TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL
Seção de Documentação - Biblioteca Cyro dos Anjos
Revista nº 30 – T. 1 – 2004 - Versão Digitalizada
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO
DISTRITO FEDERAL
R. Tribunal de Contas do Distrito Federal, 30 t.1 2004
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REVISTA EDITADA PELA SEÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO
SUPERVISÃO
Conselheiro Paulo César de Ávila e Silva
COORDENAÇÃO
Vânia de Fátima Pereira
(Chefe da Seção de Documentação)
ORGANIZAÇÃO
Lilia Márcia Pereira Vidigal de Oliveira
(Bibliotecária)
REVISÃO
Carmen Regina Oliveira de Souza Cremasco
(Bibliotecária)
Toda correspondência deve ser dirigida a esta Seção - TRIBUNAL DE CONTAS DO
DISTRITO FEDERAL - 70070-500 - SEÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO - Praça do Buriti - Ed
Costa e Silva - Brasília-DF - [email protected]
Revista do Tribunal de Contas do
Distrito Federal, nº 1 - 1975 Brasília,
Seção
Documentação, 2004.
de
CDU 336.126.55(81)(05)
ISSN 012-7751
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COMPOSIÇÃO DE 2004
Conselheiros:
Manoel Paulo de Andrade Neto - Presidente
Paulo César de Ávila e Silva - Vice-Presidente
Marli Vinhadeli
Ronaldo Costa Couto
Jorge Caetano
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
Antônio Renato Alves Rainha
Auditor
José Roberto de Paiva Martins
Ministério Público
Márcia Ferreira Cunha Farias - Procuradora-Geral
Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira
Demóstenes Tres Albuquerque
Inácio Magalhães Filho
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SUMÁRIO
DOUTRINA
TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL
Plano estratégico do Tribunal - PLANEST - 2004 - 2007 .................................... 9
MANOEL PAULO DE ANDRADE NETO
Tribunal de Contas do Distrito Federal ............................................................. 25
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
A ação dos tribunais de contas sobre os contratos ........................................... 29
A ampla defesa e a retirada de autos nos tribunais ........................................... 39
Sustação de contratos administrativos pelos tribunais de contas ........................ 49
MÁRCIA FERREIRA CUNHA FARIAS
A alienação e uso das terras públicas: uma visão do controle externo ................ 59
DEMÓSTENES TRES ALBUQUERQUE
Imprescritibilidade da ação de regresso prevista no art. 37, § 5 , da Constituição
Federal .......................................................................................................... 75
INÁCIO MAGALHÃES FILHO
Desnecessidade de registro das admissões temporárias pelos tribunais de contas 85
CARLOS ANTONIO PEREIRA DA SILVA
O processo e procedimentos diferenciados nos tribunais de contas .................... 91
GIOVANA MARIA PIRES VIEIRA
Licitação - Asfalto borracha ............................................................................. 73
MARCIA DE MELO PEREIRA TISCOSKI
Admissão de Pessoal ...................................................................................... 135l
ÂNGELA ALVES DE ARAÚJO
Atos sujeitos à apreciação do Tribunal de Contas: aplicação da decadência prevista
na lei de processo administrativo ..................................................................... 141
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IVAN BARBOSA RIGOLIN
Contratos administrativos na Lei nº 8.666/93: nove causas para a elevação do seu
valor .............................................................................................................. 157
Licitações e contratos - algumas curiosidades................................................... 175
Licitações e contratos - algumas curiosidades - II ............................................. 185
Licitações e contratos - algumas curiosidades -
III ............................................ 195
GINA COPOLA
O meio ambiente artificial ............................................................................... 205
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DOUTRINA
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PLANO ESTRATÉGICO DO TRIBUNAL
PLANEST - 2004 - 2007
Tribunal de Contas do Distrito Federal
Apresentação. I - Modelo teórico adotado. II - Plano estratégico do Tribunal. 1. Missão 2. Análise
de cenários. 2.1. Análise ambiental externa. 2.2. Análise ambiental interna. 3. Definição estratégica. 3.1.
Visão de futuro. 3.2. Diretrizes estratégicas e operacionais . III – Considerações finais.
APRESENTAÇÃO
O planejamento estratégico visa estabelecer o direcionamento a ser seguido pela
Instituição, em interação com o ambiente em que se insere, com a participação de toda a
estrutura organizacional, para alcance dos propósitos explicitados em sua missão.
Revela-se, pois, potente instrumento gerencial que busca atuação proativa,
otimização dos recursos disponíveis, maior dinamismo das atividades organizacionais,
valorização e motivação das pessoas, além de envolvimento e compromisso com o
aperfeiçoamento dos processos de trabalho e com os resultados por eles gerados.
Nesse sentido e, ainda, com o propósito de dar continuidade a iniciativas de gestões
anteriores voltadas para munir o Tribunal de ferramentas de trabalho que o tornem
referencial de excelência no contexto da Administração Pública, de forma a cada vez
melhor atender aos anseios e às expectativas da sociedade, apraz-me divulgar, em sua
terceira edição, o Plano Estratégico do Tribunal – PLANEST para o período 2004 a 2007,
elaborado com base sobretudo em valiosas contribuições das autoridades, gerentes e
servidores desta Corte de Contas e aprovado pela Decisão nº 49, de 23.10.03.
Assim, à luz do diagnóstico realizado, sobretudo com base na análise ambiental
efetuada interna e externamente, dar-se-á ênfase à atuação profilático-pedagógica do
Tribunal no sentido de orientar os jurisdicionados na consecução da finalidade estatal, ou
seja, o atendimento das demandas e das necessidades sociais; à motivação e elevação
da auto-estima dos servidores, devido a sua importância como agentes essenciais para o
sucesso da ação do Estado; ao controle social, permitindo maior interação do cidadão
com a Corte de Contas; e à pluralidade com vistas a agregar positivamente valores
àqueles já cristalizados.
I – MODELO TEÓRICO ADOTADO
Cumpre destacar, preliminarmente, que o modelo teórico para formulação do
planejamento do Tribunal vem, desde sua concepção, sofrendo ajustes, com vistas a
simplificá-lo e facilitar sua assimilação pelas áreas envolvidas, sem, no entanto, desvirtuar
seu arcabouço teórico básico.
Assim, o presente plano, materialização ordenada do resultado do processo de
planejamento estratégico, é composto por tópicos, conseqüentes de etapas distintas, as
quais objetivam precipuamente a avaliação da conjuntura, a construção de cenários e a
formulação da Definição Estratégica do Tribunal.
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A avaliação da conjuntura traduz-se pelo conhecimento atual da organização em
relação ao ambiente externo e a suas condições internas, inclusive com concepção
prospectiva.
A concepção prospectiva, de que decorre a Visão de Futuro, é definida com base na
identificação de cenários para antever determinados fatos, avaliar seus impactos e
viabilizar ações com vistas a aproveitar potencialidades e minimizar ou neutralizar os
pontos fracos internos.
Adotado um cenário, constrói-se a Visão de Futuro e estabelecem-se as Diretrizes
Estratégicas, que, em conjunto, constituem a Definição Estratégica.
Uma vez fixadas, as Diretrizes Estratégicas são desdobradas em Diretrizes
Operacionais Anuais. Em cada ano do período considerado para o alcance da Visão de
Futuro, são estabelecidas metas e ações, pelas unidades do Tribunal, com base nas
Diretrizes Operacionais. Essas ações compreendem projetos e atividades.
Com apoio nesse processo de planejamento, são definidos, como produtos finais, os
seguintes planos:
Plano Estratégico do Tribunal – PLANEST, a partir da Definição Estratégica;
Plano Geral de Ação do Tribunal – PGA, a partir dos Planos Setoriais das
unidades, derivados das Diretrizes Operacionais.
O diagrama adiante apresentado oferece um panorama geral do modelo de
planejamento adotado pelo TCDF. No nível estratégico, o PLANEST é composto pela
Missão do Tribunal, pela Análise Ambiental, pela Visão de Futuro, pelas Diretrizes
Estratégicas e pelas Diretrizes Operacionais Anuais.
No nível tático, as unidades do Tribunal, com base nas Diretrizes Operacionais
Anuais, definem seus Planos Setoriais de Ação – PSAs, contendo as metas e as ações a
serem desenvolvidas no ano subseqüente.
No nível operacional, a unidade responsável pela função planejamento consolida as
metas e as ações propostas nos PSAs das unidades, gerando o PGA para apreciação
superior.
A implementação do PLANEST ocorre mediante execução, avaliação e
realimentação do PGA, ao longo do período fixado para concretização da Visão de Futuro
do Tribunal. Essa etapa final, com fulcro na análise das distorções em relação ao
programado, permite identificar a necessidade de correção dos desvios acaso detectados
ao longo de todo o processo.
A garantia da melhoria contínua da forma de atuação do TCDF está inserida no
processo de planejamento ora apresentado, que inclui as etapas de planejamento,
execução, monitoramento e correção de desvios, integrantes do ciclo gerencial do PDCA
(Plan, Do, Check e Act), utilizado no modelo de Gerenciamento pelas Diretrizes.
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II – PLANO ESTRATÉGICO DO TRIBUNAL
1. Missão
A missão, razão de ser das organizações, tem função orientadora e delimitadora de
suas ações; é o espectro de papéis que elas podem desempenhar em busca da
satisfação dos interesses e aspirações de sua clientela.
Inferida da essência dos arts. 77 e 78 da Lei Orgânica do Distrito Federal - LODF, a
missão do Tribunal pode ser assim enunciada:
Exercer o controle externo da administração dos
recursos públicos do Distrito Federal, em auxílio à
Câmara Legislativa, zelando pela
legalidade,
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legitimidade, efetividade, eficácia, eficiência
economicidade na gestão desses recursos.
e
2. Análise de Cenários
2.1. Análise Ambiental Externa
Refere-se ao exame das condições e variáveis da ambiência externa, mediante a
identificação dos fatores externos que possam ser traduzidos em termos de
oportunidades a serem aproveitadas ou situações de risco que, na medida do possível,
devem ser evitadas ou neutralizadas, para que a instituição alcance seus objetivos
estratégicos e cumpra sua missão. Em síntese, a análise efetuada revelou o seguinte
cenário:
crescente complexidade das organizações públicas, associada à dependência cada
vez maior de recursos tecnológicos sofisticados, com a conseqüente demanda de
elevados investimentos, aliada à necessidade de constante capacitação dos recursos
humanos;
restrições orçamentárias e financeiras que impedem ou retardam a implementação
de projetos relevantes para o aumento da efetividade, eficácia e eficiência da atuação
do Controle Externo;
percepção distorcida, pela opinião pública, sobre o desempenho das Cortes de
Contas;
precária atuação do Sistema de Controle Interno do Governo do Distrito Federal —
atual Controladoria da Corregedoria-Geral do DF;
continuidade das cogitações sobre enfraquecimento, extinção ou transformação
dos Tribunais de Contas, mediante alteração ou transferência de competências para
outros órgãos;
novo dinamismo de integração e de interdependência da cena internacional, que
exige maior agilidade e presteza na condução da Administração Pública — inclusive
no combate aos desmandos administrativos e à corrupção pública —, como fatores
condicionantes para afirmação da credibilidade político-administrativa dos países
frente à comunidade internacional;
ampliação da demanda social por transparência, racionalização, economicidade e
moralidade nos investimentos e nas ações governamentais e por efetividade do
controle público para realização da justiça social, além de elevação da participação da
sociedade no controle dos serviços públicos;
constantes reformulações na estrutura organizacional dos órgãos e entidades
distritais, com criação e realocação de competências, pessoal e recursos;
possibilidade de participação em projetos governamentais como o Programa de
Modernização do Sistema de Controle Externo – PROMOEX, que se propõe a
modernizar e fortalecer o Sistema de Controle Externo do Brasil;
intensificação do processo de informatização e do uso da tecnologia da informação
por parte das organizações públicas, com crescente inserção de dados em redes de
informações, tais como sistemas integrados de administração financeira, orçamentária
e de pessoal, além de sistemas de compra pela INTERNET,
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continuidade do processo de reforma e modernização do Estado, com ênfase nos
aspectos voltados para desburocratização, descentralização, transparência, controle e
avaliação de resultados, ética, profissionalismo, competitividade e foco no
cidadão-cliente;
intensificação das pressões sobre os governos, empresas e pessoas por maior
controle ecológico;
crescimento de parcerias, firmadas mediante contratos de gestão, entre o Poder
Público local e organizações sociais, para fomento e execução de atividades de
interesse público, especialmente as dirigidas à geração de emprego e renda,
capacitação profissional, saúde e assistência social;
proximidade do Tribunal de Contas da União - TCU, da Secretaria Federal de
Controle - SFC, do Congresso Nacional, de organismos internacionais, bem como dos
órgãos e entidades jurisdicionados.
2.2. Análise Ambiental Interna
Diz respeito ao exame das condições internas da Instituição, mediante a
identificação dos aspectos classificáveis como pontos fortes e pontos fracos, de modo a,
de um lado, colocar em evidência as qualidades e potencialidades do Tribunal, que não
devem ser negligenciadas, mas melhoradas, e, de outro, detectar as vulnerabilidades da
organização, que devem merecer atenção especial com vistas a minimizá-las ou
neutralizá-las, em prol do efetivo atingimento dos objetivos estratégicos e cumprimento da
missão.
2.2.1. Pontos Fortes
Foram consideradas como principais características internas do Tribunal que
podem influenciar positivamente o seu desempenho as seguintes:
pequeno porte da Instituição, favorecendo maior agilidade na formulação de idéias
e transformação dos valores culturais vigentes;
participação na Associação dos Tribunais de Contas do Brasil, que funciona como
instrumento de integração e intercâmbio;
existência de corpo técnico qualificado, com formação multidisciplinar, aptidão para
aquisição de novos conhecimentos e potencial de resposta a fatores motivacionais,
tornando o ambiente mais propicio a mudanças culturais e receptivo à pesquisa e
implantação de novas tecnologias aplicáveis ao Controle Externo;
capacitação dos servidores para uso da linguagem da informática e predisposição
para absorver tendências tecnológicas mais avançadas;
autonomia e independência institucional, favorecendo o caráter técnico das
decisões e a isenção na utilização do poder sancionador,
poder normativo relativo às matérias de sua competência, o que pode viabilizar a
uniformização e padronização de procedimentos afetos ao Controle Externo;
modelo colegiado e processo decisório compartilhado, concorrendo para o
aumento da qualidade das decisões tomadas;
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bom relacionamento no ambiente de trabalho, constituindo fator higiênico positivo
para aplicação de programas motivacionais que resultem em aumento de
produtividade;
utilização de critérios técnicos objetivos - especialmente materialidade e relevância;
estabelecidos pela metodologia denominada Matriz de Risco para subsidiar o
planejamento das auditorias a serem levadas a efeito pela Instituição;
iniciativas da cúpula com vistas a promover a modernização administrativa do
Tribunal, entre as quais a participação no PROMOEX e a implantação de ações
iniciais do Programa TCDF da Qualidade e Produtividade;
2.2.2. Pontos Fracos
Os pontos vulneráveis, ainda não totalmente eliminados, podem, na realidade, ser
traduzidos como possibilidades de melhoria relativas à atuação do Tribunal, as quais já
vêm sendo aproveitadas pela Administração da Casa, tanto em gestões anteriores quanto
na atual, com o objetivo de torná-los características positivas da Instituição.
De fato, inúmeras iniciativas já foram ou vêm sendo adotadas, nas áreas de
comunicação interna e externa, fiscalização, planejamento e modernização administrativa,
recursos humanos, materiais e orçamentários. Ademais, a participação do TCDF no
PROMOEX certamente em muito contribuirá para o aprimoramento, a complementação e
a consolidação das realização pretéritas e futuras da Casa.
Assim, vislumbram-se como passíveis de melhoria o(a):
sistema de comunicação interna mediante, sobretudo, ampliação dos mecanismos
de divulgação de políticas, diretrizes e matérias relevantes, bem como maior interação
entre as unidades do Tribunal e entre estas e os servidores;
sistema de comunicação externa, por intermédio, principalmente, da melhoria e
ampliação dos instrumentos de: divulgação da missão e das realizações do Tribunal;
fomento do controle social; integração com os entes jurisdicionados, demais Cortes
de Contas e instituições congêneres, nacionais e internacionais;
política de recursos humanos, sobretudo nas áreas de retenção, dimensionamento
e recomposição da força de trabalho necessária ao cumprimento das competências
do TCDF, definição de seu perfil, desenvolvimento e capacitação de pessoal,
avaliação de desempenho e progressão funcional;
área de tecnologia da informação, especialmente no tocante à adequação de sua
estrutura organizacional às necessidades da Casa e à ampliação de investimentos, de
forma a se garantir efetivo e permanente suporte à modernização das atividades
desempenhadas por esta Corte de Contas;
ação fiscalizadora do Tribunal, de forma a torná-la mais seletiva, preventiva e
orientadora, por intermédio, primacialmente de: ampliação dos instrumentos para
seleção, acompanhamento e avaliação dos resultados das atividades de fiscalização;
maior ênfase para o controle concomitante em relação ao controle a posteriori;
migração gradativa do foco das fiscalizações de auditoria de regularidade para
auditoria de desempenho;
atuação do Controle Externo, especialmente por intermédio de: simplificação e
padronização da instrução de processos, objetivando ganhos de produtividade; maior
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celeridade de tramitação de processos; elevação do índice de decisões conclusivas;
provimento de assessoramento jurídico formal para as ICEs; diminuição do número de
processos sobrestados; aprimoramento da metodologia para avaliação dos sistemas
de controle interno das jurisdicionadas; maior uniformidade nos julgamentos da Corte;
sistema de planejamento e modernização administrativa, primordialmente, por meio
de: maior integração entre os sistemas de planejamento e orçamento; fomento à
participação mais efetiva das unidades e servidores do Tribunal no processo de
planejamento estratégico e operacional; incremento das ações de modernização com
vistas à racionalização e integração dos processos de trabalho; concepção de sistema
de avaliação de desempenho institucional e de aperfeiçoamento do sistema de
informações gerenciais;
integração entre os principais processos finalísticos do Tribunal, quais sejam, a
apreciação das Contas do Governo e o julgamento das Contas Anuais encaminhadas
pelos órgãos e entidades jurisdicionados, especialmente, por intermédio de:
compatibilização dos prazos legais definidos para remessa pelos entes
jurisdicionados desses documentos e seu exame pelo TCDF; medidas de
simplificação e modernização dos procedimentos de formação, entrega, instrução,
tramitação e julgamento das tomadas e prestações de contas;
3. Definição Estratégica
A Definição Estratégica do Tribunal, configurada com base na sua missão
institucional e nos fatores condicionantes identificados pela análise ambiental externa e
organizacional, é representada pelo conjunto formado pela Visão de Futuro do Tribunal e
pelas Diretrizes Estratégicas.
3.1. Visão de Futuro
A Visão de Futuro descreve o patamar de desenvolvimento que a organização
deseja atingir e pelo qual quer ser reconhecida em determinado período vindouro, ou seja,
representa o estado futuro da instituição que se pretende ver transformado em realidade,
tendo em vista os propósitos estabelecidos em sua missão.
Com expectativa de ser alcançada pelo Tribunal até o final de 2007, foi estabelecida
a seguinte Visão de Futuro:
“SER RECONHECIDO POR SUA ATUAÇÃO TEMPESTIVA,
PREVENTIVA, ORIENTADORA E TRANSPARENTE NO EXERCÍCIO DO
CONTROLE EXTERNO SOBRE A GESTÃO DOS RECURSOS PÚBLICOS
DO DISTRITO FEDERAL, COM ÊNFASE NA ANÁLISE DAS CONTAS
ANUAIS, MEDIANTE PROCESSOS DE TRABALHO RACIONALIZADOS E
INTEGRADOS,
SERVIDORES
QUALIFICADOS,
MOTIVADOS,
PARTICIPANTES E COMPROMETIDOS COM OS RESULTADOS, E
MECANISMOS DE DIVULGAÇÃO E ARTICULAÇÃO EXTERNA QUE
REVERTAM EM DESTACADO DESEMPENHO E FOMENTEM O
DESENVOLVIMENTO DO CONTROLE SOCIAL."
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3.2. Diretrizes Estratégicas e Operacionais
As Diretrizes Estratégicas compreendem as diretivas estabelecidas pela Alta
Administração para um período plurianual, necessárias ao atingimento da visão
organizacional. Correspondem às grandes orientações que servirão como base de
sustentação para as tomadas de decisões dirigidas ao alcance do ideal de futuro
almejado pela Instituição.
As Diretrizes Operacionais, extraídas das Estratégicas, representam as orientações
da Alta Administração para o atingimento dos principais objetivos a serem perseguidos
pela Instituição a cada exercício e visam nortear a elaboração anual do PGA, que, por sua
vez, reúne as ações e metas de curto prazo prioritárias para concretamente viabilizarem,
ao longo do período de vigência do PLANEST, o alcance dos desígnios de longo prazo.
Assim, foram estabelecidas as seguintes Diretrizes Estratégicas para o quadriênio
2004 a 2007 acompanhadas das respectivas Diretrizes Operacionais para o exercício de
2004.
DIRETRIZ ESTRATÉGICA Nº 1:
Cumprir tempestivamente, de forma preventiva e orientadora, as competências
institucionais
DIRETRIZES OPERACIONAIS:
1. Controle do estoque de processos, objetivando mantê-lo atualizado em relação aos
prazos previstos para sua instrução e para sua apreciação plenária.
2. Aumento das ações de controle concomitante.
3. Acompanhamento do cumprimento das decisões do Tribunal.
4. Elevação do índice de decisões conclusivas.
5. Incremento das ações de caráter preventivo e orientador.
DIRETRIZ ESTRATÉGICA Nº 2:
Promover o desenvolvimento e a modernização institucionais
DIRETRIZES OPERACIONAIS:
6.
Aperfeiçoamento do sistema de planejamento do Tribunal, especialmente com
vistas a estimular maior participação das diversas áreas.
7.
Estabelecimento de forma participativa de indicadores de desempenho do
Tribunal.
8.
Mapeamento,
melhoria,
padronização,
integração,
informatização
manualização dos principais processos de trabalho do Tribunal.
9.
Aperfeiçoamento dos normativos institucionais.
14
e
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10. Ampliação e aprimoramento do uso da tecnologia da informação.
DIRETRIZ ESTRATÉGICA Nº 3:
Desenvolver, valorizar e motivar os servidores para atingimento dos objetivos
estratégicos institucionais
DIRETRIZ OPERACIONAL:
11. Estabelecimento de programas de qualificação e avaliação, bem como adoção de
medidas direcionadas para o desenvolvimento e a valorização profissional e
promoção da qualidade de vida no trabalho, orientados para o cumprimento de
objetivos estratégicos institucionais.
DIRETRIZ ESTRATÉGICA Nº 4:
Melhorar a infra-estrutura do ambiente físico e o suporte logístico
DIRETRIZES OPERACIONAIS:
12. Melhoria dos recursos materiais e patrimoniais do Tribunal.
13. Melhoria dos equipamentos de informática e aperfeiçoamento
atendimento aos usuários de recursos de informática do Tribunal.
do
DIRETRIZ ESTRATÉGICA Nº 5:
Fortalecer a imagem institucional e estimular o diálogo com a sociedade e com
os demais entes externos
DIRETRIZES OPERACIONAIS:
14. Divulgação do papel do Tribunal e do resultado das ações de controle
externo e crescente interação e intercâmbio com entes jurisdicionados,
demais Cortes de Contas e instituições congêneres nacionais e
internacionais.
15. Fomento à vigilância social sobretudo no combate aos desvios e à
malversação dos recursos públicos.
16. Aprimoramento do sistema de comunicação interna.
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III. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Espera-se que o presente PLANEST, para o período 2004-2007, além de apoiar o
processo decisório e conferir melhor direcionamento às ações gerenciais, contribua,
mediante materialização em ações das orientações nele contidas, para o pleno alcance
da Visão de Futuro, a qual projeta para o amanhã um Tribunal mais atuante, proativo e
sintonizado com a sociedade, com plena visibilidade das ações por ele desenvolvidas e
das realizações decorrentes e com seu capital humano qualificado, motivado, participante
e comprometido com os resultados.
O passo seguinte, no processo de planejamento, compreende a formulação, com
base nas Diretrizes Estratégicas e Operacionais contidas neste Plano, dos Planos
Setoriais de Ação – PSAs, os quais, após consolidados, geram o Plano Geral de Ação –
PGA para cada exercício do quadriênio 2004-2007.
Cabe esclarecer, por último, que as Diretrizes Operacionais para 2004 — que
nortearam a elaboração do PGA para esse ano, aprovado pela Decisão nº 76, de
11.12.03. — não traduzem, em toda sua extensão, as Diretrizes Estratégicas, porquanto
refletem tão-somente a capacidade produtiva de o Tribunal materializar em metas e ações
o direcionamento estratégico instituído neste PLANEST em seu primeiro ano de vigência.
As demais orientações contidas nas diretrizes superiores e não incorporadas pelas
Diretrizes Operacionais para 2004 — ou dessas integrantes mas que não sejam
materializadas efetivamente em ações — deverão ser contempladas ou reiteradas nas
Diretrizes Operacionais a serem fixadas para os anos seguintes, de 2005 a 2007.
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Manoel Paulo de Andrade Neto
Conselheiro Presidente do TCDF
Criado em 13 de abril de 1960, como órgão auxiliar do Senado Federal, por meio da
Lei nº 3.751 de 13 de abril de 1960, sancionada por Juscelino Kubitschek de Oliveira, o
Tribunal de Contas do Distrito Federal teve a sua ata da sessão de instalação no dia 15
de setembro de 1960, com a primeira sessão plenária realizada no dia 26 de setembro do
mesmo ano.
Desde sua criação até a edição da Constituição Federal de 1967, a atuação do
TCDF no controle das finanças públicas do Distrito Federal estava concentrada no
registro prévio dos atos de natureza financeira e na elaboração de pareceres prévios
sobre as contas do Prefeito do Distrito Federal. Cabe ressaltar que o Ato Regimental nº
01 de 05 de julho de 1962, criou, de forma pioneira no Brasil, a figura da Inspeção in loco‖
uma espécie de gérmen das auditorias e inspeções adotada pela Constituição de 1967.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, que criou a Câmara Legislativa do
Distrito Federal, aconteceram evoluções relacionadas, principalmente, à situação do
TCDF, com a mudança da sua jurisdição para órgão auxiliar dessa nova Casa Legislativa,
consumada em 1991. O novo texto constitucional também introduziu a figura da auditoria
de desempenho ou operacional, com grande influência sobre a complexidade dos
processos, além da obrigatoriedade da avaliação da legalidade dos atos de admissão de
pessoal para fins de registro e outras relacionadas a avaliação dos resultados quanto à
eficácia e eficiência da gestão orçamentária, financeira, contábil e patrimonial nos órgãos
e entidades da administração do Distrito Federal.
Em apoio à Corte, passou a funcionar depois da edição da Lei nº 3.948/61, um corpo
especial de 2 (dois) Auditores, sendo que, a partir de 1967, o Decreto-Lei nº 274 criou
terceiro cargo. Desde o início, junto ao TCDF, aparece destacada atuação do Ministério
Público, órgão com independência funcional em relação à Corte.
A atual Corte de Contas do Distrito Federal tem a seguinte composição –
Conselheiro Manoel Paulo de Andrade Neto (presidente), Conselheiro Paulo César de
Ávila e Silva (vice presidente), Conselheiro Ronaldo Costa Couto, Conselheira Marli
Vinhadeli, Conselheiro Jorge Caetano, Conselheiro Jorge Ulisses Jacoby Fernandes e
Conselheiro Antônio Renato Alves Rainha.
O Tribunal de Contas do Distrito Federal desempenha atividades que resulta, entre
muitos feitos, na expedição, recomendações e orientações objetivando recuperar ou evitar
prejuízos decorrentes do uso indevido dos bens, dinheiros e valores públicos. Os
benefícios advindos das determinações, recomendações e orientações são de inegável
relevância, independentemente de mensuração ou quantificação, pois só a existência da
figura da entidade fiscalizadora por si só, quando não ilide, já minimiza ou inibe a prática
de atos indevidos na gestão.
As realizações do TCDF, que são apresentadas à cada trimestre à Câmara
Legislativa, atestam o empenho da Corte de contas na busca da melhoria continua da
qualidade dos serviços prestados à sociedade, tendo como direcionamento a sua visão de
futuro, traduzida pela atuação tempestiva e transparente na fiscalização da gestão dos
recursos públicos.
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Revista nº 30 – T. 1 – 2004 - Versão Digitalizada
No primeiro semestre deste ano, os conselheiros do Tribunal de Contas do Distrito
Federal proferiram 3.207 decisões preliminares e conclusivas. No mesmo período, houve
189 tomadas e prestações de contas sendo que mais de 50 % conclusivas. Ainda estão
em análise 523 autos, sendo 302 tomadas de contas e 221 prestações de contas.
A apreciação das Contas do Governador que é apresentada à Câmara Legislativa e
o julgamento das contas anuais dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos e as demais decisões referentes às atividades de
controle externo são atos formalizados por deliberações do Plenário. Ao julgar as contas,
o TCDF decide sobre a legalidade, legitimidade e economicidade dos atos de gestão e
das despesas deles decorrentes, bem como sobre a aplicação de subvenções e a
renúncia de receitas.
Ainda no primeiro semestre deste ano, os conselheiros analisaram 2.107 atos na
área de pessoal, entre eles, admissão, aposentadoria, pensão civil e militar, reforma e
revisão de contrato.
Com um total de 592 servidores, sendo 529 concursados como auditores, analistas
de finanças e controle externo, técnicos de finanças e controle externo, analistas de
administração pública, técnicos e auxiliares de administração pública, o TCDF conta hoje
com uma equipe altamente técnica e profissional.
Há uma preocupação constante quanto à política de recursos humanos, com a
qualificação e constante aprimoramento dos servidores, além da valorização profissional
para evitar a rotatividade de pessoal que traz uma série de prejuízos aos cofres, entre
eles, a normal queda de produtividade das atividades nos primeiros meses de adaptação
dos empossados, além dos custos de contratação de novos servidores e conseqüente
necessidade de ofertar capacitação para o cumprimento das funções inerentes ao
controle externo.
Existe, no Tribunal, a Biblioteca ―Cyro dos Anjos‖, que hoje conta com 18.223 itens
entre livros, revistas, periódicos e cds. Aberta à comunidade ela vem obtendo mais de
1.200 consultas por mês. Além de sua diversidade de títulos, oferece, ainda, duas salas
de multimeios: uma contendo TV, vídeo e mesa para reuniões e outra com três
computadores para estudos e pesquisas.
Especializada em Literatura e Direito, com ênfase em Direito Administrativo, a
biblioteca é composta de uma diversidade de títulos sobre Economia, Finanças,
Contabilidade e Administração, bem como arquivos de Diários Oficiais da União e do
Distrito Federal, que datam desde a inauguração de Brasília em 1960. O investimento é
constante. Neste ano de 2003, no primeiro semestre, foram adquiridos 400 itens e no ano
passado houve a aquisição de 500 novos títulos.
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A AÇÃO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS
SOBRE OS CONTRATOS
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
Conselheiro do TCDF
Diversamente dos poderes que concedeu aos tribunais de contas, em relação a atos
administrativos em geral, o constituinte, ao tratar de contratos, definiu 1 uma sistemática
que envolve essas Cortes, o Poder Legislativo e o Poder Executivo, numa efetiva
aplicação da teoria de freios e contrapesos cheks and balances.
Sustar um contrato significa retirar-lhe a eficácia, a produção dos efeitos financeiros –
pagamento, por exemplo – e executivos, - realização do objeto.
O inciso X e §§ 1º e 2º do art. 71, da Constituição Federal, ao referir-se à sustação admitiu,
implicitamente, que a mesma tivesse natureza cautelar ou definitiva.
Terá natureza cautelar, quando determinada no curso de um processo, visando resguardar
o patrimônio público; natureza decisória definitiva quando for anunciado pelo Tribunal de Contas,
com a recomendação para adotar as medidas legais, genericamente, ou implicar em providências
incompatíveis com a continuidade do contrato.
Tecnicamente, nesse último caso, estará o Tribunal de Contas determinando a autoridade
administrativa que rescinda ou anule o contrato. Na função de controle externo é possível
determinar à autoridade que adote as providências visando ao exato cumprimento da Lei,
expressão essa comum no âmbito das recomendações dos Tribunais de Contas.
Assim, embora tecnicamente a recomendação para sustação em caráter definitivo não seja
adequada é possível entender que a competência constitucional para sustar assuma tal
conotação, hipótese em que terá por corolário lógico a anulação ou rescisão.
Ao receber a comunicação para sustar o contrato, cabe a autoridade administrativa optar
pela medida que melhor se harmonize com o interesse público. Divergindo da decisão, poderá
impetrar recurso perante o próprio Tribunal de Contas ou iniciar a ação judicial pertinente contra o
ato do tribunal. Concordando, verificará se a sustação deverá ter natureza cautelar,
corrigindo/sanando o contrato, ou definitiva, rescindindo ou anulando-o.
a) o Tribunal de Contas tem poder de recomendar à Administração Pública que suste o
contrato
O ordenamento jurídico brasileiro, formado pela Constituição e lições do Supremo Tribunal
Federal, com extrema parcimônia, harmonizou o primado do respeito ao ato jurídico perfeito com a
secular discussão acerca dos efeitos do ato ilegal, admitindo a competência do controle externo
para buscar inicialmente que a própria administração suste o contrato, observando-se, é claro, a
legislação pertinente. Note-se que determinação à sustação não é rescisão, mas apenas ato
cautelar impeditivo da consumação da despesa ou do fato gerador de pagamento (execução). A
autoridade que recebe a comunicação é que avalia os efeitos da sustação na vida do contrato.
Cabe lembrar que, na atualidade, a anulação do contrato e até a sua rescisão,
mesmo que seja por motivo de interesse público, obrigam a Administração Pública a
observar o princípio do contraditório e da ampla defesa.2
1
No início do século, ao tempo do registro prévio, os contratos eram ―julgados‖ pelo Tribunal de
Contas da União. BRASIL. Decreto nº 2.511, de 20 de dezembro de 1911. Regula a Tomada de
Contas ao governo pelo Congresso Nacional. Coleção de Leis do Brasil 1911, v. 1, p. 80, c. 1, art. 5º.
2
Quando a nulidade é da licitação, essa induz à do contrato, e também deve ser garantido o direito
de ampla defesa e do contraditório, conforme art. 49, caput e §§ 2° e 3°, da Lei nº 8.666/93.
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Muito se tem debatido se o Tribunal de Contas deve originariamente assegurar o
contraditório ao licitante vencedor ou ao contratado, conforme o caso, ou se esse dever
compete apenas ao órgão jurisdicionado que recebe a determinação para sustar, anular
ou rescindir o contrato.
Após o advento da Lei nº 9.784/99 com mais ênfase parece prevalecer
entendimento, de que deve o próprio tribunal assegurar a ampla defesa e o contraditório.
Desse modo se decidir que a licitação deve ser anulada, quando já proclamado o
vencedor, antes de deliberar deve notificar esse licitante para integrar o processo; se
analisa contrato, havendo indícios que possam levar a nulidade, deve o contratado
também ser chamado ao processo.
Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, sintetizado na
seguinte ementa:
EMENTA: I. Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art.
71, IX e §§ 1º e 2º). O Tribunal de Contas da União - embora não tenha poder para
anular ou sustar contratos administrativos - tem competência, conforme o art. 71, IX,
para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se
for o caso, da licitação de que se originou. II. Tribunal de Contas: processo de
representação fundado em invalidade de contrato administrativo: incidência das
garantias do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, que impõem
assegurar aos interessados, a começar do particular contratante, a ciência de sua
instauração e as intervenções cabíveis. Decisão pelo TCU de um processo de
representação, do que resultou injunção à autarquia para anular licitação e o contrato
já celebrado e em começo de execução com a licitante vencedora, sem que a essa
sequer se desse ciência de sua instauração: nulidade. Os mais elementares corolários
da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa são a ciência dada ao
interessado da instauração do processo e a oportunidade de se manifestar e produzir
ou requerer a produção de provas; de outro lado, se se impõe a garantia do devido
processo legal aos procedimentos administrativos comuns, a fortiori, é irrecusável que
a ela há de submeter-se o desempenho de todas as funções de controle do Tribunal
de Contas, de colorido quase - jurisdicional. A incidência imediata das garantias
constitucionais referidas dispensariam previsão legal expressa de audiência dos
interessados; de qualquer modo, nada exclui os procedimentos do Tribunal de Contas
da aplicação subsidiária da lei geral de processo administrativo federal (Lei nº
9.784/99), que assegura aos administrados, entre outros, o direito a "ter ciência da
tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter
vista dos autos (art. 3º, II), formular alegações e apresentar documentos antes da
decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente". A
oportunidade de defesa assegurada ao interessado há de ser prévia à decisão, não
lhe suprindo a falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível
é o de reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão. 3
Sustentam alhures que não se deve olvidar que há entendimento, em linha mais
ortodoxa no sentido de que atos absolutamente nulos prescindem de ampla defesa. 4
O entendimento mais consentâneo com o novo ordenamento jurídico, porém, é o
retratado no acórdão transcrito, fato que deve obrigar os Tribunais de Contas à revisão de
alguns procedimentos. De fato, a jurisprudência referida como mais ortodoxa não analisou
3
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 23.550/DF. Min. Relator: Marco Aurélio. Rel. do Acórdão
Min. Sepúlveda Pertence. DJ 31.10.01.
4
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. R Ext. 22.4283/SP. Rel. Min. Ellen Gracie; Rec. Ext. 213.513.
Rel. Min. Ilmar Galvão.
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a competência do Tribunal de Contas, nem se contextualizou ao tema contratos e ao
advento da Lei nº 9.784/99, como faz o processo cuja ementa de acórdão foi transcrita.
Aliás, o próprio Tribunal de Contas da União, paradigma federal do controle externo
passou a adotar o mesmo entendimento, anulando suas deliberações quando o contrato
já estiver em curso e a deliberação da Corte for determinando a rescisão do contrato, sem
que tenha havido prévia audiência.5
b) se a Administração Pública não atender a recomendação, o Tribunal de Contas não tem
poder para sustar diretamente
Entre a determinação do Tribunal de Contas e a promulgação do decreto legislativo que
susta o contrato, está a administração obrigada a deixar de executar ou pagar o contrato?
Certamente não, porque a decisão do Tribunal de Contas não é vinculativa neste
caso. Somente obriga, nos termos da lei, o decreto legislativo. Nessa linha de
entendimento também é o escólio de Eros Roberto Grau.6
c) diante da recusa da Administração Pública, o Tribunal de Contas deverá comunicar a
recalcitrância ao Poder Legislativo, o qual tem a prerrogativa de sustar o contrato
diretamente
Ensina Carlos Ari Sundfeld, com a argumentação lógica que o destaca, que:
a fiscalização da regularidade dos contratos administrativos é tarefa do Tribunal
de Contas, a quem compete - de modo exclusivo - determinar, ao órgão ou entidade, a
adoção de providências para a regularização da despesa. Somente após o
esgotamento da ação da Corte de Contas, com a caracterização da ilegalidade não
corrigida, é que o legislativo poderá agir, sustando o contrato irregular. 7
Lembra, a propósito, que José Afonso da Silva obtempera ser esse controle de
natureza política, mas sujeito à prévia apreciação técnico-administrativa do Tribunal de
Contas.
Efetivamente, tal competência não integra o elenco daquelas atribuições definidas
para o Poder Legislativo na Constituição Federal. Tem, porém, o direito-dever de exercêla, tão somente, após a recusa do órgão em acatar a recomendação do Tribunal de
Contas. Não tem, desse modo, competência originária para o exame de contratos, nem
pode prescindir do formal exame técnico do Tribunal de Contas, nem a mesma subsistirá
se não houver recusa. Confirma-se aí, mais uma vez, que o Tribunal de Contas não é
órgão auxiliar do Poder Legislativo, mas, autônomo, na dicção do Supremo Tribunal
Federal, e auxilia a função de controle do Congresso Nacional.8
5
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 882/03-Plenário, DOU, 24.07.03, p.68.
GRAU, Eros Roberto. Tribunal De Contas - Decisão - Eficácia. Parecer. Revista de Direito
Administrativo, v. 210, out./dez. 1997, p. 351-356.
7
SUNDFELD, Carlos Ari. Pode o Legislativo sustar contrato administrativo (CF, art. 71, §1°) sem a
prévia decretação da ilegalidade pelo Tribunal de Contas ?
8
Considerando ilegal a sustação direta pelo Poder Legislativo, sem a participação do Tribunal de
Contas: SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Administrativo. Apelação nº
008.825.5/1-SP. Relator: Desembargador Antônio Villen. São Paulo, 20 de janeiro de 1998.
Informativo de licitações e contratos, nº 48, p. 166-167, fev. 1998.
6
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d) o ato de sustação pelo Poder Legislativo independe de nova e prévia comunicação à
Administração e ao contratado, porque essa já foi feita pelo Tribunal de Contas e não
acatada pela Administração Pública
Por esse motivo, ao requerer a sustação ao Poder Legislativo deve o Tribunal de Contas
remeter cópia da correspondência que foi enviada à Administração Pública, requerendo a
sustação do ato, posto que é um dos requisitos indispensáveis ao exercício da competência
daquele. A Administração e o contratado devem ser notificados dessa comunicação.
Quanto ao não atendimento, poderá esse ser provado:
pela manifestação escrita da autoridade requerida;
pela prática de atos incompatíveis com o acatamento;
por provas coligidas pela inspeção ordenada pelo Tribunal de Contas; ou
pela simples afirmação do Tribunal de Contas ao Poder Legislativo.
e) simultaneamente ao ato de sustação, cabe ao Poder Legislativo “solicitar, de imediato,
ao Poder Executivo as medidas cabíveis”
A Constituição Federal coloca em paralelo à comunicação dirigida pelo Tribunal de Contas
ao Poder Legislativo, visando sustar o ato, a requisição de medidas a cargo do Poder Executivo.
Que medidas serão estas? Seriam as de sustação? Óbvio que não, vez que, pelo próprio sentido
lógico, descabem sua repetição.
É importante notar que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário também podem
firmar contratos administrativos, assim como o Poder Executivo. Logo, à primeira vista, a
restrição ao Poder Executivo parece indicar que o Tribunal de Contas só estaria cuidando
de não atendimento da determinação pelo Poder Executivo. Ora, se pode haver
recalcitrância por parte do executivo, também poderá ocorrer por parte dos demais
poderes. Ademais, a expressão medidas cabíveis, aqui requeridas, não se refere à
sustação do contrato pelo jurisdicionado, pois a norma superou essa etapa e agora cuida
do não atendimento.
As medidas complementares aqui referidas, e o fato de serem dirigidas apenas ao
Poder Executivo, decorrem de que, embora os três poderes e os órgãos autônomos como
o Ministério Público e o Tribunal de Contas possam firmar contrato, fazem-no em nome do
ente da esfera de governo a que se vinculam. Assim, o Superior Tribunal de Justiça, por
exemplo, o faz em nome da União, pessoa jurídica correspondente; a Assembléia
Legislativa de um Estado, em nome desse; a secretaria de obras de uma Prefeitura, em
nome do Município. Por isso, é indispensável que, por meio do órgão jurídico encarregado
da representação judicial da unidade, a entidade jurídica esteja apta a adotar as medidas
complementares, como a prestação de contas do contrato, as ações de indenização, o
arresto de bens, a assunção da obra no estado em que se encontra.9
f) o Poder Legislativo tem o prazo improrrogável de noventa dias para efetivar o ato de
sustação e adotar as medidas cabíveis, respectivamente
O prazo, exageradamente longo, especialmente se estiver subjacente grave lesão
às finanças públicas - fato que justificaria o ato extremo da sustação -, é de 90 dias.
9
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
Diário Oficial da União, 22.06.93, art. 80.
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Pretendem os membros do Poder Legislativo que os prazos sejam contados na forma do
regimento interno das casas parlamentares. Contudo, não é o correto, vez que o
destinatário do prazo é o Tribunal de Contas. Assim, embora aceitável em outros casos
que o prazo seja contado na forma regimental, neste, especificamente, não prevalece
aquela regra, contando-se o prazo dia a dia, tendo por termo inicial, dies a quo, a data de
recebimento pelo respectivo poder.
g) decorrido esse prazo sem deliberação, o Tribunal de Contas decidirá a respeito
Com esse comando, a norma restaura a competência do Tribunal de Contas, talvez muito
tardiamente, numa tentativa de estabelecer um sistema de freios e contrapesos.
Decidirá a respeito da sustação - que o Poder Legislativo não decidiu - e também das
medidas que cabiam ao Poder Executivo adotar e não adotou.
h) é implícita a competência do Poder Legislativo examinar a impugnação
E, se o Poder Legislativo decidir que o contrato não padece dos vícios apontados pelo
Tribunal de Contas? Neste caso, a competência do Tribunal de Contas para sustar não é
restabelecida porque o constituinte só permitiu o retorno da competência diante da omissão,
fruição in albis do prazo.
i) a sustação deve submeter-se ao princípio da legalidade
É evidente que o exercício da competência não pode se concretizar com a ofensa às
demais garantias do ordenamento jurídico.
Assim, a sustação cautelar ou definitiva não pode afetar a garantia constitucional do
equilíbrio econômico-financeiro que tem como termo a quo, ou seja, inicial, a data da proposta.10
Tal garantia só não prospera se provado que a conduta dolosa do contratado consistiu na
elevação arbitrária dos preços.11
Se a sustação tiver natureza cautelar e implicar o retardamento da execução, o ato que
altera o prazo deve ser justificado e publicado;12 se implicar em desmobilização, o pagamento do
custo correspondente para o contratado, nos termos previstos no edital; 13 se tiver natureza
definitiva, as garantias do art. 78, inc. XIV e XV e 79, da Lei 8.666/93.
Dada a complexidade de que se reveste a sustação de contrato e seus efeitos na órbita
jurídica e econômica, o exercício dessa competência deve ser concretizado com extrema
parcimônia, avaliando-se os efeitos decorrentes para o erário e a sociedade.
j) Conclusão
O fortalecimento das atividades dos Tribunais de Contas fez exsurgir a competência para
sustação de contratos administrativos que deve ser exercitada nos termos da Constituição Federal
e das leis em vigor.
10
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado,
1988, art. 37, inciso XXI.
11
BRASIL. Lei nº 8.666/93, art. 96, inciso I.
12
BRASIL. Lei nº 8.666/93, art. 40, inciso X c/c art. 78, inciso XVI.
13
BRASIL. Lei nº 8.666/93, art. 8º.
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A AMPLA DEFESA E A RETIRADA DE AUTOS NOS TRIBUNAIS
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
Conselheiro do TCDF
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 assegura aos litigantes em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o contraditório e a ampla defesa, com
os meios e recursos a eles inerentes.1
O princípio do contraditório, comumente resumido na antiga parêmia latina audiatur et altera pars -, consiste na obrigação do Juiz, em razão do seu dever de
imparcialidade, de ouvir a outra parte do processo sobre as alegações deduzidas por uma
parte. Também é chamado de princípio da audiência bilateral.
Tal axioma dá sustentação a teoria geral do processo, e sua inobservância acarreta
a nulidade do ato, ressalvadas as exceções expressamente admitidas em lei, como a
medida liminar sem oitiva da parte adversa, que, por isso mesmo, constitui-se instrumento
restrito.
Com o descortino superior que lhe é peculiar, obtempera o Dr. João Bonifácio Cabral Jr.
que, no Direito comparado, em especial na doutrina alemã, é reconhecido que, subjacente ao
direito de defesa, estão presentes três outros direitos, quais sejam:
a) direito de informação
Pelo qual se garante que o interessado, num processo administrativo disciplinar, por
exemplo, tenha acesso a todas as informações relativas ao andamento e aos atos do
processo;
b) direito de manifestação
Pelo qual se garante o direito do interessado manifestar-se oralmente ou
peticionando por escrito no processo;
c) direito de ver suas razões consideradas
Pelo qual se obriga o julgador, sob pena de nulidade, a considerar as razões de
defesa, enfrentando-as, quer para acatá-las, quer, principalmente, quando for o caso,
para mostrar, fundamentadamente na prova colhida na instrução, a improcedência ou
inconsistência das mesmas.
Desafio relevante consiste em avaliar como os princípios da epígrafe afetam os
diversos tipos de processos que estão submetidos no plexo de competências dos
Tribunais de Contas.
O tema desafia a inteligência porque exige profundo conhecimento da natureza das
diversas funções que essas Cortes exercem e como, quando e em favor de quem devem
ser concretizados tais princípios.
Um dos pontos que até o mês de outubro próximo passado surpreendia os
causídicos que iniciavam a militância nos Tribunais de Contas era a vedação à retirada de
autos dos processos, mesmo quando o Advogado possuía procuração nos autos.
1
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, art. 5º, LV.
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No âmbito do TCU, logo após a edição da Lei nº 8.906/94 foi constituído processo
específico para tratar do assunto2, tendo a Corte deliberado pelo sobrestamento até a
apreciação preliminar de várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade ingressadas no
Supremo Tribunal Federal contra a referida norma.
A Resolução nº 36/95 do TCU, que definiu os parâmetros para assegurar aos
responsáveis e interessados a ampla defesa e o contraditório acabou por manter a praxe
da Corte, expressamente vedando a retirada dos autos do processo.
As motivações que justificaram a norma não podem ser simplesmente
desconsideradas diante do aparente conflito com a Lei. A sustentar a razoabilidade da
negativa desse exercício está o fato de que muitos processos tramitam com a chancela
de sigilo, que a maioria deles envolve mais de um interessado ou responsável e que o
Tribunal de Contas por vezes desempenha mera função administrativa e por outras vezes
função de jurisdição.
As controvérsias estabelecidas sobre o assunto vieram a ter bom termo com a
edição do novo Regimento Interno do TCU que dedicou um capítulo inteiro ao tema 3 e
2
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº 013.966/1994-4, conforme consta do Processo
nº 005.972/1998-1.
3
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Resolução nº 155, de 04 de dezembro de 2002. Aprova o
Regimento Interno do Tribunal de Contas da União. [...] Art. 163. As partes poderão pedir vista ou
cópia de peça do processo, mediante solicitação dirigida ao relator, segundo os procedimentos
previstos neste capítulo, assegurada aos seus advogados a obtenção de vista ou cópia de peça de
qualquer processo não sigiloso, desde que demonstrem semelhança de matéria e necessidade atual
em face do processo em que estejam atuando.
§ 1º Na ausência ou impedimento por motivo de licença, férias, recesso do Tribunal ou outro
afastamento legal do relator ou do seu substituto, e não havendo delegação de competência na forma
do art. 164, caberá ao Presidente do Tribunal decidir sobre os pedidos previstos no caput.
§ 2º Poderão ser indeferidos os pedidos de que trata o caput se existir motivo justo ou, estando no dia
de julgamento do processo, não houver tempo suficiente para a concessão de vista ou extração de
cópias.
§ 3º No caso de processo encerrado, exceto por apensamento a processo em aberto, caberá à
Presidência do Tribunal decidir sobre os pedidos previstos no caput.
§ 4º Do despacho que indeferir pedido de vista ou cópia de peça de processo cabe agravo, na forma
do art. 289.
Art. 164. O relator, mediante portaria, poderá delegar competência aos titulares das unidades técnicas
e ao chefe de seu gabinete, bem como aos dos membros do Ministério Público, para autorização de
pedido de vista e de fornecimento de cópia de processo.
Art. 165. O despacho que deferir o pedido de vista indicará o local onde os autos poderão ser
examinados.
§ 1º As partes não poderão retirar processo das dependências do Tribunal, exceto por intermédio de
advogado regularmente constituído, que poderá fazê-lo pelo prazo de cinco dias, sob a sua
responsabilidade, na forma e nas condições definidas em ato normativo.
§ 2º Se o processo, retirado das dependências do Tribunal, não for devolvido dentro do prazo
prescrito no parágrafo anterior, o relator determinará a reconstituição das peças que entender
necessárias ao julgamento, que em caso de revelia da parte poderá ter por fundamento
exclusivamente as conclusões da unidade técnica.
Art. 166. Deferido o pedido, para o recebimento de cópias, a parte deverá apresentar comprovante do
recolhimento da importância correspondente ao ressarcimento dos custos.
§ 1º O pagamento será dispensado nas solicitações de interesse de órgão ou entidade da
administração pública federal, estadual ou municipal.
§ 2º Poderá ser fornecida cópia de processo, julgado ou não, mesmo de natureza sigilosa,
ressalvados os documentos e informações protegidos por sigilo fiscal, bancário, comercial ou outros
previstos em lei, a dirigente que comprove, de forma objetiva, a necessidade das informações para
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agora surge regulamentado por Resolução. 4 Importante notar que havia registro de
decisão judicial admitindo a possibilidade de vista fora do Tribunal de Contas pelo
interessado ou seu Advogado, desde que regularmente constituído.5
DIREITO DE VISTA
Interessante notar que embora os Tribunais de Contas do Brasil admitam o jus
postulandi, – capacidade da própria parte estar em juízo, sem a assistência de Advogado
–, a regulamentação em tela limitou o direito de retirada dos autos do processo aos
regularmente inscritos na OAB ou ocupantes do cargo de Procurador.
O relator da regulamentação, assinalou que
Com efeito, o pedido de retirada de processo pelo procurador, constituído pelo
responsável ou interessado envolvido na relação processual, terá que ser,
necessariamente, formulado por advogado, único a possuir a prerrogativa de postular
a requisição e retirada de processos das dependências do Tribunal, a exemplo do que
é feito nos Tribunais do Poder Judiciário. Além do que, só podem ser conhecidos e
providos quando o profissional estiver devidamente credenciado pelas partes, para em
nome destas postular seus direitos.6
A medida não impede a parte de conhecer e consultar o processo mas o pedido de
vista fora da repartição é restringido. A regra encontra-se em absoluta consonância com o
modelo judicial e não inibe de modo algum até o pedido de cópia pelo interessado ou
responsável.
A própria norma que definiu o direito de vista, com muita propriedade conceituou: 7
Art. 2º Para fins do disposto nesta Resolução considera-se:
I - parte no processo, o responsável e o interessado;
II - responsável, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, sujeita à
jurisdição do Tribunal;
III - interessado, aquele que tem reconhecida pelo Relator ou pelo Tribunal,
razão legítima para intervir no processo.
No âmbito do Tribunal de Contas da União o direito de retirada dos autos ficou assim
definido:
Art. 3º O requerimento para retirada de processo deverá ser formulado por
advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra o
defesa do órgão ou entidade federal, estadual ou municipal.
§ 3º Constará registro do caráter reservado das informações em cada cópia de processo de natureza
sigilosa a ser fornecida.
Art. 167. Não será concedida vista ou fornecida cópia de peças da etapa de instrução antes do seu
término, observado o disposto no § 2º do art. 160.
4
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Resolução nº 163, de 8 de outubro de 2003. Dispõe sobre a
retirada de processo das dependências do Tribunal de Contas da União.
5
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Administrativo. Mandado de Segurança. MS n.º 22.314-6.
Relatar: Ministro Octávio Gallotti, Brasília, DF, 05 de setembro de 1996. Diário da Justiça, 07 fev. de
1997, p. 01340.
6
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº TC-005.972/1998-1. Acórdão nº 1.512/2003 –
Plenário. Relator: Humberto Guimarães Souto. Brasília-DF, 08 de outubro de 2003. Diário Oficial da
União, de 21 out. 2003.
7
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Resolução nº 163/2003, art. 2º.
26
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qual não pese qualquer impedimento que restrinja o livre exercício da profissão e
ainda:
I - ser apresentado mediante formulário próprio, Anexo I deste normativo;
II - indicar o número do processo;
III - indicar a unidade da federação em que se pretende retirar os autos;
IV - estar acompanhado de cópia da carteira da OAB do procurador, frente e
verso, devidamente autenticada por servidor do Tribunal; e
V - estar acompanhado de procuração com a firma do outorgante devidamente
reconhecida, no caso de ainda não constar dos autos.
Parágrafo único. Fica dispensada a exigência do disposto no inciso V deste
artigo quando se tratar de procurador de entidade pública, no efetivo exercício do
cargo.
NEGATIVA DE VISTA FORA DA REPARTIÇÃO
Também difere do sistema ortodoxo judicial a negativa do pedido de vista fora da
repartição, devido as peculiaridades inerentes a atuação do controle externo, nos termos
a seguir:
Art. 5º O requerimento para retirada de processo das dependências do Tribunal
pode ser indeferido pelo relator quando:
I - se tratar de processo sigiloso ou que contenha documentos sigilosos, nos
termos do art. 7º, § 1º, item 1, da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994;
II - existirem nos autos documentos originais de difícil restauração e ocorrer
circunstância relevante que justifique a permanência dos autos no Tribunal, conforme
previsto no art. 7º, § 1º, item 2, da Lei nº 8.906, de 1994;
III - tratar-se de advogado que tenha deixado de devolver o respectivo processo
ou algum de seus volumes no prazo, e só o tenha feito após notificado, hipótese em
que não mais poderá retirá-lo até o seu encerramento, nos termos do art. 7º, § 1º, item
3, da Lei nº 8.906, de 1994;
IV - tratar-se de advogado que, após notificado, não devolveu ao Tribunal outros
autos por ele retirados;
V - tratar-se de advogado descredenciado ou suspenso, constante de relação
enviada ao Tribunal pela OAB ou divulgada na Internet;
VI - estiver o advogado impedido de exercer a advocacia, na forma da lei;
VII - existir motivo justo ou, estando o processo incluído em pauta, não houver
tempo suficiente para a retirada dos autos do âmbito do Tribunal.
O acréscimo inserido nos itens VI e VII, teve a seguinte justificativa:
... a inclusão do inciso VI possibilita a negativa do pedido de retirada de
processo, com base em motivo justo, cuja causa não esteja prevista nos incisos
anteriores permitindo, dessa forma, ao relator ponderar as circunstâncias afetas ao
caso concreto submetido a sua apreciação, hipótese esta prevista no artigo 163, § 2º,
do Regimento Interno. Acrescenta, ainda, que, na eventualidade de o processo estar
incluído em pauta, não haveria disponibilidade temporal para sua retirada pelo
advogado. Esse indeferimento, por sua vez, não comprometeria a ampla defesa e o
contraditório, princípios constitucionais assegurados à parte, uma vez que, na fase de
julgamento, não cabe a juntada aos autos de documentos novos, podendo a parte
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fazê-lo somente até o término da etapa de instrução, consoante prescreve o art. 160, §
1º, do Regimento Interno/TCU.
Relativamente à inclusão do inciso VII, a argumentação do Ministro para que
seja indeferido novo pedido de retirada de processo, quando o advogado, mesmo
após cientificado, continuar de posse de processo, baseia-se no fato de que a
autorização de nova retirada caracterizaria displicência por parte do relator.
SANÇÕES PECULIARES
A norma em tela, seguiu parcialmente as regras gerais que prevêem sanções para
os advogados faltosos no dever de devolução, mas acrescentou outras típicas do controle
externo da competência do Tribunal de Contas como a possibilidade de aplicação de
multa diretamente.
No relatório do Ministro Humberto Souto destacou aquela autoridade:
Com relação à realização de diligência ao procurador responsável, vale dizer
que a adoção dessa medida permite, em caso de não devolução dos autos no prazo
inicialmente fixado, sem justa causa, caracterizar descumprimento à diligência do
relator, situação que pode ensejar a aplicação de multa ao advogado infrator com base
no artigo 58, inciso IV, da Lei nº 8.443/92. Dessa forma, se houver retenção indevida
dos autos por advogado, o Tribunal poderá aplicar-lhe a pena, de modo a coibir a
reincidência da irregular retenção dos autos.
Propõe sugestão no sentido de incluir mais uma alínea ao inciso I do art. 11 nos
termos a seguir:
Art. 11. [...]
I - encaminhar diligência ao procurador responsável, notificando-o, pessoalmente
ou via postal, mediante Aviso de Recebimento (AR), para que restitua os autos no
prazo de 24 horas e apresente esclarecimentos sobre os motivos da não devolução do
prazo fixado inicialmente, sob pena de:
a) [...]
b) [...]
c) aplicação da multa prevista no artigo 58, inciso IV, da Lei nº 8.443/1992, em
razão do não atendimento, no prazo fixado, sem causa justificada, à diligência do
Relator.
Como justificativa ao acréscimo da alínea ―c‖ esclarece o Ministro que convém
consignar no texto do artigo 11 a pena prevista no artigo 58, inciso IV, da Lei nº
8.443/92, em caso de eventual descumprimento à diligência do Relator.
RESTAURAÇÃO DE AUTOS
Distanciando-se do modelo judicial, e de forma muito mais prática, a norma em tela
previu a possibilidade de antes da concessão da vista fora da repartição, o Relator
determinar a extração de cópia do processo 8. Desse modo além da possibilidade de
ordenar o procedimento de reconstituição dos autos, pode o Tribunal de Contas da União
8
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Resolução nº 163/2003, art. 5º [...] § 3º Em face da natureza
do processo e da matéria nele tratada, pode o relator determinar que a unidade técnica providencie
cópia integral do processo antes de entregá-lo ao advogado para retirada, devendo a mesma
permanecer na unidade até que o TCU profira deliberação definitiva sobre a qual não caiba mais
recurso.
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reter cópia que, na ausência de extravio ou devolução, seguirão o curso que teriam os
originais.
PRAZOS
Os prazos para retirada e para devolução de processo por parte do advogado
também tiveram contagem típica definida, guardando simetria com o modelo judicial,
sendo de cinco dias, contados da ciência do deferimento da solicitação, para a retirada e
igual prazo, contado da retirada, para a devolução.
Os prazos referidos não interferirão nos fixados para a citação ou audiência, ficando
condicionado o deferimento do pedido de retirada, nessa fase, a uma única vez.
Do mesmo modo que ocorre na esfera judicial, havendo mais de uma parte com
advogados diferentes, e sendo a elas comum o prazo para defesa, é permitida a retirada
somente em conjunto ou mediante prévio ajuste formulado por escrito nos autos.
CONCLUSÃO
Aos que não militam ordinariamente nos Tribunais de Contas é incompreensível a
resistência que têm com a retirada dos autos. A cautela com que se houve o Tribunal de Contas
da União e, por conseqüência todos os Tribunais de Contas que seguem o paradigma federal do
controle externo tem efetivamente dose de razoabilidade, decorrente da natureza dos processos e
as peculiaridades do Tribunal, ora inserido em feições judiciais, ora de natureza meramente
administrativa.
A aprovação da Resolução se faz em prosseguimento aos avanços que vem
imprimindo na Presidência do Tribunal de Contas da União, o Ministro-Presidente, Valmir
Campelo, e revela a consolidação de um ramo específico e muito particular da advocacia:
a advocacia perante os Tribunais de Contas.
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SUSTAÇÃO DE CONTRATOS ADMINISTRATIVOS PELOS TRIBUNAIS
DE CONTAS
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
Conselheiro do TCDF
Diversamente dos poderes que concedeu aos Tribunais de Contas, em relação a
atos administrativos em geral, o constituinte, ao tratar de contratos, definiu1 uma
sistemática que envolve essas Cortes, o Poder Legislativo e o Poder Executivo, numa
efetiva aplicação da teoria de freios e contrapesos ―cheks and balances‖.
Sustar um contrato significa retirar-lhe a eficácia, a produção dos efeitos financeiros
– pagamento, por exemplo – e executivos, – realização do objeto.
O inciso X e §§ 1º e 2º do art. 71, da Constituição Federal, ao referir-se à sustação
admitiu, implicitamente, que a mesma tivesse natureza cautelar ou definitiva.
Terá natureza meramente cautelar, quando determinada no curso de um processo,
visando resguardar o patrimônio público; natureza decisória definitiva quando for
anunciado pelo Tribunal de Contas, com a recomendação para adotar as medidas legais,
genericamente, ou implicar em providências incompatíveis com a continuidade do
contrato.
Tecnicamente, nesse último caso, estará o Tribunal de Contas determinando a
autoridade administrativa que rescinda ou anule o contrato. Na função de controle externo
é possível determinar à autoridade que adote as providências ―visando ao exato
cumprimento da Lei‖, expressão essa comum no âmbito das recomendações dos
Tribunais de Contas.
Assim, embora tecnicamente a recomendação para sustação em caráter definitivo
não seja adequada é possível entender que a competência constitucional para sustar
assuma tal conotação, hipótese em que terá por corolário lógico a anulação ou rescisão.
Ao receber a comunicação para sustar o contrato, cabe a autoridade administrativa optar
pela medida que melhor se harmonize com o interesse público. Divergindo da decisão, poderá
impetrar recurso perante o próprio Tribunal ou iniciar a ação judicial pertinente. Concordando,
verificará se a sustação deverá ter natureza cautelar, corrigindo/sanando o contrato, ou definitiva,
rescindindo ou anulando-o.
a) o Tribunal de Contas não pode sustar contrato, mas lhe é implícito o poder de
determinar à Administração que o faça
O ordenamento jurídico brasileiro, formado pela Constituição e lições do Supremo
Tribunal Federal, com extrema parcimônia, harmonizou o primado do respeito ao ato
jurídico perfeito com a secular discussão acerca dos efeitos do ato ilegal, admitindo a
competência do controle externo para buscar inicialmente que a própria administração
suste o contrato, observando-se, é claro, a legislação pertinente. Note-se que
determinação à sustação não é rescisão, mas apenas ato cautelar impeditivo da
1
No início do século, ao tempo do registro prévio, os contratos eram ―julgados‖ pelo Tribunal de
Contas da União. BRASIL. Decreto nº 2.511, de 20 de dezembro de 1911. Regula a Tomada de
Contas ao governo pelo Congresso Nacional. Coleção de Leis do Brasil 1911, v. 1, p. 80, c. 1, art. 5º.
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consumação da despesa ou do fato gerador de pagamento (execução). A autoridade que
recebe a comunicação é que avalia os efeitos da sustação na vida do contrato.
Essa comunicação se faz, como regra, após o atendimento do princípio do
contraditório. Embora inexista dispositivo a respeito, parece ser essa a única
possibilidade, porque a sustação do contrato afetará obrigações contraídas perante
terceiros, muitas vezes não jurisdicionados aos Tribunais de Contas, com os inerentes
consectários2. Entre esses, cabe apenas lembrar que, na atualidade, a anulação do
contrato e até a sua rescisão, mesmo que seja por motivo de interesse público, obrigam a
Administração Pública a observar o princípio do contraditório e da ampla defesa3.
Muito se tem debatido se o Tribunal de Contas deve originariamente assegurar o
contraditório ao contratado, conforme o caso, ou se esse dever compete apenas ao órgão
jurisdicionado que recebe a determinação para sustar, anular ou rescindir o contrato.
Após o advento da Lei nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999, com mais ênfase, parece
prevalecer o primeiro entendimento, ou seja, deve o próprio Tribunal assegurar a ampla
defesa e o contraditório. Desse modo, se analisa o contrato, havendo indícios que
possam levar a nulidade, deve o contratado também ser chamado ao processo, pela
Corte de Contas.
Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, sintetizado na
seguinte ementa:
EMENTA: I. Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art.
71, IX e §§ 1º e 2º). O Tribunal de Contas da União - embora não tenha poder para
anular ou sustar contratos administrativos - tem competência, conforme o art. 71, IX,
para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se
for o caso, da licitação de que se originou. II. Tribunal de Contas: processo de
representação fundado em invalidade de contrato administrativo: incidência das
garantias do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, que impõem
assegurar aos interessados, a começar do particular contratante, a ciência de sua
instauração e as intervenções cabíveis. Decisão pelo TCU de um processo de
representação, do que resultou injunção à autarquia para anular licitação e o contrato
já celebrado e em começo de execução com a licitante vencedora, sem que a essa
sequer se desse ciência de sua instauração: nulidade. Os mais elementares corolários
da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa são a ciência dada ao
interessado da instauração do processo e a oportunidade de se manifestar e produzir
ou requerer a produção de provas; de outro lado, se se impõe a garantia do devido
processo legal aos procedimentos administrativos comuns, a fortiori, é irrecusável que
a ela há de submeter-se o desempenho de todas as funções de controle do Tribunal
de Contas, de colorido quase - jurisdicional. A incidência imediata das garantias
constitucionais referidas dispensariam previsão legal expressa de audiência dos
interessados; de qualquer modo, nada exclui os procedimentos do Tribunal de Contas
da aplicação subsidiária da lei geral de processo administrativo federal (Lei nº
9.784/99), que assegura aos administrados, entre outros, o direito a "ter ciência da
tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter
vista dos autos (art. 3º, II), formular alegações e apresentar documentos antes da
decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente". A
oportunidade de defesa assegurada ao interessado há de ser prévia à decisão, não
2
No mesmo sentido manifesta-se a doutrina: amparado em José Nilo de Castro: SUNDFELD, Carlos
Ari. Pode o Legislativo sustar contrato administrativo (CF, art. 71, §1°) sem a prévia decretação da
ilegalidade pelo Tribunal de Contas? Informativo de licitações e contratos, nº 29, p. 488-490, jul. 1996.
3
Quando a nulidade é da licitação, essa induz à do contrato, e também deve ser garantido o direito
de ampla defesa e do contraditório, conforme art. 49, caput e §§ 2° e 3°, da Lei nº 8.666/93.
31
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lhe suprindo a falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível
é o de reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão4.
Não se deve olvidar, que há entendimento, em linha mais ortodoxa, no sentido de
que atos absolutamente nulos prescindem de ampla defesa5.
O entendimento mais consentâneo com o novo ordenamento jurídico, porém, é o
retratado no acórdão transcrito, fato que deve obrigar os Tribunais de Contas à revisão de
alguns procedimentos. De fato, a jurisprudência referida como mais ortodoxa não analisou
a competência do Tribunal de Contas, nem se contextualizou ao tema contratos e ao
advento da Lei nº 9.784/99, como faz o processo cuja ementa de acórdão foi transcrita.
b) se a Administração Pública não atender a recomendação, o Tribunal de Contas não tem
poder para sustar diretamente
Entre a determinação do Tribunal de Contas e a promulgação do decreto legislativo que
susta o contrato, está a administração obrigada a deixar de executar ou pagar o contrato?
Certamente não, porque a decisão do Tribunal de Contas não é vinculativa neste
caso. Somente o decreto legislativo é que obriga o agente público. Nessa linha de
entendimento também é o escólio de Eros Roberto Grau6.
c) diante da recusa da Administração Pública, o Tribunal de Contas deverá comunicar a
recalcitrância ao Poder Legislativo, o qual tem a prerrogativa de sustar o contrato
diretamente
Efetivamente, a competência para sustar contratos não integra o elenco daquelas
definidas para o Poder Legislativo na Constituição Federal. Tem, porém, o direito-dever
de exercê-la, tão somente, após a recusa do órgão que recebe a recomendação do
Tribunal de Contas. Não tem, desse modo, competência originária para o exame de
contratos, nem pode prescindir do formal exame técnico do Tribunal de Contas, nem a
mesma subsistirá se não houver recusa. Confirma-se aí, mais uma vez, que o Tribunal de
Contas não é órgão auxiliar do Poder Legislativo, mas, autônomo, na dicção do Supremo
Tribunal Federal, e auxilia a função de controle do Congresso Nacional7.
Ensina Carlos Ari Sundfeld, com a argumentação lógica que o destaca, que
a fiscalização da regularidade dos contratos administrativos é tarefa do Tribunal
de Contas, a quem compete - de modo exclusivo - determinar, ao órgão ou entidade, a
adoção de providências para a regularização da despesa. Somente após o
esgotamento da ação da Corte de Contas, com a caracterização da ilegalidade não
corrigida, é que o legislativo poderá agir, sustando o contrato irregular8.
4
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 23550/DF. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 04 de
abril de 2001. Diário da Justiça, 31.10.01, p. 00006.
5
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 224283/SP. Relator: Ministra Ellen Gracie. Brasília, 11 de
setembro de 2001. Diário da Justiça, 11.10.01.
6
GRAU, Eros Roberto. Tribunal de contas - decisão - eficácia. Parecer. Revista de Direito
Administrativo, v. 210, out./dez. 1997, p. 351-356.
7
Considerando ilegal a sustação direta pelo Poder Legislativo, sem a participação do Tribunal de
Contas: São Paulo. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Administrativo. Apelação nº
008.825.5/1-SP. Relator: Desembargador Antônio Villen. São Paulo, 20 de janeiro de 1998.
Informativo de licitações e contratos, nº 48, p. 166-167, fev. 1998.
8
SUNDFELD, Carlos Ari. Pode o Legislativo sustar contrato administrativo (CF, art. 71, §1°) sem a
prévia decretação da ilegalidade pelo Tribunal de Contas ?
32
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Lembra, a propósito, que José Afonso da Silva obtempera ser esse controle de
natureza política, mas sujeito à prévia apreciação técnico-administrativa do Tribunal de
Contas.
d) o ato de sustação pelo Poder Legislativo independe de nova e prévia comunicação,
porque essa já foi feita pelo Tribunal de Contas e não acatada pela Administração Pública
Por esse motivo, ao solicitar a sustação ao Poder Legislativo deve o Tribunal de Contas
remeter cópia da correspondência que foi enviada anteriormente à Administração Pública,
recomendando a sustação do contrato, posto que é um dos requisitos indispensáveis ao exercício
da competência daquele.
Quanto ao não atendimento da recomendação de sustação, poderá esse ser
provado:
pela manifestação escrita da autoridade requerida;
pela prática de atos incompatíveis com o acatamento;
por provas coligidas pela inspeção ordenada pelo Tribunal de Contas; ou
pela simples afirmação do Tribunal de Contas ao Poder Legislativo.9
e) simultaneamente ao ato de sustação, cabe ao Poder Legislativo “solicitar, de imediato,
ao Poder Executivo as medidas cabíveis”
A Constituição Federal coloca em seqüência à comunicação dirigida pelo Tribunal de
Contas ao Poder Legislativo, visando sustar o contrato, a solicitação desse ao Poder
Executivo para adoção de medidas cabíveis. Que medidas serão estas? Seriam as de
sustação? Óbvio que não, vez que, pelo próprio sentido lógico, descabem repeti-las.
Considerando que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário também podem firmar
contratos administrativos, como explicar que a Constituição Federal tenha se referido à
solicitação de medidas cabíveis apenas ao Poder Executivo? À primeira vista, a restrição
ao Poder Executivo parece indicar que o Tribunal de Contas só estaria cuidando do não
atendimento da determinação pelo Poder Executivo. Ora, se pode haver recalcitrância por
parte do executivo, também poderá ocorrer por parte dos demais poderes. Ademais, a
expressão medidas cabíveis, aqui requeridas, não se refere à sustação do contrato pelo
jurisdicionado, pois a norma superou essa etapa e agora cuida do não atendimento.
As ―medidas cabíveis‖ aqui referidas, e o fato de serem dirigidas apenas ao Poder
Executivo, decorrem de que, embora os três poderes e os órgãos autônomos como o
Ministério Público e o Tribunal de Contas possam firmar contrato, fazem-no em nome do
ente da esfera de governo a que se vinculam. Assim, o Superior Tribunal de Justiça, por
exemplo, o faz em nome da União, pessoa jurídica correspondente; a Assembléia
Legislativa de um Estado, em nome desse; a Secretaria de Obras de um Município, em
nome do Município. Por isso, é indispensável que, por meio do órgão jurídico encarregado
da representação judicial da unidade, a entidade jurídica esteja apta a adotar as medidas
complementares, como a prestação de contas do contrato, as ações de indenização, o
arresto de bens, a assunção da obra no estado em que se encontra10. Acresce ainda que
9
Consultar FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Jurisdição e
Competência. Belo Horizonte : Fórum. 2003. Subtítulo 17.3.2.2.3., Capítulo II, sobre a prova de fatos
negativos.
10
Consultar: Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
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embora os três poderes e órgãos autônomos tenham competência para gerir recursos, as
medidas cabíveis para defesa da Fazenda são titularizadas stricto senso no Poder
Executivo.
f) o Poder Legislativo tem o prazo improrrogável de noventa dias para efetivar o ato de
sustação e solicitar as medidas cabíveis, simultaneamente
O prazo, exageradamente longo, especialmente se estiver subjacente grave lesão
às finanças públicas - fato que justificaria o ato extremo da sustação -, não é em verdade,
na prática, de apenas 90 dias, vez que são contados na forma do regimento interno das
casas parlamentares. Contudo esse entendimento, não é o mais correto, vez que o
destinatário do prazo é o Tribunal de Contas. Assim, embora aceitável em outros casos
que o prazo seja contado na forma regimental, neste, especificamente, não prevalece
aquela regra, contando-se o prazo dia a dia, tendo por termo inicial, dies a quo, a data de
recebimento pelo respectivo poder.
g) decorrido esse prazo sem deliberação, o Tribunal de Contas decidirá a respeito
Com esse comando, a norma desloca para o Tribunal de Contas a competência para
sustar contrato, talvez muito tardiamente, numa tentativa de estabelecer um sistema de
freios e contrapesos.
Decidirá a respeito da sustação - que o Poder Legislativo não decidiu - e também
das medidas que cabiam ao Poder Executivo adotar e não adotou.
h) é implícita a competência do Poder Legislativo examinar a impugnação
E, se o Poder Legislativo decidir que o contrato não padece dos vícios apontados pelo
Tribunal de Contas? Neste caso, a competência do Tribunal de Contas para sustar não é
reestabelecida porque o constituinte só permitiu o retorno da competência diante da omissão,
fruição in albis do prazo.
i) a sustação deve submeter-se ao princípio da legalidade
É evidente que o exercício da competência não pode se concretizar com a ofensa às
demais garantias do ordenamento jurídico.
Assim, a sustação cautelar ou definitiva não pode afetar a garantia constitucional do
equilíbrio econômico-financeiro que tem como termo a quo, ou seja, inicial, a data da proposta 11.
Tal garantia só não prospera se provado que a conduta dolosa do contratado consistiu na
elevação arbitrária dos preços12.
Se a sustação tiver natureza cautelar e implicar o retardamento da execução, o ato
que altera o prazo deve ser justificado e publicado;13 se implicar em desmobilização, o
Diário Oficial da União, 22.06.93, art. 80.
11
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado,
1988, art. 37, inciso XXI.
12
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
Diário Oficial da União, 22.10.1993, art. 96, inciso I.
13
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
Diário Oficial da União, 22.10.1993, art. 40, inciso X c/c art. 78, inciso XVI.
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pagamento do custo correspondente para o contratado, nos termos previstos no edital 14;
se tiver natureza definitiva, as garantias do art. 78, inc. XIV e XV e 79, da Lei nº 8.666/93.
Dada a complexidade de que se reveste a sustação de contrato e seus efeitos na órbita
jurídica e econômica, o exercício dessa competência deve ser concretizada com extrema
parcimônia, avaliando-se os efeitos decorrentes para o erário e a sociedade.
Conclusão
O fortalecimento das atividades dos Tribunais de Contas fez exsurgir a competência
para sustação de contratos administrativos que deve ser exercitada nos termos da
Constituição Federal e das leis em vigor.
14
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
Diário Oficial da União, 22.10.1993, art. 8º.
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A ALIENAÇÃO E USO DAS
TERRAS PÚBLICAS:
UMA VISÃO DO CONTROLE EXTERNO
Márcia Ferreira Cunha Farias
Procuradora-Geral do Ministério Público do TCDF
1. Introdução; 2. Patrimônio público; 2.1. O conceito de patrimônio público na história; 2.2. O
conceito de patrimônio público no direito comparado; 2.2.1. Sistemas nos quais existe a noção de um
domínio público submetido a regras especiais; 2.2.2. Sistemas nos quais não existe a noção de um
domínio público submetido a regras especiais; 3. Bens públicos no direito brasileiro; 4. Moradia,
propriedade e posse; 5. Alienação e uso das terras públicas: uma visão do controle externo.
1. INTRODUÇÃO
A estabilidade social tem como um de seus pressupostos a distribuição do território
nacional dentre seus habitantes, por meio do instituto da propriedade. A propriedade de
sua moradia é uma das expressões máximas da cidadania do homem. O direito à
moradia, insculpido na Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional nº 26/00,
conduz ao direito de propriedade mas não o pressupõe, forçosamente, pois que é
possível habitar um imóvel sem dele ser proprietário. A posse, albergada no direito
positivo, ocorre também em relação aos imóveis públicos, pertencentes ao domínio do
Estado. Todos querem ter a posse ou a propriedade de imóvel para moradia, sendo
humilhante a expressão sem teto, que quase equivale a sem nada. Quem não tem
moradia fixa não tem acesso à educação, mal tem acesso à saúde.
Neste colóquio, não há a finalidade de fazer uma abordagem sócio-cultural dos
direitos constitucionais de posse, propriedade e de moradia; objetiva-se apenas focar uma
visão jurídica desses conceitos, mais especificamente em relação à propriedade
imobiliária do Estado; sua boa gestão; e o modo como, dentro do direito positivo e na
visão sistemática do Direito, pode o Poder Público contribuir para o ordenamento
territorial, a diminuição do déficit de moradias, e o assentamento da população de baixa
renda no campo e na cidade.
Busca-se, especificamente, demonstrar quais institutos jurídicos devem ser
empregados na alienação e na outorga de uso de bens imóveis públicos, e quais não
devem ser utilizados. Discorrer-se-á brevemente sobre o domínio público no direito
comparado e no direito brasileiro para referenciar o controle dos atos de alienação e
outorga de uso de imóveis públicos, sobretudo o controle efetuado pelo Tribunal de
Contas.
2. PATRIMÔNIO PÚBLICO
2.1. O conceito de patrimônio público na história
Interessa, de início, portanto, compreender a noção de patrimônio público.
O surgimento do patrimônio público está substancialmente ligado à construção do
Estado. O patrimônio público teve grande importância na compreensão do conceito de
Estado, diante da admissão progressiva de uma separação entre os bens da Coroa e os
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bens pessoais do soberano. Os bens da Coroa, apesar de pertencerem também ao
soberano, eram inalienáveis porque ligados a uma entidade, um princípio: o Reino, ou o
Estado, do qual cada monarca não era mais que uma encarnação temporária.
No Direito francês, a regra da inalienabilidade, conceituada desde o século XIV, foi
claramente formulada em norma do século XVI e considerada, a partir de então, como lei
fundamental do Reino. Em agosto de 1667, o princípio da imprescritibilidade foi instituído
por ordenação.
Na era moderna, o patrimônio público do Estado sofreu, gradativamente, a
intervenção estatal e a intervenção da sociedade em geral. O número crescente de
missões e de responsabilidades estatais demandavam um patrimônio público, inclusive
imobiliário, também crescente.
Na atualidade, o desenvolvimento do patrimônio estatal tende a desacelerar.
Distinguem-se dois aspectos.
De um lado, as entidades públicas continuam a investir em seu patrimônio e, assim,
a se dotar de bens suplementares ou de apoio à sua atuação (imóveis, equipamentos de
transporte, patrimônio cultural).
Em alguns setores, ao contrário, o patrimônio do Estado tende a diminuir. É o que
ocorreu e ocorre com as privatizações e os casos em que a atividade da Administração
Direta foi reduzida, restando ociosos seus bens.
2.2. O conceito de patrimônio público no direito comparado
Como situam-se os patrimônios do Estado no direito comparado?
Veremos que, em todos os sistemas jurídicos, existem traços, mais ou menos
acentuados, de singularidade do direito do domínio público. Assim, o domínio público não
é jamais inteiramente submetido ao direito comum, mesmo nos sistemas em que, em
princípio, seu regime não é específico.
E por que é assim?
Por várias razões.
Em alguns casos, devido à origem histórica do patrimônio público, notadamente a
seus liames com o patrimônio pessoal do monarca.
Em outros casos, pelo fato de que, por sua função, certos bens públicos são de
natureza tal que não podem ser tratados como os bens privados. É o caso dos bens de
uso comum do povo: dos espaços públicos, das rodovias, das praças, dos rios, do espaço
aéreo etc.
Podemos então separar os sistemas jurídicos em dois grandes grupos: a) sistemas
nos quais existe a noção de um domínio público submetido a regras especiais; e b)
sistemas em que não existe essa noção.
2.2.1. Sistemas nos quais existe a noção de um domínio público submetido a regras especiais
Neste primeiro grupo, enquadram-se duas situações.
1ºs - Há duas situações inseridas nesta categoria.
1ª - Os bens da Administração acham-se divididos em bens do domínio público,
submetidos ao direito público; e bens do domínio privado, submetidos, em princípio, ao
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direito comum. É o que encontramos no Direito francês, no espanhol, no belga, no grego,
no marroquino.
2ª - Existem outros sistemas nos quais o conceito de domínio público se inscreve
dentro de uma classificação mais complexa de bens da administração.
É o caso do direito helvético, que classifica os bens em três categorias:
bens de uso comum do povo;
bens afetados à realização de um interesse público especial, que não podem ser
utilizados pelo particular senão através de uma atividade administrativa (como é o
caso dos hospitais, das escolas, das estações de ônibus e de trens etc);
bens dominicais, que constituem o patrimônio de mercado do Estado.
Vê-se que é nessa classificação que também se insere o domínio público no Direito
brasileiro.
Em tais sistemas, como no brasileiro e no helvético, em princípio, os bens públicos
que não são afetados a uso público regem-se pelo direito privado. Mas o que se verifica é
que essa submissão não é absoluta. Longe disso: a legislação, ou princípios de direito
público não escritos, interferem com freqüência nessa gestão.
Por exemplo, no direito grego, os contratos que tocam o patrimônio público nunca
são puramente regidos pelo direito privado.
No direito belga, o artigo 537 do Código Civil permite a submissão de todos os bens
púbicos a regras especiais.
No direito brasileiro, a gestão dos bens públicos de uso comum do povo e de uso
especial – bens fora do comércio, portanto, é regida pelas características da
inalienabilidade; e, em decorrência desta, da imprescritibilidade, da impenhorabilidade e
da impossibilidade de oneração.
A gestão do patrimônio comercial do Estado brasileiro submete-se ao princípio
constitucional da licitação pública.
2.2.2. Sistemas nos quais não existe a noção de um domínio público submetido a regras especiais
Analisam-se agora os sistemas jurídicos nos quais não há uma noção de domínio
público submetido, em essência, a regras especiais.
Aqui também podem-se vislumbrar dois tipos de sistemas.
Em primeiro lugar, há os que consideram que, em princípio e de maneira geral, a
Administração está submetida às mesmas regras que os particulares.
No common law, o direito dos bens públicos não é específico, e o conceito de
domínio público não é conhecido.
Mas há sistemas que distinguem entre o direito público e o direito privado, não
admitindo a submissão da Administração ao direito privado, mas nos quais considera-se
que os bens imóveis das entidades públicas não são, em sua natureza, diferentes dos
bens particulares, motivo pelo qual, em princípio, não se submetem ao direito público. É o
caso do direito alemão.
Dito isso, é bom lembrar que esses sistemas, também, confirmam que os bens
públicos não são completamente submetidos ao direito comum, pois há sempre regras
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especiais que se aplicam ao menos a alguns bens públicos, particularidade devida às
características funcionais ou simbólicas desses bens.
Por exemplo, no direito inglês, o princípio da submissão dos bens públicos ao direito
comum apresenta exceção considerável, que concerne os bens da Coroa. Esses bens,
que constituem, na realidade, uma grande parte dos bens do Estado, não estão
submetidos ao direito comum. Os monumentos históricos pertencentes ao poder público
não são submetidos ao direito comum, as obras feitas nas terras pertencentes à Coroa
não estão sujeitas à legislação de urbanismo etc. Em matéria imobiliária, como em outros
setores, a Coroa não se submete à legislação salvo se a lei expressamente o declarar.
No direito alemão, a despeito do fato de a gestão imobiliária ser regida pelo direito
comum, regras de direito público provocam, com freqüência, interferências. Hartmut
Maurer1 dá-nos um exemplo: se um partido político pretende usar um imóvel municipal, o
contrato de locação será contrato de direito privado, mas a decisão de autorizar ou não o
uso tem caráter de direito público e é regida por princípios de direito público.
3. BENS PÚBLICOS NO DIREITO BRASILEIRO
Como vimos, então, o direito brasileiro classifica os bens públicos em duas grandes
categorias:
- bens do patrimônio indisponível, que são os bens de uso comum do povo e os
bens de uso especial e
- bens do patrimônio disponível, que são os bens dominicais, bens incluídos no
comércio jurídico de direito privado.
O uso dos bens públicos no sistema jurídico brasileiro deve dar-se mediante
modalidades previstas no direito administrativo. Institutos como o comodato e a locação
devem ser evitados.
Quais são, então, as formas de alienação e de uso de terras públicas?
As formas de alienação de bens públicos são:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
venda
doação
dação em pagamento
permuta
investidura
legitimação de posse
As formas de uso privativo de bens públicos imóveis são:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
1
enfiteuse
cessão de uso (entre pessoas jurídicas de direito público)
autorização de uso
permissão de uso simples
permissão de uso qualificada
concessão de uso
concessão de direito real de uso
concessão de domínio – artigo 188, § 1º da CF
MAURER, Hartmut. Elementos de direito administrativo alemão. Porto Alegre: S.A. Fabris. 2001.
39
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4. MORADIA, PROPRIEDADE E POSSE
Feitas essas considerações, de ordem teórica, sobre o patrimônio público e sua
gestão, vamos tratar de moradia, propriedade e posse.
O direito de propriedade é condutor do direito de liberdade. Complementar ao direito
de propriedade é o direito de moradia, inscrito na Constituição Federal pela Emenda
Constitucional nº 26, de 2000, como direito social. A moradia é o asilo inviolável do
indivíduo (art. 5º, inciso XI).
A Declaração de Vancouver, enunciada pela Conferência das Nações Unidas sobre
os Assentamentos Humanos, em junho de 1976, em seu Princípio Geral nº 10, assim
pugnava, ao lembrar a função social da propriedade e incitar a distribuição justa de
moradia e propriedade:
A terra é um dos elementos fundamentais dos assentamentos humanos. Todo
Estado tem direito a tomar as medidas necessárias para manter sob fiscalização
pública o uso, a propriedade, a disposição e a reserva de terras. Todo Estado tem
direito a planejar e administrar a utilização do solo, que é um dos seus recursos mais
importantes, de maneira que os crescimentos dos centros populacionais tanto urbanos
como rurais se baseiem num plano amplo de utilização do solo. Essas medidas devem
assegurar a realização dos objetivos básicos da reforma social e econômica para cada
nação, de conformidade com o seu sistema e suas leis de propriedade da terra 2.
De igual modo, a Segunda Conferência das Nações Unidas para Moradia, realizada
entre 3 e 14 de junho de 1996, em Istambul, assim sintetiza, no preâmbulo de seu
Relatório:
(...)
2. The purpose of the second United Nations Conference on Human Settlements
(Habitat II) is to address two themes of equal global importance: 'Adequate shelter for
all' and 'Sustainable human settlements development in an urbanizing world'. Human
beings are at the centre of concerns for sustainable development, including adequate
shelter for all and sustainable human settlements, and they are entitled to a healthy
and productive life in harmony with nature.
3. As to the first theme, a large segment of the world's population lacks shelter
and sanitation, particularly in developing countries. We recognize that access to safe
and healthy shelter and basic services is essential to a person's physical,
psychological, social and economic well-being and should be a fundamental part of our
urgent actions for the more than one billion people without decent living conditions. Our
objective is to achieve adequate shelter for all, especially the deprived urban and rural
poor, through an enabling approach to the development and improvement of shelter
that is environmentally sound3.
Com efeito, se é possível não ser proprietário e, ainda assim, embora precariamente,
exercer a cidadania, o mesmo não se pode afirmar em relação à moradia. É preciso que o
cidadão tenha moradia fixa, endereço certo.
No Distrito Federal, o direito de moradia regula-se, em primeiro lugar, mediante o
Capítulo III do Título VII da Lei Orgânica do Distrito Federal. Verifica-se, dos artigos 327 a
2
Apud LIRA, Ricardo Pereira. O uso do solo urbano e o seu controle (Alguns Aspectos do Projeto de Lei Federal
nº 775/83). In: Revista de Direito Administrativo, out./dez. 1983, p. 28.
3
Habitat Agenda and Istanbul Declaration. Nova Iorque: Departamento de Informações Públicas das Nações
Unidas, p. 12 e 13.
40
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331 da LODF, a relevância dos planos diretores de ordenamento territorial e local, que
devem ser seguidos à risca pelo Poder Público. Dispõe o artigo 328 que a política
habitacional do Distrito Federal será orientada em consonância com os planos diretores
de ordenamento territorial e locais, especialmente quanto:
- à oferta de lotes com infra-estrutura básica;
ao incentivo para o desenvolvimento de tecnologias de construção de baixo custo,
adequadas às condições urbana e rural;
à implementação de sistema de planejamento para acompanhamento e avaliação
de programas habitacionais;
ao atendimento prioritário às comunidades localizadas em áreas de maior
concentração da população de baixa renda, garantido o financiamento para
habitação;
ao estímulo e incentivo à formação de cooperativas de habitação popular;
à construção de residências e à execução de programas de assentamento em
áreas com oferta de emprego, bem como ao estímulo da oferta a programas já
implantados;
ao aumento da oferta de áreas destinadas à construção habitacional.
5. ALIENAÇÃO E USO DAS TERRAS PÚBLICAS: UMA VISÃO DO CONTROLE EXTERNO
Chegamos agora ao título de nosso colóquio: Alienação e uso das terras públicas:
uma visão do controle externo.
Cabe ao Tribunal de Contas, em auxílio técnico ao Poder Legislativo, o controle
externo da Administração Pública.
Compete ao Tribunal de Contas a fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial da Administração direta e indireta, quanto à legalidade,
legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas.
Os atos e contratos de uso de bens imóveis do Distrito Federal, assim como os
contratos de alienação desses bens, devem ser examinados pelo Tribunal de Contas,
levando em consideração todos os aspectos do controle elencados no artigo 70 da
Constituição Federal. Em se tratando de ato administrativo, o Tribunal assina prazo para
que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei,
se verificada ilegalidade, e susta, se não atendido, a execução do ato impugnado,
comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, ou à Câmara
Legislativa do Distrito Federal, no caso dessa unidade da federação (artigo 71, incisos IX
e X da CF e 78, incisos X e XI da Lei Orgânica do Distrito Federal). No caso de contrato,
contudo, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, ou pela
Câmara Legislativa, mas, se estes não o fizerem, no prazo de noventa dias, o Tribunal
decidirá a respeito (artigo 71, §§ 1º e 2º da CF e artigo 78, § 1º da LODF).
O controle exercido pelo Tribunal de Contas adquiriu grande relevo com a inserção,
no texto da Carta de 1988, do controle operacional. Ao realizar o controle operacional da
Administração Pública, o Tribunal de Contas está não apenas fiscalizando o ato ou o
contrato de uso de bem imóvel público, mas, em última análise, o próprio programa ou
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projeto de governo, a política urbana e a política rural de distribuição de terras e
assentamentos.
O Tribunal de Contas da União realiza auditoria de desempenho e avaliação de
programas dentro do conceito de auditoria operacional.4
Conceitualmente, contudo, embora a auditoria de desempenho seja ―termo dúbio
para uma classe de atividades de revisão predominantemente avaliativas (...), o termo
'auditoria de desempenho' é normalmente utilizado para demarcar a distinção entre esse
tipo de atividade de revisão governamental e a auditoria tradicional de um lado e a
avaliação de programas de outro.‖5
No Brasil, portanto, inexistindo a figura do avaliador de programas, essa avaliação é
realizada pelo Tribunal de Contas no âmbito de sua competência constitucional de
fiscalização operacional da atividade administrativa.
Daí resulta a grande importância do controle realizado pelos Tribunais de Contas na
Federação brasileira6.
Na França, a Constituição - artigo 47 - e o CJF (Código das Jurisdições Financeiras)
- artigo 1.111-2 determinam que o Tribunal de Contas assista o Governo e o Parlamento
no controle da execução das leis de finanças. Relevante notar, contudo, que a Corte de
Contas exerce papel também sobre a opinião pública, pois que publica, a cada ano, em
linguagem acessível, um relatório geral e relatórios especializados nos quais consigna os
ensinamentos advindos de suas observações.
Marco na Administração Pública francesa é a Lei Orgânica de 1º de agosto de 2001,
que modificou, profundamente, os métodos da administração e esclareceu a missão do
Tribunal de Contas.
Antes da Lei de 2001, a noção de bom emprego dos recursos públicos deixava
grande margem de apreciação à Corte de Contas. A Corte, então, criticava sempre a
organização, o funcionamento e os resultados da Administração mas inexistia referencial
comum concernente à qualidade da gestão pública. Ao qualificar a Corte de Contas uma
despesa como "elevada", ou um resultado como "fraco" ou "insuficiente", a Administração
indagava-lhe: "em relação a quê?".7
4
"Essa modalidade de auditoria baseia-se no princípio de que ao gestor público cabe o dever de prestar contas
de suas atividades à sociedade (accountability), não somente agindo com integridade, mas atendendo a critérios
de economicidade, eficiência e eficácia dos atos praticados. A auditoria operacional ocupa-se, portanto, da
avaliação de fatores relacionados à qualidade da gestão, e busca aferir até que ponto os administradores
públicos gerenciam os recursos sob sua responsabilidade com economia e eficiência, e se as atividades e os
programas implementados atingem os objetivos pretendidos e as metas esperadas." (BASTOS, Glória Maia
Merola da Costa. A Experiência do Tribunal de Contas da União em Auditoria Operacional e Avaliação de
Programas Governamentais. In: O Controle Externo e a Nova Administração Pública: Uma Visão Comparativa.
Brasília: Tribunal de Contas da União, 2002, p. 7 e 8).
5
BARZELAY, Michael. Instituições Centrais de Auditoria e Auditoria de Desempenho: Uma análise comparativa
das estratégias organizacionais na OCDE. In: O Controle Externo e a Nova Administração Pública: Uma Visão
Comparativa. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2002, p. 25 e 29.
6
Explica Eros Roberto GRAU: ―A expressão políticas públicas designa todas as atuações do Estado, cobrindo
todas as formas de intervenção do poder público na vida social. E de tal forma isso se institucionaliza que o
próprio direito, neste quadro, passa a manifestar-se como uma política pública – o direito é também, ele próprio,
uma política pública.‖ (GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. São Paulo: Malheiros,
2000, p. 22).
7
Palestra proferida em 14.07.02, por Rémi FRENTZ, Procurador do Ministério Público junto à Corte de Contas da
França, no III Congresso Internacional da Associação dos Membros do Ministério Público junto aos Tribunais de
Contas.
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Em elaboração desde 1999, a Lei Orgânica de 1º de agosto de 2001 tem por
objetivo restaurar as atribuições do Parlamento nos procedimentos orçamentários do
Estado e modernizar a gestão pública. Seu slogan é "passer d'une culture de moyens à
une culture de résultat".8
Assim sendo, a necessidade de desempenho reclama um controle que o possa
verificar, não apenas no aspecto de conferir se as obrigações formais previstas pela lei
foram satisfeitas, no papel, mas se os indicadores de resultado dos programas
fornecidos pelos Ministérios são confiáveis e precisos.
Por esse motivo a Lei Orgânica expressamente previu que a Corte de Contas
consagrará a cada ano parte de seu relatório sobre a execução orçamentária à
apreciação dos resultados dessa execução, relatório esse que deverá, notadamente,
analisar, por missão e por programa, a execução dos créditos.9
O cumprimento da nova lei exigirá adequações a serem procedidas pela Corte de
Contas francesa, a fim de preparar-se para analisar os resultados obtidos para cada
programa do Estado. Várias questões se impõem.
Em relação ao conteúdo do controle, indaga o Ministério Público de Contas francês:
a Corte (de Contas) deve abster-se de fazer uma análise sobre os objetivos
fixados, quando lhe parecem imprecisos, desarrazoados, contestáveis?
quais os métodos que serão empregados pela Corte para avaliar esses objetivos?
a verificação deverá basear-se na definição dos indicadores de resultado (da
Administração)?
A Corte poderá contestar as escolhas da Administração?
Propor indicadores que lhe pareçam mais pertinentes?
- como analisar se os sistemas de informação que alimentam os indicadores de
resultados foram corretamente concebidos e aplicados?
- como interpretar os resultados?
- como não se ater às análises quantitativas, puramente estatísticas, e manter, ao
mesmo tempo, uma abordagem qualitativa da despesa pública? Como articular esse
exercício com a missão geral de controle do bom emprego dos recursos públicos aqui
reportados e ocupar-se de uma parte importante do programa de trabalho do Corte?
No que diz respeito à organização desses controles, é de perguntar:
qual é o campo anual de intervenção? Cuida-se de examinar cada ano todos os
programas ou somente uma seleção, mediante um ritmo plurianual para o conjunto de
orçamento?
é necessário buscar estabelecerem-se comparações entre os programas do
Estado? Ou mesmo com os programas equivalentes de outras administrações
públicas francesas ou estrangeiras comparáveis?
a Corte procedia, tradicionalmente, ao controle da execução das leis de finanças ao
início do ano N + 1. O controle de resultado não exige uma intervenção contínua?
8
Ibdem.
9
Ibdem.
43
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como articular os trabalhos da Corte em matéria de desempenho com aqueles
conduzidos pelas inspeções genéricas ou com as próprias Administrações (uma
comissão interministerial de auditoria reunindo o corpo de inspeção e as
administrações foi enunciada)?
a Corte deve recorrer a peritos de acordo com as políticas públicas envolvidas?
Todos os novos métodos de trabalho elaborados e aplicados pela Corte de Contas
serão objeto de verificação por parte do Ministério Público que junto a ela atua: controla o
Ministério Público Especial, portanto, o órgão de controle.
No Brasil, a Lei Complementar nº 101, de 04.05.00 - Lei de Responsabilidade Fiscal
- promove semelhante reviravolta na Administração Pública e em seu controle.10
Defende-se, enfim, um vastíssimo campo de controle do Tribunal de Contas que
excede, por vezes, aquele reservado ao Poder Judiciário, ainda que sob a atual visão do
controle jurisdicional dos atos da Administração. Outrossim, o Tribunal de Contas age de
livre iniciativa, ou por provocação do Congresso Nacional (e das Assembléias Legislativas
e Câmara Legislativa, no caso do Distrito Federal). Pode, ainda, ser provocado por
denúncia de qualquer cidadão, nos termos de sua Lei Orgânica e de seu regimento
interno, ou pelo Ministério Público que perante ele oficia.
Nesse ponto, inovou o Ministério Público de Contas do Distrito Federal, no qual foi
criado Centro de Estudos Jurídicos que examina todos as normas jurídicas distritais
publicadas e representa ao Tribunal sobre sua constitucionalidade.11
Desde 1998, o Ministério Público ofereceu trinta e nove representações ao Tribunal
de Contas versando sobre inconstitucionalidade de leis distritais, ordinárias ou
complementares, que alienam ou outorgam o uso de bens imóveis distritais, mediante
variados instrumentos. A quase totalidade dessas representações já foi julgada pelo
Tribunal, a maioria reconhecendo a inconstitucionalidade das normas e alertando o Chefe
do Poder Executivo para o entendimento da Corte. Algumas dessas peças versam sobre
várias leis de idêntica natureza, referentes a terras públicas diversas, de forma que a
atuação do Tribunal de Contas e do Ministério Público atinge inúmeras normas, cuja
inconstitucionalidade não as habilita a preencher o essencial requisito da autorização
legislativa, exigido para as diversas formas de alienação e uso de bens imóveis públicos
por particulares.
Além desse mecanismo de controle orientador, referente à constitucionalidade de
leis, outros devem ser buscados.
Urge que o Poder Judiciário e o Tribunal de Contas, embora instâncias distintas,
busquem sintonia. No Distrito Federal, por vezes, quando um entende danoso o ato
praticado pela Administração ou por particular, assim não decide o outro.
Para atingir essa sintonia mínima, seria interessante que fossem realizados
seminários, estudos e debates com membros do Poder Judiciário e dos Tribunais de
Contas, especificamente a respeito da matéria.
Nesse propósito, o Ministério Público do Distrito Federal e o Ministério Público de
Contas do Distrito Federal firmaram, ato de colaboração, entre si e com a participação do
10
Deixaremos de incursionar neste tópico devido à sua complexidade, evitando-se assim, redirecionar o foco
deste estudo.
11
Instrução Normativa - IN/PG/MP Nº 01/02, de 25.03.02, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal de
04.04.02, p. 49.
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Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, do Ministério Público do
Trabalho, da Procuradoria Regional do Trabalho da 10ª Região e da Procuradoria da
República no Distrito Federal. O ato de colaboração tem por objeto, dentre outros fins, o
estabelecimento de linhas de atuação conjuntas entre os Ministérios Públicos envolvidos.
O papel dos órgãos de controle é essencial para que seja garantida a função social
da propriedade e para que as políticas urbanas e agrárias correspondam à justiça social.
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IMPRESCRITIBILIDADE DA AÇÃO DE
REGRESSO PREVISTA NO ART. 37, § 5 , DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL
Demóstenes Tres Albuquerque
Procurador do Ministério Público do TCDF
1. INTRODUÇÃO
Muito se tem debatido acerca do alcance da regra constitucional insculpida no § 5
do art. 37 da Constituição Federal, especialmente no que concerne à sua parte final. Nos
termos do citado dispositivo, a lei determinará os prazos prescricionais para ilícitos
praticados por agente público que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas
ações de ressarcimento.
Esta ressalva expressa prevista pelo constituinte originário tem levado diversos
autores que trataram do tema a concluir que as ações de regresso da Administração
Pública em desfavor do agente causador do prejuízo apurado em decorrência de ilícito
são imprescritíveis.
Todavia, a matéria está longe de representar uma uniformidade doutrinária e
jurisprudencial. No âmbito dos Tribunais de Contas, por exemplo, verifica-se que a
questão não está devidamente consolidada até o momento. A Corte de Contas Federal,
por exemplo, apresenta decisões, não poucas, que pugnam pela imprescritibilidade das
ações de regresso, recusando as alegações de prescrição sustentada pelas partes,
notadamente em processos de Tomada de Contas Especial.
Não é menos significativo, contudo, o número de decisões em que o E. TCU decidiu
pela possibilidade de prescrição do direito de agir do Estado para cobrar débito causados
por agentes públicos. Mesmo em relação a este entendimento (da prescritibilidade), a
situação também é conflituosa no sentido de se saber qual norma prescricional se aplicar.
Questiona-se acerca da possibilidade da aplicação da regra geral de prescrição
estabelecida pelo Código Civil. Debate-se, ainda, que melhor seria admitir-se o mesmo
prazo prescricional previsto para a cobrança de créditos contra o Estado, em nome do
princípio da igualdade.
Dentro da esfera de atuação do Tribunal de Contas do Distrito Federal a matéria
também vem sendo objeto de profícuos debates, tendo sido criado grupo de estudo com a
finalidade específica de analisar o tema.
O presente trabalho não tem a pretensão de esgotar o assunto. Busca, de forma
simples e em rápidas pinceladas, tão-somente, contribuir para o debate, a partir de
pareceres já exarados no âmbito da Corte de Contas Distrital.
2. A PRESCRIÇÃO COMO FATOR DE ESTABILIZAÇÃO SOCIAL
O Direito tem sido um dos grandes pilares do desenvolvimento da civilização ao
longo da história. Por meio da ordem jurídica previamente estabelecida, as expectativas
de conduta das pessoas inseridas em determinado tecido social podem ser mais
facilmente previstas, tornando o convívio intersubjetivo mais harmonioso.
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Desempenha o Direito, nesse contexto, importante papel de pacificação social, pois
busca estabelecer regras gerais de condutas a serem obedecidas pelos integrantes de
um determinado grupo de pessoas. Na sempre atual lição de Miguel Reale, "aos olhos do
homem comum o Direito é lei e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que
garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de
seus membros." (in Lições Preliminares de Direito. 19 a ed. Saraiva: São Paulo, 1991, p
1/2).
Para que a ordem jurídica consiga atingir de forma eficaz seu objetivo de
manutenção do convívio pacífico e harmonioso dos cidadãos por ela regidos, alguns
princípios basilares devem ser obedecidos. A estabilização das relações jurídicas
presentes no seio social é uma das formas de se assegurar a eficiência do Direito como
regulador das liberdades individuais.
Nesse contexto, ganha proeminência a segurança jurídica, princípio acolhido
implicitamente pela Carta Magna a partir de diversas regras constitucionais espalhadas
por todo o texto da Lei Maior. Tamanha sua importância que o constituinte vedou ao
legislador infraconstitucional a possibilidade de editar ato normativo que possa violar
direito adquirido, ato jurídico perfeito ou coisa julgada (art. 5 , inciso XXXVI), consagrando
tal regra como garantia fundamental da pessoa humana, imune, inclusive, à emenda
constitucional, consubstanciando-se em verdadeira cláusula pétrea.
Diversos fatores são essenciais para se alcançar a segurança jurídica e com ela a
tendência de estabilização das relações sociais, fundamental para a manutenção do
convívio das pessoas em comunidade. Dentre estes, um dos principais é o tempo, que
exerce papel de relevo no mundo jurídico.
É o passar do tempo, aliado à manutenção da situação jurídica existente, que
consolida as relações existentes dentro de determinado ordenamento. Isso permite que
as pessoas, diante de situações já sedimentadas, possam ter certo grau de certeza
acerca do que esperar frente a casos que lhes são colocados diuturnamente.
Todavia, o tempo somente ganha relevância jurídica no momento em que o próprio
ordenamento delimita sua função e estabelece as conseqüências que devem advir do
simples decurso do prazo previsto. Tem-se, então, o fator tempo como essencial para se
alcançar a segurança jurídica. Porém, é imprescindível que as normas delimitem
expressamente como o tempo irá agir no ordenamento.
Nesse diapasão, a prescrição é uma das principais conseqüências prevista pelo
Direito em decorrência do transcurso do tempo. Contudo, necessita, para ocorrer, estar
expressamente prevista em lei. Exatamente por implicar a perda de determinado direito,
pela inércia do titular, somente a norma jurídica pode estabelecer os casos e os prazos
prescricionais.
Não obstante, a existência de normas prevendo casos de prescrição para as mais
variadas hipóteses configura a regra no moderno sistema jurídico. Muito embora seja
inafastável a necessidade de lei para a prescrição, a exceção é exatamente a ausência de
regras estabelecendo sua incidência.
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TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL
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3. O ALCANCE DA
FEDERAL
IMPRESCRITIBILIDADE PREVISTA NO
§ 5º DO ART. 37
DA
CONSTITUIÇÃO
Na verdade, o tema objeto da presente discussão está relacionado com o instituto
da prescrição do direito da administração em obter a recomposição do erário, conforme se
mostrará a seguir.
Como é cediço, a prescrição só ocorre quando há lei que a estabeleça, uma vez que
trata de matéria de direito estrito. Celso Ribeiro Bastos, por exemplo, examinando o
assunto, conclui que "o que é certo é que a prescrição depende sempre da existência de
lei" (Curso de Direito Administrativo. Saraiva, 1994, p. 330).
Dessa feita, é comum a citação da prescrição qüinqüenal, em virtude desta
encontrar-se presente em muitos dispositivos que tratam da matéria, senão vejamos:
Este é o prazo prescricional para propositura de ações populares contra atos
lesivos ao patrimônio público, conforme dispõe o art. 21 da lei n.º 4.717, de 19.06.65;
da mesma forma, este também é o prazo prescricional de dívidas passivas da
Fazenda Pública (Dec. nº 20.910, de 06.01.32, art. 10; e Dec.-lei nº 4.597, de
19.08.42, art. 2º);
por sua vez, este é o prazo em que prescreve a ação correspondente ao direito de
pleitear a restituição de tributos pagos indevidamente (Código Tributário Nacional, art.
168 e 174);
e ainda é o prazo para a Administração anular seu atos inválidos dos quais hajam
decorrido efeitos favoráveis ao administrado, salvo comprovada má-fé, consoante
art. 54 da Lei nº 9.784, de 29.01.99, disciplinadora do processo administrativo.
Contudo, nos casos em que, por intermédio dos Tribunais de Contas, procura a
Administração se ressarcir de prejuízo causado por ilícito, inexiste a prescrição. O
legislador constituinte criou uma exceção à regra da prescritibilidade quando se trata do
direito de a Administração se ressarcir de prejuízos causados ao erário por ilícitos
praticados por qualquer agente, servidor ou não.
Isto é o que se depreende do disposto no art. 37, § 5º, da Carta Magna, in verbis:
A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer
agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas
ações de ressarcimento (grifou-se).
Em proveito do que ora se examina, Celso Ribeiro Bastos, comentando esse
dispositivo constitucional (in Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva, Tomo III, pág.
167), assim se manifestou:
No que tange aos danos civis, o propósito do texto é de tornar imprescritíveis as
ações visando ao ressarcimento do dano causado. É de lamentar-se a opção do
constituinte por essa exceção à regra da prescritibilidade, que é sempre encontrável
relativamente ao exercício de todos os direitos.
De forma semelhante, o Professor José Afonso da Silva (in Curso de Direito
Constitucional Positivo, 9ª ed. Malheiros, pág. 574) manifestou o seguinte entendimento
quanto ao referido dispositivo constitucional:
A prescritibilidade, como forma de perda da exigibilidade de direito, pela inércia
de seu titular, é um princípio geral do direito. Não será, pois, de estranhar que ocorram
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prescrições administrativas sob vários aspectos, quer quanto às pretensões de
interessados em face da Administração, quer quanto às desta em face de
administrados. Assim é especialmente em relação aos ilícitos administrativos. Se a
Administração não toma providências à sua apuração e à responsabilização do
agente, a sua inércia gera a perda do seu ius persequendi. É o princípio que consta do
art. 37, § 5º, que dispõe: A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos
praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário,
ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. Vê-se, porém, que há uma
ressalva ao princípio. Nem tudo prescreverá. Apenas a apuração e punição do
ilícito, não, porém, o direito da Administração ao ressarcimento, à indenização,
do prejuízo causado ao erário. É uma ressalva constitucional e, pois, inafastável,
mas, por certo, destoante dos princípios jurídicos, que não socorrem quem fica inerte
(dormientibus non sucurrit ius). Deu-se assim à Administração inerte o prêmio da
imprescritibilidade na hipótese considerada (grifou-se).
Esse também é o entendimento do eminente Conselheiro e Professor Dr. Jorge
Ulisses Jacoby, em "Tomada de Contas Especial", 2ª ed. Brasília Jurídica, in verbis:
A Constituição Federal colocou fora do campo de normatização da Lei o prazo
prescricional da ação de ressarcimento referente a prejuízos causados ao erário, só
podendo a lei estabelecer o prazo prescricional para os ilícitos, como tal podendo-se
entender os crimes;
(...) A TCE é um processo administrativo que objetiva quantificar um dano
causado ao erário e identificar a autoria, possuindo natureza preparatória da ação civil.
Sendo instrumental e acessória em relação à ação de reparação de danos, e
considerada pela jurisprudência como prejudicial de mérito em relação à ação civil,
deve seguir o mesmo prazo prescricional que essa ação. Logo, como desde a
Constituição Federal a ação de ressarcimento de danos causados ao erário
tornou-se imprescritível, a TCE não é mais alcançada pela prescrição. (grifou-se)
Discorrendo sobre tal imprescritibilidade, Pinto Ferreira, in Comentários à
Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 1990, v. 2, p. 396, categoricamente afirma
que:
A expressão agente é a palavra genérica, da qual a designação de servidor é
subdivisão ou espécie. O prefeito é um agente, embora sem ser servidor público.
A lei estabelecerá os prazos de prescrição. A lei ordinária, a que alude o
preceito, será de nível federal, estadual ou municipal, quando se tratar de prazos
prescricionais para ilícitos administrativos. Será federal nos casos de ilícito penal.
As ações de ressarcimento ou as ações de responsabilidade civil, contudo,
são imprescritíveis. Não se submetem ao disposto no art. 177 do CC, determinando
que as ações pessoais prescrevem em vinte anos e as ações reais em dez anos. Não
ocorrendo prescrição, o direito do Estado é permanente para reaver o que lhe for
ilicitamente subtraído. (grifou-se).
Na mesma trilha, porém com algumas críticas, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, in
Comentários à Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990, v. 1, p. 260,
assim discursa reconhecendo a imprescritibilidade das ações de ressarcimento:
Parecem deduzir-se duas regras deste texto mal redigido. Uma, concernente à
sanção pelo ilícito; outra, à reparação do prejuízo. Quanto ao primeiro aspecto, a
norma ―chove no molhado‖: prevê que a lei fixe os respectivos prazos prescricionais.
Quanto ao segundo, estabelece-se de forma tangente a imprescritibilidade das ações
visando ao ressarcimento dos prejuízos causados.
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A imprescritibilidade é sempre condenada pela doutrina, seja qual for seu
campo; entretanto, o constituinte demonstrou por ela um entusiasmo perverso e
vingativo (v. art. 5º, XLII e XLIV).
Trago ainda à baila o entendimento firmado pela Professora Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, em sua obra Direito Administrativo. 14ª ed. p. 695, lecionando que "são, contudo,
imprescritíveis, as ações de ressarcimento por danos causados por agente público, seja
ele servidor público ou não, conforme o estabelece o artigo 37, § 5º, da Constituição."
Dessome-se, portanto, que, em princípio, é imprescritível, por força do dispositivo
constitucional retrocitado, o direito da Administração de se ressarcir dos prejuízos a ela
causados, decorrentes de atos ilícitos, festejando, assim, os postulados da supremacia do
interesse público e da moralidade administrativa.
Nada obstante, algumas considerações devem ser trazidas à discussão a fim de se
delimitar, de forma mais precisa, o verdadeiro alcance da norma constitucional sob
comento.
Não se pode olvidar que a regra geral adotada no ordenamento jurídico é que todas
as pretensões estão sujeitas a prazos prescricionais, surgindo a imprescritibilidade como
preceito francamente de exceção. Isso, porque, conforme já salientado, a segurança
jurídica configura verdadeiro princípio norteador de todo o macrossistema jurídico, sendo
essencial para que o Direito possa exercer sua função de pacificação social.
É consabido que as exceções interpretam-se restritivamente, de modo que não
devem ser extraídas de interpretação forçada ou literal da norma. Exceções devem estar
contidas de forma clara e expressa no texto da lei, de forma a não se deixar qualquer
margem de dúvida acerca da intenção do preceito legal.
A fórmula "ressalvadas as ações de ressarcimento" parece claramente voltada a
desatrelar as ações de ressarcimento, de natureza civil, dos prazos prescricionais
previstos nas respectivas leis que estatuem as demais sanções, nas esferas
administrativa e/ou penal, decorrentes de ilícitos praticados pelo agente.
Com efeito, o que o Texto Constitucional quis foi afastar a possibilidade de que a
prescrição dos ilícitos administrativos e/ou penais tivessem necessária repercussão sobre
a esfera patrimonial, ou mais precisamente, sobre o direito de agir em regresso da
Administração Pública em face da responsabilidade civil decorrente de prejuízos
ocasionados pela conduta de agente público. Agente público tido aqui em sua concepção
mais ampla possível, pois o constituinte deixou claro que os ilícitos de que trata o
dispositivo são causados por agentes, servidores públicos ou não. Enfim, abrange todo
aquele que, de qualquer forma, exerce algum tipo de atribuição pública.
Nesse contexto, merece especial atenção a presença do termo "ilícitos", contido no
dispositivo constitucional. A lei não contém palavra inúteis ou menções supérfluas.
Quando as encontra, deve o intérprete voltar-se e rever sua interpretação.
O sentido que se dá à palavra "ilícitos" é deveras polêmico, podendo-se conceituálos, sob uma acepção mais abrangente, como sendo toda ação e omissão contrária ao
Direito.
Não obstante, parece mais consentâneo com os princípios constitucionais em
questão, entender que o significado da sobredita expressão reclama uma interpretação
mais restrita, não se podendo afastar o ato ilícito do dolo ou culpa do agente, visto que,
somente assim, poderia o ato praticado resultar em sanção administrativa e/ou penal, com
possíveis repercussões no âmbito civil.
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O fenômeno prescricional encontra-se intimamente jungido ao postulado
fundamental da segurança jurídica, princípio aliás, estampado no caput do artigo 5º da
Carta Magna, razão pela qual, quando o constituinte ressalva as ações de ressarcimento,
não o faz de forma absoluta, uma vez que essa possibilidade poderia comprometer o
valor da certeza jurídica. Não existem direitos ou valores absolutos, pois devem sempre
ser tomados dentro de uma circunstancialidade que os torna relativos.
Conclui-se, então, que a imprescritibilidade das ações de ressarcimento, de que trata
o § 5º do artigo 37 da Constituição Federal, deve ser considerada em seus devidos
termos, ou seja, apenas pode ser albergada quando o ilícito praticado pelo agente
ensejar, em tese, a aplicação de sanção na esfera administrativa e/ou penal e causar
prejuízo ao erário, repercutindo, também, na responsabilidade civil, entendida aqui como
fonte do direito de ressarcimento da Administração Pública.
É que somente nesta hipótese a ressalva contida na parte final da citada norma
constitucional ganha relevo jurídico. Imprescindível o destaque final para que se evidencie
que apenas a repercussão patrimonial do ilícito é imprescritível, não o sendo as demais
conseqüências do fato (administrativa e/ou penal) que terão seus prazos prescricionais
previstos em lei.
Nesse sentido, apenas os atos praticados que demonstrem ter o agente atuado com
culpa, em seu sentido lato, e que causarem prejuízo ao patrimônio público estão afetos à
imprescritibilidade. Pois, ausente o elemento culpa, não haveria responsabilidade de
natureza administrativa e/ou criminal a ser apurada e, portanto, desnecessária a edição
de norma para se prever a prescrição de pretensões punitivas do Estado. Somente se
prescreve o fato que pode gerar punições, que pressupõe dolo ou culpa do agente
público.
4. CONCLUSÃO
O Direito foi uma das grandes conquistas da humanidade e que permitiu a evolução
social do ser humano, possibilitando o convívio pacífico das pessoas, apesar das
diferenças individuais, das necessidades próprias e da escassez dos bens da vida frente
à crescente evolução dos interesses particulares.
Para que isso se tornasse possível, é imprescindível que os operadores do Direito
sedimentem e consolidem as relações jurídicas existentes dentro do tecido social. Ganha
a segurança jurídica status de verdadeiro direito fundamental do indivíduo, de forma a
conferir a certeza de que as normas previamente estabelecidas serão respeitadas.
Nesse contexto, é o tempo fator preponderante para a concretização do referido
princípio constitucional, dentro, porém, dos limites legalmente estabelecidos. Ou seja, o
tempo tem o destaque e a importância na exata medida em que as normas estabelecem.
Tem-se, assim, que a existência de normas regulamentando o instituto da prescrição
constitui verdadeira regra geral, constituindo exceção a omissão normativa a respeito da
matéria.
Nesse diapasão, a leitura a ser dada à regra contida no art. 37, § 5º, da Constituição
Federal não deve ser mais dilatada do que se pode extrair do conteúdo normativo
expresso. Na verdade, está-se a ponderar dois princípios constitucionais: a segurança
jurídica e a indisponibilidade do interesse público.
Calcado na lição de Alexey, pode-se asseverar que a solução a conflitos entre
princípios constitucionais deve ser dada no caso concreto, podendo, em determinada
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situação, preponderar um em relação ao outro e, em outra ocasião, a ordem inverter-se.
Todavia, na hipótese ora tratada, ousando um pouco, pode-se, de forma abstrata,
concluir-se que a imprescritibilidade de que trata a parte final do dispositivo constitucional
em tela somente pode ocorrer nas hipóteses em que o agente público, lato senso, agir
com culpa ou dolo, pois nestes casos haveria, também, possibilidade de punir-se
administrativa ou criminalmente sua conduta.
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DESNECESSIDADE DE REGISTRO DAS ADMISSÕES TEMPORÁRIAS
PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS
Inácio Magalhães Filho
Procurador do Ministério Público do TCDF
Examinar o instituto da contratação temporária requer, de antemão, percuciente
análise sobre os dispositivos constitucionais que tratam do tema. A propósito, reza o
artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, que "a lei estabelecerá os casos de
contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional
interesse público".
Decompondo os termos legais, observa-se, prima facIe, que somente a lei poderá
estabelecer os casos de contratação temporária. Em âmbito Federal, o instituto é
regulado pela Lei n º 8.745/93 e no Distrito Federal pela Lei nº 1.169/96 e posteriores
alterações. Tem-se, assim, por atendido esse primeiro quesito. Em seqüência, exige o
texto constitucional que tal contratação reflita uma necessidade temporária de excepcional
interesse público. Cabe, aqui, uma reflexão mais detalhada.
À guisa de exemplo, analisar-se-á a atividade educativa. A própria natureza da área
educacional já representa excepcional interesse público. Distintamente de outros serviços,
a falta de professores representa ausência de aulas e, com isso, possibilidade de o
Estado não cumprir a missão constitucional de garantir a educação pública. Note-se que o
acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo e sua oferta irregular
importa responsabilidade para a autoridade competente, conforme estipulam os
parágrafos 1º e 2º do artigo 208 da Lei Maior:
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia
de:
.......... omissis......
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta
irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.
Desse modo, afigura-se que, independentemente da origem da vaga existente no
quantitativo docente, seja oriunda de atividade provisória ou definitiva, o fato é que o
Estado não se pode privar da responsabilidade de preenchê-la. Assim, nesse ponto, a
contratação temporária atende a esse fim plenamente.
Tal entendimento vale para
outras situações específicas em que a ausência da prestação de serviços públicos
prejudique os hipossuficientes.
O que se pretende com esse raciocínio é preservar o instituto em si, pois apresenta
validade incontestável. Afinal, não seria razoável imaginar que o poder público realizasse
concursos públicos a cada vez que o servidor público se afastasse temporariamente por
motivo de saúde, licença gestante etc.
Não se pode negar, entrementes, a existência de desvios na utilização da
contratação temporária. A resolução desse problema, todavia, não parece dar-se pelo
caminho da ilegalidade de todas as contratações. A própria atividade de controle exercida
pelos Tribunais de Contas merece ser reavaliada nesse caso. O mecanismo atual impõe
que todas as admissões, excluídas as derivadas de cargo de provimento em comissão,
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devam ser registradas. Tal entendimento é decorrência da intelecção conjunta dos artigos
37, inciso II, 71, inciso III, da Constituição Federal.
Nesse momento, chega-se ao ponto nodal da análise empreendida, qual seja, a
desnecessidade de se registrar as admissões temporárias, fato que proporcionará uma
expressiva melhora nas condições de fiscalização empreendida pelos Tribunais de
Contas, soando, dessa forma, como aprimoramento da utilização do instituto da
contratação temporária.
A posição do Tribunal de Contas da União - TCU, adotada pelo Tribunal de Contas
do Distrito Federal - TCDF, faz uma leitura literal do artigo 71, inciso III, da CF, que define:
"apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer
título (...) excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão". A seu
turno, o artigo 37, inciso II, da CF, estabelece que a investidura em cargo público depende
de aprovação em concurso público, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão.
Assim, a egrégia Corte de Contas Federal combina os dois mandamentos legais, para
construir o entendimento de que somente as admissões em cargo de provimento em
comissão são liberadas da necessidade do registro.
Assim se expressou o TCU1:
EMENTA
(...) Possibilidade de contratação temporária nos casos especiais previstos na
Constituição e na Lei 8.112/90. Admissão de Pessoal. Obrigatoriedade do registro pelo
TCU para que se torne ato jurídico perfeito. Nulidade do ato e responsabilização dos
administradores se negado o registro. Paralelo entre o concurso público e a licitação
em geral, ante os princípios da Administração Pública.
Entretanto, é importante verificar que, conquanto a posição adotada pelo TCDF
(Resolução nº 100/98) acompanhe a defendida pelo TCU, a Emenda Regimental nº 01/98
- TCDF permite outra interpretação. Dispõe o citado diploma legal no artigo 1º que a
"autoridade administrativa que praticar qualquer ato de admissão de pessoal, para cargo
ou emprego permanentes da Administração Direta ou Indireta do Distrito Federal, bem
como de aposentadoria, reforma, pensão e respectivas revisões, deve submetê-lo à
apreciação do Tribunal de Contas (...)". (grifou-se). É perfeitamente possível deduzir que
somente os cargos permanentes teriam a obrigatoriedade do registro.
Não obstante, o que ocorre é que a análise dos dispositivos constitucionais deve ser
feita de forma sistêmica. De fato, o artigo 71, inciso III, da CF, é expresso em afastar de
registro apenas as admissões oriundas de cargo em comissão por se referir à forma de
provimento prevista no artigo 37, inciso II. Veja-se que os dois comandos dizem
respeito à forma regular de contratação de servidores, que deflui em dois tipos: o de
caráter efetivo, que não prescinde do concurso público; e o de caráter de livre nomeação
e exoneração, que não necessita do competitório.
Há que obtemperar, contudo, que o instituto da contratação temporária está
regulamentado em outro dispositivo constitucional (artigo 37, inciso IX), logo, não se
submetendo à rigidez do artigo 71, inciso III, uma vez que não representa um tipo de
contratação regular efetivada pela Administração. Ao revés, reveste-se do caráter de
excepcional interesse público.
Note-se, a propósito, que o pessoal contratado em caráter temporário não pode ser
designado para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança, nem mesmo a
1
Decisão nº 236/92 - Processo TC 006.658/89-0:
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título precário ou em substituição (artigo 9º, II, da Lei Federal nº 8.745/9, e 7º, II, da Lei
Distrital nº 1.169/96), circunstância que deixa transparecer outro tipo de contratação
daquela prevista pelo artigo 37, inciso II, da CF.
Por outro prisma, se de um lado a contratação temporária se afasta do conceito de
contratação para cargo em comissão, por outro, há um ponto centrípeto. Ambas têm o
caráter precário, tendo em vista que a Administração pode a qualquer momento rescindir
o vínculo laboral existente, sem maiores delongas. Veja-se, por relevante, o artigo 12, III,
da citada Lei Federal e o artigo 11, III da mencionada Lei Distrital, que dispõem que o
contrato firmado pode ser rescindido por conveniência administrativa.
Com efeito, se o cargo em comissão não necessita de registro, notadamente, em
face da natureza jurídica precária, qual a razão de se exigir o registro de toda e qualquer
admissão temporária, que, inclusive, tem duração limitada e improrrogável por lei?
Note-se que o ilustre Conselheiro Jorge Ulisses Jacoby Fernandes2, do TCDF,
embora de forma breve, corrobora o entendimento aqui defendido:
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, verifica-se competir aos
Tribunais de Contas o exame e o registro das admissões de pessoal, cujo
procedimento vem reforçar a idéia de que as admissões do serviço público passaram,
desde então, a serem atos complexos, pois precisando, para a sua validade, da
análise e da confirmação dessas Cortes.
Determina a Constituição, porém, que não sejam registrados os casos de
admissão para cargos de provimento em comissão, dada a precariedade das
nomeações.
Sobre os registros das admissões de servidores por contrato temporário, parece
que, pelos mesmos motivos, deveriam ser genericamente apreciadas pelo Tribunal,
mas sem registro dos atos, em face à transitoriedade da ocupação."(grifos não
são do original).
Como bem salientado pelo eminente Conselheiro, é mister esclarecer que o fato de
as admissões temporárias não se submeterem a registro, não lhes exime do controle
exercido pelos Tribunais de Contas. Entende-se que o controle externo, nesse caso,
restaria aprimorado se fosse precedido de um encaminhamento ao Tribunal, pelos órgãos
jurisdicionados, de um planejamento criterioso acerca das necessidades de contratação
temporária, que possibilitasse uma fiscalização concomitante, em regra mais eficiente,
capaz de coibir desvios na utilização indevida do instituto.
A propósito da eficiência, nunca é demais recordar tratar-se de um princípio
norteador da Administração Pública (art. 37, caput, CF), de cuja disciplina não podem
fugir os entes públicos. Conforme salienta Maria Sylvia Zanella Di Pietro3:
O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser
considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera
o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores
resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a
Administração Pública, também como o mesmo objetivo de alcançar os melhores
resultados na prestação do serviço público. (grifos do original).
Dessa forma, espera-se ter demonstrado de forma singela a desnecessidade de
registro das admissões decorrentes de contratação temporária pelas Cortes de Contas, a
partir de uma interpretação constitucional sistêmica combinada com a natureza precária
2
Processo - TCDF nº 600/03
3
In Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p.83
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dessas contratações, similares às dos cargos em comissão, bem como possibilitar aos
órgãos de controle uma fiscalização mais eficiente e efetiva do instituto, com fito de evitar
desvios em sua utilização que insofismavelmente é excepcional.
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O PROCESSO E PROCEDIMENTOS DIFERENCIADOS NOS TRIBUNAIS
DE CONTAS
Carlos Antonio Pereira da Silva
Analista de Finanças e Controle Externo
1. INTRODUÇÃO
A Constituição Federal atribuiu competências aos Tribunais de Contas da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para o exercício do controle externo, a
cargo do Legislativo.
Para isso, confere competências para apreciar as contas anuais do Executivo,
emitindo sobre elas parecer prévio, julgar as contas dos administradores e apreciar, para
fins de registro, os atos de admissão de pessoal e concessões de aposentadoria, além de
promover a fiscalização na Administração Pública, verificando os atos praticados. Nesse
mister, confere, também, competências para determinar providências aos órgãos e
entidades sob sua jurisdição, sustar atos e aplicar sanções.
Recentemente, a Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF, Lei Complementar nº 101,
de 04.05.00, acresceu novas atribuições aos Tribunais de Contas, notadamente quanto à
fiscalização das normas de responsabilidade na gestão fiscal, art. 59 da LRF, reforçando
a competência (art. 56 da LRF) para exarar o parecer prévio, separadamente, para as
contas dos Chefes do Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e do Chefe do Ministério
Público, nos termos do art. 56.
A jurisdição, para o exercício das competências atribuídas aos Tribunais de Contas –
TC's, alcança as pessoas físicas, órgãos ou entidades da correspondente unidade da
federação a que pertence, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros,
bens e valores públicos ou pelos quais responda ou que, em nome da unidade federativa,
assuma obrigações de natureza pecuniária. Alcançam também aqueles que causarem
dano ao Erário e as pessoas jurídicas de direito privado que recebam contribuições,
recursos ou prestem serviços públicos, inclusive seus sucessores.
O exercício da competência atribuída aos TC's, além do parecer prévio sobre as
contas do governo, é realizado mediante processo, seja de prestação de contas, tomada
de contas ou na fiscalização de atos e contratos.
Nos processos, analisam-se fatos ocorridos no curso da administração pelo
responsável. Tais análises, em regra, estão voltadas ao passado, verificando atos já
praticados e avaliando suas repercussões no sentido de se obter um juízo de valor, seja
aprovação ou não das contas, correção do ato sujeito a registro, determinação de
providências, sustação de atos ou aplicação de sanções.
Entretanto, não raro, a fiscalização se vê diante de fatos merecedores de uma
abordagem diferenciada, seja de prevenção, pela indicação de que uma irregularidade
ocorrerá, seja pela constatação da necessidade de proteger determinado bem jurídico até
final processo, ou ainda em casos de urgência que requerem sejam determinadas
providências que antecipem os efeitos de uma decisão que só poderá ser tomada ao final
do processo. Neste último caso, devem estar presentes elementos indicativos de fundado
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receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou ainda, abuso de direito de defesa ou
manifesto propósito protelatório no processo, associado a fatos que demonstram de forma
inequívoca uma verossimilhança ao direito à antecipação dos efeitos da decisão.
A partir do momento em que o Estado atribuiu aos Tribunais de Contas o dever do
exercício do controle externo, mediante o parecer prévio, o julgamento de contas e a
fiscalização e o registro dos atos da Administração, impelindo a administração a atuar no
interesse público e limitando a discricionariedade do administrador, sobreveio-lhe o poderdever do exercício da função jurisdicional como via fundamental para a proteção do
patrimônio público e, dessa forma, inibir a prática de atos lesivos aos bens e direitos do
Estado.
O Processo, no âmbito dos Tribunais de Contas, como instrumento para o exercício
de suas atribuições, mediante julgamento de contas e fiscalização, tem por base o
procedimento administrativo, o qual, por sua vez, requer tempo e, além das fases de
instrução, julgamento e recursal, prevê a participação da Administração, dos
administradores e, eventualmente, de terceiros particulares, dos responsáveis e demais
interessados para o deslinde do feito.
Esse tempo, associado a um risco objetivamente fundado, em regra criado por
responsáveis, por terceiros ou pelas circunstâncias, podem ser razões para a existência
de um perigo de dano de impossível ou de difícil reparação a determinado bem jurídico
merecedor de tutela, passível de ocorrer antes ou no curso do processo. Essa situação
desafia a necessidade de prevenir ou afastar tal perigo.
Em outros casos, os fatos podem, diante de evidências concretas, ser indicadores
razoáveis de que uma irregularidade está por ocorrer, ou ainda, se já ocorrida, as
circunstâncias indicam a sua continuidade. Nessa situação, o ilícito pode ser combatido
mediante ações preventivas, uma vez que negar o direito à prevenção é impor ao Estado
que suporte a irregularidade, contentando-se apenas com a anulação do ato e,
eventualmente, com a sua reparação.
Em todas essas situações, há que se ater ao devido processo legal, associado ao
rigor necessário à interpretação das leis, e somente nos casos omissos o Julgador
decidirá de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito (art. 4º
da LICC), aplicando a legislação de forma a atender aos fins sociais a que ela se dirige e
à exigência do bem comum (art. 5º da LICC).
2. O PROCESSO NAS CORTES DE CONTAS.
Os Tribunais de Contas, no exercício da competência instituída pela Constituição
Federal, estendida aos Estados e ao Distrito Federal por força do art. 72 da Carta Magna,
bem como aos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, atuam mediante
processos administrativos com procedimentos próprios, cujos delineamentos gerais, em
regra, estão traçados nas respectivas leis orgânicas e regimentos internos,
complementados por outras leis e normas interna corporis.
Esses procedimentos, tendentes a realizar a missão institucional dos TC's, são
utilizados, em geral, no julgamento de contas e na apreciação de atos da Administração
Pública, com vistas a assegurar a eficácia do controle externo e constituir elementos de
subsídios à apreciação das contas de governo, mediante relatório analítico e parecer
prévio.
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Dessa forma, além das atividades administrativas internas, os TC's se utilizam de
processos administrativos próprios, na maioria das vezes para fins de julgamento de
contas e na fiscalização dos atos da Administração Pública.
Os processos têm início mediante programação anual do próprio órgão, denúncia,
representações, consultas, a pedidos do Legislativo ou qualquer outra demanda que
requeira a atuação do Tribunal.
Os processos que julgam as contas, sejam originados de prestação de contas,
tomadas de contas ou tomadas de contas especiais, possuem rito próprio que os
distinguem daqueles que procedem à fiscalização a cargo dos TC's.
As contas são julgadas regulares, regulares com ressalva ou irregularidades,
conforme evidenciem a exatidão dos demonstrativos com os atos de gestão, a
impropriedade ou falta de natureza formal, ou, para a última, omissão no dever de prestar
contas, grave infração à norma legal ou dano decorrente de gestão ilegítima ou
antieconômica.
O processo de contas, em geral, compreende as fases de instrução, de julgamento
e recursal.
Na fase instrutória, o processo é presidido pelo relator, que adotará todas as
providências necessárias ao saneamento dos autos. Esta é uma etapa preparatória para
o julgamento das contas. Nesta fase, é fundamental a descrição dos objetivos do
processo, dos fatos apurados e a indicação das normas que regulam a matéria objeto dos
autos, concluindo pela regularidade ou irregularidades dos atos praticados com as
sugestões do corpo técnico responsável pela instrução.
Concluída a fase instrutória, o processo deverá estar pronto para julgamento.
Entretanto, antes que o tribunal venha julgar as contas, o processo deve ser submetido ao
Plenário para que este se manifeste sobre as irregularidades apontadas. Uma vez
reconhecidas essas irregularidades pelo Tribunal, a responsabilidade é definida e o
responsável é chamado a apresentar defesa ou recolher a quantia devida, se houver
débito, ou apresentar razões de justificativas, em caso contrário. Pode, ainda, o Tribunal
adotar outras medidas cabíveis (art. 12 da LOTCU).
Se a defesa apresentada for rejeitada pelo Tribunal, o responsável será cientificado
para, em novo e improrrogável prazo, recolher a importância devida (art. 12, §1º da
LOTCU). O recolhimento do débito no prazo e o reconhecimento da boa-fé pelo Tribunal,
sem que se observe outra irregularidade nas contas, é elemento saneador do Processo
(art. 12, §1º da LOTCU), regularizando a situação anterior tendente ao julgamento por
irregularidade de contas.
A ausência de apresentação de defesa, recolhimento do débito ou das razões de
justificativas, implicam em revelia. Nesse caso, o processo segue para julgamento.
Julgadas as contas, a decisão está sujeita ao recurso de reconsideração, no prazo
de trinta dias, com efeito suspensivo. De toda a forma, das decisões em processo de
tomada ou prestação de contas cabem, também, recursos de embargos de declaração e
de revisão.
Os embargos de declaração são opostos face à decisão - em casos de omissão,
obscuridade ou contradição - e têm o condão de suspender os prazos para o seu
cumprimento e para a interposição dos recursos. O recurso de revisão pode ser interposto
em até cinco anos, sem efeito suspensivo, em casos de erro de cálculo, falsidade de
documento ou superveniência de documento novo e eficaz.
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Os processos que retratam a fiscalização a cargo dos TC's têm foco sobre as contas
de governo, os atos sujeitos ao registro e a fiscalização de atos e contratos.
Os primeiros referem-se à apreciação da contas anuais do Chefe do Poder
Executivo, Chefe do Poder Legislativo e do Chefe do Poder Judiciário, emitindo sobre elas
parecer prévio, separadamente.
Os segundos visam apreciar, para fins de registro ou reexame, os atos de admissão
de pessoal e concessão inicial de aposentadorias, reformas e pensões, incluindo
melhorias posteriores que tenham alterado o fundamento legal do ato inicial.
Os últimos destinam-se a fiscalizar os atos que resultem receitas ou despesas, com
vistas a assegurar a eficácia do controle e a instruir o julgamento das contas. Para tanto
são realizadas auditorias, inspeções e acompanhamento das licitações, contratos,
convênios e outras formas de acordos, ajustes ou outros instrumentos congêneres, bem
como dos atos da Administração Pública ou de terceiros, que venham causar danos ao
patrimônio público.
Da mesma forma que no processo de contas, o relator preside a instrução. Nesta
fase, se apurado tão somente a falta ou a impropriedade de forma, determinam-se
providências saneadoras, conforme o Regimento Interno.
Se no processo de fiscalização for verificada a ocorrência de irregularidade,
determina-se a audiência do responsável para apresentar suas razões de justificativas.
Estando o processo saneado, este segue para apreciação pelo Tribunal. Verificando o
Tribunal que as razões de justificativa não ilidem a irregularidade constatada, poderá ser
determinado que o responsável adote as providências necessárias ao exato cumprimento
da lei, que se não atendido, autoriza ao Tribunal a sustar o ato impugnado, comunicando
ao Legislativo da decisão, e a aplicar multa ao responsável.
No caso de contrato, se o Tribunal não for atendido em sua decisão, comunicará o
fato ao Legislativo, a quem cabe adotar o ato de sustação. A não efetivação da medida
por este Poder, no prazo de noventa dias, autoriza o Tribunal a decidir sobre a sustação
do contrato.
Se no curso da fiscalização for constatada a ocorrência de desfalque, desvio de
bens ou qualquer outra forma de dano ao Erário, o processo de fiscalização deverá ser
convertido em processo de tomada de contas especial, exceto se tratar de atos relativos à
despesa de natureza reservada.
As decisões proferidas nos processos de fiscalização estão sujeitas ao pedido de
reexame, no prazo de trinta dias, com efeito suspensivo. Ainda que não previsto
explicitamente em leis orgânicas dos TC's, admitem-se embargos de declaração e recurso
de revisão, nos termos previstos para os processos de contas.
Nos processos de fiscalização a cargo dos TC's, algumas medidas diferenciadas
poderão ser adotadas, mediante expressa previsão legal. Uma delas consiste no
afastamento temporário do responsável, se este puder retardar ou dificultar a realização
de inspeção ou auditoria, causar outros danos ou inviabilizar o seu ressarcimento.
No mesmo sentido, os TC's podem decretar a indisponibilidade dos bens pelo prazo
de um ano, na quantidade suficiente para garantir o ressarcimento dos danos em
apuração, ou solicitar, ao órgão competente, o arresto dos bens dos responsáveis
julgados em débito.
Há situações em que os TC's estão autorizados a aplicar multas aos responsáveis
por: contas julgadas irregulares, em razão de ato com grave infração à norma; ato de
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gestão que resulte dano; não atendimento de diligência ou de decisão do relator ou do
Tribunal; obstrução ao exercício da fiscalização, sonegação de processo, documentação
ou informação em inspeções ou auditorias e ainda por reincidência no descumprimento de
determinação do Tribunal.
Além das multas e de sujeição às penalidades administrativas, se a infração
constatada for considerada grave pela maioria absoluta do Tribunal, o responsável poderá
ficar inabilitado para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança por um
período entre cinco e oito anos.
3. QUANTO AOS RECURSOS
Os recursos são, antes de tudo, instrumentos processuais destinados a impugnar
uma decisão. Tal instrumento visa assegurar, na medida do possível, a qualidade das
decisões.
Os recursos, além de impedir o trânsito em julgado da decisão impugnada, podem
ter o condão de suspender a sua eficácia e devolve ao órgão julgador a matéria, para
reavaliação. No caso dos TC's, a lei atribui ao órgão que decidiu a competência para
reexaminar a matéria impugnada.
O duplo grau de jurisdição, matéria inerente aos recursos, em que pese não constar
em texto expresso na Constituição, está ínsito em nosso sistema jurídico; uma vez que a
possibilidade do reexame recomenda ao julgador maior zelo na elaboração das decisões,
o que é salutar ao processo. Algumas decisões dos TC's podem ser objeto de apreciação
pelo Judiciário competente para a matéria.
Atualmente, a aplicação de tal princípio tem propiciado maior probabilidade de
acerto do que de erros. A experiência comum indica que uma segunda reflexão acerca da
mesma questão conduz a uma conclusão mais precisa; uma vez que pode permitir seja
observada por diversos ângulos, no mais das vezes até então ignorados.
Nos processos a cargo dos TC's estão previstos recursos de reconsideração,
embargo de declaração e de revisão em face das decisões proferidas em processo de
tomada ou prestação de contas. Das decisões proferidas em processos que tratam de
atos sujeitos a registros e da fiscalização de atos e contratos, cabem pedido de reexame.
As legislações prevêem que o recurso de reconsideração tenha efeito suspensivo e
que deva ser formulado por escrito uma só vez, no prazo estabelecido. Sobre a questão
do prazo não há muitas controvérsias, mas em relação à recepção do efeito suspensivo
pela sua simples interposição e de quais decisões estão sujeitas a esse recurso, não é
matéria pacífica.
Quanto ao efeito suspensivo, se a legislação atribui ao recurso tal qualidade, não
cabe ao intérprete elidi-la mediante simples interpretação. Assim, a simples interposição
do recurso que tem esta qualidade prevista em lei tem o condão de suspender os efeitos
da decisão. Não que a decisão seja inválida, a interposição do recurso impede o trânsito
em julgado da decisão para suspender temporariamente sua aplicação até que o recurso
seja apreciado. As preocupações, quanto ao efeito suspensivo dos recursos, estão
relacionadas com a eficiência e eficácia da atuação da Corte de contas e com sua
atuação tempestiva, quase sempre associada à urgência na aplicação da decisão
proferida em processo.
A questão da atuação de urgência deve ser analisada no âmbito dos procedimentos
diferenciados. Dessa forma, para uma decisão de qualidade, há que se considerar a
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possibilidade de que a mesma possa ser revisada, diante das análises que foram feitas na
sua prolação. Novos esclarecimentos sobre os argumentos lançados merecem ser
analisados, diante da forma como a Corte tratou a questão. Nesse caso, não há porque
se efetivar a decisão, sob pena de tornar sua revisão inviável, diante de fatos
consumados ou possuir efeito passageiro, prejudicando a segurança jurídica, razão que
justifica aguardar o fim do processo e aplicá-la após o trânsito em julgado.
Diferente são as situações de urgência ou que o bem jurídico em questão merece
proteção. Nesses casos devem ser aplicadas as medidas inerentes à tutela inibitória,
cautelar ou antecipatória, mediante processo autônomo, ainda que apenso ao principal.
Sobre a forma de apresentação dos recursos, não há dúvida de que deverá ser por
escrito, não se admitindo a oralidade, o que não impede a sustentação oral em sessão
plenária.
Outra questão que merece análise diz respeito a qual decisão está sujeita ao
recurso de reconsideração. Para isso, há que se considerar o comando legal de que o
recurso será formulado por escrito uma só vez.
O comando sob análise indica que o recurso de reconsideração será formulado uma
única vez. Nesse ponto cabe reflexão, havendo duas alternativas: se a única vez for
comando com sentido absoluto, apenas uma das decisões do processo está sujeita ao
recurso de reconsideração, se não for absoluto, a cada decisão no processo desafiará o
recurso de reconsideração.
Esta última hipótese poderá levar à perpetuação do processo, pois se a cada
decisão couber recurso, todas as decisões no processo estão sujeitas a recurso, inclusive
a que decidir o recurso, o que pode ser impeditivo da prestação jurisdicional.
A primeira hipótese se apresenta como a mais indicada. Uma única decisão no
processo desafia o recurso de reconsideração, a decisão final, definitiva, que põe fim ao
processo, a que permite seja inaugurada a fase recursal. Assim, nos processos de contas,
a decisão que julga as contas, regulares, regulares com ressalva ou irregulares, é a
decisão que desafia recurso de reconsideração.
Nesse sentido, indica o Regimento Interno do TCU, art. 285, estabelecendo a
decisão definitiva em processos de prestação ou tomada de contas como a que cabe
recurso de reconsideração.
Diante dessa possibilidade, as demais decisões no processo, não estão sujeitas ao
recurso de reconsideração, desafiam recurso de embargos de declaração ou o simples
recurso admitido em processos administrativos, que não têm o condão de suspender a
decisão, a exemplo do previsto no art. 61 da Lei federal nº 9.784, de 29.01.99, podendo a
autoridade conceder efeito suspensivo ao recurso.
Ademais, o Regimento Interno do TCU prevê para algumas decisões o recurso de
agravo, art. 289, dentre elas a da medida cautelar, cujo efeito suspensivo fica a critério de
quem proferiu o despacho decisório.
Aliás, o direito de peticionar aos órgãos públicos encontra-se assegurado na
Constituição Federal, especificamente no art. 5º, inciso XXXIV.
Enquanto as decisões estão sujeitas a recurso, os despachos de mero expediente
não desafiam recurso algum. São exemplos de despachos de mero expediente: as
diligências, os que promovem o sobrestamento do julgamento, a citação, a audiência dos
responsáveis ou outras providências necessárias ao saneamento dos autos. Tais atos
podem resultar em influência na esfera jurídica dos responsáveis, mas não se podem
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admitir obstáculos ao exercício de promover a fiscalização, a citação, a audiência dos
responsáveis e a obtenção de elementos necessários a instruir o processo.
Nesses casos não há decisão, há obediência a um comando legal. A lei concede,
em momentos certos, a prerrogativa do exercício de certo direito ou estabelece a prática
de determinada providência.
O Tribunal de Contas da União adotou em seu Regimento Interno, art. 279, que não
cabe recurso de decisão que determina a citação, audiência, diligência, inspeção ou
auditoria, além da que converte o processo em tomada de contas especial.
4. QUANTO AOS PROCEDIMENTOS DIFERENCIADOS.
O exercício das atribuições conferidas aos TC's mediante processo requer tempo
para o processamento do feito. Assim, há situações que não podem aguardar o tempo
necessário ao desenvolvimento regular de um processo. Essas situações exigem uma
providência imediata diante da existência de um risco que afeta o bem jurídico a ser
tutelado pela atuação dos TC's.
No Direito Processual Civil brasileiro, o exercício da prestação jurisdicional devida ao
Estado, em diversos momentos realiza-se mediante tutelas diferenciadas, cujo objetivo é
o de assegurar a eficácia do processo civil.
Em que pese o Direito Processual Civil estar direcionado ao Judiciário, nada impede
que tais conhecimentos venham a ser aplicados, subsidiariamente, aos processos
administrativos nos tribunais de contas, com as devidas adaptações, mediante a absorção
da longa e rica experiência naquele Poder.
A legislação aplicável diretamente às atividades dos tribunais de contas, no exercício
de suas competências, prevê, em diversos momentos, providências cautelares com o
condão de atribuir poderes às Cortes de contas para assegurar a normalidade e a
efetividade da atuação jurisdicional.
De início, é de se lembrar o disposto na Constituição da República, em destaque o
art. 75, que estabelece a aplicação aos tribunais de contas dos Estados, Distrito Federal e
Municípios, das normas atribuídas ao Tribunal de Contas da União.
As competências dos tribunais de contas, assim estabelecidas, constam do art. 71
da Constituição da República. Nesse dispositivo, é de se destacar os incisos IV, VIII a X,
que atribui aos TC's competência para realizar por iniciativa própria auditoria e inspeções,
determinar providências, sustar atos e aplicar sanções.
Não se concebe o exercício de tais atividades apenas após a ocorrência de
irregularidades, considerando o princípio de quem pode o mais pode o menos. Se podem
os tribunais de contas aplicar sanções em caso de ilegalidade ou de irregularidade,
determinar providências necessárias para o exato cumprimento da lei e sustar ato
impugnado, pode, pelas mesmas competências, determinar que a Administração se
abstenha de praticar ato sujeito a impugnação, implemente o exato cumprimento da lei e
promova a adequada proteção do patrimônio público.
Elegendo, como se adotou nesse trabalho, o Tribunal de Contas da União como
paradigma para os demais TC's, tem-se que a Lei Orgânica daquela Corte de contas,
além de reproduzir o que dispõe os incisos IV, VIII a X do art. 71 da Constituição da
República, estabelece atividades cautelares ao determinar o trancamento das contas
consideradas iliquidáveis (art. 21); o afastamento temporário do responsável diante de
indícios (art. 44); a decretação de indisponibilidade de bens (art. 44, § 2º); a inabilitação
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do responsável (art. 60) e o arresto de bens dos responsáveis julgados em débito (art.
61).
O Regimento Interno do TCU consolida esse entendimento ao dispor sobre as suas
competências, no art. 1º, incluindo, no inciso XVII, a de aplicar as medidas cautelares
previstas nos arts. 266 a 276, exercida pelo Plenário, art. 15, inciso I, alínea i, e sobre
medidas cautelares nos arts. 273 a 276.
Dessa forma, ainda que não estejam amplamente regulamentadas as tutelas
diferenciadas na atividade fiscalizadora dos tribunais de contas, certamente constitui
matéria que necessita e merece tratamento imediato, uma vez estar entre suas
prerrogativas.
A Lei Orgânica do TCU estabelece, no art. 12, inciso IV, que verificada a
irregularidade nas contas, o Relator ou o Tribunal adotará outras medidas cabíveis. Vejam
que tais providências podem preceder o julgamento, pois, depende tão somente da
verificação de irregularidades nas contas, o que difere do julgamento por contas
irregulares.
Pode-se considerar, também, providências cautelares ínsitas quando a norma legal
permite ao Tribunal ou Relator que determine providências no caso de faltas ou
impropriedades formal (art. 43).
No mesmo sentido, ao autorizar seja assinado prazo ao responsável para que adote
providências ao exato cumprimento da lei (art. 45).
Inúmeras são as decisões que suspendem determinada licitação até a sua
apreciação pelo Tribunal ou que determinam à Administração que se abstenha de praticar
determinado ato.
No exercício das atividades de competência dos tribunais de contas, a fiscalização
deve verificar não só os atos praticados e compará-los à norma legal, mas verificar,
também, se constituem indicadores de que provavelmente a irregularidade será praticada,
para tomar as medidas necessárias à sua prevenção, o agir vigilante e constante no
exercício dos comandos insertos nos arts. 43 e 45 .
Pode ser o caso, não de provável ilícito, mas de perigo para a esfera jurídica da
Administração Pública, risco este que deve ser afastado mediante a tutela adequada.
Ou ainda, para impelir eficiência à Administração Pública, mediante antecipação de
atos que não merecem aguardar tão somente decisão final. Tem-se como exemplo o
pagamento de aposentadoria antes da decisão final dos tribunais de contas sobre o seu
registro.
Diferentemente do Judiciário, os tribunais de contas agem, em regra, de ofício,
independente de provocação por interessados, no sentido de verificar os atos da
administração Pública com vistas à proteção do patrimônio público e à regularidade dos
atos administrativos. Diante de tal propriedade, podem e devem os tribunais de contas
tomar a iniciativa em promover as medidas diferenciadas, a saber: a medida inibitória, a
medida cautelar e a antecipação de tutela, podendo em todos os casos serem exercidas
no início do processo, antes de ouvir o Administrador, nos casos em que este puder
frustrar a medida, prejudicar a instrução, ou ainda em razão da urgência.
No âmbito do Direito Processual Civil brasileiro a tutela inibitória é prevista no
interdito proibitório (art. 932 do CPC), na nunciação de obra nova (art. 934 do CPC), ao se
admitir a proteção da marca comercial e à propriedade intelectual, proibindo que outro
faça uso da marca ou comercialize a obra intelectual.
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A decisão que impõe a abstenção da prática de algum ato, de tolerar alguma
atividade, prestar ato ou entregar coisa, tem proteção legal para alcançar o seu resultado
prático mediante providências específicas ou aplicação de multas (as treinte), com fulcro
nos arts. 287, 461 e 461-A do Código de Processo Civil – CPC, da mesma forma prevista
no art. 84 do Código de Proteção do Consumidor.
A tutela inibitória deve ser aplicada no momento em que for verificado determinado
fato indicador de que uma irregularidade ou um ilícito está para ser praticado. Essa
verificação se faz em sede de probabilidade jurídica, não importando a certeza.
A probabilidade jurídica difere da possibilidade jurídica, por ser esta última
representativa de todos os fatos jurídicos passíveis de ocorrer ou pertencer à esfera
jurídica de uma pessoa.
A probabilidade jurídica resulta da análise racional dos fatos diante do que
ordinariamente acontece. Autoriza a valoração da prova o art. 335 do CPC, na ausência
de normas jurídicas particulares, o que é razoável diante da impossibilidade de as normas
preverem a regulação para tudo o que acontece na esfera jurídica das pessoas. Justificase tal assertiva em que a lei não tem o condão de regular todos os acontecimentos
possíveis e tampouco substituir a inteligência humana, por isso deve privilegiar o livre
convencimento do julgador.
Importa também esteja demonstrado o perigo, ou seja, elemento caracterizador de
que o ilícito provavelmente será praticado. Esta verificação deve estar acompanhada da
análise de que o ato que está para ser praticado será ilícito.
Dessa forma, demonstra-se, diante dos fatos apurados, e do seu desenvolvimento,
diante do que ordinariamente acontece, indicativo da probabilidade (não apenas
possibilidade) de outros fatos conseqüentes, naturalmente, e que tais fatos constituirão
irregularidades ou ilícitos, ferindo os princípios da Administração Pública.
Assim, se dos fatos narrados poder-se-á concluir logicamente pela ocorrência de
que determinado ato será praticado, sendo tal ato uma irregularidade, uma ilicitude, ou
ofensa aos princípios da Administração Pública, essa situação merece proteção, mediante
atuação da jurisdição adequada para inibir que a irregularidade, a ilicitude ou a ofensa
venha a ocorrer.
Nesse contexto não importa o dano, o que se pretende tutelar é a prevenção. O
dano só pode ser avaliado após a ocorrência da irregularidade. Aqui, a tutela refere-se ao
ordenamento jurídico, cuja violação merece ser repelida. A tutela jurídica pretendida está
voltada à proteção do Direito.
Na administração pública, a sustentação jurídica dessa atividade encontra esteio,
além dos dispositivos mencionados anteriormente no âmbito infraconstitucional, nos
comandos constitucionais, notadamente o do Estado Democrático de Direito, os da
cidadania e da dignidade da pessoa humana, refletida nas pessoas da população que
esperam uma atuação eficaz dos tribunais de contas, associados aos princípios da
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência da Administração
Pública.
A jurisdição sustentada tão somente na tutela repressiva e ressarcitória são
incapazes de impedir a ocorrência de irregularidades, apenas as desestimulam, e em
muitos casos incentivam a sua mercantilização, sabendo o sujeito passivo do preço a
pagar pela irregularidade pretendida. A violação dos princípios da Administração Pública é
incompatível com o ressarcimento, este diz respeito apenas ao patrimônio e não ao bem
jurídico a ser tutelado.
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Veja-se, assim, que o patrimônio desgastado pode ser recomposto, mas a legalidade
e a moralidade uma vez violadas, não podem ser reconstituídas. O tempo perdido no
refazimento das atividades anuladas e os benefícios sociais que seriam gerados pelas
atividades que seriam realizadas nesse tempo, não podem ser compensados apenas com
o ressarcimento referente ao custo com despesas de pessoal e de material.
No tocante às providências cautelares, as leis orgânicas dos tribunais de contas
trataram delas, como se enumerou anteriormente, o afastamento temporário, a
decretação de indisponibilidade de bens, a inabilitação e o arresto de bens.
O Regimento Interno do TCU dedica um Título especificamente às medidas
cautelares, além de prever sua competência no art. 1º, inciso XVII, considera-a como
matéria de urgência com tramitação especial (art. 159 do RI), podendo ser adotada
inaudita altera pars, determinando entre outras providências a suspensão do ato ou do
procedimento até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão (art. 276 do RI). Neste
caso admite o recurso de agravo em face da decisão que adotou a medida cautelar e que
seja desfavorável à parte (art. 289).
Entretanto, a tutela cautelar não se encontra regulada no mesmo grau de
detalhamento como se tem no Direito Processo Civil. Neste, a medida cautelar é típica do
processo cautelar, um terceiro gênero, ao lado do processo de conhecimento e de
execução. Nesse particular, devem constituir processo autônomo instaurado antes ou
durante o processo principal ao qual refere e tem por objetivo a preservação do bem
jurídico litigioso até final sentença, diante da existência de um risco iminente e fundado.
Os requisitos para a concessão da medida cautelar são: o fumus boni iuris, o
periculum in mora e o periculum in mora inverso, além de requisitos, constituem o mérito
da ação cautelar. A medida cautelar é concedida em razão desses elementos. O direito
material discutido no processo principal só importa para verificar o direito à cautela, à
proteção processual da pretensão instada no processo principal. Assim, um pedido
juridicamente impossível não merece cautela porque não merece processo, da mesma
forma a ausência de interesse ou de legitimidade.
Representa o fumus boni iuris o direito de a parte ver a sua pretensão amparada em
um processo principal. O fumus boni iuris consiste na aparência do direito que se
desprende de uma ação a ser intentada ou em curso, no sentido de verificar a existência
do direito de ação. Representa bem essa expressão os ensinamentos o Prof. Theodoro
Júnior1
O periculum in mora deve estar representado pelo fundado receio de que o bem
jurídico controvertido encontra-se diante de um risco que poderá implicar lesão de
impossível ou de difícil reparação. Tal situação constitui condição necessária, ainda que
não suficiente, para o eventual deferimento da medida vindicada.
O dano do qual receia o requerente não deve ser apenas possível, uma vez que
possível é tudo o que pode vir a ocorrer no cotidiano, incluindo-se as excepcionais. O
dano deve ser provável, baseado em fatos positivos que possam traduzir o fundado receio
da sua ocorrência.
Tem-se por fundado perigo de dano à plausibilidade do receio em que o interesse
processual não se encontrará suficientemente protegido de forma a que, ao se obter a
composição do litígio, a sentença não alcance seu resultado útil no processo, diante da
concretização do dano receado.
1
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo Cautelar. 20ª ed. São Paulo : Universitária de Direito, 2002. p. 82.
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Por fim, deve estar demonstrado que o deferimento da medida cautelar não
implicará em risco para a parte que a deverá suportar. Deve consistir na verificação da
possibilidade da ocorrência do grave risco de dano irreparável ou de difícil reparação para
o réu, em decorrência da eventual concessão da medida cautelar.
O requisito do periculum in mora inverso vem sendo reconhecido pelos tribunais,
conforme Acórdão2 do Tribunal de Justiça do Paraná.
A medida cautelar é autônoma, com fundamentos, pedidos e propósitos distintos da
lide principal, razão pela qual deve ser tratada em autos apartados ao processo principal.
Em razão de ser medida provisória, pode ser revista a qualquer tempo, desde que
alterada as questões de seu mérito. É concedida mediante processo constituído por
petição inicial, contestação, assegurando o contraditório, instrução e julgamento com
sentença que põe fim ao processo cautelar.
A apelação em face da sentença que decide o processo cautelar será recebida
apenas em seu efeito devolutivo (art. 520 do CPC), não dispondo do efeito suspensivo,
portanto. A decisão em processo cautelar pode subsistir até o trânsito em julgado da
decisão no processo principal, quando perde o seu objeto, ainda que contrária ao autor
que a requereu.
A pretensão à segurança cautelar pode ser em razão de um processo de
conhecimento ou de execução. A medida cautelar pode ser concedida em sede de
liminar, por conseqüência, antes da oitiva do réu, quando verificar que este, sendo citado,
poderá torná-la ineficaz (art. 804 do CPC).
Em tempo, cabe lembrar que medida liminar é decisão temporal, refere-se ao
momento processual initio litis. É impróprio empregar o termo liminar a uma decisão
concedida após a citação do réu, o conceito de liminar está associado ao momento
processual em que se aplica a medida. Considera-se liminar a medida concedida no início
do processo. São liminares o indeferimento da inicial, o despacho que determina a citação
e todas as que antecedem a manifestação do demandado. A respeito dessa abordagem
expressam esse entendimento as lições do Prof. Fabrício3.
Além da tutela inibitória e da tutela cautelar como forma de tutelas diferenciadas,
tem-se a antecipação de tutela como o provimento jurisdicional tendente a conceder,
antecipadamente, os efeitos da tutela pretendida, existindo elementos autorizadores para
sua concessão (art. 273 do CPC).
A antecipação de tutela funda-se na verossimilhança da alegação combinada com o
fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou o caracterizado abuso de
direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu (incisos I e II, do art. 273, do
CPC).
São raros os casos de antecipação de tutela nos processos dos TC's, em razão de
sua jurisdição e competência. Se tomarmos o processo de aposentadoria como um ato
complexo, envolvendo atos da autoridade e a atividade de registro por parte dos TC's,
poder-se-ia considerar a sua concessão pela autoridade competente como uma
antecipação de tutela, haja vista estarem presentes a verossimilhança da alegação e o
perigo da demora de conclusão do ato, pela ausência da concessão do benefício.
2
BRASIL, Tribunal de Justiça do Paraná, 6ª Cam.Civel. Agravo de Instrumento nº 0110728-8. Rel. Des. Antônio
Lopes de Noronha – DJ PR 24.06.02
3
FABRÍCIO, Adroaldo Furtado. Breves notas sobre provimentos antecipatórios, cautelares e liminares. Revista
AJURIS v. 23, n. 66, mar 1996. p. 13/14
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Entretanto, não são raros os casos de tutela cautelar. Estão presentes nas situações
em que os TC's devem agir em razão da urgência e para assegurar o resultado útil do
processo. São exemplos a suspensão de editais de licitação, de editais de concursos
públicos e outras atividades da Administração Pública que ponham em risco determinado
objeto de fiscalização, diante da existência de fatos indicativos de irregularidades.
O mesmo ocorre com a tutela inibitória. Neste caso, a Administração Pública é
instada a se abster da prática de determinado ato diante de fatos indicadores de que
provavelmente um ato irregular será praticado. Ao decidir a Corte, a irregularidade ainda
não foi praticada, mas, dos fatos colhidos resulta conclusão de que provavelmente o ato
considerado irregular será praticado.
São exemplos: a ampla publicidade sobre a pretensa realização de ato que os TC's
consideram irregular, despesas sem legislação que as autorizem, atos que indiquem a
execução de despesa sem prévio empenho, atividade continuada considerada irregular,
ajustes com entidades em situação irregular, atos que indiquem pela assinatura de
contrato sem a regular, exigível e indispensável licitação e a concessão de benefícios
irregulares em andamento, inclua-se aqui a renúncia de receitas.
Entre as tutelas diferenciadas são sutis as diferenças, tornando em alguns casos de
difícil percepção. As distinções existem, mas não são essenciais. A tutela inibitória, a
tutela cautelar e a antecipação de tutela são espécies do gênero tutelas de urgência ou
tutelas diferenciadas. O importante é que a providência seja adotada diante da ocorrência
de seus pressupostos.
Entretanto, todas elas têm em comum o dever da prestação jurisdicional e o risco
fundado. Para a tutela inibitória há que se verificar a probabilidade da ocorrência do ato e
da sua ilicitude. Para a tutela cautelar, o fumus boni iuris, o periculum in mora e o
periculum in mora inverso, e por fim, para a tutela antecipada a verossimilhança da
alegação, podendo substituir o periculum in mora pelo abuso do direito de defesa ou o
pelo manifesto propósito protelatório do responsável, nos termos da experiência do Direito
Processual Civil.
CONCLUSÕES
A Constituição Federal, ao atribuir aos Tribunais de Contas o exercício do controle
externo, a cargo do Legislativo, sobreveio-lhe o poder-dever de função jurisdicional como
via fundamental para a proteção do patrimônio público e da regularidade dos atos
administrativos, mediante julgamento de contas, registro e fiscalização de atos da
Administração e, dessa forma, poder para inibir a prática de atos lesivos aos bens e
direitos do Estado.
A realização dessa competência perfaz-se mediante processo administrativo, como
instrumento para o exercício de suas atribuições, com o julgamento de contas e a
fiscalização da Administração Pública. O processo tem por base o procedimento
administrativo, o qual, por sua vez requer tempo, por exigir a participação dos órgãos
públicos, dos responsáveis e da atividade do próprio Tribunal para a conclusão do feito.
Esse tempo, associado a um risco objetivamente fundado, em regra criado por
responsáveis, por terceiros ou pelas circunstâncias, podem ser razões para a existência
de um perigo de dano de impossível ou de difícil reparação a determinado bem jurídico
merecedor de tutela, passível de ocorrer antes ou no curso do processo. Essa situação
desafia a necessidade de prevenir ou afastar tal perigo.
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Nesse contexto, o ideal do controle externo viria a ser a imediata sustação do ato
irregular, inibindo a ocorrência de prejuízos, e, não sendo possível evitá-lo, a exemplar
punição do faltoso, a pronta recomposição do ato inquinado e a devida reparação do
prejuízo causado.
Mas, nem sempre tal providencia pode ser realizada com a rapidez desejada, porque
o fato precisa ser apurado, mediante inspeção ou auditoria, e a Administração precisa ser
ouvida. Ademais, concluída a coleta de dados e informações, estas precisam ser objeto
de tratamento adequado, da forma como se procede na pesquisa científica, organizada de
modo a se colher delas informações corretas, seguras e consistentes, de modo a
identificar, mediante análise, a norma aplicável ao fato com que se depara. De toda a
forma, o trabalho investigativo, ainda assim, é insuficiente para esgotar o conhecimento
completo da questão, mas deve ser o suficiente para reunir informações que conduza a
uma opinião fundamentada.
De outro lado, a Administração deve ser chamada a oferecer informações e o
responsável a apresentar razões de justificativa ou defesa. Além do mais, incidentes
processuais ocorrerem, com gastos de tempo, dilatando a chegada da decisão.
Exarada a decisão, tem-se em seguida a fase recursal. Depois dela é que terá lugar
a sua execução, às vezes já prejudicada pelos fatos que o próprio tempo incumbiu-se de
manejar, uma vez que, enquanto dura o processo, variados eventos podem acontecer às
pessoas que com ele se ligam ou às coisas sobre que versa. Os bens objeto do processo
estão sujeitos a ser alienados, onerados, desviados, ocultados, danificados, destruídos ou
simplesmente perecer.
E quando chegasse a hora de atuar o processo no mundo exterior, de saltar a
decisão do bojo dos autos para se fazer lá fora a efetivação, de realização, talvez já não
mais houvesse como e onde se exercer o que o julgado acertou e determinou.
Para obviar a isso, isto é, aos males que o tempo traz ao processo, três grandes
institutos do Direito Processual Civil são merecedores de atenção: a tutela inibitória, a
antecipação de tutela e a tutela cautelar.
Renomada doutrina tem defendido a unificação dos institutos por considerá-lo com
tal semelhança que estão a gerar inúmeras divergências na sua identificação e aplicação
na lide. Não são raros os casos de dúvida fundada sobre os pedidos, se consistem em
tutela antecipada ou tutela cautelar, ou mesmo se merecedores ou não de medidas
liminares e quais são as suas condições.
Para isso, os institutos e seus procedimentos devem restar claros e com atuação
eficiente de modo a realizar a paz social, mediante os instrumentos adequadamente
formulados.
A sistemática jurídica atual reivindica segregação de funções processuais para se
alcançar pretensões distintas, mediante atuação de processo diante das diversas
situações que se apresentam. As exceções devem ser mantidas na forma expressa em
lei, como se tem feito atualmente.
Ainda assim, com toda a boa técnica aplicada, tal tecnicismo não deve ser
construído no sentido de restringir as funções do julgador, senão ao mínimo necessário a
permitir a boa condução do processo. Ao contrário deve ampliá-las, porque não há norma
que substitua a inteligência humana.
O processo cautelar tem exercido, no âmbito do Processo Civil, um papel relevante
de equilíbrio na situação jurídica entre as partes que procuram o judiciário para a solução
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de seus conflitos. Nessa função, vem tratando vigorosamente da proteção processual da
lide principal, fazendo valer sobre as partes providências temporárias de sua regulação,
sobrepondo-se ao direito material interveniente.
A introdução dos institutos referentes às tutelas diferenciadas no Direito Processual
Civil, constituiu um avanço considerável no ordenamento jurídico pátrio. Entretanto, na
análise de situações concretas, tem-se apresentado dificuldades para a distinção em
enquadrar a medida em um ou outro instituto, bem como estabelecer a melhor forma de
sua aplicação.
Essa dificuldade se reflete nas demais áreas do Direito Processual, notadamente no
Processo Administrativo, com peculiaridades próprias e, às vezes, inconciliáveis com as
demais.
Nas reflexões desenvolvidas no presente trabalho, não se pretendeu esgotar o tema
e tampouco a análise, mas simplesmente trazer a tona algumas meditações sobre a
possibilidade de aplicação de institutos já instalados no Direito Processual brasileiro.
Para isso, pode-se ter como paradigma a sistemática processual adotada no
segmento Cível, segregando o procedimento comum dos procedimentos de urgência ou
de tutelas diferenciadas. Tal tratamento permite que o processo cumpra a sua função,
sem a preocupação com os riscos a que estão envolvidos os bens jurídicos sob
julgamento.
O tratamento diferenciado para as situações de urgência face ao processamento do
exercício regular da função de controle externo, conciliada com a proteção adequada ao
bem objeto desse controle, é instrumento de grande valia para assegurar a eficácia da
decisão a ser exarada ao final processo.
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LICITAÇÃO - ASFALTO BORRACHA*
Giovana Maria Pires Vieira
Técnica de Finanças e Controle Externo TCDF
Este trabalho se refere à Concorrência Internacional nº 007/2003, a ser realizada
pelo DER/DF, para execução de obras de engenharia e de restauração das rodovias DF002 (Eixo Rodoviário), DF-007 (EPTT) e DF-047 (EPAR), com extensão total de 19,20
Km, com a utilização de asfalto borracha (ecológico). A abertura da licitação está
programada para 27.08.2003. Será dividida em dois lotes, sob o regime de empreitada
por preço unitário, do tipo menor preço, no valor estimado de R$ 20.458.451,64 (vinte
milhões, quatrocentos e cinqüenta e oito mil, quatrocentos e cinqüenta e um reais e
sessenta e quatro centavos).
Nesta oportunidade, procedemos à análise do edital de licitação em referência,
consoante as disposições legais contidas no Estatuto das Licitações e Contratos (Lei nº
8.666/93).
Inicialmente, considerando que o uso da tecnologia de emprego do asfalto de
borracha é recente, foi necessário realizar uma pesquisa sobre suas propriedades,
fabricação, emprego, distribuição, vantagens e custo-benefício em relação ao asfalto
convencional, de forma a subsidiar os trabalhos não só desta unidade técnica, mas de
dotar o Plenário de elementos consistentes para o julgamento da matéria.
Além das noções trazidas pelo Engenheiro Paulo Gontijo em palestra proferida no
auditório desta Corte no dia 11.08.03, iniciamos a pesquisa do assunto pela Internet 1,
quando obtivemos as primeiras informações sobre o que é o asfalto de borracha e sua
utilização pelas concessionárias de rodovias brasileiras privatizadas. Junto ao
Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT2, conseguimos a notícia
de que ainda não foram realizadas licitações com o uso desse material na área federal,
estando em fase de estudo pelo Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR) daquele órgão.
O sistema SICRO 23 igualmente não possui cotação de preços para o asfalto de borracha,
tendo sido juntadas aos autos apenas as cotações referentes ao asfalto convencional –
ref. Maio/2003.
Continuando a pesquisa, no site da Petrobrás encontramos uma matéria sobre o
asfalto borracha fabricado e lançado no mercado pela BR Distribuidora com o nome de
Capflex-B. Foram feitos contatos com a empresa e apresentados alguns
questionamentos, prontamente respondidos pela área técnica, que nos enviou farto
* Tese apresentada no Precesso-TCDF nº 1.339/03 aprovada pela Decisão nº 4.367/03.
1
Consulta aos seguintes sites:
www.ces.clemson.edu/arts/faq.html
www.br.com.br/portalbr/calandra.nsf
www.construsite.com.br/o_empreiteiro/fevereiro2003/materiais/Rodovias/rodovias.html
www.cargaecia.com.br/arquivo/maio2003/index_tendencias.php
www.rubberpavements.org
www.dnit.gov.br/ipr/rog_a_licitar.htm
www.crea.rs.org.br/jornal/69/geral_09.htm
www.abrati.org.br/pub/revista/materia.asp
2.
www.dnit.gov.br
3
Sistema SICRO 2 – Sistema de Custos Rodoviários, informativo região centro-oeste – maio 2003.
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material explicando todo o processo de fabricação, distribuição, aplicação e preço do
asfalto borracha produzido por aquela estatal e comercializado no Brasil. Consultamos,
ainda, a Centro-Oeste Asfaltos e, em inspeção no DER. solicitamos esclarecimentos
técnicos complementares sobre o Edital em apreciação.
Da análise desse significativo material, fazemos as seguintes considerações gerais
sobre o asfalto borracha:
O QUE É: O asfalto borracha é um asfalto modificado por borracha moída
de pneus. Além de ser uma forma nobre de dar destino aos pneus inservíveis,
resolvendo um grande problema ecológico, o uso de borracha moída de pneus
no asfalto melhora em muito as propriedades e o desempenho do revestimento
asfáltico.
COMO APLICAR:
pavimentação.
É
aplicado
por
equipamentos
convencionais
de
ONDE APLICAR: É recomendado para aplicações que requeiram do ligante
asfáltico um desempenho superior, alta elasticidade e resistência ao
envelhecimento, tais como revestimentos drenantes, SMA (Stone Mastic
Asphalt), camadas intermediárias de absorção de tensões, camadas antireflexão de trincas e outras
VANTAGENS: Alta elasticidade; alta resistência ao envelhecimento; alta
coesividade; excelente relação custo/benefício; melhor comportamento em
altas e baixas temperaturas e maior flexibilidade. Também se verifica a redução
do efeito spray nos dias de chuva, redução do nível de ruídos e maior
aderência pneu-pavimento.
PROCESSOS: Via seca (dry process) requer que a borracha moída seja
misturada aos agregados previamente à mistura com o asfalto.
Via úmida (wet process) requer que a borracha moída seja misturada ao asfalto
quente previamente à mistura do asfalto com os agregados.
O processo de incorporação da borracha ao asfalto, por via úmida (WET
PROCESS), especificado no edital, pode dar-se de duas formas:
1º - NO PARQUE INDUSTRIAL DA EMPRESA:
Ex. 1 - PETROBRÁS:
O processo de incorporação da borracha é realizado em unidades industriais, em
reatores pressurizados e com controle de temperatura, processo este consagrado
mundialmente. Devido à incorporação ocorrer dentro de uma planta industrial, todas as
variáveis do processo são muito melhor controladas do que em uma mistura feita em
canteiro de obras ou usinas4. O asfalto de borracha é posteriormente transportado até a
usina de asfalto por meio de carretas apropriadas para tal, providas de misturadores
horizontais em toda a sua extensão movidos por motores especiais (propulsor e
hidráulico) com caixa de transmissão. Possuem também serpentinas especiais para
suportar aquecimentos a temperaturas elevadas de forma contínua e adequada para seu
transporte, de forma que o ligante possa chegar à usina de asfalto pronto para a sua
usinagem com o CAP 20 (massa asfáltica final). Esses veículos são de propriedade da
4
Fonte: Petrobrás
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transportadora, cujo frete já se encontra embutido no preço final do produto. Essa
tecnologia nacional foi desenvolvida pela Petrobrás no Centro de Pesquisa e
Desenvolvimento Leopoldo A. Miguel de Mello (CENPES), já tendo sido comercializados
2.000 t. de CAPFLEX-B (asfalto borracha). Este já foi aplicado nos seguintes trechos:
SP 75 Rodovia Santos Dumont – 800 m. Massa Asfáltica tipo SMA;
Acesso ao aeroporto do Galeão Rio de Janeiro/RJ – 350 m – Massa Asfáltica tipo
CBUQ faixa C-DNIT;
SP-191 Concessionária Intervias – 1600 m – Massa asfáltica com granulometria
descontínua (GAP GRADED);
Avenida L4 sul, Brasília-DF – 400 m de tratamento superficial duplo;
Rodovia Anhangüera SP 330, Araras/SP a Rio Claro /SP – 3.300m (GAP GRADED);
SP 147 – Concessionária Intervias Limeira/SP e Engenheiro Coelho/SP 10.000m
(GAP GRADED).
Ex. 2 - CENTRO-OESTE ASFALTOS
Também fabrica o produto em sua planta em Igarapé-Minas Gerais, a 26 Km da
refinaria Gabriel Passos, sob a denominação de CAPBORRACHA 5. O transporte é feito
por carretas térmicas, com dispositivo para aquecimento e circulação do produto com
entrega no local da obra. A capacidade de produção diária é de 150 t. Já foram realizados
os seguintes trechos:
06 (seis) km na BR251-GO
70 Km na BR 070 (em execução)
trecho experimental de 1 Km na Av. das Nações, Brasília – DF
2º - NA PRÓPRIA USINA DE ASFALTO (IN LOCO) – WET PROCESS
Edital do DER
O processamento do ligante pode ocorrer na própria usina de asfalto
convencional, por meio de equipamentos sofisticados de tecnologia estrangeira e
instalados no canteiro de obra. Ainda não foi testada em nenhuma obra no Brasil, embora
largamente utilizada, em especial, nos EUA. Portanto, as empresas brasileiras não
realizaram obra com esta tecnologia específica de processamento do asfalto borracha in
loco. O edital de licitação assim dispõe sobre o citado processamento:
a) a borracha granulada deve vir condicionada em embalagens de transporte e o
dispositivo para a sua distribuição e adição ao ligante asfáltico de constituição deve
ser dotado de sistema eletrônico de pesagem, com emprego de células de carga,
capazes de proporcionar a dosagem correta da quantidade de borracha preconizada
para a constituição do asfalto modificado com borracha (AMB);
b) numa primeira etapa, a ser realizada junto à usina de asfalto instalada no
canteiro de obras, a mistura do ligante asfáltico com borracha reciclada deve ser
obtida a partir da aplicação de uma energia mecânica capaz de promover uma
perfeita miscigenação do asfalto com borracha. O dispositivo de misturação, para além
de apresentar elevada potência cisalhante, deve ser hermeticamente acondicionado,
5
Fonte: Centro Oeste Asfaltos
75
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de forma a propiciar a elevação da temperatura do asfalto-base até cerca de 200 a
210º sem que se processe perda das qualidades originais do ligante asfáltico;
c) em uma segunda etapa, também a se processar junto à usina de asfalto
instalada no canteiro de obras, deve se processar a modificação físico-química do
cimento asfáltico de constituição pela incorporação de borracha reciclada através de
reação por aquecimento (fusão), a ser obtida à temperatura da ordem dos 200-210ºC.
Esta operação de modificação das características reológicas do asfalto-base através
de sua fusão a quente com borracha reciclada de pneus, traduzida por reação química
capaz de garantir a fixação dos maltenos componentes das frações voláteis e
aromáticas do CAP; deve ser ainda auxiliada por um sistema de agitação mecânica
com tempo de atuação não inferior a 45 minutos;
d) o novo ligante (asfalto modificado com borracha) deve ser armazenado
sob condições especiais a temperaturas elevadas (185 a 190º); para a
transferência direta do AMB para a usina de asfalto deve se dispor de um sistema
servo-hidráulico compatível com a viscosidade do AMB, com potência ajustável
eletronicamente de forma a permitir a injeção prevista na mistura asfáltica final. (grifo
nosso)
O edital do DER especifica o produto asfalto modificado de borracha – AMB - pelo
wet process e de acordo com a norma da AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND
MATERIALS – designação D-6114-97, de onde foram extraídos para integrarem o edital
os requisitos para o ligante asfáltico modificado com borracha. É de se destacar que essa
norma americana estabelece a especificação do produto em questão, porém em nenhum
momento destaca que o seu processamento deve-se dar no local da obra, conforme
exigência do edital em apreço. Destaca sim, as propriedades finais que o asfalto
borracha deve atingir por meio de ensaios. Não existe norma técnica brasileira dispondo
sobre o assunto.
Importante registrar que, a despeito dos diferentes processos de fabricação do
ligante, na fábrica ou no local da usina de asfalto, os estudos técnicos realizados, bem
como as informações prestadas pelas empresas consultadas, apontam para a assertiva
de que o processo de incorporação da borracha ao asfalto, por via úmida (wet process)
realizado no parque industrial das empresas que o efetivam, atende ao controle de
qualidade exigido como resultado final da obra para o asfalto-base. Ou seja, os seus
respectivos ligantes asfálticos modificados com borracha (capflex-B e capborracha)
atendem aos mesmos requisitos técnicos do produto AMB wet process ASTM 6114
especificado pelo DER. Mais, as empresas sondadas afirmam que suas escalas de
produção estão aptas a fornecer de imediato o quantitativo de material exigido no edital
no prazo estipulado.
Outro fator a ser analisado diz respeito ao custo de cada um desses ligantes.
DER
Produto: AMB Wet process ASTM 6114
Preço: R$ 2.623,00/ t (ref. Edital = maio de 2003)
Obs. Incluso custo do equipamento para produção do ligante na obra.
PETROBRÁS
Produto: CAPFLEX-B
Preço: R$ 1.534,08/ t (preço de tabela – 18/08/03)
Obs. Incluso frete, posto Brasília.
CENTRO-OESTE ASFALTOS
Produto: CAPBORRACHA
Preço: R$ 1.580,00/t (preço de tabela- 18/08/03)
Obs. Incluso frete, posto Brasília.
76
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Da análise dos citados processos de fabricação do ligante, a questão primordial
concentra-se na diferença de seus preços. O asfalto borracha já processado pode ser
encontrado ao preço de R$ 1.534,08/ t. (Petrobrás - 18.08.03). O mesmo produto
processado em obra está cotado no edital a R$ 2.623,00/t. Assim sendo, a cotação do
DER é 70,9% maior do que a da estatal brasileira.
Considerando-se as tabelas de fornecimento de materiais betuminosos, constata-se a
seguinte situação:
Processamento do ligante na obra
Lote 1 - Balão do aeroporto- rodoviária
Preço do lote: R$ 10.093.564,44 (fl. 100)
Ref. Maio de 2003
SERVIÇO
AMB
PROCESS
6114
UNID.
WET
ASTM
t
QUANT.
2.011,840
PREÇO UNIT.
2.623,00
TOTAL
5.277.056,32
% S/ PREÇO
DO LOTE
52,2
Processamento do ligante na obra
Lote 2 - Rodoviária- Balão do Torto
Preço do Lote: R$ 10.364.887,20
Ref. Maio de 2003
SERVIÇO
AMB
PROCESS
6114
UNID.
WET
ASTM
t
QUANT.
PREÇO UNIT.
2.086,230
2.623,00
TOTAL
5.472.181,29
% S/ PREÇO
DO LOTE
52,7
Ligante da Petrobrás
Lote 1 - Balão do aeroporto- Rodoviária
Preço do LOTE: R$ 7.902.831,62
Ref: 18/08/03
SERVIÇO
CAPFLEX-B
UNID.
t
QUANT.
2.011,840
PREÇO UNIT.
1.534,08
TOTAL
3.086.323,50
% S/ PREÇO
DO LOTE
39
Ligante da Petrobrás
Lote 2 - Rodoviária- Balão do Torto
Preço do LOTE: R$ 8.183.149,62
Ref: 18/08/03
SERVIÇO
CAPFLEX-B
UNID.
t
QUANT.
2.086,23
PREÇO UNIT.
1.534,08
TOTAL
3.200.443,71
% S/ PREÇO
DO LOTE
39
Das tabelas acima, verifica-se que substituindo o preço do ligante da Petrobrás nos
dois orçamentos do DER, permanecendo inalterados os demais itens, resultaria a licitação
no preço global estimado de R$ 16.085.981,24, representando 27% a menos que o preço
constante do edital de R$ 20.458.451,64.
77
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Salientamos, ainda, o DER não demonstrou a composição de custos do preço do
ligante AMB WET PROCESS ASTM 6114, no valor de R$ 2.623,00/t. Foi argumentado
apenas que esse valor originou-se da aplicação do percentual de 80 a 90% sobre o CAP
20 e que essas referências de custos para o AMB foram buscadas junto ao DNIT. No
entanto, essa informação quanto à fonte de referência, além de não ter sido comprovada,
não procede, pois foi levantada por esta Divisão Técnica a inexistência de qualquer
cotação no Sistema SICRO II/DNIT do referido material. Ademais não foi encaminha a
proposta de preços da empresa que atendeu ao pedido do DER.
É de se ressaltar que, independente do processo de fabricação do ligante, os
processos de usinagem (adição do ligante ao CAP20) e aplicação do asfalto borracha
utilizam basicamente os mesmos procedimentos e equipamentos do asfalto convencional,
com as adaptações já previstas no edital. Assim, qualquer empresa que tenha capacidade
técnica adquirida em obras de pavimentação com asfalto convencional e que tenha
capacidade operacional para atender ao porte da obra em questão poderia participar
dessa licitação, não fosse a obrigatoriedade de se processar o ligante na obra, como
especificado no edital. Citamos como exemplo desse procedimento a Concessionária de
Rodovias Intervias, que tem adquirido o ligante (capflex-B e Ecoflex-A) no mercado
brasileiro e utiliza usina de asfalto de empresa de pavimentação nacional para o seu
processamento e aplicação. A diferença entre esse procedimento e o disposto no edital
está na opção da empresa em adquirir o ligante já pronto e a partir daí adicioná-lo ao
asfalto convencional para sua aplicação. Ao optar pela aquisição do ligante em mercado
próprio, a Concessionária mencionada se desonerou da aquisição de equipamento
estrangeiro para fabricação do ligante in loco, reduzindo e otimizando os recursos
financeiros para a conservação das rodovias. Considerando que o produto final, asfalto
borracha, atinge a mesma característica, ou seja, alcança as mesmas propriedades
especificadas na já mencionada norma americana traduzidas para o edital do DER, o que
definirá a opção do adquirente do serviço de restauração de pavimentos com a utilização
do asfalto borracha, por um ou outro processo, será a disposição em diminuir ou não o
seu custo/ Km pavimentado.
Feitas estas considerações técnicas, importante reforçar que o asfalto de borracha é
uma tendência mundial com forte apelo em termos de preservação ambiental.
O DER exaltou as vantagens técnicas, econômicas e ambientais do asfalto borracha.
No entanto, ao afirmarem que a tecnologia de fabricação do asfalto borracha é ainda
incipiente no Brasil, desconsideram o atual estágio de desenvolvimento tecnológico das
indústrias nacionais que atuam na área, pois verifica-se que as empresas brasileiras
consultadas, Petrobrás e Centro-Oeste Asfaltos, demonstram ter domínio de tecnologias
próprias de incorporação da borracha ao asfalto e que já se encontram operando com
êxito no mercado junto às empresas privadas, em especial as concessionárias de
rodovias. Apenas no setor público pode-se falar no pioneirismo do emprego de asfalto
borracha modificado para pavimentação. Quanto à questão de sua aplicação, a
metodologia segue a do asfalto convencional qualquer que seja a forma de
processamento do ligante, como já explicado.
Não obstante, quanto aos aspectos legais e técnicos que envolvem a presente
análise, entendemos que a especificação de um único processo de fabricação do ligante,
na forma disposta no edital, impedirá a participação de empresas licitantes nacionais
ou estrangeiras que não estejam dispostas a mobilizar recursos para a aquisição
dos equipamentos de alto custo necessários ao processamento do ligante na
própria usina de asfalto convencional, mas que optem pela aquisição do ligante na
forma processada, disponível no mercado nacional, produzindo o mesmo resultado
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final de asfalto borracha, a despeito do local de sua fabricação. Ademais, os preços
do asfalto borracha pesquisados junto à Petrobrás e Centro-Oeste Asfaltos demonstram,
inclusive, que essa opção poderá reduzir o custo final da obra sem prejuízo da qualidade
do asfalto, vez que não serão computadas nos orçamentos as despesas com a
importação do equipamento ―sistema servo-hidráulico‖ para a transformação do asfalto na
obra. Assim, entendemos que o DER deve retirar do edital toda referência à forma como o
ligante deverá ser processado, por ser irrelevante para a qualidade final do objeto do
contrato, ou se preferirem, acrescentar a possibilidade de aquisição do ligante já
processado no mercado, além do fabricado in loco, permanecendo como especificação
as propriedades finais desejadas para o asfalto, a serem comprovadas pelos ensaios de
prova já previstos no edital.
Outro ponto a ser analisado no edital diz respeito à exigência de habilitação relativa
à qualificação técnica. O edital faz as seguintes exigências:
3.5.1.3 Habilitação relativa à qualificação técnica
(...)
c – Comprovação do Responsável Técnico da licitante ter executado a qualquer
tempo, serviços de obras rodoviárias (ou de obras similares) compatíveis com o objeto
da licitação, através de certidão(ões) e/ou atestado(s), em nome do próprio RT,
fornecido por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente
regularizados no CREA, conforme legislação pertinente em vigor, obedecendo, para
as parcelas de maior relevância, que deverão estar explicitadas conforme constante a
seguir para cada lote:
Lotes 1 e 2
1. Pavimentação;
2. Execução de pavimentação com aplicação de Membrana Intermediária de Tensões –
(MIAT), fabricada com asfalto modificado em borracha (AMB) atendendo à especificação
ASTM-D-6114/97(2002);
3. Execução de pavimento com Concreto de Asfalto-Borracha Usinado a quente
(CABUQ) com granulometria aberta com ou descontínua composto em asfalto
modificado com borracha (AMB) atendendo à especificação ASTM-D-6114/97 (2002).
d- Comprovação da licitante ter executado, a qualquer tempo, serviços de obras
rodoviárias (ou de obras similares) compatíveis com o objeto desta licitação, através de
certidões ou atestados, em nome da própria licitante, fornecido por pessoas jurídicas de
direito público ou privado, devidamente regularizados no CREA, conforme legislação
pertinente, para todos os serviços listados a seguir, as quantidades mínimas (sendo que
no(s) atestado(s) deverão constar a execução de todos os serviços listados na tabela
seguinte), que deverão estar explicitadas conforme constante da lista a seguir:
Item
1
2
3
Fabricação de ligante
asfáltico
modificado
com borracha (AMB)
por via úmida(WETPROCESS)-ASTM-D6114/97(2002) (t)
Execução de pavimento com membrana
intermediária de absorção de tensões com
uso de asfalto modificado com borracha
(AMB) por via úmida (wet process)-ASTM2
D-6114/97(2002) m
Execução de pavimento com
concreto
de
asfalto-borracha
usinado
a
quente
com
granulometria
aberta
e/ou
3
descontínua.CABUQ (m )
1
1005
42096
1254
2
1043
43263
1305
Lote
79
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d1- Nos atestados de CABUQ com quantidades em tonelada, caso não conste o peso
específico, será adotado o valor de 2,1 t/m3 para o CABUQ com granulometria aberta e
será adotado o valor de 2,3 t/m3 para o CABUQ com granulometria descontínua.
d2- deverá ser preenchido e apresentado o QUADRO 12, intitulado “Relação dos
Serviços Executados pela Proponente Compatíveis com o objeto da Licitação”
constante do Anexo VI;
d3 – a(s) certidão(ões) e/ou atestados apresentado(s) deverá(ão) conter as seguintes
informações básicas:
Nome do contratado e do contratante;
Identificação do contrato (n.º do contrato e tipo ou natureza da obra;
Localização da obra (rodovia, trecho, subtrecho, extensão);
As quantidades e unidades;
Especificamente os nomes dos serviços indicados no quadro de quantidades mínimas.
e- relação dos principais itens de equipamentos que serão utilizados na execução da obra,
conforme exigido na Relação de Equipamento Mínimo constante do Termo de
Referência (Anexo III), mediante o preenchimento do Quadro 11 constante do Anexo VI;
f- declaração formal de disponibilidade de instalações e dos equipamentos técnicos
adequados para a realização do objeto da licitação, em conformidade com as
disposições contidas neste Edital;
g- relação de equipe técnica mínima, conforme constante no Termo de referência (Anexo
III), proposta para os serviços e as respectivas fichas curriculares e atestados técnicos dos
técnicos de nível superior em conformidade com o QUADRO 13, que se responsabilizarão
pelos trabalhos. Será verificada pelo DER/DF a compatibilidade da documentação
apresentada com o objeto deste Edital, especialmente no que tange à execução de
obras com concreto de asfalto-borracha usinado a quente (CABUQ) composto com
granulometrias aberta e/ou descontínua e com Membrana Intermediária de Absorção
de Tensões (MIAT). Os técnicos indicados pela licitante deverão participar da obra objeto
desta licitação, admitindo-se a substituição por profissionais de experiência equivalente ou
superior, desde que aprovada pela administração;
h- (...)
i- Termo de Compromisso de Fornecimento de Borracha granulada reciclada de Pneus,
que atenda às especificações técnicas constantes nos Projetos de Engenharia e às
especificações ASTM-D-97 e ASSHTO-T255, por empresa beneficiadora de borracha,
que comprove concomitantemente a capacidade de produção compatível com o objeto e
com o prazo de execução previstos neste edital;‖
O DER, em documentação colhida em inspeção às fls. 208/209
exigências da seguinte forma:
fundamenta essas
CAPACITAÇÃO TÉCNICA: a tecnologia a ser adotada na obra é inédita no
âmbito do DF como também no Brasil. O DER/DF através de sua área técnica vem
buscando em todo o mundo informações e especificações para o emprego da
tecnologia Asfalto-Borracha, tendo assim, alcançado capacitação para especificar o
emprego desta tecnologia em suas obras. Desta forma, na outra ponta do processo
será exigido, da empresa que venha a ser contratada, um grau mínimo de experiência
e conhecimento da tecnologia. A exigência de qualificação técnica das empresas
passa desta forma a ter peso dobrado, em função das exigências do DER/DF no que
se refere à qualidade dos serviços e ao atendimento das normas técnicas assim como
o ineditismo da tecnologia a ser empregada. O DER/DF deve exigir, s.m.j., a
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experiência anterior da licitante como forma de garantir que esta domina a tecnologia a
ser empregada nesta obra.
GARANTIA DE QUALIDADE: a busca pela qualidade deve nortear as ações da
administração pública principalmente quando esta emprega seus recursos. A
exigência de execução anterior de serviços semelhantes aos que serão executados
nos futuros contratos é uma forma de garantir a qualidade da obra, uma vez que a
futura contratada já os realizou em outros empreendimentos, inclusive com quantidade
aproximadas, o que garante também que a futura contratada possui capacidade
logística para a realização de empreendimentos deste porte. O DER/DF deve exigir,
s.m.j., a experiência anterior da licitante como forma de garantir a maior qualidade do
objeto a ser contratado, o que conforme já foi mencionado anteriormente é
fundamental face ao ineditismo da tecnologia a ser adotada nas obras."
De fato, no Brasil o processamento do asfalto borracha em obra nunca foi utilizado
nem mesmo pelo setor privado. Assim, levando-se em consideração essa determinação
do edital, as empresas licitantes serão obrigadas a importar esse equipamento e estar
aptas a sua operacionalização se quiserem participar do certame e estarão impedidas de
apresentar outra solução técnica disponível. Ressalta-se mais uma vez que, após o
processamento do ligante, as fases subseqüentes de mistura com o CAP 20 (usinagem
do asfalto) e aplicação seguem o padrão convencional. Mas por que essa imposição no
edital de se fabricar o ligante in loco, quando essa decisão deve ser do licitante? Esse sim
é que deverá avaliar os reflexos de sua opção no seu orçamento, processar o ligante na
obra ou comprá-lo pronto no mercado nacional, para atender ao resultado final esperado
pelo DER: um asfalto de borracha com determinadas propriedades que atendam ao
controle de qualidade especificado no edital. E nesse caso, a escolha será pelo
procedimento que lhe possibilite ser a vencedora do certame, com o melhor preço e
atendimento de todas as exigências técnicas. Com essa abertura de alternativas técnicas,
a administração pública só tem a se beneficiar, pois só assim será atendido o art. 3º da
Lei das Licitações.
As exigências de habilitação técnica dispostas no edital implicam que somente
empresas e profissionais que já tenham executado obras de pavimentação com asfalto
borracha, cujo ligante tenha sido processado na obra, possam participar da
licitação. Essa situação de imediato exclui a possibilidade de empresas nacionais
que não estejam consorciadas com empresas estrangeiras, ou que não possuam
em seus quadros responsável técnico que tenha executado serviço semelhante no
exterior, de participarem do procedimento licitatório, pois nenhuma obra pública com
essa característica foi realizada em território nacional. Assim, o edital, na prática, só
possibilitará a participação de empresas nacionais consorciadas a estrangeiras. Mesmo
que alguma empresa brasileira admitisse participar da licitação, o seu preço, por ter que
embutir o imobilizado com equipamento, já seria desvantajoso em relação às empresas
estrangeiras, que já possuam o equipamento necessário para a execução do ligante no
local da obra e que já venham amortizando os custos dessa imobilização ao longo de
outras obras realizadas no exterior.
Importante relembrar que, obtido o ligante, qualquer empresa com experiência em
pavimentação com asfalto convencional, consolidada no mercado, com estrutura
operacional compatível com as características da obra, independente de já ter aplicado
anteriormente o asfalto borracha, poderia participar da licitação, pois o processo de
mistura deste ligante ao CAP 20 e sua aplicação se dá tal qual no processo convencional,
observadas as peculiaridades dispostas no edital. Assim, não faz sentido o DER
estabelecer exigências tão restritivas de qualificação técnica impedindo a participação de
empresas nacionais, que mesmo que estejam realizando uma primeira obra com a
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aplicação do
asfalto borracha, têm plena condição de atender aos resultados
pretendidos, especialmente se adquirirem o ligante já processado, possivelmente por um
menor preço do que o cotado no edital. Aliás, o produto nacional e a sua aplicação já
foram testados pelas concessionárias de rodovias privatizadas, empresas que primam
pela qualidade dos serviços e durabilidade do asfalto, pois visam antes de mais nada o
lucro.
Assim, como já exposto, considerando que há outras formas de se processar esse
ligante, entendemos que além das do me já foi sugerido anteriormente, deve o DER
retificar no edital o item 3.5.1.3 Habilitação relativa à qualificação técnica, excluindo
qualquer referência à necessidade de comprovação de execução de asfalto borracha e
membrana intermediária de absorção de tensões pela empresa ou profissional, e aos
quantitativos mínimos inerentes a esse tipo de obra, compromisso de disponibilização de
equipamentos e borracha moída para processamento do ligante in loco, pois essa
disposições igualmente restringem a participação de empresas nacionais
amplamente capacitadas a participarem do processo licitatório.
Do ponto de vista da Lei nº 8.666/93, o edital contraria o seu art. 3º , § 1º em que:
É vedado aos agentes públicos:
I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou
condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e
estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou
domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou
irrelevante para o específico objeto do contrato. (grifo nosso)
Jessé Torres Pereira Júnior6 assim define o caráter da norma: O inciso reveste-se de
caráter geral por desdobrar-se dos princípios da isonomia (universal) e da competitividade
(específico), cuja desconsideração é vedada aos agentes públicos. O que se observa
claramente no presente edital é uma preferência por determinado processo técnico para o
processamento do ligante em detrimento de outros disponíveis no mercado, fato que é
irrelevante para o resultado final da obra, que é o asfalto borracha com determinadas
propriedades previamente estabelecidas no edital, e que acaba por restringir o caráter
competitivo do certame.
Portanto, conclui-se que se permanecer o edital na forma apresentada,
possivelmente ocorrerá o monopólio da execução de qualquer serviço de pavimentação
com asfalto de borracha, processado em obra, no Distrito Federal.
Feitas as considerações técnicas e legais, sugerimos ao Tribunal que:
I – tome conhecimento:
a) o edital de licitação da Concorrência Internacional n.º 07/03 e anexos;
b) do resultado da inspeção realizada no DER;
c) dos documentos de fls. 127/233;
II – com fundamento no art. 45 da Lei Complementar nº 01/94, determine
ao DER, no tocante à CI em comento, a adoção de medidas imediatas
tendentes ao exato cumprimento da lei, consistente na retificação do edital,
tendo em vista prever dispositivos que contrariam os termos do art. 3º,§ 1º da
Lei nº 8.666/93, quais sejam:
6
JÚNIOR, Jessé Torres Pereira. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública .5ª
ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro, Renovar, 2002, p.56.
82
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a) retirar toda referência à forma como o ligante deverá ser processado
por ser irrelevante para a qualidade final do objeto do contrato, ou se
preferirem, acrescentar a possibilidade de aquisição do asfalto borracha já
processado no mercado, além do fabricado in loco, permanecendo como
especificação as propriedades finais desejadas para o asfalto, a serem
comprovadas pelos ensaios de prova já previstos no edital;
b) retificar no edital o item 3.5.1.3 Habilitação relativa à qualificação
técnica, excluindo qualquer referência à necessidade de comprovação de
execução de asfalto borracha e membrana intermediária de absorção de
tensões pela empresa ou profissional, e aos quantitativos mínimos inerentes a
esse tipo de obra, compromisso de disponibilização de equipamentos e
borracha moída para processamento do ligante in loco, pois essas disposições
restringem a participação de empresas nacionais amplamente capacitadas a
participarem do processo licitatório;
III - autorize o encaminhamento de cópia desta instrução como subsídio
no cumprimento do item anterior;
IV - determine a remessa de cópia do novo edital para análise tão logo
sejam feitas as correções;
V - reabra o prazo da licitação nos termos do art. 21, § 4º, da Lei nº
8.666/93;
VI - autorize o retorno dos autos à 3ª ICE para fins de acompanhamento.
83
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ADMISSÃO DE PESSOAL*
Márcia de Melo Pereira Tiscoski
Analista de Finanças e Controle Externo do TCDF
No 2º trimestre de 2003, a 4ª Divisão Técnica da 4ª Inspetoria de Controle Externo
realizou inspeção na Secretaria de Fazenda do Distrito Federal para análise dos atos de
admissão de pessoal efetuados pelo Decreto de 28.06.2002, decorrentes do concurso
público para o cargo de Auditor Tributário da Carreira Auditoria Tributária, integrante do
Quadro de Pessoal do DF, normatizado pelo Edital nº 228/93-IDR.
Apesar de o prazo de validade do certame ter esgotado em 07.01.96, a questão da
extemporaneidade das nomeações restou superada diante da decisão judicial proferida
pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça nos autos do Recurso Especial nº 174.291/DF, que
anulara duas questões da prova de Contabilidade. Assim, as nomeações, em 2002,
decorreram de nova ordem classificatória do resultado final do concurso público para o
cargo de Auditor Tributário, haja vista que a anulação de questões de prova gerou a
conseqüente atribuição de pontos a todos os candidatos que não os haviam obtido
quando da correção inicial das provas.
Importa trazer à colação a situação de determinado servidor nomeado pelo já citado
Decreto de 28.06.02, que, no momento da posse, declarou ser aposentado do Banco do
Brasil, percebendo os decorrentes benefícios pela Caixa de Previdência dos Funcionários
do Banco do Brasil - PREVI.
Tornou-se imperiosa a necessidade de verificar se se tratava de acumulação
inconstitucional de benefício previdenciário com a remuneração do cargo de Auditor
Tributário, ante as novas regras impostas pela Emenda Constitucional nº 20/98.
In casu, o servidor é beneficiário do INSS, a ele não se aplicando a regra do artigo
37, § 10, da Magna Carta (com a redação dada pela EC nº 20/98), que assim estabelece:
É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes
do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função
pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos
eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
O dispositivo transcrito tornou expressa a proibição de percepção simultânea de
proventos de aposentadoria decorrentes do artigo 40 (servidores civis), do artigo 42
(militares dos Estados, Distrito Federal e Territórios) e do artigo 142 (membros das Forças
Armadas) com a remuneração de cargo, emprego ou função pública.
O servidor em questão não percebe proventos decorrentes dos artigos 40, 42 ou 142
da CF. Percebe, sim, benefício previdenciário, eis que, quando de sua transferência para
a inatividade, operou-se a extinção de seu contrato de trabalho com o Banco do Brasil,
desvinculando-se completamente da Administração, a teor do disposto no artigo 453 da
CLT. E é a própria Lei Maior que determina sua sujeição ao regime geral de previdência
social, de caráter contributivo e em tudo igual ao regime do trabalhador privado, na forma
* Tese apresentada no Precesso-TCDF nº 7.526/93 aprovada pela Decisão nº 3.834/03 e revista pela Decisão nº
6.844/03
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do artigo 201 e seguintes. Repita-se que esses empregados não se sujeitam ao regime
previdenciário próprio do servidor público, previsto no artigo 40 da CF.
O empregado público que se aposenta pelo regime geral de previdência social
rompe o vínculo empregatício com a Administração, diferentemente do servidor público,
que mantém a condição de servidor inativo, embora se afaste do cargo.
O caso ora em estudo refere-se à admissão no cargo público de Auditor Tributário
de ex-empregado do Banco do Brasil sujeito às normas celetistas, que, por força de
aposentadoria, teve seu contrato de trabalho extinto. A acumulação que se verifica
decorre da percepção de remuneração de cargo público com benefício previdenciário,
hipótese não contemplada pelo § 10 do artigo 37 da CF. Não se verifica, no caso,
percepção simultânea de proventos de aposentadoria (típicos de servidores públicos
regidos pela Lei nº 8.112/90) com remuneração de cargo público efetivo.
É oportuno trazer à aplicação o princípio geral de direito segundo o qual exceptiones
sunt strictissimae interpretationes, ou seja, as normas que restringem o exercício de
direitos devem ser interpretadas restritivamente. Para se chegar às conclusões ora
firmadas, foi necessário partir de uma acurada interpretação da tão falada norma
acrescentada pela EC nº 20/98 (artigo 37, § 10), por meio da qual não se deve
acrescentar restrições onde o legislador não as quis contemplar.
O Colendo Tribunal de Contas da União, em decisão publicada no DOU de 02.07.02
(Decisão nº 295/02), considerou legal concessão de aposentadoria de servidor público
que já se encontrava inativado pelo regime geral de previdência social. Considerando
decisões judiciais do TJDFT, do TST, do STJ e do STF, o preclaro Relator do feito,
Ministro Benjamim Zymler, trouxe fundamentos que aclaram qualquer dúvida que possa
advir da interpretação das regras de acumulação previstas na Constituição Federal. Trazse à baila, a seguir, excerto de seu acertado voto, que contempla situação similar à
versada no presente estudo.
(...) ao aposentar-se, o empregado celetista rompe definitivamente os laços que
o atavam à Administração e passa a receber benefício previdenciário como qualquer
outro trabalhador. Frise-se que esse benefício não decorre do antigo emprego, nem
vincula-se diretamente ao salário outrora percebido - como ocorre na hipótese de
proventos em relação à remuneração do cargo efetivo. Vincula-se, sim, às regras da
Previdência Social, que atingem indistintamente empregados do setor privado ou da
Administração Pública. Tanto faz, nesse caso, que o trabalhador, no momento da
aposentação, fosse empregado de um ou de outro.
Em sede de Apelação Cível (APC 2000.01.1.030430-4), o TJDFT entendeu pela
possibilidade de acumulação de vencimentos de cargo público de professor com benefício
de aposentadoria paga pelo INSS a ex-servidor celetista do BANESPA. O respectivo
acórdão, abordado no voto do Ministro Benjamim Zymler, fora assim ementado:
Administrativo e constitucional - Cautelar inominada - Acumulação de benefício de
aposentadoria paga pelo INSS com os proventos pelo exercício de cargo público professor da FEDF - Possibilidade.
1. Não há óbice na Constituição Federal ao recebimento de proventos pelo INSS, a exservidor celetista, juntamente com vencimentos decorrentes do exercício de cargo,
emprego ou função pública exercido junto à Fundação Educacional do Distrito Federal.
Sentença reformada para se julgar procedente o pedido cautelar, com a autorização
da acumulação de vencimentos e proventos até a apreciação do mérito da ação
principal.
2. Recurso conhecido e provido. Unânime.
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O preclaro Ministro transcreveu trecho do voto proferido pela Desembargadora Maria
Beatriz Parrilha na citada Apelação Cível, que, com muita clareza, aborda a questão, in
verbis:
(...) a Carta Magna, em sua redação primitiva, não estabeleceu óbice à
percepção simultânea do benefício da aposentadoria a ex-servidor público pago pelo
INSS, e de remuneração pelo exercício de cargo, emprego ou função pública.
Destaco que este entendimento vem reforçado pelo disposto no artigo 37, § 10,
da Constituição Federal, com a redação conferida pela EC nº 20/98. A acumulação de
vencimentos decorrentes do exercício de função pública com benefício pago pelo
INSS a ex-servidor público é admitida.
É inaplicável as normas do artigo 40 da Constituição Federal aos servidores
públicos celetistas, submetidos ao regime geral de previdência social estabelecido
pelo artigo 201 e seguintes da Carta Federal.
Vale dizer, a vedação constitucional de acumulação de proventos com
vencimentos ou salários decorrentes do exercício de cargo, função ou emprego
público quando não acumuláveis na atividade, não se estende aos servidores inativos
que percebem o benefício da aposentadoria paga pelo INSS.
Ademais, a promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98 não tornou
prejudicadas tais conclusões. Destas, resultam que o apelante sempre se encontrou
em situação regular, no que tange à percepção cumulativa de vencimentos pelo
exercício do cargo de professor da FEDF, e de proventos percebidos pelo INSS, que
exerceu sob o regime da CLT junto ao BANESPA.
A Emenda Constitucional nº 20/98 acrescentou o § 10 ao artigo 37 (...), sem
mencionar as aposentadorias percebidas com base nos artigos 201 e seguintes, todos
da Constituição Federal.
Tal circunstância constitui outro argumento em favor da inexistência de óbice
constitucional à acumulação de benefício de aposentadoria paga pelo INSS a exservidor público com salários ou vencimentos pagos pelo exercício de cargo, emprego
ou função pública.
O Ministro Benjamim Zymler acrescenta que:
a expressão "proventos" é sempre usada no texto constitucional para designar o
pagamento de aposentadoria decorrente de exercício de cargo público. A Constituição
atual, quando se refere ao regime geral, faz uso do termo "benefício". (...) Por certo
que o valor da aposentadoria recebida pelo ex-empregado, vinculado ao regime geral
de previdência, não guarda relação direta com o posto outrora ocupado, mas somente
com os valores do salário de contribuição, como qualquer empregado de empresa
privada. Tampouco está sujeito a variação em função de melhorias concedidas aos
empregados "ativos".
Além das normas constitucionais de aposentadoria para os servidores públicos
previstas no artigo 40, também rege o instituto a Lei nº 8.112/90. Da leitura do normativo,
é inequívoco que a expressão 'proventos' refere-se tão somente ao servidor público,
que, quando se aposenta, mantém a mesma condição de servidor público, porém
aposentado.
Após a EC nº 20/98, é raridade encontrar julgados que se detenham
minuciosamente sobre a acumulação de benefício previdenciário com o exercício de
cargo público. O Colendo TCU esmiuçou o assunto e concluiu pela licitude de dita
acumulação. No âmbito dos Tribunais Superiores, encontra-se jurisprudência sobre a
impossibilidade de acumulação de proventos (aqui entendidos como a remuneração do
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servidor público inativo) com vencimentos de cargo público, podendo ser invocada, a título
de exemplo, a ementa do AROMS nº 13.123, julgado pelo STJ (DJU de 22.04.03):
Servidor. Agravo regimental. Recurso em mandado de segurança. Aposentadoria.
Professora. Acumulação com vencimentos de outro cargo. Emenda Constitucional nº
20/98. Impossibilidade.
- A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, em consonância com o
pensamento consagrado pelo Supremo Tribunal Federal, vem proclamando que, nos
termos preconizados pela Constituição Federal de 1988, mesmo antes da entrada em
vigor da Emenda Constitucional nº 20/98, é inadmissível a cumulação de proventos
decorrentes da aposentadoria em dois cargos públicos com o exercício de outros dois
cargos.
- Agravo Regimental desprovido. (os grifos não constam do original)
Infere-se da ementa transcrita que o Judiciário frisa invariavelmente a
impossibilidade de acumulação de proventos de aposentadoria de cargo público com o
exercício de cargo, emprego ou função pública. Não restou afastada a possibilidade de
acumulação de que se cogita no presente estudo.
Sendo assim, impõe-se concluir pela legalidade da admissão do servidor em questão no
cargo de Auditor Tributário da Carreira Auditoria Tributária, integrante do Quadro de
Pessoal do Distrito Federal, decorrente de aprovação no concurso público normatizado
pelo Edital nº 228/93-IDR. Como o servidor não mais mantém qualquer vínculo com o
Banco do Brasil, nada impede que exerça o cargo de Auditor Tributário, pois se encontra
amparado por regimes de previdência diversos.
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ATOS SUJEITOS À APRECIAÇÃO DO
TRIBUNAL DE CONTAS:
APLICAÇÃO DA DECADÊNCIA PREVISTA NA LEI DE PROCESSO
ADMINISTRATIVO
Ângela Alves de Araújo
Assessora no TCDF
Resumo da Monografia apresentada à Banca examinadora da Universidade Católica de Brasília, como
exigência parcial para obtenção do grau de bacharelado em Direito, sob a orientação da Professora M.Sc.
Liliane dos Santos Vieira, e sob co-orientação do Professor M.Sc. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes.
No âmbito do Direito Administrativo, a existência de processo estrito senso foi objeto
de amplas discussões, que só foram superadas com o advento da atual Constituição
Federal.
A presença do processo administrativo nas constituições é recente, sendo que a
atual Constituição Brasileira1 é uma das mais ricas nesse tema. As anteriores
constituições do Brasil2 faziam referências específicas somente sobre o processo
disciplinar.
A atual Carta Magna trouxe orientações gerais sobre o processo administrativo em
diversos dispositivos, tais como os artigos 5º, LV, 37, XXI e 41, § 1º, inciso II, sendo o
último sobre a garantia à ampla defesa no processo administrativo para perda do cargo do
servidor estável, o penúltimo acerca da licitação como processo, e o primeiro que trata a
respeito do contraditório e da ampla defesa, aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral.
1
BRASIL. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. 5. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2003, Art. 41. São estáveis, após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados
para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público. § 1º O servidor público estável só perderá o
cargo: [...] II – mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa.
2
BRASIL. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 16 de
julho de 1934. Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003, Art. 169.
Os funcionários públicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de provas, e, em geral,
depois de dez anos de efetivo exercício, só poderão ser destituídos em virtude de sentença judiciária ou
mediante processo administrativo, regulado por lei, e, no qual lhes será assegurada plena defesa. BRASIL.
Constituição (1937). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1937.
Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003, Art. 156. O Poder
Legislativo organizará o Estatuto dos Funcionários Públicos, obedecendo aos seguintes preceitos desde já em
vigor: [...] c) os funcionários públicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de provas,
e, em todos os casos, depois de dez anos de exercício, só poderão ser exonerados em virtude de sentença
judiciária ou mediante processo administrativo, em que sejam ouvidos e possam defender-se;[...]. BRASIL.
Constituição (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 18 de setembro de 1946. Diário
Oficial [dos] Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, RJ, 19 set. Disponível em:
<http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003, Art. 189. Os funcionários públicos
perderão o cargo: [...] II - quando estáveis, no caso do número anterior, no de se extinguir o cargo ou no de
serem demitidos mediante processo administrativo em que se lhes tenha assegurado ampla defesa. BRASIL.
Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 24 de janeiro de 1967. Diário Oficial
[da]
República
Federativa
do
Brasil,
Brasília,
DF,
20
out.
Disponível
em:
<http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003, Art. 103. A demissão somente será
aplicada ao funcionário: [...] II - estável, na hipótese do número anterior, ou mediante processo administrativo, em
que se lhe tenha assegurado ampla defesa. BRASIL. Constituição (1967). Emenda Constitucional nº 1, de 17 de
outubro de 1969. Diário Oficial da União, 17.10.69. Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>.
Acesso em: 03 out. 2003, Art. 105. A demissão somente será aplicada ao funcionário: [...] II - estável, na hipótese
do número anterior ou mediante processo administrativo, em que lhe seja assegurada ampla defesa.
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O processo existe juridicamente quando há lei que o regulamente, por isso só
poderiam ser considerados como processo aqueles disciplinados por leis específicas,
como o disciplinar. Poder-se-ia, então, notar que apenas em 29 de janeiro de 1999 foi
editada a Lei federal nº 9.7843, a respeito do modo de atuação da Administração em
relação aos administrados.
A primeira norma que versou sobre o processo administrativo foi a do Estado de
Sergipe, Lei nº 33, de 26 de dezembro de 1996, sendo a seguinte a do Estado de São
Paulo, Lei nº 10.177, de 30 de dezembro de 1998. Após, foram editadas a Lei nº 9.784/99,
da Administração Pública Federal, a Lei nº 11.781, de 06 de junho de 2000, do Estado de
Pernambuco, a do Distrito Federal, Lei nº 2.834, de 07 de dezembro de 2001 4 e, por
derradeiro, a Lei nº 7.692, de 1º de julho de 2002, do Estado do Mato Grosso.
A norma atinente a cada Estado e ao Distrito Federal somente obriga os entes
públicos vinculados a estes lugares. A norma federal obriga os entes federais. Acontece,
por vezes, que certa norma é recepcionada, assim como aconteceu, no Distrito Federal,
com a Lei local nº 2.834/01, que recepcionou in totum a Lei nº 9.784/99, a abrangência da
lei será tanto na órbita federal como distrital.
Referida Lei de Processo Administrativo Federal regulou, em seu artigo 54, o
instituto da decadência, estabelecendo que, após o prazo de cinco anos, a Administração
ficará impedida de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para
os destinatários, salvo comprovada má-fé.
Nada obstante a existência dessa norma e apesar de posicionamento favorável à
incidência da decadência dentro dos Tribunais de Contas brasileiros, os mesmos 5 se
negam à aplicação desse instituto, por haverem entendido que o prazo decadencial se
iniciaria após a apreciação das Cortes de Contas, tendo em conta que os atos apreciados
são considerados atos complexos.6
O Tribunal de Contas quando aprecia, por exemplo, os atos de aposentadoria, de
reforma, de pensão ou de revisão de proventos, estará examinando ato complexo, haja
vista que houve manifestação de outra vontade, bem como a decisão de editar o ato e,
posteriormente, a decisão de considerar o ato legal ou ilegal resulta em capacidades de
decisões autônomas.
Essa vontade se desenvolve em duas etapas: a primeira, no plano da Administração,
encerra-se com o deferimento do pleito e a conseqüente expedição do abono provisório
ou título de pensão; a segunda tem curso no Tribunal de Contas, que manifesta a vontade
tendente ao aperfeiçoamento, consistente no registro.
Assim, se é ato complexo, o Tribunal de Contas participa da formação do ato ao
conceder o registro e declará-lo legal. Logo, a apreciação desses órgãos de controle
3
BRASIL. Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração
Pública
Federal.
Diário
Oficial
da
União,
01.02.99.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9784.htm>. Acesso em: 06 maio 2003.
4
DISTRITO FEDERAL. Lei nº 2.834, de 07 de dezembro de 2001. Recepciona a Lei Federal nº 9.784, de 29 de
janeiro
de
1999.
Diário
Oficial
do
Distrito
Federal,
10.12.01.
Disponível
em:
<http://tcdfnet2/silegispages/ta_02.asp>. Acesso em: 06 maio 2003.
5
Nada obstante pesquisa intensa nos sites de diversos Tribunais de Contas brasileiros, apenas os Tribunais de
Contas da União e do Rio Grande do Sul disponibilizaram algumas decisões, contendo matéria pertinente.
6
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul. Recurso de Embargos nº 005288-02.00/009. Partes: Nelito Molon e 2ª Câmara do TCE/RS. Relator: Conselheira Terezinha Irigaray. Origem: Secretaria de
Educação, Porto Alegre, RS, 24 jul. 2002. Publicado no Boletim 551/02 em 12 de setembro de 2002. Disponível
em: <http://www.srv00.tce.rs.gov.br:8081/...Advanced&2.0>. Acesso em: 27 mar. 2003.
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externo significa, ao mesmo tempo, a vontade integradora da validade do ato e
controladora do ato antecedente.
Mas se isso é verdade, é um ato complexo sui generis porque não há controlador da
segunda vontade. Os demais atos complexos são controlados pelo Tribunal de Contas,
que neles participa e controla, como por exemplo, o ato de admissão para preenchimento
do quinto constitucional nos Tribunais de Justiça. A lista tríplice é entregue pelo Tribunal
de Justiça – a primeira vontade –, ao Chefe do Poder Executivo que nomeará um dos
candidatos ali destacados, perfazendo a última vontade.
Esse ato complexo – admissão – pode, em tese, ser apreciado pelo Tribunal de
Contas, não havendo órgão controlador dessa vontade.
Isso acontece, nada obstante esse assunto não haver sido ainda abordado pela
doutrina, pelo motivo de os Tribunais de Contas terem essa competência delineada na
Constituição Federal. Esses atos devem, obrigatoriamente, ter seu destino último voltado
para os Tribunais de Contas, tendo em conta serem órgãos com atribuição de verificar a
sua regularidade.
Dessa forma, os atos complexos poderiam ser considerados atos sui generis, já que,
em tese, os órgãos de controle externo manifestam a terceira vontade, mas essa última
manifestação decorre de norma constitucional.
As considerações e os escólios doutrinários, bem como as decisões judiciais e
administrativas que serão trazidos à lume visam definir contornos à discussão que se
pretende enfrentar sobre a aplicação do instituto da decadência.
O Tribunal de Contas da União7 e o Tribunal de Contas do Distrito Federal 8, por
exemplo, posicionaram-se no fato de não estarem exercendo função administrativa
quando no exercício do controle externo da Administração Pública Federal,
especificamente na apreciação da legalidade das aposentadorias, reformas e pensões e,
mesmo que estivessem assim desempenhando, não poderia Lei Ordinária restringir ou
limitar essa atuação, já que se trata de atividade inerente ao Poder Legislativo.
Outra alegação, contudo, se sobrepõe em termos de lógica jurídica: o Tribunal,
guardião da regularidade da despesa pública, não pode ordenar ato que, sob o aspecto
da legalidade, o destinatário não lhe possa dar cumprimento. Quem expediu o ato
inquinado, ou seja, a Administração, estaria impedida de exercer a determinação da
Corte. E assim ocorreria se os Tribunais de Contas determinassem à autoridade dirigente
do órgão jurisdicionado que reduzisse os proventos do inativo, quando já operada a
decadência do direito de rever o ato.
Mesmo que não estivessem as Cortes de Contas sujeitas ao preceito sobre
decadência que emana da Lei n.º 9.784/99, aquele que vai dar cumprimento à
7
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº 013.829/2000-0. Decisão nº 1020/00. Natureza: Consulta.
Assunto: Solicitação formulada pela Procuradoria da União no Estado do Espírito Santo sobre pronunciamento
do TCU acerca da aplicabilidade do artigo 54 da Lei nº 9.784/99 aos processos de julgamentos da competência
daquele Tribunal, relativamente à apreciação de atos de concessão de aposentadoria. Parte envolvida:
Advocacia-Geral da União (Procuradoria da União no Estado do Espírito Santo). Relator: Ministro Marcus
Vinicius Vilaça. Brasília, DF, 15 de dezembro de 2000. Diário Oficial da União Disponível em:
<http://www.tcu.gov.br/>. Acesso em: 18 set. 2003.
8
DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Contas do Distrito Federal. Administrativo. Estudos Especiais - Lei nº
2.834/01, recepcionadora, no DF, da Lei Federal nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal. Processo nº 497/02. Decisão nº 1.675/03. Conselheiro Relator: Renato Rainha.
Conselheiro Revisor: Ronaldo Costa Couto. Brasília, DF, 08 de abril de 2003. Diário Oficial do Distrito Federal,
17.0403. Seção 1, p. 18.
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determinação do Tribunal estaria inibido por completo de acatar a deliberação plenária
imposta com tal escopo.
Trago aqui a regra imperativa do § 1º do art. 54 da Lei nº 9.784/99:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que
decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da
data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-seá da percepção do primeiro pagamento;
Vê-se que o prazo decadencial inicia-se com a percepção do primeiro pagamento.
Assim, por exemplo, se a Administração concedeu uma gratificação indevida a um
servidor público, ou se essa vantagem foi deferida num percentual superior ao devido, os
estipêndios que primeiro contarem com referida gratificação darão início ao prazo de
decadência.
De se destacar que mencionada lei desconsiderou a classificação dos atos
administrativos em atos complexos, deixando, inclusive, de contemplar a existência dos
Tribunais de Contas, quando estabelece o marco inicial da decadência na percepção do
primeiro pagamento.
Levando em conta o espírito da norma e a sua finalidade, não é razoável a
interpretação que procura desobrigar o Tribunal de Contas de se assujeitar ao prazo
preceituado na Lei de Processo Administrativo.
Com efeito, os valores que referida disposição legal consagra são de interesse geral
e dizem respeito à própria dignidade da pessoa humana. São valores que emanam
diretamente de princípios constitucionais, tais como o da segurança jurídica. Os
posicionamentos favoráveis e seguidos, em muitos casos, fundamentaram-se,
principalmente, nesse princípio.
De se ressaltar que o fundamento esposado do não exercício de função
administrativa, deveu-se ao fato de, na Lei nº 9.784/99, no § 1º do artigo 1º, haver
previsão da aplicação de sua norma quando os órgãos dos Poderes Legislativo e
Judiciário da União estiverem desempenhando essa função.
Nada obstante, ao apreciar os atos de inativação, por exemplo, as Cortes de Contas
estariam exercendo função técnica de fiscalização, de registro e, essencialmente,
executando atividade administrativa, pois, estariam, assim, em conformidade com o
conceito de Administração Pública e em consonância com Cretella Júnior,
desempenhando ―[...] atos concretos e executórios, para a consecução direta, ininterrupta
e imediata do interesse público‖9.
Seria função administrativa essa apreciação por parte do Tribunal de Contas, pois,
segundo magistério de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, ―[...] as pessoas podem recorrer
ao poder judiciário, revendo a deliberação das cortes de contas ou os seus efeitos‖ 10. Os
Tribunais de Contas exerceriam função administrativa quando apreciam os atos de sua
competência, pois desempenham função judiciária apenas quando julgam as contas dos
administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos.
9
CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de Direito Administrativo. 2ª ed., atual. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.
34.
10
FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. Belo Horizonte:
Fórum, 2003, p. 172.
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O argumento de que mesmo que estivessem desempenhando função administrativa,
não poderia Lei Ordinária restringir ou limitar essa atuação, já que se trata de atividade
inerente ao Poder Legislativo, é razoável e verdadeiro, mas, igualmente à alegação de
que o prazo decadencial se iniciaria após a apreciação das Cortes de Contas, tendo em
conta que os atos apreciados são considerados atos complexos, não supera a
controvérsia existente de haver um ato a ser apreciado pelo Tribunal de Contas e uma
norma que determina a aplicação da decadência, se passados cinco anos.
Isto porque a Lei de Processo Administrativo estabelece que o prazo de decadência
contar-se-á da percepção do primeiro pagamento, ou seja, a Administração ficará obstada
de exercer o direito de anular o ato cinco anos após o percebimento do primeiro
estipêndio. Desse modo, revigorou-se o princípio da segurança jurídica com o da
estabilidade financeira.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, primeiramente, proferiu
decisões no sentido de se entender aplicável a decadência, resultando no statu quo ante
em que o interessado se encontrava, ou seja, antes da decisão das Cortes de Contas.
Posteriormente, começaram a aparecer acórdãos no sentido de se considerar
inaplicável o instituto da decadência disposto no processo administrativo, haja vista o
entendimento de que, por ser ato complexo, o prazo decadencial correria após a decisão
do Tribunal de Contas.
Entendo que esse posicionamento decorreu de entendimento recorrente do
Supremo Tribunal Federal, na apreciação da decadência prevista na lei do mandado de
segurança, manifestando-se no mesmo sentido, qual seja, por ser ato complexo, o prazo
para se impetrar mandado de segurança iniciaria após a incidência da vontade das Cortes
de Contas.
De se ressaltar que a Lei nº 1.533, de 31 de dezembro de 1951 11, que altera
disposições do Código do Processo Civil, relativas ao mandado de segurança, não dispõe
expressamente e de forma clara sobre o início do prazo da decadência. O que se tem, de
acordo com o artigo 18, é que o direito à impetração extinguir-se-á decorridos cento e
vinte dias contados da ciência do ato impugnado.
Por essa ciência, pelo interessado, do ato impugnado, já houve várias interpretações
doutrinárias e jurisprudenciais.
De se reiterar que na Lei de Processo Administrativo o prazo foi definido de forma
taxativa e clara.
Observa-se, ainda, que a fundamentação das decisões do TJDFT não é o bastante
para superar essa controvérsia, haja vista considerarem que o prazo decadencial inicia-se
após a decisão das Cortes de Contas, esquecendo-se de abordar o parágrafo primeiro do
artigo 54 da Lei de Processo Administrativo.
A solução que, a meu ver, se harmoniza com o Direito Administrativo, sem se olvidar
os princípios da legalidade, do interesse público, da segurança jurídica e da eficiência,
parece ser a mesma do voto do Desembargador Nívio Gonçalves, quando relator da
Apelação Cível nº 2002.01.1.045439-412, que entendeu pela não aplicabilidade, naquele
11
BRASIL. Lei nº 1.533, de 31 de dezembro de 1951. Altera disposições do Código de Processo Civil, relativas
ao
Mandado
de
Segurança.
Diário
Oficial
da
União,
31.12.51.
Disponível
em:
<http://wwwt.senado.gov.br/legbras/>. Acesso em: 14 out. 2003.
12
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível nº 2002.01.1.045439-4.
Acórdão 177824. Partes envolvidas: Rosa Basílio e Distrito Federal. Relator: Desembargador Nívio Gonçalves.
Brasília,
DF,
30
de
junho
de
2003.
Diário
da
Justiça,
24.09.03.
Disponível
em:
92
TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL
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caso concreto, da Lei de Processo Administrativo, por ser a edição da mesma posterior à
concessão da vantagem guerreada.13
Dessa forma, o fundamento foi baseado na inexistência de legislação que
disciplinasse sobre o eventual decurso de prazo decadencial, à época da prática do ato,
agora anulado, que ocorreu em 1996.
De se ressaltar que a lei, de regra, não se refere ao passado, não se aplicando aos
casos pendentes, destinando-se a regular o futuro. A lei, no entanto, pode,
excepcionalmente, abranger o passado, quando inequivocamente expressa. É o que
dispõe o artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil 14, quando decretou que, salvo
disposição contrária, a lei começa a vigorar quarenta e cinco dias depois de oficialmente
publicada. A Lei nº 9.784/99, em seu artigo 70, preceitua que a vigência se dará na data
de sua publicação.
Note-se, também, em consonância com Limongi França, que se respaldou no inciso
XXXVI do artigo 5º da atual Constituição Federal, quando estabeleceu que a lei não
prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, a lei não deve
retroagir, mas se assim acontecer, que se respeite o direito adquirido que, de acordo com
o autor citado, ―[...] é aquele que o titular possa exercer [...]‖ 15.
Dessa forma, o titular – sendo a Administração Pública do Distrito Federal – poderia
exercer o direito de anular o ato no prazo de cinco anos, com espeque na Lei nº 2.834, de
07 de dezembro de 2001, a partir de sua vigência, ou seja, a contar de sua publicação,
em 10 de dezembro de 2001, sendo que a decadência seria aplicável a partir do ano de
2006.
Assim, daria tempo para os Tribunais de Contas se prepararem e agilizarem os
trâmites processuais, com o fito de que citada norma não obste o exercício do controle
externo, especialmente pelo constante nos artigos 70, 71 e 75 da Constituição Federal e
nos artigos 77 e 78 da Lei Orgânica do Distrito Federal 16.
O fato de a Constituição Federal haver deferido aos Tribunais de Contas a
apreciação de tais atos, não altera a essência do instituto da decadência, que somente
recairá sobre atos onde houve incúria ou inércia por parte da Administração, haja vista
<http://juris.tjdf.gov.br/docjur/176177/177824.doc>. Acesso em: 13 out. 2003.
13
Dois outros acórdãos foram no mesmo sentido, sendo que o primeiro dispõe que o ato anulado e que rendeu
ensejo ao desconto, ―[...] foi praticado em 1991, com o pagamento indevido entre os meses de maio a novembro
daquele ano‖. BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível nº
2001.01.1.109415-9. Acórdão 177820. Partes envolvidas: Valdete de Assis Pinheiro e Distrito Federal. Relator:
Desembargador Nívio Gonçalves. Brasília, DF, 30 de junho de 2003. Diário da Justiça, 24.09.03. Disponível em:
<http://juris.tjdf.gov.br/docjur/176177/177820.doc>. Acesso em: 13 out. 2003. O segundo, além de argumentar
igualmente, diferindo somente na data da percepção do pagamento indevido, fez menção ao ato complexo, ao
acrescentar que ―[...] somente após a aprovação pelo Tribunal de Contas é que a concessão de aposentadoria
pode ser considerada inatacável, consubstanciando-se a aposentação num ato jurídico perfeito e acabado‖.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível nº 2002.01.1.033208-2.
Acórdão 175277. Partes envolvidas: Iolanda Eustáquia Marra de Sousa e Distrito Federal. Relator:
Desembargador Valter Xavier. Brasília, DF, 02 de junho de 2003. Diário da Justiça, 13.08.03. Disponível em:
<http://juris.tjdf.gov.br/docjur/174175/175277.doc>. Acesso em: 13 out. 2003.
14
BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro.
Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. 5ª ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003.
15
FRANÇA, R. Limongi. A irretroatividade das leis e o direito adquirido. 5ª ed. rev. e atual. do Direito
intertemporal brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 296.
16
DISTRITO FEDERAL. Lei Orgânica do Distrito Federal, 08 de junho de 1993. Diário Oficial do Distrito Federal,
09.06.93. Disponível em: <http://tcdfnet/silegispages/ta_02.asp>. Acesso em: 13 out. 2003.
93
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que esses órgãos poderão contar com o prazo de até cinco anos para poder atuar, a partir
da edição da Lei de Processo Administrativo.
De tudo que ficou assente, pode-se assegurar que nada obsta, sendo, pelo
contrário, recomendável, preservar esses atos administrativos em nome da segurança
jurídica e da boa fé, em face de situações consolidadas pelo tempo, em relação à
competência de apreciar a legalidade dos atos de aposentadoria, pensão, reforma e
admissão, desde que a contagem do prazo decadencial se inicie a partir da edição da
norma de processo administrativo vigente no âmbito da esfera de Poder do Tribunal de
Contas.
É possível vislumbrar que o Tribunal, acolhendo essa exegese e aplicando-a de
modo uniforme, estará valorizando a sua própria ação, porque reorganizará seu esforço
para o controle, ainda que posterior ao ato, mas em tempo mais concomitante com a sua
ocorrência, sendo mais útil à sociedade e ao contribuinte, porque poderá cumprir a parte
mais nobre de sua função, que é precisamente redirecionar o processo decisório,
consagrando com maior amplitude a Justiça, uma vez que deixaria de ordenar correção
de atos com longo período de consolidação temporal, retirando do patrimônio daqueles
que já incorporaram vantagens e verbas remuneratórias de caráter nitidamente alimentar.
REFERÊNCIAS
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Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003.
BRASIL. Constituição (1937). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003.
BRASIL. Constituição (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial da
União, 19 set. Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em:
03 out. 2003.
BRASIL. Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil. Diário
Oficial da União, 20 out. Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>.
Acesso em: 03 out. 2003.
BRASIL. Constituição (1967). Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969.
Diário Oficial da União, 17 de outubro de 1969. Disponível em:
<http://wwwt.senado.gov.br/netacgi...NJUR>. Acesso em: 03 out. 2003.
BRASIL. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. 5. ed., rev., atual. e
ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução ao Código
Civil Brasileiro. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. 5. ed.,
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
BRASIL. Lei nº 1.533, de 31 de dezembro de 1951. Altera disposições do Código de
Processo Civil, relativas ao Mandado de Segurança. Diário Oficial da União, 31.12.51.
Disponível em: <http://wwwt.senado.gov.br/legbras/>. Acesso em: 14 out. 2003.
BRASIL. Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no
âmbito da Administração Pública Federal. Diário Oficial da União, 01.02.99. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9784.htm>. Acesso em: 06 maio 2003.
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo n.º 013.829/2000-0. Diário Oficial da
União, Disponível em: <http://www.tcu.gov.br/>. Acesso em: 18 set. 2003.
94
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Revista nº 30 – T. 1 – 2004 - Versão Digitalizada
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível nº
2001.01.1.109415-9. Acórdão 177820. Diário Oficial da União, 24.09.03. Disponível em:
<http://juris.tjdf.gov.br/docjur/176177/177820.doc>. Acesso em: 13 out. 2003.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível nº
2002.01.1.033208-2. Acórdão 175277. Diário da Justiça, 13.08.03. Disponível em:
<http://juris.tjdf.gov.br/docjur/174175/175277.doc>. Acesso em: 13 out. 2003.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Apelação Cível n.
2002.01.1.045439-4. Acórdão nº 17.7824. Diário da Justiça, DF, 24.09.03. Disponível
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CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de Direito Administrativo. 2ª ed. atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2002.
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DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Contas do Distrito Federal. Voto condutor da Decisão
nº 1.675/03. Processo nº 497/02. Conselheiro Relator: Renato Rainha. Brasília, DF, 08
de abril de 2003. Diário Oficial do Distrito Federal, 17.04.03. Disponível em:
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FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e
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FRANÇA, R. Limongi. A irretroatividade das leis e o direito adquirido. 5ª. ed., rev. e atual.
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RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul. Recurso de Embargos
nº 005288-02.00/00-9. Boletim 551/ 002 em 12 de setembro de 2002. Disponível em:
<http://www.srv00.tce.rs.gov.br:8081/...Advanced&2.0>. Acesso em: 27 mar. 2003.
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Revista nº 30 – T. 1 – 2004 - Versão Digitalizada
CONTRATOS ADMINISTRATIVOS NA LEI 8.666/93: NOVE CAUSAS
PARA A ELEVAÇÃO DO SEU VALOR
Ivan Barbosa Rigolin
I
O título é eloqüente o bastante para dispensar introduções explicativas ou intróitos
ao tema: apenas interessou neste momento focar as possíveis causas, todas
expressamente previstas, admitidas e contempladas na Lei nº 8.666/93, de aumento do
valor dos contratos administrativos. E ao que parece, e até este momento da história, são
em número de nove, como se examinará1.
Este assunto um dia despertou a atenção dos aplicadores da lei nacional de
licitações, e desde então só fez crescer aquela atenção, já que ao fim e ao cabo licita-se
alguma coisa para se a contratar, e não por diletantismo ou terapia ocupacional das
entidades públicas; então, o valor do contrato, e todas as suas implicações e correlações,
passa a ser sempre o foco da atenção máxima de todos quantos envolvidos, de dentro e
de fora da Administração, no negócio que se celebrou.
O principal objetivo deste rápido estudo - não declarado no título, e talvez nem
sequer suspeitado pelos autores da lei ao início - é entretanto o seguinte: demonstrar, por
causa das cumulatividades (majoradoras de valor) admitidas pela lei, o tremendo e por
vezes insuspeitado alcance de um específico acréscimo possível de valor, aquele previsto
no § 1º, do art. 65, da lei de licitações, de até 25% no valor dos contratos que não de
reforma, ou do acréscimo de até 50% nos casos de reformam, que a lei permite à
Administração impor unilateralmente ao contratado. Vejamos.
II
Sem qualquer espécie ou pretensão de ordem pelo critério que for, estes são os detectados até o momento - motivos de possíveis acréscimos de valor nos contratos
administrativos regidos pela lei nacional das licitações e dos contratos administrativos:
a) prorrogação, prevista no art. 57, I e II, e §§ 1º e 4º;
b) extensão (art. 57, IV);
c) reajuste (art. 40, XI);
d) atualização financeira (art. 40, XIV, c);
1
Ao que apenas parece são nove, pois que a cada nova varredura da Lei nº 8.666/93 realizada para esse fim,
acredite-se se quiser, o examinador atento descobre novidade em matéria de possíveis causas de incremento do
valor contratual. A lei de licitações faz recordar uma imensa gincana em que as surpresas espoucam a todo
tempo aos olhos dos atônitos participantes quando menos se as espera, ou quando não mais se imagina que
ainda existam por descobrir; uma gincana de horrores, neste caso. Lembra ainda, em sentido inverso , a música
de Bach, a qual por mais que se ouça durante décadas nunca deixa de surpreender a cada nova audição, com
uma faceta, uma vertente, um matiz ou uma nuance até então despercebidos. Se aquela música mais extasia e
embevece quanto mais se a ouve, a lei de licitações, entretanto, produz efeito oposto, ensejando a cada releitura
novos calafrios e espasmos.
96
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e) penalização (art. 40, XIV, d);
f) variação cambial (art. 42);
g) diferimento do preço no tempo, à base de um fator conhecido e outro desconhecido (sem
previsão específica na lei, mas possível como se examinará);
h) revisão (art. 65, II, d);
i) revisão (art. 65, inc. I, als. a e b, e § 1º).
Cada uma dessas ocorrências, legalmente previstas ou admitidas, origina,
fundamenta ou constitui uma causa de acréscimo de valor nos contratos administrativos.
Constituiria este um rol um elenco exaustivo, taxativo, numerus clausus, fechado a novas
hipóteses, apenas se se pudesse ter certeza de que não existem outras hipóteses de
incremento do valor contratual; mas temos tanta certeza disso quanto do dia em que será
divulgada a cura definitiva da AIDS ou do diabetes; então, ao invés de taxativo será mais
prudente denominar a este o rol conhecido até o momento.
III
Os fatores a, h e i (prorrogação, revisão I e revisão II) são os únicos que constituem
alterações do contrato, a merecer por isso aditamento, submetido ao regime do § 2º, do
art. 57, ou seja exige justificativa, pelo setor envolvido e necessitado da alteração, e
autorização pela autoridade competente, que em geral é a mesma que mandou
contratar. Os demais fatores de acréscimo do valor contratual não alteram o contrato,
merecendo apenas, no máximo, anotação, averbação, apostilamento ou registro do fato, e
podendo ser procedidos pelo gestor do contrato, se dos seus poderes constar esse como se recomenda.
E se fala aqui, naturalmente, de contratos que tenham o objeto descrito e
quantificado originariamente com precisão, e com isso tenham valor prestabelecido ou
estimativo com base em projeção razoável e rotineira, e não daqueles com o valor apenas
vagamente estimado, pois que nesse último caso o valor pago a final poderá ser
acrescido, além de pelos fundamentos jurídicos já elencados, também por fatores
variáveis como o acréscimo imponderável e imprevisível de quantidades de objeto, as
quais apenas ao longo da execução se vão definindo. Em tais contratos de valor nem
remotamente conhecido de início, faltando a própria referência inicial de preço, não se
pode falar em fundamentos legais de aumento de valor, mas apenas de causas materiais
ou operacionais que vão determinando as quantidades necessárias de objeto, o que a
final resultará em preço equivalentemente variado, e disso, que nada tem de natureza
jurídica, aqui não se vai cogitar.
Também não se cogita aqui de contratos de que não se sabe sequer se haverá
preço, pois que tal pode acontecer em caso de pactos cujo objeto pode por acaso,
durante a execução, revelar-se oneroso, como pode revelar-se não-oneroso como se
desejaria ou esperaria. São hipóteses raras e especiosas de contratos cujo preço de início
é apenas um ilustre desconhecido, mas vale tê-las presentes.
IV
Prorrogação (art. 57, I e II, e §§ 1º e 4º). Essa primeira ocorrência pode ser causa
de aumento do valor contratual, sempre que implique em ampliação do objeto a ser
97
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entregue, seja ele obra, serviço ou compra 2. Significa a aumentação do prazo contratual,
fundamenta-se materialmente em necessidade e conveniência da administração
contratante, e juridicamente nos dispositivos acima indicados. Precisa estar prevista como
possível no edital ou no contrato, se fundamentada no inc. I, do art. 57, e não precisa
estar prevista nem no edital nem no contrato se for baseada no inc. II, pois que nessa
hipótese a lei já a autoriza independentemente de qualquer previsão contratual ou
editalícia, bastando à Administração pactuá-la com o contratado, demonstrando a
vantagem que ensejará, e efetuá-la por consensual aditamento. Os motivos justificadores
das prorrogações, também em elenco taxativo, são aqueles consignados no § 1º, do art.
57.
Se as prorrogações com base no inc. II, em contratos de serviços continuados,
precisam ser necessariamente por períodos iguais aos da contratação originária desde
que a duração máxima do contrato não ultrapasse sessenta meses, entretanto aquela
prorrogação, dita excepcional, com base no § 4º, do mesmo art. 57, poderá ser de
duração diversa, durando até doze meses, e pode somar-se aos sessenta já exercitados
com base no inc. II. Não se imagina, entretanto, muito sentido em se utilizar mais de uma
vez, em cada contrato, a prorrogação do § 4º, vez que foi ela consignada tardiamente
(pela Lei nº 9.648, de 27/5/98) na lei de licitações para dotar a Administração de um novo
instrumento prorrogatório a par daquele já existente (inc. II), com caráter extraordinário e
supletivo de situações possivelmente inesperadas ou excepcionais, a serem providas por
nova contratação licitada tão-logo que possível; e se é assim não terá muito sentido
repetir-se a prorrogação excepcional.
Por vezes a prorrogação não implica, só em si, em aumento de valor, como por
exemplo em um contrato de obra que por motivo de chuva precisou paralisar-se por um
mês, e com isso foi prorrogado para poder ser concluído, sem necessariamente ter sofrido
aumento de valor. Casos assim de prorrogação sem aumento do objeto e do valor
costumam ser raros, e em geral as prorrogações de prazo se dão para aumentar o objeto
a ser entregue, o que evidentemente aumenta o valor contratado originariamente. A
prorrogação pode dar-se pelo mesmo valor da contratação originária, se de mesma
duração que aquela, ou pode se dar por valor superior, se a esse tempo incidiu algum
outro fator de acréscimo, como por exemplo o reajuste, a ser examinado adiante. Seja
como for, prorrogação é um primeiro fator de possível aumento do valor contratado, pois
que ao valor originário se somará o valor da prorrogação.
V
Extensão (art. 57, inc. IV). Na sua origem havia mais hipóteses de extensão dos
contratos do que a única que atualmente permaneceu na lei, consignada no inc. IV, do art.
57, relativa a aluguel de equipamentos (de informática) e à utilização de programas de
2
Compra e venda é um contrato civil e não administrativo, previsto e extensivamente disciplinado no Código
Civil, arts. 481 a 532, e não administrativo, ainda que conste referido na lei de licitações, e que seja
freqüentissimamente exercitado pela Administração pública. Nem por isso se torna contrato administrativo,
porém a lei de licitações, ainda que o trate em separado das obras e dos serviços (englobados nos art. 7º a 13,
nas Seções III e IV, do Capítulo I, enquanto que as compras mereceram a Seção V, do mesmo Capítulo I), com
freqüência trata os contratos de compra como se administrativos fossem, fazendo sobre eles incidir disposições
que somente têm sentido nos contratos administrativos, como faz em diversos momentos do art. 65. Em outro
momento a Lei nº 8.666/93 manda aplicar ―no que couber‖ as regras administrativísticas aos contratos regidos
―predominantemente por normas de direito privado‖ (art. 62, § 3º, inc. I), reconhecendo que os contratos civis
merecem tratamento distinto dos administrativos. Mas o que importa frisar é que na prática os contratos de
compra ou de fornecimento, que são e sempre foram civis, são tratados como se fossem administrativos, pois
que isso operacionalmente interessa à Administração, e financeiramente aos fornecedores. A lei, sabendo-o, não
insiste muito na separação que tecnicamente seria curial, e com tudo isso também nós não insistiremos.
98
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informática. Para esse único caso a lei menciona extensão do contrato e não
prorrogação, pois que o art. 57 já está com sua quarta redação desde sua origem no art.
47, do Decreto-lei nº 2.300/86, de que se originou toda a lei atual de licitações. Nas suas
origens o inc. II, do art. 47, da lei anterior, mencionava que os contratos de serviços
contínuos tinham duração que podia estender-se ao exercício seguinte ao da vigência do
respectivo crédito. Com as sucessivas alterações que esse artigo, depois transmutado no
art. 57 da lei atual, sofreu a seguir, o que era corretamente na origem extensão passou a
ser prorrogação, como ainda o é.
É que extensão, na lei de licitações, é um conceito mais sutil que prorrogação,
exprimindo uma continuidade no tempo que não precisa ser autorizada por quem mandou
contratar, nem exige termo aditivo expresso, mas simples averbação, apostilamento ou
anotação no contrato, procedida pelo próprio gestor e não pela autoridade sua superior.
Tal simplicidade se deve ao fato de que a extensão não se dá por fato excepcional ou
inesperado como na prorrogação, que tem motivos expressos e taxativos na lei (art. 57, §
1º), mas por fato tão certo quanto o dia suceder a noite, e tão esperado quanto isso. Por
exemplo, prorroga-se um contrato de obra porque choveu um mês e a obra não se pôde
concluir no tempo contratado, exigindo mais tempo a execução do contrato. Não se
esperava que tal ocorresse, mas ocorreu. Estende-se, por outro lado, um contrato de
vigilância, porque se sabe que a vigilância era necessária, é atualmente necessária e será
amanhã e sempre necessária. Alguém precisará estar contratado, prestando o serviço,
hoje e sempre, podendo ser o atual contratado, podendo ser outro contratado, mas
alguém precisará prestar o serviço contínuo de vigilância. Quando é assim, uma simples
extensão, sem aditivo necessário, sem autorização superior necessária, pode substituir a
prorrogação, porém atualmente apenas no caso s do inc. IV, do art. 57, ou seja com
relação a aluguel de equipamentos e programas de informática, e a nenhum outro serviço
contínuo3.
Na sua exemplar imprecisão como elaborador legislativo, incapaz de perceber a não
tão sutil diferença entre extensão e prorrogação, o legislador brasileiro veio alterando
seguidamente, sempre para pior, o inc. II, do art. 57, da lei atual de licitações, iniciado
com o art. 47 do decreto-lei anterior, de modo que atualmente converteu o que
corretamente em 1986 era extensão em todos os contratos de serviços contínuos, para
prorrogação, pois isso até mesmo o nosso legislador sabe o que significa, habituado
como está a testemunhar freqüentes prorrogações de partidas de futebol. O legislador
apenas não estragou o inc. IV, do art. 57, substituindo a correta extensão originária pela
muito menos correta prorrogação, porque seguramente não chegou a enxergar o
dispositivo4.
Assim, a extensão de um contrato de utilização de programas de informática, ou de
equipamentos de informática, que sempre se dá para que a contratante obtenha mais
objeto, é um segundo fator de acréscimo do valor contratual.
Esse segundo fator não pode ser cumulado com o primeiro, prorrogação, porque a
teor do art. 57 ou se prorroga o contrato ou se o estende, sendo incompatíveis entre si, e
autoexcludentes, os dois institutos.
3
Homenageie-se a Leon Frejda Szklarowsky, que ao que se saiba foi quem primeiro insistiu publicamente, em
aulas e seminários nos idos de 1994, sobre a importante diferença entre extensão e prorrogação.
4
Como não enxergou o § 4º, do art. 62, onde manteve, ainda que entre aspas, a correta espécie termo de
contrato, que foi incompreensivelmente substituída pelo seu gênero instrumento de contrato no caput do mesmo
art. 62. Tivesse enxergado, teria estragado também o parágrafo.
99
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VI
Reajuste (art. 40, XI). Também tratado por reajustamento, essa comum e freqüente
causa de acréscimo do valor contratual tornou-se praticamente obrigatória em contratos
de largo fôlego, com mais de um ano de duração a contar da data da proposta. E é de
bem que o seja, porque constitui apenas a reposição da perda do poder aquisitivo da
moeda, ou da inflação havida, seja ela geral, seja compartimentada por segmentos
específicos da economia, e como tal não constitui alteração do contrato, nem exige termo
aditivo que a conceda, mas mera anotação do gestor, independentemente de
requerimento do contratado, observado o índice expresso no edital da licitação respectiva
ou no próprio contrato, ou em ambos. Sempre insistimos em que reajuste é assunto sério,
de profissionais sérios, que repõe seriamente a perda inflacionária ou altista de preços;
nesse ponto difere radicalmente da revisão, que como se irá em parte examinar.
Quanto ao índice, devem preferir-se, sempre que existentes, os setoriais, regionais
ou de outro modo específicos do objeto, pois que mais que quaisquer outros haverão de
expressar a subida real dos insumos próprios do mesmo objeto, mais do que os índices
econômicos gerais, pela sua intrínseca generalidade e indiscriminação, o poderiam fazer.
Em havendo a previsão editalícia ou contratual de reajuste - que atualmente tem
periodicidade mínima de um ano a contar da data da proposta ou do orçamento da
própria Administração (o que se revelou tecnicamente muito desaconselhável na prática)
por força da legislação regedora do assim denominado plano real5 - o reajuste, vencido o
prazo aquisitivo pré-estabelecido, deve ser atribuído ao contrato em favor do contratado.
Em não havendo previsão de reajuste, proibida fica a sua concessão.
Sendo atribuído constituirá, na aleatória seqüência que vimos seguindo, um terceiro
fator de incremento do custo contratual. Esse fator pode se somar tanto ao primeiro
elencado, a prorrogação, quanto ao segundo, a extensão, vale dizer: um contrato que foi
prorrogado pode ser também reajustado, e um já estendido também o pode. Trata-se de
causas acrescedoras de valor em tudo diversas, e que nenhuma incompatibilidade ou
autoexcludência guardam entre si, como, diferentemente, e como já foi visto, são
autoexcludentes a prorrogação e a extensão; quanto ao reajuste, pode cumular-se tanto
com a prorrogação quanto com a extensão contratual.
VII
Atualização financeira (art. 40, XIV, c). Fator dos menos importantes de acréscimo
do preço contratual, é daqueles de que poucos se lembram de que existe. Trata-se
daquela - hoje - questiúncula inserida na al. c, do inc. XIV, do art. 40, muito importante
nos primórdios da lei, em que a inflação mensal no país chegou a 84%, mas tornada
desimportante a seguir, com o plano real e a queda da inflação, e sua manutenção em
nível muito baixo, e sob controle, desde então até os dias de hoje. Tão desimportante se
tornou que a maioria dos editais de licitação, e dos contratos, sequer a mencionam,
quando deveriam a rigor de lei, ainda que o fator de atualização fosse zero.
Se a medição deve ser feita do dia 1º ao dia 30, para pagamento no dia 10 do mês
seguinte, então deveria o edital, e o contrato, estabelecer o fator de atualização
financeira do valor a ser pago no dia 10, como a lei exige que do contrato conste,
5
Muito particularmente centrado, quanto à questão dos reajustes anuais de contratos, no art. 2º, da Lei nº
10.192, de 14 de fevereiro de 2001, oriunda de uma medida provisória que foi reeditada 71 (setenta e uma)
vezes, e que por último foi a MP nº 2.074-72, de 27 de dezembro de 2000.
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sabendo-se que por menor que tenha sido alguma corrosão inflacionária deve ter
acontecido no período - essa ao menos sempre foi a regra nas últimas décadas. Mas,
como a inflação nem de longe representa hoje o que representou economicamente no
passado, pelo seu pequeno montante financeiro ou percentual quanto ao valor a ser pago,
vem sendo contínua e reiteradamente desprezada a previsão editalícia e contratual
daquela atualização, o que sem dúvida contraria a lei de licitações em desfavor do
contratado.
O que impende saber é que o fator de atualização financeira constitui outra causa
legal de aumento do valor contratual, a quarta em nosso elenco, podendo acumular-se
com qualquer outra, ou também incidir quando outra causa já incidiu sobre o contrato.
VIII
Penalização (art. 40, XIV, d). Por eventual atraso no pagamento de suas obrigações
contratuais a lei de licitações, no dispositivo acima indicado, estabelece que o edital
preveja uma ―penalização‖ à Administração. Melhor teria dito apenação, pois que isso
significa impor pena, ao passo que penalizar, no seu sentido mais próprio, significa
causar pena - o que constitui apanágio do legislador brasileiro, o eterno verdugo do
vernáculo, e não da Administração.
Se a causa anterior de aumento de valor, a atualização financeira, raramente é
lembrada nos dias de hoje, pode-se dizer que esta quinta, ―penalização‖ contra a
Administração praticamente nunca é lembrada, ou, em nome da verdade, o autor dos
editais e dos contratos finge que não sabe que essa espécie é prevista na lei como
obrigatória, pois que se direciona não contra o contratado mas contra a própria
Administração contratante, em caso de essa atrasar os pagamentos devidos ao
contratado. Não deve ter sido concebida por publicista que seja apenas isso, mas por
deputado empresário, que na sua atividade privada é com freqüência contratado pelo
poder público. Porém nada é mais justo, diga-se de passo, do que tratar o contratado
como a receita federal trata quem atrasa um dia o pagamento de seu imposto de renda,
ou como o Estado o trata se atrasar o pagamento de seu ICMS, ou como o Município o
trata se atrasar o pagamento de seu IPTU, ou como autarquias como o INSS também o
fazem em atraso de contribuições previdenciárias, ou ainda como identicamente o fazem
as estatais concessionárias de serviços públicos, como de energia, por atraso no
pagamento das contas.
Mas uma insidiosa amnésia acomete permanentemente os autores de editais de
licitação e de contratos administrativos, que por esse infeliz acaso nunca se lembram de
cumprir o disposto na al. d, do inc. XIV, do art. 40, do estatuto federal licitatório6.
Se cumprirem, e se um dia o contrato sair mais caro à Administração em face disso,
nesse dia de júbilo para os justos de espírito aquele terá sido um quinto possível fator de
incremento do preço contratual, o qual pode também cumular-se ou conviver com
qualquer outro, ou com os outros, entre si cumuláveis, em conjunto no mesmo contrato.
IX
Variação cambial (art. 42). Facilmente compreensível esse fator de incremento do
preço contratado, significa apenas a alteração da expectativa ou da base inicial de preço,
6
Rendamos neste passo homenagem a Diógenes Gasparini pela sua judiciosa formulação, in Direito
administrativo. 5ª ed. São Paulo : Saraiva, 2000. p. 376.
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em moeda nacional, com a qual se trabalhava quando da celebração, em face da
variação para maior da moeda estrangeira que serve de base para as variações do preço
a ser pago ao contratado.
Se, digamos, um contrato é celebrado em dólares para ser pago em reais, ou
celebrado em reais com equivalência direta em dólares, qualquer elevação do dólar,
superveniente ao início da execução do contrato, fará subir ou incrementar-se o preçobase inicialmente firmado.
É o art. 42, da lei de licitações, que, ainda que muito ligeiramente, disciplina as
licitações internacionais, e abre a possibilidade de contratos a serem pagos com
observância da razão moeda nacional - moeda estrangeira, e essa razão pode assumir
os mais variados aspectos, sempre significando aumento de valor em caso de a variação
da moeda estrangeira favorecer a última e não a nossa.
E, tal qual ocorre à maioria dos fatores anteriormente citados, este sexto fator de
incremento de preço pode cumular-se com outros, vez que a rigor nada tem de limitação
com relação àqueles, nem a limitá-los nem a por eles ser limitado.
X
Diferimento do preço no tempo, à base de um fator conhecido e outro
desconhecido. Ainda que não exista na lei previsão alguma, expressa, dessa
possibilidade, temo-la como perfeitamente possível uma vez que é sempre juridicamente
possível a pactuação de um preço contratual inicial x por determinado tempo, a ser
seguido pelo preço y por outro período, e a ser seguido pelo preço z por outro lapso
subseqüente. Nessa hipótese, exceto o preço inicial, que é totalmente conhecido, os
preços seguintes serão resultantes da multiplicação de um fator conhecido por outro
desconhecido, disso resultando a cada oportunidade novo preço por determinado prazo.
Um exemplo da vida real, e diariamente exercitado pela entidades públicas,
esclarecerá de pronto essa sétima hipótese de encarecimento de contratos: em contratos
de serviço de limpeza ou de vigilância, em que a folha de pagamento constitui, de longe,
o maior custo individualizado, analiticamente analisado, do contratado, é freqüente o
pleito, pelo contratado, de revisão em face de aumento da folha, por dissídio coletivo
que a categoria dos seus empregados obteve na Justiça do Trabalho. O dissídio,
concedido em época certa e adrede conhecida, não é fato novo, nem constitui surpresa a
nenhum empresário ou à Administração, porém o seu montante por vezes surpreende
pelo percentual obtido pelos empregados, que francamente, e com justo motivo de ordem
econômica, não se esperava. Advindo o dissídio em percentual maior que o imaginável ou
o razoável, então é fatal o plangente e compungido pleito de revisão pelo contratado,
acompanhado por vezes de centenas de páginas de planilhas, cálculos, equações de
terceiro grau, invocações ao direito quântico e apelos à teoria da relatividade,
complicados com alquimias, espagirias e mandracarias de fazer corar ao mais impassível
dos homens. E a Administração se vê com isso face ao desgaste, nada técnico nem
objetivo muita vez, de precisar examinar com máxima objetividade aqueles números
todos, quase nunca tendo para isso condição material e humana. Digamos que neste
exemplo, de pleito de revisão por dissídio e não por outro motivo, nunca são tão
complicados os cálculos apresentados, mas o desgaste e o impasse são inevitáveis - e
por isso esta formulação deste diferimento de preço.
Que não é, aliás, senão o seguinte: nas licitações para as contratações de objetos
em que a folha de pagamento do contratado for fator importante de custo na proposta do
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contratado, a Administração precisará saber de antemão, por pesquisar no mercado, que
percentual a folha representa com relação à proposta total; e, sabendo-o, determinar no
edital que o proponente especifique com clareza esses números, indicando às claras
aquela proporção, cujos parâmetros o próprio edital deverá indicar, desclassificando-se os
proponentes que não se ativerem àqueles parâmetros limitativos descritos no edital.
Feito isso, o edital deve prever que o preço do contrato, digamos mensal, será o do
vencedor até o mês do dissídio, e será outro a partir do dissídio e até o dissídio anual
seguinte, resultante da multiplicação do percentual dado no dissídio (digamos que de 8%)
pelo percentual que a folha de pagamento representa com relação à proposta (digamos
67%). E neste exemplo o aumento que será dado ao contratado será o resultado da
multiplicação dos dois fatores, ou seja 67% de 8%, o que faz resultar 5,35%, a valer até o
novo dissídio, que repetirá o cálculo considerando o novo percentual de dissídio, que não
se conhece, para multiplicá-lo pelo percentual conhecido de 67%. Observa-se que um
fator de aumento é conhecido desde o início do contrato, e outro é desconhecido.
Tal previsão, que não constitui nem revisão nem reajuste, nem atualização nem
penalização, e que é perfeitamente admissível do plano jurídico desde que constitua
regra do edital ou mesmo da contratação direta, constitui a diferenciação, ou o
diferimento, do preço ao longo do prazo da execução contratual, e pode cumular-se com
outros fatores de acréscimo do preço contratado porque com eles nada tem de
incompatível - salvo evidentemente as razões que ensejaram o próprio diferimento, que
não podem ensejar nenhuma revisão pelo mesmo motivo.
Pode ainda ocorrer o contrato com preço diferido no tempo porém inteiramente
conhecido, como um serviço que de antemão se contrata a x por um ano, y no segundo
ano e z no terceiro, todos esses preços tendo sido antecipadamente fixados e conhecidos
na contratação; o diferimento do preço nesse caso, entretanto, não constitui incremento
do contrato, porque o contrato, só por esse critério de preço, não foi acrescido em valor,
que já era, ao início, totalmente conhecido.
XI
Revisão (art. 65, II, d). Existem duas possibilidades distintas e inconfundíveis de
acréscimo do valor contratual por revisão, uma a constituir um oitavo motivo de
incremento que se passa a examinar, e outro constituindo um nono, descrito no tópico
seguinte e merecedor de particular cuidado.
A primeira espécie revisão que se pode dar em contratos administrativos é aquela
prevista na al. d, do inc. II, do art. 65, de longa redação que menciona até o apelido que a
doutrina publicística deu a ato de governo, o fato do príncipe.
São basicamente três os motivos que justificam essa revisão: a) fatos naturais,
como calamidades, intempéries, fenômenos da natureza, que os anglicanos
prosaicamente denominam acts of God; b) atos humanos, como sabotagens, terrorismo,
outras práticas criminosas por terceiros ao contrato, e c) atos de governo, como criação
de impostos ou majoração dos já existentes, ou supressão de vantagens comerciais e
fiscais existentes em favor do contratado ao início do governo, sempre que esses atos
quebrem, em desfavor do contratado, a relação econômica supostamente equilibrada ao
início do contrato em preço e objeto contratado. Ocorrendo algum desses motivos, ou
mais de um ao mesmo tempo, deve demonstrá-lo - e principalmente os seus efeitos
econômicos - o contratado à sua contratante Administração pública, para então,
comprovando o injusto prejuízo sofrido, pleitear a reparação do superveniente
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desequilíbrio, através de aditamento contratual a ser consensualmente firmado entre as
partes, para se alterar o preço principal do contrato de modo a contemplar majoração que
restaure aquele já mencionado equilíbrio inicial, com cuja permanência ambas as partes
contavam.
Por esse dispositivo, em acontecendo aumento de custo do contratado, após ter sido
celebrado o contrato e portanto durante a execução contratual por algum daqueles três
motivos elencados (fato da natureza, ato de governo ou ato de terceiro), o contratado,
demonstrando à Administração a ocorrência desse acontecimento e o reflexo
detrimentoso ao seu interesse que terá nos preços contratados, dela pode obter uma
revisão de preço, tendente a reequilibrar a equação financeira inicial, supostamente
equilibrada como se presume. A Administração, a nosso ver, tem o dever de revisar o
contrato nessas hipóteses, sempre que se demonstre convencida da veracidade dos fatos
alegados no pedido do contratado, pois resta virtualmente inadmissível a qualquer das
partes contratantes, sob qualquer argumento num país e institucionalizado, ignorar
eventos que desequilibrem financeiramente o contrato em prejuízo da outra parte, se essa
não lhe deu causa.
Trata-se apenas de levar a efeito demonstrações, planilhamentos, cálculos e
comprovações de fatos econômicos ou com conseqüências econômicas imediatas, porém
é certo que tais demonstrações podem conter muito de subjetivo e de controverso, e de
difícil avaliação com a precisão aritmética desejável, e com isso o máximo cuidado deve
ter a Administração quando receber algum desses pleitos do contratado, uma vez que lida
e lidará com dinheiro público submetido ao princípio da indisponibilidade, da legalidade
fria e da economicidade, dentre outros, a obrigá-la a permanente austeridade nos
gastos.
Essa primeira espécie de revisão nada, absolutamente nada, guarda de relação,
como causa de encarecimento do contrato, com a revisão que pode ser dada por força do
inc. I, do mesmo art. 65 - e que, repetindo, será o nono e último motivo de incremento de
preço a ser examinado neste artigo.
Não existe limite legal para a revisão restauradora estabelecida pelo inc. II, al. d, do
art. 65, porque não seria justo a lei limitá-la quando não foi o contratado que deu causa ao
desequilíbrio, mas ou a natureza, ou terceiro ao contrato, ou o governo, que muitas
vezes é a própria contratante. São muito freqüentes revisões concedidas a este título que
simplesmente multiplicam o valor inicial do contrato, como é corolariamente freqüente a
impiedosa fiscalização sobre tais ajustes, de resto mais do que necessária, pelos entes
estatais de controle das contas públicas.
Por fim, trata-se de uma causa de encarecimento do contrato que, por sua natureza,
também é plenamente cumulável com as demais até aqui elencadas, o que constitui outro
fator de imprescindível atenção, e cuidado a ser observado pela Administração, sobretudo
porque não existe planejamento que possa prevenir os efeitos, absolutamente
inesperados e imprescrutáveis, dessa espécie de revisão.
XI
Revisão (art. 65, inc. I, als. a e b, e § 1º). Chega-se enfim ao nono e último fator,
causa, fundamento ou motivo de acréscimo do valor contratual: a revisão baseada na
determinação de aumento, pela Administração contratante, de quantidades contratadas,
ou de alteração qualitativa do projeto, que implique em maiores quantidades de
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material, serviço e da própria realização da obra. Isso está admitido no inc. I, als. a e b, do
art. 65.
O limite de valor para tais alterações do objeto, determinadas pela Administração
por força do inc. I, als. a e b, do art. 65, está dado por outro momento do mesmo art, o
seu §1º, que fixa em 25% para mais ou para menos, e se se tratar de reforma de
equipamento ou edifício serão até 50% de acréscimo, tudo isso relativo ao valor inicial
atualizado do contrato seja ele de obra, de serviço ou de fornecimento. Estão portanto
umbelicalmente vinculados o inc. I, com suas alíneas, do art. 65, com o § 1º, do mesmo
artigo: os primeiros autorizam aumentar o objeto, e o outro limita o valor dessa
alteração.
Mas toda a atenção deve ser voltada para a dicção valor inicial atualizado, pois é
esse o referencial sobre o qual pode ser calculado o limite de valor para as alterações
fundadas no inc. I - e esse o ponto de destaque deste artigo, pois que nem todos se dão
conta da absurda enormidade de valor que isso pode representar, considerando-se que
valor inicial atualizado é a soma de todos os valores que foram a pagos ao contratado
por força do contrato, na data em que se quer aplicar o acréscimo de objeto (e de valor)
com base no inc. I, als. a e b, do art. 65. Assim, se o contrato teve seu preço acrescido
por diversos fatores cumulativamente, sejam eles reajuste, prorrogação, variação cambial,
penalização, revisão por fato do príncipe, atualização financeira, e tendo sido calculado
um título sobre o outro - o que é perfeitamente possível em direito e, aliás, é a única
possibilidade material - então a soma de todos os valores que já foram pagos ao
contratado representa o valor inicial atualizado do contrato, e já se pode ter idéia de a
quantas pode chegar aquele contrato. acrescido como foi por tantos e tão diversos
motivos, causas, títulos e fundamentos.
Imaginemos, para ilustrar, uma gigantesca obra de reforma contratada para dois
anos, prorrogáveis na forma do inc. I, do art. 57, da lei de licitações, com implemento de
valor parcialmente em dólar, atualização financeira e penalização contra a Administração
previstas, reajuste anual pelo INCC na parte que não em dólar, e que após três anos de
execução, após prorrogação portanto, sofra revisão com base no art. 65, II, al. d, por
inundação na sua sede. O valor inicial, era de 100 para o primeiro ano; com o reajuste
anual, e a variação cambial após dois anos, em que também ocorreram penalizações e
atualizações financeiras, foram pagos 260; surgiu então ensejo de revisão por inundação
na sede, e após dois anos e meio de execução, já após a segunda prorrogação e o
segundo reajuste portanto, o valor pago atingiu 580; com a terceira prorrogação, variação
cambial desfavorável à Administração, novas penalizações por atraso e novas
atualizações financeiras, e já no terceiro reajuste, o valor já pago não é de estranhar que
andasse pela casa dos 800.
Eis que então resolve a Administração exigir do contratado mais objeto, mais
reforma, até o valor máximo permitido, que então, considerando-se o valor inicial
atualizado do contrato (800), é de 400, o que fará totalizar, apenas por esses títulos
quando se encerrar o prazo do acréscimo do objeto, 1.200, em prazo que irá variar
conforme o novo cronograma físico. Outros fatores, nesses últimos meses após a
determinação do acréscimo, podem ainda fazer subir o último valor, porém o que
interessa ressaltar é que nesse hipotético porém absolutamente realístico exemplo
apenas uma alteração, aquela baseada no inc. I, b, do art. 65, da lei de licitações,
significou quatro vezes o valor previsto para o primeiro ano de execução. Somente
uma variação de preço, fundada em um isolado momento da lei, e lastreada em um
singelo fundamento, terá representado o valor originariamente previsto para um ano
inteiro de execução !
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XII
É em face de fatos assim, não retirados de algibeira de mágico mas da realidade do
dia-a-dia de todas as entidades da Administração pública brasileira, que os contratos,
sobretudo de obras, sofrem variações - para cima e para o alto - tão virtualmente
inimagináveis por leigos, desavisados, ingênuos ou distraídos de todo gênero.
Veja-se com isso o potencial dinamitador das finanças públicas contido nos escaninhos
quase indecifráveis da lei nacional de licitações e contratos administrativos, e sobretudo
tenha-se sempre em destaque a imprescindível importância do planejamento da
despesa pública.
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LICITAÇÕES E CONTRATOS
ALGUMAS CURIOSIDADES
Ivan Barbosa Rigolin
I
Uma palestra que recentemente proferimos inspirou a idéia deste artigo, sobre
temas e fatos curiosos sobre licitações, inclusive o pregão, e contratos administrativos.
Desfilemo-los, portanto, assistemática e descompromissadamente como convém àquela
proposta.
II
Inicia-se pelo convite. Essa utilizadíssima modalidade licitatória poderia ser
realizada de modo muito mais simples e descomplicado do que em geral o é, e a principal
simplificação consiste em eliminar sempre, e totalmente, a fase de habilitação, em
todo e qualquer convite que se realize. A Lei nº 8.666/93 admite expressamente tal
supressão, quando prevê, no art. 32, § 1º, que ―A documentação de que tratam os arts. 28
a 31 desta Lei poderá ser dispensada, no todo ou em parte, nos casos de convite,
concurso, fornecimento de bens para pronta entrega e leilão‖ - e grifamos. Fosse de fato
importante a habilitação, conforme sempre insistimos em iterar que não é, jamais a lei de
licitações a trataria com tamanho, merecido, desprezo, dispensando-a sempre em três
das cinco modalidades existentes, e também nas duas outras, concorrência e tomada de
preços, se efetuadas para fornecimento de bens de pronta entrega.
Nessa hipótese de não se promover a fase de habilitação, perguntarão os aturdidos
burocratófilos (filoburocratas?) do serviço público1, como poderá saber a Administração
com quem estará contratando, se não habilitar previamente os pretendentes?
Simplíssimo: basta exigir dos fornecedores, que se pretendia fossem convidados, porém
fora de qualquer envelope e informalmente, todos os documentos que se pretendiam
exigir, dentro do rol máximo admitido na lei, e simplesmente não convidar aqueles que
não os tenham todos.
Como o convite deve dirigir-se, em casos normais, a ao menos três fornecedores
escolhidos e convidados pela Administração, e como, tal qual em tese qualquer convite,
não deve ser publicado (v. art. 21, que não manda publicar convite, e art. 22, § 3º, que
manda apenas afixar os convites, e não publicar convite algum), então somente devem
ser efetivamente convidados aqueles fornecedores que informalmente demonstrem deter
todos requisitos documentais pretendidos. Os documentos obtidos de cada fornecedor
devem , por outro lado, ser anexados desde logo ao expediente ou processo da licitação,
para indicar que estão eles habilitados do modo como se pretendia apurar.
Quanto, por fim, ao fato de que (cf. art. 22, § 3º, da lei de licitações) também os
cadastrados que o requeiram têm direito a receber o convite, isso em nada afronta a
1
Se ainda vivesse o grande e inigualável gênio de Monteiro Lobato por certo reescreveria seu conto Velha praga,
referindo-se porém não mais a Jeca Tatu, como no início do século o fez, porém à burocracia na máquina
estatal, que constitui a mais asquerosa e perniciosa praga da história da administração pública brasileira.
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simplificação aqui advogada, pois que inexiste qualquer embaraço em estender convites a
quem já se habilitou previamente, e que por isso é já conhecido e qualificado pela
respectiva entidade licitadora. Não é dos conhecidos que deve resguardar-se a
Administração mas dos desconhecidos, muitos dos quais são aventureiros e
paraquedistas da pior e mais temível espécie. E em geral são esses últimos, seres
indesejáveis e que nada têm a perder, os primeiros a acorrer à publicação de quaisquer
avisos de editais.
Se, por fim, ainda existem os que defendem a idéia da publicação do convite, numa
tosca, deturpada, antitécnica, caolha e deletéria ampliação do princípio da publicidade,
confessamos aqui nosso sadismo técnico: comprar-nos-íamos à grande se
soubéssemos algum deles indiciado em ação popular, por ter realizado despesa pública
não autorizada na lei. Desculpe-se o requinte de crueldade, porém o pior cego, alguém
ilustre já disse, é o que não quer ver, e esse somente entende uma linguagem.
III
O próximo ponto a enfocar, vinculado umbelicalmente aos primeiros, refere-se a
habilitação de licitantes, e a esta altura da construção doutrinária sobre licitações não
constituirá novidade alguma. Quer-se apenas, uma vez mais aqui, repisar o que já vem
sendo exaustivamente apregoado pelos estudiosos, pelos técnicos e pelos operadores de
licitações dotados de bom-senso e de sentido prático, e que em sua profissão aplicam o
princípio da razoabilidade: a habilitação deve ser a menor possível. Quase ousamos
afirmar que quanto menor for o volume de documentos habilitatórios que o edital exija,
melhor, por mais inteligente, será esse mesmo edital.
Neste mundo de hoje, em que ninguém dispõe de tempo para coisa alguma
justamente quando o tempo é mais necessário do que nunca, e ainda quando a
Administração pública é demandada como jamais o fora na história para prestar os mais
variados e outrora impensáveis serviços, num quadro assim revela-se virtualmente
incompreensível a antiga - pré-histórica - mentalidade de se exigir um vasto rol de
documentos dos licitantes, seja para construir a ponte Rio-Niterói, seja para comprar dois
caminhões de tomate.
A lei não obriga a exigir em verdade nada: a Constituição (art. 195, § 3º) é que
proíbe ao poder público contratar pessoas jurídicas em situação irregular na previdência
social, ou seja em débito não-negociado, e pendente de solução; quem exagera nas
exigências documentais é o aplicador, velho e empedernido burocrata que imagina estar
prestando o serviço mais relevante e proveitoso ao poder público ao exigir atestados de
desempenho anterior aos vendedores de cenoura ou de papel sulfite; provas de
regularidade fiscal emitidas por todos os níveis de governo, quando o seu Município
nenhum interesse tem nisso, e muito ao contrário se souber que licitação é competição de
propostas e não de documentos, sobretudo os que somente interessam a esferas alheias
de poder; contrato social de multinacionais fabricantes de automóveis; o CNPJ dessas
mesmas empresas; prova de grande capital integralizado a prestadores de serviços
corriqueiros; registro ou inscrição em entidade profissional competente, que não se
sabe se existe nem qual é, a vendedores de televisões ou de mandioca brava; grande
índice de liqüidez a vendedores de mercadorias para entrega imediata e integral;
registro comercial de empresas individuais, para construção de enormes edifícios;
decreto de autorização de funcionamento de empresas estrangeiras, em licitações
nacionais e que por isso naturalmente não admitem empresas estrangeiras; declaração
de que o licitante não descumpre as regras de proteção do trabalho do menor, ao
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licitar obras de grande vulto que serão construídas por gigantescas construtoras as quais
por vezes não têm um só menor empregado2; prova de inscrição no cadastro
municipal de licitantes que não se precisam submeter a qualquer inscrição para executar
o objeto pretendido; certidão negativa de falência a vendedores de pão-de-queijo, e
outras intermináveis e incontáveis exigências, quase todas, além de desnecessárias e
desarrazoadas, impertinentes ao objeto, e com isso abusivas, discriminatórias, irracionais,
irrazoáveis, e desprovidas de qualquer finalidade ou motivação publicística com relação
ao ente que licita.
A Administração precisa selecionar com máximo rigor e extrema parcimônia os
documentos que exigirá em licitações, porque exigir mais do que necessita prejudica
sempre, por afastar grande número de participantes, mais preocupados em prestar bom
serviço ou vender bom material a bom preço que em juntar papeladas, e mais
interessados em demonstrar sua qualidade trabalhando e não com dezenas de
documentos.
E nem se argumente com a desgastada fórmula de que a Administração ―precisa
conhecer muito bem quem pretende contratar‖, pois que isso de fato nunca foi verdade.
A Administração detém a faca e o queijo nas mãos em qualquer contrato com particular,
que se não desempenhar a contento sua obrigação será apenada com suspensões e
multas, ou declarações de inidoneidade para licitar; deixará de receber e terá rescindido
seu contrato, e poderá vir a arruinar-se como se arruinaram centenas e milhares de exempresas que, tendo contratado com o poder público após exaustivas licitações,
simplesmente foram caloteadas, ou ―bigodeadas‖ pela Administração, por vezes jamais
recebendo seus créditos.
Para a Administração, entretanto, caso rescinda o contrato com algum fornecedor
que licitou, basta estalar um dedo e os demais participantes acorrerão às pressas, pela
ordem de classificação, para contratar a parte faltante, ao preço do anterior contratado,
atualizado.
Já dissemos mais de uma vez que quem porventura gosta de habilitação não gosta
de licitação, e, se psicologicamente analisado com a merecida detença, provavelmente
apresentará vocação para capataz de campo de concentração nazista - com toques
inclusive de masoquismo - antes que de servidor racional e disposto a auxiliar a
coletividade, a todos e a si mesmo.
IV
Abordemos agora um ligeiro aspecto do pregão, em duas palavras: ou a Lei nº
10.520, de 17 de julho de 2002, sem o declarar constitui norma d geral de licitação ou
todo e qualquer pregão realizado no país é ilegal.
O § 8º, do art. 22, da Lei nº 8.666/93, com efeito, sem nenhum rodeio estabelece
que ―É vedada a criação de outras modalidades de licitação ou a combinação das
referidas neste artigo‖, e a Lei nº 10.520/02 simplesmente criou outra modalidade
licitatória, a sexta, o pregão, que hoje vem sendo pacífica e desassombradamente
realizado em todas as esferas da Administração pública de todo nível, inclusive autárquica
e fundacional, e nas empresas estatais.
2
E o transpositor para a lei de licitações dessa idéia constitucional, concebida em prol do direito do trabalho no
mundo empresarial, é alguma espécie de extraterrestre acaso ungido com mandato político, tal o seu grau de
alienação com relação ao mundo real do direito. Com o mesmo sentido poderia a lei permitir que o edital exigisse
prova de que o licitante não mantém escravos a seu serviço.
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Assim, se não se quiser enfrentar uma batalha jurídica que não terá fim - e que a
esta altura dos acontecimentos já se sabe perdida de antemão -, será preciso considerar
a lei do pregão como norma geral de licitação, pois que nesse caso revogou o § 8º, do art.
22, da lei de normas gerais de licitação, a Lei nº 8.666/93.
Ainda que a lei do pregão não o declare, como qualquer lei que introduza norma
geral do que quer que fosse em boa técnica precisa declarar que o faz - até para
demonstrar o seu enquadramento a alguma das previsões do art. 22 da Constituição
relativas a competência legislativa privativa da União -, ainda assim é preciso, para se
sustentar a permanência do pregão como sexta modalidade licitatória, que a Lei nº
10.520/02 é norma geral de licitação, pois que somente assim poderia ter o condão e a
capacidade de revogar parcialmente a lei das normas gerais, já que lei que não de
normas gerias jamais revoga, ou sequer arranha, a lei de normas gerais. Quanto ao
pregão, tão magnífica foi essa idéia ante o panorama tenebroso e lúgubre da Lei nº
8.666/93 que o legislador não se deve haver lembrado de qualificar a lei do pregão como
norma geral de licitação, como precisaria ter procedido se de fato era tal a sua intenção,
como ao que tudo indica foi.
E, para rematar, aos que nos qualificam brigadores, saibam que esta briga de tentar
provar a ilegalidade dos pregões ante a lei das normas gerais de licitações, não
enfrentaremos, do mesmo modo como não nos é particularmente aprazível esmurrar
extremidades de facas. Dom Quixote nos legou, afinal, sábias lições.
V
Prosseguindo nesta incursão sobre algumas curiosidades sobre licitações,
permaneçamos no tema do pregão. De início, questão do - hoje tornado antigo regulamento do pregão, o Decreto nº 3.555, de 8 de agosto de 2000.
A lei do pregão, a Lei nº 10.520, de 17.07.02, proveio, como se sabe, da conversão
da Medida Provisória nº 2.182-18, de 23 de agosto de 2001, que foi a última da série das
medidas provisórias que se iniciaram com a MP n° 2.026, de 4 de maio de 2000 e se
repetiram, praticamente com a mesma redação por todo o tempo até se iniciar o processo
de conversão.
O § 2º, do art. 1º, de todas aquelas dezoito medidas provisórias, previa que ―O
regulamento disporá sobre os bens e serviços comuns de que trata este artigo.‖ Esse
dispositivo, dessa forma, continha ou impedia a eficácia do caput até a edição do
mencionado decreto, o qual descreveria os bens e os serviços passíveis de serem
licitados por pregão. E de fato conteve até 8 de agosto de 2000, data da edição do
referido Decreto nº 3.555. Uma vez editado, ficou livre a Administração, que naquele
momento era apenas a federal, para licitar por pregão.
Assim foi, entretanto, até a publicação da Lei nº 10.520/02, a qual,
surpreendentemente, durante a conversão sofreu drástica modificação, e o antigo § 2º, do
art. 1º das MPs, foi simplesmente suprimido da redação final do art. 1º da lei, que teve
então apenas o seu parágrafo único, do qual não constava a contenção da eficácia até
a edição de regulamento.
Com isso, perdeu completamente seu papel ―liberatório‖ o já editado regulamento, o
Decreto nº 3.555/00, passando a jazer no panorama legislativo como que perdido no
espaço, algo sem função, tornado gratuito por inteiro, e desvinculado de qualquer
finalidade. Servirá, no máximo, como inspiração a quem deseje licitar por pregão - porém
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cuidado ! Como modelo contém defeitos inumeráveis, inclusive de legalidade pois que
contraria em diversos momentos a própria lei que regulamentava.
Esse, no máximo, de ―roteiro sugerido‖, passou a ser o condão e o escopo do
mortalmente golpeado Decreto nº 3.555, de 2000. Não se tornou ilegal só por esse fato,
porém deixou de ser necessário como rol de bens e serviços licitáveis por pregão. De tal
sorte, doravante e desde a edição da lei cada edital de pregão livremente elegerá, dentro
do critério do art. 1º, da Lei nº 10.520/02, os bens e serviços a licitar, dentro dos que a
respectiva entidade pública considere comuns.
E, por fim, a julgar pela qualidade horrenda daquele decreto, até que fez por
merecer seu destino.
VI
Encerre-se este curto artigo - que será prosseguido proximamente - com duas outras
alusões ao pregão:
1ª) pode ser realizado pregão para registro de preços, a teor do disposto tanto no
art. 9º, da lei do pregão, que manda ou autoriza aplicar subsidiariamente a Lei nº 8.666/93
ao pregão, e o registro de preços consta do art. 15, inc. II, daquela lei, podendo assim ser
utilizado por aplicação do fundamento subsidiário, quanto por força do que dispõe o art.
12 da lei do pregão, que, modificando a Lei federal nº 10.191, de 14 de fevereiro de 2001,
faz admitir expressamente, para todos os entes federados, o pregão para registro de
preços para bens e serviços vinculados à área da saúde. E, comentamos nós, se para a
saúde isso é possível ninguém postulará, em sã consciência, que para outras áreas do
serviço público os bens e os serviços comuns estarão impedidos de se licitarem por
pregão, já que nenhum sentido teria uma tal restrição.
Seja como for, e apenas pelo art. 12, da lei do pregão, está também tacitamente
derrogado o inc. I, do § 3º, do art. 15, da lei de licitações, que exigia que o registro de
preços se desse tão-só por concorrência. Com a admissão do pregão pelo art. 12 da Lei
nº 10.520, foi por água abaixo aquela restrição;
2ª) consta que já tramita (ou dorme em alguma gaveta parlamentar de preferência, e
que durma para sempre) um infame projeto de lei que pretende substituir a lei do pregão,
com seus enxutos e adelgaçados artigos, contendo 175 (cento e setenta e cinco) grossos
e grosseiros artigos, que instituem até mesmo a modalidade de júri (sic ! Acredite-se se
se quiser !) para licitações de bens e serviços comuns.
Trata-se do maior retrocesso na legislação brasileira de todos os tempos, de uma
doentia torpeza de concepção, não se sabe visando atender a que espécie de interesses,
que mata de vergonha a quem tenha a mínima consciência jurídica e se disponha a ler
até o fim o enorme amontoado de incongruências e tautologias, que complicam até o
extremo o que foi brilhantemente simplificado com relação à lei de licitações, o pregão.
Aquela execrável iniciativa, cavernícola e telúrica, própria antes de primatas do
direito que de homens do direito, e que não se sabe de onde veio e a que veio - mas
somente para onde desejamos que vá -, não pode em hipótese alguma ser aprovada, ou
mesmo tramitar normalmente, como se fora normal.
Encareçamos por isso o máximo tirocínio possível aos parlamentares brasileiros, que já
brindaram nosso direito com a atual lei de licitações, para que não dêem seqüência à
inominável insânia, e ainda mais agravem o atual e tétrico panorama das licitações
brasileiras, que apenas é suavizado pela existência do pregão.
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LICITAÇÕES E CONTRATOS
ALGUMAS CURIOSIDADES - II
Ivan Barbosa Rigolin
I
Em seqüência a um primeiro artigo sobre curiosidades em licitações 1, enumeremos
outras pitorescas particularidades dessa província do direito administrativo, em nosso
continental país no qual, a crer na nem sempre acurada informação dos jornais, de 55 a
60% das contratações efetuadas pela União dão-se sem licitação, diretamente com o
particular por via da dispensa ou da inexigibilidade.
E, se assim for de fato, a ninguém reste dúvida de que a zelosa lei das licitações
oferece amplo resguardo e formal cobertura a semelhantes transações com o dinheiro
público. A norma então parece, nesse passo, não a lei das licitações mas a lei das
dispensas de licitação, ou a lei das licitações dispensadas. Ou, quiçá, a lei das nãolicitações. Com todo o seu sacrossanto e formalismo, e a sua apregoadíssima
austeridade, em verdade preconcebida para inglês ver...
II
Uma inicial curiosidade neste tema é a de que certos objetos em licitação conforme
o caso tanto podem ser compras quanto podem ser serviços. Qualquer objeto que esteja
pronto nas prateleiras de alguma loja, à espera de comprador, é compra, enquanto que
outro objeto da mesma espécie e natureza, que, entretanto, pela sua dimensão, ou pelo
material de que seja confeccionado, ou pela cor, ou pela peculiaridade de algum detalhe,
precise ser fabricado segundo alguma norma ou projeto, sendo que o seu custo nesse
caso será dado sobretudo pelo inédito e ingente trabalho que a produção envolve, então
esse mesmo material deixa de ser compra para converter-se em serviço, eis que a mãode-obra envolvida, muita vez dificílima ou tremendamente trabalhosa, com freqüência
responde pela quase totalidade do seu valor final.
Em caso assim, por evidente toda desejável diluição de custos que uma linha de
montagem acarretaria desaparece, ou não existe, já que nenhuma linha de montagem
será montada para produzir tão incomum e especializado artefato. Como classificar como
compra, se assim é, um tal objeto, em que o material utilizado pouco pesou no custo final,
ante o especializado, demorado, complexo e custoso serviço que foi necessário. Trata-se,
portanto, de serviço e não de compra nesse caso.
Como exemplos se podem citar próteses ou órteses, sempre individuais e
produzidas para atender a necessidades individualizadas, ocasiões em que serviço pesa
em geral muito mais que o material empregado; houvesse a possibilidade de produção
em massa de próteses, o custo de cada qual desabaria em face da sua multiplicação
uniforme. Outro exemplo ocorre no caso de instrumentos musicais, os quais se forem de
fábrica, produzidos em série com materiais por vezes comuns e baratos, têm um preço,
1
E nosso muito caro Cerdônio Quadros, ao deparar com o primeiro artigo sob este título, de pronto nos advertiu
para a insanável redundância que continha, já que, obtemperou, desde que existe a Lei nº 8.666/93 todo e
qualquer assunto relativo a licitação passou a ser no mínimo curiosíssimo.
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porém se confeccionados por autores renomados e com material selecionado,
envelhecido e tratado com primor artesanal custam, por vezes, quinhentas vezes mais.
No primeiro caso compram-se os instrumentos como material, e no segundo compra-se o
serviço de confecção, o que resulta drasticamente diverso. Falando-se em violinos novos2
e em dólares americanos, o primeiro vale cem no mercado e é compra, e o segundo por
vezes custa vinte e cinco mil, e somente pode ser tido como serviço.
Forçando-se um pouco a mão mas falando francamente, um automóvel popular é
compra, mas um artesanal Rolls Royce, elaborado inteiramente a mão, garantido por toda
a vida do primeiro proprietário e cujas portas são abertas e fechadas cem mil vezes antes
da aprovação para a venda, esse objeto de uma dificilmente imaginável licitação como
compra não pode ser caracterizado3.
O que para quem elabora editais se pretendeu levantar com este assunto foi a
necessidade de atenção para a perfeita caracterização do objeto como compra ou como
serviço, sabendo-se que se se confundir obra com serviço isso pouco afetará o regime
jurídico do contrato, que será sempre administrativo, porém o mesmo não ocorrerá em
caso de compra, contato sempre civil e que por isso se submete a regime jurídico
privatístico e em tudo rigorosamente diverso do primeiro, com contornos e conseqüências
equivalentemente díspares.
III
Serviços sociais autônomos. Esses invejavelmente organizados organismos
particulares, valiosos auxiliares da formação de profissionais do comércio, da indústria,
das micro e pequenas empresas (o assim chamado ―sistema S‖, integrado por SESC,
SENAC, SESI, SEBRAE e outros entes de objetos similares), apenas por receberem
subvenções oficiais, legalmente instituídas e percentualmente vinculadas a impostos, um
dia foram informadas - e dificilmente hoje se saberá por quem - que deveriam submeterse à legislação de licitações, tais quais fossem entes ou órgãos públicos.
Observou-se assim, na seqüência de tal tresloucada orientação, que tais entidades repita-se, particulares, privadas, que nem sequer são paraestatais, e nem mesmo
indiretamente governamentais - puseram-se com maior ou menor afinco a organizar seus
regulamentos de licitações, naturalmente com base na Lei nº 8.666/93, e na sua
conformidade passaram a licitar suas compras, seus serviços e suas obras, imagine-se
com que dificuldades, e em que estranhíssimas condições institucionais, talvez como as
de quem, calçando 44, é convidado a trajar sapatos 38, ou quiçá tal qual o rei Momo
sendo compelido a comandar o tríduo carnavalesco envergando uma armadura medieval,
com escudo, espada e acha d’armas. A inadequação era patente, e nesse nível insólita.
Após as vozes de costume se levantarem contra a absoluta impropriedade da idéia,
enfim foram se conscientizando os órgãos de controle, sobretudo os Tribunais de Contas,
e a seguir os empedernidos moralistas de plantão - que ainda crêem na geração
espontânea e em que o Sol gira em torno da Terra -, de modo que atualmente restou
2
E conseguimos com isso, uma vez mais, falar de violinos, que ao fim e ao cabo é o mais nos apraz. Tal qual o
incorrigível devorador de queijo parmesão que ingere macarrão apenas para devorar o laticínio, alguém já nos
acusou de que tanto falamos de licitação apenas para, de um ou de outro modo, sempre recair no tema dos
violinos.
3
E já que o assunto são curiosidades, a ninguém ocorra, dentre os gentis leitores que os desejarem adquirir nas
revendas autorizadas, indagar o preço de um desses extraordinários engenhos da indústria automobilística, eis
que então poderá vir a saber, e da pior maneira, que quem adquire um Rolls Royce apenas escolhe a cor e o
modelo, não cabendo falar em vulgaridades como preço.
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pacífico e indiscutível que, ainda que seja de todo desejável e curial que os serviços
sociais autônomos orientem-se pelos princípios da licitação, pelas suas idéias centrais de
economicidade e de vantajosidade como regra para suas contratações, em absoluto
jamais estão sujeitas à legislação licitatória, eis que não são nem nunca foram órgãos
públicos, e não é o só fato de que haurem receita oriunda da parcial vinculação de tributos
oficialmente arrecadados pelo poder público que lhes altera a natureza inteiramente
privada, de modo a afastar a incidência de legislação que apenas se aplicada para o
poder público tem sentido. Nesse sentido a decisão do e. TCU, no proc. 014.238/94-2,
Recurso de Reconsideração no proc. TC 018.320/93-74.
O tema das licitações também se presta a prestigiar e abrigar, pelo que se vê, as
mais variegadas espécies de assombrações e abantesmas institucionais, pelo que se
invoca a oportuna prédica: vade retro! 5
IV
Se, em face do mesmo apontado moralismo de fachada, de encomenda,
ocasionalmente eleitoreiro mas sempre oportunístico e tão confiável quanto uma nota de
quinze unidades de qualquer moeda no mundo, alguma dúvida pudesse restar sobre a
legitimidade das despesas públicas com participação de autoridades políticas e
administrativas em congressos, seminários, simpósios e outros eventos técnicos,
envolvendo ou não viagens, desfaça-se qualquer laivo de dubiedade, vez que é regular e
legítima, e de tempo imemorial, tais gastos.
Se todo abuso que se demonstre é sempre condenável; se todo desvio de finalidade
deve ser coibido; se a predestinação do recurso público é sempre intolerável, o que
entretanto não se admite, em casos como este ou em qualquer caso, é o preconcebido e
incondicionado julgamento antecipado segundo o qual, por exemplo, ―são sempre
irregulares despesas de viagem para participação de autoridades em congressos‖, ou
formulações congêneres que generalizam e uniformizam o que precisa ser particularizado
e sempre examinado caso a caso, sem as fórmulas prefabricadas de juízo que
invariavelmente induzem injustiças.
Demonstrando a autoridade que a despesa pública, com viagem ou sem
deslocamento da sede, relacionou-se com algum evento técnico, e que efetivamente se
deu sua participação, então não cabe a nenhum fiscal das contas públicas, nem a
moralista algum, de plantão e sempre à espreita do momento de dar o bote para aparecer
na imprensa e nos holofotes, substituir-se ao juízo discricionário das autoridades que para
precisamente exercê-lo foram eleitas, para o fim de àquelas autoridades recriminar,
apostrofar, condenar, anatematizar ou enlamear de antemão, à moda dos santos
representantes da inquisição européia, que, visando poupar aos cidadãos o incômodo de
julgar seus semelhantes, já tinham prontos os vereditos aplicáveis aos ―hereges‖ da
comunidade. Com efeito, falar-se em democracia e em igualdade é brincadeira de
criança, enquanto que prezá-las, e aplicá-las com senso de justiça, não se vem revelando
tão simples aos fiscais da moralidade pública - contra os quais, lobos vestidos de
carneiro, jamais silenciaremos.
O e. Tribunal de Contas do Estado de São Paulo pronuncia-se repetidamente, em
instância final do julgamento de contas municipais, pela absoluta legitimidade de tais
4
In Boletim de Direito Administrativo ago. 1999, p. 539.
5 Enquanto, naturalmente, permanecer sem efeito a invocação da mesma prédica contra a lei de licitações
inteira.
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gastos - observados os pressupostos declinados -, como se observa de processos
protocolos 378/026/98, 4962/026/98 e 2014/026/97, todos pela regularidade quanto às
despesas pela participação de Vereadores em Congressos.
V
Relacionado com este tema acima é o de que alguém pretender que apenas por
receber algum dinheiro público qualquer pessoa privada ficaria sujeita à fiscalização pelo
Tribunal de Contas da esfera própria do ente público repassador daquela verba.
Absolutamente não, pois isso não tem sentido nem ante a Constituição, art. 70, que
descreve o papel institucional dos Tribunais de Contas, nem frente a nenhuma lei
orgânica de Tribunal de Contas, que no mais apenas repete, como não deixaria de ser, a
orientação constitucional, E em tais diplomas vem claramente enunciado, como na Carta,
art. 70, que a ―fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da
União e das entidades da administração direta e indireta (...) será exercida pelo
Congresso Nacional (...), sendo que o art. 71 constitucional reza que o ―controle externo,
a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da
União‖, dando em seguida as competências específicas do TCU, em nenhum momento
entretanto legitimando qualquer ofensiva fiscalizatória do Tribunal diretamente sobre
empresas ou pessoas jurídicas particulares.
Quando, no inc. VI, do art. 71, a Carta fixa que cabe ao TCU ―fiscalizar a aplicação
de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo (...)‖, tal
significa apenas que o repassador será fiscalizado, para se saber se exigiu do
beneficiário a prestação de contas indicando a correta aplicação da verba que repassou,
segundo a expressa vinculação que tinha, ou se não o fez, e nesse caso o repassador,
autoridade pública, merecerá a sanção cabível - mas nunca o Tribunal fiscalizará o clube,
o time de futebol, a associação beneficente, a entidade de benemerência, a sociedade
filantrópica ou o outro ente particular que recebeu o repasse. Isso não integra, nem nunca
integrou, responsabilidade dos Tribunais de Contas, fiscal como é de contas
exclusivamente públicas.
Esse tema guarda apenas indireta vinculação com licitações. Ventilou-se neste
artigo sobre licitações apenas para concluir que, se não está sujeito o particular que
receba verbas públicas a fiscalizações oficiais, portanto por fiscais de órgãos públicos,
também por óbvio o particular beneficiário de repasses públicos não está sujeito às regras
da licitação para poder utilizar a verba pública que recebeu. Fora público o ente que a
recebeu, aí, sim, a licitação se imporia como dever, mas não se for o recebedor, repita-se,
particular.
VI
Sobre convênios de colaboração institucional e financeira entre entes públicos e
particulares, acorre-nos preocupação em face do jovial, despreocupado e alegre art. 116,
da lei de licitações, que manda aplicar a mesma lei, no que couber, aos convênios
celebrados pela Administração.
Com o máximo respeito e reverência - longe de nós desdenhar essa atitude - seria
de se convidar algum familiar do autor, quiçá a senhora sua genitora, a indicar em que
casos de convênio, em que particularidade, em que meandro ou escaninho, poderia ter
aplicabilidade a lei de licitações.
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Algum ente público licita convênio, ou convenente? Alguém procura entidade com
quem conveniar através de concorrência? Alguma entidade do poder público sai à caça
de ente particular, desconhecido, com o qual intimamente associar-se para alguma
finalidade de interesse público, como o sequioso noivo que caçasse sua noiva em lista
telefônica, concurso público ou licitação privada, ou como o aflito anfitrião que nos
mesmos moldes procurasse convidados para um churrasco em sua casa, ou par o
casamento de sua filha preferida?
A idéia do folgazão art. 116 é de um primarismo ridículo, amadorístico de fazer dó, e
indica apenas que o autor - que deve andar desempregado, porque, conhecendo-o,
ninguém o pode empregar - se acaso não é também autor do resto da lei, faz jus à
reputação de sê-lo, porque o art. 116, da lei de licitações, faz jus à lei de licitações.
Merece tanta atenção e tanta observância quanto os arautos do fim do mundo para a
semana que vem, e assim será enquanto a lei de licitações permanecer a obra de
alienados que é desde o dia 21 de junho do ano da graça de 1993.
VII
Um último tema para este momento diz respeito à efetiva possibilidade de a
Administração indicar marcas ou modelos dos bens que pretende adquirir em licitação, o
que aparenta contrariar a lei de licitações, em momentos como o art. 15, § 7º, inc. I, ou o
art. 25, inc. I, ambos a proibir a indicação de marca nas licitações.
Temos ao menos três hipóteses em que mais do que permitido torna-se logicamente
obrigatório ao edital indicar a marca, e quando for o caso também o modelo, do material,
equipamento ou bem desejado:
1ª) se existir um só produto, de marca específica, que atenda a necessidade da
Administração, e mais de um vendedor, então far-se-á obrigatória na licitação a indicação
da mesma marca e das especificações pertinentes, ou de outro modo a Administração irá
adquirir o que não deseja, ou que não lhe serve. Trata-se de uma regra de pura lógica,
contra a qual não poderia prevalecer regra legal contrária alguma, e nem sequer caberia
que tal regra existisse, por simplesmente ilógica;
2ª) se o material pretendido, com sua marca, seu modelo e suas especificações, é
padronizado, e se existe na praça mais de um fornecedor, então será igualmente
obrigatória a indicação de todos os aspectos padronizados do bem no edital, pena de
outra vez, em não sendo isso providenciado, a Administração sujeitar-se a comprar
material fora de seu padrão, ou seja fora da especificação que por qualquer motivo
anteriormente levantado ensejou a padronização. E não seja olvidado que praticamente
toda e qualquer característica de qualquer material - se houver justificativa técnica para
tanto - é suscetível de padronização, tais como são marca, modelo, idade mínima ou
máxima, desempenho mínimo, rendimento, cor, transparência, ruído máximo ou mínimo,
regularidade, visibilidade, audibilidade, timbre, forma, peso, material, cheiro, gosto (por
curioso que pareça), princípio ativo, origem, composição, fórmula, processo de fabricação
ou qualquer outro que a imaginação humana possa engendrar. Em podendo ser
tecnicamente justificada a padronização, pode ser efetuada, e o bem padronizado
precisará ser indicado ns licitações, sem qualquer possível argüição de vedação, que
nesse caso deixa de ter sentido;
3ª) nas reposições de peças ou componentes pode a Administração - e se
considerarmos o dever de boa administração deve e não apenas pode - indicar a marca e
o modelo da peça a ser adquirida, sendo da marca original do produto que integrará. É
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fato notório, além de que o barato sai caro, que peças não-originais de reposição,
fabricadas em oficinas pela-porco de fundo de quintal por marreteiros merecedores do
ergástulo com chicotadas semanais e oitiva forçada de música de Stravinsky por ao
menos duas horas diárias, danificarão invariavelmente o equipamento que deveriam
servir, e, assim, o referido dever principiológico da boa gestão pública manda exigir peças
originais para reposições de equipamentos, ao menos daqueles que contenham certo
grau de refinamento ou complexidade. A marca há então de ser destacada e exigida
particularizadamente, sem meias-palavras, subterfúgios ou escamoteações, pois que
somente assim estará atendido o melhor interesse da entidade compradora.
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ALGUMAS CURIOSIDADES - III
Ivan Barbosa Rigolin
I
Pretendia-se que o presente artigo fosse o último desta pequena série, mas os
cabelos encanecidos e a prudência inerente aos anciões recomenda não fechar questão
de modo tão abrupto sobre este delicado ponto, já que ao que parece as curiosidades em
licitação, com a lei que temos, aparentam não ter fim à vista, e nem mesmo, porventura,
no horizonte que se aviste do Everest, inigualável culminância topográfica do planeta.
Equivale a Lei nº 8.666/93, aliás, ao Everest jurídico, somente que para baixo e para o
fundo, para o centro da terra e seus grotões obscuros, e não rumo ao firmamento.
Inicia-se com o tema dos parcelamentos, fracionamentos ou execuções parciais
dos contratos administrativos, assunto cuja singela menção, só em si, costuma infligir aos
aplicadores da lei o mesmo arrepio e calafrio que a alusão a certos demônios tradicionais,
que povoavam o imaginário das gentes nas trevas medievais. Eis, entretanto, que um
semelhante abantesma jurídico, genuíno sete-peles ou tranca-rua das licitações, não
deveria revelar-se tão apavorante, porque tecnicamente não se justifica de modo algum o
temor indiferenciado que com freqüência enseja. A matéria consta principalmente, no seu
aspecto fantasmagórico, do art. 8º, da Lei nº 8.666/93, sendo que em outros momentos
aquela mesma fantasmagoria se dissipa, como se pretende demonstrar.
O art. 8º referido, fixa que ―a execução das obras e dos serviços deve programar-se,
sempre, em sua totalidade‖. Na sua deliciosa ingenuidade esta primaveril e alegre
disposição, concebida decerto por algum burocrata às vésperas de entrar em férias, não
leva em conta que nem sempre a autoridade dispõe de todo o recurso com que realizar a
obra completa, ou programar o serviço necessário em sua desejável integridade, mas
deles necessitando, ao menos na parte que for possível, em quase desespero. Falta-lhe
verba para construir o hospital com seus dez andares, ou todas as escolas de que a
cidade carece, ou ainda para contratar um serviço essencial por cinco anos e em todas as
suas etapas e fases, e o numerário de que dispõe faculta-lhe apenas edificar parte
daquilo, ou as duas etapas iniciais do serviço.
A despreocupada restrição do caput, entretanto, cede vez à razão no parágrafo
único, que, sensata e ajuizadamente, restringe a proibição de parcelamento do objeto
apenas em caso de existir toda a condição, técnica e financeira, para a contratação
integral. Agora, sim, fala o legislador e não o feitor ou o capataz, e indica que é apenas o
fracionamento desmotivado, injustificado e injustificável, irrazoável, sem causa,
gratuito, divorciado da necessidade, sem finalidade de interesse público, o proibido.
O que, por oposição, tiver causa, seja de ordem operacional, seja financeira, seja de outra
natureza técnica, isso evidentemente está e é sempre permitido e cabível - simplesmente
porque atende a estado de necessidade do administrador, e não decorre de seu capricho
ou idiossincrasia.
Reforçam esta convicção outros dispositivos da lei, como, relativamente a compras,
o art. 15, inc. IV, que ao invés de restringir a compra parcial manda subdividir as
compras em tantas parcelas quantas se revelem vantajosas e econômicas, e sobretudo o
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art. 23, § 1º, relativo não apenas a compras mas também a obras e a serviços, que fazem
o mesmo. E sepultam, com tanto, o repulsivo ectoplasma da maldição do fracionamento em verdade uma brincadeira de criança...
II
Prosseguem nossas curiosidades abordando-se o tema do manifesto desinteresse
dos licitantes, expressão utilizada pelo art. 22, § 3º, da lei de licitações, segundo o qual se
por manifesto desinteresse não acudirem ao menos três convidados à licitação sob essa
modalidade mesmo assim o certame poderá ser aproveitado, se indicado esse fato no
expediente administrativo.
Regra excelente, de origem óbvia no Executivo e não em gabinetes de
extraterrestres eleitos proporcionalmente, permite não se perder o convite ao qual
atenderam menos que os três participantes que de outro modo - exceto se por
demonstrada restrição do mercado - seriam exigíveis. Manifesto desinteresse é a
desatenção propositada, a despreocupação pura e simples, o desinteresse verificado sob
sua forma mais primitiva e rasa, seja a de simplesmente não responder ao convite
formulado pela Administração. Ninguém precisa, neste específico tema das licitações,
―formalizar o desinteresse‖, ou manifestá-lo por escrito e formalmente, para caracterizá-lo
ante uma situação concreta que não despertou no convidado a vontade de concorrer para
fornecer obra, serviço ou compra ao poder público.
Ao contrário, quem o formaliza estará provavelmente manifestamente interessado
em, nos futuros ensejos de novos convites, ser de novo lembrado e convidado,
lamentando, decerto, neste momento não poder participar. Manifestamente
desinteressado está e é quem recebe o convite e por ele simplesmente se desinteressa,
deixando de respondê-lo, ainda que para comunicar a impossibilidade ocasional de
participar. Exatamente como quem recebe convite para algum evento e o lança ao
recipiente onde, respeitosamente, deveria jazer a lei nacional de licitações e contratos
administrativos.
III
Prosseguimos com a questão da homologação e da adjudicação, a primeira da
licitação, e a segunda do objeto daquela. Homologa-se, com efeito, o certame licitatório
inteiro, endossando-se-o, avalizando-se-o e, quem o faz, assumindo com isso a
responsabilidade pela sua correção formal. Já a adjudicação se dá com relação ao objeto
da licitação, e significa tão- só a atribuição daquele objeto a alguém, ao vencedor do
certame.
Quem pratica ambos esses atos é a autoridade superior à comissão de licitação, e
nessa ordem prevista no art. 43, inc. VI, da lei de licitações. Após homologar o certame, o
que se dá apenas após resolvidos todos os incidentes do julgamento das propostas,
inclusive recursos, a autoridade homologa o certame para que possa produzir efeitos
externos à Administração, e permitir a contratação de terceiro. Homologação é o ato que
desembaraça algum procedimento administrativo exatamente para que possa produzir
efeito externo, tal qual ocorre nos concursos públicos. A adjudicação do objeto somente
terá sentido operacionalmente lógico, portanto, após a homologação do certame, ou de
outro modo, se acaso a comissão, logo após o julgamento, adjudicar o objeto ao
vencedor, algum recurso a seguir interposto poderá obrigar ao indizível vexame de a
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Administração precisar anular a precipitada adjudicação, para realizá-la em nome do
efetivo vencedor, afinal extraído da fase recursal.
Por essa razão é, como no dizer de ilustre ex-Ministro, imexível a ordem de todos os
atos descritos no art. 43, em cujo inc. VI antes aparece a homologação e apenas após a
adjudicação, não se devendo levar em conta para esse efeito, como chegou a ser comum
ocorrer, a falta de ordem escrita no art. 38, verdadeira lista de compras em supermercado
que permite quaisquer alterações sem prejuízo do resultado desejável, e a demonstração
disso é a ordem em que aparecem, naquele art. 38, o inc. VII, que menciona adjudicação
e homologação, e o inc. VIII, que cita recursos, quando se sabe que os recursos sempre
ocorrem anteriormente à homologação da licitação e à adjudicação do objeto. Fosse uma
ordem certa e necessária a dos incisos do art. 38, então jamais surgiria o inc. VIII, com
seu teor, antes do inc. VII.
IV
Outro tema que por vezes atenaza a já sempre ameaçada serenidade da autoridade
contratante segundo a atual lei nacional de licitações e contratos administrativos é o de
saber se é para valer a aparentemente imobilizante previsão da parte final do inc. IV, do
art. 24, da lei de licitações, que reza ―vedada a prorrogação dos respectivos contratos‖.
Trata-se de contratações emergenciais, para atender a situações a exigir urgência de
atendimento, e procedidas com dispensa de licitação, em contratos de ate 180 (cento e
oitenta) dias de duração. Tal vedação de prorrogação seria para qualquer contrato
emergencial, de qualquer duração, ou apenas para aqueles que já atingiram o prazo
máximo? Vale dizer: pode-se contratar emergencialmente por menos que 180 dias, e
prorrogar-se esse contrato até no máximo 180 dias, ou, de outro modo, qualquer contrato
emergencial, de qualquer prazo, só em si já é improrrogável?
Ficamos com a tese de que pode ser prorrogado, havendo motivo e justificativa, o
contrato emergencial, desde que o prazo total final não ultrapasse o máximo estabelecido
no inc. IV. Não será apenas por ser emergencial, entendemos, que estará proibida
qualquer prorrogação, ou de outro modo quem pode o mais, que é contatar por até 180
dias, ver-se-ia sem poder o menos, que é contratar por menor prazo e prorrogá-lo até o
máximo expresso.
Podem efetivamente surgir ensejos, e surgem com marcante freqüência, de se
precisar prorrogar um contrato emergencial, cujo prazo tenha sido porventura
subestimado segundo a real necessidade, porque a urgência persiste, ou porque ocorre
nova situação de urgência, conjugada à primeira, ou dela decorrente, a qual se possa
atender por prorrogação do contrato já celebrado. Não há razão por que entender
restritiva a uma só celebração, em casos assim, a regra in fine do inc. IV, do art. 24, da lei
de licitações, e simplesmente porque além de não estar expressa tal restrição ela nem
seria lógica ou razoável, se o que ali se visa é atender a necessidades excepcionais da
Administração dentro de prazo que, se exercido inteiro, é mais que razoável numa lei que
prevê contratos de até 12 (doze) vezes aquilo (art. 57, inc. II, combinado com § 4º), ou até
mesmo mais que isso (art. 57, inc. I, dependendo de sucessivas e indeterminadamente
repetidas prorrogações de diretrizes dos planos plurianuais).
Parece-nos que a lei, por pior que em seu conjunto total se afigure, e que neste
passo reconheceu e se curvou ante excepcionais estados de necessidade da
Administração, dificilmente conteria um formalismo tão gratuito e despropositado quanto
esse, se acaso alguém o advogue.
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V
O último tema escolhido para esta assistemática resenha é o das concessões e das
, distinguindo-se desde logo as de serviço público das de uso de bens
públicos. Trata-se de grupos de instituições jurídicas tão similares entre si quanto um
rinoceronte e uma suculenta berinjela, mas curiosamente ainda propiciam as mais
inconcebíveis confusões por qualificados profissionais de diversas áreas, inclusive
jurídicas, integrantes de diversos Poderes do Estado. Jura-se, ao se lerem certas
assertivas sobre concessão de uso, ou sobre permissão de uso, que os seus autores
nunca ouviram falar do assunto, e que jamais sequer suspeitaram que além das
concessões e permissões de serviço público existem-nas também de uso de bens
públicos. Se assim o é, aprendam a partir de agora que a) existem, e b) são institutos
diferentes.
permissões
É preciso que os cultores do milenarmente tradicional direito privado voltem um
pouco seus olhos, a esta altura da história e neste particular momento em que os
institutos publicísticos se multiplicam, se avolumam e se agigantam na vida de todas as
nações civilizadas, para o direito administrativo, o direito local por excelência, aquele
ainda pouco conhecido ramo jurídico dotado de suas regras todas peculiares, suas
instituições características que muita vez simplesmente se opõem àquelas do direito
comum, suas estatuições típicas, seus meandros e seus delineamentos próprios, desde
bem logo inconfundíveis. E, mesmo já se estando dentro do direito do Estado, faz-se
imprescindível atentar para as regras constitucionais de distribuição de competências,
entre as diversas pessoas jurídicas de direito público interno, conforme o assunto de que
a cada momento se cuida, e que a cada instante se visa disciplinar.
VI
Não se podem tratar problemas privativos do direito público senão com as normas a
cada momento aplicáveis. Antes de dizer o principal, figuremos um só exemplo de
impropriedade no trabalho, sobre este assunto, que engulha ao profissional do direito
administrativo como pouca coisa mais: é tremendamente irritante deparar-se alguém com
relatório de auditoria, dos Tribunais de Contas, apontando irregularidade em algum
contrato de concessão de uso de bem público, ou mesmo de concessão de serviço
público, porque não observou a lei de licitações. E imaginar, esse profissional, que
precisará perder seu escasso tempo para provar o óbvio, para demonstrar os rudimentos
da matéria, conhecidos dos administrativistas mas que o auditor não detém, não deve lhe
parecer sequer razoável. E o pior é que provavelmente no ano seguinte o mesmo se dará
e nos mais diversos Municípios, até porque em geral os auditores não acompanham a
seqüência do processo de fiscalização das contas, iniciados com seu relatório, restando
sem saber que fim teve o seu - tecnicamente, data venia, infantil - apontamento. E tudo
apenas porque o infinitamente obtuso e juridicamente nulo autor da Lei nº 8.666/93, com
o refinamento de um açougueiro medieval, estabeleceu no art. 2º de sua obra, juntando
alhos e bugalhos no mesmo saco, que ―As obras, serviços (...), compras, alienações,
concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com
terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses
previstas nesta Lei.‖
É evidente que ignora que permissão não é contrato, mas ato administrativo
unilateral de outorga, de caráter negocial, oneroso ou não, excepcionalmente por tempo
certo mas em geral por prazo indeterminado e a título precário. Jamais deve ter lido um lei
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orgânica de Município, nem mesmo a Constituição Federal ou as Constituições estaduais
que disciplinam, cada qual para seu âmbito, a matéria das concessões e das permissões.
Desconhece, por óbvio, que existem, dentro do direito administrativo nacional, quatro
espécies de contratos administrativos de concessão, sejam: a) de obra pública, que em
certos casos ganhou novo rótulo na Lei nº 8.987/94, art. 2º, inc. III 1, mas que continua
sendo e devendo ser disciplinada por legislação local; b) de serviço público, referido na
Constituição, art. 175, parágrafo único, inc. I, e disciplinado para a União na Lei nº 8.987,
de 13.02.94, e para cada Estado na sua Constituição e nas suas leis, e para cada
Município na sua lei orgânica e nas suas leis; c) de uso de bem público, que não tem
menção na Constituição Federal e que é disciplinado em cada ente federado
exclusivamente por sua legislação, e d) de direito real de uso, disciplinado pelo art. 7º,
do Decreto-lei federal (porque os existiram estaduais, mesmo contra dispositivo
constitucional federal) nº 271, de 28.02.67.
E desconhecerá também provavelmente, e até o dia de hoje, que existem
permissões de serviço público, também referidas no art. 175, parágrafo único, inc. I, da
Constituição, ao lado das permissões de uso de bens públicos, figurantes das
Constituições Estaduais e das leis estaduais para o âmbito dos Estados, e das leis
orgânicas municipais, para esse escopo territorial.
VII
É ainda evidente que muitos profissionais fiscais das contas públicas, e fiscais da lei,
desconhecem que na Constituição Federal inexiste a possibilidade de a União ditar
normas gerais sobre concessão, qualquer delas, e sobre permissão, qualquer delas,
porque simplesmente os arts. 21 a 24 da Carta não as prevêem, como prevêem, por
exemplo, que a União estabeleça normas gerais de licitação e contrato administrativo
(art. 22, inc. XXVII), ou como está constitucionalmente previsto, em outras palavras
querendo significar o mesmo que ditar normas gerais, que pode a União instituir
diretrizes para o desenvolvimento urbano (art. 21, inc. XX), ou então estabelecer
princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação (art. 21, inc. XXI).
Em todas as hipóteses constitucionalmente autorizadas a União dita regras gerais e
amplas, ou princípios e diretrizes - que no mundo real e não no nefelibatismo acadêmico
que acomete incontáveis pós-graduandos de todo gênero, repita-se, significam
exatamente o mesmo - aos demais entes integrantes da federação, mas, por favor
atenção, apenas naquelas estritas e taxativas hipóteses constitucionalmente
enumeradas, e não no que a cada momento por modismo, demagogia, proximidade das
eleições ou puro e simples alheamento do direito, der na veneta do legislador federal, do
Executivo ou do Legislativo2.
1
E a concessão de serviço público precedida de execução de obra pública, referida no inc. III, do art. 2º, da Lei
federal nº 8.987/94, a lei das concessões de serviço público, nem sempre é a mesma concessão de obra pública
conhecida do direito administrativo, porque ainda nos dias de hoje é possível ao poder público contratar a
particulares a execução de uma obra pública a ser remunerada por pedágio durante alguns anos, como o caso
de uma ponte, sem o envolvimento de qualquer serviço público. A isso se chama e sempre se chamou
concessão de obra pública, antes da lei das concessões de serviço público, depois dela ou apesar dela. Mas
aqui também o legislador federal foi por demais grosseiro para entrever a diferença. Só lhe interessou inovar,
alterar o direito, jamais se dando conta de que a grande maioria das concessões de obra pública simplesmente
passou ao largo das definições do art. 2º, da Lei nº 8.987. Assim, o Estado de São Paulo mantém a sua lei
disciplinadora dessa espécie de concessões, que é a Lei nº 7.835, de 8 de maio de 1.992. A grosseria do
legislador federal neste assunto não o contaminou.
2
Ninguém se olvide de que legislador em verdade, hoje em dia e há tempos no Brasil, é o Executivo, e o
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Em outras palavras, o único modo de a União poder ditar normas sobre assuntos de
interesse local para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios seria fazê-lo através de
normas gerais, ou diretrizes, ou ainda princípios, única e tão-somente para sobre as
matérias para as quais estivesse a União constitucionalmente autorizada. No caso de
concessões ou permissões, sejam do que for, nada semelhante a qualquer remota
autorização consta da Constituição, e isso evidencia o caráter eminentemente local de
tais assuntos.
Com todo efeito, concessão de serviço público municipal é assunto que apenas ao
Município interessa, e o mesmo se diga de qualquer outra espécie de concessão que,
contratada no Município, não espraie seus efeitos para fora do Município. O mesmo se
afirme quanto à permissão, seja do que for. Nada existe de indício, parâmetro,
norteamento, vestígio ou apontamento, na Constituição, a indicar que possa a União falar
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios sobre concessão e sobre permissão,
afora a ligeira e pouco ilustre menção a concessão e permissão de serviço público, no inc.
I, do parágrafo único, do art. 175, da Carta. Jamais a Constituição, nos dois momentos em
que se refere a licitação, sequer esbarra no assunto das concessões e das permissões.
Assim, e por tudo isso, que para um administrativista é o abc preliminar da
introdução à primeira lição, é absolutamente extreme de dúvida que os temas das
concessões e o das permissões apenas podem ser disciplinados por norma local, de cada
ente para si próprio e para nada mais além do seu âmbito. Não existe competência
federal para tratar desses temas senão para si própria, e jamais a título de norma geral,
princípio ou diretriz aplicável a outras pessoas públicas.
Assim, o Estado, o DF e o Município somente licitarão concessão ou permissão que não sejam de serviço, porque essas a Carta manda licitar sem permitir evasão - se e
como disciplinado na sua legislação, sem precisar atentar para outros feixes
normativos quaisquer. E, se as precisarem licitar porque sua legislação o determina,
então atentarão muito mais à sua legislação sobre concessão e permissão de serviço3,
a qual permitirá elaborar editais perfeitamente adequados e a essa espécie de objeto, e
muito pouco, ou quase nada, à lei nacional de licitação de obras, serviços e compras, que
é a Lei nº 8.666/93, totalmente a inadequada à licitação de qualquer concessão e
permissão.
E não será o fato de o eterno alienado, o infinitamente bisonho e grosseiro legislador
brasileiro ter escrito o art. 2º, da Lei nº 8.666/93, incluindo concessão e permissão, ou
ainda o de haver redigido o parágrafo único, do art. 1º, da Lei nº 8.987/94, que irá inverter
o que até aqui se examinou e se concluiu pelo simples compulsamento da Constituição
Federal, pois que o império da ignorância e da insciência não podem prevalecer sobre
quem, além de para usar chapéu, utilize sua extremidade mais alta para fins mais
elevados.
parlamentar é o colegislador do Executivo, tão poucas as iniciativas que o sistema constitucional e legal ainda
lhe permitem.
3
E a Lei federal nº 8.987/94 se aplica necessariamente apenas à União, já que não contém normas gerais de
absolutamente nada, uma vez que, como visto, não existem, porque constitucionalmente não podem existir,
normas gerais sobre concessão ou sobre permissão do que quer que seja. Essa lei federal pode entretanto ser
voluntariamente adotada pelo Estado, o DF ou o Município, por ato de sua própria vontade, e a tal adoção o
edital da concessão se referirá; jamais pode ser obrigado a adotá-la, entretanto, outro ente que não a União. E a
quem contra-argumentar com menção ao parágrafo único, do art. 1º, da Lei nº 8.987, recomenda-se ler de novo
este tópico, do começo.
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O MEIO AMBIENTE ARTIFICIAL
Gina Copola
1. BREVE INTRODUÇÃO AO TEMA
O meio ambiente artificial, também chamado construído, é constituído por aquelas
construções que não compõem o meio ambiente natural, mas, sim, por construções
realizadas exclusivamente por ação do homem.
O meio ambiente artificial também merece proteção legal, e sobretudo constitucional,
é o que se denota pela simples leitura de alguns dispositivos da Lei Maior, que serão
analisados mais detidamente a seguir.
A principal forma de meio ambiente artificial é o ambiente urbano, e que será aqui
enfocado. Tal forma de meio ambiente artificial é disciplinada pelo Direito Urbanístico,
que constitui ramo próprio do direito público, e que teve seu desenvolvimento a partir do
momento que as cidades começaram a crescer.
2. O DIREITO URBANÍSTICO: NATUREZA E CONCEITO
O Direito Urbanístico possui a natureza jurídica de ramo próprio e autônomo do
direito público, com feições próprias e especiais, porém, com a adição de diversas
informações e conceitos provenientes de outros ramos do direito já amplamente
conhecidos no mundo jurídico, notadamente do Direito Administrativo. Esse ramo do
direito visa à ordenação das cidades e a prática da política de desenvolvimento urbano,
conforme previsto nos arts. 182 e 183, da Constituição Federal.
José Afonso da Silva assim conceituara Direito Urbanístico: ―ramo do direito público
que tem por objetivo expor, interpretar e sistematizar as normas e princípios
disciplinadores dos espaços habitáveis1‖
O Direito Urbanístico pode ser conceituado, de forma singela, como a parte do
direito público que regula os espaços habitáveis, em especial o ambiente urbano, e seu
uso e ocupação, através de suas regras e princípios próprios.
3. COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE O MEIO AMBIENTE CONSTRUÍDO
A competência para legislar sobre a defesa do solo e dos recursos naturais é
concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, conforme se lê do art. 24, inc. VI,
da Constituição Federal.
É da União a competência para legislar sobre planos nacionais e regionais de
ordenação do território, conforme preceitua o art. 21, inc. IX, da Constituição Federal; e
sobre diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico
e transporte urbano, conforme se lê da CF, art. 21, inc. XX.
1
In Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª ed. São Paulo : Malheiros, 1995, p. 42, com grifos originais.
124
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É competência dos Estados, mediante lei complementar, instituir regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, conforme reza o art. 25, § 3º, da
Constituição Federal.
Aos Municípios cabe suplementar a legislação federal e estadual no que couber,
conforme o disposto no art. 30, inc. II, da Constituição Federal. Compete, também, aos
Municípios, legislar sobre assuntos de interesse local, conforme reza o art. 30, inc. I, da
Magna Carta.
Compete aos Municípios, sobretudo, promover o ordenamento territorial, mediante
planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano,
conforme reza o art. 30, inc. VIII, da Constituição Federal.
O art. 182, da Carta Magna, pontifica que a política de desenvolvimento urbano é
executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei. Tal
dispositivo foi regulamentado pela Lei federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 – o
Estatuto da Cidade.
4. USO E OCUPAÇÃO DO SOLO URBANO. O ZONEAMENTO URBANO.
O uso e a ocupação do solo urbano, conforme acima dito, constitui matéria de
competência privativa do Município, sendo que, é imperioso observar, a lei instituidora do
uso e ocupação do solo urbano deverá dispor, também, sobre o zoneamento urbano.
O zoneamento urbano que atualmente constitui um dos principais institutos de
planejamento urbanístico, é a repartição do solo urbano segundo a sua destinação de uso
e ocupação, considerando-se, ainda, suas características arquitetônicas, e
estabelecendo-se, para tanto, quais são as áreas residenciais, comerciais e industriais, e
suas subdivisões.
No dizer de José Afonso da Silva, ―o zoneamento pode ser entendido como um
procedimento urbanístico destinado a fixar os usos adequados para as diversas áreas do
solo municipal2‖
O zoneamento urbano, conforme é cediço em direito, é sempre realizado mediante
lei específica do Município, acompanhada de anexos, que são mapas com as diversas
zonas com seus respectivos usos. Tal lei pode ser regulamentada por decreto municipal.
5. O MEIO AMBIENTE URBANO: O SOLO URBANO E SEU PARCELAMENTO URBANÍSTICO
O solo urbano é assim classificado conforme os planos urbanísticos elaborados, e
conforme as normas específicas existentes. Com todo efeito, o solo é urbano quando
ordenado para atender finalidade urbanística, e conforme o disposto na Constituição
Federal, em seu art. 182, caput, e § 2º. A Lei federal nº 6.766, de 19 de dezembro de
1979, modificada pela Lei federal nº 9.785, de 29 de janeiro de 1999, dispõe sobre o
parcelamento do solo urbano, e dá outras providências.
O art. 1º reza que o parcelamento do solo urbano será regido pela Lei nº 6.766/79, e
o art. 2º pontifica que o parcelamento poderá ser realizado mediante loteamento ou
desembramento, sempre observadas as legislações estaduais e municipais pertinentes.
Observe-se, porém, que o loteamento já fora previsto e regulado pelo Decreto-lei federal
nº 271, de 28 de fevereiro de 1967.
2
In ob. cit., p. 216, com grifos originais.
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Loteamento é a subdivisão da gleba em lotes destinados a edificação, com
aberturas de vias de circulação e de logradouros públicos, conforme preceitua o art.
2º, § 1º, da Lei nº 6.766/79.
Desmembramento, por sua vez, é a subdivisão da gleba em lotes destinados à
edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, conforme se lê do art. 2º,
§ 2º, da Lei nº 6.766/79.
A basilar diferença entre loteamento e desmembramento, de tal sorte, é que no
primeiro há a abertura de vias e logradouros, enquanto no segundo não ocorre tal
abertura, mas somente um aproveitamento das vias e logradouros já existentes.
O art. 3º reza que somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos
em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas
pelo plano diretor, ou conforme aprovadas por lei municipal. O plano diretor, que é o
conjunto de normas urbanísticas de determinada cidade, constitui um dos mais
importantes instrumentos utilizados para viabilizar a política urbana, conforme consta do
art. 4º, da Lei nº 10.257/01.
Os loteamentos que não observarem estritamente aos termos da Lei federal nº
6.766/79 são considerados loteamentos ilegais, que são classificados em clandestinos
ou irregulares. Os loteamentos clandestinos são aqueles construídos sem prévia
aprovação pela Prefeitura Municipal, e os irregulares, apesar de aprovados pela
Prefeitura, são construídos sem a observância do plano previamente aprovado.
6. A PROPRIEDADE URBANA E SUA FUNÇÃO SOCIAL
A política de desenvolvimento urbano está disciplinada pelos arts. 182 e 183, da
Constituição Federal, e tem por objetivo, conforme se lê do caput, do art. 182,
constitucional, ―ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
garantir o bem-estar de seus habitantes.‖ (Grifamos)
Observa-se, portanto, que o objetivo primordial da política de desenvolvimento
urbano é a função social da propriedade urbana, que, por sua vez, está expressamente
prevista pelo art. 182, § 2º, da Constituição Federal, que reafirmou o disposto
expressamente no art. 5º, inc. XXIII, da Lei Maior, que, por sua vez, reza que a
propriedade deve sempre atender a sua função social.
Reza o indigitado e relevante art. 182, § 2º, da Carta Magna, que a propriedade
urbana atende sua função social quando atende às exigências fundamentais de
ordenação da cidade expressas no plano diretor.
O plano diretor, conforme acima dito, constitui um dos mais importantes
instrumentos utilizados para viabilizar a política urbana. É o plano diretor que conduz e
norteia o ordenamento urbano e suas construções.
O saudoso Hely Lopes Meirelles assim definira plano diretor:
O Plano Diretor ou Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, como
modernamente se diz, é o conjunto de normas legais e diretrizes técnicas para o
desenvolvimento global e constante do Município, sob os aspectos físico, social,
econômico e administrativo, desejado pela comunidade local. Deve ser a expressão de
aspirações dos munícipes quanto ao progresso do território municipal no seu conjunto
cidade-campo. É o instrumento técnico-legal definidor dos objetivos de cada
Municipalidade e, por isso mesmo, com supremacia sobre os outros, para orientar toda
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atividade da Administração e dos administrados nas realizações públicas e
particulares que interessem ou afetem a coletividade.3
De tal sorte, a propriedade urbana atende sua função social quando lhe é dada a
utilização e o aproveitamento adequados e previamente previstos no plano diretor
aprovado pelo Município.
A elaboração do plano diretor é de competência do Executivo Municipal, por
intermédio dos órgãos de planejamento da Prefeitura, e deve sempre ser aprovado por lei.
São objetivos do plano diretor, dentre outros: promover a ordenação dos espaços
habitáveis; ordenar a construção de casas populares; o saneamento; o zoneamento; o
arruamento; os loteamentos; os desmembramentos; e a construção de vias expressas
7. DAS LIMITAÇÕES À PROPRIEDADE URBANA IMPOSTAS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Reza o art. 182, § 4º, da Constituição Federal, que o Poder Público Municipal,
mediante lei específica, poderá exigir que o proprietário promova o adequado
aproveitamento de solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, sob pena de
determinar, sucessivamente: a) parcelamento ou edificação compulsórios; b) imposto
sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo, e, por fim, c) a
desapropriação.
O proprietário, conforme se lê do dispositivo constitucional, que não cumprir as
exigências municipais de promover o adequado aproveitamento da propriedade urbana,
pode sofrer as penalidades previstas pela Constituição Federal, que constituem
verdadeiros instrumentos de intervenção urbanística.
Resta imperioso ressaltar que as penalidades previstas pelo art. 182, § 4º, da CF/88,
não podem ser aplicadas cumulativamente, ou seja, as penalidades previstas em tal
dispositivo constitucional só podem ser aplicadas uma de cada vez. Além disso, a palavra
sucessivamente constante do dispositivo indica uma ordem de aplicação das
penalidades, começando-se pelo parcelamento ou edificação compulsórios, depois
aplicando-se o IPTU progressivo, até a última e extrema penalidade prevista, que é a
desapropriação.
Além disso, cada Município deve editar sua lei específica que defina qual área ou
região está sujeita à aplicação das penalidades previstas pelo indigitado art. 182, § 4º, da
Carta Federal. E, ainda, a imposição da penalidade ao proprietário do imóvel é realizada
sempre através de decreto a ser expedido pelo Prefeito Municipal.
O Município tem o dever e não a faculdade de regularizar o uso, no parcelamento e
na ocupação do solo, para, com isso, assegurar os padrões urbanísticos. Nesse exato
sentido, já decidiu recentemente o e. Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Especial
nº 448.216/SP, 1ª Turma, rel. Min. Luiz Fux, publicado in DJ de 17.11.03.
O parcelamento do solo urbano, conforme se viu acima, é disciplinado pela Lei
federal nº 6.766/79, modificada pela Lei federal nº 9.785/99, e poderá ser realizado
mediante loteamento ou desmembramento, já acima conceituados. Nesta hipótese, são
impostas algumas limitações na propriedade urbana, através de diretrizes que devem ser
estritamente seguidas pelo proprietário parcelador.
A edificação compulsória, por sua vez, é a determinação ao proprietário que
realize construção em seu solo não edificado, com a finalidade de que a propriedade
3
In Direito de Construir. 6ª ed. São Paulo : Malheiros, 1994, p. 96, com grifos originais.
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atenda a sua função social. Dessa forma, se a área é residencial, o proprietário deve,
conforme determinação do Poder Público, realizar construção de residência no solo
urbano ainda não edificado.
Conforme nos ensinou Celso Ribeiro Bastos4, cabe ao proprietário escolher qual das
duas formas de penalidade - parcelamento ou edificação - lhe seja aplicada, desde que,
obviamente, a propriedade comporte tal escolha.
O imposto sobre a propriedade predial e territorial - IPTU, progressivo no
tempo é aquele em que a cada ano o imposto passa a ter uma alíquota maior, onerando
cada vez mais aquela propriedade não edificada, e que não atende sua função social. Tal
imposição, todavia, não pode ter efeito de confiscar o bem, já que nenhum tributo pode
ser utilizado com efeito de confisco, conforme reza expressamente o art. 150, inc. IV, da
Constituição Federal.
E, por fim, a desapropriação é a medida extrema prevista no art. 182, § 4º, da
CF/88, e é aquela a ser paga mediante títulos da dívida pública de emissão previamente
aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas
anuais, iguais e sucessivas. A desapropriação em comento, pode ser denominada como
desapropriação-sanção, e é a utilizada estritamente como instrumento da política
urbana, e, assim, difere da forma tradicional de desapropriação, na qual existe a
indenização justa, prévia, e em dinheiro.
8. O ESTATUTO DA CIDADE
O Estatuto da Cidade instituído pela Lei federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001,
―regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da
política urbana e dá outras providências‖. Tal diploma contém relevantes inovações em
termos de administração pública urbana, sempre observando a atual preocupação
mundial com a questão do meio ambiente equilibrado, e com a imperiosa necessidade de
cidades sustentáveis.
A falta de aplicação desse diploma e de seus imprescindíveis instrumentos pode
causar danos irreparáveis na política urbana, como é o caso do Município mineiro de
Ouro Preto, que é uma cidade histórica e tombada pelo patrimônio histórico, e que
atualmente está sofrendo as duras conseqüências da ausência de um plano diretor, e de
uma administração urbana eficaz.
O relevante art. 4º, da Lei nº 10.257/01 – a nosso ver, o mais importante de toda a
lei – cuida dos instrumentos da política urbana, que são: a) planos nacionais, regionais e
estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (inc. I); b)
planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões (inc. II);
c) planejamento municipal (inc. III); d) institutos tributários e financeiros (inc. IV); e)
institutos jurídicos e políticos (inc. V), e f) estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e
estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) (inc. VI).
A nosso ver, o instrumento mais importante previsto no art. 4º, da Lei nº 10.257/01, é
o Plano Diretor, já acima conceituado.
Outros relevantes e imprescindíveis institutos da política urbana são: a) o Estudo
Prévio de Impacto Ambiental (EIA), e b) o Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV),
ambos previstos no inc. VI, do art. 4º, da Lei nº 10.257/01.
4
In Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo : Saraiva, 1990, v. 7, p. 224.
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O Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EIA – é exigível para toda obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, conforme reza
expressamente o art. 225, inc. IV, da Constituição Federal. Tal instrumento será
analisado em capítulo apropriado desta obra.
O Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança – EIV, por sua vez, está disciplinado
pelos arts. 36 a 38, do Estatuto da Cidade.
O art. 36, do Estatuto da Cidade, reza que a definição dos empreendimentos e
atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de EIV,
para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento,
deverá ser realizada por lei municipal.
O necessário art. 37, por sua vez, elenca as principais questões que devem,
obrigatoriamente, constar do EIV. O elenco não é taxativo, uma vez que admite outras
questões que podem constar do EIV. É a ilação que se retira ao ler a expressão ―no
mínimo‖ ali inserta.
E, por fim, o art. 38 deixa claro que a elaboração do EIV não substitui a elaboração
do EIA, requeridas nos termos da legislação ambiental.
Os demais instrumentos previstos no indigitado art. 4º, do Estatuto da Cidade,
também apresentam relevância, e devem sempre ser observados no plano municipal.
9. O DIREITO DE CONSTRUIR E O SOLO CRIADO
O direito de construir está expressamente previsto pelo Código Civil, instituído pela
Lei federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, em seus arts. 1.299 a 1.313. Conforme se
lê de tais dispositivos, é conferido ao proprietário a faculdade, e não a obrigação de
construir.
Com todo efeito, reza o art. 1.299, do Código Civil, que o proprietário pode levantar
em seu terreno as construções que lhe aprouver. Dessa forma, a lei substantiva civil em
nenhum momento exige que proprietário construa edifício em seu terreno, mas apenas
faculta-lhe tal direito.
A Constituição Federal, a seu turno, preceitua, no indigitado art. 182, § 4º, que o
Poder Público Municipal, poderá exigir, mediante lei específica para área incluída no
plano diretor, que o proprietário promova o adequado aproveitamento de solo urbano não
edificado, subutilizado ou não utilizado, sob pena de aplicação das penalidades previstas
naquele dispositivo, dentre elas a desapropriação.
Em análise superficial, pode-se concluir de forma equivocada que as disposições do
Código Civil e da Constituição Federal se contradizem. Tal ilação, entretanto, não é
correta, uma vez que os dois diplomas dispõem sobre âmbitos diversos. Conforme
ensina-nos José Afonso da Silva, o direito civil não disciplina a propriedade, mas tãosomente regula as relações civis a ela pertinentes.5
Conclui-se, de tal sorte, que as disposições do Código Civil valem somente para as
relações civis, e a Constituição Federal, por outro lado, cuida do regime jurídico da
propriedade, e sua função social, além de discipliná-la como direito e garantia
fundamental, em seu art. 5º, incs. XXII e XXIII.
5
In ob. cit., p. 63.
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Outro importante instituto que deve ser aqui lembrado é o referente ao solo criado.
Conforme nos ensina Toshio Mukai, o Estatuto da Cidade institucionalizou o chamado
solo criado, que é a outorga onerosa do direito de construir6.
O referido instituto, conforme é sabido, foi previsto pelo art. 28 e seguintes, do
Estatuto da Cidade, e constitui na possibilidade de fixação, através do plano diretor, de
áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de
aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.
Perfilhamos do entendimento de Toshio Mukai, no sentido de que o instituto é
perfeitamente constitucional, uma vez que a contrapartida pela outorga onerosa do direito
de construir não se constitui em tributo, mas, sim, em obrigação de dar, criada, de forma
legítima, pelo Estatuto da Cidade7.
Diante de tais considerações, e em razão das feições que as cidades têm tomado, é
forçoso concluir que o meio ambiente artificial, cada vez mais, apresenta grande
relevância para nossos estudos, sobretudo em razão de seus institutos próprios e
inovadores.
6
In Fórum de Direito urbano e ambiental, jan/fev. 2003, p. 626.
7
In ob. cit., p. 628.
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