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Fernandes JHA, Lippi UG
ARTIGO ORIGINAL
Avaliação clínica e ultra-sonográfica dos dispositivos intrauterinos inseridos pós-placenta
A clinical and ultrasound study on the use of postplacental intrauterine device*
João Henrique Araújo Fernandes1, Umberto Gazi Lippi2
ABSTRACT
Objective: To evaluate the relation of postplacental intrauterine
device insertion immediately after vaginal delivery and cesarean
section and its effects on the following: continuation, expulsion
rate and eventual removals. To verify if ultrasound is an adequate
method to follow-up postplacental IUD insertions. To assess if the
immediate insertion of postplacental IUD leads to an increased
risk of uterine infections and perforations, or greater likelihood of
pregnancy during the observation period. Methods: A group of 50
patients who had an intrauterine device introduced within ten
minutes after delivery of the placenta were studied. Twenty-five
women had vaginal delivery and 25 had cesarean sections. The
intrauterine device used in this study was the Multiload CU 375,
standard model, manufactured by Organon Ltd., in Ireland. The
intrauterine device was inserted in those who had vaginal delivery
either manually and under anesthesia, or with an inserter, which
did not require anesthesia. In patients who had cesarean sections,
the insertion was manual. Clinical and ultrasound follow up was
performed four times: 48 hours postpartum, and at 6, 12 and 24
weeks. The distance from the top of the intrauterine device to the
uterine fundus was measured by ultrasound. Results: This study
showed a significant difference in postplacental intrauterine
devices inserted after vaginal deliveries and cesarean sections.
The expulsion/removal rate was 32% among the subjects who had
an intrauterine device inserted after vaginal delivery. There were
no expulsions or removals in those submitted to cesarean sections.
In the control ultrasound of intrauterine devices inserted after
vaginal delivery, at 6 weeks, the distance of 10 mm from the top of
the device to the fundus was an average standard measurement
to determine continuation (distance < 10 mm, the IUD would
remain in the uterus) and expulsion/removal (distance > 10 mm,
the IUD would be expelled or be removed). There were no cases of
uterine infections or perforations, and no pregnancies during the
course of this study. Conclusions: Postplacental intrauterine device
insertion showed to be an useful and safe contraceptive method.
The ultrasound demonstrated to be a useful and reliable method to
control postplacental intrauterine device insertions.
Keywords: Contraception; Intrauterine device; Ultrasonography
RESUMO
Objetivos: Avaliar o comportamento do dispositivo intra-uterino
(DIU) pós-placenta, após parto normal ou cesárea, quanto à
sua permanência no útero; verificar se a ultra-sonografia é
adequada para acompanhar o DIU inserido; avaliar a ocorrência
de complicações como infecção, perfuração e gestações.
Métodos: A casuística compreendeu 25 pacientes pós-parto
normal e 25 pós-cesárea, nas quais foi aplicado um DIU Multiload
Cu 375R nos primeiros dez minutos após a dequitação. A inserção
no parto normal foi manual, sob analgesia, ou com aplicador,
sem analgesia; e manual na cesárea. Os controles clínicos e
ultra-sonográficos foram realizados com 48 horas e 6, 12 e 24
semanas após o parto. A ultra-sonografia avaliou principalmente
a distância do ápice do DIU à mucosa do fundo uterino (eco
endometrial livre). Resultados: O DIU pós-placenta pós-parto
normal foi expulso/retirado em 32% dos casos. Não houve
expulsão/retirada após cesárea. A ultra-sonografia mostrouse útil e confiável no acompanhamento do DIU pós-placenta. A
distância de 10 mm, entre a porção superior do DIU e a mucosa
do fundo uterino, tornou-se um valor médio útil para a estimativa
de permanência (< 10 mm) ou expulsão/retirada (> 10 mm)
do DIU, na avaliação da sexta semana pós-parto normal. Não
foram observados casos de infecção, perfuração uterina ou
gravidez durante o presente estudo. Conclusões: A inserção do
DIU pós-placenta mostrou-se uma técnica anticoncepcional
factível e segura, de grande eficácia em casos de pacientes
submetidas a cesáreas. A ultra-sonografia foi útil no controle e
*Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” - São Paulo/SP.
1
Professor Assistente da Disciplina de Obstetrícia do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES). Mestrando do Curso de Pós-Graduação
de Perinatologia e Ginecologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público do Estado de São Paulo (IAMSPE) - São Paulo - (SP).
2
Professor Titular da Disciplina de Obstetrícia do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES). Coordenador do curso de Pós-Graduação de
Perinatologia e Ginecologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público do Estado de São Paulo (IAMSPE) - São Paulo - (SP).
Endereço para correspondência: João Henrique Araujo Fernandes - R. Eloi Fernandes, 11 - apto. 122 - Boqueirão - CEP 11055-110 - Santos (SP), Brasil - Tel: (13) 3222-7575; Fax: (13) 3221-4988
e-mail: [email protected]
Recebido em 16 de março de 2004 - Aceito em 30 de agosto de 2004
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Avaliação clínica e ultra-sonografia 111
permitiu estabelecer a distância menor que 10 mm entre o
ápice do dispositivo e o fundo uterino como um bom indicador
da sua permanência.
Descritores: Anticoncepção; Dispositivo intra-uterino; Ultrasonografia
INTRODUÇÃO
Pacientes com gestações não planejadas representam
uma parcela importante do atendimento nas
maternidades. É lícito atribuir-se esse fato à falta de
informação acerca dos métodos anticoncepcionais, à
ignorância, ou pior, ao baixo apoio dos órgãos
governamentais ao planejamento familiar. Sabe-se
também que a puerperalidade é, para muitas mulheres,
a única oportunidade de receber cuidados em um
sistema formal de saúde.
Trata-se pois de uma ocasião propícia e ímpar para
que sejam orientadas sobre as práticas
anticoncepcionais. Com esses conceitos em pauta surgiu
a idéia de se aplicar o dispositivo intra-uterino (DIU)
logo após a dequitação, “DIU pós-placenta”,
designação feita pela Organização Mundial de Saúde
(OMS)(1). Seria, em teoria, uma atitude muito próxima
da ideal, pois contando com a anuência das pacientes,
ter-se-ia uma proteção a baixo custo, com anterioridade
segura sobre o reinício da atividade sexual,
independente do próprio ato sexual, com poucos
efeitos colaterais. Com este intuito idealizou-se
fornecer o dispositivo intra-uterino aplicado
imediatamente após a dequitação garantindo às
usuárias toda a assistência posterior necessária. A
OMS (1-2) normalizou, em 1983 e em 1996, essa
metodologia, embora as primeiras descrições da técnica
datem de 1967(3). Os trabalhos relativos ao uso do DIU
aplicado no período puerperal mostraram que as
seguintes variáveis influenciam diretamente os
resultados obtidos: período de introdução do DIU foram observados melhores resultados do DIU pósplacenta quando comparados às inserções após os
primeiros 10 minutos da dequitação(4-5); modelo do
DIU (4-7) ; modo de inserção (5,8-10) ; experiência do
profissional(5,10-11); tipo de parto(11-13). Em relação ao
controle ultra-sonográfico variam os indicadores de um
bom posicionamento do dispositivo levando em conta
o volume uterino, o comprimento total do útero(14), a
distância entre o ápice do DIU e a serosa do fundo
uterino(14-16).
Procurou-se, neste estudo, avaliar a praticabilidade
da inserção do DIU pós-placenta e confirmar ou
infirmar as observações da literatura no que diz respeito
a eficácia, expulsões, retiradas ou complicações
precoces. Avaliou-se também a ultra-sonografia para
saber se seria o método ideal com vistas ao seguimento
e principalmente se poderia fornecer algum marcador
sugestivo da probabilidade do DIU manter-se ou ser
expulso.
MÉTODOS
Estudou-se de forma prospectiva um grupo de 50
pacientes que deram à luz na Maternidade do Hospital
Guilherme Álvaro, hospital estadual da cidade de
Santos, no período de agosto de 1996 a outubro de
1999. Todas eram oriundas dos municípios da Baixada
Santista, e realizaram o Pré-Natal no próprio hospital
ou em unidades ambulatoriais denominadas
policlínicas.
A proposta do estudo foi aplicar um DIU nos
primeiros dez minutos após a dequitação (DIU pósplacenta) em 25 pacientes que tivessem dado à luz por
cesárea e em 25 por parto normal. Todas passaram por
uma seleção rigorosa onde foram respeitados um
fluxograma e um protocolo adrede preparados. O
projeto de estudo foi apresentado e aprovado no
Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Guilherme
Álvaro, Santos.
A adesão foi voluntária e precedida por explicação
minuciosa, sendo registrada por escrito no prontuário
clínico. Foram colhidos dados para avaliação
socioeconômica e cultural como: idade, escolaridade,
estado civil, moradia, renda familiar e cidade de
residência. Anotaram-se ainda os antecedentes
obstétricos, método anticoncepcional anterior, tipo de
partos prévios e atual, intercorrências no parto, uso
de ocitócico, nível de hemoglobina e hematócrito.
Foram adotados os seguintes critérios de inclusão:
aceitação do método, ausência de fatores de risco para
doença inflamatória pélvica, parceiro único, facilidade
de acesso ao serviço e evolução clínica do parto sem
intercorrências. Os critérios de exclusão foram: não
obedecer aos critérios anteriores, dificuldade de
controle pós-inserção, intercorrência obstétrica,
ginecológica ou clínica passível de ser agravada pela
inserção do DIU, a saber: infecção intraparto,
amniorrexe há mais de 12 horas, hemorragias pré e
intraparto, malformações uterinas, tumores
ginecológicos, anemia intensa.
Os dispositivos intra-uterinos foram inseridos pósplacenta, ou seja, dentro dos dez primeiros minutos
após a dequitação, por médicos residentes do segundo
ano devidamente treinados, supervisionados por um
médico obstetra plantonista. Nas pacientes submetidas
a cesárea, o DIU foi introduzido após a dequitação,
sob visão direta do fundo uterino, manualmente. As
extremidades dos fios ficaram voltadas para o orifício
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Fernandes JHA, Lippi UG
interno do colo do útero, sem ultrapassá-lo. Nos casos
de parto por via vaginal, o dispositivo foi introduzido
após a dequitação, com o útero adequada e
espontaneamente retraído e antes da utilização de
qualquer ocitócico, através de uma das duas técnicas a
seguir expostas:
· Manual: com o DIU seguro entre os dedos
indicador e polegar, com a paciente sob analgesia, fezse a introdução de uma das mãos no útero até alcançar
o fundo, estando este apreendido externamente pela
outra mão, realizando uma leve rotação do fundo
uterino de aproximadamente 15 graus. O dispositivo
foi deixado no interior da cavidade uterina em contato
com o fundo. A rotação é para melhor fixação do DIU
à parede uterina.
· Com aplicador: nesta variante, o lábio anterior
do colo uterino foi apreendido com pinça Pozzi e
tracionado. Com o aplicador que o acompanha, o DIU
foi introduzido até o fundo do útero, este apreendido
pela mão externa. Praticou-se também uma rotação de
15 graus seguida da retirada do aplicador. Esta técnica
não exige anestesia. O dispositivo intra-uterino
utilizado em todas as pacientes foi o Multiload Cu
375*.
O controle pós-inserção, do ponto de vista clínico
e ultra-sonográfico, foi realizado em quatro períodos:
antes da alta hospitalar, com seis, 12 e 24 semanas após
o parto. Do ponto de vista clínico, as pacientes foram
questionadas e examinadas de acordo com a ficha de
controle, com atenção especial para: expulsão do DIU,
hemorragias, dor pélvica, infecção, exteriorização dos
filamentos, amamentação, se exclusiva ou não e retorno
às menstruações. Os exames de ultra-sonografia foram
realizados em dois modelos de aparelhos, conduzidos
pelo mesmo profissional médico, em geral por via
transabdominal, considerando a principal prioridade
a medida entre o ápice da haste do dispositivo e a
mucosa do fundo uterino (eco endometrial livre),
portando não se considerando a espessura do
miométrio.
Os resultados do presente trabalho foram
submetidos à análise estatística através de: média
aritmética e desvio padrão, teste de igualdade das
médias: t de Student, teste de qui-quadrado corrigido
para continuidade segundo Yates, teste exato de
Fisher, intervalo de confiança da média para 95% e
gráficos em linhas e barras. Adotou-se nível de
significância de 5% (a = 0,05).
RESULTADOS
Não houve expulsão ou retirada do DIU por posição
inadequada no grupo de pacientes submetidas a
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cesárea. No grupo onde o parto foi normal ocorreram
quatro casos de expulsão (com quatro, oito, dez e 98
dias pós-parto) e quatro casos de retirada do dispositivo
intra-uterino por estar localizado no canal cervical (dois
casos no controle de ultra-som com seis semanas e dois
casos no controle de ultra-som com 12 semanas).
Portanto, de maneira didática os casos foram
classificados e analisados estatisticamente em seis
conjuntos: grupo 1 – totalidade de casos (50 ), grupo 2
– pacientes com parto cesárea (25), grupo 3 – pacientes
com parto normal (25), grupo 4 – pacientes com DIU
expulsos ou retirados (8), grupo 5 – pacientes com DIU
de localização adequada (42), grupo 6 – pacientes com
DIU de localização adequada e parto normal(17).
A aplicação dos testes paramétricos mostrou que
não houve diferença estatística significante entre os
grupos no que se refere a idade materna, número de
gestações anteriores e número de partos anteriores.
Quando a variável foi o número de partos normais
anteriores, houve diferença estatística significante
entre os grupos de parto normal e o grupo de parto
cesárea com valor de p = 0,000001* e t = 6,22. Não
ocorreu diferença estatística significante entre os
grupos quando a variável foi a distancia média em
milímetros da parte superior do DIU à mucosa do fundo
uterino em exame de ultra-som realizado com 48 h pósparto; entretanto, houve diferença estatística
significante no ultra-som com seis semanas entre os
grupos cesárea e grupo de parto normal com p =
0,011236* e t = 2,63 e entre os grupos de DIU com
localização adequada e grupo de expulsos/retirados
com p = 0,01823* e t = 2,47. No exame de ultra-som
realizado com 12 semanas, as diferenças das medidas
não foram estatisticamente significantes entre os grupos
de cesáreas e normais, mas o foram entre os grupos de
adequados (toda a população) e de expulsos/retirados
com p = 0,00008* e t = 4,44, e entre os grupos
adequados (em parto normal) e o grupo de expulsos/
retirados com p = 0,00031* e t = 4,51. Não ocorreram
diferenças estatísticas significantes entre os grupos de
parto normal e cesárea nas medidas realizadas ao exame
de ultra-som realizados com 24 semanas pós-parto. Os
demais grupos não foram comparados, pois não
ocorreram expulsões ou retiradas neste controle.
No que diz respeito aos testes não-paramétricos
adotou-se o valor de corte de 10 mm entre a distância
da parte superior do DIU à mucosa do fundo uterino.
Não houve diferença estatística nos exames de ultrasom realizados com 48 h, 12 e 24 semanas pós-parto
entre os grupos de parto normal e cesárea. Houve sim,
no exame com seis semanas pós-parto entre estes
grupos de parto normal e grupo de cesárea com p =
0,0082* (Fisher) e entre os grupos de expulsos/retirados
Avaliação clínica e ultra-sonografia 113
e grupo de adequados (toda a população) com p =
0,0086929* (Fisher). Quando a variável estudada foi o
parto normal anterior, ocorreu diferença estatística
significativa entre os grupos expulsos/retirados e o
grupo adequados (toda a população) com p =
0,0057892* (Fisher). Quando a variável foi a ocorrência
de expulsão ou retirada do DIU, ocorreu diferença
estatística significante entre os grupos de parto normal
e cesárea com p = 0,0040295* (Fisher).
DISCUSSÃO
De acordo com os trabalhos citados existem vantagens
e desvantagens na aplicação do DIU pós-placenta(17),
sendo seu emprego útil e seguro como método
anticoncepcional, especialmente em pacientes
submetidas à cesárea(7,18-19). Os pontos positivos são: a
paciente já se encontra dentro de uma unidade
hospitalar para o seu parto e, portanto não precisa
retornar para, especificamente, inserir o DIU; o pessoal
de saúde tem acesso direto à paciente para educar e
esclarecer quanto ao planejamento familiar; uma das
duas contra-indicações absolutas para a inserção do
DIU está eliminada, ou seja, a gravidez; há pouca
reclamação a respeito de sangramento e dor para a
inserção do DIU pós-placenta em relação ao DIU de
intervalo; o risco de perfuração uterina é o mesmo ou
menor, comparado ao DIU de intervalo; o custo é
baixo, pois o equipamento e o tempo utilizados para a
inserção do DIU pós-placenta são mínimos; é preciso
menor treinamento para a inserção do DIU pósplacenta em relação ao DIU de intervalo, já que a
técnica é fácil de aprender; a taxa de prevalência
contraceptiva é maior nas pacientes em que é oferecido
o DIU pós-placenta, comparado com outros locais onde
os métodos anticoncepcionais são oferecidos após o
puerpério. Os pontos negativos são: as taxas de expulsão
são maiores quando a inserção ocorre pós-placenta em
relação ao DIU de intervalo; a taxa de “fio perdido” é
maior; a taxa de continuidade do método tende a ser
ligeiramente menor no DIU pós-placenta em relação
ao DIU de intervalo; o aconselhamento contraceptivo
para o DIU pós-placenta deve ser monitorado para
assegurar que a paciente seja bem informada e sua
decisão não seja influenciada pelo impacto emocional
do momento do parto; são necessárias instruções
especiais para a paciente detectar a expulsão do DIU
e retornar para nova inserção ou outro método
anticoncepcional.
Embora pertinentes em seu conjunto, cabem
algumas considerações adicionais. Por exemplo, podese discordar naquilo que diz respeito ao treinamento
para a inserção do DIU pós-placenta, que segundo
aqueles autores é mais simples do que para o DIU de
inserção. É necessária bastante experiência para a
inserção do dispositivo em útero puerperal,
principalmente no parto normal, situação na qual várias
condições podem se apresentar. Assim, a inserção pode
ser realizada manualmente ou com aplicador, a paciente
pode ou não estar sob analgesia, o útero pode ter graus
diferentes de tônus. No parto cesárea efetivamente a
técnica é mais singela. Nas desvantagens além das
citadas poder-se-ia acrescentar que algumas pacientes
não aderem às exigências do protocolo de seguimento,
o que, aliás, foi causa de exclusões neste trabalho.
Quando retornaram ao controle e indagadas sobre o
não comparecimento na data estipulada, o principal
motivo foi econômico. Esta é sempre uma variável a se
considerar quando a população alvo da aplicação do
método é de nível socioeconômico-cultural menos
privilegiado.
Neste estudo não ocorreu qualquer caso de “fio
perdido” nas inserções após parto normal. Todos os
filamentos dos dispositivos se mostraram visíveis no
controle com seis semanas pós-parto. As freqüências
foram, porém, altas nos casos após cesáreas. Pode-se
notar que independentemente do tipo de DIU, as taxas
de expulsão do dispositivo, inseridos após parto
normal,
nesta
pesquisa,
comparam-se
desfavoravelmente às de outros autores, com exceção
àquelas citadas pela OMS(8). Já no que se refere aos
casos de inserção pós-cesariana, os resultados a que se
chegou são extremamente favoráveis quando cotejados
com os de todos os autores citados. Essa constatação
corrobora a de Chi et al. (5) e de Lara et al. (12), que
relataram menor freqüência de expulsão quando o DIU
foi utilizado no parto cesárea(20-24) em relação ao vaginal
ou mesmo nos partos por via abdominal com
implantação após a dequitação em relação àquela feita
mais de um mês após o parto(25). Caso estes números
sejam confirmados em casuísticas mais alentadas, pode
a inserção do DIU pós-placenta tornar-se a escolha
preferencial em pacientes submetidas ao parto cesárea,
exatamente as que devem respeitar um intervalo
intergestacional mais longo(23). É razoável supor que,
nas histerotomias, a colocação do dispositivo, sob visão
direta, bem localizado junto ao fundo uterino seja um
dos fatores primordiais para o bom resultado(23).
Por outro lado, é bem possível que nos casos pósparto normal a experiência do profissional tenha um
peso significativo no bom êxito do processo. Já que
aplicar o DIU manualmente ou com o aplicador
apropriado não representou um diferencial para os
resultados, a diferença deve estar no ponto em que o
operador aloca o dispositivo em relação ao “fundus
uteri”. Levando-se em conta, porém, que mais de um
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Fernandes JHA, Lippi UG
fator pode estar envolvido nas taxas de sucesso, devese ter em conta a preocupação de Cole et al.(4), que
chamam a atenção para a melhor avaliação do período
de inserção, que lhes parece mais importante do que o
modelo do DIU. Quanto a complicações imediatas
(perfuração uterina, infecções) não foram observadas
neste trabalho, fato que está de acordo com observações
encontradas na literatura(4,19).
Neste trabalho pode-se notar que a avaliação da
distância da parte superior do DIU ao fundo do útero
realizado nas primeiras 48 horas após o parto (Usg0),
ou seja, à inserção, não variou de forma
estatisticamente significativa entre os grupos nos quais
a população foi dividida para fins de análise estatística.
Portanto, tem um valor escasso no sentido de se
prognosticar sua permanência. No entanto, há uma
tendência para valores maiores dessa distância no grupo
de expulsos/retirados. Com uma casuística maior essa
diferença poderia tornar-se significativa, contribuindo
para criar padrões de prognóstico para a permanência
ou expulsão do diapositivo. No entanto, os valores das
medidas ultra-sonográficas parecem de extrema valia
quando tomadas na sexta semana. Algumas diferenças
entre os grupos, com significância estatística, também
foram notadas no exame de 12 semanas.
Entretanto, deve-se lembrar que por volta da sexta
semana um grande número de pacientes retorna à
atividade sexual, devendo por isso estar devidamente
protegidas. Isto é particularmente importante nas
mulheres que foram submetidas à inserção do DIU após
um parto normal, condição em que a probabilidade de
expulsão é muito alta, em relação àquelas que o
receberam após uma cesárea. Por isso é de bom alvitre
que se recomende (a todas as usuárias de DIU pósplacenta) que não tenham relações sexuais, nesse
período, sem a proteção de outro método e liberá-las
após a ultra-sonografia de sexta semana, com medida
da distância DIU/mucosa do fundo uterino menor que
10 mm. Essa forma teria vantagem em relação ao modo
como Gonçalves et al.(16) avaliam a boa colocação do
DIU, que dependeria de duas ou três medidas, ou seja,
uma possibilidade de erro duplicada ou triplicada,
ainda que sejam medidas simples de ser feitas. O que
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se deve considerar não é a acurácia do exame ultrasonográfico para a visualização do dispositivo dentro
da cavidade uterina, mas sim tentar comprovar que a
eficácia do dispositivo intra-uterino depende do seu
posicionamento intra-útero. O fato é que não existe
na literatura uma medida limite que seja consensual
para classificar o DIU como estando mal posicionado.
Os resultados apresentados nos trabalhos citados são
díspares, mesmo com a utilização do mesmo modelo
de DIU. Essa disparidade é flagrante quanto se
observam as distâncias médias da porção superior do
DIU ao fundo uterino, comparadas às freqüências de
expulsões. Isto pode fazer supor que outros fatores
devam estar envolvidos no insucesso da manutenção
do dispositivo “in loco”.
Dessa forma, os resultados aqui apresentados
sugerem que a metodologia do DIU pós-placenta é
útil e segura como método anticoncepcional (26-28) ,
especialmente em pacientes submetidas a cesárea(7,13,19).
Além disso, a utilização de um método
anticoncepcional seguro, implantado imediatamente
após o parto e, portanto, antes da paciente receber
alta hospitalar, é uma técnica de grande alcance em
saúde reprodutiva, ao se considerar que um número
elevado de puérperas não retorna mais para uma
adequada anticoncepção.
Também é extremamente estimulante a possibilidade
de que estudos mais amplos com o controle da inserção
através da ultra-sonografia possam sedimentar a idéia
de um ponto de corte na medida entre a parte superior
do dispositivo e o fundo do útero (10 mm neste estudo),
capaz de sugerir, com grande probabilidade de acerto,
que aquele DIU manter-se-á convenientemente
disposto e atendendo à sua função precípua, que é a
anticoncepção eficaz.
CONCLUSÃO
A metodologia de inserção de dispositivo intra-uterino
pós-placenta mostrou-se útil e segura como método
anticoncepcional, especialmente em pacientes
submetidas a cesárea.
Avaliação clínica e ultra-sonografia 115
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