ARCADISMO NEOCLASSICISMO (SÉCULO XVIII) Arcadismo ou Neoclassicismo movimento literário inspirado em uma lendária região da Grécia antiga, a Arcádia, lugar montanhoso que, segundo a mitologia, teria sido o berço de Zeus e dominada pelo deus Pã amante das fontes, das sombras dos bosques e da companhia das Ninfas, e habitada por pastores, que viviam de modo simples e espontâneo e se divertiam cantando, fazendo disputas poéticas e celebrando o amor e o prazer. O Arcadismo, ou Neoclassicismo é o período que caracteriza principalmente a segunda metade do século XVIII, rompendo com a solenidade do Barroco, seus exageros e excessos, tingindo as artes de uma nova tonalidade burguesa. É o Século das Luzes, do Iluminismo burguês, que prepara o caminho para a Revolução Francesa. Os poetas árcades, ou neoclássicos demonstravam em sua literatura uma espécie de delírio consciente: embora fossem todos eles, como indivíduos da vida real, habitantes das cidades do período, burgueses, funcionários da burocracia, administrativa ou judiciária, na poesia projetavam um mundo de sonhos e de perfeição, onde eram humildes pastores que levavam uma vida agradável e amorosa, deliciando-se com os prazeres da vida simples do campo. Engajado no processo de luta ideológica e política que levaria a burguesia ao poder em 1789, o Arcadismo pode ser visto, sob o ponto de vista ideológico, como uma arte revolucionária. Contudo, do ponto de vista estético, é uma arte conservadora, pois ainda se liga aos modelos clássicos, tanto tempo cultivados pelas cortes aristocráticas. Arcadismo = idealização da VIDA NATURAL, em oposição à vida urbana; a HUMILDADE, em oposição aos gastos exorbitantes da nobreza; o RACIONALISMO, em oposição a fé; a LINGUAGEM SIMPLES em oposição a linguagem complexa e elitista do Barroco. Contexto histórico - Na Europa Decadência da aristocracia feudal; crescimento do poder da burguesia. Progressivo descrédito das monarquias absolutas; Criação da Enciclopédia (1750/1780) por Diderot e d’ Alembert. Revolução Gloriosa (Inglaterra, 1688); Revolução Industrial (Inglaterra, 1760); Independência dos EUA (1776); Revolução Francesa (1789); “Declaração dos Diretos do Homem e do Cidadão” Principais filósofos iluministas. Voltaire - Despotismo esclarecido Montesquieu - O espírito da leis ( executivo, legislativo e judiciário). Rousseau - Discurso sobre a origem da igualdade entre os homens. John Locke - Ensaio acerca do Entendimento Humano. A RELAÇÃO COM O ILUMINISMO AS IDEIAS ILUMINISTAS NO SÉCULO XVIII CHOCAVAM COM O ESTADO ABSOLUTISTA E A IGREJA. A RAZÃO (E NÃO MAIS A CRENÇA RELIGIOSA) APARECE COMO SINÔNIMO DE VERDADE. AS LUZES DO ESCLARECIMENTO AJUDAVAM OS HOMENS A ENTENDER O MUNDO E A COMBATER PRECONCEITOS. SIMPLIFICAÇÃO DA ARTE = DOMÍNIO DA RAZÃO; APROXIMAÇÃO DA NATUREZA; VALORIZAÇÃO DAS ATIVIDADES GALANTES. CARACTERÍSTICAS BUSCA DA SIMPLICIDADE: SIMPLICIDADE VERDADE = RAZÃO = IMITAÇÃO DA NATUREZA: “LOCUS AMOENUS” = LOCAL APRAZÍVEL = CULTO AO HOMEM NATURAL PASTORALISMO = CELEBRAÇÃO (MODISMO E ARTIFICIALISMO) DA VIDA PASTORIL BUCOLISMO = ADEQUAÇÃO À HARMONIA E SERENIDADE DA NATUREZA = VALORIZAÇÃO DA VIDA NO CAMPO. CARACTERÍSTICAS IMITAÇÃO DOS CLÁSSICOS: AUTORES CONSAGRADOS DA ANTIGUIDADE GRECO-ROMANA MODELO MÁXIMO. “INUTILIA TRUNCAT” (CORTAR O INÚTIL) “CARPE DIEM” (APROVEITAR O DIA) “FUGERE URBEM” (FUGIR DA CIDADE) “AUREA MEDIOCRITAS” (VIDA MATERIALMENTE SIMPLES, MAS RICA EM REALIZAÇÕES ESPIRITUAIS) USO EVTUAL DA MITOLOGIA CLÁSSICA CARACTERÍSTICAS A AUSÊNCIA DE SUBJETIVIDADE: RENÚNCIA DO “EU POÉTICO” E ADOÇÃO DE UMA PERSONALIDADE PASTORIL. O POETA DEVE EXPRESSAR APENAS SENTIMENTOS COMUNS E GENÉRICOS. AMOR GALANTE (CONVENCIONAL): EDUCADAS E DISCRETAS. DECLARAÇÕES SURGIMENTO DE ACADEMIAS E ARCÁDIAS LITERÁRIAS. Características da linguagem árcade. Linguagem simples Convencionalismo Volta aos valores clássicos Bucolismo Pastoralismo Presença da mitologia grega Uso de pseudônimo Resgate de temas clássicos Fugere urbem Aurea mediocritas Locus amoenus Inutilia truncat Carpe diem ARCADISMO NO BRASIL CONTEXTO AUTORES & OBRAS Contexto Histórico O estudo da literatura brasileira no século XVIII deve levar em conta dois fatos: Um, de ordem particular, a descoberta do ouro no Brasil e sua exploração intensiva; E outro, de ordem geral, a profunda revolução no plano do pensamento e das mentalidades vivida pela Europa nesse século que se convencionou chamar de Século das Luzes ou da Ilustração. A descoberta do ouro na região das “minas gerais” ativou toda a economia, o comércio e a vida na colônia e deu-lhes um novo dinamismo. Em vez de fixar as famílias no isolamento dos engenhos e fazendas, como ocorreu com a cana-de-açúcar, fez os homens fundarem vilas e cidades e passarem a viver nelas. PRINCIPAIS POETAS ÁRCADES BRASILEIROS Cláudio Manuel da Costa - pseudônimo - Glauceste Satúrnio (Musa inspiradora: Nise) Tomás Antônio Gonzaga - pseudônimo - Dirceu (Musa inspiradora: Marília) Manuel Inácio da Silva Alvarenga - pseudônimo Alcindo Palmireno (Musa inspiradora: Glaura) Inácio José Alvarenga Peixoto - Eureste Fenício (Musa inspiradora: Bárbara) Basílio da Gama - pseudônimo - Termindo Sipílio. Frei de Santa Rita Durão ARCADISMO NO BRASIL DECORRÊNCIA DA ATIVIDADE ENRIQUECIMENTO DAS CIDADES. MINERADORA (MG) = SURGIMENTO DE NOVAS CLASSES: PROFISSIONAIS LIBERAIS = ROMPIMENTO COM O DUALISMO: SENHOR-ESCRAVO. RELAÇÃO COM A INCONFIDÊNCIA MINEIRA = NECESSIDADE DE INDEPENDÊNCIA. LITERATURA = SISTEMA LITERÁRIO: EXISTÊNCIA CITADINA INTENSIFICANDO AS RELAÇÕES SOCIAIS = SURGIMENTO DOS “SARAUS” = MÚSICA E POESIA = SURGIMENTO DOS PRIMEIROS NÚCLEOS PERMANENTES E REGULARES DE UM PÚBLICO INTERESSADO EM ARTE (LITERATURA). PRIMEIRO E DECISIVO PASSO NO PROCESSO DE FUNDAÇÃO DA LITERATURA BRASILEIRA. AUTORES POESIA LÍRICA CLÁUDIO MANUEL DA COSTA PSEUDÔNIMO PASTORIL: GLAUCESTE SATÚRNIO MUSA: NISE OBRAS: Obras (1768) .... mas, temendo me condenes o muito uso das metáforas, bastará, para te satisfazer, o lembrar-te que a maior parte destas “Obras” foram compostas ou em Coimbra, ou pouco depois, nos meus primeiros anos, tempo em que Portugal apenas principiava a melhorar de gosto nas belas letras. É infelicidade que haja de confessar que vejo e aprovo o melhor, mas sigo o contrário na execução. Vila Rica (1839) CLÁUDIO MANUEL DA COSTA, advogado, magistrado e poeta, nasceu em Vila do Ribeirão do Carmo [hoje, Mariana], em 5 de junho de 1729, e faleceu em Ouro Preto, MG, em 4 de julho de 1789. CARACTERÍSTICAS Nos sonetos de Cláudio Manuel da Costa o pastor aparece como vítima do Amor. O sentimento a ser expresso, geralmente, são as dores do amor do pastor por uma pastora que não corresponde e se mantém inflexível ante aos apelos do amante. Paralelismos (repetição de ideias e palavras que correspondem quanto ao sentido) e comparações. CLÁUDIO MANUEL DA COSTA (1729 – 1789) POETA DE TRANSIÇÃO: UTILIZAÇÃO ESTÉTICOS DO ARCADISMO. DE PRINCÍPIOS INFLUÊNCIAS BARROCAS: O SOFRIMENTO INFLUÊNCIACAMONIANA: GOSTO PELA ANTÍTESE E PELO SONETO. É RACIONALMENTE ÁRCADE E EMOTIVAMENTE BARROCO. TEMAS BARROCOS: O DESENCANTO COM A VIDA; A BREVIDADE DOLOROSA DO AMOR; A RAPIDEZ COM QUE TODOS OS SENTIMENTOS PASSAM. CLÁUDIO MANUEL DA COSTA O SOFRIMENTO BARROCO: “Ouvi pois o meu fúnebre lamento Se é que de compaixão sois animados.” A IMPOSSIBILIDADE AMOROSA: “Nise? Nise? Onde estás? Aonde espera] Achar-te uma alma que por ti suspira,” CLÁUDIO MANUEL DA COSTA AS ANTÍTESES (A DUREZA DA PEDRA E A TERNURA DO CORAÇÃO): "Destes penhascos fez a natureza O berço em que nasci: oh! quem cuidara Que entre penhas tão duras se criara Uma alma terna, um peito sem dureza! Amor, que vence os tigres, por empresa Tomou logo render-me; ele declara Contra meu coração guerra tão rara Que não me foi bastante a fortaleza. Por mais que eu mesmo conhecesse o dano A que dava ocasião minha brandura, Nunca pude fugir ao cego engano; Vós que ostentais a condição mais dura, Temei, penhas, temei: que Amor tirano Onde há mais resistência mais se apura. CLÁUDIO MANUEL DA COSTA A PEDRA COMO SÍMBOLO: Contradição: Formação intelectual ocidental x inconsciente preso à pátria, preferência por imagens e cenários nos quais predominam a pedra, a rocha e os penhascos, sua memória é feita de rochas e pedras de Minas Gerais. CONCLUSÃO: poemas europeizados com símbolos das raízes brasileiras. XXVI Não vês, Nise, este vento desabrido, Que arranca os duros troncos? Não vês esta, Que vem cobrindo o céu, sombra funesta, Entre o horror de um relâmpago incendido? Não vês a cada instante o ar partido Dessas linhas de fogo? Tudo cresta, Tudo consome, tudo arrasa, e infesta, O raio a cada instante despedido. Ah! não temas o estrago, que ameaça A tormenta fatal; que o Céu destina Vejas mais feia, mais cruel desgraça: Rasga o meu peito, já que és tão ferina; Verás a tempestade, que em mim passa; Conhecerás então, o que é ruína. XIV Quem deixa o trato pastoril, amado Pela ingrata, civil correspondência, Ou desconhece o rosto da violência, Ou do retiro a paz não tem provado. Que bem é ver nos campos transladado No gênio do pastor, o da inocência! E que mal é no trato, e na aparência Ver sempre o cortesão dissimulado! Ali respira amor sinceridade; Aqui sempre a traição seu rosto encobre; Um só trata a mentira, outro a verdade. Ali não há fortuna, que soçobre; Aqui quanto se observa, é variedade: Oh ventura do rico! Oh bem do pobre! TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA Tomás Antônio Gonzaga, nasceu na cidade do Porto (Portugal) em 1744 e faleceu em Moçambique, em 1810. Fez os estudos primários no Colégio dos Jesuítas(?), em Salvador (BA), e formou-se em Direito na Universidade de Coimbra (Portugal) em 1768. OBRAS: Marília de Dirceu (Parte I – 1792; Parte II – 1799; Parte III – 1812) Cartas Chilenas (1845) Características da poesia de Tomás Antônio Gonzaga. A poesia de Tomás Antônio Gonzaga, em comparação e contraste com a de Cláudio Manuel da Costa, realiza com graça e equilíbrio o novo gosto pelo “estilo simples” e “natural”. Sua expressão é direta, sem grandes inversões ou contorcimentos sintáticos das frases, seu vocabulário é acessível, desprovido de termos raros e cultos e o sentido, na maior parte das vezes, é claro. O sentido está antes voltado para convencer a sua pastora do valor e da sinceridade dos argumentos com que defende o seu amor, e para o agrado e encanto do leitor, que simpatiza com a delicada musicalidade da lira e bom senso do leitor. Tomás Antônio Gonzaga aproxima e usa a sua experiência amorosa pessoal ─ como base de suas composições poéticas sobre o amor de um quarentão com fortuna relativamente modesta por uma jovem rica ─ como base das suas composições poéticas sobe o amor de Dirceu por Marília. Essa mistura de elementos da vida do poeta com elementos da convenção poética , de forma bastante equilibrada e contida, acentua muito o senso de realidade dos poemas, levando-nos a confundir Dirceu com Tomás Antônio Gonzaga e Marília com Maria Dorotéia Joaquina Seixas. TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA MARÍLIA DE DIRCEU: PARTE I Texto árcade + dimensão romântica MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I Toda escrita em Vila Rica, com Gonzaga ainda em liberdade, em um tom otimista e afirmativo. Presença de elementos árcades: o canto da natureza convencional, a vida pastoril, a recusa em intensificar a subjetividade, a galanteria, o racionalismo neoclássico e a clareza do estilo. Liras autobiográficas dentro dos limites que as regras árcades impunham à confissão pessoal. MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I Em suas liras, um pastor (o próprio poeta) celebra, em tom moderadamente apaixonado, as graças da pastora Marília, que conquistara seu coração: “Tu, Marília, agora vendo Do Amor o lindo retrato Contigo estarás dizendo Que é este o retrato teu. Sim, Marília, a cópia é tua, Que Cupido é Deus suposto: Sé há Cupido, é só teu rosto Que ele foi quem me venceu.” MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I A EXPRESSÃO DO AMOR: Impulsos afetivos nos limites do amor galante. A expressão sentimental vale-se de alegorias mitológicas (Cupido). Há um conjunto de frases feitas e lugares-comuns sobre os encantos da amada, sobre as qualidades do pastor Dirceu e sobre a felicidade do futuro relacionamento entre ambos. Há um esforço por exaltar as qualidades da vida familiar, do casamento, das pequenas alegrias que sustentam um lar. MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I Pastoralismo & Estabilidade econômica: “Eu, Marília, não sou algum vaqueiro, Que viva de guardar alheio gado, De tosco trato, de expressões grosseiro, Dos frios gelos e dos sóis queimado. Tenho próprio casal e nele assisto; Dá-me vinho, legume, fruta, azeite; Das brancas ovelhinhas tiro o leite, E mais as finas lãs, de que me visto. Graças, Marília bela, Graças à minha Estrela! MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I IDEOLOGIA MATERIALISTA BURGUESA & VALORES AFETIVOS: “Ébom, minha Marília, é bom ser dono De um rebanho, que cubra monte e prado; Porém, gentil Pastora, o teu agrado Vale mais que um rebanho, e mais que um trono.” MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I O aflorar da sensualidade = desejo de confidência & atrevimento erótico: “Ornemos nossas testas com as flores, E façamos de feno um brando leito; Prendamo-nos, Marília, em laço estreito, Gozemos do prazer de sãos Amores. Sobre as nossas cabeças, Sem que o possam deter, o tempo corre; E para nós o tempo, que se passa, Também, Marília, morre.” MARÍLIA DE DIRCEU – PARTE I O CARPE DIEM: “Que havemos de esperar, Marília bela? Que vão passando os florescentes dias? As glórias que vêm tarde já vem frias, E pode, enfim, mudar-se a nossa estrela. Ah! não, minha Marília, Aproveite-se o tempo, antes que faça O estrago de roubar ao corpo as forças E ao semblante a graça!” O Locus Amoenus (o lugar ameno, paraíso bucólico) é muito frequente e vem definido literalmente desde o primeiro verso da estrofe abaixo: Num sítio ameno cheio de rosas, de brancos lírios, murtas viçosas, dos seus amores na companhia, Dirceu passava alegre o dia. MARÍLIA DE DIRCEU PARTE II A tristeza domina a segunda parte do poema, toda ela escrita na prisão. Motivo básico: as agruras vividas por Dirceu. Tendência maior à confissão + tom de desabafo. Pré-romantismo: sentimentais passagens mais subjetivas e MARÍLIA DE DIRCEU PARTE II TENDÊNCIA PRÉ-ROMÂNTICA = SENTIMENTALISMO: “Eu tenho um coração maior que o mundo, Tu formosa Marília, bem o sabes: Um coração, e basta, Onde tu mesma cabes.” MARÍLIA DE DIRCEU PARTE II AS PERDAS DO PASTOR DIRCEU: Eu, Marília, não fui nenhum Vaqueiro Fui honrado Pastor da tua Aldeia; Vestia finas lãs, e tinha sempre A minha choça do preciso cheia. Tiraram-me o casal e o manso gado, Nem tenho, a que me encoste, um só cajado. MARÍLIA DE DIRCEU PARTE III Publicada em condições confusas. Reúne material variado e de menor valor expressivo, nada acrescentando ao sentido final da obra. Proposta de abandono da vida no campo. Vida na cidade = Dirceu = advogado = Marília = sua “gostosa companhia.” MARÍLIA DE DIRCEU PARTE III “Verás em cima da espaçosa mesa Altos volumes de enredados feitos; Ver-me-ás folhear os grandes livros, E decidir os pleitos. Enquanto revolver os meus Consultos, Tu me farás gostosa companhia, Lendo os fastos da sábia, mestra História, Os cantos da poesia.” CARTAS CHILENAS Todo o fingimento poético cerca a elaboração desses textos: neles, Gonzaga assina com o pseudônimo de Critilo e dirige-se a Doroteu (o poeta Cláudio Manuel da Costa) que vivia supostamente em Espanha. Critilo critica a administração de Fanfarrão Minésio (Luís da Cunha Meneses) que ele diz ser “general do Chile”. Onde se lê Chile, leia-se província de Minas Gerais; onde se lê Santiago, leia-se Vila Rica (atual Ouro Preto). A sátira das Cartas chilenas incide diretamente sobre a figura do governador Luís da Cunha Meneses, cujas ações são continuamente condenadas pelo narrador Critilo. Não há, portanto, qualquer intenção ligada à condenação do sistema colonial a que estava submetido o Brasil: o que o texto pretende é criticar o mau governo, principalmente no que se refere ao desrespeito às leis do Reino Português. CARTAS CHILENAS Essa crítica é decorrência das concepções ilustradas, que colocavam as leis como instrumento fundamental para a preservação da ordem sábia e natural que organizava a vida social. O desrespeito às leis partindo de um governante era, portanto, um perigoso risco à harmonia do grupo social: era uma verdadeira monstruosidade, palavra e imagem que o narrador emprega freqüentemente. SILVA ALVARENGA (1749-1814) Considerado como o mais brasileiro dos árcades, pela sensibilidade rítmica de seus versos, Silva Alvarenga, cujo pseudônimo árcade era Alcino Palmireno, ficou conhecido por uma única obra, Glaura, publicada em 1799, composta de rondós e madrigais (“composições poéticas que encerram um pensamento delicado, terno ou galante/canções pastoris”). A obra Glaura revela um lirismo de inspiração galante, onde o poeta Alcino celebra a pastora Glaura, que se esquiva num clima de galante sensualidade. O refinamento da galanteria, o detalhismo acentuado e uma relativa superficialidade temática permite que se considere o estilo de Silva Alvarenga um exemplo do chamado rococó (“excesso de ornatos” - “acúmulo ornamental”). Por outro lado, há quem defenda que em função de sua espontaneidade e pronuncia quase sentimental, aliadas a uma certa melancolia, o poeta deva ser incluído num espaço pré-romântico. AUTORES A ÉPICA ÁRCADE BASÍLIO DA GAMA (1741-1795) Basílio da Gama, Nasceu em 8 de abril de 1741, em São José do Rio das Mortes (hoje Tiradentes), Minas. Morreu em Lisboa, em 1795. Estudou com os jesuítas: era noviço quando Pombal decretou a expulsão dos padres do Brasil. Em 1795, expulsos os jesuítas, segue para Roma, onde seus mestres fazem que seja aceito na Arcádia Romana (fundada em 1690). Em Lisboa, é preso por suspeição de jesuitismo e condenado ao degredo. Salva-se dirigindo um Epitalâmio (poema nupcial) à filha do Marquês de Pombal. Nome Árcade: Termindo Sipílio. BASÍLIO DA GAMA (1741-1795) O ponto alto da obra literária de Basílio da Gama é o texto O Uraguai, concebido originariamente como um poema épico destinado a celebrar a vitória militar de Gomes Freire de Andrade, Comissário Real, contra os índios da Colônia de Sete Povos das Missões do Uruguai. Localizadas a leste do rio Uruguai, a região hoje pertence ao estado do Rio Grande do Sul, essas missões agrupavam sete povoações habitadas por índios guaranis e jesuítas espanhóis. A origem do conflito está no tratado de Madri, de 1750, segundo o qual Portugal entregaria a Colônia do Sacramento à Espanha em troca das terras onde estavam os Sete Povos das Missões; diante da resistência indígena e jesuítica, portugueses e espanhóis organizaram uma campanha militar que se estendeu de 1752 a 1756. O Uraguai narra os episódios finais dessa campanha militar e a consequente anexação dos territórios à Coroa portuguesa. BASÍLIO DA GAMA O poema épico O Uraguai tem dois objetivos básicos: a defesa e a exaltação da política pombalina e a crítica virulenta aos jesuítas, seus antigos mestres. O Uraguai, na realidade, não é um típico poema épico em sua estrutura, formada por apenas cinco cantos, sem esquema regular de estrofes. Os maiores méritos formais do texto residem justamente nessa ruptura com a tradição camoniana da epopeia em língua portuguesa: Basílio da Gama criou um texto inovador , que explora formas e ritmos de maneira até então inéditas. No aspecto formal, O Uraguai não apresenta nenhum esquema estrófico regular; seus versos são brancos (sem rima) e, ainda que seja possível perceber a divisão nas tradicionais partes do poema épico (proposição, invocação, dedicatória, narração e epílogo), essas partes não seguem as normas estritas do gênero, revelando-se flexíveis. O INDIANISMO EM O URAGUAI Elemento temático muito importante: a exaltação da figura do índio. O poema O Uraguai, não enfatiza a guerra em si, nem as ações dos vencedores, nem os vilões jesuítas - tratados caricaturalmente. Ganham destaque, de fato, e descrição física e moral do índio, o choque de culturas e a paisagem nacional. Além disso, o autor cria passagens de forte lirismo, como a do episódio da morte de Lindóia. A valorização do índio e da natureza selvagem do Brasil corresponde, por um lado, ao ideal de vida primitiva e natural cultivado pelos iluministas e pelos árcades. Por outro lado, porém, esses aspectos, que podemos chamar de nativistas, prenunciam as tendências da literatura do século XIX: o Romantismo. PERSONAGENS General Gomes Freire de Andrade (chefe das tropas portuguesas); Catâneo (chefe das tropas espanholas); Cacambo (chefe indígena); Cepé (guerreiro índio); Balda (jesuíta administrador de Sete Povos das Missões); Caitutu (guerreiro indígena; irmão de Lindóia); Lindóia (esposa de Cacambo); Tanajura (indígena feiticeira A MORTE DE LINDÓIA Este lugar delicioso, e triste, Cansada de viver, tinha escolhido Para morrer a mísera Lindóia. Lá reclinada, como que dormia, Na branda relva, e nas mimosas flores, Tinha a face na mão, e a mão no tronco De um fúnebre cipreste, que espalhava Melancólica sombra. Mais de perto Descobrem que se enrola no seu corpo Verde serpente, e lhe passeia, e cinge Pescoço e braços, e lhe lambe o seio. Fogem de a ver assim sobressaltados, E param cheios de temor ao longe; E nem se atrevem a chamá-la, e temem Que desperte assustada, e irrite o monstro, E fuja, e apresse no fugir a morte. A MORTE DE LINDÓIA Porém o destro Caitutu, que treme Do perigo da irmã, sem mais demora Dobrou as pontas do arco, e quis três vezes Soltar o tiro, e vacilou três vezes Entre a ira e o temor. Enfim sacode O arco, e faz voar a aguda seta, Que toca o peito de Lindóia, e fere A serpente na testa, e a boca, e os dentes Deixou cravados no vizinho tronco. Açouta o campo co'a ligeira cauda O irado monstro, e em tortuosos giros Se enrosca no cipreste, e verte envolto Em negro sangue o lívido veneno. Leva nos braços a infeliz Lindóia O desgraçado irmão, que ao despertá-la Conhece, com que dor! no frio rosto Os sinais do veneno, e vê ferido Pelo dente sutil o brando peito. A MORTE DE LINDÓIA Os olhos, em que Amor reinava, um dia, Cheios de morte; e muda aquela língua, Que ao surdo vento, e aos ecos tantas vezes Contou a larga história de seus males. Nos olhos Caitutu não sofre o pranto, E rompe em profundíssimos suspiros, Lendo na testa da fronteira gruta De sua mão já trêmula gravado O alheio crime, e a voluntária morte. E por todas as partes repetido O suspirado nome de Cacambo. Inda conserva o pálido semblante Um não sei quê de magoado, e triste, Que os corações mais duros enternece. Tanto era bela no seu rosto a morte! SANTA RITA DURÃO (1722 – 1784) José de Santa Rita Durão nasceu em Cata-Preta, Minas Gerais, em 1722. Seus estudos tiveram início com os jesuítas no Rio de Janeiro. Formou-se em Teologia pela Universidade de Coimbra e ingressou na Ordem de Santo Agostinho. Viajou pela Espanha, Itália e França, quando publicou seu poema épico chamado Caramuru, em 1781, o qual tem como subtítulo “Poema épico do Descobrimento da Bahia”, escrito no padrão da poesia de Camões. SANTA RITA DURÃO (1722 – 1784) OBRA: Caramuru, que tem como subtítulo Poema épico do descobrimento da Bahia, é um poema épico escrito nos moldes camonianos: dez cantos, versos decassílabos, estrofes em oitava-rima e estrutura convencional (proposição, invocação, dedicatória, narração e epílogo), em que são narradas as lendárias aventuras de Diogo Álvares Correira, náufrago no Recôncavo da Bahia no século XVI. Seus companheiros de naufrágio foram devorados pelos índios; ele, porém, teria se salvado, dando um tiro de espingarda que impressionou tanto os nativos, índios tupinambás, que passaram a respeitá-lo e lhe deram o nome de Caramuru, que significa “filho do trovão” ou “homem de fogo”. O INDIANISMO EM CARAMURU Em Caramuru, Santa Rita procura apresentar a natureza brasileira, descrevendo o clima, a fertilidade da terra, as riquezas naturais. Assim, alia-se à tradição dos cronistas e viajantes que descreveram a colônia no século XVI. Interessa-se particularmente pelo indígena, descreve seus costumes e instituições e ressalta sua catequese. Visto que Diogo Álvares, mesmo não sendo padre, demonstra interesse em conduzir o índio ao caminho do cristianismo, caracterizando-se como um consciencioso evangelizador. MOMENTO LÍRICO = A MORTE DE MOEMA “Perde o lume dos olhos, pasma e treme, Pálida a cor, o aspecto morib䁵ndo; Com a mão já sem vigor, soltando o leE, Entre as salsas escumas desce ao fundo. Mas na onda dů mar, que irado free, Tornando a aparecer desde o profundo: - Ah! Diogo ţruel! - disse com mágoa, E sem mais vista ser, sorveu-se na água.”