Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos João Batista Rosolem*, Claudio Floridia, Danilo César Dini, Claudio Antonio Hortencio, Flávio Borin, João Batista de Mello Ayres Neto, Rogério Lara Leite, Eduardo Ferreira da Costa, Edson Wilson Bezerra, Antônio Amauri Juriollo, Jacques Philippe Marcel Sanz**, Norberto Bramatti** Levando-se em conta o fato de que as usinas hidroelétricas são hoje as principais fontes de energia do sistema elétrico nacional, pode-se notar que o desenvolvimento de métodos de proteção e acompanhamento preditivo tornou-se fundamental para impedir impactos danosos aos geradores e consequentes paradas prolongadas. Nesse aspecto, a monitoração on-line dos parâmetros dos hidrogeradores é muito importante. Uma abordagem relativa à monitoração consiste em investir na confiabilidade dos sensores e na possibilidade de implantação de redes de sensoriamento nos hidrogeradores, dado que, normalmente, há uma grande necessidade de monitoramento em inúmeros pontos e parâmetros nos hidrogeradores. Com o advento da tecnologia de sensores de fibra óptica, novas e vantajosas alternativas de medição são disponibilizadas, atendendo a esses quesitos. Este artigo apresenta os resultados do desenvolvimento de três tipos de sistemas de sensoriamento óptico a serem utilizados na monitoração de parâmetros dos hidrogeradores: sensoriamento de descargas parciais, sistema de sensoriamento de proximidade do rotor/estator e sistema de sensoriamento de temperatura e deformação do rotor. Palavras-chave: Hidrogeradores. Rotor. Estator. Smart grid. Sensor óptico. Introdução No Brasil, a produção de energia é realizada, principalmente, por meio de usinas hidroelétricas, dadas as grandes bacias hidrográficas de que o País dispõe. De toda a energia gerada, cerca de 90% provém de usinas hidroelétricas. Devido à importância dessas usinas como fonte de energia principal, o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) mantém as unidades de produção (hidrogeradores) em sua carga nominal, apenas removendo-as do serviço em casos de demanda reduzida, necessidade de pausa para manutenção ou quando as condições dos reservatórios exigem tal retirada. Os custos incidentes sobre a hora de cada máquina parada – sejam eles advindos de lucros cessantes ou, ainda, dos próprios custos decorrentes dos eventos de manutenção – tornam fundamental o desenvolvimento de métodos de proteção e de acompanhamento preditivo, de modo a impedir que os geradores sofram impactos danosos, o que ocasionaria paradas prolongadas (LLOYD; CAMPBELL; STONE, 1999), fora dos períodos de demanda reduzida ou de nível reduzido de reservatório. Essa estratégia vem ao encontro do conceito de smart grid (US DEPARTMENT OF ENERGY, 2008), de acordo com o qual a automação e a digitalização das redes elétricas é possibilitada pela incorporação de: tecnologias de informação, telecomunicações, sensoriamento e monitoração para o melhor desempenho da rede. Assim, torna-se possível identificar, antecipadamente, as falhas da rede e capacitá-la para se autorrecompor diante de ocorrências que possam afetar seu desempenho. As empresas geradoras do setor elétrico vêm buscando, desde a década passada, sistemas de monitoração para hidrogeradores. O objetivo é fornecer às equipes de operação e manutenção uma ferramenta de diagnóstico, destinada a prever defeitos em formação, a partir do tratamento das grandezas monitoradas. Uma abordagem relativa à monitoração consiste em investir na confiabilidade dos sensores e na possibilidade de implantação de redes de sensoriamento nos hidrogeradores, tendo em vista a necessidade de monitorar uma grande quantidade de pontos e parâmetros. Com o advento da tecnologia de sensores de fibra óptica, novas alternativas de medição se apresentam. As vantagens dos sensores ópticos são (CULSHAW; KERSEY, 2008): imunidade das fibras ópticas frente às interferências eletromagnéticas; capacidade de transmissão de sinais de frequência e largura de banda elevadas; capacidade de multiplexação de sinais de vários sensores em uma única fibra; compactação e uso de espaços reduzidos; possibilidade de medidas não invasivas, além do baixo custo proporcionado pela escolha de elementos adequados para a monitoração. Neste artigo, apresentamos os resultados do desenvolvimento de três tipos de sistemas de sensoriamento óptico a serem utilizados na *Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected]. **Centro de Tecnologia da Eletronorte. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos monitoração de parâmetros do hidrogerador. Para melhor descrever os resultados obtidos nesses projetos, bem como os parâmetros a serem monitorados, na Seção 1 apresentamos os resultados do desenvolvimento de um sistema de sensoriamento óptico de descargas parciais. Na Seção 2, apresentamos os resultados do desenvolvimento de um sistema de sensoriamento óptico de proximidade do rotor/estator e, na Seção 3, os resultados do desenvolvimento de um sistema de sensoriamento óptico de temperatura e deformação do rotor. 1 Sistema de sensoriamento óptico de descargas parciais para o estator A ocorrência de descargas parciais nos sistemas isolantes dos equipamentos de alta tensão é um sintoma de fragilidade na capacidade dielétrica, cuja evolução pode acarretar graves consequências para o equipamento e para o sistema elétrico. A avaliação de equipamentos de alta tensão, quanto à geração de descargas parciais, é uma ferramenta preditiva, que pode auxiliar na realização da manutenção prévia dos equipamentos (HUDON; BÉLEC, 2005; IEEE, 2000). A partir dessa avaliação, pode-se providenciar uma intervenção no sistema ou sua substituição, antes que ele sofra danos mais graves ou, até mesmo, antes que seja afetado como um todo. Descargas parciais ocorrem devido à ação de vários mecanismos de falhas, como sobrecargas térmicas, movimentos mecânicos, má impregnação do isolamento, deterioração da camada semicondutora, entre outros (BARTNIKAS, 2002). Monitorando-se as descargas parciais, que são sintomas evidentes desses mecanismos, é possível determinar se está ocorrendo deterioração do isolamento e se ele apresenta risco de falha. Testes de descargas parciais também auxiliam a equipe de manutenção a determinar, previamente, qual o tipo de reparo necessário. De uma maneira geral, esse envelhecimento acelerado dos materiais isolantes, com a ocorrência subsequente de descargas parciais, é um ponto crítico na maioria dos grandes equipamentos elétricos. Os hidrogeradores não constituem exceção e têm, no isolamento de suas barras estatóricas, um de seus elos mais fracos. Vibração nas barras, vazios no isolamento, contaminação do isolamento e deterioração das cabeças das bobinas são falhas existentes no estator e passíveis de serem detectadas, por meio da monitoração de descargas parciais. Estas caracterizam-se por um processo de ionização em ambiente gasoso no interior dos materiais dielétricos, causado por um campo elétrico intenso e localizado. A partir desse processo, diversas grandezas físicas são 22 geradas no local, tais como pulsos: eletromagnéticos conduzidos e irradiados, luminosidade, ruído acústico, acréscimo de temperatura e reações químicas localizadas. O sistema de sensoriamento óptico de descargas parciais para o estator desenvolvido baseia-se na captação dos pulsos eletromagnéticos irradiados pelas descargas parciais. O sistema consiste, basicamente, no uso de uma antena dipolo (ou de qualquer outro tipo) acoplada diretamente às portas (anodo e catodo) de um laser semicondutor de baixa corrente de limiar. Para que o sensor laser possa transmitir a forma de onda completa, é necessário polarizá-lo com uma corrente contínua acima do limiar. Isso pode ser feito facilmente em aplicações gerais, por meio de um circuito eletrônico adequado e de uma fonte de tensão ou bateria. No entanto, foi requisito desse projeto que nenhuma alimentação elétrica fosse instalada junto ao sensor, de modo a não causar quaisquer problemas ao hidrogerador. Para solucionar esse problema e polarizar o laser com corrente contínua sem a necessidade de uso de uma fonte de alimentação local, adotou-se a técnica de alimentação óptica (BARTNIKAS, 2002; LANDRY; RUPERT; MITTAS, 1991; ROSOLEM et al., 2009). Assim, uma fibra óptica, diferente da fibra do laser, conduz uma potência óptica em comprimento de onda específico e em nível adequado para alimentar uma célula fotovoltaica instalada junto ao laser. A célula fotovoltaica tem a função de transformar a potência óptica detectada em tensão e corrente para alimentação do laser. A Figura 1(a) ilustra o diagrama do sensor de descargas parciais que utiliza um laser semicondutor, conjugado a uma antena de radiofrequência, e a técnica de alimentação óptica, que denominamos sensor ativo. A célula fotovoltaica utilizada nesse projeto é um dispositivo já adequado para alimentação de sensores. No entanto, sua capacidade de fornecimento de potência é limitada. Estão disponíveis comercialmente células fotovoltaicas para uso com fibras multimodo nas janelas de 810 nm, e fibras monomodo para a faixa de 1.000 a 1.600 nm. Tipicamente, para uma potência óptica de 100 mW em uma carga de 100 Ohms, o valor de tensão é da ordem de 1,0 V para uma corrente de 6 mA. A Figura 1(b) mostra uma caracterização do sensor laser com a célula fotovoltaica incorporada. Foi utilizada, nesse caso, uma fonte de alimentação óptica de alta potência no comprimento de onda de 1.480 nm. Observamos que a corrente do laser é linear, em função da potência óptica no conversor. Já a tensão mínima de operação do laser é de 0,9 V. Outra consideração sobre o sensor é relativa ao tipo de antena a ser empregada. A antena Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos escolhida deve atender aos seguintes requisitos: a) ter frequência de ressonância dentro da faixa de interesse das medições de descargas parciais; b) possuir a maior largura de banda possível; c) ter resistência de radiação adequada para casamento de impedância com o laser semicondutor; d) ter boa direcionalidade e dimensões adequadas para instalação nas cabeças das barras do estator do hidrogerador. Diversos tipos de antenas estão disponíveis para esse desenvolvimento. Entre esses tipos, podemos citar: a antena monopolo, a dipolo e a loop. A antena escolhida para o desenvolvimento foi a do tipo dipolo, por sua simplicidade e por possibilitar maiores ganho e largura de banda – além da resistência de radiação mais adequada para casamento de impedância com o laser semicondutor. A vantagem da antena loop é a possibilidade de se obter um comprimento de onda menor – correspondente à metade – do que aquele da antena dipolo simples, para o mesmo comprimento de onda de ressonância. No entanto, a antena loop apresenta diversos Fonte luz fibra óptica conversor laser choque RF Correntedo laser (mA) resistor 18 1.2 16 1.0 14 12 0.8 10 0.6 8 6 0.4 4 Corrente Tens ão 2 0.2 0 meander Tensão no laser(V) fibra óptica Receptor óptico parâmetros desvantajosos, tais como: baixa resistência de radiação da antena, baixo ganho da antena em relação ao dipolo e baixa banda passante. As antenas dipolo de meia onda são as mais utilizadas em sistemas de radiocomunicação, e são assim chamadas porque seu comprimento é igual à metade do comprimento de onda para a faixa de frequência em que irá operar. Em outras palavras, em cada parte da antena, o sistema irradiante (comprimento) terá um quarto (1/4) do comprimento de onda para a faixa de operação. Assim, escolhemos um tipo de antena dipolo linear que é utilizada em espaços restritos, como é o caso dos hidrogeradores. O tipo de antena dipolo escolhido foi a antena meander (FREESCALE SEMICONDUCTOR, 2006; RASHED; TAI, 1991). Na antena meander1, os braços lineares da antena dipolo são confeccionados conforme uma estratégia de ida e volta no eixo perpendicular ao eixo normal da antena dipolo, até completar seu tamanho estimado. A antena meander é confeccionada em circuito impresso, o que lhe garante bastante robustez. A Figura 2(a) mostra um primeiro empacotamento utilizado para o sensor. A Figura 2(b) mostra uma caracterização do sensor, 0.0 0 50 100 150 200 250 Pot ência no conversor (mW ) 300 (a) (b) Figura 1(a) Diagrama esquemático do sistema de sensoriamento de descargas parciais baseado no laser semicondutor na forma ativa e (b) caracterização do sensor laser com a célula fotovoltaica incorporada (a) (b) Figura 2(a) Sensor confeccionado conforme os dados de simulação e (b) curva de potência óptica gerada pelo sensor laser em função da potência óptica de alimentação da célula fotovoltaica ______________________________________ 1 Ver Figura 1(a). Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 23 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos através da curva de potência óptica contínua do laser de sinal pela potência óptica de alimentação na célula fotovoltaica. Algumas curvas temporais das descargas são mostradas, também, para três níveis de potência óptica de alimentação. Para testar o sensor desenvolvido em condições mais próximas da sua operação real, ou seja, para monitorar descargas parciais provenientes do estator, foram realizados testes em um laboratório especializado em medição de descargas parciais. Utilizou-se uma barra de um estator proveniente de um hidrogerador para gerar as descargas parciais. A barra em questão foi escolhida por já apresentar alto índice de ocorrência de descargas parciais. Nos testes realizados, os dados das descargas foram obtidos tanto pela utilização do sensor desenvolvido como pelo sistema de monitoraçãopadrão baseado em acoplamento capacitivo. O próximo passo, nesse desenvolvimento, foi testar o sensor no estator de um hidrogerador real. Para tanto, outros fatores, tais como a temperatura de operação e o acondicionamento do sensor acima das barras do estator, foram analisados antes de sua instalação. A elevada temperatura na proximidade das barras das bobinas do estator (aproximadamente de 70 a 80ºC no ar e 90ºC no metal da barra) poderia comprometer o desempenho do sensor. Porém, o sistema desenvolvido possui um mecanismo de realimentação automático que possibilita o controle da condição operacional do laser. O sistema foi testado em laboratório e mostrou excelente estabilidade até a temperatura de 100ºC. O sistema de sensoriamento óptico de descargas parciais foi instalado, para testes de campo, em um hidrogerador de uma usina hidroelétrica instalada no interior do Amapá, junto a um sistema convencional de medição de descargas parciais. Desde sua instalação, o sistema de medição tem apresentado excelente desempenho. Apesar de descrevermos, neste artigo, o sensor de descargas parciais com a antena do tipo meander, outros tipos de antena estão sendo pesquisados e desenvolvidos, como, por exemplo, uma linha de transmissão diretamente acoplada e colada na barra do estator, sendo conectada ao laser por um cabo coaxial. É interessante, também, mencionar que essa tecnologia pode ser utilizada, em outras situações, para medições de campo elétrico gerado ou não por descargas elétricas. Outros exemplos de aplicação em sistemas elétricos são as medições de descargas de transformadores, subestações blindadas isoladas a gás SF6, cabos de transmissão, entre outros. 24 2 Sistema de monitoração do balanceamento do eixo do hidrogerador por sensor óptico de proximidade Em hidrogeradores é importante que o eixo da turbina não sofra nenhum desbalanceamento, de forma a evitar desgastes nos mancais e no desempenho da máquina. Para tanto, deve-se monitorar continuamente a órbita da máquina. Isto é realizado por meio de sensores de proximidade que medem a variação de distância entre o eixo e dois sensores posicionados de modo a formar um ângulo de 90º entre si. A tecnologia do sensor óptico de proximidade desenvolvido baseia-se na deformação de uma fibra de Bragg (Fiber Bragg Grating – FBG) (KERSEY et al., 1997), provocada pela força magnética de um ímã preso a essa fibra (MORA et al., 2000). O esquema do sistema de sensoriamento óptico de proximidade é apresentado na Figura 3(a). Esse sistema permite monitoração com independência de temperatura pelo uso de duas FBGs com comprimentos de onda ligeiramente sobrepostos. Na Figura 3(a), o sinal óptico de banda larga (SOA ou LED, por exemplo) passa por um circulador óptico e é refletido pela primeira FBG. O sinal refletido passa, então, pelo segundo circulador óptico e é, novamente, refletido pela segunda FBG. Como resultado, apenas a sobreposição do espectro de reflexão de cada uma das FBGs será detectada na recepção óptica. A Figura 3(b) mostra o encapsulamento do sensor. Nessa configuração, apenas uma das FBGs (FBG2) sofre a ação de deformação, devido à atração magnética do eixo do rotor. A FBG1 deverá ficar próxima o suficiente da grade FBG2 para permanecer na mesma temperatura ambiente (CHIANG et al., 2002; XU et al., 1994). Entre os requisitos que esse sensor deve apresentar, estão: resposta linear em um intervalo de até 2,0 mm, com precisão de 15 m; independência de fatores externos, como a temperatura; e velocidade de aquisição da ordem de 1.000 Hz. Foram realizadas medidas de tensão em função da distância de um alvo metálico, aproximando-se e afastando-se dele o sensor. As curvas obtidas são mostradas na Figura 4(a). Para a calibração dos protótipos dos sensores ópticos de proximidade, foi utilizada uma montagem experimental, na qual os sensores variavam a distância em relação a um bloco de aço ABNT 1045 com dimensões de 152 mm (largura) x 152 mm (altura) x 100 mm (profundidade), para simular o material da árvore da turbina hidroelétrica, constituída de aço forjado ASTM 668 CL e aço ABNT 1045. As potências ópticas da reflexão das grades de Bragg foram medidas utilizando um medidor de potência óptica, em função do deslocamento do Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos sensor montado na base do trilho óptico. O próximo passo foi a realização do teste de campo em uma usina hidroelétrica instalada no interior de Rondônia, para o qual foram desenvolvidos dois conjuntos de sensores ópticos de proximidade. A Figura 4(b) ilustra a montagem dos sensores ópticos de proximidade no interior do poço da unidade geradora, bem como todos os componentes utilizados no teste de campo. Um sinal do sensor de proximidade, posicionado a 3 mm do eixo, é mostrado no gráfico inserido na Figura 4(b). Observa-se a existência de desbalanceamento, evidenciada pela variação do sinal capturado em função do tempo. 3 Sistema de sensoriamento óptico de temperatura e deformação do rotor Intensidade A estabilidade mecânica e a temperatura de operação dos rotores de hidrogeradores são parâmetros dinâmicos que devem estar sempre dentro de margens preestabelecidas (DOUGLAS, 1988). A monitoração da evolução e o controle desses parâmetros impedem a operação fora dessas margens e, também, evitam graves consequências para o equipamento e para o sistema elétrico. Instabilidades no sistema rotor podem gerar campos magnéticos localmente intensos, que induzem correntes espúrias, o que ocasiona Fibras Fibras ópticas ópticas Circulador Intensidade Intensidade Recep ção óptica FBG Alvo met á lico Sinal detectado Magneto FBG1 Intensidade SOA ou LED sobrecargas, deformações nas formas de onda e aumentos de temperatura. A partir desse processo de deterioração, diversas grandezas físicas são geradas no local, como pulsos eletromagnéticos conduzidos e irradiados, elevação de temperatura e vibrações não harmônicas. Vibração nas barras, vazios no isolamento, contaminação do isolamento, descargas elétricas nas cabeças das bobinas, descargas elétricas nas ranhuras e deterioração das cabeças das bobinas são falhas que podem ocorrer no rotor ou no estator, causando efeitos indesejáveis no funcionamento do hidrogerador. Um agravante do processo é o envelhecimento acelerado dos mancais de sustentação, bem como dos materiais isolantes, com a ocorrência, inclusive, de fugas e descargas parciais, além do fato de se ter um sistema dinâmico em movimento com forças variáveis. Em função de curto-circuitos entre espiras do rotor, ocorre um aumento da corrente de magnetização, o que ocasiona o aparecimento de pontos quentes em outros setores do rotor e a diminuição do rendimento do gerador. Outro problema relacionado aos rotores são as deformações mecânicas ocorridas em função da não homogeneidade do material do rotor e variação da temperatura ambiente. Essa deformação pode levar à distorção do campo magnético gerado, ocasionando perdas na máquina. FBG2 Magneto (a) (b) Figura 3(a) Esquema do sistema de sensoriamento óptico de proximidade e (b) desenho do sensor óptico de proximidade usando FB -20 Potência Óptica (dBm) Proximidade 10,9 mm 5,9 mm 4,4 mm 3,9 mm 3,4 mm -30 -40 -50 -60 -70 1549 1550 1551 1552 1553 1554 Comprimento de onda (nm) (a) (b) Figura 4(a) Potências ópticas da reflexão das grades de Bragg obtidas na recepção em função da proximidade do rotor e (b) sensores instalados na unidade geradora número 3 da usina hidroelétrica Samuel Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 25 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos Por esses motivos, deve-se medir a temperatura em alguns pontos do rotor e realizar a transmissão dessa informação para fora do rotor. Algumas técnicas têm sido propostas para monitoração on-line de alguns parâmetros do rotor do hidrogerador (JOVANOVIC, 2000; SÁ; SILVA, 1995; WILLSCH et al., 2008) e são baseadas na transmissão das informações dos dados de dentro do rotor, por meio de óptica espacial (LEDs alinhados com fotodetectores) ou por transmissão de rádio. Em todo o caso, essas técnicas exigem uma alimentação elétrica permanente para a unidade de sensoriamento, o que limita a aplicação no rotor a um tempo limitado. O sistema desenvolvido é de sensoriamento passivo, ou seja, sem alimentação que colete dados no rotor e transmita esses dados para o sistema de monitoração instalado na parte fixa e externa da máquina. O sistema de sensoriamento óptico de temperatura e deformação do rotor idealizado é ilustrado na Figura 5. Na parte móvel (rotor) ficam componentes ópticos totalmente passivos: os sensores do tipo FBG e o colimador móvel. Cada FBG corresponde a um ponto de monitoração de temperatura e/ou deformação. Na parte fixa ficam o interrogador – composto de fonte de luz, analisador de canais ópticos (Optical Channel Analyzer – OCA) e circulador óptico – e o colimador fixo. O sistema funciona do seguinte modo: a fonte de luz de banda larga emite luz pela fibra óptica até o colimador fixo. Este transmite luz ao colimador móvel, quando ocorre alinhamento (a cada volta do rotor). Essa luz, então, é refletida em Fonte de luz de banda larga comprimentos de onda específicos dados pelas FBGs, que são os elementos sensores. A luz refletida passa pelo colimador móvel e é captada pelo analisador de canais ópticos, que mede o comprimento de onda de cada um dos elementos sensores. Com o aumento ou a diminuição de temperatura local (ou deformação), os comprimentos de onda observados no interrogador são alterados. Os colimadores têm a função de alargar o feixe de luz para dimensões finitas, facilitando o alinhamento óptico. Os sensores de temperatura e deformação utilizados são baseados na tecnologia FBG e são dispositivos de grau industrial destinados a ambientes hostis, encontrados em aplicações nos ramos da energia, da construção civil, do transporte e da indústria aeroespacial. Esses sensores podem ser usados isoladamente ou como parte de uma rede de sensores por FBGs. Podem, também, ser facilmente montados diretamente sobre a maioria dos materiais com epóxi, parafusos ou ponto de solda. Os colimadores utilizados não têm nenhuma peça móvel, são compactos e não suscetíveis a desalinhamento. A lente possui um revestimento antirreflexivo, que minimiza as reflexões na sua superfície. O interrogador é o equipamento que permite a visualização do espectro óptico, com a presença dos sinais de retorno das fibras com grade. Esse equipamento foi desenvolvido, inicialmente, para uso em telecomunicações e posteriormente foi adaptado para uso em sensoriamento, com a inclusão de uma fonte de luz de banda larga. O equipamento desenvolvido baseia-se no uso de tecnologias modulares comerciais. Fibra óptica Eixo do rotor ASE Circulador óptico MCO Colimador óptico Analisador de canais ópticos Colimador Rotor Interrogador FBG Sensor FBG Figura 5 Sistema de sensoriamento óptico de temperatura e deformação do rotor 26 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos pôde ser ajustada de 0 a 800 rpm. O objetivo foi simular rotores de hidrogeradores de diversas velocidades de rotação. Na Figura 6(a), observamos o intervalo entre duas medidas consecutivas (capturas de espectro consecutivas, que equivalem a medidas de temperatura sobre o rotor) ao longo do tempo de ensaio (1 hora). Por exemplo, notamos que, a 63 rpm, a maioria dos espectros foram captados em menos de 10 segundos e, em média, a cada 8,7 s. O tempo máximo entre uma captura e outra foi de 35 s. Já para 630 rpm (valor mais próximo do rotor do hidrogerador da Pequena Central Hidroelétrica Luiz Dias), a maioria dos espectros foi capturada em menos de 1,5 s, com valor médio de 1 s e tempo máximo de 3,3 s. A calibração dos sensores FBG foi realizada por meio da comparação entre um sensor eletrônico LM35 e um sensor óptico com fibra com grade de Bragg comercial, em um ciclo de aquecimento e resfriamento da temperatura ambiente em até 65°C. O teste foi realizado aquecendo-se ambos os sensores e registrando os valores de temperatura fornecidos pelo LM35 e o comprimento de onda refletido pela FBG ao longo do tempo. Um gráfico com a curva de calibração do sensor FBG, obtido pela comparação entre dados de comprimento de onda em função da temperatura registrada pelo sensor eletrônico LM35, e seu ajuste linear é mostrado na Figura 6(b). Como pode ser observado nessa curva, o sistema de sensoriamento óptico de temperatura é muito linear. Foi realizado um teste de aquecimento e resfriamento sobre a parte girante de um torno mecânico, para simular situação análoga à que seria encontrada em uma máquina real. Uma bateria induziu o aquecimento de um resistor (situação análoga ao curto das espiras do rotor). O rotor foi posto em movimento e os dados foram registrados durante 30 minutos (tempo necessário para o resistor aquecer e esfriar). Dois dos três sensores foram colocados sobre a resistência e o terceiro foi mantido termicamente isolado. 1532.0 40 Comprimento de onda nm) ( Intervalo entre medições (s) A estratégia adotada é a integração dos seguintes módulos: a) analisador de canais ópticos (OCA); b) placa de processamento de dados; c) placa de comunicação Ethernet; d) chave óptica, para a leitura de diversas entradas ópticas (sistemas com múltiplas fibras com grade); e) circulador para rotear a luz enviada para os sensores e que retorna para o OCA; e f) fonte de luz ASE (Amplified Spontaneous Emission), para gerar luz em banda larga para os sensores a fibra com grade (FBGs). O módulo OCA comercial utiliza a tecnologia de fibra de Bragg (Blazed FBG) e matriz de fotodetectores para ler o espectro óptico da banda C (1.528 a 1.568 nm). A precisão do equipamento na leitura de comprimento de onda é de 0,05 nm e a precisão de potência lida é de 0,5 dB. A faixa de medição da razão óptica sinal-ruído é de 10 a 28 dB. O tempo de leitura de toda a banda espectral da banda C é inferior a 100 ms. O módulo de chaveamento óptico utiliza tecnologia MEMS (Micro Electro-Mechanical Systems) e pode, de acordo com a aplicação, possuir até 16 portas ópticas de entrada para cada uma de saída. O módulo de processamento de dados possui microprocessador de 32 bits, operando em 50 MHz de frequência de relógio e 8 MB de memória flash. Esse módulo possui, embutido, o sistema operacional Linux, que realiza algumas operações com os dados enviados pelo módulo OCA antes de exteriorizálos. O módulo OCA, já integrado a todos esses outros módulos, exterioriza os dados via interface Ethernet 10BaseT ou via interface serial. O interrogador possui, embutido, um módulo de fonte óptica de luz ASE, que cobre a faixa de funcionamento das fibras – que vai de 1.528 a 1.564 nm. No detalhe da Figura 5, mostra-se uma foto do interrogador desenvolvido. Os testes do sistema de sensoriamento óptico de temperatura e deformação do rotor foram realizados em um torno mecânico, cuja rotação Max Media Min 35 30 25 20 15 10 5 0 0 100 200 300 400 500 600 700 800 [nm] = 1530.379 + 0.033184 (T[ °C]- 24.10) 1531.5 1531.0 1530.5 1530.0 20 30 40 50 Rotação (rpm) Temperatura ( °C) (a) (b) 60 70 Figura 6(a) Intervalos de tempo máximo, médio e mínimo de detecção de espectros consecutivos em função da velocidade de rotação do torno mecânico e (b) curva de calibração do sensor FBG Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 27 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos Na Figura 7(a), observamos o deslocamento do comprimento de onda dos sensores de FBG. Notamos que o sensor termicamente isolado não teve alteração no comprimento de onda. Esses resultados foram obtidos com o rotor em movimento com uma rotação de 500 rpm. A Figura 7(b) mostra as temperaturas obtidas a partir das variações de comprimento de onda registradas (usando a calibração indicada no inset da Figura 6(b)). Observa-se que a temperatura dos sensores, em contato com o resistor, atingiu o pico de 75ºC. Após atingir essa temperatura, a bateria descarregou e a temperatura decaiu lentamente, até o valor do ambiente circunstante. Os resultados obtidos em laboratório com esse sistema são muito promissores. Pretende-se, em breve, realizar um teste de campo em uma hidroelétrica para comprovar os resultados em uma situação real de funcionamento. tecnologia de fibra óptica. Referências BARTNIKAS, R. Partial discharges: their mechanism, detection and measurement. IEEE Transactions on Dielectrics and Electrical Insulation, v. 9, n. 5, Oct. 2002. CHIANG, Y. J. et al. Multipoint temperature-independent fiber-Bragg-grating strain-sensing system employing an opticalpower-detection scheme. Applied Optics, v. 41, n. 9, p. 1661-1667, 2002. CULSHAW, B.; KERSEY, A. Fiber-Optic Sensing: A Historical Perspective. Journal of Lightwave Technology, v. 26, n. 9, May 1st 2008. DOUGLAS, J. Hydro Generator Failure. IEEE Power Engineering Review, v. 8, n. 11, p. 4-6, Nov. 1988. Conclusão FREESCALE SEMICONDUCTOR. Compact Integrated Antennas. Application Note: AN2731, Rev. 1.4. Freescale Semiconductor, jul. 2006. Disponível em: <http://www.freescale.com/files/rf_if/doc/app_not e/AN2731.pdf>. Acesso em: 23 abr. 2010. HUDON, C.; BÉLEC, M. Partial Discharge Signal Interpretation for Generator Diagnostics. IEEE Transactions on Dielectrics and Electrical Insulation, v. 12, n. 2, p. 297-319, Apr. 2005. INSTITUTE OF ELECTRICAL AND ELECTRONICS ENGINEERS (IEEE). IEEE STD 1434-2000: Trial-use guide to the measurement of partial discharges in rotating machinery. 2000. 1558 Sensor 1 80 1556 Sensor 2 Sensor 3 70 1554 1552 1550 1548 1546 00:00:00 Temperatura (°C) Comprimento de onda (m) Neste trabalho apresentamos os resultados do desenvolvimento de três tipos de sistemas de sensoriamento – baseados em tecnologia de fibra óptica – a serem utilizados na monitoração de parâmetros do hidrogerador. As características da fibra óptica conferem uma série de vantagens em relação aos sistemas de sensoriamento, como: imunidade eletromagnética, isolamento elétrico, baixo peso, flexibilidade, resistência, entre outras. Os sistemas de sensoriamento foram desenvolvidos para monitorar descargas parciais de estatores, proximidade do rotor/estator e temperatura e deformação do rotor. Os sistemas de sensoriamento desenvolvidos foram testados com êxito e suas características comprovam os benefícios obtidos com o uso da Sensor 1 Sensor 2 Sensor 3 60 50 40 30 20 10 00:10:00 00:20:00 00:30:00 0 00:00:00 00:10:00 00:20:00 Tempo (horas) Tempo (horas) (a) (b) 00:30:00 Figura 7(a) Variação do comprimento de onda de três sensores sobre o rotor do torno mecânico durante o teste de simulação de aquecimento e resfriamento e (b) temperaturas correspondentes obtidas2 ____________________________________________________ 2 Note que um dos sensores foi mantido termicamente isolado. 28 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 Tecnologias de monitoração de hidrogeradores utilizando sensores ópticos JOVANOVIC, L. D. Optical Transmission System for Acquisition and Measurement of the Signals from the High-speed Rotating Shaft. In: IEEE INSTRUMENTATION AND MEASUREMENT TECHNOLOGY CONFERENCE, 17., 2000, Baltimore, MD. Proceedings... Baltimore, MD, USA: IMTC, 2000. p. 1308-1312, v.3. ROSOLEM, J. B. et al. Comparative Analysis of Fiber Grating Versus Fiber Powering for Fiber Optical Sensing Applications. In: MICROWAVE AND OPTOELECTRONICS CONFERENCE (IMOC), 2009, Belém, Pará, Brazil. Proceedings... SBMO/IEEE MTT-S International, 2009. p. 641-645. KERSEY, A. D et al. Fiber grating sensor. Journal of Lightwave Technology, v. 15, n. 8, p. 1442-1463, Aug. 1997. SÁ, F. S.; SILVA, M. D. Máquinas Rotativas e Conversão de Energia. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE PRODUÇÃO E TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA (SNPTEE), 13., 1995, Balneário Camboriú, SC. Anais... 1995. LANDRY, M. J.; RUPERT, J. W.; MITTAS, A. Power-by-light systems and their components: an evaluation. Applied Optics, v. 30, n. 9, p. 10521061, Mar. 1991. LLOYD, B. A.; CAMPBELL, S. R.; STONE, G. C. Continuous on-line partial discharge monitoring of generator stator windings. IEEE Transactions on Energy Conversion, v. 14, n. 4, Dec. 1999. US DEPARTMENT OF ENERGY. Smart Grid: an introduction. USA: DOE’s Office of Electricity Delivery and Energy Reliability, 2008. Disponível em: <http://www.oe.energy.gov/DocumentsandMedia/ DOE_SG_Book_Single_Pages(1).pdf>. Acesso em: 23 abr. 2010. MORA, J. et al. A magnetostrictive sensor interrogated by fiber gratings for dc current and temperature discrimination. IEEE Photonics Technology Letters, v. 12, n. 12, p. 1680-1682, 2000. WILLSCH, M. et al. FBG sensor interrogation on rotating parts of large machines in power generation plants. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON OPTICAL FIBRE SENSORS (OFS), 19., 2008, Australia. Proceedings... SPIE, 2008. v. 7004. (Paper 7004_243). RASHED, J.; TAI, C. T. A new class of resonant antennas. IEEE Transactions on Antennas and Propagation, v. 39, n. 9, Sept. 1991. XU, M. G. et al. Discrimination between strain and temperature effects using dual-wavelength fiber grating sensors. Electronics Letters, v. 30, n. 13, p. 1085-1087, 1994. Abstract Since hydroelectric energy are the main energy source of the national electric system, the development of protection and predictive methods and monitoring systems for hydrogenerator has become essential to prevent harmful impacts and consequent lengthy stoppages. Hydrogenerators monitoring systems need to attend to severe reliability criteria and the capability of sensing hundreds of sensors, since typically there are several points and parameters to monitors in hydrogenerators. Fiber optic sensing is a new, viable and reliable technology to be used in hydrogenerators. This paper presents the results of the development of three types of sensing systems based on optical fiber technology for use in hydrogenerator monitoring. The sensing systems have been developed to monitor partial discharge, proximity to the rotor/stator and rotor temperature and deformation. Key words: Hydrogenerator. Rotor. Estator. Smart grid. Optical sensor. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 6, n. 1, p. 21-30, jan./jun. 2010 29