A MASSIFICAÇÃO DO ESIO SUPERIOR EM PORTUGAL: EFEITOS
ESPACIAIS A DIVERSIFICAÇÃO DO SISTEMA
MADALEA FOSECA
1
A3ES – Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior
2
Universidade do Porto (Departamento de Geografia FLUP)
[email protected]
SARA ECARAÇÃO
1
A3ES – Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Supeiror
3
e-Geo Centro de Estudos de Geografia e Planeamento Regional, FCSH-UL
Resumo
Podem os efeitos espaciais contribuir para aumentar a estratificação dos sistemas de ensino
superior? De que forma a localização, onde um programa de estudos é oferecido, influencia a
capacidade de captação de estudantes? A comunicação incide sobre os comportamentos dos
candidatos ao ensino superior em Portugal, ao nível da mobilidade, nas escolhas dos cursos e
instituições, no processo de acesso, com o objectivo de compreender os principais factores que os
determinam. Os resultados põem em evidência a estratificação diferenciada, por tipos de
instituições, para diferentes áreas científicas, e em localizações.
Palavras chave: Ensino Superior, Efeitos Espaciais, Diversidade do Sistema, Estratificação
Abstract
Is there a spatial effect that contributes to additional stratification of Higher Education
systems? How does the location where a particular study program is offered influence its capacity
to attract students? The analysis focuses on the behavior of applicants to higher education in
Portugal, in the process of access, in terms of mobility, in order to understand the main factors
that determine their choices of programmes and institutions. The results highlight the
stratification by types of institutions for different scientific areas, in different locations.
Keywords: Higher Education, Spatial effects, System diversity, Stratification
1. Introdução
O Ensino Superior (ES), enquanto sector económico, não tem sido objecto de uma
investigação intensiva por parte da Geografia (Erickson, 2012). O padrão territorial do sistema de
ES em Portugal, como noutros países, porém, tem acompanhado as grandes alterações estruturais
do próprio sistema e reflectido as políticas públicas e as estratégias individuais das instituições,
constituindo, em si mesmo, um factor de organização interna do sistema, respondendo a pressões
e constrangimentos diversos. Desde logo, o crescimento registado desde os anos 70, até à
actualidade, com uma variação superior a 6 vezes, no número de estudantes inscritos, entre 1974
(51496 estudantes) e 2011 (377389 estudantes), foi acompanhado por uma expansão territorial do
sistema, o qual passou de apenas 3 localizações principais, anteriores a 1970 – Lisboa, Porto e
Coimbra - para uma dispersão por todas as sedes de distrito e regiões autónomas e muitos outros
centros urbanos de menor dimensão (Fonseca, 2012; A3ES, 2012).
Apesar da actual dispersão territorial na oferta, ela nem sempre vai de encontro à procura.
Há instituições de ensino superior (IES) e cursos (ou ciclos de estudos) que registam uma procura
muito superior à oferta, e outros, pelo menos aparentemente, sobredimensionados, pouco
1
atractivos, que não conseguem preencher as vagas oferecidas. A presente comunicação incide
sobre os comportamentos dos candidatos ao ES em Portugal, ao nível da mobilidade, nas
escolhas dos cursos e instituições, no processo de acesso e inclui um pequeno conjunto
exemplificativo de casos de estudo.
Os resultados que se apresentam procuram validar dois argumentos principais. Em primeiro
lugar, que em Portugal e à semelhança de outros países, o processo de massificação levou à
diversificação e estratificação e a dispersão territorial não contribuiu para um maior equilíbrio
entre a oferta e a procura, não se podendo afirmar inequivocamente, que se tenha assistido a uma
democratização do sistema (1). Em segundo lugar e, em grande medida, relacionado com o
anterior, que o alargamento do acesso tem encontrado um conjunto de barreiras, não só de
carácter económico, social e cultural mas também, territoriais que têm levado a uma
reestruturação do sistema de ensino superior, com um aumento de diversificação e estratificação
que tendencialmente reforçam a polarização de algumas localizações e instituições, num processo
que poderíamos classificar de recomposição de um estrato elitista (2).
A análise incide sobre o concurso nacional de acesso de 2011, tendo sido também usadas as
bases de dados entre 1999 e 2011, facultadas pela Direcção Geral do Ensino Superior (DGES) e
as bases de dados da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), assim
como estatísticas secundárias, das fontes oficiais, INE, EUROSTAT e OCDE.
2. Massificação, Democratização e Estratificação
A massificação do ensino superior (termo criado por Martin Trow nos anos 70) que se
registou a partir da segunda metade do século passado, na maior parte dos sistemas, continua a
constituir o principal marco na história recente do ES, condicionando-o sob diversas formas e nas
tendências evolutivas que se vão desenhando (Trow, 1974, 2000). As políticas e medidas
aplicadas pelos diferentes Estados com objectivos de alargamento do acesso, desejável, no
âmbito das teorias do capital humano desenvolvidas por T. W. Schultz, Jacob Mincer e Gary S.
Becker (Teixeira, 2007; Becker, 1993), foram encontrando barreiras de diferentes tipos, nunca se
tendo assistido a uma verdadeira democratização do ES, como o próprio modelo de Trow tinha
preconizado (elite-mass-universal model). A equidade social e a igualdade de oportunidades no
acesso ao ES mantiveram-se, assim, na generalidade dos sistemas de ensino superior, mais
teóricas do que reais (Erickson, 2012; Koucky et al, 2010; Konstantinovskiy, 2012; Santiago et
al, 2008). Com efeito, à medida que foram chegando cada vez maiores contingentes de estudantes
ao ES, foram emergindo novas e diferentes instituições, assim como diferentes cursos e diplomas,
num leque cada vez mais alargado de áreas científicas e de formação profissional, assistindo-se a
um processo de diversificação, acompanhado, por seu turno, por uma maior estratificação (Shavit
et al, 2007; Teichler, 2009; Kehm & Stensaker, 2009). A primeira fase da massificação, em
Portugal, como nos outros países europeus, foi levada a cabo pelas universidades já existentes.
Posteriormente, foi aumentando o número de institutos politécnicos e de universidades, foi aberto
o ES ao sector privado e o sistema expandiu-se em diversidade, dimensão e dispersão territorial (
Figura 1). Apesar disso, “os modelos europeus de ensino superior – o alemão, o francês, o
inglês e o mediterrânico – reflectem nas suas estruturas as suas origens e funções elitistas, mesmo
à medida que avançam para o acesso massificado. “ (Trow, 2000: 6).
2
Figura 1 – Data de criação/funcionamento das Instituições de Ensino Superior em Portugal em 2011/12
a) Anterior a 1970
b) De 1970 a 1979 c) De 1980 a 1989
d) De 1990 a 1999
e) De 2000 a 2007
Nota: para efeitos de visualização não estão representadas as regiões autónomas dos Açores e da Madeira. R. A. dos Açores:
Universitário/Púbico (1976), Politécnico/Público (1958). R. A. da Madeira: Universitário/Público (1988), Politécnico/Público (1988),
Politécnico/Privado (1948 e 1984).
Relativamente à origem socio-económica dos estudantes e ao alargamento a classes sociais
de menores rendimentos e capital cultural, os estudos têm concluído que se mantêm barreiras no
acesso (Koucky et al, 2010; Huang, 2012; Fonseca, 2012). A título de exemplo, refira-se que
estudos conduzidos na Rússia, para séries longas de observações anteriores e posteriores ao
desmembramento da União Soviética, mostraram que, o padrão da “meritocracia”, outrora
dominante, tem sido substituído pelo domínio do padrão da “parentocracia” (Konstantinovskiy,
2012: 21). A escolaridade, o emprego e as funções profissionais dos pais, continuam a
condicionar de forma crítica o acesso ao ES naquele país (idem). Ainda que não tendo centrado a
sua investigação nas questões territoriais, Konstantinovskiy concluiu que, as escolas “fortes”,
aquelas onde os alunos têm uma maior probabilidade de aceder às universidades, estão
localizadas nas megapolises, ou centros regionais. “The chances of children living in a village or
urban-type rural community studying at one of the 8th cluster schools are close to nil, if they do
not have the resources to overcome territorial deprivation” (idem: 18).
Em Portugal, a formação dos pais e os rendimentos familiares condicionam não só o
acesso, como influenciam as escolhas pelo tipo de ensino dos estudantes. Os estudantes com pais
com formação superior têm dez vezes mais probabilidade de entrar no ES e especificamente no
ensino universitário (Tavares et al, 2008). Já os estudantes provenientes de famílias com menores
rendimentos, apresentam uma maior probabilidade de se inscreverem no ensino politécnico
(idem).
3. O Sistema de ensino superior em portugal
O sistema de ES em Portugal é binário, com universidades e institutos politécnicos e inclui
instituições públicas e privadas, existindo assim 4 tipos diferentes de instituições (Figura 2;
Anexos – Quadro 2). As instituições públicas cobrem a totalidade do território nacional,
apresentando um padrão mais disperso do que as privadas que se concentram nas áreas
metropolitanas de Lisboa e Porto e nas regiões com maior população. As instituições privadas
são em maior número e têm uma menor dimensão. A forte concentração destas instituições, nas
áreas metropolitanas de Lisboa e Porto foi, em grande medida, provocada pela procura excessiva,
3
não satisfeita pela oferta pública. A dimensão média das instituições públicas é de cerca de 6800
alunos, enquanto que no sub-sistema privado desce para cerca de 920 alunos por instituição
(A3ES, 2012).
Figura 2 – Instituições de Ensino Superior em Portugal, 2011/12
a) Sector Público
b) IES – Sector Privado
A distribuição regional do ES em Portugal decalca, no seu essencial, a rede urbana nacional
e os respectivos desequilíbrios. Existe uma dispersão territorial maior do que seria de esperar, já
que se trata de uma função central de nível elevado que necessita de patamares mínimos de
procura potencial – população – superior a outras funções de ensino. Existem, assim, pequenos
núcleos urbanos com ES, com uma dimensão populacional, um perfil funcional de comércio e
serviços à população e uma base económica que poderá não assegurar a eficiência e
sustentabilidade necessária às respectivas IES neles localizadas (A3ES, 2012).
Para além da proximidade à rede urbana, o padrão territorial do sistema de ES, decalca o
padrão geral dos desequilíbrios regionais do país (Figura 3).
Figura 3 – Os desequilíbrios regionais em Portugal: População e PIB per capita (*UTS 3)
a) Distribuição da População(%), 2011
b) PIB per capita 2009(PT=100%)
Nota: para efeitos de visualização não estão representadas as regiões autónomas dos Açores e da
da Madeira. a): 2,46% (Açores) e 2,67% (Madeira). b): 94 (Açores) e 132 (Madeira).
Em 1974, o sistema de ES em Portugal, podia considerar-se de elite com uma taxa bruta de
participação de apenas 7% (Amaral et al, 2005; Amaral & Fonseca, 2012). O processo de
massificação iniciado desde então, está longe de ter atingido um nível idêntico à média dos países
4
da OCDE ou da restante Europa. Em 2008, a percentagem de adultos com pelo menos o ensino
secundário, em Portugal, era ainda apenas de 28%, uma das mais baixas na OCDE e na União
Europeia (19 países), com 71% e 72%, respectivamente (Amaral & Fonseca, 2012). A
percentagem de adultos (idades entre 25 e 64 anos) com educação superior aumentou de 9% em
2000, para 14% em 2008 e 16,2%, em 2009, embora se mantenha bastante baixa face aos valores
dos países da OCDE (28%) e da União Europeia a 19 (25%) (idem).
3.1. O Acesso
Grande parte da investigação sobre o ES centra-se no acesso e nos processos de aumento do
número de estudantes e alargamento do recrutamento a diferentes segmentos da sociedade. O
acesso permite, de facto, ano a ano, acompanhar as principais alterações dos sistemas ao nível
mais agregado ou por tipos de instituições, áreas científicas e regiões, para diferentes
componentes, a mais relevante das quais tem sido, seguramente, a equidade socio-económica e
cultural.
Em Portugal, como no resto da Europa, o ES é fortemente regulado pelo Estado, existindo
um sistema de numerus clausus extensivo à totalidade do sistema. O número de vagas por ciclo
de estudos é aprovado a nível central, pelo Ministério da Tutela. No subsistema público, os
candidatos são colocados centralmente através de um concurso nacional de acesso, podendo
escolher até 6 combinações de curso/instituição, por ordem de preferência. O concurso nacional
de acesso decorre em três fases, nas quais são sucessivamente disponibilizadas as vagas sobrantes
da fase anterior, para candidatos que, entretanto, tenham conseguido as habilitações necessárias
ou para colocados nas fases anteriores que queiram mudar de colocação.
Do leque de parâmetros, que condicionam as escolhas dos estudantes, é possível identificar
os seguintes, sem que a ordem pela qual se apresentam corresponda, sempre, a uma ordem
decrescente de importância: capacidade financeira para frequentar o ensino superior, incluindo a
possibilidade de obtenção de bolsa de estudo ou recurso ao crédito/ empréstimos (1); nota de
candidatura (2); curso/ área científica da preferência do estudante (3); instituição
(reconhecimento, prestígio, etc.) de preferência do estudante (4); proximidade da instituição à
residência ou à localização de menores custos, incluindo a possibilidade financeira de mudança
de residência (5); factores emocionais e outros de carácter social e psicológico, incluindo a
propensão e vontade para mudar de residência e sair da casa dos pais/ família (6).
Os estudos sobre o sistema de ES em Portugal, nos quais esta comunicação se insere, têm
posto em evidência a persistência de grandes desequilíbrios na procura, não se registando
alterações profundas ao nível da mobilidade dos estudantes (A3ES, 2012). Sumariamente pode
dizer-se que, em 2011, como em anos anteriores, houve um desajuste entre a oferta e a procura de
vagas de acesso ao ES em Portugal (Figura 4), sendo que as diferenças se manifestam,
essencialmente, a 4 níveis: em primeiro lugar, ao nível do total de vagas e candidatos, tendo-se
verificado, no ano de 2011, um número superior das primeiras, face aos segundos. Em segundo
lugar, ao nível institucional, registando-se, globalmente, uma maior preferência dos candidatos
pelas universidades em detrimento dos institutos politécnicos. Em terceiro lugar, ao nível de áreas
de ensino e formação e dos cursos, destacando-se Medicina como o mais procurado e existindo
um conjunto de cursos que não registaram qualquer candidatura. Finalmente, ao nível territorial,
os desequilíbrios reproduzem as assimetrias territoriais do sistema de ES, da distribuição da
população e rede urbana e, paralelamente, dos potenciais candidatos (Figura 5). Assim, os
principais pólos de concentração da oferta correspondem às maiores universidades públicas, e
oferecem os cursos mais procurados, nalguns casos de forma exclusiva. Esses pólos
correspondem, por seu turno, aos maiores centros urbanos do país, convertendo-se,
5
simultaneamente, nos pólos da maior oferta e de maior procura. Lisboa, Porto, Coimbra, Braga e
Aveiro, por ordem decrescente de relevância numérica, funcionam, assim, como os pilares do
sistema ou a rede estruturante de base que condiciona a mobilidade dos candidatos.
Figura 4 – Vagas, Candidatos e Matriculados 1999 – 2011
60.000
55.000
Vagas
50.000
45.000
Candidatos
(1ª fase 1ª op)
40.000
35.000
Matriculados
Total (1ª fase)
30.000
Matriculados
(1ª fase 1ªop)
25.000
20.000
15.000
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: DGES
Figura 5 – Acesso 2011 – Vagas e candidatos para as IES públicas (2011)
a) Universitário – Público
b) Politécnico - Público
Considerando os indicadores fundamentais do acesso1, índice de força e taxa de ocupação,
é possível identificar desde logo, a maior atractividade das universidades face aos institutos
politécnicos, correspondendo às primeiras, os valores mais elevados dos dois índices (
Figura 6). Sendo certo que a rede de institutos politécnicos se encontra dispersa pelo
território, com localizações em todas as sedes de distrito, inseridas, nalguns casos, em
1
Já desenvolvido em trabalhos anteriores (Fonseca et al, 2012). Índice de força = ratio entre os candidatos e as vagas; taxa de
ocupação = ratio entre os matriculados e as vagas, vezes 100
6
universidades aí também localizadas, a preferência dos candidatos, relativamente a universidades,
apresenta, um padrão de grande polarização, por parte dos principais centros urbanos.
Figura 6 – Instituições de ensino superior por índice de força e taxa de ocupação (2011)
4,50
I
III
4,00
Índice de Força
3,50
Politécnico Público
Universitário Público
3,00
2,50
2,00
1,50
1,00
II
IV
0,50
0,00
0,0
20,0
40,0
60,0
80,0
Taxa de ocupação
100,0
120,0
Considerando as candidaturas ao próprio distrito de residência (dentro) e a outro(s)
distrito(s) (fora) (Figura 7), verifica-se que os maiores centros urbanos, com destaque para as
áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e Coimbra registam os valores mais baixos das
candidaturas fora, enquanto os distritos com centros urbanos mais pequenos, com oferta apenas
de ensino politécnico, registam os valores mais elevados, evidenciando uma manifesta vontade
dos candidatos de saírem, para estudar noutras localizações, independentemente de existir oferta
local, mesmo nas áreas de formação a que se candidatam (A3ES, 2012).
Figura 7 – Candidaturas 1ª fase, 1ª opção, por distrito de entrega, para o próprio distrito (dentro) e para outro
distrito (fora) (2011)
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
Dentro (0)
Guarda
Santarém
Portalegre
Viseu
Bragança
Beja
Setúbal
Leiria
Aveiro
Vila Real
Évora
Faro
R. A. Madeira
R. A. Açores
Castelo Branco
Braga
Porto
Coimbra
Lisboa
0%
Viana do…
10%
Fora (1)
3.2. A mobilidade diferenciada : Medicina, História e Arqueologia e Construção Civil e
Engenharia Civil
7
Com o objectivo de analisar os desajustes entre a oferta e a procura, ao nível dos padrões
territoriais e da mobilidade dos estudantes, apresentam-se de seguida, 3 casos de estudo,
referentes a 3 áreas de ensino e formação2, seleccionados de um conjunto mais amplo: Medicina
(cnaef 721), Construção Civil e Engenharia Civil (cnaef 582) e História e Arqueologia (cnaef
225). Estas três áreas ilustram alguns dos padrões dominantes em todo o sistema.
Figura 8 - Oferta de cursos de 1º ano de acesso a Medicina, História e Arqueologia e Construção Civil e
Engenharia Civil (2011)
a) Medicina
b) Construção Civil e Eng. Civil
c) História e Arqueologia
Nota: para efeitos de visualização não estão representadas as R. A. dos Açores e da Madeira.
Medicina corresponde à área mais procurada em todo o sistema. Os cursos de 1º ciclo são
oferecidos apenas em universidades públicas, num conjunto restrito de localizações – 5 distritos
do Continente3. História e Arqueologia apresenta um padrão territorial relativamente próximo do
da Medicina, existindo cursos de 1º ciclo, em universidades públicas e privadas, em 6 distritos do
Continente e na Região Autónoma dos Açores4. Construção Civil e Engenharia Civil, em
oposição, apresenta uma padrão de grande dispersão, com oferta em todos os distritos do
Continente e nas Regiões Autónomas, em todas as tipologias, universidades e institutos
politécnicos, públicos e privados (Figura 8).
Em Medicina (cnaef 721), em 2011, foram oferecidas 1517 vagas e registaram-se 3183
candidaturas, o que correspondeu a um índice de força de 2,1 (Quadro 1); 63,5% dos candidatos
tinham origem nos principais centros urbanos de Porto, Lisboa, Braga e Coimbra, centros onde,
por seu turno, se localiza o maior número de cursos, pelo que, não será surpresa que os mesmos
recebam 87% do total de candidaturas. Dos distritos onde se localizam instituições de ES com
cursos de Medicina, Lisboa e Coimbra destacam-se como aqueles onde a grande maioria dos
candidatos opta por uma universidade no próprio distrito, com 95,3% e 87,9%, respectivamente.
Em contrapartida, Braga (Universidade do Minho) e Castelo Branco (Universidade da Beira
Interior, na Covilhã) só conseguem atrair cerca de 50% dos seus candidatos. O número de
candidatos que concorreu a outro distrito que não o seu contabilizou, globalmente, 47 % do total
de candidaturas, sendo os distritos que mais candidatos atraíram, por ordem decrescente, Lisboa,
Porto e Coimbra. Lisboa recolheu candidaturas em todo o país. Coimbra que recebeu candidatos
de quase todos os distritos, não registou candidaturas de Lisboa.
História e Arqueologia (cnaef 225), por seu turno, ofereceu 618 vagas de entrada em cursos
de 1º ciclo, exclusivamente em universidades, como acontece na Medicina. Registaram-se 444
2
Segundo a classificação CNAEF: Classificação Nacional das Áreas de Ensino e Formação. Portaria nº 256/2005, de
16 de Março.
3
4
Existem preparatórios de Medicina nas Regiões Autónomas
Existe um ciclo de estudos de licenciatura, no Instituto Politécnico de Tomar, sem vagas atribuídas.
8
candidaturas, sendo a procura inferior à oferta, com um índice de força de 0,72. Considerando os
distritos de entrega de candidaturas e os distritos a que os candidatos concorreram, evidencia-se a
maior atractividade de algumas localizações, sendo o valor máximo no distrito de Lisboa, seguido
de Porto, Coimbra e Évora.
Quadro 1 – *úmero de candidatos por distrito, por distrito de candidatura (ao próprio distrito – dentro - e fora do
distrito de origem) (2011)
Distrito de
entrega de
candidatura
Aveiro
Beja
Braga
Bragança
Castelo
Branco
Coimbra
Évora
Faro
Guarda
Leiria
Lisboa
Portalegre
Porto
R.A. Açores
R.A.
Madeira
Santarém
Setúbal
Viana do
Castelo
Vila Real
Viseu
Total
Distrito de
entrega de
candidatura
Aveiro
Beja
Braga
Bragança
Castelo
Branco
Coimbra
Évora
Medicina
Dentro do
Fora do
distrito
distrito
.º
%
.º
%
149
100
14
100
193 49,4
198 50,6
41
100
Total
(100%)
.º
149
14
391
41
21
47,7
23
52,3
44
218
87,9
490
95,3
644
46*
74,2
78,0
30
35
59
38
109
24
11
224
13
12,1
100
100
100
100
4,7
100
25,8
22,0
248
35
59
38
109
514
11
868
59
74*
69,8
32
30,2
83
104
72
1686
53,0
Dentro do
distrito
.º
%
865 35,7
123 24,9
2601 56,2
131 24,1
434
52,7
1969
343
82,8
46,0
Faro
733
46,0
Guarda
Leiria
65
759
11,0
32,4
Candidaturas
História e Arqueologia
Dentro do
Fora do
Total
distrito
distrito
(100%)
.º
%
.º
%
.º
10
100
10
6
100
6
26 72,2
10 27,8
36
4
100
4
Construção Civil e Engenharia Civil
Dentro do
Fora do
Total
distrito
distrito
(100%)
.º
%
.º
%
.º
21 48,8
22 51,2
43
6 46,2
7 53,8
13
65 75,6
21 24,4
86
3 23,1
10 76,9
13
3
100
3
6
42,9
8
57,1
14
1
5
7
3
10
6
4
11
4
3,8
26,3
46,7
100
100
4,9
100
9,9
44,4
26
19
15
3
10
123
4
111
9
34
9
10
1
12
185
1
178
4
94,4
69,2
38,5
9,1
30,0
77,7
12,5
89,4
26,7
2
4
16
10
28
53
7
21
11
5,6
30,8
61,5
90,9
70,0
22,3
87,5
10,6
73,3
36
13
26
11
40
238
8
199
15
106
7
100
7
15
100
15
100
100
83
104
14
22
100
100
14
22
1
22
3,4
57,9
28
16
96,6
42,1
29
38
100
72
3
100
3
8
22,9
27
77,1
35
97
100
8
100
9 36,0
97
8
141
100
11
100
12 31,6
141
11
1497 47,0
3183 295 66,4
149 33,6
444
587 62,8
TOTAL DO SISTEMA DE ESIO SUPERIOR EM PORTUGAL
Fora do
Dentro do
Fora do
Distrito de
Total
distrito
distrito
distrito
entrega de
candidatura
.º
%
.º
%
.º
%
.º
%
1559 64,3
9451 89,8
1076 10,2
2424
100 Lisboa
370 75,1
71 18,0
323 82,0
493
100 Portalegre
2025 43,8
7429 81,3
1712 18,7
4626
100 Porto
413 75,9
421 51,0
405 49,0
544
100 R.A. Açores
R.A.
389 47,3
707 50,8
686 49,2
823
100
Madeira
408 17,2
295 17,4
1405 82,6
2377
100 Santarém
403 54,0
631 27,2
1685 72,8
746
100 Setúbal
Viana do
859 54,0
268 23,3
884 76,7
1592
100
Castelo
525 89,0
395 37,9
647 62,1
590
100 Vila Real
1586 67,6
361 22,7
1230 77,3
2345
100 Viseu
Total
28052 60,1 18590 39,9
16
26
348
64,0
68,4
37,2
25
38
935
25
14
8
96,2
73,7
53,3
117
95,1
100
5
90,1
55,6
Total
.º
10527
394
9141
826
%
100
100
100
100
1393
100
1700
2316
100
100
1152
100
1042
1591
46642
100
100
100
O número de candidatos a História e Arqueologia (cnaef 225) que concorre fora do seu
distrito contabilizou 33,6%, valor inferior a Medicina, com 47% e mesmo à média do sistema, de
39,86%. A procura nos distritos de Lisboa, Porto e Coimbra é, em termos absolutos, muito maior
que o somatório dos candidatos de todos os outros distritos. Os padrões territoriais das
candidaturas revelam duas situações aparentemente contraditórias: por um lado, os pólos de
Lisboa, Porto e Coimbra destacam-se como destinos que recrutam candidatos num grande
número de distritos do Continente; por outro lado, quando se analisam as candidaturas por
9
distrito de origem, verifica-se que é muito reduzida a mobilidade potencial dos estudantes. Estes
resultados indicam que História não terá o reconhecimento social e económico de Medicina, isto
é, um candidato de uma região remota estará disposto a suportar os custos da deslocação para
entrar em Medicina mas não para estudar História ou Arqueologia. Os candidatos “urbanos”, ou
porque reconhecem mais facilmente o valor social de cursos das áreas de Humanidades ou pela
proximidade, estão disponíveis para se candidatar às suas vagas.
Construção Civil e Engenharia Civil (cnaef 582) ofereceu, em 2011, 1934 vagas para
cursos de “entrada” no ES, das quais 922 correspondiam a universidades e 1012 a institutos
politécnicos. A procura global foi consideravelmente inferior ao número de vagas (menos de
metade do número de vagas!), com um índice de força de 0,48. Do total de 935 candidaturas, as
universidades registaram 688 (74%) e os institutos politécnicos 247 (26%). Existindo oferta em
todos os distritos, apenas 5 registaram um saldo positivo no que diz respeito à diferença entre o
total de candidaturas e as candidaturas do próprio distrito: Lisboa, Porto, Coimbra, Setúbal e
Évora. A mobilidade potencial dos estudantes para Construção Civil e Engenharia Civil,
considerando a percentagem global de candidatos “fora”, a um distrito que não o da sua
residência, foi de 37,2%, próximo da média do sistema e superior ao de História e Arqueologia.
Daqui se poderá inferir que, ainda que o candidato possa encontrar oferta de ensino superior na
sua proximidade, ele tem uma percepção das diferenças internas do valor social (ou económico)
dos cursos e faz uma escolha selectiva. Ele estará disposto a suportar os custos da deslocação
para entrar num curso de Construção e Engenharia Civil específico, não lhe sendo indiferente o
tipo de instituição. Daí decorre uma maior ou menor propensão para o estudante se deslocar.
Não é possível afirmar inequivocamente que os candidatos concorrem aos cursos que lhes
são oferecidos na sua proximidade; não há uma relação directa entre a mobilidade potencial dos
candidatos e a distribuição territorial da oferta, sendo evidente, pelo contrário, uma clara
percepção dos candidatos de uma hierarquia subjacente à oferta (rankings?), marcada, de forma
inequívoca pela dualidade universidade/ politécnico e pela força de atracção das duas áreas
metropolitanas de Lisboa e Porto.
Analisando a distribuição do total de estudantes inscritos nas licenciaturas e mestrados
integrados, das áreas em análise, evidencia-se a polarização das áreas metropolitanas, nas
universidades - reforçada no caso da Construção Civil e Engenharia Civil - deixando um grande
vazio nas áreas mais periféricas do país. A mobilidade no acesso ao sistema público não tem
modificado o padrão de base, antes o tem reforçado, num forte contraste com o mapa geral do
sistema em termos de oferta, marcado pela grande dispersão e cobertura regional (Figura 9).
Figura 9 – Estudantes inscritos em licenciaturas e mestrados integrados (2011/12)
a) Uni./Público
(MI)
A
b) Uni./Público
(L1)
B
c) Uni./Privado
(L1)
B
d) Poli./Público
(L1)
B
A: Medicina
B: História e
Arqueologia
10
e) Uni./Público
(MI)
C
f) Uni./Público
(L1)
D
g) Uni./Privado
(L1)
D
h) Poli./Público
(L1)
D
C: Construção Civil
D: Construção Civil
e Engenharia Civil
(MI)
e Engenharia Civil
L1)
f) Poli./Privado
(L1)
D
Nota: MI = Mestrado Integrado; L1 = Licenciatura
Considerações Finais
Apresentaram-se, nesta comunicação alguns resultados de estudos mais alargados sobre o
ES em Portugal e especificamente sobre o acesso, procurando pôr em evidência padrões
dominantes da mobilidade dos estudantes.
Mais do que conclusões, estes estudos têm permitido colocar questões e interrogações sobre
a eficiência e eficácia do sistema, no que diz respeito à sua componente territorial.
O padrão territorial do sistema manteve-se, em termos de localizações, praticamente
inalterado desde o início dos anos noventa, com a consolidação da criação da rede de institutos
politécnicos públicos. A partir de então, o crescimento do sector privado nas áreas metropolitanas
de Lisboa e Porto constituiu a alteração mais significativa.
O comportamento dos estudantes no momento do acesso, revela, porém que o padrão de
mobilidade – em termos absolutos baixo - se tem mantido, sem grandes alterações. Os estudantes
estão dispostos a deslocar-se mas, de forma muito selectiva, por tipos de cursos, instituições e
localizações, mantendo-se Medicina como o curso que maiores níveis de mobilidade induz.
A dispersão territorial da oferta, em grande medida assegurada pelo sector público, com
critérios de equidade social subjacentes, poderá não estar a atingir os seus objectivos.
Retomando Doreen Massey “geography matters”! (Massey, 1984).
Referências Bibliográficas
A3ES-Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior. (2012). O Sistema de Ensino Superior em
Portugal. Lisboa: Policopiado.
AMARAL, A., & FONSECA, M. (2012): «Portugal. Higher education and lifelong education in
Portugal.» In SLOWEY, M. & Schuetze, H. G. (edts.) Global Perspectives on Higher Education and
Lifelong Learners, New York: Routledge. pp. 82 - 96.
AMARAL, A., ROSA, M. J., & VEIGA, A. (2005): «Institutional internationalisation strategies in a
context of state inefficiency». In HUISMAN, J. & VAN DER WENDE, M. (edts.) On Cooperation and
Competition II, Bonn: Lemmens Verlag, pp. 249-275.
BECKER, G. S. (1993 (3rd ed)): Human Capital. A Theorethical and Empirical Analisis with Special
Reference to Education, London: The University of Chicago Press.
ERICKSON, R. A. (2012): «Geography and the Changing Landscape of Higher Education». Journal of
Geography in Higher Education, pp. 9-24.
11
FONSECA, M. (2012): «The Student Estate». In NEAVE, G. & AMARAL, A. (edts.), Higher Education
in Portugal 1974-2009: A *ation, A Generation,. Dordrecht/ Heidelberg/ London/ New York: Springer,
pp. 383 - 415.
FONSECA, M., TAVARES, D., SÁ, C., & AMARAL, A. (2012): «Waves of (Dis)Satisfaction: Effects of
the Numerus Clausus system in Portugal». European Journal of Education, (forthcoming).
HUANG, F. (2012): «Higher Education from massification to universal access: a perspective from Japan.»
Higher Education, pp. 257-270.
KEHM, B., & STENSAKER, B. (2009): University, Rankings, Diversity, and the *ew Landscape of
Higher Education. Rotterdam. The Netherlands.: Sense .
KONSTANTINOVSKIY, D. L. (2012): «Social Inequality and Access to Higher Education in Russia.»
European Journal of Education, pp. 1-24.
KOUCKY, J., BARTUSEK, A., & KOVAROVIC. (2010): Who gets a degree? Access to tertiary eduction
in Europe 1950-2009. Prague: Education Policy Centre, Faculty of Education, Charles University.
MASSEY, D. (1984): Spatial Divisions of Labour. Social Strucutres and the Geography of Production.
London: Macmillan Education Ltd.
SANTIAGO, P., TREMBLAY, K., BASRI, E., & ARNAL, E. (2008): Terciary Education for the
Knowledge Society (vol1, vol 2). Paris: OECD.
SHAVIT, Y., ARUM, R., & GAMORAN, A. (. (2007): Stratification in Higher Education. A
Comparative Study. Stanford, California: Stanford University Press.
TAVARES, D., TAVARES, O., AMARAL, A., & JUSTINO, E. (2008): «Students' preferences and needs
in Portuguese higher education». European Journal of Education, pp. 107-122.
TEICHLER, U. (2009): Between over-diversification and over-homogeneization: five decades of search
for a creative fabric of higher education. In B. M. Kehm, & B. Stensaker, University Rankings, Diversity,
and the *ew Landscape of Higher Education.. Rotherdam, The Netherlands: Sense Publishers, pp. 1555 181.
TEIXEIRA, P. N. (2007): Jacob Mincer, A Founding Father of Modern Labor Economics. Oxford:
Oxford University Press.
TROW, M. (1974): «Problems in the Transition from Elite to Mass Higher Education». Conference on
Future Structures of Post-secondary Education (Policies for Higher Education). Paris: OECD, pp. 55 101.
TROW, M. (2000): From Mass Higher Education to Universal Access: The American Advantage.
Berkeley: CSHE Center for Research in Higher Education.
AEXOS
Quadro 2 – Instituições do Sistema de Ensino Superior em Portugal, 2011
Instituições
de Ensino
Superior
(IES)*
%
Universitário
Politécnico
TOTAL
16
20 (27)*
36 (43)*
13,22
16,53
29,75
Universitário
Politécnico
TOTAL
3
2,48
3
2,48
Tipologia das
Instituições
Ciclos
de
Estudo
%
Vagas
Ensino Superior Público
2126
50,86
68250
965
23,09
35512
3091
73,95
103762
Ensino Superior Militar
21
0,50
260
21*
0,50
28
42
1,00
288
Ensino Supeirior Privado
740
17,70
34021
349
8,35
17820
1089
26,05
51841
%
Estudantes
Inscritos
2011
%
Dimensão
média
(Inscritos/
IES)
43,78
22,78
66,56
182859
108943
291802
48,45
28,87
77,32
11428,7
4034,9
6786,1
0,17
0,02
0,18
1051
71
1122
0,28
0,02
0,30
350,3
374,0
40
33,06
21,82
58572
15,52
1464,3
Universitário
42 (51)*
34,71
11,43
25893
6,86
507,7
Politécnico
TOTAL
82 (91)*
67,77
33,25
84465
22,38
928,2
TOTAL do
121
100
4222
100
155891
100
377389
100
4147,1
Sistema ES
Nota: Existem unidades orgânicas de natureza politécnica que estão inseridas em universidades. O valor entre parêntesis indica o total
de unidades orgânicas de natureza politécnica, contabilizando as que pertencem a universidades. O toal geral porém teve em conta a
vinculação institucional e não a natureza e corresonde aos totais parcelares fora dos parêntesis.
Fonte: A3ES
12
Download

A Massificação do Ensino Superior em Portugal