PROJETO PILOTO DE IMPLEMENTAÇÃO DA PROMOTORIA AMBIENTAL DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA Edson Luiz Peters1 O fenômeno da concentração urbana, acelerada pelo êxodo rural a partir da segunda metade do século passado no Brasil e aliada ao incremento da industrialização, trouxe conseqüências sócio-ambientais desastrosas, tais como a formação de favelas, a poluição e a conseqüente degradação da qualidade de vida nestes centros, dentre os quais se encontra a Região Metropolitana de Curitiba. Surgiu um novo desafio para a política e para a administração pública: como tratar os problemas destas regiões, que ultrapassam o interesse municipal – são transmunicipais –, ainda que não se configurem em questões de interesse do Estado-membro como um todo, exigindo, portando, respeito à autonomia municipal. Aparece assim o que se pode denominar peculiar interesse metropolitano que reclama um governo e uma autoridade igualmente metropolitana. O Ministério Público, enquanto instituição voltada à defesa dos interesses sociais maiores, dentre os quais a proteção do meio ambiente, que é condição essencial à sadia qualidade de vida. Foi o reconhecimento, ainda que tardio, de que determinadas funções e serviços públicos são de interesse comum nestas regiões de alta concentração urbana e assim devem ser organizados, planejados e executados de forma conjunta e integrada, sob pena de ineficácia das políticas públicas que visam evitar a degradação ambiental e combater a poluição nestas regiões de conurbação, assegurando a sadia qualidade de vida proclamada pelo Ordenamento Jurídico Nacional. Não obstante tal avanço institucional e as incontáveis vantagens técnicas e econômicas proporcionadas pela gestão sócioambiental integrada, o modelo de gerenciamento político-administrativo em muito prejudicou a implementação e o pleno desenvolvimento das ações metropolitanas, pois por um lado falta autonomia administrativa, orçamentária e financeira e por outro concentra poderes no governo estadual. Imprescindível, neste momento histórico, que o Ministério Público do Paraná enfrente a questão metropolitana através de órgão de execução com abrangência de atuação em toda a Região Metropolitana de Curitiba, sob pena de ineficácia das ações isoladas em cada 1 Doutor em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná; Mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná; Especialista em Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná; Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná; Professor de Direito Ambiental em diversas instituições, em cursos de graduação e pós-graduação em direito; autor do Manual de Direito Ambiental, Ed. Juruá, Curitiba, 2000. Doutorando em Direito Ambiental pela Universidad de Burgos. 2 Comarca, e igualmente integrado aos demais órgãos de gestão, no intuito de responder a altura às demandas sociais. I. INTRODUÇÃO Não se pretende aqui lançar um estudo aprofundado do fenômeno metropolitano e sua institucionalização no Brasil, mas tão somente contribuir no debate e demonstrar a relação direta que existe entre a melhor administração metropolitana e os melhores resultados em gestão ambiental urbana. Também não é propósito imediato deste trabalho adentrar fundo na conceituação jurídica de Região Metropolitana e nas distinções conceituais com outras figuras assemelhadas, tais como microrregiões e aglomerações urbanas. Partindo da lição de José Afonso da Silva2 temos que as Regiões Metropolitanas “constitui uma realidade fática, sociológica, que se transforma, entre nós, em entidades jurídicas” e assim passaram a contar com tratamento constitucional específico a partir da década de sessenta no Brasil. Como é sabido, as Regiões Metropolitanas no Brasil se caracterizam, dentre outros aspectos, pelo agravamento do risco sócio-ambiental, resultante da somatória das condições adversas à manutenção do equilíbrio e da qualidade de vida, tais como concentração industrial, urbanização acelerada em certas áreas, loteamentos clandestinos e irregulares, adensamento populacional, trânsito e tráfego intenso, geração de grande volume de resíduos sólidos, ausência de saneamento básico, saturação de aterros sanitários, etc Neste exato sentido foi editado o Decreto nº 76389, de 03/10/1975, que reconhece como áreas de risco todas as Regiões Metropolitanas existentes naquele momento, conforme se pode conferir da redação do art. 8º, a seguir transcrito: “Art 8º Para efeito dos artigos 3º e 4º do Decreto-lei nº 1.413, de 14 de agosto de 1975, são consideradas áreas críticas de poluição as relacionadas pelo II PND, a saber: 2 In Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª Ed. revista e atualizada. Malheiros, São Paulo, 1995, p. 137. 3 I - Região Metropolitana de São Paulo; II - Região Metropolitana do Rio de Janeiro; III - Região Metropolitana de Belo Horizonte; IV - Região Metropolitana de Recife; V - Região Metropolitana da Salvador; VI - Região Metropolitana de Porto Alegre; VII - Região Metropolitana de Curitiba; VIII - Região de Cubatão; IX - Região de Volta Redonda; X - Bacia Hidrográfica do Médio e Baixo Tietê; XI - Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul; XII - Bacia Hidrográfica do Rio Jacuí e estuário do Gaiba; XIII - Bacias Hidrográficas de Pernambuco.” O mesmo raciocínio pode ser estendido para todas as Regiões Metropolitanas criadas posteriormente e até os nossos dias. O fenômeno da conurbação, que se constata em inúmeras ou quase todas as Regiões Metropolitanas brasileiras, faz desaparecer as divisas territoriais entre os municípios que as integram e faz com que os efeitos da degradação ambiental ultrapassem facilmente as esferas municipais ou, em outras palavras, ainda que as fontes geradoras da poluição estejam situadas em determinados municípios todos passam a sofrer as conseqüências. Nestas circunstâncias, as administrações municipais isoladamente não são capazes de apresentar soluções viáveis, seja porque as fontes da poluição estão fora de seu alcance político-administrativo, seja porque as conseqüências degradadoras das atividades 4 realizadas em seu território extrapolam facilmente suas divisas. Some-se a isto a impotência financeira e técnica dos governos locais para dar respostas adequadas aos problemas ambientais que se multiplicam dia a dia. Algumas funções e serviços públicos têm sido reconhecidos com de interesse comum metropolitano, podendo-se apontar, dentre outros, os seguintes: - Planejamento, Controle do Uso e da Ocupação do Solo; - Criação e administração de Distritos Industriais; - Criação e gestão de Unidades de Conservação; - Preservação das áreas de manancial, fundos de vale, etc. - Preservação e recuperação de matas ciliares e bosques; - Habitação; - Abastecimento de água e gestão de recursos hídricos; - Saneamento básico; - Manejo de resíduos sólidos; - Localização e gestão de Aterros Sanitários; - Transporte coletivo intermunicipal; - Combate à Poluição; - Trânsito. Para agravar tudo isto, os prefeitos e outras autoridades dos municípios que integram estas Regiões Metropolitanas muitas vezes não se entendem, pois foram eleitos por diferentes Partidos Políticos, apoiaram diferentes candidatos a governador do Estado e assim por diante, não aceitando a autoridade metropolitana, que é escolhida pelo Governador. Tecnicamente é sabido e comprovado que os problemas ambientais comuns das Regiões Metropolitanas do Brasil requerem soluções conjuntas e integradas, pois as soluções isoladas por melhores que sejam não são suficientes para combater eficientemente a poluição e assim garantir a almejada sadia qualidade de vida. Não basta, 5 por exemplo, que um determinado município disponha de exemplar sistema de coleta e tratamento de esgotos domésticos e industriais, preservando os rios e evitando a poluição hídrica, se o município vizinho lançar o esgoto diretamente nos rios. A poluição será inevitável, pois as águas circulam por toda a bacia hidrográfica e alcançam rios maiores e os mares. A gestão ambiental integrada para as Regiões Metropolitanas se impõe por todos os ângulos em que se queira analisar a questão: técnico, científico, social, econômico, etc. Os resultados positivos das experiências desta natureza são contundentes, mesmo para municípios que não integram Regiões Metropolitanas, mas que desenvolvem ações conjuntas em diferentes formatos de gestão, tais como consórcios intermunicipais, gestão por bacia hidrográfica, etc. O desafio maior é de ordem política, isto é, que modelo de gestão e que estrutura político-administrativa pode servir melhor para alcançar uma eficaz gestão ambiental para as Regiões Metropolitanas no Brasil. II. RESENHA HISTÓRICA As Regiões Metropolitanas despontaram no contexto brasileiro com a Constituição de 1967, que no art. 157, § 10º facultava à União instituí-las mediante Lei Complementar e cuja redação é a seguinte: “A União, mediante Lei Complementar, poderá estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independente de sua vinculação administrativa, integrem a mesma comunidade socioeconômica, visando à realização de serviços de interesse comum”. Na Emenda nº 01/69, esse dispositivo é elevado ao status de artigo (art. 164), com redação praticamente idêntica. Antes, porém, a Carta Constitucional de 1937 6 estabelecia que “os municípios da mesma região podem agrupar-se para a instalação, exploração e administração de serviços públicos comuns. O agrupamento assim constituído, será dotado de personalidade jurídica limitada a seus fins” (art. 29). Com base no citado dispositivo constitucional de 1967 e 1969, já na década de setenta, o Congresso Nacional votou a Lei Complementar nº 14/73, instituindo as regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, com o objetivo de propiciar um planejamento urbano regional, tendo em consideração as tendências e fragilidades de cada município integrante. Mais tarde, em 1974, através da Lei Complementar nº 20/74, que fundiu os estados da Guanabara e Rio de Janeiro no novo estado do Rio de Janeiro, institui a região metropolitana (RM) do Rio de Janeiro. As Regiões Metropolitanas nascem assim a partir da aglomeração humana em determinadas regiões do país superando os limites geográficos dos municípios envolvidos, fenômeno conhecido como conurbação, e que passam a reclamar um tratamento igualmente supramunicipal. Visam igualmente a conjugação de esforços para a obtenção de financiamento de obras estruturais importantes, manutenção de sistemas integrados de transportes, abastecimento de água para as populações, coleta e tratamento de esgoto além da articulação política estratégica. III – AS REGIÕES METROPOLITANAS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988: INOVAÇÕES E DESAFIOS A Carta Política de 1988 dedicou um capítulo à Política Urbana, estabelecendo que a política de desenvolvimento urbano tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, tratando da obrigatoriedade do plano diretor para as cidades com mais de 7 vinte mil habitantes e da função social da propriedade rural. Entretanto, neste capítulo, não tratou das Regiões Metropolitanas. A novidade da Constituição Brasileira de 1988 é a transferência aos estadosmembros da faculdade de instituir as regiões metropolitanas, através de Lei Complementar, conforme redação do parágrafo 3º do art. 25, a seguir transcrito: “Art. 25 – Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. § 1º - [...] § 2º - [...] § 3º - Os Estados poderão, mediante Lei Complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de Municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.” Esta transferência de atribuição para criar regiões metropolitanas aos estados-membros foi proposta antes mesmo da Constituição de 1967, pelo Prof. Hely Lopes Meirelles ao então Ministro da Justiça Milton Campos, conforme afirma Eurico de Andrade Azevedo, citado por LEMOS3. Propunha o prestigiado professor um preceito mais completo, atribuindo ao estado-membro a faculdade de instituir as RM e indicar os meios financeiros para a realização dos serviços comuns aos municípios que integrassem a mesma comunidade sócio-econômica. Segundo o Prof. CAFFÉ ALVES4, a previsão constitucional impõe “uma determinação normativa em que se recorta, a partir das competências estaduais e municipais tradicionais, uma nova modalidade de atribuição de poderes administrativos que reclama uma tomada de posição diversa frente ao nosso federalismo de caráter cooperativo e orgânico.” Observa-se que a única novidade da Carta de 1988, em relação às Regiões Metropolitanas, é a de facultar ao Estado-membro a possibilidade de instituí-las (§3º do art. 25), através de Leis Complementares, o que não é suficiente para avançar. Não se 3 LEMOS, João Gonçalves de. Em busca de modelos político-institucionais para as regiões metropolitanas: o caso da RM de Fortaleza. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro, EBAP (FGV) 1985, p. 57. 4 CAFFÉ ALVES, Alaôr. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Microrregiões: Novas dimensões constitucionais da organização do Estado brasileiro. In Temas de Direito Ambiental e Urbanístico – Org. Guilherme José Purvin de Figueiredo. Max Limonad, Advocacia Pública & Sociedade, Ano II, Nº 3 – 1998 – Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública. 8 apresentam respostas ou soluções para as antigas questões até hoje pendentes, tais como: definição dos serviços comuns, estabelecimento das fontes orçamentárias para realizar tais serviços, criação de órgão próprio para organizar e governar, isto é, para exercer a autoridade metropolitana, criação de parlamentos metropolitanos e sua organização e funcionamento, sistema de cooperação entre municípios integrantes e estado-membro no qual estejam localizados, etc. Há, enfim, muito por se fazer nesta seara. IV. MODELO DE GESTÃO ADOTADO E SUAS DEFICIÊNCIAS Constitucionalmente, as Regiões Metropolitanas foram previstas no art. 164 da Emenda Constitucional nº 1/69, que não estabeleceu um modelo de gestão e administração e, muito menos, um ente estatal para tanto. Também as Leis Complementares editadas sobre a questão não determinaram uma entidade com o fim de organizá-las e administrá-las. O modelo de gestão político-administrativa adotado originalmente pela Lei Complementar nº 14, de 08/06/1973, apresentava a seguinte configuração, dada pelo art. 2º: Art 2º - Haverá em cada região metropolitana um Conselho Deliberativo e um Conselho Consultivo, criados por lei estadual. § 1º - O Conselho Deliberativo constituir-se-á de 5 (cinco) membros de reconhecida capacidade técnica ou administrativa, nomeados pelo Governador do Estado, sendo um deles dentre os nomes que figurem em lista tríplice feita pelo Prefeito da Capital e outro mediante indicação dos demais Municípios integrantes da região metropolitana. § 2º - O Conselho Consultivo compor-se-á de um representante de cada Município integrante da região metropolitana sob a direção do Presidente do Conselho Deliberativo. § 3º - Incumbe ao Estado prover, a expensas próprias, as despesas de manutenção do Conselho Deliberativo e do Conselho Consultivo. Denota-se, desde o princípio, uma concentração de poder nas mãos do 9 Governador do Estado num modelo único e rígido de estrutura dos Conselhos Deliberativos. Mais tarde, no ano de 1975, foi editada a Lei Complementar nº 27, de 03/11/1975, que atribuiu nova redação ao art. 2º da Lei Complementar 14/73, estabelecendo a seguinte composição dirigente para as Regiões Metropolitanas no Brasil: "Art. 2º - Haverá em cada Região Metropolitana um Conselho Deliberativo, presidido pelo Governador do Estado, e um Conselho Consultivo, criados por lei estadual. § 1º - O Conselho Deliberativo contará em sua composição, além do Presidente, com 5 (cinco) membros de reconhecida capacidade técnica ou administrativa, um dos quais será o Secretário-Geral do Conselho, todos nomeados pelo Governador do Estado, sendo um deles dentre os nomes que figurem em lista tríplice organizada pelo Prefeito da Capital e outro mediante indicação dos demais Municípios integrante da Região Metropolitana." Como se pode constatar facilmente, concentrou-se ainda mais o poder decisório sobre as questões metropolitanas na figura do Governador do Estado, que além de passar a reinar absoluto como presidente nato do Conselho Deliberativo é quem escolhe os demais integrantes. O requisito da capacidade técnica ou administrativa e a escolha de um dos conselheiros a partir de lista tríplice encaminhado pelo Prefeito da Capital ou do município sede não são suficientes, nem de longe, para amenizar a desproporcional concentração de poder no Governador do Estado. Com este modelo se partidarizou o destino das Regiões Metropolitanas em prejuízo direto da população, que passa a sofrer as conseqüências da falta de entendimento e até das diferenças ideológicas e pessoais que possam existir entre governadores e prefeitos. Inadmissível em nossos dias um modelo concentrador de poder e antidemocrático como este, pois afasta a possibilidade de qualquer participação significativa da população, contrariando os princípios e objetivos fundamentais da República Federativa brasileira (Art. 1º e 3º da Constituição Federal). Neste exato sentido 10 apontam as normas do Capítulo IV do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), ao tratar da Gestão Democrática da Cidade, estabelecendo com clareza, no art. 45, a obrigatoriedade de gestão participativa, nos seguintes termos: “Art. 45. Os organismos gestores das regiões metropolitanas e aglomerações urbanas incluirão obrigatória e significativa participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade, de modo a garantir o controle direto de suas atividades e o pleno exercício da cidadania.” Comentando este artigo do Estatuto da Cidade, afirma MUKAI5 que “embora, pelo art. 25 da Constituição, a instituição e a legislação sobre regiões metropolitanas sejam hoje de competência dos Estados-membros, a norma nos parece constitucional, no sentido de que impõe a observação do princípio da democracia direta, prevista no parágrafo único do art. 1º da Constituição.” Não obstante estas distorções de cunho político, a partir de então os Estadosmembros, exercendo o poder residual, foram criando suas respectivas entidades metropolitanas, com diferentes configurações, tendo em comum a tentativa de ser uma síntese da multiplicidade de autonomias. Algumas ganharam o formato de empresas públicas (Belém, Salvador e São Paulo), outras de autarquia (Fortaleza e Belo Horizonte) e outras de fundação pública (Recife, Rio de Janeiro e Porto Alegre). Há ainda o caso da Região Metropolitana de Curitiba, que conta com uma entidade especial denominada Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba – COMEC. Ainda que existam diversas entidades coordenando as Regiões Metropolitanas no Brasil, não se reconhece, de regra, a capacidade processual e contratual das mesmas, o que representa mais um obstáculo a ser superado no caminho da autonomia, condição sine qua non para o desenvolvimento harmônico e justo destas aglomerações. Outra deficiência do modelo metropolitano brasileiro é a ausência de autonomia financeira, pois não dispõe de dotação orçamentária e nem pode propor previsão desta 5 MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade – Anotações à Lei N. 10257, de 10-7-2001. Saraiva, São Paulo, 2001, pág. 52. 11 natureza, pois carece de governo próprio e de autonomia administrativa, ficando a execução dos projetos de interesse comum na dependência de financiamento de órgãos e programas nacionais e até internacionais e de toda burocracia e morosidade inerentes. Este quadro financeiro deficitário reforça ainda mais o poder dos governadores, pois são os Estados que acabam por financiar e custear inclusive a estrutura administrativa necessária para tratar das chamadas questões metropolitanas, a exemplo do Estado do Paraná que criou recentemente uma Secretaria Especial de Assuntos Metropolitanos. Diante de tais dificuldades, não raras vezes os governos municipais acabam cedendo à pressão de grupos econômicos que pretendem instalar empreendimentos sem se submeter às diretrizes traçadas em planos diretores integrados, comprometendo o planejamento do conjunto da Região Metropolitana em troca de benefícios imediatos e prejuízos permanentes. V. PROPOSIÇÃO: UM NOVO ATUAR DO MINISTÉRIO PÚBLICO Tendo em consideração a necessidade de aperfeiçoamento da atuação do Ministério Público do Paraná na esfera de proteção ambiental, particularmente na Região Metropolitana de Curitiba; Tendo em consideração a insuficiência da atuação isolada das Promotorias de Justiça junto as Comarcas integrantes da Região Metropolitana e a necessidade de ação especializada e integrada; Tendo em consideração a necessidade de acompanhamento da ação política do Estado e dos Municípios integrantes da Região Metropolitana de Curitiba, bem como a articulação com os órgãos municipais e estaduais responsáveis pela gestão ambiental; Tendo em consideração a ineficácia do sistema de organização administrativa metropolitana, a carência de legitimidade e a conseqüente crise de autoridade engendrada pelo modelo adotado na legislação brasileira para disciplinar as Regiões Metropolitanas, 12 cujas conseqüências são por vezes desastrosas para a população residente que sofre de perto os resultados da falta de articulação político-administrativa imperante nestas importantes regiões do país; Tendo em consideração a falta de capacidade demonstrada pelo Estado e Municípios para conter a degradação e os acidentes ambientais, tais como enchentes, crises contínuas no abastecimento de água, saneamento insuficiente e poluição dos mananciais e a necessidade de intervenção contínua do Ministério Público do Paraná junto ao poder público estadual e municipal; Tendo em consideração a necessidade de planejamento e atuação metropolitana por parte do Ministério Público do Paraná, visando garantir a preservação da qualidade de vida nestas regiões; Tendo em consideração o papel essencial do Ministério Público do Paraná na garantia do direito fundamental ao ambiente equilibrado, essencial condição à sadia qualidade vida e ao bem estar das presentes e futuras gerações; Tendo em consideração a complexidade dos problemas que afligem e atingem a Região Metropolitana de Curitiba como um todo e a importância de buscar um modelo de atuação ministerial peculiar para esta região, que permita ultrapassar as barreiras da atuação municipal isolada e assim alcançar o interesse maior da população que vive nestas áreas de risco sócio-ambiental agravado pela multiplicação dos fatores de degradação da qualidade de vida; Imperativa se apresenta a revisão do atuar ambiental do Ministério Público do Paraná, caminhando-se gradativamente no sentido da regionalização das ações de prevenção, melhoria e recuperação do meio ambiente. Num momento em que se agrava a deficiência da União para proteger o meio ambiente e garantir a proclamada sadia qualidade de vida nos mais de oito milhões de quilômetros quadrados do território nacional, na medida em que também se agravam os 13 efeitos perversos da concentração industrial e urbana, sem que os municípios possam atuar de forma eficaz para conter a poluição e prevenir os danos ambientais que comprometem as condições de vida, oportuna se apresenta a idéia de implementar a Promotoria Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba, com atuação supramunicipal e com raio de atribuições em todos os municípios integrantes, de modo a garantir um tratamento atual das questões ambientais nesta área de risco ambiental agravado pela pressão da ocupação urbana acelerada e não planejada, pelas deficiências na coleta e tratamento do esgoto e de resíduos sólidos e industriais e outros fatores já referidos. A atuação ambiental integrada e integradora é alternativa político-administrativa que vem apresentando os melhores resultados, posto que é nos grandes centros urbanos industriais que se observa os efeitos mais devastadores da degradação ambiental e nada mais lógico, econômico e eficaz que implementar uma Promotoria Metropolitana para fazer frente a esta situação.. Num momento histórico em que os efeitos da poluição ultrapassam quase sempre a órbita municipal ao mesmo tempo em que as soluções locais são quase sempre insuficientes para garantir a preservação e a qualidade de vida, não restando outra alternativa que não seja a integração das ações e dos serviços comuns, desde o planejamento até a execução, não deve a instituição do Ministério Público permanecer à margem de tal processo. Neste sentido se propõe a criação de uma Promotoria Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba, com atribuições específicas para tratar dos interesses metropolitanos, entre o Estado-membro e o Município, a seguir relacionadas: 1. Planejamento, Controle do Uso e da Ocupação do Solo; 2. Instalação e acompanhamento de Distritos Industriais; 3. Acompanhamento e fiscalização da gestão de Unidades de Conservação; 4. Preservação das áreas de manancial, fundos de vale, etc. 14 5. Preservação e recuperação de matas ciliares e bosques; 6. Acompanhamento e fiscalização da atividade mineral; 7. Abastecimento de água e gestão de recursos hídricos; 8. Saneamento básico; 9. Manejo de resíduos sólidos; 10. Localização e fiscalização de Aterros Sanitários; 11. Combate à Poluição nas suas diversas formas; 12. Trânsito metropolitano. REFERÊNCIAS 1 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 4ª edição, Malheiros, São Paulo, 1993 2 CAFFÉ ALVES, Alaôr. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Microrregiões: Novas dimensões constitucionais da organização do Estado brasileiro. In Temas de Direito Ambiental e Urbanístico – Org. Guilherme José Purvin de Figueiredo. Max Limonad, Advocacia Pública & Sociedade, Ano II, Nº 3 – 1998 – Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública. 3 LEMOS, João Gonçalves de. Em busca de modelos político-institucionais para as regiões metropolitanas: o caso da RM de Fortaleza. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro, EBAP (FGV) 1985, p. 57. 4 MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade – Anotações à Lei N. 10257, de 10-7-2001. Saraiva, São Paulo, 2001, pág. 52. 5 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª Ed. revista e atualizada. Malheiros, São Paulo, 1995.