BIOCONVERSÃO DE RESÍDUOS AGROINDUSTRIAIS, DE ANÁPOLIS E
REGIÃO, EM PRODUTOS DE INTERESSE BIOTECNOLÓGICO
Priscylla Amora Vieira 1,4 , Lorena da Fonseca Ferreira 2,4 e Solange Xavier dos Santos 3,4
1
BolsistaPIBIC/CNPq/UEG
Voluntário Iniciação Científica PVIC/UEG
3
Pesquisadora – Orientadora
4
Curso de Ciências Biológicas, Unidade Universitária de Ciências Exatas e Tecnológicas, UEG
2
RESUMO: O Brasil é um país de grande atividade agrícola e grande gerador de resíduos
agroindustriais. O município de Anápolis/GO e região constitui um importante pólo
agroindustrial. Foi avaliado o potencial desses resíduos em bioprocessos para obtenção de
produtos microbianos. Cinco linhagens foram utilizadas: Pleurotus ostreatoroseus (SXS 532),
P. sajor-caju (SXS 512), P. eryngii (SXS 521), Lentinula edodes (SXS 504) e Ganoderma
lucidum (SXS 531). Os resíduos constituiram-se de casca/sementes de tomate (TO), bagaço
de cana-de-açúcar (CA), coroa-de-abacaxi (AB), palha de arroz (PA), impurezas do milho
(IM), palha de milho (PM), palha da guariroba (GU), serragem (SE), farelo de arroz (FA) e
Capim (CP), que foram empregados isoladamente e/ou combinados. Cultivos foram
realizados em sacos de polipropileno a 27ºC. Crescimento micelial ocorreu em todos os
substratos, exceto em SE+FA+IM e IM+CP. As linhagens de Pleurotus spp apresentaram
crescimento mais elevado que as demais. Os substratos mais efetivos para a miceliação foram
CA+IM, PM+TO, AB, IM+GU, GU, IM. Frutificação ocorreu apenas nas linhagens de
Pleurotus spp e nos substratos de melhor miceliação. A linhagem 532 apresentou a maior
produtividade de cogumelos. Todas as linhagens produziram celulase (CMCase) e ligninases
(MnP e LiP) em todos os substratos testados. A 512 foi a mais efetiva em produzir
peroxidades e a 504 em celulase. O substrato GU foi o mais efetivo na produção das enzimas,
empatando com AB na produção de LiP. Esses dados são incentivadores para o
aproveitamento das potencialidades regionais para bioconversão em produtos de alto valor
agregado, uma vez que os fungos estudados são de interesse comestível, medicinal e
biotecnológico.
Palavras-chaves: cogumelos comestíveis e medicinais, enzimas microbianas, aproveitamento
de resíduos.
Introdução
A economia brasileira é uma das mais importantes baseadas na agricultura, produzindo
e exportando café, cana-de-açúcar, soja, mandioca, entre outros. Entretanto, a obtenção desses
produtos agrícolas gera grande quantidade de resíduos (Uenojo & Pastore, 2007). Neste
contexto encontra-se o município de Anápolis, que é caracterizado como um importante pólo
agroindustrial do estado de Goiás, produzindo materiais residuários, que nem sempre
costumam ter aproveitamento econômico e podem ser adquiridos a baixo custo ou custo zero.
A bioconversão de materiais lignocelulósicos vem recebendo considerável interesse,
pois esses materiais representam vasta fonte de material bruto, que podem ser empregados no
desenvolvimento de bioprocessos que resultam em produtos de alto valor agregado; entre os
quais açúcares fermentáveis, combustíveis, alimentos, fármacos, enzimas e substâncias de
interesse industrial (Pandey et al., 2000a; Xavier-Santos, 2003; Uenojo et.al.,2007).
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A biodegradação dos materiais lignocelulósicos por microrganismos é atribuída à ação
de uma série de enzimas extracelulares, muitas das quais, através do desenvolvimento dos
processos biotecnológicos, têm sido produzidas comercialmente e assumindo importante
papel na indústria, seja no bioprocessamento de material vegetal, convertendo a biomassa em
produtos de alto valor comercial, ou ainda em aplicações na indústria de alimentos, de
combustíveis, papeleira ou farmacêutica (Guiraud et al., 1999; Duran & Espósito, 2000;
Ruegger et.al.,2004).
As celulases hidrolisam polissacarídeos das paredes celulares vegetais (Uenojo &
Pastore, 2007) e têm amplo potencial de aplicação na indústria de alimentos, têxtil e química
(Hang & Woodanms, 1997). As ligninases apresentam elevado poder oxidante, o que faz com
que possam ser utilizadas não só sobre seu substrato habitual, mas numa grande variedade de
espécies químicas similares à estrutura básica da lignina (Brito et al., 2004), por essa razão
têm sido de suma importância para o tratamento enzimático de diferentes efluentes industriais,
como o da indústria papeleira, ou ainda na degradação de corantes (Ferrer et al., 1991;
Esposito et al., 1991 e 1993; Michel Jr. et al., 1991; Knapp et al., 1995).
Além das enzimas, os cogumelos comestíveis e medicinais, constituem produtos de
origem microbiana de grande interesse econômico. Muitas espécies de cogumelos podem
melhorar a dieta alimentar, ou atuar como remédios, por apresentarem, em sua composição
elevado índice de proteínas, vitaminas, minerais, carboidratos, além de compostos bioativos
(Zanetti et al., 1997).
A proposta desse trabalho consistiu em avaliar o potencial de resíduos agroindustriais
gerados no município de Anápolis/GO e região, no desenvolvimento de bioprocessos, para a
obtenção de diferentes produtos de origem microbiana, como cogumelos comestíveis e
medicinais, e enzimas de interesse industrial.
Materiais e Métodos
Linhagens estudadas: SXS 504 (Lentinula edodes); SXS 512 (Pleurotus sajor-caju); SXS
521 (P. eryngii); SXS 531 (Ganoderma lucidum) e SXS 532 (P. ostreatoroseus).
Preparação dos substratos, inoculação e incubação - Os substratos foram obtidos de
diferentes resíduos agroindustriais adquiridos junto a lavouras, feiras, sacolões e indústrias de
beneficiamento da região de Anápolis. Os resíduos foram utilizados na forma bruta ou após
serem submetidos a um pré-tratamento (lavagem, secagem, trituração), dependendo da
origem. O preparo dos substratos foi feito a partir do resíduo puro e/ou combindos, os quais
foram hidratados e homogeneizados manualmente (UR 70%), distribuídos (1L) em sacos de
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polipropileno e esterilizados a vapor, a 121ºC por1 h. A inoculação se deu a partir de discos
de cultura miceliada em BDA. Os sacos foram incubados a ± 27o C.
Avaliação do crescimento micelial e indução da frutificação - Semanalmente, foi medidase
a extensão da área de colonização do substrato pelo micélio. Os experimentos foram
conduzidos em tri ou duplicatas. Após a completa colonização micelial do substrato e a
verificação do surgimento de primórdios de frutificação, as culturas foram transferidas para
uma estufa germinadora, mantendo-se uma média de 27ºC e UR de 70% a 84%.
Cultivo para produção de enzimas - Para esses ensaios foram selecionados os substratos:
AB; IM; PM+TO; PA+FA e GU. Uma alíquota de 5g de substrato foi distribuída em
erlenmeyer de 250mL. O material foi hidratado e esterilizado, como anteriormente, inoculado
com três discos de cultura miceliada em BDA e incubado a 27°C, por 30 dias.
Obtenção da solução enzimática bruta - Foi obtida adicionando-se 40 mL de água destilada
para cada 5g de substrato miceliado, que foi macerado e filtrado com o auxilio de uma gaze.
Avaliação da atividade enzimática - A solução enzimática bruta foi avaliada quanto à
atividade de ligninases (MnP e LiP) e celulase (CMCase). A atividade de CMCase foi
determinada em 0,8 mL de tampão acetato de sódio 0,2 M pH 5,0, contendo 1% de Carboxi
Metil Celulose e 0,2 mL de solução enzimática bruta. O açúcar redutor liberado, após a
incubação da mistura reacional a 40ºC por 10 min., foi quantificado pelo método do DNS
(Miler, 1959). Uma unidade de CMCase sendo definida como a quantidade de enzima capaz
de liberar 1 µmol de glicose por minuto, nas condições de reação, utilizando curva padrão de
glicose. A atividade de MnP e LiP foi determinada segundo Glenn et al.(1986) e Tien & Kirk
(1988), respectivamente. Todos os ensaios foram conduzidos em duplicata e os dados
apresentados correspondem à média aritmética dos valores obtidos nas duas réplicas. A
unidade de atividade enzimática foi expressa em U/g de substrato.
Resultados e Discussão
Miceliação – Foi observado crescimento em todos os substratos, exceto em SE+FA+IM e
CP+IM. As linhagens 512, 521 e 532 (todas Pleurotus) apresentaram taxas de crescimento
mais elevadas (colonizando toda extensão do substrato entre 21 e 33 dias, em média) do que
as linhagens 504 e 531 (que levaram de 61 a 68 dias). Os substratos mais efetivos em
promover a miceliação, nos quais foi verificado crescimento de todas as linhagens inoculadas
e as maiores taxas de crescimento vegetativo foram, respectivamente, CA+IM, PM+TO, AB,
IM+GU, GU, IM (Figura 1).
Frutificação - Das cinco linhagens estudadas, em três delas foi verificada a produção de
cogumelos (512; 521 e 532). A ausência de frutificação, aliada à baixa velocidade de
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miceliação nas linhagens 504 e 531, possivelmente se devam a condições ambientais
desfavoráveis de cultivo (umidade, pH, temperatura, etc) e não necessariamente à composição
dos substratos. Esses casos são merecedores de estudos adicionais envolvendo essas
linhagens. Entre os 13 substratos estudados, foi obtida frutificação em cinco deles (GU,
IM+GU, PM+TO, IM e AB), os quais foram também os mais efetivos para a miceliação.
Exceção feita para CA+IM, que apesar de ter sido efetivo em promover a miceliação, não
proporcionou a frutificação. A 532 foi a linhagem que frutificou em mais tipos diferentes de
substratos (todos os cinco citados acima), seguida da 521 (que frutificou em GU, AB,
PM+TO) e da 512 (que frutificou apenas em IM). A maior média de frutificação (16g peso
úmido/L de substrato úmido) foi alcançada pela linhagem 532 no substrato AB (Figura 2).
Atividade Enzimática - Todas as linhagens produziram celulase (CMCase) e ligninases
(MnP e LiP) em todos os extratos testados. Os maiores níveis médios de atividade de celulase
foram obtidos nos ensaios utilizando o substrato GU, sendo que os níveis de LiP foram
equivalentes em GU e AB. A análise comparativa entre as linhage ns, mostrou os maiores
níveis médios de celulase entre a linhagem 504; e os maiores níveis de MnP e LiP entre a
linhagem 512 (Tabela 1). Assim, a 512 foi a linhagem mais efetiva em produzir peroxidases e
a 504 a mais efetiva em produzir celulase. O substrato GU foi o mais efetivo na produção de
todas enzimas, empatando com AB na produção de LiP. Comparando-se a atividade
enzimática com a frutificação, pode-verificar que a produção de enzimas, independe da
capacidade de frutificação, pois mesmo cultivos que se mantiveram apenas na fase
anamórfica, sintetizaram níveis de enzimas comparáveis àqueles que exibiram a fase
teleomórfica.
Conclusão
Os substratos estudados se mostraram adequados para promover a miceliação,
havendo crescimento em quase 100% deles. Foi verificada relação entre a miceliação e
frutificação, de modo que os cultivos de maior crescimento micelial foram os que mais
produziram cogumelos (linhagens: 512, 521 e 532; substratos: GU, IM+GU, PM+TO, IM e
AB). Além disso, esse padrão de crescimento (tanto vegetativo, quanto reprodutivo) esteve
relacionado com o grau de parentesco das linhagens, aquelas do gênero Pleurotus spp foram
mais eficientes na miceliação e frutificação, do que aquelas pertencentes a outros gêneros. Por
outro lado, a produção de enzimas, não mostrou relação aparente com a velocidade de
miceliação ou a frutificação, pois mesmo cultivos que se mantiveram apenas na fase
anamórfica, sintetizaram níveis de enzimas comparáveis àqueles que exibiram a fase
teleomórfica. As linhagens 504 e 512 foram respectivamente as mais efetivas em produzir
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celulase e peroxidases; o substrato GU foi o mais efetivo na produção das enzimas,
empatando com AB na produção de LiP. Os dados obtidos são indicativos de que os
substratos estudados têm potencial para serem utilizados em bioprocessos para a obtenção dos
produtos microbianos em questão, merecendo aprofundamento nos estudos em direção à
otimização dos processos.
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18
10
8
6
Peso fresco (g)/ L de
531
504
512
521
532
4
2
0
¦ 521
¦ 532
¦ 512
16
14
substrato
18
16
14
12
12
10
8
6
4
2
PM+TO PM+TO
IM
SE +TO
+F
A+
IM
AB
+F
A
IM
+C
P
PA
+F
A
IM
CA
GU
0
AB
CA
+IM
IM
+G
U
PM
PM
+T
O
Cobertura Micelial(cm)
6
AB
AB
IM+GU
GU
GU
IM
IM
Substratos
Substratos
Figura 1 – Crescimento micelial de diferentes linhagens fúngicas
cultivadas em diferentes substratos. Medida tomada aos 27 dias de
incubação a 27o C.
Figura 2 – Produtividade de cogumelos originários de cultivos em diferentes substratos .
Tabela 1 – Atividade enzimática das diferentes linhagens cultivadas em diferentes substratos.
Linhagem
Enzima
Celulase
(U/g)
MnP
(U/g)
LiP
(U/g)
SXS 504
SXS 512
SXS 521
SXS 531
SXS 532
SXS 504
SXS 512
SXS 521
SXS 531
SXS 532
SXS 504
SXS 512
SXS 521
SXS 531
SXS 532
GU
IM
31,7
16,8
20,3
21813,3
17846,7
18851,1
7579,5
11,4
8,5
6,0
16,6
8922,1
17998,2
17524,3
8841,1
4305,9
7663,2
6379,8
3106,2
Substrato
AB
11,7
12,3
6,2
3,3
15154,3
27290,8
9448,8
11113,5
PM+TO
13,8
14,0
5,5
6880,9
5700,9
3817,9
3236,4
PA+FA
35,6
10,2
6,6
11,7
10,7
6176,2
4548,1
7217,1
12064,9
4369,9
3613,0
2431,9
3031,8
4394,2
2297,1
7
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