I SEMINÁRIO DE DIREITO PARA JORNALISTAS - DIA 31.08.00 A todos a minha boa noite. Gostaria de me apresentar, dizendo que auxilio o Doutor José Carlos D'Avila, hoje titular da Vara da Infância e da Juventude e que louvo a iniciativa deste Tribunal e da Associação dos Jornalistas. Acho que esta reunião, este encontro veio em um momento muito oportuno, porque essa questão do menor, especificamente, chama a atenção de toda a nossa sociedade. Inicialmente, gostaria de dizer aos senhores que esta questão não se esgota no Poder Judiciário. O próprio estatuto, cuja lei que o promulgou foi a de 8.069 de 13 de julho de 1990, completou agora seus dez anos, ela não dá especificamente ao Poder Judiciário essa incumbência de proteção do menor. Esta foi uma peculiaridade do estatuto, pois distribuiu essa incumbência a toda a comunidade, aos poderes em geral, a todos os encarregados, aos técnicos, enfim, aos órgãos governamentais. Todos nós estamos envolvidos com essa questão do menor. Tenham sempre em mente, senhores, que o intuito do legislador, quando assim o fez, pelo estatuto, foi o da proteção realmente integral do menor. Estes cidadãos foram tomados como pessoas ainda em desenvolvimento. Portanto, jamais podemos tentar responsabilizá-los como adultos maiores, muito embora o que eles praticam hoje seja verdadeiros atos de adultos irresponsáveis, enfim, infratores. Mas esta peculiaridade, este princípio básico não pode ser olvidado nem pelo julgador, nem por qualquer setor da sociedade. Nós nos perguntamos, muitas vezes, por que acontecem tantos casos de menores. Menores latrocidas, estupradores, homicidas, menores que, às vezes, possuem famílias estruturadas, senhores, mas estão no cometimento de seus atos infracionais, atos esses de natureza hedionda. Há poucos dias, houve uma notícia no DF-TV, de conhecimento geral, de que há uma superpopulação no CAJE. Realmente há uma superpopulação no CAJE. Mas por que isso tudo? E pergunto aos senhores: se um de nossos filhos - infelizmente não sabemos o dia de amanhã - estivesse envolvido em situações como estas, o que nós gostaríamos, como adultos maiores, pais, avós, irmãos, qual o tratamento que nós gostaríamos que fosse dado a esses adolescentes? Simplesmente encarcerá-los não é a solução, senhores. Com relação à inimputabilidade, hoje se cogita que esta idade seja reduzida a 16 anos, a meu ver, também esta não é a solução. Está devidamente comprovado que o encarceramento não barra a questão da violência, da criminalidade. O que está sendo hoje cogitado, e precisa ser repensado realmente, é que a estrutura social impele os nossos jovens a uma situação como essa. Ademais, senhores, com relação especificamente ao ato infracional, às políticas de atendimento. Então, o fato acontece, chega ao conhecimento do Poder Judiciário, o menor é encaminhado à Vara da Infância e da Juventude pela autoridade policial e aí o menor é ouvido pelo Ministério Público. O Ministério Público tem suas prerrogativas iniciais. Ele pode sugerir o arquivamento do feito. Não sei se é do conhecimento dos senhores, mas o Ministério Público tem essa iniciativa da ação e isso também serve para o menor. Então o Ministério Público é o dono do writ. O menor chega à Vara da Infância, é atendido, ouvido pelo Ministério Público, o Ministério Público terá três opções: Poderá sugerir o arquivamento do processo, dizendo ou, enfim, sugerindo ao juiz que não há requisitos para o ajuizamento de uma ação e, se assim o juiz entender, homologará essa situação de arquivamento. Se discordar, deverá submeter o feito ao Procurador-Geral, que, não entendendo ou concordando com a promoção de arquivamento, outra alternativa não resta ao julgador senão a de homologar esse arquivamento. Também há a possibilidade de que ele conceda a remissão judicial a esse menor. Com essa remissão judicial, ele pode sugerir a aplicação de uma medida sócio-educativa a esse menor que não seja a de semiliberdade ou de internação, as consideradas mais graves. E assim, o julgador também poderá, concordando com a sugestão do Ministério Público, aplicar ao menor esse tipo de medida sócioeducativa: liberdade assistida, advertência, prestação de serviço à comunidade. Situações essas onde são consideradas tanto a gravidade da infração como a personalidade do adolescente e também a situação em que ele se encontra, ou seja, se está ingressado na escola, se tem alguma profissionalização... Coisas dessa natureza são todas verificadas no momento. Caso, então, o Ministério Público entenda que o ato infracional requer uma averiguação mais profunda do Poder Judiciário, então ele representa contra aquele adolescente. Inicia-se uma ação pública, na qual será, ao final, por uma sentença, aplicada uma medida sócio-educativa a esse menor. Dessas medidas sócio-educativas, senhores, a mais grave é a de internação, que é exatamente a cumprida no CAJE. Então, menores sentenciados com internação são alocados nas celas, enfim, nos quartos do CAJE e por lá permanecerão pelo período máximo de três anos. É o que dita o estatuto. Também há casos em que os menores são para lá direcionados, como disse o Desembargador Edson Alfredo Smaniotto, como um estilo de prisão cautelar, a internação provisória. Então, se é verificado pelo julgador, diante de uma representação, que este menor corre inclusive riscos da sua própria integridade física, esse menor é internado provisoriamente no CAJE pelo período de 45 dias e, neste período, há de ser processado, ou seja, o prazo máximo para o término do procedimento do menor internado provisoriamente é o de 45 dias. Não findo o processo neste período, o julgador deve por em liberdade este menor. Com relação ao ato infracional, há que ser relevar aqui, senhores, que esta função não compete apenas aos juízes. Nós temos que questionar hoje que implantação das estruturas que alocam esses menores, (CAJE, unidades de semiliberdade, que são verdadeiras casas nas comunidades, essas alocações, inclusive o centro de liberdade assistida, onde funcionam técnicos, psicólogos, pessoas interessadas em direcionar os menores às escolas, a uma profissionalização), tudo isso, é incumbência do Poder Público. É o Governo que deve providenciar essas estruturas, senhores. Infelizmente, não é isso que nós temos visto. Nossas estruturas, infelizmente, não tem condições hoje de reabilitar, ou seja, de dar integral cumprimento ao que dita a lei do menor. Então o Ministério Público, como fiscal da lei, já ajuizou duas ações civis públicas contra o governo, exatamente pedindo, ou seja, com essa obrigação de fazer. Obrigação essa de construir ou dar o suporte necessário para que as sentenças, as medidas sejam possíveis, ou seja, estejam adequadas àquilo que dita o Estatuto. O que vemos hoje são unidades sem liberdade, com goteiras, colchões, inaptos para qualquer pessoa, CAJE com péssimas estruturas, superlotação, infelizmente, passível, a qualquer momento, de uma nova rebelião. Então, há que se questionar muito essa situação hoje. Na Vara da Infância contamos com 10 (dez) mil processos atualmente, dentre eles considerados os atos infracionais , que são a maior parte deles. Outra questão de competência exclusiva da Vara da Infância é a adoção. A adoção é outra questão que hoje nos eleva muito ao pensamento, enfim, é a oportunidade que a criança tem, senhores, de estar alocada em famílias substitutas, quando a criação no seio da família biológica se torna impossível por diversos fatores: abandono, maus-tratos, pais que foram destituídos do pátrio poder por abuso sexual ou, enfim, práticas hediondas contra os seus próprios filhos. Consta,, na Vara da Infância, um cadastro de interessados na adoção. Funciona como uma lista prévia que é examinada pelo julgador, pelo juiz, passa pelo crivo do Ministério Público para a verificação da habilitação para adoção de uma criança. Constam certos requisitos, documentos que precisam ser juntados e submetidos à apreciação do julgador. Se habilitados, receberão um lugar nessa lista de adoção. Hoje me parece que constam 250 (duzentos e cinqüenta) casais interessados. A partir daí, as crianças nessas condições: abandonadas, maltratadas, enfim, são postas à visitação desses interessados. Havendo essa aceitação mútua, adentra-se na fase processual para a adoção. Uma ação deve ser ajuizada para que o juiz passe por meio da verificação, do estudo técnico, da oitiva das partes, enfim, dos pais, para verificar se essa é a melhor solução para a criança. Muitos conflitos, nessa área de adoção, existem. Mães que deixam os seus filhos e depois se arrependem do que fizeram, mas a criança já tem 10 (dez), 5 (cinco) anos e vive com os interessados ou com aquelas pessoas para as quais ela entregou a sua criança. Então, aí entra o problema do julgador, do juiz. É um verdadeiro dilema, senhores, embora a lei preveja que a criança tenha o direito de ser criada no seio de sua família biológica. Temos que ver também o interesse dessa criança hoje. Será que a melhor solução seria determinar o retorno dessa criança a pais e mães com quem ela já não tem contato há muitos anos? Fica essa questão, e os juízes, por meio de toda a dilação probatória possível, vai verificar, ao final, qual será a melhor solução dentro de seu convencimento, das provas, logicamente, que foram produzidas, verificará qual é a melhor solução para essa criança. Infelizmente o tempo urge, teria também várias outras coisas para abordar com os senhores, mas ainda temos um colega para ser ouvido. Agradeço a atenção e me coloco à disposição dos senhores para qualquer pergunta ou questionamento. Obrigada.