NOTA EXPLICATIVA Tendo em vista a edição das Instruções Normativas nº 18 e 114/2014 pelo Ministério do Trabalho e Emprego, e também a expedição da Nota Técnica nº 256/2014/DEFIT/SIT, a Associação Brasileira do Trabalho Temporário – ASSERTTEM, vem pelo presente apresentar sua nota explicativa sobre os termos equivocados apresentados pelo MTE nos documentos supramencionados. DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 114/2014 Esta instrução normativa estabelece diretrizes e disciplina a fiscalização do trabalho temporário regido pela Lei nº 6.019/74. De início, apesar de colocar fim à discussão sobre a possibilidade de contratação de trabalho temporário para atender demandas sazonais, a norma editada pelo MTE, em seu artigo 2º, § 2º, veda a utilização deste regime de contratação de mão de obra para os casos de acréscimos de serviços comuns do ramo de negócio da utilizadora, bem como os decorrentes do crescimento da empresa, da expansão de seus negócios ou da abertura de filiais, entendendo que estes fazem parte do risco do empreendimento. Tal proibição foi feita de forma imprecisa. Não diz a IN o que considera ‘aumento excepcional’ e ‘aumento expressivo e significativo’. Também não conceitua o que é ‘acréscimo comum’ nem estabelece a sua diferença do acréscimo excepcional e do expressivo e significativo. Também não define o que é risco do empreendimento. Da forma como encontra-se redigida, a regra deixa ampla margem para o fiscal fazer a interpretação, o que não corresponde à sua atividade de apenas aplicar a lei. Para aplicála, o fiscal necessita do conceito. Certamente cada fiscal dará seu próprio e pessoal entendimento, levando à aplicação da IN de forma diferente em todo o país e de acordo com o pensamento de cada agente público da fiscalização, gerando equívocos e imposição irregular de penalidades. No entendimento da ASSERTTEM, esse parágrafo deveria ter sido revogado, ou apresentar uma redação mais clara e com conceitos concretos. No Parágrafo Único do art. 3º, a Instrução Normativa 114/2014 estabelece que a empresa tomadora ou cliente pode ser responsabilizada pelo vínculo empregatício com o trabalhador temporário em caso de irregularidade na locação de mão de obra, conforme disposto no art. 9º da CLT. Ocorre que, como se sabe, a CLT não se aplica ao trabalho temporário. A Lei Especial (Lei 6.019/74) derroga a Lei Geral (CLT). É conceito básico de Direito. Assim, só se aplicaria a CLT ao trabalho temporário se em algum momento a Lei 6.019/74 nos remetesse à Norma Consolidada, o que não faz. Não obstante, nos termos do art 2º da Lei 7.855/89, as infrações à Lei 6.019/74 serão punidas com multa de 160 UFIR, dobradas no caso de reincidência. Esta é a multa do trabalho temporário. Esse parágrafo deveria ter sido revogado por contrariar o espírito da Lei do Trabalho Temporário. E mais, apenas o juiz do trabalho tem o poder de descaracterizar o trabalho temporário e aplicar eventual penalidade à Agência Privada de Trabalho Temporário e/ou à utilizadora. Conforme já dissemos, a tarefa do Agente Fiscal do Trabalho é única e exclusivamente aplicar a lei, sem margem para interpretá-la. Outro ponto que merece destaque e correção é o previsto no § 3º do art. 4º, que proíbe o recrutamento e a seleção de trabalhadores temporários por parte da própria utilizadora da mão de obra. Proibir a utilizadora de “indicar” aqueles trabalhadores que julga melhor qualificado para o trabalho é fazer distinção onde a lei não o faz. A Lei 6.019/74 e seu decreto regulamentador não trazem esta proibição. Logo, a IN não pode ser contrária à lei. Ademais, o que a Súmula 331 do TST proíbe é que a intermediação de mão de obra que não seja realizada através de Agência devidamente registrada no MTE, isto é, a contratação direta de trabalhadores temporários pela empresa utilizadora, jamais a indicação daqueles trabalhadores que entende serem melhores qualificados para o desempenho da função. Portanto, esse parágrafo extrapolou os conceitos trazidos pela Lei do Trabalho Temporário e por violar o princípio constitucional da legalidade previsto no artigo 5º, inciso II da Constituição Federal (“II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”), deve ser considerado inconstitucional. Já o artigo 5º diz que é lícito à empresa tomadora ou cliente exercer, durante a vigência do contrato firmado com a empresa de trabalho temporário, o poder diretivo sobre o trabalhador colocado à sua disposição, inclusive em tarefas vinculadas à sua atividade-fim. Para aqueles que conhecem a dinâmica do trabalho temporário e, levando em conta o princípio da primazia da realidade que vige no Direito do Trabalho, a empresa utilizadora da mão de obra temporária não é responsável somente pelo poder diretivo, mas também pelos poderes técnico e disciplinar sobre o empregado temporário, conforme já constava na Instrução Normativa nº 03, de 01/09/1997. A Lei não impõe, quanto a estes aspectos, qualquer obrigação à Agência Privada de Trabalho Temporário. Não existe qualquer ingerência desta na empresa utilizadora. Assim, horário de trabalho, serviços a prestar dentro da qualificação do trabalhador, horário de almoço, tudo é administrado pela empresa utilizadora. Esta é a única forma viável para que o trabalhador temporário possa executar seus serviços. Teria sido prudente que o Ministério do Trabalho tivesse alterado este artigo. Oportunidades não faltaram. A correta redação é aquela que já constava da Instrução Normativa nº 03, de 01/09/1997, qual seja: 1 - As relações entre as empresas de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente são registradas pela lei civil; 2 A empresa de trabalho temporário transfere durante a vigência do contrato de trabalho o poder diretivo sobre seus assalariados sobre à empresa tomadora ou cliente; 3 - O trabalhador temporário pode atuar tanto na atividade-meio, quanto na atividade-fim da empresa tomadora ou cliente; 4 - A empresa tomadora ou cliente exerce, durante a vigência do contrato firmado com a empresa de trabalho temporário, o poder disciplinar, técnico e diretivo sobre o assalariado colocado a sua disposição. Imiscuir-se nesta celeuma sobre atividade meio e atividade fim foi um equívoco imensurável cometido pelo MTE, já que esta definição ainda está pendente de análise pelo Supremo Tribunal Federal, não tendo a doutrina sido capaz de fazer tal distinção. E mais, este conceito está ligado à terceirização da qual o trabalho temporário muito se diferencia. Os enganos cometidos pelo MTE prosseguem quando estabelece no artigo 6º que somente trabalhadores devidamente qualificados podem ser contratados na modalidade de contrato temporário. Distorce a própria lei ao conceituar o trabalhador devidamente qualificado como aquele tecnicamente apto a realizar as tarefas para as quais é contratado. O trabalho temporário é a maior oportunidade que existe para jovens em situação de primeiro emprego. Nesta condição, estes trabalhadores não tem qualificação. Ao contrário, buscam o trabalho temporário justamente para adquirirem a experiência exigida pelo mercado de trabalho. O dispositivo, face seu conceito amplo, fecha essa porta de entrada do mercado de trabalho aos jovens, fazendo uma distinção onde a lei não o faz, incorrendo em flagrante inconstitucionalidade ao afrontar o Princípio da Isonomia (artigo 5º da Constituição Federal). Destarte, para atender ao fim social da norma, deveria ter dado ao texto melhor redação, apesar da doutrina entender de forma diversa da regra estabelecida pelo MTE. Isso porque a expressão “tecnicamente” poder gerar várias interpretações diferentes. A Lei 6.019/74, em seu artigo 4º, determina que o trabalho temporário será prestado por um trabalhador devidamente qualificado. Logo, ele deve estar apto a realizar as tarefas e nem sempre “tecnicamente apto”, face a exigência do grau de instrução conforme a tarefa a ser realizada. Interpretação mais simples e diversa é feita por Vólia Bomfim Cassar1: “Não há necessidade de o trabalhador temporário ser especializado, como pretendeu o Decreto nº 73.841/74, mas tão somente que seja devidamente 1 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 9ª ed. São Paulo: Método, 2014. P. 496. qualificado no contrato (brasileiro, caso, portador da CTPS...), na forma prevista na Lei nº 6.019/74. O decreto extravasou os limites da lei.” Se, na lição da eminente jurista, o decreto extravasou os limites da lei, a Instrução Normativa nº 114/2014 foi ainda mais além, incorrendo em ilegalidade, senão em verdadeira inconstitucionalidade por afronta ao Princípio da Isonomia insculpido do artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Ao que parece, a redação da Instrução Normativa carece de melhor técnica de redação e principalmente melhores conhecimentos do Direito do Trabalho, em especial do Trabalho Temporário. O Ministério do Trabalho confunde institutos simples e muitos diferentes como a rescisão do contrato (forma de extinção anormal), também chamada de resilição, e a extinção normal do contrato por implemento do prazo ou de condição resolutiva. Isto é o que podemos verificar da leitura do artigo 8º (A rescisão por término do contrato de trabalho temporário acarreta o pagamento de todas as verbas rescisórias, calculadas proporcionalmente à duração do contrato e conforme o tipo de rescisão efetuada.). Quando a IN diz rescisão por término do contrato de trabalho temporário, na verdade quer dizer extinção normal do contrato. E, neste caso, não cabe qualquer indenização, apenas o pagamento das verbas rescisórias como 13º proporcional, férias proporcionais, etc. A confusão e o desconhecimento ficam ainda mais claros quando analisamos o disposto no § 1º do citado artigo 8º. Em sua redação original, o dispositivo previa o pagamento da indenização prevista no artigo 479 da CLT. Ocorre que, a jurisprudência pacífica do TST é no sentido de que a CLT não se aplica ao Trabalho Temporário e, portanto, a indenização do dispositivo consolidado não é devida em caso de rescisão de contrato de trabalho temporário. O Ministério do Trabalho e Emprego, em atitude rara, reconheceu o erro e revogou esta parte do artigo, olvidando-se das demais indenizações nele previstas equivocadamente. No que tange à indenização do artigo 12, alínea “f”, da Lei nº 6.019/74, doutrina e jurisprudência são uníssonas no sentido de sua revogação pela Constituição Federal de 1988 que institui o regime único do FGTS. Vejamos: “RECURSO ORDINÁRIO DAS RECLAMADAS. INDENIZAÇAO POR TÉRMINO DO CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. INDEVIDA. Derrogada a norma contida na alínea f do art. 12 da Lei 6.019/74, pela nova ordem constitucional vigente a partir de 1988, não há mais falar em indenização de 1/12 sobre o pagamento recebido. Apelo das reclamadas que se acolhe. RECURSO ADESIVO DO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. Decisões do STF não tornam obrigatório o entendimento de que o adicional de insalubridade não pode tomar como base de incidência o salário mínimo vigente, ainda mais quando conflitantes. O art. 192 da CLT, em plena vigência, indica o salário mínimo como base de cálculo do adicional de insalubridade e os incisos IV e XXIII do art. 7º da Constituição não afastam sua aplicação. Orientação jurisprudencial sedimentada no verbete nº 2 da Seção Especializada em Dissídios Individuais do TST. Recurso do reclamante a que nega-se provimento.” (TRT-4 - RO: 859002219995040301 RS 0085900-22.1999.5.04.0301, Relator: JURACI GALVAO JÚNIOR, Data de Julgamento: 25/09/2001, 1ª Vara do Trabalho de Novo Hamburgo) “CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. INDENIZAÇÃO PREVISTA NO ART. 12, F, DA LEI 6.019/74. Com o advento da Lei 8.036/90 não subsiste o direito à indenização prevista no art. 12, f, da Lei nº 6.019/74, na medida em que o FGTS se tornou, a partir da Constituição Federal de 1988, regime jurídico único e compulsório, substituindo 023770/2009, aquela indenização.” Relator: LUIZ (TRT-15 ANTONIO - RO: LAZARIM, 23770 SP Data de Publicação: 30/04/2009) “CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. LEI Nº 6.019/74. Na hipótese de intermediação de trabalho, na modalidade temporário, a prestação de serviços exige, para sua validade e eficácia, a observância estrita dos requisitos fixados pela Lei nº 6.019/74. Merecem destaque o prazo de contratação, relativamente ao mesmo empregado, não superior a três meses, e o objetivo específico de atender à necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços. A legislação afeta à matéria foi recepcionada pela atual Constituição Federal. A exceção que se pode referir diz respeito à letra f do art. 12 da Lei nº 6.019/74, entendendo-se que a indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do contrato foi substituída pela inscrição irrestrita no FGTS. Quanto ao aviso prévio, a legislação em comento não prevê o instituto dentre os direitos assegurados ao 768005719985040922 trabalhador RS temporário.”(TRT-4 0076800-57.1998.5.04.0922, - RO: Relator: JURACI GALVAO JÚNIOR, Data de Julgamento: 13/12/2000, 2ª Vara do Trabalho de Rio Grande (d)) No que se refere à multa rescisória do FGTS, o entendimento dos Tribunais do Trabalho é de que não se aplica ao trabalho temporário. “FGTS - INDENIZAÇÃO - INCOMPATIBILIDADE. Uma vez paga a indenização prevista na Lei 6019/74, art. 12, alínea f, não há que se falar em levantamento do FGTS acrescido de 40%, pois tais institutos são substitutos entre si: ou um ou outro.” (TRT-3 - RO: 351191 3511/91, Relator: Antonio Miranda de Mendonca, Primeira Turma, Data de Publicação: 05/06/1992 04/06/1992. DJMG . Boletim: Não.) Tal inaplicabilidade é cristalina ao lermos o artigo 9º do Decreto 99.684/90, que regulamenta o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço: “Art. 9º - Ocorrendo despedida sem justa causa, ainda que indireta, com culpa recíproca por força maior ou extinção normal do contrato de trabalho a termo, inclusive a do trabalhador temporário, deverá o empregador depositar, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e, ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais cabíveis.” Verifica-se que o supracitado artigo é expresso quanto ao depósito do FGTS na conta do empregado em caso de despedida sem justa causa. Entretanto, o dispositivo que trata da multa, é o §1º do artigo 9º, que é silente quanto à sua aplicação ao contrato de trabalho temporário, in verbis: “§ 1º - No caso de despedida sem justa causa, ainda que indireta, o empregador depositará na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros, não sendo permitida, para este fim a dedução dos saques ocorridos.” Posto isto, conclui-se ser indevida a aplicação da multa sobre o saldo do FGTS como pretende o MTE. Erro grosseiro e grave ocorreu na redação do § 2º do artigo 8º, da Instrução Normativa nº 114/2014, que determina a obrigatoriedade de constar a data de término do contrato de trabalho temporário. Trata-se de confusão clássica com a modalidade de contrato de trabalho por prazo determinado prevista no artigo 443 e seguintes da CLT. A ASSERTTEM tem posição firme e fundamentada de que o contrato de trabalho temporário é modalidade de contrato a termo, mas não com prazo determinado e sim LIMITADO. O artigo 10, da Lei nº 6.019/74 é claro neste sentido: “O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente, com relação a um mesmo empregado, não poderá exceder de três meses, salvo autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, segundo instruções a serem baixadas pelo Departamento Nacional de Mão de Obra”. (G.N.) Podemos verificar que o contrato de trabalho temporário não poderá exceder de três meses, ou seja, poderá durar ATÉ este limite. Logo, tem prazo limitado, já que pode terminar antes deste prazo, pois está vinculado ao motivo justificador, mas nunca além deste prazo, salvo autorização expressa do Ministério do Trabalho e Emprego. Já o contrato por prazo determinado, contido no artigo 443 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho, tem sua vigência a um termo prefixado ou à execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada, não podendo ser estipulado por mais de 2 (dois) anos. Logo, comparando-se as duas modalidades de contrato de trabalho, podemos extrair que o contrato de trabalho temporário não se confunde com o contrato por prazo determinado. Vejamos: 1 – o contrato de trabalho temporário tem prazo limitado e de curta duração; o contrato de trabalho com prazo determinado tem termo prefixado com duração de dois anos; 2 – o contrato de trabalho temporário só pode ser prorrogado com autorização do Ministério do Trabalho e Emprego; o contrato de trabalho por prazo determinado independe de autorização para prorrogação; 3 – o contrato de trabalho temporário não tem data pré-fixada para seu termo, encontrado seu limite temporal na Lei 6.019/74 e no motivo justificador; já o contrato com prazo determinado deve trazer, obrigatoriamente, a data de início e término do mesmo; 4 – o contrato de trabalho temporário visa atender demandas de pequena duração (substituição de pessoal regular e permanente) ou estranha à ordem normal do serviço (acréscimo extraordinário); o contrato por prazo determinado tem por finalidade execução de serviços especificados (obra certa) ou a realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada (se é suscetível de previsão não pode ser extraordinário); 5 - por fim, o contrato por prazo determinado está previsto na CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 e o contrato de trabalho temporário está regulamentado pela Lei nº 6.019, de 03 de janeiro de 1974. Se fosse a intenção do legislador criar uma nova modalidade de contrato por prazo determinado, promoveria alterações na CLT e não o faria através de norma específica. Mesmo aqueles que defendem que o contrato de trabalho temporário é modalidade de contrato por prazo determinado, não entendem ser obrigatória a existência de data de término no mesmo. Esta é a lição de Maurício Godinho Delgado2, ipses literis: 2 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13ª ed. São Paulo: Ltr, 2014. P. 558-560. “Termo, como se sabe, ‘é o dia, no qual tem de começar ou de extinguirse a eficácia de um negocio jurídico’. A doutrina classifica o termo em certo e incerto. Não há contradição nessa tipologia. O termo sempre será certo — quanto a sua ocorrência (distingue-se, assim, da condição, que e incerta quanto a sua própria ocorrência: art. 114, CCB/1916; art. 121, CCB/2002). Mas pode haver imprecisão quanto à efetiva data de verificação do termo; assim, a diferenciação quanto à precisão temporal do termo e que justifica a tipologia ora examinada. Termo certo (certus an, certus quando) é aquele cuja exata incidência já esta prefixada no tempo, sabendo-se, antecipadamente, sua precisa verificação cronológica. É exemplo dessa modalidade o chamado termo fixo, isto e, o termo indicado através de data especificada (31 de maio do proximo ano, por exemplo). Termo incerto (certus an, incertus quando) é aquele cuja exata incidência ainda não esta prefixada no tempo, não se sabendo, antecipadamente, sua precisa verificação cronológica, embora seja segura sua ocorrência em lapso futuro firmemente previsível. É exemplo dessa modalidade o chamado termo fixado em vista da ocorrência de um acontecimento suscetível de previsão aproximada (final da temporada de verão em região praieira, por exemplo). A normatividade justrabalhista estipula três meios de fixação do termo final do contrato a prazo (art. 443, § 1a, CLT): mediante termo fixo (termo certo) — data prefixada — (trata-se, pois, de meio submetido a critério estritamente cronológico); mediante termo previsto em função da execução de serviços previamente especificados (termo incerto); mediante termo previsto em função da realização de determinado acontecimento suscetível de previsão aproximada (termo incerto). A primeira modalidade de estipulação de termo (critério estritamente cronológico) é utilizada em contratos de experiência. Embora a lei seja lacônica com respeito a eleição exclusiva desse tipo de termo para os contratos a contento (arts. 443, § 2a, “c”, e 445, paragrafo único, CLT), a jurisprudência tem se mostrado firme na direção dessa exclusividade. E é sensata tal interpretação normativa. É que o franqueamento largo dos contratos de experiência — admissíveis para qualquer tipo de trabalhador empregaticiamente contratado, como visto — toma relevante a garantia de transparência no concernente a modalidade de contrato efetivada entre as partes. Além disso, a aprovação ou desaprovação na experiência jamais teria caráter de efetivo termo, já que e fato incerto quanto a sua própria ocorrência (aproximando-se mais de uma condição, portanto). Nesse contexto, não poderia o final do contrato ser fixado em função de serviço especificado (experiência não é serviço), nem em função de acontecimento suscetível de previsão aproximada (não se sabe ao certo se a experiência terá êxito ou não). Logo, não somente por necessidade de transparência inequívoca acerca de cláusula contratual importante e restritiva, como também por exclusão logica das duas outras modalidades de fixação de termo final estipuladas no § 1ª do art. 443 da CLT e que se tem como inexorável a só utilização de termo cronológico nos contratos de prova (termo certo). Registre-se que, evidentemente, o termo estritamente cronológico também pode ser utilizado em outros tipos de contrato a prazo, sejam contratos regulados por normas especiais (atletas profissionais, artistas, etc.), sejam contratos a prazo pactuados nas duas outras hipóteses mencionadas pela CLT (serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo e atividades empresariais de caráter transitório). Nestes dois últimos casos as partes podem substituir a imprecisão da data de incidência do termo por uma data certa, que o transforme licitamente em termo certo. A segunda modalidade de estipulação de termo (execução de serviços especificados) e utilizada em distintos contratos a prazo. Trata-se de uma modalidade que se funda no esgotamento do objeto central do contrato, sob a ótica do empregador, isto é, a prestação de fazer pactuada. Tanto pode concretizar-se em uma obra contratada, como em um serviço pactuado. O essencial e que seja especificado o serviço ou a obra, escapando a indeterminação do objeto da prestação de fazer que tende a caracterizar os contratos de duração incerta. A terceira modalidade de estipulação de termo (realização de determinado acontecimento suscetível de previsão aproximada) também é utilizada em distintos contratos a prazo. Trata-se de modalidade que não se funda em uma precisa obra ou serviço pactuado, podendo a obrigação objeto do contrato assumir a mesma indeterminação que tende a possuir nos contratos por tempo incerto. Contudo, sua transitoriedade emerge em face das circunstancias envolventes a contratação, justificadoras da pactuarão a prazo, nos termos da CLT. E o que se passa, por exemplo, nos contratos de safra (o final da safra e suscetível de previsão aproximada).” Logo, conclui-se que, pela natureza do contrato de trabalho temporário, a fixação de termo final é indevida. Registre-se, neste mesmo sentido, a doutrina de Vólia Bomfim Cassar.3 DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 18/2014 Esta instrução normativa repete alguns erros cometidos na IN 114/2014. Destacamos os seguintes: 1 – inexistência de definição de ‘aumento excepcional’, ‘aumento expressivo e significativo’, ‘acréscimo comum’, ‘risco do empreendimento’ e não diferencia acréscimo comum do acréscimo excepcional e de expressivo e significativo. Repetimos que, da forma como encontra-se redigida, a regra estabelece ampla margem para o fiscal fazer tal interpretação. Logo, este dispositivo deveria ter sido revogado, a exemplo do seu equivalente na IN 114/2014. 3 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 9ª ed. São Paulo: Método, 2014. P. 572. 2 – obrigatoriedade de fixação de data de término do contrato de trabalho temporário que, como visto acima, não se coaduna com este regime de contratação de trabalhadores. Aqui cabe, ainda, fazer uma ressalva. O artigo 25 da Instrução Normativa nº 18/2014 proíbe a celebração de contrato de trabalho temporário sujeito a condição para seu encerramento. Trata-se de mais um equívoco cometido pelo Ministério do Trabalho e Emprego. A condição resolutiva é da essência do contrato de trabalho temporário, vez que este só poderá existir caso a empresa utilizadora possua uma necessidade temporária de substituição de pessoal regular e permanente ou um acréscimo extraordinário de serviços. A pactuação de contrato de trabalho temporário sem que exista uma destas duas hipóteses legais de contratação, torna-o nulo de pleno direito, consistindo em burla à celebração de contrato de trabalho celetista. E mais, tão logo deixe de existir a hipótese legal de contratação de trabalho temporário, a manutenção do trabalhador temporário na empresa utilizadora é ilegal. Prontamente, podemos concluir que a hipótese legal de contratação de trabalho temporário é também condição resolutiva do mesmo. Assim, ao vedar a celebração do contrato de trabalho temporário com condição resolutiva, o MTE imiscuiu-se em atividade plenamente legislativa, o que afronta o princípio basilar da democracia da separação dos poderes. Não obstante, a doutrina justrabalhista, bem como a jurisprudência dos tribunais do trabalho são unânimes em admitir a condição resolutiva no contrato de trabalho. Trazemos novamente à baila a lição do Ministro do TST, Maurício Godinho Delgado4. 4 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13ª ed. São Paulo: Ltr, 2014. P. 537-538 “Elementos acidentais do contrato são aqueles que, embora circunstanciais e episódicos no contexto dos pactos celebrados, alteramlhes significativamente a estrutura e efeitos, caso inseridos em seu conteúdo. Os elementos acidentais classicamente enfatizados pela doutrina civilista são o termo e a condição. No Direito do Trabalho também o termo e a condição surgem como elementos acidentais do contrato empregatício, já que tem frequência francamente circunstancial e episódica no conjunto dos contratos celebrados. A existência de termo (certo ou incerto) nos contratos de trabalho e situação excetiva, viável apenas se configuradas hipóteses legais tipificadas e expressas (art. 443 da CLT ou Lei n. 9.601/98, por exemplo). A regra geral incidente (e presumida) no cotidiano justrabalhista reporta-se aos contratos sem termo final prefixado. O tipo contratual dos pactos por tempo indeterminado considera-se presumido, caso não comprovada a licita inserção de termo final no contrato em exame (Sumula 212 do TST). Mais rara ainda e a presença da condição (pelo menos a expressa) nos contratos empregatícios. A CLT prevê uma hipótese (extremamente incomum) de condição resolutiva expressa em contrato de trabalho: tratase do empregado substituto de trabalhador afastado por razoes previdenciárias e que tenha especificada em seu pacto empregatício clausula de rompimento contratual automático em face do simples retorno do titular do cargo (art. 475, § 2-, da CLT). Registre-se, ademais, poder-se considerar revogado o referido preceito, tacitamente, pela Constituição (art. 7,1, CF/88), uma vez que a indenização ali referida e expressão que no ramo justrabalhista não pode sofrer interpretação ampliativa. Pode-se ponderar que a condição resolutiva tácita comparece com maior frequência do que a expressa no cotidiano juslaboral. Ilustrativamente, ela estaria implicitamente vinculada a uma ou outra parcela contratual cuja percepção possa frustar-se em face da modalidade de ruptura do contrato empregatício correspondente (por exemplo, 13º salario proporcional em dispensas por justa causa). Poder-se-ia também enxergar uma condição resolutiva implícita nos contratos por tempo indeterminado, hábil a subordinar a extinção do pacto contratual a evento futuro e incerto (por exemplo, a vontade de uma das partes: resilição unilateral; a vontade de ambas as partes: resilição bilateral ou distrato; a inadimplência contratual culposa de uma das partes ou de ambas: resolução contratual; a decretação de nulidade do pacto: rescisão).” Logo, proibir que conste no contrato de trabalho temporário condição resolutiva que é de sua própria essência é ilegal. Por fim, coroando todas as ilegalidades cometidas na edição das multicitadas INs, o Ministério do Trabalho e Emprego incorreu na mais grave de todas elas, a inconstitucionalidade. Isto porque a Constituição Federal, em seu artigo 87, Parágrafo Único, inciso II, estabelece que a competência para expedir instruções normativas é de Ministro de Estado. Entretanto, desrespeitando o preceito constitucional, as normas expedidas pelo MTE são assinadas pelos Secretários de Inspeção do Trabalho e de Relações do Trabalho, com fundamento no Decreto nº 5.063/2004 e na Portaria 483/2004, que sequer contém delegação de poderes para tal fim. Sem qualquer fundamento legal, as INs ainda revogam a Instrução Normativa nº 3/1997, esta sim assinada por autoridade competente, qual seja, o Ministro do Trabalho e Emprego à época. Por todo o exposto, concluímos que, além de ilegais, já que afrontam diretamente a Lei nº 6.019/74, as Instruções Normativas editadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego contém inconstitucionalidades, sendo a mais grave delas o vício de competência em sua expedição, que desafia Ação Direta de Inconstitucionalidade. Diante de todos estes defeitos apresentados pelas Instruções Normativas, a ASSERTTEM está propondo medidas judiciais cabíveis, com a finalidade de declarálas inválidas, garantindo maior segurança jurídica para o segmento do Trabalho Temporário. Ademais, o Departamento Jurídico da ASSERTTEM encontra-se à disposição para esclarecimentos necessários, por e-mail [email protected] São Paulo, 18 de dezembro de 2014. Marcos Abreu Diretor Jurídico da ASSERTTEM “Trabalho Temporário não é Terceirização”