16, 17 e 18 de Julho de 2015
Instituto de Ciências Sociais (ICS-UL)
Duarte Machado Sobral1
Jorge Baptista e Silva2
Isabel Loupa Ramos3
Povoamento neorural em Portugal Continental - oportunidades e ameaças para o
planeamento do território
Resumo
No espaço rural contemporâneo emergem novas formas de ocupação e utilização do
solo que configuram um processo de transformação física, funcional e simbólica deste
território. Neste contexto de transformação debate-se a vocação habitacional do espaço
rural associada a um novo movimento social de retorno ao campo (Halfacree 2006)
enquadrado na anti-urbanização (Mitchel 2004), que procura desenvolver modelos
multifuncionais de ocupação e utilização do solo rústico — associados a novos estilos de
vida e a anseios por contacto com a natureza, vivência comunitária e soberania
alimentar — configurando um espectro de propostas diversas, mais ou menos arrojadas,
para o aprofundamento da sustentabilidade.
1
Universidade de Lisboa, Instituto Superior Técnico, Núcleo de Urbanismo e Ambiente – CESUR
2
Universidade de Lisboa, Instituto Superior Técnico, Núcleo de Urbanismo e Ambiente – CESUR
3
Universidade de Lisboa, Instituto Superior Técnico, Núcleo de Urbanismo e Ambiente – CESUR
A incidência territorial e a diversidade das iniciativas de retorno ao campo em Portugal
continental são o objecto da presente comunicação, tendo por base os trabalhos de
Halfacree (2007). Povoamento neorural foi o termo escolhido para designar a expressão
territorial deste movimento de retorno ao campo, uma dinâmica emergente que
interessa conhecer e acompanhar na perspectiva do planeamento e da gestão
territorial, de forma a potenciar os seus contributos para a regeneração e
desenvolvimento do espaço rural, e prevenir ameaças e riscos que possa representar.
A comunicação apresenta os resultados de uma investigação exploratória ao
povoamento neorural em Portugal continental assente em dados empíricos, uma vez
que se trata da primeira abordagem extensiva a esta dinâmica na perspectiva do
planeamento e gestão territorial.
Apresenta-se um mapeamento extensivo das iniciativas neorurais em Portugal
continental e uma classificação em tipologias com base em informação recolhida na
internet, através de redes e portais relacionados com este movimento social que
ofereceram uma primeira via de acesso às iniciativas implantadas no território. Esta
metodologia designada por cyber-mapeamento procurou mapear e caracterizar
exemplos de ‘ruralidades radicais’ (Halfacree 2007) e permitiu reunir uma amostra de
100 casos, revelando padrões geográficos claros em Portugal continental e uma forte
presença de populações estrangeiras. As representações e práticas dos conceitos de
Ecologia, Economia e Comunidade na amostra foram classificadas através de uma
análise de conteúdos aos websites destas iniciativas e, juntamente com dados
quantitativos disponibilizados nas mesmas fontes, foi possível, através de uma análise
de clusters, distinguir quatro tipologias de povoamento neorural.
A caracterização destas tipologias foi testada e enriquecida através de um inquérito no
terreno a quatro casos de estudo na região Sudoeste, com base em observação directa
e participante e entrevistas semi-estruturadas.
A relação dos neorurais com a administração territorial foi um dos aspectos explorados
nas entrevistas, que envolveram também técnicos superiores de duas câmaras
municipais. Os resultados revelam o reconhecimento de oportunidades e ameaças desta
dinâmica social para o planeamento do território no quadro legislativo em vigor. As
tensões existentes entre os actores — neorurais e administração territorial — apelam a
uma mudança de comportamentos e práticas de ambas as partes e a um
aprofundamento do seu envolvimento e colaboração.
A discussão dos resultados abre uma reflexão em torno dos desafios que o povoamento
neorural coloca ao planeamento e à gestão territorial, nomeadamente, o de catalisar a
criatividade e a inovação social desencadeada pelas iniciativas de base sem abdicar do
dever de salvaguardar valores e interesses colectivos. Os constrangimentos a uma
actuação eficaz da administração territorial decorrem tanto da falta de conhecimento
do fenómeno, como da dificuldade de o enquadrar nos instrumentos legais em vigor —
que não conferem aos técnicos a discricionariedade necessária para o desenvolvimento
de soluções adequadas à diversidade de casos ou às particularidades de cada iniciativa.
A rigidez do quadro legislativo em vigor não promove o diálogo ou a colaboração,
alimentando uma atitude de desconfiança e evitamento mútuo que, por sua vez, agrava
os riscos e ameaças e compromete a concretização das oportunidades estratégicas. As
soluções propostas para superar este impasse retiram inspiração de uma política
recentemente implementada no País de Gales e exploram um conjunto de medidas a
desenvolver no plano político, legislativo, do conhecimento e investigação com vista a
desenvolver mecanismos e instrumentos mais adequados.
Download

Povoamento neorural em Portugal Continental