Nº8 NOVEMBRO 2002 PAREDES DE ALVENARIA EM BLOCOS DE BETÃO CELULAR AUTOCLAVADO VITOR MANUEL DIAS GUERREIRO A monografia apresentada foi realizada no âmbito da cadeira de Tecnologias da Construção de Edifícios do 11º Mestrado em Construção do Instituto Superior Técnico ÍNDICE página Resumo 1 1. Introdução 1 2. Criação do betão celular autoclavado 2 3. Um sistema de construção 3 4. Características técnicas do betão celular autoclavado 4.1 isolamento térmico 4.2 incombustibilidade e resistência ao fogo 4.3 isolamento acústico 4.4 absorção de água 4.5 facilidade de manuseamento 4 4 5 6 6 6 5. 7 Material Amigo do Ambiente 6. Economia da construção com betão celular autoclavado 8 7. Normalização e homologação Documento de homologação DH 383 Norma francesa NF P 14-306 Norma Europeia EN 771-4:2000 9 8. Cadernos de Encargos 11 9. Processo de fabrico 12 10. Apresentação comercial do betão celular autoclavado: 15 11. Metodologia de montagem 11.1 lintéis sobre aberturas em portas e janelas exteriores 11.2 lintéis sobre aberturas em portas interiores 11.3 reforços em panos de peito 11.3.1 colocação de armadura de reforço 11.3.2 colocação de armadura de junta em fibra de vidro 11.4 execução de juntas entre a parede e a estrutura 11.5 junta de parede corta-fogo 11.6 tratamento de juntas flexíveis 11.6.1 com rede de fibra de vidro 11.6.2 corte à colher 11.7 montagem de aro para colocação de porta e janela 11.8 forras térmicas 11.9 fixação de equipamentos 16 19 20 20 20 21 22 24 24 24 25 26 27 28 12. Argamassas de Montagem 12.1 Rebocos 12.2 Outros acabamentos 29 30 31 13. Ferramentas especiais 31 14. O betão celular autoclavado no mundo 33 15. Desenvolvimento de novos estudos 34 16. A experiência portuguesa 35 17. O grupo Ytong AG 37 18. Conclusões 37 19. Bibliografia 38 20. Anexo 39 RESUMO Em Portugal a construção mantém as técnicas ditas tradicionais, mas que correspondem na realidade a técnicas relativamente recentes e que transformaram a construção num “todo igual”, não atendendo às características efectivamente tradicionais da construção. Existe toda a vantagem na procura de novas técnicas e tecnologias para a construção de forma a obter uma construção: mais económica, mais confortável, mais rápida, com menos desperdício de matérias primas e menos agressiva para o ambiente. Uma tecnologia que corresponde a este objectivos é a construção com betão celular autoclavado, actualmente pouco conhecido entre nós ,mas com sucesso reconhecido em todo o mundo. Procura-se neste trabalho apresentar as características e descrever as técnicas adequadas à execução de paredes de alvenaria em betão celular autoclavado, que permitam alcançar o êxito com a sua aplicação. 1. INTRODUÇÃO Em Portugal a construção mantém as técnicas ditas tradicionais, mas que correspondem na realidade a técnicas relativamente recentes e que transformaram a construção num “todo igual”, não atendendo às características efectivamente tradicionais da construção, que tinham a ver com a localização (clima e disponibilidade de materiais na região). Em resultado da aprendizagem ao longo dos tempos, construíam-se os edifícios mais confortáveis e mais económicos, para cada região. No pós-guerra da II Guerra Mundial, a destruição generalizada na Europa central conduziu a um avanço significativo da construção no sentido de desenvolver novas tecnologias. Existe toda a vantagem na procura de novas técnicas e tecnologias para a construção de forma a obter uma construção: mais económica, mais confortável, mais rápida, com menos desperdício de matérias primas e mais amiga do ambiente. Uma tecnologia que corresponde a este objectivos é a construção com betão celular autoclavado, actualmente pouco conhecido entre nós e só obtido por importação, já que não se fabrica em Portugal. Este trabalho apresenta as características, evidenciando as vantagens, e descreve as técnicas adequadas à execução de paredes de alvenaria em betão celular autoclavado, que permitam alcançar o êxito com a sua aplicação. Em Portugal teve pouco sucesso a introdução do betão celular autoclavado por sucessivos erros de aplicação, que se traduziu numa ideia geralmente negativa acerca deste material. Esta má imagem surge por desconhecimento das características e das tecnologias adequadas. 1 2. CRIAÇÃO DO BETÃO CELULAR AUTOCLAVADO O betão celular autoclavado foi inventado e registado em patente em 1924 pelo arquitecto sueco Johan Axel Eriksson, na sequência de estudos realizados desde o século XIX. Esta criação resultou da pesquisa desenvolvida no sentido de encontrar um material que apresentasse boas características idênticas à madeira (estrutura sólida, bom isolamento térmico, facilidade de trabalho e manuseamento), mas sem as suas desvantagens (combustibilidade e apodrecimento com o tempo). FIG. 1 (fábrica e transporte no início do século XX) O primeiro fabricante foi a Messrs Christiani & Nielson Ltd, na Escadinávia, ainda em 1924. Em 1929 iniciou-se a produção industrial pela fábrica da Ytong. Um dos nomes porque é conhecido o betão celular autoclavado, nomeadamente em Portugal, e que é uma das marcas comerciais, é “ytong”. O nome Ytong resulta da combinação de Yxhult, o lugar de origem da descoberta, com a palavra betong, termo sueco para betão. Em outros países, para além desta designação, é também conhecido por “siporex”, surgindo mesmo em dicionário como designação deste material. Na bibliografia em inglês surgem múltiplas designações como: AAC (Autoclaved Aerated Concrete), ALC (Autoclaved Lightweight Concrete), Airecrete, Airstone, Thermostone, Gas Concrete, Cellular Concrete, Porous Concrete. 2 3. UM SISTEMA DE CONSTRUÇÃO O betão celular autoclavado é um material de construção, inteiramente natural e não poluente, composto por areia, cal, cimento e água. Na fase final do fabrico é adicionado pó de alumínio que actua como gerador de bolhas de hidrogénio no seio da mistura dos restantes constituintes, e que são responsáveis pela formação da estrutura celular deste material. A cura deste betão é feita em autoclave sob a acção de vapor de água em condições de pressão e temperatura controladas. Os blocos de betão celular autoclavado apresentam todas as propriedades e características para a construção de alvenarias de alta qualidade, nomeadamente: isolamento térmico excelente, elevada resistência à compressão, incombustibilidade e resistência ao fogo, bom isolamento acústico e facilidade de manuseamento Foi desenvolvido um sistema de construção de paredes, utilizando blocos maciços de betão celular autoclavado, com peso específico de 550 kg/m3. Os blocos com largura inferior a 15 cm têm topos planos e o seu assentamento é realizado com juntas verticais e horizontais delgadas, constituídas por argamassa especial. Os blocos com largura igual ou superior a 15 cm dispõem de uns perfis de encaixe tipo “macho-fêmea” nos topos para realização, por encaixe, de juntas verticais secas. Adicionalmente, os blocos com largura igual ou superior a 20 cm apresentam uma “pegas” nas zonas superiores dos topos para facilitar o seu manuseamento. O peso reduzido e a estabilidade dimensional do betão celular autoclavado são características ideais para a construção de alvenarias. A sua utilização em paredes exteriores e interiores, permite uma menor transmissão de carga, a todos os elementos estruturais (lajes, vigas e pilares), do que outros materiais de construção, para além de toda a qualidade e bem-estar oferecidos. Em construções industriais, devido à existência de grandes painéis de alvenaria corrida, o betão celular autoclavado permite rendimentos de assentamento de blocos ainda mais elevados, possibilitando um encurtamento significativo dos prazos de execução das obras. Um apoio técnico especializado e uma assistência à obra por técnicos do fabricante é fundamental para garantir a segurança da utilização dos produtos de betão celular autoclavado, dadas as especificidades desta nova tecnologia. 3 4. CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS DO BETÃO CELULAR AUTOCLAVADO O betão celular autoclavado é um material de construção que apresenta propriedades e características técnicas adequadas para a construção de alvenarias, e que se podem sintetizar no quadro seguinte: Propriedade unidades valor kN/m3 5,5 3 6,5 N/mm 2 5,0 Resistência à tracção por flexão N/mm 2 0,8 Coeficiente de condutibilidade térmica W/mºC 0,16 mm/mºC 0,008 Peso específico seco Peso específico de cálculo Resistência à compressão Coeficiente de dilatação Módulo de elasticidade Ponto de fusão Coeficiente de retracção Coeficiente de Poisson kN/m N/mm 2 2300 ºC > 500 mm/m 0,15 – 0,15 - 0,25 FIG. 2 (quadro das características técnicas) 4.1. Isolamento térmico O isolamento térmico de um elemento construtivo mede-se através do seu coeficiente de transmissão térmica K. Este coeficiente indica a quantidade de calor que atravessa 1 m2 desse elemento durante 1 hora quando a diferença de temperatura entre as suas duas faces é de 1ºC. Quanto mais baixo for este coeficiente mais baixas serão as perdas de energia e, consequentemente, menores serão os gastos de energia de aquecimento. A existência de minúsculos poros de ar oferecem ao betão celular autoclavado o seu excelente isolamento. As paredes construídas com blocos de betão celular autoclavado apresentam reduzidos coeficientes de transmissão térmica (elevadas resistências térmicas) o que permite manter durante todo o ano temperaturas de conforto. No inverno as perdas térmicas pelas paredes exteriores são mínimas e durante o verão oferecem grande resistência à penetração do calor exterior. 4 4.2 Incombustibilidade e resistência ao fogo As exigências aplicáveis aos edifícios de habitação e seus elementos, visando a satisfação da segurança contra incêndio, são definidas no Regulamento de Segurança Contra Incêndio em Edifícios de Habitação” DL 64/90 de 21 de Fevereiro. De acordo com este regulamento o comportamento face ao fogo caracteriza-se pelos seguintes indicadores: − Reacção ao fogo – materiais M0 a M4, não combustíveis a facilmente inflamáveis respectivamente. − Resistência ao fogo – comportamento relativamente à manutenção das funções dos elementos em caso de incêndio, classificado em escalões de tempo de 15 a 360 min: Estável ao fogo (estabilidade) EF Pára-chamas (estanquidade) PC Corta-fogo (estanquidade e isolamento térmico).CF Exigências Paredes exteriores Paredes interiores Tipo de edifício Revestimentos Paredes de empena Paredes guarda-fogo Separação entre habitações contíguas Unifamiliar M3 CF60 não são exigidas – Multifamiliar altura <= 28 m M2 (M3 se h<=9m) CF60 edifícios de grande desenvolvimento CF90 (CF60 se h<=9m) CF60 Multifamiliar altura > 28 m M1 CF90 edifícios de grande desenvolvimento CF90 CF60 FIG. 3 (exigências aplicáveis aos edifícios de habitação) Os blocos e a argamassa de assentamento são da classe de reacção ao fogo M0. De acordo com ensaios em laboratório estrangeiros paredes com 0.15 m não revestidas, assentes com juntas horizontais e verticais preenchidas, apresentam um grau corta-fogo superior a CF180. Por outro lado há que garantir uma série de requisitos como a não libertação de gases nocivos nem inflamáveis, a estabilidade do elemento construtivo, a inalterabilidade do material e a resistência ao jacto de água. 5 As alvenarias Ytong, constituem assim excelentes paredes corta-fogo, atendendo às suas características de incombustibilidade e incomburência, que não produz fumos nem gases tóxicos. Mas a existência de juntas flexíveis penaliza a obtenção de paredes corta-fogo, obrigando a cuidados especiais em termos de selecção dos materiais usados no preenchimento das juntas e na espessura mínima de reboco a aplicar sobre estas. 4.3 Isolamento acústico O novo Regulamento Geral do Ruído, Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro estabelece os requisitos e regras sobre poluição sonora, licenciamento das construções, ordenamento e zonamento acústico, ficando os requisitos acústicos dos edifícios de acordo com o definido no DL 251/87, de 24 de Julho, revogado no restante. As paredes construídas com blocos de betão celular autoclavado apresentam um bom isolamento acústico aos ruídos transmitidos do interior para o exterior e oferecem uma eficiente barreira sonora aos ruídos produzidos no exterior. 4.4 Absorção de água A absorção de água no betão celular autoclavado processa-se, de um ponto de vista global, mais lentamente do que em outros materiais de construção. A existência de micro-poros, separados entre si, implica uma reduzida velocidade de absorção. À superfície do bloco e até cerca de 5cm de profundidade, a absorção é mais rápida, devido à existência de micro-poros cortados, o que poderá levar a considerações menos correcta acerca da permeabilidade do material. 4.5 Facilidade de manuseamento Atendendo ao seu reduzido peso específico os blocos de betão celular autoclavado facilitam o trabalho do aplicador. Os blocos com espessura superior a 15cm possuem reentrâncias que constituem “pegas” na parte superior dos topos, tornando ainda mais fácil o seu manuseamento. As peças de acerto das dimensões da obra são obtidas por simples corte com um serrote manual ou serra eléctrica. 6