MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ANÍSIO DE ABREU
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA
CIDADE E COMARCA DE ANÍSIO DE ABREU - PIAUÍ,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ, por seu
representante nesta Comarca, in fine subscrevente, no uso de suas atribuições
constitucionais e legais e legitimado pelos arts. 127 e 129, II e III, ambos da
Constituição Federal, 25, IV, “a” e 27, I, ambos da Lei Federal nº 8.625/93, 1º,
IV e 5º, I, ambos da Lei Federal nº 7.347/85, vêm a Juízo aforar a presente:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de liminar,
contra o MUNICÍPIO DE ANÍSIO DE ABREU - PI, pessoa jurídica de
direito público interno, representada por seu Prefeito, ISAAC RIBEIRO,
com endereço funcional na sede da Prefeitura Municipal de Anísio de AbreuPI, aduzindo as razões de fato e de direito subseguintes:
I - DOS FATOS
1.
Cuida-se da Representação n. 07/2013 (doc. 01), recebida em
20/02/2013, no Centro de Combate à Corrupção e Defesa do Patrimônio
Público - CACOP, em que o Sr. MÁRCIO DIAS RIBEIRO, Vereador do
Município de Anísio de Abreu-PI, noticia que, no dia 25 de janeiro de 2013,
foi publicado o Edital n. 001/2013 (doc. 02), abrindo inscrição para escolha
dos titulares e suplentes para os cargos do CONSELHO TUTELAR daquela
comuna, sendo que, no aludido edital, consta que os candidatos seriam
escolhidos em teste seletivo, além de prever, de forma irregular, o
credenciamento dos votantes. Pediu providências.
2.
Com efeito, o referido edital, por absurdo, estabeleceu o prazo de 20 a
27/02/2013, para Credenciamento dos Votantes, com a Divulgação da
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Listagem dos Votantes em 05/03/2013, para a votação a ser realizada na
próxima sexta-feira, dia 08 de março de 2013, das 8h às 12h, no Prédio da
Câmara Municipal de Vereadores de Anísio de Abreu-PI.
3.
Junto com o Edital n. 001/2013, foi publicada a Resolução n.
001/2013 (doc. 03), do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente - CMDCA do Município de Anísio de Abreu-PI, regulamentando
o processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar do Município de
Anísio de Abreu-PI.
4.
Dispondo sobre os votantes, a supracitada resolução assim dispõe:
“Artigo 11. Terão direito a voto, além do Conselho Municipal
dos Direitos da Criança e do Adolescente, as organizações não
governamentais, constituídas há pelo menos 01(um) ano, que
incluam em seus objetivos a defesa, proteção, assistência social
e/ou atendimento da Criança e do Adolescente ou defesa do
cidadão.
“Parágrafo Único - Cada entidade ou organização poderá
credenciar até 48 (quarenta e oito) horas antes da eleição 02
(dois) delegados”.
5.
A mesma resolução estabelece, ainda, em seus artigos 19 a 22, um
processo de capacitação e avaliação dos candidatos inscritos, verdadeiro
PROCESSO SELETIVO, eis que também ali se estabelece uma Comissão de
Escolha que selecionará os candidatos com avaliação suficiente.
6.
Consta também do artigo 1º dessa resolução que os candidatos serão
eleitos para um mandato de 03 (três) anos.
7.
À míngua de Promotor de Justiça titular na Promotoria de Justiça de
Anísio de Abreu-PI, o subscritor desta foi designado pela Portaria PGJ nº
318/2013, de 25/02/2013, para apurar as notícias de irregularidade constantes
no Edital nº 001/2013, para escolha dos membros titulares e suplentes do
Conselho Tutelar do Município de Anísio de Abreu-PI.
8.
Observando, de plano, na regulamentação do processo de escolha dos
membros do Conselho Tutelar de Anísio de Abreu-PI, agressão à ordem
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jurídica, ao regime democrático e a interesses difusos da sociedade anisiense,
optou-se por propor imediatamente esta ação civil pública.
II - DO DIREITO
9.
O art. 1º, caput e parágrafo único, da Constituição Brasileira de 1988,
estampa, de forma eloquente, que, no nosso Estado Democrático de Direito,
todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos da Constituição.
10.
De outra parte, o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei n.
8.069/90, estabeleceu, em seus arts. 131 e 132, que o Conselho Tutelar é
órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade
de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, como
órgão integrante da administração pública local, composto de 5 (cinco)
membros, escolhidos pela população local para mandato de 4 (quatro) anos,
permitida 1 (uma) recondução, mediante novo processo de escolha.
11.
Ademais, o art. 133 do ECA não exige, entre os requisitos para uma
candidatura ao Conselho Tutelar, que o candidato passe por um processo
seletivo de conhecimentos, bastando que tenha reconhecida idoneidade moral,
idade superior a 21 (vinte e um) anos e resida no município.
12.
Daí se dessume, pois, que, exercendo parcela do poder estatal, o
processo de escolha dos membros de um Conselho Tutelar deve reger-se pelos
mais amplos princípios democráticos, de molde a garantir o exercício pleno
da soberania popular, sendo de todo irregular e inconstitucional, violando o
regime democrático, um regulamento e um processo de escolha que
restrinjam esse exercício, como se dá na espécie.
13.
Ora, no momento em que se estabelece um credenciamento dos
votantes a partir de associações, excluindo aqueles cidadãos que, ainda que
façam parte de uma associação, não forem por ela indicados, bem assim o
cidadão comum que não está associado (e nem é obrigado a tal), ferem-se de
morte o regime democrático e a regra do ECA que estabelecem a escolha dos
conselheiros tutelares pela população local, isto é, pelos cidadãos moradores
da região em que o Conselho Tutelar desempenha as suas atribuições, no caso,
todos e cada um dos eleitores do Município de Anísio de Abreu-PI, que têm
direito facultativo de votar nesse processo de escolha.
14.
Por sua vez, a restrição a candidaturas mediante processo seletivo de
conhecimento, também constante do edital e da resolução ora combatidos,
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viola a ordem jurídica, mais especificamente a regra do art. 133 do ECA, que
somente estabelece requisitos de cidadania, jamais de conhecimento, e merece
correção judicial.
15.
Por fim, o edital e a resolução em apreço estabelecem um mandato de
3 (três) anos para os conselheiros tutelares de Anísio de Abreu-PI, quando o
art. 132 do ECA fixa um mandato de 4 (quatro) anos, também por isso
merecendo reproche e ajustamento.
16.
Não se deve deslembrar tampouco, conforme sabido e ressabido, que
o controle jurisdicional dos atos administrativos já se faz fartamente aclamado
pela doutrina e pela jurisprudência mais abalizadas, como autêntico corolário
do Estado Democrático de Direito e do sistema de freios e contrapesos
(checks and balances) a ele subjacente. É o que restou consolidado em lapidar
aresto emanado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, a
seguir transcrito:
“Assim, quando o judiciário vem a ser provocado por qualquer
do povo (mediante ações populares, ações civis públicas e
mandados de segurança coletivos, dentre outros remédios
processuais, de perfil constitucional, cabíveis) ou pelo
Ministério Público (a quem foi atribuída institucionalmente,
pelo legislador constituinte, a tarefa de defender os interesses
públicos em geral, bem como os interesses coletivos e difusos),
para analisar a possibilidade de ter havido algum erro por
parte dos agentes dos demais poderes, tal fato deve ser
encarado com a maior naturalidade, pois é esta a forma de
funcionar um sistema realmente democrático.
(...)
O que deve acabar, isto sim, é a caolha perspectiva de que há
um confronto entre os poderes cada vez que há uma ação
judicial envolvendo atos dos demais poderes. Isso deve ser visto
com naturalidade, repito, pois se todas as manifestações do
Poder – que em si é uno, não se olvide – necessariamente
devem buscar o bem comum, as eventuais demandas judiciais
que forem propostas, colocando em dúvida a preservação de tal
finalidade, nada mais representam do que uma oportunidade
que o sistema oferece para uma última e detida análise da
questão, buscando garantir a efetiva consecução do interesse
público” (Apelação 596.017.897 - Santo Ângelo; apud
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LIVIANU, Roberto, Da Atuação do Ministério Público na Luta
pelo Cumprimento dos Deveres do Estado como Forma de
Defesa dos Interesses Sociais frente à Discricionariedade
Administrativa, in Revista do Curso de Direito das Faculdades
Integradas de Guarulhos, ano 3, nº 5 (jul-dez/2001), São
Paulo: Sociedade Guarulhense de Educação, pp. 90-91).
17.
Nesse diapasão, propõe o Ministério Público contra o Requerido a
vertente Ação Civil Pública, buscando o cumprimento de sua obrigação de
fazer um processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar de Anísio de
Abreu-PI que respeite a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses
difusos dos cidadãos que formam o corpo eleitoral daquela comuna,
propiciando a todos os eleitores de Anísio de Abreu-PI o direito de votar nas
eleições de seu Conselho Tutelar, garantindo o acesso e a candidatura ao
Conselho Tutelar pelo simples exercício da cidadania, de fora parte a
exigência de processo seletivo de conhecimento, que muito bem pode (e deve)
ser suprido por posterior capacitação funcional, bem assim assegurando a
duração quadrienal do mandato dos conselheiros, tudo conforme previsões
constitucionais e do Estatuto da Criança e do Adolescente supracitadas.
III - DOS PEDIDOS
A) DO PEDIDO DE LIMINAR
18.
É de trivial sabença que o deferimento de pedido liminar se encontra
condicionado à reunião de dois pressupostos inafastáveis, quais sejam, o
fumus boni juris e o periculum in mora.
19.
O fumus boni juris consiste na verossimilhança do pedido, vale dizer,
na probabilidade de existência do direito invocado e que justifica a sua
proteção imediata,ainda que em juízo vestibular.
20.
Nesse quadrante, a presença de tal requisito serenamente se depreende
dos anexos documentos, que comprovam de plano a ofensa à ordem jurídica
atinente à espécie, constante dos comandos normativos trazidos à baila, quais
sejam, o art. 1º, caput e parágrafo único, da Constituição Federal de 1988,
bem assim os arts. 131, 132 e 133, estes da Lei Federal nº 8.069/1990.
21.
Já o periculum in mora descansa na possibilidade de danos
irreparáveis ou de difícil reparação aos cidadãos e ao corpo eleitoral do
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Município de Anísio de Abreu-PI, ante a iminente realização – já na próxima
sexta-feira (08/03/2013) – de um processo de escolha de conselheiros
tutelares flagrantemente irregular e viciado.
22.
Demais disso, os arts. 11 e 12, caput, da Lei Federal nº 7.347/85, e o
art. 84, § 3º, da Lei Federal nº 8.078/90 – este perfeitamente aplicável ao caso
em tela à vista do art. 21 da Lei Federal nº 7.347/85 – consagram a
possibilidade de o julgador, diante da relevância do fundamento da demanda e
de justificado receio de ineficácia do provimento final, conceder liminarmente
a tutela pretendida pelo autor da ação.
23.
Por conseguinte, restam devidamente comprovados os pressupostos de
procedência do provimento acautelatório initio litis, pelo que REQUER o
Ministério Público a Vossa Excelência que, concedendo-o, inaudita altera
pars, determine ao Requerido que SE ABSTENHA DE REALIZAR O
PROCESSO DE ESCOLHA DOS CONSELHEIROS TUTELARES DE
ANÍSIO DE ABREU-PI NO DIA E PELA FORMA PRECONIZADOS NO
EDITAL Nº 001/2013 E RESOLUÇÃO Nº 001/2013 DO CMDCA, TUDO
ATÉ O JULGAMENTO FINAL DESTA AÇÃO.
24.
Ao Requerido deverá ser cominada, na hipótese de descumprimento
do mandamento judicial, multa de R$ 100.000,00 (CEM MIL REAIS), valor
que deverá ser revertido para o fundo de que trata o art. 13, da Lei Federal nº
7.347/85, sem prejuízo das sanções decorrentes do crime de desobediência e
do ato de improbidade administrativa, a serem aplicadas a seu representante
legal, além da configuração de ato atentatório ao exercício da jurisdição e da
aplicação de multa, prevista no art. 14, parágrafo único, do Código de
Processo Civil.
B) DOS PEDIDOS CONCLUSIVOS
25.
Ante o exposto, pugna o Ministério Público que se digne Vossa
Excelência de deferir a presente inicial para:
A)
DETERMINAR a autuação desta vestibular com os documentos que
a instruem;
B)
CONCEDER LIMINAR na forma supraexpendida;
C)
DETERMINAR a citação do MUNICÍPIO DE ANÍSIO DE
ABREU - PI, na pessoa de seu representante legal, o Prefeito Municipal
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ISAAC RIBEIRO, através de Oficial de Justiça, para, querendo, contestar o
pedido, no interstício legal, sob pena de confissão e revelia, nos termos do art.
319, do CPC;
D)
DETERMINAR a publicação do edital previsto no art. 21, da Lei
Federal nº 7.347/85, c/c o art. 94, da Lei Federal nº 8.078/90, para
conhecimento dos interessados e eventual habilitação como litisconsortes;
E)
DETERMINAR a inversão do ônus da prova, à luz do art. 6º, VIII, da
Lei Federal nº 8.078/90, aplicável à espécie conforme o disposto no art. 21, da
Lei Federal nº 7.347/85;
F)
JULGAR PROCEDENTES os pedidos para:
ICONDENAR o Requerido na obrigação de fazer consistente em
realizar, dentro de prazo razoável, um processo de escolha dos membros do
Conselho Tutelar de Anísio de Abreu-PI que respeite a ordem jurídica, o
regime democrático e os interesses difusos dos cidadãos que formam o
corpo eleitoral daquela comuna, propiciando a todos os eleitores de Anísio
de Abreu-PI o direito de votar nas eleições de seu Conselho Tutelar,
garantindo o acesso e a candidatura ao Conselho Tutelar pelo simples
exercício da cidadania, de fora parte a exigência de processo seletivo de
conhecimento, que muito bem pode (e deve) ser suprido por posterior
capacitação funcional, bem assim assegurando a duração quadrienal do
mandato dos conselheiros, tudo conforme previsões constitucionais e do
Estatuto da Criança e do Adolescente supracitadas;
II DETERMINAR outras medidas necessárias para a efetivação da
tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente, conforme arts.
287 e 461, § 5º, do Código de Processo Civil, e 84, § 5º, da Lei Federal nº
8.078/90;
III - CONDENAR o Requerido na obrigação de pagar, na hipótese de
descumprimento do mandamento judicial, multa de R$ 100.000,00 (CEM
MIL REAIS), valor a reverter-se para o fundo de que trata o art. 13, da Lei
Federal nº 7.347/85, sem prejuízo das sanções decorrentes do crime de
desobediência e do ato de improbidade administrativa, a serem aplicadas a seu
representante legal, além da configuração de ato atentatório ao exercício da
jurisdição e da aplicação de multa, prevista no art. 14, parágrafo único, do
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Código de Processo Civil, bem assim nas custas processuais e demais ônus de
sucumbência.
IV - DAS PROVAS
26.
Requer a produção de todos os meios de prova em Direito admitidos,
em especial o depoimento pessoal do representante legal do Requerido, sob
pena de confissão, a oitiva de testemunhas, cujo rol será oportunamente
ofertado, a juntada de documentos e a realização de perícias eventualmente
necessárias, com o direito de indicar assistente técnico.
V - DO VALOR DA CAUSA
27.
Dá-se à causa o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), para efeitos
meramente fiscais.
Termos em que pede e espera deferimento.
De São Raimundo Nonato-PI para Anísio de Abreu-PI, 07 de março de
2013.
REGIS DE MORAES MARINHO
Promotor de Justiça
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PJABREU - AÇÃO CIVIL PÚBLICA (CONSELHO TUTELAR)