PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
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ARQUITETURA, PAISAGEM E PARTICIPAÇÃO: UMA EXPERIÊNCIA
PARTILHADA EM TABOÃO DA SERRA – SP
KASAHARA, Joyce
Arquiteta e Urbanista. Aluna especial do curso de Pós-Graduação da FAU USP. Área de
Concentração Paisagem e Ambiente. E-mail: [email protected]
MOLICA, Hiderlene M.
Arquiteta e Urbanista. Aluna especial do curso de Pós-Graduação da FAU USP. Área de
Concentração Paisagem e Ambiente. E-mail: [email protected]
MORAES, Elaine de
Arquiteta e Urbanista. Aluna especial do curso de Pós-Graduação da FAU USP. Área de
Concentração Paisagem e Ambiente. E-mail: [email protected]
SOUZA, Fabíola B.
Arquiteta e Urbanista. Aluna regular do curso de Pós-Graduação da FAU USP. Nível
Mestrado. Área de Concentração Paisagem e Ambiente. E-mail: [email protected]
Resumo
Este artigo tem como objetivo apresentar os resultados de uma atividade realizada
para a disciplina Paisagismo, do curso de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo. A principal meta foi desenvolver uma
ação com parceiros externos à Universidade, na região adotada como referência
nesta disciplina: a Bacia do rio Pirajuçara.
Nesta “experiência partilhada”, além de estudos teóricos sobre conceitos como
Participação Social, Gestão Pública e Paisagem, foram realizados inúmeros
encontros com representantes da Prefeitura de Taboão da Serra e do Instituto
Ecoar – Procam - Projeto Bacias Irmãs, culminando em três atividades com a
comunidade de Taboão da Serra: Caminhada Diagnóstica e duas oficinas. A
articulação entre as diversas instâncias surgiu como uma possibilidade de iniciar
uma discussão, entre Prefeitura/ONG/Universidade/Comunidade, acerca da
execução de um Parque Linear às margens do rio Pirajuçara no qual estão
envolvidos três bairros do município em questão. Entende-se o processo de
participação social como um item fundamental na produção coletiva da paisagem,
estimulando um trabalho de desenvolvimento da cidadania.
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1. APRESENTAÇÃO
1.1. A disciplina Paisagismo – AUP5810 e o campo de estudo
Este artigo visa apresentar o resultado de uma atividade solicitada pelo professor Dr.
Euler Sandeville Jr. para a disciplina Paisagismo – AUP 5810, ministrada no curso de Pósgraduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo
(USP). A idéia principal, explicitada no plano de ensino da disciplina, pautou-se no
desenvolvimento de um projeto com parceiros externos à Universidade. Portanto, faz
parte deste trabalho, a vivência em um contexto cultural, político e urbano, em busca de
uma interação entre os alunos da FAUUSP, instituições, ONGs, comunidade etc. As
experiências aconteceram na região adotada como referência nesta disciplina: a Bacia do
rio Pirajuçara.
É importante ressaltar que a proposta desta disciplina inclui-se em um projeto do
Laboratório Gestão e Projeto do Espaço da FAU USP, do qual o “Fórum Permanente da
Paisagem: Bacia Pirajuçara”, realizado em 2006 na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo (FAU) da USP faz parte.
O grupo escolheu trabalhar em um trecho localizado às margens do rio Pirajuçara, na
divisa entre os municípios de São Paulo (Bairro Campo Limpo) e Taboão da Serra
(Bairros Parque Pinheiros, Jardim Marabá e Parque São Mateus), ambos localizados em
terras pertencentes ao Estado de São Paulo.
Assim como em toda a metrópole de São Paulo, percebe-se nesta região um vínculo
entre pobreza urbana e problemas ambientais urbanos.
“Em áreas de importância ambiental, são diversos os fatores atrelados à forma de
produção da moradia e às condições de vida nesses assentamentos populares, que
tornam seus habitantes poluidores involuntários” (MEYER, 2004, p. 90).
A paisagem do rio Pirajuçara, drasticamente transformada pelas ações antrópicas,
evidencia um “cenário” comum da realidade brasileira: a ocupação irregular das áreas de
mananciais, visivelmente desordenada, em trechos dos municípios de Taboão da Serra,
Embu e São Paulo, afetando a qualidade da água do rio, não só destruindo os
remanescentes da flora e fauna, mas prejudicando também, a qualidade de vida da
população.
A segregação desta paisagem, portanto, é evidente. O rio Pirajuçara marca a divisa entre
os dois municípios. E a desconexão entre as duas gestões governamentais acaba
descaracterizando o rio enquanto lugar de valor ecológico, paisagístico e social. Esses
aspectos, tão peculiares das áreas limítrofes, são tratados com descaso pelos poderes
constituídos, cujo empenho e investimentos se restringem apenas aos territórios
pertencentes aos seus municípios.
Contudo, o rio exige que ambos os lados se integrem em uma única gestão. Uma que
aconteça por meio da integração de todas as instâncias: Estado, Mercado e Comunidades,
de modo que realmente haja canais abertos para o direito de voz e poder de decisão de
todos os representantes do interesse público, chegando, como afirma Pereira (2007) a
uma auto-gestão autônoma, que ao invés de excluir, une as instâncias. Assim como o
rio une as margens, deseja-se uma gestão de Paisagem que una as cidades à mesma
História, à mesma gente e ao mesmo cotidiano.
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Desta forma, acredita-se que somente quando os valores sociais e culturais bem como os
processos naturais são reconhecidos, torna-se possível estabelecer as prioridades e
resolver ou conciliar os conflitos. É fundamental também construir uma consciência
ambiental, fazendo cada indivíduo perceber seu impacto cumulativo sobre a cidade,
dando-lhes ferramentas para lutarem por melhores condições de vida.
Entende-se que, para qualquer profissional, aqui, especificamente o profissional
arquiteto-urbanista, somente os conhecimentos técnicos não são suficientes para a
proposição de modelos de paisagem sustentáveis integradas aos sistemas ecológicos. A
vivência e o contato com as complexidades e peculiaridades do lugar e o estudo de
experiências similares, são imprescindíveis.
“Os resultados ideais da atividade do cientista, do planejador, do administrador, do
técnico, do político sobre as cidades começam quando toda esta gente sai de cena.
Quando os seus projetos deixam de ser mapas, memoriais e orçamentos, leis decretos,
ou planos financeiros e se transformam em uma linguagem física decodificável no dia-adia”. (Carlos Nelson, 1985)
Além dessa “experiência partilhada” ter possibilitado o desenvolvimento de um trabalho
conjunto entre diversos atores sociais e a vivência, às alunas da disciplina, em um
contexto urbano específico, pode também, estabelecer uma nova parceria entre a
prefeitura de Taboão da Serra e o Projeto Bacias Irmãs. Essa parceria deu início a uma
série de atividades com a comunidade de Taboão da Serra, que sem dúvida alguma
extrapolará as três atividades realizadas neste trabalho: Caminhada Diagnóstica, Oficina
1 e Oficina 2.
1.3. Os agentes sociais envolvidos
A abordagem participativa na elaboração de projetos de arquitetura, urbanismo e
paisagismo, de acordo com Boucinhas (2005, p. 10), pode fortalecer as novas formas de
gestão democrática dos espaços públicos, aumentando as possibilidades da sociedade
realmente contribuir na determinação e qualificação de seus lugares de vida.
Desta forma, quatro grupos diferentes participaram deste trabalho: a comunidade
residente em bairros de Taboão da Serra, entre eles Jardim Marabá, Parque São Mateus,
Parque Pinheiros, Jardim das Oliveiras; algumas lideranças residentes em Embu e
também em Campo Limpo, São Paulo. Todos vivem nas proximidades das margens do rio
Pirajuçara, e sofrem, direta ou indiretamente, com as freqüentes enchentes, mau cheiro,
carência de espaços públicos de lazer, entre outros. Além da comunidade, outras
instituições têm papel fundamental neste processo: a prefeitura de Taboão da Serra; o
Instituto Ecoar – Procam – Projeto Bacias Irmãs; e, por fim, a FAUUSP.
1.4. A proposta de um Parque Linear para Taboão da Serra
A necessidade de recuperação dos córregos e fundos de vale estimulou o surgimento de
parques lineares, cujo principal objetivo centra-se na preservação dos recursos hídricos,
de modo a resgatar o papel dos fundos de vale como parte fundamental do sistema de
drenagem natural. Além de se constituírem como expansão das áreas verdes da cidade,
esses parques contribuem para a melhoria da permeabilidade do solo, de modo a
diminuir as enchentes, proteger os cursos d’água existentes e conservar a mata ciliar,
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bem como criar áreas de lazer e recreação. Desta forma, além da função social, tem
como função auxiliar a estabilidade das bordas, protege o rio, reduz o assoreamento,
estabelece uma barreira física que auxilia na proteção do rio, evita a construção de
habitações irregulares nas áreas de várzea dos córregos, ampliando, assim, a qualidade
de vida das populações que vivem na região.
De acordo com representantes da Prefeitura de Taboão da Serra, a empresa New Corp,
proprietária de um terreno de dimensões significativas, uma grande área verde, negociou
a abertura de uma via na área de estudo (frente para seu lote) e, como compensação,
cedeu parte de suas terras para a prefeitura com o intuito de torná-la pública. Essa área
está localizada nas margens do rio Pirajuçara (trecho escolhido para o trabalho). A
empresa se comprometeu em doar à Prefeitura de Taboão da Serra as mudas de árvores,
incrementando a implantação de um parque linear.
Figura 1: Localização do Parque Linear. Fonte: Google Earth – alterada pelo grupo FAUUSP, 2007.
Um parque linear para essa área cumpre um papel de elemento integrador espacial entre
os dois municípios envolvidos. Assim, a proposta da implantação de um parque linear,
procura valorizar a função do rio na cidade, enquanto um espaço de lazer, um lugar de
encontro e passeio, bem como um local destinado ao desenvolvimento de atividades
relacionadas à educação ambiental. E, como área verde, espera-se que a sua função
ecológica seja recuperada: proteção do solo, contenção e mitigação dos desequilíbrios.
Acrescenta-se ainda, que a Prefeitura de Taboão da Serra já iniciou a execução desse
Parque Linear, com a justificativa de barrar as invasões irregulares, além de impedir que
a margem do rio Pirajuçara se torne um depósito de lixos (ver figuras 2, 3, 4 e 5).
Figura 2: Panorâmica da área do Parque Linear. À esquerda o galpão de reciclagem – Caritas – Campo Limpo,
São Paulo. À direita terreno da empresa New Corp. Fonte: grupo FAUUSP, 2007.
Figuras 3, 4 e 5: Imagens do trecho do Parque Linear – Taboão da Serra – Parque Marabá. Fonte: grupo
FAUUSP, 2007.
Portanto, discutir com a população a paisagem do seu bairro e a implantação de um
Parque Linear torna-se uma medida urgente. Acredita-se que o desenvolvimento de
projetos deve ser entendido como parte de um processo coletivo, interdisciplinar, onde
conhecimentos, técnicas, estratégias e decisões para a produção do espaço público são
democratizados. Vislumbra-se assim, um espaço saudável e agradável para a
comunidade, um lugar de convívio e estar, que possibilite o contato com a natureza e a
preservação da paisagem natural do entorno do rio Pirajuçara.
1.5. A proposta de Canalização do rio Pirajuçara (DAEE e SIURB)
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No decorrer deste processo, o grupo da FAUUSP tomou ciência que uma parceria entre o
DAEE - Departamento de Águas e Energia Elétrica do Governo do Estado de São Paulo, e
a SIURB – Secretaria de Infra-Estrutura Urbana e Obras, da Prefeitura da cidade de São
Paulo, deu origem a um projeto de canalização de todo o rio Pirajuçara, além da
construção de “piscinões” para contenção de água. Esse aspecto, a priori, inviabilizaria o
projeto de um parque linear para o trecho da área de estudo.
Diante disso, representantes da prefeitura de Taboão da Serra, do grupo da FAUUSP e
algumas lideranças comunitárias tomaram a iniciativa de discutir o projeto de canalização
proposto para a bacia do rio Pirajuçara com o Secretário Adjunto da SIURB e com o
Superintendente do DAEE. Como resultado, se estabeleceu um acordo de compatibilizar o
projeto de Canalização com o parque linear, proposto pela Prefeitura de Taboão.
Não se sabe ao certo quando as obras de canalização do trecho em estudo irão começar.
No entanto, conclui-se que o parque linear será executado, mas o seu projeto deverá
adequar-se ao projeto de canalização do rio Pirajuçara proposto pela SIURB e DAEE.
O que mais chamou a atenção do grupo, além da falta de articulação entre Secretarias e
Prefeituras, é a força do discurso, tanto de políticos quanto da comunidade, que se
restringe apenas aos benefícios trazidos pela canalização de rios e córregos. Enquanto o
resto do mundo revê seus conceitos sobre as águas urbanas e implementa a
“descanalização” ou também a conhecida “renaturalização” de rios, aqui tem-se mais um
exemplo negativo da realidade urbana.
“(...) Infelizmente, de certa forma esta visão negativa persiste nas comunidades urbanas.
Depois de ocuparem a planície de inundação, atira-se toda sorte de objetos no canal,
entre sofás, fogões e geladeiras velhas, lixo, etc. O esgoto completa o serviço. Aí,
quando o rio esta todo degradado, (...) chamam os engenheiros dos órgãos de recursos
hídricos para o golpe final: emparedar o rio num caixão de concreto, decretando sua
morte definitiva. (...). A isto chamam de saneamento e recuperação! (...) Porque não se
pensou em recuperar o rio e criar um parque linear nas margens para evitar a ocupação?
Porque esta é a visão da engenharia tradicional apoiada ainda por grandes segmentos da
população. (...)” (BIDEGAIN, P., 2003, p.2)
2. Objetivos
O objetivo principal desta experiência foi o de articular as várias instâncias:
comunidade/prefeituras/ONG’s/FAUUSP, com o intuito de dar início a uma série de
atividades integrando esses atores, visando discutir a paisagem, a produção do seu
espaço público e a proposta de um parque linear, adequado à proposta de canalização do
rio Pirajuçara.
A necessidade de implantação de um Parque Linear e a viabilidade financeira de sua
execução despertou o interesse desse grupo para o desenvolvimento do trabalho da
disciplina Paisagismo, neste trecho do rio Pirajuçara, no município de Taboão da Serra.
A proposta deste trabalho visou, portanto, ajudar na mobilização da comunidade, a partir
de três atividades – Caminhada Diagnóstica e duas oficinas - de modo que os moradores
pudessem compreender a paisagem do seu bairro e vislumbrar alternativas para a
melhoria do local, em termos sociais, paisagísticos e ambientais.
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A decisão de articular as várias instâncias surgiu da necessidade de realizar uma
intervenção que para todos os atores sociais envolvidos era “oportunamente necessária”.
Cada qual com suas demandas e motivações específicas, sempre convergiam para o
mesmo ponto: trabalhar ações sociais e ambientais, junto à comunidade, localizada às
margens do rio Pirajuçara. Para todos, uma experiência partilhada, onde se partilhou
tanto a potência, quanto os desejos e os créditos.
3. Métodos e Etapas do trabalho
O trabalho está dividido em cinco etapas principais, que, em alguns momentos,
aconteceram de forma simultânea: a revisão teórico-conceitual; o contato com a área de
estudo (“errâncias”); o contato com os diversos agentes sociais (prefeituras, ONG’s,
comunidade, agentes de saúde e demais lideranças); a participação em experiências
similares; a elaboração de atividades com a comunidade: oficinas, caminhada diagnóstico.
Buscou-se relacionar o conhecimento empírico a um arcabouço teórico, trazendo à tona
uma reflexão crítica mais próxima da realidade. Para a fundamentação deste trabalho,
portanto, houve a realização de estudos teóricos e práticos.
3.1. Etapa Teórico-conceitual
3.1.1.
Paisagem
A idéia de que paisagem não é apenas um produto final, aquilo que se enxerga, mas algo
dinâmico e em constante mutação, aquilo que se observa, vive, sente e também aquilo
que pode se transformar, trouxe à cena uma ampla lista de referências bibliográficas que
puderam contribuir para a complexa discussão sobre o conceito Paisagem.
Para Milton Santos (2002), a paisagem é constituída pelo conjunto de formas que
exprime as heranças que representam as sucessivas relações criadas entre homem e
natureza, e o espaço, por sua vez, caracteriza-se pelas formas mais a vida que as anima.
Mas Sandeville (2005), em seu artigo “Paisagem”, não aceita a distinção, defendida por
Milton Santos, entre paisagem e espaço. Sandeville, na verdade, entende a paisagem
como algo mais rico e complexo, ou, um campo vasto de significados, cujas tensões e
contradições sociais constituem-se como suas peças fundamentais, pois, são os maiores
responsáveis pela transformação da paisagem. Argumenta ainda que entender a
paisagem como um “espaço e lance de vista” é insuficiente, e, assim, sugere que a
paisagem, além da forma, deve ser caracterizada por experiências partilhadas. Daí a
necessidade de vivenciá-la: “(...) paisagem, mais do que espaço observado, trata-se de
espaço vivenciado, da sensibilidade das pessoas com seu entorno”.
Neste sentido, pode se dizer que a paisagem carrega as marcas da História, sendo o
resultado das interações entre o homem e a natureza. Esse aspecto faz com que a
paisagem, além de expressar características complexas da ecologia, expresse outras
relações de ordem sociais e econômicas. Por isso, torna-se necessário compreendê-la em
um sentido mais amplo. Schama (1996) afirma que a cultura e a época passam, todavia,
no ambiente ficam os traços gravados das atividades humanas. Os elementos das
paisagens, neste sentido, podem nos fazer acessar uma vasta informação sobre o que se
passou (ou se passa) em uma cultura, em termos de sua relação com o ambiente.
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Segundo Pronzato (2005, p. 117), a importância das ações antrópicas na paisagem e sua
considerável influência, faz do usuário dos lugares que serão objeto de propostas de
intervenção, um agente em permanente inter-relação com o tempo, o espaço e a
natureza. Neste sentido, o território acaba revelando a dinâmica da sociedade bem como
a luta de classes que permeia a sua conformação.
Desta forma, conclui-se, nesse momento, que a paisagem deve ser entendida, ao mesmo
tempo, como produto e processo social. Fica-se claro que a compreensão da paisagem
exige, sobretudo, uma discussão acerca do território, da ecologia, da cultura e, ainda, de
implicações políticas.
3.1.2.
Projetos participativos - relação com as instituições públicas – Comunidade –
Terceiro Setor- Mercado
Segundo Fredrik Wulz (apud Ramalho, 2005, p. 153), o conceito de participação surgiu
nos anos 60, mas em 1870 já havia cidadãos envolvidos nesse tipo de atividade nos EUA.
Pode-se dizer que a participação se apresenta como diversas possibilidades. Ela também
pode ser chamada de envolvimento dos cidadãos, influência dos cidadãos, ação de grupo
dos cidadãos, co-decisão e auto-gestão. A participação é um conceito geral que engloba
diferentes formas de decisão em nome das partes envolvidas.
De acordo com Boucinhas (2005), o conceito de participação sempre está ligado à
democracia das políticas modernas. Afirma ainda, que a palavra participação tornou-se
uma das mais utilizadas no vocabulário político, científico e popular da modernidade.
Além disso, Boucinhas comenta que dependendo da época e da conjuntura histórica, a
participação aparece associada a outros temas, como democracia, representação,
organização, conscientização, cidadania, solidariedade, inclusão.
No entanto, quando o conceito de participação está embasado ao assunto político pode
ser uma ferramenta de manipulação do pensamento e de decisões. Por outro lado, a
utilização das práticas sociais, leva a ações concretas engendradas nas lutas,
movimentos e organizações, de modo a alcançar algum objetivo, aqui, a participação,
segundo Ramalho (2005), é fundamental para viabilizar conquistas, aprendizados e
novos avanços.
3.1.3.
Gestão Pública - a reconquista coletiva do espaço público
O termo gestão pública, no contexto deste trabalho, aproxima-se muito de “Governança
Ambiental” e diz respeito não apenas a atuação governamental, mas a participação dos
cidadãos, indivíduos de todas as instâncias: Estado, Mercado e Sociedade Civil. Fez-se
então, uma abordagem da evolução das políticas públicas no Brasil e a inserção da visão
do arquiteto nesse processo.
Na gestão pública, o Estado, mesmo sendo o responsável pela formulação de políticas
ambientais, não é o único ator. Na verdade, as ONG’s, os interesses organizados,
também têm desempenhado um papel essencial no processo de construção coletiva da
paisagem.
Assim, entende-se que a condição para a participação social na construção da paisagem
começa pela democratização das instituições públicas. De acordo com a teoria de
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Habermas, há forte necessidade de criação de espaços públicos que promova processos
de tomada de decisão mais dialogados sobre temas de interesse público.
Habermas descarta a possibilidade de que os problemas das sociedades humanas
possam ser resolvidos na instância do Mercado (Via liberal) ou pelo Estado (estruturas de
poder institucionalizadas). Segundo Drummond (2002), Habermas propõe uma instância
intermediária, um diálogo entre a Sociedade civil, o Mercado e o Estado, denominando
esta instância de “esfera pública”:
“A esfera pública, para J. Habermas, é um lócus central onde os atores da sociedade civil
interagem mediante discussões públicas, produzindo um poder comunicacional. Através
de condições procedimentais, os atores sociais agem no espaço público e é nele que são
formadas a opinião pública e a vontade política, as quais legitimarão a lei e a tomada de
decisões político-administrativas. (...).” (TENDRICH, 2005)
Neste sentido, Pereira (2007) complementa que a globalização político-econômica
ocorrida nas últimas décadas alcançou ritmos alucinantes, cuja velocidade dos processos
de ramificação mundial, no âmbito das estruturas de poder, passa a exigir por parte das
amplas camadas desfavorecidas da sociedade, novas contrapartidas conceituais e
organizacionais a fim de fazer frente a essa nova realidade.
Assim, o profissional da paisagem, quanto à sua atuação no projeto, construção ou
gestão, encontrará respostas coerentes com as necessidades da coletividade se buscar
na esfera pública os vários níveis de decisão: Estado, Mercado e Sociedade Civil.
3.2.
“Errâncias” pela área de estudo
Enfrentando as incertezas do território escolhido para o trabalho, o grupo da FAUUSP,
deixando sua terra, tornou-se estrangeiro. Isso, pois, acredita-se que os caminhos da
ciência, como afirma Monteiro de Andrade ao citar Mauro Maldonato, deve sempre
superar a última fronteira, explorando o desconhecido, não sendo apenas conceituais. Os
caminhos da ciência devem também “abrir-se a imagens, aproximações, conexões,
encontros inusitados” (MALDONATO apud ANDRADE, 2007).
Na viagem epistemológica experimentada pelo grupo, a compreensão do espaço foi
formada por dados primários e secundários (fotos aéreas, plantas topográficas, mapas,
informações textuais sobre a área), ou seja, “critérios de racionalidade”, organização e
planejamento, somados aos resultados dos encontros inusitados ocorridos nas idas e
vindas à área de estudo. Procurou-se entender que um bairro urbano não está
determinado apenas pelos seus fatores geográficos e econômicos, mas também pela
forma como os próprios habitantes bem como os vizinhos de outros bairros enxergam o
espaço.
A tolerância dos moradores do local com o “grupo estrangeiro” da FAUUSP,
compreendendo “as diferenças exibidas no confronto das palavras e também dos gestos”,
assim como o desejo deles de melhores condições de vida, tornou a experiência entre as
instituições e a comunidade muito agradável, rica e interessante.
3.3. Contato com os diversos agentes sociais
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Julgou-se imprescindível, para o desenvolvimento deste trabalho, o contato com os
representantes do Programa FUSP – Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo –
Professora Catharina P.C.S. Lima e Professor Caio Boucinhas, cuja experiência em
projetos participativos é indiscutível. Ambos também participam do grupo que está
elaborando o sistema de áreas verdes de Taboão da Serra.
Além deles, o grupo entrou em contato com a Diretora da Secretaria da Habitação, Meio
Ambiente e Desenvolvimento Urbano (SHMADU) da Prefeitura de Taboão da Serra, Ana
Gonzatto. Essa ação foi importante para o grupo entender a intenção da prefeitura para o
local de estudo.
A partir daí, avaliou-se importante estimular uma relação entre a Subprefeitura de
Campo Limpo e a Prefeitura de Taboão da Serra, visando conciliar os esforços para a
implantação de um parque linear na área. Contudo, após algumas tentativas mal
sucedidas de contatar representantes da Subprefeitura de Campo Limpo, optou-se por
continuar o trabalho apenas com a Prefeitura de Taboão da Serra. É importante salientar
que se defende a conciliação dos esforços entre as duas prefeituras, e ainda com a
Prefeitura de Embu, como algo essencial para a sustentabilidade futura daquela região.
Com relação ao terceiro setor, o grupo entrou em contato com a Gerente Executiva do
projeto “Bacias Irmãs”, do Instituto Ecoar – Procam, Débora Teixeira. A partir de uma
reunião entre as alunas da FAUUSP, a Diretora da SHMADU de Taboão da Serra e a
Gerente Executiva do projeto Bacias Irmãs, iniciou-se um trabalho conjunto onde a ONG
auxiliaria o grupo de trabalho da FAUUSP na mobilização da população do entorno da
área de estudo e na organização de oficinas, atendendo uma demanda da Prefeitura.
Assim, nasceu ali uma parceria entre Universidade, Prefeitura e Terceiro Setor.
Com o intuito de potencializar a mobilização da comunidade, a Diretora da SHMADU de
Taboão da Serra contatou a pessoa responsável pelo Programa Saúde da Família (PSF),
de modo a tornar as agentes de saúde, do município de Taboão da Serra, parceiras deste
trabalho. Em uma reunião entre a prefeitura, representantes do Projeto Bacias Irmãs, do
grupo da FAUUSP e das agentes de saúde, surgiu a proposta de realizar a “Caminhada
Diagnóstica”, ou de reconhecimento do rio Pirajuçara, tal qual uma preparação para as
oficinas seguintes.
3.4. Participação em experiências similares
A Prefeitura do Município de Taboão da Serra juntamente com a FUSP – Fundação de
Apoio à Universidade de São Paulo, têm a proposta de projeto e execução, de modo
participativo, de um parque no Bairro Parque Laguna, em Taboão da Serra.
A proposta do parque consiste na conscientização da comunidade para a preservação da
área - uma APP (Área de Proteção Permanente) -, além da participação dos moradores
em todos os processos: desde a discussão da área e questões ambientais, passando pelo
projeto do parque até a formação de um conselho gestor.
A participação nas Oficinas realizadas no Parque Laguna – lideradas pelos professores
Caio e Catharina-, foram importantes no sentido de entender como se dá a relação entre
a comunidade envolvida com o projeto e as demais instituições, adquirindo ainda,
referência sobre elaboração de oficinas.
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O grupo da FAUUSP participou de três das cinco oficinas realizadas junto à comunidade
do Parque Laguna (ver figuras 6, 7 e 8)
Figuras 6, 7 e 8: Imagens da Oficina realizada no dia 06/05/2007 – Parque Laguna. Fonte: grupo FAU USP,
2007.
Ficou bastante clara a importância da participação da comunidade nos processos políticos
dos espaços livres urbanos. Os moradores que convivem ali decidiram que é importante
para eles compreenderam a importância da preservação das nascentes e mata nativa e
mais, entenderam que podem e devem se apropriar desses espaços livres,
compartilhando os sonhos e aceitando opiniões adversas.
3.5. Elaboração de atividades com a comunidade
A intenção foi abordar o tema do Parque Linear tanto na Caminhada Diagnóstica quanto
nas oficinas, envolvendo discussões sobre preservação ambiental, mata ciliar, meio
ambiente, rio, comunidade, cidadania etc.
A Caminhada Diagnóstica, realizada em Taboão da Serra, surgiu como uma possibilidade
de estabelecer um primeiro contato com a paisagem do rio Pirajuçara, no trecho
escolhido para a execução do Parque Linear.
A articulação entre Comunidade, Prefeituras, ONG e Universidade foi realmente
consolidada no dia da primeira oficina. Ao todo, foram realizadas duas oficinas, cujo tema
foi: “Venha discutir o parque linear do seu bairro”. Estas oficinas foram realizadas na
Escola Seninha, no bairro Jardim das Oliveiras, em Taboão da Serra.
3.5.1.
Caminhada Diagnóstica de reconhecimento do rio Pirajuçara
A Caminhada Diagnóstica contou com a participação das alunas do Curso de PósGraduação da FAUUSP; representantes da Prefeitura Municipal de Taboão da Serra;
representante do Projeto Bacias Irmãs – Instituto Ecoar – Procam; lideranças da
comunidade de Taboão da Serra e do bairro Campo Limpo, em São Paulo; e, por fim,
representantes dos Agentes de Saúde de Taboão da Serra - UBS Parque Pinheiros.
O objetivo desta atividade centrou-se no reconhecimento da paisagem do rio Pirajuçara,
no sentido de levantar os problemas e as potencialidades do local (ver figuras 9, 10, 11 e
12). Após a caminhada, discutiu-se acerca do que foi visto. Além de levantamentos
fotográficos, foram feitas anotações.
Figura 9: trecho do projeto para parque linear – margens do rio Pirajuçara. Fonte: grupo FAU USP, 2007.
Figuras 10, 11 e 12: Vista do Piscinão Parque São Mateus. Momentos da Caminhada. Fonte: grupo FAU USP,
2007.
PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
3.5.2.
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Oficina 1
Figura 13: Convite elaborado pelo grupo de alunas da FAU USP. Fonte: grupo, 2007.
A intenção de articular a comunidade e as instituições surgiu, num primeiro momento,
como uma possibilidade de reverter um aspecto que, antes da primeira oficina realizada,
parecia real nessa área: as pessoas da comunidade de Taboão da Serra se preocupam
com a situação do rio Pirajuçara e suas conseqüências apenas de forma isolada, ou seja,
não estão organizadas ou mobilizadas para discutir com a prefeitura, por exemplo, os
problemas e os projetos de seu bairro. No entanto, após a primeira oficina, onde
inúmeras lideranças da comunidade estavam presentes, pode-se notar o equívoco do
grupo da FAUUSP e constatar que a comunidade de Taboão da Serra, em alguns bairros,
está efetivamente organizada, e já vem há algum tempo lutando por melhorias na região.
Um exemplo é a comunidade do bairro Jardim São Mateus, liderada por um casal
extremamente empenhado, que entre outras coisas, ajudou a prefeitura no projeto e
execução da Praça São Mateus, inaugurada no dia 24/06/2007 (ver figuras 14, 15 e 16).
a
b
c
Figuras 14, 15 e 16: Imagens da praça São Mateus. a – dia da Caminhada Diagnóstico; b –
Mutirão para o Plantio de mudas na Praça (14/06/2007)
c - Dia do
Fonte: grupo FAU USP, 2007.
A “Oficina 1” contou também com a participação da Diretora da SHMADU de Taboão da
Serra e outros dois representantes da prefeitura, além de um representante do Projeto
Bacias Irmãs.
O aspecto mais marcante deste evento foi a participação massiva de lideranças
comunitárias, o que exigiu uma readaptação da programação prevista para essa oficina.
E com isso, a equipe de facilitadores dessa oficina (Prefeitura, FAUUSP e Projeto Bacias
Irmãs), pode constatar que há uma disposição enorme da população residente na Bacia
do rio Pirajuçara, ou de pelo menos algumas lideranças, em alcançar melhores condições
de vida. São cidadãos cientes de seus direitos e também de seus deveres.
Estavam presentes, lideranças comunitárias de Taboão da Serra, Embu e São Paulo. A
grande maioria convencida de que a canalização do rio Pirajuçara é a solução para os
problemas de enchentes. Descrentes, muitos deles, não acreditam que os parques
lineares possam resolver uma questão social e ambiental, a um curto prazo de tempo
(ver figuras 17, 18 e 19).
Figuras 17, 18 e 19: Comunidade participando da Oficina 1. Fonte: grupo FAU USP, 2007.
PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
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Após as apresentações dos facilitadores e comunidade, dividiu-se o pessoal em dois
grupos que passaram a discutir e mapear, numa foto aérea, os problemas e
potencialidades da área destinada ao parque linear, em Taboão da Serra (ver figuras 20,
21, 22, 23 e 24). Depois da apresentação dos grupos, fez-se um resgate da Caminhada
Diagnóstica, realizada em maio desse ano. Um casal, do bairro Jardim São Mateus,
localizado em Taboão da Serra, apresentou, a partir de fotos, os resultados dessa
primeira atividade, e, também aproveitaram para mostrar a Praça São Mateus,
inaugurada no dia seguinte (24/07/2007), cujo processo de projeto e execução se deu de
forma participativa (ver figura 25).
Figuras 20, 21 e 22: Grupo 1 – discussão e apresentação dos resultados. Fonte: grupo FAU USP, 2007.
Figuras 23, 24 e 25: Grupo 2 – discussão e apresentação dos resultados. E, apresentação, em Datashow da
Caminhada Diagnóstico. Fonte: grupo FAU USP, 2007.
Durante essa oficina, um dos líderes comunitários, anunciou e convidou todos a
participar da Plenária do dia 13/07/2007, no bairro Campo Limpo, em São Paulo, como
uma forma de discutir a canalização do rio Pirajuçara, juntamente com representantes do
DAEE e SIURB. Uma das lideranças sugeriu que os três municípios – Taboão da Serra,
Embu e São Paulo – elaborassem um documento para ser apresentado no dia da Plenária,
expondo assim, as vontades, sugestões e desejos desses municípios com relação à
canalização do rio Pirajuçara.
Por fim, o grupo de facilitadores sugeriu a realização de uma próxima oficina, com a
intenção de discutir o conceito de parques lineares e, também, a elaboração do
documento a ser apresentado no dia da Plenária.
3.5.3.
Oficina 2
A Oficina 2 contou com a participação de 30 moradores de Taboão da Serra, Embu e São
Paulo, entre lideranças e pessoas comuns. Dentre os participantes, havia uma
quantidade significativa de estudantes da escola Seninha (turma de adultos, moradores
de Taboão da Serra). Além deles, estavam presentes alguns moradores da comunidade e
também lideranças que já tinham participado da Oficina 1 (ver figura 26). Houve,
portanto, a participação de pessoas que, esperançosas, e cientes de que podem
contribuir de alguma forma para a melhoria das condições de vida do seu bairro,
deixaram suas casas dispostas a trocar conhecimentos, aprender alguma coisa e ensinar
também.
Quanto aos facilitadores, participaram neste momento: representantes da Prefeitura de
Taboão da Serra, entre eles a Diretora da SHMADU; a Gerente Executiva do Projeto
Bacias Irmãs; e, por fim, o grupo de alunas da FAUUSP.
PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
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Após a apresentação da programação da oficina, dos facilitadores bem como da
comunidade, a Diretora da SHMADU apresentou o projeto de parque linear para Taboão
da Serra. Durante sua explanação, procurou explicar o conceito de parque linear e a sua
importância ecológica e social. (ver figuras 27 e 28)
a
b
c
Figuras 26, 27 e 28: a – comunidade participando da Oficina; b – comunidade conversando em frente aos
painéis da Caminhada Diagnóstica, elaborados pelas alunas da FAU USP; c – explicação sobre o projeto do
Parque Linear. Fonte: grupo FAU USP, 2007.
Durante esse percurso, iniciou-se uma discussão sobre a plenária do dia 13/07/07. Um
grupo de moradores, com representantes dos três municípios (Taboão da Serra, Embu e
São Paulo) já está trabalhando em um documento cujo objetivo, entre outras coisas, é
reivindicar a proteção dos parques lineares executados em Taboão da Serra, durante a
obra de canalização do rio Pirajuçara.
No fim dessa etapa da oficina, a Gerente Executiva do Projeto Bacias Irmãs sugeriu que a
escola se utilizasse do material exposto pela prefeitura (projeto do parque linear), para
os alunos e professores desenvolverem atividades sobre esse tema, propondo, inclusive,
diferentes usos para o espaço. Desta forma, iniciou-se uma parceria entre a escola e a
prefeitura visando a execução de um parque linear que atenda, quando possível, as
solicitações da comunidade, futura usuária do espaço.
A atividade seguinte foi a experiência da maquete. Esta maquete foi elaborada e testada
dias antes da Oficina 2, pelas alunas da FAUUSP e por educadores ambientais do Projeto
Bacias Irmãs. Primeiramente, tentou-se descobrir junto com a comunidade, os nomes
das árvores que estavam plantadas na maquete, simulando uma floresta. Em seguida, a
discussão sobre a importância da mata ciliar teve início. Os dois lados, tanto o vegetado
quanto o sem vegetação, foram molhados e, então, foi possível perceber claramente que
a floresta ajuda na absorção da água, prevenindo o assoreamento do rio e as enchentes
(ver figuras 29, 30 e 31).
Figuras 29, 30 e 31: Experiência da maquete da mata ciliar x terreno sem vegetação. Fonte: grupo FAUUSP,
2007.
Com o intuito de ilustrar a explicação sobre parques lineares e “renaturalização de rios
urbanos”, bem como dar continuidade à experiência da maquete da mata ciliar, fez-se
uma apresentação, em PowerPoint, de alguns exemplos interessantes, do Brasil e do
mundo, da apropriação das margens de cursos d’água, de projetos de “renaturalização” e
de despoluição de rios urbanos (ver figura 32).
Após uma rodada de canjica, oferecida pela merendeira da escola Seninha, a Oficina 2 foi
finalizada, com a promessa de ser o início de uma série de atividades entre a Prefeitura
de Taboão da Serra, o Projeto Bacias Irmãs e a Comunidade (ver figuras 33 e 34).
PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
a
b
14
c
Figuras 32, 33 e 34: a - Apresentação em PowerPoint sobre outras paisagens fluviais no Brasil e no mundo.
b - Hora da canjica. c - Foto com o grupo de facilitadores (alunas FA USP, Ana Gonzatto – Prefeitura de
Taboão da Serra -, educadores ambientais do Projeto Baciais Irmãs) e o casal Ana e Marcos, lideranças do
Bairro Jardim São Mateus. Fonte: grupo FAUUSP, 2007.
Ao entender que o planejamento de lugares, bairros, cidades podem ser ineficientes pela
simples razão de não considerar as pessoas, com suas diferenças e suas maneiras
diversas de sentir e perceber os espaços, coloca-se neste momento, a sábia reflexão de
um dos maiores mestres da educação brasileira, Paulo Freire:
“Não basta reconhecer que a cidade é educativa independente do nosso querer ou de
nosso desejo. A cidade se faz educativa pela necessidade de educar, aprender... de criar,
de sonhar, de imaginar que todos nós, mulheres e homens, impregnamos seus campos,
suas montanhas, seus vales, seus rios, ...suas ruas, suas praças, suas fontes, seus
edifícios... A cidade é cultura, criação, não só pelo que fazemos nela e dela, pelo que
criamos nela e com ela, mas também é cultura pela própria mirada estética ou de
espanto, gratuita, que lhe damos. A cidade somos nós, e nós somos a cidade...Enquanto
educadora, a cidade é também educanda.” (FREIRE, P. 1997 apud PRONZATO, 2005, p.
51)
4. Considerações finais
A perda de referenciais geográficos e históricos tornou-se uma constante na metrópole
São Paulo. O rio Pirajuçara, “componente dinâmico” de algumas cidades, há tempos
deixou de ser percebido pela população. Ora permeado por habitações, ora entendido
como um canal de esgoto ou um depósito de lixos, ora simplesmente tapado e
transformado numa avenida de tráfego intenso.
É fato que a metrópole São Paulo é caracterizada por inúmeros problemas ambientais,
conseqüentes da forma como a cidade é organizada espacialmente, economicamente.
Contudo, a questão ambiental não deve ser encarada como um problema apenas de
ordem ecológica, deve também, ser entendida como uma questão de ordem econômica,
social e política, levando em consideração a relação entre as ações antrópicas e a
natureza. Esse aspecto torna-se fundamental para a resolução dos inúmeros problemas
da metrópole, uma vez que é a rede social econômica que vem condicionando, por
décadas, a configuração espacial das cidades.
A paisagem percebida e sentida pelo grupo, a partir da vivência, por algum tempo, com a
comunidade, com representantes da Prefeitura de Taboão da Serra e com os educadores
ambientais do Projeto Bacias Irmãs, somou-se aos conhecimentos advindos das
pesquisas bibliográficas.
Pode-se afirmar que foi, no mínimo, chocante sentir o cheiro ruim oriundo do curso
d’água durante as caminhadas pelas margens do rio Pirajuçara. Não há dúvidas quanto à
tristeza e decepção sentidas ao ver o canal de esgoto em que se transformou o rio
Pirajuçara, entulhado de lixos domésticos, circulando, sem peixes, e sendo notado pela
população apenas por causa do mau cheiro e dos ratos. Trouxe esperança perceber a
vontade e a determinação de alguns moradores que vislumbram a construção, ou reconstrução, de uma cidade melhor não só para eles, mas também para seus filhos, seus
PAISAGENS EM DEBATE revista eletrônica da área Paisagem e Ambiente, FAU.USP - n. 05, dezembro 2007
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netos... Vislumbram a sustentabilidade futura da metrópole, cuja desatenção à natureza
vem causando enormes conseqüências para a qualidade de vida humana.
Acredita-se, assim, que somente quando os valores sociais e culturais bem como os
processos naturais são reconhecidos, é possível estabelecer as prioridades e resolver ou
conciliar os conflitos. Certificou-se que melhorar a qualidade ambiental da metrópole, e
de qualquer outro lugar, depende de esforços coordenados dos legisladores dos órgãos
públicos e corporações e instituições privadas; dos arquitetos, urbanistas e paisagistas;
dos cientistas naturais e sociais; dos humanistas e dos cidadãos.
Portanto, as experiências vividas ao longo desse curto período de três meses foram
intensas e suficientes para evidenciar que o habitat transcende o simples fato de se
possuir uma casa; direciona-se, na verdade, para a necessidade de inserção da
comunidade nos lugares de vida, de modo a estabelecer um processo de construção da
cidadania.
Procurou-se, durante todo o percurso, compreender o processo de participação como um
item fundamental na construção coletiva da paisagem, onde os usuários dos espaços a
serem construídos contribuem de alguma forma tanto no desenho quanto no processo de
decisão.
A experiência partilhada vivida neste período, por esse grupo de alunas, teve seus altos e
baixos. Foram momentos de euforia, como o dia em que surgiu a possibilidade do grupo
de trabalho da FAUUSP participar do desenho do parque linear. Decepções e mudanças
de percursos, quando o grupo ficou sabendo do projeto de canalização do rio Pirajuçara.
Todavia, a partilha dos conhecimentos entre as próprias alunas da FAUUSP,
especialmente na escrita deste trabalho, entre a comunidade, as alunas, a ONG e a
Prefeitura de Taboão da Serra, constituíram-se numa rica experiência, agora, entranhada
em cada um dos atores envolvidos, como um patrimônio.
Houve, sem dúvida alguma, um crescimento profissional, mas, sobretudo, um
crescimento pessoal, num processo de auto-conhecimento, de grandes descobertas;
enfrentaram-se desafios e construiram-se laços de amizade entre as pessoas envolvidas
e, entre as pessoas e a paisagem do rio Pirajuçara.
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