CONSCIÊNCIA HISTÓRICA SOBRE O MOVIMENTO DOS CARAS PINTADAS
HISTORICAL CONSCIOUSNESS ON MOVEMENT ON THE PAINTED FACES
CONCIENCIA HISTÓRICA SOBRE EL MOVIMIENTO DE LOS CARAS PINTADAS
Douglas Ferreira dos Santos
Licenciado em História pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG; Mestrando do Programa de PósGraduação em História pela Universidade Federal do Rio Grande-FURG; E-mail:
[email protected]
Profª. Drª. Júlia Silveira Matos
Orientadora do trabalho; Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em História pela Universidade Federal
do Rio Grande –FURG; E-mail: [email protected]
Resumo
A referida pesquisa é parte do trabalho de conclusão de curso de Licenciatura em História pela
universidade Federal do Rio Grande (FURG) localizada na cidade de mesmo nome. O objetivo deste
estudo foi perceber os discursos sobre o movimento dos caras pintadas composto por jovens que
saíram as ruas em manifestações exigindo a saída do então presidente Fernando Collor de Mello. O
referencial utilizado para compreender os discursos, ou seja, a consciência histórica sobre o fato em
questão foi de Fernando Cerri. Para coletar os dados e apropriar-se dos discursos foi realizada oficinas
com estudantes do curso de História utilizando a metodologia de Isabel Barca. Nos materiais
produzidos foi empregada analise de conteúdo a partir da perspectiva de Roque Moraes. Para finalizar,
algumas considerações finais.
Palavras-chave: Consciência História, Caras Pintadas, Juventudes.
Abstract
This such research it is a part of the job of completing the Bachelor's Degree in History from the
Federal University of Rio Grande (FURG) located in Rio Grande city. The aim of this study was to
understand the discourses on the movement of painted faces composed by young people who came out
to the streets in demonstrations demanding the departure of President Fernando Collor de Mello. The
framework used to understand the discourse of the historical awareness of the fact in question was
Fernando Cerri. To collect data and appropriating the discourse workshops with students of history
using the methodology of Isabel Barca was performed. The produced materials was employed content
analysis from the perspective of Roque Moraes. Finally some concluding remarks.
Keywords: Historical Consciousness, painted faces, youths.
Resumen
Esta investigación es parte Del trabajo de conclusión del curso de Licenciatura en Historia de
Universidad Federal de Río Grande (FURG), ubicado en la ciudad del mismo nombre. El objetivo de
este estudio fue comprender los discursos sobre el movimiento de las caras pintadas compuestas de
jóvenes que salieron a las calles en manifestaciones para exigir la salida del presidente Fernando
Collor de Mello. La referencia utilizada para entender el discurso, es decir, la conciencia histórica del
hecho en cuestión fue de Fernando Cerri. Para recoger los datos y apropiarmos de los discursos,
fueram realizadas oficinas con los estudiantes del curso de historia utilizando la metodología de Isabel
Barca. En los materiales producidos se empleó el análisis de contenido desde la perspectiva de Roque
Moraes. Por último, algunas observaciones finales.
Palabras clave: la conciencia histórica, caras pintadas, jóvenes.
Introdução
A escolha desta temática, além de ser de interesse do autor no que tange sobre a
atuação dos jovens na História, refere-se à necessidade de compreender como esse fato
histórico do tempo presente é visto. Essa pesquisa faz parte do trabalho de conclusão de curso
de Licenciatura em História na Universidade Federal do Rio Grande (FURG) que teve como
objetivo perceber as representações do movimento dos caras pintadas nos livros didáticos e os
discursos sobre as manifestações que exigiram a saída de Collor da presidência.
O movimento dos caras pintadas foi composto, em sua maioria, por jovens que
exigiram o impeachment do presidente Fernando Affonso Collor de Mello, envolvido em
esquemas de corrupções e denunciado pelo irmão, Pedro Collor. O nome do movimento é por
causa da utilização da tinta guache nas cores verde e amarela usada nos rostos em sinal de
patriotismo e expressão.
Os caras pintadas foi considerado por vários pesquisadores o último manifesto de
forma massiva realizado pela juventude brasileira até o advento das manifestações em prol do
transporte coletivo, que ocorreram no ano de 2013. Por se tratar de um acontecimento da
História do tempo presente e protagonizado pela juventude, o movimento dos caras pintadas
permite, além de trabalhar a História recente da política brasileira, abordar as questões que
envolvem o público juvenil como protagonismo e participação política.
Após as analises nos livros didáticos e percebendo que esse material didático
distribuído gratuitamente para as escolas públicas brasileiras traz uma representação
padronizada sobre o assunto, sentiu-se necessidade de apropriar-se da consciência histórica de
sujeitos para compreender quais as narrativas sobre o fato pesquisado. Foi realizada uma
oficina sobre o comportamento juvenil com os acadêmicos do curso de História (Licenciatura
e Bacharelado) da Universidade Federal de Rio Grande, localizada na cidade de mesmo nome.
Durante a atividade, foi produzido material de forma escrita, que foi utilizado para análise de
conteúdo para conhecer as narrativas sobre os caras pintadas.
Consciências Históricas
A História está sempre em movimento, não é estática, e o que hoje é tido como
verdade amanhã pode ser descartado. É papel do historiador questionar constantemente a
História e estar atento ao contexto histórico produzido. Para isso, é preciso observar por quem
tal fato histórico é descrito e quais as possíveis intenções que motivaram o discurso.
A história permite, afinal, compreender que todas as coisas estão sempre vinculadas
a contextos, e só são compreendidas se os contextos em que surgem e se
desenvolvem são esmiuçados. Por isso são relativas, por relacionarem-se a
contextos, condições, pessoas e posicionamentos (CERRI; 2011; p.65).
Cerri discorreu sobre a relevância em compreender o contexto considerando as
condições, pessoas e posicionamentos. É comum o ser humano querer fazer memória sobre
acontecimentos do passado que vivenciou ou que ouviu falar, e ao relatar utiliza-se da
organização do pensamento e de características muitas vezes construídas coletivamente. Com
a consciência histórica, é possível realizar uma leitura do passado mesmo que o fato tenha
acontecido em temporalidade diferente a do sujeito. Mesmo assim, ele é capaz de contar
particularidades sobre os acontecimentos realizando uma leitura a partir do presente. “O
passado não está a salvo das intenções do presente de dar tal qual significado ao tempo, aos
personagens históricos, à nação. O presente - bem como o futuro - depende de um passado
relativamente móvel, que possa ser relido” (CERRI; 2011; p.11-12).
O movimento dos caras pintadas, fato histórico do Tempo Presente na História da
política brasileira, marcado pelas manifestações populares com a participação predominante
de jovens, era considerado, até as manifestações que aconteceram em 2013, a última
manifestação com a participação massiva da população brasileira. Muitos sujeitos
participaram ativamente dos protestos, acompanharam pela imprensa ou se comportaram com
indiferença, porém todos certamente têm narrativas sobre o episódio.
Os sujeitos que hoje estão dentro da faixa etária juvenil, em 1992 eram crianças ou
ainda nem tinham sidos gerados, porém de alguma forma são capazes de realizar uma leitura
do fato histórico em questão, seja pelo conhecimento adquirido no ambiente escolar, pela
mídia, família ou até mesmo a partir das redes sociais, em virtude das constantes comparações
entre o movimento dos caras pintadas com as manifestações realizadas em várias cidades
brasileiras em 2013.
As narrativas predominantes sobre o movimento dos jovens que pintaram os rostos
como expressão da insatisfação com a política brasileira hoje são legitimadas, e uma das
causas para tal afirmação é o posicionamento da mídia. A mídia televisiva foi mudando seu
discurso à medida que as manifestações foram ganhando visibilidade e adeptos pelo Brasil.
Com isso, os discursos sobre o movimento dos caras pintadas se alteraram, passando a fazer
parte positivamente da consciência histórica. As manifestações de 2013 tiveram o processo
parecido, porém na atualidade ainda é ressaltado os aspectos considerados negativos pelas
empresas de televisão, como a depredação do patrimônio público e privado.
Essa construção de discurso e definição sobre identidade coletiva (que também é
individual) é a leitura de uma memória inserida, conforme discorreu Luis Fernando Cerri
(2011):
Tais questões, de fundo identitário, estão na base do conceito de consciência
histórica que, em poucas palavras, podemos definir como um das estruturas do
pensamento humano, o qual coloca em movimento a definição da identidade
coletiva e pessoal, a memória e a imperiosidade de agir no mundo em que se está
inserido (CERRI; 2011, p. 13).
Outro fator determinante para compreender as diferentes leituras sobre o mesmo fato
histórico se refere às experiências pessoais de cada sujeito. A trajetória é relevante para a
construção e o entendimento da consciência história, que pode ser sobre o passado ou sobre o
futuro. A identidade e a cultura são características que influenciam a memória para a ação no
presente. “A consciência histórica, entretanto, não se resume ao passado e à memória, mas às
projeções que fazemos para o nosso futuro” (CERRI; 2011; p. 15).
A organização individual do pensamento, visão de mundo, leitura sobre o passado, são
narrativas decorrentes do planejamento, organização da consciência e construção da
identidade. Cerri (2011) aponta para essas considerações:
Projeto o futuro, imediato, de médio prazo ou distante, e com isso tomo as decisões
que me permitem agir, porque nunca ajo apenas para que hoje seja igual a ontem,
mas trabalho a partir da possibilidade de que no amanhã se realizem minhas
expectativas, mesmo que de um cotidiano pacato e seguro. Nessa dinâmica, a minha
identidade (construída em grande parte pela minha história) e a identidade coletiva
(construída em grande parte pela história nacional) são fundamentais. E aqui está a
ligação entre a consciência histórica e o ensino de história, bem como com os vários
usos sociais que o conhecimento histórico assume (CERRI; 2011; p. 15).
Os professores também são responsáveis pela construção da consciência histórica,
podendo legitimar aquelas estabelecidas e/ou contribuir em novos discursos a partir da
identidade. Cerri (2011) discorreu sobre o que se acabou de afirmar:
Logo, os professores de história somos também protagonistas desse jogo, voluntária
ou involuntariamente, consciente ou inconscientemente. Produzimos, com nosso
trabalho, parte de nossas identidades pessoais, políticas e profissionais, e
participamos da constituição das identidades dos outros (CERRI; 2011; p. 16).
A identidade coletiva se confunde com a identidade individual. Pode ser que a
identidade individual tenha características particulares, porém é rodeada de influências
externas (coletivo) com as quais o mesmo sujeito também contribuiu para essa criação. A
consciência histórica, do mesmo modo que a identidade é construída pelo coletivo.
As narrativas sobre o movimento dos caras pintadas são consciências históricas
construídas ao longo da História pelos sujeitos oriundos de diversas realidades, politizados ou
não, participantes ou não do fato histórico, com mais ou menos saberes.
Luis Fernando Cerri (2011) discorreu sobre a vertente de dois pensadores de tempos
diferentes, Agnes Heller e Jörn Rüsen. Para eles, a consciência histórica é um das condições
do pensamento e não está restrita a um determinado período de tempo (CERRI; 2011; p. 28).
Cerri ainda aponta que o professor é capaz de identificar e trabalhar com a consciência
histórica dos sujeitos no processo educativo:
Se o ensino da história implica o gerenciamento dos objetivos curriculares e das
concepções de tempo e de história que os alunos já trazem consigo desde fora da
escola, então o professor de história definitivamente não é um tradutor de
conhecimento erudito para o conhecimento escolar, um simplificador de conteúdos.
É, sim, um intelectual capaz de identificar os quadros de consciência histórica
subjacente aos sujeitos do processo educativo – inclusive o seu próprio – e de
assessorar a comunidade na compreensão crítica do tempo, da identidade e da ação
na história (CERRI; 2011; p.18).
Essa afirmação de Cerri (2011) vai ao encontro do que já foi discorrido, ou seja, a
consciência história está presente no ser humano independente do nível de sua
intelectualidade. O caminho percorrido pelo sujeito agrega experiência na construção da
identidade pessoal e coletiva, é o espaço que a consciência histórica ocupa nas relações
humanas:
O espaço que a consciência histórica ocupa nas relações humanas pode ser
percebido por diversos elementos, mas o principal (e provavelmente aquele do qual
os demais derivam) é a identidade coletiva, ou seja, tudo aquilo que possibilita que
digamos nós (e eles) (CERRI; 2011; p.41).
As narrativas construídas pela consciência histórica devem ser enxergadas a partir dos
contextos de seus criadores. As ideias enraizadas podem proporcionar dificuldades para serem
analisadas, dificultando novas abordagens porque foram concedidas com preconceitos
(CERRI; 2011; p.62). Sendo assim, as memórias sobre determinados fatos podem ser
realizadas negativamente a partir dos discursos gerados pelos dominantes, cujo interesse é
defender seus interesses nem que seja preciso omitir ou empregar informações distorcidas. A
partir dessa discussão, nos questionamos sobre quais percepções teriam os jovens que
ingressaram no curso de História da Universidade Federal do Rio Grande, os quais saíram a
pouco do Ensino Médio, tema que discorreremos a seguir.
4.2- Oficina sobre Comportamento Juvenil na História do Tempo Presente
A oficina foi realizada com acadêmicos do curso de História (Licenciatura e
Bacharelado) da Universidade Federal do Rio Grande em duas etapas e foram destinados
quatro períodos de 50 minutos cada. O objetivo desta atividade é se apropriar das narrativas
realizadas sobre o movimento dos caras pintadas e compreender qual a relação das
abordagens realizadas pelos livros didáticos utilizados pelos universitários no terceiro ano do
ensino médio.
A escolha da realização da oficina na universidade é por considerar que os graduandos
matriculados no segundo semestre do ano de 2013 na disciplina de Teorias e Metodologia I
têm uma consciência histórica diferenciada dos sujeitos de outras áreas. Defende-se a hipótese
de que os alunos de graduação, principalmente dos cursos das humanas, são mais
contestadores e questionadores. Outro fator decisivo para essa escolha é por acreditar na
afinidade dos sujeitos que participaram da atividade com a ciência histórica.
No início do primeiro dia de oficina, foi entregue aos participantes um questionário
(ver anexo) para se obter algumas informações em relação à trajetória dos sujeitos e
conhecimentos prévios sobre o assunto. Após todos terem respondido e o material ser
recolhido, foi realizado uma dinâmica de leituras de imagens.
Foram espalhadas imagens do movimento dos caras pintadas e das manifestações que
aconteceram em 2013 pela sala enquanto os participantes as analisavam. Após alguns
minutos, foi solicitado que cada estudante permanecesse próximo a imagem que mais lhe
chamou atenção e conversasse com os demais, partilhando as impressões e sentimentos ao
visualizá-la. Diante do grande grupo, foi solicitado que um representante do grupo menor
fizesse uma explanação sobre o contexto histórico, quais sensações e percepções que tiveram
a partir das observações.
Após as análises das imagens, foi realizada uma “explosão de ideias”, que consiste em
escrever palavras, neste caso um conceito, no quadro ou em qualquer outro material para
provocar os demais para uma reflexão no coletivo. A reflexão em questão foi sobre
“protagonismo juvenil”. À medida que cada acadêmico partilhava uma ideia sobre o termo
proposto para reflexão, anotações foram sendo realizadas.
No segundo dia da oficina, foi exibido um documentário1 intitulado Era uma vez um
presidente - Collor, impeachment e os caras pintadas, produzido por Marina Camargo, Thaísa
Gazelli e Ana Pereira, disponível no canal do Youtube. Após a exibição, foi realizada uma
reflexão sobre o vídeo e foi criado o perfil da juventude das décadas de 1960, 1970, 1980,
1990, 2000 e 2010 a partir das contribuições e memórias dos acadêmicos. Em cada década,
procurou-se pensar sobre a vestimenta, música, fatos históricos, filme, culinária, esporte,
moda...
Para finalizar, foram entregues alguns questionamentos (ver anexo) sobre o tema
estudado para perceber quais os conhecimentos adquiridos e quais os discursos adotados pelos
acadêmicos depois dos momentos de discussões na oficina. As questões deveriam ser
respondidas após análises de três fontes: o documentário exibido, imagem e trecho de um
artigo sobre o movimento dos caras pintadas, disponibilizados no próprio material entregue.
A atividade foi preparada a partir das orientações de Isabel Barca (2004), que propõe a
metodologia oficina aula, que permite que os sujeitos participem ativamente em todo o
processo, construindo de forma coletiva o conhecimento. Ela aponta para a relevância dos
conhecimentos prévios e que o conteúdo a ser trabalhado tenha alguma ligação com os
educandos:
Lecantar e trabalhar de forma diferenciada as idéias iniciais que os alunos
manifestam tacitamente, tendo em atenção que estas idéias prévias podem ser vagas
ou mais precisas, mais alternativas à ciência ou mais consistentes com esta. Propor
questões orientadoras problematizadoras, que constituam um desafio cognitivo
adequado aos alunos em presença e não apenas um simples percorrer de conteúdos
sem significado para os jovens (BARCA; 2004; p.135).
Para a autora, é importante identificar os conhecimentos existentes nos educandos
através de tarefas e outras estratégias (trabalho escrito individualmente ou em grupos) para, a
partir daí, avançar no objetivo da atividade. A interação e troca de conhecimento entre os
pares é relevante para o estudo.
4.3- Perfil dos Participantes e Narrativas sobre o Movimento dos Caras Pintadas
Diante das narrativas que o ser humano é capaz de realizar e considerando que são
construídas ao longo de sua trajetória, experiências formativas adquiridas e de materiais
1
Documentário: Era uma vez um presidente - Collor, impeachment e os caras pintadas. Disponível em:
http://www.youtube.com/watch?v=QQjs9nMdT7I
acessados que influenciam na construção de um conhecimento histórico, indaga-se sobre a
influência do livro didático na construção de uma leitura sobre o movimento dos caras
pintadas. Para isso, é preciso tecer algumas considerações sobre a trajetória dos participantes
da oficina para compreender as visões sobre o fato histórico.
Participaram da oficina 39 acadêmicos, porém somente 21 (11 mulheres e 10 homens)
se fizeram presente nos dois dias da atividade. Serão utilizados para análises somente os
materiais produzidos por aqueles que se fizeram presente nas duas etapas da oficina. As
análises qualitativas, assim como realizadas nos livros didáticos, foram a partir da perspectiva
de Moraes (2007).
No gráfico a seguir, podem-se observar algumas informações sobre os acadêmicos que
participaram da oficina realizada.
No público participante da oficina, no que refere ao sexo feminino, a predominância é
de jovens e, no sexo masculino, a quantidade é igual entre jovens e adultos. Os sujeitos que
estão acima de 30 anos, a maioria, são homens, diferentemente daqueles que estão na faixa
etária entre 15 a 29 anos, que são do sexo feminino. A maioria estudou em escola pública e
71% (totalizando homens e mulheres) utilizaram o livro didático no terceiro ano do ensino
médio.
Ao relatar sobre a utilização do livro didático, é notável a mudança de opiniões sobre
esse recurso didático e a utilização, muitas vezes mecânica, conforme se pode perceber nas
seguintes frases:
- Na minha escola da época, o livro era utilizado apenas para a realização de
pequenos questionários e, mesmo assim, era raro (Sujeito D).
- Eu acreditava no que estava no livro, era a verdade absoluta. Não discordava e não
tentava saber se realmente era a verdade absoluta (Sujeito Q).
- Eram Livros que contavam apenas uma versão da história (Sujeito M).
- De que o livro seria absoluto, de que nele teríamos uma base sólida de conhecimento
(Sujeito P).
O sujeito D expõe que a utilização do livro pelo professor não era frequente, porém,
quando usado era da mesma forma. Os sujeitos Q e P afirmam que tinham o livro didático
como verdade absoluta, já o sujeito M aponta que era apresentada apenas uma versão da
História. Essas afirmações realizadas comprovam o que foi discutido no primeiro capítulo no
que se refere à importância dada pela comunidade escolar ao livro didático e que, na maioria
das vezes, o educador não adverte os alunos sobre a capacidade da construção ideológica
deste material, que é tendencioso.
Nos dados sobre a participação em organizações, percebe-se que as mulheres estão
mais engajadas do que os homens. Cabe salientar que tanto no sexo masculino quanto no sexo
feminino aqueles que estudaram na escola privada participavam de alguma organização.
Dentre as organizações que foram citadas, as que mais apareceram foram: grupos de jovens da
Igreja Católica, grupo de jovens Espíritas, movimentos sociais e sindicatos dos trabalhadores.
A partir destas informações e das que foram discorridas nos questionários, é visível a presença
das religiões para a fomentação do protagonismo.
Inspirado por Barca (2001), que se utilizou de outros referenciais, estabeleceu-se três
perfis em relação às argumentações prévias sobre o assunto, como: respostas menos
elaboradas e fragmentadas; posicionamentos padrões e do senso comum e respostas reflexivas
e críticas.
O perfil 1- caracteriza-se por respostas rápidas e fragmentadas, ideias sem conclusão e
confusas, muitas vezes sem argumentações. Quando indagados sobre a compreensão do
protagonismo juvenil, este perfil, em geral, responderam que é tudo aquilo referente ao jovem
e que chama atenção para si. É a liberdade da juventude em se comportar como deseja. A
seguir, algumas frases que elucidam o que foi discorrido:
- Quantos certos aspectos e estatísticas são liderados por jovens (Sujeito S).
- É quando se toma as decisões, somos nós mesmos, agimos da forma que achamos
certo (Sujeito G).
- Compreendo que o protagonimo juvenil é a área onde só o jovem atua como
prioridade (Sujeito E).
- A grande atuação dos jovens nos movimentos sociais (Sujeito A).
- Minha compreensão a respeito do protagonismo juvenil, tendo em vista a área da
educação, onde o jovem assimila as informações que são passadas, e em contra partida gera
informações de acordo com assunto, no final atribuirá o seu posicionamento de ponto de
vista próprio (Sujeito T).
Nas respostas destes sujeitos pertencentes ao perfil 1, percebe-se que o
posicionamento em relação ao protagonismo juvenil é considerado simplesmente qualquer
ação desempenhada por jovens (sujeito S, G e E). Ainda afirmaram que o protagonismo
juvenil está ligado a uma área de atuação, como os movimentos sociais (sujeito A),
desconsiderando outras organizações. O sujeito T, ao relatar sua compreensão sobre
protagonismo, o realiza de forma confusa, como se o jovem fosse um agente propagador de
ideias já estabelecidas.
Em relação ao movimento dos caras pintadas, os universitários fizeram considerações
sobre a saída do presidente Fernando Collor de Mello. Vários não souberam responder ou
mencionaram a fonte de seus conhecimentos, mas é visível que o movimento é caracterizado
por 57, 1 % dos que participaram da oficina, como uma organização que simplesmente exigiu
a saído do presidente, porém, não é atribuída ao jovem a participação nos caras pintadas e
nem considerado o papel da mídia durante esses acontecimentos.
As frases a seguir
comprovam o que foi afirmado acima.
- Foi um movimento criado para o impeachment do presidente Collor (Sujeito E).
- Nenhum, não era nascido (Sujeito F).
- Foi um movimento para pedir impeachment do então presidente Collor (Sujeito G).
- Foi o movimento que os brasileiros fizeram para a retirada do presidente Collor da
presidência (Sujeito J).
- Movimento Juvenil em protesto à situação política no governo de Collor (Sujeito D).
- Caras pintadas ficou marcado como o protesto para o impeachment do presidente
Collor (Sujeito Q).
- Quase nenhum. Só que foi o movimento para tirar o Collor do poder (Sujeito S).
Quando questionados sobre as motivações que levam a juventude a se organizar para
reivindicar e assegurar os seus direitos, as respostas obtidas foram: a busca por melhorias nas
condições de vida, insatisfação em relação ao status quo e insatisfação ao governo. Apenas o
sujeito N apontou para outra visão no que se refere às motivações da organização juvenil,
conforme frase a seguir:
- Na sua grande maioria, nem sabem o que estão falando nas passeatas, vão porque
outros estão lá (Sujeito N).
O sujeito em questão se contradiz ao afirmar que a juventude participa das
manifestações por causa da presença de outros jovens, negando as lideranças que pensaram e
organizaram os atos públicos. Ou ele ignora a juventude organizada ou esqueceu-se de
mencionar quem foi que motivou os demais a saírem às ruas.
No perfil 2 predominam-se posicionamentos padronizados com resposta do senso
comum, com informações certamente influenciadas pelos livros didáticos e sem reformulação
pessoal. No que tange as respostas sobre o protagonismo juvenil, ficou evidente uma visão
mais elaborada que no perfil anterior. Segue alguns posicionamentos sobre a questão:
- Penso que seria uma juventude atuante, protagonista de seu tempo (Sujeito P).
- O protagonismo seria a participação do jovem em diferentes movimentos ou grupos
sociais, os quais estão reunidos por direitos ou enfatizando uma causa específica (Sujeito K).
- Protagonismo juvenil, no meu ponto de vista, é a participação da juventude nas
questões decorrentes de uma sociedade, sejam elas políticas, sociais, religiosas... (Sujeito I).
- Penso que protagonismo juvenil consiste em ter a participação social, independente
do grupo, se for político, religioso, etc. Tentando sempre fazer a diferença no seu meio onde
vive.
- Protagonismo é a pessoa que atua ou participa de grupos, ou se insere na sociedade
de maneira atuante (Sujeito O).
- Protagonismo Juvenil seria a participação mais intensa do jovem em atividades que,
geralmente, não são de interesse da juventude. Seria possível dizer que é a tomada de
consciência, pelo jovem ou adolescente da dianteira dos movimentos e situações fora do seu
cotidiano. (Sujeito B).
Embora a percepção acerca do protagonismo juvenil seja mais elaborada, as posições
estabelecidas do que é ser protagonista estão relacionadas a atuar nas questões fora do
cotidiano, como ficou evidente na resposta do sujeito B. Protagonismo juvenil está muito
mais associado à participação política do que escolhas conscientes dos jovens, independente
das ideologias.
Há semelhanças nas narrativas sobre o movimento dos caras pintadas realizadas pelos
universitários e as abordagens feitas pelos autores nos livros didáticos.
- Foi um movimento que começou pela mídia, que ganhou notoriedade pela mídia,
mas que ajudou no processo do impeachment do então presidente Fernando Collor, acusado
de corrupção (Sujeito B).
- Foi o movimento estudantil liderado pela UNE, que convocou todos a irem às ruas
pedirem o afastamento do então presidente eleito Fernando Collor de Mello, e resultou na
sua cassação (Sujeito O).
- Foi o movimento em que o povo saiu para rua pedindo a saída do presidente
Fernando Collor de Mello (o caçador de marajás), movimento esse que começou com os
jovens nas faculdades (sujeito C).
- Foi um movimento pelo impeachment do presidente da época, Collor. Eles foram às
ruas protestar com os rostos pintados, reivindicando a saída de Collor da presidência
(Sujeito P).
- Foi um movimento que pediu o afastamento do presidente Collor. Esse movimento
foi organizado principalmente por estudantes que saíram às ruas com as caras-pintadas
(Sujeito M).
Embora o movimento dos caras pintadas tenha sido uma organização, sobretudo de
jovens ligados à União Nacional dos Estudantes, com sentimento de insatisfação contra o
governo de Fernando Collor de Mello, alguns aspectos além deste são relevantes salientar no
que diz respeito sobre o comportamento da juventude. A mídia com certeza influenciou
muitos sujeitos a participarem das manifestações, mas não a ponto da organização em âmbito
nacional, conforme afirmado em livros didáticos e narrativas realizadas sobre os caras
pintadas.
Ao serem questionados sobre os sentimentos que motivaram as juventudes a se
organizarem, as respostas que expressam o pensamento de todos os sujeitos do perfil 2 foram
as seguintes:
- Uma forma de consciência coletiva e que influenciada por outras coisas acaba
levando todo mundo a protestar (Sujeito M).
- Descontentamento com a política, condições de vida que vão contra as condições
necessárias (Sujeito P).
Assim como no perfil 1, as motivações para a organização da juventude são a
insatisfação com o que está estabelecido, decepções com o governo e descontentamento com
a política.
Somente um dos participantes se enquadrou no perfil 3, cujas características são de
aprofundamento, críticas e reflexões em relação ao movimento dos caras pintadas, porém, ao
discorrer sobre sua compreensão acerca do protagonismo juvenil, poderia pertencer ao perfil
2, conforme pode-se comprovar a seguir:
- Movimentos juvenis de engajamento político, que se organizam com a perspectiva de
reivindicarem um conjunto de ideias (Sujeito R).
Ao relatar sobre o movimento dos caras pintadas, o sujeito traz personagens
desconhecidos para os demais participantes da oficina, além de realizar uma reflexão sobre o
comportamento da juventude e da mídia frente ao fato histórico.
- O movimento dos Caras Pintadas ocorreu no início de 90, no governo de Collor,
protagonista da campanha “Fora Collor”. O movimento foi composto, essencialmente, pela
juventude e tinha a figura de Lindberg Farias, então presidente da UNE, seu líder. Apesar da
sua legitimidade, os caras pintadas também é um belo exemplo de manipulação da grande
mídia. Sabe-se que o Sr. Fernando Collor foi eleito graças a Rede Globo de Televisão,
porque naquele momento o mesmo se apresentava como o que atendia seus interesses. Depois
do desastroso início de governo, a Globo percebendo que representava mais como um
problema que solução (Sujeito R).
Apesar da padronização ao narrar sobre o movimento dos caras pintadas, o sujeito R
realizou reflexões sobre o comportamento da mídia no fato histórico. Não cabe aqui avaliar se
as considerações são corretas ou incorretas, mas conhecer as narrativas sobre o movimento
dos caras pintadas.
No que se refere sobre as motivações que levaram as juventudes a se organizarem, o
sujeito relatou duas possibilidades, sendo uma delas o processo histórico de engajamento
social e a outra a manipulação da mídia.
Para estabelecer breves comparativos entre o movimento dos caras pintadas e as
manifestações que aconteceram no ano de 2013, intituladas Black Bloc2, as perguntas finais se
referiram à participação dos sujeitos em ambas as manifestações e o papel da mídia na
cobertura dos fatos. Todos os sujeitos aqui organizados por perfil dão legitimidade ao
movimento dos caras pintas e questionam as pautas das manifestações juvenis que
aconteceram no ano de 2013. Nos dois fatos históricos, a mídia não deixou de ser tendenciosa,
legitimou o movimento dos caras pintadas e marginalizou o Black Bloc.
Ninguém participou do movimento dos caras pintadas devido à idade ou por ser
militar, como ficou evidente em duas respostas. Já nas manifestações ocorridas no ano de
2013, os números de participantes totalizaram seis, dos quais alguns destes fizeram questão de
salientar que participaram enquanto os protestos eram pacíficos.
Na segunda etapa da oficina, foi exibido o documentário e construído um perfil de
cada década do jovem, com o intuito de apropriar-se do contexto histórico, lutas e
organizações juvenis. Essas atividades contribuíram para realizar comparações entre três
fontes, fazendo, assim, uma nova leitura sobre o movimento dos caras pintadas, agora com o
aporte teórico.
Foram usados como fonte o documentário exibido, imagem e trecho de um artigo
sobre o movimento dos caras pintadas, que possibilitou analisar e perceber os discursos dos
acadêmicos antes e depois da participação na oficina e quais pontos que continuaram fazendo
parte das narrativas.
Dos 21 participantes, 17 não lembram como foi trabalhado esse acontecimento no
terceiro ano do ensino médio e dentre as justificavas estão entre a conclusão do ensino básico
a partir de supletivos e que o professor não conseguiu chegar a abordar a História até a década
de 1990 por causa do tempo. Alguns mencionaram que os conhecimentos que possuem são a
partir dos relatos de familiares e reportagens vinculados na mídia. Aqueles que apontaram a
forma como foi trabalhada no último ano afirmaram que o conteúdo foi realizado de forma
rápida, sem a utilização de fontes.
O segundo questionário possibilitou material para análise para compreender quais as
leituras sobre o movimentos dos caras pintadas, a partir de seis questões. A primeira, sobre as
2
Alguns pesquisadores (sociólogos, historiadores, antropólogos...) utilizam-se desse termo para retratar as
manifestações juvenis ocorridas esse ano no Brasil. Black Blocks, blocos negros, foi uma estratégica política
anticapitalista de que nasceu na Alemanha na década de 1970 com o intuito de destruir patrimônios símbolos do
capitalismo, como Mc Donald’s. Utiliza-se de máscaras e roupas pretas como cor da negação, segundo Carvalho
(2013).
fontes, com o intuito de perceber se os universitários conseguiam perceber as diferentes
vertentes sobre o mesmo assunto. Já a segunda, indagação do objetivo, era perceber, através
de suas leituras, a posição da mídia em relação ao movimento, como ele foi retratado e
fluências para a construção do discurso hoje empregado ao movimento.
Na quarta pergunta, a ideia foi de provocar os estudantes para analisar o movimento
dos caras pintadas e as manifestações de 2013 para possíveis semelhanças. Na penúltima
questão sobre qual das fontes apresentadas se aproximava mais com o conhecimento histórico
de cada sujeito, o objetivo foi de se apropriar do material mais presente na construção das
narrativas. Por fim, foi perguntado de que forma o movimento dos caras pintadas foi abordado
no último ano do ensino médio, cujos resultados já foram explanados anteriormente.
Obtidas as seguintes informações, foi possível a construção deste quadro ilustrativo
que possibilitou discorrer sobre o assunto. A necessidade desta visualização partiu utilizando
a proposta de Moraes (2007) sobre categorias emergentes.
Categoria: Movimento dos Caras Pintadas
Unidade de Referencia
Relações
Visão sobre Motivações
estabelecidas
a mídia
para
entre as fontes
surgimento dos pintadas
Satisfatório
Satisfatório
Sujeito
Sim
Sim
A
X
Não
X
Satisfatório
Sim
Não
X
Satisfatório
Sim
X
C
X
X
X
X
E
F
X
X
X
X
G
X
X
H
X
X
I
X
X
J
X
X
K
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Não
X
X
X
Sim
X
X
X
Satisfatório
X
X
X
Não
histórico
X
X
ao
e conhecimento
Black Bloc
B
D
Fontes
o entre os caras próximas
caras pintadas
Não
Semelhanças
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
L
X
M
N
X
X
X
X
X
X
X
O
X
P
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Q
X
X
X
X
X
R
X
X
X
X
X
S
X
X
X
T
X
X
X
X
X
X
X
X
U
X
X
X
X
Compreender a capacidade dos participantes da oficina em ler fontes diferenciadas
sobre o mesmo fato histórico foi o objetivo neste primeiro momento. Conforme se pode notar,
52,4% responderam de forma satisfatória, percebendo que as fontes além de serem de
linguagens diferentes, traziam pontos de vistas variados. Apontaram para as defesas dos
jornalistas no documentário e ainda questionaram sobre as origens do material pesquisado. Os
demais, totalizando 47,6%, simplesmente descreveram as informações que cada fonte
apresentava, sem fazer relações entre elas. Para elucidar, utilizou-se a resposta do sujeito A,
que conseguiu atingir o esperado, discorrendo de forma simples e breve, e do sujeito C, que
analisou de forma superficial, não aproveitando as particularidades de cada uma:
- Elas apresentam visões diferenciadas do mesmo fato. Cada qual mostrou a atuação
dos estudantes diante do movimento Fora-Collor, porém com visões diferenciadas, algumas
valorizando menos a participação e outras mais (Sujeito A).
- As relações são as razões das manifestações, a pedido de saída, ou seja,
impeachment do presidente (Sujeito C).
A resposta do sujeito C demonstra a dificuldade em analisar as fontes, considerando os
diversos contextos históricos e por quem foi produzido. Os resultados em relação ao
comportamento da mídia em retratar o movimento dos caras pintadas foram iguais se tratando
de porcentagem em relação ao primeiro questionamento. Porém, no que se referem a respostas
satisfatórias, os acadêmicos mencionaram sobre a mudança de discurso da mídia sobre os
caras pintadas, percebendo que ela criminalizou, em alguns momentos, as manifestações, não
fazendo questão de tentar esconder a imparcialidade, manipulando a opinião pública. A
resposta do sujeito J demonstra, de forma geral, as reflexões realizadas pelos universitários,
que de forma satisfatória responderam a questão:
- A mídia, após ter apoiado muito a eleição do presidente Collor, após a descoberta
do desvio ficou contra o presidente. A mídia começou a “valorizar” os caras pintadas e eles
não foram colocados como vândalos ou baderneiros e sim jovens que foram às ruas pelo país
(Sujeito J).
A resposta que acabou de ser discorrida traz os pontos abordados pela maioria dos
acadêmicos. As posições consideradas insatisfatórias responderam generalizando o
comportamento da mídia, não percebendo seus diversos interesses. Nesta outra resposta, fica
clara a falta de argumentos sobre os meios de comunicação, neste caso a televisão:
- Do conhecimento que tenho sobre isso, a mídia, por já ter apoiado o Collor em sua
eleição, fez o que pode para que ele continuasse no cargo de presidente, indo contra os
movimentos dos caras pintadas (Sujeito P).
Para as considerações sobre as motivações que levaram à organização dos movimentos
dos caras pintadas, as respostas satisfatórias totalizaram 66,7%. Porém, cabe salientar que em
nenhuma das respostas foi mencionado que a União Nacional dos Estudantes foi a
organização que tomou iniciativa nos protestos e que as manifestações que acorreram em
diversas cidades brasileiras foram aderidas pela comunidade civil e outras organizações. Nas
respostas, destaca-se o desgosto pelo governo de Fernando Collor de Mello, envolvimento em
escândalos e esquemas de corrupção, como se pode perceber a partir dessas respostas:
- A forte problemática na economia brasileira, péssimas condições sociais,
desemprego, instabilidade da moeda, inflação... entre outros (Sujeito D).
- A insatisfação quanto a situação do Brasil no período governado por Collor, como
também pode-se apontar o foco dado pela mídia nas questões sociais e econômicas do país
(Sujeito K).
Foram consideradas respostas insatisfatórias aquelas que, de forma breve,
responderam sem argumentar e problematizar a questão. A maioria respondeu que o que
motivou a organização dos protestos foi a saída de Collor do poder, porém não mencionou por
que ele deveria sair da presidência ou afirmou que a mídia simplesmente organizou o
movimento, pois tinha interesse de retirar o mesmo presidente que ajudou a eleger.
- Queriam ver Collor fora do poder (Sujeito F).
Em relação às respostas sobre as semelhanças entre o movimento dos caras pintadas e
os black bloc, 15 das 21 foram consideradas satisfatórias, pois os universitários fizeram
críticas e pautaram suas considerações sobre o questionamento. As respostas realizaram
ponderações sobre os diferentes contextos históricos e reivindicações, porém, consideraram
que a participação foi em sua maioria de jovens e pelo fim da corrupção na política brasileira,
conforme podemos notar nestas respostas:
- Sim, principalmente no que diz respeito a necessidade de um Brasil melhor e menos
corrupto (Sujeito P).
- Ocorrem semelhanças quando se refere à mobilização dos jovens insatisfeitos por
inúmeras situações do país (Sujeito K).
As respostas consideradas insatisfatórias são aquelas que os universitários realizaram
de forma confusa, generalizada ou com uma leitura já padronizada que faz parte do discurso
do senso comum. Nas respostas a seguir, é possível identificar a distorção das pautas dos
movimentos, neste caso dos que aconteceram em 2013 e de sua constituição enquanto grupo.
- Não há semelhanças. A do Collor havia uma grande união da população e as do ano
de 2013 não havia união (Sujeito M).
- Sim. Ambas tinham como objetivo tirar alguém do poder e garantir melhorias
(Sujeito S).
A última resposta aqui explicitada afirma que em ambas as manifestações o objetivo
era a retirada de alguém do poder. Em 1992, a pauta maior do movimento dos caras pintadas
foi o impeachment de Collor. As manifestações intituladas Black Bloc foram motivadas por
diversas pautas, dentre elas o transporte público, que acabou dando visibilidade e formação de
grupo por um único objetivo. O discurso da saída de “alguém do poder” foi iniciado por
poucos sujeitos de oposição ao atual governo, porém não teve êxito nas ruas. Essa afirmação
demonstra que os discursos propagados pelos sujeitos não são questionados ao serem
ingeridos ou aproveitam-se de tais acontecimentos para legitimar suas ideias ou distorcer os
fatos.
Quando questionados sobre qual a fonte mais próxima dos conhecimentos históricos, a
resposta foi de 85,7% satisfatório, enquanto 13,3% dos acadêmicos responderam de forma
insatisfatória. Foram consideradas respostas insatisfatórias todas aquelas que fugiram da
pergunta ou que responderam de forma confusa, não justificando sua escolha, conforme as
respostas a seguir:
- Fotografia, acho mais acessível (Sujeito N).
- As duas. Vivenciei ambas e a primeira marcou mais, pois o desrespeito de ser
demitido junto com outros 107.000 (cento e sete mil) trabalhadores de empresas estatais e até
hoje não recebemos a anistia, as demissões foi considerado ato político. A atual participei,
sobretudo o que na realidade não seriam 20 centavos o moti principal da luta, mas
novamente os políticos que nós colocamos em seus mandatos que nos traem (Sujeito O).
Percebe-se que na última resposta o sujeito confundiu-se ao responder o que foi
solicitado, pois ele não faz nenhuma relação com as fontes trabalhadas na oficina. Já a
primeira resposta, apesar de justificar, faz isso de maneira ampla e vaga.
As respostas consideradas satisfatórias foram todas aquelas que justificaram de forma
clara a indicação da fonte que traz mais informações e se aproxima do conhecimento histórico
de cada sujeito. A grande maioria informou o documentário e, nas justificativas, informaram
que as narrativas que possuem sobre o movimento dos caras pintadas são parecidas com as
vinculadas na mídia e com o conhecimento repassado na escola. A imagem foi a segunda
fonte mais escolhida e as respostas a seguir demonstram a capacidade de construção de uma
consciência histórica produzida pelos livros didáticos:
- Fonte 2, pois muitos livros históricos trazem esses fatos do movimento (Sujeito H).
- A imagem, porque me lembro dela num livro didático que tive no médio e acho que é
uma ótima forma de representar o movimento (Sujeito J).
- A fonte A se aproxima mais ao conhecimento, pois se faz muito próxima à forma
apresentada no livro didático, assim como a fonte 2 (Sujeito K).
Nestas respostas, ficou claro o quanto a mídia e o livro didático contribuíram para a
formação da consciência histórica dos sujeitos. Ambos os materiais, televisão e livro didático,
estão acessíveis à maioria dos brasileiros. A primeira é considerada o meio de comunicação
mais difundido e presente nas diversas realidades brasileiras, independente de condições
sociais. O livro didático é distribuído gratuitamente através de programas do governo a todos
os estudantes da rede pública de ensino. Mesmo nas escolas, onde o número de exemplares
não é suficiente para serem distribuídos para os educandos, os livros ficam disponíveis na
biblioteca para empréstimos ou utilização pelos educadores na sala de aula.
Nas narrativas e participação dos universitários na oficina, ficou evidente a dificuldade
em interpretar os documentos, cuidando para compreender o contexto em que foi produzido e
por quem. Mesmo com material diferenciado sobre o movimento dos caras pintadas com
informações com outro viés, os discursos prévios que estão enraizados são presenças fortes
em suas narrativas.
Inúmeros foram os momentos, durante a oficina, na partilha para o grande grupo, de
forma padronizada ao legitimar o movimento dos caras pintadas como um grupo uniforme e
de membros com pauta definidas. Já as narrativas sobre as manifestações que aconteceram no
ano de 2013, a maioria fazia questão de salientar a presença dos baderneiros e dos pacíficos.
Estas últimas não tinham a mesma união e foco que o movimento dos caras pintadas na
perspectiva dos participantes da oficina.
O conhecimento histórico adquirido durante a formação básica com certeza faz parte
da consciência histórica destes sujeitos, porém, são mais evidentes os posicionamentos da
mídia do que uma posição contrária. Cabe salientar que a forma como o movimento dos caras
pintadas é retratado nos livros que foram analisados no capítulo anterior se aproxima muito
mais do discurso midiático e dos grupos dominantes do que de um material que fomenta a
criticidade do educando.
Outro fator é em relação ao protagonismo juvenil. A maioria dos participantes está na
faixa etária considerada jovem pelo estatuto da juventude e grande parte está cursando
licenciatura em História e possivelmente irão trabalhar com jovens em sala de aula, porém,
não fazem reflexões sobre o assunto ou reproduzem preconceitos já estabelecidos para o
público juvenil. É relevante salientar que os livros didáticos, o recurso mais utilizado na aula
de História a partir dos relatos dos participantes de oficina, não trazem essas abordagens e não
contribuíram para a formação do educando enquanto sujeitos históricos, simplesmente trazem
informações sobre o passado e o educador deve estar atento.
Considerações Finais
Por se tratar de um fato histórico recente, ainda é possível realizar rodas de conversas
e pesquisas com militantes do movimento, sendo que os pais dos próprios educandos podem
ter participado das manifestações. É relevante dar atenção a essa abordagem do movimento
dos caras pintadas, e também de outros fatos históricos que demonstram o protagonismo
juvenil, pelo simples fato de os educandos poderem se enxergar como sujeitos
transformadores da realidade. Na oficina realizada com os acadêmicos dos cursos de História
Bacharelado e Licenciatura, ficou evidente que, mesmo a maioria estando na faixa estaria
considerada jovem pelo estatuto da juventude, eles têm dificuldade de se posicionarem nos
assuntos referentes às juventudes.
As narrativas realizadas sobre as manifestações do ano de 2013 foram reproduções,
em sua maioria, dos discursos disseminados pela mídia, assim como a representação do
movimento dos caras pintadas. Esse último ainda sofre influência da forma como foi
representado nos livros didáticos. É possível perceber que as leituras dos universitários sobre
o movimento que exigiu a saída de Fernando Collor da presidência da república é padronizada
e semelhante à forma como é abordado no livro.
Diante destas circunstâncias, percebe-se que o livro é propagador de discursos e
ideologias e estas estão a serviço de um grupo dominante que autoriza ou não a publicação
das obras que serão distribuídas gratuitamente nas escolas públicas brasileiras.
A utilização mecânica do livro didático ou manual a ser seguido sem ser contestado
contribui para estabelecer o descrédito com a disciplina de História em alguns espaços
escolares. Na atualidade, a atenção dos jovens está voltada para muitas outras possibilidades
mais atraentes do que o conteudismo ou a reprodução deste material didático que deveria
auxiliar e não conduzir as aulas de História.
Referenciais bibliográficos
BARCA, Isabel. Aula Oficina: do Projeto à Avaliação. In. Para uma educação de
qualidade: Atas da Quarta Jornada de Educação Histórica. Braga, Centro de Investigação
em Educação (CIED)/ Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2004, p.
131 – 144.
CERRI, Luis Fernando. Ensino de história e consciência histórica. Rio de Janeiro: Editora
FGV; 2011.
MORAES, Roque. Mergulhos discursivos análise textual qualitativa entendida como processo
integrado de aprender, comunicar e interferir em discursos. In: GALIAZZI, Maria do Carmo;
FREITAS, José Vicente de (Orgs.). Metodologia emergentes de pesquisa em educação
ambiental. 2.ed. Ijuí : Editora Unijuí, 2007.
ANEXOS
Oficina - Comportamento Juvenil na História do Tempo Presente
As narrativas deste questionário serão utilizadas na escrita do trabalho de conclusão de curso.
Responda com atenção e com o máximo de informações possíveis. Desde já, muito obrigado
pela participação.
 O que você compreende por protagonismo juvenil?
 Marca a alternativa que compreende sua faixa etária.
□ 15 aos 18 anos □ 19 aos 21 anos □ 22 aos 25 anos □ 26 aos 29 anos □ Mais de 30 anos
 Participa/participou de algum grupo juvenil (igreja, partidos políticos, movimentos
sociais...)? Discorra sobre sua participação e objetivo do grupo.
 Em qual instituição você cursou o 3º ano do ensino médio? □ Pública □ Privada
 Quais lembranças que você tem do ensino de História no 3º ano do ensino médio?
 Quais materiais didáticos utilizados pelo seu educador de História no 3ª ano do ensino
médio em sala de aula?
 Quais lembranças que você tem em relação ao livro didático de história durante sua
formação na educação básica?
 Quais conhecimentos você tem sobre o movimento dos caras pintadas?
 Você foi um cara pintada? De que forma você participou das manifestações?
 Em sua opinião o que leva a juventude a se organizar e participar de manifestações
como o movimento dos caras pintadas?
 Quais relações podem ser estabelecidas entre os movimentos dos caras pintadas e o
Black Bloc?
 Você participou das manifestações, intitulada Black Bloc, em sua cidade?
 Em sua opinião, qual o papel da mídia em ambas as manifestações?
Oficina - Comportamento Juvenil na História do Tempo Presente
Fonte 1
Os caras pintadas surgiram nesse período como figuras de destaque entre as diversas forças
responsáveis pela derrocada do primeiro presidente eleito por voto direto em quase trinta
anos. Esse movimento de caráter estudantil se tornou uma espécie de “porta-voz” do
movimento Fora - Collor junto à esfera pública, mesmo existindo outras entidades civis nesse
cenário e com esse mesmo objetivo. Suas manifestações se tornaram emblemas da
participação popular na campanha para a saída de Collor devido, principalmente, a sua
visibilidade adquirida.
Thales Torres Quintão. Disponível em: http://www.usp.br/anagrama/Quintao_caraspintadas.pdf
Fonte 2
Fonte 3
Vídeo: Era Uma vez um
Presidente Collor,
Impeachment e os Caras Pintadas
Produção Marina Camargo e Thaísa Gazelli
ARAÙJO, Jorge. Sem título. São Paulo; Fotografia; 16/8/1992.
Foto 1
1) Quais as relações que você estabelece entre as fontes?
2) Qual foi o comportamento da mídia em relação ao movimento dos caras pintadas?
3) Quais motivações que levaram para o surgimento dos caras pintadas?
4) Há semelhanças entre os caras pintadas e as manifestações ocorridas no ano de 2013?
5) De todas as fontes, qual mais se aproxima mais com os teus conhecimentos históricos?
Por quê?
Você lembra como esse fato histórico foi trabalhado no 3º ano do ensino médio? Discorra
sobre.
Download

consciência histórica sobre o movimento dos