CIRCUITOMATOGROSSO ESPECIAL PG 5 www.circuitomt.com.br CUIABÁ, 23 A 29 DE OUTUBRO DE 2014 EDUCAÇÃO Docência desvalorizada não atrai Além de apresentar rendimento historicamente baixo em relação a outras categorias, carreira de professor é cada vez menos desejada pelos jovens Diego Frederici Outubro, mês em que se comemora o Dia dos Professores é uma singela homenagem a profissionais que ajudam a construir o conhecimento de crianças, jovens e adultos que irão moldar a sociedade. Entretanto, já há algum tempo a carreira não goza mais do mesmo prestígio de outrora. Salários defasados, falta de apoio administrativo e políticas públicas ineficientes, ou mesmo inexistentes, fazem com que os jovens priorizem outras áreas profissionais. Uma pesquisa feita pelo Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube), que contou com a participação de mais de 6.910 jovens de todo o país, aponta que 40,08% deles responderam “que não seriam professores, pois é uma profissão cada vez mais desvalorizada”. Outros 19,69% disseram que “já pensei em seguir a carreira, mas desisti pelas más condições”. Os números encontram ressonância na concorrência dos cursos universitários que preparam os jovens para o exercício da docência, caso da pedagogia e das licenciaturas específicas, como matemática, letras, química, história, fotos: Diego Frederici Jovens escolhem outras carreiras na hora de prestar o vestibular aumentando o déficit de professores nas escolas do ensino básico e médio biologia, geografia, física e outras áreas do conhecimento. Entre os mais concorridos – medicina, engenharia civil e direito – verifica-se uma nota alta de corte para ingresso nos cursos da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). No Sisu 2014/1 da instituição de ensino superior, aqueles que desejam se tornar médicos precisaram de um índice mínimo de 785,02 no campus Cuiabá. Os estudantes que almejam ser engenheiros civis atingiram 729,56, no mínimo, e os jovens que pretendem seguir a carreira da aplicação e do estudo das leis na advocacia, promotoria ou magistratura obtiveram pontuação de 723,82. Números bem diferentes da licenciatura. A pedagogia, por exemplo, exigiu nota de corte de 578,34 – índice similar ao de geografia (589,4) e física (593,42). De acordo com o levantamento do Nube, outros motivos que levam os jovens a não se sentirem estimulados a se tornarem professores são as deficiências pedagógicas que não levam em conta os interesses e demandas da tecnologia no dia a dia das pessoas. O estudo diz ainda que a escola precisa mudar seu foco de “transmissão” para “produção” de conhecimento. “Silval é uma continuidade de Maggi”, diz presidente do Sintep Se por um lado as escolas apresentam deficiência nas áreas estrutural e pedagógica, em que carecem de políticas públicas e investimentos mais consistentes, por outro o governo de Mato Grosso parece não fazer sua parte na melhoria do ensino no Estado, fazendo com que o discurso de educação como “salvador de uma nação” permaneça apenas no campo da retórica, exemplificada pelas últimas gestões do Palácio Paiaguás. A opinião é do presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep-MT), Henrique Lopes do Nascimento, que recebeu o Circuito para uma conversa na sede da entidade, localizada em Cuiabá. De acordo com o sindicalista, a despeito de alguns avanços, o governo Silval Barbosa (PMDB) foi apenas uma “continuidade” da gestão do hoje senador Blairo Maggi (PR) – uma época que, segundo ele, ficou marcada por alguns retrocessos na luta pela educação. Secretaria de Educação segue lógica eleitoreira Helena Maria Bortolo conhece bem a realidade da educação em Mato Grosso. Professora da educação básica, expresidente da subsede Cuiabá do Sintep e atual diretora da instituição que representa os servidores que atuam na capital, ela afirma que enquanto a ampla maioria das secretarias de Educação seguir a lógica eleitoreira de cabide de empregos – caso da Secretaria de Estado de Educação (Seduc-MT), a qualidade do ensino será prejudicada e não será atraente aos jovens: “Enquanto tivermos secretarias com foco eleitoreiro, com gestores eleitoreiros, ficamos nesse paradigma de troca de favores, não avançamos nas gestões de qualidade de ensino. É preciso que haja técnicos”. A especialista em educação e representante de classe critica também a política de valorização dos servidores da educação. De acordo com a professora, um profissional da rede municipal recebe R$ 1.726,14 por uma jornada de 20 horas semanais, enquanto que aqueles que atuam na rede estadual obtêm ganhos de R$ 2.600 para trabalhar 30 horas durante a semana. “É muito pouco”, pondera, “ter um incentivo tão baixo ao mesmo tempo em que os professores encontram-se muitas vezes em condições degradantes de trabalho, expostos à violência e ao assédio, faz com que os jovens pensem duas vezes antes de se tornarem docentes”. Ela também critica a falta de estrutura encontrada em algumas escolas de Cuiabá: “O governo federal manda ar-condicionado, mas a rede elétrica das escolas é precária e não suporta a demanda de energia. Além disso, muitas delas se encontram em situação de abandono, com goteiras, falta de telhado, matagal etc.”. Abandono A Escola Estadual João Panarotto, localizada no bairro Morada da Serra IV, em Cuiabá, é exemplo de descaso do poder público e das políticas institucionais que utilizam a importância da educação apenas como argumento retórico de discursos e frases de efeito utilizadas por candidatos durante as eleições. O mato e a presença de materiais inservíveis lembram um terreno baldio “A primeira gestão do governo Blairo Maggi foi marcada pelo ‘choque de gestão’ na educação, que nada mais foi do que a dificuldade de diálogo com a classe dos trabalhadores, além da quebra do direito a carreira para todos os servidores que atuam na escola, e não apenas professores”, diz ele. Henrique afirma que apesar da mobilização dos servidores garantirem novamente a equiparação de status de educadores aos que atuam dentro das escolas, a área vem sofrendo com as sucessivas retiradas e desvios de recursos que deveriam ser investidos na educação e que são utilizados para cobrir rombos de outras pastas – lógica seguida pelo atual gestor Silval Barbosa, sobretudo na condução do Fundo Previdenciário do Estado de Mato Grosso (Funprev). “O governo tem retirado parcelas significativas, que deveriam ser utilizadas na melhoria do ensino, para o pagamento de aposentados e pensionistas”, afirma.