O CONCEITO DE TECNOLOGIA: PRESSUPOSTOS DE VALORES
CULTURAIS REFLETIDOS NAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS
CHAGAS, Ariana - UFPR
[email protected]
BRITO, Gláucia da Silva - UFPR
[email protected]
KLAMMER, Celso Rogério – PUC-PR/UP-PR
UFPR - [email protected]
RIBAS, André - UFPR
[email protected]
Área Temática: Comunicação e Tecnologia
Agência Financiadora: Não contou com financiamento
Resumo
O presente artigo é resultado de uma pesquisa desenvolvida na disciplina Escola, Professor e Novas
Tecnologias do Programa de Pós Graduação em Educação da UFPR. O objetivo era apresentar o
conceito de tecnologia vigente nas práticas educacionais de professores do Ensino Fundamental,
Médio e Superior da rede pública e privada. Partimos do pressuposto que a escola enfrenta o desafio
de incorporar as tecnologias da informação para uma vinculação entre o conteúdo escolar, a vida do
jovem estudante, do mundo do trabalho e da cultura contemporânea e o professor deve dar
significado ao seu uso a partir da concepção que possui de tecnologia. Dividimos o trabalho em
duas etapas: a primeira que consistiu no referencial teórico, em que procuramos estabelecer a
relação entre sociedade, professor e tecnologias, destacando o conceito de tecnologia e a sua
classificação em três grupos aliando a metodologia com a análise das entrevistas realizadas com 22
professores do Ensino Fundamental, Médio e Superior. E, a segunda, que ainda está em fase de
estruturação, será em pensar cursos de formação para professores a partir de suas concepções de
tecnologias, pois entendemos que articular as concepções dos professores entrevistados com a
classificação de tecnologia nos leva a reflexão teórica e metodológica necessária à transposição de
conceitos e pré-conceitos cristalizados na prática pedagógica cotidiana.
Palavras-chave: Professores; Escola; Educação; Tecnologia.
1 – Formação de professores e o conceito de tecnologia: articulando a pluralidade de
olhares
[...] a tecnologia tende a apresentar novidades a cada dia e assim aumenta a
demanda por uma educação que privilegie o uso das linguagens das tecnologias,
aumentando também a demanda por professores que as utilizem em processos
significativos de aprendizagem.
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Com essas novas demandas, muitos professores estão buscando novos caminhos,
mas são poucos os que encontram caminhos que sejam diferentes de uma
educação tradicional, centrada na informação. O que parecem não compreender é
que com as tecnologias, as formas de comunicação, de vida e de relação entre as
pessoas mudam e, nesse sentido muda a forma de educar e o papel do professor.
(SCHERER, 2003. p. 270)
Partindo do estudo do conceito que professores possuem em relação a tecnologia,
acreditamos que os processos de formação docente podem não somente considerar e
constatar qual a concepção que possui sobre ela , mas que ainda o processo de formação do
professor neste sentido, leve em conta que este conceito é o que permeará a sua prática no
seu cotidiano, para então assim o amparar a superar a condição na qual atua.
O saber desta categoria profissional é plural, diverso e complexo. Igualmente
complexas são as formas pelas quais tais saberes são adquiridos no processo de um sujeito
tornar-se professor. Estes saberes específicos que se baseiam no trabalho cotidiano e no
conhecimento do campo educacional, ou seja, saberes experenciais possuem relação com as
funções dos professores, o modo como permeiam seus os comportamentos e seus hábitos,
e sua natureza existencial, pois estão ligados não somente à experiência de trabalho, mas
também à história de vida do professor.
Enquanto um saber existencial, o saber experiencial está incorporado a sua
identidade, ao seu agir, às suas maneiras de ser.
Ao pensarmos em formação, também como transformação de atitudes, precisamos ir
ao centro dessas atitudes.
Como bem expressa Alonso (1999, p. 31) ao refletir sobre a formação de
professores, esse é um processo que envolve mudanças que não são tão simples e
superficiais como a utilização de recursos didáticos mais modernos ou a inclusão de
disciplinas no currículo.
Ou seja, ao tratarmos a questão da formação de professores para o uso dos recursos
da tecnologia, mais especificadamente para o uso das TIC´s (tecnologias da informação e
da comunicação), não podemos focar nosso olhar apenas para um campo de atuação, como
por exemplo, estruturar propostas de formação que levam em conta apenas a apropriação
dos recursos das técnicas e manuseio de máquinas de última geração. Também nos
interessa questionar a premissa de que a “aquisição de maquinário” e o “investimento
financeiro” por si só garantam a articulação da demanda das práticas pedagógicas na dita
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Sociedade da Informação, assim como não nos interessa evidenciar apenas qual o conceito
que este ou aquele professor possui de tecnologia.
O que viemos propor, portanto é a intersecção hipertextual dos diversos focos que
devemos buscar nesta caminhada, ou seja, pensar a formação de professores a partir tanto
do conceito que possuem a cerca da realidade tecnológica na qual estão inseridos bem
como as ações necessárias no campo teórico para superar as demandas da prática
pedagógica de nossa época.
2. Sociedade, professor e tecnologias
Acreditamos que a sociedade contemporânea passa por profundas transformações
tecnológicas alterando de forma significativa a maneira como as pessoas se relacionam e
interagem. Na informatização, por exemplo, que circunda os serviços bancários, os clientes
são obrigados a interagir com a máquina através de códigos e senhas, até mesmo através do
telefone, sem sair de casa. É neste contexto, que entendemos que podem ocorrer mudanças
nos processo de aprendizagem e de interação social, pois não se trata somente de uma
mudança tecnológica, mas também da forma como as pessoas se organizam e interagem
com estas mudanças.
Sendo assim, entendemos que a instituição escolar enfrenta o desafio de incorporar
as tecnologias da informação para desenvolver, de forma mais significativa e atrativa, os
conteúdos que se propõe a ensinar.
Ante essas questões, acreditamos que a escola sempre procurou incorporar as
tecnologias do seu tempo seja o lápis, o caderno, os textos impressos ou o quadro de giz.
Hoje, as novas tecnologias da informação já se fazem ou, dada as condições materiais ou
políticas pedagógicas, se farão presentes na escola, mesmo que lentamente. O fato, como
diz Apple (1995, p. 169-170), é que “a nova tecnologia está aqui. Não irá embora [...]
Devemos estar muito seguros de que o futuro que ela promete para nossos estudantes é real,
não fictício”.
No entanto, no que diz respeito à atual educação escolar, defendemos que somente
com o uso de cadernos e do quadro de giz a difusão do saber escolar, não terá muito
significado para o jovem aluno, pois a tecnologia tem um impacto cada vez maior na vida
de todos os indivíduos. O professor não é mais o único meio de acesso às informações.
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[...] alunos estão acostumados a aprender através dos sons, das cores; através das
imagens fixas das fotografias, ou em movimento, nos filmes e programas
televisivos [...] As novas gerações têm um relacionamento totalmente favorável
e adaptativo às novas tecnologias de informação e de comunicação e um
posicionamento cada vez mais aversivo às formas tradicionais de ensino.
(KENSKI, 2001, p. 133).
Acreditamos, portanto, que no espaço escolar o desafio que se coloca é a
incorporação das tecnologias da informação, presentes na vida de todos os seres humanos.
O importante é compreender o processo de incorporação das tecnologias da informação
pela escola, particularmente pelo professor, pois defendemos que estas tecnologias podem
contribuir para uma vinculação entre os contextos da escola, da vida do jovem aluno, do
mundo do trabalho e da cultura contemporânea.
Contudo, devemos destacar que:
Tecnologia não melhora a essência do que se ensina e sim a forma de transmitila. Assumir o emprego de tecnologias educacionais favorece a revisão da prática
convencional. Rever atitudes de ensino pelo professor corresponde a ponderar
necessidades de inovação da prática como o objeto principal da capacitação ou
da formação continuada do professor hoje. (SOARES, 2006, p. 39).
Corrêa (2002, p. 46) afirma que “o valor da tecnologia não está nela em si mesma,
mas depende do uso que fazemos dela”. Ao referir-se a caneta esferográfica, que já foi
considerada uma inovação tecnológica, diz que:
O que produzimos é mediado pela caneta, mas o conteúdo e o processo pelo qual
escrevemos depende da nossa história de vida, de nossos afetos, de nossas
competências, do lugar social que ocupamos [...] Tal análise serve para o uso dos
diversos recursos tecnológicos, desde o uso de transparências, apresentações em
quadro-negro ou power point até a internet.
Portanto, o que se deve ter claro é o conceito de tecnologia, articulado com o
conceito de sociedade, indivíduo, educação e ensino, ou seja, o fazer e o pensar do
professor deve estar contemplado no seu projeto político pedagógico, e nesta relação
dialética deve estar expressa a concepção e o uso das tecnologias.
Brito e Purificação (2006, p. 19), com base em Sancho (1998), classificam as
tecnologias em três grandes grupos:
Físicas – são as inovações de instrumentais físicos, tais como: caneta
esferográfica, livro, telefone, aparelho celular, satélites, computadores;
Organizadoras – são as formas de como nos relacionamos com o mundo e como
os diversos sistemas produtivos estão organizados;
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Simbólicas - estão relacionadas com a forma de comunicação entre as pessoas,
desde o modo como estão estruturados os idiomas escritos e falados até como as
pessoas se comunicam.
Esta classificação tem um caráter somente didático, pois entendemos tecnologia
como um conjunto de conhecimentos produzidos na relação dos indivíduos consigo
mesmos, com a natureza e com os seus pares. Além disso, acrescentamos que o valor da
tecnologia não está nela em si mesma, mas no uso que se faz dela. Usar simplesmente um
recurso em sala de aula, para reproduzir um determinado conteúdo, é apenas dar um caráter
ilustrativo à aula. Seja este recurso o quadro de giz, o livro didático ou a internet. Portanto,
defendemos que para usar a tecnologia educacional, o professor deve dar significado ao seu
uso. Este significado deve estar diretamente ligado à concepção de mundo que o professor
possui.
A concepção de mundo que um indivíduo tem, está pautada no universo de
conhecimento construído ao longo da sua existência que orienta a sua relação com meio.
Neste caso, questionamos em que está fundamentada a ação pedagógica do professor, no
que diz respeito ao tipo de aluno que pretende formar e para que tipo e sociedade. Assim, se
não se formula um significado crítico e consciente da ação docente, especialmente sobre o
uso das tecnologias educacionais, ele apenas pode reproduzir um conhecimento em aula
para que posteriormente o aluno devolva esta reprodução numa prova.
Brito e Purificação (2006, p. 31) apoiando-se em Niskier, afirmam que
a tecnologia educacional, sabiamente, não se reduz à utilização de meios. Ela
precisa necessariamente ser um instrumento mediador entre o homem e o
mundo, o homem e a educação, servindo de mecanismo pelo qual o educando se
apropria de um saber, redescobrindo e reconstruindo o conhecimento.
Além dos conceitos de tecnologias apontados acima, Brito (2006, p.14) reflete sobre
tecnologia social e com base no Instituto de Tecnologia Social conceitua como um
“Conjunto de técnicas e metodologias transformadoras desenvolvidas na interação com a
população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão e melhoria das
condições de vida”.
Por este viés de análise, Sancho ao refletir sobre as funções básicas da educação,
afirma que:
As próprias escolas são uma tecnologia, uma solução à necessidade de
proporcionar educação a todos os cidadãos e cidadãs de certas idades. [...] a
educação pode ser concebida como uma Tecnologia Social e um educador como
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um tecnólogo da educação. Assim, os professores ou os teóricos da educação
que só parecem estar dispostos a utilizar e considerar as tecnologias (artificiais,
organizadoras e simbólicas) que conhecem, dominam e com as que se sentem
minimamente seguros, por considerá-las não (ou menos) perniciosas, não
prestando atenção às produzidas e utilizadas na contemporaneidade, estão, no
mínimo, dificultando aos seus alunos a compreensão da cultura do seu tempo e o
desenvolvimento do juízo crítico sobre elas. (SANCHO, 1998, p. 39-41).
À luz das reflexões até aqui realizadas e acatando a proposta da professora Gláucia
da Silva Brito, da disciplina de Escola, Professores e Novas Tecnologias, do Programa de
Pós Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná, procuramos analisar a
concepção de tecnologia para 22 professores do Ensino Fundamental, Médio e Superior.
3. Metodologia
A pesquisa foi desenvolvida por 4 alunos do programa que deveriam entrevistar
dois professores de cada nível de ensino sendo um da rede particular e um da rede privada.
O propósito da pesquisa era investigar o conceito de tecnologia para esses professores e
procurar inserir esses conceitos na classificação de Brito e Purificação (2006) quanto às
tecnologias físicas, organizadoras e simbólicas, incluindo também a educacional e a social.
Ao todo foram entrevistados 22 professores, 11 da rede pública e 11 da rede
privada.
Procuramos identificar o foco principal de cada resposta, considerando os exemplos
apresentados pelas pesquisadoras referenciadas.
Pudemos perceber que no Ensino Fundamental, 18,1% dos professores articulam
seu conceito pautados em concepções Físicas, 13,6% dos professores possuem articulações
de fala pautados em concepções de conceito que caracterizam as Tecnologias como
Organizadoras. Apenas 4,5% dos professores conceitua tecnologia sob um o eixo
Simbólico e também um percebe a Tecnologia como possibilidade de instrumento
educacional.
Já no Ensino Médio, 13,6% declaram em suas respostas características da
Tecnologia como recurso Físico, cinco professores percebem a Tecnologia como
Organizadora, um a percebe como Simbólica e também um coloca mesma como Social.
Finalizando este grupo, ainda um dos entrevistados percebe o cunho Educacional da
Tecnologia.
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Levando-se em conta as redes de ensino, pública e privada, os professores tanto de
uma como a de outra declararam em números iguais concepções de Tecnologia pautadas
em estruturações Físicas (seis respostas em cada uma das redes), sendo que na rede pública
sete professores pontuaram preceitos relativos a possibilidade de utilização Organizacional
da Tecnologia, e cinco declararam o mesmo na rede privada. Também na rede privada
aparecem dois professores com a concepção Simbólica de Tecnologia estruturada em seu
discurso, bem como a concepção Social. Tanto na rede pública como na rede privada, um
professor de cada uma das redes declara em sua resposta preceitos de concepção
Educacional de uso da Tecnologia.
Com o resultado da análise dos dados, pudemos concluir que não houve diferença
significativa entre as respostas entre o nível fundamental, médio ou superior, nem entre a
rede pública e privada. A maioria dos conceitos de Tecnologia apresentados podem ser
classificados como Físicos ou Organizadores.
Os exemplos abaixo revelam o posicionamento dos professores quanto ao conceito
de tecnologias como físicas:
a) “Tecnologia só funciona quando não preciso!!!!”
b) “Área do conhecimento humano que investiga a necessidade da sociedade e
formula recursos tecnológicos para atender as demandas sociais”.
Quanto ao conceito de tecnologias organizadoras:
a) Tecnologia é um conjunto de métodos, técnicas e conhecimentos aplicados
a resolução de problemas, produção de bens e serviços relacionados ás
necessidades humanas.
b) Qualquer interferência provocada na realidade por meio de instrumentos
criados a partir de estudos científicos pode ser associada a tecnologia .Assim ,
diferente de associar TECNOLOGIA apenas as máquinas , ela também se refere á
discussão de novos paradigmas nas diferentes áreas do conhecimento. Ou seja,
não se pode pensar a TECNOLOGIA apenas como resultado traduzido em um
objeto, mas que todo objeto TECNOLÓGICO contém um novo olhar sobre a
realidade.
Assim sendo, pressupomos que, para a maioria dos professores entrevistados, o
conceito de Tecnologia relaciona-se com as inovações de instrumentos físicos e como
formas de como nos relacionamos com o mundo e não estão diretamente ligados aos
preceitos e a constituição de sua prática pedagógica, como se tecnologia fosse “algo” dado
e exteriorizado por “outrem”, que não fruto da história da humanidade, e intrínseco no
cotidiano humano.
4330
4. Para além do conceito de tecnologia: a importância da formação do professor
Abordamos anteriormente que a concepção de mundo que um indivíduo tem, está
pautada no universo de conhecimento construído ao longo da sua existência e que orienta a
sua relação com meio.
Tendo em vista a pesquisa desenvolvida, questionamos em que está fundamentada a
concepção que o professor possui sobre o uso das tecnologias e por extensão a sua ação
pedagógica.
Acreditamos que se não se formula um significado crítico e consciente da ação
docente, especialmente sobre o uso das tecnologias educacionais, se o professor apenas
reproduzir um conhecimento em aula para que posteriormente o aluno devolva esta
reprodução numa prova.
Na escola humanista tradicional, por exemplo, ao professor cabia formar um aluno
para a coesão social, aceitação da disciplina e normas de conduta. Os conteúdos eram
apresentados de forma linear e fragmentada, por meio do método expositivo e a habilidade
cognitiva fundamental era a memorização. O acesso ao conhecimento estava centralizado
no livro didático e no professor. A sua função era transmitir o conteúdo, controlar a
disciplina e elaborar rigorosos instrumentos de avaliação para que os alunos reproduzissem
o que foi ensinado.
Hoje, acreditamos que o professor deve compreender as transformações da
sociedade contemporânea e buscar uma nova postura, diferente da escola humanista
tradicional, que venha ao encontro das mudanças na educação escolar, pois há uma
exigência de um novo perfil de professor na sua relação com o conhecimento e com o
processo cognitivo de aprendizagem dos seus alunos.
Se o professor estiver em contato com o seu tempo, poderá compreender as
transformações da sociedade na qual vive e assim detectar o significado do movimento
histórico, da sua cultura e das suas contradições. Nesse sentido poderá incrementar a sua
ação e identificar o seu projeto de sociedade e de aluno.
Ao identificar seu projeto de sociedade e de aluno, deverá ser capaz de responder:
qual tipo de aluno pretende formar e para que tipo de sociedade? Por esse caminho poderá
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perceber que a sociedade exige um novo tipo de sujeito. Não mais o bom orador com ótima
cultura geral que a escola humanista exigia. Mas um indivíduo com capacidade de inovar
cada vez mais, de compreender o mundo no qual participa e capacidade apontar soluções
resolver problemas.
Neste sentido entendemos que além do domínio do conteúdo técnico e científico
que se propõe a ensinar, o professor deve ser comprometido politicamente com o que faz. É
neste compromisso que ele revela seu projeto de sociedade e de sujeito que pretende formar
através da sua forma de organizar a realidade e as suas ações diárias. Quando o professor
não elabora um sentido específico para a sua ação, ele apenas assegura a manutenção do
ritual tradicional da docência: transmissão do conteúdo; controle da disciplina e rigorosos
instrumentos de avaliação para que os alunos reproduzam o que foi ensinado.
Por este viés Masetto (2002, p. 23) afirma que
O professor, ao entrar na sala de aula para ensinar uma disciplina, não deixa de
ser um cidadão, alguém que faz parte de um povo, de uma nação [...] Ele tem
uma visão de homem, de mundo, de sociedade, de cultura e de educação que
dirige suas opções e suas ações mais ou menos conscientemente. Ele é um
cidadão, um ‘político’, alguém comprometido com seu tempo, sua civilização e
sua comunidade, e isso não desprega de sua pele no instante em que ele entra em
sala de aula. Pode até querer omitir esse aspecto em nome da ciência que deve
transmitir, e que, talvez ingenuamente, ainda entenda que possa fazê-lo de forma
neutra. Mas o professor continua cidadão e político e, como profissional da
docência, não poderá deixar de sê-lo.
Portanto, entendemos que o professor deve estar comprometido com o seu fazer, o
seu pensar e ocupado consigo mesmo no sentido de rever, analisar e inventariar a sua
concepção de mundo, ou seja, identificar tudo aquilo que dá sustentação às suas concepções
teórica-metodológicas para tornar a cada dia sua ação mais consistente, coerente e unitária.
Mas para tanto, defendemos que é preciso o professor se preparar cotidianamente.
Esse preparo é o que podemos chamar de formação continuada. Como afirma Nóvoa
(1992, p. 29) “A formação deve ser encarada como um processo permanente, integrado no
dia-a-dia dos professores e das escolas, e não como uma função que intervém à margem dos
projetos profissionais e organizacionais.”
Portanto, para que as tecnologias não sejam utilizadas somente como uma novidade
na aula. Mas, para ele dar conta dessas questões, é necessário uma formação permanente
tanto no que diz respeito a sua competência técnica e política como no uso das tecnologias.
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Como menciona Behrens (2002, p. 64)
As práticas na formação do professor devem criar espaços para contemplar uma
dimensão coletiva, em que os professores possam discutir, refletir e produzir os
seus saberes e os seus valores. A proposição de formação continuada num
processo participativo leva o professor a sair do seu isolamento em sala de aula,
e esse desafio o impulsiona a discutir com seus pares sobre sua ação docente.
Neste sentido, defendemos o investimento na formação continuada numa
perspectiva coletiva e partilhada. A instituição escolar deve oferecer o espaço para esse
processo, como grupo de estudos, por exemplo, para que os professores possam debater
com seus pares a sua ação.
5. Considerações Finais
Ao partirmos da questão problema deste estudo, que foi: O que é Tecnologia?
Buscamos traçar um caminho entre os depoimentos de profissionais da área de educação
atuantes em diversos níveis de ensino, sendo da rede publica e privada. O que a princípio
poderia ser motivo de divergência, por se tratar de profissionais de realidades diferentes em
sua prática profissional diária resultou numa proximidade dos discursos.
Constatamos uma predominância de respostas sobre o conceito físico de tecnologia,
tendo logo em seguida aparecido o discurso organizacional como o mais freqüente.
Notamos também a presença de respostas onde não foi possível identificar a
predominância de uma única classificação, dando-nos a impressão daquilo que Lefebvre
chamou de “sopa epistemológica”.
No entanto percebemos que muitas respostas foram construídas com a intenção de
se ter uma “resposta certa” e/ou para agradar seus entrevistadores. Como se trata de uma
pesquisa exploratória, consideramos relevante a sua continuidade, até mesmo para a
validação do instrumento aplicado.
Além disso, convém registrar sobre a metodologia nas entrevistas que influenciou
no resultado final. Entre as repostas classificadas como mais elaboradas, tivemos como
forma de entrevistas o e-mail e o MSN, assim permitindo ao entrevistado um tempo para
responder a questão proposta. Já naquelas entrevistas gravadas e/ou presenciais percebemos
que os entrevistados tiveram certa dificuldade de formular um conceito.
4333
Por fim, realizada a primeira fase do trabalho de recolhimento das fontes e a
realização das primeiras discussões feitas pelo grupo, buscaremos dar continuidade nas
reflexões aqui iniciadas pelos debates e enfrentamentos metodológicos e ideológicos
presente nos componentes deste grupo de trabalho sobre os conceitos de tecnologia.
Assim a tarefa que se desenha para o grupo a partir daqui é que passamos a
acreditar, pautados em Brito (2003, p.08) que: “programas de formação de professores
deveria considerar a complexidade da construção dos saberes docentes, e nesse sentido,
pensar a formação dos professores é olhar em diversas direções.”
E concluir que um processo de formação deve considerar esta multiplicidade de
horizontes, talvez nos leve a perceber que em uma proposta de formação de professores
para o uso das TIC´s talvez devamos começar pelas “diferenças” de conceitos existentes
entre os profissionais , e não partir da premissa que “todos os professores” podem e devem
usar tecnologia pois “todos” acreditam em um mesmo conceito e portanto em uma mesma
prática de uso.
Para isso, é preciso ter como foco a aprendizagem significativa, e superar o que
conhecemos por “racionalidade tecnológica” que valoriza meios em detrimento dos fins,
atentando para o compromisso ético de instituições que propõem-se a educar desenvolvendo
um projeto capaz de livrar o cidadão da massificação, mesmo quando dirigido a grandes
contingentes, devendo sobrepujar a necessidade de apropriação técnica de linguagens digitais e
promovendo a qualidade nos processos de construção de conhecimento.
Nosso tempo é o das crianças e jovens que nasceram, vivem e irão trabalhar numa
sociedade em permanente desenvolvimento tecnológico, onde já utilizamos até mesmo hoje o
termo “nativos digitais” para denominá-los.
E somos nós os professores desta época.
Através da uma metáfora mencionada por Doria (2006) Prensky preconiza: “Não há
mais volta para o Kansas, Dorothy: E é bom se acostumar com Oz” , reafirmando que nosso
espaço é o de um mundo “conectado” a uma rede que afeta a todos, mesmo àqueles que não
estão ou não se consideram diretamente conectados.
4334
Como educadores, possuímos a responsabilidade histórica de “no mínimo” convidar a
sociedade a pensar e agir sobre o assunto, deixando a posição de expectadores frente a este
desafio.
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