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SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA
E ENSINO SUPERIOR
Secretário: Narcio Rodrigues
Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de Minas Gerais
Presidente: Mario Neto Borges
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Conselho Curador
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Carlos de Barros Martins, Dijon Moraes Júnior,
Flávio Antônio dos Santos, Júnia Guimarães Mourão,
Marcelo Henrique dos Santos, Marilena Chaves,
Ricardo Vinhas Corrêa da Silva, Sérgio Costa Oliveira,
Valentino Rizzioli, Virmondes Rodrigues Júnior.
Ruas e avenidas sendo revitalizadas, aeroportos em processo de expansão,
manifestações públicas, obras por toda a parte. Nas capitais brasileiras, os efeitos
de um megaevento como a Copa do Mundo de Futebol podem ser sentidos diariamente. Para além da infraestrutura urbana, tais eventos de porte mundial, que
envolvem a mobilização de milhares de pessoas e o investimento de cifras vultosas,
também têm efeitos sobre as estruturas políticas, sociais e culturais das nações que
se oferecem como anfitriãs.
Por isso, quando a bola rolar no Mundial, não só torcedores estarão atentos,
mas também pesquisadores interessados em avaliar as consequências imediatas e
em longo prazo de um evento dessa magnitude. Espalhados pelo país, eles estão
curiosos, por exemplo, sobre a forma como as prioridades de investimento são
redefinidas, a elaboração de políticas sociais, a disseminação e a contenção de
doenças relacionadas a viagens e aos viajantes. Como mostra nossa reportagem
especial, este será um espaço privilegiado para aprofundar pesquisas e discutir os
vários significados de um megaevento.
E já que o assunto é paixão nacional, quem resiste ao arroz com feijão? A
mistura, presente nos pratos de brasileiros de Norte a Sul do país, não é apenas
apetitosa, mas também rica em nutrientes que se complementam. Uma pesquisa
desenvolvida na Universidade Federal de Viçosa (UFV) promete enriquecer ainda
mais esses alimentos por meio de um “troca-troca” de nutrientes. O grupo desenvolveu um procedimento que, utilizando uma espécie de revestimento biodegradável e hidrossolúvel, permite que os nutrientes do arroz sejam repassados ao feijão
durante o cozimento, e vice e versa. Com isso, seria possível oferecer os benefícios
da combinação àqueles que não têm o hábito de consumir os grãos juntos – o que
costuma ser comum, por exemplo, entre crianças.
Gostou do tema? Então acesse o nosso blog (http://blog.fapemig.br) e acompanhe os programas das séries Ondas da Ciência e Ciência no Ar para saber mais
sobre o assunto. A partir dessa edição, sempre que se deparar com os ícones (abaixo) é sinal de que o assunto também será abordado em nossos outros canais de comunicação. A proposta é expandir nossa cobertura por diferentes meios, agregando
novas informações e utilizando as potencialidades de cada veículo para contar as
histórias. Dentro dessa proposta, a participação dos leitores/ouvintes/telespectadores é muito importante. Periodicamente, publicaremos enquetes e desafios que
nos ajudarão a elaborar nossas próximas pautas. Contamos com sua contribuição
por meio do nosso blog e das redes sociais, no Facebook (www.facebook.com/
minasfazciencia) e no Twitter (@minasfazciencia).
O que está esperando? Nas próximas páginas, é possível conhecer pesquisas
relevantes em todas as áreas: um novo kit de diagnóstico com biomarcadores para
identificação da meningite; mapeamento de novas espécies de anfíbios e répteis
na Serra do Espinhaço; práticas de cooperativismo com resultados positivos para
a comunidade. Convido a todos, ainda, para apreciar a bela imagem enviada pela
bióloga Núbia Monteiro, que estampa a sessão Varal. Boa leitura!
Vanessa Fagundes
Diretora de redação
AO LEI TO R
EX P ED I EN T E
MINAS FAZ CIÊNCIA
Diretora de redação: Vanessa Fagundes
Editor-chefe: Maurício Guilherme Silva Jr.
Redação: Ana Luiza Gonçalves, Camila Alves
Mantovani, Diogo Brito, Maurício Guilherme Silva Jr.,
Vanessa Fagundes, Verônica Soares, Virgínia Fonseca
e William Ferraz
Diagramação: Fazenda Comunicação
Designer gráfico: Alice Barreto e Breno Maia
Revisão: Sílvia Brina
Projeto gráfico: Hely Costa Jr.
Editoração: Fazenda Comunicação & Marketing
Montagem e impressão: Rona Editora
Tiragem: 20.000 exemplares
Capa: Hely Costa Jr.
Í N D I CE
12
ENTREVISTA
37
administração
20
Zoologia
41
biomedicina
24
Computação
45
LEMBRA DESSA?
27
Genética
46
5 PERGUNTAS PARA...
30
Presidente da Academia
Brasileira de Ciências, Jacob
Palis Junior fala sobre os
desafios da pesquisa no Brasil
Espécies de anfíbios e répteis
da Serra do Espinhaço são
mapeadas para afastar ameaça de
extinção
Pesquisa da PUC Minas busca
aproximar os mais velhos dos
modernos dispositivos móveis
Iniciativas buscam difundir
informações sobre enfermidades
sanguíneas de origem genética
Engenharia de
alimentos
Especialistas da UFV
transferem nutrientes do arroz
ao feijão – e vice-versa
33
arte e educação
Alunos mineiros são estimulados
a perceber a polissemia da dança
como expressão artística
48
Projeto da Universidade Federal
de Alfenas dissemina princípios
do cooperativismo para
produção do marolo
6
ESPECIAL
Reportagem explora implicações
sociopolíticas, econômicas e
culturais dos megaeventos sobre
a rotina de uma nação
Estudo interdisciplinar
almeja melhorar
tratamento da epilepsia
Projeto reúne pesquisadores
mineiros para conversão de lixo
urbano em fonte limpa de energia
Virgílio Almeida comenta nuances
do Marco Civil da Internet
hiperlink
Casas sustentáveis, futebol e
outras novidades do blog Minas
faz Ciência
16
Biotecnologia
Fiocruz desenvolve kit
de diagnóstico com
biomarcadores para
identificação da meningite
“Recebi o número 56 da revista MINAS FAZ CIÊNCIA, que leio sempre imediatamente. Escrever
ao editor nunca foi uma atitude minha. Entretanto,
outros tempos. Excelente a entrevista com Tomaz
Aroldo da Mota, colega do ICB [Instituto de Ciências Biológicas da UFMG], amigo especial, pessoa
que fez e faz a universidade de forma clara, calma e
lúcida. Parabéns ao jornalista Maurício Guilherme
Silva Jr. pela condução da entrevista, e, principalmente, pela sua transcrição, fidedigna das ideias do
entrevistado. Como disse o Tomaz, ‘para entender o
ICB, temos de mergulhar em sua história e na trajetória da UFMG’. Ao abordar, ainda, a grande encruzilhada dos críticos à ciência – básica X aplicada – e
“Prezados senhores, recebi MINAS FAZ CIÊNCIA, por algum tempo, no Centro Federal
as inutilidades de certas pesquisas, permitiu-se que
alguém com propriedade e conhecimento tornasse a
questão de fácil compreensão. Muito bom para esta
de Educação Tecnológica (Cefet) de Bambuí
revista, que viaja e é lida por pessoas tão diferen-
– hoje, IFMG Bambuí. Como estou aposenta-
tes, para além da fronteira científica. [...] No interior
do, gostaria de continuar a receber a revista
de Minas, um certo farmacêutico recebia a revista.
em casa, caso seja possível. Agradecendo
Sua viúva, hoje com 87 anos, lê todas as edições
antecipadamente por sua atenção, aproveito
e, depois, as doa a um polo de ensino a distância,
para parabenizá-los pela alta qualidade da
instalado na cidade. Daí meu comentário”. publicação, que, hoje, é motivo de orgulho
Marilene Suzan Marques Michalick
aos pesquisadores de Minas Gerais”.
Professora aposentada da UFMG
José Ferreira de Noronha
Belo Horizonte / MG
Bambuí (MG)
“Gostaria de lhes agradecer pelo recebimento
“Olá, pessoal! Desejo receber MINAS FAZ CI-
da revista MINAS FAZ CIÊNCIA em minha re-
ÊNCIA. Sou professora de redação técnica e de
sidência, além de parabenizá-los pelo belís-
português instrumental e utilizo os textos da re-
simo conteúdo disponibilizado à sociedade.
vista para trabalhá-los em sala de aula. Além de
E de maneira gratuita. Abraços!”.
atualizadas e de pertencer ao campo da divulga-
Geraldo Júlio Pinto Filho
ção científica, as reportagens são de excelente
Estudante / Chromos
qualidade. Isso permite aos alunos que tenham
Belo Horizonte / MG
contato com as mais recentes pesquisas desenvolvidas nas universidades brasileiras”.
“Prezados, boa tarde! Recebo a revista regular-
Daniela dos Santos Costa
mente e acho as matérias muito importantes!”
Professora / Universidade Federal de Viçosa
Fábio S. Duarte Melo
Florestal / MG
Via e-mail
Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, envie seus dados (nome, profissão, instituição/
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tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é
permitida, desde que citada a fonte.
CARTAS
a aposentadoria nos devolve tempo para recuperar
especial
HErcÚleos
efeiTOs
Responsáveis por reflexos sociopolíticos, econômicos e
científicos, megaeventos mobilizam cidadãos, realocam
capitais e redefinem identidades nacionais
Maurício Guilherme Silva Jr. e Vanessa Fagundes
6
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Uma vez mais, Neymar ajeita o (novo)
corte de cabelo. Observado pelos milhares de
torcedores a lotar a Arena Corinthians – palco de estreia da seleção canarinho na Copa
do Mundo 2014, promovida pela Federação
Internacional de Futebol (Fifa) –, o jogador
não se dá conta, naquele instante, de que a
comezinha ajeitada nos fios será também
observada por outros tantos bilhões de atentos espectadores, espalhados pelos quatro
cantos do planeta. Em momento de tamanha
responsabilidade pessoal, o craque brasileiro
possivelmente não se recordará dos estratosféricos esforços (financeiros, técnicos, estruturais, humanos etc.) para que todo o imenso
circo do esporte, no qual é protagonista, pudesse se tornar realidade.
O interessante a ressaltar é que o
próprio atleta de múltiplos talentos, mechas capilares mutantes e centenas de
milhões no bolso há de ser considerado,
tão somente, como um dos inúmeros
elementos capazes de transformar a mais
importante festa mundial da bola no que
se pode chamar, com propriedade, de “megaevento”. Trata-se de conceito complexo,
em torno do qual reúnem-se pesquisadores (brasileiros e estrangeiros) ligados às
mais diversas áreas do conhecimento.
“É bastante ampla a literatura dedicada à temática. O termo tem sido aplicado a eventos de porte internacional
– normalmente, culturais e esportivos –,
com características proeminentemente
comerciais, que envolvem, portanto, produções/realizações de larga escala, enorme alcance midiático, grande número de
agentes públicos e privados e de atores
sociais – os quais, frise-se, têm interesses, por vezes, conflitantes”, ressalta Hélio
Rodrigues de Oliveira Jr., coordenador do
Núcleo Belo Horizonte do projeto “Metropolização e Megaeventos: os impactos da
Copa do Mundo/2014 e Olimpíadas/2016”
(veja box à página 8), iniciativa ligada ao
Observatório das Metrópoles.
Tais acontecimentos assumem, segundo o pesquisador, proporções grandiosas em termos de investimentos financeiros (públicos e/ou privados). “Além disso,
têm impactos não negligenciáveis sobre as
estruturas econômicas, políticas, sociais,
culturais e urbanas, que conformam e ca-
racterizam os contextos em que são realizados”, destaca Hélio Rodrigues.
Na visão de Ricardo Ferreira Freitas,
professor do curso de Relações Públicas
da Faculdade de Comunicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)
e integrante, na instituição, do grupo de
pesquisa “Comunicação Urbana, Consumo e Eventos”, para além da questão
espacial, megaeventos são encontros que
repercutem bastante na mídia. “Isso ocorre
antes, durante e depois do acontecimento,
despertando o interesse de milhares ou milhões de pessoas”, resume o pesquisador,
ao atentar para a importância da análise do
alcance de público pelos meios de comunicação de massa e pelas redes sociais. “É
fundamental compreender se, meses ou
anos antes e depois do evento, parcelas
significativas da sociedade acabaram por
se expressar sobre o assunto”, completa.
Afora a relevância da disseminação de
informações, na acepção do professor Luís
Eustáquio Moreira, do departamento de
Engenharia de Estruturas da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), megaeventos envolvem o
desenvolvimento sociopolítico e econômico
de uma nação, de modo a exigir coerentes
megalogísticas. Em sua visão, acontecimentos de grande vulto são responsáveis
por efeitos imediatos e em longo prazo.
“A difusão cultural motivada por um evento como a Copa do Mundo tende a trazer
95% de efeitos positivos ao País, ficando
os possíveis 5% negativos relacionados às
naturais perturbações em torno de todos os
fenômenos sociais”, analisa.
“Comunicação Urbana, Consumo e Eventos” é um grupo de pesquisa e extensão,
cadastrado no CNPq e apoiado pela Faperj, que pretende definir e conceituar os
megaeventos, de modo a produzir maior
arcabouço teórico relacionado ao fenômeno. Dentre as áreas de estudos relacionadas às metrópoles, destacam-se investigações sobre comunicação, consumo,
violência, meio ambiente, cultura popular,
artes e esportes. “Em todas essas áreas,
a cidade se revela como protagonista ou
cenário das pesquisas. Quanto à extensão, trabalhamos com escolas públicas
e alunos de licenciatura, no sentido de
provocar maior reflexão sobre o consumo
na sociedade contemporânea”, explica
Ricardo Ferreira Freitas.
Trata-se de laboratório do Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur) da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ). Nacional, o
grupo reúne instituições em rede para
realização de pesquisas – comparativas
e multidisciplinares – acerca dos impactos metropolitanos da mudança de
modelo de desenvolvimento em 13 metrópoles brasileiras: Rio de Janeiro, São
Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte,
Belém, Brasília, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Natal, Recife e Salvador, além da
aglomeração urbana de Maringá.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
7
Mas e o Brasil?
Por sua magnitude, megaeventos tendem a ressignificar sociabilidades, técnicas
e padrões éticos. Neste sentido, o que dizer
de tais transformações em países ainda em
desenvolvimento, a exemplo do Brasil? De
outro modo: quais as benesses e os prejuízos – financeiros, humanos, tecnológicos,
científicos etc. – dos efeitos provocados por
imensuráveis “tsunamis” comerciais, como
a Copa do Mundo, o show de uma superbanda ou as Olimpíadas?
Em primeiro lugar, segundo Hélio Rodrigues, há que se ressaltar algo de extrema
relevância: a rota dos megaeventos mundiais é
determinada pelo capital. “Dito de outro modo,
é fato que a escolha do país-sede de um megaevento está atrelada à capacidade de se satisfazer as condições exigidas por interesses
econômicos privados de diversas ordens, que
atuam em inúmeras instâncias e com graus
diferenciados, mas sempre de forma conexa,
complementar, na expectativa da obtenção ampliada e continuada de lucro”, comenta.
A Fifa, por exemplo, não realiza
uma Copa do Mundo sozinha. Conforme destaca o pesquisador, os parceiros
da entidade movimentam-se de maneira
fortemente articulada nessa busca. “Por
isso, o fracasso e o sucesso de candidaturas para sediar os jogos da Copa do
Mundo podem ser pensados em termos
da capacidade de resposta a interesses,
do cenário político e econômico local,
dos agenciamentos entre público e privado”, destaca Hélio Rodrigues. Segundo
o pesquisador, tais elementos – mais ou
menos favoráveis e propícios à oferta dos
vultosos recursos que viabilizam o megaevento – reduzem os gastos e maximizam
o lucro da empresa organizadora e de
seus parceiros.
Além disso, a concorrência se estabelece com base nas melhores possibilidades de sucesso do investimento. O Brasil
entrou na rota dos megaeventos, portanto,
não apenas por ter condições, mas, principalmente, por se dispor a satisfazer uma
série de exigências. “E, enquanto se mostrar atrativo para viabilização desses interesses e estiver disposto a fazer as concessões às exigências que lhes acompanham,
o País será forte candidato ao acolhimento
de eventos dessa magnitude”, esclarece
Hélio, ao lembrar, ainda, que não se deve
pensar a metrópole como entidade neutra,
alheia aos processos que nela ganham forma e conteúdo. “Obviamente, é muito forte
a articulação entre os interesses relacionados à realização de megaeventos e aqueles
diretamente ligados aos processos pelos
quais a metrópole se ergue”, completa.
Ricardo Freitas considera que o Brasil não entrou “definitivamente” na rota dos
megaeventos, apesar de vivenciá-los desde a realização dos Jogos Pan-americanos,
no Rio de Janeiro, em 2007. “As últimas
administrações da capital fluminense compreenderam os megaeventos como plataformas de negócios que projetariam a cidade internacionalmente, transformando-a
em um produto mais atraente”, afirma.
Do estádio ao lar
Proposto pelo Observatório das Metrópoles (www.
observatoriodasmetropoles.net), o projeto “Metropolização
e Megaeventos: os impactos da Copa do Mundo/2014 e
Olimpíadas/2016” estrutura-se em 12 núcleos de trabalho. A
iniciativa estabelece o monitoramento das implicações dos
megaeventos esportivos acolhidos pelo País sobre a estrutura
urbano-metropolitana das cidades-sede: Rio de Janeiro, São
Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Brasília, Salvador,
Recife, Fortaleza, Natal, Manaus e Cuiabá. “Os impactos e
especificidades no contexto belo-horizontino, assim como
nos das demais cidades-sede, são investigados por meio de
quatro eixos de análise complementares, levando-se em conta
aspectos econômicos, políticos, sociais, culturais, urbanísticos,
ambientais, dentre outros”, explica Hélio Rodrigues de Oliveira
Jr. Confira as vertentes de investigação do projeto:
»» Eixo 1 – Desenvolvimento econômico: análise dos impactos
econômicos dos megaeventos sobre as metrópoles, sob o ponto
de vista da integração e da justiça sociais. Busca-se identificar
os setores e os agentes beneficiados pelas intervenções, bem
como aqueles que sofrem seus efeitos negativos..
»» Eixo 2 – Esporte e segurança pública: pesquisa dos
efeitos sobre o acesso aos equipamentos e serviços
vinculados ao esporte e à política de segurança pública.
8
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
»» Eixo 3 – Moradia, mobilidade e meio ambiente:
iinvestigação de reflexos sobre a configuração socioespacial
das cidades, em termos da implantação de equipamentos e
serviços coletivos, da realização de obras de mobilidade, da
ampliação do acesso à moradia, da distribuição dos diferentes
grupos sociais na cidade – com identificação de eventuais
processos de diferenciação, segmentação e segregação
urbana – e dos impactos ambientais das intervenções.
»» Eixo 4 – Governança urbana e metropolitana: estudo da
ação dos megaeventos sobre as coalizões de forças sociais
e políticas e a governança urbana e metropolitana das
cidades, no que tange à emergência de novas composições
de agentes e interesses, à ampliação dos espaços de
participação sociopolítica, aos processos de organização de
movimentos sociais, de monitoramento e controle social e às
novas modalidades de financiamento das políticas urbanas.
»» Eixo extra – Estudo comparativo com experiências
internacionais: verificação dos impactos em países/
cidades que abrigaram megaeventos esportivos, com vistas
a avaliar a recorrência de fatores manifestos nesses contextos
e a emergência de posturas refratárias ao acolhimento/
realização dos megaeventos – posto que, a partir de tais
fatores, desenvolvem-se importantes questões de ordem
política, econômica e social.
No caso de Belo Horizonte, segundo
Hélio Rodrigues, é sintomático o fato de
que a capital mineira experimente, hoje,
uma forma de planejamento urbano que
não apenas prioriza o atendimento às demandas da Copa do Mundo – em detrimento das necessidades da cidade e de
seus moradores –, mas, principalmente,
usa o megaevento como fator preponderante ao licenciamento, à legitimação
e à catalisação de políticas urbanas de
favorecimento a capitais com papel determinante na construção da urbe. “Mais
do que isso, a ideia de que a Copa deva
deixar um legado funciona, tão somente,
como pretexto para autorizar a inclusão
de obras que, a princípio, estariam marginalmente relacionadas ao megaevento,
e que, como tal, carecem de legitimação
quanto a sua conformidade com o interesse de capitais financeiros e do mercado imobiliário, e a seu deslocamento
da política urbana e do planejamento
estratégico”.
Por sua vez, o professor Luís Eustáquio Moreira chama a atenção para a
necessidade de os brasileiros compreenderem que o País tem recebido pessoas, e
não deuses provindos de “mundos” mais
adiantados. “Desse modo, todos terão condições de se defender daqueles que não
estiverem bem intencionados. Os efeitos
positivos virão em médio e longo prazos,
por meio do estreitamento dos laços entre brasileiros e estrangeiros”, acredita, ao
sublinhar que megaeventos representam
um grande passo para “nos entendermos
como povo colonizado, mas com direitos
iguais aos dos colonizadores”.
Afinal, segundo o pesquisador da
UFMG, o desenvolvimento de uma nação
está na cultura material realizada. “Somos
muito capazes, individualmente ou em grupo. Relacionar-se e se comunicar são as
chaves para que tomemos consciência das
diferenças, das desigualdades, dos conceitos e preconceitos. Neste sentido, um megaevento é responsável por provocar o impacto de todas essas coisas juntas”, conclui.
Neste cenário, estudos acadêmicos
revelam-se imprescindíveis. “O intercâmbio
internacional de conhecimentos tecnológicos aumentou significativamente nos últimos 14 anos e tem gerado rápidos reflexos
positivos”, afirma Luís Eustáquio.
O aumento da visibilidade das pesquisas científicas, por outro lado, tem atraído alunos de todas as partes do globo, de
modo a aprimorar a expertise nacional. “Em
termos de Engenharia, há, hoje, grandes
construtoras com obras no Brasil e no exterior. A construção de uma barragem como
a de Belo Monte revela-se, sem dúvida,
um megaevento, e, a não ser por questões
sociopolíticas, ela pode ser administrada
e construída por engenheiros brasileiros e
empresas nacionais, ainda que contem com
suportes e consultorias de outras nações”,
completa.
O que pesquisar?
Por sua inata complexidade, megaeventos apresentam-se como tema bas-
tante rico aos pesquisadores. Segundo
Hélio Rodrigues, por suas gigantescas
proporções e pelos impactos gerados, as
feiras internacionais, a exemplo da Expo
98 Lisboa/Portugal, as Olimpíadas realizadas a partir dos anos 1970 e as Copas
do Mundo Fifa mais recentes – searas de
recursos monumentais, grandes interesses em jogo, enormes números de agentes envolvidos e atores impactados – têm
se constituído como referências concretas
para análises comparadas sob diversos
contextos.
Se, por um lado, a literatura especializada dedica-se, com maior afinco, às
dimensões econômicas e espaciais dos
impactos produzidos pelos megaeventos,
por outro, tem aumentado o interesse pela
forma como as dimensões simbólicas,
políticas e sociais são por eles afetadas.
“Também nos interessam a maneira como
se (re)definem os investimentos considerados prioritários em cada contexto, o
modo como as populações são atingidas,
a natureza da participação e as políticas
urbanas e sociais traçadas a reboque dos
megaeventos”, esclarece o pesquisador.
No Brasil, o projeto “Metropolização
e Megaeventos”, o Observatório das Metrópoles e a rede de pesquisadores que
dele fazem parte têm dado grande atenção
ao tratamento de tais questões. “Isso porque, afora a variabilidade de características e de condições que informam países
e cidades-sede para os megaeventos, há
necessidade de se compreender as razões
pelas quais certos fatores neles manifestos
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
9
BH na Copa
Dados da pesquisa “Metropolização
e Megaeventos: os impactos da Copa do
Mundo/2014 e Olimpíadas/2016” revelam
que os valores apurados, referentes aos
investimentos ligados à realização do
megaevento da Fifa na capital mineira,
põem em evidência o poder público federal
como protagonista. “Oficialmente, estão
previstos pouco mais de R$ 2,7 bilhões,
entre financiamentos e investimentos na
cidade-sede de Belo Horizonte, sendo,
aproximadamente, 75% oriundos do
governo federal”, explica Hélio Rodrigues.
Deste total, mais de R$ 1,4
bilhão são investimentos financiados
pela esfera federal, sendo que R$ 400
milhões (ou 28%) provêm de recursos
do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) para
obras de reforma e adaptação do
Estádio Governador Magalhães Pinto, o
Mineirão. O restante se refere às obras
de mobilidade urbana, financiadas pela
Caixa Econômica Federal. Quanto à
distribuição dos recursos previstos
para Belo Horizonte, destacam-se
os financiamentos federais (51%),
seguidos da aplicação direta de
recursos pelos governos federal
(19%), estadual (13%), outros (9%)
e municipal (7%). “A participação
do governo federal, seja por meio
de financiamento ou de aplicação
direta, representa expressivos 70%
dos recursos previstos, enquanto
os governos estadual e municipal
apresentam participação mais tímida”,
comenta o pesquisador.
10
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Comparativamente, a capital mineira
apresenta maior dependência dos recursos
federais do que a média de todas as cidadessede (43% para o financiamento federal
e 19% para aplicação direta de recursos).
Quanto à aplicação pelos governos
estaduais e municipais, BH encontra-se
perto da média nacional – de 16% e 7%,
respectivamente. “Ora, o somatório de
recursos empregados para realização da
Copa do Mundo no Brasil bate, hoje, na
casa dos R$ 30 bilhões investidos. Assim
como em Belo Horizonte, os recursos que
viabilizam este megaevento nas demais
cidades-sede são majoritariamente de
origem pública. É fácil perceber que a
alocação financeira para esta finalidade
colide com demandas de investimentos
importantes em outras áreas”.
Segundo o pesquisador, à medida
que se reconhece a existência de um
déficit histórico de investimentos (e,
portanto, de problemas) em áreas
consideradas prioritárias – como
habitação, saúde, saneamento básico
e educação – e que se revelam as
demandas de investimentos para
viabilização e realização de megaeventos,
faz-se necessário reconhecer que
há evidente desequilíbrio entre as
forças e os interesses envolvidos
nestes processos. “A flexibilização e
a facilitação de meios que beneficiam
os agentes privados e contam com a
condescendência dos agentes públicos
tornam o megaevento bastante atrativo,
direta ou indiretamente, aos capitais
envolvidos em sua produção e aos
que atuam nos processos próprios à
metrópole”, pontua Hélio Rodrigues.
têm se mostrado alinhados à adoção de
modelos neoliberais de políticas sociais e
urbanas, denotando o favorecimento de capitais que atuam na construção da cidade e
exacerbando as condições de desigualdade”, avalia.
A verdade é que nem tudo são flores. Na opinião de Hélio Rodrigues, é
fundamental que se compreenda, em primeiro lugar, o modo como se estabelece
a confluência, “por vezes perversa, entre
interesses econômicos privados e negociações políticas de legitimidade contestável – e, em certos casos, escusas”.
Por fim, também se faz imprescindível a
investigação dos “rumos” de cidades que,
amiúde, desprezam as necessidades concretas e os anseios dos cidadãos que nela
vivem e trabalham. “Isso tem sido apontado por nossa pesquisa. Daí a relevância
de se construir e promover os meios de
enfrentamento e de mudança dessas condições”, finaliza.
Medicina do viajante é um novo campo
novo de atuação, que abrange outras
especialidades médicas, como infectologia, medicina tropical, preventiva e
ocupacional. Todas as variáveis relacionadas aos diversos tipos de viagens e
viajantes são temas de estudo da área.
“As viagens são cada vez mais comuns
e acessíveis em todo o planeta e, com
o aumento exponencial do número de
viajantes, faz-se necessário estudar
mais profundamente os impactos na
disseminação de doenças e formas de
prevenção”, destaca Adelino Freire Jr,
que é membro da Sociedade Internacional de Medicina do Viajante. Ele explica
que, além das orientações aos viajantes
– cuidados preventivos –, os médicos
dessa especialidade avaliam pessoas
que adoecem durante a viagem, com
males que podem ter sido adquiridos
no local de origem, como a malária em
países africanos, ou no local de destino, como a dengue em Belo Horizonte.
Outra possibilidade são as pessoas que
adoecem algum tempo depois de retornarem para casa com enfermidades
que possuem períodos de incubação
de alguns dias ou mesmo de semanas,
como a hepatite A.
Impactos na saúde
Pesquisador da Uerj, Gilmar Mascarenhas lembra, no artigo “Megaeventos esportivos e urbanismo: contextos históricos
e legado social”, que tais empreendimentos são oportunidade para um novo modelo de planejamento e gestão das cidades,
além de chance para pensar e enfrentar
problemas urbanos crônicos. Afinal, para
receber grande número de visitantes, é necessário rever toda a infraestrutura local,
que inclui desde o sistema de telecomunicações e transporte até a rede de hotelaria
e comércio, com a revitalização dos pontos
turísticos.
Outra área afetada pelos megaeventos é a da saúde. Grandes aglomerações
humanas são ideais para a transmissão de
doenças como a gripe. Há de se considerar,
ainda, a presença de visitantes estrangeiros e a possibilidade de transmissão de
enfermidades comuns em outras regiões
do planeta, a exemplo do sarampo. Também é importante prever possíveis sobrecargas nos serviços de saúde, já que, durante o período de duração do megaevento,
a população local aumenta de forma significativa. No caso da Copa do Mundo de Futebol, que terá início em junho, milhares de
estrangeiros e brasileiros irão transitar por
diversas partes do País para acompanhar
os jogos das 32 seleções participantes.
O médico infectologista Adelino de
Melo Freire Jr., especialista em medicina
do viajante, conta que, apesar dos vários
impactos possíveis, eventos esportivos
como a Copa do Mundo e as Olimpíadas,
normalmente, não geram grandes problemas de saúde – tanto à população local
quanto aos turistas. “Dentre os agravos
mais comuns, relacionados a esses eventos, posso citar insolação, desidratação,
traumas leves e abuso de álcool e drogas”,
diz.
O especialista, contudo, não deixa
de dar recomendações. No caso da população local, é importante estar com o
cartão de vacinas em dia e de acordo com
a faixa etária. Para adultos e idosos, eis
a maneira eficiente de prevenção contra
doenças infecciosas. Evitar aglomerações
é uma forma de prevenir enfermidades de
transmissão respiratória, como a gripe e a
meningite. Além disso, há que se lembrar
de usar preservativos em qualquer tipo de
relação sexual.
No caso dos viajantes, o conselho
do médico é procurar atendimento ao
menos quatro semanas antes da partida,
para receber orientações de prevenção de
acordo com características individuais,
itinerário e programação de atividades
durante a viagem. “As orientações gerais
aos viajantes relacionam-se aos cuidados com água e alimentos e à prevenção
de doenças transmitidas por insetos, de
doenças sexualmente transmissíveis, de
trombose em voos de longa duração, de
traumas e acidentes”, explica. As recomendações não são apenas para os estrangeiros: existem, no Brasil, regiões de
risco para certas doenças, como a febre
amarela e a malária. Antes de visitá-las, é
importante tomar as precauções necessárias, expressas em uma vacina ou no uso
de repelentes.
Com relação à Copa do Mundo
2014, o governo brasileiro divulgou nota,
no início do ano, na qual informava que
cerca de 10 mil profissionais de saúde
foram capacitados para atuar durante o
evento. Além disso, as 12 cidades-sede
terão aparato de 531 unidades móveis
do Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência (Samu), 66 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e 67 hospitais
funcionando de forma integrada, para
atendimento aos turistas e à população.
Na página www.saude.gov.br/viajante, é
possível encontrar informações diversas
sobre cuidados para quem visita outros
países ou o Brasil, além de contatos dos
serviços de emergência.
Dica de leitura
Livro: Legados de megaeventos esportivos
Organizadores: Rejane Penna Rodrigues, Leila Mirtes Magalhães Pinto,
Rodrigo Terra e Lamartine P. DaCosta
Ano: 2008
Disponível em: www.esporte.gov.br/
arquivos/sndel/esporteLazer/cedes/LegadosMegaeventosEsportivos.pdf
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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ENTREVISTA
A ousadia
como princípio
Na visão do matemático Jacob Palis Junior, um dos mais
premiados pesquisadores do País, a ciência brasileira
carece de arrojo para aproveitar melhor as oportunidades
Maurício Guilherme Silva Jr.
Ao ouvir suas saborosas gargalhadas,
repletas de energia e simplicidade, é incrível
imaginar que, há décadas, ele se dedique à
complexidade de temas como sistemas dinâmicos e hiperbólicos, difeomorfismos,
fluxos, atratores ou ciclos de Poincaré e suas
bifurcações. Pois nesta entrevista a MINAS
FAZ CIÊNCIA, o matemático Jacob Palis Junior, atual presidente da Academia Brasileira
de Ciências, revela naturalidade, objetividade
e competência não apenas para elucidação
de intrincados teoremas, mas, também, para
elucidação de (enormes) desafios ligados à
atividade científica no Brasil.
Nascido em Uberaba (MG) Palis é
Doutor em Matemática pela Universidade
da Califórnia. Professor titular do Instituto
Nacional de Matemática Pura e Aplicada
(Impa), instituição que dirigiu de 1993 e
2003, detém diversas condecorações nacionais e internacionais – dentre as quais,
os prêmios Moinho Santista (1976), TWAS
em Matemática (1988), InterAmerican Prize for Science (1995), Prize Mexico for
Science and Technology (2001), Trieste
Science Prize (2006) e International Prize
Accademia Nazionale dei Lincei for Mathematics (2008) –, presidiu a Academia de
Ciências para o Mundo em Desenvolvimento (TWAS) e a União Internacional de
Matemática (IMU).
12
Autor de mais de 80 artigos científicos em periódicos no Brasil e no exterior –
o que o torna recordista de publicações em
sua área no País –, Palis é responsável pela
formulação das Conjecturas de Estabilidade, que apontam para uma hipótese global
do comportamento caótico, e da teoria das
bifurcações, que trata do modo como se
modificam as estruturas dos sistemas que
dependem de parâmetros. Abrangentes,
suas pesquisas aplicam-se a áreas e funções distintas, como Mecânica Quântica,
turbulência de fluidos, competição evolutiva das espécies, previsão do tempo e, até
mesmo, mapeamento do genoma.
De que maneira o senhor analisa, hoje,
o mito social em torno da ciência? Nesta segunda década do novo milênio, o
que mudou na percepção das pessoas
em relação à prática científica?
Pesquiso termodinâmica, área da matemática que, por coincidência, foi também
tema de investigação de Jules Henri Poincaré [1854-1912], um dos mais importantes matemáticos de todos os tempos. Além
de tudo o que realizou, Poincaré apreciava
discussões filosóficas e escreveu importantes livros sobre ciência. Em suas obras,
discute tais questões de modo inovador.
Ao abordar a questão do “valor da ciência”,
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Eis as mais importantes obras de
Poincaré sobre teoria e práxis científicas: A ciência e a hipótese, Ensaios
fundamentais e O valor da ciência.
Arquivo Pessoal
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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busca pensar tal valor em referência à
sociedade. Como atividade humana, a ciência propõe a compreensão de modelos
capazes de explicar, por exemplo, os fenômenos da natureza. Felizmente, em nosso
tempo, a aceitação das práticas científicas
pela sociedade é crescente, apesar de lenta. Em retrospectiva, voltemos à época da
Biblioteca de Alexandria: naquele período,
questões como estas eram trabalhadas
por matemáticos e físicos. De lá para cá,
o assunto tem evoluído. E considero consistente essa evolução. Ideias elaboradas
pelo homem, a exemplo das criações de
Deus ou da Terra como centro do universo – princípios apoiados por Aristóteles
– acabaram por retardar o entendimento
público da ciência, que, neste século, é
muito mais consistente para a sociedade
do que no século anterior. Neste sentido,
hoje, o mito da ciência tem fundamentos
muito mais sólidos do que antes. Isso se
deve ao fato de acertarmos muito mais.
Cientistas de quaisquer áreas buscam, no
presente, compreender o futuro com certo
grau de incertezas. Afinal, jamais teremos
cem por cento de certezas sobre algo. Com
o tempo, por meio de novas técnicas e
conjecturas, é possível apurar métodos e
aumentar o grau de certezas. A incerteza é
parte da ciência. E é bom que assim seja.
Qual sua visão acerca da divulgação
científica realizada no Brasil? Tomando-se como pressuposto a importância de aproximar os jovens da ciência,
com vistas, por exemplo, à construção
de vocações, as instituições de ensino superior não viveriam, ainda, numa
espécie de “redoma de vidro”?
A divulgação da ciência é importantíssima. Os cientistas e suas iniciativas,
afinal, precisam do apoio da sociedade.
Sou inteiramente a favor de tal difusão e
aprecio muito a divulgação da ciência.
Comenta-se, é verdade, que os cientistas
da área básica têm preconceito à divulgação de suas atividades. Creio, porém, que
esta visão esteja equivocada. E espero que
não mais se refiram a nós desta forma.
Estou convicto de que estamos cada vez
mais cientes da relevância da comunicação científica. Aqueles que se dedicam à
divulgação merecem nosso maior respeito.
Afinal, esforçam-se para que toda a socie-
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dade possa compreender o trabalho do
cientista. Gostaria de também discutir outra importante questão paralela, referente à
aproximação entre os cientistas e a indústria. Percebo que há grande preconceito
em relação à mistura das práticas científicas com o poder econômico. E preciso,
contudo, compreender a importância do
papel da indústria. Na Academia Brasileira
de Ciências, lançamos a ideia da criação
de fóruns, realizados em diversas regiões
do País, sob o nome de “AcademiaEmpresa”. Buscamos, desse modo, divulgar a importância do desenvolvimento de
pesquisas nas próprias sedes das empresas. Desde que criamos tal iniciativa, nenhum cientista reclamou dela na Academia
Brasileira de Ciências.
Nas últimas décadas, cresceu significativamente o número de citações a
pesquisas e pesquisadores brasileiros
no exterior. Além disso, temos ampliado os índices de registros oficiais de
patentes, principalmente, em áreas de
ponta, como genética e nanotecnologia. Neste cenário de desenvolvimento, o que significaria, para o Brasil, a
possibilidade de receber um Prêmio
Nobel? Que parte da grande estrutura
da produção – e disseminação – da
ciência seria modificada em função
do que aqui chamarei de “reconhecimento internacional”?
A ciência brasileira é relativamente
jovem. O CNPq [Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico] foi criado em 1951, ano em que
também é fundada a Capes [Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior]. Ambas as entidades, portanto, são muito recentes. No mundo, há
instituições do século XVI. Na França, o
Collège de France surge, em 1530, porque a Universidade de Paris revela-se
muito conservadora. Buscavam-se, portanto, outros desafios. A ciência brasileira
é realmente muito nova. E a verdade é que
nosso processo de colonização não contou com muito espaço para a produção
científica. Os portugueses nunca se preocuparam com a construção de escolas ou
de universidades. Nesse aspecto, aliás,
viva Tiradentes! [risos] Na realidade, co-
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Como atividade humana, a
ciência propõe a compreensão
de modelos capazes de explicar, por exemplo, os fenômenos da natureza. Felizmente,
em nosso tempo, a aceitação
das práticas científicas pela
sociedade é crescente, apesar
de lenta.
Por meio da iniciativa, pretende-se
promover a aproximação entre a
comunidade científico-tecnológica e o
meio empresarial, de modo a beneficiar
não apenas as partes envolvidas,
mas, principalmente, a economia e a
sociedade brasileiras.
meça-se a desenvolver ciência no Brasil,
por meio de escolas de superiores, apenas no século XIX. Além disso, o País não
aproveitou boas oportunidades – ao contrário, por exemplo, da Argentina, que, na
virada do século XIX, quando estava bem
economicamente, devido à produção de
carnes, e por ocasião da Primeira Guerra
Mundial, recebeu cientistas de peso, ligados a diversas áreas do conhecimento.
Com base nesta história, não acho que
seja acaso o fato de, em um período relativamente curto de tempo, terem aparecido dois prêmios Nobel por lá [Bernardo
Houssay e César Milstein receberam o
Nobel de Fisiologia/Medicina, respectivamente, em 1947 e 1984]. Perceba que, na
Argentina, há uma sequência. Neste caso,
trata-se, mesmo, de uma linhagem, já que
um dos ganhadores foi aluno do outro.
No Brasil, deveríamos conviver mais com
grandes cientistas. Para tal, precisamos
abrir mais as portas, de modo a aproveitar
oportunidades. Em 2008, por exemplo,
passávamos por uma situação econômica
relativamente privilegiada, em comparação com outros tantos países. Naquele
momento, precisávamos estar preparados
para abrir as portas, pagar bons salários
e trazer grandes figuras ao Brasil. De vez
em quando, ouço dirigentes afirmando
que pagam “salários condignos” aos
pesquisadores. Não gosto da expressão,
pois os cientistas precisam, na verdade,
de “salários competitivos”. Impossível
trazer cientistas de renome ao País e só
lhes oferecer pagamento “condigno”. É
necessário que sejamos ousados.
Permitir que crianças de 4
ou 5 anos tenham fundamentos
de Matemática ou de linguagem
é abrir vastos horizontes. E não
há nada de milagroso nisso.
Precisamos, tão somente, de um
ensino pré-escolar de qualidade,
que proponha uma série de desafios aos alunos.
De modo geral, de que forma o senhor
analisa os modelos de gestão da ciência, da tecnologia e da inovação no
Brasil?
Eu gostaria de ver mais consistência, mais arrojo. Hoje, investimos cerca
de 1,2% do PIB [Produto Interno Bruto]
em ciência. Em várias ocasiões, temos
proposto – principalmente, por meio da
Academia Brasileira de Ciências – que o
Brasil caminhe para os 2%. Afinal, cada
vez mais, é preciso ampliar o suporte a
laboratórios etc. Resultados efetivos, atualmente, dependem disso. Daí a necessidade de políticas mais efetivas e consistentes.
Com relação ao ensino da Matemática, um de seus campos de estudo, em
que estágio o Brasil se encontra?
A Matemática evoluiu muito no País,
mas o ensino ainda peca. Não temos aprendizagem de qualidade, o que é bastante
crítico. Hoje, está comprovado que, independentemente de ainda ser criança ou de
estar no período pré-escolar, o aluno pode
aprender os primeiros fundamentos de Matemática e de linguagem. Isso faz uma grande diferença. Permitir que crianças de 4 ou
5 anos tenham fundamentos de Matemática
ou de linguagem é abrir vastos horizontes.
E não há nada de milagroso nisso. Precisamos, tão somente, de um ensino pré-escolar
de qualidade, que proponha uma série de
desafios aos alunos. Os cientistas sociais
dirão que, desse modo, acabaremos por
forçar demais as crianças. Estou de outro
lado, por pensar de modo distinto. Sou a
favor dos desafios. E quanto mais cedo melhor! O que não quer dizer que as crianças
precisem deixar de brincar e de se divertir.
A pesquisa na área da Matemática no Brasil
começou a tomar corpo, de forma mais consistente, a partir dos anos 1950, quando se
tornaram concretas as oportunidades para
que os pesquisadores viajassem ao exterior,
para fazer doutorado ou participar de programas de intercâmbio. Tudo foi melhorando à medida que os pesquisadores voltavam
às universidades. A Matemática brasileira
passou, então, a ter prestígio internacional.
O ensino, contudo, não acompanhou este
processo. Daí a necessidade de investirmos
na base. Em 2010, numa entrevista que concedi à CNN, perguntavam-me como estava a
Matemática no Brasil. À época, disse ao entrevistador que a própria pergunta precisaria
ser qualificada. Afinal, na “ponta” – a pesquisa –, temos muito prestígio, ao menos
em certos setores. Enquanto isso, na base,
há que se melhorar muito. Diante de tal paradoxo, o repórter não se conformava: “Mas
como é que pode?”. Para mudar esse panorama, a própria Capes criou mecanismos
de incentivo, de modo a fazer com que os
próprios cientistas contribuam para o ensino. A iniciativa tem dado certo. O processo,
contudo, é lento. Afora tal iniciativa, há as
Olimpíadas da Matemática, que envolvem
muita gente – o que inclui crianças de diversas idades – e têm gerado bons resultados.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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biotecnologia
Rápido,
mas nada
rasteiro
Desenvolvido por pesquisadores
da Fiocruz, kit de diagnóstico
com biomarcadores permite
identificação eficaz e
“personalizada” da meningite
Verônica Soares
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Por meio de metodologia inovadora,
já é possível identificar as proteínas da resposta inflamatória dos hospedeiros da meningite, de modo a garantir a análise exata
do quadro clínico do paciente, a partir de
uma leitura sequencial dos resultados. Tais
“biomarcadores” serão empregados em
kits para a identificação das meningites
malignas e benignas. Atende-se, assim, à
vasta demanda por critérios que orientem,
de maneira precisa, a decisão clínica pela
abordagem terapêutica adequada.
Sob liderança do pesquisador Roney
Santos Coimbra, doutor em Microbiologia pela Universidade René Descartes
(Paris 5), a “Pesquisa de biomarcadores
e identificação de alvos terapêuticos para
as meningites” foi desenvolvida no Centro de Pesquisas René Rachou (CPqRR-Fiocruz Minas), com a colaboração de
Rosiane Pereira, também pesquisadora
do CPqRR e coproponente do projeto
junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
e Guilherme Oliveira, coordenador do
Centro de Excelência em Bioinformática
(CEBio), que é fruto de uma ação da FAPEMIG e do CPqRR.
A pesquisa básica que deu início à investigação, financiada pelo CNPq, consistiu
na análise do conteúdo proteico do líquor,
fluido corporal presente entre as membranas cerebrais, que também preenche as
cavidades do cérebro. “Nossa hipótese era
a de que, no líquor, haveria sinais específicos da resposta do paciente às meningites
causadas por diferentes patógenos – cujos
tipos determinam a abordagem terapêutica
adequada. Um diferencial do método é que
o diagnóstico se baseia na resposta inflamatória do paciente, e não na detecção do
patógeno”, explica Coimbra.
O rápido diagnóstico dos tipos de
meningite é um dos fatores cruciais para o
sucesso do tratamento. O kit desenvolvido
a partir da identificação dos biomarcadores
propõe uma solução inédita, que pretende
apresentar resultados imediatos. Comparado às estratégias já existentes de identificação da meningite, o kit configura-se
como instrumento útil e acurado, auxiliando o médico na tomada de decisões para o
tratamento.
Precisão e rapidez
É comum que pacientes procurem
os hospitais já com um quadro avançado
da doença, de modo que a janela de tratamento disponível, por vezes, torne-se
curta. Atualmente, os médicos têm que se
basear na experiência clínica, adquirida ao
longo do tempo e com risco de erro: “O
clínico precisa ter dados para tomar uma
decisão urgente e não perder nenhum caso
de meningite bacteriana, não confundindo
com a viral, menos grave. Se o médico não
iniciar o tratamento com antibiótico e abordagens de controle da inflamação adequados, o paciente pode morrer em questão de
horas”, esclarece Coimbra. Com o novo
método, além do resultado disponível em
alguns minutos, ainda é possível reduzir
o número de internações preventivas em
hospitais.
De acordo com o pesquisador, o
método de diagnóstico a partir da observação dos sintomas e a experiência do
profissional continuam sendo soberanos no critério final de decisão: “Apesar
disso, com esta pesquisa, conseguimos
desenvolver um instrumento mais confiável do que os que temos hoje. Os testes
existentes avaliam parâmetros não específicos da meningite, como níveis liquóricos de glicose, proteína e leucócitos, que
podem ser alterados de acordo com tipo
de alimentação, idade e histórico de doenças, dentre outros fatores”.
O desenvolvimento do kit está sendo
conduzido a partir de duas estratégias: uma
delas usa o teste imunológico Elisa (enzyme-linked immunoassay), que é bastante
comum e pode ser feito diretamente em
laboratório hospitalar, a fim de identificar
o tipo de agente causador da inflamação
das meninges. A outra abordagem consiste
em sistema que utiliza anticorpos artificiais
em parceria com a empresa Bioaptus, que
desenvolveu um protótipo de leitor de eletroforese capilar capaz de permitir ao médico receber, imediatamente, o resultado. A
Fiocruz estabeleceu, com a Bioaptus, um
contrato de pré-licenciamento do novo
método para diagnóstico diferencial das
meningites.
Na pesquisa, foram usadas amostras
de líquor de pacientes, em sua maioria, do
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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Hospital João Paulo II, a partir de parceria com a Fundação Hospitalar do Estado
de Minas Gerais (Fhemig): “O líquor já é
coletado na rotina dos hospitais quando
se tem suspeita de meningite. Por isso,
não causamos transtorno ou desconforto
adicional aos pacientes”, explica Roney
Coimbra. A coleta do material é feita com
punção liquórica na região lombar da coluna vertebral: “Trata-se de procedimento
de risco, mas que, nesse caso, se justifica.
Além disso, o método é recomendado pela
Organização Mundial de Saúde”.
O estudo envolveu amostras doadas
por pacientes ou por seus responsáveis
legais, adultos e crianças. Os pacientes
foram tratados de maneira individualizada,
sendo divididos em quatro classes – que
18
contemplavam os quadros de meningite
viral (a forma benigna), meningocócica e
pneumocócica, além de um “grupo controle”, no qual, ao final dos procedimentos,
foi descartada qualquer infecção do sistema nervoso central, assim como de doenças neurodegenerativas ou psiquiátricas
que poderiam se confundir com meningite.
“O projeto já nasceu orientado para
a aplicação, devido à parceria com o Hospital João Paulo II. Isso é, sem dúvida,
um facilitador nessa etapa, que consiste
em transformar o kit de diagnóstico em
realidade”, argumenta Coimbra, que segue a desenvolver a formatação e a padronização do kit no método Elisa, a fim
de que se possa realizar o registro junto à
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
(Anvisa). Paralelamente, o pedido de patente do método de diagnóstico diferencial
de meningites foi depositado no Instituto
Nacional da Propriedade Industrial (Inpi),
em fevereiro de 2014, pela Gestec-NIT, órgão da Fiocruz responsável pela proteção
intelectual.
Perspectivas
O potencial dos resultados da investigação conduzida por Roney Coimbra
pode ir além do diagnóstico preciso das
meningites e contribuir, também, para a
evolução no quadro atual do tratamento da
doença. Durante a pesquisa, foi possível
identificar rotas de sinalização intracelular
e metabólicas mais afetadas pelos diferentes tipos da doença, orientando a identifi-
cação de candidatos a alvos terapêuticos.
“É um desdobramento que já está em desenvolvimento. Temos o mapeamento das
rotas e, agora, podemos adequar o uso de
anti-inflamatórios, substituindo aqueles de
largo espectro, que também causam efeitos
indesejáveis, como a morte celular programada de neurônios”.
A nova pesquisa indica que seria
admissível substituir os anti-inflamatórios
por medicamentos adequados à causa exata da doença. “Buscamos estratégias para
reduzir as lesões cerebrais, os danos e as
perdas de neurônios, sem ter que, necessariamente, recorrer a um anti-inflamatório
com efeitos colaterais. Resultados preliminares de nosso grupo demonstram que o
tratamento com uma molécula de origem
natural, extraída de plantas, e capaz de modular uma das rotas de sinalização identificadas pela análise proteômica, previne
a morte neuronal em modelo experimental
de meningite pneumocócica”, destaca o
pesquisador.
Conheça melhor a
meningite
Considerada doença endêmica no Brasil, a
meningite consiste em um processo inflamatório das
membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal,
as meninges. Quando causadas por vírus, são, em sua
maioria, benignas, e desenvolvem cura espontânea,
sem deixar sequelas. Já as meningites bacterianas
revelam-se extremamente graves, associadas a
altos índices de mortalidade – da ordem de 30% a
40% – e, dentre os sobreviventes, até 50% podem
ter implicações neurológicas permanentes, como
surdez, déficit de aprendizado e paralisia cerebral,
dentre outras.
Dados do Ministério da Saúde indicam que
os casos de meningites bacterianas em crianças
de até dois anos têm diminuído no País. Nos tipos
mais frequentes da doença – a meningocócica e a
pneumocócica –, foi registrada queda, respectivamente,
de 29% e 30%. Entretanto, casos da enfermidade são
esperados ao longo de todo o ano, com a ocorrência
de surtos e epidemias ocasionais, sendo mais comum a
ocorrência das meningites bacterianas no inverno, e, das
virais, no verão.
A pesquisa da Fiocruz contribui, ainda, para o
cumprimento de ações da agenda estratégica 2011-2015
da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério
da Saúde, que tem entre suas metas a redução dos
riscos e agravos ao bem-estar da população, por
meio de ações de precaução e de promoção de
hábitos saudáveis. Uma das iniciativas consiste
em aumentar para 59%, até 2015, o número de
casos de meningite bacteriana encerrados por
diagnóstico laboratorial específico.
Projeto: Pesquisa de biomarcadores das
meningites para o desenvolvimento de kits
de diagnóstico
Coordenador: Luiz Augusto Pinto
Edital: Rede Mineira de Biotecnologia e
bioensaios; Projeto estruturador do arranjo
produtivo local de Biotecnologia
Valor: R$ 110.000,00
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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zoologia
Fauna em
apuros
Mapeamento de anfíbios e répteis aponta ameaça
por que passam áreas da Serra do Espinhaço
Virgínia Fonseca
A espécie Bokermannohyla itapoty,
presente na Serra do Curral, foi
descrita pelos professores Felipe
Leite e Paulo Garcia
20
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Mais de mil quilômetros de serras e
formações montanhosas, em linha quase
reta, cortando a região central do País no
sentido norte-sul, da Bahia a Minas Gerais.
A Serra do Espinhaço recebeu este nome
em alusão a sua pequena variação longitudinal, que faz dela uma “espinha” – de
Ouro Branco, em terras mineiras, à baiana
Xique-Xique. Se você é aficionado pelas
belezas naturais do Brasil, dificilmente não
botou (ainda) os pés nessas paisagens que
primam por características semelhantes e
absolutamente singulares. Basta dizer que
fazem parte desta construção geográfica
alguns trechos bastante populares, como
Serra do Cipó, Chapada Diamantina, Serra
dos Cristais e Serra de Ouro Branco, dentre
outros.
Na América do Sul, essa cadeia de
serras só perde, em extensão, para a Cordilheira dos Andes – motivo pelo qual
pleiteia a denominação de “Cordilheira
Brasileira”. Grande parte da singularidade
deste ecossistema, porém, está seriamente
ameaçada. Essa é uma das conclusões de
estudo conduzido pelos professores Paulo
Garcia, do Departamento de Zoologia do
Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (ICB-UFMG), e Felipe Leite, do Departamento
de Zoologia da Universidade Federal de
Viçosa (UFV) – campus Florestal. Durante
quase quatro anos, ao longo do doutorado
de Felipe, uma equipe por eles coordenada
realizou minuciosa varredura das espécies
de anfíbios e répteis da Serra do Espinhaço
e dos habitats que os abrigam.
A pesquisa abrangeu toda a Serra do
Espinhaço, desde a Serra de Ouro Branco,
na porção Sul, até o Norte da Bahia, na
Chapada Diamantina, pois, conforme destacam os estudiosos, não há, em Biologia,
divisões políticas, mas “biogeográficas”.
Existia, argumentam os cientistas envolvidos na investigação, um desconhecimento
generalizado sobre a distribuição dos anfíbios na Serra do Espinhaço. “É comum
conhecermos melhor apenas as regiões
próximas aos centros urbanos, por uma
questão de recursos e de acesso”, explica
Paulo Garcia.
Para se ter ideia, a região do Quadrilátero Ferrífero, em Minas, é a mais
trabalhada, pela proximidade e devido aos
interesses econômicos que envolvem a
área. Porções afastadas, por sua vez, não
dispõem de foco específico, de forma que
o acesso permanece restrito. Sem a complementaridade do trabalho e sem estudar
a fauna como um todo, alegam os professores, não é possível compreender o que
ocorre em determinada região.
Assim, o desafio assumido foi o de
montar uma base de dados com a distribuição geográfica de todas as espécies de
anfíbios da Serra do Espinhaço. E, a partir
dessa base, obter informações necessárias
à proposição das regiões mais importantes
para criação de novas áreas de preservação.
O levantamento possibilita planejar e fornecer subsídios aos tomadores de decisão –
especialmente, ao Estado – para a criação
de novas unidades de conservação, além de
verificar se as atuais são suficientes e comportam, de fato, as populações relevantes.
Muitas unidades de conservação
existentes foram criadas com base em aspectos mais cênicos do que biológicos. As
normas que instituem o estudo de preservação, considerando fatores variados, são
recentes. “Antes, fazia-se tudo com base
em critérios cênicos, focados na paisagem,
mesmo. Por isso, muitas unidades não
atendem ao requisito básico, que é preservar a diversidade biológica, pois boa parte
desta biodiversidade não está na reserva,
mas fora dela”, revela Paulo Garcia.
Peculiaridades
A abrangência e a diversidade da
Serra do Espinhaço embasaram a escolha
do local para a realização da pesquisa.
O complexo serrano engloba três tipos
de biomas: Cerrado, Mata Atlântica e, ao
Norte, Caatinga. Além disso, há formações
específicas, como aquelas que ocorrem
apenas nos campos rupestres ou de altitudes, um ambiente de transição, com componentes próprios. Além disso, comporta,
nas partes de maior altitude, os chamados
campos rupestres, conhecidos por sua
fisionomia única e elevada riqueza de espécies endêmicas – ou seja, de ocorrência
exclusiva.
Os campos rupestres possuem
mescla de composição de fauna de Cer-
rado, Mata Atlântica e Caatinga. O fato
de abrigarem elementos endêmicos lhes
confere importância especial no estudo,
inclusive, das mudanças climáticas. Sabe-se que parte dessa fauna é relictual, remanescente de quando esses ambientes
possuíam climas distintos do atual. “Os
estudos dessas regiões podem nos ajudar
a prever mudanças em andamento. Talvez,
ao compreender o que houve no passado,
consigamos prever ou imaginar o futuro”,
defende o professor da UFMG.
Dois momentos principais marcaram os trabalhos de pesquisa. A coleta de
material foi realizada por meio de exaustivas saídas de campo, levadas a cabo,
especialmente, na época das chuvas, de
novembro a janeiro. Outra parte, igualmente importante, compunha-se de visitas
às principais coleções de anfíbios e répteis
do País – como Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro, Museu de
Zoologia da Universidade de São Paulo,
entre outras –, para verificar o que já havia
sido coletado na Serra do Espinhaço e que
constava nesses acervos.
As coleções dão aos pesquisadores
uma ideia do registro histórico, da época em que se coletou o material, além da
referência de localização. Parte desses
acervos, porém, foi registrada em regiões
onde hoje se formaram cidades. Daí o fato
de os animais não mais existirem naquele lugar. Felipe Leite menciona o exemplo
de uma espécie que, anos atrás, havia
sido coletada na capital, no bairro Santo
Antônio. “Provavelmente, num período
em que a região ainda era selvagem”, deduz. Mesmo no Parque das Mangabeiras,
acrescenta o professor Paulo, muita coisa
já não existe.
Como parte da pesquisa realizada,
todo o material precisou ser re-identificado, pois grande parte dele foi coletada em
épocas distantes, com outros nomes e diferentes padrões de identificação. Já o trabalho de campo possibilitou aos biólogos
outro aspecto fundamental: a exploração
de lugares inéditos, que sequer constam
nos registros (veja box à página 23).
Como resultado de todo o esforço
empreendido, os pesquisadores obtiveram
17 mil registros de anfíbios, totalizando
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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Preservação falha
Após a construção do banco de dados,
o grupo realizou uma análise de lacunas, por
meio da qual se estabelece a área necessária para que uma espécie seja minimamente
preservada. O cálculo envolve a estimativa
da extensão total da distribuição do animal
e, com base em critérios previamente determinados, a definição do percentual desta
área que precisa ser preservada. Quanto
menor a distribuição total de uma espécie,
maior a porcentagem da área de que ela
precisa para garantir sua conservação. “Se
determinado animal apresenta ocorrência
numa região vasta, assumimos que parte
daquela distribuição pode ser perdida por
plantações, empreendimentos minerários e
urbanização”, exemplifica Felipe Leite.
Os pesquisadores constataram que a
maioria esmagadora das espécies endêmicas está sub-representada dentro das atuais unidades de conservação – muitas não
ocorrem em nenhum parque hoje delimitado. “Elas estão à mercê das transformações
ambientais que, normalmente, ocorrem fora
dessas unidades”, conclui Paulo Garcia.
Além da análise de lacunas, a equipe
realizou avaliação por distribuição potencial.
Na impossibilidade de ir a todos os lugares,
usam-se modelos para inferir a localização
das espécies endêmicas e gerar o mapa com
esses pontos. A representação é sobreposta
à informação sobre vegetação remanescente,
para ver o que já foi desmatado. Constatou-se, com isto, que muitas espécies perderam
área significativa de distribuição potencial
em função do desmatamento. Para nove es-
22
pécies, o quadro já torna inviável criar áreas
de preservação nos moldes adequados para
proteger o mínimo necessário.
A má notícia não para por aí: comparação desse panorama com análises de
lacunas do mundo todo apontou o caso da
Serra do Espinhaço como o mais preocupante. A ideia, agora, é submeter os dados
às autoridades, para que sejam recalculados os limites das áreas de preservação.
Trabalho similar, realizado em São
Paulo com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesp) daquele estado,
tem conduzido ao mesmo padrão. “São
metodologias e lugares distintos, mas que
chegam à mesma conclusão. Nossa forma
de uso antrópico tem gerado uma situação
complicada, que precisamos repensar”,
adverte Paulo Garcia. Em Minas, o Quadrilátero Ferrífero também é afetado, de forma
a isolar populações importantes de espécies endêmicas, o que, em longo prazo,
pode resultar em extinção. “Não temos nenhum processo em andamento para reverter este quadro, e mesmo as unidades de
conservação não são suficientes”, conclui.
Para Felipe Leite, a palavra de ordem,
neste cenário, seria “priorização”, pois facilitaria, inclusive, o diálogo entre as partes
envolvidas – governo, empreendedores,
mineradoras e outros interessados. “É impossível preservar toda a extensão da Serra. Porém, com o bom mapeamento das
ocorrências, conseguimos selecionar áreas
prioritárias e abrir mão de outras”, pondera.
Neste sentido, Paulo Garcia avalia
positivamente a iniciativa de editais como
o do Programa Biota Minas, da FAPEMIG, que possibilitou o mapeamento,
mas adianta: a falta de continuidade gera
grandes perdas. “A ausência de políticas
públicas dificulta o andamento e provoca
perda de dados significativos, os quais, em
outro momento, precisarão ser novamente
levantados”, conclui.
Referência
O trabalho realizado pelos professores Paulo e Felipe trouxe contribuições que
devem refletir em outras pesquisas na área.
A partir do material coletado, eles criaram
uma completa coleção testemunho, que inclui, até mesmo, girinos e amostras de tecidos, para compor banco de DNA das espécies. Os exemplares estão depositados
na Coleção Herpetológica, que faz parte
das Coleções Taxonômicas do ICB-UFMG,
grande acervo biológico representativo da
fauna e flora de Minas e do País. Em breve,
todo o material será transferido para um
prédio próprio no campus, a ser construído
com recursos federais obtidos pelo Comitê
de Coleções Taxonômicas e pela Congregação do ICB.
A coleção já se tornou referência nacional e foi selecionada pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) e pelo governo do
Estado, que irão custear a disponibilização
de seu banco de dados para uso público.
Isso tornará possível a consulta das infor-
Arquivo do projeto
163 espécies, 47 delas endêmicas – ou
seja: só ocorrem na Serra do Espinhaço.
Além disso, 13 espécies revelam-se potencialmente novas, enquanto outras cinco,
comprovadamente inéditas, foram descritas e geraram trabalhos publicados pelo
grupo. Felipe Leite esclarece que, embora
tenha começado a pesquisa, oficialmente,
em 2009, quando ingressou no doutorado, vinha coletando exemplares desde
a graduação. “Suponho que contabilizo,
neste material, mais de 10 anos de coleta
de dados”. Já na estruturação da base de
informações, o professor calcula que tenha
levado cerca de dois anos e meio.
Encontrada na Chapada Diamantina, Bokermannohyla itapoty é uma das espécies endêmicas
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Arquivo do projeto
Projeto: Anfíbios e répteis da Serra
do Espinhaço: preenchendo as lacunas
do conhecimento de quatro áreas prioritárias para a conservação da herpetofauna de Minas Gerais
Coordenador: Paulo Christiano de
Anchietta Garcia
Edital: Programa Biota Minas
Valor: R$ 28.585,20
Leptodactylus oreomantis, também da Chapada Diamantina, descrito pelo professor Felipe Leite
Raquel Domingues
mações por instituições de todo o mundo,
que poderão entrar em contato para solicitar material e detalhes sobre as espécies.
Os pesquisadores também foram convidados, pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama),
a auxiliar na montagem da lista nacional de
animais em vias de extinção.
Outro resultado é o desenvolvimento
de uma chave de identificação interativa
para anfíbios. A equipe fotografa os animais
com uma lupa especial, gerando imagens
de qualidade, e transfere a um software
específico, que facilita a identificação de
espécies por meio da filtragem de suas
características – cor, formato das partes do
corpo, tamanho, local de coleta, entre outras. A ideia é oferecer o programa na internet, para que outras pessoas, inclusive leigos, auxiliem, de forma ágil, os processos
de identificação. Isso facilitaria, inclusive,
trabalhos de consultoria ambiental.
Ainda na vertente tecnológica, foi gerado um guia eletrônico de cantos dos anfíbios, com foco no Quadrilátero Ferrífero.
O material resultará em CD e em aplicativo
que possibilita identificar o animal pelo
som emitido.
Felipe Leite e Paulo Garcia ajudaram a compor coleção que se tornou referência
Sobrevivência na selva
As expedições de campo para acessar
locais inéditos na Serra do Espinhaço
duravam, em média, 10 dias. Nesse período,
os pesquisadores precisavam prescindir de
praticamente todo o acesso à tecnologia.
Como a maioria dos lugares eram picos, não
havia sequer estradas, e os celulares não
funcionavam. “Íamos de carro até onde dava
e, depois, púnhamos mochila nas costas”,
conta Felipe Leite. Os únicos aparelhos
indispensáveis eram o GPS e a lanterna – as
coletas são feitas quase sempre à noite, já
que os anfíbios, em sua maioria, possuem
hábitos noturnos.
Os pesquisadores contam que,
por vezes, a tecnologia se restringe aos
laboratórios. “Na mata, quanto mais
habilidade para sobreviver sem tecnologia
você tiver, tanto melhor”, assegura o
professor, que compara as expedições
à atuação dos primeiros naturalistas.
O veterano Paulo Garcia acrescenta
que, para os participantes, trata-se de
oportunidade única. “Este tipo de projeto
ajuda a formar os alunos em situações
práticas de campo e de laboratório,
algo que apenas um curso de Biologia
não proporciona. Estamos, portanto,
qualificando recursos humanos altamente
especializados para a pesquisa”, avalia.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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Sabedoria em
touchscreen
computação
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Iniciativa da PUC
Minas pretende
transmitir
conhecimento aos
idosos por meio
de objetos de
aprendizagem em
dispositivos móveis
Camila Alves Mantovani
O envelhecimento da população
mundial é um fenômeno demográfico que
desafia as sociedades contemporâneas.
No Brasil, a população idosa cresce continuamente. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), extraídos da Pesquisa Nacional
de Amostras de Domicílios (Pnad), realizada em 2012, o número de pessoas com
mais de 60 anos correspondia a 12,6% da
população, ou seja, quase 25 milhões de
indivíduos.
Resultante de uma série de fatores ligada às melhorias nas condições de vida da
população, tal cenário apresenta impactos
não apenas aos aspectos macrossociais
do País, mas, também, aos sistemas de
saúde e de previdência, assim como gera
importantes consequências no dia a dia da
população.
Com idades entre 60 e 65 anos, os
brasileiros iniciam o processo de aposentadoria, fato que provoca mudanças significativas em seus estilos de vida. Trata-se
de alterações que vão da provável diminuição da renda à perda de inserção social,
devido às dificuldades do sujeito em se
manter atualizado. Sendo assim, é preciso
pensar na promoção da qualidade de vida,
para a população idosa, de maneira bastante ampla.
Dentre os principais fatores que podem promover essa melhoria, destaca-se a
oportunidade de o idoso conseguir manter-se atualizado, seja para trabalhar, seja
para acompanhar conversas à mesa com a
família. Áreas como Educação, Psicologia,
Saúde e Computação têm se ocupado de
estudos dessa natureza.
Coordenado pela professora Lucila
Ishitani, do Instituto de Ciências Exatas
e Informática da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais (PUC Minas),
o projeto “M-learning para usuários com
restrições decorrentes da idade” pretende
oferecer opções de atualização de conhecimento ao público idoso, a partir do desenvolvimento e da avaliação de objetos
de aprendizagem em dispositivos móveis.
De acordo com a pesquisadora, o aumento da longevidade tem levado muitos
idosos a buscar formas de permanecer em
atividade. Neste sentido, assim como as
opções de cursos presenciais, o ensino a
distância surge como interessante opção,
em função da flexibilidade – de horários e
ferramentas – oferecida ao aluno.
No entanto, se, até o final da década
de 1990, os computadores eram os dispositivos mais emblemáticos do ensino
virtual, a partir do século XXI, as mídias
móveis, com destaque para os celulares e
smartphones, entram em cena. A partir da
digitalização e da ampliação da capacidade
de processamento de dados, os recursos
computacionais dos aparelhos têm se
ampliado. Em função disso, o projeto da
PUC Minas buscou conhecer e aproveitar
melhor as potencialidades de tais dispositivos no contexto do mobile learning, ou
m-learning (aprendizagem móvel, em tradução livre).
Segundo Lucila Ishitani, o idoso de
hoje, durante grande parte de sua vida,
não lidou muito com os computadores – e
menos ainda com os celulares inteligentes.
Contudo, de acordo com resultados apontados pela pesquisa, o fato de não possuírem
contato prévio não se revela impeditivo para
a abertura ao uso dos aparelhos. “Apesar de
não terem muita intimidade com a tecnologia, no momento em que tinham acesso,
encantavam-se com as inúmeras possibilidades de uso”, afirma, ao lembrar que o
foco nos dispositivos móveis deveu-se ao
fato de o investimento em computadores
mostrar-se alto, tanto do ponto de vista financeiro, quanto do esforço necessário à
aprendizagem para utilização.
“A realidade é que muita gente não
vai comprar um computador. Foi por isso
que pensamos nos dispositivos móveis.
Eles até podem ter custo elevado, mas é
possível ter um smartphone de valor inferior. Além disso, o dispositivo oferece
menos resistência por estar ligado a um
objeto que o indivíduo já usa, o telefone”,
destaca Lucila.
Sensibilidade(s)
Vencida a barreira à escolha dos dispositivos móveis como forma de “ambiente” para busca de informações, é preciso
pensar na experiência do usuário durante
seu uso. A experiência é agradável? O
idoso sente-se confortável e motivado?
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
25
Com base em tais questões, para além da
preocupação com o conteúdo, a pesquisa
apontou a necessidade de se pensar interfaces que atendessem às características do
público mais velho.
No que concerne a tal desenvolvimento, existe uma série de questões e
pré-requisitos a ser considerada. Entre tais
fatores, a pesquisadora destaca o tamanho
da letra, o contraste de cor e o tempo de
resposta, preocupações que se relacionam
à diminuição das habilidades motoras,
cognitivas e perceptivas resultantes do
avanço da idade. Além disso, havia questões referentes à própria experiência de
uso de equipamentos tecnológicos.
Como exemplo, Lucila destaca as
experiências realizadas, no projeto, com as
telas touchscreen. A maior parte dos idosos
pesquisados – e representativos de uma geração – não teve muito contato com a referida tecnologia, estando mais acostumados
ao uso de botões. Ao experimentarem as
telas sensíveis ao toque, os participantes
da pesquisa acabavam por exercer pressão
maior que a necessária, interferindo na interface. “Dependendo do aplicativo, eles não
conseguem interagir, porque o equipamento
não responde a determinado tipo de pressão. Por isso, os aplicativos desenvolvidos
têm que ser pensados, por exemplo, para
aceitar toques mais fortes”, conclui.
Outro interessante resultado obtido
refere-se à questão da dinâmica da atividade. A coordenadora destaca que a marcação de tempo para a realização de ações é
algo que estressa bastante os idosos. Sendo assim, é recomendável criar iniciativas
que não apresentem limitação de tempo
para sua execução.
Apesar de os resultados serem bastante expressivos, permitindo a caracteri-
26
zação do público em relação ao uso dos
dispositivos, a pesquisadora destaca o
fato de esse segmento apresentar grande
heterogeneidade. “É uma faixa de idade
muito grande, abarcada sob denominação
única: terceira idade. Há pessoas com 75
anos que estão ótimas e outras que já têm
a saúde fragilizada. Dessa forma, durante o
desenvolvimento e a avaliação dos objetos
de aprendizagem, procuramos trabalhar
com as características mais gerais e representativas desse público”, pontua.
Desenvolvimentos futuros
Após a conclusão do projeto, as investigações encontram-se em nova fase.
De acordo com Lucila Ishitani, estão sendo
realizados estudos de usabilidade com o
objetivo de desenvolver aplicativos para
o público idoso. Tendo ainda como foco
a questão da aprendizagem, o grupo tem
se debruçado sobre o universo dos jogos,
com vistas à incorporação dessa dinâmica
aos aplicativos de cunho educacional.
Ao tomar por base os chamados jogos
sérios, o estudo busca descobrir, dentro
desse universo, o que seja de interesse dos
idosos, para o desenvolvimento de interfaces.
A partir de aplicativos gratuitos já existentes,
foram feitos testes com o público-alvo, e,
com base nos resultados obtidos, iniciou-se
a elaboração de um protótipo.
Ao avaliar o projeto e seus desdobramentos, a pesquisadora destaca que um dos
principais méritos do estudo foi confirmar a
necessidade de se investir em investigações
e iniciativas com foco nos mais velhos.
“Vimos que é fundamental oferecer a esse
público opções de novos aprendizados. Por
que não continuar a aprender? A aposentadoria não pode significar o fim. Há muita
vida pela frente”, conclui.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Diferentemente de outras atividades lúdicas, os chamados “jogos sérios” (serious games) têm foco em aprendizado
específico e intencional.
genética
eram os deuses
geneticistas?
Projeto de extensão procura socializar conhecimento
sobre doenças sanguíneas de origem genética
Virgínia Fonseca
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
27
Fazendo escola
A vertente do projeto Nagente,
conduzida em parceria com a
PUC Minas, buscou socializar os
conhecimentos da Genética com
professores de Biologia da rede
pública de Belo Horizonte. A partir
da colaboração de docentes e
estudantes do curso de Ciências
Biológicas da universidade, foram
desenvolvidos materiais de ensino
capazes de facilitar o processo de
ensino-aprendizagem nesta área.
Raquel Santiago
Práticas e jogos faziam parte
do modelo pedagógico adotado,
apresentado aos professores do
ensino médio por meio de uma
oficina que abordou conteúdos
como variações das leis de Mendel;
biologia molecular e biotecnologia;
genética e princípios evolutivos.
A equipe produziu oito modelos e
jogos, além de uma apostila. Alguns
foram entregues na Escola de Saúde
Pública de Minas Gerais, em Belo
Horizonte, e há outros em exposição
no Centro de Integração e Valorização
das Atividades Acadêmicas (Ceiva)
do Departamento de Ciências
Biológicas da PUC Minas.
Produção de modelos didáticos foi uma
das faces do projeto
28
Em 1997, o mundo acompanhou,
estarrecido, o anúncio de que cientistas
do Instituto Roslin, na Escócia, haviam realizado inédita clonagem de um mamífero.
Quem não há de se lembrar da famigerada
ovelha Dolly? Já à época, também estava
em andamento outro estudo, empreendido
em nível global, com resultados admiráveis: o mapeamento genético da espécie
humana. O Projeto Genoma Humano, que
teve participação brasileira, iniciou em
1990 e concluiu, em 2003, o sequenciamento dos genes que constituem o homem. Ambas as iniciativas científicas compõem marcos da evolução das pesquisas
em Genética e Biologia Molecular, campos
que, nos últimos anos, sob holofotes, despertam curiosidade e controvérsia.
Tanto na academia quanto fora dela,
pontos polêmicos relacionados a pesquisa
genômica, clonagem, emprego de células-tronco, produção e uso de organismos transgênicos têm sido discutidos, embalados pela
visibilidade midiática. “As questões advindas
destes temas convocam as pessoas a refletir e
a opinar sobre benefícios, riscos, implicações
éticas, morais e sociais das biotecnologias geradas a partir de pesquisas”, corrobora Cibele
Velloso Rodrigues, professora da Universidade Federal de Juiz de Fora, campus Governador Valadares. Doutora em Genética Genética
e especialista em Genética Molecular Humana, a pesquisadora idealizou propostas que
buscam socializar os conhecimentos da área,
estendendo-os, especialmente, aos pacientes
com distúrbios sanguíneos hereditários – hemoglobinopatias e coagulopatias – investigados pela Fundação Centro de Hematologia e
Hemoterapia de Minas Gerais (Hemominas).
O projeto de extensão “Socialização
da Genética: formação do Núcleo de Apoio e
Orientação em Genética (Nagente)”, iniciado
em 2009, presta orientação aos profissionais da Fundação Hemominas quanto a metodologias e interpretação de resultados de
diagnósticos em Genética. Paralelamente,
na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), onde Cibele Velloso lecionava então, o grupo trabalhou com a
criação de materiais didáticos para oficinas
de educação continuada para professores de
ensino médio de Belo Horizonte, bem como
para profissionais de saúde.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Ao possibilitar a vivência de atividades experimentais empregadas em
Genética e Biologia Molecular, a proposta contribui, segundo a professora, para
que a metodologia usada na produção de
conhecimentos nestas áreas seja melhor
compreendida.
Perfil aprofundado
Cada “microporção” do material de
que somos feitos – minúsculas estruturas
químicas (moléculas) que reúnem quatro
bases, cuja sequência se alterna – carrega traços de nossos antepassados e pode
influenciar no que seremos (nós e nossos
descendentes). Com o mapeamento genético humano, grandes perspectivas se abriram aos estudos relacionados à prevenção
e ao tratamento de doenças de origem genética.
Na Fundação Hemominas, o grupo
coordenado pela professora Cibele iniciou
a proposta avaliando os prontuários dos
pacientes cadastrados com um distúrbio
de coagulação sanguínea conhecido como
doença de Von Willebrand. Por meio de
consultas médicas e de dados obtidos nos
prontuários, os estudiosos criaram dois
bancos informatizados, com informações
clínicas e laboratoriais. “A partir de tais
elementos, temos conseguido traçar um
perfil da realidade desta doença genética,
reclassificar alguns dos seus tipos e melhorar o atendimento a este público”, comemora a coordenadora.
Ainda no que tange à atuação junto
aos profissionais de saúde, a equipe realizou
encontros de formação com funcionários da
Fundação e produziu uma cartilha de orientação, a eles destinada, sobre a doença de
Distúrbio hemorrágico resultante de
defeito quantitativo e/ou qualitativo do
fator Von Willebrand (FVW). Na maior
parte das ocorrências, trata-se de doença genética, congênita, transmitida como
caráter autossômico, resultante de mutações no gene que codifica o FVW. Das
enfermidades hemorrágicas hereditárias,
é a mais prevalente, chegando a um caso
para cada 100 habitantes. Segundo dados do Ministério da Saúde, entretanto,
ainda é subdiagnosticada no País.
ticipação de professores de Departamentos
de Saúde e de Nutrição.
No escopo da proposta está, ainda,
o desenvolvimento de estudos com crianças das escolas municipais de Governador
Valadares, nas quais serão avaliados dados antropométricos, de pressão arterial e
informações familiares que possam gerar
o perfil fenotípico dos participantes. “Assim, poderemos investigar os riscos de
hipertensão, obesidade e diabetes. Realizaremos, junto às escolas e aos familiares
destas crianças, orientações genéticas e
nutricionais”, adianta Cibele Velloso. Além
disso, a ação envolverá professores de
Biologia das escolas públicas da região.
Paloma Araujo
Von Willebrand. Os dados trabalhados com
os pacientes da enfermidade resultaram em
novas possibilidades de desenvolvimento
de pesquisas, e, segundo Cibele Velloso,
têm fornecido suporte para o conhecimento
mais abrangente e cuidadoso do público-alvo. “Além disso, tivemos a oportunidade de
apresentar aos profissionais de saúde, e à
direção da Fundação Hemominas, a necessidade de investir na melhoria do diagnóstico
e do acompanhamento terapêutico dos pacientes”, comenta.
O núcleo permanece ativo no acompanhamento dos pacientes com a doença, sob
coordenação da médica Maria Sueli Namen
Lopes, e na alimentação dos dois bancos
de dados informatizados, organizados pela
bióloga Stela Brener. Agora, os trabalhos
estenderam-se ao Hemocentro de Governador Valadares, em parceria com o campus
local da UFJF. A equipe formada ali pretende
realizar, na cidade, pesquisa com pacientes
de anemia falciforme e alfa-talassemia. O alcance da proposta também se ampliou, com
atividades na área de Nutrição. O novo projeto, intitulado “Núcleo de Apoio e Orientação em Genética e Nutrição: NAOriGeN”, foi
aprovado pela FAPEMIG em 2013, com par-
Minicurso proporcionou desenvolvimento de atividades práticas
Genética e prevenção segundo Angelina Jolie
Em 2013, a atriz Angelina Jolie optou
por se submeter à dupla mastectomia,
como forma de prevenir uma doença de
origem a que ela estaria sujeita devido
a fatores genéticos. A notícia causou
alvoroço e muito debate sobre o tema.
Para a professora Cibele Velloso, a mídia
tem traduzido e levado ao público não
acadêmico informações relevantes das
descobertas da Genética na área humana
e, consequentemente, das questões
éticas advindas destas investigações.
“No entanto, ainda é preciso investir na
formação continuada dos educadores
das Ciências Biológicas que atuam nos
ensinos fundamental e médio, para que
tais informações sejam abordadas de
forma menos abstrata e mais próxima da
realidade dos estudantes e da comunidade
em geral”, opina.
Portaria publicada recentemente
pelo Ministério da Saúde deve contribuir
para a socialização do conhecimento.
Trata-se do documento que cria a Política
Nacional de Atenção Integral às Pessoas
com Doenças Raras no Sistema Único de
Saúde (SUS). Dentre as enfermidades,
enquadram-se as que têm, como causa,
a contribuição genética.
Desse modo, usuários do SUS
passarão a contar com rede de atendimento
estruturada em serviços de atenção
especializada e de referência – entre os
quais, estarão o diagnóstico das doenças
raras e o aconselhamento genético.
“A curiosidade e a consciência das
pessoas sobre o assunto devem aumentar
significativamente nos próximos anos
e demandar dos profissionais da saúde
a capacidade de transmitir, de forma
simples, mas fidedigna, conhecimentos
da área”, prevê.
Projeto: Socialização da Genética: formação do Núcleo de Apoio e Orientação em
Genética
Coordenador: Cibele Velloso Rodrigues
Edital: Extensão em Interface com a Pesquisa
Valor: R$ 47.040
Projeto: Núcleo de Apoio e Orientação em
Genética e Nutrição: NaOriGeN
Coordenador: Cibele Velloso Rodrigues
Edital: Extensão em Interface com a
Pesquisa
Valor: R$ 39.165
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
29
eNGENHARIA DE ALIMENTOS
Eles,
definitivamente,
se completam
Técnica desenvolvida por estudiosos da Universidade Federal de Viçosa
permite que se transmitam nutrientes do arroz ao feijão (e vice-versa)
William Rocha Ferraz
30
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Presença indispensável nas receitas
da culinária brasileira, o arroz com feijão
tornou-se emblemático na cultura nacional, e, variando de estilo aqui e acolá, dá
as caras nos quatro cantos do País. Fruto
de miscigenação da tradição lusitana –
que, por herança mediterrânea, tem o arroz
como carro-chefe das refeições – com os
costumes dos escravos africanos e ameríndios, que consumiam feijão em diversas
formas, a combinação ganhou tanta popularidade em terras tupiniquins que, hoje, é
difícil imaginar uma refeição sem o apetitoso dueto.
Reza a lenda – fomentada pelo historiador, antropólogo e jornalista Luiz da Câmara Cascudo (1898-1986) – que o responsável pela harmonização dos grãos, em
um mesmo prato, foi o monarca português
Dom João VI, famoso por sua glutonaria
inveterada e pela irrefreável apreciação à
arte da Gastronomia. Controvérsias à parte, fato é que o ávido gosto do rei por novos paladares contribuiu para difundir, no
Brasil, um hábito alimentar que redefiniu a
qualidade de vida da população.
A combinação parecia elevar o moral de soldados e trabalhadores rústicos.
E não é para menos. A mistura assegura
importante complementação nutricional.
Ambos os alimentos possuem, em sua
composição, substâncias essenciais ao
bom funcionamento do organismo humano. Em termos de nutrientes essenciais,
o que falta em um é fornecido pelo outro. “Ambos possuem extensa gama de
vitaminas do complexo B, carboidratos e
ferro. No arroz, encontram-se, exclusivamente, cálcio e folato. Já o feijão é detentor de proteína vegetal e de minerais
fundamentais”, explica Nilda de Fátima
Ferreira Soares, doutora em Ciência de
Alimentos e coordenadora da equipe de
embalagens ativas da Universidade Federal de Viçosa (UFV), ao lembrar, ainda,
que o arroz possui metionina, enquanto o
feijão, lisina. “Cria-se, desse modo, o elo
entre aminoácidos indispensáveis à reparação de tecidos do organismo”.
Ademais, a combinação apresenta um
benefício extra: se consumido diariamente,
mas sozinho, o arroz pode provocar aumento
das taxas de açúcar e de insulina presentes
no sangue. Já em parceria com o feijão, tal
efeito é controlado, por meio da conservação
da estabilidade da glicose. “Todos esses fatores fazem do prato um dos mais completos
do Ocidente”, ressalta Nilda Soares.
Entretanto, apesar de sua popularidade, a iguaria ainda passa despercebida à
mesa de muitos brasileiros, que não a têm
como combinação palatável, principalmente, no que diz respeito ao feijão. Esse
comportamento é muito frequente entre as
crianças – e é na infância que a completa
entrega de nutrientes provida pelos alimentos revela-se ainda mais importante,
devido às necessidades de um organismo
em formação.
Ao pensar, inicialmente, nesse público, Nilda Soares e a equipe do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV
deram início a projeto cujo objetivo seria a
incorporação dos nutrientes de um alimento na composição do outro, com vistas à
possibilidade de maior oferta de nutrientes
essenciais a indivíduos que não têm por
hábito o consumo dos grãos combinados,
numa mesma refeição. A investigação resultou de outras duas pesquisas, desenvolvidas separadamente, com ênfase no
enriquecimento do arroz e do feijão.
Liberação de nutrientes
Os estudos se enveredaram por estratégias pouco usuais, no sentido de agregação de valor nutricional aos alimentos.
“Geralmente, o processo de enriquecimento alimentar dá-se por meio da incorporação de nutrientes à composição da comida,
método que depende de maior dispêndio
Trata-se de recipientes que apresentam
interação com os produtos que abrigam.
De acordo com Nilda Soares, “esses envoltórios são capazes de controlar uma
propriedade que se deseja, como inibir
o amargor de determinados alimentos ou
exercer ação antimicrobiana. No projeto
em questão, o objetivo é o armazenamento de nutrientes”, explica. Em 1998,
a UFV, com apoio da FAPEMIG, trabalhou
no desenvolvimento do primeiro projeto
de embalagens ativas do País. Tal pesquisa foi tema de reportagem publicada na
edição nº 9 de MINAS FAZ CIÊNCIA.
de fase laboratorial. A produção que experimentamos baseou-se na inserção dos
nutrientes em uma espécie de revestimento
biodegradável e hidrossolúvel, para que,
durante o cozimento, eles fossem liberados
no alimento”, explica Soares.
A pesquisadora, que possui conhecimento na área de fabricação de embalagens ativas, explica que o método foi testado a partir do pressuposto de que o uso
desse recurso permitiria uma produção
mais dinâmica. “Isso se reflete na oferta do
produto em maior escala e no atendimento
mais eficaz às demandas de um prospecto
de mercado”, comenta.
Para introdução de nutrientes no
alimento, a pesquisadora baseou-se no
modelo de preparo de arroz instantâneo,
cozido por meio de imersão em água fervente, sem retirada da embalagem. Nesse
caso, buscou-se incorporar, ao invólucro,
uma espécie de biofilme à base de celulose, modificada para preservar os nutrientes característicos do feijão. “Resistente à
temperatura média de cozimento do arroz,
entre 90º e 100°C, mas devidamente confeccionada para liberar os nutrientes quando em contato com a temperatura de cozedura, a tecnologia agrega valor nutricional
ao arroz quando aquecida”, conclui.
No caso do feijão, que requer procedimentos que inviabilizam o processo
de cozimento rápido, a técnica aplicada
envolveu metodologia inovadora. Os estudos iniciais consistiram no desenvolvimento de uma solução à base de amido,
de consistência glutinosa, que demonstrou
potencial para conservar as propriedades
nutricionais do arroz.
Na solução, os grãos de feijão são
imersos. Após a secagem, os feijões, envoltos pela substância, estão prontos para
transportar, ao prato do consumidor, também as propriedades do arroz. “Durante o
cozimento, os nutrientes se diluem e se misturam ao caldo do feijão. O tipo de solução
usada não interfere nos valores nutricionais
propostos, nem adultera o sabor dos grãos”.
Entretanto, a preocupação dos
cientistas com a qualidade do produto
estende-se, ainda, ao aspecto visual do
alimento. “Durante os estudos, constatamos que o revestimento de amido confere
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
31
Daniel Sotto Maior
Nilda Soares: inserção de nutrientes é realizada durante cozimento
aos grãos uma tonalidade opaca, esbranquiçada. Considerando que essa característica pudesse comprometer a adesão do
produto junto ao público, estamos conduzindo novos estudos”. Ainda em fase de
testes, a matéria selecionada para compor
o revestimento dos grãos foi a cera de
carnaúba – que, natural e comprovadamente sem malefícios à saúde humana, é
capaz de atender à proposta tal como a
goma de amido. Entretanto, por ser mais
translúcida, conserva o feijão em sua coloração própria.
Encontrar o produto nas prateleiras
de seu supermercado favorito, porém,
ainda depende de muita ciência aplicada.
De acordo com a pesquisadora, o projeto
passa, atualmente, por importante fase, até
que esteja pronto para distribuição ao público. “Conduzimos estudos que buscam
identificar a sobrevida do produto, ou seja,
o período de consumo seguro após a fabricação”, explica.
Outro estudo em andamento diz respeito ao consumo simultâneo de arroz e
feijão enriquecidos. “Desenvolvemos pesquisas sobre os valores toleráveis de consumo diário dos nutrientes em questão, para,
então, determinar as taxas recomendáveis a
cada pessoa, seja por faixa etária, gênero ou
rotina. Já se pode garantir que não há malefícios no consumo dos produtos de maneira
associada. O que se modifica é o volume
das porções, de acordo com o estilo de vida
de cada indivíduo”, esclarece a pesquisadora. Importante ressaltar, por fim, que o pro-
32
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
duto está em processo de patenteamento,
fase que pode levar alguns anos.
Aspirações
Nilda Soares explica que as pesquisas já desenvolvidas representam apenas
o primeiro passo para que se dê início
a uma linha específica de investigações
no campo da Engenharia de Alimentos.
“Agora que nossa equipe constatou a
funcionalidade do produto, buscaremos
realizar estudos voltados à criação de
produtos para nichos específicos, como
idosos, populações infantis em regiões
cuja alimentação ofereça baixo índice
proteico, ou mesmo uma linha de alimentos especialmente desenvolvida para
atender as necessidades nutricionais de
atletas”, explica.
A pesquisa também demonstra forte
candidatura à abrangência internacional,
uma vez que não é comum encontrar, em
outras culturas, o hábito de combinar os
grãos em suas refeições. “O uso da tecnologia seria uma excelente oportunidade
para povos de outros países consumirem
os nutrientes de nosso prato tradicional,
mesmo em culturas cujo paladar não está
acostumado à combinação do arroz com o
feijão, ou em regiões onde o cultivo dos
grãos seja pouco viável”, conclui.
Para saber mais sobre o assunto, acesse o blog
Minas faz Ciência e acompanhe os programas
Ciência no Ar e Ondas da Ciência.
arte e educação
Passos
transcendentes
Projeto trabalha o diálogo entre diferentes vocabulários
da dança e estimula a educação sensível para a arte
Ana Luiza Gonçalves
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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da Universidade Federal de Viçosa (UFV),
onde fundou o curso de Dança (bacharelado
e licenciatura).
Aulas teórico-práticas sobre os diferentes gêneros da dança, fruição de vídeos,
apreciação de espetáculos, oficinas e excursões pedagógicas foram as formas encontradas por Alba Vieira para debater, com
os alunos, a amplitude do conceito da dança. Por meio do projeto, essa arte acabou
valorizada e redescoberta por aqueles que
se propuseram a fazer parte da iniciativa.
Os pesquisadores notaram, contudo,
que, mesmo com investimento e apoio
para educar pessoas nesse âmbito, ainda
há falhas a serem sanadas: recentemente,
pesquisa realizada pelo Serviço Social do
Comércio (Sesc) e pela Fundação Perseu
Abramo, com 2,4 mil pessoas de 25 estados da Federação, mostrou que seis em
cada dez brasileiros nunca foram ao teatro
e que 75% dos entrevistados jamais assistiram a um espetáculo de dança.
Como se pode perceber, há deficiências nacionais que precisam de solução. Afinal, segundo os pesquisadores, existe um
“condutor” que pode se quebrar a qualquer
momento, caso não haja boas políticas de
educação para os novos e diferentes olhares que a arte pode propiciar. Na acepção
de Alba Vieira, tanto nos grandes quanto
nos pequenos centros urbanos, é escasso o
público interessado em dança, em compa-
ração ao tamanho da população brasileira.
“A partir dessa identificação, percebemos a
necessidade de buscar mecanismos capazes
de apoiar a valorização e a difusão cultural,
sobretudo a dança, além de ampliar o acesso ao conhecimento sensível, imagético e
criativo da população, por meio da educação
e da formação da sensibilidade estética do
público”, esclarece.
Neste sentido, o projeto trabalha o
conceito de fruição da arte como “diálogo”,
de modo a que o espectador interaja com
as expressões artísticas como sujeito ativo.
Desse modo, adquire autonomia e também
se torna artista. “Nos corpos de quem faz,
cria, assiste, ouve, sente, cheira e, às vezes, toca a obra de ‘outro’ ser artístico, está
aberta a possibilidade de construir saberes,
assim como de acompanhar, ressignificar e
articular discursos próprios, estabelecidos
por diferentes entendimentos, histórias de
vida e valores – compostos, coletivamente,
pelo contexto da arte”, comenta Alba Vieira.
Modos de olhar
Para além de mera técnica, a preparação do olhar do(s) outro(s) para a arte
requer tempo – da adaptação ao novo à
aprendizagem do que seja fruição, observação e experimentação. Nessa perspectiva, as horas atuam, concomitantemente, como aliadas e vilãs: por um lado, o
passar dos dias pode ser útil para que os
Alba Vieira
O que significa a dança para você?
Talvez Alice e Paulo dissessem que são movimentos de mudança. Carlos, por sua vez,
apontaria para o balé das nuvens no céu, enquanto Cecília, ainda pensando na questão,
girasse e girasse, de modo a sentir o vento
sobre o corpo. Por fim, Ana e Deborah, categóricas, afirmariam: vida! Aqui, os nomes
são ilustrativos e renovam os conceitos em
torno de uma das mais antigas atividades
da humanidade. Contudo, essa variável de
significações depende bastante do olhar do
espectador, pois a dança pode ser e representar muitas coisas em um mesmo espaço
– e para um único corpo.
Imagine, agora, que a questão acima
tenha sido feita a uma plateia com estudantes de escolas públicas dos ensinos médio
e fundamental do interior de Minas Gerais.
Diferentemente da elaboração das respostas
de Alice, Paulo, Carlos, Cecília etc., percebem-se discursos tímidos, capazes, tão somente, de relacionar a arte à atividade física:
“Dança, para mim, é esporte”. Tais palavras
foram elaboradas por crianças e adolescentes das cidades de Viçosa e Paula Cândido,
municípios da Zona da Mata mineira, como
resultado da iniciativa intitulada “Educação
para as artes: análise do impacto de projetos
de interface entre pesquisa e extensão que
focam na sensibilização estética ou no apreciar da dança pelo público mineiro”, coordenado por Alba Pedreira Vieira, professora
No estúdio de aulas práticas, alunos do 4º ano da Escola Municipal Dona Nanete participam da oficina de dança contemporânea.
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Alba Vieira
Alunos da Educação Infantil da Escola Municipal Anita Chequer durante apresentação de coreografia na Mostra de Dança Ladrilho, Ladrilhando e Brincando VIII - Arte e Meio Ambiente”, no Espaço Cultural Fernando Sabino da UFV.
alunos aprofundem seu conhecimento;
por outro, trata-se de limitador aos profissionais, no que se refere às aplicações
prática, estética, crítica e sensível.
Para a coordenadora, tais questões
permitem construir pontes dialógicas
entre a realidade do sujeito e universos
até então desconhecidos. Ao se deparar
com o novo, por exemplo, a pessoa amplia a consciência de si mesma, e, simultaneamente, por meio da conversação
estabelecida, torna-se auto-observadora.
“Essas reflexões sugerem que nós, professores de arte e artistas, devemos considerar a inclusão da educação estética
em nossa rotina, que desvela mundos até
então ignorados ou pouco conhecidos. O
conhecimento e a compreensão da diversidade na arte também podem levar à
capacidade de aceitação das diferenças
na vida cotidiana”, destaca.
Outro aspecto discutido pela pesquisadora é o fato de que as pessoas só
podem dizer se gostam ou não de arte se
conhecerem, minimamente, as suas diversas possibilidades e expressões. “Para
nós, o olhar do espectador que se permite
conhecer, se lançar à vivência da arte ‘diferente’ cria uma tensão, um desequilíbrio
que pode corresponder a uma aprendizagem estética em que há transbordamento
de novos significados. Assim, o primeiro
passo para que o outro seja preparado/
educado para a arte é levá-lo a se abrir a
essa diversidade”, comenta.
Além disso, é necessário que se
criem formas de incentivo à vivência artística, para que se forme o sentimento
de pertencimento aos meios culturais.
Ao pensar e planejar métodos de ensino,
os profissionais envolvidos na área –
tanto os educadores quanto os próprios
artistas – devem considerar a importância do desenvolvimento do sujeito pela
ampliação de sua consciência estética.
“Ao investir no processo cognitivo holístico (mental e emocional), ampliamos
as possibilidades dos sujeitos de processar informações de forma equilibrada
e aprender em sentidos mais amplos,
considerando a razão mental e o saber a
partir do corpo”, reflete a pesquisadora.
Para tal, Vieira aponta caminhos
para a construção de políticas culturais de
educação para arte que sejam acessíveis
às diversas camadas sociais. Em primeiro lugar, está a difusão do alfabetismo
em arte. Além disso, há necessidade de
estreitar os canais de comunicação entre
obra de arte, artista e público, de estabelecer relações entre universidade e sociedade e de democratizar o acesso à arte.
Trata-se de ação essencial, por permitir análises acerca da divulgação
artística e sobre a sensibilidade
apreciativa do público. A democratização do acesso aos bens da cultura
permite, ainda, que os indivíduos
desenvolvam o pensamento crítico.
Por fim, a disseminação do conhecimento sobre arte significa a possibilidade de aproximar o indivíduo
do próprio corpo, este importante
meio de comunicação humana.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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Resultados
Dentre os problemas percebidos
para a promoção da difusão cultural, destacam-se a massificação das obras pelos
meios de comunicação e o imediatismo
da vida na atualidade. Alba Vieira explica que a experiência investigativa levou
os pesquisadores a sugerir propostas de
educação apreciativa da arte – em particular, da dança –, privilegiando não
apenas o produto, principal interesse da
indústria cultural, mas, principalmente, a
criatividade e a valorização do processo.
Respeitaram-se, assim, as diversidades
artística, cultural e corporal. “Desde a
educação básica na escola, as pessoas
devem ser estimuladas a apreciar obras
de arte e a se questionar. Na universidade, problematizamos e discutimos o
contexto das diferentes situações. Entendo que é nosso dever compartilhar
esta atitude crítica com a sociedade, para
minimizar os efeitos da massificação artística e cultural”, resume.
Embora as escolas também percebam a barreira da inclusão da arte, foi
dentro delas que Alba e sua equipe encontraram as principais dificuldades. Era
preciso que as instituições participantes
entendessem as expressões artísticas e
a dança não como mero entretenimento,
mas como área de conhecimento específica, que requer estudo e pesquisa.
Mesmo com a verificação desses
“percalços”, os resultados encontrados
mostram que houve melhoria significativa quanto ao conhecimento artístico dos
participantes: 73% deles consideraram
que as atividades do projeto mudaram sua
visão sobre o que seria a dança e 65%
declararam ter outra concepção sobre os
significados de uma apresentação da referida arte.
“O trabalho permitiu enriquecimento
cultural aos envolvidos, e, ao mesmo tempo, a valorização do patrimônio imaterial e
histórico da região, do País e do exterior.
Sugerimos que, por meio de metodologias
educacionais diversificadas e duradouras
de fruição e usufruição, seja possível ampliar a sensibilização estética e apreciação
36
artística em dança”, comenta a pesquisadora.
A dança como arte
Durante o projeto, os alunos trabalharam, como intérpretes-criadores, na execução das mostras “Ladrilho, Ladrilhando
e Brincando” e “Mosaico”. Nas apresentações, os educandos mostraram obras
variadas, resultantes de processos colaborativos com a equipe do projeto. Além
disso, as coreografias foram criadas pelos
próprios alunos, englobando movimentos,
gestos e expressões corporais em parceria
com as professoras-pesquisadoras.
Ao dialogar com a arte, é possível repensar práticas, e, também, dar novo sentido à vida. É possível perceber o amadurecimento dos estudantes em relação à dança.
A mesma pergunta proposta ao início do
projeto – “O que é dança para você?” – foi
realizada ao final da iniciativa. Para além do
“esporte”, a prática se revelou multifacetada: “É a arte que a gente descobre”; “É arte,
é diferente”.
Alba Vieira explica que a educação
estética desenvolvida acabou por estabelecer, entre os participantes, as diferenças
entre dança como arte e como atividade
física. “A frase ‘É a arte que a gente descobre’, por exemplo, revela a descoberta
da arte em si. Também pode se referir à
capacidade da dança em nos estimular a
descobrir algo sobre nós mesmos. Falo de
aptidões, de gostos e limitações sobre os
quais, por vezes, não temos plena consciência”, conta.
A especificidade dos muitos estilos
de dança também foi percebida pelos participantes do projeto. “Creio que isso diga
respeito à diversidade de expressões vistas
e experimentadas por eles, o que inclui gêneros novos em sua rotina, como o flamenco e a dança contemporânea”, comenta, ao
lembrar que a pesquisa preocupou-se em
estimular os alunos a buscar e identificar
aspectos e nuances das obras – como
a expressão facial do artista –, que antes
passavam despercebidas a muitos deles.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Projeto: Educação para as artes:
análise do impacto de projetos de
interface entre pesquisa e extensão
que focam na sensibilização estética ou no apreciar da dança pelo
público mineiro
Coordenador: Alba Pedreira Vieira
edital: Extensão em Interface com a
Pesquisa
Valor: R$ 37.183,66
Pautado em valores solidários,
associativismo possibilita inserção
alternativa de grupos no sistema produtivo
Virgínia Fonseca
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
37
administração
Todos por
todos
Com 20 mil habitantes, o município
de Paraguaçu, no Sul de Minas Gerais,
descobriu formas interessantes de geração de renda a partir de um fruto bastante
comum no Cerrado. Trata-se do marolo
– também conhecido como “araticum” –,
espécie abundante na região e passível de
ser empregado em produções diversas, do
artesanato ao consumo in natura ou em licores, bolos, geleias etc.
Na cidade, o trabalho de exploração
consciente do fruto vem sendo conduzido
pela Associação Terra do Marolo. A iniciativa segue a lógica do cooperativismo: a
união de pessoas em torno das atividades
de determinado foco produtivo que, isoladamente, seriam difíceis ou mesmo impossíveis de se realizar.
Ao melhor estilo “a união faz a força”, a oficialização do grupo contou com
o envolvimento de produtores, representantes da Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural do Estado de Minas Gerais
(Emater-MG), do Departamento de Agricultura Municipal e de Associações Rurais
locais, além de setores ligados a turismo,
bares, hotelaria e cultura e de uma equipe
de pesquisadores do campus Varginha da
Universidade Federal de Alfenas (Unifal).
Sob coordenação da professora Virgínia Carvalho, do Instituto de Ciências
Sociais Aplicadas da Unifal, a constituição
da associação foi acompanhada e orientada, passo a passo, pela Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITPC)
da universidade. A consolidação do empreendimento representou, aos integrantes
e ao município, a possibilidade de explorar nova potencialidade econômica para a
região, o resgate da tradição e da cultura
locais relacionadas ao marolo, bem como
a promoção de maior consciência acerca
da necessidade de preservação da espécie.
O associativismo e o cooperativismo
baseiam-se na posse coletiva dos meios de
produção, o que implica o direito de participar igualmente dos processos de gestão
e distribuição de resultados. “Esse formato
As ITCPs oferecem apoio e orientação à
constituição de cooperativas e associações, caracterizadas como empreendimentos solidários.
38
produtivo tem se constituído como alternativa de geração de trabalho e renda para as
populações social e economicamente excluídas do mercado formal de trabalho”, explica Virgínia Carvalho. Porém, embora unidos
em torno de um empreendimento solidário,
os membros da associação incubada no Sul
de Minas não são indivíduos em situação
de exclusão econômica e social, esclarece a
professora. Eles estabeleceram, entre si, relações de cooperação frente aos problemas
e objetivos comuns no trabalho com o fruto.
Valores adaptados
Em Paraguaçu, o processo de incubação da Associação durou cerca de dois
anos, ao longo dos quais realizaram-se
reuniões quinzenais entre os membros da
ITCP/Unifal – discentes e professores – e
os interessados na constituição do empreendimento. A iniciativa dividiu-se em três
fases: caracterização, organização e ação
gestora. Como parte do estudo acadêmico,
durante a etapa de organização, realizou-se
o levantamento dos valores atribuídos
ao trabalho pelos membros do grupo, de
modo a subsidiar o desenho e a implementação de ações desenvolvidas no transcurso do projeto.
A percepção dos associados sobre
os valores do trabalho foi comparada à
concepção presente no ideário norteador
da economia popular ou solidária. Dentre
as limitações vivenciadas, os estudiosos
ressaltam a dificuldade dos grupos em
operar segundo princípios de autogestão.
No caso do trabalho em questão, desde o
início do processo de incubação, a partir
das articulações com um pequeno grupo
informal que reuniu os interessados na
causa do marolo, percebeu-se a grande
influência deste sobre os rumos do empreendimento. Tal situação tendeu a se consolidar com o tempo, a despeito dos esforços
realizados pelos membros da ITCP/Unifal.
“Em nossa análise, a tendência à
centralização de decisões nas mãos de
um pequeno núcleo de indivíduos poderia
decorrer por influência das relações consolidadas na sociedade sobre a estrutura
de poder no âmbito do empreendimento”,
explica Virgínia Carvalho. Considerou-se,
ainda, que as decisões e iniciativas ten-
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Quando se constituem em conformidade
com a proposta da economia solidária,
as associações e cooperativas devem
pautar suas ações em princípios como
solidariedade, cooperação, mutualismo
e autogestão.
diam a se mostrar centralizadas nesse núcleo. Por outro lado, todos os resultados
das ações foram sempre igualmente compartidos entre os membros da associação,
apontando que todos têm potencial de
prestar grandes contribuições ao grupo.
Os pesquisadores também viram com
certa preocupação a concepção sobre a
prioridade que deve orientar os empreendimentos solidários, no sentido de estabelecer se o êxito buscado é aquele gerado por
meio de ganhos econômicos ou da concretização de outra realidade de trabalho. “São
comuns os relatos de autores que apontam
as dificuldades de implantação da autogestão no âmbito de tais empreendimentos”,
lembra a coordenadora. Para ela, trata-se
de questão delicada, pois, se, por um lado,
a não observação dos princípios da economia solidária é capaz de descaracterizar
a proposta, por outro, sua implementação
integral permanece um desafio a demandar
esforços e alternativas de enfrentamento.
Dentre os membros do empreendimento estudado, os valores do projeto
emergiram em uma hierarquia de importância que enfatizou, primeiramente,
a “realização no trabalho” e, depois, as
relações sociais, a estabilidade e o prestígio. Em comparação com os princípios
da economia solidária, observou-se a
existência de uma diferença na atribuição
de importância às categorias de “relações
sociais” e “realização no trabalho”. Esta
distinção valorativa caracterizou-se como
elemento de dificuldade para a concretização dos princípios solidários no interior
do empreendimento, pois significava que
os membros da associação buscavam no
trabalho, essencialmente, satisfação pessoal, realização profissional e independência de pensamento e ação, princípios que
apresentavam primazia ante os esforços
de construir relações sociais positivas e
contribuições para a sociedade, por meio
do trabalho.
Mudar e refletir
e desenvolvimento da associação”, afirma
a atual presidente da Associação Terra do
Marolo, Gilmara Aparecida de Carvalho.
Os 25 associados continuam a receber assistência e assessoria técnica por
parte da ITCP/Unifal. E pretendem buscar
outras contribuições, para além das reuniões mensais, por considerarem fundamental o trabalho da universidade junto à associação. Para Gilmara Carvalho, a economia
solidária é hoje o caminho mais certeiro,
e uma entidade que quer progredir deve
sempre ter seus valores como objetivo.
“Imagino que só por meio do associativismo teremos condições dignas e sustentáveis de trabalho”, opina.
Oposição ao
capitalismo?
A posição da economia solidária
como contraponto à forma de produção
tradicional do capitalismo é motivo
de controvérsia entre os estudiosos
do tema. Alguns defendem a ideia de
que a economia popular e solidária
pode se constituir como possibilidade
de configurar, no interior dos
empreendimentos, uma realidade laboral
distinta, que promova a transformação
individual e social, ainda que em âmbito
local, modificando as perspectivas de
realização pessoal e geração de renda
por meio do trabalho. Já críticos de
tal proposta são contundentes em
abraçar a concepção de que a economia
solidária consiste em apenas mais uma
forma de precarização das atividades
profissionais.
Pensamento solidário
No Norte das Minas Gerais, a 700 km
de distância de Paraguaçu, a região de Montes
Claros serviu como base a outro trabalho que
estuda estratégias adotadas por famílias do
Cerrado para geração de renda a partir de redes de solidariedade. “No campo das práticas,
observa-se uma diversidade de formas econômicas, em que as pessoas se associam para
produzir e reproduzir meios de vida com base
em relações de reciprocidade e igualdade”,
aponta a economista Luciene Rodrigues, professora da Universidade Estadual de Montes
Claros e coordenadora do projeto de pesquisa.
Aquivo pessoal Luciene Rodrigues
De acordo com a coordenadora da
pesquisa, este cenário, entretanto, não é
estanque. Como se trata de empreendimento em fase de consolidação, é possível
que se construam oportunidades de transformação da orientação valorativa relacionada ao trabalho, abrindo possibilidades
de avanço rumo a um modelo de gestão
mais alinhado ao ideal solidário. Virgínia
Carvalho explica que, nesse sentido, o
conhecimento, por parte do coletivo, dos
limites do empreendimento configurou-se
como primeiro passo no sentido de provocar reflexões necessárias. “Sabemos,
porém, que a mudança de valores é um
processo mais complexo, contra o qual se
coloca o fato de estarmos inseridos numa
sociedade fortemente marcada por valores
capitalistas, dentre os quais o individualismo e a competitividade são apelos constantes”, admite.
No que tange aos integrantes da associação, os pesquisadores contam com
um ponto crucial para possível mudança do
cenário: o reconhecimento da importância
da atuação da ITCP. “Durante o processo
de incubação, tivemos grande crescimento
de todos os associados, por meio de palestras, cursos e atividades dinâmicas. A
Unifal foi essencial no processo de criação
Na região de Montes Claros, cultura solidária favorece a formação de associações
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
39
A principal motivação para a existência de redes de solidariedade nos setores
populares é um desejo libertário e de autodeterminação de suas vidas e da atividade
econômica, com a centralidade do trabalho.
O motor das ações, explica a professora, é
o desejo de uma melhor qualidade de vida
para a comunidade local e para a sociedade em geral, a partir de valores partilhados,
como solidariedade, democracia, cooperação, preservação ambiental e direitos humanos. Nas frestas das formas mercantis
dominantes, desenvolvem-se alternativas
de produção fundadas em outras lógicas,
muitas delas reconhecidas pela designação de “economia solidária”. No caso das
iniciativas no Cerrado Norte Mineiro, o que
se percebe são modos variados, em que
algumas, embora não institucionalizadas
como tal, funcionam como associações de
trabalhadores, enquanto outras se revelam
formas econômicas de produção e reprodução ampliadas de meios de vida, regidas
por princípios associativistas.
No Cerrado Norte Mineiro, as práticas
comunitárias não são novidade: a solidariedade primária é parte da vida e da cultura
camponesas, constituindo o cimento das
relações sociais e econômicas. Diante dos
processos de modernização e desagregação
do campo, ao migrar para as cidades, muitas famílias levam a tradição comunitária da
cultura do mundo rural para as relações no
espaço urbano, processo esse que é transmitido para as gerações seguintes.
A partir de pesquisa de campo, Luciene e sua equipe constataram que a
proliferação de formas de trabalho associativas, especialmente entre os setores de
baixa renda, recupera a dimensão política
do associativismo e de práticas de solidariedade social. Para além dessa percepção,
entrevistas mostraram que se, por um lado,
há pessoas que sonham em ingressar no
mercado de trabalho formal, outras cultivam a convicção do valor do ofício associativo – modelo capaz de lhes garantir
autonomia, autogestão e novas relações
sociais e profissionais.
Os pesquisadores distinguiram associações que se constituíram horizontalmente – a partir da vontade de seus
membros – daquelas que aderiram a um
programa institucional de economia solidária. Considerou-se, também, uma situação intermediária, em que a mobilização
se faz de forma vertical, partindo do centro
de iniciativa de uma associação para os
empreendimentos ou investimentos singulares. “O tipo de iniciativa distingue os
níveis de autonomia dos associados em
relação aos projetos”, constata Luciene
Rodrigues. A professora, agora, desenvolve uma proposta de continuidade dos estudos que permita contribuir para o desenho
de políticas públicas aptas a fortalecer a
economia solidária, não apenas no sentido
de combater a pobreza, mas, também, de
identificar experiências inovadoras para
fomento dessas ações.
Mil possibilidades
O marolo (Annona crassiflora) é uma fruta nativa do Cerrado brasileiro,
pertencente à família das anonáceas, da qual também fazem parte a graviola, a
fruta-do-conde, a pinha e a atemoia, dentre outras. Sua safra começa em meados
de fevereiro e vai até abril. Com folhas grossas e galhos retorcidos, o maroleiro é
uma árvore rústica, encontrada, principalmente, em campos abertos e pastagens.
Quando começa a amarelar por baixo, é sinal de que o fruto está maduro. A polpa,
de aroma perfumado, possui sabor forte e muito doce, apreciado para confecção de
licores e doces. Por sua influência sociocultural, a fruta tornou-se um dos símbolos
de Paraguaçu (MG). Os integrantes da Associação Terra do Marolo produzem e
comercializam o fruto e sua polpa, além de mudas, doces, licores, geleias, bolos,
pães de mel, sorvetes, biscoitos e objetos de artesanato.
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Projeto: Economia e vida: redes de solidariedade, recursos e estratégias de autoorganização do trabalho para a geração de
renda e reprodução social de famílias pobres do Cerrado – Norte de MG
Coordenadora: Luciene Rodrigues
Edital: Demanda Universal
Valor: R$ 44.770,32
Projeto: O processo de incubação em
cooperativas populares e a percepção de
valores do trabalho
Coordenadora: Virgínia D. Carvalho
Edital: Extensão em Interface com a Pesquisa
Valor: R$ 33.796,35
Pesquisa interdisciplinar aglutina Engenharia e
Biologia para compreensão e tratamento da epilepsia
Camila Alves Mantovani
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
41
biomedicina
O cérebro e
seus teoremas
O uso das tecnologias de informação e comunicação tem apoiado, cada
vez mais, as pesquisas em diversos campos científicos. Em 1999, John Taylor, à
época diretor geral do Departamento de
Ciência e Tecnologia do Reino Unido,
cunhou o termo e-Science (em português, e-Ciência) para designar estudos
realizados por meio de um ambiente
colaborativo, organizado em rede, e que
empregava mecanismos computacionais
de processamento, armazenamento e
transmissão remota de dados.
O envolvimento das tecnologias no
fazer científico, sob o ponto de vista da
e-Science, advém tanto de uma necessidade estimulada pela dispersão geográfica das equipes de trabalho quanto pelo
fato de os pesquisadores em interação
não pertencerem, necessariamente, ao
mesmo campo disciplinar.
Sendo assim, a e-Science pode ser
compreendida a partir de dois aspectos:
o primeiro diz respeito a pesquisas que
têm sua realização possível graças ao
uso de recursos computacionais, que
não apenas integram equipes distantes
– do ponto de vista geográfico –, mas
podem se encontrar disciplinarmente separadas. O segundo representa o desenvolvimento tecnológico capaz de tornar
real a nova conformação estrutural da
prática científica.
Mais que nos deter à questão material, contudo, pensar a introdução das
tecnologias de informação e comunicação na ciência abre a possibilidade de
vislumbrar as mudanças ocorridas na
produção do conhecimento. Exemplos
simples podem ser encontrados na prática científica contemporânea: a facilidade em recuperar referências na rede por
meio de sites que oferecem acesso livre
a artigos científicos, a rapidez com que
se procede à identificação de pesquisadores que trabalham temas de interesse
– no intuito de estabelecer parcerias –
e o uso das tecnologias para mapear a
produção científica de determinada área.
Neste contexto, quando as tecnologias digitais passam a ser vistas como
ferramentas de pesquisa, acabam por
disseminar práticas de conhecimento
42
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
distintas, fornecendo traduções entre diferentes campos de pesquisa. Essas interpretações podem se dar em diferentes
níveis e variam de acordo com o problema científico, as áreas em inter-relação
e, ainda, a disposição e a capacidade
dos pesquisadores envolvidos em manusear tais recursos.
No caso de Antônio-Carlos de Almeida, coordenador do projeto “Efeitos
dinâmicos dos mecanismos sinápticos e
não sinápticos em epilepsias refratárias”
– desenvolvido junto ao Laboratório de
Neurociência Experimental e Computacional da Universidade Federal de São
João del-Rei (UFSJ) –, a disposição para
atuar em projetos com essas características apareceu desde muito cedo em sua
formação. Graduado em Engenharia Elétrica, o pesquisador confessa eterno fascínio pelos princípios biológicos, assim
como pela possibilidade de descrever
um sistema físico por meio de equações
matemáticas. Dessa forma, na Engenharia, ele encontrou os atrativos fundamentais para treinar o jogo de observação e
descrição que, posteriormente, usaria
para estudar os sistemas biológicos – e,
mais especificamente, os processos epileptogênicos (fatores responsáveis pela
epilepsia).
Caminho interdisciplinar
Nos anos 1990, ao ingressar no
Programa de Engenharia Biomédica
do Instituto Alberto Luiz Coimbra de
Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ), para cursar o
mestrado, o pesquisador investiu no
estudo da Neurociência, pela perspectiva da Engenharia. Contudo, apenas
no doutorado – também realizado na
UFRJ, sob a orientação do professor
Antonio Fernando Catelli Infantosi –, é
que o pesquisador dedicou-se, de fato,
à modelagem matemática e às suas representações computacionais, voltadas
ao estudo das epilepsias.
À época, assumiu o desafio de
modelar uma atividade cerebral denominada ritmo teta, bem como atividades
epileptiformes. Durante esse período,
foi altamente incentivado por um grande
neurocientista brasileiro, Hiss Martins
Ferreira, do Instituto de Biofísica da
UFRJ. De forma incansável, ele o entusiasmava ao estudo de outro fenômeno,
também associado à epilepsia, denominado depressão alastrante. “Assim,
ao assumir meu cargo na Universidade
Federal de São João del-Rei, iniciei o
desafio de construir um laboratório voltado à investigação das epilepsias e da
Depressão Alastrante, o Lanec”, conta o
pesquisador.
Segundo Antônio-Carlos, os trabalhos do Laboratório são desenvolvidos
com base na estratégia de realizar medidas experimentais em fatias do cérebro e
reproduzir esses achados em simulações
computacionais baseadas em representações matemáticas dos tecidos neuronais.
Desse modo, a relação interdisciplinar entre a Engenharia e a Biologia, na
visão do pesquisador, apresenta grande
potencial científico. Seria muito difícil,
afinal, abordar fenômenos biológicos
complexos, a exemplo da epilepsia, sem
o uso dos conhecimentos e práticas da
Engenharia. Em sua perspectiva, o exercício fundamental consiste na descrição
dos processos neurofisiológicos envolvidos, para, então, buscar-se identificar
sob quais circunstâncias as alterações
nesses processos poderão favorecer a
deflagração de crises. “É exatamente aí
que a pesquisa tem seus maiores ganhos”, afirma.
Cérebro equacionado
A pesquisa atualmente desenvolvida insere-se no âmbito do projeto
“Neurociências Epilepsia” e tem apoio
conjunto de FAPEMIG e Fapesp. O estudo busca contribuir para o entendimento
das epilepsias refratárias a medicamentos, com destaque àquelas que afetam,
em grande parte, pacientes na fase infantil. De acordo com o pesquisador, a
investigação da excitabilidade neuronal
durante as transições entre os períodos
ictal (estado fisiológico durante a crise) e interictal (estado fisiológico entre
crises), nesse tipo de atividade, envolve
Fenômeno de propagação associado à
epilepsia e à enxaqueca, é o estado no
qual ocorre um “silêncio” da atividade
neuronal, que se propaga como onda,
após o aumento da excitabilidade no cérebro. O efeito foi descoberto e descrito
pelo médico e pesquisador brasileiro
Aristides Azevedo Pacheco Leão. Daí ter
ficado conhecido como “Onda de Leão”.
sequência intrincada de interações de
fluxos iônicos que não podem ser investigadas simultaneamente durante medidas experimentais. Neste caso, a simulação computacional é uma ferramenta
poderosa, que permite testar hipóteses,
agrupar informações experimentais de
forma conexa e fazer previsões.
As simulações auxiliam a investigação experimental da influência de
alterações geométricas do tecido cerebral em função do desenvolvimento, e,
ainda, de modificações morfológicas
(não sinápticas) induzidas nos modelos
experimentais de epilepsia. “Longe de
desprezar a importância dos mecanismos sinápticos na gênese da epilepsia,
a presente proposta considera que não
se pode ignorar os mecanismos não
sinápticos (MNS) na instalação, curso e
progressão dessa patologia”, avalia.
Para que se pudesse avançar nas
proposições atuais da pesquisa, que
envolvem interação com profissionais
da área médica do estado de São Paulo,
Almeida avalia a importância dos estudos realizados tanto para a modelagem
matemática dos mecanismos associados
ao fenômeno quanto para os processos
não sinápticos, responsáveis pela transição entre os fenômenos epilepsia e
Depressão Alastrante.
O pesquisador destaca, ainda, a publicação, em 2008, do modelo matemático
desenvolvido na revista Epilepsia, editada
pela International League Against Epilepsy. Segundo Antônio-Carlos, o ponto
forte dos trabalhos é o uso de amostras
de tecidos cerebrais de pacientes com a
doença, resultantes de ressecções de porções do cérebro identificadas como foco
das crises epilépticas.
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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Nesses casos, os pacientes se encontram em situações nas quais os medicamentos disponíveis no mercado revelam-se ineficazes. De acordo com Almeida,
os estudos têm demonstrado que essa ineficácia deve-se aos alvos de ação dos medicamentos, normalmente direcionados a
mecanismos de interação entre neurônios
envolvendo as sinapses. “Nossos achados
indicam que, nesses casos, as crises são de
origem fundamentalmente não sináptica”,
pontua.
Na fase atual, o pesquisador destaca
o melhoramento do modelo matemático e a
finalização de sua implementação. Para tanto, é preciso concluir a fase experimental,
que se refere aos experimentos com tecidos
cerebrais de roedores, os quais fornecem
informações importantes para verificação do
modelo ou confirmação de predições advindas das simulações. “É nessa fase que identificamos os alvos antiepiletogênicos mais
eficazes e que poderão favorecer o design
de novas drogas”, explica.
Para Antônio-Carlos, na medida
em que os processos constituintes das
epilepsias são representados por meio de
equações matemáticas, entende-se, cada vez
mais, a complexidade da doença. Diante dos
consideráveis avanços alcançados, Almeida
destaca como fundamental a ação colaborativa de diferentes especialistas envolvidos com
projeto: Efeitos dinâmicos dos
mecanismos sinápticos e não sinápticos em epilepsias refratárias
Coordenador: Antônio-Carlos Guimarães de Almeida
Modalidade: Programa Pesquisador
Mineiro
Valor: R$ 48.000,00
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
o tema. Adotar a perspectiva interdisciplinar,
portanto, revela-se, na visão do pesquisador,
algo extremamente importante.
Na experiência da UFSJ, Antônio-Carlos salienta não apenas a formação
de mestres e doutores em Bioengenharia,
mas, também, a proposição de um novo
curso de graduação voltado à formação de
profissionais dentro do perfil interdisciplinar da Engenharia Biológica. “É um grande
desafio formar profissionais capazes de
atuar de forma interdisciplinar. Porém, temos docentes com experiência de mais de
20 anos de atuação em suas áreas, e, portanto, com qualificação para realizar, com
êxito, essa tarefa”.
Pesquisadores de Belo Horizonte reúnem-se para
transformar resíduos urbanos em fonte limpa de energia
William Rocha Ferraz
Tudo o que é produzido para consumo humano, de automóveis a garrafas PET,
revela-se como provável resíduo futuro. A
problemática já bate à porta das autoridades
nacionais. A produção de lixo no País – que
cresce em ritmo mais acelerado do que a
população urbana – chega a mais de 61 milhões de toneladas por ano. O vasto território
brasileiro também cobra muito da natureza
para manter suas lâmpadas acesas. Dados
do Banco Mundial indicam que, em 2013, o
Brasil foi a sétima nação em consumo total
de energia. Por aqui, mais de 80% da energia
gerada vêm de usinas hidroelétricas – o que
é ambientalmente preocupante, visto que há
necessidade de alagamento de grandes áreas.
O que parece representar problemas
vindouros para a sociedade brasileira, no
entanto, pode ter encontrado solução prática nas mãos de pesquisadores mineiros. A
proposta do projeto “Levantamento do potencial energético dos resíduos domiciliares
e comerciais urbanos do município de Belo
Horizonte” é o estudo do reaproveitamento
de resíduos sólidos para geração de energia
elétrica. Iniciada em 2009, a iniciativa é encabeçada pelo engenheiro civil e sanitarista
Cláudio Jorge Cançado. A pesquisa foi tema
de reportagem publicada em 2009, na edição
37 da MINAS FAZ CIÊNCIA.
O pesquisador contou com a cooperação de equipe composta pelo químico Vitor
Gouveia e pela engenheira química Marta
Ribeiro, todos integrantes da Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais (Cetec),
que, desde janeiro de 2014, foi integrada
ao Instituto de Geociências Aplicadas (IGA),
compondo o Instituto de Geoinformação e
Tecnologia (IGTEC). A iniciativa contou com
a colaboração de Flávia Komatsuzaki, mestre
em estatística da Universidade Federal de Minas Gerias (UFMG).
Os estudos encontraram, no cenário
socioambiental de Belo Horizonte, as condições ideais para justificar suas finalidades. O
aterro sanitário da capital mineira, inaugurado
em 17 de fevereiro de 1975, chegou ao limite
de sua capacidade em dezembro de 2007,
com cerca de 24 milhões de metros cúbicos
de resíduos aterrados. O lixo hoje gerado na
cidade destina-se ao aterro de Macaúbas, em
Sabará. O fato demonstra que alternativas
para a questão dos resíduos não é necessidade para um futuro longínquo. De acordo
com Cláudio Cançado, o uso da tecnologia
de tratamento térmico de resíduos por plasma apresenta significativa vantagem para geração de energia – em relação aos métodos
de aterramento ou incineração –, devido ao
baixíssimo índice de emissão de gases de
efeito estufa decorrentes do processo.
As investigações tiveram início com a
caracterização geográfica do lixo, realizada
nas diferentes regionais de BH. “Nesta fase,
mensuramos se havia variações do perfil de
potencial energético dos resíduos produzidos
nas regionais, em razão da classe social ali
estabelecida, partindo do pressuposto de
que, em áreas com maior poder aquisitivo,
tem-se maior oferta de embalagens e afins”,
explica.
Entretanto, não houve expressiva diferença entre as amostras de resíduos domiciliares coletados, pela própria equipe, nas diferentes regiões. “Pudemos identificar que o
lixo produzido no município apresentou, em
todas as áreas, equivalente potencial calorífero, a capacidade de produção de energia”,
conta.
Testes de laboratório
Na etapa laboratorial, o lixo foi triturado e encaminhado à realização de ensaios
químicos. “Cada tipo de resíduo foi testado
em relação a seu potencial. Fizemos um mapeamento dos materiais que permitem maior
produção energética. Em seguida, concentramos os estudos em métodos para a determinação do potencial a partir de cada amostra”,
esclarece Cláudio Cançado. Buscou-se,
desse modo, determinar o Poder Calorífico
Superior (PCS) e o Poder Calorífico Inferior
(PCI) a serem gerados pela composição de
cada amostra de resíduos.
Outra possibilidade para conhecer
a energia potencial do lixo é reduzi-lo a
seus componentes químicos: carbono,
oxigênio, nitrogênio, hidrogênio e enxofre. Esta etapa contou com o apoio do
Setor de Análises Químicas do Cetec. A
partir dos resultados laboratoriais obtidos, chegou-se a equações de predição
do PCS dos resíduos sólidos urbanos domiciliares e comerciais do município de
Belo Horizonte.
No intuito de ampliar o conhecimento sobre a caracterização dos resíduos
sólidos urbanos e comerciais, a Agência de
Desenvolvimento da Região Metropolitana
de Belo Horizonte – em cooperação com
a Associação para a Preservação do Meio
Ambiente da Cidade de Kitakyushu, no Japão – desenvolveu o “Projeto para a promoção da eficiência na gestão de resíduos sólidos no Brasil”. A iniciativa, que contou com
a participação da equipe do Cetec, buscou
o treinamento e a troca de experiências sobre o assunto com especialistas japoneses,
país onde há grande uso da tecnologia de
tratamento térmico para geração de energia
elétrica muito usada.
Além dos ensaios laboratoriais, os
estudos em questão dependem da determinação de equações matemáticas, fundamental à avaliação da viabilidade técnica
e econômica deste tipo de tratamento. “Os
técnicos japoneses compartilharam conosco sua vasta expertise, chegando a resultados satisfatórios por meio de equações
bem simplificadas. Essa cooperação nos
levou a ganhar alguns anos de vantagem
nas pesquisas”, conta Cláudio.
Segundo o pesquisador, até hoje,
foram realizadas 220 amostras de determinação dos índices PCS e PCI dos resíduos
sólidos urbanos em Belo Horizonte, quantidade suficiente para demonstrar que o
potencial energético oferecido pelo reaproveitamento dos resíduos domiciliares e comerciais da cidade – algo em torno de 3.500
kcal/kg – é bem representativo e proveitoso.
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LEMBRA DESSA?
Alquimia à mineira
5 PERGUNTAS PARA...
Virgílio
Almeida
Professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG) e membro titular da Academia Brasileira de Ciências, Virgílio Augusto
Fernandes de Almeida acredita que o Marco Civil da Internet seja um grande passo para
manter a liberdade de expressão na rede. Nesta breve entrevista à revista Minas faz
Ciência, o atual Secretário de Política de Informática do Ministério de Ciência e
Tecnologia e Inovação (MCTI) garante, ainda, que o direito à expressão e à privacidade são
itens essenciais para que a democracia no ciberespaço se revele mais viva do que nunca.
1 3
De que modo o senhor analisa os impactos sociais do Marco Civil da Internet?
O Marco garantirá às pessoas as várias características de uso que assumimos
que existem, mas não estavam garantidas,
como a liberdade de expressão. Ela é garantida a partir do momento em que os
conteúdos não possam ser censurados
ou retirados da internet. Isso é algo fundamental. Vários países têm reivindicado a
falta de expressão na rede. Outro ponto é a
garantia da privacidade. Os registros que
mostram em quais sites o usuário navegou
– e quais aplicativos utilizou – são guardados por um ano, mas podem ser acessados
apenas com autorização judicial.
No que tange ao processo de regularização da internet, como avaliar o
Brasil, em comparação a outros países?
O Brasil é extremamente avançado no
que se refere à internet. Talvez seja a nação que tenha a experiência de governança
hoje tida como a mais avançada. Trata-se
do modelo multissetorial ou multisteakholder, por meio do qual a sociedade civil, o
setor privado, os governos e a academia
trabalham para a criação das regras relativas à governança da internet. De todo
modo, alguns países já possuem legislação específica. No Chile, na Estônia e na
Holanda, por exemplo, a neutralidade da
rede já é garantida por lei.
A rede no Brasil era regida pelos princípios do Comitê Gestor da Internet. O
Marco Civil representa uma segurança a mais?
Na verdade, os princípios não têm
força de lei. São apenas princípios da melhor prática, assim como as resoluções do
Comitê Gestor da Internet (CGI). Agora,
teremos um Marco Civil, que, sendo aprovado no Senado, deve ser cumprido.
Podemos, então, afirmar o que Brasil
está à frente de países mais desenvolvidos?
O conjunto de regras que o Marco Civil
nos oferece é muito mais avançado porque a
lógica dele é garantir os direitos dos cidadãos
na internet. Isso está muito próximo aos direitos que temos offline, no que se refere à
privacidade e à liberdade de expressão. O
Marco Civil é uma legislação muito avança-
2 4
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
Diogo Brito
da e foi construído por meio de processo de
consultas públicas, que envolveram inúmeras
reuniões dos participantes da sociedade para
definir o texto, antes que fosse apresentado
ao Congresso Nacional. As inovações do
Marco Civil da Internet, portanto, começam
já em seu processo coletivo de elaboração.
5
Por fim, o que o Marco Civil representará para o campo da Ciência, da Tecnologia e da Inovação?
Por garantir a liberdade de expressão e a privacidade dos usuários, o Marco
Civil da Internet permitirá que pequenas
e médias empresas, startups e grupos de
pesquisa possam propor novas ideias e
competir em igualdade com as grandes
corporações. Caso contrário, se não houvesse o Marco Civil, poderia haver descriminalização de tráfego, por exemplo.
Neste caso, se um projeto que começou na
universidade gerasse um novo tipo de produto ou tecnologia, e fosse competir com
as empresas estabelecidas, poderia ser
bloqueado se não houvesse a neutralidade de rede. Com o Marco Civil, a inovação
continuará sendo mantida, favorecida pelo
ambiente aberto, livre e neutro da internet.
O título desta obra – trabalho imprescindível aos especialistas e aficionados por
divulgação científica e questões filosóficas
relacionadas a uma das mais fascinantes
atividades criadas pelo homem – revela,
de modo objetivo, um dos grandes dilemas de nossa espécie: o que seria, enfim,
a ciência? Publicado pela primeira vez em
1993, o livro de A. F. Chalmers reúne os resultados de sua criteriosa retrospectiva das
principais teorias epistemológicas, com
vistas a apresentar respostas plausíveis à
referida (e “dramática”) inquirição.
“Alguns dos argumentos para defender a afirmação de que teorias científicas não podem ser conclusivamente provadas ou desaprovadas se baseiam amplamente em considerações filosóficas e lógicas.
Outros são baseados em uma análise detalhada da história da ciência e das modernas teorias científicas.
Tem sido uma característica do desenvolvimento moderno das teorias de método científico que uma atenção
crescente venha sendo prestada à história da ciência.”
Nos 14 capítulos de O que é ciência,
afinal?, estão discussões em torno das
múltiplas dimensões do senso comum, do
problema da indução ou da dependência
da observação em relação à teoria. Chalmers realiza, ainda, abordagem crítica em
relação a preceitos relacionados ao Falsificacionismo, aos paradigmas de Kuhn, ao
Racionalismo, ao Objetivismo e aos princípios anarquistas de Feyerabend. Trata-se,
em suma, de obra indispensável aos apaixonados pelas expressões científicas – e
seus mistérios sem fim.
Livro: O que é ciência, afinal?
Autores: A. F. Chalmers
Editora: Brasiliense
Páginas: 224
Ano: 2014
Em nome das estrelas
Stephen Hawking parece ter sido
escolhido, pelos deuses do tempo – ou
sabe-se lá que outras tantas entidades e/
ou ações metafísicas –, como representante máximo dos paradoxos da existência.
Hoje, bastante debilitado pelos efeitos da
doença da qual é portador, a esclerose
lateral amiotrófica, o físico teórico e cosmólogo britânico é uma das mentes mais
prodigiosas da ciência mundial. Em outros
termos: preso à cadeira de rodas, o cientista não para de viajar, estimulado pelos
inúmeros desafios da Astronomia.
“Cheguei a Cambridge como estudante de pós-graduação em outubro de 1962. Eu me candidatara para trabalhar com Fred Hoyle, o mais famoso astrônomo da época e o principal defensor da
teoria do estado estacionário. Digo astrônomo porque, naquele tempo, a cosmologia dificilmente era
reconhecida como um campo legítimo. E era nesse campo que eu pretendia fazer a minha pesquisa,
inspirado por um curso de verão que havia feito com um aluno de Hoyle, Jayant Narlikar. No entanto,
Hoyle já tinha alunos demais e, para minha grande decepção, fui designado com Dennis Sciama, de
quem eu nunca ouvira falar.”
Neste pequeno livro, o pesquisador – que também é um dos diretores
do Departamento de Matemática Aplicada e Física Teórica (DAMTP) e fundador
do Centro de Cosmologia Teórica (CTC)
da Universidade de Cambridge – revive,
desde a infância, a sua extraordinária trajetória. Além da beleza das narrativas e
fotografias pessoais, o leitor encontra, na
obra, comentários elucidativos em torno
de algumas das mais complexas problemáticas referentes ao relacionamento entre o homem e o universo.
Livro: Minha breve história
Autores: Stephen Hawking
Editora: Intrínseca
Páginas: 142
Ano: 2013
MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
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LEITURAS
Dúvida imprescindível
HI P ER LI N K
As (novas)
leis da internet
O longo e caloroso debate sobre o Marco Civil da Internet
(PL 2126/2011), iniciativa legislativa que visa à regulamentação
do uso da rede de computadores no Brasil, com ênfase na previsão de princípios, garantias, direitos e deveres e na determinação
de diretrizes para atuação dos governos, culminou com a aprovação da regra na Câmara dos Deputados e no Senado e com a
sanção da presidente Dilma Rousseff, realizada no dia 23 de abril.
O Projeto de Lei, que aborda não apenas os diretos e deveres dos usuários, mas também das empresas, gerou interpretações dúbias. Por um lado, especialistas consideram-na
um avanço, principalmente, por tratar a comunicação como direito fundamental. Outros, ao
contrário, veem no projeto uma ferramenta que, no futuro, pode ser usada para promover
a censura e aumentar a vigilância à ação dos usuários. O programa Ondas da Ciência não
ficou de fora do debate.
Blog Minas
faz Ciência com
novo endereço
“Divulgar informações, incentivar o debate e mostrar que falar de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) não é apenas importante, mas também prazeroso”. A missão do
blog Minas faz Ciência continua a mesma. Acessá-lo, contudo, ficou muito mais simples.
O novo endereço é blog.fapemig.br. O blog é fruto do Programa de Comunicação Científica e Tecnológica (PCCT) da FAPEMIG, projeto que iniciou o ano de 2014 com nova – e
crescida – equipe. A chegada de outros profissionais busca intensificar as atividades de
difusão da ciência mineira.
Casas
sustentáveis
Muito em voga numa sociedade que começa a investir esforços na construção de um
futuro mais verde, as casas sustentáveis têm se tornado elemento imprescindível à concretização desses alicerces. Apesar disso, você saberia dizer, de fato, o que é “arquitetura
sustentável”? Muitos creem que, para receber tal título, basta incorporar elementos naturais
à casa. A história, porém, é mais complexa. Especialistas calculam que grande parte dos
impactos antiecológicos provocados por uma construção ocorre durante a habitação, e não
ao longo da obra. Por isso, para além de boa adaptação, é fundamental adotar uma rotina
ecologicamente consciente. Em Ciência no Ar, confira dicas para construir sem agredir o
meio ambiente.
Do IDH à
bola na rede
Você já pensou que, para além do treino, dos investimentos do clube e da atmosfera
da torcida, dados como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e a data de nascimento
podem condicionar o nível de rendimento e a ascensão profissional de um jogador de futebol? Estudo publicado em 2013 pelos pesquisadores Israel Teoldo da Costa e Felippe da
Silva Leite Cardoso, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), e Júlio Garganta, do Centro
de Investigação, Formação, Inovação e Intervenção em Desporto do Porto, em Portugal,
revela ser possível investigar a influência do IDH e da data de nascimento na produtividade
dos atletas da bola. De acordo com os especialistas, jogadores nascidos nos primeiros meses do ano, em cidades com até 200 mil habitantes e Índice de Desenvolvimento Humano
acima de 0,73, parecem reunir condições mais favoráveis ao sucesso nas quatro linhas.
Quer saber mais? Veja no blog Minas faz Ciência (blog.fapemig.br)!
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MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/ABR/MAI 2014
de Papa-Capim – pássaro do gênero Sporophila – no aconchego do ninho.
Registrada pela bióloga Núbia Monteiro, em um sítio no povoado de Barreiras, próximo ao município de Bonfim (MG), esta imagem mostra filhotes
VARAL
Crédito: Núbia Monteiro
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