Sumário
COMPORTAMENTO ESTRATÉGICO NA INDÚSTRIA DE TORREFAÇÃO E
MOAGEM DE CAFÉ NO ESTADO DO PARANÁ
1
Resumo – O trabalho analisa o comportamento estratégico vigente na indústria de torrefação
e moagem de café do estado do Paraná, considerando sobretudo a mudança decorrente do
novo modelo tecnológico de produção de café adotado no estado, o qual deverá permitir a
melhoria da qualidade da matéria-prima disponibilizada para tal indústria. Realizado por
intermédio de um estudo multicaso junto à nove empresas de diferentes tamanhos, o estudo
contempla inicialmente uma breve descrição do sistema agroindustrial do café paranaense,
apresentando na seqüência o relato dos casos estudados, com a caracterização geral das
empresas integrantes do trabalho e a análise das informações coletadas segundo sua natureza
específica. A título de conclusão analisam-se as estratégias identificadas e sugere-se uma
estratégia coletiva cuja adoção julga-se pertinente.
Palavras-chave: café, sistema agroindustrial, comportamento estratégico.
INTRODUÇÃO
Como qualquer outro segmento econômico brasileiro, o sistema agroindustrial (SAG)
do café não passou incólume às profundas transformações no ambiente político, econômico e
social vivenciadas no país ao longo da última década.
Como analisa em profundidade Saes (1997), entre outras mudanças, tal SAG enfrentou
o fim do Acordo Internacional que por décadas disciplinou o mercado cafeeiro e passou de
setor onde predominava historicamente uma forte regulamentação estatal, para uma situação
de “quase orfandade” com a mudança no papel do Estado e sua retirada das atividades
regulamentadoras, que culminou com a extinção do Instituto Brasileiro do Café (IBC) em
1990. É justamente após a extinção do IBC que começam a surgir os contornos que
determinarão o novo ambiente competitivo onde estas empresas irão atuar.
Consolida-se o programa de auto-regulamentação da indústria que fora criado por
iniciativa da Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC) em 1989. Não sendo mais
necessária a autorização prévia do IBC para a abertura de novas firmas, com os preços ao
consumidor sendo liberados, acirra-se a concorrência e estabelece-se um processo de
concentração na indústria do café torrado e moído. (Associação, 1998a)
Os produtos e serviços oferecidos pelas indústrias do setor diversificam-se, novos e
variados blends passam a ser ofertados e o consumo interno gradativamente recupera-se da
redução verificada nos anos 80, alcançando os níveis verificados na década anterior.
A abertura da economia traz também a maior concorrência e assédio de compra por
parte de indústrias de capital internacional. Finalmente, a indústria assiste ainda ao avanço da
tendência de concentração do varejo no país, constatando também a mudança nos padrões de
consumo, o que aumentou a preocupação com a qualidade do produto e a competição com
outras bebidas.
Os desdobramentos de tais mudanças, que afetam cada qual com sua particularidade
todos os segmentos do SAG, e as conseqüências que trazem para o futuro de todos os agentes
envolvidos, são particularmente importantes para a indústria do café torrado e moído do
estado do Paraná, objeto principal deste estudo.
1
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador da Área Técnica de Sócioeconomia do Instituto Agronômico do Paraná
(IAPAR)., [email protected]
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Após situar-se por mais de uma década entre os principais estados brasileiros
produtores de café, o Paraná conheceu o decréscimo progressivo de sua produção cafeeira
(Instituto, 1991). A queda na produção trouxe à tona o risco de escassez de matéria-prima
inclusive para a indústria de torrefação e moagem situada no estado, já que esta, que em 1991
absorveu somente 19,7% da produção estadual de café, necessitou em 1996 de 75,2% da
quantidade total ali produzida.
Diante de tais fatos, o estado vem buscando desde 1995 conjugar esforços públicos e
privados em um programa de revitalização da cafeicultura, com uma estratégia pautada
principalmente na mudança da base tecnológica de produção, o que permitiria não só o
aumento da produção e produtividade das lavouras, como também a oferta de um produto de
melhor qualidade (Instituto, op.cit.).
Apontado como o responsável direto pela reversão da tendência de declínio da
cafeicultura no Paraná, o novo modelo de produção agrícola, desenvolvido pelo Instituto
Agronômico do Paraná (IAPAR), órgão oficial de pesquisa agropecuária do estado, tem
conseguido não só estancar tal declínio como também abrir as perspectivas de uma
cafeicultura na qual, ao contrário do modelo hoje predominante, a qualidade do produto ganha
maior destaque. (Cadeia produtiva, 1997).
Evidencia-se portanto de forma concreta, a possibilidade de que em um curto período
de tempo a produção paranaense de café seja oriunda majoritariamente de lavouras adensadas,
e sendo assim o estado possa dispor de um café de qualidade superior ao hoje produzido.
Frente à realidade dos últimos anos, o parque industrial paranaense de torrefação e
moagem de café, que reúne hoje 130 empresas, vive portanto uma situação especial. Conta
não apenas com a perspectiva de que a disponibilidade de matéria-prima no estado mantenhase assegurada, com também com a possibilidade de dispor para processamento de um café de
melhor qualidade, cujo aproveitamento pleno certamente demandará importantes decisões
Os fatos expostos acima permitem concluir que não são poucos os fatores, que vem
contribuindo para mudar o ambiente no qual operam as indústrias de café torrado e moído do
Paraná, o que permite supor que as empresas deste setor venham reagindo a tais alterações.
Diante disto, este trabalho tem como objetivo geral conhecer o comportamento estratégico
vigente na indústria paranaense de café torrado e moído frente as mudanças ambientais que o
setor vivencia de modo geral. Como objetivo específico busca-se conhecer as percepções dos
empresários do setor acerca de uma mudança ambiental em particular, a qual diz respeito as
inovações na tecnologia de produção de café, que trazem a possibilidade de melhoria da
qualidade da matéria-prima estadual, apurando em que medida este fato poderá afetar o
comportamento estratégico identificado.
Como tem reagido a indústria face à tais mudanças ? Como pretende encarar o novo
cenário que se desenha para a atividade ? Quais as decisões estratégicas que vem sendo
consideradas ? Estas são algumas das questões aqui enfocadas.
Para tanto, o trabalho traz em sua seqüência a descrição dos materiais e métodos
utilizados, uma breve descrição dos sistema agroindustrial do café paranaense, a
caracterização geral das empresas pesquisadas, a análise das informações coletadas agrupadas
conforme sua natureza específica e finalmente as conclusões possíveis e algumas
recomendações julgadas pertinentes.
Este trabalho tem como objeto de pesquisa nove indústrias de café torrado e moído
situadas no estado do Paraná, amostradas entre aquelas filiadas à ABIC. Justifica-se tal
delimitação pelo fato de que a filiação à ABIC e a participação no programa de autoregulamentação coordenado por aquela associação com a instituição do “Selo de Pureza”, o
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qual garante que o produto contém café em sua composição dentro dos limites legalmente
determinados, pode ser considerado como um “pré-requisito” para os cuidados com a
qualidade, questão que se pretende explorar com maior profundidade neste estudo.
Em outras palavras, assume-se que as empresas que não se submetem aos controles
exigidos para a concessão do “Selo de Pureza” às suas marcas, além de representarem uma
parcela menos significativa do mercado, desenvolvem estratégias distantes das que se busca
aqui discutir, sendo conveniente portanto delimitar-se a problemática exposta ao campo das
A amostragem utilizada caracteriza-se como intencional e não probabilística. Foram
escolhidas e contatadas com a utilização dos dados cadastrais da ABIC, inicialmente quinze
empresas. A seleção das empresas obedeceu primordialmente a disponibilidade e o interesse
dos empresários procurados em participar do estudo.
As nove empresas escolhidas correspondem a 23% do total de associadas da ABIC no
estado e industrializaram em 1999 aproximadamente 23% do total de café torrado e moído
processado pelas associadas da ABIC no Paraná2 .
Para atingir-se os objetivos propostos, foram realizadas entrevistas pessoais com a
utilização de questionários semi-estruturados, buscando-se além de caracterizar-se as
empresas estudadas em seus aspectos gerais, detalhar as estratégias em uso para suprimento
da matéria-prima e comercialização do produto final.
Solicitou-se também aos empresários entrevistados a identificação das oportunidades,
ameaças, pontos fortes e pontos fracos existentes para as suas empresas, bem como de que
forma estes aspectos vem influenciando as estratégias adotadas, temas que serão abordados
neste estudo.
Identificou-se por fim a visão que os empresários da torrefação e moagem possuem
acerca das mudanças ocorridas no setor, em decorrência das alterações havidas na produção
agrícola com o adensamento do plantio e, fundamentalmente, quais as implicações destes
fatos para os seus negócios e para as estratégias de suas empresas.
A natureza do problema estudado evidencia a necessidade de adotar-se aqui
referenciais teóricos complementares de análise, uma vez que se busca compreender questões
de natureza estratégica que relacionam diferentes segmentos de um sistema agroindustrial,
que como tal já tem merecido abordagens analíticas específicas.
Assim sendo serão utilizados neste estudo elementos do modelo de análise estrutural
de indústrias e estratégias genéricas proposto por Porter (1986), bem como seu enfoque de
cadeia e sistema de valores (Porter, 1989), tendo como pano de fundo a análise do sistema
agroindustrial do café realizada segundo o proposto nos trabalhos sob o enfoque de
agribusiness desenvolvidos por Davis&Goldberg (1957) e Goldberg (1968) e de coordenação
de sistemas agroindustriais sugerido por Farina & Zylbersztajn (1994).
O presente trabalho caracteriza-se, conforme Mattar (1996), como uma pesquisa
qualitativa, descritiva e exploratória, enquadrando-se entre as variações dos estudos de caso
descritos por Yin (1994), no formato de estudo multicaso, o que permite que se examine as
respostas de uma mesma questão ou das questões existentes dentro da cada caso para iniciar a
elaboração de comparações cruzadas dos casos, facilitando assim o desenvolvimento da
análise para os objetivos propostos.
2
Valores estimados considerando a volume industrializado pelas empresas estudadas em 1999 e a
industrialização no ano de 1998 do total de indústrias associadas à ABIC. Se considerado o universo de
indústrias de torrefação e moagem do estado estes números são de respectivamente 19% e 7%.
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O SISTEMA AGROINDUSTRIAL DO CAFÉ NO PARANÁ
Ainda que bastante distante da realidade dos anos 60 quando foi responsável por até
54% da produção brasileira de café em grão, a cafeicultura paranaense mantém-se como
importante fonte de geração de emprego e renda no estado.
Um estudo da cadeia produtiva do café do Paraná realizado por integrantes do setor
público e privado (Cadeia Produtiva, 1997); o qual será aqui utilizado como fonte
bibliográfica básica; aponta que o sistema agroindustrial do café no estado movimenta
Quando considerado apenas o segmento agrícola, a produção estadual alcança o valor
de US$ 220 milhões e gera cerca de 70.000 empregos diretos, mantendo-se como a segunda
atividade na geração do ICMS agropecuário, atrás apenas da cultura da soja.
São mais de 16.000 cafeicultores localizados nas regiões norte, noroeste e oeste do
estado, com predomínio absoluto de pequenas propriedades, sendo que cerca de 65% das
propriedades cafeeiras possuíam lavouras de café com até 10 ha.
A produção na safra 1997/98 foi de 1.725.000 sacas, representando 7,6% da produção
brasileira o que colocou o estado em 4o lugar no ranking nacional.
No segmento industrial, o Paraná destaca-se como importante produtor de café
solúvel, contando com duas indústrias deste produto, as quais são responsáveis por cerca de
Mantendo a característica já mencionada do segmento de torrefação e moagem de
café, de operar preponderantemente com pequenas empresas atuando em mercados locais, o
estado reúne 130 indústrias responsáveis pelo suprimento de cerca de 95% do consumo
estadual do produto.
Contudo, mais do que os números passados e atuais, o que se destaca hoje na
cafeicultura paranaense são as perspectivas apontadas pela nova tecnologia de produção
agrícola desenvolvida para o estado. Como adiantava o estudo tomado aqui como base:
O setor de produ ção n ão atende a demanda dos setores de indústria e
exportação... Caso não ocorra a continuação da implantação acelerada de
lavouras dentro de novos padrões tecnológicos, esse déficit tende a aumentar,
colocando em risco todo o agroneg ócio de caf é do estado. (Cadeia produtiva,
op.cit., p.50)
Estes novo padrão tecnológico, popularizado com o nome de “café adensado”, envolve
o aumento da densidade de plantio, a utilização de cultivares específicas e o manejo integrado
de pragas e doenças. Oferece sobretudo a possibilidade de melhoria na qualidade do produto,
dado ao fato de que em decorrência do maior número de plantas por unidade de área, torna-se
praticamente indispensável a adoção de novas técnicas de colheita, as quais afetam
positivamente a qualidade do café colhido. (Instituto, op.cit.).
Estima-se que na safra 1999/2000 este novo sistema de plantio esteve presente em 20%
da área cafeeira em produção no estado, respondendo por cerca de 40% do total produzido. É
apontado também como o responsável direto pela reversão da tendência de declínio da
cafeicultura no Paraná. Tais perspectivas são confirmadas por Brando (apud Vegro,
Moricochi e Johnson, 1997) que reconhece a possibilidade de melhoria da qualidade do café
paranaense com a incorporação de técnicas de processamento mais facilmente utilizadas em
lavouras sob plantios adensados.
4 - 10
RELATO DOS CASOS ESTUDADOS
Dada a solicitação manifestada por alguns dos entrevistados quando dos contatos
iniciais para a realização do trabalho, os nomes das empresas visitadas serão mantidos em
sigilo, sendo estas identificadas apenas por um número de ordem atribuído na seqüência das
visitas realizadas.
Também com o objetivo de preservar o sigilo das fontes, serão omitidos dados como o
município sede das empresas e as marcas de café comercializadas.
Isto posto, são apresentados aqui a síntese dos relatos das entrevistas realizadas em
cada uma das empresas, trazendo primeiramente a caracterização preliminar da mesma, onde
define-se seu tamanho segundo a estratificação proposta por Saes & Farina (1999), que
estipula as diferentes categorias considerando a capacidade de processamento utilizada
expressa em sacas de café beneficiado3 .
Caracterização geral das empresas estudadas
O Quadro 1 abaixo apresenta as principais informações referentes as empresas
participantes deste estudo:
Quadro 1. Características gerais das empresas estudadas
No
Início das
Origens
N o func.
Atividades
1
1992
2
1989
3
1993
4
1987
5
1995
6
1998
7
1988
8
1976
Cafeicultores que partiram para
p/indústria
Benefiamento, compra
e venda de café (cafeeira)
Benefiamento, compra e venda
de café (cafeeira) & Exportação
Outra torrefadora
Benefiamento, compra
e venda de café (cafeeira)
Benefiamento, compra
e venda de café (cafeeira)
Cooperativa multiproduto
Benefiamento, compra e venda
Participação nos
Capacidade
Classificação
Instalada
Utilizada
Comercializa
blends (em %)
Arábica
outros produtos
Conillon
Sim
Não
54
3333
1666
Grande
80
20
X
6
1000
500
Pequena
70
30
X
Grande
50-80
50-20
4500
10
2750
500
Pequena
80
X
4
500
229
Micro
100
X
5
500
125
Micro
100
X
30
20
40
6666
2500
Grande
100
70
1500
16666
6250
Grande
NI
NI
3
2250
208
Micro
85
15
X
9
1993
café / total
Torrado em grão, Cappuccino,
Torrado p/expresso
Café beneficiado
Torrado em grão, Torrado p/expresso,
Solúvel, Cappuccino, Café verde p/exp.
Torrado em grãos p/moinhos
Torrado p/expresso, Cappuccino
X
X
de café (cafeeira) & Exportação
Cafeicultor que partiu
p/indústria
Contribuição
matéria-prima
Café verde p/ exportação
Cappuccino, Torrado p/expresso
50
2750
Outros produtos com café como
X
Torrado p/expresso
Administração
Fam.
100
X
100
X
98
X
100
X
100
X
100
X
Profis.
3
X
30
X
100
X
A análise das informações apresentadas salienta primeiramente que cinco entre as
nove empresas visitadas possuem menos de nove anos de funcionamento e oito entre as nove
operam a menos de quatorze anos. Tal característica vem ao encontro daquelas já apuradas na
literatura sobre o tema, quais sejam a ocorrência de fracas barreiras à entrada de novos
concorrentes e o movimento de entrada de novas firmas independentemente da conjuntura
econômica do país ou do sistema agroindustrial do café. (Zylbersztajn, Farina e Santos, 1993;
Filetto, Gonçalves e Antonialli, 1996)
Quanto à origem, predominam entre as empresas estudadas aquelas originárias da
atuação de seus proprietários no mercado de primeiro beneficiamento, compra e venda de
café. Quando consideradas conjuntamente com as indústrias originárias da iniciativa de
cafeicultores de agregar maior valor ao seu produto, temos sete empresas entre as nove
estudadas. Tal característica confere aos empresários entrevistados um profundo
conhecimento não só do segmento de torrefação e moagem, como também do segmento de
produção agrícola, fato que pode ser atestado pela desenvoltura com a qual discutiam
aspectos relacionados ao adensamento do plantio.
3
As autoras justificam a adoção deste critério pela consulta realizada junto a especialistas, que consideraram-no
mais apropriado do que a classificação conforme o número de funcionários usualmente utilizada.
5 - 10
Predominam entre as empresas entrevistadas as micro e pequenas torrefadoras, mas
todas indistintamente vem operando com pelo menos 50% de capacidade ociosa, o que
confere com outra característica já apontada para o setor que é o superdimensionamento de
suas plantas industriais. (Zylbersztajn, Farina e Santos, op.cit.)
Com exceção de duas das três microtorrefadoras visitadas, nas quais se utiliza apenas
café arábica na composição do produto final4 , todas as demais empresas trabalham com
blends, predominantemente com pelo menos 70% de café arábica e 30% de café robusta.
Foram identificadas também situações de blends diferentes conforme a marca com a qual o
café é comercializado, utilizando-se maior concentração de café robusta nas marcas mais
populares, as chamadas marcas de combate.
Evidencia-se o fato de que as empresas estudadas tem no café o seu principal foco de
negócios, já que em sete entre os nove casos relatados, produtos que possuem café como
matéria-prima participam com pelo menos 98% do faturamento total da empresa. Apenas
entre as grandes torrefadoras visitadas constatou-se a comercialização de outros produtos
além daqueles que possuem café como matéria-prima, ressaltando-se que em uma das três
situações onde tal fato verificou-se, isto se dá de forma ainda bastante incipiente.
Por outro lado, apenas três empresas sendo duas micro e uma pequena torrefadora,
restringem-se a comercialização do café torrado e moído. As seis outras já produzem e/ou
comercializam produtos como café torrado em grão, café capuccino, café torrado para
máquinas de café expresso, café verde para exportação ou até café somente beneficiado.
Cabe registrar por fim que entre as empresas visitadas, somente duas grandes
torrefadoras possuem administração profissionalizada, isto é, com executivos contratados no
mercado para a sua gestão. Todas as demais são administradas pelos próprios sóciosNa seqüência são apresentadas as informações referentes a visão estratégica presente e
as percepções apuradas frente ao café adensado e o novo cenário para a cafeicultura do
Para delinear a visão dos entrevistados acerca das estratégias em uso e/ou passíveis de
adoção por suas empresas, foi-lhes solicitada a menção das oportunidades e ameaças, bem
como das estratégias adotadas frente a estes aspectos, além dos pontos fortes e fracos de suas
organizações. Tal elenco de informações é fundamental, segundo a concepção de Ansoff
(1977, 1981) utilizada e adaptada por Fischmann e Almeida (1991), na leitura do ambiente no
qual insere-se a empresa, bem como de suas condições para fazer frente às adaptações
Oportunidades
Duas principais informações sobressaem entre as oportunidades mencionadas nos
depoimentos coletados, as quais surgiram indiferentemente do porte da empresa do
entrevistado.
Primeiramente, os empresários acreditam na possibilidade de expansão de suas
vendas. Neste sentido, apontam como oportunidades seja a tendência de aumento de consumo
dos cafés para expresso, seja o crescimento do mercado de cafés especiais, ou ainda, o
simples aumento das vendas de suas marcas de torrado e moído hoje já comercializadas.
4
Justifica-se tal fato pela observação que nos dois casos citados, os empresários entrevistados controlam também
cafeeiras, as quais são as responsáveis exclusivas pelo abastecimento das torrefações, com custos de matériaprima inferiores aos praticados no mercado.
6 - 10
A segunda informação evidenciada diz respeito ao fator qualidade, a qual para alguns
se tornará uma característica tão determinante para o mercado quanto o preço do produto é
hoje, trazendo oportunidades para um melhor posicionamento de suas marcas.
Outras oportunidades citadas associam-se a estratégias específicas de algumas das
empresas estudadas ou à leitura que seus administradores fazem do ambiente em que operam,
mas ainda assim merecem citação. São elas a localização em região produtora com maior
disponibilidade de matéria-prima, o crescimento das marcas próprias das grandes redes de
varejo trazendo a perspectiva de aumento da produção contratada para suprir este canal de
comercialização, a possibilidade de comercialização de café solúvel produzido por terceiros
com marca da empresa, e por fim a utilização do café como matéria-prima de outros produtos.
Quando analisam-se as estratégias adotadas para o aproveitamento das oportunidades
mencionadas, percebe-se algum distanciamento entre aquilo que a visão empresarial dos
entrevistados é capaz de apontar e o que as condições objetivas de suas empresas lhes permite
fazer.
Desta forma, entre as pequenas torrefadoras soma-se um depoimento como “ n ão tenho
nenhuma estratégia, meu capital de giro não permite”, a declaração de outro entrevistado,
para quem as oportunidades por ele mencionadas só poderão ser aproveitadas por empresas de
grande porte, com maior poder de diversificação e acesso aos principais mercados.
Também entre as microtorrefadoras o cenário pouco muda, encontrando-se estratégias
genéricas como ampliação da equipe de vendas e a manutenção do padrão de qualidade e
atendimento adotados.
Somente entre as grandes torrefadoras foram apontadas algumas estratégias que de
fato permitirão às empresas o aproveitamento das oportunidades mencionadas, como a
parceria com representantes de máquinas para café expresso italianas visando ampliar a venda
do produto por meio da locação das máquinas, a divulgação com degustação nos pontos de
venda, o aumento do número de contratos com redes de varejo, a pesquisa de novos blends
visando atingir mercados focados na qualidade, o desenvolvimento de novos produtos com
café como matéria-prima e por fim, a negociação de uma parceria com um fabricante de café
Entre as ameaças mencionadas, uma fez-se presente em todos os depoimentos,
independentemente da escala de operação da empresa do entrevistado: o aumento da
concorrência desleal em um mercado no qual o preço ainda é o principal fator concorrencial e
a fraude e adulteração do produto ainda se fazem presentes.
Outras ameaças citadas, as quais entretanto não permitem que sejam associadas ao
tamanho da indústria, dizem respeito ao avanço das grandes marcas nos mercados locais, à
concentração no segmento do varejo, ao fato de o café ser uma mercadoria pouco valorizada
pelo varejista pelas pequenas margens que oferece, à inadimplência, ao risco de escassez de
matéria-prima elevando os custos, e aquilo que um entrevistado chamou de
a qual ameaçaria todos os segmentos face ao avanço verificado
no país das grandes empresas internacionais que operam no setor.
Face às ameaças mencionadas, as empresas pesquisadas tem buscado cada qual ao seu
modo e com suas diferentes limitações, ações que visam a fixação e/ou fortalecimento de suas
marcas, seja mantendo o padrão de qualidade que afirmam possuir, seja realizando
degustações e divulgação nos pontos de venda.
Pontos Fortes e Fracos
A qualidade que os entrevistados atribuem ao produto que comercializam surge como
o ponto forte mais comumente apontado para as suas empresas. A ele associam-se aspectos
7 - 10
relacionados `a credibilidade e reputação junto aos clientes e fornecedores de matéria-prima, o
reconhecimento de suas marcas, o sistema de distribuição adotado e o atendimento de venda
oferecido, sendo citados aqui em casos específicos a localização em região produtora e a
qualidade dos equipamentos utilizados. A identificação dos pontos fortes não obedeceu
nenhuma diferenciação em função do tamanho da empresa.
pontos fracos, os depoimentos colhidos puderam ser
analisados segundo o porte da torrefadora. Curiosamente, em três situações, sendo duas destas
em grandes torrefadoras, os entrevistados não identificaram nenhum ponto fraco na operação
de suas empresas. Nas pequenas torrefadoras a restrição de capital de giro foi o ponto fraco
lembrado, já em duas das três microtorrefadoras visitadas foram apontados problemas com a
política e as equipes de venda. Finalmente, problemas com o treinamento dos recursos
humanos e a baixa rentabilidade do segmento de torrado e moído foram identificados como
pontos fracos nas duas grandes torrefadoras restantes.
Percepções frente ao café adensado
Considerando o objetivo específico do trabalho, foi demandado aos entrevistados suas
percepções frente ao novo modelo tecnológico do café paranaense, o “café adensado”,
sobretudo sobre as conseqüências que tal modelo, trouxe ou trará para os negócios de sua
empresa. Os resultados obtidos não permitem que se considere o porte da empresa no
Primeiramente, ressalte-se o já citado conhecimento das mudanças por que passa o
segmento agrícola demonstrado pelos empresários entrevistados, os quais afirmam que o
adensamento está gradativamente acarretando maiores cuidados no manejo da lavoura, com
conseqüente elevação nos níveis de produtividade e maiores cuidados na colheita e no póscolheita, daí decorrendo a melhoria na qualidade do café que já se faz sentir, segundo alguns
deles, no momento de compra da matéria-prima.
Contudo, salvo em duas situações posteriormente descritas, os entrevistados
afirmam que tais mudanças não trarão conseqüências diretas para suas empresas, não
merecendo desta forma nenhuma estratégia específica.
De forma geral, as impressões colhidas, com conseqüências indiretas para as empresas
visitadas, podem ser agrupadas da seguinte forma:
• Os cafés de melhor qualidade produzidos nas lavouras adensadas terão como destino
prioritário o mercado exportador de café em grão,
• O adensamento do plantio permitirá uma elevação generalizada na qualidade do café
parananense, permitindo também a melhoria da qualidade do café torrado e moído
produzido no estado, uma vez que aumentará a disponibilidade de matéria-prima de
qualidade superior.
As estratégias específicas decorrente do adensamento do plantio que foram
identificadas, assemelham-se e estão presentes em uma pequena e uma grande torrefadora.
Dizem respeito ao lançamento de novas marcas de cafés voltadas aos mercados focados na
qualidade do produto. Uma destas empresas já realizou investimentos para este propósito,
enquanto que na outra aguarda-se a consolidação da mudança hoje em curso.
O presente trabalho permitiu que se identificasse a visão estratégica presente em nove
empresas do segmento de café torrado e moído do estado do Paraná, e sobretudo as
percepções destes empresários face a importante mudança que ocorre no segmento de
Ainda que conheçam em detalhe o novo modelo tecnológico proposto para a produção
de café no estado e identifiquem a gradativa melhoria na qualidade do café paranaense, os
8 - 10
empresários entrevistados não apontam tal melhoria como oportunidade para suas empresas,
mesmo reconhecendo como tal a tendência futura de maior demanda por cafés de qualidade
superior.
As empresas visitadas identificam na concorrência desleal a sua maior ameaça, mas as
estratégias adotadas face a tais ameaças e as oportunidades mencionadas, são na maior parte
dos casos por demais genéricas ou inexistentes, devendo-se ressaltar que apenas uma das
empresas participantes do estudo faz uso de instrumentos formais de planejamento
estratégico.
Mesmo considerando como verdadeira a tendência indicada pelos entrevistados de que
o mercado natural dos cafés de melhor qualidade produzidos em lavouras adensadas seja o
mercado exportador, chama atenção o fato de que somente duas entre as nove empresas
estudadas esteja traçando estratégias para utilizar tal matéria-prima como diferencial
competitivo.
As associações entre empresas torrefadoras já existentes em outras regiões do país,
visando atingir objetivos estratégicos comuns, eventualmente poderiam permitir que as micro
e pequenas torrefadoras do Paraná traçassem conjuntamente as estratégias necessárias visando
contemplar a demanda por um produto de maior qualidade, demanda esta que também os
depoimentos colhidos apontam como grande oportunidade para o setor.
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COMPORTAMENTO ESTRATÉGICO NA INDÚSTRIA DE