2^]Yd]cdaPB>280; V. 14, N. 1, MAI-AGO, 2003. ISSN 0103-961X A Inclusão Social pela Previdência Imprensa e Inclusão Social na Previdência A Importância da Previdência Social na Economia dos Municípios Brasileiros e no Resgate da Cidadania Diálogo Social e os Conselhos de Previdência Panorama do Atual Modelo de Seguro de Acidente de Trabalho Cobertura Previdenciária: Diagnóstico e Propostas Quinze Princípios para Regulação dos Sistemas de Previdência Privada Fechada Ministério da Previdência Social Assessoria de Comunicação Social Mai-Ago, 2003. ISSN 0103-961X conjuntura SOCIAL A INCLUSÃO SOCIAL PELA Brasília Dezembro/2003 Conjuntura Social, Brasília, mai-ago/2003. PREVIDÊNCIA conjuntura SOCIAL (*) Os conceitos emitidos nos artigos são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da Revista. Os direitos autorais foram cedidos ao Ministério da Previdência Social conforme documentos arquivados na Assessoria de Comunicação Social. Não é permitida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização prévia do editor. Tiragem: 8.000 exemplares Expediente Edição e distribuição: Assessoria de Comunicação Social Esplanada dos Ministérios, Bloco F – 8o andar Tel.: (0 _ _ 61) 317-51 09/317-5449 Fax: (0 _ _ 61) 321-0179 Cep: 70059-900 – Brasília, DF Editor Responsável Irapuam Silveira da Rosa – [email protected] Chefe da Comunicação Social Marcello Antunes da Silva Coordenador Editorial e Acompanhamento Gráfico Juraci Pereira dos Santos (*) Solicitação de registro encaminhada ao INPI pelo Ministério da Previdência Social Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca. Seção de Processos Técnicos – MTE C751 Conjuntura Social. Brasília: MPS, ACS, 2003 – Quadrimestral. ISSN 0103-961X. 96 p. Publicação interrompida em 1978, voltando a ser publicada em maio de 1992. 1. Conjuntura social. 2. Previdência Social. CDD-368.4 3 SUMÁRIO EDITORIAL ___________________________________________________ 5 IMPRENSA E INCLUSÃO SOCIAL NA PREVIDÊNCIA WLADIMIR GRAMACHO _________________________________________________ 7 A IMPORTÂNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL NA ECONOMIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS E NO RESGATE DA CIDADANIA ÁLVARO SOLON DE FRANÇA ______________________________________________ 15 DIÁLOGO SOCIAL E OS CONSELHOS DE PREVIDÊNCIA GERALDO ALMIR ARRUDA LEILA GIANDONI OLLAIK _______________________________________________ 23 PANORAMA DO ATUAL MODELO DE SEGURO DE ACIDENTE DE TRABALHO SECRETARIA DE PREVIDÊNCIA SOCIAL ________________________________________ 41 COBERTURA PREVIDENCIÁRIA: DIAGNÓSTICO E PROPOSTAS 65 QUINZE PRINCÍPIOS PARA REGULAÇÃO DOS SISTEMAS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA FECHADA SECRETARIA DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR (ARTIGO DA OCDE) ______________________ 79 Conjuntura Social mai-ago, 2003. MARCELO NERI _____________________________________________________ 5 EDITORIAL D INCLUSÃO SOCIAL iversos mecanismos de inclusão social têm sido utilizados ao longo da história, e muitos deles mostraram pouca eficácia e resultantes efêmeros. Não importa o modelo econômico adotado, não importa o regime político vigente, não importam as ideologias e as tendências culturais dos povos: desde que o Estado organizado surgiu como “administrador” da sociedade, uma de suas principais funções tem sido a preocupação com os excluídos, a busca de amparo social aos mais desvalidos, a proteção daqueles que, por qualquer motivo, não têm capacidade de autosustentação. De modelos incipientes nos primórdios da civilização a regimes complexos de proteção e seguro para aqueles que buscam um mínimo de bem-estar, constatamos que o seguro social, tal como hoje é conhecido, tem demonstrado resultados mais consistentes e mais duradouros. Obviamente que o seguro coletivo demanda capacidade contributiva dos diversos segmentos da sociedade, competência gerencial do Estado e estrutura socioeconômica favorável ao seu desenvolvimento. A fragilidade de qualquer um desses sustentáculos, correlatos e interdependentes, implicará a inexorável fragilidade de todo o seguro social. Esta edição de “Conjuntura Social” permite ao leitor conhecer e analisar melhor os aspectos que envolvem a inclusão social em nosso País, a partir da análise que se faz do tema e dos dados colhidos por meio de pesquisas metódicas, baseadas em técnicas científicas. Assim, torna-se mais fácil chegarmos a uma compreensão bastante abrangente da importância da Previdência Social para o bem-estar dos cidadãos, na sua missão de assegurar a tranqüilidade coletiva que, por sua vez, só pode ser atingida quando se alcança a estabilidade social em todo o País. Conjuntura Social mai-ago, 2003. No Brasil, somente a partir da Constituição Cidadã de 1988, que introduziu o conceito de Seguridade Social, a Previdência, inserida neste novo contexto, juntamente com a saúde e a assistência social, pôde atuar além do primitivo amparo previdenciário de natureza meramente securitária e lançar-se à promoção e execução de políticas que contemplam a redução dos níveis de pobreza e a conseqüente inclusão social. 7 IMPRENSA E INCLUSÃO SOCIAL NA PREVIDÊNCIA WLADIMIR GANZELEVITCH GRAMACHO* Em seu discurso de posse no Congresso Nacional, em 1o de janeiro de 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou que suas prioridades na agenda legislativa seriam as reformas tributária e da Previdência. Dava, com isso, um passo adiante nos compromissos assumidos na “Carta ao Povo Brasileiro”, divulgada durante sua campanha eleitoral, em 22 de junho de 2002. Comprometia-se com o complexo desafio do governo brasileiro nos últimos anos: preservar a estabilidade da economia e os contratos em vigor e, ao mesmo tempo, acelerar a retomada do crescimento econômico e da redução das desigualdades sociais no País. “O pacto social (sugerido durante a sessão de posse) será, igualmente, decisivo para viabilizar as reformas que a sociedade brasileira reclama e que eu me comprometi a fazer”, disse o presidente, referindo-se prioritariamente às reformas da Previdência e tributária, mas citando também a política, a da legislação trabalhista e a agrária. A agenda de governo, no entanto, mostrou que o empenho maior deu-se sobre as duas primeiras. * Doutorando em Ciência Política da Universidade de Salamanca (Espanha) e ex-assessor especial de Comunicação Social do Ministério da Previdência Social. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Este artigo pretende apresentar e discutir alguns aspectos do processo de comunicação que acompanhou a reforma da Previdência no Brasil entre janeiro e setembro de 2003, período em que o debate sobre o tema parece haver cumprido um ciclo. Pretende-se indicar sumariamente o contexto político em que se deu a reforma até setembro, as repercussões que o tema gerou na imprensa e alguns resultados desse processo para a política de inclusão social previdenciária no Brasil. 8 Analisando as duas reformas, entretanto, sob o ponto-de-vista do processo de comunicação de massas, a reforma da Previdência reunia atenções e preocupações muito mais próximas do cotidiano dos brasileiros do que a reforma tributária. Afinal, regras de acesso a benefícios previdenciários, por mais complexas que sejam, tendem a despertar muito mais interesse do público consumidor de informações, dada a proximidade com os eventos determinantes desse sistema, como a maternidade, a doença, o acidente que incapacita temporária ou definitivamente ao trabalho, a aposentadoria e a morte. Apesar da mudança de parâmetros para o setor público, o debate concentrou atenções de todos os trabalhadores que potencialmente consideravam-se atingidos pelas medidas. Os tributos, por sua complexidade e, no caso brasileiro (que prefere tributos indiretos), por sua obscuridade, dificilmente seriam alvo de tanta polêmica junto à opinião pública como foram as regras previdenciárias durante sua fase de maior exposição na mídia. O governo Lula, no seu início, trazia consigo duas grandes incógnitas aos olhos dos analistas e da opinião majoritária reproduzida pela imprensa. A primeira dizia respeito à condução da política econômica e ao compromisso com a estabilidade. Esta foi esclarecida com as sucessivas manifestações do governo sobre o tema, o que reduziu a pressão sobre o dólar e a inflação. A segunda incógnita dizia respeito às condições de governabilidade que o presidente Lula construiria no Congresso, uma vez que os partidos que o apoiaram nas eleições (PT, PL, PCdoB, PCB e PMN) não reuniam maioria parlamentar necessária para aprovar emendas constitucionais (2/3 dos votos na Câmara e no Senado). O grande teste para encontrar esta resposta parece ter sido a reforma da Previdência. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Há pelo menos três razões para isso: 1 – O calendário eleitoral no Brasil dá ao governo federal recém-eleito especiais condições de cumprir uma agenda legislativa no primeiro ano que depois não se repete mais ao longo do mandato. Há eleições no 2o e no 4o anos de governo e no 3o ano o nível de popularidade do presidente tende a ser menor do que no 1o ano, quando ele acaba de ser aprovado pela maioria dos eleitores. Não cumprir a reforma da Previdência no 1o ano, logo, indicaria sérias dificuldades para cumprí-la nos anos seguintes e falta de coordenação política na construção da maioria parlamentar. 9 2 – Por sua proximidade em relação ao cotidiano dos brasileiros, o conteúdo da reforma, ou ao menos seus objetivos mais amplos, de justiça social e sustentação orçamentária, assim como o êxito ou fracasso seriam percebidos com muito mais facilidade pela população, produzindo efeitos imediatos sobre a aprovação do governo junto à opinião pública. A reforma da Previdência, como se vê, reunia grande potencial de exposição na mídia, pelas repercussões políticas, econômicas e sociais que provocaria. Foi o que ocorreu. O gráfico a seguir revela a exposição que a reforma da Previdência teve, entre janeiro e setembro, numa cesta de 9 jornais de grande circulação analisados pela Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Previdência Social: Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Jornal da Tarde, Valor Econômico, Gazeta Mercantil, O Globo, Jornal do Brasil, Extra e Correio Braziliense1. Foram selecionados dentre aqueles periódicos disponíveis diariamente em Brasília, ainda pela manhã. Considerando-se o processo de formação das pautas do noticiário no Brasil, que freqüentemente nascem nos jornais para produzir repercussões também em rádios, televisões e na internet, podemos deduzir que o gráfico também representa, muito provavelmente, o nível de exposição que o tema teve não só junto ao público leitor desses jornais (que juntos têm média diária de 1,9 milhão de exemplares) como junto à toda a sociedade. 1 Considerou-se notícia o texto com pelo menos dois parágrafos e título que versava prioritariamente sobre reforma da Previdéncia, para um conjunto de dados ilustrado no gráfico a seguir, e sobre todos os temas ligados à Previdência, para o outro, incluindo fiscalização, administração, serviços, etc. Conjuntura Social mai-ago, 2003. 3 – Por seu conteúdo, que buscou aliar a construção de um novo sistema previdenciário, com regras mais isonômicas para trabalhadores do setor público e do setor privado, à obtenção imediata de espaço no Orçamento do setor público que permitisse uma gestão mais eficiente e justa dos recursos tributários. A não aprovação da reforma da Previdência, portanto, reduziria o espaço fiscal do governo para investimentos sociais e incentivos à atividade econômica. 10 Exposição da Previdência nos 9 jornais analisados Notícias sobre a reforma da Previdência Notícias sobre todos os temas ligados a Previdência 2,000 1,800 1,600 1,400 1,200 1,000 800 600 400 200 0 iro ne ja iro re ve e f ç ar m o ril ab o ai m o nh ju o lh ju to os ag o br m te e s Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Previdência Social Entre janeiro e março, durante a fase de debates para a elaboração da proposta que seria apresentada pelo governo ao Congresso, a imprensa demonstrou passar por um breve processo de saturação. As notícias nos 9 jornais somaram 505 em janeiro, 542 em fevereiro e caíram para 306 em março. A partir de abril, mês decisivo para a apresentação da proposta (que chegou ao Congresso no dia 30), o interesse da imprensa foi crescente: 673 notícias em abril, 721 em maio, 876 em junho, quando a proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e teve seu mês de debates mais intensos na Comissão Especial instalada para analisar o mérito da reforma. Em julho, foram 678 notícias. Em agosto, quando passou pelo plenário e o governo ali negociou algumas alterações com os deputados federais, as notícias subiram para 734. No mês seguinte, setembro, com a reforma no Senado e a percepção pela imprensa de que a proposta ali não sofreria alterações significativas, as notícias caíram para 231. Aparentemente, portanto, a reforma da Previdência cumpriu na Câmara dos Deputados sua fase de maior exposição na mídia. 11 Parece haver razões para isso: 1 – Foi ali que o partido do presidente Lula, o PT, enfrentou pela primeira vez um tema considerado até então tabu para diversos integrantes de sua base parlamentar e por sua militância mais ativa. 2 – Também pela primeira vez, o PT enfrentou seu primeiro e talvez mais crucial teste de fidelidade partidária no governo Lula, registrando apenas 3 votos contrários e 8 abstenções num conjunto de 93 deputados federais. 3 – As negociações sobre itens da proposta foram intensas e envolveram os três Poderes e diversas entidades de classe com grande acesso à imprensa. Apresentado o contexto da reforma da Previdência e a difusão de notícias sobre ela nos meios de comunicação, cabe agora buscar algumas indicações sobre os resultados desse episódio. Um deles diz respeito às decisões que a população tomou, ou deixou de tomar, sobre a Previdência enquanto lia, ouvia, assistia e, em alguns casos, discutia o noticiário sobre a reforma. O próximo gráfico revela o comportamento das novas inscrições no Regime Geral de Previdência Social, administrado pelo INSS, entre janeiro e setembro de 2003. A coincidência com o gráfico anterior é enorme. Até agosto, quase idêntico, descolando-se em setembro, aparentemente por duas razões: a reabertura das agências da Previdência Social (em greve desde julho) e a reformulação do site oficial do Ministério da Previdência Social, que simplificou muito a inscrição para os internautas e, com isso, elevou o número de filiações. Conjuntura Social mai-ago, 2003. 4 – Há baixa expectativa, por parte dos analistas ouvidos pela imprensa, de que a proposta sofra drásticas alterações que a obriguem a retornar à Câmara dos Deputados para uma nova fase de debates e revisões ao texto. 12 Inscrições no RGPS/INSS pela Internet 60,000 50,000 40,000 30,000 20,000 10,000 0 j e an i ro v fe e er i ro m ar ço ab ri l m ai o ju nh o ju lh o o ag o st s em et br o Fonte: Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Previdência Social Conjuntura Social mai-ago, 2003. Certamente, outras razões podem ter provocado altas e baixas no interesse da população em buscar na Previdência Social proteção para sua renda laboral. Mas a coincidência de trajetórias e o inédito nível de exposição do tema pela imprensa sugerem forte associação. De janeiro a agosto, a correlação entre a exposição dos temas ligados à Previdência nos 9 jornais selecionados, fortemente influenciada pela reforma, como vimos, e as inscrições na Previdência Social foi de 0,852. O gráfico de dispersão ilustra essa informação. O coeficiente de regressão (b) sugere que cada notícia na cesta de jornais pode motivar 25 novas inscrições na Previdência Social pela internet. 2 Sig. (bilateral) .007. 13 Número de noticias nos 9 jornais analisados Dispersão entre notícias sobre a Previdência e inscrições no INSS pela internet, de janeiro a agosto de 2003 2000 1800 1600 1400 1200 1000 800 600 400 200 0 0 10,000 20,000 30,000 40,000 50,000 60,000 Número de inscrições pela internet Os dados também reforçam a hipótese do agenda-setting, uma das mais fortes nas teorias sobre comunicação de massa. Segundo Shaw3, “em conseqüência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público sabe ou ignora, presta atenção ou descura, realça ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas”. Este artigo não tem a pretenção de submeter essa hipótese a teste, mas parece reunir dados que reforçam sua sentença, além de renovar, com dados, as evidências da força que têm hoje jornais e seus editores em construir a 3 In Mauro Wolf, “Teorias da Comunicação”, Editorial Presença, 1987, p. 128 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: Elaboração sobre dados da Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Previdência Social 14 Conjuntura Social mai-ago, 2003. agenda de seus leitores e, por extensão, de parte significativa da população. Apesar da falta de informações e estatísticas mais refinadas sobre o processo de comunicação relacionado à reforma da Previdência, parece possível afirmar que a exposição do tema ajudou a produzir inclusão social na Previdência. Inclusão social entendida aqui não apenas como extensão da cobertura previdenciária à população de baixa renda, mas também àqueles que têm renda para contribuir mas têm lhes faltado informação sobre os conceitos previdenciários. A Previdência Social, como instituição pública de proteção de renda do trabalhador e de seus familiares, parece ter sido fortalecida ao longo do debate sobre a reforma da Previdência, uma vez que a resposta da população, medida aqui pelas inscrições no RGPS por meio da internet, foi positiva às expectativas do governo federal. Se há que indicar algum vencedor nessa “batalha da comunicação”, travada entre as diferentes versões sobre o sentido da proposta do governo, a Previdência Social pública e seus defensores parecem ter preponderado, a julgar pelos breves dados aqui contidos. 15 A IMPORTÂNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL NA ECONOMIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS E NO RESGATE DA CIDADANIA ÁLVARO SOLON DE FRANÇA* A Previdência Social vem cumprindo o seu papel na construção de um Brasil mais justo e solidário, com galhardia. Ao garantir a assistência do Estado a idosos e inválidos, o governo realiza a política pública de maior eficiência no País, a qual permite aos cidadãos brasileiros o exercício pleno da cidadania. O dinheiro proveniente da Previdência garante redistribuição da renda e incremento à economia. Aos descrentes e aos pouco afeitos à prosa literária, informa-se que os números comprovam as impressões de Rachel de Queiroz – e não corroboram críticas à Previdência baseadas, na maioria das vezes, em dogmas reproduzidos à exaustão por tecnocratas agrilhoados a tratados econômicos neoliberais. Entre 1988 e 2003, a quantidade de benefícios pagos pela Previdência Social aumentou 84,5%, passando de 11,6 milhões para 21,4 milhões de beneficiários. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para cada segurado da Previdência Social existem, em média, 2,5 pessoas atingidas de maneira indireta pelo pagamento. Assim, em 2003, a Previdência beneficiará 73,9 milhões de pessoas, ou 42% da população brasileira. * Secretário-Executivo do Ministério da Previdência Social Conjuntura Social mai-ago, 2003. A escritora Rachel de Queiroz compreendeu rápido o significado dessa tese. Nos quase 93 anos vividos por ela, guardou sabedoria muito além de seu tempo de vida. “O dinheiro das aposentadorias assegura a estabilidade econômica a muitas vilas e pequenas cidades onde circula”, resumiu ela, em artigo publicado pelo jornal O Estado de São Paulo, à época da criação da aposentadoria rural. 16 Dados colhidos pela Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev) e pelo IBGE mostram que o pagamento de benefícios previdenciários tem alta correspondência em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), tornando-se responsável direto pelo incremento da economia local. A preços de mercado, a relação entre o valor dos benefícios pagos em 2002 e o PIB chega a 10,47% no Nordeste; 6,54% no Sul; 6,43% no Sudeste; 4,81% no Norte e 3,87% no Centro-Oeste. Para o Brasil, a correspondência atinge 6,72%. O fato de o pagamento de benefícios previdenciários ultrapassar o Fundo de Participações do Município (FPM) não é um fenômeno comum ou restrito a uma determinada região. Está presente em 3.546 dos 5.561 municípios brasileiros, o que representa 64% do total, segundo dados de 2002. Os números referentes a 2001 mostram que, naquele ano, nada menos do que 3.586, ou 65% dos 5.507 municípios pesquisados, dispunham de números referentes ao FPM inferiores ao total de benefícios previdenciários pagos. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Em 2002, na Região Norte o campeão é o Pará, onde 81 dos 143 municípios (57%) têm volume de benefícios previdenciários superiores ao valor recebido pelo FPM. No Nordeste, a liderança está com Pernambuco, estado no qual 159 dos 185 municípios (86%) vivem essa situação. Porcentuais expressivos também são encontrados na região Sul. A maior incidência de casos aparece no Paraná. Dos 399 municípios, 285 convivem com essa realidade (71%). Chegando ao Sudeste, região mais abastada do País, não é diferente. No estado do Rio de Janeiro, 81 dos 92 municípios (88%) têm repasse de aposentadorias, pensões e auxílios previdenciários além do FPM. Fato semelhante espelha-se no Espírito Santo, onde o mesmo é verificado em 72 dos 78 municípios (92%), e em Minas Gerais, cuja correspondência é de 548 dos 853 municípios (64%). São Paulo também conta com porcentual elevado: 495 dos 645 municípios (76,7%) contam com pagamento de benefícios maior do que o FPM. Brasil para Brasileiros Abra-se aqui um parêntesis para lembrar um dos casos folclóricos que, aliados à capacidade invulgar de analisar fatos e pessoas, tornaram Rui Barbosa fonte inesgotável de citações. Pouco depois de aportar em Londres, a “Águia de Haia” teria ousado publicar um anúncio no Times, jornal de maior prestígio entre os 17 súditos da rainha. “Ensina-se inglês aos ingleses”, teria desafiado Barbosa. Verdadeira ou não, pede-se licença para reproduzir aqui a anedota. Levando-se em conta a sapiência de nossos especialistas em Previdência, talvez fosse o caso de convidar os brasileiros a aprender um pouco sobre Brasil – mas com o povo de verdade, com o mar de gente que se espalha pelas metrópoles e pelos campos. Não se aprende Brasil na teoria. É um país que exige mais do que a costumeira leitura de anotações que embasam as opiniões de nossos “especialistas” em Previdência. Fecha-se o parêntesis. Há outros índices que demonstram a relação direta entre repasses previdenciários e qualidade de vida dos brasileiros. Considerando-se os 100 municípios melhor situados com relação ao Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M) – Brasil – Municípios – 20001, verifica-se que em 88 deles o pagamento de benefícios está acima do FPM. Em contrapartida, nos municípios onde foram medidos os 100 piores IDHs, a relação cai para 22 o número de municípios com benefícios previdenciários em volume superior ao FMP. Tabela V Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M), Brasil – Melhores Municípios 2000 1 UF – São Caetano do Sul – Águas de São Pedro – Niterói – Florianópolis – Monte Belo do Sul SP SP RJ SC RS PNUD/IPEA/FJP – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil IDH-M 2000 0,919 0,908 0,886 0,881 0,874 Conjuntura Social mai-ago, 2003. 1 2 3 4 5 MUNICÍPIO 18 Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M), Brasil – Piores Municípios 2000 MUNICÍPIO 1 2 3 4 5 – Manari – Jordão – Guaribas – Traipu – Araioses UF PE AC PI AL MA IDH-M 2000 0,467 0,476 0,478 0,479 0,486 Tomando-se como base exclusivamente o IDH de renda, não é diferente. Em cerca de 90 dos 100 municípios com melhores índices, os benefícios são superiores ao FPM. Na contramão, nas cem localidades nas quais estão registrados os piores IDH de renda, somente 29 contam com pagamento de benefícios mais expressivos do que o FPM. Esse conjunto de números demonstra, de forma inequívoca, o quão fundamental é o pagamento de benefícios previdenciários à economia dos municípios brasileiros. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Indicadores de Condição de Vida, IDHM Renda – Brasil – Melhores Municípios 2000 1 2 3 4 5 MUNICÍPIO UF – Águas de São Pedro – São Caetano do Sul – Niterói – Campos de Júlio – Monte Belo do Sul SP SP RJ MT RS IDHM-R 2000 0,918 0,895 0,890 0,884 0,883 19 Indicadores de Condição de Vida, IDHM Renda – Brasil – Piores Municípios 2000 MUNICÍPIO UF IDHM-R 2000 1 – Manari PE 0,343 2 – Belágua MA 0,351 3 – Centro do Guilherme MA 0,358 4 – Jordão AC 0,364 5 – Santo Amaro do Maranhão MA 0,367 A Previdência Social representa também um instrumento poderoso para evitar o agravamento da exclusão social no País. Já se tornou conhecida a máxima de que o Brasil é, na verdade, dois. O primeiro, uma nação de abastados, onde mulheres lindas desfilam em meio à natureza exuberante do solo tropical. O outro Brasil pertence aos desdentados, aos miseráveis, aos “sem” – sem-teto, sem-terra, sem-previdência, sem-perspectivas. Em meio a um universo tão complexo como o da realidade previdenciária brasileira, verificamos uma particularidade da qual poucos têm conhecimento: em 4.509 municípios existentes no País, o pagamento de benefícios supera a arrecadação previdenciária. Nesses locais, conclui-se facilmente, a capacidade distributiva da Previdência Social se verifica de forma ainda mais acentuada. Há cidades onde seria preciso quase mil anos para o valor arrecadado junto aos segurados alcançar o total pago aos beneficiários locais. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Não é com palavras que daremos fim ao Brasil dos sem-nada, mas com ações concretas. Algumas já caminham, sem alarde, como o pagamento de benefícios do INSS. O reflexo do calendário mensal de repasses permite sentir a força da Previdência em todo o Brasil. Os benefícios previdenciários, incluídos rurais e assistenciais, representam 20,3% da renda monetária das famílias nos municípios de até 5 mil habitantes. Nos municípios nordestinos com população entre 20 mil e 50 mil pessoas, o porcentual vai a 22,8%. 20 Entre 1992 e 1999, a renda per capita dos domicílios nos quais residem beneficiários da Previdência subiu cerca de 30%. O crescimento da renda per capita média dos domicílios que não recebem nenhum benefício previdenciário, por sua vez, não ultrapassou 23%. Nos domicílios beneficiados pela Previdência a renda é 32,5% maior que a média nacional e 54% maior que a renda dos domicílios que não são beneficiados. Não pára por aí. Em 1999, 34% dos brasileiros possuíam renda mensal menor do de R$ 98, vivendo abaixo da linha de pobreza. Se não fosse a Previdência, o porcentual seria de 45,3%. Ao receber os benefícios previdenciários, 18 milhões de pessoas escaparam da miséria. O papel da Previdência Social como legítimo instrumento de redistribuição de renda é percebido com especial importância no campo. Hoje, nada menos do que 7 milhões de brasileiros – equivalente ao dobro da população do Uruguai e à metade dos habitantes do Chile – recebem dos cofres públicos um salário mínimo de R$ 240. Conjuntura Social mai-ago, 2003. No ano de 2002, foram pagos 6,87 milhões de benefícios a aposentados e pensionistas da área rural. O número correspondeu a R$ 18,5 bilhões anuais. A Previdência Social beneficiou, indiretamente, aproximadamente 24 milhões de pessoas no interior do país2, em uma população rural de 31,8 milhões de habitantes, de acordo com o Censo Populacional de 2000, realizado pelo IBGE. A arrecadação da área rural, por sua vez, foi de apenas R$ 2,3 bilhões, o que representou 12,4% do valor pago como benefícios rurais3. Os segurados do campo, assim, apesar de uma vida de trabalho duro, pouco ou nada contribuíram para a Previdência Social. Isso remete à conclusão óbvia de que, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, a instituição funciona como um verdadeiro programa de renda mínima para os idosos no Brasil. Outro aspecto a ser mencionado é que, ao repassar benefícios a segurados e pensionistas, a Previdência colabora para evitar o êxodo rural. 2 Pesquisa de Avaliação Sócio-econômica e Regional da Previdência Rural. II, 1998, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea 3 Fonte: INSS / Informar 21 No interior do Brasil, muitos beneficiários ascendem socialmente quando se aposentam, uma vez que passam a contar com garantia de renda fixa mensal. Em certas regiões do País é comum encontrar agricultores que recebem em torno de R$ 50 por mês. Ora, quando aposentados, esse valor é multiplicado por quatro, aumentando para R$ 240. Não é motivo de estranhamento, portanto, que existam municípios nos rincões do País onde a venda “fiada” é prática permitida apenas aos donos de comprovantes de aposentadoria ou pensão pela Previdência Social, pois a inadimplência entre os beneficiários é praticamente nula. A aposentadoria permite, no caso da população menos favorecida do interior, resgate da cidadania – por intermédio da elevação da renda e da certeza do recebimento do benefício. O compartilhamento da renda proveniente da Previdência faz com que o idoso volte a ter um papel familiar importante na área rural, estreitando os laços de solidariedade com as gerações mais jovens, que convivem com os beneficiários. O Desafio da Inclusão Previdenciária Na área previdenciária, o maior desafio deste e dos próximos governos é trazer à Previdência Social 41 milhões de brasileiros e brasileiras sem a proteção previdenciária, conforme Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio do IBGE, referente a 2001. O número é o dobro dos atuais beneficiários do sistema. Essas pessoas não possuem vínculo com a Previdência Social e trabalham sem qualquer proteção do governo. Ilegalidade essa nas relações trabalhistas e previdenciárias que constituem uma série de transtornos, como desrespeito à cidadania e ao contrato social, desgaste da relação entre setor privado e Estado, e desequilíbrio das contas públicas. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Além do aspecto social, a Previdência tem impacto direto na economia do campo. O acesso a benefícios da Previdência Rural permite ainda ao trabalhador investir na agricultura familiar. Supre ainda a lacuna de um seguro-desemprego para os filhos dos beneficiários da área rural e permite aos aposentados e pensionistas adquirirem medicamentos, criando possibilidade de acesso a tratamentos não existentes na área pública de saúde. 22 Esse mosaico de dados, longe de meros números soltos em páginas de uma publicação institucional, é o atestado da relevância da Previdência Social do país. O fato de o cidadão, muitas vezes, ter a renda multiplicada por três ou quatro vezes, no momento da aposentadoria, não significa que o rendimento chegou ao ideal. Para populações miseráveis espalhadas pelo território nacional, entretanto, os recursos da Previdência são a única chance de sobreviverem sem resvalar na indigência. Diante de problemas tão difíceis de solucionar, a discussão não pode ganhar contornos acadêmicos ou entrar para a vala comum dos embates puramente ideológicos, sob pena de a exclusão social aumentar. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Ao contrário do que rezam muitos gurus econômicos, cujo conhecimento é restrito a tintas no papel, sem a estabilidade social de pouco adiantará o esforço para sedimentar a estabilidade econômica. Por isso, aprofundar o debate construtivo sobre as causas dos sem-previdência no Brasil, a fim de encontrar soluções perenes para o problema é obrigação dos que vivem neste País. A Previdência Social é patrimônio, talvez o maior, inalienável da sociedade brasileira. É, portanto, tarefa de cada um e de todos, lutar por um sistema cada mais vez mais universal, público e eficaz. 23 DIÁLOGO SOCIAL E OS CONSELHOS DE PREVIDÊNCIA GERALDO ALMIR ARRUDA * LEILA GIANDONI OLLAIK ** 1. Diálogo Social em Gestão Previdenciária O diálogo social1 em previdência difere – em objetivos, forma e princípios – de país para país. Manifestou-se desde as origens dos sistemas previdenciários, talvez sob uma hipótese intuitiva de que um sistema de seguro social com a participação dos beneficiários fosse melhor e mais eficiente. No entanto, a existência de meios de representação não implica necessariamente bons resultados ou gestão democrática. Pode haver democracia sem meios de representação tradicionais e pode haver meios de representação institucionalizados que sejam insensíveis às demandas populares. O diálogo social pode assumir diversas formas. A forma mais comum, não específica da Previdência, é a participação por meio do poder legislativo, responsável por * Diretor do Departamento do Regime Geral de Previdência Social. ** Coordenadora da Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Previdência Social. 1 Por diálogo social entende-se, para fins deste artigo, a participação da sociedade na administração pública. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Institucionalizar o diálogo social pode ter diferentes objetivos. Pode-se buscar manter um diálogo mais perene para aperfeiçoar a política previdenciária. Pode-se também buscar desenvolver parcerias para a gestão administrativa do sistema previdenciário, ou obter respaldo da sociedade para esta gestão. Alternativamente, pode-se buscar construir um consenso em momentos pontuais de reformas previdenciárias. 24 representar a população. No entanto, há muitas especificidades previdenciárias que não são tratadas pelo legislativo e que afetam diretamente a vida dos beneficiários. Teoricamente, das formas mais específicas à Previdência, que exigem o necessário embasamento técnico, descreve-se a possibilidade de dois modelos extremos de participação: desde o total controle pelos beneficiários até o mero acompanhamento informal, não institucionalizado. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Em geral, não se observa na prática os modelos teóricos extremos. O total controle pelos beneficiários não é colocado em prática, uma vez que implicaria a tomada de decisões dos beneficiários sobre os fins e meios da previdência e sobre a administração de seus recursos, o que seria uma responsabilidade técnica desproporcional. O acompanhamento informal também não é observado, pois há o risco de assunto tão importante não ter nenhuma participação da sociedade, caso não esteja institucionalizado. Entre os extremos, há diferentes formas de participação. Há a que permite aos beneficiários supervisionar o funcionamento das entidades gestoras. Os beneficiários podem questionar o sistema e avaliar sua gestão. Há também outra forma que permite aos beneficiários decidir sobre as macro-políticas do sistema previdenciário. Além de monitorar, questionar e avaliar a gestão, os beneficiários podem decidir acerca das diretrizes gerais da entidade gestora. Uma terceira forma permite a presença dos beneficiários como membros das entidades gestoras, exercendo assim uma participação interna. Os beneficiários são co-responsáveis pela gestão, sendo a participação interna dos empregadores e dos segurados defendida como mecanismo que garantiria uma cobertura eficaz das contribuições e que facilitaria alcançar maior eficácia na gestão, possibilitando inclusive redução nas contribuições. Esta forma de participação é por vezes chamada de gestão plena2. Independente da forma, seus princípios são sempre fundados na autoridade democrática, na transparência, na responsabilização dos participantes, no controle financeiro e na qualidade da gestão e da supervisão. 2 O que por vezes é chamado de gestão plena é essa participação interna com os beneficiários sendo coresponsáveis pela gestão, e não deve ser confundida com o modelo teórico de beneficiários exercendo total controle do sistema previdenciário. 25 A participação social não implica perda de autoridade do Estado ou das administrações públicas. A administração pública pode definir o grau de participação e, na maioria das vezes, tem o diálogo social como uma das opções para o processo decisório. Ouvir os beneficiários, institucionalizar formas de participação e democratizar o processo decisório são ações que não devem enfraquecer a autoridade governamental, mas sim fortalecê-la. A transparência é necessária a qualquer forma de participação. Para poder participar de forma produtiva, é preciso ter acesso aos assuntos que são objeto da participação. A transparência também permite responsabilizar os participantes pelas suas colocações e desenvolver um controle financeiro eficaz. No entanto, para a participação social funcionar, é fundamental que os participantes tenham bom nível técnico e conheçam bem os assuntos a serem tratados. A qualidade da participação é fundamental para os bons resultados. Esses princípios precisam estar em vigor em um contexto onde o marco legislativo seja claro, coerente e aplicável, estipulando as regras a serem seguidas na busca por administração democrática e de baixo custo. A participação institucionalizada tem-se debilitado porque se, por um lado, o processo de universalização das prestações sociais obriga levar em conta os interesses de distintos grupos de trabalhadores; por outro, a inovação tecnológica e a Internet permitem maior aproximação dos beneficiários independentemente das participações institucionalizadas. Alguns autores argumentam que a participação foi tão ampliada que se enfraqueceu, defendendo que por ser mais diluída e mais democrática, a participação institucionalizada não é mais tão legítima nem tão representativa. Conjuntura Social mai-ago, 2003. O princípio da qualidade da participação pode gerar uma falsa polêmica. Por um lado, argumenta-se que os participantes devem ser especializados em previdência, técnicos com alto grau de conhecimento acerca do assunto. Por outro lado, argumenta-se que, devido à abrangência da Previdência, universal e obrigatória, deveria haver uma desprofissionalização, podendo qualquer cidadão representar o povo no diálogo social. A polêmica não se justifica, pois o perfil dos participantes irá depender dos diferentes objetivos e formas de participação almejadas. 26 Três atores estão diretamente interessados no bom funcionamento da previdência social: o Estado, pois se trata de prestação de um serviço público essencial para o bom funcionamento da sociedade; as pessoas protegidas, que dependem da previdência social para manutenção de renda em situações de risco; e os empregadores, que arcam com uma parte substancial dos custos do sistema. Esses três atores manifestam interesse em participar internamente da gestão da previdência e buscam respaldo no marco regulatório internacional. No entanto, a participação da sociedade nas decisões previdenciárias traz benefícios também para os excluídos, já que a concertação visa aperfeiçoar a previdência para expandir a cobertura e atingir plenamente seus objetivos, promovendo a inclusão social. Assim, ainda que indiretamente, toda a sociedade tem interesse que Conselhos e outras formas de participação social tenham espaço garantido na gestão pública. Direta ou indiretamente, os benefícios do diálogo social alcançam toda a sociedade. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Apesar de cada Estado ter autonomia para definir formas de participação, as Organizações Internacionais exercem grande influência sobre a evolução da opinião pública no âmbito da política social. A organização internacional mais relacionada aos assuntos previdenciários é a Organização Internacional do Trabalho – OIT. Desde a Conferência Internacional do Trabalho, realizada na Filadélfia em 1944, diversos atos foram editados. O primeiro deles que recebeu grande atenção foi a Recomendação 67 que, em seu artigo 27, destaca a conveniência dos segurados (contribuintes) serem representados nos órgãos determinados ou indicados pela política administrativa, em especial na administração das indenizações dos riscos profissionais. O Convênio no 102, que estipula normas mínimas para regimes de Seguridade Social, leva em conta esses precedentes ao estabelecer no artigo 72 dois princípios básicos: 1. o Governo é responsável pela correta administração; e 2. os segurados e, eventualmente, os empregadores e as autoridades públicas, deverão participar da administração, quando a administração não estiver instituída ante um parlamento, os representantes dos segurados deverão participar na administração ou estar associados a ela em caráter consultivo, nas condições que forem estabelecidas. Esses princípios estão reunidos em outras normas posteriores, como no Convênio 121 de 1964, sobre prestações por riscos profissionais (artigo 24), ou no Convênio 128 de 1967, sobre prestações por invalidez, velhice e morte (artigo 35) ou ainda no Convênio 130 de 1969, sobre assistência à saúde e 27 prestações monetárias de doença. Também da OIT, há os Convênios 24 e 25, e a Recomendação 29, de 1997, que tratam especificamente do seguro doença, estabelecendo que “os segurados devem participar na administração das instituições autônomas, nas condições que determine a legislação nacional”. Os Convênios 35 a 40, de 1993, tratam dos seguros de velhice, invalidez e morte, também destacando a participação dos interessados. Com base no marco regulatório internacional, cada país desenvolve seu próprio modelo de gestão previdenciária. A seguir, trata-se de como o diálogo social em previdência se desenvolveu no Brasil, bem como as intenções para o futuro. 2. Diálogo Social na Previdência Social Brasileira 2.1. Histórico Desde os primórdios da previdência social brasileira, a participação dos agentes sociais na gestão do sistema quase sempre esteve prevista. Com a edição do Decreto no 20.465, de 1o de outubro de 1931, que estendeu o regime da Lei Elói Chaves aos empregados dos demais serviços públicos concedidos ou explorados pelo Poder Público, houve a consolidação da legislação referente às Caixas de Aposentadorias e Pensões e a determinação de que cada Caixa de Aposentadorias e Pensões fosse dirigida por uma junta administrativa, composta por quatro ou seis membros, conforme fosse conveniente, sendo a metade dos membros designada pela empresa e a outra metade eleita pelos associados. Posteriormente, em 26/08/1960, foi editada a Lei n° 3.807, a chamada Lei Orgânica de Previdência Social – LOPS, que unificou a legislação referente aos Institutos de Aposentadorias e Pensões. A referida Lei previu dois institutos jurídicos de gestão: o Conjuntura Social mai-ago, 2003. A Lei Elói Chaves (Decreto Legislativo no 4.682, de 24 de janeiro de 1923), considerada o ponto de partida da Previdência Social no Brasil, determinou a criação de uma Caixa de Aposentadoria e Pensões para os empregados de cada empresa ferroviária e, em seu art. 41, já previa um Conselho de Administração composto pelo superintendente ou inspetor geral da respectiva empresa, dois empregados do quadro e mais dois empregados eleitos pelos trabalhadores ferroviários. 28 Departamento Nacional de Previdência Social – DNPS, dirigido por um Conselho Diretor composto de seis membros: dois representantes do Governo, dois das empresas e dois dos segurados, todos com mandato de quatro anos; e o Conselho Administrativo dos Institutos de Aposentadorias e Pensões – CA/IAP. O Decreto-Lei no 72, de 21 de novembro de 1966, unificou os Institutos de Aposentadoria e Pensões e criou o Instituto Nacional de Previdência Social – INPS. O sistema geral da previdência social passou a constituir-se de um órgão executivo, representado pelo INPS, e dos seguintes órgãos de planejamento, orientação e controle administrativo ou jurisdicional, integrantes da estrutura do Ministério do Trabalho e Previdência Social, sob a supervisão do Ministro de Estado: Departamento Nacional da Previdência Social – DNPS; Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS; Juntas de Recursos da Previdência Social – JRPS; e Serviço Atuarial. A participação social ficou cingida apenas ao DNPS, o qual era dirigido por um Conselho Diretor, composto de oito membros, sendo quatro representantes do Governo, dois dos segurados e dois das empresas. Com a Lei no 5.890, de 8 de junho de 1973, que alterou a Legislação de Previdência Social, o sistema geral da previdência social passou a constituir-se dos seguintes órgãos: Secretaria da Previdência Social; Secretaria de Assistência Médico-Social; e Instituto Nacional de Previdência Social. Não se previu nenhuma forma de participação na gestão por parte de empresas ou trabalhadores. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Nova participação da sociedade civil na gestão do sistema previdenciário somente veio a ser prevista na Constituição Federal de 1988, em seu art. 194, parágrafo único, inciso VII, conforme redação dada pela Emenda Constitucional no 20, de 1998. “Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I – universalidade da cobertura e do atendimento; II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; 29 III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV – irredutibilidade do valor dos benefícios; V – eqüidade na forma de participação no custeio; VI – diversidade da base de financiamento; VII – caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.” O Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS já teve, historicamente, conselhos estaduais e municipais a ele subordinados. Os Conselhos Estaduais e Municipais de Previdência Social, instituídos legalmente em 1993, com instalação gradativa a partir de então, visavam descentralizar o debate sobre políticas previdenciárias. Tentou-se estimular a participação da sociedade, proporcionando canais de diálogo social em todos os lugares abrangidos pelo sistema previdenciário, com estímulo à interação e ao debate entre as entidades governamentais e não governamentais acerca da política e da gestão da Previdência Social. No entanto, alguns resultados não corresponderam às expectativas de debate previdenciário construtivo, sendo os conselhos municipais por vezes confundidos com ouvidorias onde questões específicas de processos previdenciários individuais eram discutidas. Este modelo foi interrompido em 1999, por Medida Provisória, que os extinguiu. O grande desafio dos conselhos descentralizados é ter como conselheiros cidadãos capazes de identificar características da gestão previdenciária que podem ser alteradas para aperfeiçoar a gestão previdenciária. Os conselhos descentralizados devem contribuir para o aperfeiçoamento da previdência mediante debate de legislação e de melhores formas de funcionamento e atuação. Conjuntura Social mai-ago, 2003. As Leis no 8.212 e no 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispuseram, respectivamente, sobre os planos de custeio e benefícios da previdência social, instituíram o Conselho Nacional de Seguridade Social – CSSS e o Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS. O primeiro foi revogado pela Medida Provisória no 1.799-5/99, restando vigente o segundo, tendo como membros seis representantes do Governo Federal e nove representantes da sociedade civil, sendo três representantes dos aposentados e pensionistas, três representantes dos trabalhadores em atividade e três representantes dos empregadores. 30 Apesar da extinção dos conselhos estaduais e municipais em 1999, continuou a haver demanda por diálogo social. O CNPS foi o instrumento de diálogo que foi mantido. Há interesse da administração pública em fazer gestão democrática e próxima dos cidadãos. Se houvesse conselhos, esses poderiam promover a interação entre Governo e sociedade em seus pólos de jurisdição, contribuindo para o aperfeiçoamento da política de Previdência Social e da gestão do sistema previdenciário. 2.2. Atualmente O Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, instalado em 27/08/91, vinculado ao Ministério da Previdência Social, é órgão superior de deliberação colegiada, tendo como finalidade deliberar sobre a política de Previdência Social e sobre a gestão do sistema previdenciário. Conjuntura Social mai-ago, 2003. O CNPS é um instrumento para o diálogo social importante na busca da transparência e legitimidade na resolução dos problemas da Previdência Social. Sendo suas deliberações respaldadas pelas entidades representativas da sociedade civil, Governo, aposentados, empregados e empregadores, são co-autores das decisões proferidas pelo Conselho, o que garante a participação e a responsabilidade no equacionamento dos problemas da Casa. Há quem defenda que o Conselho poderia ter atribuições gerenciais e participar diretamente dos órgãos executivos do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, a exemplo da Diretoria Colegiada e das Gerências Executivas. Contudo, há o risco de que, em havendo representantes da sociedade que exerçam funções executivas, haja maior engessamento da máquina administrativa, bem como maior influência política nas ações da Previdência Social. A ação executiva deve ser exercida por servidores públicos, concursados e habilitados nas especificidades previdenciárias. Esta posição tem respaldo na experiência internacional e corrobora para a construção de um Estado democrático, forte, isento e transparente. O histórico das atuações do CNPS demonstra que se por um lado ele vem tratando de temas de grande relevância para o aperfeiçoamento da previdência brasileira, por outro ainda encontra espaço para pensar ações que permitam melhorias na sua atuação. 31 Do lado dos temas relevantes, os debates têm se traduzido em resoluções. Desde a sua instalação, foram por ele editadas 1.229 resoluções, sobre os mais variados assuntos, influenciando a edição de atos legislativos, o combate à fraude e corrupção, a ação fiscal do INSS, o debate acerca das renúncias previdenciárias, entre outros. Por exemplo, nos anos de 1996 a 1999 o Conselho Nacional de Previdência Social emitiu resoluções para fixar as diretrizes básicas para a ação administrativa da Previdência Social, consubstanciada na Resolução no 720/96, reformulada pela a Resolução no 960/97. Esse documento é um resumo de todos os programas, projetos e atividades realizados pela administração ao longo dos anos nas suas diversas linhas de atuação. O CNPS também busca monitorar contratos, como por exemplo o contrato com a rede bancária e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, no que concerne à prestação de serviços para concessão, manutenção, habilitação e pagamento de benefícios. Nesse sentido, aprovou a Resolução no 993/97, definindo diretrizes básicas para a negociação com a ECT quando da renovação do contrato em vigor. O mesmo foi feito em relação ao contrato com a rede bancária. Em 2003 o CNPS se debruçou sobre os contratos da DataPrev para serviços de informática, sempre buscando monitorar e aperfeiçoar a administração previdenciária. O CNPS está envolvido no processo para ampliar a cobertura dos benefícios concedidos pelo Regime Geral de Previdência Social -RGPS, conforme mostra a Resolução no 1.189, de 24/05/2000, que consigna a parceria das entidades da sociedade civil nele representadas para a efetiva implantação do então Programa de Estabilidade Social, hoje Programa de Educação Previdenciária. Resolução no 1.197, de 25 de abril de 2001, determinou a publicação bimestral dos Indicadores de Desempenho Institucional no Diário Oficial da União. Posteriormente, a Resolução no 1.211 determinou que fosse elaborado relatório mensal com diversas informações para prover informações para a melhor gestão quadripartite da Conjuntura Social mai-ago, 2003. Outro exemplo é a Resolução no 1.188, de 26/4/2000, solicitando ao INSS e à Dataprev a apresentação dos seus respectivos planos de trabalho. Outra resolução de impacto na melhoria da gestão é a no 818/96, que aprova os Indicadores de Excelência nas Gerências Regionais do Seguro Social. 32 Conjuntura Social mai-ago, 2003. previdência, inclusive com a avaliação e acompanhamento do desempenho das Gerências Executivas mediante indicadores dos serviços. Os indicadores foram desenvolvidos com base no sistema anteriormente publicado no Diário Oficial da União. Os indicadores, apesar de alimentados pelas Gerências Executivas do INSS, eram elaborados pela DataPrev e entregues à Subsecretaria de Orçamento e Planejamento – SPOA do Ministério, que desenvolvia a avaliação das gerências e entregava uma tabela de classificação de gerências à Secretaria Executiva do Conselho para elaboração do relatório. No entanto, a partir de 2003 a DataPrev passou a cobrar da SPOA para entregar os indicadores e o Tribunal de Contas da União – TCU questionou a SPOA do pagamento destes serviços. Em junho de 2003 a SPOA optou por cancelar o serviço. Assim, os dados dos últimos dois relatórios (julho e agosto de 2003) referentes a este item não foram atualizados. Cabe aos Conselheiros do CNPS propor uma melhor adequação para que a avaliação e o acompanhamento do desempenho das gerências prossigam. Uma alternativa seria remodelar os indicadores para evitar que impliquem distorções nos serviços das gerências e para que sejam produzidos pelo próprio INSS, em vez da DataPrev. Seria também interessante retornar ao procedimento anterior de publicação no Diário Oficial da União, para que a classificação das gerências funcione como instrumento impulsionador de melhorias nos serviços previdenciários. Outra resolução importante do CNPS é a Resolução no 1.215, de 5 de junho de 2002, que trata de sugestões para auxiliar o processo que visa desimobilizar o INSS. O processo de desimobilização, iniciado em 1987, recebeu atenção especial do CNPS e o plenário baixou resolução para que se priorize a venda dos imóveis ocupados ou de interesse de outros órgãos públicos e se aprimore o sistema de controle patrimonial. Um representante do Conselho ficou encarregado de acompanhar o processo de desimobilização. O Conselho é informado periodicamente da situação dos imóveis do INSS. Em fevereiro de 2003, durante a 88a reunião ordinária do CNPS, houve uma atualização dos dados, quando os conselheiros foram informados de que atualmente são 1.611 terrenos, 1.045 casas e apartamentos, 767 edifícios, 397 imóveis em poder de terceiros, 131 glebas e fazendas, 26 armazéns e silos, 339 imóveis a alienar, 5 imóveis a registrar/regularizar e 5 imóveis a classificar, e ainda há 112 imóveis numa classificação genérica de “outros imóveis”. Há um conjunto de 5.175 imóveis, dentre os quais estão todas as unidades que o INSS utiliza na sua rede de atendimento – como prédios de funcionamento de agências, gerências e superintendência e, em alguns locais, centros de unidades de reabilitação profissional, que somam mais de 33 Em ações mais abrangentes, as Resoluções no 1.214, de 8 de maio de 2002, e no 1.219, de 10 de abril de 2002, criaram um grupo de trabalho para estudar e propor medidas para melhorar o financiamento e sustentabilidade da Previdência Social. O relatório final do grupo, apresentado do CNPS, traz oito propostas principais. Uma proposta seria separar as fontes para o financiamento de benefícios, em assistenciais, previdenciárias contributivas e previdenciárias não contributivas, para maior transparência do financiamento. Outra proposta seria estudar formas de desonerar a folha de salários, talvez alterando a forma de contribuição de débito em folha para porcentagem do faturamento líquido. A proposta de revisar as renúncias previdenciárias também consta do documento, e está em pauta no CNPS em sua 95a reunião ordinária, de setembro de 2003. Uma quarta proposta do grupo de trabalho acerca do financiamento foi de aperfeiçoar a previdência para áreas rurais, propondo atribuir número de inscrição pessoal e intransferível ao segurado pessoal, dentre outras propostas. O CNPS tem desenvolvido um ciclo de debates acerca da previdência rural Conjuntura Social mai-ago, 2003. 1.100 unidades no contexto desses 5.175. Desses imóveis, 2.090 estão no Estado do Rio de Janeiro – origem de toda a estrutura administrativa da Previdência. E 535 deles estão no Estado de São Paulo. Mil imóveis estão em uso por unidades de serviço, e o Instituto ainda loca de terceiros 350 imóveis (em cidades onde não há patrimônio). Esses 350 imóveis alugados não estão incluídos nos 5.175. O valor contábil do patrimônio do INSS está estimado em 2,8 bilhões, incluindo todos os imóveis – inclusive os utilizados pelo INSS nas suas unidades de serviço. Como resultado das ações do processo de desimobilização, em 2001 dos 241 imóveis ofertados, 53 foram vendidos por licitação somando 5,1 milhões de reais, além da venda direta de imóvel para órgão público, totalizando 9,7 milhões de reais. Em 2002, foram ofertados 96 imóveis, com 18 efetivamente vendidos totalizando 3.293.562 reais. Os fatores que vêm afetando a efetividade do processo em 2003 são a legislação, que restringe a concorrência pública; as avaliações efetuadas pela Caixa Econômica Federal; e as exigências de regularidade do imóvel. A meta é de desimobilizar mais de 100 imóveis por meio de concorrência pública até dezembro de 2003. Está em estudo pelo INSS, pelo Ministério da Previdência, pela SPU e pelo Ministério da Fazenda, a obtenção de uma fórmula de pagamento de dívida do INSS com a União por meio da dação em pagamento de imóveis do Instituto, ocupados por órgãos públicos ou de interesse de órgãos públicos federais. A aprovação de tal instrumento virá auxiliar a administração dos imóveis, permitindo a diminuição das despesas na gestão do patrimônio. O CNPS continuará a acompanhar o processo de desimobilização. 34 ao longo de 2003, que será tratado a seguir. Outra proposta do relatório final é expandir a cobertura previdenciária, mediante criação de loteria/sorteio dentre contribuintes RGPS; retenção da contribuição do empregado pelo empregador (proposta que já foi implementada no início de 2003); solicitação de comprovante de regularidade INSS para ser contratado pelo setor público; vinculação do desconto da previdência privada aberta no IRPF à contribuição ao INSS. Uma sexta proposta foi de examinar formas para recuperar contribuintes individuais inadimplentes. Alienar a parte da dívida judicial que seja considerada, pela Procuradoria, como irrecuperável ou de cobrança não economicamente viável também foi proposto pelo grupo. E, finalmente, buscar meios de flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Todas as propostas para melhorar o financiamento e a sustentabilidade da previdência social brasileira apresentadas no relatório final do grupo de trabalho no âmbito do CNPS têm sido analisadas durante as reuniões ordinárias do CNPS e algumas já foram inclusive implementadas. A ênfase, no entanto, tem sido quanto à Previdência Rural. O CNPS inaugurou um ciclo de debates para remodelar a Previdência Rural, que ocorre ao longo do ano de 2003. O relatório do grupo de trabalho acerca da sustentabilidade e financiamento da previdência foi apresentado aos conselheiros em janeiro de 2003. De fevereiro a julho de 2003, as reuniões do CNPS contaram com apresentações feitas pelos próprios conselheiros mostrando um diagnóstico da previdência rural do ponto de vista do Governo, dos empregadores rurais e dos trabalhadores rurais. A 94a reunião ordinária realizada em agosto de 2003 contou com a participação do Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais e da Federação dos Trabalhadores Rurais FETRAF Sul. Em setembro, na 95a reunião ordinária, o debate foi voltado aos pescadores e a Previdência Social, com a participação do SINPESCATRAESP e da Federação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviários e Afins. Dando continuidade ao ciclo de debates sobre a previdência rural, para outubro está prevista apresentação da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca. Assim, o ciclo de debates se traduz que as reuniões do CNPS dedicam parte significativa da pauta para tratar de formas para melhorar a cobertura, o financiamento, a equidade e a sustentabilidade da previdência rural, preservando as especificidades da área. O debate tem sido frutífero. Um exemplo é a Resolução no 1.227, de 25 de junho de 2003, que sugere que seja feito termo de cooperação técnica entre a Confederação 35 da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA e o Ministério da Previdência Social para desenvolver ações para expandir a cobertura da previdência social junto aos produtores rurais, e elevar os níveis de formalidade e arrecadação previdenciária na comercialização dos produtos agrícolas e pecuários. Outro assunto de grande relevância, e relacionado ao Sistema de Acidente de Trabalho, embora do lado da prevenção, é o debate acerca de como implementar o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP. O PPP é um histórico-laboral do trabalhador que permite descrever detalhadamente as funções existentes em uma empresa, levando em conta tipos de tarefas, equipamentos de proteção individuais e coletivos, máquinas em uso, meio-ambiente, ritmo e área de trabalho. Permite registrar dados administrativos, registros ambientais com base no Programa de Prevenção dos Riscos Ambientais – PPRA e no Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT, e resultados de monitorização biológica. Apesar do Perfil Profissiográfico – PP ter sido instituído pela Medida Provisória no 1.523, de 11/10/96, posteriormente convertida na Lei no 9.528, de 10/12/97 que, em seu art. 58 § 4o, estabelece que “a empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento”, busca-se agora fazer melhor uso deste instrumento para fins previdenciários. O Decreto no 4.032, de 26/11/01, alterou a denominação do PP para Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, acrescentando ao histórico-laboral do trabalhador, além das informações administrativas, registros ambientais e resultados de monitoração biológica. Posteriormente o INSS editou a Instrução Normativa no 84, de 17/12/02, que revogou a Instrução Normativa no 78 de 16/07/02 (que, entre outras coisas, havia instituído o PPP), instituindo, no § 1o do art. 148, o Perfil Profissiográfico Previdenciário – Conjuntura Social mai-ago, 2003. O tema previdência rural tem sido presente em todas as reuniões, mas outros itens relevantes continuam também a serem tratados; dentre eles o esforço para aperfeiçoar a segurança no trabalho. A Resolução no 1.221, de 30 de agosto de 2002, recomenda medidas para melhorar o regulamento e a manutenção das informações referentes a acidentes do trabalho, recomendando inclusive que se desenvolva estudos para embasar a construção de uma nova tarifa para o seguro de acidente de trabalho que melhor reflita a relação risco x custo das atividades por empresa. O CNPS tem até maio de 2004 para deliberar sobre as alíquotas do SAT e para tanto estará analisando a questão pormenorizadamente. 36 Conjuntura Social mai-ago, 2003. PPP, estabelecendo que até 30/06/03 seriam aceitos os laudos técnicos através dos formulários SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030 e DIRBEN 8030 como alternativa ao PPP, mas que a partir de 01/07/03 tais formulários perderiam a eficácia e o PPP passaria então a ser obrigatório e de responsabilidade das empresas. A Instrução Normativa no 90, de 16/06/03 alterou a data de entrada em vigor do PPP de 01/07/2003 para 01/11/2003. Está-se buscando propostas para aperfeiçoamento do PPP. Uma proposta que está sendo examinada seria que o PPP fosse implantado em duas fases. Na primeira fase, as informações que compõem o PPP seriam mantidas por meio de formulário próprio tendo como público os segurados expostos a agentes nocivos. Durante esta fase, o INSS analisaria as informações e desenvolveria estudos para aperfeiçoar o PPP. Com um universo de prestadores de informações reduzido, o período funcionaria como um teste preliminar à expansão do PPP a todos os segurados. Na segunda fase, as informações que compõem o PPP seriam migradas por meio da GFIP. O PPP já teria passado pela fase de teste, teria sido aperfeiçoado, podendo ser então expandido a todos os segurados, municiando a previdência de informações necessárias para seu funcionamento e dando incentivo às empresas para implementarem ações preventivas com objetivo de proporcionar melhor saúde ao trabalhador. Neste contexto, o CNPS tem papel fundamental para promover o debate acerca da implementação do PPP, buscando sugestões que tenham o respaldo de representantes dos trabalhadores e dos empregadores. Assim, a Resolução no 1.229, de 27 de agosto de 2003, criou um grupo de trabalho para estudar e propor medidas para o aperfeiçoamento do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP. O grupo desenvolveu duas reuniões propondo alterações no formulário atual e sugerindo formas de aperfeiçoar o processo de implementação do PPP. Além de temas do âmbito da Previdência Social, o CNPS tem visão abrangente dos problemas previdenciários. Acompanhou com atenção a Reforma Previdenciária encaminhada ao Congresso em abril de 2003 e busca também identificar formas de aperfeiçoar o funcionamento da previdência dos servidores públicos no que diz respeito ao marco legal em referência ao RGPS. A Recomendação no 4, de 30 de julho de 2003, ao Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão, aponta a necessidade de adequar os critérios de concessão de aposentadoria por invalidez, aposentadoria especial, auxílio-funeral e auxílio-natalidade ao disposto no Art. 5o da Lei 9.717/98 por terem critérios de concessão diferenciados no Regime Geral de Previdência Social – RGPS. Conforme entende o CNPS, com respaldo na Lei 9.717/98, não cabe aos servidores públicos perceber benefícios diferentes dos previstos no 37 RGPS exceto os previstos constitucionalmente. Os órgãos de controle interno deverão tomar as providências cabíveis a respeito. Pelo lado das ações que permitiriam melhorias na atuação do CNPS, sugere-se um ciclo de debates para discutir os critérios de composição do CNPS, definindo assim critérios objetivos para escolha das entidades com assento no Conselho. As Resoluções CNPS no 1.222, de 30 de agosto de 2002, e no 1.224, de 31 de outubro de 2002, criaram um Grupo de Trabalho com o objetivo de definir critérios de escolha das entidades que representarão a sociedade civil no CNPS, bem como para a designação dos membros titulares e suplentes, com o correspondente mecanismo de alternância ou rodízio. No entanto, os trabalhos do grupo não foram concluídos. Houve também, em 24 de junho de 2003, uma reunião extraordinária que tomou o formato de seminário internacional voltado inteiramente para a questão do diálogo social e da gestão participativa. O seminário contou com a participação de quatro Conselhos Nacionais (do meio ambiente, do trabalho, da educação e da saúde) e de organizações internacionais (OISS e OIT) para discutir a composição, o funcionamento e os desafios que conselhos – em diversas áreas e em diversos países – comumente encontram. Com isso, buscou-se aperfeiçoar o debate acerca do melhor funcionamento e da maior efetividade do CNPS3. O interesse em encarar esse desafio é conjunto. Todos os participantes estão interessados em buscar de aperfeiçoamento do CNPS. A parceria neste sentido é constante, entre o Ministério e as entidades representativas da sociedade. Apesar da necessidade de melhorias, o Conselho Nacional de Previdência Social vem dinamizando a sua tarefa, tendo em vista que a atuação plena, encampada pela compreensão dos seus objetivos institucionais, garantirá a eficácia dos mecanismos de gestão e a conseqüente melhora no atendimento à clientela previdenciária. 3 Pretende-se publicar o conteúdo das palestras e dos debates deste seminário em volume da Coleção Previdência Social em 2004. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Além do debate da composição e do funcionamento do CNPS, um caminho para a melhoria da atuação que proporcionaria maior efetividade das decisões seria o capacitação mais técnica dos conselheiros, bem como avaliar a possibilidade de dar às resoluções do Conselho um caráter mais deliberativo do que consultivo. 38 A presença da cultura participativa de gestão é recente e exige comprometimento das partes envolvidas. Porém, diante da atual conjuntura histórica do País, urge esforço conjunto, com o intuito de garantir a qualidade dos serviços à população. Somente por meio dessa ação mútua será possível atingir os objetivos preconizados pela democracia e pela cidadania. 2.3. A Visão para o Futuro Para expandir e fortalecer o diálogo social na gestão previdenciária, pretende-se recriar conselhos descentralizados com base nas lições aprendidas da experiência dos conselhos estaduais e municipais existentes de 1993 a 1999. A intenção é de utilizar a infra-estrutura do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS, que já dispõe de grande capilaridade, e compor Conselhos de Previdência Social junto às Gerências Executivas. Conjuntura Social mai-ago, 2003. A Resolução CNPS no 1.226, de 1o de abril de 2003, transformou a demanda por diálogo social descentralizado, represado desde 1999, em ato administrativo, propondo estabelecer projeções do CNPS junto às Gerências Executivas. Em decorrência desta Resolução, pretende-se editar ato legal criando Conselhos de Previdência Social – CPSs junto às Gerências Executivas. As competências dos CPSs seriam definidas por Resolução do CNPS, bem como os critérios de seleção dos representantes dos trabalhadores e dos empregadores e a forma de funcionamento dos CPSs. Assim, depois do ato publicado, o CNPS baixaria resolução com o regimento interno para os CPSs e os gerentes poderiam iniciar seus exercícios de diálogo social. O CNPS iniciou o debate sobre o regimento interno que seria mais adequado no mês de setembro. Dentro das linhas gerais, os gerentes executivos teriam autonomia para instalar o CPS de acordo com o contexto e a realidade de cada gerência executiva. Propõe-se que cada CPSs seja composto por dez conselheiros: 4 representantes do Governo e 6 da sociedade, sendo 2 representantes dos trabalhadores, 2 dos empregadores e 2 dos aposentados e pensionistas. Assim como no CNPS, as funções dos conselheiros dos CPSs não seriam remuneradas e seu exercício seria considerado serviço público relevante. 39 Imagina-se que os CPS seriam vinculados às superintendências e às gerências executivas, e subordinados ao Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS. A proposta é que sejam vinculados às gerências executivas em quase todas as 102 gerências existentes. Das 102, há 13 que são únicas em seus respectivos Estados. Nestas, cada CPS seria único em seu Estado. Há cinco outros Estados onde há duas gerências, e em cada uma delas haveria um CPS. Os restantes nove estados contariam com três ou mais gerências e uma superintendência. Onde houver mais de uma gerência no mesmo município, para que não crie a necessidade de indicação de representantes dos trabalhadores, empregadores e aposentados para reuniões de Conselhos de Previdência na mesma cidade, o Conselho estaria vinculado à superintendência. Sugere-se que os quatro representantes do Governo no Conselho sejam o superintendente, o gerente-executivo, um representante da área de benefícios e um representante da área de arrecadação, com respectivos suplentes. Nas gerências localizadas em municípios onde não há superintendência, um representante da procuradoria teria assento no CPS. Para os CPSs vinculados às superintendências, os quatro representantes seriam o superintendente e três gerentes das gerências daquele município. Recomenda-se que superintendentes e gerentes possam contar com o apoio da Secretaria Executiva do CNPS para dirimir dúvidas e receber material referente ao CNPS, bem como apoio técnico no que for preciso. Espera-se com isso ter mais um instrumento democrático para o aperfeiçoamento da Previdência Social. Conjuntura Social mai-ago, 2003. As reuniões dos CPSs, assim como as do CNPS, seriam mensais e abertas ao público. Os representantes dos trabalhadores, dos aposentados e dos empregadores seriam indicados pelas respectivas entidades sindicais ou associações representativas, e seriam nomeados pelo gerente-executivo ou pelo superintendente. Os CPSs teriam caráter consultivo e de assessoramento, institucionalizando assim o diálogo social descentralizado na gestão previdenciária brasileira. 40 3. Conclusões O diálogo social tem diferentes objetivos, ocorre de diversas formas e segue princípios variados internacionalmente, mas tem sempre papel de fundamental importância para o bom funcionamento da gestão previdenciária. No Brasil, a previdência social conta com o Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, que trata de temas relevantes para o aperfeiçoamento da gestão previdenciária garantindo a participação social e a transparência das decisões governamentais de forma institucionalizada. A descentralização da participação institucionalizada terá grande avanço em 2004 com a criação dos Conselhos de Previdência Social – CPSs junto às gerências executivas e às superintendências do INSS, construindo um modelo mais democrático e com maior capacidade de responder às demandas sociais para a previdência social brasileira. Referências Bibliográficas Alonso, Fidel Ferreras. 2002. La Participación de los agentes sociales em la gestión de la seguridad social: análisis comparado. Governo, Ministério da Previdência Social. Resoluções do Conselho Nacional de Previdência Social de 1991 a 2003. Malbrán, Juan Manuel Sepúlveda (editor e coordenador). 2003. Las organizaciones Sindicales Centroamericanas como Actores del Sistema de Relaciones Laborales. Organização Internacional do Trabalho, Genebra. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Reynaud, Emmanuel (organizador). 2002. Reforma de las jubilaciones y concertación social. Organização Internacional do Trabalho, Genebra. Silva, Sriyan de. 1996. Collective Bargaining Negotiations. Organização Internacional do Trabalho, Genebra. 41 PANORAMA DO ATUAL MODELO DE SEGURO DE ACIDENTE DE TRABALHO1 O objetivo deste artigo é traçar um diagnóstico do Sistema de Seguro de Acidente de Trabalho – SAT e apresentar as recentes iniciativas do Ministério da Previdência Social sobre o tema, além de alguns desafios. A primeira seção apresenta sucintamente a descrição dos riscos que são cobertos pelo atual modelo e a sua forma de financiamento; na seção 2 são analisados os números de acidentes de trabalho em 2002, que consistem nas últimas informações disponíveis; a seção 3 apresenta os dados previdenciários propriamente; a seção 4 traz as considerações finais, sublinhando as recentes modificações legais e os alguns desafios a serem enfrentados. Em anexo, são apresentados conceitos e as fontes das informações utilizadas neste artigo. Seguro de Acidente de Trabalho – SAT: Breve Descrição A Previdência Social paga um benefício acidentário quando um empregado formal sofre um acidente de trabalho e é afastado de suas atividades profissionais por mais de quinze dias, ou fica incapacitado de trabalhar. No primeiro caso, o trabalhador tem direito a um auxílio temporário, no segundo, a uma aposentadoria. Se o empregado vier a falecer em razão do acidente de trabalho, também é gerado um benefício, neste caso uma pensão por morte em acidente de trabalho paga ao seu dependente. A Previdência paga também um auxílio vitalício (auxílio-acidente) aos acidentados que ficaram com seqüelas do acidente mesmo que, uma vez reabilitados, voltem a trabalhar. 1 Texto elaborado pela Secretaria de Previdência Social – SPS do Ministério da Previdência Social Conjuntura Social mai-ago, 2003. 1. 42 Estas situações impactam diretamente o fluxo de caixa da Previdência Social. Por um lado, com o pagamento de benefícios relacionados a acidentes de trabalho, aumentam as despesas Previdenciárias. Pelo outro, com o empregado afastado, seja de forma temporária ou permanente, tanto ele como seu empregador deixam de contribuir para a Previdência, o que reduz a arrecadação previdenciária. Outro impacto sobre a Previdência provém da aposentadoria ou pensão por morte por acidente de trabalho. Geralmente, um empregado que se aposenta por acidente de trabalho ainda não tem idade e nem tempo de contribuição suficiente para uma aposentadoria regular, o que significa que ele teve um tempo de contribuição menor do que o esperado e tem grande probabilidade de receber aposentadoria por um tempo maior que o esperado. Vale ressaltar, no entanto, que trabalhadores acidentados e pessoas portadoras de deficiência física têm, em média, uma expectativa de vida menor que a verificada para o restante dos trabalhadores. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Para financiar estes os riscos provenientes de acidentes de trabalho, os empregadores são obrigados a pagar uma alíquota adicional em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa, decorrentes dos riscos ambientais do trabalho – conhecida como alíquota SAT2 – junto com a contribuição mensal referente à cota patronal paga regularmente. Pela legislação vigente, os benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho e a aposentadoria especial são financiados com as alíquotas de 1%, 2% ou 3% incidentes sobre a remuneração paga pela empresa a seus empregados e trabalhadores avulsos, conforme o ramo da atividade. Embora juridicamente não conexo com o SAT, vale lembrar que no caso dos trabalhadores sujeitos a riscos que ensejem a aposentadoria especial, há, ainda, um adicional de 6%, 9% ou 12% incidentes sobre a remuneração dos trabalhadores expostos a condições que ensejam a concessão desse benefício. A Emenda Constitucional no 20/98, no entanto, abriu a possibilidade de atendimento concorrencial da cobertura do risco de acidente de trabalho entre o RGPS e o setor 2 Existem duas exceções à cobrança da alíquota SAT: Entidades Filantrópicas, que são isentas do pagamento da cota patronal à Previdência Social, e os estabelecimentos optantes pelo SIMPLES, que trocam seus encargos – entre eles a cota patronal – pelo pagamento de uma cota única em função de seu faturamento. 43 privado3. Como no período 1999-2003 não houve regulamentação de lei específica para atender o dispositivo, o modelo do SAT continua sob os mesmos critérios vigentes pré-Emenda no 20/98. Em 2003, no atual contexto da reforma previdenciária, o modelo de SAT volta a ser discutido. Na Câmara dos Deputados, durante a discussão da PEC no 40/03 (Reforma da Previdência), foram incluídas modificações no texto constitucional que estabelecem o atendimento da cobertura dos acidentes de trabalho exclusivamente pela Previdência4, sem participação do setor privado, o que leva à revogação do atual § 10 do art. 201 da CF. 2. Acidentes de Trabalho no Brasil5 3 De acordo com o § 10 do art. 201 da Constituição, “Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado”. 4 O texto da reforma da Previdência será discutido no Senado Federal com o seguinte dispositivo: “Art. 201. … I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidente de trabalho, e idade avançada; (grifos nossos)” e a supressão do § 10 do mesmo artigo. 5 Esta seção está baseada no artigo “Segurança do Trabalho no Brasil”, publicado no Informe de Previdência Social de outubro de 2001. 6 Ressalte-se que estes dados estão, provavelmente, subnotificados. Primeiro, em face da informalidade das relações de trabalho no Brasil – apenas 42,34% das pessoas ocupadas eram contribuintes da previdência social no ano de 2001 (PNAD 2001/IBGE). Segundo, em face de o empregador priorizar a notificação apenas dos acidentes mais graves – aqueles que geram conseqüências em termos de benefícios e assistência à saúde –, deixando de lado um número considerável de acidentes leves e sem maiores repercussões. Terceiro, em face de a previdência social registrar apenas os acidentes referentes aos segurados empregado, trabalhador avulso e segurado especial. 7 Considerou-se a quantidade média de trabalhadores empregados em 2002 (21.725.833), de acordo com o Anuário Estatístico da Previdência Social – AEPS 2002. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Em 2002, foram registrados 387.905 acidentes de trabalho no Brasil6, o que significa que de cada 1.000 trabalhadores segurados, 17,857 sofreram algum acidente de trabalho. A quantidade de acidentes em 2002 representa um contingente 14,0% superior ao verificado em 2001 (340.251 acidentes) e 6,6% em relação a 2000 (363.868 acidentes), conforme gráfico 1 a seguir. 44 Gráfico 1 Quantidade total de acidentes de trabalho registrados – 2000 a 2002 400.000 387.905 390.000 6,6% 380.000 370.000 363.868 360.000 14,0% 350.000 - 6,5% 340.251 340.000 330.000 320.000 310.000 2000 2001 2002 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão De acordo com o gráfico 2, dentre os 387.905 acidentes registrados em 2002, 82,6% (320.398) correspondem a acidentes típicos, ou seja, decorrentes do exercício do trabalho, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause morte, perda ou redução da capacidade para o trabalho. Além dos acidentes típicos, 12,0% (46.621) referem-se a acidentes de trajeto (que ocorrem durante o deslocamento entre a residência e o local de trabalho) e 5,4% (20.886) foram acidentes provenientes de doenças do trabalho (resultante da atividade profissional exercida). 45 Gráfico 2 Quantidade total de acidentes de trabalho registrados, segundo o motivo – 2000 a 2002 TOTAL/00 = 363.868 350.000 TOTAL/01= 340.251 TOTAL/02= 387.905 320.398 304.963 282.965 300.000 250.000 200.000 150.000 100.000 39.300 50.000 46.621 38.799 19.605 20.886 18.487 2000 Típico 2001 Trajeto 2002 Doença de trabalho A concentração de acidentes na categoria “típicos” mostra que a maioria dos acidentes no Brasil ocorre dentro da própria empresa, no desenvolvimento rotineiro da atividade laborativa e acomete principalmente trabalhadores jovens com idade até 24 anos (como pode ser visto na tabela 1 – quantidade absoluta e gráfico 3 – freqüência ponderada pela quantidade de trabalhadores em cada faixa etária). Os dados indicam a necessidade de políticas orientadas fundamentalmente para o ambiente de trabalho, ou seja, para o local onde a atividade profissional é desenvolvida, com especial ênfase nos trabalhadores com menos experiência. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão 46 Tabela 1 Quantidade de acidentes do trabalho registrados, segundo os grupos de idade e motivo – 2002 GRUPOS DE IDADE TOTAL Típico Trajeto Doença de Trabalho TOTAL ............. Até 19 anos .......... 20 a 24 anos ......... 25 a 29 anos ......... 30 a 34 anos ......... 35 a 39 anos ......... 40 a 44 anos ......... 45 ou mais ............ 387.905 15.273 73.207 70.881 61.715 54.643 44.747 67.439 320.398 13.076 61.822 59.025 51.090 44.709 36.183 54.493 46.621 1.958 9.142 8.817 7.404 6.408 4.994 7.898 20.886 239 2.243 3.039 3.221 3.526 3.570 5.048 QUANTIDADE TOTAL 387.905 320.398 46.621 20.886 Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão Gráfico 3 Participação % relativa da quantidade de acidentes registrados na média de vínculos de empregados, segundo os grupos de idade – 2002 % 2,50 2,05 1,96 2,00 1,79 1,76 1,77 1,83 1,59 1,50 Conjuntura Social mai-ago, 2003. 1,00 0,50 0,00 Até 19 anos 20 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 34 anos 35 a 39 anos 40 a 44 anos 45 ou mais Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão 47 O maior contingente dos acidentes ocorreu no estado de São Paulo, onde foram registrados 39,2% do total. Entretanto, a maior relação entre quantidade de acidentes e total de trabalhadores nas empresas aparece em Santa Catarina, onde, de cada 100 trabalhadores, 2,6 sofreram algum acidente (gráfico 4). Gráfico 4 Participação % de acidentes nas 10 UF’s com maior incidência (2001) e participação % relativa na média total de vínculos de empregados – 2002 45,0 40,0 3,0 39,2 2,6 2,5 2,4 35,0 25,0 2,0 2,0 1,9 1,6 1,6 20,0 1,5 1,3 1,2 1,2 15,0 10,1 9,9 10,0 1,1 10,6 7,1 7,0 6,7 5,0 % (relativa) % (quantidade) 2,2 30,0 1,0 0,5 3,0 2,3 2,2 1,8 BA GO ES PE Outros 0,0 SP RS MG PR Partic. % da qtde SC RJ Partic. % relativa Quando se observam as conseqüências dos acidentes do trabalho (acidentes liquidados8 por conseqüência), verifica-se que, do total de 410.502 acidentes, 331.398, equivalente a 80,7%, acabaram em incapacidade temporária do trabalhador, o que gera, na maior parte das vezes, benefícios de auxílio-doença acidentário (tabela 2 e gráfico 5). 8 Acidentes Liquidados são aqueles cujos processos foram encerrados administrativamente pelo INSS, depois de completado o tratamento e indenizadas as seqüelas. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão 48 Tabela 2 Quantidade de acidentes do trabalho liquidados*, segundo a consequência – 2000 a 2002 Variação Percentual Quantidade Conseqüências 2000 2001 2002 01/00 02/01 02/00 Assistência Médica Incapacidade Temporária Menos de 15 dias Mais de 15 dias Incapacidade Permanente Óbito 51.474 318.698 172.077 146.621 15.317 3.094 51.686 294.991 151.048 143.943 12.038 2.753 61.177 331.398 175.640 155.758 15.029 2.898 0,4 -7,4 -12,2 -1,8 -21,4 -11,0 18,4 12,3 16,3 8,2 24,8 5,3 18,9 4,0 2,1 6,2 -1,9 -6,3 TOTAL 388.583 361.468 410.502 -7,0 13,6 5,6 Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão * Corresponde à quantidade de acidentes cujos processos foram encerrados administrativamente pelo INSS, depois de completado o tratamento e indenizadas as seqüelas. Gráfico 5 Distribuição da quantidade de acidentes do trabalho liquidados*, segundo a consequência – 2002 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Incapacidade Permanente 3,3% 15.029 Óbito 0,7% 2.898 Incapacidade Temporária 81,8% 331.398 Assistência Médica 14,2% 61.177 Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão * Corresponde à quantidade de acidentes cujos processos foram encerrados administrativamente pelo INSS, depois de completado o tratamento e indenizadas as seqüelas. 49 Em 2002 foram registradas 2.898 mortes por acidentes de trabalho, com um coeficiente de 0,133 óbitos a cada 1.000 segurados. Este indicador encontra-se em um patamar ainda bastante elevado quando comparado com os índices de outros países. Conforme dados da Organização Internacional do Trabalho – OIT, para um grupo de 32 países selecionados entre vários continentes e níveis de desenvolvimento, o Brasil ocupa a 10a posição em termos de índices de acidentes fatais9, sendo superado por países como Paquistão, Índia, El Salvador, Turquia, Peru, Equador, Tailândia, Malásia e Cingapura (tabela 3). País 9 Coeficiente Ano Referência 1 Paquistão* 0,860 1996 2 Índia* 0,340 1997 3 El Salvador 0,330 1998 4 Turquia 0,290 1997 5 Peru 0,186 1996 6 Equador 0,168 1994 7 Tailândia 0,154 1998 8 Malásia 0,150 1998 9 Cingapura* 0,142 1998 10 Brasil 0,133 2002 11 México 0,120 1997 12 Hungria* 0,119 1998 13 Tunísia 0,099 1998 14 Espanha 0,097 1998 15 Nicarágua 0,096 1998 16 Alemanha* 0,080 1993 17 Itália 0,079 1997 18 Colômbia 0,077 1995 Foi utilizado o índice de acidentes fatais, tendo em vista que a subnotificação dos óbitos é mais difícil, sendo os registros mais confiáveis, de forma a permitir uma comparação mais adequada. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Tabela 3 Coeficiente de acidentes fatais, para grupos de 1.000 segurados, segundo países selecionados 50 País Coeficiente Ano Referência 19 Canadá* 0,071 1997 20 Costa Rica 0,069 1997 21 Bolívia 0,066 1998 22 Polônia* 0,060 1997 23 Bélgica 0,055 1997 24 França* 0,053 1996 25 Áustria* 0,051 1997 26 República Tcheca 0,050 1998 27 Austrália* 0,050 1996 28 Kazaquistão* 0,041 1997 29 Suíça 0,034 1997 30 Suécia* 0,023 1997 31 Reino Unido* 0,010 1997 32 EUA* 0,005 1997 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fonte: Yearbook of Labour Statistics, OIT, 1999; AEPS 2002. Elaboração: SPS/MPS * A taxa mensurada nestes países tem como fator multiplicativo mil pessoas empregadas. Obs. No caso do Brasil, foi utilizado o número médio de empregados contribuintes em 2002 (21.725.833), com base no AEPS 2002. A análise da incidência dos acidentes do trabalho por ramo de atividade mostra, para grupos de mil segurados, um índice médio, para todas as atividades, de 17,51. Chama a atenção o índice da atividade industrial, de 28,10, onde a indústria da extração mineral apresenta um índice de 29,18 e a de serviços industriais de utilidade pública, de 33,90. Na agricultura, o índice ficou em 21,80 acidentes para cada mil segurados10 (tabela 4). 10 Contudo, como já antes ressaltado, esses índices estão, provavelmente, sub-representados, sobretudo nos setores que apresentam cobertura previdenciária mais baixa, a exemplo dos da agricultura e construção civil. Conforme dados da PNAD/2001, a cobertura previdenciária nas atividades de agricultura e construção civil é, respectivamente, 10,2% e 27,5%. São as atividades de mais baixa cobertura previdenciária, enquanto em atividades industriais diversas a cobertura é de 76,3%. 51 Tabela 4 Quantidade e coeficientes de acidentes do trabalho, segundo a atividade econômica – 2002 SETOR DE ATIVIDADE ECONÔMICA Registros de Acidentes de Trabalho Média de Vínculos Empregatícios Coeficiente (p/ cada 1.000 contribuintes) Agricultura ........................................... Indústria .............................................. Extrativa Mineral ................................ Construção ........................................ Serviços Industriais de Utilidade Pública Transformação .................................... Serviços ............................................... Ignorado .............................................. 28.436 176.378 3.067 28.335 9.492 135.484 172.923 10.168 1.304.176 6.275.790 105.092 1.131.489 280.030 4.759.179 14.545.576 25.764 21,80 28,10 29,18 25,04 33,90 28,47 11,89 394,67 TOTAL .............................. 387.905 22.151.305 17,51 Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão Deve-se destacar também a região do corpo atingida pelos acidentes. Segundo os últimos dados disponíveis (2002), as lesões com maior incidência foram o ferimento do punho e da mão, com 13,83% do total de acidentes, fratura do punho e da mão, com 7,06%, traumatismo superficial do punho e da mão, com 4,68% e sinovite e tenossinovite, com 3,14% (tabela 5). S61 – Ferimento do punho e da mão .................................................... S62 – Fratura do punho e da mão ........................................................ S60 – Traumatismo superficial do punho e da mão ................................. M65– Sinovite e tenossinovite ............................................................ S68 – Amputação traumática do punho e da mão .................................. S63 – Luxação, entorse e distensão das articulações desligamentos punho e mão T23 – Queimadura e corrosão do punho e da mão .................................. S67 – Lesão por esmagamento do punho e da mão ................................ S66 – Traumatismo de músculo e tendão ao nível do punho e da mão ...... S69 – Outros traumatismos e os não especificados do punho e da mão .... Subtotal Outros 53.636 27.390 18.151 12.170 6.942 5.821 2.750 2.005 1.926 1.884 132.675 255.230 TOTAL 387.905 Fonte: AEPS/2002 Elaboração: SPS/MPS Obs. Dados sujeitos a revisão ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ % sobre o total 13,83 7,06 4,68 3,14 1,79 1,50 0,71 0,52 0,50 0,49 34,20 65,80 100,00 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Quantidade ○ TIPOS DE ACIDENTES DE TRABALHO REGISTRADOS ○ ○ Tabela 5 Quantidade de acidentes do trabalho registrados por tipo de ferimentos e lesões ligadas ao punho e mão, segundo os Códigos da Classificação Internacional de Doenças (CID) – 2002 52 Dessa forma os acidentes localizados nos punhos e mãos dos trabalhadores somaram 132.675 acidentes, o equivalente a 34,20% do total de acidentes verificados em 2002. São acidentes na sua maioria provocados por máquinas, em grande parte obsoletas, como demonstra o trabalho do prof. René Mendes, publicado pelo Ministério da Previdência Social11 (ver tabela 6). Tabela 6 Máquinas geradoras de acidentes de trabalho Segundo o Prof. René Mendes, as máquinas e equipamentos obsoletos e inseguros são responsáveis por cerca de 25% dos acidentes do trabalho graves e incapacitantes registrados no país. Entre essas máquinas, destacam-se as seguintes: Conjuntura Social mai-ago, 2003. MÁQUINA OU EQUIPAMENTO UTILIZAÇÃO SETORIAL PREDOMINANTE IMPORTÂNCIA COMO CAUSADOR DE ACIDENTES GRAVES E INCAPACITANTES 1. PRENSAS: máquinas nas quais o material (placa ou chapa) é trabalhado sob operações de conformação ou corte, que se sucedem entre a parte superior ou inferior da ferramenta. Metalurgia básica; fabricação de máquinas e equipamentos; fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos; fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias. Responsáveis por: 31,8% de todos os acidentes graves ingestigados pelo INSS/SP; 15% de todos os acidentes do trabalho causados por máquinas; 42% dos casos de esmagamento de dedos ou mão. 2. MÁQUINAS DE TRABALHAR MADEIRAS: SERRAS CIRCULARES Construção; fabricação de artigos de mobiliário; comércio atacadista de madeira, etc. Responsáveis por 15% dos acidentes graves investigados pelo INSS/SP; Serras circulares: 15% de todos os acidentes do trabalho causados por máquinas e 16% dos casos de amputação de dedos. 3. MÁQUINAS DE TRABALHAR MADEIRAS TUPIAS: confecção de molduras. DESEMPENADEIRAS: ajustar ou endireitar a peça de madeira bruta. Construção civil; fabricação de artigos de mobiliário; fabricação de produtos de madeira. As máquinas de trabalhar madeiras foram responsáveis por 15% de 1.000 acidentes graves investigados pelo INSS/SP; as desempenadeiras são classificadas entre as mais “perigosas”. 11 MENDES, René. Máquinas e acidentes de trabalho. Brasília: MPAS, 2001. 86 p. (Coleção Previdência Social, Série Estudos; v.13). 53 UTILIZAÇÃO SETORIAL PREDOMINANTE IMPORTÂNCIA COMO CAUSADOR DE ACIDENTES GRAVES E INCAPACITANTES 4. INJETORAS DE PLÁSTICO: utilizada para fabricação descontínua de produtos moldados, pela injeção de material plasfificado no molde, que contém uma ou mais cavidades. Fabricação de produtos de plástico – distribuição nacional, em todas as áreas com indústrias, principalmente pequenas e médias. Em 1992, 39% dos casos de acidentes graves na indústria plástica foram com máquinas injetoras de plástico. 5. GUILHOTINAS: máquinas ferramentas para corte principalmente de chapas ou lâminas de metal. Metalurgia básica; fabricação de máquinas e equipamentos; fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos; fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias. Responsáveis por: 2,6% de todos os acidentes graves causados por máquinas; 4,5% dos casos de amputações de dedos. 6. CALANDRAS E CILINDROS: máquinas utilizadas com o propósito de atingir a espessura desejada para a seqüência do processo. Fabricação de produtors de padaria, confeitaria e pastelaria; lavanderias e tinturarias. Responsáveis por: 3,4% de todos os acidentes com máquinas; 6,6% de todos os acidentes graves, causados por máquinas; 16,1% de todos os esmagamentos de dedos, causados por máquinas. 7. MOTOSSERRAS Silvicultura, exploração florestal e serviços relacionados com estas atividades; fabricação de produtos de madeira. Em 43% dos acidentes são atingidos mãos e braços; 38% atingem as pernas; 6% os pés, 8% cabeça e face, e 5% o tronco. 8. MÁQUINAS DE DESCORTICAR E DESFIBRAR O SISAL Atividades de serviços relacionados com a agricultura; beneficiamento de outras fibras têxteis naturais. Os acidentes com máquinas “paraíbas” constituem um dos exemplos mais conhecidos e trágicos, associados com mutilações graves, que incluem amputação de mãos e antebraços. Fonte: Coleção Previdência Social – volume 13 Elaboração: SPS/MPS Conjuntura Social mai-ago, 2003. MÁQUINA OU EQUIPAMENTO 54 3. Previdência e os Acidentes de Trabalho Confrontando receitas e despesas, pode-se afirmar que o sistema de Seguro de Acidente de Trabalho no Brasil é superavitário. De acordo com o gráfico 6, em 2002 este superávit foi de R$ 1,6 bilhão. Esse superávit financiou os demais benefícios previdenciários em curso de pagamento. Gráfico 6 Arrecadação com o seguro de acidentes de trabalho e despesa com benefícios acidentários emitidos – Valores em R$ milhões de Dez/2002 – INPC – – 1997 a 2002 – 5.000,0 4.674,0 4.500,0 4.000,0 4.640,2 4.387,8 3.805,1 3.730,3 3.572,7 R$ milhões 3.500,0 2.982,7 3.000,0 2.500,0 2.778,5 2.412,6 2.521,9 2.616,5 2.184,7 2.000,0 1.771,3 1.895,6 1.657,5 1.545,6 1.500,0 1.160,0 1.283,2 1.000,0 1997 1998 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Arrecadação com o SAT 1999 2000 2001 Despesas com Benefícios Acidentários 2002 Saldo Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS A despesa de R$ 3,0 bilhões em 2002 pagou um estoque médio de 705,6 mil benefícios de caráter acidentário. A quantidade de auxílios-acidente representou 37% do total, o que significou 261,3 mil benefícios. Em seguida, destaque para o estoque das pensões por morte (130 mil benefícios, 18,4% do total) e das aposentadorias (119,9 mil, 17% do total) (gráficos 7 e 8). 55 Gráficos 7 e 8 Quantidade média e valor dos benefícios acidentários emitidos em 2002 – ajustado pelo INPC – Dez/2002 – QUANTIDADE MÉDIA TOTAL = 705.649 Auxílio-Suplementar 13,7% Qt.: 96.980 Aposentadorias 17,0% Qt.: 119.931 Auxílio-Acidente 37,0% Qt.: 261.272 Pensão por Morte 18,4% Qt.: 129.802 Auxílio-Doença 13,8% Qt.: 97.664 GASTO TOTAL = R$ 2.983 milhões Auxílio-Doença 24,2% Vl.: R$ 722 milhões Aposentadorias 23,2% Vl.: R$ 692 milhões Pensão por Morte 25,3% Vl.: R$ 756 milhões Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS Notas (1) As pensões por morte emitidas encontram-se desdobradas por cada dependente. (2) A quantidade de benefícios emitidos é apurada pela média dos meses de 2002. A trajetória de crescimento do estoque médio de benefícios acidentários é sempre crescente, assim como do respectivo gasto12, como pode ser visto nos gráficos 9 e 10. Os 705,6 mil benefícios pagos em 2002 representaram um crescimento de 4% em relação a 2001 e de 25,9% comparado a 1995, quando foram pagos 560,5 mil benefícios. 12 A trajetória de crescimento da quantidade e despesa dos benefícios acidentários não difere do comportamento também crescente verificado nos benefícios previdenciários. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Auxílio-Acidente 24,4% Vl.: R$ 727 milhões Auxílio-Suplementar 2,9% Vl.: 85 milhões 56 Gráfico 9 Quantidade média de benefícios acidentários emitidos – 1995 a 2002 – 710.000 705.649 Quantidade de Benefícios Acidentários 690.000 678.477 670.000 660.399 650.000 647.487 632.677 630.000 610.000 606.397 590.000 581.822 570.000 560.509 550.000 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS Gráfico 10 Despesa com benefícios acidentários emitidos – Valores em R$ milhões de Dez/2002 (INPC) – – 1995 a 2002 – 3.000,0 2.982,7 2.800,0 2.778,5 2.616,5 2.600,0 R$ milhões Conjuntura Social mai-ago, 2003. 2.521,9 2.412,6 2.400,0 2.200,0 2.184,7 2.000,0 1.923,5 1.800,0 1.688,0 1.600,0 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS 57 Dentre os grupos de espécies de benefícios, no período 1995-2002 o estoque dos auxílios-doença acidentários cresceu 61,5%, com destaque para o incremento de 22,4% somente entre 2001 e 2002. Registre-se também o crescimento das aposentadorias (43,5%) e dos auxílios-acidente (35,3%) no período (gráfico 11). A abertura da despesa por grupos de espécies não segue o mesmo comportamento da quantidade. Percebe-se, pelo gráfico 12, que as pensões por morte representam o maior volume de gastos. Gráfico 11 Quantidade média de benefícios acidentários emitidos, por espécie – 1995 a 2002 – 300.000 Quantidade de Benefícios 250.000 200.000 150.000 100.000 - 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Aposentadorias 83.587 86.936 91.575 96.786 101.659 107.794 114.298 119.931 Pensão por Morte 116.683 120.014 122.905 125.547 127.102 128.346 129.228 129.802 Auxílio-Doença Auxílio-Acidente 60.484 68.637 75.176 80.635 80.328 76.693 79.799 97.664 193.050 203.607 217.974 230.892 240.307 249.492 257.094 261.272 Auxílio-Suplementar 106.705 102.628 98.768 98.817 98.091 98.075 98.057 96.980 Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS Conjuntura Social mai-ago, 2003. 50.000 58 Gráfico 12 Despesa com benefícios acidentários emitidos (por espécie) – Valores em R$ milhões de Dez/2002 – INPC – – 1995 a 2002 – 800,0 700,0 R$ milhões 600,0 500,0 400,0 300,0 200,0 100,0 - 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Aposentadorias 338,8 376,9 424,3 477,7 520,4 574,5 641,6 692,0 Pensão por Morte 579,8 632,5 673,0 708,1 722,3 734,9 751,0 755,9 Auxílio-Doença 335,3 424,0 516,2 579,1 582,8 565,4 593,9 722,5 Auxílio-Acidente 348,2 406,0 487,4 562,0 611,2 656,8 705,1 726,9 Auxílio-Suplementar 86,0 84,1 83,9 85,7 85,2 85,0 86,8 85,4 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS O comportamento do fluxo de benefícios acidentários difere bastante do verificado no estoque. Em 2002, foram concedidos 204 mil novos benefícios acidentários, sendo a maioria – 88,4% ou 180,3 mil – de auxílios-doença13. O gasto com auxílios-doença acidentários, de R$ 98 milhões, representou 88,6% do gasto total, ou seja, também a maior parte (gráficos 13 e 14). 13 Entre os anos de 2001 e 2002, observou-se um forte crescimento de 62,3% na concessão dos auxíliosdoença previdenciários explicado preliminarmente pela paralisação dos servidores do INSS (ago/2001 a nov/2001) – o que resultou em desrepresamento da concessão dos benefícios logo no início de 2002 – e da publicação da Resolução INSS no 60/2001, que abriu a possibilidade de qualquer médico credenciado concluir exames médico-periciais em caráter decisório. O movimento verificado na concessão do auxílio-doença acidentário, que requer a Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT para a sua concessão, foi, no entanto, bem menos intenso que o crescimento na concessão dos auxílios-doença previdenciários. 59 Gráficos 13 e 14 Quantidade e valor dos benefícios acidentários concedidos em 2002 – ajustado pelo INPC – Dez/2002 – QUANTIDADE TOTAL = 204.057 Auxílio-Acidente 5,4% Qt.: 10.973 Auxílio-Suplementar Aposentadorias 0,3% 4,7% Qt.: 640 Qt.: 9.687 Pensão por Morte 1,2% Qt.: 2.422 Auxílio-Doença 88,4% Qt.: 180.335 GASTO TOTAL = R$ 111 milhões Auxílio-Suplementar 0,1% Vl.: < R$ 1 milhão Aposentadorias 6,0% Vl.: R$ 7 milhões Pensão por Morte 1,5% Vl.: R$ 2 milhões Auxílio-Doença 88,6% Vl.: R$ 98 milhões Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social; Boletim Estatístico da Previdência Social Elaboração: SPS/MPS Nota: As pensões por morte emitidas encontram-se desdobradas por dependente. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Auxílio-Acidente 3,9% Vl.: R$ 4 milhões 60 4. Considerações Finais Historicamente, o SAT sempre teve um viés mais indenizatório que preventivo em relação a acidentes. O fato de se pagar benefícios após a ocorrência do acidente de trabalho sem conseqüências relevantes para o empregador – que é o responsável pela saúde e segurança do trabalho no ambiente da empresa – não cria incentivos favoráveis à prevenção ou para que sejam feitos esforços para reabilitação do profissional acidentado e sua reintegração ao mercado. Entende-se que este é um viés equivocado. O SAT precisa ter um efeito de estímulo à prevenção de acidentes de trabalho, evitando a dor e perdas dos acidentados e suas famílias, bem como os custos sociais e econômicos dos acidentes de trabalho. Neste sentido, o Ministério da Previdência Social decidiu flexibilizar as alíquotas de contribuição para premiar as empresas que já investem em programas de prevenção de acidentes de trabalho e que, graças a esses programas, têm conseguido uma redução progressiva em seus índices de acidentes. Além disso, pretende-se estimular outras empresas a fazer o mesmo e, assim, proporcionar níveis cada vez maiores de segurança aos trabalhadores. Conjuntura Social mai-ago, 2003. A Lei no 10.666 de maio de 2003 diz, em seu artigo 10, que a alíquota de 1%, 2% ou 3% poderá ser reduzida pela metade, ou até dobrar, de acordo com os índices de freqüência, gravidade e custo dos acidentes de trabalho. Ou seja, empresas que investirem em prevenção de acidentes de trabalho poderão colher frutos sob a forma de alíquotas de contribuição ao SAT menores que as previstas para o respectivo setor. A metodologia para esta classificação das empresas ainda não está definida. Um desafio consiste em construir, com muita cautela, indicadores objetivos e não manipuláveis, para evitar, por exemplo, incentivo à subnotificação na Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT), o que seria um retrocesso. Uma alternativa, ainda sujeita a discussão, poderia ser mesclar a análise de dados de benefícios já concedidos, informações do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que as empresas terão que comunicar à Previdência futuramente, com outros critérios já previstos na legislação trabalhista em relação ao ambiente de trabalho e mesmo pensar em algum modo de participação das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipa). É importante ressaltar que a elaboração desses indicadores será discutida, em 2004, no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), que precisará aprovar 61 sua metodologia de apuração. A expectativa é de que, até meados de 2004, esses critérios estejam definidos e a matéria possa ser regulamentada. Por fim, vale mencionar que, com as propostas de revogação do atual § 10 do art. 201 e alteração do inciso I do mesmo artigo da CF na atual discussão da Reforma da Previdência, a operacionalização do SAT, na prática, não sofre alteração. Em verdade, a responsabilidade pela cobertura dos acidentes de trabalho tem sido feita, desde 1967, apenas pelo INSS. A Emenda no 20/98 apenas abriu a possibilidade de as seguradoras privadas atuarem nesse mercado de seguro de acidente de trabalho, o que não chegou a acontecer em função da matéria não ter sido regulamentada. O Ministério da Previdência apóia a proposta de vedação à participação concomitante do setor privado no controle do SAT porque entende que a concorrência entre o INSS e as seguradoras privadas geraria o fenômeno conhecido por “seleção adversa” no mercado. Em outras palavras, haveria o risco de o setor público arcar com a cobertura de segmentos com alto risco de acidente e com menores salários – uma atuação “assistencial” aos excluídos e aos pouco rentáveis, enquanto as seguradoras privadas focalizariam seus esforços em um público com maior potencial de contribuições – o que gera maiores receitas – e menores riscos. Em suma, a concorrência entre o setor público e o privado na operacionalização do SAT tende a eliminar a solidariedade entre segurados com maior renda e menores riscos e trabalhadores mais pobres e sujeitos a maiores enfermidades. Define-se como acidente do trabalho aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, ou ainda pelo exercício do trabalho de segurados especiais, provocando lesão corporal ou perturbação funcional, permanente ou temporária, que cause a morte, ou a perda, ou redução da capacidade para o trabalho. São considerados acidentes do trabalho a doença profissional e a doença do trabalho. Equiparam-se também ao acidente do trabalho: o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a ocorrência 14 Reproduzido do Anuário Estatístico da Previdência Social – AEPS/MPS 2002 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Anexo Acidentes de Trabalho – Conceitos14 62 da lesão; certos acidentes sofridos pelo segurado no local e no horário de trabalho; a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade; e o acidente sofrido a serviço da empresa ou no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado e vice-versa. Os principais conceitos sobre o assunto são apresentados a seguir: Acidentes Registrados – corresponde ao número de acidentes cuja Comunicação de Acidentes do Trabalho – CAT foi cadastrada no INSS. Não são contabilizados o reinício de tratamento ou afastamento por agravamento de lesão de acidente do trabalho ou doença do trabalho, já comunicados anteriormente ao INSS. Acidentes Típicos – são os acidentes decorrentes da característica da atividade profissional desempenhada pelo acidentado. Acidentes de Trajeto – são os acidentes ocorridos no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado e vice-versa. Acidentes Devidos à Doença do Trabalho – são os acidentes ocasionados por qualquer tipo de doença profissional peculiar a determinado ramo de atividade constante na tabela da Previdência Social. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Acidentes Liquidados – corresponde ao número de acidentes cujos processos foram encerrados administrativamente pelo INSS, depois de completado o tratamento e indenizadas as seqüelas. Assistência Médica – corresponde aos segurados que receberam apenas atendimentos médicos para sua recuperação para o exercício da atividade laborativa. Incapacidade Temporária – compreende os segurados que ficaram temporariamente incapacitados para o exercício de sua atividade laborativa. Durante os primeiros 15 dias consecutivos ao do afastamento da atividade, caberá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral. Após este período, o segurado deverá ser encaminhado à perícia médica da Previdência Social para requerimento de um auxíliodoença acidentário – espécie 91. 63 Incapacidade Permanente – refere-se aos segurados que ficaram permanentemente incapacitados para o exercício laboral. A incapacidade permanente pode ser de dois tipos: parcial e total. Entende-se por incapacidade permanente parcial o fato do acidentado em exercício laboral, após o devido tratamento psicofísico-social, apresentar seqüela definitiva que implique em redução da capacidade. Esta informação é captada a partir da concessão do benefício auxílio-acidente por acidente do trabalho, espécie 94. O outro tipo ocorre quando o acidentado em exercício laboral apresentar incapacidade permanente e total para o exercício de qualquer atividade laborativa. Esta informação é captada a partir da concessão do benefício aposentadoria por invalidez por acidente do trabalho, espécie 92. Óbitos – corresponde a quantidade de segurados que faleceram em função do acidente do trabalho. As informações foram extraídas do Sistema Único de Benefícios – SUB e do Sistema de Comunicação de Acidente do Trabalho – CAT, desenvolvido pela DATAPREV para processar e armazenar as informações da CAT que são cadastradas nas Agências da Previdência Social ou pela Internet. As informações relativas aos acidentes registrados foram geradas exclusivamente pelo Sistema CAT, enquanto que para os acidentes liquidados também foi utilizado o SUB. A contagem dos óbitos, a partir do Cadastro de Benefícios, envolve algumas particularidades. A correta mensuração deve considerar os óbitos de segurados que possuíam dependentes e, portanto, geraram pensão por morte, mas também os daqueles que morreram e, por não possuírem dependentes, não geraram qualquer tipo de benefício. No primeiro caso, dados completos estão disponíveis no SUB. No segundo caso, só podem ser obtidos dados parciais, já que a rotina de captação do dado indicativo de morte decorrente de acidente do trabalho depende da comunicação do óbito por meio da CAT. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Para os acidentes cuja conseqüência foi simples assistência médica e incapacidade temporária utilizou-se a Data do Acidente – DA como referência temporal na contabilização dos acidentes liquidados a cada ano. Para mensurar o número de acidentes cuja conseqüência, no ano, foi incapacidade permanente utilizou-se a Data de Início do Benefício – DIB. 65 COBERTURA PREVIDENCIÁRIA: DIAGNÓSTICO E PROPOSTAS MARCELO NERI* 1. Visão Geral Este artigo apresenta os principais resultados de livro homônimo editado pelo Ministério da Previdência Social (volume 18 da Coleção Previdência Social) e está dividido em três seções. A presente seção apresenta uma visão geral da extensão e das causas da evasão previdenciária brasileira. A segunda seção discute algumas propostas de reformas estruturais do sistema de arrecadação previdenciária. A terceira seção apresenta uma taxionomia das políticas no setor, fazendo a ligação com algumas evidências empíricas encontradas. Dos 64 milhões de trabalhadores do setor privado, 39,5 milhões (62%) não contribuem para a Previdência Social. Já a taxa de evasão previdenciária dos 20% mais pobres é de 96%, contra 16% dos 20% mais ricos, conforme a tabela 1. Nas áreas urbanas, saímos de uma taxa de evasão de 39% em 1985 para 53% em 1999. A crescente evasão previdenciária implica não só inconsistência fiscal, mas também desproteção social. O grupo sem previdência é particularmente vulnerável a mudanças associadas a acidentes de trabalho, maternidade, viuvez e velhice. Nesses casos, os indivíduos deveriam se proteger por conta própria dessas eventualidades, o que não é o caso entre os trabalhadores mais pobres. * Centro de Políticas Sociais do IBRE/FGV e EPGE/FGV [email protected] Conjuntura Social mai-ago, 2003. Apresentamos inicialmente cruzamentos bivariados da taxa de evasão previdenciária para o conjunto de ocupados do setor privado para 1985 e 1999 segundo diversos atributos sócio-demográficos como gênero, idade, renda, escolaridade e inserção trabalhista e regional, bem como as respectivas populações. 66 Tabela 1 Evasão Previdenciária – Brasil Taxa de Evasão Total ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Gênero Homens Mulheres ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Conjuntura Social mai-ago, 2003. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Fonte: PNAD/IBGE ○ ○ ○ ○ ○ ○ 95,5% 68,5% 48,5% 25,3% 16,0% ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 96,4% 82,5% 53,3% 41,9% 29,0% Elaboração: CPS/IBREV/FGV ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 11727 11257 11080 9802 9761 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 30841 13218 16543 2336 269 93 439 2 ○ ○ ○ ○ ○ 3424 7536 8389 7939 7924 7361 6186 4826 3647 2635 1733 1126 1017 ○ ○ ○ ○ ○ 8410 11487 20949 18120 4777 ○ ○ ○ ○ ○ 16474 4523 1551 31877 9318 ○ ○ ○ ○ ○ 16538 29552 17652 ○ ○ ○ 5001 12551 5179 9298 6820 ○ ○ 39203 24540 15454 21541 16632 68,7% 82,4% 75,2% 48,8% 55,3% ○ ○ 14430 3099 5731 21245 9122 86,2% 59,1% 44,0% ○ ○ 10260 11324 17376 10582 3850 89,9% 71,7% 36,5% 54,4% 37,9% ○ ○ 4055 7970 8257 7347 6449 5392 4330 3427 2544 1815 1122 528 393 86,0% 79,8% 66,0% 43,9% 27,4% ○ ○ 25732 7820 16982 1932 240 191 731 0 97,6% 71,8% 54,2% 52,4% 53,4% 53,7% 55,7% 58,7% 65,7% 71,3% 79,4% 87,0% 92,2% ○ ○ 35712 17916 55,8% 69,2% 67,4% 63,8% 65,5% 37,1% 63,4% 10,0% 79,9% 32,3% 36,4% 51,8% 58,6% Quintil Renda 1 (+ pobres) 2 3 4 5 (- pobres) ○ 59,4% 66,1% 86,4% 46,2% 30,2% Região Centro Nordeste Norte Sudeste Sul ○ ○ 92,9% 50,8% 12,1% 46,6% 30,0% Densidade Pop. Rural Urbano Metropolitano ○ 1999 63742 83,0% 70,1% 50,9% 23,9% 9,8% Setor de Atividade Agricultura Construção Setor Público Serviço Indústria ○ 1985 53628 94,4% 69,7% 46,5% 40,3% 39,7% 42,4% 43,9% 48,3% 51,5% 55,8% 63,8% 75,4% 77,9% Escolaridade 0 anos 0 a 4 anos 4 a 8 anos 8 a 12 anos mais de 12 anos ○ 1999 62,0% 42,8% 56,7% 65,4% 53,7% 59,0% 23,9% 77,2% 100,0% Idade Até 15 anos 15 a 20 anos 20 a 25 anos 25 a 30 anos 30 a 35 anos 35 a 40 anos 40 a 45 anos 45 a 50 anos 50 a 55 anos 55 a 60 anos 60 a 65 anos 65 a 70 anos Mais de 70 anos ○ 1985 52,8% 51,0% 56,4% Posição na Família Chefe Cônjuge Filhos Outro Parente Agregado Pensionista Emp. Doméstico Parente Emp. Doméstico Pop. Ocupada Privada (em mil) ○ ○ 4927 18230 2190 27419 10977 ○ ○ ○ ○ ○ 13899 13282 11519 13488 11554 67 O principal desafio da Previdência Social é aumentar a cobertura do sistema. À parte mudanças demográficas e nos benefícios concedidos, a situação financeira previdenciária se agravou em função da existência de um círculo vicioso entre evasão e alíquotas. De um lado, a informalidade crescente do mercado de trabalho provocada por encargos sociais também crescentes, mas dissociada dos benefícios a serem auferidos. O resultado tem sido a redução da arrecadação previdenciária, o que induz novos aumentos de alíquotas e a mais informalidade. REFORMA DA PREVIDÊNCIA CONTRIBUIÇÕES CRESCENTES E BENEFÍCIOS DISSOCIADOS ARRECADAÇÃO PREVIDENCIÁRIA CADENTE INCENTIVOS A INFORMALIDADE REFORMA TRABALHISTA O comportamento do mercado de trabalho revela como traço marcante dos últimos anos uma crescente informalização das relações de trabalho. A proporção de autônomos na força de trabalho apresenta uma tendência de crescimento desde 1986, atingindo hoje 23%. Similarmente, o aumento da participação dos empregados sem carteira tem subido desde 1989, atingindo hoje 11%. Pode-se pleitear a existência de uma relação de causalidade entre os dois fatos, isto é, o aumento de alíquotas observado levou a uma crescente informalização das relações de trabalho. O impacto final das várias alíquotas sobre a arrecadação tributária é captado pela chamada Curva de Laffer – instrumental de análise da interação entre Conjuntura Social mai-ago, 2003. Nas últimas décadas observamos um aumento das alíquotas de contribuição previdenciária tanto de firmas como de trabalhadores. A alíquota de empregados que percebiam entre um e três salários mínimos sobe de 3% nos anos 30 para os atuais 8%. Essa inflação de alíquotas é ainda maior no caso dos empregadores, onde as alíquotas passaram dos mesmos 3% para os atuais 20%, durante o mesmo intervalo de tempo. 68 Conjuntura Social mai-ago, 2003. arrecadação do imposto inflacionário e o nível da inflação. A idéia é que a relação entre a variação das alíquotas de contribuição e a arrecadação previdenciária não é linear: a arrecadação acompanha a elevação das alíquotas até o ponto em que a carga excessiva passa a empurrar as firmas para a informalidade. A partir daí, o aumento das alíquotas passa a influenciar negativamente no desempenho da arrecadação. Na Curva de Laffer previdenciária estaríamos hoje possivelmente no lado direito. Nesse caso, como no caso das hiperinflações, teríamos uma situação explosiva, só que de informalidade. Mudanças são necessárias para reverter a espiral ascendente entre evasão e alíquotas. Essas mudanças podem permitir a redução das alíquotas de contribuição sem prejuízo da arrecadação. 69 2. Políticas A saída da armadilha previdenciária envolve a adoção de medidas operacionais e estruturais. No último grupo figuram mudanças nos incentivos para a contribuição, por meio de alterações nas legislações previdenciária e trabalhista. Exploramos aqui duas questões estruturais: a primeira ligada ao próprio caráter de repartição simples, predominante no sistema de seguridade social brasileiro: o fato de o empregado não perceber ligação estreita entre contribuição presente e benefícios a serem auferidos no futuro inibe sobremaneira a contribuição. A mudança na regra de cálculo dos benefícios e a introdução do fator previdenciário em 1999 buscam corrigir gradual e parcialmente esse tipo de distorção. Já na legislação trabalhista existem inúmeras sinergias com a previdência a serem exploradas. Por exemplo, direitos trabalhistas são independentes do caráter legal da relação de trabalho assumida. Os empregados informais têm a prerrogativa de cobrar a posteriori seus direitos na Justiça do Trabalho. O resultado é que as firmas honram por antecipação os direitos devidos, levando a uma alta efetividade dessas cláusulas no setor informal do mercado de trabalho. O clichê associado a essa situação é o seguinte: “existem mais relações entre os empregados informais e a CLT do que supõe o INSS”. Já entre as medidas operacionais encontramos ações na área de fiscalização e ações mercadológicas (propaganda, abertura de postos fixos ou ambulantes, etc.). Essas medidas são mais fáceis de implementar que as estruturais, pois não envolvem mudanças constitucionais, ou mesmo legais. Nos últimos anos foram anunciadas mudanças operacionais no INSS que o tornam mais próximo da sua clientela. Essas mudanças visam, em primeiro lugar, melhorar as contribuições através do envio de cartas com mensagens de esclarecimentos amigáveis sobre o funcionamento do sistema e com extratos das contas previdenciárias. Esses extratos vão melhorar a fiscalização dos empregados em relação às suas respectivas firmas. Conjuntura Social mai-ago, 2003. O INSS é um agente grande que, ao contrário do Big Brother de Orwell, não tem olhos por toda parte. Dessa maneira, no anonimato microeconômico, firmas e trabalhadores chegam a acordos mutuamente vantajosos à custa dos cofres públicos. Cabe ao Estado reduzir esse espaço de arbitragem através de mudanças de incentivo à contribuição, aí incluindo prêmios, punições e aumento da quantidade de informação no sistema. 70 Outra inovação seria a criação de um sorteio pela Caixa Econômica Federal entre os contribuintes que estão em dia. Essas mudanças tornam o dia-a-dia da previdência mais ao gosto da sua potencial clientela e mais competitiva em relação às estratégias dos fundos de previdência privada. Embora a Previdência Social tenha implementado medidas para expandir a cobertura do sistema, é preciso buscar alternativas para dar mais velocidade e sustentabilidade nesse processo dominado por resistências de todas as formas. O estudo de medidas para expandir a cobertura da previdência social é fundamental para a política previdenciária. Os trabalhadores que atuam na informalidade não terão como enfrentar os riscos sociais do trabalho no futuro, devido a causas fortuitas que afetem sua capacidade de trabalho, como ao próprio envelhecimento. Não sendo filiados ao sistema, os informais de hoje gerarão altos custos sociais no futuro, ao dependerem de seus familiares e, consequentemente, diminuindo sua renda e piorando suas condições de vida. Ou dependendo dos programas assistenciais do governo, o que onerará os contribuintes por um motivo que, pelo menos em parte, pode ser evitado hoje. 3. Diagnóstico e Propostas A formulação de propostas de medidas de aumento da base de cobertura do INSS constitui o objetivo principal aqui discutido. Buscamos agora construir uma ligação entre resultados empíricos e medidas de expansão de cobertura previdenciária. Políticas Previdenciárias Conjuntura Social mai-ago, 2003. TIPOS DE POLÍTICAS COMUNICAÇÃO (i.e., propaganda) FISCALIZAÇÃO AUMENTO DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA INCENTIVOS (i.e., reformas) CONTEXTO MACRO ESFERAS DAS POLÍTICAS POLÍTICAS NACIONAIS POLÍTICAS REGIONAIS POLÍTICAS SETORIAIS 71 No grupo de medidas estruturais figuram basicamente mudanças no sistema de incentivos para a contribuição do sistema via alterações nas legislações previdenciárias e fiscal discutidas. Entre as medidas operacionais, encontramos ações na área de comunicação do MPS (e.g., propaganda, abertura de novos postos fixos, envio de postos ambulantes, interação com a mídia etc.) e políticas de fiscalização. Em ambos os casos, uma análise dos fatores correlacionados com a não contribuição pode ser de extrema valia na escolha do foco de medidas operacionais. A análise empírica agora explorada está restrita ao conjunto de indivíduos ocupados no setor privado conservando apenas os indivíduos entre 15 e 59 anos cuja renda se situa acima de um salário mínimo. Essa população constitui o público-alvo prioritário de políticas de expansão da cobertura previdenciária. Por exemplo, compare duas regiões onde todos os atributos individuais com exceção da distribuição de escolaridade, sejam iguais inclusive a taxa de contribuição previdenciária. O potencial de implementação de políticas bem sucedidas na região mais educada é superior a da região menos educada, pois a baixa escolaridade inibe o sucesso de políticas. A decisão mais proveitosa em termos de alocação de esforços de expansão do sistema seria expandir para a área mais educada. O objetivo da análise dos coeficientes das variáveis dummies espaciais numa regressão multivariada é justamente identificar áreas com potencial de expansão de cobertura de sistema. A análise espacial controlada revela as regiões relativamente mais problemáticas em termos de não contribuição para a previdência social. Essas áreas devem desempenhar um papel de destaque no desenho de políticas geo-referenciadas que visem reduzir a evasão da previdência social. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Políticas Regionais – Uma particular atenção deve ser dada à distribuição espacial da não contribuição, uma vez controlados os principais atributos individuais. Isto é, buscamos comparar a extensão da não contribuição previdenciária em diferentes áreas geográficas (i.e., macro-regiões, unidades da federação e mesoregiões) e atributos geográficos (tamanho de cidade) de indivíduos de mesmas características (i.e., escolaridade, idade, sexo, setor de atividade, tempo de empresa e status imigratório). Essa análise tem melhores condições de identificar e guiar focos de ação espaciais do que a análise não controlada. 72 Conjuntura Social mai-ago, 2003. A fim de conferir uma estatística intuitivamente interpretável, utilizamos aqui a razão de chances condicionadas. Para o leitor, a interpretação é relativamente simples: se a razão de chances for superior à unidade para um determinado atributo de variável, assume-se que o impacto desse atributo sobre a variável endógena (não contribuição) é positivo. Caso a razão de chances seja inferior à unidade, assume-se que o impacto é negativo. Vejamos isso por meio de um exemplo: se a razão de chances condicionada do atributo “8-12 anos” (da variável “escolaridade”) é de 1.5811, isso significa que as chances dos indivíduos com escolaridade entre 8 e 12 anos não contribuírem para a Previdência Social são 58,11% maiores que a dos indivíduos com escolaridade superior a 12 anos (grupo base). A diferença da razão de chances condicionada para a não condicionada é que, no cálculo da primeira, os indivíduos comparados diferem apenas no atributo da variável examinada (no caso do nosso exemplo, escolaridade) e possuem os mesmos atributos nas demais variáveis (sexo, posição na família, idade, raça, status migratório, posição na ocupação etc.). Na razão de chances não condicionada, todos os indivíduos são comparados. Em outras palavras, no caso da “condicionada” o efeito das demais variáveis está “controlado”, o que não ocorre no caso da “não condicionada”. Neste trabalho, utilizaremos a razão de chances condicionada. Assim sendo, na análise das variáveis espaciais da nossa regressão básica observamos que as razões de chances condicionadas nas áreas rural e urbana (não metropolitana) tomando como base as metrópoles são respectivamente 1.45 e 1.16 (tabela 2). Ou seja, com os mesmos atributos, moradores da área rural teriam chance 45% maior de não contribuir para a Previdência que moradores das áreas metropolitanas. No caso dos moradores das áreas urbanas não metropolitanas, as chances de não contribuição, controlados os demais atributos, seriam 16% maiores. Há, dessa forma, um potencial de expansão – embora se deva considerar os maiores custos operacionais para a expansão em áreas menos densamente povoadas. 73 Tabela 2 Modelo Logístico – Análise dos Parâmetros Estimados 1999 Não Contribui para a Previdência OCUPADOS Universo: População ocupada no setor privado restrita Razão de Chances Mulher Cônjuge Filhos Outro Parente Agregado Pensionista 15 a 20 anos 20 a 25 anos 25 a 30 anos 30 a 35 anos 35 a 40 anos 40 a 45 anos 50 a 55 anos 55 a 60 anos 0 anos 0-4 anos 4-8 anos 8-12 anos Indígena Amarela Preta Menos de 4 anos Entre 5 a 9 anos Mais de 10 anos Agricultura Construção Serviço Até 1 ano 1 a 3 anos 3 a 5 anos Rural Urbana Centro-Oeste Nordeste Norte Sul ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Idade ○ ○ Escolaridade ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Cor ○ Imigração ○ ○ ○ Setor de Atividade ○ ○ ○ ○ ○ ○ Tempo de Empresa ○ ○ ○ ○ ○ ○ Densidade Populacional ○ ○ ○ ○ Região ○ ○ ○ Estatística t 0.0480 0.2784 0.0541 0.0709 0.3517 -0.1082 0.1993 -0.1742 -0.1697 -0.1305 -0.1309 -0.0497 0.1674 0.2255 1.2796 1.1345 0.9711 0.4581 0.8366 -0.0059 0.0593 -0.0359 0.0247 -0.1017 1.3239 1.6929 0.8175 0.4262 -0.0114 -0.1529 0.3745 0.1520 0.5311 0.6573 1.0544 -0.0999 53.33** 232.00** 49.18** 37.32** 67.63** -14.24** 110.72** -108.88** -113.13** -87.00** -87.27** -33.13** 93.00** 102.50** 673.47** 709.06** 693.64** 352.38** 91.93** -1.23 74.13** -19.94** 13.72** -101.70** 882.60** 1.128.60** 817.50** 426.20** -12.67** -139.00** 288.08** 190.00** 408.54** 657.30** 554.95** -99.90** ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ PRED ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 0.5125 0.5696 0.5140 0.5182 0.5875 0.4735 0.5502 0.4571 0.4582 0.4679 0.4678 0.4881 0.5422 0.5566 0.7827 0.7570 0.7257 0.6130 0.6982 0.4990 0.5153 0.4915 0.5067 0.4751 0.7902 0.8449 0.6941 0.6054 0.4977 0.4623 0.5930 0.5384 0.6302 0.6591 0.7420 0.4755 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 1.0492 1.3210 1.0556 1.0735 1.4215 0.8974 1.2205 0.8401 0.8439 0.8777 0.8773 0.9515 1.1822 1.2529 3.5952 3.1096 2.6408 1.5811 2.3085 0.9941 1.0611 0.9647 1.0250 0.9033 3.7580 5.4352 2.2648 1.5314 0.9887 0.8582 1.4543 1.1642 1.7008 1.9296 2.8703 0.9049 Não Condic. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ DF Número de Observações: 40501950; Log Likelihood: -24648102.47; Pearson Chi-Square: 4500 0.8662 0.9890 0.8821 1.0321 1.3225 0.6394 1.1345 0.7809 0.7951 0.8226 0.8390 0.9270 1.2647 1.4335 6.3191 4.7454 3.2606 1.7599 3.1185 0.7083 1.6341 1.3555 1.3071 1.1966 5.7459 5.9774 2.1373 1.3716 0.8594 0.7527 2.6634 1.4094 2.0920 2.2677 2.9692 0.9574 Erro Padrão Prop ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Value 21513997 0.41 0.44 0.41 0.45 0.51 0.34 0.49 0.40 0.40 0.41 0.42 0.44 0.52 0.55 0.66 0.59 0.50 0.35 0.67 0.31 0.51 0.47 0.46 0.44 0.67 0.67 0.43 0.52 0.40 0.37 0.60 0.45 0.56 0.58 0.65 0.37 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 0.0028 0.0039 0.0035 0.0085 0.0241 0.0300 0.0052 0.0040 0.0040 0.0041 0.0043 0.0048 0.0068 0.0092 0.0055 0.0045 0.0029 0.0024 0.0357 0.0219 0.0025 0.0079 0.0083 0.0038 0.0048 0.0047 0.0021 0.0034 0.0030 0.0041 0.0045 0.0025 0.0045 0.0034 0.0065 0.0034 Pop. Total (%) ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 32.9 16.7 21.8 3.5 0.4 0.2 10.0 15.5 15.2 15.1 14.0 11.7 6.0 3.3 7.2 12.6 32.8 37.0 0.1 0.6 39.0 0.0 3.8 19.2 10.6 9.2 58.4 22.7 27.7 14.1 13.0 51.1 8.3 17.7 3.6 18.1 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Value/DF 479.72 *Estatisticamente significante ao Nível de Confiança de 90% **Estatisticamente significante ao Nível de Confiança de 95% Obs.: 1) Excluindo trabalhadores sem qualquer fonte de renda, que ganham menos de 1 SM e trabalhadores com menos de 15 anos e mais de 59 anos. 2) Variáveis omitidas em ordem: homem, chefe de família, idade entre 45 e 50 anos, mais de 12 anos de estudo completos, cor branca, não imigrou, setor industrial, mais de 5 anos de empresa, metropolitano, região sudeste. No de Pessoas % Não Contribui Contruibui 17,755,684 22,746,266 43.8 56.2 Fonte: Microdados da PNAD/IBGE Elaboração: CPS\IBRE\FGV Conjuntura Social mai-ago, 2003. Sexo Posição na Família Estimativa Condicional 74 No que tange às macroregiões observamos que as razões de chances condicionais em ordem decrescente são: Norte (2.87), Nordeste (1.92), Centro-Oeste (1.70), Sudeste (1 pois é a base) e Sul (0.9). Mais uma vez é importante lembrar que estamos levando em conta a escolaridade, gênero etc. das populações nessa comparação. A análise sugere a conveniência do direcionamento de esforços de expansão do sistema para a região Nordeste dados a sua alta taxa de não contribuição condicionada e seu alto peso na população-alvo (17.7%, última coluna da tabela 2). Políticas Nacionais – Em termos de políticas nacionais (por exemplo, relativas à comunicação, à fiscalização ou à regulação), as altas razões de chance condicionais de não contribuição dos cônjuges (1.32) e a participação de 16.7% no conjunto de ocupados na população restrita do setor privado os torna um público interessante para políticas de comunicação do tipo “proteja você também a sua família”. Nesse caso deve-se levar em consideração a já provável contribuição dos chefes dos respectivos domicílios como fator dificultador para a incorporação desse segmento à previdência social (dadas as generosas regras de pensões brasileiras). Conjuntura Social mai-ago, 2003. Por outro lado, ações nacionais que buscam conferir um caráter “politicamente correto” à cobertura previdenciária ligadas a atributos como gênero, imigração e raça, não parecem particularmente atrativas, dada a relativa proximidade da unidade das razões de chance condicionadas (todas abaixo de 1.05). Uma surpresa no atributo tempo de empresa: a expectativa seria uma queda contínua da razão de chances condicionadas, conforme o aumento do tempo de trabalho na mesma empresa. Como o grupo base é formado pelos trabalhadores com mais de 5 anos de trabalho, supunha-se que, em queda, as razões de chances condicionadas dos grupos que apresentam outros atributos (menos de 1 ano, entre 1 e 3 anos, entre 3 e 5 anos) fosse sempre superior a 1. Isso, no entanto, não ocorre: as chances dos trabalhadores entre 1 e 3 anos e entre 3 e 5 anos não contribuírem são menores que a dos trabalhadores com mais de 5 anos na mesma empresa. Esse resultado deve ser explicado pela maior probabilidade de ocorrência de acordos espúrios entre firmas e trabalhadores na medida que um nível de conhecimento mínimo é estabelecido. Esse fator dominaria a busca de maior segurança na medida que aumenta a senioridade do trabalhador no seu respectivo posto de trabalho. 75 O acúmulo de capital humano específico levaria a maior demanda por seguro social, se esse for um bem de luxo. O fato desse resultado não ser observado com contapróprias e empregadores é consistente com essa interpretação. Esse resultado inspiraria mudanças nos incentivos implícitos na legislação trabalhista brasileira, conforme argumentado anteriormente. Os principais atributos individuais explicativos da não contribuição previdenciária são aqueles relativos a aquisição de capital humano geral como aqueles ligados a anos completos de estudo e a experiência, aqui captado pelo quesito idade. No caso dos grupos jovens a razão de chances condicional cai monotonicamente de 3.9 no grupo de 15 a 20 anos até o grupo base de comparação de 45 a 50 anos quando ela é unitária (é importante notar que no grupo de 20 a 25 anos ela já é 1.71). A alta incidência dos empregos sem carteira é um reflexo disso. O estabelecimento de salários mínimos diferenciados para os jovens e adolescentes como nos EUA, pode contribuir indiretamente para o aumento da taxa de contribuição. Similarmente, campanhas de conscientização entre jovens sobre a importância de contribuição de previdência. Por exemplo, a incorporação da questão no currículo escolar, a adoção de sorteios entre contribuintes ou outras atividades voltadas para o público jovem poderiam ser testadas. Entretanto, nada substitui a adoção de incentivos “corretos” para a inclusão previdenciária. Por exemplo, políticas que estabelecem ligações mais estreitas entre contribuições durante todo o ciclo de vida ativa e benefícios percebidos1. 1 A Lei 9.876/99, que instituiu o fator previdenciário, aponta nessa direção. Conjuntura Social mai-ago, 2003. No caso de escolaridade, a razão de chances relativa ao grupo com pelo menos segundo grau completo é acima de 3.3 para todos os demais grupos educacionais. Existem duas linhas básicas de políticas aqui. De um lado, aumentar a conscientização dos mais pobres através de campanhas educativas da importância de se contratar seguro social através da Previdência Social. O fato de, segundo a Constituição de 1988, existir uma pensão mínima de um salário mínimo mesmo para aqueles que nunca contribuíram para a previdência é um incentivo fundamental nesse caso. Se o objetivo é aumentar a contribuição previdenciária, deveria se condicionar o acesso a benefícios (ou o valor dos benefícios) a algum esquema mínimo de contribuição anterior. 76 Políticas Setoriais – A análise temporal da taxa de não contribuição na nossa população alvo por setor de atividade para o período 1993-99, demonstra: queda na agricultura (68.9% para 66.2%), uma virtual estabilidade da indústria (26% para 25.7%) e crescimento na construção civil (53% para 67.5%), no setor serviços (36.2% para 42.6%) e nos ocupados (privados) em atividades do setor público (20.1% para 29.9%). A regressão logística apresenta os seguintes resultados. Entre todos os atributos analisados, pertencer ao setor da construção civil é aquele que apresentava em 1999 a maior taxa de não contribuição na população ocupada restrita do setor privado. A razão de chances condicionada é de 5.4 contra 3.8 da agricultura e é também a mais alta arbitrada. A adoção de suspensão temporária de contrato de trabalho que prevê a manutenção da contribuição durante o período de layoff se mostra especialmente indicada, nesse caso, dada a natureza intermitente das atividades exercidas no setor. Conjuntura Social mai-ago, 2003. A cobertura crescente na agricultura é a melhor notícia no âmbito setorial de contribuição previdenciária observada nos últimos anos. Uma possibilidade seria substituir a contribuição (cota patronal) sobre folha de salários de alguns ramos econômicos por contribuição sobre faturamento. Além disso, pensa-se em permitir que a empresa abata de sua contribuição aquela já feita pelo empregado. Apesar da razão de chances condicionada no setor serviços ser menos da metade daquela observada na construção (2.3 dos serviços em relação à indústria), a alta e crescente participação desse setor na ocupação privada restrita (de 53.2% em 1993 para 58.5% em 1999) é mais de seis vezes superior a da construção (9.2% em 1999). Como conseqüência, a contribuição relativa dos serviços para a taxa de não contribuição agregada em 1999 (isto é, a participação na população vezes a taxa) perfazia 56.5%. Entretanto, a alta heterogeneidade do setor impõe dificuldades na confecção de políticas. Essa dificuldade sugere um nível maior de segmentação da análise. A existência de novas bases de dados específicas sobre pequenos empresários como a ECINF (pesquisa sobre Economia Informal Urbana, do IBGE) se mostra especialmente indicada nesse caso. A sugestão adicional é que se mude a base de incidência do imposto segundo o qual será feita a dedução de faturamento para valor adicionado. Essa modalidade de incidência possui como vantagens a não cumulatividade e, em particular, o incentivo 77 a que empresas na fase final da cadeia produtiva identifiquem os seus fornecedores a fim de reduzir a própria base de arrecadação. Visa-se, assim, estimular a formalização de trabalhadores, atentando para calibrar as alíquotas de forma a não haver mudanças da contribuição agregada2. O potencial de aumento da contribuição dos ocupados (privados) do setor público se mostra baixo tanto em indicadores condicionados como não condicionados, entretanto cabe ressaltar a possibilidade do setor público nos seus diversos níveis impor normas mais rígidas quanto à contratação de serviços terceirizados. 2 Por exemplo: hoje o empregado que ganha R$ 1.000 paga 11% sobre este valor e a empresa 20%. Na proposta, o empregado pagaria os mesmos valores e a empresa não pagaria 20%, mas sim uma porcentagem do seu respectivo valor adicionado, podendo abater deste valor aquele já pago pelo empregado. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Mapas da Evasão – Por fim, apresentamos os resultados de variante da regressão logística analisada anteriormente. A ênfase da análise aqui recai sobre as dummies espaciais mas cabe notar a robustez dos demais coeficientes estimados para os atributos controlados no conjunto de regressões apresentados. A nossa opção foi utilizar dados conjuntos de 1996, 1997, 1998 e 1999 para aumentar os graus de liberdade da estimativa pois abordaremos células geográficas mais específicas. Em particular, abrimos a análise geográfica por mesoregiões, o que pode propiciar um maior direcionamento geográfico na implementação e avaliação de ações fiscalizatórias e de comunicação por parte de gerências administrativas do MPS. O mapa plota informações condicionadas sobre as razões de chance de contribuição previdenciária em nível de mesoregiões. Dada a natural limitação de espaço a leitura detalhada desse mapa é deixada a cargo do leitor. Afinal, como diz o ditado, “uma imagem vale mais do que mil palavras”, ou números. 78 Não Contribui para a Previdência Razão de Chances Não Condicional Conjuntura Social mai-ago, 2003. População Ocupada no Setor Privado Restrita Razão de Chances - Não Contribui Sem Informação 0 - 0.999 1.000 1.001 - 6.089 6.089 - 14.169 14.169 - 37.656 37.656 - 252.46 Fonte: PNAD 96, 97, 98 e 99 / IBGE Elaboração: FGV/IBRE/CPS 79 QUINZE PRINCÍPIOS PARA REGULAÇÃO DOS SISTEMAS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA FECHADA* O * Publicado originalmente em inglês pela OCDE, com o título “Fifteen Principles for the Regulation of Private Occupational Pensions Scheme” (também disponível no site http://www.oecd.org/dataoecd/ 31/32/2403207.pdf). Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OECD), Paris. Todos os direitos reservados. Para o português. Publicado com a autorização da OCDE, Paris. A qualidade da tradução portuguesa e sua coerência com o texto original são da responsabilidade da Secretaria de Previdência Complementar/ Ministério da Previdência Social. Conjuntura Social mai-ago, 2003. intercâmbio com a OCDE tem se revelado bastante proveitoso. Prova disso foi o seminário recentemente promovido pelo Ministério da Previdência Social, em parceria com aquela entidade, no Itamaraty, dias 1o e 2 de outubro. Num momento em que a previdência complementar fechada ganha destaque em nosso país, no contexto da reforma previdenciária, a Secretaria de Previdência Complementar traduziu os “Quinze Princípios para Regulação dos Sistemas de Previdência Privada Fechada” da OCDE. Ainda que não reflita a posição oficial do MPS e da SPC, o texto constitui-se em rica contribuição ao debate para a sofisticação e o aperfeiçoamento das alternativas de regulação do nosso sistema de previdência complementar fechado. 80 Estrutura Regulatória Adequada Princípio No 1: Uma estrutura regulatória adequada para os fundos privados de pensão deve ser implementada de forma flexível, dinâmica e abrangente (levando-se em conta a complexidade dos sistemas de previdência), com vistas a assegurar proteção aos participantes de planos de benefícios, solidez aos fundos de pensão e estabilidade para a economia como um todo. Essa estrutura, contudo, não pode sobrecarregar excessivamente o sistema de previdência complementar, as instituições e os empregadores. Regulação Apropriada dos Mercados Financeiros Princípio No 2: Uma aplicação diversificada dos ativos dos fundos, capaz de diluir riscos, requer um bom funcionamento do mercado de capitais e das instituições financeiras. O desenvolvimento de sistemas avançados para capitalização dos fundos de pensão deve caminhar em compasso com o fortalecimento da infra-estrutura do mercado financeiro e da estrutura regulatória (incluindo o desenvolvimento de novos instrumentos financeiros e novos mercados, como por exemplo, mecanismos de proteção contra a inflação e de melhoria dos benefícios de aposentadoria). Conjuntura Social mai-ago, 2003. Direitos dos Participantes Princípio N o 3: O acesso aos fundos privados de pensão não deve ser discriminatório. A regulação deve ter como objetivo evitar exclusões com base na idade, salário, gênero, tempo de serviço, contrato de emprego, jornada parcial de trabalho e estado civil. Deve-se também promover a proteção dos direitos adquiridos e da expectativa do direito, em relação às contribuições tanto dos empregados quanto dos empregadores. Regras de indexação dos benefícios devem ser incentivadas. Portabilidade de direitos é essencial quando há mobilidade no mercado de trabalho. Deve ser encorajada a criação de mecanismos para proteção dos participantes, em caso de saída antecipada do plano, especialmente quando a adesão não é voluntária. 81 Adequação dos Fundos Privados Princípio No 4: Avaliação correta da adequação dos fundos de pensão (riscos, benefícios, cobertura) deve ser promovida, especialmente quando desempenham uma função pública, seja por meio da substituição, seja pela assunção de relevante função complementar ao regime público, seja quando eles são obrigatórios. A adequação deve ser avaliada levando-se em conta as várias fontes de financiamento previdenciário (sistemas de repartição, sistemas capitalizados, sistemas individuais de poupança). Sistema Regulatório e Segregação Patrimonial Princípio No 5: Um sistema regulatório institucionalizado e funcional, com critérios contábeis, técnicos, financeiros e gerenciais adequados, deve ser aplicável aos fundos de pensão e planos, individual ou conjuntamente, mas sem que para tal se constitua uma estrutura administrativa onerosa. O patrimônio dos fundos de pensão tem que estar legalmente segregado daquele do patrocinador (ou pelo menos tal segregação tem que ser inexoravelmente garantida por mecanismos apropriados). Princípio No 6: Os fundos privados de pensão devem ser constituídos pelo regime de capitalização. Enquanto a capitalização é completa, em princípio, nos planos de contribuição definida, outros tipos de planos devem ser submetidos a regras de acumulação mínima ou outros mecanismos para assegurar a acumulação adequada para fazer face às obrigações do fundo. As regras baseadas no método de capitalização (ex. ABO-Acumulated Benefit Obligation e PBO-Project Benefit Obligation) devem ser promovidas, com um nível mínimo, para complementar os métodos correntes não capitalizados. A flexibilidade, temporalmente limitada e sob circunstâncias restritas, pode ser permitida a fundos deficitários. Deve-se considerar o desenvolvimento de condições adequadas, desde que flexíveis, para garantir liquidez mínima aos fundos de pensão, levando em consideração a natureza de longo prazo de seus passivos. A política tributária e a regulação adequada devem estimular um nível prudente de acumulação. Fundos privados baseados no método de repartição simples devem ser proibidos no âmbito de cada empresa individualmente. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Capitalização 82 Técnicas de Cálculos Princípios No 7: Métodos de cálculo apropriados para avaliação dos ativos e constituição de reservas, incluindo técnicas atuariais e regras de amortização, devem ser estabelecidos com base na transparência e na comparabilidade. Deve ser promovido o aumento da confiança no moderno e efetivo gerenciamento de risco, nos padrões de gerenciamento de risco para fundos de pensão e outras instituições relacionadas com o pagamento de benefícios previdenciários. O desenvolvimento de técnicas de gerenciamento entre ativos e passivos deve receber também a devida atenção. Estrutura de Supervisão Princípio No 8: Supervisão eficaz dos planos e fundos de pensão deve ser estabelecida e focada na aderência às normas legais, no controle financeiro, no exame atuarial e na supervisão dos gerentes. Um corpo apropriado de supervisores, devidamente financiado e com equipe adequada, deve ser estabelecido com o objetivo de conduzir, quando relevante, supervisão direta e indireta, pelo menos para algumas categorias de fundos e em particular quando problemas são detectados. A supervisão deve ser dotada de adequado poder regulatório e fiscalizatório sobre cada plano individualmente, com o objetivo de prevenir desperdício de recursos em função de irregularidades no seu uso. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Auto-Supervisão Princípio No 9: Auto-regulação e a auto-supervisão devem ser estimuladas. Os serviços dos atuários independentes, das empresas custodiantes e dos conselhos fiscais devem ser promovidos dentro de uma estrutura regulatória apropriada. Competição Justa Princípio No 10: A regulação deve permitir um certo nível de competição entre diferentes operadoras de planos e avaliar as suas vantagens. A competição justa deve trazer benefícios aos participantes e permitir um desenvolvimento adequado do mercado de fundo de pensão. 83 Investimento Princípio No 11: Investimentos dos fundos de pensão devem ser adequadamente regulados. Isto inclui a necessidade de aplicação de um método de compatibilização entre ativo e passivo dos fundos, tanto no aspecto institucional quanto no funcional, e a consideração da relevância dos princípios relacionados à diversificação, dispersão, maturidade e equilíbrio financeiro. A regulação quantitativa e “o princípio da pessoa prudente” devem ser cuidadosamente avaliados, considerando os objetivos de segurança e rentabilidade dos fundos de pensão. Os investimentos na própria empresa patrocinadora devem ser limitados, a menos que existam salvaguardas adequadas. Deve ser promovida a liberalização da aplicação de recursos dos fundos de pensão em investimentos no exterior, sujeita aos princípios do gerenciamento prudente. Mecanismos de Seguros Princípio No 12: A necessidade de seguro de insolvência e/ou outros mecanismos de garantia têm que ser devidamente avaliados. Esses mecanismos podem ser recomendados em alguns casos, mas dentro de regras adequadas. A utilização de mecanismos de seguro (em grupo e resseguro) deve ser estimulada. Liquidação Princípio No 13: Mecanismos adequados de liquidação devem ser colocados em prática. Acordos (incluindo, quando necessário, prioridade de direitos creditórios para fundos de pensão) devem ser postos em prática para assegurar que as contribuições devidas ao fundo pelo empregador serão pagas em caso de sua insolvência, de acordo com as leis nacionais. Princípio No 14: Transparência e informação apropriadas devem ser promovidas com base nas características dos custos e dos benefícios dos fundos de pensão, especialmente quando várias opções de planos são oferecidas. Os participantes devem ser informados sobre o uso indevido dos benefícios de aposentadoria (em particular nos casos de prestação única, ou pecúlio) e sobre a forma adequada de assegurar seus direitos. A transparência sobre a composição das contribuições, do desempenho dos planos e das modalidades de benefícios devem ser especialmente promovidas em casos de planos de benefícios individuais. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Transparência e Informação 84 Governança Corporativa Princípio No 15: O papel da governança corporativa e a capacidade dos fundos de pensão devem ser considerados. Isto inclui: a adesão (por dispositivo estatutário ou não) aos princípios de governança; o impacto da participação ativa dos participantes no comportamento da entidade; e a governança dos próprios fundos de pensão e o papel dos administradores. Estrutura Normativa de Regulação da Previdência Privada Conjuntura Social mai-ago, 2003. A renda de aposentadoria deve ser proveniente da composição de sistemas de repartição, sistemas capitalizados e sistemas individuais de poupança. O objetivo é maior diversificação do risco, balanceamento do pacto entre gerações e dar aos indivíduos mais flexibilidade sobre a decisão de aposentadoria. O aumento da credibilidade dos sistemas de previdência privada requer uma estrutura regulatória apropriada, que é uma condição prévia para manter a confiança dos participantes e do público em geral. A regulação apropriada contribuirá para assegurar os direitos dos participantes, que inclui, entre outros, acesso não-discriminatório aos fundos de pensão, proteção aos direitos adquiridos, implementação de cláusulas para portabilidade e a adequação de benefícios. A eficaz regulação e supervisão sobre a situação financeira geral dos fundos de pensão são indispensáveis para o desenvolvimento seguro da previdência privada. O objetivo principal é proteger os participantes do efeito da insolvência do patrocinador, da constituição insuficiente de reservas em decorrência da aplicação de técnicas e/ou processos de investimentos impróprios, e da mensuração equivocada, por parte dos gerentes, dos riscos de contraparte existentes na aplicação dos ativos dos fundos de pensões. A maneira de se promover a regulamentação divergirá, entretanto, em razão da natureza dos planos (benefício definido versus contribuição definida, compulsório versus voluntário), cujos riscos associados requerem métodos diferentes. Critérios apropriados devem balizar o processo de autorização para entidades de previdência operarem planos de benefícios; devem ser estabelecidas exigências de capitalização mínima, atuarial, contábil e de transparência, assim como limites de investimento na própria empresa patrocinadora. A competição adequada entre gestores de recursos dos fundos de pensão também deve ser assegurada. Deve-se dedicar atenção permanente à evolução das práticas de mercado, a fim de assegurar que os métodos de supervisão estejam adaptados à realidade do mercado local. 85 Os planos de pensão privados vêm sendo operados, há muito tempo, em muitos países da OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. Nos últimos anos, os planos se expandiram consideravelmente, mas o que mudou, principalmente, são as expectativas sobre eles, já que agora estão sendo considerados como uma resposta viável para os problemas dos sistemas de previdência pública. A maioria dos observadores concorda que o papel dos sistemas privados é limitado para continuarem expandindo-se no futuro. Muitos também enfatizam o fato de que eles terão um papel essencialmente complementar aos sistemas públicos, e que qualquer efeito de substituição somente poderia ser parcial. Espera-se que os governos continuem a ser, pelo menos, os provedores exclusivos de assistência, a exemplo de benefícios de amparo à velhice, capaz de cobrir as necessidades essenciais mínimas do idoso carente. Assim, o sistema privado paga benefícios acima e além da assistência básica e seu propósito é prover renda de aposentadoria que permita aos beneficiários manter um padrão mínimo de vida, compatível com o que desfrutava antes da aposentadoria, que poderá ser maior se, eventualmente, o beneficiário tiver contribuído para plano de previdência individual. Não é papel da previdência complementar fechada apenas apresentar respostas para problemas macroeconômicos de déficits atuais ou esperados pelos sistemas públicos de previdência. Sobretudo, seu papel é atender às necessidades dos empregadores e empregados, já que ambos consideram que os fundos oferecem vantagens significativas, principalmente relacionadas à constituição de reservas e à flexibilidade dos planos. As considerações precedentes podem induzir os governos a promover o uso de fundos de pensão, levando-se em conta as características específicas dos países ou indústrias. Conjuntura Social mai-ago, 2003. O papel dos fundos privados de pensão varia consideravelmente de um país para outro, contudo, o seu desenvolvimento está intimamente relacionado aos sistemas públicos. Deve ser notado que se por um lado os fundos são vistos freqüentemente como uma resposta para os problemas que os sistemas públicos enfrentam, por outro, não constitui a única solução. Existem muitas maneiras de se realizar a reforma do sistema público, incluindo a utilização parcial de métodos de capitalização (em particular em função do contexto não inflacionário atual), como também de instrumentos tradicionalmente usados para ajustar benefícios e contribuições (mudanças no modo como os benefícios são calculados, idade de aposentadoria, etc). 86 Conjuntura Social mai-ago, 2003. A promoção, por exemplo, pode ocorrer na forma de incentivos fiscais. Em muitos países da OCDE, o tratamento tributário dado aos fundos de pensão permite a dedução das contribuições do empregador e empregado, enquanto a renda dos investimentos dos fundos de pensão está isenta, e os impostos são pagos somente sobre benefícios. Essa forma de diferimento tributário das contribuições tem sido considerada um importante incentivo para prover rendas de aposentadoria. Os governos também podem tornar obrigatórios os fundos privados para os empregados e/ou empregadores, por meio de planos relacionados ao vínculo empregatício ou de planos individuais. Muitos argumentos têm sido apresentados com relação à natureza obrigatória ou opcional dos fundos de pensão, que dependem em grande medida do contexto doméstico no qual operam. Os sistemas compulsórios existem em muitos países, ao passo que em outros, segundo se sabe, está sendo considerada a possibilidade de sua implementação, especialmente onde está sendo planejada privatização em larga escala. Até agora, porém, muitos países da OCDE optaram por sistemas voluntários combinados com incentivos fiscais. O crescimento das pensões privadas expõe os indivíduos e instituições, assim como a sociedade como um todo, a enormes riscos, que os governos devem enfocar com o objetivo de contê-los, otimizando os efeitos benéficos do sistema de aposentadoria. Alguns desses riscos são também comuns nos sistemas públicos. Nestes incluem-se vários riscos – potencialmente mais graves do que no caso dos sistemas privados – relacionados à proteção dos participantes, particularmente na medida em que a elegibilidade não discriminatória, o direito acumulado e a adequação de benefícios estão em questão. Os planos privados também estão expostos a significantes riscos financeiros, tais como a insolvência do patrocinador, déficit do fundo, riscos de investimento, processo inflacionário, taxas de juros e, até mesmo, fraude. Os planos segurados também estão expostos a estes riscos, mas são mais severamente regulados pelo nível de solvência da companhia de seguro. É importante notar que os sistemas públicos também devem enfrentar esses tipos de riscos, mas sob modalidades diferentes, e deve ser levado em conta o fato de que os governos podem sempre recorrer à tributação. É essencial para o desenvolvimento saudável dos fundos de pensão que sejam adequadamente regulados. A regulação, que é indispensável para manter a credibilidade perante os participantes, ajuda principalmente a assegurar seus direitos e o equilíbrio financeiro dos planos. Eles são especialmente necessários porque os sistemas de 87 aposentadoria afetam a vida das pessoas. Seu relevante papel social, que o segmento de pensão compartilha, por exemplo, com o sistema de saúde pública, requer que os governos prestem atenção especial nesse fato, e assegurem que as empresas privadas – autorizadas a exercerem atividades de interesse público – estejam devidamente cumprindo sua função social. A concessão de incentivos fiscais é um forte argumento para que o governo exerça sua função regulatória de forma apropriada. Um método integrado de regulação é necessário para assegurar sua convergência em direção a um objetivo mais amplo. Neste contexto, deve ser notado que algumas normas de regulação podem ser conflitantes com outras, como no caso entre as leis tributárias e as regras prudenciais relativas ao superávit dos fundos. Os métodos contábeis e atuariais podem, em muitos casos, não se ajustar perfeitamente às exigências dos supervisores e reguladores. Entretanto, as diferenças podem, às vezes, ser justificadas, em particular quando os objetivos buscados são distintos, porém compatíveis. Isto ocorre, por exemplo, quando as regras de prudência aplicáveis aos fundos são diferentes daquelas da administração financeira de longo prazo. Até mesmo quando a regulação procura alcançar os mesmos objetivos finais, ela varia de país para país, refletindo as diferenças na natureza de seus respectivos Conjuntura Social mai-ago, 2003. Há uma enorme variedade de sistemas privados de previdência, alguns dos quais são altamente complexos – este é o preço que tem de ser pago pela flexibilidade. Os sistemas diferenciam-se consideravelmente, tanto do ponto de vista gerencial, quanto na forma de constituir as reservas garantidoras, bem como em termos das características, objetivos e funções dos planos, e ainda no grau que desempenham seu papel social e atendem às necessidades da sociedade. A regulação deve levar em consideração essa complexidade para não se tornar nociva. A regulação do setor deve ser entendida a partir de uma metodologia compreensiva, levando-se em conta o papel dos fundos de pensão como uma das várias fontes de renda de aposentadoria, assim como outros objetivos sociais que estes possam desempenhar. Deve-se considerar a interação com a regulação social, tributária e competitiva e a dos sistemas de previdência públicos. A regulação também deve integrar os vários aspectos envolvidos e evitar o estabelecimento de diferentes padrões, até que se obtenha o melhor potencial de sinergia. A regulação deve ser dinâmica e evoluir juntamente com o setor. Finalmente, a regulação deve ser equilibrada e deve evitar criar distorções desnecessárias que impeçam o funcionamento adequado da previdência complementar. 88 fundos de pensão. Essa situação pode constituir sério obstáculo à mobilidade internacional da força de trabalho. Pode também realçar a necessidade de se levar em conta as características nacionais e setoriais desses sistemas, a fim de adaptar apropriadamente as políticas. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Questões relacionadas com o acesso aos fundos de pensão devem ser consideradas de acordo com o papel que eles exercem, seja de complementar, seja de substituir parcialmente o sistema público. Neste particular, deve-se ter em mente que no caso dos sistemas de pensão ocupacionais voluntários, os empregados não têm alternativa, a não ser contar com o terceiro pilar (previdência individual) ou confiar nos sistemas públicos de aposentadoria. Alguns governos têm tentado focalizar esse assunto (em particular quando o regime privado exerce papel de substituto ao público), por exemplo, mediante incentivos fiscais, simplificando formalidades administrativas ou fazendo tais sistemas compulsórios. Nos casos em que as empresas instituem fundos de pensão, o acesso pode estar sujeito a condições específicas que resultem na exclusão de algumas categorias de empregados. As principais formas de exclusão ou discriminação incluem: idade, salário e restrições de gênero. Do ponto de vista da política pública, parece essencial que os planos existentes não contenham cláusulas discriminatórias, mas apenas critérios objetivos de acesso. Em muitos países, os empregados cobertos por um plano de benefícios da empresa têm direitos adquiridos que, teoricamente, refletem compromissos irrevogáveis do empregador e asseguram que os empregados receberão os benefícios referentes também ao serviço passado (tempo de trabalho anterior à instituição do plano). O conceito de direito adquirido tornou-se fundamental, uma vez que as reservas garantidoras têm de ser avaliadas em relação aos compromissos atuariais assumidos pelos fundos, ou seja, em relação aos direitos adquiridos (possíveis de ser projetados) de todos os beneficiários. O escopo das regras de direitos adquiridos varia significativamente de um país para outro. Além disso, certas práticas, tais como as pesadas contribuições iniciais (direitos paulatinamente adquiridos pelos beneficiários), podem ter impacto na sua eficácia. As dificuldades de se indexar o valor dos benefícios, que são freqüentes, também diminuem consideravelmente o valor dos benefícios futuros, em particular quando os empregados mudam de emprego. Em geral, os participantes também perdem quando mudam de emprego ou se aposentam cedo, uma vez que a possibilidade de transferência e portabilidade 89 A adequação dos fundos de pensão deve ser examinada em um amplo contexto, levando-se em conta os sistemas públicos de previdência existentes e o papel esperado dos sistemas de previdência privada. Isto se aplica não somente aos benefícios e riscos relacionados aos sistemas privados, mas também no âmbito de cobertura da população. Em relação a isso, é importante notar que em vários países onde os sistemas públicos não provêem um valor suficiente de benefícios de aposentadoria, uma parte significativa da população também não se beneficia da cobertura dos sistemas privados. Alguns países têm procurado resolver esse problema criando fundos privados de pensão compulsórios ou promovendo significativos incentivos fiscais. Apesar disso, alguns estratos da população acabam ficando sem cobertura. No limite, essa situação poderá causar sérios problemas para os governos no longo prazo, uma vez que eles podem ser chamados a suprir as necessidades mínimas desse segmento da população. Com relação aos benefícios, um critério padrão usado no caso de adequação de planos privados de previdência, pelo menos quando eles provêem a parte principal da renda de aposentadoria, é determinar o pagamento de um benefício básico, necessário para assegurar um padrão mínimo de vida ou comparável ao que desfrutavam antes da aposentadoria; outro é o equilíbrio entre benefícios e contribuições. A medida de adequação de um plano pode variar no caso de diferenças individuais e ramo de atividade, mas os benefícios devem corresponder, em todo caso, ao que foi prometido no contrato. Outro aspecto diz respeito à percepção e exercício do direito aos benefícios antes e depois da aposentadoria. O valor acumulado pode estar sujeito a regras estabelecidas para prevenir o uso impróprio dos benefícios de aposentadoria e seu dispêndio prematuro. Conjuntura Social mai-ago, 2003. dos direitos está freqüentemente limitada. Há um caso claro para o desenvolvimento da adequada regulação para proteger e promover os direitos adquiridos e assegurar sua portabilidade. A recente experiência da OCDE pode ser de grande ajuda nesse sentido: em alguns países, a portabilidade tem crescido por meio da harmonização dos princípios técnicos, atuariais e financeiros, subjacentes na avaliação dos direitos adquiridos. A política pública relacionada a essa questão deve estar alinhada com os princípios usados para determinar a política de emprego de um país. Quando a mobilidade no mercado de trabalho é promovida, deve-se adotar medidas apropriadas na área previdenciária de forma a contribuir para que esse objetivo seja alcançado. 90 Conjuntura Social mai-ago, 2003. Os parâmetros relativos ao tratamento da inflação antes e depois da aposentadoria também são elementos essenciais. O desenvolvimento de um mercado de títulos indexados poderia representar uma solução para o problema da inflação. As preocupações com o valor dos benefícios nos planos de contribuição definida têm, algumas vezes, levado à inclusão de cláusulas de benefício mínimo em alguns desses planos. A alternativa também deve ser avaliada em relação à política tributária e outros princípios (por exemplo, se há isenção de impostos, comparativamente a outras formas de poupança). Quando tudo é considerado, a alternativa dos fundos privados de pensão é um assunto complexo que deve ser tratado com precaução. As autoridades do governo devem prestar atenção a isto, pois se os benefícios forem insuficientes, o Estado terá que, no final, prover ajuda mediante políticas assistenciais. Para se evitar problemas é necessário que os participantes de planos de benefícios sejam bem informados e que regras bem definidas sejam implementadas para protegêlos contra abusos. Todas as entidades de previdência devem estar sujeitas a especificações legais, contábeis, técnicas, financeiras e a critérios gerenciais, para que sejam autorizadas a funcionar como operadoras e administradoras de planos de previdência. Isto pode incluir proibições contra certos tipos de planos, critérios de qualificação e reputação dos administradores, e a apresentação de relatórios de planejamento das ações e dos métodos atuariais a serem usados pelas entidades de previdência. Tanto os planos, quanto os fundos devem submeter-se à aprovação do órgão regulador, com vistas a compatibilizar procedimentos institucionais com os procedimentos internos de funcionamento das entidades de previdência. O sistema de aprovação ou autorização deve avaliar a sustentabilidade do plano e do fundo, mas deve ser capaz de regulálos por meio de uma estrutura simples. Os procedimentos formais de autorização podem ser necessários já que, em muitos países, a supervisão ordinária dos fundos e planos pode ser impedida por obstáculos de natureza prática. Exceto com relação aos planos de repartição simples, todos os atuais sistemas privados de pensão estão baseados no princípio de acumulação de reservas, que podem ser ativos reais ou reservas registradas. Outra regra geralmente aplicada diz respeito à necessidade do patrimônio dos fundos estar segregado daquele de propriedade dos respectivos patrocinadores. Nem as reservas garantidoras, nem a segregação patrimonial asseguram, por si só, a consistência de um plano. Contudo, a aplicação desses princípios reduz certos riscos de insolvência do patrocinador 91 A crença no capital próprio, em uma abordagem de solvência, é pouco freqüente no caso de fundos de pensão – em contraste com a maioria das outras instituições financeiras, cujo capital provê um grau mínimo de segurança para os investidores. Entretanto, é tecnicamente possível para os fundos constituir capital ou, pelo menos, seu equivalente na forma de garantias. Este último caso tem sido utilizado por vários países da OCDE (tais como garantias subsidiárias dadas aos ativos do patrocinador, dívida subordinada, superávit obrigatório) que poderia se somar à garantia geral dada pelo empregador nesse sistema de previdência. A necessidade de que o superávit do fundo seja acumulado contribuirá provavelmente para segurança financeira ao mesmo tempo em que proporcionará ao fundo alcançar sua maturidade. Deve-se levar em consideração, sempre que possam surgir conflitos, a compatibilização dessas exigências com a política fiscal. A necessidade de liquidez deve levar em conta que a natureza de longo prazo, da maioria das obrigações dos fundos de pensão, reduz tanto o impacto das flutuações de curto prazo nos valores dos ativos, quanto a possibilidade de se permitir investimentos em ações, ou em outras formas de investimentos correlatas, que podem prover, no longo prazo, taxas mais altas de retorno. Além disso, as análises devem ser conduzidas para estabelecer que tipos de garantias devem ser considerados nesse contexto, tendo como base, em particular, a situação predominante no setor de seguro e, em especial, em associações mútuas, levando-se em conta a natureza específica dos fundos de pensão. Conjuntura Social mai-ago, 2003. e, conseqüentemente, devem ser recomendados. A exposição ao risco de falência do patrocinador varia, dependendo se o plano é administrado pelo próprio patrocinador, ou de forma independente. No caso de falência do patrocinador, os direitos adquiridos estarão protegidos se o patrimônio do fundo estiver legalmente segregado e tiver ativos suficientes. Os direitos podem ser completamente protegidos, até mesmo no caso de insuficiência de reservas, se houver prioridade para esses créditos na massa falida da patrocinadora, ou se o plano estiver segurado. Um fundo deve, conseqüentemente, ter patrimônio segregado em relação ao patrocinador. Esta segregação legal, que minimiza riscos de fraude e conflitos de interesse, deve assegurar direitos irrevogáveis aos participantes. Se essa não for a regra, o fundo deve ter como salvaguardas o resseguro ou o seguro de insolvência. Os fundos privados que não são capitalizados e não permitem a segregação, devem ser proibidos. Cabe observar que reservas registradas são tecnicamente consideradas como fundos capitalizados. 92 Uma distinção é freqüentemente feita sobre as regras dos fundos, dependendo de ser o regime utilizado o de capitalização ou de caixa. O princípio da prudência tende a ser mais favorável para uma combinação entre ambos, com o regime de capitalização complementando o de caixa. Em qualquer caso, regras mínimas de capitalização devem ser estabelecidas. À luz da experiência dos países nas recentes metodologias desenvolvidas, as regras baseadas no PBO, (Project Benefit Obligation – Obrigação do Benefício Projetado) ou, alternativamente, , no ABO (Acumulated Benefit Obligation – Obrigação do Benefício Acumulado) métodos que incluem os benefícios adquiridos, podem ser recomendadas. Os fundos de pensão também devem estimar suas obrigações de longo prazo recorrendo a métodos de projeção. Nesse contexto, é essencial ter em mente que as regras de acumulação de reservas baseadas no método de capitalização não levam em conta, ou levam muito pouco, cálculos atuariais referentes ao desenvolvimento futuro dos fundos. As regras prudenciais também devem levar em consideração situações temporárias de déficit, admitindo possíveis ameaças resultantes de situações não controladas pelo gestor do fundo (por exemplo, falência do patrocinador, retirada de patrocínio, transferências crescentes dos direitos adquiridos em razão de mudança de emprego). Conjuntura Social mai-ago, 2003. Muitas variáveis devem ser consideradas ao selecionar métodos de cálculo. Eles incluem despesas de administração, crescimento das taxas em geral, taxa de inflação, indexação e/ou reajuste dos benefícios, rotatividade dos empregados e taxa de juros. Os métodos devem ser baseados em princípios atuariais e contábeis comparáveis ou pelo menos compatíveis. As regras de avaliação dos ativos devem ser revistas à luz do desenvolvimento do mercado financeiro e da necessidade de não impedir a competição justa, e deve usar métodos compatíveis entre ativos e passivos. As regras de avaliação devem tornar possível um nível razoável de transparência. Pode ser útil solicitar que os valores de mercado sejam especificados sempre que os ativos forem avaliados pelo seu preço de compra (e vice-versa). Também é importante seguir rígidos princípios de amortização e contar com uma avaliação prudente das taxas de juros. Além disso, o desenvolvimento recente das técnicas de administração de ativos/passivos, assim como das técnicas para imunizar portfólios, devem ter a atenção devida. No caso da previdência privada complementar, os supervisores têm que considerar primeiramente os planos de benefícios, uma vez que os fundos de pensão são 93 Na grande maioria dos casos, a supervisão indireta é essencialmente baseada em uma revisão da contabilidade e das demonstrações financeiras que devem ser preparadas e remetidas às autoridades de acordo com os procedimentos exigidos. Também pode haver auditoria no local. O papel das autoridades de supervisão deve focar nos seguintes eixos: assegurar conformidade com as obrigações legais, incluindo as leis aplicáveis, as leis locais para as empresas e os termos e condições gerais; controles financeiros: patrimônio líquido, reservas técnicas, investimentos, monitoramento das atividades, auditoria de relatórios financeiros anuais e provisórios, exame atuarial das taxas de contribuição, e provisões técnicas ou matemáticas; supervisão gerencial Conjuntura Social mai-ago, 2003. estabelecidos somente depois que os planos estão delineados. Um plano corresponde ao conjunto de regras contratuais, que explicita os direitos e as obrigações das partes, ao passo que o fundo é constituído pelas reservas garantidoras necessárias para se atingir os objetivos do plano. O controle dos planos tem, principalmente, o escopo legal e fiscal, enquanto o controle dos fundos é financeiro. A supervisão dos planos e fundos deve ser pelo menos indireta, a fim de dar conta do grande número existente. Adicionalmente, pode ser necessário conduzir revisões dos métodos utilizados e dos custos. Os fundos de pensão não estão, às vezes, sujeitos a uma supervisão detalhada, embora pareça lógico que eles devam estar sujeitos a um nível mínimo de supervisão. Mesmo que isto não seja sempre feito sistematicamente, devido ao grande número de fundos e pela sua complexa natureza, certos procedimentos de supervisão são possíveis e necessários – e alguns deles já estão sendo aplicados para fins tributários. Uma supervisão rígida deve ser exercida sobre os fundos em que o administrador, patrocinador, membros ou atuários tenham se reportado às autoridades, em função de problemas que eles tenham enfrentado. Isso pode ser aplicado a todos os fundos acima de um certo tamanho admitindo-se, também, a utilização de amostras aleatórias. A supervisão pode também ter como meta a identificação de problemas que possam representar riscos para uma instituição financeira sob supervisão, em parceria com os diversos profissionais que trabalham com a instituição, tais como auditores, atuários ou outros. A supervisão pode ser modelada a partir das práticas de outros setores, tais como seguradoras, bancos e especialmente a indústria de seguro. Isto poderia resultar no fortalecimento da cooperação entre as autoridades responsáveis por esses setores. Trabalho extensivo poderia ser conduzido pelas autoridades de supervisão dos países da OCDE para identificar o escopo dos procedimentos operacionais projetados, com vistas a otimizar a supervisão dos fundos de pensão, levando-se em conta as respectivas experiências. 94 (pelo menos em alguns casos): qualificação e reputação dos gestores, levantamento dos principais acionistas e patrocinadores; revisão econômica: condições do mercado, dados estatísticos. Para um fundo de pensão, a qualidade do gerenciamento é essencial. A proteção dos participantes pode ser significativamente melhorada e os riscos minimizados, se a qualificação e a reputação dos gestores forem verificadas antes do início das atividades da entidade de previdência, como parte do processo de autorização para o funcionamento. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Posteriormente, a supervisão pode ser exercida sobre uma base corrente, mediante representação conjunta do empregado/empregador no quadro de supervisores (conselho fiscal, por exemplo); exigências de transparência; uso de atuários; serviços de custódia; agências de rating, possibilidade de registrar queixas junto às autoridades de supervisão. Independentemente disso, a supervisão interna é particularmente importante em um setor onde a multiplicidade de planos pode limitar a operacionalidade do controle governamental. De uma maneira geral, as autoridades também devem promover o desenvolvimento dos sistemas auto-regulatórios, pelos gestores, participantes e patrocinadores, o que poderia torná-los mais responsáveis, além de compartilhar com o poder público o peso da responsabilidade pela supervisão. Os problemas suscitados pelas diferenças no grau de regulação aplicável às várias categorias prestadoras de serviços aos fundos de pensão são semelhantes àqueles em outros setores, incluídos os de nível internacional. Baseado na existência de princípios relativos aos aspectos levantados anteriormente parece que os esforços devem ser direcionados para eliminar ou reduzir as diferenças que não são justificáveis a partir de um ponto de vista prudencial, e, ainda por cima, constitui injustificável prática discriminatória contra certas categorias de prestadores de serviços. Os Governos devem considerar a necessidade de desenvolver novos métodos funcionais. Levandose em conta as características institucionais, esse método deve permitir uma redução significativa das diferenças atuais na regulação aplicada sobre produtos similares, porém originários de diferentes provedores. Todos os países da OCDE regulam os investimentos dos fundos de pensão, embora com diferentes graus e em diferentes formas. Vale ressaltar que os investimentos das companhias de seguro são geralmente regidos por regulação mais estrita do que os 95 A liberalização dos investimentos em países estrangeiros, por fundos de pensão e companhias de seguros, tem sido recentemente examinada pela OCDE. Muitos tipos de restrições têm sido identificados, sendo que a maioria consiste em definir tetos ou pisos (menos freqüentemente), assim como provisionamento relativo ao equilíbrio financeiro. Embora pareça que uma maior consideração deva ser dada à possibilidade da liberalização nessa área, uma estrutura regulatória deve ser colocada em prática para assegurar que as instituições financeiras invistam de maneira prudente. Em junho de 1999, o grupo constituído entre o CMIT (Committee on Capital Movements and Invisible Transactions) e o Comitê de Seguro concordou com as novas obrigações do código de liberalização dos movimentos de capital relacionados aos portfólios de investimentos estrangeiros por companhias de seguro e fundos de pensão. A estrutura regulatória aplicada aos sistemas privados também pode contar com redes de segurança contra falência do patrocinador, como no caso do seguro de insolvência (quando disponível), o qual geralmente é provido por uma agência de governo. Esse “seguro de último recurso” pode se mostrar supérfluo e contraproducente Conjuntura Social mai-ago, 2003. dos fundos de pensão. Estes últimos devem obedecer a princípios semelhantes, mas estão menos freqüentemente restringidos por regras quantitativas e submetemse, em geral, a regras gerenciais mais flexíveis, como a regra da “pessoa prudente”. Um princípio que geralmente é implementado, no caso dos fundos de pensão, é a restrição de investimento na empresa do patrocinador. Existe uma lista de ativos, cuja compra é admitida, para as companhias de seguro, mas não necessariamente para os fundos de pensão. Uma distinção clara também deve ser feita entre os diferentes tipos de planos e suas respectivas obrigações, como por exemplo, a obrigação resultante dos planos de benefícios definidos. Em planos de contribuição definida, o risco do investimento é transferido aos participantes, o que poderia justificar a necessidade de uma supervisão mais rígida. Entretanto, as práticas de investimento dos fundos não refletem necessariamente essa distinção. Também parece que, em média, os investimentos não estão significativamente limitados ao teto de enquadramento, uma vez que eles geralmente permanecem abaixo desses níveis. Isto também poderia significar que, nesse sentido, a regulação está cumprindo corretamente o seu papel, fixando critérios de referência em lugar de restrições. A desregulamentação deve ser estimulada, desde que não entre em conflito com os objetivos prudenciais. 96 se já existem proteções eficazes, em particular porque podem criar incentivos impróprios com a adição de um fator de “risco moral”. Entretanto, pode ser aconselhável, no caso dos sistemas com um grau limitado de proteção preventiva – tais como o plano que não segrega seu patrimônio daquele do patrocinador, ou como no caso de reservas registradas. O estabelecimento de um teto nas garantias do seguro e a precificação adequada dos prêmios de seguro podem reduzir o “risco moral”. Outras redes de segurança são providas pelo direito de crédito especial no caso de falência e, geralmente, pelo uso de seguro. Os fundos de pensão não desfrutam necessariamente de direitos especiais no caso de falência do patrocinador. Isto constitui uma séria ameaça, se o fundo não for uma entidade legalmente separada. O estabelecimento de prerrogativas especiais deve ser levado em consideração, pelo menos em certas circunstâncias, em particular com vistas a manter a credibilidade. Conjuntura Social mai-ago, 2003. Recorrer ao seguro, seja na forma de seguro de grupo, seja na de resseguro do fundo de pensão, constitui proteção adicional para os participantes e geralmente transfere a responsabilidade do patrocinador para o segurador. A regulação das companhias de seguro e a supervisão implementada na maioria dos países da OCDE oferecem uma forte – embora não absoluta – garantia de solvência. Segurar fundos pode ser aconselhável no caso de não haver regulação governamental adequada. A regulação poderia basear-se naquela aplicável às companhias de seguros, levando-se em consideração as diferenças reais e às vezes subestimadas que distinguem os fundos de pensão das companhias de seguros. Finalmente, um fator chave para maior segurança financeira dos sistemas de pensão consiste em definir procedimentos de transparência para os participantes (especialmente no caso dos sistemas de contribuição definida – CD em que a escolha individual é oferecida, e no caso de déficit), permitindo o monitoramento, direto ou indireto, da gestão dos fundos, a qualquer momento. Nesse contexto, parece que os participantes nem sempre têm acesso às informações adequadas, e que esforços adicionais podem ser feitos nesse sentido. Também parece importante informar os participantes sobre os temas relacionados à previdência privada. Em geral, a promoção da transparência dos fundos de pensão é essencial para os participantes e para o quadro de supervisores. REMETENTE Assessoria de Comunicação Social Esplanada dos Ministérios, bloco "F", 8º andar, sala 835 Fone: (061) 317-5109 / 317-5449 Fax: (061) 321-0179 / 317-5568 CEP: 70 059-900 – Brasília-DF <8=8BCqA8>30?A4E83À=280B>280;