COBERTURA DE ANÁLISE Efeito assembleia Para a Amec, analistas não estão dando a importância devida às deliberações dos encontros de acionistas em seus relatórios, mas os profissionais argumentam que apenas as decisões mais relevantes devem ser consideradas 14 Mecado de Capitais Mauro Cunha, da Amec: “Não há uma análise detalhada para verificar se o que foi decidido é positivo ou negativo para a empresa” O crescimento e a consolidação do mercado de capitais brasileiro nos últimos anos vem trazendo a reboque uma série de avanços em todas as suas áreas. Empresas, investidores e analistas são regidos hoje por Códigos de Ética e não ambicionam menos do que exercer as melhores práticas em seus segmentos. Entre as companhias abertas, a adoção do conceito de governança corporativa, que engloba todos os aspectos voltados para a profissionalização da gestão, vem proporcionando muitas mudanças, entre as quais está a qualidade de suas assembleias de acionistas. Hoje a participação dos investidores é estimulada pelas empresas e por medidas do órgão regulador - como a autorização de acompanhamento via procuração ou à distância, por meio eletrônico -, e o chamado “ativismo” dos acionistas vem aumentando, principalmente o dos minoritários. Mais organizadas e mais representativas, as assembleias são as instâncias onde o estágio da governança fica explícito. Para os investidores, porém, os analistas não estão dando às assembleias de acionistas a importância devida. Na visão de Mauro Cunha, presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), na maioria dos relatórios dos analistas as assembleias são ignoradas ou citadas de forma burocrática, sem uma avaliação mais aprofundada sobre seus efeitos na administração ou nos resultados das companhias. “Não há uma análise detalhada para verificar se o que foi decidido é positivo ou negativo para a empresa”, afirma. A pedido da revista Mercado de Capitais, a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) fez uma pesquisa com relatórios fornecidos à entidade nos meses de abril e maio deste ano para verificar se as assembleias são citadas nos relatórios e qual o teor Mecado de Capitais 15 Para Amec, evolução recente do modelo societário brasileiros, que envolve um ativismo maior dos minoritários, não está sendo refletida nos relatórios de análise das informações divulgadas. A pesquisa envolveu uma amostragem dos relatórios enviados em PDF. A conclusão, segundo a Apimec, foi que os relatórios mencionam as deliberações de assembleias de acionistas nos casos em que elas são consideradas relevantes para o mercado. Segundo o coordenador do Comitê Consultivo do Analista da Apimec Nacional, Ricardo Levy, do Codim: fortalecimento dos minoritários faz parte do processo de maior governança e transparência dentro das empresas 16 Mercado de Capitais Martins, as assembleias não são relevantes nos relatórios dos analistas quando as decisões não têm influência no valuation das empresas, mas o procedimento é diferente quando, na convocação da assembleia, são anunciadas discussões de questões específicas que podem influir na avaliação do papel, como incorporações ou a relações de trocas de ações. Também há casos de relatórios que citam uma Oferta Pública de Ações (OPA) para fechamento de capital e outros que descrevem desdobramentos que ocorrerão em assembleias futuras. “Em casos específicos, como em Assembleia Gerais Extraordinárias, imediatamente o analista entra em contato com a área de Relações com Investidores da empresa para se informar sobre o que será discutido e, se for relevante, já inclui isso em seu relatório”, explica o Martins. Além disso, argumenta, é da natureza do trabalho do analista estar permanentemente em busca de informações nas próprias companhias ou nos seus setores para poder fazer sua análise. Cunha acha pouco. Para ele, o modelo societário do país evoluiu muito, especialmente entre as empresas de capital pulverizado, abrindo caminho para que os acionistas minoritários influenciem de forma mais decisiva a administração das companhias, e os relatórios dos analistas “já deveriam refletir esse movimento”. Haroldo Levy, um dos coordenadores do Comitê de Orientação para Divulgação de Informações ao Mercado (Codim), também considera importante que essas mudanças sejam observadas pelos analistas. De Adriene de Almeida, do IBGC: “Participação dos minoritários, quando for relevante, deve ser captada pelos analistas” acordo com ele, a participacão maior e o fortalecimento dos minoritários faz parte do processo de maior governança e transparência dentro das empresas de capital aberto no Brasil, reproduzindo o que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos. Lá, diz ele, os acionistas já conseguiram promover mudanças inclusive na remuneração de altos executivos das companhias. Um exemplo recente, ressalta o presidente da Amec, foi a reunião do Conselho de Administração da construtora Gafisa, no dia 11 de maio, em que os acionistas minoritários conseguiram eleger quatro membros do conselho de administração da empresa, cujo valor de mercado vêm caindo nos últimos meses. “O episódio não mereceu mais do que um parágrafo na maioria dos relatórios”, afirmou. Martins, da Apimec, afirma que os analistas dispõem atualmente de tantos canais para obter informações das empresas que as decisões relevantes, de alguma maneira, acabam sendo incorporadas aos relatórios. No entanto, ele reconhece que a questão da cobertura dada às assembleias “é importante e deve ser discutida pelos analistas”. Este debate, porém, não se restringe ao segmento destes profissionais. A participação dos próprios acionistas nas assembleias vem aumentando, mas ainda é considerada insatisfatória pelo mercado e pelo órgão regulador, dentro do contexto de adoção dos princípios de governança corporativa. Foi para estimular uma presença maior dos acionistas nas assembleias que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) autorizou recentemente o voto pela internet e as empresas têm sido incentivadas a tornar seus encontros de acionistas mais profissionais e democráticos. Um exemplo é o Caderno de Boas Práticas para Assembleias de Acionistas lançado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Entre as recomendações está a criação de mecanismos que facilitem e encorajem o fluxo de informações entre os acionistas e a companhia, dentre os quais está o estabelecimento de procedimentos para o encaminhamento de perguntas pelos acionistas previamente à realização da assembleia. Para Adriene de Almeida, superintendente adjunta de Conhecimento do IBGC, as empresas só têm a ganhar com a participação maior dos acionistas nas assembleias. “Os minoritários têm condições de avaliar e fazer sugestões sobre a administração da empresa, exercendo o papel de consultores”, diz. “E esta participação, quando for relevante, deve ser captada pelos analistas”, afirma. Mercado de Capitais 17