ABSTRACT: Analysis of Medieval Portuguese syllable structure, focusing D.Dinis' cantiga de amigo 555, based in metrical Phonology Theory. the KEY WORDS: Medieval Portuguese; Historical Phonology; Syllable; Medieval poetry. o objetivo do presente trabalho e analisar as estruturas siliibicas do Portugues Arcaico, a partir da awilise de uma cantiga de amigo, a Cantiga 555, de D. Dinis, utilizando como fonte para realizar esta awilise 0 Cancioneiro da Biblioteca Nacional (CBN), na edicao 1982, par ser 0 cancioneiro medieval partugues mais completo e par ser uma excelente reproducao fotognifica. Dentro do arcabou9Qte6rico da fonologia metrica, a silaba passui a seguinte estrutura (confonne Massini-Cagliari, 1995: 82 e Cagliari, 1997: 88):1 cr /,:R o /\ A - t\ A A figura acima nos passibilita interpretar a silaba como tendo duas partes: 0 onset e rima. A rima se subdivide em mais duas: a parte central (nucleo) e a coda. As partes da silaba sao preenchidas par vogais e consoantes. A parte nuclear e ocupada pelas vogais, 0 nucleo ou pica da silaba, enquanto que as consoantes localizam-se no onset e coda - as partes perifericas. As consoantes do onset sao as que iniciam a silaba e as da coda, dominadas pela rima, sao as que travam a silaba. As silabas da cantiga foram analisadas confonne abaixo (foi adotada como criterio de classificacao das silabas desta cantiga a seguinte convencao: V vogal; C - consoante; N - nasal2):3 ev eeve ev ev ClV v ev ev Que I tris I 1'0 I j' e I meu I a I mi I go v ev ev ev ew ev ev cvn a I mi I ga I no I seu I eo I ra I ~m ev cvn ev ev ev eve ev ev Ca I nom I po I de I fa Ilar I mi I go evn ev ve ev eve ccvn ev cvn Nen I ve I er I -m', e I faz I gram I ra I zom ew v ev ev ev eeve cvn eve Meul al mil gol del trisl 1'anl dar ewe eve evn eve v cvvv cvn eeve pois I m'el I non I vir I e I Ih'eu I nem I brar ccve cvn ev ev ewe ev ev cvv Tris I fan I da, I se I Deus I mi I va I lha ev ev cvn cvv v ev ew ev Ca I me I non I viu, I e I de I rei I 1'e v eve ve ev eve cvn ev cvv el porI esl tol fazl sen I fa 11ha ew ccvn ev cvn eve ev v ev Mui I gram I ra I zorn, I per I bOI a I fe ew v ev ev ev ccve cvn eve Meu I a I mi I go I de I tris I 1'an I dar ewe eve cvn eve v cvvv cvn eeve pois I m'ell non I vir I e I Ih'eu I nem I brar evn eve ccve ev eve ev ev ev D'anl dar I trisl te I faz I gui I sal do ev v cvn ev cvn ew ve ev Ca I 0 I non I vi, I nen I vio I ell mi evn ve v \TV ew cvn ev ev Nen I ar I 0 I 10I meu I man I da I do v ev cvn eve ccvn ev ew ev e I po I ren I faz I gram I de I reil t'i ew v ev ev ev ccve cvn eve Meu I a I mi I go I de I tris I fan I dar ewe eve cvn eve v ew cvn eeve pois I m'ell non I vir I e I Ih'eu I nem I brar ewe ewe Mais, I Deus, I e v ev cvn que I jal nonl ev ev ev ev ev eve eo I mo I po I de I du I rar ev ew cvn ev eve mol rreul eonl pel sar 393 A partir desta classi:fica~o, foi possivel verificar os tipos de silabas e quantas vezes aparecem na cantiga, conforme a tabela abaixo: Nilmero de Ocorrencia Tioos de Silaba V ev ve evv evv eVN eve evve eeve evvv eeVN Exemnlo e 14 62 04 no 11 meu andar 02 23 21 06 06 02 03 falba COI'a£QID faz pois triste Ih'eu gram Caso se confirme que as nasais se comportam como seqiiencias de vogal mais consoante nasal, enmo a tabela acima poderia ser refeita considerando as silabas CVC e CVN como pertencendo ao mesmo tipo. 0 mesmo vale para silabas do tipo CCVC e CCVN. Analisando a cantiga de D. Dinis, percebemos algumas altera~Oes da estrutura das silabas causadas por elisao; como pode ser observado no exemplo (1): vvv cv cv A elisao atua quando a primeira palavra acaba em voga! atona e a segunda com~a por voga! - (2): (2) TRISTE v OJE v OlE E cv v Temos uma regra que define a elisao, subdividindo-a 1. Cai a primeira vogal em dois pontos: 394 2. A segunda voga} passa a ser nucleo da Ultima sHaba da palavra anterior, formando corn a consoante do onset que ficara isolado, urna nova sHaba, como mostra o exemplo (3): cr (3) 1\ 0 I i ccvc c V IRIS T 0 o mesmo ocorre no segundo verso do rerrao, ern que aparece a forma mel m'el, segundo Nunes, 1973, vol. 11:7): v (= v (4) m e + ele = m'ele o exemplo acima nos perrnite questionar, taIn.bern,se era possivel a queda de vogais atonas em Portugues Arcaico. Se e possivel, enmo a opera~iioiniciada ern (4) continua como ern (5): (5) v cv v c E+LE=E+L Considerando esta possibilidade, depois da queda da voga} atona, Wi urna reestru~o da sHaba, ou seja, 0 onset da silaba posterior (L) passa a ser coda da sHabaanterior: cr I R 1\ II V c E L Urn tipo de sHaba interessante a ser comentado esm relacionado corn a forma corazo. Pela ortografia do CBN, a estrutura desta sHaba poderia ser proposta como cv) (consoante + voga} nasalisada). No entanto, existe a hip6tese de que a v) (voga} 395 nasalizada) no Portugues Arcaico pode ser interpretada como uma sequencia de vogal oral + consoante nasal = VN. Nunes (1973, vol. II:7) adota a segunda hip6tese, na medida que grafa cora90m. Como ja em latim essa gratia era possivel e como, ate os dias de hoje, seqftencias desse tipo sao interpretadas como vogal seguida de consoante nasal (cf. Mattoso Camara: 1970), optamos pela segunda hip6tese esquematizada em (7): (j /"". (j /\/\ eve COR o (j v A R I /\ c v N Z 0 (N) Outros casos observados esmo relacionados com 0 fenomeno da ditongacao, por exemplo: a palavra pois pode ser considerada urn ditongo ou hiato? Segundo a metrica da cantiga, ou seja, analisando a maneira como 0 trovador conta as silabas poeticas no verso em que esta palavra aparece, pode-se concluir que se trata de urn ditongo conforme apresentado em (8): (j IA ONe 1/\1 c v v P 01 c S Em relacao aos ditongos crescentes, que eram freqUentemente documentados no periodo arcaico (= semivogal + vogal) do tipo ia, muitas vezes a semivogal nessa sequencia era grafada com h. Nas palavras do tipo va/ha, de acordo com MassiniCagliari (1995: 36 e 213), 0 h, neste contexto, equivale a i, formando urn ditongo crescente com a vogal posterior.Enmo: 396 (9) (J /\ N /\ I 0 c v VA c v v LHA (I) Na fase arcaica, as seqiiencias grafadas <ue,ui> precedidas de <q, g>, 0 <u> e apenas um recurso gnifico que remanesceu do latim, 1130 possuindo este <u> valor ronico (cf. Mattos e Silva:1996). Considerando a pronUncia do u na palavra Que, a silaba sera cvv, pois se trata de urn ditongo. Mas se se considera Qu como urn digrafo, a silaba sera cv. A segunda o~o foi adotada na amllise. A partir desta amllise sobre as estruturas sillibicas da Cantiga 555, de O. Oinis, podemos concluir que a silaba minima, simbolizada por v, representa a estrutura mais simples, enquanto as silabas m3ximas ccvc (duas consoantes, uma vogal e uma consoante) e cvvv (uma consoante + urn tritongo - cf. lh'eu) as estruturas mais complexas. Traduzindo em termos da fonologia metrica: (10) (J I I N I v (11) 0 R ~ 01 I c (12) (J ~ R A02 I c N I v C I c 0 (J ~ 1\ I vI c 01 02 R ANl I v N2 I v NOTAS: * 0 presente artigo integra os trabalhos do Projeto "Fonologia do Portugues Arcaico", da Faculdade de Ciencias e Letras da UNESP de Araraquara, coordenado pela Profa. Ora. Gladis Massini-Cagliari - financiado pela FAPESP (processo 1997/12447-5) 1. Na estrutura sillibica proposta pela teoria metrica, considera-se: cr = silaba, R = rima; N = nucleo; C = coda; c = consoante; v = vogal. 2. Para indica~ de ditongo, sao usados dois V seguidos, sendo que 0 centro da silaba e indicado por negrito. 3. A cantiga foi considerada conforme a interpretarrao de Nunes (1973, vol. II: 07), consultada a versao da Linea Pro/ana Galego - Portuguesa. RESUMO: Analise das estruturas silabieas em Portugues A reaieo a partir da eantiga de amigo 555, de D. Dinis, eom base na teoria metriea. PALA VRAS-CHA VB: portugues areaieo; eantiga de amigo; fonologia historiea; silaba; poesia medieval portuguesa. CAGLIARI, Luiz Carlos (1997) Amilise FonolOgiea.Campinas: edicao do Autor. cAMARA Jr., J. Mattoso. (1975). As Estruturas da Silaba ern Portugues. Estrutura da Lingua Portuguesa. Petropolis: RJ. Editora Vozes Ltda. pp. 43-51 cAMARA Jr., 1. Mattoso. (1970). As Estruturas da Silaba ern Portugues. Esttrutura da Lingua Portuguesa. Petropolis: Vozes. pp. 43-51 MASSINI-CAGLIARI, G. (1995). Cantigas de Amigo: do ritmo poetieo ao linguistieo. Um estudo de percurso historieo da aeentuafiio em Portugues. Tese de doutorado. Campinas, UNICAMP. MATTOS E SILVA, R. V. (19960 Portugues Areaieo: fonologia. ) 3&ed. Sao Paulo: Contexto. NUNES, J. 1. (1973) Cantigas d'amigo dos trovadores galego-portugueses. Lisboa: Centro do Livro Brasileiro. 13 edicao: 1926/1929. Cancioneiro da Biblioteea Naeional de Lisboa (Colocci-Braneuti). Reproducao facsirnilada. Lisboa: Biblioteca Nacional/lrnprensa Nacional - Casa da Moeda, 1982. Liriea Profana Galego-Portuguesa. Santiago de Cornpostela: Xunta de Galicia/Centro de Investigacions Lingiiisticas e Litercirias Ramon Pineiro, 1996.