FATORES MOTIVACIONAIS NO TRABALHO VOLUNTÁRIO: UMA ANÁLISE DIALÉTICA À LUZ DA SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL Neyde Maria de Faria Thomé da Silva Mestrado de Administração e Desenvolvimento Empresarial da Universidade Estácio de Sá – UNESA - R. Joaquim Nabuco, 98/503 – Copacabana Rio de Janeiro – RJ – CEP 22080-030 Tel.: (21) 2247-3891 / 2287-6783 E-mail: [email protected] Lamounier Erthal Villela Mestrado de Administração e Desenvolvimento Empresarial da Universidade Estácio de Sá – UNESA - R. Joaquim Nabuco, 98/503 – Copacabana Rio de Janeiro – RJ – CEP 22080-030 Tel.: (21) 2206-9743 E-mail: [email protected] RESUMO Identificar os fatores motivacionais que movem o cidadão voluntário e compara-los àqueles presentes nos trabalhadores remunerados é o objetivo do estudo de campo apresentado neste artigo. A verificação dos fatores de motivação baseou-se nas teorias de Maslow, Herzberg, McGregor e McClelland e em dados de observação empírica. As respostas obtidas dos trabalhadores voluntários pesquisados, sobre as razões que os levam a desenvolver este tipo de trabalho e sobre os sentimentos daí decorrentes foram analisadas à luz daquelas teorias, procedendo-se, então, através da literatura, à comparação com os fatores motivacionais dos trabalhadores remunerados. As conclusões apontaram que os trabalhadores voluntários têm motivação diversa da que move o trabalhador remunerado, preocupado, prioritariamente, com sua sobrevivência. O trabalhador voluntário, jovem ou da terceira idade, é automotivado, não carece de estímulos externos, não precisa que lhe acenem com prêmios para que alcance metas, nem que sua jornada de trabalho seja controlada, pois desenvolve suas atividades durante o dia, à noite ou, até mesmo, nos finais de semana. Sua recompensa – não - material, mas espiritual – é o próprio resultado do trabalho. É importante, portanto, que as organizações empresariais percebam e se apropriem dos elementos da dinâmica do Terceiro Setor, a fim de encontrar na razão substantiva novos fatores de motivação para o desenvolvimento de suas atividades. PALAVRAS-CHAVE: motivação, trabalho voluntário, racionalidade, Terceiro Setor. ABSTRACT Identifying the motivating factors which stimulate citizens to do voluntary work and comparing them to those of ordinary employees is the aim of the research presented in this article. The examination of these motivating factors is based on Maslow, Herzberg, McGregor and McClelland’s theories and on data from empirical observation. The answers received from volunteers who were investigated as to the reasons why they take up this kind of work were analysed on the light of those theories, and then compared to the motivating factors of ordinary employees. The conclusions shows that volunteers’ motivation is different from that of the ordinary employee, who is primarily concerned about his basic needs. The volunteer, young or senior, is self-motivated, does not need external stimulus; he does not need prizes to achieve aims; it is not necessary to control his daily working hours, for he develops his activities during the day or at night, or even at weekends. His reward – not material, but spiritual – is the outcome of his work itself. It is, therefore, important that business organizations notice and adapt the elements of dynamics of the Third Sector, so as to find in peoples inner feelings new motivating factors to develop their activities. KEY WORDS: motivation, voluntary work, rationality, third sector. 1. INTRODUÇÃO Identificar os fatores motivacionais presentes em trabalhadores voluntários e compará-los àqueles encontrados em trabalhadores remunerados com vínculo empregatício é o objetivo do presente estudo, sendo, então, o problema da pesquisa, examinar que fatores motivacionais estão presentes nos indivíduos que desenvolvem trabalho voluntário e em que aspectos tais fatores diferem daqueles que movem os trabalhadores remunerados. Dado o caráter exploratório da pesquisa, foi-se a campo, utilizando formulários e questionários, a fim de observar as características motivacionais dos voluntários, adotando-se as suposições a seguir, com base em teorias da motivação e em observação empírica do cotidiano. a. Quanto às teorias da motivação supõe-se que: com relação à Hierarquia das Necessidades, de Abraham Maslow (1954), os trabalhadores voluntários têm meios de satisfazer suas necessidades básicas e estão em busca de auto-realização, de uma vida associativa vinculada a causas cultural ou socialmente consideradas nobres, o que remete também à necessidades de estima, reconhecimento, poder e utilidade; quanto à Teoria dos Dois Fatores, de Frederick Herzberg (1959), os trabalhadores voluntários podem estar motivados por fatores intrínsecos, ligados à natureza do trabalho que desenvolvem, à possibilidade de aplicar seus conhecimentos e desenvolver suas aptidões em clima agradável, mesmo que as condições físicas do ambiente de trabalho não sejam as mais favoráveis; no que se refere às Teorias X e Y, de Douglas McGregor (1973), os voluntários podem caracterizar-se como o tipo de trabalhador concebido pela Teoria Y, que não tem desprazer inerente em trabalhar e para o qual o trabalho pode ser uma fonte de satisfação e recompensa, além de ter motivação básica, potencial de desenvolvimento, capacidade para assumir responsabilidades e alto grau de criatividade e imaginação na solução de problemas empresariais; de acordo com a Teoria da Expectativa (VIE), de Vroom (1964), os voluntários podem atribuir uma valência positiva ao seu trabalho. Para Vroom apud Wagner e Hollenbeck, valência é a “medida de atração que um determinado resultado exerce sobre um indivíduo ou a satisfação que ele prevê receber de um determinado resultado” (Wagner e Hollenbeck, 1999, p. 89). b. Quanto à análise da racionalidade, em Guerreiro Ramos (1989), supõe-se que os voluntários buscam resgatar sua racionalidade substantiva, ou de valor. c. No que se refere à observação empírica, supõe-se que os voluntários: têm visão prospectiva quanto ao aumento da situação de pobreza da população brasileira, trabalhando então, para minorar os efeitos perversos dessa tendência; têm espírito de cidadania – entendida em seu sentido amplo, como “o fundamento da primordial finalidade do Estado democrático de direito, que é possibilitar aos indivíduos habitantes de um país seu pleno desenvolvimento através do alcance de uma igual dignidade social e econômica” (Cristiane Rozicki, 2002, p. 1) – que os leva à preocupação proativa, desenvolvendo ações solidárias; buscam alívio da “culpa” por pertencerem a camadas sociais economicamente mais favorecidas, numa sociedade onde a distribuição da renda é extremamente desigual; procuram satisfação pessoal, novas experiências, oportunidades de aprendizado, prazer de se sentirem úteis, novos vínculos de pertencimento e afirmação do sentido comunitário; desenvolvem esse trabalho como uma missão decorrente de seus valores religiosos. O interesse pelo estudo do tema através da pesquisa ora relatada justifica-se pela crescente importância do trabalho voluntário, a partir de uma nova visão de mundo, mais solidária e participativa, que o vem legitimando como base de sustentação do Terceiro Setor 1 – que prospera com a percepção, pela sociedade, de que o Estado não é o único responsável pela criação de um mundo melhor (CRA, fev./mar. 2001, p. 4). A consciência da necessidade de atuar, de forma cidadã, junto a causas sociais vem tomando vulto, não apenas junto a indivíduos, mas nas próprias empresas que passam a cobrar um posicionamento neste sentido, de quem quer entrar ou já participa do mercado. O presente artigo está baseado nos resultados obtidos através de pesquisa qualiquantitativa realizada junto a oitenta e oito voluntários de vinte e nove organizações não governamentais2 no município do Rio de Janeiro. Trata, seqüencialmente, da racionalidade substantiva3 inerente à motivação de trabalhadores voluntários na sociedade pós-industrial 4, da releitura do próprio conceito do trabalho voluntário no mundo atual e dos resultados do estudo de campo sobre a percepção da motivação pelos voluntários, seguida de uma tipologia dos mesmos em função dos elementos pesquisados. Nas conclusões são mostradas, num movimento dialético as diferenças entre a motivação de trabalhadores voluntários e trabalhadores remunerados. 2. O RESGATE DA RAZÃO SUBSTANTIVA NA SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL Como motivar empregados para trabalhar mais e melhor, dando maior lucratividade para a organização, tem sido objeto de estudo desde os primórdios da administração científica. Mesmo hoje, quando se valoriza a qualidade de vida nas organizações, o que se visa, em última instância, é obter cada vez mais vantagem competitiva para permanência no mercado. Assim, o conhecimento dos fatores da motivação humana afigura-se como um instrumento das organizações para obtenção de lucro. Nesse caso, predomina a racionalidade formal e instrumental5, sendo o homem colocado como um mero objeto frente aos interesses da organização. Entretanto, a sociedade pós-industrial vem se caracterizando pela valorização da cidadania e da solidariedade, pela consciência da necessidade de maior valorização do social em lugar do material. Além disso, a adoção do modelo econômico neoliberal em grande parte do mundo, trouxe o agravamento das diferenças sócio-econômicas, aumentando a população de excluídos do mercado consumidor (Oswald apud BIRD, 2001), vista e tratada como não cidadã. A alta taxa de desemprego é também fator característico da sociedade pós-industrial e, dentre outros aspectos, está relacionada aos processos de reengenharia, downsizing e outros ajustes feitos pelas empresas nos últimos anos, quando milhões de postos de emprego foram eliminados devido a mudanças organizacionais e nas relações de trabalho. De Masi (2001, p. 8) destaca como valores dessa fase, a intelectualização, a desespecialização, a ética, a estética, a emotividade, a feminilização, a desestruturalização do tempo e do espaço, a importância crescente dada à qualidade do produto e à qualidade de vida. É também a fase da criatividade, da flexibilização das relações de trabalho, a era do conhecimento e da valorização do capital intelectual. É a busca da racionalidade substantiva, definida por Manheim apud Guerreiro Ramos (1989, p. 6) como “um ato de pensamento que revela percepções inteligentes das inter-relações de acontecimentos, numa situação determinada”, sugerindo que atos dessa natureza tornam possível uma vida pessoal orientada por “julgamentos independentes”, constituindo-se essa racionalidade, na base da vida humana ética e responsável. Ainda segundo Guerreiro Ramos (1989) “A teoria corrente da organização dá um cunho normativo geral ao desenho implícito na racionalidade funcional. Admitindo como legítima a ilimitada intrusão do sistema de mercado na vida humana, a teoria da organização atual é, portanto, teoricamente incapaz de oferecer diretrizes para a criação de espaços sociais em que os indivíduos possam participar de relações interpessoais verdadeiramente autogratificantes” (Guerreiro Ramos, 1989, p. 22) Compreender a lógica da racionalidade substantiva contribui para analisar as motivações do trabalho voluntário, desenvolvido num espaço no qual a motivação esteja relacionada a estágios mais avançados das necessidades humanas, onde seja possível o exercício das faculdades de crítica do indivíduo, em que possa pôr em prática sua criatividade e seu conhecimento. O trabalho voluntário permite, a quem o desenvolve, produzir idéias, voltar-se para a busca da qualidade de sua própria vida e da vida daqueles em prol de quem trabalha. É a solidariedade cidadã, que tece redes de comunicação e realiza-se através de grupos com objetivos comuns. O trabalho voluntário pode ser visto como uma reação da sociedade civil organizada às lacunas que o Estado deixa de preencher nas políticas públicas de bem-estar e, também, uma forma de manifestação de interesses contrários à postura meramente mercadológica. Além das pessoas, individualmente, as próprias empresas vêm tomando consciência de sua responsabilidade social, idéia que, de acordo com Vieira (2001) popularizou-se nos anos 70, na Europa, sendo o primeiro Balanço Social da história das empresas, publicado pela francesa Singer, em 1972. No Brasil, a “Carta de Princípios do Dirigente Cristão de Empresas”, de 1965, pode ser considerada um marco dessa mudança da mentalidade empresarial. Entretanto, segundo Vieira, “Apenas em princípios dos anos 90 é que algumas empresas – muito poucas – passaram a levar a sério essa questão e divulgá-la sistematicamente em balanços à comunidade, ao meio ambiente e ao seu próprio corpo de funcionários” (Vieira, 2001, p. 1). O mesmo autor ressalta que instituições como FIDES (Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial, ADCE (Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas), SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e, principalmente, o IBASE (Instituto Brasileiro de Ação Social e Econômica), acreditam que “A parceria entre empresas, governo e sociedade é fundamental para reduzir a pobreza e a injustiça social, promovendo um maior progresso e desenvolvimento social e humano” (Vieira, 2001, p. 2). Em pesquisa realizada em 1999-2000, na região Sudeste, sobre “A iniciativa privada e o espírito público”, o IPEA (2000) usou, para definir a ação empresarial, um conceito deliberadamente abrangente, considerando como tal, “...qualquer atividade que as empresas realizam para atender às comunidades, nas áreas de assistência social, alimentação, saúde, educação, meio ambiente e desenvolvimento comunitário, dentre outras. Essas atividades abrangem desde pequenas doações eventuais a pessoas ou instituições até grandes projetos mais estruturados, podendo, inclusive, estender-se aos empregados da empresa e a seus familiares” (IPEA, 2000, p. 7). No relatório da citada pesquisa, o IPEA (2000) concluiu, dentre outros aspectos, que é marcante a presença da iniciativa privada no atendimento habitual às demandas das comunidades (300 mil empresas); que é expressivo o volume de recursos privados destinados às atividades sociais de fins públicos (R$3,5 bilhões em 1998); que tal movimento de ajuda independe das políticas governamentais, tratando-se de uma iniciativa do próprio empresário que não reconhece influências do governo no processo decisório de sua atuação, na operacionalidade das ações, e nem no volume de recursos aplicados (IPEA, 2000). Essa responsabilidade social das empresas é entendida como “O exercício pleno da forma superior do capitalismo: respeito ao trabalhador, ao fornecedor, ao distribuidor, ao investidor, à comunidade, ao meio ambiente, aos encargos fiscais e aos programas sociais” (Vieira, 2001, p. 3). Verifica-se assim, que tanto indivíduos como organizações, estão empenhados no resgate da lógica substantiva de estar no mundo, arrasada pela lógica mercadológica, função da razão instrumental produtivista da sociedade industrial 6. A subjetividade e a ética são valores tão significativos na lógica pós-industrial, que a participação em ações filantrópicas tem ajudado até na disputa de uma vaga em processos de seleção, conforme noticiado no jornal O Globo em 07/10/2001: “A atividade exercida com as crianças foi o critério de desempate. (...) depois de sua contratação, muitos aderiram ao projeto, o que propiciou benefícios pessoais e profissionais” (Cad. Boa Chance, p. 3). A mesma reportagem diz que a empresa, ao valorizar o voluntariado, está, na verdade, valorizando três aspectos no profissional: caráter, confiança e personalidade; que esses profissionais que demonstram que se preocupam com o outro, são mais flexíveis e capazes de ouvir opiniões e sugestões do colega, o que é de grande importância no trabalho de equipe. Mais adiante, ressalta que essas pessoas trabalham mais motivadas, o trabalho fica mais produtivo porque elas estão se sentindo bem. Destaca que quem participa de ações solidárias demonstra, nas entrelinhas, que tem iniciativa, capacidade de trabalho em grupo, sabe administrar seu tempo e consegue levantar recursos, atributos que, junto com a formação específica, são muito bem vistos no mercado de trabalho atual. Quanto às empresas, diz Vieira (2001), que: “A experiência internacional mostra que a consciência social do empresariado é também um diferencial competitivo, (...) pois a produtividade não está mais do lado do investimento material, mas do investimento humano, subjetivo” (Vieira, 2001, p. 14). 3. RELEITURA DO CONCEITO DE TRABALHO VOLUNTÁRIO Tradicionalmente, o trabalho voluntário foi motivado mais por razões religiosas e voltado, quase que exclusivamente, para a caridade. Não se percebiam preocupações com a cidadania, a educação, a informação, elementos de presença marcante no mundo atual. Na visão tradicional, simplesmente dava-se por dar, reforçando-se indefinidamente o vínculo de dependência entre assistidos e voluntários e, por conseqüência, a alienação daqueles, num movimento típico da sociedade industrial. Atualmente, a Lei do Voluntariado (Lei nº 9.608, de 18/02/1998), em seu Artigo 1º, evidencia as características do voluntário sob ótica diversa: “Considera-se serviço voluntário, para fins desta Lei, a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive, mutualidade”. (Grifo nosso) Na definição da Fundação ABRINQ pelos Direitos da Criança apud Centro de Voluntariado Santa Fé do Sul (2001), "O voluntário, como ator social e agente de transformação, presta serviços não remunerados em benefício da comunidade; doando seu tempo e seus conhecimentos, realiza um trabalho gerado pela energia de seu impulso solidário, atendendo tanto as necessidades do próximo ou aos imperativos de uma causa, como às suas próprias motivações pessoais, sejam estas de caráter religioso, cultural, filosófico, político ou emocional" (p. 1). (Grifo nosso) Uma definição do IDAC (2001), traduz bem o perfil do trabalho voluntário na era pósindustrial: “Não é só o trabalho assistencial de apoio aos grupos mais vulneráveis da população. Inclui as múltiplas iniciativas dos cidadãos nas áreas de educação, saúde, cultura, defesa de direitos, meio ambiente, esporte e lazer”. (...) O trabalho voluntário é, também, cada vez mais, uma via de mão dupla: não só generosidade e doação mas também abertura a novas experiências, oportunidades de aprendizado, prazer de se sentir útil, criação de novos vínculos de pertencimento, afirmação do sentido comunitário“(p. 1). (Grifo nosso) A definição de voluntário do Programa Voluntários, do Conselho da Comunidade Solidária (2001) como: “... o cidadão que, motivado pelos valores de participação e solidariedade, doa seu tempo, trabalho e talento, de maneira espontânea e não remunerada, para causas de interesse social e comunitário” (p. 1) reforça o conceito anterior, do IDAC. Reforça ainda mais quando destaca como direitos do voluntário (s. d.), dentre outros, “... desempenhar uma tarefa que o valorize e seja um desafio para ampliar e desenvolver habilidades e ter oportunidades para melhor aproveitamento de suas capacidades, recebendo tarefas e responsabilidades de acordo com seus conhecimentos, experiência e interesse” (p. 40). Pode-se, portanto, verificar que o trabalho voluntário atual é mais cidadão que caridoso, volta-se mais para educar do que para simplesmente dar. E, embora não os substitua, cobre lacunas do Estado – no que se refere às políticas sociais públicas – e do mercado – cujo único alvo é o consumidor e não, o cidadão – desenvolvendo-se a partir de espaços privados, mas voltado para o público. 4. PERCEPÇÃO DA MOTIVAÇÃO PELOS VOLUNTÁRIOS – ESTUDO DE CAMPO A fim de verificar as suposições formuladas na Introdução e avaliar os conceitos de trabalho voluntário segundo as referências estudadas, optou-se por uma pesquisa de campo, objetivando coletar dados através de formulários, questionários, observação direta não participante e entrevistas, apoiada em referencial teórico obtido em pesquisa bibliográfica e telematizada. Considerou-se como universo do presente estudo as organizações não -governamentais instaladas no município do Rio de Janeiro, trabalhando-se com uma amostra que abrangeu vinte e oito instituições7 e oitenta e oito voluntários. Tomando por base as definições de Vergara (1998, p. 48-49), a amostra in casu caracteriza-se como não probabilística – por não estar baseada em nenhum procedimento estatístico; estratificada não proporcional – por incluir voluntários de diferentes organizações, faixas etária, níveis de renda, escolaridade, etc., sem qualquer proporcionalidade; e, por acessibilidade – uma vez que a amostra foi selecionada pela facilidade de acesso aos sujeitos. Os dados receberam tratamento qualiquantitativo, na busca de compreensão dos significados e características situacionais apresentadas pelos voluntários pesquisados sobre os fatores que os impulsionam para esse tipo de trabalho. Com base nos elementos constitutivos das suposições foram elaborados os formulários e questionários, buscando-se obter dentre outros, dados relativos aos motivos que levam ao desenvolvimento do trabalho voluntário e sentimentos decorrentes da realização desse tipo de trabalho, tempo de atuação na instituição, e ao perfil dos voluntários pesquisados, como sexo, idade, estado civil, escolaridade e renda, dentre outros. Os resultados coletivos da pesquisa indicam que, quanto ao tempo de atividade na instituição, 73,86% dos voluntários vêm desenvolvendo suas atividades nas respectivas instituições entre um e seis anos, havendo maior concentração – 47,72% – no período de tempo entre menos de doze meses e dois anos; 17 voluntários, 19,32%, vêm realizando tais atividades entre sete e dez anos e 4,54%, há mais de dez anos. A faixa etária compreendida entre 18 e 19 anos representou 7,96% dos voluntários, ficando a maior concentração – 29,54% – entre 20 e 29 anos; 6,82% estão entre 30 e 39 anos – a faixa de menor concentração –, 11,36%, entre 40 e 49 anos, 20,45% entre 50 e 59 anos, 15,91% entre 60 e 69 anos e, 7,96% entre 70 e 77 anos. Nas três primeiras faixas etárias – 18 e 19 anos, 20 a 29 anos, 30 a 39 anos – e de 60 a 69 anos, a maior concentração é de voluntários do sexo masculino; já, entre 40 e 59 anos, assim como entre 70 e 79 anos, o predomínio é de voluntárias do sexo feminino. Foi verificado que 51,13% dos respondentes vivem sozinhos, considerando-se como tal, os solteiros, separados ou viúvos, sendo a maioria, do sexo feminino. Os restantes 48,86% vivem em companhia de um cônjuge, sendo a maioria, do sexo masculino. Com relação à escolaridade, 1,13% são analfabetos e 1,13%, alfabetizados; 2,27% concluíram apenas o ensino fundamental e 1,13% não o concluíram; 15,90% concluíram o ensino médio, contra 11,36% que não o completaram; a maior concentração – 45,45%, têm nível superior, completo ou cursando e 13,63%, incompleto; 7,95% têm pós-graduação (especialização ou mestrado). O maior nível de escolaridade verifica-se entre as mulheres: 34,61% estão cursando uma faculdade, contra apenas 16,66% dos homens; 25% têm o terceiro grau completo, contra apenas 8,33% dos homens e 11,53% têm pós-graduação, contra apenas 2,77% dos homens. A classificação relativa à renda teve como parâmetro o salário mínimo federal, equivalente a R$200,00 e mostrou que 22,72% dos voluntários pesquisados têm renda entre dois e quatro salários mínimos; 19,31% recebem mais de 16 salários mínimos; 13,63% não têm renda declarada (incluindo-se aqui estudantes cursando o terceiro grau); 13,63% estão entre cinco e sete salários mínimos; 3,41%, entre oito e dez salários; 6,81%, entre onze e treze salários; 5,68%, entre 14 e 16 salários e, 3,41% não responderam. Nas faixas de renda até um salário mínimo, entre dois e quatro, entre cinco e sete, oito e dez e entre onze treze salários mínimos, os voluntários do sexo masculino são maioria; na faixa entre quatorze e dezesseis salários mínimos e mais de dezesseis salários, as mulheres são maioria, assim como na categoria dos que declararam renda nula ou não declararam. O item referente à motivação dos voluntários, que reflete o próprio objeto da pesquisa, permitiu respostas múltiplas, através de escolhas em ordem de importância, considerando-se, na apuração, até a sétima escolha. Prestar solidariedade humana foi a razão de maior escolha, com 20,23%, seguida de ser útil aos mais necessitados, com 16,66% e, logo a seguir, do exercício da cidadania, com 16,27% das escolhas. A razão religiosa e a prática de caridade, vêm em seguida, cada uma com 9,12%. A busca de auto-realização foi indicada por 8,73% e a ocupação do tempo, por 5,95%. Fazer amigos foi a razão apresentada por 4,36% dos voluntários e, atender ao chamado de um amigo, por 3,57%. Compensar alguma frustração e buscar reconhecimento social foram razões indicadas, cada uma, por 1,58% dos respondentes, para a realização de trabalho voluntário. Outras razões apresentadas, todas com o percentual de 0,40% foram: contribuir para a formação de adolescentes e jovens, contribuir para o desenvolvimento da própria prática educacional, contribuir para reduzir as diferenças sociais, contribuir para um mundo melhor, principalmente para os menos favorecidos, possibilidade de expandir o próprio potencial, reconhecer a significância das ONGs/AIDS no controle social e na melhoria da qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV/AIDS e retribuir o atendimento recebido. Quanto ao sentimento pessoal dos voluntários decorrente do trabalho que desenvolvem, também admitindo respostas múltiplas consideradas até a 9ª escolha, os resultados indicaram que 19,26% sentem-se mais felizes; 17,21%, mais realizados, 16,80%, mais cidadãos; 8,60% sentemse mais em paz com sua consciência e 7,78%, mais tranqüilos; 7,37% acham que melhoraram no relacionamento com a família e 6,69%, no relacionamento com os amigos; 4,91%% acham que passaram a ter menos tempo para a família e 0,41% acha que, embora tenha menos tempo, tem mais paciência com a família; 2,86% dizem ter menos tempo para o lazer. Abrir a visão, ampliar relacionamentos e perceber os próprios problemas menores em relação aos dos outros foram escolhas, cada uma, de 0,82% dos respondentes. As demais informações, cada uma com 0,41% de escolha foram: abre horizontes para procurar novos cursos, aprende muito, tem menos tempo para si, tem outra visão da vida, dá mais valor ao que tem em casa, é gratificante, sente-se mais gente, tem mais paz, sente-se mais preenchida, sente-se mais solidária, mais útil. Para 1,22%, nada mudou em conseqüência da realização do trabalho voluntário. Quanto aos resultados individuais, pode-se observar uma “tipologia de motivação dos voluntários”, que apresenta variações em função de faixa etária e sexo dos voluntários pesquisados. Com relação à faixa etária entre os 18 e 39 anos, verificou-se incidência bem maior de voluntários trabalhando na sexta-feira à noite, aos sábados e domingos, do que em relação aos voluntários a partir de 40 anos, que o fazem apenas entre segunda e sexta-feira, alguns o dia inteiro e outros pela manhã ou à tarde, embora, na sua maioria, trabalhem em mais períodos que os da faixa etária anterior. O exercício da cidadania, por exemplo, teve 20% de escolhas entre os pesquisados de sexo masculino de 18 a 39 anos, próximo ao percentual dos dois sexos, na faixa etária entre 39 e 77 anos – 17,9%, das mulheres e 18,51% dos homens – ficando o sexo feminino entre 18 e 39 anos, com apenas 11,11% de escolhas nesse aspecto. Por outro lado, 22,22% dos respondentes do sexo feminino entre 18 e 39 anos, indicaram a solidariedade humana como fator que os motiva para o trabalho voluntário, que foi indicado por apenas 16,60% dos homens nesta mesma faixa etária e 15,79% das mulheres e 11,11% dos homens compreendidos na faixa etária mais alta. Ser útil aos mais necessitados é um fator motivacional que parece ser mais próprio das mulheres, pois, nas duas faixas etárias apresentou percentuais bem mais altos que em relação ao sexo masculino – 19,04% entre 18 e 39 anos e 20% entre 40 e 77 anos, contra 13,33% e 14,81% dos homens na primeira e na segunda faixas etárias, respectivamente. Curiosamente, quanto às razões religiosas, o menor percentual referiu-se às mulheres entre 40 e 77 anos; voluntários de ambos os sexos da faixa etária mais baixa e os homens de 40 a 77 anos apresentaram o mesmo percentual de escolha – 11,11%. A busca de auto-realização teve baixo percentual de escolha pelos voluntários do sexo masculino compreendidos na segunda faixa etária – apenas 3,70%, enquanto as mulheres dessa faixa etária tiveram 8,42% de escolha, praticamente igual às escolhas masculinas da primeira faixa etária – 8,33%; quanto ao sexo feminino da faixa etária mais baixa, a escolha foi de 11,11%. Com relação aos sentimentos decorrentes da realização do trabalho voluntário, sentir-se mais feliz e mais realizado foram os fatores predominantes nas duas faixas etárias definidas e nos dois sexos, havendo variações mínimas: sentem-se mais felizes, 22,22% das mulheres entre 18 e 39 anos e, 18,36% da segunda faixa etária e 18,96% dos homens entre 18 e 39 anos e 20% dos que integram a segunda faixa etária. Sentem-se mais realizados, 20,66% das mulheres mais jovens e 19,38% das mais velhas e 12,06% dos homens até 39 anos e 20% dos que estão acima desta idade. Quanto ao aspecto da cidadania, os homens parecem valorizá-la mais que as mulheres: 22,41% dos homens entre 18 e 39 anos e 24% daqueles entre 40 e 77 anos sentem-se mais cidadãos como decorrência da realização do trabalho voluntário, o que é apontado por apenas 11,11% das mulheres da primeira faixa etária e 16,32%, da segunda. Comparando-se estes percentuais àqueles relativos ao exercício da cidadania apontado como fator de motivação para o trabalho voluntário, verifica-se que há uma coerência significativa: 11,11% dos respondentes do sexo feminino entre 18 e 39 anos e 17,9% na segunda faixa etária; e, 20% dos homens entre 18 e 39 anos e 18,51% entre 40 e 77 anos fizeram essa indicação. 5. CONCLUSÕES As diferenças motivacionais entre trabalhadores remunerados e voluntários aparecem claramente nas respostas obtidas através dos formulários e questionários aplicados a esta segunda categoria. Considerem-se, em primeiro lugar, as variáveis envolvidas no trabalho remunerado, tomando como base a Hierarquia das Necessidades, de Maslow (1954), na qual os dois primeiros degraus da pirâmide que a simboliza referem-se a necessidades fisiológicas e de segurança. Nestes dois primeiros estágios encontram-se as motivações primárias que levam as pessoas a buscarem um trabalho remunerado visando, através dele atender suas necessidades de alimento, abrigo, segurança, proteção contra perigos, doenças e outras incertezas. Essas necessidades primárias, de Maslow, encontram correspondência nos fatores higiênicos da Teoria dos Dois Fatores, de F. Herzberg (1959), como condições físicas de trabalho, salário e vida pessoal, referentes às necessidades fisiológicas. Já, as necessidades de segurança, enunciadas por Maslow, encontram em Herzberg, correspondência com a supervisão técnica e políticas administrativas e empresariais. Estes são fatores com os quais o indivíduo se depara no trabalho remunerado e sobre os quais não tem controle e o afetam psicologicamente. Segundo Herzberg, mesmo quando esses fatores são ótimos, apenas evitam a insatisfação das pessoas, não chegando a gerar satisfação e, nem mesmo, mantê-la elevada por muito tempo. É o caso, por exemplo, de um aumento salarial. Satisfaz no momento em que é recebido, mas, no mês seguinte já não faz diferença, deixando de ser uma motivação. No trabalho voluntário as políticas administrativas são mais flexíveis, propiciando maior liberdade e participação dos voluntários em todo o processo de trabalho, gerando mais facilmente, a satisfação das necessidades de auto-realização. É visto como uma possibilidade do indivíduo ter controle e sobre suas ações e maior liberdade para desenvolvê-las, o que pode provocar efeitos psicológicos satisfatórios. Em relação aos trabalhadores voluntários, verificou-se que os pesquisados, têm meios de assegurar o atendimento às suas necessidades primárias. Portanto, a motivação para desenvolverem o trabalho voluntário não se refere à busca de satisfação dessas necessidades. Vale ressaltar que as abordagens sobre motivação humana não se atêm ao conceito de necessidade, mas incluem o conceito de expectativa (Kanaane, 1999, p. 18) e assim, “é preciso considerar também em que grau o trabalhador percebe as condições existentes no ambiente de trabalho, como facilitadoras ou não, para o alcance de seus objetivos e de suas necessidades” (Kanaane, 1999, p. 18-19). Por ocasião dos contatos realizados para aplicação dos formulários e questionários, verificou-se que as condições físicas dos locais em que os voluntários desenvolvem suas atividades, nem sempre eram o que se pode considerar como ideais – espaços pequenos, exígüos até, com excesso de pessoas, acomodações inadequadas, um deles ainda em obras, pouca ventilação, inexistência de ar refrigerado, fluxo permanente de pessoas, interrupções constantes das atividades – mas nenhum dos voluntários sequer as citou e, muito menos as considerou como fatores de insatisfação ou obstáculos ao seu trabalho. Tal atitude por parte dos voluntários vem corroborar a afirmação de Kanaane (1999) de que “a motivação (...) corresponde às ações selecionadas pelo indivíduo na busca do alcance de suas necessidades (...)” (p. 19), se for levado em conta que nos locais onde se desenvolve o trabalho remunerado são constantes as reivindicações por melhores condições de trabalho, tomadas corriqueiramente como impeditivos do bom desempenho. Analisando o quadro de fatores motivacionais encontrado junto aos trabalhadores voluntários em relação à Teoria X e Y, de Douglas McGregor (1973), verifica-se que em nada correspondem às concepções da Teoria X, que caracteriza o trabalhador como indolente por natureza, sem ambição, egocêntrico, resistente a mudanças e incapaz de autocontrole e autodisciplina. O oposto dessas características pôde ser observado na pesquisa de campo, quando voluntários jovens, na faixa etária dos vinte anos, informaram dedicar, semanalmente, suas noites de sexta-feira, além de períodos do sábado e/ou do domingo, à realização de atividades voluntárias. Verificando-se, agora, o outro extremo de cada continuum em que os autores citados colocam sua teorias sobre motivação, podem ser analisadas as constatações que se seguem. A pirâmide de Maslow tem situadas nos três degraus superiores as necessidades sociais – referentes a associação, participação, troca de amizade, afeto e amor; de estima – que envolvem auto-apreciação, autoconfiança, necessidade de aprovação social e autonomia, cuja satisfação leva a sentimentos de valor, capacidade e utilidade; e as de auto-realização do próprio potencial e de permanente autodesenvolvimento. Essas necessidades encontram correspondência nos fatores motivacionais, ou intrínsecos, de Herzberg, que referem-se ao conteúdo do cargo e à natureza das tarefas que a pessoa desenvolve, e sobre os quais pode ter controle. Envolvem sentimentos de crescimento individual, de reconhecimento profissional e as necessidades de auto-realização que, no dizer de Chiavenato (2000), são produtos da educação e da cultura, sendo raramente satisfeitas na sua plenitude, pois o homem vai procurando gradativamente maiores satisfações e estabelecendo metas cada vez mais sofisticadas. Para ele, a necessidade de auto-realização é a síntese de todas as outras necessidades. É o impulso para o indivíduo utilizar o seu potencial de aptidões e habilidades, autodesenvolvimento e realização pessoal. São sentimentos que podem ser encontrados no trabalho voluntário e que resgatam a racionalidade substantiva do indivíduo, até agora pouco freqüente nas organizações empresariais, muitas das quais ainda não se apropriaram dos valores da sociedade pós-industrial, como emotividade, desestruturalização de tempo e de espaço, criatividade e flexibilização das relações de trabalho. Sob o foco da Teoria Y, de Douglas McGregor, está o homem que não tem desprazer inerente em trabalhar e para o qual o trabalho pode ser uma fonte de satisfação e recompensa quando é realizado voluntariamente. Revela que as pessoas têm motivação básica, potencial de desenvolvimento e capacidade para assumir responsabilidades, além de alto grau de imaginação e de criatividade na solução de problemas empresariais. São aspectos que puderam ser verificados nas respostas dos pesquisados quando se referiram aos fatores que os motivam ao trabalho voluntário. A busca de auto-realização, de novas relações de amizade e de reconhecimento social foram motivos explicitados por eles. Quanto aos sentimentos gerados pelo desenvolvimento do trabalho voluntário, os pesquisados relataram sentirem-se mais felizes, mais realizados, mais cidadãos, mais em paz com sua consciência, além de ter melhorado o relacionamento com a família e com os amigos. Referiram, ainda, a abertura de horizontes para busca de novos conhecimentos, a ampliação dos relacionamentos e o crescimento pessoal. Foi expressivo, também, o relato dos voluntários pesquisados quanto a fatores motivacionais relativos a solidariedade humana, religião e caridade, relatos que vão ao encontro do que Agnes Heller apud De Masi (2000) define como necessidades qualitativas, fundamentais ou radicais – necessidades de meditação, de introspecção, de amizade e de convivência. Verifica-se, mais uma vez, a presença dos valores imateriais da sociedade pós-industrial, representados pela ética, estética, emotividade, feminilização, além do capital intelectual. Pelo exposto, verifica-se que a motivação do trabalhador voluntário é bem diversa da que move o trabalhador remunerado que estaria preocupado, prioritariamente, com sua sobrevivência, com o atendimento a suas necessidades básicas. O trabalhador voluntário é automotivado para esta atividade, não carece de estímulos externos permanentes, como nas organizações empresariais; não precisa que lhe acenem com prêmios para que alcance metas; nem que sua jornada de trabalho seja controlada, pois ele desenvolve suas atividades a qualquer momento, seja dia ou noite e, até mesmo, nos finais de semana, conforme relataram. Sua recompensa – não material, mas espiritual – é o próprio trabalho. É importante, portanto, que as organizações empresariais percebam e se apropriem dos elementos da dinâmica do Terceiro Setor, a fim de encontrar, na razão substantiva, novos fatores de motivação para o desenvolvimento de suas atividades. NOTAS 1. Terceiro Setor – “... É composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental, dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia e do mecenato e expandindo o seu sentido para outros domínios, graças, sobretudo, à incorporação do conceito de cidadania e de suas múltiplas manifestações na sociedade civil” (Fernandes, 2000, p. 27). 2. Organizações não-governamentais – Entidades civis, sem fins lucrativos que, para efeito de enquadramento legal, podem constituir-se em associações ou fundações, definidas estas no inciso I do Art. 16 do Código Civil Brasileiro (2000) como “... pessoas jurídicas de direito privado: I – as sociedades religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, as associações de utilidade pública e as fundações”. 3. Racionalidade substantiva – “A racionalidade substantiva, ou de valor (Wertrationalitat), é determinada ‘independentemente de suas expectativas de sucesso’ e não caracteriza nenhuma ação humana interessada na ‘consecução de um resultado ulterior a ela’.” (Weber apud Guerreiro Ramos, 1989, p. 5). 4. Sociedade pós-industrial – segundo Bell apud De Masi, cinco aspectos definem a sociedade pós-industrial: “... 1) passagem da produção de bens para a economia de serviços; 2) a preeminência da classe dos profissionais e técnicos; 3) o caráter central do saber teórico, gerado da inovação e das idéias diretivas nas quais a coletividade se inspira; 4) a gestão do desenvolvimento técnico e o controle normativo da tecnologia; 5) a criação de uma nova tecnologia intelectual” (De Masi, 2000, p. 33). 5. Racionalidade formal e instrumental – “... a racionalidade formal e instrumental (Zweckrationalitat) é determinada por uma expectativa de resultados, ou fins calculados” (Weber apud Guerreiro Ramos, 1989, p. 5). 6. Sociedade industrial – é caracterizada, dentre outros, pelos seguintes aspectos: modo de produção industrial; concentração de grande massa de trabalhadores assalariados nas fábricas; progressiva urbanização e escolarização das massas; aumento da produção e de massa e crescimento do consumismo; conflitos entre empregados e empregadores, rígida hierarquia entre os vários países com base no Produto Interno Bruto, na propriedade das matérias-primas e dos meios de produção (De Masi, 2000). 7. Instituições pesquisadas – Aldeias Infantis - Casa Transitória; Associação Beneficente Rio Criança Cidadã; Associação de Apoio à Criança com Neoplasia de Rio de Janeiro – Casa Ronald McDonald; Associação de Educação Infantil Florescer; Associação Ressurgir – Escola de Família; Casa Espírita Sentimento; Casa Francisco de Assis; Centro Cultural Casa de Teatro; Centro Espírita Leon Denir; Círculo de Amigos do Menino Patrulheiro de Santa Teresa – CAMP; Congregação Espírita Francisco de Paula; Creche Cantinho Feliz; Cruzada Espírita Discípulos de Alan Kardec; Curso Pré-Vestibular Comunitário de Vila Isabel; Espaço Cultural Chico Belo; Ginásio Público |Hélio Pellegrino – CIEP 435; Grupo de Teatro Ângelus; Grupo Espírita da Fé – Casa de Caridade Irthes Terezinha; Grupo Pela Vidda (Valorização, Integração e Dignidade do Doente de AIDS); Hospital Universitário Pedro Ernesto; Igreja Nossa Senhora da Conceição e São José; Instituição Santa Clara; Lioness Clube de Santa Teresa; Matriz Nossa Senhora da Glória; Projeto Pró-Criança Cardíaca; Saúde Criança Renascer; Sociedade Espírita Cabana Antonio de Aquino; Viva Rio. REFERÊNCIAS BERGAMINI, Cecília Whitaker. Motivação nas organizações. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1997. BRASIL. Lei do Voluntariado. Disponível em <http://redeglobo.com/brasil500/ br500novo/educacao /conteudo_voluntariado.htm>. Acesso em 23/05/2001. BRUYNE, Paul de; HERMAN, Jacques; SCHOUTHEETE, Marc de. Dinâmica da pesquisa em ciências sociais. Trad. Ruth Joffily. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1977. CARDOSO, Ruth. Fortalecimento da sociedade civil. In: IOSCHPE, Evelyn Berg. 3º setor: desenvolvimento social sustentado. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. p. 7-12. DE MASI, Domenico. A era pós-industrial. Painel apresentado na COPPE-UFRJ, em 28 maio 1999. Disponível em <http://www.painel /painel 000020. html>. Acesso em 17 jul. 2001. DE MASI, Domenico. A sociedade pós-industrial in: DE MASI, Domenico(Org). A sociedade pósindustrial. Trad. Anna Maria Capovilla e outros. 3. ed. São Paulo: SENAC, 2000. Enxugamento da máquina pública faz Terceiro Setor crescer. Administração Acadêmico. 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