Memórias de um orientador de tese:
um autor relê sua obra de faz um lustro
Claudio de Moura Castro
O editor desta segunda edição do livro perguntou-me se gostaria de introduzir consertos
ou modificações. Sem reler, preferi não bulir no texto, inicialmente, por respeito ao autor
de faz 25 anos. Além disso, poderia me entusiasmar e começar a remendar o texto. Mas o
argumento preponderante é que o teste do ensaio é a sua possível atualidade e a
sobrevivência dos problemas que descreve. Se o recauchutasse, os leitores não saberiam
onde está o novo e onde está o velho.
Reli com grande trepidação o texto, confesso, morrendo de medo de achar uma porcaria.
Não achei. Será falta de modéstia ou objetividade? Que decida o leitor, já que a idéia de
republicá-lo tampouco foi minha.
Certamente, há trechos obsoletos, pela morte morrida de alguns temas contra os quais
descarrego minha billis. Assim foi com as chamadas “análises de sistema” da época, uma
farsa, pois não passavam de prescrições ingênuas fantasiadas de análise.
Há um tema onde mudaram as etiquetas mas não mudaram os problemas. Como não
havia doutorados, a discussão se refere às teses de mestrado. Naquele momento tais teses
podiam ser tão alentadas quanto uma tese de doutorado hoje. De resto, já então não
tinham menos ambições – e em certos casos, méritos – do que doutorados na Europa e
Estados Unidos.
Talvez o ponto mais curioso que a redação precedeu a idade das trevas ideológicas em
que mergulhou a educação e outras áreas sociais a partir do fim da década de setenta. O
ensaio reage a um momento onde o pecado mortal das pesquisas na educação era a
irrelevância e falta de expressão dos problemas escolhidos para assunto das teses.
Tomavam-se aspectos menores, testes de novos métodos de ensinar esta ou aquela
disciplina. Ou descrições de assuntos ou pessoas irrelevantes.
Mas, de repente, a ideologia desabou no país. A teoria da dependência, o a teoria da
reprodução, os economistas neo-marxistas radicais, a teoria do imperialismo cultural e
todas as outras explicações conspiratórias da nossa realidade. E vinha tudo empapado em
fervor ideológico, em fórmulas prontas e em explicações simples – simples demais.
Todas tinham um fundo de verdade, todas punham o dedo em problemas importantes.
Mas ao se transformarem-se em religiões fundamentalistas, perderam a capacidade de
serem testadas e de se auto-renovarem.
Meus colegas da educação se enfureceram quando comentei publicamente que a temática
havia saltado do tricô para a luta de classe, sem parar na educação. Para estas novas
modas, meu ensaio pouco dizia, imagino. Tinha a falsa neutralizade do neo-positivismo.
Não bradava contra tudo e contra as forças opressoras. Sugeria números e estatísticas.
Pelo pouco que entendo, o vendaval ideológico amainou por todas as partes – umas mais
do que outras. Já se pode falar em dados, evidência e números com impunidade. O
discurso racional e a busca desapaixonada de explicações e a verificação empírica estão
deixando de ser crime contra a pátria.
Portanto, imagino que o ensaio é hoje mais atual do que há dez ou vinte anos atrás. Cabe
ao leitor julgá-lo.
Download

um autor l sua obra de faz um lustro