Implicações da adoção das Compras Públicas Sustentáveis de Madeira Nativa nos Processos de
Gestão e no Controle Social: o caso do Estado de São Paulo
Autoria: Raquel Sobral Nonato, Anny Karine de Medeiros, Zilma Borges de Souza
O artigo tem por objetivo analisar a gestão das Compras Públicas Sustentáveis de Madeira Nativa e
suas implicações para a transparência governamental, o controle social e a legalidade do setor. Parte-se
de revisão teórica para realizar um estudo de caso da experiência do Estado de São Paulo, com
levantamento de dados via Lei de Acesso à Informação, visitas de campo e entrevistas semiestruturadas
com gestores públicos. A principal contribuição do estudo é apontar as potencialidades e os desafios
impostos ao setor público pelas mudanças nos processos de gestão e no controle social induzidas pelas
compras públicas sustentáveis.
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Introdução
É possível perceber nos últimos anos uma série de ações públicas surgidas com o intento de
reduzir os padrões de consumo não sustentáveis da sociedade atual, seja por meio de legislação e
regras, como também de controle e fiscalização sobre diversos tipos de negócios. Na operação do
próprio poder público, as Compras Públicas Sustentáveis (CPS) vêm sendo adotadas e incentivadas,
como parte destas ações (DE BRUNDTLAND, 1991, BIDERMAN et al., 2011). Trata-se de uma
estratégia para que o governo contrate bens e serviços que levem em consideração o tripé da
sustentabilidade, ou seja, as dimensões ambiental, econômica e social (ELKINGTON, 2004) com vistas
à maximização dos benefícios para a sociedade no médio e longo prazo. Neste sentido as CPS
consideram em suas decisões, custos extrínsecos para além dos critérios de qualidade e preço
(CONWAY, 2012), sejam estes critérios de durabilidade, economia energética, ou mesmo alternativas
para produtos sob risco de esgotamento.
Um marco no caso brasileiro foi a Instrução normativa n°1, de 2000, elaborada pelo Ministério
do Planejamento, Orçamento e Gestão, que estabelece e define critérios e práticas de sustentabilidade
pela administração pública federal.
Junto com esta normatização, a questão florestal aparece como pauta relevante para a adoção das
Compras Públicas, compreendendo, de um lado, a emergência do poder público em fomentar práticas e
políticas para garantir a preservação ambiental frente às mudanças climáticas e ao avanço do
desmatamento, e, por outro, em incentivar o desenvolvimento econômico e social em âmbito local e
territorial, a partir do uso e da exploração responsável dos recursos advindos da atividade florestal.
Especificamente em relação à madeira, o governo, em todos os seus níveis, e regiões, e,
sobretudo o estado de São Paulo, é apontado como um dos principais consumidores de madeira nativa,
utilizadas para fins diversos (DOF, 2012; VILELLA et al, 2011).
A compra de produtos nativos ilegais, é, por outro lado, uma realidade, sendo a falta de controle e
transparência das transações realizadas, um dos principais gargalos, somados à falta de
responsabilização dos agentes e gestores públicos.
Diante dessa realidade, o estado de São Paulo estabeleceu nos últimos anos uma série de normas
e leis para regularizar a aquisição de forma direta ou indireta de madeira nativa em seus fluxos
administrativos, bem como no processo de compras públicas. Dentre elas, destaca-se a utilização da
Bolsa Eletrônica de Compras do Estado de São Paulo (BEC-SP), o CADMADEIRA instituído pelo
decreto 53.047/2008 e reconhecido como passo importante para a consolidação de um arcabouço
institucional envolvendo a temática da madeira de origem amazônica e o Protocolo Madeira é Legal,
que busca fomentar a interação entre atores envolvidos na produção e no consumo. Estas
normatizações serão discutidos neste artigo.
Assim, aponta-se a necessidade de aprofundar as discussões sobre os desafios impostos à gestão
das compras públicas, sobretudo no tocante a produtos e subprodutos oriundos da Amazônia, uma vez
que esta região detém cerca de um terço das reservas mundiais de florestas tropicais úmidas do mundo
e presta uma ampla gama de serviços florestais para a sociedade (UEHARA, 2012).
Partindo deste cenário, definiu-se como objetivo de pesquisa analisar a gestão das Compras
Públicas Sustentáveis de Madeira Nativa e suas implicações para a transparência governamental, o
controle social e a legalidade do setor. Para atingir tal objetivo foi realizada revisão bibliográfica sobre
controle social, transparência e compras públicas sustentáveis que subsidiaram o estudo de caso da
madeira de origem amazônica e seus subprodutos, consumida pelo estado de São Paulo (SP).
A escolha de São Paulo como amostra de pesquisa se deu a partir da constatação de que o estado
é o principal destino da madeira nativa amazônica, sendo responsável pelo consumo de 17% da
produção, sobretudo para a construção civil (VILELLA et al, 2011). Especificamente sobre o estudo de
campo, foram realizadas análises de dados a partir de levantamento de dados primários e secundários,
2
obtidos através da Lei de Acesso à Informação, em razão da não disponibilidade dos dados necessários.
Esta indisponibilidade se originou da falta de organização de informações sobre as CPS e da falta de
estruturação dos dados existentes. Estes aspectos e a necessidade de uso da Lei de Acesso à Informação
levaram à constatação de que os gestores públicos e atores de interesse no tema, precisam fazer os
mesmos caminhos para obter informações confiáveis. Isto se revelou como um dos resultados desta
pesquisa, que aponta direções para a obtenção do controle social sobre o processo das compras públicas
sustentáveis.
A partir das informações obtidas e análises desenvolvidas, foram realizadas entrevistas
semiestruturadas com gestores das seguintes unidades do governo do estado de São Paulo: Secretaria
da Fazenda, Secretaria do Meio Ambiente, Secretaria da Administração Penitenciária e Companhia
Paulista de Obras e Serviços. As entrevistas permitiram demonstrar a visão dos gestores e o cotidiano
da administração pública estadual, o que possibilitou uma aproximação mais concreta dos avanços e
desafios que envolvem a aprendizagem do processo das compras públicas sustentáveis.
O artigo está dividido em três partes, além desta introdução e das considerações finais. A
primeira seção se dedica a apresentar e contextualizar as Compras Públicas Sustentáveis. Em seguida
desenvolve uma fundamentação teórica sobre controle social, com enfoque para a questão da
transparência governamental, que se mostrou relevante para nortear a pesquisa de campo. A segunda
seção descreve a metodologia de pesquisa, com detalhamento das etapas previstas e alternativas que
precisaram ser desenhadas no decorrer do estudo, em razão da não disponibilidade dos dados
necessários. Em seguida, são demonstrados os resultados da pesquisa sobre o estado de São Paulo.
A contribuição central do estudo está em apontar as potencialidades e os atuais desafios impostos
ao setor público, ao incorporar as compras públicas sustentáveis em seu cotidiano e garantir maior grau
de confiança no consumo de madeira nativa por parte do setor público por meio do controle social.
Pretende-se ainda gerar conhecimento para ampliar alternativas viáveis para a preservação dos
recursos florestais, tendo no poder de compras do Estado seu principal vetor. Espera-se dessa forma
contribuir para uma análise de como o Estado pode influenciar positivamente a cadeia legal dos
produtos florestais de origem amazônica, por meio das compras públicas sustentáveis.
1. Contextualização sobre Compras Públicas Sustentáveis
As compras do setor público, de maneira geral, envolvem grandes volumes de recursos
financeiros, sendo que atualmente as compras do governo representam de 10 a 16% do Produto Interno
Bruto (PIB) do Brasil (ICLEI, 2008). Gradativamente tem-se destacado o papel que as compras
públicas podem cumprir para o desenvolvimento local e a sustentabilidade (BRAMER & WALKER,
2011; BIDERMAN et al, 2011; CALDAS e NONATO, 2013), revelando potencialidades destas
políticas, e trazendo novas demandas de controle social e de estruturação de processos administrativos
para sua efetivação.
O incentivo ao consumo sustentável, no caso dos produtos de origem florestal, tem sido
considerado uma das estratégias que pode propiciar o desenvolvimento local, já que implica na
inserção de tecnologias de produção e extração mais sustentáveis, na ampliação de acesso ao mercado,
e na capacitação das comunidades, gerando empregos e renda para estas, bem como a preservação da
floresta. Reforçando essa noção, para muitos estudiosos, os modos de exploração extrativista da
floresta (e, portanto, sustentáveis) são menos invasivos, em certa medida, do que a ocupação que ocorre
por meio da expansão da fronteira agropecuária, e, portanto, geram menor degradação ambiental
(BIDERMAN et al, 2011).
Este movimento também é percebido em outros países. O Reino Unido desponta como pioneiro
no processo de compras sustentáveis. Em 2005, na condição de quarto produtor mundial de madeira no
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mundo, promoveu incremento da demanda doméstica por madeira de origem legal e sustentável por
meio da implementação de sistemas de compras públicas sustentáveis, prevendo mecanismos de
verificação de origem e certificação (SECRETARIA ESTADUAL DE MEIO AMBIENTE, 2012).
Outras experiências podem ser encontradas na União Europeia, Austrália e Canadá (BIDERMAN at
al., 2011).
No tocante aos critérios envolvendo as CPS, Bramer & Walker (2011:02) elaboraram um estudo
sobre práticas de CPS a partir de uma amostra de 280 organizações que realizam contratações publicas
de 20 países, com responsabilidade coletiva para as despesas no montante de U$ 45 bilhões. Entre as
organizações que prevêem uma definição sobre CPS em sua rotina de trabalho, 50% enfatiza questões
da compra verde ou ecológica, enquanto que o restante inclui também questões sociais, ambientais e
econômicos.
No Brasil, o decreto nº 7.746 de 2012 consolida e amplia o Programa de Contratações Sustentáveis,
do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), e se coloca como avanço na referida
temática. Esse decreto pretende incentivar as compras governamentais sustentáveis, dando preferência
aos produtos criados em processos de fabricação sustentáveis, por meio das seguintes diretrizes que
devem guiar os editais: (1) menor impacto sobre recursos naturais como flora, fauna, ar, solo e água;
(2) preferência para materiais, tecnologias e matérias-primas de origem local; (3) maior eficiência na
utilização de recursos naturais como água e energia; (4) maior geração de empregos, preferencialmente
com mão de obra local; (5) maior vida útil e menor custo de manutenção do bem e da obra; (6) uso de
inovações que reduzam a pressão sobre recursos naturais; e (4) origem ambientalmente regular dos
recursos naturais utilizados nos bens, serviços e obras.
No plano jurídico, entre as normas que atualmente regem o processo de aquisição governamental
no Brasil estão a Lei de Responsabilidade Fiscal (n° 101/200) e a Lei de Licitações e Contratos
(8.666/93). Alterada em 2010 (Lei 12.349/10), o art. 3° da Lei 8.666/93 dispõe que a função da
licitação é também de promover o desenvolvimento inclusivo, de forma a direcionar a demanda do
Estado para o desenvolvimento nacional sustentável. Somado a isso, alguns mecanismos institucionais
vêm sendo criados com o objetivo de inserir as CPS de maneira transversal na gestão das políticas
públicas. No âmbito federal pode-se citar a Política Nacional de Mudanças Climáticas, que estabelece
a preferência nas contratações públicas para propostas que propiciem maior economia de energia, água
e outros recursos naturais, a redução da emissão de gases de efeito estufa e de geração resíduos (art. 6º,
XII). Outras ações proeminentes nesse sentido são o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, Plano
Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, Plano de Aquisição de Alimentos (PAA) e Plano
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que possuem como eixo articulador as compras públicas
com vistas ao fomento à economia local.
No entanto, questões como o enrijecimento das normas, morosidade no processo de gestão,
opacidade institucional na organização e na disponibilização dos dados sobre os processos licitatórios e
a ausência de informação sobre a viabilidade jurídica de inserir as CPS no setor público são, ainda,
apontados como grandes entraves para efetivar práticas inovadoras no setor. No caso brasileiro, a
criação do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) exemplifica o contexto para a flexibilização
da normativa e práticas inovadoras na gestão das compras públicas. Instituída pela Lei n° 12.462 de
2011 e implementada pela urgência em realizar as obras de infra-estrutura da Copa do Mundo de 2014
e Olimpíadas de 2016, dispõe, entre outras coisas, sobre a prioridade para os meios eletrônicos de
contratação, a inversão de fases entre habilitação e julgamento, e previsão de certificação ambiental
como requisito para os fornecedores vencedores.
Como consequência das questões acima apontadas, pode-se afirmar que ao incorporar a estratégia
de compras públicas sustentáveis na rotina do setor público, é pressuposto a inclusão de novos atores,
tais como fornecedores e capacitadores do corpo burocrático, bem como gera uma necessidade de
redesenhos de processos de gestão no setor público, a exemplo do que ocorre na criação de bancos com
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“cadastros positivos”, no desenvolvimento de ferramentas de verificação de origem do produto, dentre
outros.
Assim é possível identificar avanços tanto em termos de criação de mecanismos, como na
identificação de critérios de compras públicas sustentáveis, inclusive no que se refere a questão da
identificação de origem de produtos e subprodutos de origem florestal. No entanto, a questão requer
maiores reflexões tanto do ponto de vista estrutural, ou seja, a partir da observação da atual arquitetura
das compras públicas no Brasil, sobretudo no que se refere aos caminhos necessários para a
modernização da Lei 8.666/93, como do ponto de vista da compreensão dos atuais processos de gestão,
redesenhando modelos e buscando alternativas. Além disso, tais mudanças organizacionais induzidas
pela inserção das CPS requerem a criação de mecanismos de transparência que acompanhem a sua
complexidade e, ao mesmo tempo, promovam o controle social. A discussão sobre as formas de
controle de controle social das CPS de madeira nativa, sobretudo por meio de instrumentos de
transparência governamental, será desenvolvida na próxima seção.
2. Importância da Transparência governamental para o Controle Social
A priori, o presente artigo reconhece que as informações que o governo reporta à sociedade são
instrumentos que promovem o controle social (CORBARI, 2004), ao garantir transparência aos atos
públicos. Como afirma Bobbio (1992), a transparência governamental é condição necessária, apesar de
não suficiente, para que se efetive a ordem democrática, uma vez que a democracia pode ser entendida
como “o governo do poder visível” (BOBBIO, 1992: 83). Essa noção reforça a ideia de que, em
governos democráticos, os atos dos agentes públicos devem ser devidamente informados à sociedade,
para que esta seja capaz de exercer o controle social. Neste sentido, a transparência pública é tema que
vem ganhando destaque ao longo dos anos, tanto no cenário nacional quanto internacional. Segundo o
Portal da Transparência (2013), a transparência pública permite o controle social, constituindo-se como
mecanismo de capacitação do cidadão, que passa a ter informações (e, portanto poder) sobre a gestão
pública, que por sua vez passa a ser cada vez mais fortalecida (PORTAL DA TRANSPARÊNCIA,
2013).
Vindo a complementar a busca por transparência como instrumento de controle social, outro
importante marco é a Lei de Acesso à Informação - LAI, Lei Federal nº 12.527 em vigor desde maio de
2012 e objeto do presente artigo. A LAI foi aprovada com a finalidade de permitir acesso a
informações públicas, buscando reverter o quadro de baixa transparência das informações, ao permitir
seu acesso de forma mais direta que os meios até então existentes, favorecendo a transparência por
meios digitais. Segundo o Relatório de Pedidos de Acesso à Informação e Solicitantes, no período de
junho de 2012 a maio de 2013, foram acionados 86.266 pedidos de informações; destes, 98,6% foram
atendidos no prazo determinado (PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, 2013). Sobre as características
dos pedidos, o referido relatório destaca que finanças, administração pública e economia, representam
juntos, 32,87% de todas as solicitações. Os pedidos estão concentrados na região sudeste (51,94%) e a
ferramenta mais utilizada para obtenção da resposta é o pedido digital (email), correspondendo a
95,56% dos casos (PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, 2013).
Pelos dados apresentados é possível conceber que os pedidos realizados por meio digital
convergem para uma nova realidade social pautada pelas novas Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs), que, ao mesmo tempo em que se tornam ferramentas de acesso imediato e
dinâmico, disseminam a necessidade de cada vez mais informações. Entretanto, a recente aprovação da
LAI, somada a indefinição dos dados a serem disponibilizados e número reduzido da equipe
responsável pelo programa, tornam esta realidade ainda muito distante.
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Antes destas, a Lei Federal nº 10.650 de 2003 já configurava importante avanço, apesar de não tão
disseminada. Esta lei dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e
entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). Além de exigir que alguns
dados sejam publicados sistematicamente pelos órgãos e gestores do Sisnama, a lei garante o acesso às
informações para qualquer indivíduo, mas mediante requerimento escrito.Estas leis reforçam uma
noção que deve ser muito clara: devido às dimensões continentais do país e à complexidade política e
social dos mais de cinco mil municípios existentes é indispensável que haja incentivo permanente à
participação social, a fim de que os cidadãos possam tomar parte no controle dos gastos públicos e
colaborar, assim, com a gestão pública. Este é um aspecto cultural e relacionado à percepção de
validade da iniciativa individual ou coletiva para controle social, que requer investimento planejado de
incentivo à mudança de mentalidade sobre a participação política. (PORTAL DA TRANSPARÊNCIA,
2013).
3. Estudo de Caso: Transparência no consumo público de madeira de origem amazônica no
Estado de São Paulo.
Tratando especificamente de transparência das compras públicas em madeira, a ilegalidade dos
produtos nativos, como apontado por diversos estudos e movimentos sociais, é, pelo contrário,
incentivada por uma série de fatores, sendo a falta de controle e transparência das transações realizadas
um dos principais gargalos, somadas à falta de responsabilização dos agentes e gestores públicos.
Alguns destes fatores funcionam como limitadores, pela dificuldade da gestão dos sistemas e
processos, que mesmo nos casos nos quais os objetivos dos processos sejam bem definidos, acabam
sendo ineficazes para seus propósitos.
Pode-se citar, no caso da madeira, o exemplo do Documento de Origem Florestal (DOF), que
embora represente evidente avanço no controle dos produtos e subprodutos florestais de origem nativa
da flora brasileira, apresenta fragilidades que permitem que grande quantidade de madeira de origem
ilegal seja “esquentada”, ou seja, adquira caráter legal por meio de procedimentos irregulares de
inserção no sistema de controle (Sistema DOF) e seja, posteriormente, comercializada como madeira
legal. Esta situação é amplamente divulgada por meios de comunicação e reconhecida pelas
autoridades do Ministério do Meio Ambiente (ADEODATO et al, 2011).
A Amazônia é uma das regiões estratégicas mais importantes nas discussões sobre
desenvolvimento sustentável, uma vez que possui o maior bioma nacional, detendo cerca de um terço
das reservas mundiais de florestas tropicais úmidas do mundo, contendo ainda cerca de 2.500 espécies
de arvores (UEHARA et al, 2012). O estudo realizado focalizou o consumo público de produtos e
subprodutos madeireiros de origem amazônica realizado pelo Estado de São Paulo, uma vez que é o
maior consumidor de madeira nativa do país, conforme dados disponibilizados no Relatório do
Documento de Origem Florestal (DOF, 2012) e evidenciados pela Figura 01.
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Figura 01: Destino da madeira serrada da Amazônia Legal (%) em 2010
Fonte: Relatório do Documento de Origem Florestal (2012)
Diante dessa realidade, o estado de São Paulo estabeleceu nos últimos anos uma série de
normas e leis para regularizar a aquisição de forma direta ou indireta de madeira nativa em seus fluxos
administrativos, bem como no processo de compras publicas. Dentre elas, destaca-se a utilização da
Bolsa Eletrônica de Compras do Estado de São Paulo (BEC-SP), que tem um sistema que diferencia
(positivamente) empresas sustentáveis nos processos de compras públicas, por meio do Cadastro de
Comerciantes de Madeira Nativa do Estado de São Paulo, o CADMADEIRA inserido pelo decreto
53.047/2008 e reconhecido como passo importante para a consolidação de um arcabouço institucional
envolvendo a temática da madeira de origem amazônica. Trata-se de um instrumento de adesão
voluntária das empresas que comercializam produtos nativos, mas de natureza obrigatória para quem
deseja comercializar madeira destinada a obras públicas do Estado e alguns de seus municípios. Sobre a
operacionalização do sistema, não basta ser cadastrada para ter o registro validado. A empresa deve
obedecer a quatro pré-requisitos: (1) não ter multa relacionada à (transações com) madeira, (2) estar
inscrita no Cadastro Técnico Federal (mantido pelo IBAMA), (3) comprovar que está regularizada na
Junta Comercial de São Paulo e (4) operar regularmente o sistema DOF (VILELLA et al, 2011).
Somada as ações promovidas pelo CADMADEIRA, ações de fortalecimento entre os entes
públicos e privados estão sendo realizados no esforço de promover um ambiente de confiança entre a
produção e o consumo da madeira nativa estão sendo realizadas no estado. Motor importante desse
movimento é o protocolo Madeira é Legal, assinado em março de 2009 por um grupo de 23
instituições, reunindo setor produtivo, organizações não governamentais, poder público e centros de
pesquisa. Com foco no mercado de São Paulo, a iniciativa incorporou o Cadmadeira e o DOF ) e
começou a desenvolver uma série de ações com objetivo de induzir práticas sustentáveis em favor da
conservação e do desenvolvimento econômico da Amazônia (VILELLA et al, 2011).
Cabe ressaltar que os resultados de compras públicas feitas pelo catálogo da Bolsa Eletrônica de
Compras do Estado de São Paulo (BEC-SP) são divulgados pelo governo do estado a cada dois anos,
período que pode ser considerado longo, sobretudo para efeitos de controle social. Para identificar o
volume, as formas e os usos dos produtos e subprodutos de madeira nativa consumidos pelo estado de
São Paulo, a presente pesquisa promoveu um levantamento de dados junto aos órgãos públicos, a
descrição da pesquisa e apresentação dos resultados prosseguirão nas seções subsequentes.
7
3.1 Procedimentos e métodos de coleta de dados
A percepção do potencial de preservação de florestas nativas por meio do reforço da legalidade
da madeira de origem amazônica levou a novas questões a serem investigadas nesta pesquisa, como o
detalhamento da cadeia de custódia da madeira, desde sua extração até o consumo final, concentrado na
região sudeste e com grande volume de compra pelo poder público.
A fim de desvendar qual o volume de madeira de origem amazônica consumido pelo poder
público em São Paulo, o primeiro passo foi acionar o portal de transparência estadual e analisar
informações a respeito de execução e balanço orçamentários governamentais por meio do Sistema
Integrado de Informações Físico-Financeiras – Siafísico/SP, considerando que este portal poderia
disponibilizar as informações necessárias e correspondendo, assim, com um mecanismo de
transparência governamental ativa incentivado pela LAI.
O portal Siafísico/SP disponibiliza informações a respeito da execução orçamentária
governamental, desagregando tais informações por secretaria e tipo de receita ou despesa. As
informações disponibilizadas, por outro lado, contam com duas ordens de limitação de acesso: a
primeira é a dificuldade de se obter e tabular as informações, dado que são disponibilizadas em
arquivos não editáveis (de extensão .pdf), e em diferentes páginas de navegação, o que dificulta a
comparação e análise de variáveis distintas. A segunda ordem de limitação de acesso é a desagregação
insuficiente de informações, dado que os demonstrativos financeiros apontam receitas e despesas
globais, detalhadas por despesas realizadas com materiais e serviços, e enquanto materiais, por grupos
de natureza semelhante. Assim, a informação sobre madeira de origem amazônica aparece mesclada a
outros materiais, como por exemplo, ferro ou MDF, inviabilizando aferir precisamente os recursos
destinados à compra de madeira. Neste contexto, os dados disponíveis não responderam ao objetivo da
pesquisa.
A partir de então, o levantamento de dados ocorreu por meio da busca espontânea de editais
publicados em Diário Oficial que previsse a aquisição de produtos em madeira. Utilizou-se como
critério de seleção das secretarias uma pesquisa prévia de licitações de ampla concorrência, disponíveis
no site oficial do governo. Assim, foi realizada listagem de todas as secretarias com processos
licitatórios finalizados que envolviam produtos e subprodutos de madeira em 2012, levando em
consideração que, uma vez finalizados, tais processos resultariam em compra de madeira e permitiriam
o mínimo controle das informações contratadas.
As secretarias questionadas segundo tal critério foram: Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano – CDHU; Secretaria da Administração Penitenciaria; Secretaria da Agricultura e
Abastecimento; Secretaria da Educação; Secretaria da Fazenda; Secretaria da Gestão Pública;
Secretaria da Habitação; Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania; Secretaria da Logística e
Transporte; Secretaria da Segurança Pública; Secretaria do Desenvolvimento Social; Secretaria do
Saneamento e Recursos Hídricos.
Esse processo foi importante para estabelecer um panorama inicial sobre quais órgãos estaduais
previam a compra direta ou indireta do referido produto (madeira). Contudo, as informações
disponíveis ainda não contemplam a descrição pormenorizada sobre o volume e os recursos
despendidos ao objeto de estudo.
Diante dessa realidade, foi acionada à Lei de Acesso à Informação, com o objetivo de obter
dados mais detalhados diretamente com os órgãos levantados na etapa anterior. Especificamente sobre
esse processo, o pedido obedeceu aos seguintes passos:
Cadastramento: Ao acessar o portal estadual que atende aos pedidos da LAI
(www.sic.sp.gov.br/Cadastro.apx), é possível realizar cadastro via Pessoa Física ou Pessoa Jurídica. Os
dados obrigatórios para o preenchimento são: Nome Completo, Tipo e número de Identificação (RG,
CPF, etc.), email ou endereço completo. Sexo, data de nascimento, escolaridade, profissão e telefone
8
são dados de preenchimento opcional. A presente pesquisa optou por realizar cadastramento declarando
tão somente os dados da instituição de pesquisa e correspondente CNPJ, sem preencher os dados não
obrigatórios.
Solicitação: Para registrar o pedido de informação, é necessário identificar o órgão/entidade
responsável pela informação, escolher a forma do recebimento da resposta (retirada no órgão,
recebimento por email ou correio) e redigir a pergunta. Cabe destacar que só é possível realizar uma
pergunta por solicitação. Dessa forma, as questões foram enviadas as secretarias segregadamente. As
solicitações da pesquisa corresponderam em três perguntas para cada secretaria enunciadas da seguinte
foram as destacadas pela Figura 01.
Protocolo: Ao final, foi gerado um número de protocolo para o acompanhamento da solicitação
encaminhada.
Nº
Pergunta
0
Qual foi o volume de
madeira consumido
pelo governo do
estado de São Paulo
no período de 2009 a
2012, ano a ano?
1
Qual foi o volume de
madeira consumido
em sua secretaria, de
forma direta ou
indireta, no período
de 2009 a 2012, ano a
ano?
2
Qual foi o montante
de recursos
financeiros utilizados
para compra de
madeira em sua
secretaria, de forma
direta ou indireta, no
período de 2009 a
2012, ano a ano?
Detalhamento
Em quais formas?
Qual volume em obras?
Qual volume de recursos em materiais?
Qual volume de recursos em serviços?
Há especificação para madeira descrita no
contrato? Em caso afirmativo, qual
especificação?
Em obras
Em materiais
Em serviços
Especificamente sobre madeira de origem
amazônica
Há especificação para madeira descrita no
contrato? Em caso afirmativo, qual
especificação?
Em obras
Em materiais e serviços
Especificamente sobre madeira de origem
amazônica
Observação
Especificamente para
secretarias da
Fazenda e Gestão
Todas as secretarias
com processos
licitatórios
finalizados que
envolviam produtos e
subprodutos de
madeira em 2012
Todas as secretarias
com processos
licitatórios
finalizados que
envolviam produtos e
subprodutos de
madeira em 2012
9
Nº
3
Pergunta
Detalhamento
Observação
Qual o consumo
(volume e montante
de recursos
financeiros)
consumido em sua
secretaria, de forma
direta ou indireta, dos
seguintes
subprodutos, período
de 2009 a 2012?
1. Madeiras em toras;
2. Toretes;
3. Postes não imunizados;
4. Escoramentos;
5. Palanques roliços;
6. Dormentes;
7. Estacas e mourões;
8. Achas e lascas;
9. Pranchões desdobrados com motosserra;
10. Bloco ou file, tora em formato poligonal,
obtida a partir da retirada de costaneiras;
11. Madeira serrada sob qualquer forma,
faqueada ou em lâminas;
12. Dormentes e postes na fase de saída da
indústria.
Todas as secretarias
com processos
licitatórios
finalizados que
envolviam produtos e
subprodutos de
madeira em 2012
Figura 02: Questões enviadas às secretarias paulistas por meio da LAI
Fonte: autoria própria.
O desenvolvimento da pesquisa levou a caminhos antes não traçados na definição da metodologia
de pesquisa a ser adotada, que são relativos às dificuldades que qualquer indivíduo ou organização
teriam para acessar as informações sobre as compras públicas de madeira no estado de São Paulo. As
limitações inicialmente encontradas permitem afirmar que vários processos comumente adotados pelos
órgãos do estado não têm significado claro para quem os realiza. Além disso, observou-se que vários
dos órgãos em seus editais de compras exigiam informações e documentações desnecessárias, a
exemplo do Autorização de Transporte de Produto Florestal (ATPF), que não possui validade jurídica
desde 2006. Dessa forma, funcionam como barreiras para a efetivação de determinadas compras
públicas, mas não servem ao controle social.
3.2 Discussão dos resultados da LAI
O primeiro ponto a ser destacado corresponde ao número de redirecionamentos no processo de
atendimento das solicitações de informação. A Figura 02 destaca as secretarias e os correspondentes
órgãos para os quais as informações foram redirecionadas.
Órgão original
Redirecionado para
Data
Motivo
Secretaria da
Gestão Pública
Central de Atendimento ao Cidadão
15/05/2013
Não explica
Secretaria da
Fazenda
Central de Atendimento ao Cidadão
15/05/2013
Não explica
10
Órgão original
Redirecionado para
Data
Motivo
Secretaria de
Habitação
Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano – CDHU
15/05/2013
Não explica
Secretaria da
Logística e
Transporte
Central de Atendimento ao Cidadão
20/05/2013
Não explica
Secretaria
Estadual de
Saneamento e
Recursos
Hídricos
Central de Atendimento ao Cidadão
20/05/2013
Não explica
Figura 03: Redirecionamentos entre secretarias paulistas
Fonte: autoria própria.
O Decreto estadual n. 58.052/2012 prevê redirecionamento de questionamentos dirigidos aos
órgãos públicos paulistas, uma vez que o pedido pode ser feito a qualquer secretaria. Contudo, este não
altera a contagem do prazo - não sendo superior a 20 dias, a contar da data do protocolo da solicitação
resposta da referida solicitação, podendo ainda ser prorrogado por mais 10 dias, mediante justificativa
do órgão requerido.
A Figura 02 ainda permite analisar que cinco das secretarias redirecionaram as questões, sem
detalhar os motivos para tal. Mesmo que tal prática seja prevista em lei, não esclarece se os
direcionamentos foram feitos devido à impertinência da questão ou à incapacidade da secretaria em
respondê-la. No caso específico das perguntas gerais direcionadas às Secretarias da Fazenda e Gestão,
embora tenham perfil estratégico para o governo paulista, o que pressupõe controle sobre a execução
das despesas relacionadas às compras públicas, ambas as secretarias responderam que devido ao
modelo descentralizado de compras públicas realizado no estado, o pedido deveria ser realizado de
maneira fragmentada. Esta fragmentação das informações pode garantir maior autonomia para as
secretarias e agilidade nos processos de compras, mas com efeito de perda de controle do que é
adquirido pela administração pública como um todo. Pode–se considerar neste caso que a
descentralização pertinente ao processo da compra não precisa obrigatoriamente implicar na falta de
controle final por órgãos que prioritariamente tem a função de unificar informações como as
Secretarias da Fazenda e Gestão.
Outro aspecto relevante é a negativa de grande parte das secretarias quando questionadas se
houve aquisição de produtos madeireiros. Por outro lado, levantamento prévio no Portal da
Transparência estadual e nos editais publicados revela que os dados existem, demonstrando que não
houve um esforço de saber se as informações existiam antes de negá-las. Esta característica reflete o
que estudiosos têm chamado de opacidade institucional, também entendida como opacidade
administrativa, ou mesmo opacidade de informações públicas, o termo se refere à dificuldade de se
obter informações de gestão pública, o oposto da transparência pública (JARDIM, 1999), seja por
interesses políticos em não divulgar informações, seja pela falta de familiaridade dos cidadãos para
com os trâmites burocráticos. Tal qual há diferentes gradações de transparência, há diferentes
gradações de opacidade (JARDIM, 1999). Alguns governos disponibilizam menos informações que
outros, tendo, portanto, mais opacidade institucional de seus processos.
Uma hipótese que busque justificar a opacidade institucional pode ser relacionada à falta de
controle sistemático das informações. Uma vez que os processos licitatórios são realizados, há registro
11
de compras e realização de etapas na composição do próprio processo. A sistematização destes
registros, por sua vez, pode não ocorrer, o que compromete não apenas a transparência de tais dados,
como o próprio controle gerencial, uma vez que o volume de informações e processos inviabiliza
análises abrangentes.
A Secretaria de Administração Penitenciária representou uma exceção entre as solicitações
realizadas, porque disponibilizou dados quantitativos e forneceu respostas substantivas frente à questão
apresentada. O nível de organização informacional sobre o volume de madeira adquirida converge com
a opinião da administração do Cadmadeira, a qual a classifica como órgão mais desenvolvido. Por
outro lado, o nível o detalhamento da resposta não contempla se há madeira de origem nativa, ou
mesmo certificada. Outro aspecto a ser destacado é que a resposta enviada pela secretaria está em
formato não editável (arquivo.pdf).
A partir dos resultados colhidos com a Lei de Acesso à Informação, é possível afirmar que a
demonstrada ausência de transparência dos dados públicos reflete, em grande medida, a dificuldade em
obter informações referente aos próprios produtos florestais, sobretudo a madeira de origem amazônica,
O levantamento dos dados também permitiu observar que a LAI enquanto instrumento de transparência
governamental e controle social está em fase de estruturação, fato evidenciado sobretudo no que se
refere a não disponibilização de informações editáveis sobre a compra de madeira ou a afirmação de
que não foram realizadas compras, mesmo com editais específicos para tal, até questões estruturais
como a falta de comunicação entre diferentes áreas, que redirecionam informações e não contam com
sistemas que permitam antever pedidos futuros.
3.3 O ponto de vista dos gestores
A partir dos resultados da Lei de Acesso a Informação, a próxima fase foi a realização de visitas
de campo, de modo a ter mais insumos sobre as formas de uso de madeira, bem como para entender
como os critérios de sustentabilidade são incorporados no processo de compras públicas a partir da
perspectiva dos atores.
Assim, as visitas realizadas foram à Secretaria da Fazenda, à Secretaria do Meio Ambiente e à
Secretaria da Administração Penitenciária e à Companhia Paulista de Obras e Serviços. É necessário
explicitar que esses órgãos foram selecionados em função de contatos internos da equipe,
disponibilidade dos funcionários e, principalmente, reconhecimento da importância dessas secretarias
dentro do contexto abordado neste estudo. A análise das informações colhidas a partir da realização de
entrevistas foram sistematizadas na figura 03.
As falas evidenciam que existem diferentes níveis de apropriação do conceito de compras
públicas sustentáveis na aquisição de madeira nativa. Embora tenha sido incorporado nos principais
decretos envolvendo as compras públicas no estado, a polissemia envolvendo o termo “sustentável”
reflete no entendimento de cada gestor sobre esse tema. Assim, há uma perspectiva de preservação
ambiental no discurso de todos os entrevistados, porém, nem todos parecem identificar o caráter
estratégico de adquirir produtos de origem florestal com mecanismos de modo sustentável e de
incentivar a mudança de comportamento mudanças no comportamento do setor privado de produção e
consumo de madeira.
Em todas as secretarias acionadas foi frisado que o volume mais expressivo de consumo de
madeira está contido na realização de obras públicas, seja em reparos e pequenas reformas (estrutura de
concretos, portas, estruturas de cobertura, divisórias, gesso, forros) seja na construção de equipamentos
públicos (dormentes, toras, palanques etc.). Tal aquisição é realizada tanto de maneira direta (sobretudo
empresas de transporte ferroviário) como de maneira indireta, por meio da contratação de empresas da
construção civil.
12
O catálogo socioambiental inserido no âmbito da BEC é citado pelas Secretarias da Fazenda,
Meio Ambiente e Administração Penitenciaria como ferramenta imprescindível para dar validade e
legitimidade para a adoção de critérios de sustentabilidade e não somente o “menor preço” nas compras
públicas. Atualmente há um universo de 150 mil itens cadastrados na Bolsa Eletrônica de Compras
(BEC), dentre eles, apenas 900 possuem selo socioambiental. Essa limitação no cadastramento é
apontada pela Secretaria do Meio Ambiente por ausência de recursos humanos que se dediquem
especificamente a tal função.
Figura 04: Entrevistas com gestores
Órgão
Apropriação do
conceito de
CPS
Ações
realizadas no
âmbito das
CPS
Pontos
Fortes/oportunidades
para o controle social
Entraves
Secretaria da
Fazenda
Inclui as
dimensões
econômicosociais
Gestão do
sistema da BEC
do CADTERC.
Potencial logístico de
sistematizar os dados
envolvendo as práticas
de CPS
Ausência de RH
para tratar
especificamente
deste assunto.
Determina os
critérios do Selo
Socioambiental
Liderar o processo de
sensibilização nos
demais órgãos
Possui comissão
interna sobre
CPS
, possui um papel de
replicador de
procedimentos em favor
das CPS
Secretaria do
Meio Ambiente
Secretaria da
Administração
Penitenciária
CPOS
(empresa
mista)
Inclui as
dimensões
econômicosociais
CPS ligada a
conscientização
ambiental e
redução do
desperdício.
CPS ligada a
noção de
diminuição de
impactos
ambientais
Define os
parâmetros e as
especificações
dos nos editais e
licitações.
.
É um órgão que lida
diretamente com as
obras públicas, maior
forma de consumo de
madeira nativa no
estado.
- Insuficiência de
recursos financeiros
e RH
Não há
padronização nos
processos
administrativos.
Não possui um
setor especifico de
controle de
mecanismos de
verificação e
controle da origem
de produtos
florestais, nem
controle interno
sobre a estimativa
de volumes e
espécies que são
utilizados nas obras
Fonte: autoria própria
O desenho institucional dos procedimentos das compras públicas, isto é, a forma
descentralizada como os órgãos elaboram seus editais e licitações, aparece como desafios para a
efetivação das práticas de CPS, isto porque, demanda recursos (humanos e financeiros) para realizar a
sensibilização e processos de capacitação em todas as unidades compradoras. A adoção de editais13
padrão aprovadas pela Procuradoria Geral do Estado foi mencionada pela Secretaria do Meio Ambiente
como mecanismo validado juridicamente passível de uso na contratação de obras públicas.
Outro aspecto importante a ressaltar é que a capacitação de órgãos que realizam o
gerenciamento de serviços públicos, tais como a CPOS, é essencial para garantir que os requisitos
previstos na licitação (selo socioambiental, CADMADEIRA, DOF) são efetivamente realizados na
etapa da contratação e execução do serviço licitado.
Por fim, a resposta do governo sobre os dados de CPS de madeira nativa requer maior controle
informacional, representando um elemento necessário para a transparência ativa.
Considerações Finais.
O presente artigo procurou analisar a gestão das Compras Públicas Sustentáveis de Madeira Nativa
e suas implicações para a transparência governamental, o controle social e a legalidade do setor.
Concebendo a transparência governamental como um dos instrumentos fundamentais para a
promoção do controle social, foram buscados os dados dos órgãos públicos por meio de consultas a
sites públicos, acionamento pela Lei de Acesso à Informação e entrevista com gestores. Os sites
governamentais destinados ao processo de transparência do estado de São Paulo, embora apresentem
dados relativamente atualizados sobre a aquisição de madeira, se apresentaram de modo agregado,
impossibilitando a diferenciação sobre a espécie, o volume orçamentário despendido e as formas de uso
dos produtos e subprodutos de origem amazônica.
Ao acionar a Lei de Acesso à Informação, por sua vez, foi possível estabelecer um panorama sobre
o controle existente no consumo de madeira nativa dentro dos órgãos públicos. Foi possível perceber
que a LAI, enquanto instrumento normativo, incentiva a criação de um sistema de aprendizagem
institucional, pelo qual os gestores públicos são “obrigados” a organizar e disponibilizar as
informações, seja proativamente, seja mediante pedidos de acesso. Ainda, foi possível evidenciar que a
ausência de sistematização anterior, e a falta de organização das respostas já concedidas levam os
servidores a constantes retrabalhos. A expectativa é que, a partir da aplicação da lei, cada vez mais
órgãos busquem estruturar suas informações, tornando a transparência mais que uma obrigação, um
hábito que atente à cidadania e seja inerente ao cotidiano da administração pública.
As entrevistas apontaram para o papel fundamental dos gestores no processo de adoção de critérios
de sustentabilidade de compras públicas em São Paulo. Destaca-se a importância da Secretaria do Meio
Ambiente como órgão que lidera o processo de incorporação das CPS de madeira nativa por meio de
incentivos para a dinamização destes processos junto aos demais órgãos públicos à exemplo do selo
socioambiental, seminários realizados e site estruturado como ferramenta de governo eletrônico.
Pode-se afirmar que no estado de São Paulo, a implementação da estratégia de CPS, a exemplo do
CADMADEIRA, encontra-se em um estágio de apropriação de uma nova lógica, tendo que enfrentar
algumas resistências internas. Um dos fatores que influencia esta dificuldade parece ocorrer
principalmente porque estes produtos possuem maior custo no curto prazo, de modo que não é trivial
esta mudança de comportamento. Frente a essa realidade, se faz necessário estimular práticas
inovadoras dos gestores públicos, por meio de instrumentos de aprendizagem e de incentivo, tais como
na realização de cursos de formação e de prêmios para inovação e pesquisa nessa temática, o que
permitirá trazer maiores insumos para a organização da informação referente à temática e muni-los de
instrumentos mais transparentes para promoção do controle social.
O presente artigo, portanto, não esgota as possibilidades de discutir a potencialidade e os usos das
compras públicas sustentáveis de madeira de origem amazônica, sendo os modelos de rastreamento de
origem relacionados à cadeia produtiva da madeira uma questão passível de desdobramentos de
pesquisas futuras.
14
Em busca de considerações finais, pode-se afirmar que no estado de São Paulo, ainda não há
transparência nos processos de aquisição de compras de determinados produtos, em especial no caso da
madeira, produto de impacto relevante na economia nacional e cuja legalidade de origem é um objetivo
a ser alcançado. A falta de transparência dos dados públicos revela a falta de estruturação das
informações referentes à madeira de origem florestal e também como a Lei de Acesso à Informação
ainda não está estruturada plenamente.
Também é possível constatar que o processo de estruturação das Compras Públicas Sustentáveis
vem avançando do ponto de vista legal, e na definição de critérios que orientam a compra. No entanto,
este estudo aponta para a necessidade de um redesenho de processos que facilite a implementação
destas compras e a incorporação de ferramentas que organizem as informações e ampliem a
transparência.
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