FERNANDO DE SOUSA OLIVEIRA AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA E TOXICOLÓGICA DE (-)-HIDROXIDIIDROCARVONA EM ROEDORES UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE LABORATÓRIO DE TECNOLOGIA FARMACÊUTICA PROF. DELBY FERNANDES DE MEDEIROS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PRODUTOS NATURAIS E SINTÉTICOS BIOATIVOS JOÃO PESSOA 2009 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. FERNANDO DE SOUSA OLIVEIRA AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA E TOXICOLÓGICA DE (-)-HIDROXIDIIDROCARVONA EM ROEDORES Tese apresentada ao Programa de Pósgraduação em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica Prof. Delby Fernandes de Medeiros da Universidade Federal da Paraíba, para obtenção do grau de DOUTOR EM PRODUTOS NATURAIS E SINTÉTICOS BIOATIVOS. Área de concentração: FARMACOLOGIA. ORIENTADOR: Prof. Dr. Reinaldo Nóbrega de Almeida JOÃO PESSOA 2009 O48a Oliveira, Fernando de Sousa. Avaliação da atividade antinociceptiva e toxicológica de (-)-hidroxidiidrocarvona em roedores / Fernando de Sousa Oliveira. – João Pessoa, 2009. 120p. : il. Orientador: Reinaldo Nóbrega de Almeida Tese (doutorado) – UFPB / CCS 1. Farmacologia 2. (-)-Hidroxidiidrocarvona 3. Atividade antinociceptiva 4. Toxicologia 5. Monoterpeno. UFPB / BC CDU: 615(043) FERNANDO DE SOUSA OLIVEIRA AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA E TOXICOLÓGICA DE (-)-HIDROXIDIIDROCARVONA EM ROEDORES Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica Prof. Delby Fernandes de Medeiros da Universidade Federal da Paraíba, para obtenção do grau de DOUTOR EM PRODUTOS NATURAIS E SINTÉTICOS BIOATIVOS. Área de concentração: FARMACOLOGIA. Aprovado em 18 / 03 / 2009 BANCA EXAMINADORA __________________________________________ Prof. Dr. Reinaldo Nóbrega de Almeida Orientador – UFPB __________________________________________ Profª. Drª. Regina Helena da Silva Examinadora – UFRN __________________________________________ Profª. Drª. Carlúcia Ithamar Fernandes Franco Examinadora – UEPB __________________________________________ Profª. Drª. Rita de Cássia da Silveira e Sá Examinadora – UFJF __________________________________________ Profª. Drª. Leônia Maria Batista Examinadora – UFPB Aos meus pais, Ana Maria de Sousa Oliveira e José Eciene de Oliveira, minha irmã Luciana de Sousa Oliveira e irmão Adriano de Sousa Oliveira, dedico. AGRADECIMENTOS A Deus, pela presença constante e oportunidades que coloca em meu caminho no decorrer de minha vida. Ao Prof. Dr. Reinaldo Nóbrega de Almeida, pela valiosa e sábia orientação desde minha iniciação científica, em quem me espelho como exemplo de profissionalismo. Ao Prof. Dr. Damião Pergentino de Sousa, pela colaboração direta e fornecimento da substância estudada. A todos os professores do Curso de Pós-graduação, em especial as Profªs Drªs Margareth de Fátima Formiga Melo Diniz, Leônia Maria Batista e Márcia Regina Piuvezam, pelos ensinamentos científicos. A todos os amigos de turma do doutorado, em especial, Adalberto Coelho, Karina Karla Medeiros, Marcelo Dantas, Raline dos Anjos e Nadábia Souza pelo companheirismo e incentivo. Aos amigos do LTF e pós-graduação Adriana Oliveira, Alecsandro Marinho, Alessandra Castello Branco, David Antas, Gabriela Lemos, Islânia Araújo, Raline dos Anjos, Sócrates Golzio e Vanine Mota, pela amizade e atenção a mim prestadas. A todos os amigos do Laboratório de Psicofarmacologia, em especial, André Pinho, Camila Carolina Santos, Clécia Sena, Flávia Souto Maior, Leandra Oliveira, Liana Morais, Raquel Lima, Rita Sá e Rubens Benedito, pela colaboração na elaboração deste trabalho, companherismo e agradável convívio. A todos os amigos do LABETOX, em especial, as Profªs Drªs Margareth de Fátima F. Melo Diniz e Marianna Castelo Branco, a Drª Hosana Santos e Kardilândia Oliveira pela amizade e colaboração nos testes de toxicidade. A todos os integrantes do Laboratório de eletrofisiologia que colaboraram com a realização dos testes in vitro. A todos os funcionários do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica e da pós-graduação pelos serviços prestados. A José Crispim Duarte, Luis Cordeiro e Adriano Silva, pela disponibilidade e apoio técnico imprescindível na execução deste trabalho. Ao Biotério Prof. Dr. Thomas George do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica pelo fornecimento dos animais. Desejo também deixar demonstrado meu respeito a todos os animais utilizados durante a realização dos testes. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro. A todos que de alguma forma, direta ou indiretamente, contribuíram para a execução deste trabalho. “ Vós porém, esforçai-vos, e não desfaleçam as vossas mãos; porque a vossa obra terá uma recompensa.” II Crônicas 15: 17 RESUMO OLIVEIRA, F. S. Avaliação da Atividade Antinociceptiva e Toxicológica de (-)Hidroxidiidrocarvona em Roedores. 2009. 120p. Tese (Pós-graduação em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos, Farmacologia) Laboratório de Tecnologia Farmacêutica, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa. A (-)-hidroxidiidrocarvona (HC) é um intermediário semi-sintético obtido a partir da hidratação da R-(-)-carvona. Estudos prévios demonstraram que esse composto apresentava atividade no sistema nervoso central (SNC), em especial, atividade antinociceptiva. O presente trabalho objetivou detalhar o estudo da atividade antinociceptiva de HC. Inicialmente, foi avaliada o possível efeito de HC por via oral, já que todos os estudos anteriores foram realizados por via intraperitoneal. Determinou-se a dose letal 50% (DL50), o que permitiu estabelecer doses relativamente seguras para os testes subsequentes. No teste da movimentação espontânea, HC (100 e 200 mg/kg) provocou uma diminuição da ambulação dos camundongos; já no teste de “rota rod”, HC não interferiu na coordenação motora dos camundongos em nenhuma das doses utilizadas (50, 100 e 200 mg/kg). Em seguida, HC (200 mg/kg) diminuiu o número de contorções abdominais provocadas pelo ácido acético com indicativo de atividade antinociceptiva. De forma complementar, no teste de imersão da cauda, os animais tratados com HC (200 mg/kg) apresentaram um aumento de tempo na resposta ao estímulo termoceptivo, demonstrando assim que HC apresenta atividade antinociceptiva central quando administrada por via oral. A segunda etapa deste trabalho consistiu da avaliação do efeito de HC em longo prazo por via intraperitoneal (i.p.), com o intuito de observar possíveis sinais de toxicidade. Durante 28 dias de tratamento, HC (200 mg/kg) causou aumento no tempo de reação dos camundongos no teste da placa quente e não induziu catatonia nos animais. HC promoveu uma redução na temperatura dos animais e não apresentou qualquer efeito no consumo de água, ração e peso corporal dos camundongos. Um aumento nos níveis de glicemia foi observado, no entanto, não foram encontradas alterações bioquímicas no final do tratamento com HC. Na análise hematológica, HC alterou apenas os números de neutrófilos, porém, essa variação permaneceu dentro do intervalo aceitável para camundongos. Nenhuma alteração foi encontrada no peso do fígado, coração ou rins dos animais tratados com HC. Portanto, HC exerceu um efeito antinociceptivo central desprovido de tolerância farmacológica e sem causar qualquer alteração toxicológica significativa. A terceira fase desse estudo consistiu em determinar o mecanismo de ação de HC. Nesta etapa, atropina (5 mg/kg, ip) e pirenzepina (75 mg/kg, ip), não foram capazes de reverter o efeito antinociceptivo de HC (100 e 200 mg/kg, i.p.). Do mesmo modo, sulpirida (20 mg/kg, ip), também não diminuiu o efeito de HC nos testes utilizados. Os resultados também mostraram que HC reduziu a excitabilidade neuronal em nervo isquiático de rato. Portanto, de acordo com os resultados obtidos nas três etapas desse estudo, HC apresenta atividade antinociceptiva central por via oral, sendo esse efeito desprovido de tolerância farmacológica e efeitos tóxicos significativos, não tendo relação direta com receptores muscarínicos e dopaminérgicos D2, e parece atuar em canais para Na+ dependentes de voltagem. Palavras-chave: (-)-Hidroxidiidrocarvona. Atividade antinociceptiva. Monoterpeno. ABSTRACT OLIVEIRA, F. S. Evaluation of Antinociceptive Activity and Toxicity of (-)Hydroxydihydrocarvone in Rodents. 2009. 120p. Thesis (Post-graduation in Natural Products and Synthetic Bioactives, Pharmacology) Laboratory of Pharmaceutical Technology, Federal University of the Paraíba, João Pessoa. (-)-Hydroxydihydrocarvone (HC) is a monoterpene analogue prepared as a semisynthetic intermediate by hydration of the R-(-)-carvone monoterpene. Previous studies have shown that this compound exerts some activity on the central nervous system, namely an antinociceptive activity. The present work was aimed at performing a detailed investigation of HC antinociceptive activity. Initially, the possible effect of HC was evaluated through the oral administration of this substance as previous studies were performed using the intraperitoneal via. The lethal dose 50% was calculated and used as reference for the choice of relatively safe doses (50, 100 and 200 mg/kg) for the subsequent tests. In the spontaneous motor activity test, HC (100 and 200 mg/kg) decreased the motor activity in mice whereas no changes in motor coordination were recorded in the rotarod test in any of the doses used. In the acetic acid-induced writhing test, HC (200 mg/kg) reduced the number of abdominal writhing which is indicative of an antinociceptive activity. Moreover, the time of response to the thermoceptive stimulus in the tail immersion test was longer in HC-treated animals (200 mg/kg), demonstrating that HC presents a central antinociceptive activity following oral administration. The second part of this study comprised the evaluation of the long-term exposure of HC with the purpose of detecting possible signs of toxicity. During a 28-day-treatment period, HC (200 mg/kg) increased the reaction time of mice in the hot plate test and failed to produce catalepsy. HC also reduced the rectal temperature of these animals and had no effect on water and food consumption or on their body weight. By the end of treatment, an increase in the glycemic level was observed; however, no biochemical alterations were found. In the hematological analysis, HC affected only the neutrophil counts, which remained within the acceptable range for neutrophils in mice. In addition, the weight of the liver, heart or kidneys was not significantly altered by the treatment. These results indicate that HC exerts a central antinociceptive effect without causing pharmacological tolerance or any significant toxicological alteration. The third part of this study involved the investigation of a possible mechanism of action of HC. Atropine (5 mg/kg, i.p.), a nonselective muscarinic receptor antagonist, and pirenzepine (75 mg/kg, i.p.), a muscarinic antagonist selective for M1 receptors, were unable to reverse the antinociceptive effect of HC (100 and 200 mg/kg, i.p.). Likewise, sulpiride (20 mg/kg, i.p.), a selective dopamine D2 receptor antagonist, also failed to reduce the effect of HC in the tests used. The results have also shown that HC reduced neuronal excitability of the rat sciatic nerve. According to the results obtained in this study, HC presents a central antinociceptive action after oral administration, without showing tolerance and significant toxic effect. It showed no direct relation to the muscarinic and D2 receptors but appears to affect the voltagegated Na+ channels. Key words: (-)-Hydroxydihydrocarvone. Antinociceptive activity. Monoterpeno. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Estrutura química de linalol........................................................... 21 Figura 2 – Estrutura química de mentol.......................................................... 22 Figura 3 – Estrutura química de R-(-)-carvona................................................ 22 Figura 4 – Estrutura química de (-)-hidroxidiidrocarvona................................ Figura 5 – Nociceptores e sua conexão com a medula e encéfalo................. Figura 6A – Camundongo Suíço macho e albino.............................................. 42 Figura 6B – Rato Wistar macho e albino........................................................... 42 Figura 7 – Camundongos em grupo de 5 animais no interior da gaiola.......... Figura 8 – Reação de hidratação de R-(-)-carvona......................................... 45 Figura 9 – Aparelho de movimentação espontânea........................................ 46 Figura 10 – Aparelho de “rota rod”.................................................................... 47 Figura 11 – Aparato para o teste imersão da cauda......................................... 48 Figura 12 – Aparelho de placa quente............................................................. 48 23 31 43 Figura 13A – Visão superior da caixa de observação para o teste da formalina. 49 Figura 13B – Visão frontal da caixa de observação para o teste da formalina... 49 Figura 14 – Aparato para técnica de “single sucrose gap”................................ 50 Figura 15 – Câmara experimental para captação dos PAC’s........................... Figura 16 – Resumo esquemático do estudo da atividade antinociceptiva de HC por via oral, em camundongos................................................. 51 Figura 17A – Camundongo na caixa de atividade............................................... 50 53 Figura 17B – Visão frontal do monitor central do aparelho de movimentação espontânea (à esquerda) e de uma das caixas de atividade (à 53 direita)............................................................................................ Figura 18 – Aspecto geral de um procedimento do teste de imersão da cauda.............................................................................................. 55 Figura 19 – Procedimento experimental do tratamento subcrônico com HC 56 em camundongos........................................................................... Figura 20A – Barra para o teste de catatonia...................................................... 57 Figura 20B – Camundongo em posição catatônica............................................. 57 Figura 21 – 62 Aspecto geral de um procedimento do teste da formalina............. LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Seletividade de agonistas e antagonistas para os subtipos de receptores opióides............................................................................ 35 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Efeito de HC sobre o percentual de mortes em camundongos tratados por v.o.................................................................................. 66 Tabela 2 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o tempo de permanência na barra horizontal....................................................... 72 Tabela 3 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre os parâmetros bioquímicos de camundongos........................................................... 78 Tabela 4 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre os parâmetros hematológicos de camundongos....................................................... 79 Tabela 5 – Efeito de HC sobre amplitude do PAC de nervo isquiático de rato... Tabela 6 – Efeito de HC sobre a velocidade de despolarização do PAC de nervo isquiático de rato..................................................................... 88 Tabela 7 – Efeito de HC sobre a constante de repolarização do PAC de nervo isquiático de rato............................................................................... 89 87 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Efeito de HC sobre a movimentação espontânea em camundongos .................................................................................. 67 Gráfico 2 – Efeito de HC sobre o tempo de permanência na barra giratória no teste do “rota rod”............................................................................. 68 Gráfico 3 – Efeito de HC sobre as contorções abdominais induzidas por ácido acético, em camundongos................................................................ 69 Gráfico 4 – Efeito da HC na imersão da cauda de camundongos tratados por v.o.................................................................................................... 70 Gráfico 5 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a latência no teste da placa quente em camundongos.................................................. 71 Gráfico 6 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a temperatura retal de camundongos.............................................................................. 73 Gráfico 7 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o consumo de ração de camundongos.................................................................... 74 Gráfico 8 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o consumo de água de camundongos..................................................................... 75 Gráfico 9 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a evolução ponderal de camundongos............................................................... 76 Gráfico 10 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a glicemia de camundongos.................................................................................. 77 Gráfico 11 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o peso de fígado, rins e coração de camundongos....................................................... 80 Gráfico 12 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN no teste da placa quente em 81 camundongos.................................................................................. Gráfico 13 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN na 1ª fase do teste da 82 formalina em camundongos.............................................................. Gráfico 14 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN na 2ª fase do teste da 83 formalina em camundongos.............................................................. Gráfico 15 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD no teste da placa quente em camundongos.................................................................................. 84 Gráfico 16 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD na 1ª fase do teste da formalina em 85 camundongos.................................................................................. Gráfico 17 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD na 2ª fase do teste da formalina em 86 camundongos.................................................................................. LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS δκμμA – μL – τrep – Aδ – Aβ – AAS – ALT – AST – ATR – Ca2+ CaCl2 – CHCM – COX – dL – DL50 – e.p.m. – E.U.A. – EC – EDTA – et al – fL – g– GABA – GABAA – HC – HCM – HEPES – HPD – Hz – i.p. – IASP – K+KCl – L– LTF – MgCl2 – Min – mM – mm3 – MRF – ms – mV – N– n– Delta Kappa mü Microampere Microlitro Constante de repolarização A delta A beta Acido acetil salicílico Alanina aminotransferase Aspartato aminotransferase Atropina Íon cálcio Cloreto de cálcio Concentração de hemoglobina corpuscular média Ciclooxigenase Decilitro Dose letal 50% Erro padrão da média Estados Unidos da América Enzyme commission Ácido etilenodiamino tetracético e colaboradores Fentolitro Grama Ácido gama amino butírico Receptor de ácido gama amino butírico tipo A (-)-Hidroxidiidrocarvona Hemoglobina corpuscular média Ácido-N-[2-hidroxietil]-piperazina-N’-[2-etanosulfônico] Haloperidol Hertz Intraperitoneal Associação internacional para o estudo da dor Íon potássio Cloreto de potássio Litro Laboratório de Tecnologia Farmacêutica Cloreto de magnésio Minuto Milimolar Milímetro cúbico Morfina Milisegundos Milivolts Normal Número de animais Na+ – NaCl – NaOH – Nav – NMDA – PAC – pg – pH – PZN – r.p.m. – s– SNC – SPD – t.a. – UI – V– v.o. – VCM – vs – Íon sódio Cloreto de sódio Hidróxido de sódio Canais para sódio dependentes de voltagem N-metil-D-aspartato Potencial de ação composto Picograma Potencial hidrogeniônico Pirezenpina Rotação por minuto Segundo Sistema Nervoso Central Sulpirida Temperatura ambiente Unidade internacional Volts Via oral Volume corpuscular médio Versus SUMÁRIO I – INTRODUÇÃO............................................................................................... 19 II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.................................................................... 26 2.1 Considerações gerais sobre dor.................................................................... 2.1.1 Conceito e classificação de dor............................................................. 2.1.2 Percepção da dor.................................................................................. 2.2 Fármacos depressores do SNC.................................................................... 2.2.1 Tratamento farmacológico da dor: os fármacos analgésicos................ 2.3 Aspectos gerais sobre canais para Na+, K+ e antinocicepção....................... 26 27 29 31 33 36 III – OBJETIVOS................................................................................................. 40 IV – MATERIAL................................................................................................... 42 4.1 Animais.......................................................................................................... 4.1.1 Condições experimentais...................................................................... 4.2 Substâncias utilizadas................................................................................... 4.3 Preparação da (-)-hidroxidiidrocarvona......................................................... 4.4 Aparelhagem................................................................................................. 4.4.1 Aparelho para registro da movimentação espontânea.......................... 4.4.2 Aparelho de “rota rod”........................................................................... 4.4.3 Aparato para imersão da cauda............................................................ 4.4.4 Aparelho de placa quente.................................................................... 4.4.5 Caixa de observação para o teste da formalina.................................... 4.4.6 Aparato eletrofisiológico para registro extracelular dos PAC’s............. 42 43 44 44 45 46 47 47 48 49 49 V. MÉTODOS...................................................................................................... 51 5.1 Estudo da atividade antinociceptiva de HC por via oral................................ 5.1.1 Determinação da dose letal 50%.......................................................... 5.1.2 Teste da movimentação espontânea.................................................... 5.1.3 Teste do rota rod................................................................................... 5.1.4 Teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético............ 5.1.5 Teste da imersão da cauda................................................................... 5.2 Estudo subcrônico de HC.............................................................................. 5.2.1 Teste da placa quente........................................................................... 5.2.2 Teste da catatonia................................................................................. 5.2.3 Teste da temperatura retal.................................................................... 5.2.4 Avaliação do consumo de água e alimento e evolução ponderal......... 5.2.5 Avaliação da glicose sanguínea............................................................ 5.2.6 Avaliação laboratorial sanguínea.......................................................... 5.2.6.1 Análise de parâmetros bioquímicos........................................... 5.2.6.2 Análise de parâmetros hematológicos....................................... 5.2.7 Pesagem de órgãos.............................................................................. 5.3 Investigação do mecanismo de ação de HC................................................. 5.3.1 Avaliação in vivo.................................................................................... 51 51 52 53 54 54 56 56 57 58 58 58 59 59 59 60 60 60 5.3.1.1 Bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos.......................................................... 5.3.1.2 Bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com antagonista dopaminérgico D2.................................................... 5.3.1.3 Teste da placa quente................................................................ 5.3.1.4 Teste da formalina..................................................................... 5.3.2 Avaliação in vitro................................................................................... 5.3.2.1 Técnica de “single sucrose gap”................................................ 5.4 Análise estatística.......................................................................................... 60 61 61 62 63 63 64 VI – RESULTADOS............................................................................................. 66 6.1 Estudo da atividade antinociceptiva de HC por via oral................................ 6.1.1 Determinação da dose letal 50%.......................................................... 6.1.2 Efeito de HC no teste da movimentação espontânea........................... 6.1.3 Efeito de HC no teste do rota rod.......................................................... 6.1.4 Efeito de HC no teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético........................................................................................ 6.1.5 Efeito de HC no teste da imersão da cauda.......................................... 6.2 Efeito subcrônico de HC ............................................................................... 6.2.1 Efeito de HC no teste da placa quente.................................................. 6.2.2 Efeito de HC no teste da catatonia........................................................ 6.2.3 Efeito de HC no teste da temperatura retal........................................... 6.2.4 Efeito de HC no consumo de ração...................................................... 6.2.5 Efeito de HC no consumo de água....................................................... 6.2.6 Efeito de HC na evolução ponderal....................................................... 6.2.7 Efeito de HC na glicemia....................................................................... 6.2.8 Efeito de HC nos parâmetros bioquímicos............................................ 6.2.9 Efeito de HC nos parâmetros hematológicos........................................ 6.2.9 Efeito de HC no peso de órgãos........................................................... 6.3 Investigaçâo do possível mecanismo de ação de HC 6.3.1 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos no teste da placa quente............................ 6.3.2 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos no teste da formalina.................................. 6.3.3 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonista dopaminérgico no teste da placa quente............................ 6.3.4 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos no teste da formalina.................................. 6.3.5 Efeito de HC na amplitude do PAC....................................................... 6.3.6 Efeito de HC sobre a velocidade de despolarização do PAC............... 6.3.7 Efeito de HC sobre a constante de repolarização do PAC................... 66 66 67 68 69 70 71 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 81 82 84 85 87 88 89 VII – DISCUSSÃO............................................................................................... 91 VIII – CONCLUSÕES.......................................................................................... 103 REFERÊNCIAS................................................................................................... 105 ANEXOS.............................................................................................................. 122 OLIVEIRA, F. S. Introdução 20 I – INTRODUÇÃO O tratamento da dor tem sido motivo de preocupação e de estudos para pesquisadores e para a indústria farmacêutica, pois apesar da variedade de substâncias e do avanço no desenvolvimento das terapias de controle da dor, ainda há uma necessidade urgente de analgésicos potentes, principalmente para os casos de dores crônicas, onde a melhor alternativa farmacológica ainda é a morfina, mesmo considerando seus efeitos adversos. Neste sentido, inúmeros grupos de pesquisa em todo mundo têm voltado sua atenção para a validação do uso de plantas medicinais e o isolamento de seus metabólitos secundários, que possam vir a ser fonte de substâncias similares à morfina, sem seus efeitos colaterais, produzidas em menor tempo, com baixo custo e tornando-se economicamente acessíveis à população (CALIXTO et al., 2000; LIRA, 2001). A etnofarmacologia associada à descoberta de novas drogas, usando produtos naturais, é um assunto de grande importância na atualidade (PATWARDHAN; VAIDYA; CHORGHADE, 2004). Dentro deste contexto, os óleos essenciais representam uma promissora fonte de moléculas bioativas que muitas vezes se mostram dotadas de atividade farmacológia. Estes óleos são produtos naturais com diferentes aplicações, principalmente na área da saúde e na indústria cosmética. Eles contribuem para o aroma e sabor de várias espécies vegetais, em especial aquelas conhecidas como aromáticas (LIS-BALCHIN; HART, 1999; CARDOSO et al., 2006). Os óleos essenciais constituem os elementos voláteis contidos em vários órgãos das plantas. Sua composição lipofílica os difere quimicamente da composição glicerídica dos verdadeiros óleos e gorduras (SIANI et al., 2006). Estudos sobre várias atividades biológicas de diversos óleos essenciais já foram realizados, como a atividade no SNC, a exemplo da analgésica (ALMEIDA; NAVARRO; BARBOSA-FILHO, 2001), anticonvulsivante (ALMEIDA; MOTTA; LEITE, 2003) e ansiolítica (UMEZU et al., 2002; ALMEIDA et al., 2004). Pode-se mencionar como exemplos de investigações mais recentes, o efeito ansiolítico do óleo essencial de Citrus aurantium L., conhecida como laranja, em modelos experimentais de ansiedade utilizando camundongos (CARVALHOFREITAS; COSTA, 2002; PULTRINI; GALINDO; COSTA, 2006). O óleo essencial de OLIVEIRA, F. S. Introdução 21 Cymbopogon citratus Stapf., espécie vegetal conhecida por capim-santo e utilizada como analgésica, antiinflamatória e antipirética, apresentou efeito antinociceptivo central e periférico nas metodologias utilizando ácido acético, placa quente e formalina (VIANA et al., 2000). A Lavandula angustifolia Mill., popularmente conhecida como lavanda, é outra espécie que teve seu óleo essencial avaliado quanto às propriedades antinociceptivas e que demonstrou resultados significativos em diminuir a resposta dos animais a estímulos nociceptivos (HAJHASHEMI; GHANNADI; SHARIF, 2003). Outros estudos realizados com os óleos essenciais de Artemísia dracunculus L. e Cuminum cyminum L., demonstraram a eficácia desses óleos em atenuar as convulsões induzidas por pentilenotetrazol e eletrochoque máximo, sugerindo uma atividade anticonvulsivante para essas espécies (SAYYAH; MAHBOUBI; KAMALINEJAD, 2002; SAYYAH; NADJAFNIA; KAMALINEDJAD, 2004; JANAHMADI et al., 2006). Com relação à natureza química dos óleos essenciais, estes, em sua maioria, são constituídos de substâncias terpênicas e eventualmente de fenilpropanóides, acrescidos de moléculas menores, como álcoois, ésteres, aldeídos, e cetonas de cadeia curta. O perfil terpênico apresenta normalmente substâncias constituídas de 10 e de 15 carbonos, conhecidas por monoterpenos e sesquiterpenos, respectivamente (SIANI et al., 2006). Os efeitos farmacológicos encontrados são provavelmente devido a essa diversidade químico-estrutural presente nos constituintes dos óleos essenciais. Essa informação é baseada no fato de que vários monoterpenos presentes em muitos óleos essenciais apresentaram atividade no SNC, a exemplo de estudos com o linalol, mentol e rotundifolona. No caso do linalol (Figura 1), tratase de um monoterpeno comumente encontrado OH como componente principal do óleo essencial de várias espécies de plantas aromáticas. Possui propriedades sedativas e age como antagonista competitivo de receptores do N-metil-D- aspartato (NMDA) (ELISABETSKY et al., 1995a; ELISABETSKY; BRUM; SOUZA, 1999; SILVA Figura 1 – Estrutura química de linalol; OLIVEIRA, F. S. Introdução 22 BRUM; ELISABETSKY; SOUZA, 2001; SILVA BRUM et al., 2001), cuja inibição leva a um efeito antinociceptivo (CODERRE; VAN EMPEL, 1994; CHIZH et al., 2001). Estudos realizados com o (-)-linalol mostram que esse enantiômero é capaz de reduzir as respostas de camundongos em testes de nocicepção por estimulação química e térmica, indicativo de efeito antinociceptivo central, sendo sugerido, por estudos utilizando antagonistas e bloqueadores de canais iônicos, que esse efeito envolve mecanismos opióides, colinérgicos e dopaminérgicos (PEANA et al., 2003, 2004). O mentol (Figura 2) é outro monoterpeno com estudos sobre sua atividade antinociceptiva central. Esse composto é encontrado principalmente no óleo essencial de OH várias espécies do gênero Mentha como Mentha piperita L., Mentha x Villosa Huds. e Mentha arvensis L. Seu enantiômero (-)-mentol também foi efetivo em antinociceptividade, teste com de avaliação resultados Figura 2 – Estrutura química de mentol; de que mostram a relação desse efeito com o sistema opióide (GALEOTTI et al., 2002). Estudos realizados no setor de Psicofarmacologia do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica (LTF) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), demonstraram o efeito antinociceptivo central da R-(-)-carvona (Figura 3), em ratos e camundongos. Esse monoterpeno Figura 3 – Estrutura química de R-(-)-carvona; representa um dos principais constituintes químicos do óleo essencial de muitas espécies do gênero Mentha, sendo esse efeito não revertido pela naloxona, um antagonista de receptores opióides (GONÇALVES et al., 2008). A (-)-hidroxidiidrocarvona (HC) é uma substância que se caracteriza por ser originada de um composto natural, a R-(-)-carvona, sendo produzida a partir de uma rota semi-sintética, e que apresenta estrutura química análoga a vários monoterpenos com atividade no SNC, em especial, a antinociceptiva. OLIVEIRA, F. S. Introdução 23 Estudos prévios realizados no LTF/UFPB demonstraram o efeito de HC (Figura 4) no SNC. A princípio, foi calculada a O dose letal 50% (DL50) da substância citada. Realizou-se uma triagem que aliada a testes gerais demonstraram o efeito psicodepressor OH de HC por via intraperitoneal (DE SOUSA; OLIVEIRA; ALMEIDA, 2006). A partir dos resultados obtidos Figura 4 – Estrutura química de (-)-hidroxidiidrocarvona; nos dos testes gerais, foram realizadas metodologias caracterizar mais o tipo específicas de para atividade psicodepressora de HC, sendo então, observado que HC possuía atividade antinociceptiva central, efeito esse não antagonizado pela naloxona (OLIVEIRA; DE SOUSA; ALMEIDA, 2008). As informações anteriormente descritas tiveram significativa parcela de estímulo para a continuidade deste trabalho, aliado ao fato de não ter sido encontrado na literatura relato de estudos por v.o. e toxicológicos controlados com HC. Baseado na necessidade de novas alternativas farmacológicas que possam ser utilizadas para o alívio da dor, que sejam desprovidas de efeitos tóxicos graves, e no efeito promissor apresentado por HC, o presente trabalho avaliou a atividade antinociceptiva central e toxicológica de HC em camundongos. O presente trabalho avaliou se HC apresentava efeito por v.o. Determinou-se a DL50, assim como testes gerais e específicos, esses últimos baseados em estímulos de nocicepção. A etapa seguinte deste trabalho foi conduzida tomando como base a procura por substâncias que possuam atividade farmacológica de longa duração e que possam ser utilizadas no tratamento de dores de natureza crônica. Essa etapa consistiu de um tratamento subcrônico com HC que avaliou os possíveis efeitos farmacológicos e toxicológicos da referida substância após uso contínuo. Foram observados parâmetros como tolerância farmacológica, indução de catatonia, alterações no consumo de água e ração, e no peso dos animais, dentre outras observações. Para melhor caracterizar esse estudo, foi procedida análise OLIVEIRA, F. S. Introdução 24 laboratorial do sangue dos animais, observando-se os parâmetros bioquímicos e hematológicos, além da pesagem de alguns órgãos vitais. A terceira etapa desse estudo determinou de que forma HC estaria atuando para exercer seu efeito antinociceptivo. Para tanto, foram realizadas análises do efeito de HC na presença de antagonistas específicos, em duas metodologias comportamentais onde a substância citada apresentou-se efetiva, com o intuito de verificar um possível bloqueio de efeito e a interação deste com sistemas de antinocicepção. Para a complementação desse estudo, o efeito antinociceptivo de HC foi avaliado no potencial de ação composto (PAC) em nervo isquiático de rato, na perspectiva de um provável envolvimento com canais iônicos de forma a melhor caracterizar seu mecanismo de ação. Portanto, o presente trabalho contribuirá para a pesquisa científica no que se refere à investigação farmacológica em modelos animais de uma nova molécula bioativa originada de um composto natural, que já possui resultados promissores em testes comportamentais, e de forma a proporcionar um estudo mais detalhado de seu efeito antinociceptivo, com perspectivas para a elaboração de um novo agente farmacológico, desprovido de efeitos adversos graves e que possa se tornar um futuro fármaco com atividade antinociceptiva, utilizado no tratamento da dor. OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 26 II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Considerações gerais sobre dor A dor é um sintoma tão antigo quanto a própria humanidade. Nas civilizações antigas, como a assíria-babilônica, egípcia e hebraica, o conceito de dor adquiriu uma conotação religiosa. Eles acreditavam ser a dor uma intoxicação produzida pelos espíritos malignos, ou um castigo divino resultado de pecados cometidos (BRAUN FILHO, 1999). Todos os indivíduos, exceto os portadores de insensibilidade congênita, sabem o que é dor. Entretanto, é difícil para alguém descrever a própria dor e impossível conhecer exatamente a experiência dolorosa do outro, isso porque esta é uma experiência individual, com aspectos peculiares, associada às características únicas de cada organismo (GUIMARÃES, 1999). Dados da literatura norte-americana mostram que existiam em 2000, cerca de 86 milhões de norte-americanos com dores crônicas, dos quais 65 milhões apresentavam-se incapacitados total ou parcialmente. No Brasil, não se tem dados epidemiológicos que permitam tais análises. Estimativas levantadas em um trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, mostram dados aproximados de que 13,6 milhões de brasileiros seriam portadores de quadros dolorosos persistentes e intensos, dos quais 50 a 60% seriam dores crônicas (MARQUEZ, 2004). Pressupõe-se a existência de dois componentes envolvidos no processo doloroso: um é a sensação de dor ou “nocicepção”, induzida por estímulos nocivos, que podem ser exógenos, tais como biológicos, químicos, físicos ou ainda endógenos, caracterizados principalmente por processos inflamatórios, sendo conseqüência da transmissão dos citados estímulos pelas vias nervosas até o córtex cerebral. O outro componente seria a reação emocional à dor, que corresponderia à interpretação afetiva a essa sensação. Esta é de caráter individual, sendo representada principalmente por experiências prévias, tais como a lembrança de alguma forma de sofrimento. A percepção final da dor será conseqüência da OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 27 integração de ambos os componentes (MORAES; CAMARGO, 1999; BRAUNFILHO; BRAUN, 2004). 2.1.1 Conceito e classificação de dor Diante da complexidade e das várias influências que envolvem o processo doloroso a “International Association for the Study of Pain” - IASP, conceituou a dor como “uma experiência sensorial e emocional, em geral desagradável, associada com dano tissular real ou potencial, ou descrita em termos deste dano”. É essencialmente uma manifestação subjetiva, variando a apreciação de um mesmo estímulo nóxico de indivíduo para indivíduo (VILELA FILHO, 1998). Por outro lado, a nocicepção é definida como os mecanismos pelos quais os estímulos periféricos nocivos são transmitidos ao SNC, sem, no entanto, apresentar o componente subjetivo que é característico da dor (ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). Dentre os vários fatores que modificam esse componente afetivo e subjetivo, podemos citar o estado emocional, posição social, nível cultural, preferência religiosa, plano econômico-financeiro e fatores ambientais; esses alteram profundamente o significado que a experiência dolorosa pode causar. A dor ocorre em um momento específico da existência de uma pessoa, relacionada à sua história e ao contexto no qual o acontecimento doloroso se desencadeou (LEMONICA, 1997). A dor pode ser classificada sob vários aspectos, um deles leva em consideração sua distribuição temporal em aguda e crônica (VILELA-FILHO, 1998). A dor aguda é aquela que se segue a um estímulo nóxico; deve-se à ativação das vias da dor e se faz acompanhar de manifestações neurovegetativas, tais como taquicardia e sudorese, desaparecendo com a resolução do processo patológico que lhe originou. É uma importante modalidade de natureza sensorial, desempenhando um papel de alerta para o próprio organismo. De maneira geral, a dor crônica é aquela que persiste por um período de tempo superior àquele necessário a função de alertar o indivíduo e gera acentuado estresse e incapacidade para o trabalho. Sob o aspecto conceitual, pode estar associada a patologias crônicas ou decorrentes de lesão do SNC ou periférico. OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 28 De fato, a dor provocada por estímulo lesivo tem a função de alertar o indivíduo e, assim, lhe permite a possibilidade de fugir do estímulo prejudicial ou diminuir o dano que causa a sensação dolorosa. Em alguns casos, a dor persiste por tempo excessivamente longo e passa a representar sofrimento, sendo muitas vezes prejudicial ao organismo. Portanto, o primeiro caso corresponde a “dor aguda”, e o segundo, a “dor crônica”. Para alguns autores a dor crônica significa um processo patológico (dor patológica) e não tem o caráter protetor da dor aguda (dor fisiológica) (GRAEFF; GUIMARÃES, 2000). Outras classificações e modalidades de dor, além das já citadas, incluem a dor nociceptiva, a somática, a neuropática, a referida e a visceral. A nociceptiva é a forma de dor que surge em todos os indivíduos normais, como conseqüência da aplicação de estímulos que produzem dano ou lesão nos órgãos somáticos ou viscerais. Origina-se da ativação dos nociceptores. A dor somática tem origem na pele, músculos, articulações, ligamentos e ossos. Tratase de uma dor bem localizada, circunscrita à área lesada e caracteriza-se por sensações claras e precisas (BRAUN-FILHO; BRAUN, 2004). Doenças neurológicas que afetam as vias sensoriais podem produzir dor crônica severa, sendo essa então designada por dor neuropática. Esse tipo de dor, não está diretamente relacionada a qualquer lesão tecidual periférica. É decorrente de distúrbios do SNC, tal como na esclerose múltipla (RANG et al., 2007). A dor visceral é a forma de dor que surge com mais frequência como consequência de enfermidades. É o sintoma comum na maioria das síndromes dolorosas agudas e crônicas de interesse clínico. É vaga, mal localizada e se estende além do órgão lesado. Pode ser referida em regiões distantes da víscera que a originou (BRAUN-FILHO; BRAUN, 2004). Frequentemente uma pessoa sente dor em uma parte do corpo consideravelmente distante dos tecidos que a causaram. Esse tipo de dor visceral é chamada de referida, sendo iniciada em um dos órgãos viscerais e referida a uma área na superfície corporal (GUYTON; HALL, 2002). OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 29 2.1.2 Percepção da dor O reconhecimento da dor como reação sensitiva envolve três mecanismos básicos: transdução, transmissão e modulação. Denomina-se transdução ao fenômeno de ativação dos receptores da dor, conhecidos como nociceptores (Figura 5), isto é, a transformação de um estímulo mecânico, térmico ou químico nóxico em potencial de ação (impulso nervoso) pelo nociceptor (VILELA-FILHO, 1998). Encéfalo Medula Nociceptores Figura 5 – Nociceptores e sua conexão com a medula e encéfalo. No processo de transdução, no caso da sensação dolorosa, ocorre uma amplificação dos eventos pela liberação local de uma grande variedade de substâncias químicas, denominadas genericamente de substâncias algogênicas, que surgem em grande quantidade nos tecidos em decorrência de processos OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 30 inflamatórios, traumáticos ou isquêmicos. Essas substâncias incluem serotonina, bradicinina, noradrenalina, histamina, citocinas, prostaglandinas, leucotrienos e substância P (MARQUEZ, 2004). Os nociceptores são terminações nervosas livres das fibras mielínicas Aδ e das fibras amielínicas C localizados na pele, músculos, articulações, tecido conjuntivo e vísceras. Alguns tecidos possuem nociceptores que podem ser térmicos, ativados por temperaturas extremas, nociceptores mecânicos que são ativados por intensa pressão e os polimodais, ativados por estímulos químicos, térmicos ou mecânicos de elevada intensidade (PINTO, 2000). O processo de transmissão de mensagem da periferia até a medula espinhal é feito por fibras nervosas, sendo as fibras Aδ e C já referidas, envolvidas primariamente na nocicepção e, também, pelas fibras mielinizadas, de condução rápida Aβ participando de forma conjunta no processo doloroso. Os sinais de dor rápida são transmitidos nos nervos periféricos em direção a medula espinhal pelas fibras tipo A (rápidas) e a dor lenta, por fibras tipo C amielínicas (MARQUEZ, 2004). A informação nociceptiva é transmitida da medula espinhal para o tálamo e para o córtex por cinco vias ascendentes: os tratos espinhotalâmico, espinoreticular, espinomesencefálico, cervicotalâmico, espinohipotalâmico (BASBAUM; JESSELL, 2000; PINTO, 2000). O sistema de modulação mais conhecido é o da Teoria da Comporta, segundo a qual as fibras mielínicas grossas Aβ (responsáveis pela condução do tato, propiocepção e pressão) excitariam os interneurônios inibitórios da substância gelatinosa de Rolando (lâmina II), os quais promoveriam a inibição pré-sináptica dos aferentes nociceptivos, que por sua vez, inibiriam os interneurônios inibitórios e, ao mesmo tempo, excitariam os neurônios das vias de projeção da dor. Esta teoria explicaria o fato de que a estimulação tátil de uma área dolorosa diminui a sensação de dor (VILELA-FILHO, 1998). OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 31 2.2 Fármacos depressores do SNC Os fármacos depressores do SNC, também conhecidos como psicolépticos, têm como característica predominante a redução da atividade funcional das estruturas encefálicas, como por exemplo, o cérebro. Dentre esses, encontram-se os neurolépticos, benzodiazepínicos, barbitúricos e opióides (ALMEIDA; BARBOSA-FILHO, 2006). Os neurolépticos ou antipsicóticos são substâncias utilizadas para atenuar ou abolir os sinais e sintomas da esquizofrenia e de outras psicoses. São classificados em neurolépticos clássicos ou típicos e os de nova geração ou atípicos (GALDURÓZ; BARBOSA, 2006). Os neurolépticos típicos são aqueles que atuam bloqueando principalmente os receptores dopaminérgicos chamados D2, além dos receptores muscarínicos do sistema colinérgico, atuando por antagonismo farmacológico na via mesolímbica, via essa postulada como causadora de sinais e sintomas das psicoses. Estão incluídos nessa classe de fármacos o haloperidol e a clorpromazina. Já os neurolépticos atípicos ou de segunda geração são definidos farmacologicamente como antagonistas serotonina-dopamina, sendo menos específicos que os neurolépticos típicos por bloquearem mais de um sistema, apresentam menos efeitos extrapiramidais (agem menos na via nigroestriatal) e possuem eficácia sobre os sintomas negativos da esquizofrenia (STHAL, 2000). Os benzodiazepínicos representam os fármacos psicoativos mais consumidos no mundo devido às suas propriedades anticonvulsivante, ansiolítica, hipnótica e pré-anestésica. Entretanto, efeitos indesejáveis como relaxamento muscular, sedação, dependência física e tolerância, são associados ao uso dessa classe de fármacos (RUBIN et al., 2000). Esses fármacos exercem suas ações farmacológicas pela interação com receptores específicos no SNC, localizados em uma subunidade dos receptores do GABAA, agindo como neuromoduladores alostéricos positivos. Esta interação ocorre por acoplamento estrutural, formando um complexo macromolecular que potencializa os efeitos do neurotransmissor inibitório GABA, aumentando a transmissão gabaérgica pré e pós-sináptica (PAGE et al., 1999; OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 32 Na subunidade de ligação dos benzodiazepínicos dos receptores GABAA existem múltiplas formas de receptores benzodiazepínicos, com distintos perfis farmacológicos. Os receptores ômega 1 são preferencialmente abundantes no cerebelo e contém sítios de reconhecimento com alta afinidade para benzodiazepínicos e outras substâncias de diferentes estruturas químicas. São responsáveis pelas ações ansiolíticas e hipno-sedativas. Os receptores ômega 2 estão localizados predominantemente na medula espinhal e estriato, e estão envolvidos na mediação da atividade miorelaxante. Já os receptores ômega 3, também conhecidos como tipo periférico, são abundantes nos rins e seu papel na atividade ansiolítica permanece desconhecido (STHAL, 2000). Outra classe de fármacos depressores do SNC que causam especificamente sedação e hipnose são os barbitúricos. Esses também se ligam a receptores associados ao ionóforo de GABA-cloreto; todavia, esses fármacos parecem prolongar os efeitos do GABA, em lugar de intensificá-los (DAILEY, 2005). Em doses baixas, os barbitúricos aumentam a duração de abertura do canal de cloreto GABAA produzida pelo GABA. Em doses altas, produzem anestesia geral, coma ou morte. Os barbitúricos abrem o canal independentemente do GABA. Por outro lado, a ativação do receptor para benzodiazepínicos modula o receptor GABAA, aumentando ou diminuindo a freqüência de abertura dos canais de cloreto em resposta ao GABA (GRAEFF; GUIMARÃES, 2000). O uso dos barbitúricos tornou-se obsoleto com o advento dos benzodiazepínicos. Apenas aqueles mais específicos como o fenobarbital, usado por sua atividade anticonvulsivante, e o tiopental, muito empregado como agente anestésico intravenoso permanecem em ampla utilização (RANG et al., 2007). Os analgésicos de ação central ou simplesmente opióides têm como característica principal aumentar o limiar neuronal ao estímulo nocivo ou até mesmo erradicar a sensação dolorosa (ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). O termo “opióide” é habitualmente empregado para substâncias de natureza sintética ou peptídica com ação semelhante à morfina, enquanto que “opiáceo” representa uma terminologia mais antiga sendo aplicado a substâncias naturais isoladas do ópio como a morfina e codeína. Entretanto, alguns autores relacionam o termo opióide de forma ampla a todos os compostos que estão relacionados com o ópio, o suco extraído da papoula (Papaver somniferum L.) (GUTSTEIN; AKIL, 2003). OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 33 Os efeitos destes fármacos incluem principalmente analgesia, sendo este o mais relevante fator para a utilização desta classe de substâncias. São também observados os efeitos de sedação, depressão respiratória, miose, supressão do reflexo de tosse e efeitos no trato gastrointestinal, a exemplo de constipação. É importante destacar que além dos efeitos citados, todos os agonistas opióides produzem graus variados de tolerância e dependência física (WELCH; MARTIN, 2005). 2.2.1 Tratamento farmacológico da dor: os fármacos analgésicos Os analgésicos representam uma das classes de fármacos mais vendidas no mundo. Em 2000, os analgésicos estiveram na quarta posição em vendas chegando em 2001, ao segundo lugar, perdendo apenas para as drogas antiinfecciosas, passando, em termos de vendas, de 6,8 bilhões de dólares em 1998, para 14,3 bilhões de dólares em 2001. Se forem somados aos analgésicos, os considerados analgésicos adjuvantes, seguramente seriam atingidos números muito acima do primeiro lugar em consumo e venda de fármacos no mundo (MARQUEZ, 2004). Analgesia é o termo empregado para o alívio ou o cessar da sensação dolorosa sem, no entanto, ocorrer a perda da consciência. As substâncias capazes de causar analgesia são designadas por analgésicos, os quais podem ser divididos, de maneira geral, em analgésicos periféricos, fármacos adjuvantes e os de ação central (BRAINER-LIMA, 1997; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). Os analgésicos periféricos são representados pelos antiinflamatórios não-esteroidais, também conhecidos por analgésicos não-opióides. Esses fármacos são úteis no tratamento da dor, febre e inflamação, e para redução da agregação plaquetária. Embora sejam menos eficazes do que os opióides no alívio da dor, eles não causam tolerância nem dependência física. O mecanismo de ação dos antiinflamatórios não-esteroidais tradicionais envolve o bloqueio da produção de prostaglandinas pela inibição da enzima ciclooxigenase (COX) no local de lesão, diminuindo assim a formação de mediadores da dor no sistema nervoso periférico (WELCH; MARTIN, 2005). OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 34 Entre os efeitos colaterais a serem lembrados estão a influência sobre a hemostase (inibição reversível sobre a COX), o risco de lesão da mucosa gástrica (risco moderado se o tratamento for inferior a 5 dias), alteração da função renal (aumento da resistência vascular renal, hipercalemia, retenção hidrossalina, risco elevado em pacientes hipovolêmicos) e o risco de indução de broncoespasmo, em pacientes asmáticos (SLULLITEL; SOUSA, 1998). O ácido acetilsalicílico (AAS) é um dos antiinflamatórios não-esteroidais mais importantes, visto que diminui a dor em locais predominantemente periféricos, com pouca interação cortical, apresentando conseqüentemente poucos efeitos sobre o SNC. Fazem ainda parte dessa classe de fármacos a indometacina, o piroxicam e o diclofenaco (WELCH; MARTIN, 2005). Existem fármacos que agem como adjuvantes no tratamento da dor e podem ser definidos como aqueles que não têm indicação analgésica primária, atuando como analgésicos em circunstâncias bem definidas. Os principais grupos desta classe incluem antidepressivos, anticonvulsivantes, ansiolíticos e antipsicóticos (REITAN, 1996; BRAINER-LIMA, 1997). Os antidepressivos tricíclicos são analgésicos adjuvantes efetivos em algumas condições dolorosas. O efeito deles é distinto daquele empregado nos distúrbios do humor, sendo indicados principalmente no tratamento da dor neuropática. O mecanismo de ação dos antidepressivos como analgésicos ainda não está bem esclarecido. A explicação padrão é que eles agiriam em áreas cerebrais moduladas pela serotonina e noradrenalina, que transmitem o estímulo doloroso pela medula espinhal. Essa explicação é insatisfatória, mas o fato é que os antidepressivos têm papel importante no alívio da dor crônica (McQUAY, 1997; MORAES; CAMARGO, 1999). Outra classe de fármacos analgésicos adjuvantes são os anticonvulsivantes efetivos no tratamento de dores crônicas, a exemplo da carbamazepina, gabapentina, clonazepam e valproato de sódio, sendo esses dois últimos úteis na profilaxia da enxaqueca (McQUAY, 1995; ROTHROCK, 1997; MORAES; CAMARGO, 1999). Os ansiolíticos são adjuvantes no tratamento da dor por atuarem reduzindo a ansiedade, a insônia e também promovendo relaxamento muscular. Já os antipsicóticos atuam com funções analgésicas através de mecanismos de modulação da dor que levam à diminuição da excitabilidade neuronal, OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 35 proporcionando sedação e analgesia (SAKATA; GOZZANI, 1994; TEIXEIRA et al., 1999, LIRA, 2001). Os opióides podem modificar tanto os aspectos sensitivos da dor quanto o emocional. Agem via ligação a receptores específicos no SNC e periférico, inibindo a nocicepção. O mecanismo de ação destas substâncias, no processo nociceptivo, ocorre pela interação com receptores opióides, levando ao fechamento de canais para Ca2+ voltagem-dependentes nas terminações nervosas présinápticas, o que reduz a liberação de neurotransmissores. Além disso, a ativação destes receptores leva à abertura de canais para K+, produzindo hiperpolarização da membrana celular de neurônios pós-sinápticos, reduzindo a liberação de neurotransmissores, a exemplo da substância P (DICKENSON, 1997; GRAEFF; GUIMARÃES, 2000). Foram identificadas três principais classes de receptores opióides em vários locais do SNC e em outros tecidos. Estas classes incluem receptores μ, κ e δ. Em nível molecular, todos são membros da família de receptores acoplados à proteína G, e, portanto, capazes de afetar a regulação iônica, o processamento do Ca2+ intracelular e a fosforilação de proteínas. Foi sugerida a existência de diversos subtipos de receptores opióides; atualmente, os mais caracterizados por critérios farmacológicos incluem μ1, μ2, δ1, δ2, κ1, κ2 e κ3 (WAY; FIELDS; SCHUMACHER, 2003). No quadro 1 estão listados alguns agonistas e antagonistas e suas respectivas atividades nos subtipos de receptores opióides. Quadro 1 – Seletividade de agonistas e antagonistas para os subtipos de receptores opióides μ κ δ Morfina, codeína +++ + + Meperidina ++ + + Etorfina +++ +++ +++ Sulfentanil, fentanil +++ - + Naloxona +++ ++ + Naltrexona +++ +++ + Agonistas opióides Antagonistas opióides + apresenta atividade; ++ atividade moderada; +++ alta atividade; - sem ou atividade fraca. Fonte: RANG et al., 2007. p. [599] OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 36 Outros tipos de receptores como os serotoninérgicos, GABAérgicos, glutamatérgicos e adrenérgicos estão envolvidos no processo de analgesia, sendo que esses receptores respondem ao tratamento com opióides (PINTO, 2000). O uso de fármacos opióides no tratamento da dor é limitado pela intensa quantidade de efeitos colaterais graves que essas substâncias causam nos pacientes. Dentre esses efeitos indesejáveis, merecem mais atenção a tolerância, dependências física e psíquica, além de náuseas e vômitos. A tolerância é o estado no qual doses progressivamente maiores do fármaco são requeridas para manter o mesmo efeito analgésico. Desenvolver-se-á sempre, seja em maior ou menor velocidade, dependendo do opióide que esteja sendo utilizado. A dependência física está associada com a síndrome de abstinência quando se suspende o fármaco ou quando se usa um antagonista puro como a naloxona, levando o paciente a desenvolver sintomas e sinais em função dessa retirada de tratamento (DELGADO, 2000). A dependência psíquica é caracterizada por um desejo compulsivo pelo uso do opióide apresentado pelo indivíduo. Náuseas e vômitos ocorrem em até 40% dos pacientes quando tomam pela primeira vez morfina e esses efeitos não parecem ser separáveis do efeito analgésico opióide (RANG et al., 2007). 2.3 Aspectos gerais sobre canais para Na+, K+ e antinocicepção Os canais iônicos pertencem a uma família de proteínas que formam poros macromoleculares através de membranas lipoprotéicas e que se encarregam de controlar o fluxo de partículas carregadas eletricamente (íons) entre o meio interno e externo das células (HERNANDEZ; FÉLIX, 2001). Esses canais estão largamente envolvidos em vários mecanismos fisiológicos e patológicos. A compreensão do funcionamento, da estrutura e regulação desses canais leva ao entendimento de muitos processos fisiopatológicos. Dentre esses processos, pode-se citar a sensação dolorosa. Na maioria das células excitáveis, a corrente de entrada que dá início ao potencial de ação resulta da ativação dos canais para sódio regulados por OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 37 voltagem (Nav). Até o momento foram identificadas pelo menos nove isoformas de Nav (WOOD et al., 2004). Os Nav são geralmente classificados em dois grandes grupos: os sensíveis à tetrodotoxina (TTX-S), que estão presentes nas fibras Aδ, em todo sistema nervoso e nos gânglios da raiz dorsal, e os resistentes à tetrodotoxina (TTXR), que são encontrados especialmente nas fibras C do gânglio da raiz dorsal (LAI et al., 2002). Alterações na atividade ou expressão dos subtipos dos Nav, principalmente a excitabilidade, estão associados com a dor. Em particular, estados de dor crônica que envolvem também alterações na composição dos subtipos dos neurônios sensoriais (EKBERG, ADAM; 2006). Dados clínicos e experimentais indicam que a mudança na expressão dos Nav tem um papel fundamental na patogênese da dor neuropática e isso mostra que drogas que bloqueiam esses canais são alvos potencialmente terapêuticos (AMIR et al., 2006). Os bloqueadores dos Nav de interesse incluem os anestésicos locais, usados em doses baixas sem que prejudiquem a propagação do impulso nervoso ou a função cardiovascular, e os antidepressivos tricíclicos, cujo efeito analgésico pode estar envolvido pelo menos em parte com o bloqueio dos Nav, bem como os analgésicos centrais (MAO, CHEN, 2000; BURGESS et al., 2002). Enquanto o papel preciso dos Nav em estados de dor está para ser elucidado, é incontestável a importância desses canais na sensação dolorosa e como alvo para futuros fármacos dotados de atividade analgésica. Uma das funções mais marcantes dos canais para K+ está na manutenção do potencial de repouso da membrana de todas as células. No entanto, à medida que os estudos acerca desses canais se intensificam, novas funções são atribuídas a eles (HILLE, 2001). Vários estudos descritos na literatura demonstram o envolvimento de todos os tipos de canais de K+ no processo de antinocicepção. A abertura de canais para K+ e o consequente aumento da condutância a esse íon para o exterior da célula leva a hiperpolarização celular, assim não ocorrendo a propagação do estímulo nociceptivo (RANG et al., 2007). Estudos eletrofisiológicos demonstraram que agonistas de receptores μ- e δ- opióides abrem canais para K+ retificadores de entrada em neurônios pela ativação de proteínas Gi/o. O primeiro estudo que sugeriu o envolvimento da abertura OLIVEIRA, F. S. Fundamentação teórica 38 de canais para K+ na antinocicepção induzida por agonistas μ-opióide mostrou que a glibenclamida, um bloqueador de canais para K+, inibiu o efeito da morfina no teste da placa quente e retirada da cauda em roedores (OCAÑA; DEL POZO; BAEYENS, 1990; OCAÑA et al., 1993; 1995; 2004; ROANE; BOYD, 1993). Portanto, fármacos capazes de ativar canais para K+ são importantes em mediar a antinocicepção induzida por opióides. Drogas que agem em determinados canais para K+ induz a antinocicepção por ativarem esses canais, dessa forma, representando importantes alvos para o desenvolvimento de novos agentes no tratamento da dor. Drogas que bloqueiam esses canais podem ter eficácia terapêutica em doses abaixo da que possa prejudicar a propagação do impulso nervoso ou a função cardiovascular. Portanto, o entendimento da relação dos canais iônicos com o processo nociceptivo pode levar a elaboração de fármacos analgésicos mais específicos e seguros, com poucos efeitos colaterais e melhor eficácia clínica. Contudo, em virtude dos vários efeitos indesejáveis graves advindos do tratamento com os analgésicos, os farmacologistas pesquisam incessantemente novas substâncias que apresentem atividade antinociceptiva e que possam ser utilizadas na terapêutica, sejam desprovidas de efeitos adversos graves como os apresentados pelos fármacos opióides e com melhor resposta farmacológica. Nesse contexto se insere a avaliação da atividade antinociceptiva e toxicológica de (-)hidroxidiidrocarvona em camundongos. OLIVEIRA, F. S. Objetivos 40 III – OBJETIVOS 3.1 Geral Ö Detalhar o estudo sobre a atividade antinociceptiva e investigar uma possível atividade toxicológica de (-)-hidroxidiidrocavona. 3.2 Específicos Ö Determinar a DL50 e investigar o efeito antinociceptivo central de HC por via oral; Ö Realizar um tratamento subcrônico com HC avaliando seu efeito antinociceptivo central em teste específico; Ö Observar o surgimento de possíveis efeitos tóxicos, assim como, analisar as alterações bioquímicas e hematológicas de camundongos em decorrência desse tratamento subcrônico; Ö Avaliar alterações ponderais de alguns órgãos vitais de camundongos tratados com HC; Ö Elucidar os prováveis mecanismos de ação envolvidos na atividade antinociceptiva de HC. OLIVEIRA, F. S. Material 42 IV – MATERIAL 4.1 Animais No desenvolvimento do presente estudo, foram utilizados camundongos (Mus musculus) machos albinos da linhagem Suíça, com 2 a 3 meses de idade, pesando entre 25 a 35 g (Figura 6A) e ratos (Rattus norvegicus) machos albinos da linhagem Wistar, com 3 a 4 meses de idade, pesando aproximadamente 350 g (Figura 6B), provenientes do Biotério Prof. Dr. Thomas George do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica Prof. Delby Fernandes de Medeiros da Universidade Federal da Paraíba. No biotério, os animais foram alojados em gaiolas de polietileno, contendo 20 camundongos ou 7 ratos cada, mantidos sob condições monitoradas de temperatura equivalente a 21 ± 1º C, com livre acesso a uma dieta controlada a base de ração tipo pellets (Purina) e água disponível em garrafas de polietileno com bicos de inox, encaixadas na parte superior da grade metálica da gaiola. Os animais foram mantidos em ciclo claro/escuro de 12 horas, sendo a fase clara de 6:00 às 18:00 horas. Figura 6A – Camundongo Suíço macho e albino. Figura 6B – Rato Wistar macho e albino. OLIVEIRA, F. S. Material 43 4.1.1 Condições experimentais Os testes foram realizados no Biotério Prof. Dr. Thomas George, onde os camundongos foram previamente alojados em gaiolas de polietileno, contendo 5 animais cada (Figura 7), com pelo menos 60 minutos de antecedência à execução dos testes, visando minimizar as possíveis alterações comportamentais do animal decorrentes da mudança de ambiente, bem como permitir uma adaptação à sala de experimentação. Os camundongos foram mantidos a temperatura de 21 ± 1º C e privados de água e ração 60 min antes dos testes. Antes de cada procedimento, a bancada foi limpa com etanol 70%, entretanto, durante os testes foi utilizado etanol de baixa graduação (30%). Os experimentos foram executados no período compreendido entre as 12:00 e 17:00 horas, sendo os animais utilizados uma única vez e, em seguida, eutanasiados por deslocamento cervical. Todos os procedimentos experimentais foram analisados e previamente aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa Animal (CEPA) do LTF / UFPB, sob a certidão nº 1206/ 06. Figura 7 – Camundongos em grupo de 5 animais no interior da gaiola. OLIVEIRA, F. S. Material 44 4.2 Substâncias utilizadas 9 (-)-Hidroxidiidrocarvona (LTF / UFPB – Brasil); 9 Ácido acético glacial (Reagen – Brasil); 9 Ácido-N-[2-hidroxietil]-piperazina-N’-[2-etanosulfônico] (HEPES) (Sigma – Brasil); 9 Cloreto de cálcio (Vetec – Brasil); 9 Cloreto de magnésio (Vetec – Brasil); 9 Cloreto de potássio (Vetec – Brasil); 9 Cloreto de sódio (Merck – EUA); 9 Cloridrato de morfina (Merck – EUA); 9 Etanol (LTF / UFPB – Brasil); 9 Formaldeído 37% (Vetec – Brasil); 9 Haloperidol (Sigma – EUA); 9 Pirezenpina (Sigma – Brasil); 9 Sulfato de atropina (Sigma – Brasil); 9 Sulpirida (Sigma – Brasil); 9 Tween 80 (polioxetileno sorbitano monoleato) (Sigma – Brasil); A preparação das doses foi realizada minutos antes de sua utilização, dissolvidas em água destilada ou solução salina 0,9%, utilizando-se concentrações decimais de forma a possibilitar a injeção de 0,1 mL/10 g de peso de camundongo. 4.3 Preparação da (-)-hidroxidiidrocarvona A HC foi obtida como intermediário semi-sintético a partir da hidratação do monoterpeno R-(-)-carvona, de acordo como o método descrito por Büchi e Wüest (1979). Esta hidratação foi realizada através da reação de R-(-)-carvona com ácido sulfúrico a 50%. Em seguida, deixou-se agitando o meio reacional em um agitador magnético por 40 horas a temperatura ambiente (t.a.), obtendo-se a HC OLIVEIRA, F. S. Material 45 com 50% de rendimento (Figura 8). Essa preparação foi realizada no LTF / UFPB, sendo cedida pelo Prof. Dr. Damião Pergentino de Sousa. H2SO4 50% 40 hs, t.a. 50% R-(-)-carvona (-)-hidroxidiidrocarvona Figura 8 – Reação de hidratação de R-(-)-carvona. Imediatamente antes da realização dos testes, HC foi dissolvida em solução salina 0,9%, com auxílio de uma gota de tween 80, seguindo a mesma proporção das demais drogas utilizadas. Esta preparação de HC apresentou pH de aproximadamente 6,1 (25º C). 4.4 Aparelhagem 9 Analisador bioquímico automático (Cobas Mira Plus® - Roche Diagnostic System - Brasil); 9 Analisador hematológico ABC Vet (Animal Blood Counter Horiba ABX Diagnosties - Brasil); 9 Banho-maria (FISATOM modelo 550 - Brasil); 9 Espectrofotômetro UV-Vis (Modelo Cary 50 – Varian Inc - Austrália); 9 Glicosímetro (Optium® – Abbott Laboratories - Reino Unido); 9 Microscópio estereoscópico (Zeiss – Alemanha); 9 Microscópio Olympus® (CBA-213 – Brasil); 9 Termômetro colônico digital (BD AccubeepTM – China). OLIVEIRA, F. S. Material 46 4.4.1 Aparelho de movimentação espontânea O aparelho para registro da movimentação espontânea (modelo 7430 – Ugo Basile) é composto de quatro caixas e uma unidade eletrônica contendo uma tela gráfica onde são efetuadas as operações e os resultados observados. A caixa de atividade é feita de persplex e acrílico de cor cinza, com as dimensões de 35 cm de comprimento, 23 cm de largura e 20 cm de altura, podendo ser utilizada para até quatro camundongos. O seu piso é constituído de 30 barras de aço inoxidável, com 3 mm de diâmetro e espaços entre si de 11 mm. As barras pares são eletrificadas, entretanto, a corrente conduzida através do corpo do animal corresponde a poucos μA estando abaixo do limiar sensitivo, sem provocar danos ao animal. Figura 9 – Aparelho de movimentação espontânea. Com a movimentação, o animal produz alterações nos pulsos que são enviados, através das barras ativas ligadas à eletricidade, para o detector de resistência e, em seguida, são convertidos em valores numéricos visíveis na tela que podem ser impressos. A movimentação animal é registrada automaticamente, em intervalos estabelecidos pelo experimentador (Figura 9). OLIVEIRA, F. S. Material 47 4.4.2 Aparelho de “rota rod” O aparelho de “rota rod” (modelo 7750 – Ugo Basile) foi inicialmente descrito por DUNHAM & MIYA (1957) e constituí-se de uma barra giratória com 2,5 cm de diâmetro, dividida por cinco discos em quatro segmentos de 20 cm, e localizada a 40 cm de altura em relação a pequenas pranchas que desativavam automaticamente um contador digital de tempo com a queda dos animais da barra. O modelo utilizado possui dispositivos para ajuste de velocidade da barra giratória em rotações por minuto (rpm) e para contabilizar, de forma automática, o tempo de permanência dos animais na mesma (Figura 10). Figura 10 – Aparelho de “rota rod”. 4.4.3 Aparato para imersão da cauda O aparato foi montado no LTF / UFPB e consiste de um banho-maria com termostato que funciona como fonte de calor elétrica e sobre esse é acoplado um recipiente de alumínio de forma esférica sob o qual contém água. Um termômetro é fixado por um suporte de ferro e submerso na água para registro da temperatura (Figura 11). OLIVEIRA, F. S. Material 48 Figura 11 – Aparato para o teste de imersão da cauda. 4.4.4. Aparelho de placa quente A placa quente (modelo 7406 – LE) permite avaliar a atividade de drogas antinociceptivas por meio de um aparelho cuja temperatura de sua placa, localizada na superfície superior, pode ser controlada entre 45 e 62 ºC, em incrementos de 0,1 ºC. Neste aparelho, um cronômetro acoplado era ativado por um pedal externo, que permitia a medida precisa do tempo de reação do animal ao estímulo térmico. Acoplado à placa, havia um cilindro de acrílico transparente, que isolava o animal para observação sobre o aparelho (Figura 12). Figura 12 – Aparelho de placa quente. OLIVEIRA, F. S. Material 49 4.4.5 Caixa de observação para o teste da formalina Este aparato é formado de um encaixe de metal que forma uma caixa triangular em ângulo de 45°, com os lados e altura medindo 25 cm cada, sendo duas paredes formadas por espelho e uma de vidro transparente, que dá ao observador um maior campo de visão (Figura 13A e 13B). Figura 13A – Visão superior da caixa de observação para o teste da formalina. Figura 13B – Visão frontal da caixa de observação para o teste da formalina. 4.4.6 Aparato eletrofisiológico para registro extracelular dos potenciais de ação composto (PAC’s) O aparato utilizado na técnica eletrofisiológica de “single sucrose gap” era constituído por um estimulador (CF Palmer, modelo 8048, Reino Unido), uma câmara de registros eletrofisiológicos, uma caixa de aquisição do sinal acoplada a um amplificador, e uma placa conversora de sinais analógicos/digital A/D (Lynx, Brasil) conectada a um computador PC-compatível (Figura 14). O estimulador era composto por cinco botões que permitiam ajustar o tipo de estímulo (único ou repetitivo), a duração do pulso (0,05-0,5 ms), a frequência de estimulação (1-100 Hz) e a voltagem aplicada (0,1-25 V). Um outro botão permitia ao experimentador disparar os estímulos manualmente. OLIVEIRA, F. S. Material 50 a d c b Figura 14 – Aparato para técnica de “single sucrose gap”. a) estimulador; b) Câmara experimental para captação dos PAC’s; c) Pré-amplificador de ganho fixo/variável; d) Placa conversora A/D + PC-compatível. A câmara experimental para captação dos PAC’s era feita de acrílico e composta por cinco compartimentos que se comunicavam entre si, unicamente por meio de uma linha sulcada disposta perpendicularmente aos mesmos, que era utilizada para acomodar o tronco nervoso do animal. Por meio de eletrodos de níquel-cromo conectavam-se ao estimulador, os compartimentos I e II, e ao préamplificador (de ganho fixo/variável), os compartimentos III e V. Por sua vez, o préamplificador era conectado à placa conversora A/D, e acoplava-se ao computador, permitindo o armazenamento dos registros dos PAC’s. O compartimento IV, perfurado nas extremidades, era utilizado para a perfusão da solução de sacarose (292 mM), que caracteriza esta técnica (Figura 15). IV V II III I Figura 15 – Câmara experimental para captação dos PAC’s. Os cinco compartimentos estão indicados na figura. OLIVEIRA, F. S. Métodos 51 V. MÉTODOS 5.1 ESTUDO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA DE HC POR VIA ORAL Os testes realizados nessa etapa do estudo do efeito de HC estão esquematizados na figura 16. Teste preliminar Teste da movimentação espontânea Teste do “rota rod” Testes gerais Avaliação da atividade antinociceptiva central Teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético Testes específicos Teste da imersão da cauda Figura 16 – Resumo esquemático do estudo da atividade antinociceptiva de HC por via oral, em camundongos. 5.1.1 Determinação da DL50 A determinação da DL50 possibilita investigar os possíveis efeitos tóxicos de substâncias e extratos, para estabelecer a dose responsável pela morte de 50% dos animais em estudo (LITCHFIELD; WILCOXON, 1949), permitindo a OLIVEIRA, F. S. Métodos 52 realização dos testes farmacológicos utilizando doses seguras (GRACIOSO et al., 1998). Para a realização desse teste, grupos de dez camundongos foram tratados com doses crescentes de HC por via v.o.: 500, 1000, 1500 ou 2500 mg/kg, além de um grupo controle tratado com solução salina 0,9% e tween 80. Após os tratamentos, os camundongos foram colocados em caixas de polietileno, em grupos de cinco animais cada e observados por um período de 4 horas. Em seguida, os animais receberam água e comida, sendo observados a cada 12 horas por um período de até 7 dias para o registro de possíveis mortes. 5.1.2 Teste da movimentação espontânea Esse método é utilizado em animais de laboratório para identificar o efeito comportamental induzido por fármacos (HSIEH et al., 1991; FILE; FERNANDES, 1994), avaliando o nível de excitabilidade do SNC (MASUR; MARTZ; CARLINI, 1971). Dessa forma, drogas que reduzem a locomoção sugerem efeito inibitório do SNC (ADZU et al., 2002), por outro lado, o aumento da atividade motora é característico de drogas estimulantes, a exemplo das do tipo anfetamina (RANG et al., 2007). Quatro grupos de 10 camundongos foram colocados individualmente no aparelho de movimentação espontânea para registro da movimentação do animal por 5 minutos, sendo essa considerada a leitura basal. Em seguida os animais receberam os seguintes tratamentos: controle, HC nas doses de 50, 100 ou 200 mg/kg, todos tratados por via oral. Posteriormente, a etapa de avaliação ocorreu após 30 minutos dos respectivos tratamentos, sendo registrada a movimentação de cada camundongo pelo monitor central do aparelho, prosseguindo as observações também aos 60 e 120 minutos pós-tratamento (Figuras 17A e 17B). OLIVEIRA, F. S. Métodos 53 Figura 17A – Camundongo na caixa de atividade. Figura 17B – Visão frontal do monitor central (à esquerda) e de uma das caixas de atividade (à direita). 5.1.3 Teste do “rota rod” O teste do rota rod é uma metodologia utilizada na triagem de drogas com possível atividade neurotóxica/mio-relaxante e consiste em avaliar a coordenação motora do animal, através do tempo de permanência deste em uma barra giratória (CAPASSO et al., 1996). Para execução deste protocolo, os camundongos foram pré- selecionados sem administração de nenhuma droga, sendo considerados aptos ao teste aqueles animais que permaneceram na barra giratória (velocidade de 7 rpm) por 180 segundos. Após a seleção, os animais foram tratados com salina e tween 80 (controle), 50, 100 ou 200 mg/kg de HC. Transcorridos 30 minutos destes tratamentos, os animais foram colocados nas barras giratórias e o tempo de permanência foi registrado, limitando-se as observações ao tempo máximo de 3 minutos por animal ou três reconduções à barra. As leituras foram repetidas aos 60 e 120 minutos dos tratamentos. OLIVEIRA, F. S. Métodos 54 5.1.4 Teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético Este teste baseia no fato de que a administração intraperitoneal do ácido acético a 0,8% provoca irritação peritoneal, sendo tal efeito nociceptivo caracterizado por contorções abdominais seguidas de extensões dos membros posteriores (KOSTER; ANDERSON; DEBBER, 1959). Para este experimento 3 grupos de 10 camundongos receberam por via oral o pré-tratamento com 50, 100 ou 200 mg/kg de HC, além de um grupo que recebeu o veículo e outro tratado com morfina 10 mg/kg (solúvel em água destilada) que funcionou como padrão positivo. Transcorridos 30 minutos dos tratamentos iniciais, os animais foram tratados com solução de ácido acético 0,8% (0,1 mL/10 g) por via i.p. e colocados em caixas de polietileno individuais, sendo então registrado o número total de contorções abdominais apresentado por cada animal durante 10 minutos de observação. Uma redução significativa do número de contorções quando comparado ao grupo controle negativo foi considerado como uma resposta antinociceptiva (NARAYANAN et al., 2000; BASTOS et al., 2006). 5.1.5 Teste de imersão da cauda O método é fundamentado na exposição do animal a um estímulo térmico (nociceptivo) proporcionado pela imersão de sua cauda em um aparelho contendo água à temperatura de 50 ± 1 ºC, produzindo uma reação de retirada da cauda do agente nociceptivo (JANSSEN; NIEMEGEERS; DONY, 1963). Neste teste, é medido o tempo de reação, ou seja, o tempo que o animal leva para retirada da cauda que está diretamente em contato com a água. Cinco grupos de 10 camundongos receberam os seguintes tratamentos: controle, 50, 100 ou 200 mg/kg de HC por v.o., ou morfina 10 mg/kg por via i.p. OLIVEIRA, F. S. Métodos 55 Inicialmente foi realizada uma pré-seleção dos animais, onde aqueles que permaneciam por mais que 4 segundos sem reagir ao estímulo não participaram do teste (RUJJANAWATE; KANJANAPOTHI; PANTHONG, 2003). Nas avaliações, cada animal foi posto no interior de uma caixa de contenção, e no momento mais adequado, quando a cauda do animal estava imóvel, foi feita a imersão de 2/3 desta na água pré-aquecida. Procedeu-se então o registro desde o momento da introdução da cauda na água até a reação de retirada, que consiste em agitar a cauda. A imersão da cauda não excedeu 12 segundos, para evitar dano tecidual (ADEYEMI; OKPO; OKPAKA, 2004). Foi realizada uma medição basal (antes do tratamento), e nos tempos de 30, 60, 120 e 180 minutos após os referidos tratamentos (Figura 18). Figura 18 – Aspecto geral de um procedimento do teste de imersão da cauda. OLIVEIRA, F. S. Métodos 56 5.2 ESTUDO SUBCRÔNICO DE HC Para o estudo subcrônico de HC foi utilizado grupos de 12 camundongos, tratados por via i.p.: um grupo controle tratado com solução salina 0,9% e 0,5% de tween 80, um grupo experimental que recebeu HC na dose de 200 mg/kg, além de um grupo morfina (10 mg/kg) e outro tratado com haloperidol (5 mg/kg). O esquema de tratamento dos animais e os testes utilizados com seus respectivos dias de realização estão esquematizados na figura 19. Teste da placa quente Teste da catatonia Medição da temperatura retal Medição da glicemia Figura 19 – Procedimento experimental do tratamento subcrônico com HC em camundongos. Os números significam os dias de tratamento e cada símbolo representa os testes utilizados. 5.2.1 Teste da placa quente Este teste, descrito por Eddy e Leimback (1953), representa uma modificação do modelo original de Woolfe e MacDonald (1944). Consiste em quantificar o tempo de reação do animal ao estímulo térmico, ou seja, do momento em que o animal é colocado em uma placa quente a 47,0 ± 0,5 ºC até apresentar o comportamento de levantar (tentativa de pular) ou lamber uma das patas, sendo essas respostas indicativas de nocicepção. Os animais foram submetidos a uma seleção (resposta de até 15 s). Foi feita a leitura basal e 30 minutos após os OLIVEIRA, F. S. Métodos 57 tratamentos os animais foram colocados no aparelho de placa quente, sendo registrado o parâmetro citado. As avaliações foram procedidas antes (basal) e no 1º, 7º, 14º, 21º e 28º dia de tratamento. Os animais permaneceram na placa por um tempo máximo de 30 segundos para evitar dano tecidual (ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). 5.2.2 Teste da catatonia A avaliação da catatonia baseia-se no fato de que algumas espécies de roedores quando sob efeito de uma droga psicodepressora, como opiáceos e antipsicóticos típicos, apresentam rigidez muscular intensa, e dessa forma, no momento em que são colocados com suas patas dianteiras apoiadas em uma barra horizontal, permanecem nessa posição por um significativo período de tempo (CARLINI, 1973). Para esse teste, procedeu-se a avaliação do tempo de permanência dos animais apoiados com as patas anteriores sobre um bastão de vidro horizontal fixado em suportes de madeira a uma altura de 6 cm, por até 3 vezes consecutivas, somando-se o tempo em segundos das três tentativas em um período máximo de 5 minutos (Figura 20A e 20B). Foi feita uma leitura basal no dia anterior ao início dos respectivos tratamentos e no 3º, 10º, 17º e 24º dia de tratamento (TUFIK; LINDSEY; CARLINI, 1979). Figura 20A – Barra utilizada para o teste de catatonia. Figura 20B – Camundongo em posição catatônica. OLIVEIRA, F. S. Métodos 58 5.2.3 Teste da temperatura retal Para medida da temperatura retal foi utilizado um termômetro digital, cujo sensor foi lubrificado com vaselina e cuidadosamente inserido no reto dos animais. As avaliações foram procedidas antes dos tratamentos e aos 30 minutos do 5º, 12º, 19º e 26º dia de administração. 5.2.4 Avaliação do consumo de água e alimento e evolução ponderal Neste experimento, foi avaliado o consumo de água, ração e peso corporal. Com relação à água, foram colocadas mamadeiras cheias de água em cada gaiola, sendo no dia seguinte registrado o volume de água ingerida pelos animais com o auxílio de uma proveta. Quanto ao consumo de alimentos, a ração na forma de “pellets”, foi previamente pesada e colocada, diariamente, na parte superior da gaiola, sendo no dia posterior registrado o peso de ração consumido pelos camundongos. Todos os dias os animais foram pesados para cálculo da dose administrada e análise da evolução ponderal. 5.2.5 Avaliação da glicose sanguínea Durante as quatro semanas de tratamento, o nível glicêmico dos animais foi avaliado antes das administrações e aos 30 minutos dos tratamentos do 9º e 23º dias de tratamento. Os camundongos foram submetidos a um jejum de 6 horas e, em seguida, imobilizados em caixas de contenção de madeira. Uma gota de sangue foi cuidadosamente coletada da veia caudal e, posteriormente, analisada em fita reativa para dosagem de glicemia. A leitura foi efetivada em um glicosímetro específico (Optium® – Abbott Laboratories). OLIVEIRA, F. S. Métodos 59 5.2.6 Avaliação laboratorial sanguínea Ao final do período de tratamento, os camundongos foram submetidos a um jejum de seis horas e anestesiados com éter, sendo então eutanasiados para retirada de amostras de sangue. A coleta das amostras foi realizada através de sangria do plexo braquial, sendo em seguida procedidas às análises bioquímica e hematológica. 5.2.6.1 Análise de parâmetros bioquímicos Para análise bioquímica foi utilizado um analisador bioquímico automatizado (Cobas Mira Roche®), sendo o soro sanguíneo obtido por centrifugação (3500 rpm x 5 min) do sangue total em microtubos de 0,8 mL com gel separador (Minicollect® - Greiner Bio-one) sem anticoagulante. Kits de diagnóstico padrão da Labtest® foram utilizados para avaliação espectrofotométrica dos seguintes parâmetros bioquímicos: glicose, uréia, ácido úrico, creatinina, colesterol, triglicerídeos, proteína total, albumina, globulina, aspartato aminotransferase (AST, EC 2.6.1.1), alanina aminotransferase (ALT, EC 2.6.1.2), amilase (EC 3.2.1.1), lactato desidrogenase (EC 1.1.1.27), creatina quinase (EC 2.7.3.2) e fosfatase alcalina (EC 3.1.3.1.). 5.2.6.2 Análise de parâmetros hematológicos Para determinação dos parâmetros hematológicos, o sangue foi coletado em microtubos de 0,5 mL (Minicollect® Greiner Bio-one) com ácido etilenodiamino tetracético (EDTA) como anticoagulante. Para essa análise foi utilizado um analisador hematológico automatizado (Vet abc™ Animal Blood Counter). Os seguintes parâmetros foram analisados: Hemácias, hemoglobina, OLIVEIRA, F. S. Métodos 60 hematócrito, volume corpuscular médio (VCM), hemoglobina corpuscular média (HCM), Concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM), leucócitos, neutrófilos, linfócitos, monócitos, eosinófilos e plaquetas. 5.2.7 Pesagem de órgãos Após o final dos tratamentos e coleta das amostras de sangue, procedeu-se a laparotomia sendo então removidos o coração, fígado e rins de cada animal. Cada órgão foi lavado com solução fisiológica, e em seguida pesados individualmente em balança analítica. 5.3 INVESTIGAÇÃO DO MECANISMO DE AÇÃO DE HC 5.3.1 Avaliação in vivo 5.3.1.1 Bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos Para determinar a possível participação do sistema muscarínico no efeito antinociceptivo de HC, grupos de camundongos foram pré-tratados com atropina (ATR - 5 mg/kg, i.p.), um antagonista não seletivo de receptores muscarínicos, e pirenzepina (PZN - 75 mg/kg, i.p.), um antagonista seletivo de receptores muscarínicos M1, 15 minutos antes da administração de HC (100 ou 200 mg/kg, i.p.). Em seguida, os animais foram submetidos ao teste da placa quente e formalina, como descritos a seguir (PEANA et al., 2004). OLIVEIRA, F. S. Métodos 61 5.3.1.2 Bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com antagonista dopaminérgico D2 Para avaliar o possível envolvimento de receptores dopaminérgicos tipo D2 no efeito antinociceptivo induzido por HC, grupos de 10 camundongos foram previamente tratados com sulpirida (SPD - 20 mg/kg, i.p.), um antagonista seletivo de receptores dopaminérgicos D2, 15 minutos antes do tratamento com HC (100 ou 200 mg/kg, i.p.). Posteriormente, os camundongos foram submetidos ao teste da placa quente e formalina, como descritos a seguir (PEANA et al., 2004). 5.3.1.3 Teste da placa quente Este teste foi conduzido de forma semelhante ao item 5.2.1 (ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). Os grupos de camundongos (n=10) foram tratados por via i.p., segundo o descrito abaixo: 9 1º grupo – controle (água destilada + 5% de tween 80); 9 2º grupo – HC (100 mg/kg); 9 3º grupo – HC (200 mg/kg); 9 4º grupo – antagonista (15 minutos) + HC (100 mg/kg); 9 5º grupo – antagonista (15 minutos) + HC (200 mg/kg); Foi feita a leitura basal e, após os tratamentos, os animais foram colocados no aparelho de placa quente, registrando-se o tempo em que o animal é colocado na placa até apresentar o comportamento de pular ou lamber uma das patas. As avaliações foram procedidas após 30, 60 e 120 minutos da administração dos tratamentos. OLIVEIRA, F. S. Métodos 62 5.3.1.4 Teste da formalina O teste da formalina foi conduzido como descrito por Vaz et al., (1996), que representa uma modificação do modelo original de Hunskaar, Fasmar e Hole, (1985) e Santos et al., (1995). Nesta metodologia, uma solução de formalina foi injetada na região subplantar do camundongo, o que induziu a estimulação dos nociceptores, sendo o tempo de lambida da pata considerado indicativo de resposta nociceptiva (SOUZA et al., 2000). Esse teste consiste de duas fases em que é quantificado o tempo de lambida da pata. A primeira fase ocorre nos 5 primeiros minutos após a injeção da formalina, levando a uma resposta neurogênica. Em seguida, há uma interfase de aproximadamente 10 minutos caracterizada por mecanismos inibitórios da dor. A segunda fase (15-30 minutos) é conhecida principalmente por uma resposta inflamatória (HUNSKAAR; HOLE, 1987). Os grupos de camundongos receberam os mesmos tratamentos citados no teste da placa quente. Após 30 minutos, 40 μL de solução de formalina 2,5% foi injetada na região subplantar da pata posterior direita de cada camundongo. Em seguida, esses animais foram colocados nas caixas de observação, sendo então registrado o tempo de lambida da pata que recebeu a formalina durante 5 minutos (1ª fase). Após um período de 10 minutos, foi contabilizado o parâmetro citado por mais 15 minutos, correspondente a 2ª fase (Figura 21). Figura 21 – Aspecto geral de procedimento do teste da formalina. um OLIVEIRA, F. S. Métodos 63 5.3.2 Avaliação in vitro 5.3.2.1 Técnica de “single sucrose gap” Para esta técnica, descrita inicialmente por Stämpfli (1954), foi utilizado o nervo isquiático de ratos. Inicialmente, os animais foram eutanasiados por deslocamento cervical, retirando-se o tronco nervoso (isquiático). O nervo foi imediatamente imerso em solução fisiológica de Locke modificado com a seguinte composição (mM): NaCl, 150; KCl, 4; CaCl2; MgCl2, 1 e HEPES (ácido N-[2hidroxietil] piperazina – N’-[2-etanosulfônico]), 5. O pH da solução foi ajustado para 7,3 com NaOH (0,1 N). Após o isolamento do tronco nervoso, foi retirada a bainha de tecido conjuntivo que o envolve. Esse processo foi procedido usando-se um microscópio estereoscópio de modo que ao final obteve-se um conjunto de fibras desnudas. Em seguida, o tronco nervoso foi acomodado cuidadosamente sobre a linha sulcada de uma câmara de registros eletrofisiológicos. A câmara possuía 5 compartimentos, os quais foram recobertos por vaselina nas suas interseções, de modo que o percurso da corrente elétrica ocorresse apenas através do nervo. No quarto compartimento, havia um fluxo constante de solução de sacarose isotônica (290 mM, (1,0 mL/min), usado para gerar um aumento na resistência elétrica do nervo, impedindo dessa forma, a sua captação pelo eletrodo conectado ao quinto compartimento, obtendo-se assim, um registro do PAC amplificado e do tipo monofásico (DE SOUSA et al., 2006). O terceiro compartimento (compartimento-teste) foi utilizado para incubar a HC nas seguintes concentrações: 0,25; 0,5; 1,0; 2,0; 4,0 ou 8,0 mM. Nos compartimentos 1, 2, 3 e 5 foi adicionada solução de Locke modificada. Ao primeiro e terceiro compartimentos estava conectado um estimulador do qual foram disparados estímulos elétricos supramáximos (4-6 V), com duração de 0,1 ms. Os registros foram adquiridos com uma frequência de aquisição de 11.000 Hz. Uma placa A/D fez a conversão do sinal analógico para digital conectada aos compartimentos três e cinco. Esta placa A/D, por sua vez, fazia conecção a um microcomputador, no qual as leituras do PAC foram verificadas. Com esse registro, pode-se avaliar o OLIVEIRA, F. S. Métodos 64 comportamento dos canais para Na+ e K+, na presença ou não de HC, durante as fases do PAC (CRUZ et al., 2000; NONAKA et al., 2000). Os registros controles (contendo apenas a solução fisiológica) foram gravados e, após a troca da solução do compartimento-teste pela solução com HC, foram gravados os registros do potencial de ação obtidos até 40 minutos. Os parâmetros verificados foram: a amplitude, intervalo (em mV) entre a linha de base e o ponto máximo do PAC, e a constante de tempo de repolarização (tau), definida pela equação: V = V0*exp(-t/τ), onde V é a diferença de potencial, V0 é o valor do potencial que cruza o eixo das ordenadas, t é o tempo e τ é o tau. Para realizar o ajuste dos pontos experimentais, foram utilizados os programas Sigmaplot, v 5.0 for DOS. O ajuste seguiu o método dos quadrados mínimos. Cada concentração teve um N=5 experimentos. 5.4 Análise estatística Com relação aos testes estatísticos, os resultados obtidos na primeira etapa e nos testes in vivo da terceira etapa deste estudo foram analisados através de ANOVA (análise de variância) de uma via “one way”, seguido do Teste de Dunnett. A determinação da DL50 foi calculada por regressão não-linear. Na avaliação toxicológica, os resultados foram analisados através do Teste “t” de Student não pareado; já nos expermentos in vitro, foi utilizado esse mesmo teste, entretanto, do tipo não pareado. Os dados numéricos foram aplicados no programa Graph Pad Prism versão 4 (GraphPad Software Inc., EUA). Os valores obtidos, exceto os da DL50, foram expressos em média ± erro padrão da média (e.p.m.), sendo os resultados considerados significativos quando apresentaram um valor de p < 0,05. OLIVEIRA, F. S. Resultados 66 VI - RESULTADOS 6.1 ESTUDO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA DE HC POR VIA ORAL 6.1.1 Determinação da dose letal 50% De acordo com a tabela 1, o tratamento com HC na dose de 500 mg/kg não promoveu mortalidade dos camundongos. No grupo de animais tratado com 1000 mg/kg, foi observado 10% de mortes. Já o grupo que recebeu 2000 mg/kg, 70% dos camundongos morreram, enquanto que, na dose de 2500 mg/kg registrouse 100% de letalidade. Com tais resultados, foi possível calcular, pelo método de probitos, a DL50 de HC em camundongos tratados por v.o., sendo essa estimada em 1258,9 mg/kg com limite de confiança de 1000,0 – 1584,9 mg/kg. Tabela 1 – Efeito de HC sobre o percentual de mortes em camundongos tratados por v.o Dose (mg/kg, v.o.) % de mortes 500 0 1000 10 2000 70 2500 100 (n=10 animais por grupo) OLIVEIRA, F. S. Resultados 67 6.1.2 Efeito de HC no teste da movimentação espontânea O gráfico 1 mostra que o tratamento com HC reduziu a movimentação dos animais nas doses de 100 e 200 mg/kg de HC (78,1 ± 17,5; 46,0 ± 21,0) de forma significativa, quando comparados ao controle (201,3 ± 30,0) aos 30 minutos de observação. Aos 60 minutos, houve diminuição da ambulação com 100 e 200 mg/kg de HC (44,5 ± 10,0; 37,0 ± 12,7; respectivamente), em relação ao controle (141,0 ± 32,8). Na dose de 50 mg/kg não ocorreu essa diminuição aos 30 minutos (158,9 ± 40,4), ou 60 minutos (97,0 ± 16,9). Aos 120 minutos, não houve diminuição significativa da ambulação em todas as doses testadas: 50 (95,5 ± 27,4), 100 (73,4 ± 7,8) e 200 mg/kg (83,8 ± 22,5), respectivamente, em relação ao controle (98,5 ± (unidade de pulsos elétricos) Movimentação espontânea 22,3). 225 Controle 50 mg/kg HC 100 mg/kg HC 200 mg/kg HC 200 175 150 125 100 * 75 ** 50 ** ** 25 0 30 60 120 Tempo de observação (min) Gráfico 1 – Efeito de HC sobre a movimentação espontânea em camundongos Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=8), * p<0,05; ** p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 68 6.1.3 Efeito de HC no teste do “rota rod” De acordo com o gráfico 2, os animais tratados com HC não apresentaram perda da coordenação motora, como observado nas doses de 50, 100 ou 200 mg/kg aos 30 (178,0 ± 2,0; 178,7 ± 1,3; 179,9 ± 0,1), 60 (179,0 ± 0,7; 179,0 ± 1,0; 180,0 ± 0,0) e 120 minutos (180,0 ± 0,0; 180,0 ± 0,0; 179,6 ± 0,4) de observação, quando comparados ao grupo controle (178,9 ± 1,1; 180,0 ± 0,0; 178,9 Tempo de permanência na barra giratória (s) ± 1,1), respectivamente. 200 Controle 50 mg/kg HC 100 mg/kg HC 200 mg/kg HC 150 100 50 0 30 60 120 Tempo de observação (min) Gráfico 2 – Efeito de HC sobre o tempo de permanência na barra giratória no teste do “rota rod”. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=8) (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 69 6.1.4 Efeito de HC no teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético Neste teste, os resultados mostraram que na dose de 200 mg/kg de HC ocorreu diminuição do número de contorções abdominais (13,8 ± 3,0), quando comparado ao controle que apresentou 23,0 ± 1,4 contorções. O resultado apresentado pelo grupo tratado com morfina foi de 1,1 ± 0,3 de contorções, enquanto que, nas doses de 50 e 100 mg/kg de HC não houve diminuição do número de contorções (17,9 ± 2,6; 18,5 ± 2,6; respectivamente), conforme o gráfico 3. Nº de contorções 25 20 C o n tr o le HC -50 HC -100 HC -200 M o r f in a - 6 * 15 10 5 ** 0 T r atam en to s (m g /kg , v.o .) Gráfico 3 – Efeito de HC sobre as contorções abdominais induzidas por ácido acético, em camundongos Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=8) *p<0,05; **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 70 6.1.5 Efeito de HC no teste da imersão da cauda O gráfico 4 mostra que aos 30 minutos na dose de 200 mg/kg observou-se aumento de tempo para retirada da cauda (5,4 ± 1,0), já o grupo morfina apresentou média de 9,1 ± 1,1 contorções. Aos 60 minutos, com 50 (4,6 ± 0,7), 100 (4,6 ± 0,5) e 200 mg/kg (5,3 ± 0,6) obteve-se resultados significativos em relação ao controle (2,6 ± 0,3). Com 120 minutos de observação, nas dose de 100 (5,2 ± 0,9) e 200 mg/kg (5,1 ± 0,4) de HC também houve aumento da latência em comparação ao grupo controle (2,6 ± 0,3). Entretanto, aos 30 minutos de observação, os camundongos tratados com 50 e 100 mg/kg de HC não apresentaram alterações significativas no tempo de permanência da cauda na fonte de calor (3,1 ± 0,6; 2,1 ± 0,3; respectivamente), não diferindo do grupo controle (2,2 ± 0,4). Em ambas as observações citadas, os animais tratados com o padrão também apresentaram aumento de latência (7,3 ± 1,3; 5,1 ± 0,9). Já com 180 minutos pós-tratamento, não foram obtidos resultados significativos (50: 4,6 ± 0,8; 100: 3,2 ± 0,6; 200: 4,4 ± 0,6; morfina: 5,0 ± 1,0) em relação ao controle (3,9 ± 0,5). Tempo para retirada da cauda (s) 12.5 Controle 50 mg/kg HC 100 mg/kg HC 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina ** 10.0 ** 7.5 ** 5.0 *** ** * ** 2.5 0.0 30 60 120 180 Tempo de observação (min) Gráfico 4 – Efeito da HC na imersão da cauda de camundongos tratados por v.o Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=8), *p<0,05; ** p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 71 6.2 EFEITO SUBCRÔNICO DE HC 6.2.1 Efeito de HC no teste da placa quente De acordo com o gráfico 5, foi observado efeito significativo de HC ao longo de toda a avaliação experimental. Nos primeiros dias, já foi possível observar o efeito antinociceptivo de HC (1º: 15,3 ± 2,3; 7º: 10,9 ± 1,9; 14º: 12,9 ± 1,3). Esse efeito foi observado até os últimos dias de avaliação (21º: 17,0 ± 2,9; 28º: 16,3 ± 2,0), quando comparado aos animais do grupo controle (1º: 9,1 ± 0,9; 7º 6,8 ± 0,7; 14º: 5,9 ± 0,7; 21º: 7,1 ± 0,9; 28º: 6,2 ± 0,6). No grupo tratado com morfina, houve aumento de tempo de resposta ao estímulo do teste até aproximadamente o 14º dia (1º: 21,0 ± 2,6; 7º: 14,9 ± 2,6; 14º: 13,2 ± 2,1). Em torno do 21º dia de avaliação em diante, não foi observado efeito significativo (21º: 10,5 ± 1,7; 28º: 10,0 ± 2,1). 25 Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina *** Latência (s) 20 ** 15 * 10 * ** ** *** 21 28 *** 5 0 0 7 14 Dias de tratamento Gráfico 5 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a latência no teste da placa quente em camundongos Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), *p<0,05; **p<0,01; ***p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 72 6.2.2 Efeito de HC no teste da catatonia Conforme a tabela 2, os animais tratados com HC não apresentaram catatonia, quando comparados aos animais do grupo controle. Já o haloperidol induziu catatonia nos quatro dias de avaliação após os tratamentos. Esses resultados com o grupo haloperidol foram bem evidentes a partir da primeira avaliação realizada no segundo dia de tratamento, sendo esse efeito significativo até a última observação. Tabela 2 - Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o tempo de permanência na barra horizontal. Tratamento (mg/kg, i.p.) Dia de tratamento 0 3º 10º 17º 24º Controle 1,4 ± 0,8 0,0 ± 0,0 0,2 ± 0,1 0,1 ± 0,7 0,9 ± 0,7 HC-200 2,7 ± 2,6 1,5 ± 1,0 0,1 ± 0,1 0,1 ± 0,1 0,5 ± 0,3 Haloperidol-5 0,1 ± 0,0 206,7 ± 30,5*** 247,5 ± 18,3*** 262,8 ± 10,8*** 237,5 ± 19,0*** Os valores representam media ± e.p.m. em segundos (n=12); ***p<0,001 vs grupo controle (Teste tStudent). OLIVEIRA, F. S. Resultados 73 6.2.3 Efeito de HC no teste da temperatura retal O gráfico 6 mostra que o tratamento com HC reduziu de forma significativa a temperatura dos animais na dose de 200 mg/kg, tanto nos primeiros dias de observação (5º: 34,9 ± 0,3; 12º: 33,9 ± 0,2), quanto nas avaliações posteriores (19º: 33,5 ± 0,2; 26º: 34,6 ± 0,2), quando comparado ao grupo controle (36,9 ± 23,2; 37,0 ± 0,1; 37,0 ± 0,1; 37,5 ± 0,3). Esses resultados são semelhantes ao grupo de animais tratados com 5 mg/kg de haloperidol (35,1 ± 0,2; 35,3 ± 0,2; 35,4 ± 0,2; 35,8 ± 0,2). Por outro lado, os animais tratados com 10 mg/kg de morfina, apresentaram aumento de temperatura corporal nas primeiras observações após o início do tratamento (37,9 ± 0,2; 37,8 ± 0,2), sendo esse efeito reduzido no 19º dia de avaliação (35,4 ± 0,2) até não ser mais observado (35,8 ± 0,2). *** Temperatura (ºC) 38 ** * 37 # 36 # 35 # # # 34 # # Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina 5 mg/kg Haloperidol # 33 0 5 12 19 26 Dias de tratamento Gráfico 6 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a temperatura retal de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), *p<0,05; ** p<0,01; ***p<0,001; #p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 74 6.2.4 Efeito de HC no consumo de ração As médias de peso de ração em gramas obtidas com os camundongos tratados com HC na primeira (21,5 ± 1,3), segunda (25,1 ± 2,2), terceira (28,6 ± 3,1) e quarta semanas (32,0 ± 4,4), mostram que o tratamento com a referida substância não interferiu no consumo de ração ao longo dos 28 dias de tratamento, quando comparadas as do grupo controle (22,5 ± 2,1; 28,0 ± 2,9; 38,9 ± 4,9; 44,5 ± 5,7; respectivamente). Os camundongos tratados com morfina não apresentaram alterações no consumo de ração nas duas primeiras semanas (17,5 ± 1,6; 22,3 ± 1,7), sendo então observada diminuição da ingesta de ração nas duas últimas semanas (23,9 ± 1,4; 29,9 ± 2,6), quando comparadas ao controle. O grupo que recebeu haloperidol exibiu diminuição do consumo de alimento a partir da segunda semana até a quarta (21,1 ± 1,0; 22,9 ± 1,1; 21,6 ± 1,0), não sendo observado efeito na primeira avaliação (22,5 ± 3,7), como mostra a gráfico 7. Consumo de ração (g) 60 Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina 5 mg/kg Haloperidol 50 40 * 30 * 20 ** ** *** 10 0 1 2 3 4 Nº de semanas Gráfico 7 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o consumo de ração de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), *p<0,05; **p<0,01; p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 75 6.2.5 Efeito de HC no consumo de água Conforme o gráfico 8, os animais tratados com HC (1ª: 45,4 ± 0,3; 2ª: 45,7 ± 0,1; 3ª: 45,0 ± 0,2; 4ª: 45,8 ± 1,0) e morfina (45,0 ± 0,3; 45,1 ± 0,2; 45,2 ± 0,2; 45,6 ± 0,9) não apresentaram alterações quanto ao consumo de água nas quatro semanas de observação, em comparação ao grupo controle (45,0 ± 0,4; 44,8 ± 0,4; 44,0 ± 0,7; 42,8 ± 1,2). Os animais do grupo haloperidol apresentaram diminuição do consumo de água durante todo o tratamento subcrônico (31,2 ± 1,8; 31,0 ± 1,2; 34,2 Consumo de água (mL) ± 1,8; 38,6 ± 1,5). 50 40 *** 30 * *** *** Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina 5 mg/kg Haloperidol 20 10 0 1 2 3 4 Nº de semanas Gráfico 8 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o consumo de água de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), *p<0,05; ***p<0,001 vs grupo controle (Teste tStudent). OLIVEIRA, F. S. Resultados 76 6.2.6 Efeito de HC na evolução ponderal Os resultados expressos no gráfico 9 mostram que o tratamento com HC não interferiu no ganho de peso normal dos animais durante as quatro semanas de avaliação (1ª: 2,8 ± 0,4; 2ª: 3,5 ± 0,6; 3ª: 4,8 ± 0,6; 4ª: 6,5 ± 0,7) em relação ao controle (2,2 ± 0,3; 3,8 ± 0,3; 4,9 ± 0,6; 6,6 ± 0,4; respectivamente). O grupo morfina apresentou diminuição do ganho ponderal nas três primeiras semanas (1,3 ± 0,4; 1,9 ± 0,5; 2,6 ± 0,8), sendo esse efeito não observado na última semana (5,4 ± 0,5). Já nos camundongos tratados com haloperidol, foi observado redução do ganho de peso em todas as semanas (0,9 ± 0,4; 2,2 ± 0,5; 1,3 ± 0,7; 3,3 ± 0,7). Ganho ponderal (g) 7 6 5 4 ** ** 3 2 * 1 * ** Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina 5 mg/kg Haloperidol *** *** 0 0 1 2 3 4 Nº de semanas Gráfico 9 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a evolução ponderal de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), *p<0,05; **p<0,01; ***p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 77 6.2.7 Efeito de HC na glicemia Conforme ilustrado no gráfico 10, não houve alteração da glicemia dos animais no 9º dia de observação nos grupos avaliados (HC: 125,6 ± 2,4; morfina: 113,1 ± 7,7; haloperidol: 106,5 ± 6,6) em relação ao grupo controle (127,1 ± 7,1). No 23º dia de avaliação, o tratamento com 200 mg/kg de HC aumentou de forma significativa a glicemia dos camundongos (223,7 ± 15,1), quando comparado ao controle (112,6 ± 5,2). O mesmo não foi observado com os grupos tratados com morfina (96,6 ± 5,5) e haloperidol (106,8 ± 6,6). Glicemia (mg/dL) 250 *** 200 150 Controle HC 200 mg/kg Morfina 10 mg/kg Haloperidol 5 mg/kg 100 50 0 0 9 23 Dia de tratamento Gráfico 10 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre a glicemia de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), ***p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 78 6.2.8 Efeito de HC nos parâmetros bioquímicos De acordo com a tabela 3, o tratamento com HC não alterou os parâmetros bioquímicos analisados, em comparação aos animais do grupo controle. Os camundongos tratados com morfina apresentaram uma redução significativa dos níveis de ALT, enquanto que no grupo tratado com haloperidol, houve alterações nos níveis de glicose, uréia, creatinina e triglicerídeos, assim como, proteína total, globulina e lactato desidrogenase em relação ao grupo controle. Tabela 3 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre os parâmetros bioquímicos de camundongos Parâmetro Controle HC Morfina Haloperidol 200 mg/kg 10 mg/kg 5 mg/kg Glicose (mg/dL) 185,4 ± 6,8 171,0 ± 7,3 165,8 ± 5,5 144,1 ± 4,1*** Uréia (mg/dL) 42,0 ± 1,9 48,3 ± 4,2 35,3 ± 4,6 30,9 ± 1,3*** Ácido Úrico (mg/dL) 2,2 ± 0,2 1,9 ± 0,5 1,2 ± 0,4 2,2 ± 0,2 Creatinina (mg/dL) 0,4 ± 0,02 0,4 ± 0,02 0,3 ± 0,02 0,5 ± 0,02** Colesterol (mg/dL) 76,3 ± 3,8 87,4 ± 2,4 79,5 ± 4,6 79,0 ± 2,3 Triglicerídeos (mg/dL) 103,4 ± 5,2 93,3 ± 8,5 88,5 ± 8,6 62,1 ± 4,8*** Proteína total (g/dL) 4,4 ± 0,3 4,3 ± 0,1 4,5 ± 0,1 5,7 ± 0,3** Albumina (g/dL) 2,1 ± 0,2 2,1 ± 0,1 2,1 ± 0,2 2,0 ± 0,1 Globulina (g/dL) 2,2 ± 0,3 2,1 ± 0,1 2,4 ± 0,2 3,9 ± 0,3*** AST (UI/L) 245,0 ± 12,7 236,2 ± 15,1 250,2 ± 27,9 229,4 ± 16,1 ALT (UI/L) 73,1 ± 2,9 63,0 ± 4,0 63,7 ± 2,2* 77,7 ± 5,3 Amilase (UI/L) 2182 ± 268,3 2227 ± 365,0 1757 ± 295,9 1655 ± 115,8 Lactato desidrogenase (UI/L) 6526 ± 255,9 6296 ± 387,8 7045 ± 208,3 5302 ± 90,3*** Creatina quinase (UI/L) 1977 ± 342,5 2140 ± 397,7 1179 ± 123,8 3358 ± 578,2 101,0 ± 8,5 101,3 ± 6,6 92,0 ± 2,1 82,1 ± 4,9 Fosfatase Alcalina (UI/L) Os valores representam media ± e.p.m. (n=12); *p<0,05, **p<0,01, ***p<0,001 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 79 6.2.9 Efeito de HC nos parâmetros hematológicos A tabela 4 mostra que o tratamento com HC induziu o aumento do percentual de neutrófilos, enquanto que a morfina não alterou os parâmetros hematológicos analisados, em comparação aos animais do grupo controle. Os níveis de hemoglobina, a HCM e a CHCM aumentaram no grupo tratado com haloperidol, em relação aos animais controle. Tabela 4 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre os parâmetros hematológicos de camundongos HC Morfina Haloperidol 200 mg/kg 10 mg/kg 5 mg/kg 8,0 ± 0,2 7,2 ± 0,5 8,1 ± 0,5 8,4 ± 0,1 Hemoglobina (g/dL) 12,4 ± 0,3 11,7 ± 0,9 12,7 ± 0,4 14,0 ± 0,1*** Hematócrito (%) 34,8 ± 1,0 31,4 ± 2,5 34,2 ± 1,5 37,0 ± 0,5 VCM (fL) 44,0 ± 0,7 43,7 ± 0,6 42,7 ± 0,8 43,7 ± 0,4 HCM (pg) 15,9 ± 0,2 16,4 ± 0,2 15,9 ± 0,5 16,4 ± 0,2* CHCM (g/dL) 36,3 ± 0,4 37,1 ± 0,1 37,3 ± 0,7 37,5 ± 0,2* Leucócitos (103/mm3) 7,1 ± 0,6 5,3 ± 1,1 8,4 ± 0,9 5,9 ± 0,4 Neutrófilos (%) 14,8 ± 1,5 21,7 ± 1,8* 24,3 ± 5,4 18,2 ± 1,2 Linfócitos (%) 77,8 ± 1,4 71,7 ± 3,0 68,8 ± 5,4 76,4 ± 1,2 Monócitos (%) 6,4 ± 0,8 4,6 ± 1,1 6,0 ± 0,5 4,3 ± 0,7 Eosinófilos (%) 1,1 ± 0,3 0,7 ± 0,2 0,8 ± 0,3 1,2 ± 0,2 759,2 ± 60,7 818,3 ± 105,9 826,7 ± 87,0 877,4 ± 42,3 Parâmetros Controle Hemácias (106/mm3) Plaquetas (103/mm3) Os valores representam media ± e.p.m. (n=12); *p<0,05; ***p<0,001 vs grupo controle (Teste tStudent). OLIVEIRA, F. S. Resultados 80 6.2.10 Efeito de HC no peso de órgãos Segundo o gráfico 11, o tratamento com não alterou o peso dos órgãos avaliados (fígado: 2,0 ± 0,1; rins: 0,2 ± 0,01; coração: 0,1 ± 0,01), quando comparados aos do grupo controle (2,2 ± 0,1; 0,2 ± 0,02; 0,2 ± 0,01; respectivamente). Os camundongos tratados com morfina também não apresentaram modificação ponderal dos órgãos (2,3 ± 0,1; 0,2 ± 0,01; 0,1 ± 0,01). Entretanto, nos animais do grupo haloperidol, foi observado redução do peso de fígado (1,9 ± 0,6), e nenhuma alteração no peso dos rins (0,2 ± 0,01) e coração (0,1 ± 0,00). 2.5 ** 2.0 Peso (g) Controle 200 mg/kg HC 10 mg/kg Morfina 5 mg/kg Haloperidol 1.5 1.0 0.5 0.0 Fígado Rins Coração Órgãos Gráfico 11 – Efeito do tratamento subcrônico com HC sobre o peso de fígado, rins e coração de camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=12), **p<0,01 vs grupo controle (Teste t-Student). OLIVEIRA, F. S. Resultados 81 6.3 INVESTIGAÇÂO DO POSSÍVEL MECANISMO DE AÇÃO DE HC 6.3.1 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos no teste da placa quente Como pode ser visto no gráfico 12, os camundongos tratados com 100 ou 200 mg/kg de HC apresentaram aumento do tempo de reação ao estímulo do teste da placa quente de forma significativa, tanto aos 30 (100: 18,7 ± 1,6 e 200: 19,9 ± 4,0) como aos 60 minutos de observação (17,9 ± 1,4 e 18,0 ± 2,7), em relação ao grupo controle (10,5 ± 1,0 e 10,9 ± 0,9). Nos grupos pré-tratados com atropina (ATR) e a seguir tratados com HC, não foi observado bloqueio de efeito (30: 22,7 ± 2,5 e 19,3 ± 1,8; 60: 19,1 ± 1,6 e 24,1 ± 0,8), demonstrando resultados diferentes do controle. Da mesma forma, os grupos pré-tratados com pirezenpina (PZN) e posteriormente tratados com HC, demonstraram os seguintes resultados: 30 (21,2 ± 2,2 e 19,3 ± 3,3) e 60 minutos (18,2 ± 1,2 e 20,1 ± 2,9), não ocorrendo bloqueio do efeito de HC. Aos 120 minutos, não foram observados resultados nos grupos estudados. Latência (s) 30 20 ** ** *** * * ** * * ** Controle 100 mg/kg HC 200 mg/kg HC ATR + Controle ATR + 100 mg/kg ATR + 200 mg/kg PZN + Controle PZN + 100 mg/kg PZN + 200 mg/kg ** * 10 0 30 60 HC HC HC HC 120 Tempo de observação (min) Gráfico 12 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN no teste da placa quente em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), *p<0,05; **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 82 6.3.2 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonistas muscarínicos no teste da formalina Na 1ª fase do teste, os camundongos tratados com HC apresentaram diminuição do tempo de lambida da pata de forma significativa (100: 62,3 ± 6,6 e 200: 33,3 ± 9,1), em relação ao grupo controle (96,7 ± 4,2). Os grupos inicialmente tratados com ATR e a seguir tratados com HC não tiveram seus efeitos bloqueados (58,6 ± 4,4 e 15,4 ± 6,5), quando comparados ao controle. De maneira similar, os grupos pré-tratados com PZN e posteriormente com HC permaneceram com os mesmos resultados observados sem o pré-tratamento com PZN (47,1 ± 6,8 e 11,0 ± 3,1), dessa forma não ocorrendo bloqueio da atividade antinociceptiva de HC, como Tempo de lambida da pata (s) demonstrado no gráfico 13. 125 100 75 50 25 ** ** ** ** ** 0 ** C ontrole HC -100 HC -200 ATR + C ontrole ATR + HC -100 ATR + HC -200 PZN + C ontrole PZN + HC -100 PZN + HC -200 Tratamentos (mg/kg, i.p.) Gráfico 13 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN na 1ª fase do teste da formalina em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 83 Segundo o gráfico 14, o tratamento com HC diminuiu o tempo de lambida da pata de forma significativa também na 2ª fase do teste (100: 40,0 ± 19,0; 200: 1,4 ± 1,3), quando comparado ao controle (269,1 ± 32,4). Nos grupos prétratados com ATR e a seguir tratado com HC não foi observado antagonismo do efeito de HC, (26,8 ± 22,2), em relação ao grupo controle. Resultados semelhantes foram obtidos com os grupos inicialmente tratados com PZN e posteriormente com HC (38,9 ± 19,3; 43,9 ± 42,8), mostrando que o efeito antinociceptivo da HC não foi Tempo de lambida da pata (s) antagonizado. 350 300 250 200 150 100 50 0 ** ** ** ** ** ** C ontrole HC -100 HC -200 ATR + C ontrole ATR + HC -100 ATR + HC -200 PZN + C ontrole PZN + HC -100 PZN + HC -200 Tratamentos (mg/kg, i.p.) Gráfico 14 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com ATR e PZN na 2ª fase do teste da formalina em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 84 6.3.3 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonista dopaminérgico no teste da placa quente Como demonstrado no gráfico 15, os animais do grupo HC (100 ou 200 mg/kg) apresentaram aumento significativo de latência aos 30 (100: 11,9 ± 0,8 e 200: 15,2 ± 2,2), e 60 minutos de avaliação (10,6 ± 0,9 e 14,8 ± 2,7), em comparação ao controle (30: 5,7 ± 0,5 e 60: 4,3 ± 1,3). Nos grupos pré-tratados com sulpirida (SPD) e a seguir tratados com HC, não foi observado antagonismo de efeito (30: 12,2 ± 1,3 e 15,3 ± 2,9; 60: 11,5 ± 1,6 e 13,0 ± 1,2), demonstrando resultados diferentes do controle. Com 120 minutos de tratamento, não foram observados resultados significativos nos grupos estudados. 20 ** Latência (s) ** 15 ** ** Controle 100 mg/kg HC 200 mg/kg HC SPD + Controle SPD + 100 mg/kg HC SPD + 200 mg/kg HC ** * * ** 10 5 0 30 60 120 Tempo de observação (min) Gráfico 15 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD no teste da placa quente em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), *p<0,05; **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 85 6.3.4 Bloqueio do efeito antinociceptivo de HC pelo tratamento prévio com antagonista dopaminérgico no teste da formalina Segundo o gráfico 16, os camundongos tratados com HC apresentaram redução do tempo de lambida da pata de forma significativa (100: 46,1 ± 8,0 e 200: 12,6 ± 2,9), em relação ao grupo controle (93,4 ± 7,1). Os grupos pré-tratados com SPD e secundariamente com HC apresentaram resultados similares aos observados Tempo de lambida da pata (s) sem o pré-tratamento (100: 41,1 ± 3,5; 200: 17,6 ± 3,8). 125 Controle HC -100 HC -200 SPD + C ontrole SPD + HC -100 SPD + HC -200 100 75 50 25 ** ** ** ** 0 Tratamentos (mg/kg, i.p.) Gráfico 16 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD na 1ª fase do teste da formalina em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 86 Na 2ª fase do teste, o tratamento com HC também levou a uma redução significativa do tempo de lambida da pata (100: 18,3 ± 11,3; 200: 0,0 ± 0,0), quando comparado ao controle (266,1 ± 36,7). Nos grupos inicialmente tratados com SPD e a seguir com HC, não ocorreu antagonismo do efeito de HC (61,9 ± 32,1; 0,2 Tempo de lambida da pata (s) ± 0,1) em relação ao grupo controle, como pode ser observado no gráfico 17. 400 C ontrole HC -100 HC -200 SPD + C ont SPD + HC -100 SPD + HC -200 350 300 250 200 150 ** 100 50 0 ** ** ** Tratamentos (mg/kg, i.p.) Gráfico 17 – Efeito de HC sobre o bloqueio do efeito antinociceptivo pelo tratamento prévio com SPD na 2ª fase do teste da formalina em camundongos. Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (n=10), **p<0,01 vs grupo controle (ANOVA - Teste de Dunnett). OLIVEIRA, F. S. Resultados 87 6.3.5 Efeito de HC na amplitude do PAC A tabela 5 mostra que a concentração de 0,25 mM de HC não produziu efeito sobre a amplitude do potencial de ação composto (PAC) nos tempos de incubação. Por outro lado, esse efeito foi alcançado com 0,5 mM de HC aos 20 minutos de incubação, em relação ao controle (0 minuto). A partir de 1,0 mM, verificou-se redução significativa da amplitude do PAC já na primeira incubação (10 minutos), sendo esse efeito observado até os 40 minutos de aplicação de HC. Tabela 5 – Efeito de HC sobre amplitude do PAC de nervo isquiático de rato HC (mM) Amplitude do PAC (mV) após incubação Controle 10 min 20 min 30 min 40 min 0,25 39,5 ± 5,3 38,8 ± 5,0 38,4 ± 5,3 38,3 ± 5,6 36,2 ± 5,1 0,5 53,8 ± 5,2 48,8 ± 5,2 48,6 ± 5,1* 46,9 ± 5,0** 45,6 ± 5,0*** 1,0 47,5 ± 3,8 44,0 ± 3,7* 40,0 ± 3,9* 41,8 ± 3,5** 40,0 ± 2,9** 2,0 48,1 ± 3,8 45,4 ± 3,9* 40,9 ± 4,6* 42,4 ± 3,5** 40,3 ± 2,8** 4,0 50,6 ± 4,3 48,6 ± 4,2* 45,1 ± 3,7* 43,6 ± 4,0* 41,1 ± 4,0* 8,0 39,7 ± 3,0 35,6 ± 1,7 33,4 ± 1,9* 33,0 ± 1,9* 31,2 ± 2,1** Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (N=5), *p<0,05; **p<0,01; ***p<0,001 vs controle (Teste t-Student pareado). OLIVEIRA, F. S. Resultados 88 6.3.6 Efeito de HC sobre a velocidade de despolarização do PAC De acordo com os resultados expressos na tabela 6, a incubação de 4,0 mM de HC em nervo de rato, induziu de forma significativa, diminuição na velocidade de despolarização aos 30 minutos de incubação. Efeito semelhante foi demonstrado na concentração de 8,0 mM de HC aos 30 minutos de incubação quando comparado ao controle, sendo esse efeito observado até os 40 minutos, nessa mesma concentração. Tabela 6 – Efeito de HC sobre a velocidade de despolarização do PAC de nervo isquiático de rato Velocidade de despolarização (ms) HC (mM) Controle 10 min 20 min 30 min 40 min 0,25 55.0 ± 8.2 50,6 ± 8,0 49,7 ± 7,6 48,8 ± 7,7 53,3 ± 7,3 0,5 72,1 ± 9,1 68,6 ± 9,6 69,1 ± 7,1 79,1 ± 10,3 74,4 ± 11,7 1,0 70,3 ± 10,7 64,5 ± 9,8 65,2 ± 10,3 71,2 ± 11,9 66,8 ± 10,8 2,0 63,5 ± 5,2 60,9 ± 8,0 58,9 ± 7,8 62,1 ± 8,5 61,8 ± 7,2 4,0 91,9 ± 11,2 97,2 ± 18,9 82,2 ± 10,7 79,4 ± 11,1* 85,7 ± 16,2 8,0 61,1 ± 5,4 61,4 ± 7,0 57,0 ± 5,9 53,6 ± 4,0* 51,4 ± 5,6** Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (N=5), *p<0,05; **p<0,01; vs controle (Teste t-Student pareado). OLIVEIRA, F. S. Resultados 89 6.3.7 Efeito de HC sobre a constante de repolarização do PAC Conforme a tabela 7, a incubação com HC não causou nenhum tipo de alteração significativa na constante de repolarização do PAC em nenhuma das concentrações utilizadas. Tabela 7 – Efeito de HC sobre a constante de repolarização do PAC de nervo isquiático de rato τrep (ms) HC (mM) Controle 10 min 20 min 30 min 40 min 0,25 0,54 ± 0,04 0,54 ± 0,04 0,56 ± 0,04 0,59 ± 0,05 0,60 ± 0,03 0,5 0,52 ± 0,03 0,52 ± 0,02 0,53 ± 0,03 0,53 ± 0,04 0,53 ± 0,02 1,0 0,56 ± 0,07 0,52 ± 0,04 0,46 ± 0,02 0,54 ± 0,06 0,53 ± 0,04 2,0 0,54 ± 0,07 0,57 ± 0,06 0,56 ± 0,08 0,58 ± 0,07 0,56 ± 0,07 4,0 0,39 ± 0,02 0,41 ± 0,02 0,41 ± 0,03 0,41 ± 0,03 0,42 ± 0,03 8,0 0,42 ± 0,02 0,43 ± 0,04 0,47 ± 0,01 0,44 ± 0,04 0,43 ± 0,03 Os valores estão expressos em média ± e.p.m. (N=5), (Teste t-Student pareado). OLIVEIRA, F. S. 91 VII – DISCUSSÃO A avaliação da atividade antinociceptiva e toxicológica de HC consistiu de três etapas. Inicialmente, foi investigada uma possível atividade da referida substância administrada por via oral. A segunda etapa utilizou testes que avaliassem seu perfil toxicológico. Em seguida, foram realizados testes direcionados a determinar possíveis mecanismos de ação antinociceptivo de HC. Levando-se em consideração que na literatura científica há poucos registros de monoterpenos estudados por outras vias de administração que não a i.p., e que esses registros parecem ser mais raros quando tais compostos são administrados principalmente por v.o., tornou-se oportuno investigar o efeito antinociceptivo de HC por v.o., já que essa via de administração é mais utilizada pela população em geral. Para tanto, procedeu-se inicialmente a determinação da DL50. Em seguida, foram realizados testes gerais e específicos que auxiliassem essa investigação. Na determinação da DL50, foram utilizadas doses elevadas que possibilitassem a observação de mortalidade. Essas doses foram estabelecidas baseando-se na toxicidade de monoterpenos com estrutura química semelhante à HC e, principalmente, em sua DL50 por via i.p. de 800,2 mg/kg (724,6 – 883,6), dessa forma auxiliando de maneira mais objetiva essa determinação (DE SOUSA; OLIVEIRA; ALMEIDA, 2006). A DL50 da HC por v.o. foi estabelecida em 1258,9 mg/kg (1000,0 – 1584,9) (Tabela 1). Valores de DL50 elevados como este, representam uma toxicidade relativamente baixa, quando comparados a outros monoterpenos com estrutura química semelhante a da HC. Essa DL50 apresentou-se maior que a observada por via i.p., representando possivelmente uma via de administração mais segura para HC. Tendo como base a DL50 de HC e as doses utilizadas por via i.p., foram padronizadas doses de 50, 100 e 200 mg/kg de forma que não extrapolassem um quinto dessa DL50 (SOUZA BRITO, 1996). Isto possibilitou a escolha de doses a serem utilizadas nos testes gerais e específicos, de modo que os resultados encontrados não estivessem associados a efeitos tóxicos. OLIVEIRA, F. S. 92 Como testes gerais, elegeu-se o teste da movimentação espontânea e o teste do rota rod para analisar a possível atividade de HC no SNC, administrada pela referida via de administração. No teste da movimentação espontânea, o tratamento com a HC causou nos animais uma diminuição significativa da movimentação até 60 minutos de observação, sendo esse efeito aumentado com doses maiores de HC (Gráfico 1). Uma redução na atividade motora pode ser causada por efeito inibitório da HC no SNC ou uma atividade relaxante muscular (RADHAKRISHNAN et al., 2001). A ambulação diminuída em camundongos é talvez a forma mais comum de verificar se uma substância analisada apresenta efeito depressor do SNC (ALMEIDA, OLIVEIRA, 2006b). Segundo Masur, Martz e Carlini (1971), a mobilidade é função do grau de excitabilidade do SNC e uma diminuição desse parâmetro é sugestiva de uma atividade depressora (OZTURK et al., 1996; FRANCO et al., 2005), possuindo uma boa correlação desse efeito em humanos (AMOS et al., 2005); por outro lado, o aumento da atividade motora é característico de drogas estimulantes, como por exemplo, as drogas do tipo anfetamina (RANG et al., 2007). Esta ação psicodepressora de HC, no entanto, não interfere com a coordenação motora dos camundongos, uma vez que os animais submetidos ao teste do “rota rod” não apresentaram alteração no tempo de permanência na barra giratória em nenhuma das observações procedidas (Gráfico 2), descartando-se, assim, a possibilidade de um efeito miorelaxante ou neurotóxico por v.o. Portanto, por ter diminuído a ambulação dos animais no teste da movimentação espontânea e não ter alterado a coordenação dos animais no teste do rota rod, a HC fornece evidências de possuir uma ação do tipo central semelhante à de drogas depressoras que diminuem a atividade do SNC (PEREZ et al., 1998; FRANCO et al., 2005). Para análise da atividade antinociceptiva de HC foram utilizadas metodologias comportamentais com estimulação química e física para indução de nocicepção, como o teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético, que produz estímulo nociceptivo químico em nível periférico com componente medular, e o teste da imersão da cauda, que utiliza a temperatura como agente nociceptivo físico. OLIVEIRA, F. S. 93 O teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético foi escolhido por ser um teste simples, rápido e confiável para avaliar a atividade antinociceptiva de substâncias (SHINDE, et al., 1999). Este teste é caracterizado por ser uma metodologia de alta sensibilidade a drogas de ação central e periférica (VAZ et al., 1996; VOGEL; VOGEL, 1997; RAMEZANI; HOSSINZADEH; DANESHMAND, 2001). A resposta nociceptiva ao ácido acético pode envolver uma estimulação direta das fibras aferentes nociceptivas, devido a uma redução do pH ou a uma síntese de mediadores da inflamação, como os metabólitos do ácido araquidônico pela via da ciclo-oxigenase, com consequente biossíntese de prostaglandinas (DUARTE; NAKAMURA; FERREIRA, 1988; FRANZOTTI et al., 2000) tais como prostaglandinas Eα e F2α no fluido peritoneal (DERAEDT et al., 1976, 1980; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). Estudos demonstraram que a atividade nociceptiva do ácido acético pode ainda ser devido à liberação de citocinas, por macrófagos e mastócitos peritoneais, tais como fator de necrose tumoral alfa, interleucina-β1 e interleucina-8 (RIBEIRO et al., 2000; BASTOS et al., 2006). O tratamento com HC provocou uma redução do número de contorções abdominais (Gráfico 3). Com isso, fica demonstrado a eficácia da HC no teste das contorções induzidas por ácido acético, o que possibilita propor que a HC apresenta atividade antinociceptiva e/ou estaria inibindo a liberação de mediadores inflamatórios ou citocinas. O fármaco padrão utilizado nesse teste foi a morfina, um analgésico central, protótipo da classe dos opiáceos (ALMEIDA; BARBOSA-FILHO, 2006). Esses resultados da HC são similares aos obtidos quando essa substância foi administrada por via i.p. (DE SOUSA; OLIVEIRA; ALMEIDA, 2006). Peana et al (2003) encontrou resultados semelhantes com o monoterpeno (-)-linalol. Entre outros monoterpenos avaliados na metodologia do ácido acético, pode-se citar o mentol e a rotundifolona que levaram a uma diminuição do número de contorções, entretanto, esses três últimos monoterpenos só foram estudados até então por via i.p. (ALMEIDA; HIRUMA; BARBOSA-FILHO, 1996; GALEOTTI et al., 2002; PEANA et al., 2004). Na tentativa de melhor caracterizar a atividade antinociceptiva da HC encontrada no teste das contorções abdominais induzidas por ácido acético, já que OLIVEIRA, F. S. 94 nesse método atuam indiferentemente substâncias centrais quanto periféricas, utilizou-se o teste de imersão da cauda, onde um maior tempo de reação ao estímulo térmico é geralmente considerado um importante parâmetro de atividade antinociceptiva central (RUJJANAWATE; KANJANAPOTHI; PANTHONG, 2003), sendo essa metodologia utilizada para diferenciar drogas de ação antinociceptiva central daquelas de ação periférica (ASONGALEM et al., 2004). Nesse teste, a atividade antinociceptiva da HC foi observada durante os três períodos pós-tratamento, nas doses de 100 e 200 mg/kg (Gráfico 4). Este teste possibilitou ainda demonstrar que o efeito antinociceptivo de HC nos camundongos foi observado até 120 minutos após o tratamento, o que não foi observado por via i.p. Dessa forma, o efeito antinociceptivo de HC por v.o. parece ser mais duradouro e observado também em menores doses, já que por via i.p. HC só foi eficaz na dose de 200 mg/kg (OLIVEIRA; DE SOUSA; ALMEIDA, 2008). A rotundifolona também se mostrou efetiva no teste de imersão da cauda nas doses de 125 e 250 mg/kg por via i.p., tendo seu efeito perdurado até 120 minutos de observação (ALMEIDA; HIRUMA; BARBOSA-FILHO, 1996). Alguns estudos sugerem que a resposta de retirada da cauda é mediada por reflexo espinhal (CHAPMAN et al., 1985). Além disso, segundo Grumbach (1966), agentes analgésicos centrais efetivos no modelo de imersão da cauda apresentam alta correlação com o alívio da dor em humanos. Portanto, os resultados do presente estudo indicam que a HC é eficaz em modelos onde não há estímulos de natureza periférica, atuando por mecanismos adicionais que envolvem transmissão nociceptiva em nível espinhal e supraspinhal (GONCALES et al., 2005). No teste de imersão da cauda, o efeito farmacológico de analgésicos como a morfina, utilizada como droga padrão, é mediado por receptores do tipo μopióide ao invés de κ- e δ-opióides (SCHMAUSS; YAKSH, 1984; AYDIN et al., 1999). Analgésicos moderados como AAS possuem atividade antinociceptiva fraca em testes por estimulação térmica, como o teste de imersão da cauda, entretanto, apresentam bons resultados naqueles de estimulação química direta de nociceptores. Agentes nociceptivos térmicos e químicos apresentam seletividade para estimulação de fibras A-δ e fibras C, respectivamente (YEOMANS; PIREC; PROUDFIT, 1996). Com base nessa afirmativa, é possível propor que a HC pode OLIVEIRA, F. S. 95 interferir na transmissão de ambas as fibras ou possuir uma via comum, tais como a espinhal e a via talâmica (GONCALES et al., 2005). Portanto, o conjunto de resultados encontrados na primeira etapa desse estudo permitiu inferir que a HC apresenta atividade antinociceptiva mediada por mecanismos centrais quando administrada por v.o., sendo que esse efeito não interfere na atividade motora dos animais. Para detalhar o estudo da atividade antinociceptiva central de HC, a segunda fase desse estudo consistiu em investigar se o efeito antinociceptivo dessa substância está associado a efeitos tóxicos graves. Com esse intuito, foi realizado um tratamento subcrônico com HC, utilizando-se a dose de 200 mg/kg. A escolha dessa dose para a avaliação toxicológica de HC se deve ao fato de ser a maior e mais efetiva dose dessa substância utilizada nos estudos anteriores. Estes testes objetivaram avaliar ações qualitativas ou quantitativas diferentes, produzidas pelo maior tempo de exposição à substância estudada, permitindo assim observar os possíveis efeitos tóxicos de HC (LARINI, 1999; OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). Durante o tratamento subcrônico, foram avaliados parâmetros como: temperatura retal, consumo de ração e água, ganho ponderal e glicemia. Um item importante desse estudo toxicológico foi a análise do efeito antinociceptivo central de HC com tratamento de longa duração, além de avaliar a ocorrência de um possível efeito catatônico nos animais durante os 28 dias de observação. Ao final, foram mensuradas alterações de parâmetros bioquímicos e hematológicos, pela análise laboratorial do sangue de camundongos e realizada a pesagem de alguns órgãos vitais dos animais. O principal fator responsável pelo estudo subcrônico com HC foi o de avaliar uma possível tolerância farmacológica ao longo dos 28 dias de tratamento. Para tanto, foi utilizada a metodologia da placa quente onde a substância estudada se mostrou efetiva em demonstrar resultados significativos previamente (OLIVEIRA; DE SOUSA: ALMEIDA, 2008). O teste da placa quente é utilizado na pesquisa de sustâncias antinociceptivas de ação central através da avaliação do bloqueio da resposta nociceptiva provocada por estímulo térmico em animais (ALMEIDA; OLIVEIRA, 2006a). Sabe-se que essa metodologia é reconhecida por ser sensível a OLIVEIRA, F. S. 96 drogas que atuam em nível supraespinhal (CAMPOS et al., 2002; FRANÇA et al., 2001; PEANA et al., 2003). Neste teste, o efeito antinociceptivo de HC foi observado em todas as cinco avaliações, do 1º ao 28º dia de experimentação (Gráfico 5). Dessa forma, HC parece não induzir tolerância farmacológica durante os 28 dias de tratamento. Por outro lado, com a morfina, um fármaco opiáceo, foi possível observar o declínio de seu efeito antinociceptivo, representando a tolerância típica dos fármacos opiáceos. O uso repetido de fármacos dessa classe induz prontamente tolerância que reduz o efeito ou requer um aumento da dose para alívio da dor. Os mecanismos neurobiológicos do desenvolvimento da tolerância opióide são complexos e até agora parcialmente compreendidos (GABRA et al., 2007). Dando continuidade ao estudo, procurou-se identificar se HC induz catatonia em camundongos em longo prazo. A catatonia, em animais de laboratório, é definida como um estado de imobilidade em uma posição não habitual, com duração de vários minutos. Neste teste, a HC não causou catatonia nos camundongos, quando comparado ao grupo controle (Tabela 2). Esse parâmetro também é observado em outros tipos de drogas depressoras centrais, além dos analgésicos centrais, a exemplo de efeitos indesejáveis durante o uso de antipsicóticos. Dessa forma, a HC não provocou estado catatônico nos animais, não apresentando esse efeito tóxico comum a outras substâncias antinociceptivas. Por outro lado, o haloperidol foi capaz de induzir catatonia durante todo o tratamento. Fármacos antipsicóticos típicos como o haloperidol, produzem distúrbios motores ao antagonizar os receptores pós-sinápticos, do tipo D2, para o neurotransmissor dopamina, levando ao aparecimento de sintomas como bradicinesia, acinesia, catatonia, entre outros (MARCUS; NOMIKOS; SVENSSON, 1996). Anatomicamente, as fibras A-δ e C, presentes nas raízes nervosas e nos nervos periféricos aferentes, são conhecidos por conduzir os impulsos relacionados com a sensação dolorosa e a temperatura através das raízes do corno dorsal (CARPENTER; MACKEY, 1992). Mudanças na temperatura corporal são um dos principais efeitos farmacológicos dos agonistas opióides, como a morfina e outras drogas como o haloperidol. Os opióides atuam diretamente no centro OLIVEIRA, F. S. 97 termorregulador presente no hipotálamo para produzir tal mudança (SMITH et al., 1995; ADEBIYI; ELSA; AGAIE; ETUK, 2006). A HC, da mesma maneira que a morfina e o haloperidol, alterou a temperatura dos animais fornecendo mais evidências do envolvimento de sua atividade com as vias da dor e controle de temperatura (Gráfico 6). Com relação às avaliações do consumo de ração e água, não foram encontradas alterações na ingestão de água e no consumo de alimento nos camundongos tratados com HC. Os resultados desses testes também demonstraram que a morfina induz a diminuição da ingestão de alimento e no grupo haloperidol houve diminuição do consumo de alimento e água (Gráficos 7 e 8). A definição desses parâmetros é um componente essencial no estudo da segurança de fármacos, que tem de ser realizada em qualquer produto destinado a fins terapêuticos. Uma nutrição adequada é essencial para o estado fisiológico dos animais e para garantir que a resposta a uma droga testada seja confiável e não uma "falsa" resposta inadequada devido a deficientes condições nutricionais (STEVENS; MYLECRAINE, 1994; IVERSEN; NICOLAYSEN, 2003). Além disso, alterações no peso corporal de camundongos são indicativos de efeitos indesejáveis, uma vez que, animais que sobrevivem a tratamento com fármacos administrados por longos períodos, não podem perder mais de 10% do seu peso inicial (RAZA et al., 2002; TEO et al., 2002; FÉRES et al., 2006). No presente estudo, não houve diferença significativa no peso corporal dos animais tratados com HC e os do grupo controle, no entanto, nos grupos morfina e haloperidol foram observadas diminuição do peso dos camundongos (Gráfico 9). Contudo, HC não alterou os parâmetros citados, demonstrando relativa segurança no que se refere ao consumo de água e ração, e ganho de peso. A análise laboratorial do sangue de roedores representa uma importante forma de se investigar a segurança de uma substância-teste. A administração de HC conduziu a um aumento de glicose no 23ª dia de tratamento (Gráfico 10), no entanto, no final do tratamento, esse aumento não foi mais observado. Além do mais, não foram constatadas diferenças estatisticamente significativas nos parâmetros bioquímicos de camundongos tratados com HC, em comparação com o grupo controle (Tabela 3). Por outro lado, a morfina alterou os níveis de ALT, enquanto o haloperidol alterou vários parâmetros bioquímicos. No OLIVEIRA, F. S. 98 que diz respeito ao estudo hematológico, não ocorreram mudanças nos parâmetros analisados nos camundongos tratados com HC, exceto na contagem diferencial de leucócitos que revelou um aumento nos níveis de neutrófilos (Tabela 4), no entanto, os níveis se mantiveram dentro da normalidade para os valores de referência e não são considerados como sendo clinicamente significativos. No grupo tratado com morfina, não foram encontradas anormalidades hematológicas. Por outro lado, o tratamento com haloperidol induziu pequenas flutuações nos níveis de hemoglobina e no HCM e CHCM. A análise do peso do fígado, coração e rins de camundongos demonstrou que HC não teve efeito sobre o peso destes órgãos, porém o tratamento com haloperidol reduziu o peso do fígado (Gráfico 11), o principal órgão envolvido na biotransformação de fármacos. Com base nestes resultados, a administração subcrônica de HC em camundongos por um período de 28 dias não levou à tolerância farmacológica no teste da placa quente, induziu alterações na temperatura semelhantes àquelas encontradas com outras drogas que atuam sobre o SNC, e não produziu efeitos tóxicos significativos na dose e via testadas, no entanto, existem outros estudos a serem realizados sobre a segurança na utilização de HC (por exemplo, fetotoxicidade, genotoxicidade). Estes resultados podem servir para estimular ainda mais estudos complementares que permitam o uso seguro de HC. A terceira etapa da avaliação do efeito antinociceptivo de HC consistiu na elucidação do mecanismo de ação de HC. Essa fase do trabalho foi fundamentada em estudos prévios relatados para alguns monoterpenos semelhantes quimicamente à HC, como por exemplo, mentol e linalol. O efeito antinociceptivo do (-)-mentol foi bloqueado por antagonistas de receptores opióides (GALLEOTTI et al., 2002), enquanto o efeito antinociceptivo do (-)-linalol foi revertido por antagonistas opióides, muscarínicos e dopaminérgicos D2, assim como por glibenclamida, um bloqueador de canais para potássio sensíveis à ATP (Peana et al., 2003). Além disso, citronelol, outro monoterpeno hidroxilado, e a (R)-(-)-carvona foram capazes de reduzir a excitabilidade em nervo isquiático de rato pela redução da amplitude do potencial de ação composto (DE SOUSA et al., 2006; GONÇALVEZ et al., 2008). Estes resultados reforçam as informações sobre o mecanismo de ação antinociceptivo do citronelol e da (R)-(-)-carvona, pois OLIVEIRA, F. S. 99 compostos que bloqueiam canais iônicos dependentes de voltagem constituem uma ferramenta importante para o tratamento da dor (AMIR et al., 2006). Os resultados com HC demonstraram a eficácia dessa substância em diferentes modelos de nocicepção gerados pela exposição física, por estímulo nociceptivo térmico aplicado no teste da placa quente, já comentado anteriormente, e por indução química, por administração de formalina (HALEY; SULLIVAN; DICKINSON, 1990) ou ainda, utilizando a técnica do “single sucrose gap”. O teste da formalina é um modelo seguro e válido de nocicepção sensível a várias classes de drogas analgésicas. A formalina produz uma resposta bifásica distinta, onde drogas analgésicas podem atuar diferentemente na primeira e segunda fases do teste (MORTEZA-SEMNANI et al., 2002). A primeira fase do modelo da formalina ocorre devido à liberação de substância P e à estimulação química nociceptiva direta de fibras aferentes, principalmente as fibras C (HEAPY; JAMIESON; RUSSEL, 1987), sendo sensível a drogas que agem em nível central como a morfina. Já a segunda fase, resulta da ação de mediadores inflamatórios locais, como por exemplo, prostaglandinas, serotonina, histamina e bradicinina (MURRAY; PORRECA; COWAN, 1988; TORNOS et al., 1999; RUJJANAWATE; KANJANAPOTHI; PANTHONG, 2003), ou por uma facilitação da transmissão sináptica espinhal (TJOLSEN et al., 1992; FRANÇA et al., 2001). Entre a primeira e a segunda fase do teste da formalina, ainda há um período de repouso chamado de “interfase” que ocorre devido a uma ativação de processos inibitórios não regulados por mecanismos que envolvem o GABA, já que agonistas gabaérgicos tipo A inibem a diminuição de manifestações de dor durante esse período (HENRY et al., 1999; LIRA, 2001). Drogas que atuam em nível central, tais como analgésicos opióides, inibem ambas as fases do teste da formalina, entretanto, drogas de ação periférica como os antiinflamatórios somente são eficazes na segunda fase (SANTOS et al., 1994; FARSAM et al., 2000; ADEYEMI; OKPO; OKPAKA, 2004). Segundo Hunskaar e Hole (1987), tanto os antiinflamatórios não-esteroidais quanto os corticosteróides agem na segunda fase da formalina, como por exemplo a indometacina e a dexametasona; o AAS não possui qualquer atividade na primeira fase quando comparado ao efeito da morfina (RUJJANAWATE; KANJANAPOTHI; PANTHONG, OLIVEIRA, F. S. 100 2003). Assim, essa metodologia representa um modelo que pode ser utilizado para estudar o mecanismo de drogas antinociceptivas e que tem boa correlação com a dor clínica (TJOLSEN et al., 1992; CAMPOS et al., 2002). Estudos recentes realizados com HC mostraram que seu efeito antinociceptivo não foi antagonizado pela naloxona, um antagonista opiáceo, tanto na placa quente quanto no teste da formalina (OLIVEIRA; DE SOUSA; ALMEIDA, 2008). O fato de que o linalol, outro monoterpeno hidroxilado, assim como a HC, ter tido seu efeito antinociceptivo reduzido por antagonistas muscarínicos e dopaminérgicos serviu de base para essa etapa do estudo. No presente trabalho, a atropina, um antagonista não seletivo de receptores muscarínicos, não antagonizou o efeito de HC, em ambos os testes utilizados. Além disso, a pirenzepina, um antagonista seletivo de receptores muscarínicos M1, também não conseguiu inverter a antinocicepção induzida por HC (Gráficos 12, 13 e 14). Estes resultados sugerem que a transmissão muscarínica não está envolvida diretamente no mecanismo de ação de HC. Da mesma forma, a administração prévia de sulpirida, um antagonista de receptores da dopamina D2, não alterou a atividade antinociceptiva de HC nas doses utilizadas, tanto na placa quente quanto no teste da formalina (Gráficos 15, 16 e 17), sugerindo que esse subtipo de receptor dopaminérgico não está envolvido de forma direta no efeito de HC. Portanto, os resultados encontrados para HC diferem daqueles encontrados para o linalol, uma vez que o efeito antinociceptivo deste monoterpeno foi antagonizado pela atropina e sulpirida. Os autores sugerem que seu efeito está envolvido com receptores muscarínicos e dopaminérgicos D2, com consequente abertura dos canais para K+ (PEANA et al., 2004). Na técnica do “single sucrose gap”, a inibição da excitabilidade neuronal está associada com o bloqueio dos canais para Na+ dependente de voltagem. HC diminuiu a amplitude e a velocidade de despolarização do PAC (Tabelas 5 e 6), levando à hipótese de que o efeito antinociceptivo observado nos diferentes modelos utilizados em estudos anteriores, provavelmente ocorra como resultado do bloqueio desses canais. Por outro lado, HC não afetou o tempo da constante de repolarização (Tabela 7), sugerindo que HC não tem efeito direto sobre os canais para K+ dependentes de voltagem, responsáveis pela repolarização do potencial de ação em nervos periféricos. OLIVEIRA, F. S. 101 Um grande número de tipos de canais iônicos está presente em axônios mielinizados. Cada tipo de canal é regionalmente distribuído de forma nãouniforme nesses axônios (KOCSIS et al., 1987; ENG et al., 1988; ROPER; SCHWARZ, 1989; WAXMAN, 1995). Os canais para Na+ são encontrados em grande quantidade na membrana do axônio na região dos nódulos de Ranvier, onde eles são necessários para a geração do potencial de ação. Em contrapartida, o número de canais para Na+ diminui expressivamente nas regiões dos internódulos e há uma densidade menor desses canais na membrana internodular do axônio, abaixo da bainha de mielina (BLACK; KOCSIS; WAXMAN, 1990; RASBAND; TRIMMER, 2001). Além disso, estudos mostraram que canais para K+ dependentes de voltagem podem ser encontrados em zonas nodulares e internodulares (GUVEN et al., 2006). Os resultados mostraram que o efeito antinociceptivo de HC não está diretamente envolvido com o sistema muscarínico ou com receptores dopaminérgicos D2. Por outro lado, demonstraram que a HC tem um efeito antinociceptivo que poderia estar relacionado a uma redução da excitabilidade neuronal através da inibição dos canais para Na+ dependentes de voltagem. Os resultados apresentados nesse trabalho mostram o promissor efeito antinociceptivo de HC no SNC, observado também por v.o., desprovido de tolerância e toxicidade grave após tratamento subcrônico de 28 dias.. Entretanto, estudos adicionais são necessários para elucidar eventuais mecanismos de ação de HC em nível molecular, com o intuito de fornecer subsídios capazes de estabelecer a participação da HC nos mecanismo inibitórios da dor em nível central. OLIVEIRA, F. S. 103 VIII – CONCLUSÕES Diante dos resultados obtidos nas metodologias utilizadas neste estudo, conclui-se que HC nas doses e vias testadas: Ö Apresentou uma elevada DL50 por via oral, o que representa uma baixa toxicidade aguda, permitindo a utilização de doses nos testes subseqüentes, desprovidas da observação de efeitos tóxicos; Ö Apresentou atividade antinociceptiva por via oral mediada por mecanismos centrais como evidenciado nos testes das contorções abdominais induzidas por ácido acético e da imersão da cauda; Ö Não induziu tolerância farmacológica durante 28 dias de avaliação e alterou a temperatura dos animais, bem como não causou efeitos comportamentais tóxicos relevantes ao longo de todo o tratamento subcrônico; Ö Não provocou alterações bioquímicas e hematológicas importantes, assim como, não interferiu no peso de alguns órgãos vitais dos camundongos; Ö Seu efeito antinociceptivo central provavelmente não envolve de forma direta o sistema muscarínico e os receptores dopaminérgicos D2, e parece atuar bloqueando os canais para Na+ dependentes de voltagem. OLIVEIRA, F. S. Referências 105 REFERÊNCIAS ADEBIYI, R. A; ELSA, A.T.; AGAIE, B. M.; ETUK, E. U. Antinociceptive and antidepressant like effects of Securidaca longepedunculata root extract in mice. Journal of Ethnopharmacology, v. 107, p. 234-239, 2006. ADEYEMI, O. O.; OKPO, S. O.; OKPAKA, O. The analgesic effect of the methanolic extract of Acanthus montanus. Journal of Ethnopharmacology, v. 90, p. 45-48, 2004. ADZU, B.; AMOS, S.; DZARMA, S.; WAMBEBE, C.; GAMANIEL, K. Effect of Zizyphus spina-christi Willd aqueous extract on the central nervous system in mice. Journal of Ethnopharmacology, v. 79, p. 13-16, 2002. ALMEIDA, F. R. C.; OLIVEIRA, F. S. Avaliação de drogas analgésicas de ação central. In: ALMEIDA, R. N. Psicofarmacologia: fundamentos práticos, 1ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006a. cap. 17, p. 179-188. ALMEIDA, R. N.; BARBOSA-FILHO, J. M. Drogas psicotrópicas. In: ALMEIDA, R. N. Psicofarmacologia: fundamentos práticos, 1ª Ed. 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OLIVEIRA, F. S.; LIMA, M. R; SILVA, M. R.; DE SOUSA, D. P.; ALMEIDA, R. N. Toxicidade e ação hidroxidiidrocarvona antinociceptiva central de administrada por via oral. Resumos do V Encontro Anual de Pesquisa do Laboratório de Tecnologia Farmacêutica – ENAP, João Pessoa / PB, 2007. OLIVEIRA, F. S.; SILVA, M. R.; SOUSA, D. P.; ALMEIDA, R. N. Determinação da dose letal 50% e efeito antinociceptivo central de hidroxidiidrocarvona em camundongos tratados por via oral. Anais do II Reunião Regional da Federação de Sociedades de Biologia Experimental – FeSBE, Recife / PE, 2007. OLIVEIRA, F. S.; DE SOUSA, D. P.; ALMEIDA, R. N. Effect of hydroxydihydrocarvone in spontaneous locomotor of mice treated orally. Anais do II Simpósio do Instituto Internacional de Neurociências de Natal, Natal / RN, 2007. OLIVEIRA, F. S; SOUSA, D. P.; SENA, M. C. P.; NÓBREGA, E. B.; ALMEIDA, R. N. Efeito antinociceptivo de hidroxidiidrocarvona: evidências farmacológicas do não envolvimento com mecanismos muscarínicos. Resumos da 39º Congresso Brasileiro de Farmacologia e Terapêutica Experimental – SBFTE, Ribeirão Preto / SP, 2007. OLIVEIRA, F. S; SOUSA, D. P.; SANTOS, C. C. M. P.; LIMA, M. R. V.; ALMEIDA, R. N. Avaliação da possível tolerância farmacológica de hidroxidiidrocarvona no teste da placa quente durante um tratamento subcrônico. Resumos da 39º Congresso Brasileiro de Farmacologia e Terapêutica Experimental – SBFTE, Ribeirão Preto / SP, 2007. 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