O ESCRITOR
RODAPÉ
JORNAL DA UBE
Sobre O Livro, a Literatura e o Computador,
de Sérgio Luiz Prado Bellei
Fábio Lucas
sofia pragmática, utilitarista e
desumanizadora da globalização,
consiste em confundir as conquistas tecnológicas com o avanço
cognitivo do homem, impulso
mais totalizador e humanitário do
saber.
Da leitura de O Livro, a Literatura e o Computador advém abundante e segura provisão
conceitual. Importa assinalar a
boa distribuição temática,
seqüencial e extremamente produtiva para a apreensão do assunto.
A obra terá certamente grande
proveito para os estudiosos de literatura, comunicação, antropologia filosófica e de informática,
bem assim para os empenhados
em atividades afins, como o jornalismo, a propaganda e a lingüíst ic a ,
em
e s p e c ia l
a
sociolingüística.
Se houver senões a apontar, desejamos referir a ausência de abonações em língua portuguesa. Cremos que o autor, jungido à bibliografia utilizada, socorreu-se ape-
A tendência contemporânea, regida pela filosofia
pragmática, utilitarista e desumanizadora da
globalização, consiste em confundir as conquistas
tecnológicas com o avanço cognitivo do homem,
impulso mais totalizador e humanitário do saber.
nas das obras em língua inglesa,
como The Life and Opinions of
Tristram Shandy, de Laurence
Sterne, Ulysses, de James Joyce,
e outras. Mesmo obras como
R a y e l a , d e J u l i o C o r t á z a r,
Ficciones, de Jorge Luis Borges, e
autores como Umberto Eco, Régis
Débray, Pierre Bourdieu, Michel
Foucault, são mencionados em traduções para o inglês. Sem contar
que o acesso à obra de Platão é
feito mediante tradução inglesa.
Outra breve imperfeição foi basear-se o autor de preferência na
produção narrativa, sem um exame específico da produção poética pela via eletrônica, assunto
bastante explorado, por exemplo,
pelo poeta e ensaísta português E.
M. de Melo e Castro (cf. as obras
In Novar, Porto, Plátano, 1977;
Algorritmos: infopoemas, S. Paul o , M u s a , 1 9 9 8 e Uma
Transpoética 3D, separata de Dimensão, Uberaba, n.º 27, 1998,
e exposições diversas em universidades brasileiras e portuguesas).
De qualquer forma, O Livro, a Literatura e o Computador, de Sérgio Luiz Prado Bellei, enriquece o
catálogo da editora e traz nova
contribuição ao debate dos temas
enunciados no título.#
FÁBIO LUCAS é crítico literário e
ensaísta, autor de Vanguarda,
história e ideologia da literatura, O
caráter social da ficção do Brasil e
Expressões da identidade brasileira
No 102 - Março/2003 - Pág. 24
temporalidade da antiga, comandada pelo princípio da causalidade. O mundo logocêntrico será sucedido por um universo em que se
determinará o primado da vastidão e do acaso, algo informe, topográfico, extensivo até o infinito.
Na esfera da crítica, Sérgio Luiz
Prado Bellei tem em consideração
os limites do meio eletrônico, admitido como “caixa de ferramentas” à disposição do executor,
desligada, todavia, das condições
de produção. Uma espécie de
hipermercado da informação, dominado pelas corporações provedoras. Chega a discutir os projetos universitários de educação a
distância, repelidos pelos profess o re s da Un i v e r s ida de da
Califórnia e da Universidade de
York no Canadá.
O cerne da questão está em distinguir tecnologia e conhecimento, duas esferas diferentes da
capacitação humana. A tendência
contemporânea, regida pela filo-
!
O escritor Sérgio Luiz Prado Bellei
!
O Livro, a Literatura e o Computador (São Paulo, Educ/Ufsc,
2002), de Sérgio Luiz Prado Bellei,
traz uma contribuição nova à discussão do tema no Brasil. Impressionam ao leitor a segurança dos
conceitos, a distribuição da matéria em capítulos e a riqueza da
bibliografia, tendo em vista os elementos contidos no título: o livro,
a literatura e o computador.
A obra se credencia a bem informar acerca do panorama atual
da comunicação eletrônica e das
suas possíveis conseqüências sobre as formas convencionais da
escrita. Deste modo, historia os
antecedentes das aberturas do
texto ao longo da vigência da escrita linear em direção ao que
hoje se denomina hipertexto. Tanto o exploratório quanto o construtivo, que associa à viagem da
imaginação os campos visual e
auditivo, combinados ao textual.
A obra, assim, explora o futuro
do livro impresso na civilização
ocidental, na linha das reflexões
de Umberto Eco. Anuncia o advento da “textura”, para melhor
definir o posicionamento do leitor do texto computadorizado. E
principalmente evita o marco ideológico nas considerações sobre
a conquista tecnológica, bem
como contorna as discussões
a c e rc a
da
c o m p e t ê nc ia
linguajeira.
Ao mesmo tempo, o autor distingue as duas correntes que se
manifestam quanto à possibilidade da predominância do “lautor”
(misto de “leitor” e de “autor”),
em contraposição à sobrevivência
hegemônica do leitor subordinado
ao esquema narrativo do autor. Assim, põe em destaque a leitura
processada pelo meio eletrônico,
diferente daquela devida ao meio
impresso. Para uns, assistimos ao
advento de nova era; para outros,
a informática instaura uma crise
no âmbito do conhecimento e se
deixa aprisionar aos interesses
mercadológicos. De qualquer
modo, aceita-se estarmos no
declínio da tirania do “autor”, tal
como o concebeu o romantismo.
Menos se sabe acerca da
entronização do “wreader”
(“lautor”), operante da leitura
eletrônica, mais participativo,
mais construtivo do que o “leitor”
da tradicional leitura textual linear.
O autor de O Livro, a Literatura
e o Computador explora devidamente a espacialidade da nova leitura, em detrimento da
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de Sérgio Luiz Prado Bellei