A A história de Édipo relaciona-se com a história de um poder, o poder político. Interessado em manter a própria realeza, Édipo procura a solução do problema dos habitantes de Tebas contra a peste, recorrendo ao poder divino do oráculo de Delfos. Ao sentir-se ameaçado pelas respostas que surgem, no momento em que o oráculo o designa e, mais tarde, quando o adivinho profere, de forma ainda mais clara, que é ele o culpado, Édipo, sem responder em termos de inocência, diz a Tirésias: “Pois se é por causa deste poder – doado, e não reclamado – que a cidade nas minhas mãos depôs, pois se é por causa dele que Creonte, o leal, o amigo de sempre, me quis ludibriar, com a ambição de me depor, subornando um feiticeiro, um forjador de embustes como este, um charlatão enganador que só para o lucro tem olhos, mas para a sua arte é cego” (384-388). Desta forma, demonstra nitidamente, logo num momento inicial da peça, que a sua grande preocupação é a manutenção do seu poder. Aquando da grande disputa com Creonte, Édipo acusa-o de ser “ladrão manifesto do trono” (535-534), interrogando-o “Persuadiste-me ou não me persuadiste de que era necessário que eu mandasse um homem consultar o «venerável» adivinho?” (555-557), e afirmando “Que, se não se concertasse contigo, jamais me atribuiria o assassínio de Laio” (572-573) o que demonstra que Édipo se sente ameaçado não ao nível da sua inocência ou culpabilidade, mas sim ao nível do poder. Nesta contenda, fica ainda claro que o que move Édipo na sua busca é o dever de governar, de procurar uma solução para a peste que assola o povo de Tebas, quando refere que “Governar é o que devo” (625-630). Quando convocada a última testemunha – o pastor de ovelhas (o servo de Corinto) – é como soberano que Édipo lhe arranca a verdade, ameaçando-o de tortura: “Se não falares de bom grado, falarás por entre lágrimas” (1152). A alternância de poder corresponde ao perfil característico de Édipo. Esta dualidade é obtida através de uma série de aventuras que fazem dele inicialmente o homem mais miserável, em seguida, o homem mais poderoso e o levam novamente à desgraça. A irregularidade do destino é característica do personagem do tirano tal como é descrito nos textos gregos desta época. Várias são as atitudes reprováveis em Édipo nas suas discussões. Creonte diz-lhe que não deve “governar no erro” (625-630) e quando Édipo exalta a sua cidade, responde-lhe “Minha também é a cidade, não apenas tua” (630). Édipo é aquele que não dá importância às leis e que as substitui pelas suas vontades e ordens. Édipo não quer perder o seu poder, quer manter a sua soberania a qualquer custo, por isso está constantemente indagando argumentos que possam provar a sua inocência. Porém, tal não é o que acontece sendo que as testemunhas revelam a verdade (como se de um autêntico puzzle se tratasse) e Édipo cai em extrema desgraça, bem ao estilo das antigas tragédias gregas. Afinal, Édipo não era o rei legítimo de Tebas, era um típico tirano. Ana Catarina Fialho B Na última aula foi reportado pelo meu colega Manuel Melo, e debatida a obra – Rei Édipo questionando a acção humana, de uma forma racional, pelo leitor e não por quem sofre na pele as fatalidades da tragédia. Será que o ser humano age sempre consciente das consequências inerentes à sua acção? Será esta acção condicionada pelo exterior, ou não estará já predeterminada? E será essa predeterminação imanente ao Homem ou é-lhe imposta por algo de superior? Mesmo que o sujeito tenha vontade e conhecimento pode agir com erro? Deste modo pode alguém ser culpado sem ter consciência da sua culpa? Neste quadro como se relacionam responsabilidade, liberdade e culpa? Assim sendo, e não tendo Édipo consciência isso torna-o inocente ou, antes pelo contrário, faz dele ainda mais culpado porque devia conhecer? Sabendo nós que, o Rei Édipo, de Sófocles vem incorporado numa tragédia emblemática da Condição Humana, onde os deuses são o cerne da vida na terra. Sob a linha da mitologia grega, a ideologia da sociedade é altamente influenciada por deuses que trazem a vida e a morte. A fatalidade do destino e as suas circunstâncias são tidas em consideração em toda a obra, retratando a submissão do Homem ao determinismo de ‘profecias’ e a ironias do “Fado”. Também é relevante referir que Édipo é retratado simultaneamente como vilão e herói, expondo uma ambiguidade e sentimentos antagónicos no mesmo. Por fim, outro aspecto ainda importante é a consciência do erro, sem contudo apagar o sentimento de culpa e expiação e, culminando na fatídica auto-mutilação de Édipo tornando-se cego. Na obra, Sófocles retrata de forma ousada um drama do autoconhecimento (Édipo cometeu um crime sem ter consciência da gravidade e consequências dos seus actos com que viria a deparar-se no futuro), luta pelo poder, o incesto, o sofrimento humano, a morte, o desvio moral e social, transmitindo um ensinamento Ético da Condição Humana. Valter Duarte