AGROECOLOGIA E SEMENTES CRIOLAS:
UM OLHAR SOBRE A COMUNIDADE MATA PRETA EM CATALÃO (GO)
Liliana Beatriz da Silva
Campus Catalão/UFG
Geografia Trabalho e Movimentos Sociais - GETeM-CNPQ
[email protected]
Helena Angélica de Mesquita
[email protected]
Resumo
Este texto traz uma reflexão sobre a importância em repensar as atuais formas de produção de
alimentos, não intencionando aqui abrir debate sobre o que é melhor ou o que é pior, mas pensar
a comunidade camponesa, a agroecolgia e as sementes crioulas como possibilidade de
segurança alimentar. Expõe-se aqui a preocupação com a supervalorização da técnica em
detrimento dos saberes populares tradicionais, a inquietação em se pensar um mundo agrícola
controlado por sementes transgenéticamente modificadas e a grande utilização de agrotóxicos
que provocam sérios danos. Relatando assim uma experiência de trabalho de campo no qual
deparamos com experiências camponesas que contribuem sobremaneira para a compreensão das
argumentações apresentadas no texto, realçando a importância do trabalho de campo para o
processo de pesquisa.
Palavras-chave: Trabalho de Campo. Transgenia. Camponês.
Introdução
A proposta deste texto é trazer algumas experiências, com o objetivo de contribuir com
a discussão de temas relevantes como, agricultura camponesa, agroecologia e sementes
crioulas, bem como de demonstrar que o trabalho de campo “representa, portanto, um
momento do processo de produção do conhecimento que não pode prescindir da teoria,
sob pena de tornar-se vazio de conteúdo”. (ALENTEJANO, ROCHA-LEÃO, 2006, p.
57). Partindo deste pressuposto, pretende-se, na prática, demonstrar como teorias e
conhecimentos formulados sobre os temas propostos se realizam na Comunidade
camponesa denominada Mata Preta no município de Catalão-GO.
A Comunidade camponesa, a agroecologia e as sementes crioulas são hoje uma
alternativa não só para a sobrevivência de muitos camponeses e pequenos agricultores,
são a possibilidade de segurança alimentar e ambiental, com uma produção voltada a
conservação da vida e vida com boa qualidade.
1
A revolução industrial é para a humanidade um marco em termos de técnicas de
produção, não significou apenas uma transformação na maneira de produzir bens
manufaturados, foi uma revolução também na maneira de viver das pessoas, no
processo de urbanização e na produção de alimentos. No movimento do capitalismo
industrial monopolista, surgiram grandes corporações que a cada descoberta técnica
menospreza os modelos tradicionais de produção agropecuária. Dentre estas grandes
corporações estão a Monsanto e a Cargill, ambas estadunidenses e produtoras de soja
transgênica.
Este texto não considera o desenvolvimento da humanidade de maneira linear e
seguindo apenas o caminho do modelo agrário-agrícola atual, (PORTO-GONÇALVES
2004). Ao contrário pensa em modelos contraditórios, que se entrelaçam dentro do
contexto da evolução social e econômica da humanidade. Em pleno século XXI, fica
claro que todo avanço técnico produzido pelas grandes nações podem gerar catástrofes
ambientais e sociais. São vários os autores que acreditam naquilo que seria devaneio há
anos atrás, mas que neste século se faz necessário: o retorno à valorização da produção
de alimentos de maneira agroecológica, através de sementes crioulas e adubação verde.
Destacamos alguns destes autores são Altieri (2009), Zambelam, Froncheti (2002),
Porto-Gonçalves (2004), Mesquita (1993), e Mendonça (2004).
Existem também os movimentos sociais como Movimento das Mulheres Camponesas
(MMC), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Movimento Camponês Popular (MCP),
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) que lutam por justiça e equidade no
campo tentando impedir que o agronegócio venha subordinar definitivamente a
agricultura camponesa condenando a humanidade à insegurança alimentar. Concordam
com a necessidade de libertar o camponês da dependência de sementes e insumos
industrializados, emancipando e seres humanos e livrando os alimentos da
contaminação por agrotóxico e outros produtos químicos e o meio natural das agressões
provocadas pelo modelo de produção agrário/agrícola dito moderno: o agronegócio.
É interesse deste artigo, contribuir para que informações sobre o tema, alcance os
leitores, destacando a contribuição da pesquisa em campo aqui considerada essencial na
compreensão das realidades pesquisadas e na necessidade de refletir sobre as
contradições que envolvem a resistência dos camponeses.
2
Agricultura camponesa, agroecolgia e sementes crioulas
Segundo Lima (2010, p. 37) existe um grande debate entre a resistência e o
desaparecimento do campesinato dentro da expansão do modo de produção capitalista.
Para os marxistas-leninistas a agricultura camponesa estaria fadada, no
futuro, ao desaparecimento, pois a ascensão da forma capitalista de produção
acabaria por romper com as estruturas vitais para a pequena exploração da
terra, responsáveis pela inexorabilidade da forma de produção dos
camponeses. (LIMA, 2010 p. 36).
Não é interesse e nem seria possível neste artigo justificar o pensamento marxistaleninista considerando o contexto em que tal teoria foi pronunciada. Há de se destacar
aqui a lógica do desenvolvimento capitalista, que levaria a crer na impossibilidade da
manutenção do campesinato junto ao agronegócio. Porém, as contradições que
envolvem a sociedade, acabaram por estabelecer sua convivência, através da resistência
dos camponeses que lutam com diferentes estratégias para permanecerem na terra.
A evolução técnica apropriada pelo modo de produção capitalista colocou os homens
em uma cilada: deveria libertar o trabalhador de tantas horas de trabalho, deveria
apresentar soluções aos impactos ambientais, deveria acabar com a fome. Porém, seus
resultados foram invertidos ao esperado. O trabalhador continua explorado a níveis
extremos, Mesquita (1993), as agressões ao ambiente se intensificaram e a humanidade
não conseguiu resolver problemas milenares como a fome. Segundo Altieri, as
estratégias de desenvolvimento atual revelam-se limitadas, “não foram capazes nem de
atingir os mais pobres, nem de resolver o problema da fome, da desnutrição ou das
questões ambientais”. (ALTIERI, 2009 p. 19).
A agroecologia se traduz em um modelo de produção agrícola que objetiva restaurar a
saúde ecológica associada à preservação da diversidade cultural que nutre as
agriculturas locais (ALTIERI, 2009). Para Mesquita (2009) e Porto-Gonçalves (2006)
valorizar a agricultura local é considerar os saberes e os amplos conhecimentos dos
camponeses que vivem da terra. È compreender que mesmo sem grandes maquinários e
produtos químicos, muitos agricultores locais de geração em geração vêm transmitindo
as formas de produzir e o que produzir em seus locais de vivência. Ninguém melhor que
os Cerradeiros¹ para transmitir os conhecimentos sobre o que e como plantar em solos
do Cerrado, além de conhecer as possibilidades que o Cerrado possui em termos de
sementes, frutos e raízes de grande valor alimentício e medicinal.
3
O conhecimento camponês sobre ecossistemas geralmente resulta em
estratégias produtivas multidimensionais de uso da terra, que criam, dentro de
certos limites ecológicos e técnicos, a auto-suficiência alimentar das
Comunidades em determinadas regiões (Toledo et al., ALTIERI 2009, p.26).
Tentar compreender a agroecologia separando natureza e cultura seria incorrer em erro
grave, é preciso considerar que além dos conhecimentos técnicos a sabedoria popular
também se faz relevante quando se trata da produção de alimentos por camponeses. É
interessante a associação de conhecimentos técnicos “modernos” com os saberes
tradicionais, que possibilitam importantes informações a serem utilizadas no
desenvolvimento de manejos agrícolas apropriados a agrossistemas regionais. Porém o
que ocorre é a centralização da técnica em detrimento do conhecimento tradicional
popular. Segundo Ribeiro (2003),
Através de milhares de anos e no mundo inteiro, as bases de sustentação da
humanidade têm se apoiado nos processos de conhecimento do meio e na
adaptação, disponibilização e criação de recursos para a alimentação,
moradia, usos medicinais, vestimentas, abrigo, usos estéticos e outros, que os
integrantes das várias culturas locais – indígenas, camponeses, pastoris,
pescadores, habitantes dos bosques – têm realizado para sua sobrevivência,
legando assim esse conhecimento e a possibilidade de utilizar esses recursos
para toda a humanidade. Sempre foi um processo coletivo, aberto e livre.
(RIBEIRO, 2003, p. 52).
Porto-Gonçalves (2004) afirma:
que o processo de reprodução ampliada do capital que opera o atual modelo
de produção agrário/agrícola está ancorado em dois pilares básico: (1) no uso
de um modo de produção de conhecimento próprio do capital que se traduz
na supervalorização da ciência e das técnicas ocidentais (que se querem
universais); (2) na expansão das terras cultivadas, sobretudo em regiões onde
as terras são baratas. (PORTO-GONÇALVES, 2004, p. 224-225).
Desta evolução técnica nasce a transgenia como sinônimo de progresso, como solução
para a fome, diminuindo a diversidade dos alimentos consumidos, transformando os
hábitos alimentares, exigindo quase uma padronização do modelo de produzir, com os
mesmos agrotóxicos, as mesmas máquinas, os mesmos fertilizantes e atualmente com as
mesmas sementes, sementes transgenéticamente modificadas. Na agricultura industrial
as variedades industriais têm de ser freqüentemente renovadas ou trocadas
por outras para manterem os rendimentos prometidos pelas empresas que as
produzem e/ou porque se tornam vulneráveis às pragas e doenças (o que
significa a esse tipo de agricultores ter de comprar novas sementes em cada
Colheita). (RIBEIRO, 2003, p. 57).
4
Na verdade os produtores são obrigados a comprar todo o “pacote”, sementes e insumos
capazes de elevar a produção a custos altos perdendo assim autonomia em relação aos
cultivos. Dentro deste modelo os agricultores ficam a mercê de alguns grupos mundiais
como a empresa norte-americana Monsanto, que se encarregam de abastecer o mercado
mundial com sementes e insumos industriais. Este controle industrial de sementes
produz barreiras para a expansão da agricultura de alimentos estabelecendo uma injusta
realidade, produz quem pode comprar sementes dos monopólios agrotecnológicos
mundiais. Em caso de catástrofes que afetassem o sistema de transporte mundial, a
humanidade sucumbiria à fome exceto devido ao fato que camponeses continuam
preservando sementes crioulas, que são selecionadas por eles mesmos para os próximos
plantios.
São esta sementes geneticamente modificadas (PORTO-GONÇALVES, 2004) pelo
desenvolvimento natural da agricultura, que produzem a possibilidade de reprodução da
vida. Não devem se perder ou serem abolidas do sistema de produção de alimentos
mundial, devem ser preservadas e protegidas para garantir segurança alimentar a este
planeta já tão desgastado.
No município de Catalão-GO, a Comunidade denominada Mata Preta é formada por um
conjunto de unidades camponesas que procuram preservar as sementes crioulas,
naturalmente produtivas, selecionadas e cultivadas pelos próprios agricultores.
Foi nesta Comunidade que um grupo de alunos de graduação e pós-graduação em
Geografia da UFG, teve a possibilidade de conhecer as experiências de produção
camponesa, especialmente o cultivo com sementes crioulas de milho e hortaliças
cultivadas no sistema agroelógico.
Comunidade camponesa Mata Preta Catalão-GO
Sob a orientação dos Professores da Universidade Federal de Goiás Marcelo Rodrigues
Mendonça
Campus
Catalão
e
Adriano
Rodrigues
de
oliveira
Campus
Samambaia/Goiânia foi realizado o trabalho de campo á Comunidade camponesa da
Mata Preta no município de Catalão-GO a aproximadamente 20 km do perímetro
urbano. Os alunos já haviam realizado leituras e debates acerca do tema e em campo foi
utilizada a seguinte metodologia: distribuição dos alunos da graduação em grupos de
quatro, organizados com a mediação dos professores e dos mestrandos envolvidos na
atividade; Cada grupo foi responsável por um dos temas propostos de acordo com o
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trabalho de Campo cada “grupo de trabalho” se organizou internamente e distribuiu as
responsabilidades para melhor cumprimento das atividades realizadas; entre as
atividades
destaca-se:
conversas/entrevistas
com
professores,
técnicos,
colaboradores/facilitadores e membros das Comunidades. Foi autorizado pelos
camponeses o uso das imagens e informações obtidas em Campo. Dentre as atividades
propostas, estava a produção de registros audiovisuais utilizados para enriquecer as
informações obtidas em todo o processo.
Este trabalho de campo foi realizado em 05/05/2012 e contou para a avaliação com
relatório que deveria conter: título; resumo; introdução; metodologia da pesquisa;
resultados alcançados e conclusões. Os relatórios foram apresentados e debatidos em
sala de aula.
Os temas abordados pelos grupos foram: Dinâmicas e conflitos territoriais: o
Movimento Camponês Popular e a luta pela permanência na terra; Terra e Gênero: a
ação das mulheres camponesas na Feira Camponesa; As práticas agroecológicas como
estratégia de reprodução camponesa; Relações de trabalho na agricultura camponesa; O
meio geográfico: usos e formas de apropriação; Sementes crioulas: usos, sentidos e
perspectivas.
A primeira Unidade Camponesa visitada foi a de Dona Valda onde Wendel Ferreira
(Coordenador do MCP Regional) e outros agricultores militantes do movimento
explicaram o significado para a Comunidade em fazer parte de um movimento
organizado em prol da permanência dos camponeses na terra. As camponesas ali
presentes recitaram o poema “Homens da Terra” de Vinícius de Moraes (2009, p. 68).
Elas se emocionaram e sensibilizaram os participantes do trabalho de campo.
“Nossa guerra forja e funde
O operário e o camponês;
Foi ele quem fez o forno
Onde assa o pão que comeis.
Nosso pão de cada dia
Feito em vossa padaria
Com o trigo que não colheis;
Nosso pão que forja e funde
O camponês e o operário
No forno onde coze o trigo
Para o pão que vos vendeis
Nas vendas do latifúndio”.
“Senhor latifundiário!
Senhor grileiro de terra
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É chegada a vossa vez
A voz que ouvis e que berra
É o brado do camponês
Clamando de seu calvário
Contra a vossa mesquinhez”...
“Queremos bonança e paz
Para cuidar da lavoura
Ceifar o capim que dá
Colher o milho eu doura,
Queremos que a terra possa
Ser tão nossa quanto vossa
Porque a terra não tem donos
Senhores donos da terra.
Queremos plantar no outono
Para ter na primavera
Amor em vez de abandono
Fartura em vez de miséria”.
Vinícius de Moraes.
Em seguida foi servido o almoço camponês com um cardápio bastante típico: frango
caipira, salada de couve, carne de porco, angu de milho verde, preparados de maneira
coletiva para atender aos visitantes, curiosos em entender o modo de trabalho e vivência
dos moradores daquela Unidade Camponesa. O cardápio do almoço expressa a fartura
da mesa camponesa, considerando que todos os ingredientes foram produzidos ali na
Comunidade de maneira orgânica.
Após o almoço houve um período dedicado às entrevistas e exploração da propriedade
nas proximidades da casa, onde se pôde perceber os elementos utilizados na produção
para o autoconsumo, como criação de porcos, galinhas, pomar com plantas frutíferas,
hortaliças, (foto1), gado leiteiro e roça de milho proveniente de sementes crioulas. Após
estas observações foi realizada uma roda de conversa onde os alunos puderam dialogar
com os professores, militantes do Movimento Camponês Popular (MCP) e camponeses
ali presentes. Foi importante perceber a ajuda mútua, para a realização daquele almoço
para 80 pessoas. Os camponeses da Mata Preta reuniram os alimentos e o trabalho foi
coletivo, para realizar almoço e lanche, e também se reuniram para receber e contribuir
com esclarecimentos sobre a vivência e o trabalho no campo.
7
Foto 1. Cesta preparada com alimentos do quintal de dona Dalva.
Autor: SILVA, L. B. (05-05-2012).
Vale ressaltar que nas casas camponesas, as mesas são ornamentadas com cestas de
legumes, verduras, frutas e flores.
Ao encerrar a visita na primeira residência, o grupo se dirigiu á residência do senhor
Luiz, que é o guardião do campo de experimento de Sementes Crioulas (banco de
sementes crioulas). É a atividade demonstrativa dos procedimentos para a seleção e
conservação destas sementes. Para o senhor Luiz e sua esposa (foto 2) as sementes
crioulas representam “a semente da vida”. Eles possuem muito orgulho em fazerem
parte do grupo que tenta protegê-las e reproduzi-las. São camponeses, pessoas que
entendem o significado de produzir condições para sua reprodução familiar e social.
A reprodução de sementes oferece possibilidade aos camponeses de se libertarem da
aquisição de sementes monopolizadas por corporações que as modificam, impedindo
que as famílias tenham acesso aos cultivares necessários ao autoconsumo. Além das
sementes crioulas. A propriedade de experimento do Sr. Luiz cuida também dos
produtos utilizados na adubação verde. Foto 2.
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Foto 2. Senhor Luiz e esposa: guardiões do banco de sementes crioulas da
Comunidade camponesa da Mata Preta em Catalão-GO.
Autor: SILVA, L. B. (05-05-2012).
Na seqüência nosso aprendizado continua na Unidade Camponesa da Senhora Eristânia
onde os sabores camponeses novamente se apresentaram através do lanche, preparado
de forma coletiva pelas famílias envolvidas neste trabalho. A senhora Eristânia se
destaca por fazer parte do grupo de mulheres que comercializam os produtos orgânicos
que cultivam na feira (feira das mulheres camponesas) que é realizada na cidade de
Catalão uma vez na semana. Ela vende o excedente e contribui para a renda da família.
Além dos sabores, os saberes camponeses (MESQUITA 2009) também se apresentaram
naquele momento da visita em uma roda de conversa, demonstrando quantos
conhecimentos se pode adquirir com a sabedoria daquelas pessoas. São saberes
produzidos, reproduzidos e passados de geração a geração, que produzem. “Por
empírico entende-se o conhecimento baseado em experiências de anos e anos
(milenares) que marcaram a evolução da humanidade e sua relação com a natureza”.
(ZAMBERLAM, FRONCHETI, 2002, P. 94).
O trabalho foi encerrado na propriedade do senhor Divino, que possibilitou ao grupo
acompanhar o processo artesanal da produção da rapadura. O senhor Divino, a mulher e
a filha, ainda pequena, mas que também ajuda nas tarefas, retiram do trabalho com a
cana e derivados o sustento da família que é complementado com a comercialização de
ovos, quitandas, doces, leite derivados. O Excedente que produzem é comercializado na
9
feira de mulheres camponesas e contribui para a renda da família que aufere seu
sustento da terra com próprio trabalho. Fotografia 3.
Foto 3. Produção de rapadura na Unidade Camponesa da família do senhor
Divino.
Autor: SILVA, L. B. (05-05-2012).
Considerações finais
Após a Revolução industrial o mundo vem passando por várias outras revoluções como
a revolução urbana, a revolução técnica e a revolução Verde, responsáveis por
transformações radicais na forma de viver, trabalhar e pensar no Brasil e no mundo. No
século XXI o culto ao moderno e desprezo dos saberes daqueles que não são, por
exemplo, o roceiro considerando apenas um modelo de desenvolvimento para a
humanidade, o caminho que leva ao consumismo, ao individualismo, a degradação
ambiental, e o do desejo de ter sempre mais.
Todo esse “progresso” tem conseqüências, como a implantação do modelo de produção
agrário/agrícola no campo, expulsando milhares de camponeses que milenarmente
sobrevivem sem a contribuição de tantos avanços tecnológicos. Não se propõem aqui
uma defesa ao retrocesso, consideramos a importância da evolução tecnológica no
auxílio à saúde, transporte, comunicação, produção agrícola e tantos outros benefícios
que esta evolução oferece. O que se questiona é a imposição de apenas um modelo de
desenvolvimento, o modelo imposto pelo modo de produção capitalista, que não
permite, por exemplo, a democratização de tanto “progresso”.
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A Comunidade camponesa Mata Preta comprova a razão destas palavras, não possui
acesso a tanta tecnologia, talvez seus moradores nunca tenham ouvido falar da maioria
delas, porém, produzem sua própria vivência com respeito ao ambiente. A Comunidade
desfruta de bens que ajudam no conforto, bem estar e lazer, como eletricidade,
televisão, telefone celular e internet, mas preservam as relações sociais, as amizades, a
cooperação, a solidariedade e a preocupação com a mesa farta, o trabalho familiar, etc.
Nota
______________________
1
“refere-se às classes sociais que historicamente viveram nas áreas do Cerrado constituindo formas
materiais e imateriais de trabalho, denotando relações sociais de produção e de trabalho muito próprias e
em acordo com as condições ambientais, resultando em múltiplas expressões culturais. Atualmente se
configuram nos trabalhadores da terra, camponeses e demais trabalhadores que lutam pela terra e pela
reforma agrária, territorializando ações políticas contra o capital”. (MENDONÇA, 2004, P.29.)
Referências
ALENTEJANO, Paulo R. R.; ROCHA-LEÃO, Otávio M. Trabalho de campo: uma
ferramenta essencial para os geógrafos ou um instrumento banalizado? Trabalho de
campo. Boletim Paulista de Geografia. AGB, São Paulo: 2006 n 84, p. 51-68,
ALTIERI, Miguel. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável.
Porto Alegre. Editora UFRGS, 5 ed. 2009.
DOURADO, José Aparecido Lima. REFLEXÕES PARADIGMÁTICAS SOBRE A
QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL: dissídios e consensos. Revista CampoTerritório: revista de geografia agrária, fevereiro 2010, v. 5, n. 9, p. 33-50.
MENDONÇA, Marcelo Rodrigues. A urdidura espacial do capital e do trabalho no
Cerrado do sudeste goiano. Tese de doutorado em Geografia-Universidade Estadual
Paulista/Presidente Prudente. Presidente Prudente, 2004.
MESQUITA, Helena Angélica de. A Modernização da Agricultura: um caso em
Catalão (Goiás). Dissertação de Mestrado em História das Sociedades Agrárias – ICHL
– UFG - Goiânia, 1993 (Dissertação de Mestrado).
______MESQUITA, Helena angélica de. Onde estão as flores, as cores, os odores, os
saberes e os sabores do Cerrado brasileiro? O agro/hidronegócio comeu! Revista Terra
Livre, ano 25, n.33, 2009, p.17-33
MORAES Vinícius. Alimentando Sonhos: Cantos e Poesias. Movimento Camponês
Popular. Catalão. Gráfica Modelo, 2009.
11
PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. A globalização da natureza e a natureza da
globalização. Rio de Janeiro: Record, 2006.
______Geografia da riqueza, fome e meio ambiente. In OLIVEIRA, Ariovaldo
Umbelino. MARQUES, Maria Inez Medeiros (Org.). O campo no século XXI:
território de vida, e de construção da justiça social. São Paulo. Editora Casa Amarela e
editora Paz e Terra, 2004. P. 207-254.
RIBEIRO, SILVIA. Camponeses, biodiversidade e novas formas de privatização.
Trad.: Geraldo Martins de Azevedo Filho; Juan Alberto Pezzuto Blanco; Elisa Scheiner;
Werner Fuchs, Paulo Petersen. In: CARVALHO, Horácio Martins. (Org.). Sementes:
patrimônio do povo a serviço da humanidade. São Paulo. Editora Expressão Popular
2003.
ZAMBERLAM, Jurandir; FRONCHETI Alceu. Agricultura ecológica. Preservação do
pequeno agricultor e do meio ambiente. Petrópolis: Ed. Vozes 2ª edição 2002.
12
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