A Constituição Cidadã prevê em seu primeiro artigo fundamentos como a cidadania e
a dignidade da pessoa humana. O terceiro artigo constitui como objetivos fundamentais da
República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e
da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e visa a promoção do bem
de todos, sem qualquer forma de descriminação. Artigos posteriores da Constituição tratam
da defesa da paz e do repúdio ao racismo, terrorismo e por fim trata da cooperação de povos
para o progresso da humanidade.
O último Anuário Brasileiro de Segurança Pública revela que 2212 pessoas foram
mortas no Brasil pelo Estado. Um total de seis cidadãos por dia são mortos pela polícia. O
bastante para que em cinco anos ela tenha matado o que a polícia norte-americana matou em
30 anos. Uma pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal de São Carlos, denominada
Desigualdade Racial e Segurança Pública em São Paulo constatou que mais da metade dos
assassinados pelo Estado entre 2009 e 2011 tinham menos de 24 anos e 61% eram negros.
A mesma pesquisa revelou que 94% dos autores das mortes nunca precisaram
responder por tais atos, sob o argumento da legítima defesa e de exercício da função. Grupos
em redes sociais e blogs acabam recebendo conteúdo de operações (de acordo com um artigo
escrito por Camila Almeida para a revista Superinteressante) onde policiais exibem fotos de
cadáveres e a morte de criminosos é celebrada. Um leitor de um blog de admiradores da Rota
relata que “se sente triste ao se deparar com cenas como essas, aí me lembro que era um
bandido, a tristeza passa e abro um sorriso. Afinal, um a menos”.
Samira Bueno, diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública critica tal filosofia
de “bandido bom é bandido morto” no mesmo artigo de Almeida: “A gente está delegando ao
policial a decisão de quem deve viver ou morrer”. Todo o processo, do julgamento à pena,
acontece nos segundos de uma ação nas ruas e conforme o agente público achar melhor. Tal
julgamento possui como base o histórico policial desde os tempos da ditadura militar e a
descrença populacional no sistema judiciário.
Estatísticas de estudos também demonstram que 490 policiais foram mortos em 2013
e que apenas um quarto deles foi morto em serviço, demonstrando o ciclo vicioso da
vingança de criminosos matando policiais e a recíproca indefinidamente. A Polícia Militar de
São Paulo desejava como represália a tais números tornar crime hediondo o assassinato de
agentes, lei aprovada pelo Senado no dia 11 de junho de 2015 e aguardando sanção
presidencial.
Os dados descritos anteriormente acerca da polícia e sua conduta destoam
imensuravelmente dos ideais elaborados constitucionalmente no retorno à democracia e no
futuro planejado por todos em 1988. Bueno ressalta que um dos desafios atuais seria
justamente adequar a corporação aos valores desejados e cortar as raízes com épocas onde
tanta violência era o protocolo. Infelizmente tal forma de agir possui não só a moral de tropa
dos próprios policiais e sempre foi um valor encastelado no meio deles como também possui
a população como defensora, acreditando que o revide à altura das atrocidades criminosas é a
solução do problema, porém esse ciclo vicioso é uma guerra que continuará indefinidamente
e só trará prejuízos para a sociedade.
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