PROFESSORA PESQUISADORA: ALGUMAS REFLEXÕES
SOBRE ESSE CONCEITO
Jaqueline Regina Mota da COSTA
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FACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES/UERJ
RESUMO EXPANDIDO
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Fala-se hoje, com
insistência, no professor pesquisador. No meu entender o que há de
pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou
atuar que se acrescente á de ensinar. Faz parte da natureza da prática
docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua
formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque
professor, como pesquisador. (FREIRE, 1996, p. 15).
O que é ser professora? E pesquisadoras como poderiam definir? Seriam estas duas
atividades incompatíveis entre si? Ou seria possível considerar uma professora que leciona no
ensino fundamental, pesquisadora? Se a resposta for sim, de que natureza seria essa
investigação? A que tipo de pesquisa estaríamos nos referindo?
Neste artigo irei tomar as questões acima a fim de problematizar o sentido dado a
pesquisa tanto na formação de professores quanto para aqueles que já atuam no magistério,
já que este tem sido um tema controverso de estudos e um ponto importante na pesquisa que
temos desenvolvido na Faculdade de Formação de Professores da UERJ, sendo por
consequência, eixo central pesquisa apresentada.
Um autor central na discussão sobre “professora pesquisadora” tem sido Paulo Freire.
Sua discussão tem uma dupla natureza: epistemológica e política. Epistemológica porque
envolve concepções e compreensões do que seja conhecimento, pesquisa, docência. Política
porque toda ação humana, e a pesquisa em educação como parte de uma ação humana ocorre
em processos de interação e interlocução com outros e outras. Como nos alerta Freire em suas
tantas obras, educar e pesquisar não são atos neutros, ingênuos, nem solitários. Se, como
esclarece Freire, “educação é um ato político”, a pesquisa, como ato que educa professores e
alunos, como ação que forma, é, neste sentido, igualmente política.
Em diálogo e consonância com Freire no que se refere a discussão sobre docência e
pesquisa, trago uma autora que muito tem ajudado a aprofundar a discussão em pauta: Regina
Leite Garcia. Para a autora o sentido da pesquisa na escola não é o de que um outro externo a
instituição de ensino vá a esta dizer o que, de seu ângulo, está errado bem como deveria ser o
supostamente correto. Garcia defende, como Freire, que o sentido da pesquisa na escola
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básica é que as professoras desenvolvam olhares para seu cotidiano e sobre ele busquem
novas formas de estranhá-lo, compreendê-lo e melhora-lo. Outro ponto defendido por Garcia
(2001) é que fazer pesquisa não é de maneira alguma ser e estar em uma zona de neutralidade
ao contrário: toda pesquisa implica escolhas nada neutras: o que pesquisar, para quem, para
quê? Cada uma destas perguntas pressupõe tomada de posição. Garcia, portanto, aponta
claramente o importante papel político que representa fazer pesquisa neste país de tantas
desigualdades. A autora defende, com isso, que devem as professoras se assumem
pesquisadoras de seu cotidiano, de sua prática, e não se conformarem com a invasão das
“pesquisadoras” em suas salas de aula.
Garcia denuncia a postura arrogante daqueles e daquelas que se nomeiam
pesquisadores/as, entram nas salas de aula das professoras da escola básica e sentem-se no
direito de criticar as ações que veem. A autora afirma ainda, que a postura de quem faz
pesquisa na escola é, boa parte das vezes, de quem parece estar investigando e, ao mesmo
tempo, querendo ensinar aquelas que estão cotidianamente nas salas de aula, mas que,
segundo estes, “nada sabem”.
As questões que Freire (1996) e Garcia (2001) trazem nos provocam a refletir será que
a maioria dos professores faz pesquisa sobre a escola ou com a escola? De que natureza é a
pesquisa docente? Para quem os professores fazem pesquisa? Como sinaliza Garcia:
Pesquisamos para a academia ou para as agências de fomento ou para as
escolas onde a complexidade da realidade desafia a cada dia a competência
docente? (GARCIA, 2001, p.21)
Para quem fazemos pesquisa? Esta pergunta tem sido fundamental em nossa
investigação. Respondemos, em acordo com Freire e Garcia: para as professoras das escolas
públicas, para seus alunos e alunas pesquisamos para inquietar e indagar a nós e as/os
professoras/es.
Existe um mito amplamente difundido: de que quem sabe são as/os professoras/es da
universidade. “Elas sim fazem pesquisa. E ganham para isso.” Falam algumas professoras com
quem converso. No entanto, esse olhar tem mudado. A medida que várias professoras da
escola básica produzem pesquisa a partir do cotidiano que vivem, socializam essa investigação,
buscam formas de publicação, muitas vezes não convencionais
A pesquisa deve ser feita para trazer mudanças de pensamentos, atitudes, etc,
Pautado em uma perspectiva que dialoga com a de Garcia, temos a afirmação de
Freire (1996), para quem “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino” (p. 15). Ensinar
e pesquisar se perpassam todo tempo. Pesquisar e ensinar virá um exercício permanente de
luta diária do professor com a sociedade que diz “que ele não é pesquisador” e dele com ele
mesmo na exaustão do cotidiano escolar da escola básica.
Nós somos sujeitos históricos sociais, por isso nossas ações refletem nas salas de aula e
por onde vamos. Como nos aponta Nóvoa:
A formação de professores não pode considerar-se um domínio autônomo
de conhecimento e decisão. Pelo contrário, as orientações adaptadas ao
longo da sua história encontram-se profundamente determinadas pelos
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conceitos de escola, ensino e currículo prevalecentes em cada época.
(NÓVOA, 1954, p.96)
Por acreditar como a autora que nossos atos são influenciados por cada época vivida.
Anseio que a cada ano vão ser formados professores conscientes questionadores e
incompletos. Professores que acreditem que estar incompleto é a porta para a aprendizagem.
Estes educadores vão perceber que ter o nível superior não é estar pronto. Vão perceber a
educação pública e o chão da escola, não como uma estabilidade, mas como habitat
potencializador de uma educação melhor para as classes populares.
Seguindo a discussão sobre professora pesquisadora com Freire, trazemos um pouco
mais de palavras sobre o assunto: “fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No
meu entender o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de
ser ou atuar que se acrescente á de ensinar”. (FREIRE, 1996, p. 15).
É importante ressaltar que o professor não deveria separar-se da pesquisa. O ser
professor já nos remete a busca, por pesquisa. Contudo naturalizou-se a separação. Coloca-se
de um lado o professor, de outro o pesquisador. Como se os dois não andassem juntos. A
busca por pesquisa é um desemaranhar diário do professor. Já que o habito da pesquisa
precisa ser desenvolvido todos os dias cotidianamente dentro e fora da sala de aula.
Acreditar no chão da escola como potência, como terra fértil de pesquisa é o que
acreditam os autores:
Temos perseguido em nossas pesquisas e nas práticas formativas
continuadas que alimentam e são alimentadas por aquelas, a produção de
um conhecimento que reconheça a escola como um lugar legítimo de
produção de saberes legítimos e legitimados, o que pressupõe
problematizar a idéia de que as universidades, as secretarias de educação e
os centros de formação exteriores a escola, são os lócus privilegiado de
produção de conhecimento. (MORAIS, ARAÚJO E ARAÚJO, 2012, p. 7)
Como os autores, também acredito que a escola básica é um lugar potente, que
constrói e reconstrói conhecimentos cotidianamente e por isso devemos fazer pesquisa com a
escola e não sobre a escola. A medida que esta instituição e os sujeitos que dela participam
tem tanto a nos ensinar. Deste modo, percebo como imprescindível o estabelecimento do
dialogo entre escola-universidade como possibilidade de juntas produzirem pesquisas e
conhecimentos capazes superar os desafios da educação.
PALAVRAS-CHAVE: Professora pesquisadora - Escola, Universidade e Pesquisa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.
GARCIA, Regina Leite. Et al. Para quem pesquisamos, para quem escrevemos. O impasse dos
intelectuais. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção Questões da Nossa Época V 88).
MORAIS, Jacqueline. Et al. PROCESSOS DE (AUTO)FORMAÇÃO DOCENTE NO COTIDIANO DA
ESCOLA: HORIZONTES DE POSSIBILIDADES. Acessado em dia: 24/05/05. Disponível:
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http://www.colectivoeducadores.org.ar/cd_6to_encuentro/_pages/pdf/eje_2/pdf_2_varios/I0
31.pdf
NÓVOA, António. (Org.). Os Professores e a sua Formação. 2º edição, editora: Nova
Enciclopédia, 1992.
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Professora pesquisadora: algumas reflexões sobre esse conceito