Ser humano: a bola da vez! Descuidar da motivação dos funcionários pode ser fatal para o seu negócio. Mas quando há comprometimento, os resultados são surpreendentes. Se você acha que os seus funcionários não estão comprometidos, que as vendas estão diminuindo ea crise econômica impede sua empresa de crescer, cuidado. O problema pode ser você! A falta de liderança, muitas vezes, dificulta a união das pessoas para a conquista dos objetivos. Atualmente, as empresas que investem no relacionamento interpessoal interno têm conseguido encontrar diferenciais para manter seu crescimento no mercado. Mas antes de apresentar a importância desse assunto para o varejo de construção, é preciso saber um pouco de História. A economia mundial chegou na quarta onda de sua evolução: a prestação de serviços. A primeira onda foi a da agricultura, e em seguida a industrial e a da tecnologia. Agora, na era da prestação de serviços, o ser humano é a bola da vez. Por quê? Na era industrial, houve uma grande ênfase na máquina, na robótica, no computador. A visão dos empresários era produzir máquinas que substituíssem o homem, esse 'ser problemático'. Robôs, computadores e a automação se proliferaram nas indústrias. Mas chegou-se a um ponto em que todas ficaram com o mesmo nível tecnológico. Os produtos de um fabricante de geladeiras, por exemplo, usam o mesmo motor que todos os seus concorrentes. E até o robô da linha de produção é o mesmo em todas as fábricas. Então, como é possível se diferenciar? Através do atendimento personalizado ao cliente. E quem faz essa diferença não é mais a robótica nem o computador, e sim o ser humano. Já que, tecnologicamente, todos estão nivelados, o ser humano passou a ser o foco de investimentos das empresas como diferencial competitivo. Trabalhando pessoas Há 15 anos atuando em consultoria de RH pela TCA Consultores, Silvio Bugelli comenta como a atenção para as pessoas é importante no gerenciamento das empresas: "Quase sempre, as pessoas procuram o trabalho de vendas quando todas as outras alternativas se esgotam, o que é um problema. Afinal, um vendedor deve ter algumas competências indispensáveis. Não adianta empurrar o produto para o consumidor, ainda mais no varejo de construção". Ele comenta que muitos empresários o procuram "padronizar o atendimento", através de um manual de normas e procedimentos: "É claro que você pode ter algumas premissas. Mas cartilha não funciona, ninguém é robô. Ele também acredita que treinamentos motivacionais não fazem milagres: "Não existe uma sessão de treinamento onde a pessoa saia satisfeita. Ela pode até dar algumas risadas, mas a situação não muda muito. Um encontro de duas ou três horas não consegue motivar ninguém". Segundo Silvio, a empresa só consegue resultados através de um processo, que quase sempre é de longo prazo. "A própria empresa deve reavaliar a forma com que trata seus funcionários que, aliás, devem ser chamados de colaboradores. Qualquer mudança deve ser desenvolvida através de uma série de etapas. É preciso um processo, não um evento", comenta. Desmotivado? Eu? Para Silvio, uma pessoa motivada é aquela que está comprometida em fazer alguma coisa. Ele explica que o grande problema das empresas (em qualquer setor) é que as lideranças não deixam claro com o que os colaboradores devem se comprometer, achando que só o salário basta. "Não adianta você chegar no seu colaborador e pedir 'eu quero que você se comprometa comigo'. Primeiro, faça com que elas participem das decisões da empresa. Segundo, construa junto com elas o que foi decidido em conjunto. Dessa forma, existe uma chance maior de comprometimento", explica Silvio. José Maria, da Seteco (veja box nesta matéria), completa: "O próprio salário não motiva ninguém, e um aumento só deixa a pessoa satisfeita no primeiro mês. É preciso criar outros elementos para manter a equipe constantemente motivada". De acordo com o consultor Silvio Bugelli, o comprometimento nasce da participação, por exemplo, do processo de decisões. Muitas vezes, essas decisões podem envolver coisas básicas (mas importantes) dentro de uma empresa: lay out de loja, exposição de uma promoção de produtos, o melhor horário de almoço, etc. "O grande segredo é esse: quando as pessoas participam das melhorias do seu trabalho, elas sentem que também Fotógrafo Luiz Machado são donas e tornam-se comprometidas", revela Silvio. Infelizmente, muitas empresas criam barreiras para esse comprometimento. "O engraçado é que, ao mesmo tempo que se dá muita importância para o capital intelectual, ele é muito desperdiçado e mal usado", comenta. Silvio dá um exemplo: "Há alguns meses, precisei visitar, como consumidor, uma loja de material de construção na capital paulista. Reparei que a gerência havia instalado uma catraca para controlar o tempo que os vendedores gastavam no refeitório. O salário não era descontado, mas eles ouviam discursos do tipo: 'Olha, você ficou muito tempo fora da loja descansando'. Uma coisa absurda!". Contundente, Silvio classifica essa atitude de "policialesca": "Os próprios vendedores alegavam que não havia interesse em ficar fora da loja, afinal eles ganham em cima de comissão. A catraca não durou nem um mês. Você acha que as pessoas conseguem ficar motivadas em um ambiente assim?". Claro que não! Treinando as lideranças Para se ter um processo de atendimento diferenciado, não se deve trabalhar apenas a equipe. O líder, gerente ou dono da empresa deve ser o principal alvo do treinamento, segundo Silvio: "Nós chamamos o líder de educador. Por isso, quando o processo de liderança funciona bem, as coisas mudam". Para Silvio, a primeira coisa que precisa mudar é o preconceito que a maioria dos gerentes e chefes possuem: "Muitos olham para os seus funcionários como pessoas menores, sem muita cultura, incapazes de evoluir". Segundo ele, os gerentes costumam ter na ponta da língua argumentos como "o problema do funcionário é da porta para fora", ou "aqui dentro eu quero apenas que ele trabalhe". Segundo o consultor, a liderança deve perceber as pessoas. "Se eu olhar alguém de forma negativa, uma série de atitudes negativas é criada e reforça essa idéia. Mas se eu enxergar a mesma pessoa sob outro aspecto, o retorno será positivo". Entra gente, sai gente... mas o chefe fica! Vários segmentos do varejo, incluindo o da construção, sofrem com a grande rotatividade de vendedores, balconistas e funcionários. Mas isso dificilmente acontece com as lideranças. Segundo Silvio Bugelli, uma boa gerência consegue diminuir essa rotatividade. Sem contar que, quando isto acontece, a qualidade do atendimento é mantida. Uma coisa interessante: ninguém acorda de manhã e diz que hoje vai atender mal um cliente. Ele só faz isso quando não encontra no trabalho um ambiente propício. "O trabalho da liderança é justamente esse: fazer uma pessoa acordar na segunda-feira pensando que ela vai para um ambiente gostoso e produtivo", diz Silvio. Outro ponto importante: a liderança precisa trabalhar sempre para desenvolver a equipe, e não achar culpados. "Tem muita empresa onde os acertos da equipe são vistos apenas como uma obrigação a ser cumprida. Já os erros são destacados. Isso é totalmente errado". Portanto, é preciso pensar da seguinte forma: Se você quer que o seu funcionário atenda bem o seu cliente, atenda bem o seu funcionário. "Se algo não estiver bem na empresa, o funcionário não é louco de desacatar o gerente. E ele acaba desacatando quem? O cliente. É muito mais fácil descarregar toda a raiva que tenho do gerente no cliente. De que forma? Não atendo, sou displicente, não dou informação, etc.", conta Silvio. Por isso, o clima da empresa influi decisivamente. E ele é ditado pelo líder, que não deve enxergar as pessoas como simples funcionários. Silvio Bugelli ironiza esse termo que classifica como pejorativo: "Existe uma definição bem curiosa de funcionário: ele só está na empresa enquanto funciona. No dia em que ele parar de funcionar, ele não serve mais, portanto, é descartável. Os donos de empresas precisam enxergar que ele é um colaborador, e não um funcionário", finaliza. Um caso para se pensar "As empresas que procuram estar sempre na frente estão voltadas a formar os profissionais. Não esperam mais que eles venham formados. E passam a criar metodologias para buscar o seu público-alvo de forma diferenciada", diz José Maria Chapina de Alcazar, diretor da Seteco, empresa paulista que há 35 anos presta serviços de consultoria fiscal e tributária para vários clientes do varejo e indústria. A trajetória da Seteco é uma prova de como o investimento nas pessoas traz resultados. "Há quatro anos ampliamos nosso departamento de RH. Antes, ele era responsável pelas obrigações Fotógrafo Luiz Machado tributárias e fiscais, ou seja, da CLT, e cuidava dos registros em carteira. Mas como o atendimento ao cliente começou a tomar uma ênfase muito grande, foi preciso se voltar para a nossa equipe", comenta José Maria. Nesta ampliação, foi montado um departamento de RH voltado ao público interno com duas psicólogas. Passaram a ser aplicados treinamentos com a equipe e palestras com temas variados, como por exemplo, "Como lidar com conflitos". E como se deve investir nas pessoas? "Facilitar o acesso à Educação (ensino médio ou universidades), fazer uma política de plano de carreira, motivar a equipe para sempre estar adquirindo cultura", diz. Segundo ele, a participação nos lucros da empresa também é uma modalidade muito inteligente, quando bem empregada. Para garantir o sucesso dos investimentos, ele ainda ressalta: "As metodologias de treinamento interno devem ser criadas por profissionais especializados, que entendem como se deve lidar com gente. Afinal, eu sou um técnico, e muitas vezes não sei como lidar com os conflitos e personalidades de dez, vinte ou trinta pessoas dentro de uma empresa", finaliza José Maria. Fonte: Jornal O Globo