SIMULAÇÕES DO PERÍODO MÁXIMO DE EXPOSIÇÃO
DO SER HUMANO À RADIAÇÃO SOLAR UV-B
Marcelo de Paula Corrêa (1, 2) e Artemio Plana-Fattori (1)
(1) Departamento de Ciências Atmosféricas – IAG – USP
(2) Aluno de Pós-Graduação (Mestrado em Meteorologia), bolsista FAPESP
ABSTRACT
The excess of exposure by the human being to the Sun and, consequently to UV-B radiation,
can bring serious risks to the health like the skin cancer and catarats. In this study, simulations are
carried out to determine the maximum time of exposure to the Sun at any day of the year, in the period
of 11h30m to 12h30m (maximum intensity of solar radiation) in two distinct sites (Brasília, alt. 1171m
and Guarujá, alt. 4m). It was taken in consideration concepts of radiative transfer using all the orders
of light scattering, real ozone concentrations profiles (radiative code Lowtran-7) and aerosol absence
in the atmosphere, as well as two distinct situations for the surface (refletances null and 25%).
1. INTRODUÇÃO
O excesso de exposição do ser humano ao Sol e, consequentemente à radiação UV-B, pode
trazer sérios riscos à saúde, como o câncer de pele e a catarata. Com o crescente aumento da incidência
destas doenças em grandes centros urbanos, segundo a “American Academy of Dermatology”
(http://www.aad.org/SkinCancerNews/), torna-se necessário o controle do tempo de exposição à
radiação solar diariamente.
Neste estudo são apresentadas simulações com o objetivo de determinar a máxima duração do
período de exposição de um ser humano sem qualquer proteção (cremes, chapéu, óculos de Sol, etc.) à
radiação solar entre 11h30m e 12h30m, sem que sejam atingidos limiares estabelecidos
internacionalmente para a ocorrência de prejuízo à saúde. Este intervalo de tempo, cujo limite superior
vale 60 minutos, é a partir daqui denominado período máximo de exposição. Estas simulações são
efetuadas ao longo do ano para duas localidades distintas (Brasília, alt. 1171m and Guarujá, alt. 4m).
Leva-se em consideração conceitos de transferência radiativa utilizando todas as ordens de
espalhamento da luz, perfis reais de concentração de ozônio, ausência de aerossol na atmosfera e duas
situações distintas para a superfície (refletância nula e 25 %).
2. METODOLOGIA
2.1. Irradiância Solar Absorvida pela Pele Humana
O cálculo da quantidade de energia solar que atinge um determinado alvo em superfície deve
levar em consideração as características da fonte de radiação (o Sol), do meio óptico absorvedor ou
espalhador (a atmosfera) e dos detetores (pessoas, plantas, animais ou mesmo radiômetros). O valor da
irradiância espectral numa superfície horizontal (S(λ) – [Wm-2/µm]), nas condições propostas para este
trabalho, é determinada pela relação:
2
d
S(λ ) =   S o (λ )TO3 (λ )Tatm (λ)µ o
(1)
d
onde os termos à direita representam, respectivamente: i) a correção devida à variação diária da
distância média Terra-Sol, ii) a irradiância espectral solar no topo da atmosfera numa superfície
normal à incidência, iii) a transmitância direta relativa à presença do ozônio, iv) a transmitância global
(direta + difusa) relativa a composição molecular da atmosfera e, v) o cosseno da distância zenital
solar.
Os comprimentos de onda utilizados variaram de 280 nm a 320 nm, que abrange a região da
radiação UV-B no espectro eletromagnético. Ao longo deste intervalo, a espessura óptica vertical da
composição molecular da atmosfera assume valores entre 0,92 e 1,63.
Na avaliação da transmitância atmosférica foram utilizadas as equações propostas por Skartveit
& Olseth (1988) que expressam a transmitância atmosférica como função da espessura óptica vertical
(τRλ) (Fröhlich & Shaw, 1980; Young, 1980) e do cosseno da distância zenital do Sol (µo), para
espalhamento molecular e superfície lambertiana com albedo A. Sendo assim, a transmitância global
(direta + difusa) é dada por:
Tatm =
exp( − τ Rλ µ o ) + f R (µ o , τ Rλ )[1 − exp( − τ Rλ µ o )]
(1 − A s ( τ Rλ ))
(2)
onde,
A = albedo da superfície
s = refletância atmosférica para radiação solar refletida pela superfície (Chandrasekhar &
Elbert (1954))
fR = fração da irradiância solar que não atinge a superfície terrestre
Tais equações são aproximações daquelas apresentadas por Chandrasekhar (1960) e
Deirmendjian & Sekera (1954), as quais incorporam todas as possíveis ordens de espalhamento da luz
em uma atmosfera plano-paralela, para Espalhamento Rayleigh conservativo. O domínio de validade
destas equações determina valores menores que 1,3 para a espessura óptica (Margraaf & Griggs, 1969)
porém, a extensão do domínio de validade para valores de espessuras ópticas até 1,6 (UV-B), caso
deste trabalho, deve-se à alta absorção da radiação pelo ozônio e o comportamento monotônico das
curvas de transmitância molecular. Margraaf & Griggs (1969) representam a mesma transmitância
através de uma expansão polinomial em 5 termos e pode-se constatar que uma expansão em maior
número não se faz necessária para o domínio de validade utilizado neste estudo.
Deve-se observar, da equação (2), que a refletância da superfície incrementa a transmitância
atmosférica por possibilitar o retorno de radiação à atmosfera a qual pode promover retroespalhamento para o solo.
A energia do feixe incidente também é atenuada pela absorção do ozônio, representada pela
variável TO3 . A absorção pelo ozônio é proporcional à concentração deste elemento na atmosfera, cuja
maior densidade encontra-se entre 20 e 30 km de altitude. Os cálculos de TO3 foram efetuados com o
código radiativo Lowtran 7 (Kneizys et al., 1988), implementando-se as características de uma
atmosfera tropical, variando-se a concentração de O3 na camada (240 a 320 Unidades Dobson (DU)),
de acordo com as concentrações médias tabeladas em Robinson (1966) para a faixa de latitudes que
abrange o Brasil. Ainda, através do código Lowtran 7, foram obtidos os valores das irradiâncias
espectrais incidentes (Soλ) no topo da atmosfera, para o intervalo de comprimento de onda utilizado
neste trabalho.
A pele humana reage à radiação solar segundo um fator de refletividade, função do
comprimento de onda. Green et al. (1974) apresentam uma expressão que exprime a dependência deste
fluxo solar global incidente em relação a resposta do sistema biológico. Este fator, ε(λ), representa a
eficiência relativa do fóton ultravioleta para induzir uma resposta biológica dos cromatóforos e é a
representação de um espectro para a ocorrência do eritema na pele humana.
ε (λ ) =
0,04485
3,9796.e ( λ − 296 ,5 ) / 2 , 692
+
1 + e ( λ −311, 4 ) / 3,13 (1 + e ( λ − 296,5 ) / 2, 692 ) 2
(3)
A análise da expressão (3) demonstra um pico máximo de eficiência em 296 nm (região do
UV-B) e praticamente se anula para valores acima de 320 nm, que compreende a região do espectro
UV-A. Por este motivo, explica-se a importância da aplicação deste estudo para a região do UV-B.
A quantidade total de energia que o ser humano absorve, dentro do espectro UV-B, é obtida
pela integração do produto entre a irradiância espectral solar que atinge a superfície e o fator ε(λ) que
caracteriza a reação da pele humana.
A integração, no intervalo de comprimento de onda para o UV-B, é dada por:
S = ∫ S(λ )ε(λ )dλ
(4)
∆λ
2.2. Período Máximo de Exposição
A análise do período máximo de exposição ao Sol deve levar em consideração o horário do dia,
o dia do ano e a localização do alvo (latitude, longitude e altitude), já que a posição do disco solar é
função destes parâmetros. Desta forma, nos cálculos µo deve ser considerado como um valor médio
das posições do disco solar entre o período de 11h30m e 12h30m, a fim de respeitar o horário de máxima
incidência e, portanto, de maiores cuidados à exposição do ser humano. De acordo com Paltridge &
Platt (1976) e Boczko (1984), a posição do disco solar é dada por:
µ o = sen ϕ sen δ o + cos ϕ cos δ o cos(ζ − 180 + 15(∈t + UTC))
(5)
onde: ϕ = latitude, δo = declinação, ζ = longitude, ∈t = equação do tempo e UTC = “Universal Time
Coordinate”.
3. RESULTADOS
Os resultados aqui apresentados levam em consideração uma atmosfera plano-paralela, livre de
nuvens e aerossóis, para as localidades do Guarujá (24°00’S e 46°22’W, alt. 4 m) e Brasília (15°45’S e
47°57’W, alt. 1171 m). O interesse nestas duas localidades decorre de sua importância no presente
contexto sócio-econômico. Os gráficos sugerem períodos máximos de permanência do ser humano,
sob o Sol, livre de protetores solares para diferentes conteúdos de ozônio na atmosfera, no horário de
máxima intensidade de radiação solar. Estes diagramas são apresentados para dois tipos distintos de
superfície para o Guarujá (refletância nula ou igual a 25% caracterizando, respectivamente, regiões
sobre o mar ou sobre a orla marítima) e um tipo para Brasília (refletância 25%).
O tipo de pele do indivíduo tem fundamental importância na determinação do tempo de
exposição e, de acordo com a “Environmental Protection Agency" (EPA) – NOAA – EUA
(http://www.noaa.gov/uvb/appen.html), são quatro os tipos fundamentais de pele de acordo com a
pigmentação: branca (tipo I), levemente morena (II), levemente bronzeada/morena (III) e mulata/negra
(IV). Através destes tipos básicos, aplica-se a mínima dose de energia requerida para ocorrer o
avermelhamento e, conseqüentemente, a ocorrência de eritema.
Os resultados obtidos podem ser resumidos como se segue:
1. O período de exposição aumenta quando o conteúdo de ozônio aumenta, já que contribui
para uma menor quantidade de radiação solar disponível na baixa atmosfera;
2. O período de exposição aumenta, de acordo com o tipo de pele, do tipo I para o tipo IV;
3. O ciclo anual do período de exposição apresenta um máximo no final de junho (solstício de
inverno no Hemisfério Sul);
4. Para uma dada altitude, o período de exposição diminui com o aumento do albedo de
superfície, já que o alvo recebe radiação adicional em função do retro-espalhamento
atmosférico de radiação refletida pela superfície;
5. Para uma dada superfície (mesmo albedo), o tempo de exposição diminui à medida que
aumenta a altitude (maior disponibilidade de radiação solar à superfície.
6. O período de exposição pode atingir o limite de 60 minutos conforme as condições
envolvidas (tipo de pele, época do ano, conteúdo de ozônio, altitude e albedo da superfície).
Guarujá (4m) - A = 0,25
60
50
50
50
40
40
40
30
20
Tempo (minutos)
60
30
20
10
10
0
90
180
270
0
0
360
90
50
50
40
40
40
30
20
Tempo (minutos)
50
30
20
10
180
270
180
270
360
0
50
50
50
40
40
40
Tempo (minutos)
60
Tempo (minutos)
60
30
20
90
180
270
180
270
360
0
50
50
50
40
40
40
Tempo (minutos)
60
Tempo (minutos)
60
10
30
20
10
0
180
270
360
Figura 1:
Tempo de Exposição à
Radiação Solar UV-B, sendo
A = Albedo da Superfície.
360
20
10
0
0
90
Dia do ano
Conteúdo Total de Ozônio na Camada:
270
30
0
90
180
Dia do ano
60
0
90
Dia do ano
20
360
0
90
Dia do ano
30
270
10
0
360
360
20
0
0
180
30
10
0
90
Dia do ano
60
10
270
20
Dia do ano
20
360
0
90
Dia do ano
30
270
10
0
360
180
30
0
90
90
Dia do ano
60
Tempo (minutos)
Tempo (minutos)
0
360
60
0
Tempo (minutos)
270
60
0
Tempo (minutos)
180
Dia do ano
10
Tipo IV
20
10
Dia do ano
Tipo III
30
0
0
Tipo II
Brasília (1171m) - A = 0,25
60
Tempo (minutos)
Tipo I
Tempo (minutos)
Guarujá (4m) - A = 0
180
270
360
0
Dia do ano
240 DU
280 DU
Tipo de Pele:
I
Pálida / Branca
II
Morena Clara
III
Morena
IV
Morena Escura / Negra
90
180
Dia do ano
320 DU
Bronzeamento:
Avermelhamento / Descascamento
Bronzeado Leve / Avermelhamento
Bronzeado Moderado
Bronzeamento Rápido
4. CONCLUSÃO
Deve-se destacar que o intuito principal deste estudo é analisar a importância da proteção à
radiação UV-B, no dia a dia em localidades de interesse sócio-econômico, sob condições atmosféricas
extremas, como céu aberto (ausência de nuvens) e limpo (ausência de aerossóis). Nestas condições,
presume-se que as estimativas do período de exposição correspondam a valores máximos da
irradiância UV-B disponível na proximidade do solo.
De maneira geral, o período máximo de exposição do ser humano à radiação solar diminui: (a)
durante o verão, (b) com a escassez de ozônio na estratosfera, (c) com a capacidade que a superfície
possui de refletir luz solar e, (d) de acordo com a altitude em que se encontra o observador. Desta
forma, nossos resultados são coerentes com advertências dirigidas às populações residentes em regiões
montanhosas em quaisquer épocas do ano, e não apenas a praticantes de esportes de neve
(http://nic.fb4.noaa.gov:80/products/stratosphere/uv_index/uv_clouds.html).
No específico caso brasileiro, deve-se lembrar a ocorrência de concentrações humanas
significativas em altitudes intermediárias àquelas correspondentes ao Guarujá e a Brasília, tais como
São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba e Campinas. Em outras palavras, estas populações encontram-se
expostas a condições intermediárias àquelas apresentadas nas colunas 2 e 3 da Figura 1. Constitui
recomendação deste estudo o uso de protetores solares (cremes, chapéus, óculos de sol, etc) por estas
populações, mesmo que a distância ao litoral possa representar um fator de resistência cultural.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Boczko, R., 1984: Conceitos de Astronomia, Editora Edgard Blücher, 429pp.
Chandrasekhar, S., 1960: Radiative Transfer, Dover Publications Inc., 393pp.
Chandrasekhar, S. & Elbert, D.D., 1954: The Ilumination and Polarization of the Sunlit Sky on
Rayleigh Atmosphere, Transactions of the American Philosophical Society, 44: 643 – 728.
Deirmendjian, D. & Sekera, Z., 1954: Global Radiation Resulting from Multiple Scattering in a
Rayleigh Atmosphere, Tellus 6: 382 – 398.
Fröhlich, C. & Shaw, G. E., 1980: New Determination of Rayleigh Scattering in the Terrestrial
Atmosphere, Applied Optics, V. 19, N° 11: 1773-1775.
Green, A. E. S et al., 1974: Photochem. and Photobiol., V. 19: 251 – 259.
Kneizys et al., 1988: Users Guide to LOWTRAN 7, Environmental Research Papers, N° 1010 - Air
Force Geophysics Laboratory, 137pp.
Marggaf, W. A. & Griggs, M., 1969: Aircraft Measurements and Calculations of the Total
Downward Flux of Solar Radiation as a Function of Altitude, Journal of Atmospheric Sciences,
V. 26: 469 – 477.
NOAA (National Oceanic and Atmopheric Administration) / EPA (Environmental Protection
Agency), 1998: Technical Appendices to the Experimental UV Index Factsheet –
http://www.noaa.gov/uvb/appen.html
Paltridge, G. W. & Platt, C. R. M., 1976: Radiative Processes in Meteorology and Climatology,
Elsevier Publishing Co., 318pp.
Robinson, N., 1966: Solar Radiation, Elsevier Publishing Co., 347pp.
Skartveit, A. & Olseth, J. A., 1988: Some Simple Formulas for Multiple Rayleigh Scattered
Irradiance, Solar Energy, V. 41, N° 1: 19 – 20.
Young, A. T., 1980: Revised Depolarization Corrections for Atmospheric Extinction, Applied
Optics, V. 19, N°20: 3427 – 3428.
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