Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti Nº 1 | Fev. 2011 ISSN: 2178-7689 . Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti Nº 1 | Fev. 2011 ISSN: 2178-7689 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti Membros do Corpo Editorial Ana Claudia Valentini Montenegro (AMF – Mestranda em Administração/Univ. Presb. Mackenzie) Clarissa Mazon Miranda (Mestranda em Comunicação/UFSM) Estela Maris Giordani (AMF – Doutora em Educação/UNICAMP) Gabriela Rockenbach de Oliveira (AMF – Mestranda em Engenharia da Produção/UFSM) Josele Nara Delazeri de Oliveira (AMF – Mestre em Engenharia da Produção/UFSM) Leandra Calegare (AMF – Mestre em Engenharia de Produção/UFSM) Paolo Garcia Moreno Leonardi (AMF – Doutor em Ciências Políticas/Univerità degli Studi di Roma “La Sapienza”) Patrícia Wazlawick (AMF – Doutora em Psicologia/UFSC) Paula Silva Bazzo (AMF – Mestranda em Administração/UFSM) Soraia Schutel (AMF – Mestre em Administração/UFSM; Doutoranda em Administração/UFRGS) Viviane Disarz (AMF – Bibliotecária) Viviane Teresinha Biachi Brust (AMF – Especialista em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, Mestranda em Letras/Estudos Linguísticos, UFSM). Expediente: Bibliotecária Responsável: Viviane Disarz | CRB 14/1051 Revista Saber Humano: Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti, n.01, fevereiro 2011. Estrada Reanto Maestro: Faculdade Antonio Meneghetti, 2011. Semestral ISSN – 2178-7689 1. Faculdade Antonio Meneghetti: periódicos. É permitida a reprodução dos artigos desde que citada a fonte. Os conceitos emitidos em cada artigo são de reponsabilidade de seus respectivos autores. Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti – AMF Estrada Recanto Maestro, nº 338 Distrito Recanto Maestro | Restinga Sêca-RS Cep: 97200-000 Tel. (55) 3289-1139 | (55) 3220-0344 [email protected] www.faculdadeam.edu.br Apoio: Fundação Antonio Meneghetti Associação Brasileira de Ontopsicologia Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Sumário A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho.………………………………………………………………… 10 Beatriz Machri de Pellegrini Ana Maris Petry Soraia Schutel A responsabilidade do emprendedor individual e suas perspectivas jurídicas…………………………….. 21 João Francisco Dias Feltrin Josemar Sidnei Soares A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário.……………………… 34 Letícia Balen Zereu Batistela Soraia Schutel Estratégia empresarial: planejamento e implementação.…………………………………………………………… 52 Maria Alice Schuch Vera Lúcia Rodegheri Ambientes confortáveis e humanizados...…………………………………………………………………………………… 67 Luiz Henrique Girardi Estela Maris Giordani Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens na sociedade atual……………………………………… 76 Maria Tereza Andreola Ana Maris Petry Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: estudo de caso da Lavanderia Acquachiara…………………..…………………………………………………………………………………………. 91 Lilian Werner Phillippi da Silva Soraia Schutel Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens 105 Ana Paula Mariano Pregadier Josiane Beatriz Piccin Barbieri Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no proceso de vendas…………………………………. 114 Joana de Jesus Adriane Maria Moro Mendes A esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova lei de estágio de estudantes 125 Alessandro Spiller Josemar Sidnei Soares Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Contents Leadership in the elderly: the meaning of work.…………………………………………………………………………. 10 Beatriz Machri de Pellegrini Ana Maris Petry Soraia Schutel The responsibility of the individual entrepreneur and their legal perspectives.………………………….. 21 João Francisco Dias Feltrin Josemar Sidnei Soares The role of counsel for success in decision-making entrepreneur...…………………………………………….. 34 Letícia Balen Zereu Batistela Soraia Schutel Corporate strategy: planning and implementation...…………………………………………………………………… 52 Maria Alice Schuch Vera Lúcia Rodegheri Comfortable environments and humanized......………………………………………………………………………….. 67 Luiz Henrique Girardi Estela Maris Giordani Predictors of leadership in the lifestyle of young people in modern society...…………………………….. 76 Maria Tereza Andreola Ana Maris Petry Development of the young leader and economic sustainability - social - environment: a case study of Acquachiara Laundry...…………………………………………………………………………………………………………… 91 Lilian Werner Phillippi da Silva Soraia Schutel Residence of authentication: the relationship between concept and self-sustaining exercise in young..……………………………………………………………………………………………………………………………………… 105 Ana Paula Mariano Pregadier Josiane Beatriz Piccin Barbieri Exploratory study on the application of intuition in the process of selling.……………………………….. 114 Joana de Jesus Adriane Maria Moro Mendes Schizophrenia demonstrated in the current legislation through the new law student internship 125 Alessandro Spiller Josemar Sidnei Soares Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Editorial A Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti, ISSN 2178-7689, tem como objetivo a publicação de trabalhos que sejam classificados nas seguintes modalidades: artigos/resultados de pesquisas, revisão de literatura (estudo teórico) e cases, nas áreas de Ciências Humanas e Ciências Sociais aplicadas, em especial áreas de Administração, Sistemas de Informação e afins. Com frequência de publicação semestral, a Saber Humano conta também com duas seções especiais: Seção Scio Ens que será destinada para outras áreas do conhecimento; e a Seção Episteme destinada à publicação de trabalhos especiais. O nascimento da Saber Humano Revista Científica se dá em decorrência do percurso histórico inicial da Faculdade Antonio Meneghetti-AMF nas áreas interligadas de ensino, pesquisa e extensão, e converge ações, bem como está em consonância com o momento em que a instituição começa a intensificar suas atividades na área de pesquisa. Descobrindo sua vocação, desde sua criação a Faculdade Antonio Meneghetti estimula a pesquisa entre docentes e discentes, as quais se encontram em publicações. No ano de 2009 a AMF instituiu um Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa-NIP, o qual realiza atividades conjuntamente entre professores e alunos, e a partir do ano de 2010 começou a reforçar sua área de Pesquisa Institucional, com a delimitação da Área de Concentração e 05 Linhas de Pesquisa. Como Instituição de Ensino Superior a Faculdade Antonio Meneghetti respeita e pratica o pressuposto fundamental da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. No âmbito de suas atividades de Pesquisa, de acordo com o Regimento Institucional (Título I Da instituição e seus objetivos, Cap. II, art. 4º), a AMF prioriza: - Estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; - Incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e à criação e difusão da cultura e, desse modo, promover o entendimento do homem em relação ao meio em que vive. No desenvolvimento da investigação científica e tecnológica, a Faculdade mantém um pertinente instrumento pedagógico e social para a consecução de seus objetivos educacionais. O fazer ciência, participando de atividades de pesquisa básica ou aplicada, tem um importante papel na formação do estudante, no despertar e aprimorar da qualidade que se reflete no preparo de um profissional capacitado a enfrentar problemas cotidianos (cf. Projeto Pedagógico Institucional – PPI, Faculdade Antonio Meneghetti). Dessa forma, as atividades de pesquisa e estudos científicos buscam atender às necessidades investigativas empreendidas pela instituição, bem como atender às necessidades regionais, tendo em vista promover a difusão e divulgação da produção científica dos professores e alunos, integrando a graduação e a pós-graduação. A Área de Concentração dos trabalhos de pesquisa da AMF é a Ontopsicologia. A Ontopsicologia é a mais recente entre as ciências humanistas contemporâneas e tem por objeto de estudo a análise da atividade psíquica inerente ao humano. Através do seu método é possível a repetibilidade e a reprodutividade dos resultados. A Ontopsicologia permite, na sua aplicação, tornar exato o pesquisador, o operador, o líder em qualquer campo que este opere. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ A Área de Concentração da Pesquisa Institucional da AMF congrega os fundamentos teóricos, epistemológicos e metodológicos da Ontopsicologia, tendo em vista que a mesma é uma ciência epistêmica – geral a qualquer procedimento científico ou intelectivo – e interdisciplinar, pois o seu destinatário é o operador do contexto global: o homem. Abrange também a atuação do conhecimento ontopsicológico, ou seja, suas aplicações práticas nas áreas de intervenção humanista-profissionais, tais como a Psicopatologia e Psicossomática, Pedagogia, Psicologia do Líder, Filosofia, OntoArte, Estética, Ética, Direito, e Metafísica existencial. A Ciência Ontopsicológica, ao ser aplicada na prática, viabiliza a experiência humana em sua totalidade. No contexto acadêmico-educacional possibilita a passagem multidisciplinar do aluno, de modo a orientar a construção de caminhos metodológicos para a ação otimal profissional. Tanto os cursos de graduação quanto os de pós-graduação da Faculdade Antonio Meneghetti aplicam a metodologia ontopsicológica, visando formar a inteligência global do aluno permitindo que o mesmo seja capaz de produzir e visualizar a realidade em diferentes ambientes e setores, de acordo com cada especificidade de localização. O escopo principal desta formação é favorecer o desenvolvimento humano ao progressivo crescimento econômico e social, e preparar homens aptos a resolver os constantes anseios da sociedade em contínua evolução. Portanto, neste ponto encontramos, de modo científico, a relação entre conhecimento, método e cultura a serviço da humanidade. A partir da Área de Concentração Ontopsicologia, as Linhas de Pesquisa foram delimitadas do seguinte modo: Linha 1 – Formação de Líderes, Empreendedorismo e Sustentabilidade; Linha 2 – Gestão de Negócios, Cultura Humanista e Intuição; Linha 3 – Informação, Tecnologia, Inovação e Memética; Linha 4 – Política, Direito, Ontologia e Sociedade; Linha 5 – Psicossomática Física e Organizacional. Mais informações sobre cada uma das linhas de pesquisa, profesores pesquisadores integrantes e temáticas de estudo desenvolvidas podem ser verificados na página da AMF, no seguinte endereço: http://www.faculdadeam.edu.br/pesquisa. Sendo assim, a Saber Humano se torna um instrumento que promove a veiculação do conhecimento científico produzido nos programas de pesquisa da própria instituição, bem como constrói uma interface de diálogo e promoção da interdisciplinaridade entre demais pesquisadores e instituições no cenário acadêmico e científico em primeira instancia regional, no contexto brasileiro e também internacional. Em seu primeiro número, datado de fevereiro de 2011, a Saber Humano, em uma edição inaugural, apresenta 10 artigos científicos que são frutos dos Trabalhos de Conclusão de Curso da primeira turma do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu MBA Business Intuition “Gestão de Negócios e Intuição”. Estes trabalhos foram apresentados e defendidos a uma banca avaliadora no período de 30/07 à 01/08/2010. Foi possível verificar, a partir da apresentação de cada trabalho de conclusão de curso que estes se converteram em ações de inovação para os empreendimentos já conduzidos pelos alunos, ou ainda em um primeiro passo para a abertura de um novo empreendimento. E, junto disto, fundamental se faz verificar que se tornam também conhecimento objetivado, produzido e registrado em um instrumento de informação, como esta Revista, que permite a circulação das novidades entre seus pares e a tantos outros espaços e contextos humanos de atuação acadêmica e profissional de mercado de trabalho. Neste número da Revista publicamos os seguintes trabalhos: Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Em A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho”, as autoras Beatriz Machri de Pellegrini, Ana Maris Petry e Soraia Schutel realizam um estudo descritivo sobre o sentido do trabalho para os líderes que, com posição econômica estável, permanecem em atividade após completar o tempo regulamentar que lhes possibilitaria estar na inatividade. Em A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas, João Francisco Dias Feltrin trata do instituto da responsabilidade aplicado aos empreendedores individuais, enfoca a origem e o percurso histórico desse instituto, registra a contribuição que a Ciência Ontopsicológica pode oferecer aos operadores de direito na resolução do problema e sintetiza o trabalho pela necessidade de adequação da legislação nacional aos novos tempos. No artigo A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário, Letícia Balen Zereu Batistela e Soraia Schutel discutem a função do assessor jurídico para o processo de tomada de decisão do empresário com o consequente sucesso em seu business. No artigo Estratégia empresarial: planejamento e implementação, as autoras Maria Alice Schuch e Vera Lucia Rodegheri abordam com a pesquisa o objetivo de investigar a visão de empresários sobre a implementação do planejamento estratégico, sendo este um constante desafio na realidade das organizações. Já no artigo Ambientes confortáveis e humanizados, Luiz Henrique Girarde e Estela Maris Giordani apresentam um estudo prático sobre conforto e funcionalidade de ambientes. Seus principais objetivos são: apresentar um panorama de como são desenvolvidos os projetos da maioria dos apartamentos em uma cidade do Estado de Santa Catarina; resgatar os conceitos necessários para o desenvolvimento de projetos funcionais, estéticos e com ambientes confortáveis; desenvolver um projeto de um edifício de apartamentos com ambientes funcionais, confortáveis e estéticos; avaliá-lo e compará-lo com um projeto convencional. Em Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens na sociedade atual, Maria Tereza Andreola e Ana Maris Petry enfocam os principais preditores na construção da liderança do jovem, definidos como: valor saúde, valor social, valor ambição, valor profissional e valor econômico. Descrevem os principais resultados da pesquisa sobre o estilo de vida dos jovens como fator de desenvolvimento do potencial de liderança, comprovando-se que a aplicação da teoria ontopsicológica apresenta resultados sólidos e efetiva competência para a formação do jovem líder. No artigo Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-socialambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara, de Lilian Werner Philippi da Silva e Soraia Schutel, o objetivo foi demonstrar como a implementação de um novo negócio em serviços de lavanderia pode contribuir para o desenvolvimento sustentável e a formação do jovem. Com isto, relatam o processo de implantação do projeto; demonstram como este projeto contribui para os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio; discorrem sobre a formação integral dos jovens no Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro e descrevem como o Recanto Maestro estimula e apoia o empreendedorismo. Ana Paula Mariano Pregardier e Josiane Barbieri apresentam o artigo Residence de Autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens, que é produto de uma pesquisa realizada com jovens abordando o tema autossustento. O estudo teve como objetivo identificar a relação entre a compreensão dos jovens sobre o autossustento e a suas atitudes práticas entre aqueles que participaram do Residence de Autenticação e aqueles que nunca tiveram esta vivência. O problema de pesquisa centrou-se na investigação do Residence de Autenticação como elemento facilitador e funcional, para o jovem, na conquista do autossustento. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ___________________________________________________________________________________________ Joana de Jesus e Adriane Maria Moro Mendes abordam o Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no proceso de vendas, que apresenta os resultados de uma pesquisa realizada entre os meses de maio e junho de 2009 com profissionais envolvidos diretamente em processos de vendas. O foco da pesquisa foi verificar se vendedores de bom desempenho consideravam-se intuitivos, se usavam a intuição durante o processo de vendas e se o que eles classificavam como intuição era atribuído do mesmo modo pelos autores estudados. Por fim, o artigo intitulado A esquizofrenia demonstrada na legislação atual através da nova lei de estágio de estudantes, de Alessandro Spiller e Josemar Sidinei Soares, demonstra que o sistema legal brasileiro, baseado em um conceito errôneo de Justiça Social, vem gerando um excessivo protecionismo e assistencialismo, que se traduzem em resultados que travam o empreendedorismo. Tal fato não condiz com o ideal humanista de um homem protagonista responsável, encontrando-se o ordenamento normativo cindido entre o que a lei impõe e o que deveria dispor para fomentar o crescimento do ser humano de forma holística, e consequentemente o crescimento do Brasil como liderança mundial. Dessa forma fechamos o Editorial do primeiro número da Saber Humano Revista Científica da Faculdade Antonio Meneghetti com alegria por este primeiro passo dado e sabendo que ainda temos um imenso caminho de produção do conhecimento, no qual convidamos você leitor a se fazer presente como sujeito do conhecimento, seja na produção escrita de artigos científicos de pesquisas edificadas, seja como pessoa crítica-reflexiva na discussão dos mesmos. Bem vindo a Saber Humano, uma publicação da Faculdade Antonio Meneghetti e e em especial do trabalho já desenvolvido pela Biblioteca Humanitas! Conta-nos Werner Jaeger, na obra Paidéia – A Formação do Homem Grego (2003), que a descoberta dos gregos em relação ao Homem: ...não é a do eu subjetivo, mas a consciência gradual das leis gerais que determinam a essência humana. O princípio espiritual dos Gregos não é o individualismo, mas o “humanismo”, para usar a palavra no seu sentido clássico e originário. Humanismo vem de humanitas. Pelo menos desde o tempo de Varrão e de Cícero, esta palavra teve, ao lado da acepção vulgar e primitiva de humanitário, que não nos interessa aqui, um segundo sentido mais nobre e rigoroso. Significou a educação do Homem de acordo com a verdadeira forma humana, com o seu autêntico ser (JAEGER, 2003, p. 14). Boa leitura a todos! Os Editores, Fevereiro de 2011, Faculdade Antonio Meneghetti-AMF. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho Beatriz Machri de Pellegrini Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Ana Maris Petry Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) [email protected] Soraia Schutel Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) [email protected] 10 Resumo: O artigo apresenta um estudo descritivo sobre o sentido do trabalho para os líderes que, com posição econômica estável, permanecem em atividade após completar o tempo regulamentar que lhes possibilitaria estar na inatividade. A pesquisa é de abordagem qualitativa e os participantes são cinco empresários, de ambos os sexos, com idade superior a 60 anos, que possuem empresas na Região Sul do Brasil. Os resultados obtidos apontam ser o trabalho parte integrante da vida dessas pessoas para as quais o exercício da liderança é um serviço através do qual realizam seu próprio potencial. O sentido do trabalho é descrito como prazer, alegria e realização. Palavras-chave: sentido do trabalho; terceira idade; liderança. Abstract: This article present a descriptive study about the sense of work for leaders which, with a stable economic position, remain in activity after completing the regular time of work that would allow them to retire. The research uses a qualitative approach and the participants are five business men, from both genders, with ages superior to 60 years old, who own firms on the South of Brazil. The results obtained point that work is a integrant part of the life of these people for whom the exercise of leadership is a service through which they realize its own potential. The meaning of work is described as pleasure, joy and accomplishment. Keywords: sense of work; third age; leadership. 1 Introdução Em geral, observa-se que a grande maioria das pessoas se enquadra basicamente em dois grupos, no que diz respeito à relação com o trabalho: os que estão na expectativa da inatividade assim que completarem o tempo regulamentar de serviço e aqueles já PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ aposentados, que não desenvolvem qualquer tipo de atividade laborativa. Outro olhar diz respeito àqueles já aposentados que permanecem em atividade por uma premência econômica, haja vista a necessidade de complementar seus recursos a fim de atender a manutenção do estilo de vida alcançado. No grupo dos que ainda permanecem trabalhando, constata-se a existência de lideranças, cuja vida laboral lhes proporcionou uma posição econômica estável, e, no entanto, mantêm-se ativos frente às organizações que lideram. Portanto, constituem um grupo especial, que se diferencia dos demais, porque é formado por pessoas que já atingiram a estabilidade financeira e continuam trabalhando movidos pela satisfação pessoal de servir. Esses líderes não são a maioria e, no entanto, toda a sociedade se beneficia da sua atuação. Eles têm a necessidade de realização baseada num profundo amor pelo seu trabalho, resultando em geração de empregos, riquezas e desenvolvimento para a sociedade, o que justifica a relevância desse estudo. O presente estudo aborda a temática do sentido do trabalho para o líder que continua em atividade após completar o tempo legal que lhe permitiria permanecer na inatividade; investiga que sentido tem o trabalho hoje e como interpreta o sentido do trabalho ao longo de sua vida profissional. A pesquisa é de abordagem qualitativa e está fundamentada nas categorias teóricas do sentido do trabalho na perspectiva ontológica, ou seja, que diz respeito ao líder, enquanto dimensão humana, seu modo de ser e, enquanto ser, como se realiza no trabalho por meio do exercício da liderança (MENEGHETTI, 2005). O estudo atém-se ao sentido do trabalho enquanto intercâmbio entre o homem e o seu ambiente (natureza), abstraindo-se qualquer contexto sóciohistórico específico. 2 Fundamentação Teórica As duas partes em que essa seção está organizada visam contribuir para a compreensão do tema em estudo. Na primeira parte apresentam-se aspectos referentes à concepção ontológica do trabalho e, na segunda parte, conceituações de líder e liderança, na perspectiva de diferentes autores das áreas das ciências sociais. 2.1 Concepção ontológica do trabalho Diversos campos do conhecimento, a partir de diferentes vertentes epistemológicas, demonstram como o trabalho ocupa um lugar central da vida do ser humano. Já nos estudos da formação do homem grego, encontra-se a descrição do “valor do trabalho”, na obra de Hesíodo, O Trabalho e os Dias. O sentido do trabalho, como ordem natural da existência e dela recebendo as leis que o regem, é celebrado como o único caminho, ainda que difícil, para alcançar a areté (virtude). O conceito envolve, simultaneamente, a habilidade pessoal e o que dela deriva – bemestar, êxito, consideração (JAEGER, 1995). O trabalho faz parte da formação do ser humano e, através dele o indivíduo pode resgatar o sentido da vida. É pelo trabalho que o homem, como ser social, passa da condição de sua origem natural baseada nos instintos para uma produção e reprodução como gênero humano. De acordo com Lúria (1991), a partir da necessidade do emprego dos instrumentos de trabalho para sua posterior utilização, temse a primeira forma de atividade consciente. A preparação dos instrumentos para utilização posterior exigia várias operações auxiliares que levariam ao surgimento de formas de comportamento que não eram dirigidas por motivos biológicos. Ainda para o mesmo autor: PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ A atividade consciente do homem não é produto do desenvolvimento natural de propriedades jacentes no organismo, mas o resultado de novas formas histórico-sociais de atividade-trabalho (LÚRIA, 1991, p.75). Na concepção de Marx (2003), o trabalho, que é a capacidade de transformar a natureza para atender às necessidades humanas, assume um caráter, uma característica que o diferencia daquele realizado instintivamente pelos animais. Ele afirma: O que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador (MARX, 2003, p. 211). Nessa perspectiva, o homem faz a prévia ideação do que quer obter, ou seja, o trabalho é a realização de uma posição teleológica (de telos, finalidade). Antunes (1999) apresenta uma concepção complementar à perspectiva ontológico-humanista. Esse autor fundamenta seus argumentos no filósofo húngaro Lukács, para quem o trabalho tem em sua natureza ontológica, um caráter transitório; faz a interrelação entre o homem (sociedade) e a natureza. Por meio do trabalho há uma mudança no interior do ser material, ocasionando o nascimento de uma nova objetividade. Desta forma, o trabalho torna-se protoforma de toda a práxis social, sua forma originária desde que o ser se constituiu. O autor identifica três esferas ontológicas – inorgânica, orgânica e social – onde há, necessariamente, uma articulação entre as mesmas que só pode ser compreendida pelo momento predominante. De forma genérica é o salto ontológico, que passa pela centralidade do trabalho (protoforma do agir humano), pela categoria de prévia-ideação como passo fundamental para a execução do processo do trabalho, chegando à exteriorização e à necessidade do conhecimento das leis do ser inorgânico e orgânico para que os objetivos do processo de trabalho possam ser alcançados. Por meio do trabalho e da contínua realização de necessidades, a consciência humana deixa de ser mera adaptação ao meio ambiente; faz a mediação entre a esfera das necessidades e a sua realização. Como resultado tem-se o comportamento consciente que é diverso da mera espontaneidade do instinto biológico o qual, embora se distancie (de forma relativa) da natureza imediata, não anula a sua origem ontológica em relação ao trabalho consciente. O trabalho, portanto, está ontologicamente voltado para o processo de humanização do homem. Lukács (citado por ANTUNES, 1999), menciona que “o trabalho não é um mero ato decisório, mas um processo de uma contínua cadeia temporal que busca sempre novas alternativas” (p. 138). As proposições desse autor acentuam que o processo do trabalho assume a gênese ontológica da liberdade, porque, simultaneamente, ao transformar a natureza, o próprio ser que trabalha se autotransforma. O homem busca atingir um controle de si mesmo, base para a conquista da liberdade. Assim, o trabalho pode ser considerado como modelo à liberdade humana (ibid., p. 142). O trabalho é o elemento mediador entre as necessidades e a sua realização. Nesta relação metabólica (do ser social e a natureza) o trabalho é o produtor de valores de uso. Na base da práxis social, em sentido genérico e abstrato, por meio do ato laborativo, objetos naturais são transformados em utensílios, ferramentas, instrumentos úteis. Nas formas mais desenvolvidas da práxis social, onde, paralelamente à relação homem natureza, desenvolvem-se inter-relações com outros PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ seres sociais com vistas à produção de valores de uso, tem-se a práxis social interativa, cujo objetivo é convencer outros seres sociais a realizar determinado ato teleológico (ANTUNES, 1999). Conforme apontado por Lukács (citado por ANTUNES, 1999), o sujeito é inserido nas relações sociais. As decisões individuais ocorrem dentro das relações sociais e acionam outras tantas relações dos mais variados tipos. Essa constatação ontológica remete à figura do líder, enquanto inserido no seu contexto social e parte de uma rede de relações na sua área de referência e atuação. Nas proposições de Maslow (2003), os indivíduos: Altamente evoluídos assimilam o trabalho dentro da própria identidade, isto é, o trabalho se torna parte efetiva de seu próprio Eu, parte da definição que ele tem sobre si mesmo (MASLOW, 2003, p. 7). Complementa afirmando que trabalhar pode ser psicoterápico e psicológico, isto é, fazendo pessoas saudáveis crescerem em direção à autorrealização. As cinco categorias de metas a serem alcançadas, descritas por Maslow, como fisiológicas, de segurança, amor, estima e autorrealização, são relacionadas entre si, por ordem de predominância. Na perspectiva do sentido do trabalho, tem-se que, quando uma necessidade é satisfeita, a próxima preponderante passa a dominar a vida consciente e servir como centro de organização do comportamento. As necessidades preenchidas não servem como motivadores ativos. Portanto, a atitude dos indivíduos perante o trabalho assume postura também diversa de sentido, conforme a sua situação nas cinco categorias identificadas pelo autor. As pessoas que tenham razoavelmente satisfeitas as suas necessidades de segurança, aceitação, afeição, dignidade e liberdade para desenvolver suas potencialidades pessoais, não serão mais motivadas por necessidades básicas, mas por “metamotivos que vêm a ser essencialmente os valores intrínsecos, as verdades eternas, os valores do Ser” (MASLOW, 2003, p.10). De acordo com Morin (2001), para que um trabalho tenha sentido deve ser realizado de forma eficiente e levar a um resultado, ou seja, os objetivos devem ser claros e os resultados devem ter valor aos olhos de quem o realiza; deve permitir a realização de suas competências. Parece relevante que o trabalhador tenha a oportunidade de testar suas capacidades, com o objetivo de estimular suas necessidades de crescimento pessoal e seu senso de responsabilidade (MORIN, 2001, p. 18). Pesquisa realizada com jovens executivos brasileiros aponta que o principal sentido do trabalho é permitir a sobrevivência, sendo fundamentais para que um trabalho tenha sentido a natureza das tarefas, a aprendizagem, a autonomia, o reconhecimento e a segurança (MORIN, TONELLI, PLIOPAS, 2007). Considera-se que as conclusões a que chegaram esses autores, reconfirmam categorias descritas por Maslow na pirâmide das necessidades: a primeira que corresponde às necessidades fisiológicas (como o sono e a alimentação), a segurança e o reconhecimento social (autoestima). Pode-se também, inferir que, por se tratar de jovens, as necessidades afetivo-sexuais (amor) e a autorrealização são, por estes entendidas como decorrentes do atendimento às necessidades básicas. 2.2 Líder e liderança O tema liderança é exaustivamente abordado na literatura existente em diversas PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ áreas, especialmente naquelas da Administração e afins. Entretanto, sobre o sentido do trabalho para o líder que permanece em atividade após o tempo regulamentar de aposentadoria, objeto deste estudo, não foi localizado uma literatura específica. Cunha (2007) define líder como o tipo representativo de uma sociedade, chefe, condutor. Afirma ser a palavra originária do inglês leader, do verbo to lead que significa conduzir. Trata-se do indivíduo que comanda ou coordena outras pessoas; suas ações e palavras exercem influência sobre o pensamento e o comportamento de outras. Conforme indicado por Meneghetti (2008), a palavra líder, originária de leading, encontrada pela primeira vez na língua viking, indicava um homem que tinha um projeto a cumprir e estimulava também os outros a realizá-lo. O conceito apresenta duas características: capacidade de realizar (capacidade de ação) e capacidade de coordenar um grupo a um único escopo (capacidade de socialização). Em relação ao termo liderança, o novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa descreve que liderança decorre da ação de liderar, refere-se à “função do líder”, portanto, ao que o indivíduo executa (FEREIRA, 2004). De acordo com Robbins (2000, p. 371): investiga o sentido do trabalho para o líder que ainda permanece em atividade, após o tempo regulamentar de trabalho. Por tal razão, referese ao líder e às suas ações de liderança. O líder é o indivíduo que dirige, representa um grupo, em qualquer contexto, seja econômico, político, social ou ideológico. É capaz de dar unidade de ação com uma multiplicidade de exigências, capacidades e meios. O conceito aplica-se, portanto, a qualquer pessoa que demonstre habilidade de ter sucesso como operador econômico, político ou social. Nesse sentido, elimina-se a tendência de que somente grandes personalidades sejam reconhecidas como líderes. Aplica-se a qualquer empreendedor de pequenas empresas, construtores, mestres, jornalistas eficientes, artistas com sucesso autônomo, estilistas, cabeleireiros, produtores de vinho, queijo, entre outros. Entende-se aqui que o comando implica uma capacidade diferenciada. O líder é o indivíduo que se autorrealiza conduzindo outros seres sociais no desempenho do seu trabalho. A cada situação, tem a capacidade de visualizar, selecionar e alocar os recursos adequados (humanos e materiais) que propiciem a solução otimal para a realização econômica, política e social do seu contexto de atuação (MENEGHETTI, 2004). A liderança é o processo de influência pelo qual os indivíduos, com suas ações, facilitam o movimento de um grupo de pessoas rumo a metas comuns ou compartilhadas (ROBBINS, 2000, p. 371). O líder é o centro operativo de mais relações e funções, é aquele que sabe individuar a proporção de como se movem as relações da vida e sabe aplicar, a cada situação, a fórmula justa para resolver e realizar econômica, política e socialmente (MENEGHETTI, 2001, p. 94). Essa definição amplia o conceito de liderança como atividade que possibilita a obtenção de resultados que transcendem a esfera individual e que demandam a ação coletiva. Embora, por vezes a literatura existente seja potencialmente confusa na distinção dos termos líder e liderança, o presente estudo Esse autor considera que, ao desenvolver seus negócios, o líder “desloca bens, interesse, propicia trabalho a centena de pessoas, estimula a sociedade, revitaliza-a, impõe uma dialética que dá impulso ao progresso” (MENEGHETTI, 2008, p. 21). PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ O líder deve ser capaz de ação qualitativa, o que resulta em aumento territorial, de inteligência e de ser. A qualidade aqui é entendida não apenas como um instrumento de marketing, mas, essencialmente, como uma mudança psicocultural. Qualquer coisa que faça ou venda, “o líder produz, vende verdadeiramente satisfação, realização, um saber servir bem” (MENEGHETTI, 2008, p. 191). O trabalho para o líder assume um sentido diferenciado, na medida em que, por sua inteligência, sabe harmonizar as relações entre todos para a obtenção do nível máximo de produção de valores e coisas; a assertiva de suas decisões garante a solução vencedora e propiciam trabalho para todos. 3 Metodologia Trata-se de um estudo descritivo em que foi realizada uma pesquisa qualitativa tendo em vista a sua natureza, ou seja, conhecer os sentidos do trabalho para o líder, por permitir uma maior flexibilidade no levantamento e tratamento das informações obtidas. O grupo selecionado foi constituído por cinco líderes de ambos os sexos, com 60 anos de idade ou mais, que, mesmo tendo completado o tempo regulamentar de trabalho, permanecem ativos frente às suas organizações, ou seja, já realizaram são expectativa financeira e permanecem trabalhando. São empresários proprietários de empresas situadas na Região Sul do Brasil, com grau de escolaridade superior ou de pósgraduação nas áreas de Administração, Economia, Ciências Contábeis e Letras. O processo de pesquisa foi por abordagem direta, através de uma entrevista individual, semi-estruturada, tendo sido elaborado um tópico guia, contemplando os temas centrais e o problema de pesquisa. As entrevistas foram gravadas em fitas cassete e a sua transcrição originou um corpus textual que possibilitou a posterior análise de conteúdo. Através do estudo das informações então sintetizadas, foi procedida a análise de conteúdo por ser “uma técnica para produzir inferências de um texto focal para seu contexto social de maneira objetivada” (BAUER e GASKELL, 2002, p. 191). Assim, na análise das informações foi considerado, não só o conteúdo manifesto, mas aquele latente, isto é, que era percebido pelo entrevistador. Em especial, chamou a atenção a paixão e ao entusiasmo com que falavam do seu trabalho no transcorrer da entrevista. Cuidado especial foi dedicado à interpretação do material transcrito das entrevistas, pois: Os textos, do mesmo modo que as falas referem-se aos pensamentos, sentimentos, memórias, planos e discussões das pessoas, e algumas vezes nos dizem mais do que seus autores imaginam (BAUER e GASKEL, 2002, p. 189). 4 Resultados e Discussão Os resultados a seguir descritos foram precedidos de uma cuidadosa análise para a identificação e a compreensão do tema objeto do estudo, face ao que foi expresso pelos entrevistados. Cada depoimento revelou-se um material instigante, na medida em que as respostas aos questionamentos reservam um conteúdo rico em experiências e relatos que permitem reflexões diversas sobre o sentido do trabalho para o líder. Desse modo, o conteúdo das respostas, por vezes, está transcrito com o objetivo de melhor evidenciar a realidade manifestada pelos entrevistados. As informações referentes à idade em que começaram a trabalhar mostram que todos PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ os líderes iniciaram a sua atividade laborativa ainda muito jovens, como ilustram os seguintes depoimentos: Apenas um dos entrevistados iniciou efetivamente a trabalhar na juventude, mas insistia em afirmar que desde criança tinha um grande desejo de trabalhar. o início da ação liderística já estava presente na vida dos entrevistados. Cabe registrar também que foi significativo observar, não somente as declarações sobre o gosto que tem pelo seu trabalho, como também, o prazer com que falam dele. Ao serem indagados sobre o que representava o trabalho enquanto jovens observou-se que tinha o sentido do atendimento às necessidades mais imediatas; representava a possibilidade de pagar os estudos, atender às exigências do vestir-se, de locomover-se, de moradia. Entretanto, sempre estavam focados num objetivo maior, pois a cada ano, novas metas de crescimento pessoal deveriam ser atingidas. Evidencia-se assim, a descrição de Maslow a respeito da hierarquia das necessidades, quando afirma estarem as cinco categorias (fisiológicas, segurança, amor, estima e autor-realização) relacionadas entre si por ordem de predominância. Uma necessidade satisfeita torna a seguinte como preponderante e motivadora da vida consciente do sujeito (MASLOW, 2003). “Quando tinha, aproximadamente (...), 4, 5 anos, (...) eu organizava prateleiras com madeiras, forrava de papel e vendia flores, que eu mesmo fazia as mudas, para minhas avós, para os vizinhos (...). Eu vi uma vez um engraxate engraxando sapatos e ganhando, (...) também resolvi engraxar todos os sapatos do meu pai (...) sempre tive inata esta vontade de trabalhar” (E3). “Quando eu era jovem, a cada ano eu precisava (...) de ter um fato de destaque na minha vida. Digamos, por exemplo, primeiro era comprar roupa boa, depois comprar (...) o meu próprio carro (...) formar na faculdade, enfim, ter um crescimento profissional. Assim, a cada ano eu precisava (...) dizer: bem neste ano eu fiz isto, mais aquilo” (E1). Os relatos mostram que o trabalho era um fato normal, que fazia parte do cotidiano da vida dos entrevistados, sem a conotação de sofrimento ou castigo; era inquestionável a sua realização. Além de terem iniciado muito jovens, todos os entrevistados tiveram as suas primeiras experiências de trabalho a partir do empreendimento na iniciativa privada, no caso, da família, para posteriormente construírem seus próprios negócios. Assim, as primeiras experiências laborativas propiciaram o embrião para que, ao longo do tempo, pudessem construir seus empreendimentos. Observa-se, portanto que “No tempo de estudante a gente trabalhava nas férias, que eu achava importante para aprender... então, era uma extensão da escola. Depois, quando eu fiz faculdade (...) me formei com 22 anos e a partir daí, fui trabalhar direto (...). Acostumei-me a trabalhar desde muito cedo” (E2). “Desde que me lembro de ser gente eu já trabalhei, fiz alguma coisa em casa com meus pais na roça, (...) sempre tive o privilégio de ter pais que faziam a gente trabalhar desde pequeno e eu gostava de trabalhar” (E1). “Desde os 10 anos de idade, no primeiro dia de férias, meu pai nos levava para trabalhar... No início fui estafeta, encaixotava as mercadorias (ele tinha atacado), separava, fui balconista, depois viajante vendedor, fui faturista, fui caixa... na medida que ia crescendo..., então, fiz todos estes trabalhos comuns (...) desde criança” (E2). “Desde uns 10/12 anos, eu fazia o trabalho de bancos (...) todos os dias eu saia da aula, almoçava e ia ser caixa (...). Adorava aquilo ali” (E4). “Desde que eu me lembro que eu era gente, tinha uma enxada na mão. Então, comecei a trabalhar, acho que com uns 5, 6 anos de idade” (E5). “No começo via como uma responsabilidade familiar, como algo que honestamente tinha que ser feito para (...) a família (...) foi totalmente saudável. Trabalhei na agricultura até os 13 anos de idade, aí meu pai, como não podia me dar estudo, me colocou numa oficina mecânica para aprender um ofício. (...) e o meu objetivo sempre foi estudar e eu não podia, quando vim para o quartel (...) voltei a estudar (...). Eu trabalhava e PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ objetivo do meu trabalho não era fazer dinheiro, era sustentar meus estudos” (E5). Embora presente o sentido do trabalho como “dever, obrigação, ganha-pão, pagar estudos”, destaca-se o compromisso em atingir metas que impulsionavam à realização de outras atividades. Ou seja, na medida em que, por meio do trabalho, realizavam atividades e conquistavam novos objetivos, esta conquista lhes dava liberdade e os impulsionava à consecução de atividades de maior destaque, como se refere o entrevistado: “...A cada ano eu buscava (...) dar um passo para a frente e, também, constantemente, ao mesmo tempo, (...) buscava ter algo assim também de realização social” (E1). Os depoimentos acima mencionados demonstram que, no exercício de suas atividades, no processo do trabalho houve a conquista de novas alternativas propulsoras para o fortalecimento da pessoa do líder, e, no controle sobre si mesmo, a busca de novos patamares de sucesso. Cada etapa vencida proporcionava um novo grau de liberdade, que os desafiava impulsionando-os a novas conquistas. Isso comprova que, das ações bem sucedidas advêm, como consequência, os resultados econômicos obtidos através de seus empreendimentos. Por se tratar de pessoas com uma trajetória profissional e pessoal diferenciada, o trabalho faz parte da sua própria identidade, da definição que têm sobre si mesmos, onde trabalhar as faz crescer e se autorrealizarem. Considerando já estarem com suas expectativas financeiras atendidas, os líderes mantêm-se em atividade motivados por grandes desafios, que Maslow os denomina “metamotivos”, valores intrínsecos denominados de “valores do Ser” (MASLOW, 2003, p.10). “Desde pequenas coisas (...), por exemplo, fui presidente do CPM do colégio, fui presidente da comunidade católica aqui do estado, fui prefeito, fui buscando (...) era um desejo meu de participar ativamente da vida social, dar a minha contribuição. Deixar o meu legado em todos os locais por onde passava. E sempre foi assim, sempre foi algo de muito proveitoso como em busca de protagonismo pessoal, mas também como busca em cada época, em cada idade, realizar aquilo que eu achava que era importante realizar” (E1). Esse depoimento de E1 mostra o trabalho como mediador entre as necessidades e a realização pessoal. Por serem os entrevistados líderes em seus diferentes campos de atuação, o processo do trabalho, enquanto mediação entre necessidade e realização, é feita por meio de pessoas, ou seja, o exercício da liderança. Quando questionados sobre o que representa o trabalho atualmente, obtiveram-se expressões que remetem ao verdadeiro sentido do trabalho em suas vidas, como mostram os depoimentos a seguir: “...trabalho é um prazer, é uma alegria, uma realização. O trabalho é a forma da gente se realizar” (E1). “Trabalho (...) é uma diversão (...)” (E2). “O sentido do trabalho hoje é o social. O meu projeto de vida que, além de desenvolver a mim, não basta, eu devo contribuir. Isto para mim é o prazer” (E3). “É um prazer (...)” (E4). “É um prazer enorme trabalhar. Eu não sei ficar sem trabalhar” (E5). A análise que se faz aqui é que, na essência, é pelo exercício da liderança que os entrevistados, ao obterem a realização de si mesmos, também o fazem para muitos. Os líderes, na medida em que se autoconstroem através do trabalho, ao mesmo tempo exercem um papel fundamental no contexto das relações sociais, pois são capazes de prover oportunidades, recursos e soluções para outros tantos indivíduos que consigo trabalham. Ao desenvolverem-se a si mesmos, por sua inteligência, são capazes de interagir na manutenção e no desenvolvimento de seus negócios, dando oportunidade a que outras tantas pessoas cresçam. Da realização de si mesmos, geram novas oportunidades que beneficiam PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ diretamente os seus colaboradores e, indiretamente, a sociedade como um todo. Para que possa realizar-se, o líder tem uma necessidade intrínseca de ser útil, o que beneficia a todos os que estejam situados no seu raio de influência de ação. Portanto, as suas ações na sociedade, são um meio de realizar-se. Os três depoimentos a seguir elucidam os benefícios da ação do líder para as pessoas que com ele trabalham e, em consequência, para a sociedade como um todo. “Eu vejo o maior benefício para essas pessoas é a oportunidade, (...) de elas terem o seu salário, (...) mas, acima de tudo, a oportunidade pessoal das pessoas se realizarem através da sua profissão, buscar um crescimento profissional, buscarem o seu protagonismo (...). Há mais de quinze anos eu digo isto: o tamanho da empresa depende do tamanho das pessoas que estão comigo. Se elas crescem, a empresa cresce; se elas não crescem, eu não tenho como crescer (...). Isto é realmente uma coisa que estimula as pessoas, muitas vezes, muito mais do que o dinheiro: a oportunidade das pessoas crescerem, das pessoas mostrarem o que sabem fazer, se sentirem capazes. Isso faz com que a empresa cresça e as pessoas também cresçam. É só saber fazer com que esta inteligência cresça, é claro que depois existe o resultado. Mas, a maior alegria minha é dar a oportunidade para as pessoas crescerem” (E1). “Ninguém faz fortuna sozinho. Quando faz para si, carrega um exército junto, dependendo da dimensão do projeto. Então, o benefício é direto para todos aqueles que participam. Na vida tem dois projetos vencedores: ou se é um líder vencedor ou se serve a um líder vencedor. Qualquer outro caminho é furado... E um bom líder tem junto com ele outras lideranças e tem também seguidores” (E2). “A iluminação que eu tive foi, trate bem as pessoas. Faz dez anos que a minha filosofia é esta: o cliente em segundo lugar, primeiro a minha equipe. Então eu consigo formar. Hoje eu sei encontrar os talentos, sei mantê-los e os meus lucros são cada vez maiores: proporcionais à satisfação que eles têm aqui dentro. (...). Foi uma somatória de fatores que me levaram a descobrir o óbvio: trate bem as pessoas que elas vão te dar o resultado” (E4). que No último questionamento, foi solicitado os entrevistados complementassem livremente ao que já haviam declarado. Em todos houve a ratificação do prazer pelo trabalho e a necessidade de servir. O entrevistado E3, por exemplo, expressa a sua satisfação ao compreender o sentido do trabalho como o cumprimento de um projeto que já é seu. “O sentido do trabalho hoje, é cumprir um projeto que já é meu (...). Aos 45 anos eu já tinha uma vida, em termos sociais, totalmente organizada (...). A coisa do ter, com 45 anos eu já tinha terminado. Pensava (...) „na tua família as pessoas duram 90 anos.Fiquei numa crise incrível (...). O que vais fazer nos próximos 45? Esta era a minha angústia (...) tinha 50 anos (...) e fiquei feliz (...) compreender que quando uma pessoa termina uma missão, passa para uma outra maior. Eu parti com o maior entusiasmo e acho que até os 95 eu vou andar neste ritmo, porque (...) podemos andar para a frente (...), colaborar com tudo; é um espetáculo. Enquanto eu tiver este ímpeto de fazer e a possibilidade de fazer, eu vou pronta e este é o meu prazer efetivamente” (E3). O entrevistado E1 afirma que entre os pontos práticos para o sucesso, o primeiro é o trabalho. “Não adianta a pessoa fazer mil outras coisas se tudo o que ela aprende (...) se ela não botar a mão, (...) trabalhar, fizer a coisa acontecer (...). A gente é corpo e alma e o instrumento de realização da alma é o corpo... e o trabalho faz bem (...). E eu vejo que todas as pessoas que trabalham estão felizes. As pessoas que trabalham, fazem aquilo que gostam... Nenhuma pessoa está deprimida. Está feliz, está sempre querendo mais... O trabalho é uma forma de realização muito grande. É claro que as pessoas têm de buscar a fazer aquilo que elas gostam, que estejam vocacionadas, sim, é verdade, mas não existe nenhuma pessoa que eu vi no mundo, realizada sem trabalhar. Aliás, eu vejo que as pessoas que não têm trabalho, que não buscam o trabalho como forma de realização, elas jamais são pessoas felizes, realizadas. Sempre estão tentando achar qualquer coisa, mas nunca acham por que não focam que o trabalho é um prazer, é uma alegria, uma realização. O trabalho é a forma da gente se realizar” (E1). O entrevistado E2 refere-se à autossabotagem que determinadas pessoas fazem por tratarem o trabalho como algo penoso, difícil, conforme descrito pela ideologia judaico- PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ cristã e os valores da sociedade em geral. Na realidade, trabalho para ele faz parte do cotidiano da vida e é considerado como uma diversão: “...o que mais atrapalha as pessoas (...) é que elas se precaveem contra o trabalho (...), a sociedade inteira pensa assim: (...) que o trabalho, na Bíblia também, que o trabalho... tem que suar... é penoso. Trabalho na realidade faz parte, é uma diversão (...), as pessoas fazem o contrário, elas devem desenvolver através do hábito, o gosto pelo trabalho e devem se precaver de hábitos sociais que não tem nada a ver com a realidade de cada um” (E2). Os entrevistados complementaram suas falas ratificando a importância do trabalho para os seus liderados, ressaltando que, além da oportunidade de crescimento, devem executá-lo como projeto pessoal a que são vocacionados, por ser o trabalho a única forma de realização. 5 Considerações Finais Do que foi expresso pelos entrevistados, pode-se depreender que uma das características do grupo pesquisado é ter iniciado as atividades laborativas ainda muito jovens, tendo realizado suas primeiras experiências em empreendimentos da iniciativa privada, ainda na família. Os relatos mostram que o trabalho não tinha a conotação de sofrimento ou castigo, pois o expressam como um fato normal do seu cotidiano. Os diferentes depoimentos revelam um interesse contínuo e uma preocupação com o seu bom desempenho, aliado a uma vigilante atenção ao crescimento. Adiciona-se então, o sentido de construção de vida através do trabalho, pois, como foi sendo revelado, a cada nova conquista, outras iam se interpondo com premência de realização. Na descrição do que poderia mudar no sentido do trabalho ao longo da vida profissional, percebe-se que, num primeiro momento representava a satisfação de necessidades imediatas. Entretanto, na proporção em que as suas necessidades básicas eram atendidas, ao mesmo tempo, desempenhavam o papel de propulsoras para novos desafios, sempre focados em seus objetivos. A cada relato, pode-se constatar a importância que o trabalho exerce na formação do ser humano. As experiências vivenciadas permitiram a realização gradativa de objetivos empreendedores onde o exercício da liderança se fazia presente. A transitoriedade do trabalho é percebida na descrição dos entrevistados para os quais, cada etapa vencida representava um impulso na direção de novas alternativas. Isso permitia um gradativo controle sobre si mesmo e consequente liberdade na conquista de espaços de liderança em termos econômicos e sociais. Fato marcante refere-se à alegria e ao entusiasmo com que falam sobre o sentido do trabalho. Todos os entrevistados manifestaram-se dessa forma ao usarem expressões como sendo o trabalho um prazer, uma alegria, uma diversão, o que chama a atenção para a necessidade da revisão no paradigma do trabalho, enquanto socialmente considerado como algo penoso, um sacrifício ou castigo. A atividade de liderança é uma constante ao longo das experiências profissionais dos entrevistados, que manifestam um profundo amor pelo trabalho que realizam, demonstrando ser o seu exercício uma forma de se realizarem. Portanto, a liderança é um serviço através do qual o líder realiza o seu potencial. Assim, do seu trabalho, ao permanecer em atividade, toda a sociedade se beneficia, pois tem a capacidade de prover para muitos no seu âmbito de atuação, quer seja ele político, econômico ou social. Os resultados positivos da ação desses líderes direcionam ainda, para outras razões de PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ futuras investigações. A importância do estímulo para que outros tantos líderes que, com experiência no exercício de liderança, sejam estimulados a permanecerem em atividade, como forma de benefício a si mesmos, num primeiro momento, e para a sociedade que se beneficia diretamente de suas ações. O incentivo aos jovens que, ao lado dessas lideranças, valorizando suas experiências e vivências, sejam estimulados a darem o verdadeiro sentido ao trabalho, dispensando tempo para uma pertinente preparação em cada etapa da vida profissional, para que possam, no tempo adequado, estarem preparados para o exercício da liderança. Referências ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 3. ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999. BAUER, M. W., GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002. CUNHA, A. G. da. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Lexikon Editora Digital, 2007. FERREIRA, A. B. de H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba: Positivo, 2004. JAEGER, W. Paidéia: a formação do homem grego. 3. ed. São Paulo: Martins Fortes, 1995. LURIA, A. R. Curso geral de Psicologia: introdução evolucionista à Psicologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1991. MARX, K. O capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. MASLOW, A. H. Diário de negócios de Maslow. Organizado por Déborah C. Stephens. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2003. MENEGHETTI, A. A psicologia do líder. 4. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008. MENEGHETTI, A. Dicionário de Ontopsicologia. São Paulo: Ontopsicologica Editrice, 2001. MENEGHETTI, A. Fundamentos de Filosofia. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2005. MENEGHETTI, A. Manual de Ontopsicologia. 3. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2004. MORIN, E. Os sentidos do trabalho. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.41, n.3, p.8-19, jul./set., 2001. MORIN, E.; TONELLI, M. J.; PLIOPAS, A. L. V. O trabalho e seus sentidos. Psicologia e Sociedade, São Paulo, v.19, n.1, p. 47-56, 2007. PEREIRA, I. Dicionário grego-português e português-grego. 5. ed. Porto: Livraria Apostolado da Imprensa, 1976. ROBBINS, S. P. Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2000. Autores: Beatriz Machri de Pellegrini: administradora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti, Mestre em Administração (UFRGS). Ana Maris Petry: consultora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti, mestranda em Filosofia (PUC-SP). Soraia Schutel: administradora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti, Mestre em Administração (UFSM), doutoranda em Administração (UFRGS). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 22/12/2010. PELLEGRINI, Beatriz M.; PETRY, Ana M.; SCHUTEL, Soraia. A liderança na terceira idade: o sentido do trabalho. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 10-20, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas João Francisco Dias Feltrin Faculdade Antonio Meneghtti (AMF) [email protected] Josemar Sidinei Soares Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) [email protected] Resumo: O presente trabalho trata do instituto da responsabilidade aplicado aos empreendedores individuais; enfoca a origem histórica desse instituto, a contar da Revolução Francesa, bem como o entendimento consolidado nas codificações napoleônicas e nas Escolas de Direito desenvolvidas na França: a Escola da Exegese. Em paralelo, analisa as especulações teóricas ocorridas na Escola Histórica de Direito alemã; registra, também, a evolução histórica que os países de tradição romano-germânica obtiveram no arco de dois séculos; além disso, constata e analisa a difusão do instituto da responsabilidade limitada aos empreendedores individuais nos demais países da Europa: França, Portugal, Itália, entre outros, resultando no final, pela adoção, por parte da Comunidade Europeia, da XII Diretiva, que estabelece as sociedades unipessoais de responsabilidade limitada a todos os integrantes da Comunidade; avalia a legislação nacional, bem como sua influência franco-portuguesa e as políticas legislativas produzidas; por fim registra a contribuição que a Ciência Ontopsicológica pode oferecer aos operadores de direito na resolução do problema e sintetiza o trabalho pela necessidade de adequação da legislação nacional aos novos tempos. Palavras-chave: sociedade unipessoal de responsabilidade limitada; instituto da responsabilidade limitada; empreendedor individual de responsabilidade limitada. Abstract: The work herein is about the institute for responsibility applied to individual entrepreneurs, focusing the historical origin of that institute from the French Revolution, as well as the consolidated understanding of the Napoleon Codes and Law Schools developed in France: the Exegesis School. Parallely, it analyzes the theoretical speculations which occurred in the German Historical Law School during the period called pandectistic; it also registers the historical evolution the Roman-German tradition countries had obtained during the two centuries; furthermore, it verifies and analyzes the diffusion of the liability company limited to individual entrepreneurs in other European countries such as France, Portugal, Italia, among others, having as a result the adoption by the European Community of the Directive number 12, establishing the single-member limited liability companies to all the constituents of the Community; it evaluates the national law as well as its French-Portuguese influence and the legal policies produced; finally, it registers the contribution the Ontopsychological Science can offer to the law operators for the problem solution and synthesizes the work by the need of adjustment of the national law to the present time. Keywords: single-member limited liability companies; limited liability company; individual limited-liability entrepreneur. FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. 21 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ 1 Introdução A escolha do tema: “A Responsabilidade do Empreendedor Individual e suas Perspectivas Jurídicas” foi inspirada, inicialmente, na tentativa de compreender as razões das diferenças entre os empreendedores individuais e os coletivos atribuídos pela legislação. O empreendedor individual representa, no cenário empresarial brasileiro, mais de 50% das empresas formalizadas, sendo sua importância na geração de renda, trabalho e riquezas indiscutível. Apesar da relevância acima citada, existe uma situação desfavorável entre esses empreendedores, que ocorre no aspecto da responsabilidade: caso um grupo de pessoas empreenda coletivamente através de uma sociedade empresária limitada, a responsabilidade de cada sócio fica restrita à participação de cada um no capital social. Porém, caso uma pessoa, individualmente, empreenda na condição de empresário, a sua responsabilidade é ilimitada, no sentido de que o seu patrimônio pessoal confunde-se com o patrimônio da empresa individual, ocorrendo mesmo que exista uma separação perfeita do ponto de vista contábil e fiscal. Como consequências imediatas desse fato, ocorrem duas situações: a) o empreendedor atua por conta e risco no mercado, de tal forma que o seu patrimônio pessoal possa vir a responder por eventuais perdas, prejuízos, execuções, etc.; ou, b) o empreendedor mais precavido cria uma sociedade ficta, com o propósito de se resguardar de eventuais situações desfavoráveis, adaptando a situação jurídicodocumental, com vistas a atender ao formalismo da legislação. Em função disto, o presente trabalho visa a compreender as razões históricoculturais que formalizaram essa posição jurídica desfavorável ao empreendedor individual; tomar conhecimento, tanto quanto possível, sobre como as legislações de países estrangeiros com tradição jurídica semelhante administram tal fato; verificar o que foi feito no direito pátrio até o presente momento, sobre essa matéria, o que existe de políticas legislativas; pontuar o que a Ciência Ontopsicológica pode contribuir na resolução deste problema; e, por fim, fazer uma abordagem conclusiva sobre a real necessidade ou não de adequação do sistema jurídico vigente. 2 Fundamentação Teórica 2.1 Comunidade Econômica Europeia e a XII Diretiva Em 21 de dezembro de 1989, o Conselho das Comunidades Europeias adotou a “Décima Segunda Diretiva” em matéria de direito societário ao estabelecer a sociedade de um único sócio com responsabilidade limitada. Esta diretiva foi apresentada em dezembro de 1988, porém sua edição oficial ocorre, somente, um ano depois. Destaque-se que esta diretiva também previa a não aceitação desse modelo societário, caso a legislação dos estados integrantes fizessem previsão de empresas individuais de responsabilidade limitada (Art. 7°), com patrimônio de afetação devidamente regulamentado. É o caso específico de Portugal, que apresenta um modelo não-societário. Na leitura das justificativas relacionadas ao documento acima, resta claro o objetivo do Conselho em homogeneizar a legislação europeia sobre esse assunto, tendo em vista a existência de sociedades ou empresas individuais de responsabilidade limitada em diversos países como a Dinamarca, Alemanha, França e Portugal, entre outros, porém com características diversas. FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. 22 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ Além do fato acima, é bom lembrar que essa medida decorre de um plano estratégico, em nível comunitário, de cooperação para o crescimento europeu. A própria fundamentação da XII Diretiva menciona a Resolução de 03 de novembro de 1986. Nessa resolução, é destacada a importância de políticas comunitárias destinadas à criação e desenvolvimento das pequenas e médias empresas, bem como à geração de postos de trabalho. Com essa diretiva, os Estados-membros da Comunidade Europeia usufruíram de um conjunto de regras sistematizadas, que vão desde a forma de registro ao modo de materialização dos contratos entre sócio único e sociedade, como parâmetro para instituição de sociedades unipessoais. Recentemente, essa diretiva foi revogada, tendo em vista suas constantes alterações. E, por medida de clareza e racionalidade, ocorreu a codificação do seu conteúdo pelo Parlamento Europeu e Conselho da União Europeia: “Directiva 2009/102/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009”. definitivamente, a sociedade unipessoal, originária de responsabilidade limitada. Em que pese o Principado de Lichnstein (Liechtenstein) ter sido o primeiro a adotar o referido instituto, a Alemanha é considerada a “terra-mãe”. Esse título deve-se ao fato da jurisprudência e doutrina considerarem legítima a transformação em sociedades unipessoais de responsabilidade limitada, as tradicionais sociedades por quotas de responsabilidade limitada já existentes, na ocorrência de situações especiais. Nesse contexto, é oportuno distinguir dois tipos de sociedades unipessoais: a originária e a derivada. A primeira é aquela que se institucionaliza com um único sócio, já nos atos de formação, quando de sua abertura formal. A segunda é aquela que começa como sociedade de responsabilidade limitada típica, com no mínimo dois sócios, e, ao longo de sua existência, transforma-se por razões diversas, em sociedade de um único sócio. Exemplo muito recorrente é o falecimento do segundo sócio, permanecendo, apenas, um único integrante. 2.3 França 2.2 Alemanha Cabe destacar, que a Alemanha foi o primeiro país na Europa a instituir a sociedade de responsabilidade limitada, excluídas, obviamente, as sociedades anônimas, que já possuíam um histórico diverso. Esse fato ocorreu em 1892, “Gesellschaft MIT beshränkter Haftung” (G.m.b.H.). Já a sociedade unipessoal de responsabilidade limitada foi introduzida em 04 de julho de 1980, a denominada Gesetz zur Änderung des Gesetzes betreffend die Gesellschaften mit beschränkter Haftung und anderer Handelsrechtlicher Vorschiften vom 4 jul. 1980. Com essa legislação, foi oficializada, Na França, como regra, sempre foi adotado o instituto do comerciante individual com responsabilidade ilimitada ou sociedades de capital, cuja responsabilidade era limitada, desde que existissem dois sócios ou mais. A primeira reforma, diga-se de passagem, bastante polêmica, que possibilitou a sobrevivência da sociedade com um único sócio foi introduzida, com o Artigo 9 da Lei n° 66-537, de 24 de julho de 1966. Essa reforma possibilitou a existência da sociedade unipessoal, pelo menos por um ano, por meio da reunião de todas as quotas ou ações de uma sociedade comercial em uma única mão ou sócio. Após o término desse período, inexistindo a recomposição societária, aquele FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ que tivesse interesse poderia requerer o desfazimento da sociedade. Depois de muitas discussões, por meio da Lei n° 85-697, de 11 de julho de 1985 introduziu-se na legislação francesa a possibilidade do empreendedor individual ser sócio único, originariamente, sob a forma de sociedade de responsabilidade limitada (Entreprise unipersonnelle à responsabilité limitée o E.U.R.L.). Diversas alterações foram feitas na legislação, entre elas o próprio conceito de sociedade, redigido no Código Civil. Antes da reforma o Artigo 1832 definia sociedade da seguinte forma: “A sociedade é um contrato através do qual duas ou várias pessoas convêm pôr algo em comum com o objetivo de compartilhar seu lucro”. Nesse dispositivo, após a definição clássica de sociedade, introduziu-se a possibilidade da instituição de uma sociedade por um ato de vontade singular nos casos previstos em lei. Em outras palavras, além do conceito clássico de contrato, apresentou-se o conceito de contrato-instituição unilateral. A base dos textos legais do século XIX tinha como premissa a tese contratual. A sociedade nasce por um contrato e rege-se pelo mesmo. Com certeza, é um resquício do Direito Romano, que foi incorporado ao período codicista. No caso francês, o contrato também adquiriu, com essa reforma, o caráter instrumental para constituir uma sociedadeinstituição unipessoal. 2.4 Portugal Portugal foi o segundo país, dentro da Europa, a adotar a sociedade de responsabilidade limitada, a tradicional “sociedade por quotas de responsabilidade limitada”. Esse fato aconteceu por meio da Lei de 11 de abril de 1901, e foi o produto de uma importação da Alemanha. Além desse fato, deve-se destacar que Portugal apresenta uma característica própria dentro da Comunidade Europeia: é o único país que apresenta o modelo não-societário de responsabilidade limitada para o empreendedor individual, o Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada – EIRL. É oportuno citar algumas características desse modelo jurídico adotado por Portugal, tendo em vista a raridade de sua existência: a) Instituição por uma única pessoa e esta deverá ser titular de um único estabelecimento (Art. 1° do Decreto-Lei n° 248/86); b) Criação de um patrimônio de afetação especial, que terá um regime específico de responsabilidade por dívidas, definidos em lei (Art. 1° do DL n° 248/86); c) Constituição por escritura pública (Art. 2° do DL n° 248/86); d) A firma será o nome da própria pessoa, com acréscimos opcionais do objeto comercial, seguida sempre da sigla “E.I.R.L.” (Art. 2° do DL n° 248/86); e) Realização do capital em numerário, não inferior a dois terços do capital mínimo (Art. 3° do DL n° 248/86); f) Obrigatoriedade da formação de uma reserva legal, não inferior a 20% dos lucros auferidos no ano (Art. 15º do DL n° 248/86); g) Por ocasião da morte do titular da empresa individual de responsabilidade limitada, os sucessores terão o prazo de 90 dias para dar destinação ao estabelecimento. Ultrapassado este prazo, qualquer interessado poderá requerer a liquidação judicial (Art. 23º do DL n° 248/86). A grande vantagem deste modelo nãosocietário está na preservação dos conceitos clássicos de direito contratual. A definição de contrato permanece inalterada, evitando-se discussões teóricas sobre esse instituto. Por outro lado, o sistema societário também foi adotado por Portugal, por meio de modificações no Código das Sociedades Comerciais. O Decreto-Lei n° 257, de 31 de dezembro de 1996, incluiu o Artigo 270° A, FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ que permite a constituição da Sociedade Unipessoal por Quotas. Feita esta inclusão, Portugal entra num grau de paridade com os demais países europeus em matéria societária. Em que pese ter introduzido a empresa individual de responsabilidade limitada, essa não havia alcançado os objetivos esperados, especialmente, no que se refere à superação do conceito contratualista de sociedade e à construção da personalidade jurídica. Com esses dois modelos, o nãosocietário e o societário, Portugal torna-se o único país europeu a apresentar duas possibilidades de limitação de responsabilidade aos empreendedores individuais. 2.5 Itália A Itália recepcionou a diretiva da Comunidade Econômica Europeia, no ano de 1993, ao instituir a sociedade unipessoal, por meio do Decreto Legislativo n° 88, de 03 de março de 1993. A porta de entrada dessa modificação ocorreu no Artigo 2.247 do Código Civil (C.C.) italiano, que passa de uma “noção de sociedade” a uma ideia de “contrato de sociedade”. Posteriormente, as disposições das sociedades limitadas foram adequadas com a inclusão de uma pequena frase, no final do Artigo 2.475 deste mesmo C.C. As modificações ocorridas na legislação italiana por meio da Lei n. 133/97 são bastante complexas, pois são extensivas a outros tipos de sociedade, como a sociedade por ações e as empresas artesanais. 3 Legislação Nacional 3.1 Introdução histórica Em que pese a existência de um grande comércio no Brasil, inexistiu produção jurídico-normativa própria desde o seu descobrimento. É bom lembrar que o Brasil era uma colônia de Portugal, portanto, gerida pela burocracia jurídico portuguesa, por meio de seus feitores, capitães hereditários e governadores gerais. No período de 1580 a 1640, o Brasil encontra-se sob o domínio da Espanha, em função da União Ibérica. Decorrido esse intervalo de tempo, sobe ao trono português o Rei Dom João IV, que dá início à dinastia de Bragança. O Brasil retorna ao domínio português, agora na condição de Vice-Reinado, ou seja, com um Vice-Rei que coexistia com o sistema de Capitanias Hereditárias. A história do Direito Comercial e de seus diversos institutos inicia com a vinda de Dom João VI ao Brasil, impulsionado pela invasão napoleônica ao território português, em 1807. Com a chegada de Dom João VI, iniciase a implantação de medidas burocráticas, tendo em vista a formação de instituições próprias, a saber, a Carta Régia de 28 de janeiro de 1808, que abriu os portos do Brasil às nações amigas; o Alvará de 1° de abril de 1808, autorizando o funcionamento de fábricas e manufaturas; o Alvará de 23 de agosto de 1808 criador da Real Junta de Comércio, Agricultura e Navegação; e, o Alvará de 12 de outubro de 1808, instituindo o primeiro Banco do Brasil, enquanto entidade pública. Considerando-se todas as modificações introduzidas pela Família Real, não se admitia o Brasil na condição de Vice-Reinado, até porque a Corte Portuguesa encontrava-se em solo brasileiro. Em decorrência dessa insatisfação, o Brasil foi elevado à categoria de Reino-Unido de Portugal e Algarves, através da Carta de Lei de 16 de dezembro de 1815. No período compreendido entre a descoberta do Brasil até a confecção de um código comercial próprio, que somente ocorreu FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ no ano de 1850, foi utilizada a legislação portuguesa, acrescida dos Alvarás, Cartas de Lei e outras normas complementares, além das legislações de nações amigas, nas matérias que inexistiam regulamentação específica, tendo em vista a famosa Lei da Boa Razão, de 18 de janeiro de 1769. 3.2 De comerciante a empresário O comerciante, também conhecido como firma mercantil individual, era o empreendedor individual da época. Era aquele indivíduo que, por meio do registro da firma e o exercício dos atos de comércio, devidamente definidos pela legislação, denominava-se, simplesmente, comerciante ou comerciante sem sócio. Para demonstrar a afinidade existente entre o Código Comercial francês de 1807, em relação ao nosso Código Comercial de 1850, é oportuno citar o conceito definido pelo Código francês que foi seguido pelo nosso, assim como por tantos outros códigos europeus: “Art. 1° São comerciantes aqueles que exercem atos de comércio e deles fazem profissão habitual” (grifo nosso). O Artigo 4° do Código Comercial de 1850, assim menciona: “Ninguém é reputado comerciante para efeito de gozar da proteção que este Código liberaliza em favor do comércio, sem que se tenha matriculado em algum dos Tribunais do Comércio do Império, e faça da mercancia profissão habitual.” (grifo nosso). Deve-se destacar a expressão mercancia, que não foi definida no nosso Código Comercial, porém o foi no Regulamento 737, de 25 de novembro de 1850. No Artigo 19 desse Regulamento, é listado um conjunto de atos de comércio que definem a mercancia, o que significa que o nosso modelo seguiu a técnica francesa da enumeração dos atos que definem a atividade mercantil. O ponto de afinidade entre a definição de comerciante do Código Comercial francês e a definição do nosso Código Comercial de 1850 é, justamente, o exercício dos atos de comércio. No primeiro, é dito com todas as letras: “exercem atos de comércio e deles fazem profissão habitual”; e, no segundo, “faça da mercancia profissão habitual”. A expressão mercancia foi definida pelo Artigo 19, do decreto acima citado, que lista os atos ou atividades que constituem a mercancia. Portanto, utilizou-se da mesma ideia, ou seja, da Teoria dos Atos de Comércio, porém com uma construção linguística diversa. O primeiro usou a forma direta ao se referir aos atos de comércio, o segundo utilizou uma forma indireta, ou seja, fez uso de uma expressão intermediária para chegar ao mesmo escopo. Uma vez compreendido que o conceito de comerciante estava relacionado ao exercício dos atos de comércio específicos, pode-se ressaltar essa característica como resquício das codificações napoleônicas, adotadas pelo nosso Código Comercial de 1850. Já foi mencionado anteriormente que a ideia de classe profissional foi abolida com a Revolução Francesa, em nome do princípio da igualdade. A classe do comerciante não era definida no Código, enquanto substantivo, mas era considerada, na medida em que exercia determinados Atos de Comércio. “Todos são iguais perante a lei”, a concepção da época não admitia classes definidas nos textos da lei, justamente, para não ferir o princípio revolucionário de igualdade da época. Outro ponto de importância e de profunda relação com a responsabilidade ilimitada do comerciante individual diz respeito à impossibilidade de admitir patrimônios diversos a uma única pessoa, ou seja, o princípio da unidade do patrimônio, devendo-se destacar aqui a ideia de indivíduo, pessoa natural, único centro de direitos e deveres. Não se conseguia relacionar o FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ comerciante com o seu patrimônio mercantil separado do seu patrimônio pessoal. O conceito de pessoa jurídica não foi suficientemente desenvolvido na França, tendo em vista a ideia revolucionária iluminista de indivíduo, corporificada nos códigos e que impediu as abstrações da pessoa natural. Essas ideias, aqui rapidamente retomadas, serão também evidenciadas nos modelos de sociedades comerciais adotados pelo nosso Código e, também, inspirados na codificação francesa. Atualmente, em função do novo Código Civil, a antiga figura do comerciante individual foi substituída pela figura do empresário. Esse empresário é assim definido, no Código Civil italiano, em seu Artigo 2.082: “É empresário quem exercita profissionalmente uma atividade econômica organizada para o fim de produção ou troca de bens ou de serviços”. Essa mesma definição foi adotada pelo legislador brasileiro, que assim refere: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. O conceito de empresário utilizado no nosso novo Código Civil corresponde ao mesmo conceito aplicado no Código Civil italiano. O núcleo conceitual reside em dois fatores: a) exercício profissional de atividade econômica organizada; e, b) produção, circulação ou troca de bens ou serviços. Dentro desse contexto, é bom lembrar que a Teoria dos Atos de Comércio foi abandonada enquanto lista de atividades específicas. Desse momento em diante, inexiste a definição de comerciante vinculada ao exercício de atos de comércio, mas sim relacionados ao exercício de atividade econômica organizada. A Teoria dos Atos de Comércio foi incorporada, de certa forma, pois o conceito de empresário é mais amplo. Sem dúvida alguma, esse fato foi um avanço significativo. Aquela igualdade plana, horizontal do Iluminismo revolucionário francês foi posta de lado, abandonada, pois se admitiu em nosso Código o sujeito empresário, uma classe distinta e definida. Entendido que o comerciante pertencente ao antigo código comercial, atualmente é o empresário do novo Código Civil, pode-se entrar no assunto que nos interessa, ou seja, a responsabilidade ilimitada. O antigo comerciante por força do individualismo iluminista revolucionário era o único centro natural de direitos e deveres. Não se admitia patrimônios distintos pertencentes à mesma pessoa. Imperava o princípio da unidade do patrimônio, ou seja, uma única pessoa tem que possuir um único patrimônio. Apesar do abandono da Teoria dos Atos de Comércio, enquanto lista de atividades, ainda permanece a necessidade do exercício profissional de atividade econômica organizada e a ideia da confusão patrimonial entre patrimônio do empresário, enquanto empresa individual e o patrimônio da pessoa civil. Não ocorreu a superação desse excesso de personalização. Ainda não se admite a separação patrimonial, o que faz o empreendedor individual atuar em profunda discriminação em relação ao empreendedor coletivo: sociedade empresária. 4 Necessidade de exatidão da consciência dos operadores do direito, sobretudo, dos legisladores Para compreender a necessidade de exatidão da consciência, indispensável é a compreensão de três pontos: a) o intelecto (inteligência de natureza) ou Em Si ôntico; b) a consciência ou monitor de reflexão; e, c) a razão ou racionalidade. a) O intelecto humano é totalmente espiritual, transcendente, pois ele cria, dá unidade. Enquanto está na matéria age sobre ela, mas está acima dela, ou seja, é FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ transcendente. A Ciência Ontopsicológica, também o chama de Em Si ôntico: “Princípio formal inteligente que faz autóctise histórica”. Princípio, é o primeiro real, antes dele não há nada; formal porque é um formalizado que também formaliza, é estrutura e estruturante, tem um design e modo próprios para uma função; inteligente, pois conhece por presença interna, por intuição; e, faz autóctise histórica, haja vista a realização no tempo e no espaço, ou seja, faz-se a si mesmo em progresso. Uma das grandes contribuições científicas da Ontopsicologia foi a sistematização do estudo sobre o intelecto, sobre o Em Si ôntico. O intelecto é a capacidade de ver dentro, é a faculdade de intuir. b) O segundo ponto é a razão ou racionalidade. É “a técnica de administrar aqueles primeiros princípios e fazer a conexão, o nexo entre a realidade externa e verdade interna; é o exercício que administra as correlações entre primeiros princípios e percepções externas”. A razão emite juízos, sínteses, confronta e compara. Os primeiros princípios nesta citação significam a racionalidade elementar relativa ao ser, também denominada metafísica. Pode-se entendê-la, também, no sentido de intelecto aplicado. Racionalidade econômica, política, jurídica, enfim racionalidade entendida como conhecimento sistematizado à disposição do homem, seja qual for este conhecimento. Deve-se destacar que a racionalidade deve estar subordinada ao intelecto, ao Em Si ôntico; porém, o que se constata é a subordinação à consciência. c) Por fim, o terceiro ponto, é a consciência que se usa para fazer ciência, para investigar a verdade, para emitir juízos, para legislar e interpretar normas. A Ciência Ontopsicológica constata que esta consciência não apresenta reversibilidade com o real, ou seja, ela não colhe os fatos como se apresentam na realidade. Esta deficiência não decorre da norma de natureza, mas é decorrência das normas sociais, das opiniões societárias, que se sobrepuseram as lógicas de natureza, desde a infância até a época adulta. Então, a consciência é um fenômeno, que colhe o real por reflexão. Esta representação poderá ser idêntica ao real do fato, do fenômeno ou distorcida. A compreensão, do modo em que a consciência colhe é semelhante ao reflexo do espelho. Se este estiver limpo, transparente, a reflexão seguirá a mesma sorte, ou seja, reproduzirá o objeto na sua completude, como de fato ele é; caso contrário, a reflexão apontará o erro, a distorção. Na medida em que o homem encontrase impedido de colher o seu real, o seu ponto de exatidão, invalidada está a exatidão de sua pesquisa, a exatidão de sua produção jurídica, de sua intervenção legislativa, por mais esforçado que seja este operador. A assertiva de Protágoras: “o homem é a medida de todas as coisas” é verdadeira, desde que o homem seja um metro exato, uma mente capaz de mensurar, de pesar, de medir o real nas suas devidas proporções. Nesta linha, o homem de fato, será a medida de todas as coisas. Dentro de qualquer contexto, em especial na gestão do Estado, a consciência dos operadores de direito constituem uma ferramenta indispensável para fazer uma produção jurídica funcional ao ser humano. Aqui, o termo consciência adquire um significado exato, de acordo com a sua etimologia, consciência significa: Do latim cum se scire actionem = quando se sabe a ação (...), se scire cum ente = saber-se com isso que é. Conhecer conforme à ação. Conhecimento intrínseco ao cognoscente. Quando o ente está consigo e se sabe. O ato ou a coisa é evidente por intrínseca transposição. O FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ fato se conhece ou se reflete sem mediação (MENEGHETTI, 2008, p. 62). A consciência é um mediador técnico. Caso esta mediação não seja exata, já estamos fora do real, estamos alienados, perde-se o fio condutor que coliga os fatos, de si mesmo e da vida. A grande contribuição que a Ciência Ontopsicológica apresenta aos operadores sociais, jurídicos e econômicos está na exatidão da consciência. Ela dispõe de método e instrumentos de intervenção capazes de restituir a exatidão de consciência aos operadores. A psicoterapia de autenticação é o instrumento por excelência, que uma vez coordenado por um consultor expert em Ontopsicologia permite fazer a leitura exata do Em Si ôntico do sujeito, de tal forma, que a consciência possa refletir de modo preciso e operar corretamente sobre a racionalidade. Em linha de síntese, a exatidão da consciência permite ao legislador, ao conjunto dos operadores sociais a base de transparência necessária ao desenvolvimento das suas funções jurídicas, sociais e econômicas. Recuperada a autenticidade de natureza da consciência, retorna-se a própria exatidão e, por conta deste fato percebem-se as contradições sistêmicas, históricas, sociais; e, sobretudo, visualizam-se os fatos e os pontos que devem ser corrigidos, com vistas à funcionalidade ao ser humano. 5 Justificativa para sociedade unipessoal a instituição da 5.1 Princípio Constitucional da Igualdade e da Livre Iniciativa De início é necessário destacar duas situações relacionadas à interpretação do direito constitucional e do direito legislado ou infraconstitucional. Na primeira situação existe como antecedente imediato a vontade do povo, através dos seus representantes; na segunda situação, por sua vez, existe a mesma vontade do povo expressa pelos seus representantes, porém subordinada à primeira, à Constituição Federal. Estabelecida esta premissa é possível a leitura correta da legislação, também objeto deste trabalho. A matéria-prima de análise é a atividade do empreendedor, que quando atua individualmente responde ilimitadamente; todavia, quando atua de forma societária (sociedade empresária ou sociedade anônima) responde na medida da sua participação, ou seja, de forma limitada. Esses dispositivos constitucionais estão postos no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos. O Artigo 5°, caput é considerado o mais importante da Carta Constitucional, pelo simples fato de estabelecer os cinco direitos fundamentais do cidadão, que devem ser observados no conjunto da legislação infraconstitucional. Em rápida análise, o direito que interessa ao nosso objeto é o da igualdade ou isonomia, não no sentido de que todos são iguais por natureza, mas sim, iguais no plano da norma, no plano da obtenção e fruição dos direitos, bem como no cumprimento dos deveres. Esta igualdade é vista pelos constitucionalistas como uma igualdade formal, diante do direito e, jamais, deve-se entendê-la como igualdade substantiva, real, diante dos bens da vida. Dando concretude ao princípio acima, deve-se especificá-lo, pois assim, ter-se-á as coordenadas que permitem medir a existência ou não da igualdade. No inciso XIII, citado acima, apresenta-se a espécie com a qual se pode definir o direito genérico da igualdade, ou seja, o direito de exercer qualquer trabalho, ofício ou profissão. O ato de empresariar, empreender, organizar uma atividade FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ profissional, um ofício, um trabalho é o especificante. Com este nível de detalhamento, já se pode tecer as primeiras considerações. No exercício do trabalho, no exercício empresarial, enquanto empreendedor individual existe a responsabilidade ilimitada, o patrimônio pessoal confunde-se com o patrimônio empresarial. No exercício de atividade coletiva (dois sócios ou mais), articulados sob a forma de sociedade empresária ou sob a forma de sociedade anônima inexiste responsabilidade ilimitada. Este é um fato. Constata-se de imediato uma flagrante desproporção de tratamento, em manifesto prejuízo ao empreendedor individual. Sendo mais concreto, através de exemplo. Um comerciante de veículos atuando como empresário individual responde com o patrimônio por eventuais prejuízos, da sua atividade empresarial; por outro lado, este mesmo comerciante atuando com outro sócio, na mesma atividade, terá a sua responsabilidade limitada à sua participação societária e o seu patrimônio pessoal não responderá por eventuais prejuízos, que superem o seu patrimônio empresarial. O princípio da livre iniciativa, implicitamente, encontra-se maculado pela legislação que regula a atividade do empresário individual. É de compreensão mediana, o desestímulo gerado ao crescimento econômico e à livre iniciativa do empreendedor singular, na medida em que este responde ilimitadamente, com o seu próprio patrimônio pessoal. As condições de desenvolvimento que a legislação infraconstitucional, especialmente o novo Código Civil, apresenta para os integrantes de sociedade empresária ou de sociedade anônima, em relação ao empresário individual são flagrantes. O constituinte primeiro estabelece a igualdade entre todas as pessoas perante a lei, no caso específico, os protagonistas ou agentes do processo produtivo. Sejam eles individuais ou coletivos, sejam eles empresários individuais ou integrantes de sociedades empresárias ou anônimas. Depois, destaca que a ordem econômica é fundada em dois pilares: valorização do trabalho humano e na livre iniciativa. O primeiro pilar é o trabalho desenvolvido, por meio das mais diversas relações regulamentadas pela legislação trabalhista; e, o segundo pilar é constituído pelas empresas individuais e coletivas ou empresários e sociedades. Na medida em que a legislação outorga responsabilidades diferentes entre os empreendedores, parece-me claro que existe uma restrição velada, que inibe a livre iniciativa para um em benefício de outro, bem como tratamento não isonômico. 5.2 Compreensão histórica do Código Napoleônico à luz da Revolução Francesa e a sua transmutação ao Brasil e demais países da família romano-germânica O Código de Comércio Francês de 1807, com os seus diversos modelos societários mantinham-se em perfeita sintonia com o princípio da igualdade, característico da revolução. Todos os modelos de sociedade apresentados neste código tinham como regra geral a responsabilidade ilimitada de seus integrantes e, somente, em casos excepcionais era limitada a responsabilidade, ou seja, os integrantes das sociedades e os comerciantes recebiam o mesmo tratamento. Esse modelo de código é transferido em linhas gerais ao Brasil. O nosso Código Comercial de 1850 adotou os mesmos modelos de sociedade, a mesma figura de comerciante, definida com base nos atos de comércio. FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ A partir de um dado momento, surgem as sociedades anônimas, as sociedades limitadas nas legislações europeia e brasileira. Acrescentam-se novos modelos societários e os antigos ficam em desuso, tornam-se “peças de museu”. Esta engenharia societária do final do século XIX e início do século XX constituíram uma revolução no instituto da responsabilidade. Aquilo que era até então regra, tornou-se exceção. Entretanto, esta exceção não permaneceu por muito tempo. Logo foi percebida pelos legisladores que a figura do antigo comerciante era a única que apresentava a responsabilidade ilimitada. Era uma incongruência em relação aos novos modelos societários. Então, a legislação de diversos países do sistema romano-germânico atualizou este instituto. O primeiro estado europeu foi o Principado de Liechtenstein, depois temos a Alemanha, a França, Portugal, Itália e a própria Comunidade Econômica Europeia adotando a sociedade unipessoal de responsabilidade limitada. O Brasil é o único país de expressão econômica, da família romano-germânica, que ainda continua com a responsabilidade ilimitada do empresário individual. Os seus legisladores ainda insistem no antigo princípio da unidade do patrimônio como justificativa para não criar a sociedade unipessoal. Alegam que seria um abalo aos credores, insistem nos velhos conceitos de sociedade, continuam com os mesmos argumentos do século XIX, próprios da codificação napoleônica. Portanto, a compreensão do instituto da responsabilidade deve ser feita no contexto histórico em que ela foi criada e institucionalizada. O momento, que hoje se vive, não se admite conceitos típicos do século XVIII e XIX. Este modelo de empresário individual ou antigo comerciante individual não está adequado à nossa Carta Constitucional. É um instituto alheio aos novos tempos, que exigem igualdade no tratamento e estímulo à livre iniciativa, fatores fundamentais para o desenvolvimento econômico das nações. 6 Considerações Finais Todo o esforço aplicado na compreensão histórica do instituto da responsabilidade, seja do empreendedor individual, seja do coletivo resulta na constatação, de que até o advento das sociedades anônimas e das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, a regra corrente era da responsabilidade ilimitada. Os empreendedores individuais, bem como os integrantes das sociedades comerciais respondiam pelas obrigações, inclusive com o seu patrimônio pessoal. Este entendimento foi aplicado antes das codificações napoleônicas e após esta, até o surgimento das sociedades limitadas. As únicas exceções dentro do quadro das sociedades comerciais típicas eram as sociedades em comandita simples, onde os sócios comanditários ou investidores respondiam nos limites do capital investido, desde que tivessem afastados da gestão; e, as sociedades de capital e indústria, onde os sócios de trabalho respondiam nos limites das quotas do seu próprio trabalho profissional. Além das exceções acima, existiam as sociedades anônimas, cuja instituição e controle eram do Estado, juntamente com grandes capitalistas. Estas companhias, também eram chamadas de sociedade de capital. Dentro desse contexto, que se estendeu até o final do século XIX a regra da responsabilidade era coerente com os modelos societários utilizados. O instituto da responsabilidade apresentava como norte a inexistência de limites, ressalvadas as exceções. Os Códigos Comerciais próprios da época expressavam esta compreensão, que foi FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ consolidada ao longo da história. Portanto, o instituto da responsabilidade estava totalmente adequado àquele momento histórico. Ocorre, que com a disseminação das sociedades anônimas no direito romanogermânico, a criação das sociedades limitadas na Alemanha em 1892 e sua difusão aos demais países da mesma família, cria-se um ponto de inflexão na história do instituto da responsabilidade. Na virada do século, a necessidade de promover segurança aos empreendedores, especialmente os pequenos e médios era indiscutível. Não se podia admitir que, somente, os grandes investidores e o Estado tivessem limitação na responsabilidade. Os pequenos e médios empreendedores, também, deveriam dispor desta mesma possibilidade. No início do século XX, surge a discussão da sociedade unipessoal com responsabilidade limitada. Os países de tradição germânica são os primeiros a adotarem este modelo. Na terceira metade do século começa a consolidação deste modelo em diversos países europeus, chegando-se ao ponto da comunidade econômica europeia adotá-la como diretiva aos seus integrantes. Neste momento, na maioria dos países de tradição romano-germânica, a regra é a limitação da responsabilidade para todos os empreendedores, independente de atuação singular ou coletiva. Esta evolução do instituto da responsabilidade é um estímulo, uma segurança jurídica mínima, mas, sobretudo, um ato de isonomia e de respeito ao empreendedor individual. Em que pese as modificações acima relatadas, o nosso direito pátrio, ainda insiste na manutenção do empresário com responsabilidade ilimitada. Os projetos de lei, cujo propósito era limitar esta responsabilidade não vingaram. O último em tramitação, o Projeto de Lei n° 4.605/2009, talvez seja a redenção desta matéria, que já tem sido discutida nos anais do Congresso, desde 1947, com o projeto do Deputado Federal Fausto Freitas e Castro. Deve-se mencionar a necessidade dos operadores de direito, sobretudo os legisladores, tornarem exata sua consciência sobre esta nova realidade e permitirem-se a livre discussão sobre esta matéria, em relação ao empreendedor individual, até porque ele representa mais de 50% dos empreendimentos constituídos. Por fim, é necessário uma consciência capaz de entender o papel do Estado e do Direito como um sistema funcional à sociedade. O Estado legislador é um meio de economia social para o ser humano, para a pessoa, na medida em que se produzam normas úteis e funcionais. Nesta empreitada a Ciência Ontopsicológica tem muito a colaborar, especialmente, no processo de autenticação, de exatidão de consciência dos operadores sociais, com vistas a uma compreensão e práxis superior. Somente, com uma consciência transparente é possível fazer uma discussão e adequação saudável do sistema normativo, que contemple o desenvolvimento harmônico, sustentável e de respeito ao próprio ser humano, que são empreendedores por natureza. Referências (Bibliografia consultada) ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000. BOBBIO, N. O positivismo jurídico. São Paulo: Ícone, 1995. BULGARELLI, W. Direito comercial. São Paulo: Atlas, 1990. BRUSCATO, W. A. Empresário individual de responsabilidade limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2005. CAENEGEM, R. C. van. Uma introdução histórica ao direito privado. São Paulo: Martins Fontes, 1995. FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ________________________________________________________________________________________________________ CERVO, F. A. S. Regime jurídico de limitação da responsabilidade do empresário individual: sociedade unipessoal e estabelecimento individual de responsabilidade limitada. Revista de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor, n. 09, p. 6776, jun.-jul. de 2006. CRISTIANO, R. Empresa é risco. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. DAVID, R. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. São Paulo: Martins Fontes, 1998. ISFER, E. Sociedades unipessoais & empresas individuais. Responsabilidade limitada. Curitiba: Juruá, 1996. FLACH, N. O formalismo jurídico oitocentista: doença infantil do positivismo. Revista da Faculdade de Direito Ritter dos Reis, v. III, p. 131-180, 2000. FURTADO, J. P. Disposições gerais do Código Comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 1984. GAMA, D. Das sociedades civis e comerciais. São Paulo: Saraiva, 1923. LOPES, J. R. de L. O direito na história. São Paulo: Atlas, 2008. MAGNOLI, D. União Europeia história e geopolítica. São Paulo: Moderna, 2000. MENEGHETTI, Antonio. A crise das democracias contemporâneas. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2007. _____. A Psicologia do líder. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008. _____. Direito, consciência, sociedade. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2009. _____. O critério ético do humano. Porto Alegre: Ontopsicologica Editrice, 2002. _____. Dicionário de Ontopsicologia. São Paulo: Ontopsicologica Editrice, 2001. _____. Dicionário de Ontopsicologia. 2. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008. MONTEIRO, W. de B. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1997. MORRISON, W. Filosofia do direito dos gregos ao pós-modernismo. São Paulo: Martins Fontes, 2006. PEDROSO, R. L. Direito em história. Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2008. PEREIRA, B. Y. P. Curso de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. QUEIROZ, A. F. de. Direito constitucional. Goiânia: Editora Jurídica IEPC, 1996. REQUIÃO, R. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2007. RODRIGUES, D. J. Principais inovações do novo Código Civil. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2003. THALLER, E. Trattato elementare di diritto commerciale. Milão: Società Editrice Libraria, 1923. TZIRULNIK, L. Empresas & empresários no novo Código Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. Autor: João Francisco Dias Feltrin: advogado, contador, atuação em assessoria empresarial e tributária, Especialista em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Josemar Sidinei Soares: Doutor em Filosofia (UFRGS); Mestre em Educação (UFSM); Mestre em Ciência Jurídica (UNIVALI); professor Programas de Mestrado e Doutorado em Ciência Jurídica e professor Curso de Direito (UNIVALI); professor graduação e pósgraduação Faculdade Antonio Meneghetti (AMF). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 21/12/2010. FELTRIN, João F. Dias; SOARES, Josemar S. A responsabilidade do empreendedor individual e suas perspectivas jurídicas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 21-33, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário Letícia Batistela Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Soraia Schutel Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) [email protected] Resumo: Esta pesquisa discute a função do assessor jurídico para o processo de tomada de decisão do empresário com o consequente sucesso em seu business. Efetivamente, a assessoria jurídica é um instrumento que pode servir ao tomador de decisão em situações estratégicas, levando ao sucesso ou ao fracasso. Considerando os pressupostos da Ciência Ontopsicológica, nos fundamentos teóricos, apresentam-se as características elementares que o assessor jurídico deve possuir para auxiliar os empresários nos processos de tomada de decisão. Os dados são apresentados e discutidos a partir da abordagem qualitativa nas pesquisas em ciências sociais aplicadas. Utilizou-se na coleta de dados a aplicação de 10 questionários, realizados com 10 empresários e uma entrevista aberta com o Acadêmico Professor Antonio Meneghetti. Foi analisada, outrossim, através dos questionários e de doutrina especializada, a relação existente entre o empresário e seu assessor jurídico no que tange ao aspecto psicológico, histórico, financeiro e comercial, desde a forma e possibilidade de contratação, passando pela relação operante e resultados obtidos. A forma como o empresário se relaciona com o seu assessor jurídico e como suas orientações influenciam no business do empresário demonstram a absoluta necessidade de entendimento desta relação e como seus desdobramentos influenciam no resultado alcançado. O trabalho conclui acerca da necessidade do assessor jurídico desenvolver-se pessoal e profissionalmente a fim de melhor prestar serviço especializado para o empresário tomar a decisão mais acertada. Palavras-chave: função do assessor jurídico; tomada de decisão; ética legal; postura do assessor jurídico. Abstract: This research discusses the role of legal advisor to the decision-making process of the businessman with the resulting success in your business. Indeed, the legal counsel is an instrument that can serve the decision-maker in strategic situations, leading to success or failure. Given the assumptions of science Ontopsychological, theoretical foundations, we present the basic features that should have legal counsel to assist entrepreneurs in processes of decision making. The data are presented and discussed from a qualitative approach in social science research applied. We used to collect data for the application of 10 questionnaires conducted with 10 businessmen and an open interview with Professor Antonio Meneghetti. Was analyzed, furthermore, through questionnaires and specialized doctrine, the relationship between the entrepreneur and their legal counsel regarding the psychological, historical, commercial and financial, from the shape and the possibility of hiring, working from the relationship BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, jan. 2011. 34 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ and results obtained. The way the business is related to their legal counsel and guidance as their influence on the entrepreneur's business demonstrate the absolute necessity of understanding how this relationship and its consequences influence the result. The paper concludes on the need for counsel to develop both personally and professionally in order to better provide specialized service for the businessman to take the right decision. Keywords: role of the General Counsel; decision making; legal ethics; legal secretary position. 1 Introdução O tema deste trabalho surgiu em razão da dificuldade que se tem vivenciado na função de assessoria auxiliando o empresário a buscar uma solução jurídica que responda a necessidade de seus problemas empresariais. Notou-se que a falta de sinergia na relação entre o profissional do direito e o empresário pode acarretar em falhas, inconsistências e até mesmo fazer com que o empresário assuma riscos desnecessários no crucial processo de tomada de decisões. O empresário, com foco em seu negócio, quer obter sucesso com o mínimo de riscos possíveis e a melhor orientação, mas não sabe exatamente o que exigir de sua assessoria jurídica. O advogado, por sua vez tem a sua técnica jurídica, sua especialização, mas esbarra de forma ingênua em imbróglios e burocracias muitas vezes intransponíveis que tornam seu trabalho falho e lento. Buscando eliminar esta barreira na relação profissional entre advogado e empresário, objetivou-se compreender a percepção de empresários sobre a assessoria jurídica e o assessor quando realiza o processo de tomada de decisão. O estudo deste tema trará benefícios para o aprimoramento da execução da assessoria pontual e efetiva, pois este deve primar sempre pela satisfação do cliente. Considera-se que um trabalho de assessoria jurídica bem sucedida ocorre quando a aspiração do cliente é cumprida ou superada e ele realiza com sucesso seu business. Apesar de a pesquisadora dominar a prática jurídica, nunca havia efetivamente “ouvido” o cliente sobre o que ele espera de seu serviço profissional como assessora jurídica, além do previsível: uma boa técnica. Buscou-se em diversos meios trabalhos similares que versam sobre a visão do empresário sobre o que espera de uma assessoria jurídica e não foi encontrado nenhum trabalho com este enfoque, o que demonstra uma abordagem inovadora desta investigação sobre o papel do assessor jurídico e sua relevância para um negócio bem sucedido. Desta forma, tenta-se compreender a perspectiva do empresário, do cliente que é a parte diretamente beneficiada pela assessoria jurídica especializada. A contribuição da visão do empresário pode servir de contraponto com a visão do advogado que realiza a função de assessoria jurídica e, assim, enriquece tanto o campo da aplicação prática deste serviço quanto da teorização da assessoria jurídica ao business. Inicialmente pesquisou-se a perspectiva histórica da visão da função do advogado, como nasceu, constituiu-se e alcançou seu lugar na sociedade, inclusive sua formação em grupo, a hoje conhecida Ordem dos Advogados do Brasil (O.A.B.). A seguir buscou-se na teoria de uma doutrina especializada, os fundamentos de uma assessoria jurídica efetiva e de sucesso, ou seja, que alcança seu objetivo: a satisfação do cliente, o empresário. Posto este argumento, explicitou-se a visão ontopsicológica sobre o papel do advogado no suporte ao líder. E, por fim, BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ desenvolveu-se a análise dos dados coletados com os empresários caracterizando as suas expectativas no que tange ao papel do advogado, bem como quando estas orientações são efetivas cumprindo com o objetivo para o qual foi contratado. 2 Fundamentação Teórica 2.1 Origem do advogado A profissão de advogado tem sua origem em remotos tempos e é objeto de diversas lendas e histórias não comprovadas. Procurou-se resgatar de forma fidedigna a história da Advocacia trazendo dados históricos e doutrina especializada, através de autores conceituados e respeitados na área. Segundo Gilissen (1988): A figura do advogado surgiu ainda que, de certo modo rudimentar, nas civilizações mesopotâmicas, com marco inicial na Suméria. Os egípcios usavam comumente a figura do Conselheiro para auxiliá-los nos assuntos do direito e das leis, tendo surgido nessa época as primeiras regras e normas processuais, que, de forma estranha aos nossos dias, afastavam fortemente a eloqüência com o objetivo de convencer o julgador (GILISSEN, 1988, p. 32). Foi justamente na antiga Grécia que hoje as respeitadas oratória e eloquência se tornaram qualidades associadas à figura do advogado. Oradores respeitados e famosos, como os grandes Péricles e Demóstenes, tornaram-se grandes advogados, admirados, reconhecidos e de grande reputação. Surge, pois, a figura dos Corógrafos, ditos defensores dos acusados, que recebiam pelos seus serviços. Pois, foi então na Antiguidade Clássica, com os gregos, que a eloquência passou a ser o elemento precípuo na defesa forense. Os ditos Corógrafos eram cidadãos livres, cultos e com grande e invejável capacidade oratória, remunerados justamente pelos seus serviços como defensores de acusados. Foi ainda na Grécia antiga que o culto e admiração do direito atingiu o seu prestígio máximo com as reformas de Drácon, Sólon e Licurgo. As leis de Drácon e Sólon eram taxativas e estipulavam que só os homens livres podiam servir como advogados, os quais não podiam ter qualquer mácula ou desconfiança em sua reputação. O Tribunal era tido e respeitado como um local verdadeiramente sagrado, que tinha de ser purificado no início de cada julgamento, conforme Gilissen (1988). Segundo Garrido (2000), o advogado Hypérides protagonizou um incidente que foi a origem de uma das primeiras regras deontológicas, ou seja, éticas, para advogados. Durante um controverso julgamento, este atuava na defesa de uma cortesã. Ao verificar que esta seria condenada, exigiu que ela avançasse para o meio do tribunal e que retirasse o véu que lhe cobria os seios. Impressionados pela beleza da mulher e seduzidos pela verve do advogado, os juízes acabaram por absolvê-la. Este fato originou uma lei para disciplinar a intervenção dos advogados, proibindo-os de atitudes que incitassem à piedade ou indignação, e interditando os juízes de olharem o acusado se este tentasse apelar aos sentimentos quaisquer que fossem. Dessa forma, antes de cada audiência, um funcionário lembrava aos oradores o seu dever, para que ninguém tentasse ganhar a causa por meios ilegítimos. De igual modo, foi instituída pela primeira vez na história a regra do sigilo profissional, a proibição do uso de expressões grosseiras e a limitação de tempo para a intervenção do advogado. De acordo com Garrido (2000), foi com os romanos que a advocacia surge como profissão organizada. Os Patronus e os Oratores dão origem ao advocatus. Profissão que passou a ser exercida BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ também por mulheres, destacando-se as afamadas advogadas Amásia e Hortência, notáveis e respeitadas na época do Imperador Augusto. Saliente-se que as mulheres só perderam esse direito com o derradeiro declínio do Império Romano e que só o vieram a recuperar já no século XIX. Para Garrido (2000), foi na época Romana que se tornou obrigatório o uso da toga perante os tribunais, como forma de impor respeito pela profissão, porque esta só era usada por aqueles a quem tivesse. Desta forma, para alguns estudiosos da área, foi Péricles, na cidade de Atenas, o primeiro profissional da advocacia. Para outros, essa primazia foi de Antifonte, na Grécia, em 479 a.C. É fato que a História da Advocacia sempre acompanha a História do Direito. Na Roma antiga já existia a representação judicial por meio dos advocati, os representantes judiciais. Os litígios eram resolvidos na presença do senado ou até mesmo do imperador e, geralmente, as pessoas envolvidas nestes litígios eram pessoas simples e rudes. Já os advogados sabiam como se dirigir às autoridades do império, bem como defender fortemente os interesses de seus representados. Assim, a oratória era a primeira, senão a principal das qualidades exigidas dos representantes judiciais. Na Grécia, o prestígio da advocacia era enorme. Isso porque, o direito de defesa era instituído na própria legislação, o que ocasionou a origem de grandes advogados, inclusive os citados acima. Segundo Petit (1926), a fama do sistema judiciário grego chegou à Roma que, por sua vez, enviou a Atenas uma comissão de juristas para conhecer as leis de Drácon e Sólon. No princípio o exercício da advocacia era uma grande honraria e não podia ser remunerado. Porém, durante o reinado do imperador romano Claudio, em 451 d.C., surgiram os honorarium, ou seja, os honorários, os chamados tributos de honra. O senado passou a fiscalizar o exercício da profissão e, ao fim do século IV, surgia a Ordem dos Advogados. A Advocacia, segundo o mesmo autor, converteu-se em profissão organizada quando o imperador Justino constituiu, no século VI, a primeira ordem de advogados no império romano do oriente, obrigando o registro a quantos fossem advogar. Requisitos rigorosos foram impostos: ter aprovação em exame de jurisprudência, ter boa reputação, advogar sem falsidade e não abandonar a defesa, uma vez aceita. No Brasil, já na época da sua Independência, se realizavam debates acalorados na Assembleia Constituinte, e após na Assembleia Legislativa, em favor da criação dos cursos jurídicos, muito almejados na época. Já em 1824, foi redigida a primeira Constituição Brasileira. Mas não bastavam leis, eram necessários profissionais que as executasse. Com este objetivo precípuo, o imperador criou, no dia 11 de agosto de 1827, os dois primeiros cursos de Direito no país. Um foi inaugurado em Olinda, no Mosteiro de São Bento, e outro na cidade de São Paulo. Por este motivo, houve a instituição do dia 11 de agosto para ser comemorado o dia do advogado. Para dar amparo ao profissional advogado, em 1843 foi criado o Instituto dos Advogados Brasileiros, cujo objetivo maior era constituir uma Ordem dos Advogados do Império. Mesmo com o projeto de criação apresentado ao Senado, em 1851, depois detido na Câmara dos Deputados e discutido exaustivamente, a Ordem dos Advogados, durante o período do Brasil Império, não conseguiu se constituir. Entretanto, após a Revolução de 1930, instalado o Governo Provisório, em 18 de novembro de 1930, foi criada a BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Ordem dos Advogados do Brasil, numa época em que advogados e juristas já participavam de forma ativa da movimentação em torno da renovação e das mudanças na política do Brasil (era a época da chamada República Velha). A nossa Carta Magna, promulgada em 1988 alçou a advocacia ao patamar de “preceito constitucional”, preservando sua atividade exclusivamente privada, como prestadora de serviços de interesse coletivo, dando aos seus atos múnus público, conforme preceitua o Art. 133: “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Em 04 de abril de 1994, entrou em vigor o esperado Estatuto do Advogado, garantindo prerrogativas até então inexistentes que poderiam dar ao advogado a necessária e esperada independência. Sem esta prerrogativa, não há Advocacia e o devido processo legal, e quem perde precipuamente é o cidadão. Desta forma, o Direito valorizado como uma ciência das normas que regulam as relações entre os indivíduos na sociedade só pode funcionar para preservar as relações preconizadas nas normas até então estabelecidas, e garantido o trabalho do advogado, que representa o jurisdicionado em qualquer instância, juízo ou tribunal. Segundo Lopes (2007): A função do advogado é estrutural e basilar ao princípio de justiça. Do latim advocatu (ad = para junto, e vocatus = chamado), significa aquele que é chamado para ajudar. O homem moderno se perfaz assegurandolhe o direito de reivindicar e defender seus direitos através de regras legais previstas no ordenamento processual judicial (civil e penal) e administrativo, criados sob a inspiração do espírito democrático que encampa o Poder Legislativo deste país. Et pour causae, vem a tona no nosso mundo jurídico o Princípio do Processo Legal, nos termos do artigo 5º, LIV, da Constituição da República, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. E só o advogado é capaz de fazer que as leis sejam aplicadas, sem jamais desertar do espírito de justiça” (LOPES, 2007, p. 14). Nota-se após este estudo, que o surgimento da figura do advogado, tratado neste texto no papel de assessor jurídico, manteve sua essência até os dias de hoje, tendo como missão fundamental preservar os direitos inerentes a cada cultura e nação, sempre coerente as respectivas regras e preceitos legais. Desta forma, independente da função que exerça, o advogado deve preservar sua essência, em prol de sua formação e do pleno atendimento ao seu cliente. 2.2 Assessoria jurídica e o papel do advogado enquanto assessor O advogado pode assumir diversas funções após o seu curso de habilitação profissional em nível superior e necessária aprovação no exame da O.A.B. Dentre estas funções, encontra-se a de assessor jurídico empresarial, enquanto advogado independente sem vínculo empregatício direto ou qualquer exclusividade com seu cliente. O assessor jurídico tem como clientes empresas de qualquer porte que buscam um profissional especializado. A busca pela melhoria do desempenho das organizações faz com que estas empresas procurem prestadores de serviços jurídicos cada vez mais eficazes, ágeis e eficientes. O assessor jurídico externo é uma opção que pode aconselhar ou prestar algum tipo de serviço especializado que melhore o desempenho e aumente a competitividade e agilidade da empresa. Segundo Kubr (1986): A atividade de assessoria jurídica passou a existir representada por uma pessoa ou empresa que tinha por responsabilidade não BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ apenas a identificação e investigação de problemas relacionados à política, organização, procedimentos e métodos, mas, também, à orientação adequada à resolução dos problemas. Existia um problema, mas o pessoal efetivo, ou seja, interno, não tinha especialização necessária para resolvê-lo (KUBR, 1986, p. 145). Para Kubr (1986): A assessoria deve ser um aconselhamento, na qual os assessores não são chamados para dirigir as empresas ou tomar decisões de risco em nome do empresário ou do executivo responsável. Os assessores devem ter o papel exclusivo de conselheiros, e suas responsabilidades se limitam à qualidade e integridade dos conselhos que dispõe. Aos empresários/clientes devem caber todas as responsabilidades decorrentes da aceitação e aplicação dos conselhos. É claro que, no dia-a-dia da assessoria, há muitas variações tênues e graus diversos do que se entende por “conselho”. Apenas jogar o conselho não é suficiente. Mas, dá-lo de forma adequada, efetiva e no tempo certo são habilidades fundamentais de um assessor (KUBR, 1986, p. 148). Kubr (1986, p. 142) também destaca que a assessoria “é um serviço que provê conhecimento profissional e habilidades relevantes para problemas organizacionais na prática”. Ora, mas quando um profissional se torna assessor efetivo? De acordo com a experiência que se tem ao longo de 16 anos do exercício de assessoria jurídica, entende-se que é quando o advogado acumula um grande conhecimento de várias situações e imbróglios organizacionais e, ainda, quando adquire determinadas habilidades necessárias à resolução de alguma questão. Ou seja, identificar os problemas, buscar e encontrar informações diretamente relevantes; analisar e/ou sintetizar; definir entre as várias alternativas para a efetiva solução e saber comunicar-se com o cliente. Entende-se que o maior diferencial do assessor é que ele passa por muitas empresas e aprende como utilizar-se da experiência obtida em trabalhos feitos anteriormente para implantar novas soluções com maior habilidade e competência. Além disto, os assessores com maior experiência mantêmse constantemente atualizados nos métodos e técnicas jurídico-comerciais, estando atentos às novidades desenvolvidas em universidades e instituições de pesquisa, para informar os empresários a esse respeito e ajudá-los a aplicá-las. Segundo Mocsányi (2003), além de conhecimento técnico, talento e criatividade, as características que destacam um bom assessor são mais amplas e até mesmo subjetivas, sejam elas profissionais, culturais, políticas e até mesmo psicológicas. Todas essas qualidades, segundo o autor, são fundamentais na atuação diária do assessor em seu relacionamento com clientes e seus respectivos colaboradores, incluindo parceiros fixos ou eventuais, e consigo mesmo, exigindo mais de seu próprio desempenho. Segundo Grocco & Guttmann (2005), o assessor tem algumas características que podem ser detalhadas, tais como: Independência e qualificação – a característica mais importante (...) é a imparcialidade na atuação do consultor, (...) aumenta a complexidade no seu relacionamento com os clientes. (...) a qualificação pressupõe que o consultor esteja plenamente capacitado e fortemente embasado para fazer as suas recomendações; política, organização, procedimentos e métodos (...) fazem parte da essência dos motivos que levam à contratação de um consultor. (...) trata-se de conhecimento profissional e habilidades relevantes para as necessidades da empresa; recomendação – a ação esperada do consultor é de aconselhamento, não de decisão. A qualidade e integridade das recomendações constituem o enfoque desse aconselhamento, respeitando o momento BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ das pessoas e da empresa-cliente; auxílio – significa não ter controle direto sobre a situação ou sobre a decisão. A responsabilidade de aconselhar existe, mas autoridade ou liberdade de decisão não; processo interativo (...) significa um conjunto estruturado de atividades seqüenciais que apresentam uma relação lógica entre si, com a finalidade de atender e superar as expectativas e necessidades dos clientes internos e externos (GROCCO & GUTTMANN, 2005, p. 34). As características citadas por este autor evidenciam o papel do advogado enquanto assessor jurídico. São trazidos conceitos basilares de postura, capacitação e técnica que, se criteriosamente seguidos trarão um diferencial a assessoria prestada, influenciando diretamente no sucesso do negócio orientado pelo assessor jurídico. Inicialmente, é citada a independência e qualificação, que são características que dão o cerne, a estrutura de um assessor jurídico. Um assessor jurídico, ao contrário de um advogado interno de uma empresa, mantém sua independência, por conseguinte sua imparcialidade quanto às orientações dadas. Ao manter sua independência em relação à empresa e ao próprio empresário ele consegue enxergar o problema de fora, trazendo uma solução livre de vícios e prédisposições. Esta visão privilegiada é o grande diferencial de um assessor jurídico, posto que ao ser contaminado pelos problemas e soluções pregressas já aplicadas, o advogado interno não traz soluções novas e criativas para o mesmo problema. A qualificação também é um pressuposto básico a uma boa assessoria jurídica, merecendo um lugar de destaque entre suas principais características, pois é pressuposto básico que as orientações do assessor jurídico sejam embasadas. Assim, há a aprendizagem constante do assessor e, esta se baseia no enfrentamento constante de situações novas, a cada projeto, a cada serviço contratado, a cada organização e com diferentes pessoas envolvidas, o que exige destes profissionais não somente a capacidade de aprenderem, mas a existência de oportunidades e liberdades significativas. O mesmo autor evidencia bem que o papel do assessor jurídico é recomendar, orientar e não decidir. Conforme dito por um dos empresários entrevistados no presente estudo (E1), o assessor jurídico deve ter a compreensão de que não é o protagonista do jogo. Sendo assim, o que o empresário espera dele é uma orientação técnica, com todo o embasamento, imparcialidade e qualificação necessário para que a sua decisão seja a mais acertada para o seu negócio. Não é raro encontrar estudos que procuram identificar características pessoais ou traços em pessoas como líderes, empreendedores e também consultores. Dessa maneira, Kubr (1986) aponta que os consultores de sucesso são, geralmente, profissionais éticos, corteses, autoconfiantes, de comportamento estável, independentes, competentes intelectualmente, capazes analiticamente, hábeis para se comunicar e persuadir. Este tema explorou o papel do advogado enquanto assessor jurídico, demonstrando que seu papel é precípuo para a empresa, posto que decisões estratégicas passam por ele e podem alterar o resultado de um negócio. 3 Visão da Ontopsicologia sobre o assessor jurídico Dentre todas as visões sobre a assessoria jurídica, a Ontopsicologia traz uma visão sob o ponto de vista do empresário e de quais riscos ele enfrenta no seu dia-a-dia. A relação do ente social com a lei é inevitável, todos nós de algum modo, estando em sociedade assumimos uma condição de, nesta, ter direitos e BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ deveres. Contudo, esta é a relação elementar, muitas vezes não refletida na realidade do empresário de negócios. Segundo Meneghetti, existe uma obrigação jurídica e superá-la é uma questão de sobrevivência no business: Na realidade, entre mandantes e mandados, todos sofremos a obrigação jurídica com dependência fideísta ou com necessidade de sobrevivência na agressividade social; na maioria dos casos, observamos o direito por legítima defesa, e não como serviço de ordem e crescimento. O direito internacionalmente resulta em uma coação a repetir, porque sistema e indivíduo já estão em uma relação homo lúpus (MENEGHETTI citado por GROSSO, 2006, p. 27). A questão abordada por Meneghetti é crucial, pois se verificam situações nas quais os empresários usam a assessoria jurídica como uma defesa passional dos “perigos” de uma ordem jurídica fatal. Constitui-se este um problema, pois o conhecimento jurídico deve ser utilizado de forma proativa e não reativa. Deve ser utilizado a fim de escolher os melhores caminhos, buscadas as melhores nuances de um business de sucesso, enfim, deve ser encarado como uma orientação de um critério jurídico lógico e racional e não como uma defesa passional. Meneghetti (2009b) afirma que a lei hoje é prioritária em relação ao dinheiro e, antes de iniciar qualquer coisa, deve ser sempre controlada. O empresário tem a intuição, mas lhe falta a técnica jurídica e a imparcialidade, atributos que um assessor jurídico tem e que se seguidos levarão o empresário a vencer. Meneghetti (2009b), também argumenta que quando se começa a ter riqueza, é prudente se prover por meio da lei, porque é uma proteção contra os pequenos, os frustrados. Pois, segundo ele, a lei deve ser usada a fim de que o empresário não seja afetado por estes que o cercam, mantendo-se livre. O empresário precisa conhecer a lei para optar pelo melhor caminho, escolher o melhor parceiro, fornecedor, etc. Este é o primeiro passo para que ele se dedique ao seu business prevendo e minimizando riscos na organização de seu negócio. Segundo Meneghetti (2009b), existem muitas armadilhas e peripécias legais no mundo atual, sendo que o empresário deve seguir a legislação para não perder a sua liberdade, não podendo alegar ignorância ou boa-fé, pois, segundo o autor, “algumas coisas podem parecer um tanto quanto óbvias na nossa boa-fé e, na realidade, são contra a lei”. (MENEGHETTI, 2009b, p. 22). A ignorância sobre a lei é uma grande armadilha na qual o empresário invariavelmente incorre, pois a nossa legislação pátria prevê que a ignorância de uma norma não isenta o cidadão da responsabilidade pelo seu não cumprimento. O Código Civil Brasileiro em seu Artigo 1.011, determina que: “o administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo o homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios”. Este dispositivo legal dá ao administrador a certa responsabilidade ao gerir a sua empresa, e os riscos inerentes a gestão de seu negócio. A sua responsabilidade, como administrador é única e exclusiva e é ele que deve prestar contas seja ao fisco, a justiça ou a terceiros, dentre eles, seu cliente. Ainda, dando maior responsabilidade ao empresário, o mesmo código no Artigo 1.016 determina que: “Os administradores respondem solidariamente perante a sociedade e aos terceiros prejudicados, por culpa no desempenho de suas funções”. Ou seja, não é apenas no tocante a sua empresa que o empresário é o responsável. A lei brasileira o BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ responsabiliza por atos ilícitos cometidos por seus colaboradores em caso de danos a terceiros. Esta previsão legal torna imperativo que o empresário se cerque de bons técnicos a fim de se resguardar de riscos que podem destruir seu negócio, sua empresa. Na mesma seara, o Supremo Tribunal Federal consensuou sobre a responsabilidade do empresário, demonstrando que, independente de quem for a culpa dentro da empresa, o primeiro e único responsável será sempre o empresário, na Súmula 341 deste órgão: “É presumida a culpa do patrão pelo ato culposo do empregado ou preposto”. Não é admitida pelo Estado a alegação de desconhecimento ou boa-fé, sendo o empresário penalizado sem quaisquer atenuantes legais. Neste cenário tem-se um empresário, cioso de sua obra precisando delegar uma tarefa técnica a um terceiro em uma matéria que ele não domina. E nesta questão, entra a importância da delegação: Qual a gama das situações a serem delegadas? Os funcionários, o contador, o advogado, o partner, o médico, o programador, o gráfico, o motorista do próprio veículo, o porteiro, etc. Atenção ao advogado, ao contador, àquele que toma uma fatia da responsabilidade e garante resolvê-la. Muitas vezes o empresário, por ingenuidade, oferece ao outro a possibilidade de lesá-lo. E um fato no qual se tem razão – por exemplo, circunstâncias do dinheiro – é estragado por imperícia do advogado, do burocrata, do contador. Em tudo isso, o pagante, penal e civilmente, será sempre aquele que delegou. O outro jamais é uma garantia total. A gratuidade de deferência, de fé que se dá a certos órgãos ou profissões é errada, posto que um específico profissionalismo, em qualquer papel dentro dos tantos ofícios que existem no interior da globalização, não exime da responsabilidade de verificar e vigiar, posto que o jogo do dinheiro, das relações, do levar adiante um negócio implica uma clareza técnica. No final, é por meio de intuição pessoal que se deve entender se uma coisa (negócio, pessoa, etc.) é ou não é para si. O critério que permite entendê-lo é a própria identidade (MENEGHETTI, 2009b, p. 47). De acordo com Meneghetti (2009b), o assessor jurídico age como um delegado do empresário, seu cliente, em uma questão técnica. Claramente não é uma transferência de uma responsabilidade onde o que delega passa o problema adiante e não mais se responsabiliza por ele. Segundo Schutel (2008) é o contrário, pois existe uma co-participação, um coenvolvimento, uma co-responsabilidade que deve ser mantida entre as partes envolvidas. Ao assumir esta delegação, o assessor jurídico deve preservar as características do empresário, aplicando apenas a técnica, mas não esquecendo jamais que não é o protagonista e sim um suporte ao empresário que realiza seu business. Um business de sucesso passa necessariamente pelo comprometimento, competência e sintonia das pessoas envolvidas, e nisto é fundamental que a relação entre empresário e assessor jurídico seja funcional. Ainda segundo Schutel (2008), o que se espera do delegado, no caso o assessor jurídico, é que ele não projete o seu modo de pensar, mas utilize seu preparo profissional e técnica para chegar ao escopo pré-estabelecido. Segundo o entrevistado E1, para isso, deve-se compreender a intenção do líder no projeto e cuidar para não projetar o seu modo de pensar, mas com a sua condição de preparo profissional chegar ao escopo préestabelecido, aliando uma intenção única a melhor técnica. O verdadeiro líder sabe delegar e utiliza a delegação como meio de crescimento de sua obra de forma inteligente, posto que não existe crescimento concreto sem delegação. BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Bernabei (2007) trata desta questão de forma pontual e precisa, quando referese à importância da junção dos potenciais dos indivíduos que compõe o grupo de trabalho. Quanto maior for uma intuição do líder mais mãos devem existir para torná-la história. A delegação aos colaboradores atuada de modo correto é uma das passagens fundamentais para realizar a business intuition enquanto – prestando atenção e gerindo de modo correto as dinâmicas inconscientes a junção dos potenciais dos indivíduos que compõem o grupo de trabalho prevalece e, quando isso ocorre, deslocar o mundo torna-se a norma (BERNABEI, 2007, p. 110). Segundo Bernabei (2007) “são justamente os recursos humanos que fazem a diferença na competitividade e qualidade do produto e serviço da empresa” (BERNABEI, 2007, p. 95). Um assessor jurídico válido, em sintonia com o empresário traz maior competitividade à empresa. Ao entrevistar Meneghetti (2009a)1 para a elaboração deste estudo, ele aborda três princípios fundamentais ao assessor jurídico. O primeiro é a competência técnica do Direito no seu campo específico, demonstrando desta forma que esta característica é basilar para um bom profissional. Este autor também elucida que o segundo princípio é a formação que serve para a evolução de sua personalidade e inteligência. Segundo Meneghetti (2009a), nesta mesma entrevista: Se ele não faz esta formação psicológica e filosófica contínua – para si mesmo, não para os outros – corre o risco de acreditarse um grande advogado, porém não possui mais os fundamentos, não possui mais a fonte da inteligência. Isto é, a competência psicológico-filosófica serve para manter o exercício da sua inteligência, do seu 1 Informação verbal. intelecto. Se ele não faz isso, corre o risco de sentir-se potente, porque, é claro, as pessoas recorrem ao advogado somente quando têm problemas (MENEGHETTI, 2009a). Meneghetti (2009a) salienta aspectos relevantes na formação de um assessor jurídico. Além da competência, técnica, ética, etc., citada por outros empresários, ele entende ser fundamental a formação de caráter psicológico-filosófica que permitirá com que o assessor jurídico faça a evolução de sua inteligência. Entende-se que esta passagem, se realizada pelo assessor jurídico o fará superior, pois segundo Meneghetti (2009a), o grande advogado deve entender que uma coisa é ser advogado, e outra coisa é ser pessoa inteligente, interior a si mesma. E, por fim, o terceiro princípio é “conhecimento da situação real antes de aceitar a causa”. O autor ainda explicita como exercer esse princípio: O advogado deve ser sempre honesto. O que isto significa? Que ele, quando pega uma causa, deve entender bem se vale à pena ou não. (...) Portanto, o bom advogado deve entender imediatamente como as coisas estão, para não ser enganado pela mentira do cliente (MENEGHETTI, 2009a). Segundo Meneghetti (2009a), destes três princípios, tem-se a formação plena do advogado. Desta forma, a Ontopsicologia apresenta uma visão sistêmica sobre o advogado e seu papel na vida empresarial, com um papel estratégico e essencial ao sucesso do negócio. 4 Metodologia Do ponto de vista da forma de abordagem do problema, esta é uma pesquisa qualitativa, pois considera que há uma relação dinâmica entre o mundo real e BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso de métodos e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave. Do ponto de vista de seus objetivos, conforme Gil (2002) ela é uma pesquisa exploratória, pois visa proporcionar maior familiaridade com o problema com vistas a torná-lo explícito ou a construir hipóteses. Envolve levantamento bibliográfico; entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado; análise de exemplos que estimulem a compreensão. Assume, em geral, as formas de pesquisas bibliográficas e estudos de caso. Também desenvolveu-se pesquisa em referenciais bibliográficos constituído principalmente de livros, artigos de periódicos e material disponibilizado na internet. Os instrumentos de coleta de dados foram entrevista padronizada com a obtenção de informações de um entrevistado, sobre determinado assunto ou problema com um roteiro previamente estabelecido, e uma entrevista contendo uma questão tema norteadora realizada com o Acadêmico Professor Antonio Meneghetti. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa e de pesquisa de campo realizada por meio de entrevistas com dez empresários que podem ser considerados cases de sucesso. Para realizar a entrevista elaborou-se previamente um roteiro contendo nove questões. Os temas das questões das entrevistas foram assim definidos: a) identificação do tipo de assessoria jurídica que os empresários utilizam; b) momento em que o empresário utiliza-se da assessoria; c) setores da empresa que são consultados em situações de risco; d) momento em que é necessário buscar um assessor jurídico externo; e) situação em que a postura do advogado foi um catalisador para auxiliar no sucesso do negócio; f) pela sua experiência, quais características (comportamentais, personalidade, conhecimento, etc.) são importantes em um advogado no momento de dar o suporte necessário ao empresário; g) o que gera confiança ou indica confiabilidade na postura do advogado e que lhe faz resultar em um negócio bem sucedido; h) como identifica o que o advogado está orientando em relação a ser o melhor ou não para o negócio. Os entrevistados foram selecionados de acordo com seu perfil empreendedor e cases de sucesso, sendo que suas empresas têm no mínimo 15 colaboradores. As respostas trouxeram uma visão mais clara do que o empresário espera de seu assessor jurídico e qual o caminho a ser seguido para que o negócio seja bem sucedido. Dos dez empresários entrevistados, nove são do sexo masculino e um do sexo feminino. A faixa etária compreende de 32 a 52 anos de idade. Duas empresas são de sociedade anônima, e oito são sociedades limitadas. Dos dez empresários entrevistados, cinco possuem assessoria jurídica externa (50%), e os outros 50% possuem assessoria jurídica interna. Destes últimos, dois possuem advogados que atuam em todas as áreas (generalistas), três na área comercial, sendo que também possuem outras especialidades tais como administrativa, trabalhista e tributária As questões foram elaboradas a fim de conhecer as percepções dos empresários, deixando-os livres para explicar e ilustrar da melhor forma o que esperam de seu assessor jurídico. Foram agendadas entrevistas presenciais com os empresários, em locais definidos por eles. Dos dez BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ empresários entrevistados, 06 foram ouvidos em sua empresa, 02 foram ouvidos no escritório profissional da pesquisadora e 02 foram ouvidos em um hotel localizado no Distrito Recanto Maestro. As entrevistas tiveram uma duração entre 20 minutos e 1 hora, sendo que foram gravadas e transcritas integralmente, tendo informações que atendiam os objetivos da pesquisa extraída. Após, foram construídos quadros descritivos contendo trechos das respostas dos entrevistados, as quais foram agrupadas e analisadas a fim de elucidar todas as questões abordadas. De forma complementar as entrevistas, transcreveuse parte da entrevista realizada com o Acad. Prof. Antonio Meneghetti. Esta entrevista buscou evidenciar a este trabalho a sabedoria e inteligência de um grande empresário e cientista, enquanto cliente de um profissional da advocacia. Com referência a pesquisa propriamente dita, buscou-se dentre os métodos existentes os que possibilitariam extrair com maior precisão as informações elucidativas. Para Gil (2002), um bom pesquisador precisa, além do conhecimento do assunto, ter curiosidade, criatividade, integridade intelectual e sensibilidade social. São igualmente importantes características tais como a humildade para ter atitude autocorretiva, a imaginação disciplinada, a perseverança, a paciência e a confiança na experiência. Investigou-se em que momentos o empresário consulta o setor jurídico. Esta questão aborda uma situação bastante controversa na vida empresarial, pois demonstra em qual situação e fase o assessor entra no problema apresentado e consequentemente qual o seu papel. Três dos dez entrevistados (E1, E4 e E5) entendem que o assessor jurídico deve ser consultado em todas as situações, inclusive um referiu que deve participar de forma proativa e não apenas quando consultado. Um deles referiu (E2) que a assessoria jurídica é acionada apenas quando a empresa deve se relacionar com outro departamento jurídico demonstrando não querer uma atitude proativa de seu assessor. Apenas um (E9) entende que a atuação de seu assessor, no caso um estagiário de direito, não é relevante, posto que praticamente nunca o aciona. Os empresários E6 e E8 entendem que a participação do assessor jurídico se dá em determinadas situações onde existe um conflito, ou quando a diretoria entende ser necessário. A maior parte dos entrevistados consulta o assessor jurídico para a tomada de decisões, usando o aconselhamento técnico de forma funcional. Mesmo os empresários que acionam o jurídico apenas em decisões estratégicas demonstram que a opinião técnica da assessoria é necessária para o sucesso do negócio. Desta forma, para Block (1991): 5 Resultados e Discussão Ao entrevistar os empresários buscou-se entender o que eles efetivamente esperam de seu assessor jurídico e como o vêem em relação ao seu negócio e em relação ao setor jurídico interno de suas empresas, quando existente. 5.1 Consulta ao Setor Jurídico Consultor é a pessoa que está em condição de ter influência sobre um indivíduo, grupo ou organização, mas sem o poder direto para produzir mudanças ou programas de implementação (BLOCK, 1991, p. 2). Resta claro que o assessor jurídico não tem controle direto sobre a questão que orienta, entretanto, o seu papel é tornar-se disponível a quem pode alterá-la, no momento em que for consultado prestando BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ as informações técnicas ou disponibilizando as ferramentas necessárias. 5.2 Momentos de risco e a solicitação da assessoria jurídica O objetivo desta questão é entender em que momento o assessor jurídico é apresentado ao problema e qual seu grau de importância na hierarquia da empresa. Esta foi uma pergunta objetiva em que se buscou a informação da hierarquia de ordem de oitiva do jurídico interno, procurando entender em que momento o questionamento sobre o problema chega às mãos deste jurídico. Três empresários (E1, E6 e E8) responderam que o jurídico interno é o primeiro hierarquicamente na ordem de consulta, após a diretoria que avalia o risco, enquanto três empresários (E2, E4 e E9) responderam que é o segundo. Três empresários não citaram o jurídico interno em sua ordem de prioridade e um avalia esta hierarquia segundo cada situação. As respostas dadas pelos empresários demonstram que a maioria consulta o jurídico de forma prioritária buscando uma orientação sobre qual caminho é o mais adequado. A hierarquia deflagrada demonstra que o jurídico é visto de forma estratégica, posto que suas respostas direcionam as ações tomadas em situações de risco. 5.3 Jurídico externo Outro tema investigado foi em que momento o empresário sente a necessidade de uma assessoria jurídica externa e quais especialidades procura. Esta pergunta mostra o momento em que o empresário sente a necessidade da visão de um assessor jurídico especializado para o sucesso de seu negócio. Três empresários (E1, E2 e E3) entendem que a busca de um assessor externo é usual quando se faz necessário em razão de uma demanda específica. E2 ainda afirma que “o conhecimento especializado é positivo e contribui em muito para o meu negócio”. Dois empresários (E7 e E9) afirmaram não buscar especialistas jurídicos externos. Cinco (E4, E5, E6, E8, E10) empresários afirmaram buscar apenas em questões pontuais, demonstrando não ser uma prática usual na empresa, sendo que um informou recorrer apenas quando o seu jurídico interno recomendar. A especialidade do assessor jurídico permite benefícios imediatos à empresa, sendo que se corretamente aliado ao jurídico interno, pode favorecer a tão almejada blindagem de riscos. É certo, desta forma, que os profissionais que atuam na área do Direito Empresarial se colocam ao lado do comando das empresas no intuito de apresentar soluções jurídicas orientadas para a criação de valor e racionalidade nas relações comerciais, influenciando, de modo concludente, na tomada de decisões e no planejamento dos negócios. A atuação se dá no âmbito consultivo ou contencioso, sendo que se consultados no momento certo, trazem maior segurança jurídica ao negócio. 5.4 Postura do assessor jurídico Procurou-se levantar junto aos empresários uma questão até então subjetiva aos profissionais jurídicos: qual efetivamente é a postura esperada por seu cliente/o empresário? O objetivo desta questão foi entender, na visão do empresário, quando o assessor erra e quando ele acerta. Três empresários (E2, E5 e E7) não se recordaram de nenhuma situação específica na qual tenha havido erro ou acerto do assessor jurídico. Sete empresários (E1, E3, BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ E4, E6, E8, E9, E10) demonstraram saber exatamente o que, em sua opinião e vivência, faz com que a assessoria prestada por um assessor jurídico seja um sucesso ou um fracasso. Um deles (E1), foi bastante específico, alertando: “Hoje em dia, depois de uma holística funcional, isto é, uma sinergia que gera resultado, um comprometimento que é focado em dar resultado frente a um todo, que de forma holística garante a função, desenvolvida com alguns profissionais ao longo dos anos, nossos assessores sempre ajudam. Mas, a decisão final é sempre do empreendedor, o jurídico é técnico, dá as lógicas, os ângulos, mas, não são o negócio, não o vivem no dia a dia, então sempre tudo deve ser ponderado. Hoje só temos relações positivas e propositivas com nossos jurídicos, mas, no passado, por erro de contratação nossa, nem sempre foi assim. Em resumo, deve haver uma sinergia total, já que mesmo que o advogado não seja bom, é o cliente que o contratou e, portanto o contratante já errou no princípio, o advogado errado é já consequência de uma série de erros” (E1). A informação trazida por E1 traz algumas novas considerações, dentre elas, a relação hologramática entre as partes e o todo. O holismo significa que o homem é um ser indivisível, que não pode ser entendido através de uma análise separada de suas diferentes partes. Com a globalização (integração do mundo; povos e cultura) compartilhamos não somente as oportunidades que ela oferece, mas também os diversos problemas. E sua compreensão exige a aplicação da teoria sistêmica na busca de uma sabedoria sistêmica, que se pode interpretar como sendo a busca de uma visão holística. O enfoque sistêmico exige dos indivíduos uma nova forma de pensar; de que o conjunto não é mera soma de todas as partes, mas as partes compõem o todo, e é o todo que determina o comportamento das partes. A empresa ganha uma nova visão, valorizando o setor jurídico e tendo consciência que todos têm a sua importância e que todos compõem a empresa, e, ainda, que a empresa não é mera soma de departamentos, dentre os quais, o jurídico. Traz a percepção da organização como uma série de processos e atividades interligadas. Ainda, sobre as informações trazidas na resposta de E1, resta que o êxito da operação do assessor jurídico está baseado em princípios como ética, probidade e confiança gerados a partir da sinergia entre advogado e cliente, e, ainda, de um trabalho sério e dedicado desenvolvido com excelência profissional, atendimento personalizado, objetividade que permitem acesso e respostas rápidas e ágeis em qualquer situação. Entende-se que a ética significa o que o indivíduo deve ter para manter seu equilíbrio permanente entre a sua ação diária e sua vontade expressa pelos seus pensamentos; é também a sua ação e coragem de fazer uma revisão racional e crítica sobre a validez de determinadas condutas humanas e de regras estabelecidas, além de ter a capacidade de criticá-las e contribuir para alterá-las. Se o empresário erra ao escolher e manter um mau assessor jurídico, este erro vai lhe causar uma multiplicação geométrica de problemas, fazendo com que este empresário passe a investir seu tempo produtivo em resolução dos imbróglios criados. Ou seja, passa a não ser mais uma relação funcional. Por índole, pela natureza da profissão que escolheu, o profissional do direito deve ser comprometido com a verdade. Este compromisso com a verdade deve ser a base fundamental daqueles que oferecem seus serviços a terceiros. Ainda, sobre esta questão, a relação de confiança que deverá existir entre advogado e seu cliente encontrou respaldo na Constituição Federal de 1988, no seu Artigo 133, e no Artigo 26 do Código de Ética quando diz que o advogado deve BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ guardar sigilo de tudo que saiba em razão de seu ofício, podendo até mesmo escusarse em depor como testemunha em processo de pessoas que foram ou são clientes seus. Outro empresário (E9) foi bastante específico no ponto, que a seu ver, torna o advogado um fator de fracasso no negócio. ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social e a boa aplicação das leis. Meneghetti (2007) enfatiza uma reflexão sobre a importância dos especialistas que servem ao empreendedor e como fazê-los produzir da melhor forma: “...(o assessor jurídico) foi irresponsável e arrogante. A humildade em reconhecer uma deficiência é nobre e engrandece o trabalho” (E9). As pessoas de apoio são aquelas com as quais se tem uma relação de trabalho, aquelas que dão uma maior garantia ao aspecto econômico e legal. Deve-se cultivá-las, também fingindo ser segundos, de forma que elas se sintam importantes, e dêem a melhor consultoria sobre aquilo que lhes interessa (MENEGHETTI, 2007, p. 51). A arrogância é citada também por outro empresário (E6) como um fator negativo na postura do assessor jurídico. As respostas dadas pelos empresários evidenciam que eles esperam uma postura de parceria do assessor jurídico, sem qualquer traço de arrogância. Este ponto citado é fundamental e é um exemplo prático do princípio salientado por Meneghetti (2009a), quando ensina que o advogado corre o risco de acreditar-se um grande advogado sem possuir os fundamentos, a fonte de inteligência, sentindo-se potente e perdendo-se na sua arrogância. Desta feita, a despeito da formação acadêmica do bacharel em Direito, faz-se necessário repensar a postura adversarial do advogado como assessor jurídico, por imposição das mudanças que se vem operando na sociedade, a exigir a presença de novos paradigmas para reger ou compor tais relações. A função do assessor jurídico ultrapassa os limites do contrato profissional que o habilita ao exercício da defesa dos direitos e interesses do empresário. E, nesta seara ele deve saber que é apenas um instrumento técnico para que seu cliente alcance seu objetivo. Ou seja, ao ser investido no exercício profissional, o assessor jurídico assume o compromisso de exercer a advocacia com dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas profissionais e defender a Constituição, a 5.5 Características comportamentais A importância de se investigar esta questão é demonstrar quais aspectos na personalidade do assessor jurídico são importantes no suporte jurídico, pois se entende que este é um fator que pode sabotar a assessoria. Quatro dos dez empresários entrevistados (E2, E4, E8, E10) citaram a competência como característica que deve estar presentes em seu assessor jurídico. Dois (E1 e E8) mencionam a importância do assessor jurídico saber servir, sendo que um (E1) asseverou a importância do conhecimento, humildade, compreensão de que não é o protagonista do jogo. Um (E6) salientou a importância de saber atuar em equipe, sempre ouvindo o cliente. A honestidade foi citada por quatro entrevistados (E1, E2, E7 e E9) como característica fundamental. A agilidade foi citada por três entrevistados (E3, E4 e E9) de forma pontual, sempre agregada à outra característica. Pode-se concluir que a ética teve uma importância fundamental para os empresários, pois ela disciplina o comportamento do homem, quer o exterior e social, quer o íntimo e subjetivo. Prescreve deveres para realização de BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ valores. Não implica apenas em juízo de valor, mas impõe uma diretriz considerada obrigatória pela sociedade. Daí, portanto, a adoção de um ordenamento jurídico como o Código de Ética e Disciplina da O.A.B., a fim de constituir um parâmetro do qual os profissionais da área do direito devam adotar, com a finalidade de avaliar a própria conduta diante da sociedade e suas exigências morais. Este conjunto de preceitos morais deve nortear a conduta do indivíduo no ofício ou na profissão que exerce, devendo necessariamente contribuir para a formação de uma consciência profissional composta de hábitos dos quais resultem integridade e a probidade, de acordo com as regras positivadas num ordenamento jurídico. Os princípios éticos e morais são na verdade os pilares da construção de um profissional que representa o Direito Justo, distinguindo-se por seu talento e principalmente por sua moral e não pelo efeito externo que possa dar causa. Finalmente, a ética profissional, todavia, deve ser estimada e desempenhada com máxima austeridade adotando-a antes mesmo de qualquer outro código, pois a moral juntamente com a ética devem ser cultivadas para crescimento profissional e da instituição. 5.6 Postura do assessor jurídico Esta temática visou entender qual postura o empresário entende como positiva para contribuir ao sucesso do negócio. Este elemento elucida um tema importante sobre o assessor jurídico que não é usualmente citado: a sua postura. Normalmente os estudos versam sobre a questão técnica, deixando a margem um ponto que é essencial para um negócio bem sucedido. Quatro dos dez empresários entrevistados (E1, E4, E5 e E10) citam a ética como característica fundamental para a postura de seu assessor jurídico. Sete empresários entrevistados (E1, E2, E3, E4, E6, E7, E8) entendem que a postura do advogado deve vir sempre ao lado do entendimento do seu cliente. O assessor jurídico, é sabido, é o primeiro Juiz da causa. É seu dever avaliar e avisar ao cliente os riscos da sua pretensão. Para os operadores de direito, ética envolve diretrizes de conduta profissional, um conjunto de regras que regulam a atividade jurisdicional, objetivando a boa prática da função, bem como a preservação da imagem do próprio profissional e de sua categoria. É um tipo específico de avaliação ou orientação da prática jurídica que se encontra paralelo à orientação determinada pelas normas processuais e pelas normas objetivas de Direito, e para a qual também se pode conceber certa forma jurídica de codificação - códigos de ética, e também certa forma de sanção - tribunais de ética. A ética jurídica é, portanto, criada a partir da prática profissional do Direito. Resume-se o que Acquaviva (2002) afirma sobre o conceito de ética: a) a ética observa o comportamento humano e aponta seus erros e desvios; b) formula os princípios básicos a que deve subordinar-se a conduta do homem; c) a par de valores genéricos e estáveis, a Ética é ajustável a cada época e circunstância. 5.7 Identificação do empresário quanto à orientação dada Outra questão importante na assessoria jurídica é saber se o profissional está de fato prestando um bom serviço ao empresário. Assim, buscou-se compreender junto aos empresários investigados como percebem se quando recebem a orientação de seu assessor jurídico ela o auxilia em seu negócio. BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Esta pergunta visou entender o que o empresário sente no momento em que o assessor jurídico dá sua orientação - o que sente, qual sua percepção? Três empresários (E4, E6 e E10) não souberem dizer, se abstendo de responder. Quatro empresários (E1, E5, E7 e E8) citaram que têm uma sensação de tranquilidade quando recebem uma orientação correta do assessor jurídico. Um (E2) citou a sensação confortável, que parece se assemelhar muito à sensação de tranquilidade. Este questionamento visou identificar a percepção do empresário ao receber uma orientação, o que ele sente/percebe, e se costuma seguir esta primeira percepção. A maioria dos empresários informou percepções como tranquilidade, sensação confortável, denotando que a orientação do assessor jurídico pode ter um resultado subjetivo e altamente determinante. Para Meneghetti (2007, p. 19) “a intuição é a obra-prima, a iluminação, a perfomance da inteligência humana em situação histórica”. O homem precisa isolar esta percepção, esta intuição e usá-la como um vetor para lhe mostrar o melhor caminho a ser tomado. Aprender a ouvir, a entender, a perceber leva o empresário a repetir ações de sucesso. Da mesma forma, aprende o estilo dos erros, e o mais importante, como superá-los e identificá-los quando se repetem, evitando-os futuramente. 6 Considerações Finais Neste estudo buscou-se entender o que o empresário realmente espera de seu assessor jurídico enquanto suporte para o sucesso de seu negócio. Uma das preocupações iniciais consistia na falta de sinergia na relação entre o assessor jurídico e o empresário e como este fato pode acarretar falhas, inconsistências e até mesmo fazer com que o empresário assuma riscos desnecessários no crucial processo de tomada de decisões de uma empresa. O Artigo 133 da Constituição Federal Brasileira proclama que o advogado é indispensável à administração da justiça. E, analisando a fundo a atividade deste profissional, observa-se sua importância fundamental para a implementação e o exercício pleno da cidadania. O mercado de consultoria jurídica hoje no Brasil mostra-se promissor para um perfil de consultor ético, especialista, proativo e com uma bagagem cultural sólida. É fato que existem muitas empresas que necessitam de mudanças para adequação competitiva, principalmente no que se refere ao fato de as mesmas estarem perdendo o foco do negócio pela derrocada de concorrência e por haver necessidade de constante adequação tecnológica e avaliação de riscos. Conclui-se, pelo papel do advogado na história, pela evolução do mundo globalizado e pelas respostas dadas pelos empresários entrevistados que há espaço para um assessor jurídico de trajetória. Primeiramente graduado e com pelo menos uma especialização, com habilidade de interrelacionamento com as várias áreas empresariais, o que também aumenta seu leque de opções de prestação de serviço. É um profissional comprometido, ético, com visão holística e, ainda, com uma visão estratégica para gerir seus produtos, trazendo consigo a bagagem de experiências no mercado na área escolhida, sejam advindas de trabalho em empresas como funcionário, sejam advindas de projetos bem sucedidos de assessoria. Foi citado também, por Meneghetti (2009a) os aspectos relevantes na formação de um assessor jurídico. Verificou-se como fundamental a formação de caráter psicológico-filosófica que fará com que o assessor jurídico faça sua evolução de BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ inteligência. Esta passagem, se realizada pelo assessor jurídico o fará superior, interior a si mesmo. Para isto há uma escalada que envolve formação acadêmica, experiência de mercado, maturidade para relacionamento e muito comprometimento e a postura ética será a orientação para a consolidação de imagem e respeito. Fundamental é o autoconhecimento, a autenticidade do profissional jurídico, caso contrário, ele mesmo é o primeiro a viver com medo da lei, e transmite essa informação nos seus contatos com empresários. Referências ACQUAVIVA, M. C. Notas introdutórias à Ética Jurídica. São Paulo: Desafio Cultural, 2002. BERNABEI, P. Problemáticas, análises e diretivas no processo de colaboração do líder. In: MENEGHETTI, A. Business Intuition. São Paulo: Foil, 2007. BLOCK, P. Consultoria: o desafio da liberdade. São Paulo: Makron, 1991. GARRIDO, M. J. G. Derecho privado romano. Madri: Dykinson, 2000. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002. GILISSEN, J. Introdução histórica ao Direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. GROCCO, L.; GUTTMANN, E. Consultoria empresarial. São Paulo: Saraiva, 2005. GROSSO, T. Os critérios da justiça social nas democracias contemporâneas. Revista Nova Ontopsicologia, n. 2, Recanto Maestro, p. 24-29, dez. 2006. KUBR, M. Consultoria: um guia para a profissão. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. LOPES, R. K. O Princípio do devido processo legal. In: Informativo adv 02/07. MENEGHETTI, A. Atos do congresso Business Intuition. São Paulo: Foil, 2007. MENEGHETTI, A. Psicologia da Organização. São Paulo: Foil, 2009b. MENEGHETTI, A. Entrevista concedida pelo autor com exclusividade em data de 19 dezembro de 2009a, a Letícia Batistela. Gravada, transcrita e traduzida. Informação verbal. MOCSÁNYI, D. C. Assessoria: o caminho das pedras. Trabalhando na “era do não emprego”. São Paulo: Central de Negócios em RH Editora e Marketing, 2003. PETIT, E. Tratado elemental de derecho romano. México: Porrua, 2002. SCHUTEL, S. O conhecimento do ser humano como premissa no processo de delegação. Artigo em versão inicial de pesquisa utilizado exclusivamente para fins didáticos, 2008. Autores: Letícia Batistela: advogada, especialista em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Soraia Schutel: administradora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti (AMF), Mestre em Administração (UFSM), doutoranda em Administração (UFRGS). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 20/12/2010. BATISTELA, Letícia; SCHUTEL, Soraia. A função do assessor jurídico para sucesso na tomada de decisão do empresário. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 34-51, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Estratégia empresarial: planejamento e implementação Maria Alice Schuch Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Vera Lúcia Rodegheri Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) [email protected] Resumo: A pesquisa tem como objetivo investigar a visão de empresários sobre a implementação do planejamento estratégico, sendo este um constante desafio na realidade das organizações. Por meio do estudo etimológico e linguístico da palavra “estratégia” e de alguns teóricos da área, analisa-se os principais modelos utilizados em sua elaboração e práxis nas empresas. Este trabalho traz indicativos sobre os principais problemas decorrentes da implementação dessa estratégia, que, conforme a literatura e a prática de empresários impedem a consecução dos objetivos. A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas com cinco empresários que adotaram esta ferramenta de gestão a partir da metodologia FOIL. Conclui o estudo que a metodologia FOIL seria uma proposta a ser considerada para que seja possível atingir um maior sucesso na execução do planejamento estratégico. Palavras-chave: estratégia; planejamento; implementação; líder; sucesso. Abstract: The research aims to investigate the vision of entrepreneurs on the implementation of strategic planning, which is a constant challenge in the reality of organizations. Through etymological and linguistic study of the word “strategy” and some theorists in the field, examines the main models used in their preparation and practice on companies. This work provides indications about the main problems of implementing this strategy, which, according to the literature and practice of business, impede the achievement of goals. The information was collected through interviews with five leaders that have adopted this management tool from the FOIL method. The study concludes that the methodology would be a FOIL proposal to be considered so that you can achieve greater success in implementing strategic planning. Keywords: strategy; planning; implementation; leader; success. * Texto publicado nos Anais do VII Convibra – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – 19 a 21/11/2010. 1 Introdução Nas últimas décadas tem-se constatado o crescente desenvolvimento e a evolução da área de estudo em estratégia empresarial, em especial, o planejamento estratégico. Existe uma vasta bibliografia sobre planejamento estratégico, apresentada por diversos autores, como Kaplan (2008), Fischmann e Almeida (2009), Porter (1986), sendo que esses autores sugerem diferentes modelos de como elaborar um planejamento estratégico. Porém, tais propostas apresentadas por esses, como Kaplan e Norton, além de outros, como Price Waterhouse (1997) e Grouard e Menson (2001), raras vezes elaboram, de SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. 52 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ maneira pontual, um dos elementos mais importantes em estratégia: sua implementação. Kaplan e Norton (2008) escrevem que: Segundo uma pesquisa global feita em 2006, The Monitor Group interrogou altos executivos sobre suas prioridades. A prioridade número um, por ampla margem, foi a execução da estratégia (KAPLAN e NORTON, 2008, p. 3). O Conference Board, ainda segundo esses autores, em sua pesquisa de 2007, relatou que, para os executivos, o mais importante era a “excelência na execução”. A atribuição de alta prioridade à eficácia na execução da estratégia pode ser atribuída à gravidade dos problemas, os quais se encontram documentados e com os quais se defrontam as empresas na tentativa de executar a estratégia. Afirmam também que várias pesquisas, realizadas ao longo das últimas décadas, indicam que 60% a 80% das empresas ficam muito longe de alcançar os objetivos definidos em seus planos estratégicos. Uma vez que o planejamento estratégico e, em sua decorrência, a gestão estratégica é um processo dinâmico para se chegar ao futuro pretendido, o presente artigo parte da seguinte questão de pesquisa: O que representa para o líder a elaboração e a implementação do planejamento estratégico em sua empresa, e qual é a razão pela qual, segundo a pesquisa supracitada, 60% a 80% das organizações não alcançam os objetivos definidos em seus planos estratégicos? A pesquisa visa explicitar a compreensão de cinco empresários que utilizam o planejamento estratégico a partir da metodologia FOIL sobre: como avaliam a responsabilidade pessoal no andamento da empresa, qual a importância que atribuem para a própria intuição, qual sua posição com relação ao emprego das ferramentas de gestão, qual a relevância destas e, finalmente, por que os objetivos traçados nos planejamentos estratégicos muitas vezes não são alcançados. Para isso, foram feitas entrevistas direcionadas aos líderes dessas empresas. Neste sentido, este estudo busca por meio da literatura e das entrevistas apontar algumas alternativas de solução da problemática de transformar este instrumento de gestão em resultado efetivo na empresa. 2 Fundamentação Teórica 2.1 Estratégia Segundo Ferreira (1999, p. 841), etimologicamente, o termo estratégia deriva do grego strategía e do latim strategia. De acordo com o autor, significava a arte militar de planejar e executar movimentos e operações de tropas, visando alcançar ou manter posições relativas e potenciais bélicos favoráveis a futuras ações táticas sobre determinados objetivos. Já o termo estratégico, derivado da palavra grega strategikós, que significava ponto onde há ardil: ardiloso, manhoso, astucioso. Estratego, derivado do grego strategós e do latim strategu, significava general superior, ou generalíssimo, na Grécia antiga. Então, diz-se que uma pessoa é um estrategista quando ela sabe estratégia. Deste modo, este termo remete ao líder. Pode-se discorrer, sobre o termo líder, ao citar Maquiavel (2008): Um príncipe cuja capacidade militar não sobressai, além dos já referidos dissabores, não poderá incutir respeito aos seus soldados, nem, emprestar-lhes a sua confiança. Sendo assim, o príncipe, jamais deverá desviar as suas atenções destes exercícios militares, e na paz terá de exercitar-se ainda mais que na guerra (MAQUIAVEL, 2008, p. 70). Diz o Antigo Testamento que, quando David foi à presença de Saul, com a finalidade de oferecer-se para lutar contra Golias, Saul, na intenção de encorajá-lo, SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ deu-lhe sua própria armadura. David, após tê-la vestido, recusou-se a usá-la, alegando que com ela não poderia valer-se de suas próprias forças, preferindo ir de encontro ao seu inimigo armado com as suas próprias armas: a funda e a faca. A armadura do outro ou cairá dos seus ombros ou o comprimirá: o líder é só nas suas batalhas. Segundo Lunks (2008), para entender a evolução do pensamento estratégico empresarial, faz-se necessário analisar seu ponto de partida, as estratégias militares. O termo estratégia foi usado largamente pelos exércitos para determinar as ações ofensivas, com o único propósito de alcançar vitória sobre o inimigo. Ainda, segundo esse autor, somente na segunda metade do século XIX, após a Segunda Revolução Industrial, é que essa palavra começou a ser adaptada ao contexto dos negócios com o intuito de criar uma vantagem competitiva sustentável. Nos anos subsequentes a 1970, idade de ouro da estratégia empresarial, ocorre uma proliferação de conceitos, de escolas de administração, de empresas de consultoria empresarial estratégica, o que refletia já uma crescente aceitação da teoria do planejamento estratégico. 2.2 Planejamento estratégico: conceitos É necessária a apresentação de conceitos do que pode vir a se constituir um planejamento estratégico, afinal, é a partir dessa necessidade que serão definidos os objetivos da empresa a curto, médio e longo prazos para se atingir o escopo selecionado. Para Ansoff (1981), o processo de planejamento estratégico é definido como a análise racional das oportunidades oferecidas pelo meio, dos pontos fortes e fracos das empresas e da escolha de um modo de compatibilização (estratégia) entre os dois extremos. Compatibilização esta que deveria satisfazer do melhor modo possível os objetivos da empresa. O planejamento estratégico, para Vasconcelos Filho (1992), é uma metodologia de pensamento participativo utilizada para determinar a direção que a organização irá seguir por meio da descoberta de objetivos válidos e nãosubjetivos. Segundo Catelli (1999), planejamento estratégico é o momento em que os cenários futuros são antecipados, e oportunidades e ameaças são identificadas. Segundo Cotterman e Wilber (2000), o planejamento estratégico responde a seis perguntas: Onde estamos? Onde queremos ir? Como chegaremos lá? Quando deveremos estar lá? Quem nos ajudará a chegar lá? Como medimos e avaliamos o progresso do plano? Para Rosa (2001), o planejamento estratégico é utilizado para a tomada de decisões e estas servirão para definir o rumo que a organização deverá seguir. Essa ferramenta fornece o rumo e a direção geral dos esforços e dos recursos da empresa. O planejamento cria compromisso de execução e dá o instrumental para cobrança. Na concepção de Valadares (2002), o planejamento estratégico é considerado uma ferramenta moderna de gestão empresarial que, baseando-se em conceitos e atitudes nas quais a empresa acredita, torna o ato de planejar uma forma inteligente de escolher uma sequência de ações futuras para a empresa, na procura de seus objetivos maiores. Com o planejamento estratégico pretende-se não adivinhar o futuro, mas construí-lo, evitando ao máximo as surpresas, racionalizando o processo de tomada de decisão e garantindo o sucesso da empresa em seu ambiente futuro, é o que afirma Sampaio (2002). O planejamento estratégico é um processo dinâmico e flexível para incorporar as mudanças do ambiente. SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Para Fischmann e Almeida (2009): Planejamento estratégico é uma técnica administrativa que, através da análise do ambiente de uma organização, cria a consciência das suas oportunidades e ameaças, dos seus pontos fortes e fracos para o cumprimento da sua missão e, através desta consciência, estabelece o propósito de direção que a organização deverá seguir para aproveitar as oportunidades e evitar ameaças (FISHMANN e ALMEIDA, 2009, p. 25). Ou seja, para esses autores, é a partir da tomada de consciência sobre a situação atual da empresa e do meio onde ela se encontra que se pode direcionar as ações para garantir o fortalecimento e o crescimento da mesma. 2.3 Relevância do planejamento estratégico na prática Na abordagem de Hayes (1996), quando se fala em planejamento, o maior problema das empresas não é definir o que é planejamento estratégico, nem a existência de um planejamento formal, mas a forma de como ele será implementado. Fischmann e Almeida (2009) procuram mostrar a necessidade do planejamento estratégico como uma ajuda para o administrador, não só na decisão do rumo a tomar, como também na atitude de fazer com que essa decisão seja seguida. Segundo os autores, retorna o sentido etimológico da palavra estratégia e o conjunto de técnicas administrativas (planejamento estratégico), as quais estão intrinsecamente ligadas ao planejamento das guerras, realizado pelos líderes políticos e militares competentes. Segundo os autores referidos anteriormente, na administração das organizações podemos distinguir três níveis com características distintas, a saber: o estratégico, que dá a direção à organização, adaptando-a ao seu meio ambiente; o administrativo, que cuida do relacionamento e integração interna da organização; e o operacional, que cuida das operações. Hammer (citado por KAPLAN e NORTON, 2008, p. 1), o líder visionário da reengenharia e da gestão de processos, afirma que “os processos operacionais de alto desempenho são necessários, mas não são suficientes para o sucesso das empresas”. Por isso, a ciência da Administração tem desenvolvido inúmeras técnicas com relação aos dois últimos níveis. No entanto, só recentemente tem merecido atenção necessária aquilo que se refere ao primeiro nível ou à Direção e Conselho Administrativo, ou seja, a estratégia propriamente dita ou o caminho a seguir. A divisão das atividades do planejamento estratégico, assim como sua implementação em etapas, tem relevância didática tanto para o entendimento do processo quanto para o fácil cumprimento e acompanhamento do cronograma estabelecido. Porém, essas etapas são flexíveis, pois as atividades de um plano estratégico variam conforme o tipo e tamanho da empresa, sendo necessária a definição de quem (who) executa, de quem coordena e também de quem aprova essas atividades. Já a administração estratégica é o processo de tornar a organização capaz de integrar as decisões administrativas e operacionais com as estratégias estabelecidas, procurando dar, ao mesmo tempo, maior eficiência e melhor eficácia à organização. Assim, para propiciar a implementação do plano estratégico podem ser estabelecidas regras. Além disso, a administração estratégica implica uma mudança de atitude das pessoas envolvidas no processo do planejamento estratégico relativa a três elementos: o cognitivo, o afetivo e o comportamental. A mudança de atitude, segundo Fischmann e Almeida (2009): SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Deve iniciar pela cúpula, sendo necessária a ela a preocupação da capacitação da empresa para que seja possível mudar a atitude das pessoas de decisão. Por esse motivo, revela-se delicadíssima a avaliação das aspirações tanto dos proprietários como dos funcionários na realização de um plano estratégico. Faz-se necessário ter o cuidado de verificar pontos concretos para não criar falsas expectativas (FISHMANN e ALMEIDA, 2009, p. 70). Ainda, para esses autores, as resistências ao planejamento estratégico ocorrem por três motivos, assim apresentados: o desconhecimento das teorias, a falta de tempo e a perda de autonomia. Neste sentido, o planejamento estratégico não é uma atividade da área de finanças ou marketing, mas sempre uma relação funcional com o presidente da empresa. 3 Modelos de planejamento estratégico As transformações constantes da economia globalizada levam os estudiosos da gestão empresarial a se lançarem em uma pesquisa de novos modelos em busca de soluções eficazes para seus clientes. Entre os modelos sugeridos, citam-se o da Equipe da Price Waterhouse (1997), o de Grouard e Meston (2001), Modelo de Sistema Gerencial: Planejamento Estratégico e Execução Operacional de Kaplan e Norton e a proposta da FOIL, Formação Ontopsicológica Interdisciplinar Liderística (2003). O primeiro que se traz à análise é o Modelo Price Waterhouse (1997, 1998). Esse modelo sugere quinze princípios básicos que podem servir de guia para a mudança organizacional. Os princípios básicos a serem seguidos para que as mudanças sejam efetivadas são: enfrentar a realidade, o que deve ser revisto permanentemente; concentrar-se em contextos estratégicos, objetivando onde o retorno é maior; agir com autoridade, pois o que sustenta a mudança é a autoridade, porém endossada pela voz do cliente; definir o escopo com inteligência, concentrando esforços nos setores mais importantes da organização; preparar o terreno para a mudança, trabalhando sempre para se obter o consenso; deixar o cliente conduzir a mudança, pois se deve considerá-lo um aliado nesse processo; conhecer seus stakeholders, compreendendo e priorizando as suas necessidades e os seus motivos, pois são partes interessadas ou intervenientes; comunicar-se sempre, visando, pela clareza e pela concisão, a compreensão das mudanças; redefinir o sistema de indicadores, para ser possível avaliar a implementação da mudança; utilizar todas as alavancas da mudança, de forma coordenada, envolvendo mercados, clientes, ofertas de produtos, serviços, entre outros; pensar grande, a partir do líder, para que a equipe também assim o faça, implementando inovações positivas na organização; alavancar a diversidade, como fontes inovadoras; desenvolver habilidades, investindo no capital humano, para se obter competência técnica na solução de problemas; além de planejar, detalhadamente o plano de ação, mudança nos processos, nos sistemas, nos treinamentos; e, por fim, integrar as iniciativas. É importante destacar, nesse modelo, o princípio do agir com autoridade, em que a mudança deva ser sustentada por uma gestão forte, pois a responsabilidade é da alta administração, e o pensar grande, pois essa atitude provém do líder, e é dele que deve partir o trabalho de persuasão para que a equipe também tenha ações e inovações positivas na empresa. O segundo modelo, é o Modelo de Grouard e Meston (2001), o qual se estrutura em dez chaves da mudança organizacional. Para esses autores, a SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ liderança é a essência das mudanças bem sucedidas, e a mudança organizacional é parte integrante das atividades nas empresas, envolvendo dez chaves que consideram o caminho para o sucesso da implementação de processos administrativos como o planejamento estratégico. Esse modelo apresenta as seguintes chaves da mudança organizacional: definição da visão, o que estimula e justifica a mudança; mobilização, o que dá início ao processo real de mudança, criando sua dinâmica; catalisação, o processo que institui uma organização que vai gerenciar e estimular as mudanças; direção, que mantém o processo no caminho certo; realização, a execução do processo de mudança, o movimento de transição; obtenção da participação, ou seja, a administração da dimensão emocional, que visa a encontrar uma solução para as resistências à mudança; administração das questões de poder, objetivando a conciliação; além do treinamento e supervisão e da comunicação ativa. Esse modelo enfatiza que o sucesso e a durabilidade das mudanças realizadas dependem do aproveitamento de todas as ideias e iniciativas das pessoas que compõem a organização. Porém, para que isso seja possível, é prioritária a ação do líder. O terceiro modelo a ser relacionado é o Modelo Kaplan e Norton (2009). Esse modelo estabelece vínculo entre a Estratégia e a Operação. Segundo os autores, o desenvolvimento da estratégia e a ligação entre estratégia e operação, ainda hoje, permanecem isolados, não padronizados e fragmentados, e os gestores se defrontam com a questão de como conseguir que os recursos do planejamento estratégico e de melhorias operacionais trabalhem juntos. Permanece, então, o orçamento financeiro como única característica comum ou como ferramenta de coordenação, previsão e avaliação de desempenho das empresas. Sistema gerencial para a integração de planejamento estratégico e execução operacional – sistema de seis estágios de Kaplan e Norton: Esse sistema preconiza que, no estágio 1 os gestores desenvolvam a estratégia, usando ferramentas estratégicas; no estágio 2 a organização passa a planejar a estratégia, com base em ferramentas, como mapas estratégicos e Balance Scorecards; no estágio 3 os gestores alinham a organização com a estratégia, por meio de desdobramentos com mapas estratégicos e Balance Scorecards interligados para as unidades organizacionais. Também alinham os empregados, por meio de processo de comunicação formal, e vinculam os objetivos e incentivos de cada empregado aos objetivos estratégicos. No estágio 4, depois de alinhadas as unidades organizacionais e os empregados à estratégia, os gestores podem planejar as operações, usando métodos como gestão da qualidade e dos processos, reengenharia, dashboards, Rolling forecasts (previsões rotativas), custeio baseado em atividades, planejamento da capacidade dos recursos e orçamento dinâmico. No estágio 5, à medida em que executa a estratégia e os planos operacionais, a empresa monitora e aprende sobre problemas, barreiras e desafios. Esse processo integra informações sobre operações e estratégia por meio de um sistema de reuniões de análise da gestão. E, no estágio 6 os gestores usam dados operacionais internos e novas informações sobre o ambiente externo e sobre os concorrentes, para testar e adaptar a hipótese estratégica, lançando outro loop em torno do sistema integrado de planejamento estratégico e execução operacional. Kaplan e Norton (2009) afirmam que, embora não seja explícita em nenhum dos seis estágios da gestão estratégica SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ citada anteriormente, a liderança executiva permeia todas as fases do sistema gerencial. Segundo os autores, a liderança é tão importante para o sistema de gestão da estratégia que pode ser considerada, ao mesmo tempo, necessária e suficiente. Afirmam, com base em sua experiência com mais de uma centena de empresas em todo o mundo, tratar-se de condição necessária, pois nenhuma organização que alcançou sucesso com o sistema de gestão da estratégia tinha um líder ausente ou passivo. Segundo Fischmann e Almeida (2009): Quando McNamara introduziu o planejamento estratégico no Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América, esse somente funcionou pela sua autoridade, pois, quando ele foi afastado do Departamento, o planejamento estratégico caiu em desuso (FISHMANN e ALMEIDA, 2009, p. 121). Porter (1986) escreveu que: Um líder forte do mercado ou um pequeno grupo de líderes é capaz, frequentemente, de comandar uma expansão ordenada através de seus pronunciamentos e atitudes (PORTER, 1986, p. 306). Na posição desses autores, há consenso sobre a importância do líder, seja como condição necessária para a execução do planejamento estratégico, seja pela autoridade que representa no processo ou pela importância de seu posicionamento. 3.1 Modelo FOIL: Formação Ontopsicológica Interdisciplinar Liderística A FOIL, segundo Bernabei (2007), é uma das aplicações práticas da teoria e metodologia da Ontopsicologia, feita em âmbito econômico e sua fundação teve como objetivo dar ordem à aplicação da Ciência Ontopsicológica no campo da economia, sendo que o eixo sobre o qual gira toda a consultoria é o processo da autenticação do líder. A FOIL, em Berlim, Alemanha, em outubro de 2006, durante a Neuro Psyco Economics Conference: “Human behavior in economics decisions. Perspectives of marketing, behavioral finance, and organizational decision making”, promoveu palestras sobre o tema Business Intuition. Esta conferência uniu especialistas em economia, gestão, psicologia e neurologia em torno de quatro temas fundamentais: marketing, finançacomportamental, ciência da organização e tomada de decisões. É importante destacar que para a Metodologia FOIL não existe um modelo de administração fixo; existe, outrossim, um líder que, mantendo a racionalidade sobre a sua intuição, determina os resultados evolutivos da própria empresa. Nesse evento, segundo o Acadêmico Professor Antonio Meneghetti, Presidente da FOIL, pode-se discutir economia e liderança de todos os modos, mas se não se considera a realidade inconsciente, continua-se a analisar sempre somente 20% do fato econômico e, de tal modo, o conhecimento do mesmo será parcial ou errôneo. Segundo Meneghetti (2006), mesmo que se acredite estar analisando o fato econômico na sua totalidade, 80% sempre permanecerá desconhecido, mas constantemente operativo em desvantagem do empresário, uma vez que este não tem controle consciente. A FOIL sustenta que os modelos, programas, planejamentos e estudos podem ser bons, mas o erro está na consciência do sujeito. Toda formação é autoconstrução, mas, depois, a consciência deve saber usar todos estes instrumentos: a real estratégia é conduzir o líder à própria intuição. Característico do Método FOIL é favorecer e identificar a intuição do líder e, também, nela atuar. Ou seja, através de instrumentos SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ próprios, objetiva conduzir o líder à própria intuição de modo consciente e, ainda, auxiliá-lo a manter a racionalidade sobre ela em ação histórica empresarial, social, política, familiar. Ao pensar em termos de “consciência”, reporta-se à teoria freudiana (FREUD, 1996): Na qual o inconsciente, entendido como substantivo, é a parte do psiquismo latente, feita de desejos e de processos psicológicos dinâmicos, de que não se pode dispor, pois foge do conhecimento. Recalcadas fora do campo da consciência por uma potência de controle ético ou censura, as forças inconscientes conseguem, no entanto, manifestar-se em certos atos da vida cotidiana através de lapsos, esquecimentos, nos sonhos e nos sintomas neuróticos (FREUD, 1996, p. 60). No inconsciente, ainda segundo Freud (1996), está o substrato da vida psíquica, nascem os desejos e os fantasmas, e organizam-se os vínculos inter-humanos e as condutas. Porém, para compreender a inteligência inconsciente, segundo Meneghetti (2006), é preciso conhecer o primeiro e fundamental mover-se do homem, isto é, como a atividade psíquica formaliza a si mesma e qual é a radicalidade da atividade psíquica. Então, pode-se entender em que direção está se movendo esta inteligência e quais efeitos ela está formalizando. Nesse sentido, pergunta-se: quantos conhecem a ação do inconsciente – o reservatório de todas as informações não metabolizadas que chegam até nós do ambiente e das remoções? E, ainda: da linguagem do inconsciente feita de flashes, imagens, sonhos, sensações, percepções, quantos possuem o código de interpretação reversível com a realidade? Meneghetti (2001) esclarece que: O inconsciente é intuição, percepção extrasensorial, espiritual, lógica intelectiva; é o quântico de vida psíquico e somático que o indivíduo é, mas do qual não é consciente e que age, de qualquer modo, além da lógica consciente (MENEGHETTI, 2001, p. 84). Dada esta realidade do inconsciente ou ignorância do homem a respeito de si mesmo, Meneghetti (2001) diz que: Para alcançar a realidade acerca de si mesmo, é necessária uma psicoterapia de autenticação, análise que consente ao sujeito recuperar, em total consciência, o quântico de inteligência que é (MENEGHETTI, 2001, p. 85). Encontra-se nos Atos do Congresso Business Intuition, citado por Bernabei (2007) que: É sabido que a intuição no business é um fio seguro do sucesso. A FOIL possui, exatamente, o ordinário conhecimento sobre o íntimo processo daquela intuition que ao final resulta o ponto mediador, de convergência, de equilíbrio de mais referências racionais àquele escopo que permanece familiar se, junto à performance didático-managerial, didáticoadministrativa, didático-experiencial da economia centrada, se sincretizam as três fundamentais descobertas da Ciência Ontopsicológica: Em Si ôntico, campo semântico e monitor de deflexão; então, a Business Intuition é ordinária amiga de casa (BERNABEI citado por MENEGHETTI, 2007, p. 103). A Ontopsicologia é uma ciência que justifica a própria diversidade das outras ciências com base em algumas inovações prioritárias e exclusivas. Essa, de fato, descobriu três realidades cardeais para compreender a existência humana, sobre as quais funda a própria teoria e práxis: 1) Em Si ôntico ou essência virtual e formal, é a radicalidade da atividade psíquica, o projeto de natureza que constitui o ser humano. A Ontopsicologia individuou o critério primeiro e elementar da unidade de ação homem e o denominou Em Si ôntico, ou seja: principio formal inteligente que faz SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ autóctise histórica (MENEGHETTI, 2008, p. 7); 2) Campo semântico ou transferência é a comunicação-base dos comportamentos energéticos das individuações. É o conhecimento dos processos fenomênicos da nossa existência: ação e reação (MENEGHETTI, 2009, p. 288); 3) Monitor de deflexão ou distorção é um mecanismo que interfere na exatidão dos processos cognitivos e voluntarísticos, determinando toda a fenomenologia regressiva conhecida pelo homem como doença, dor, angústia, falência. É um automático estabilizador de estereótipos (MENEGHETTI, 2009, p. 288). A Formação Ontopsicológica Interdisciplinar Liderística (FOIL), segundo Bernabei (2007), coloca-se em uma ótica completamente diversa de todos aqueles que falam de intuição. Para isso, afirma que: …primeiro, autentiquemos o homem; depois, o seu agir segundo a própria intuição é consequência direta dessa autenticação. Para a FOIL, a intuição é algo que normal e constantemente se dá no ser humano. A formação FOIL tem por objetivo tornar o Eu consciência transparente, para que este simplesmente seja capaz de ler a intuição (BERNABEI, 2007, p. 93). Na posição da FOIL há consenso sobre a importância do líder, porém acrescenta que é necessária a sua autenticidade, a exatidão da sua consciência para que seja capaz, em um segundo momento, de escolher o instrumento útil e funcional para buscar racionalmente a consecução de suas metas. Com relação a todas as correntes do pensamento, a ótica da FOIL desloca-se decididamente, uma vez que o objetivo não é compreender como funciona a intuição, mas aquele de ir à raiz do problema, afirmando que não faz sentido falar de formar, colher ou exercitar a intuição: faz sentido formar (ou melhor, recuperar) o “instrumento” por meio do qual a intuição se explicita e realiza. (...) enquanto não se dá uma consciência transparente, a intuição permanece apenas uma hipótese... (BERNABEI, 2007, p. 93). A FOIL entra na raiz, no fundamento de como se dá a intuição no líder, enquanto ser humano dotado da capacidade de conhecer. Uma vez identificado o que é o processo intuitivo, disponibiliza um método, comprovadamente eficaz, para auxiliar a consciência do empreendedor no reconhecimento e execução da intuição. 3.2 Planejamento implementação hoje estratégico e Em Editorial da Revista HSM Management (2009) e em entrevistas de Marcos Braga, Philip Kotler, Sydney Finkelstein e Ikujiro Nonaka concedidas à citada Revista, pode-se perceber, mais uma vez, que, na conjuntura atual, de globalização, sente-se mais veementemente a importância do estratego. Marcos Braga escreve na referida Revista (2009), em seu editorial, “O pneu certo e a antropofagia”, o seguinte: Pare e pense por um instante: uma corrida de fórmula 1 começa com a pista seca, o sol brilhando entre as nuvens. De repente chove a cântaros e os carros passam a rodar em asfalto molhado, às vezes encharcado. É assim que imaginamos a “nova modalidade do caos”, assunto da capa desta edição de HSM Management, em que boom e recessão se revezam com a mesma naturalidade que as pistas, seca e molhada na categoria máxima do automobilismo. Só que no lugar dos carros, estão empresas e, no lugar dos pilotos, líderes. Sou capaz de apostar que, da mesma maneira que na fórmula 1 vence sempre quem escolheu o pneu certo para o tipo de pista que prevalece na prova, no mundo dos negócios a vitória será de quem se adaptar mais rapidamente ao “mood” econômico do momento (BRAGA, 2009, p. 6). SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Assim, Braga associa o mundo de incertezas do business com as vicissitudes de uma corrida de fórmula 1, pois, vence na economia quem tem a capacidade e agilidade para reconhecer os instrumentos certos e detém o conhecimento para usá-los no momento preciso. Por sua vez, Philip Kotler, em entrevista à HSM Management (2009), afirma que: O sistema gestão do caos, por ele desenvolvido, é capaz de responder, de modo adequado, à realidade atual, marcada por sobressaltos da economia e dos mercados. Segundo o autor, a partir de agora, as empresas terão de instalar um sistema de alerta vermelho permanente, ou melhor, precisarão abandonar a sensação de segurança que haviam construído com políticas, estratégias e táticas resultantes de anos de tentativa e erro. Precisam aceitar que no contexto atual surgiu um ponto de inflexão estratégica gigantesca (KOTLER, 2009, p. 117). Constata-se que, na visão desse teórico, com a transformação da realidade econômica mundial, também houve uma tentativa de adaptação a ela, já que os paradigmas não são mais os mesmos. O recente livro de Kotler (2009), escrito em parceria com John A. Caslione, Chaotics, busca formatar essa nova estratégia. Na referida entrevista (HSM Management, 2009), Kotler não entra no mérito sobre se esse estado caótico atual é pior ou é melhor. Diz ser diferente, inevitável, exigindo outra abordagem por parte das empresas, pois fenômenos como a globalização e digitalização introduziram uma nova dimensão de velocidade e interdependência em nossas vidas e não há retorno disso. De agora em diante, afirma, “precisamos pensar proativamente sempre e não apenas durante uma queda: um lado de uma crise é a vulnerabilidade, e o outro é a oportunidade”. Resumindo a essência do enfrentamento desta nova era do caos, Kotler cita, como ponto fundamental, serem exigidos especialmente no marketing, grandes profissionais que consigam esperar o inesperado e que, em tempos de caos, possam reinventar os modelos de negócios e as estratégias de marketing, a fim de reagir rápido aos fatos. Entende-se, então, que esses grandes profissionais, referidos anteriormente, seriam identificados na figura de um líder exato, com clareza intuitiva, pois não haveria lógica, não haveria regras, não haveria sistemas garantidos. Ao abordar a neurociência, Kotler diz serem algumas descobertas especialmente surpreendentes para ele, como por exemplo, quando Martin Lindstrom afirma que os pôsters “Cigarro mata”, na verdade, abrem o apetite dos fumantes para acender o cigarro, ao invés de alertá-los sobre e para o problema. Encontra-se ainda, na Revista HSM Management (2009), a resposta de Sydney Finkelstein para a pergunta: Por que os executivos inteligentes falham? Existem quatro condições de bandeira vermelha: experiências enganosas, julgamentos errados, interesses pessoais, apegos inadequados. Prossegue dizendo que: “O problema da análise de negócios convencional é que ela ignora a parte mais importante do panorama: os responsáveis pela tomada de decisão. O mais importante é voltar a colocar o foco nas pessoas-chave das organizações: os líderes (FINKELSTEIN, 2009, p. 19). Segundo Finkelstein (2009), se os líderes não estiverem conscientes das “bandeiras vermelhas” que surgirem, correm o risco de incorrer em enganos desnecessários. Afirma ainda: “bons líderes se equivocam e grandes líderes também” (ibid., p. 19). O especialista em negócios Ikujiro Nonaka (1997) revela que executivos que tratam a gestão do conhecimento como se fosse um apêndice de Tecnologia da Informação (TI) não compreendem de que SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ modo os seres humanos aprendem e criam e, portanto, jamais conseguirão capacitar seu pessoal para o aprendizado profundo. Ao favorecer o conhecimento explícito e definir competência como a capacidade de obter números elevados nas métricas escolhidas, as empresas correm o risco de nomear líderes que não compreendem plenamente as sutilezas do negócio e ainda promover uma visão de que as capacidades das pessoas são estáticas e, deste modo, deixam de investir em talentos. Nonaka (2009, p. 108) diferencia a ideia de: phronesis – “sabedoria prática”, techné – “saber como fazer” e episteme – “saber por que fazer”. Afirma que é necessário compreender o propósito e a razão de ser da organização no mundo e, ainda que, para que uma empresa seja resiliente e capaz de criar conhecimento, a phronesis deve ser amplamente distribuída. 4 Metodologia A pesquisa foi desenvolvida por meio dos pressupostos da abordagem qualitativa (HAIR, 2007) utilizando entrevistas com cinco empresários, que utilizam a metodologia FOIL com faixa etária entre 40 e 55 anos, com ramos de negócios distintos: orizicultura, calçadista, educação e alimentação. Estes empresários atuam no mercado interno e externo, e possuem várias unidades de negócio, destacando-se cada um no seu ramo de atividade não só pela competência competitiva, mas também pela lucratividade. As entrevistas foram realizadas a partir das questões a seguir relacionadas: 1) Qual é a responsabilidade do líder no andamento da empresa?; 2) Que importância atribui à própria intuição na gestão de seu negócio?; 3) Como o senhor utiliza as ferramentas de gestão?; 4) Segundo seu ponto de vista, quais são as causas da consecução dos objetivos delineados no Planejamento Estratégico? Em relação a responsabilidade os empresários assim se manifestaram: “É a pedra fundamental para o andamento da empresa” (E1). “Diz que sou eu quem determina o escopo e ‘puxa’ o ritmo da empresa, que o líder é a mente e a intencionalidade do negócio e este responde exatamente a como o primeiro posiciona” (E3). “É o líder é aquele que imposta a cultura, os objetivos, a lógica, o modus operandi, dá o tom, organiza os mercados, produtos, garante a evolução do negócio, que sem o líder, a empresa não tem, em geral, coerência, fica uma nau sem rumo” (E4). “É total, ele é o responsável pelos resultados qualitativos e quantitativos” (E5). Na leitura dessas entrevistas, constatou-se que a maioria dos posicionamentos foi categórica ao afirmar, em resposta à primeira questão, que a responsabilidade do líder é total, é “pedra fundamental”, seja por ele ser mente e intencionalidade do negócio, por ser ele quem dá o “modus operandi” ou por ser o responsável pelos resultados qualitativos e quantitativos da empresa. Outro posicionamento, de forma indireta, também referenda o que foi colocado por E2 ao destacar a participação direta do líder na formação dos profissionais colaboradores. Neste sentido, um diferencial destes empresários que utilizam a metodologia FOIL é que a direção da estratégia é realizada diretamente pelo líder da organização. Deste modo, o sucesso da implementação do planejamento estratégico depende da variável líder. Hammer (2009) constata que os processos operacionais de alto desempenho não são suficientes para o sucesso das empresas, e, Kaplan e Norton (2009) afirmam que nenhuma organização que alcançou sucesso com o sistema de gestão estratégica tinha um líder passivo. Em relação à intuição e ao business os empresários assim se manifestaram: SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ “É a intuição do líder que mantém a identidade da empresa, a unidade de ação e as correções de rumo necessárias” (E1). “Sempre que racionalizamos muito sobre um tema o resultado é inferior. Quando seguimos a intuição diretamente sem elaborá-la os resultados são ótimos” (E2). “A intuição é fundamental no processo de decisão. É ela quem conduz as pequenas e grandes escolhas. Uma vez decidido com a intuição, o papel da racionalidade é fazer as passagens técnicas, fundamentais para fazer o projeto, mas é a intuição quem determina o caminho, sem ela ficamos sem bússola” (E3). “É extremamente relevante, ela é aquele flash que nos indica os caminhos a serem seguidos, é algo fundamental para os empreendedores, pois permite diferenciar a empresa no mercado e ainda garante seu sucesso” (E4). “É de total importância quando se trata da verdadeira intuição...” (E5). Nas respostas sobre a importância da intuição do líder no andamento da empresa, salientam que essa é “extremamente relevante”, é “bússola”, por vários motivos, entre eles, porque mantém a identidade da empresa, porque, ao contrário da racionalização, a intuição desencadeia ótimos resultados, além de ser o que diferencia a empresa no mercado e garante o seu sucesso; que a leitura da intuição é possível com base na formação ontopsicológica FOIL. Porter (2009) afirma que um líder forte ou um pequeno grupo de líderes é capaz de comandar uma expansão no mercado, por sua vez, Marcos Braga relata que “vence quem escolheu o pneu certo para o tipo de pista que prevalece na prova”. Essas afirmações referendam que se faz necessária a leitura exata da intuição por parte do líder. Para Kotler (2009), o ponto fundamental é: grandes profissionais que consigam esperar o inesperado e, segundo Nonaka (2009), é preciso investir em talentos. Meneghetti (2007) afirma que o líder distingue-se de todos pela posse natural da intuição. Esta consente em operar a escolha otimal na conjuntura de mais problemas ou mais soluções. Portanto, cabe ao líder desenvolver, de modo voluntário, sua capacidade natural de ler de modo racional sua intuição. E, isso só é possível mediante o conhecimento da totalidade de sua atividade psíquica (consciente e inconsciente) por meio da consultoria de autenticação. Os empresários se manifestam sobre como são utilizadas, por eles, as ferramentas de gestão: “As ferramentas de gestão são a forma de o líder conduzir a empresa” (E1). “Hoje trabalhamos com diversas ferramentas de gestão. As principais são: Planejamento Estratégico e seus projetos, Gestão de Relação com Clientes, Planejamento Tributário, Sistemas de controle do resultado, controle de despesas, Sistema de Gestão das competências, Gestão de contratações, Gestão de RH, etc.” (E2). “Apoio ao processo de controle e comunicação, serve para dar uniformidade a toda a empresa e para muitas vezes embasar racionalmente uma decisão intuitiva” (E3). “Cotidianamente para gerenciar clientes, resultado do negócio, contabilidade, financeiro, pois tem um negócio bastante informatizado, com informações rapidamente disponíveis através de ERP, BI, BSC” (E4). “Quando depende internamente da sua interferência, utiliza aquelas ferramentas e que, quando as ideias colocadas em prática vão bem, não interfere e como a gestão é compartilhada por regulador externo deve-se obedecer às regras impostas” (E5). Os empresários responderam que as ferramentas são efetivamente utilizadas e justificam seu uso, entre outros, pela rapidez com que as informações ficam disponíveis, como apoio aos processos de controle e comunicação, como SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ embasamento racional de decisões intuitivas. Ao voltar para Fischmann e Almeida (2009), é possível retomar suas observações: o planejamento estratégico do Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América somente funcionou enquanto esteve presente seu mentor, Mac Namara. Observam ainda que a ciência da Administração, só recentemente, tem voltado sua atenção aos primeiros níveis, ou seja, à Direção e ao Conselho Administrativo, deste modo, remetendo ao termo estratego e, portanto, ao líder. E, sobre quais seriam as causas da consecução dos objetivos delineados no planejamento estratégico assim se manifestam: “É da visão correta do Planejamento Estratégico que se parte com unidade de ação para a sua execução” (E1). “São as pessoas dedicadas à execução dos projetos, comunicação e foco” (E2). “A ferramenta de PE não garante o sucesso de uma estratégia, é apenas uma ferramenta analítica para organizar informações, comunicar, priorizar projetos e acompanhar. A causa do sucesso ou insucesso de uma empresa ou de um objetivo estratégico está na coerência do líder com o projeto, se aquele projeto é natural, seu, e o líder está 100% dentro dele, o projeto invariavelmente tem sucesso, se é um projeto que não reflete o líder, será fracassado” (E3). “Existem várias formas de garantir que o planejamento efetivamente aconteça, mas as principais são: planejamento bem feito, conciso, focado no negócio, com objetivos plausíveis, além de constante revisão e motivação das equipes” (E4). “Fundamental é a unidade de ação das equipes de trabalho e sinergia entre as lideranças” (E5). Destacam os empresários que as causas do sucesso da implementação dos objetivos traçados no planejamento estratégico estão na coerência do líder com o projeto; que estão nas pessoas dedicadas à execução dos projetos, comunicação e foco; na visão correta do planejamento estratégico, junto com a unidade de ação para sua execução; e no planejamento bem feito, na revisão constante e na motivação das equipes, salientando assim, a necessidade da liderança ativa. Segundo Meneghetti (2007), é a inteligência do líder que coordena os meios para obter o sucesso na implementação do planejamento estratégico. Daí porque se torna fundamental o líder recuperar a integralidade de sua inteligência por meio da consultoria de autenticação. 5 Análises e Considerações Finais Buscou-se realizar uma pesquisa teórica e empírica a fim de estabelecer uma reflexão sobre a razão pela qual um alto índice de organizações (60 a 80%) não atingem os objetivos estabelecidos no Planejamento Estratégico. Ao retomar o primeiro autor citado, Maquiavel (2008), em sua obra “O Príncipe”, se é levado a concordar com a filósofa e psicóloga italiana Margherita Carotenuto (2009), quando esta afirma que aquele autor, por considerar a natureza humana imutável e tendencialmente malvada, preconiza que, para conservar e fundar o Estado seria necessário astúcia, firmeza, destreza e coragem e, ainda, seria mais conveniente ser temido ao invés de amado, aparentando ser justo, grande e magnífico somente com o escopo de conservar o poder. Todavia, Maquiavel não oferece receita para uma forma institucional estável, saudável e duradoura, conveniente ao momento atual. Quanto aos autores trabalhados neste estudo, Kaplan e Norton, Hayes, Fischmann e Almeida, Ansoff, Vasconcelos Filho, Valadares, Sampaio, Equipe Change Integration da Price Waterhouse, Grouard e Menson, Kotler, Finkelstein, Nonaka, pode-se dizer que SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ fornecem instrumentos válidos e úteis para as análises. Porém, falta a eles o conhecimento radical da matéria-prima que move a sociedade e o business, responsável direto pelo protagonismo e pela implementação do planejamento estratégico: o empresário líder. A partir do método FOIL o estudo demonstra que o Planejamento Estratégico e demais instrumentos de gestão como ferramentas são fundamentais. Todavia, este estudo aponta alguns questionamentos, que assim se apresentam: será que, para diminuir a lacuna entre elaboração do Planejamento Estratégico e sua implementação não seria indicado trabalhar para formar líderes conscientes, autênticos, protagonistas responsáveis, que saibam servir e sejam capazes de fazer funcionar a harmonia das relações entre operadores do contexto, para que, assim, exista resultado integral? De 60% a 80% das organizações não alcançam os objetivos definidos em seus Planejamentos Estratégicos pela simples razão que a maioria dos seres humanos possui em torno de 80% de inconsciente, o qual age fora do controle do seu Eu lógico-histórico. Neste caso, preliminar ao Planejamento Estratégico, não seria necessária a exatidão consciente do empresário líder para que lhe fosse possível controlar as variáveis endógenas e exógenas tanto pessoais como relativas à sua empresa? Diferentemente do que mostram jornais e publicações específicas na área em estudo, os empresários pesquisados, ao abordarem a atual “crise mundial”, não demonstraram preocupação, e sim a vêem como oportunidade de crescimento para suas empresas. Ao entrevistá-los, nota-se, em suas colocações, um misto de competência, alegria, orgulho e entusiasmo, característico dos vencedores. Poder-se-ia, então, questionar: qual é o embasamento teórico que referenda a práxis que os estaria diferenciando? Suas respostas não indicariam possíveis e consistentes caminhos? Pode-se constatar que esses empresários utilizam a Metodologia FOIL em suas empresas, servindo-se, quando necessário de técnicos credenciados, tanto nacionais como europeus. Todos eles são líderes comprovados pelos resultados alcançados em suas atividades empresariais e sociais, dando imenso valor à intuição pessoal, sabem identificá-la e conscientizá-la. Além disso, usam ferramentas como o Planejamento Estratégico e gestão estratégica, orçamento e outras, para comunicar e colocar em prática aquilo que colheram, através da própria visão intuitiva e não em substituição a ela. Um dos empresários afirma: “O segredo da indústria da estratégia é que ela não tem de fato nenhuma estratégia”. Segundo o empresário, o Planejamento Estratégico não pode recriar os processos do gênio empreendedor e deve ser apresentado como um auxílio à formação de estratégias, como um tipo de suporte para os processos naturais (inclusive a intuição), mas não como gerador de estratégias ou no lugar da intuição do líder. Ainda, segundo o referido empresário, a estratégia existe na mente do líder como perspectiva, como um senso de direção em longo prazo e uma visão de futuro da organização. Para finalizar, na visão dos empresários entrevistados, todo e qualquer problema que possa ocorrer na empresa é de sua responsabilidade e a solução deve ser procurada na sua pessoa. Então, por tudo o que foi considerado neste estudo, é o líder quem deve ser trabalhado, tornado autêntico, para que num segundo momento, o planejamento estratégico possa vir a ser implementado como uma ferramenta útil e funcional para a organização. SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Referências ALMEIDA, R. Manual de planejamento estratégico. São Paulo: Atlas, 2003. ANSOFF, I. Do planejamento estratégico à administração estratégica. São Paulo: Atlas, 1981. BRAGA, M. O pneu certo e a antropofagia. HSM Managment. n. 75, v. 4, jul./ago. 2009. p. 6. FERREIRA, A. B. de H. O Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. CAROTENUTO, M. Sogno, arte e società. Roma: Psicologica, 2009. CATELLI, A. Controladoria abordagem da gestão econômica. São Paulo: Atlas, 1999. COTTERMAN, D.; WILBER, S. Strategic planning for dumies, 2000. FINKELSTEIN, S. Ferramenta previne erros nas decisões. HSM Managment. n. 75, v. 4, jul./ago. 2009. p. 38-43. FISCHMANN, A.; ALMEIDA, M. Planejamento estratégico na prática. São Paulo: Atlas, 2009. FREUD, S. Sobre a psicopatologia da vida cotidiana. Rio de Janeiro: Imago, 1996. GROUARD, B.; MESTON, F. Empresa em movimento: conheça os fundamentos e técnicas da gestão da mudança. São Paulo: Negócio, 2001. HAYES, R. H. Strategic planning forward in reverse? California Review, 1996. HAIR, Joseph. F. J. Fundamentos de Métodos de Pesquisa em Administração. Porto Alegre: ArtMed, 2007. KAPLAN, R.; NORTON, D. A execução premium. São Paulo: Elsevier, 2009. KOTLER, P. Entrevista concedida sobre livro Chaotics. HSM Managment. n. 75, v. 4, jul./ago. 2009. p. 116-123. LUNKES, R. Manual de orçamento. São Paulo: Atlas, 2008. MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. São Paulo: DPL Editora, 2008. MENEGHETTI, A. Atos do Congresso Business Intuition 2004. São Paulo: FOIL, 2007a. MENEGHETTI, A. Dalla coscienza all´Essere. Roma: Psicologica, 2009. MENEGHETTI, A. Dicionário de ontopsicologia. São Paulo: OntoEd, 2001. MENEGHETTI, A. La psicologia del leader. Roma: Psicologica, 2007b. MENEGHETTI, A. Nova Fronda Virescit. Recanto Maestro: OntoEd, 2008. MENEGHETTI, A. Personalidade empresarial. São Paulo: FOIL, 2004. MENEGHETTI, A. Nova Ontopsicologia, São Paulo: Associação Brasileira de Ontopsicologia, ano XXIV, dez. de 2006. PORTER, M. Estratégia competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1986. PRICE WATERHOUSE. Mudando para melhor Better Change. São Paulo: Atlas, 1997. Autores: Maria Alice Schuch: empresária, licenciada em Letras; Especialzação em Psicologia com aordagem em Ontopsicologia (UESP); Especialização MBA em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Vera Lúcia Rodegheri: psicóloga, consultora, Especialização em Psicologia com aordagem em Ontopsicologia (UESP); Mestranda em Psicologia (PUC-SP). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 22/12/2010. SCHUCH, Maria A.; RODEGHERI, Vera L. Estratégia empresarial: planejamento e implementação. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 52-66, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Ambientes confortáveis e humanizados Luiz Henrique Girardi Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Estela Maris Giordani Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) [email protected] Resumo: Esse trabalho é um estudo prático sobre conforto e funcionalidade de ambientes. Seus principais objetivos são: apresentar um panorama de como são desenvolvidos os projetos da maioria dos apartamentos em Jaraguá do Sul-SC; resgatar os conceitos necessários para o desenvolvimento de projetos funcionais, estéticos e com ambientes confortáveis; desenvolver um projeto de um edifício de apartamentos com ambientes funcionais, confortáveis e estéticos; avaliá-lo e compará-lo com um projeto convencional. No estudo dos conceitos e princípios necessários para o desenvolvimento do projeto foi confirmada a necessidade de ordenar os espaços em referência ao homem e às suas necessidades. Com base no princípio de estética observado por Meneghetti e na lógica de funcionalidade exposta por Neufert, buscou-se desenvolver um projeto no mesmo terreno onde já havia sido implantado um edifício concebido sem atenção a esses princípios. A análise buscou desenvolver um projeto funcional e confortável, obteve-se um melhor aproveitamento do terreno, uma melhor relação custo/benefício e maior lucro e principalmente, um melhor ambiente, mais confortável e funcional aos clientes. Palavras-chave: arquitetura; conforto; estética. Abstract: This work is a case study on comfort and functionality of environments. Its main objectives are: to present an overview of how projects are developed in most of the apartments in Jaragua do Sul - SC; recover the concepts necessary for the development of functional designs, with aesthetic and comfortable environments and develop a project of an apartment building environments with functional, comfortable and aesthetic, evaluate it and compare it with a conventional design. In the study of concepts and principles for the development of the project confirmed the need to sort the spaces in reference to man and his needs. Based on the principle of aesthetics observed by Meneghetti and logic functionality exposed by Neufert aimed to develop a project on the same ground where he had been deployed in a building designed without attention to these principles. The analysis aimed to develop a functional design and comfortable we got a better use of land, greater cost efficiency and more profit and foremost, a better environment, more comfortable and functional to customers. Keywords: architecture; comfort; aesthetics. GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. 67 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ 1 Introdução Na prática profissional da construção civil, atuando como engenheiro responsável na execução de projetos imobiliários de médio padrão em Jaraguá do Sul-SC, observou-se a insatisfação dos clientes em relação às dimensões dos cômodos de seus apartamentos, no momento em que pela primeira vez este tem contato com seu imóvel. Ocorre frequentemente que o cliente que adquiriu o imóvel na planta, ao visitar a obra, após as paredes já estarem levantadas, verifica que o espaço é inadequado ou não atende às suas expectativas de distribuição do espaço físico nas peças. De fato, apartamentos pequenos, com ambientes compactos ocupam uma grande fatia do mercado imobiliário de Jaraguá do Sul, possuindo uma metragem quadrada e preço de venda já definido pelo mercado. Essa fatia do mercado é explorada principalmente por pequenas construtoras e investidores autônomos que observam nesse negócio a possibilidade de rendimentos superiores às aplicações financeiras. A lógica do incorporador ao planejar e projetar um apartamento de médio padrão é, de modo geral, a seguinte: procura-se reduzir as áreas dos cômodos para diminuir o custo de construção e assim reduzir o preço e facilitar a venda. Essa lógica tem o objetivo de dar liquidez ao produto, aumentando a receita durante o período de construção. Na perspectiva do pequeno construtor, que geralmente não possui um custo administrativo relevante, a avaliação do retorno financeiro é realizada subtraindo-se a previsão de receita, do valor do terreno e do custo de construção. De modo geral, o custo de construção é estimado pelo investidor a partir da multiplicação da área do projeto pelo custo unitário de construção (R$/m²), sendo esse último, obtido a partir das informações de empreendimentos já construídos ou arbitrado como uma percentagem do CUB1, por exemplo, 85% do CUB. Custo de construção = área de projeto x custo unitário Nesse procedimento não é realizado um orçamento analítico a partir de quantitativos do projeto (quantidade de concreto, alvenaria, cerâmica, etc.) e consequentemente, as características arquitetônicas do projeto não interferem na estimativa do custo unitário da construção. Nesse método a principal variável determinante na estimativa do custo da obra é a área construída. Seguindo essa linha de pensamento desenvolve-se um projeto compacto que atenda os seguintes critérios: medidas e áreas mínimas estabelecidas pelo código de obras do município e área mínima dos ambientes estabelecida pelo senso comum do mercado imobiliário. A aplicação dessa lógica implica na alienação em relação ao principal escopo do projeto: tornar o ambiente funcional ao usuário, atendendo suas necessidades de conforto e estética. De fato, são frequentes as queixas dos clientes, principalmente em relação à pequena área dos quartos e a pequena profundidade da sala. 2 Fundamentação Teórica 2.1 A formação integral do arquiteto Retorno = receita – (valor do terreno + custo de construção) 1 CUB: Custo unitário básico. GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6375, jan. 2011. 68 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Antes de tratar sobre arquitetura, Vitrúvio (~70-25 a.C.), autor do primeiro tratado sobre o assunto, dedica o primeiro capítulo de seu tratado descrevendo como deveria ser a formação do arquiteto. Nesse texto o autor trata sobre a importância do conhecimento e habilidade nas diversas artes e ciências humanas daquele período: literatura, desenho, geometria, aritmética, história, filosofia, música, medicina, direito e astronomia, afirmando que “o conhecimento enciclopédico, com efeito, é composto de todas essas partes como se fosse um corpo só” (VITRUVIO, 2007, p. 70). De fato, no período da Antiguidade Clássica via-se o homem de modo integral, relacionando-se com todos os conhecimentos centrados em si mesmo. 2.2 Arquitetura e estética Conforme Meneghetti (2003): Arquitetura é ordenar espaços em referência a uma função. (...) Assim, o propósito é dar ordem ao espaço próximo do indivíduo, tendo presente que se entra imediatamente na psicologia territorial e, portanto, na primeira espacialidade do Em Si (MENEGHETTI, 2003, p. 255). “O Em si ôntico é a radicalidade da atividade psíquica, o projeto de natureza que constitui o ser humano” (MENEGHETTI, 2006 p. 7), ou em outras palavras, o princípio que determina o que o sujeito é. A partir desse conceito compreende-se que arquitetura é ordenar espaços em referência àquilo que o sujeito é em seu projeto de natureza. Na história diversos pesquisadores buscaram projetar os ambientes a medida do homem. Dentre eles destacou-se Le Corbusier (2006) que usou as séries harmônicas para dimensionar os ambientes. As séries harmônicas baseiam-se na proporção, encontrada pelo psicólogo Adolf Zeising, que relaciona as dimensões das partes do corpo humano. Le Corbusier usou os valores da série harmônica para dimensionar o ambiente, tornando-o assim proporcional ao corpo humano. Entretanto não parece que a proporção das partes do corpo humano seja suficiente para propiciar funcionalidade e estética ao homem. Segundo Meneghetti (2003), para ordenar o espaço em função do homem é preciso ordená-lo em função da intencionalidade de natureza que o especifica. O conceito desse autor sobre o verbete “estética” elucida o tema: Representatividade da intencionalidade proporcional às próprias partes. Este gênero de representatividade é imagem formal da proporção que é percebida intelectivamente e emocionalmente pela medida de proporção ordenada daquele que percebe. Mesmo sendo uma experiência fenomenológica causa-se dentro da relação otimal entre constante H e presença do ser ambiental. Percepção externa do proporcional em ato. A parte e o todo intencionam o idêntico do conjunto. (MENEGHETTI, 2001, p. 66). Segundo o mesmo autor, “a constante H é o constituinte que formaliza toda e qualquer fenomenologia humana, enquanto atividade ordenada” (MENEGHETTI, 2001, p. 39). Desse modo, a partir do conhecimento daquilo que constitui e caracteriza o homem, pode se projetar o ambiente a medida do homem. Nesse ponto Torrice (1991), após o estudo dos conceitos formulados por Meneghetti, afirma que: A constante H é o critério universal de interação do homem com o ambiente. Operando como um discriminante, ela decide o que é côngruo ou não ao humano. O que é côngruo, ao ser metabolizado, produz crescimento, o que não é, ou é rejeitado ou produz diminuição (TORRICE, 1991, p. 20). GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ A natureza pré-estabeleceu o que é o homem e o que lhe produz bem ou mal e esse determinante é chamado de “constante H”. A estética é o resultado da melhor relação entre a “constante H” e o ambiente. 2.3 Funcionalidade e dimensionamento dos ambientes Uma vez que o homem é posicionado como produto arquitetônico da natureza, prossegue projetivamente a sua genialidade; continua a criar espaços como corpos apropriados, côngruos, corpos de espaço específico ao melhor viver, agir mover-se do homem (MENEGHETTI 2003, p. 255). Segundo Neufert (1976), o projetista deve conhecer a razão porque escolhe cada medida no dimensionamento dos ambientes: Devem saber as relações entre os membros de um homem normal e qual o espaço para se deslocar, para trabalhar, para descansar em várias posições. Devem conhecer o espaço que o homem necessita entre os vários móveis na cozinha, na sala de jantar, no escritório, para trabalhar com comodidade sem espaços desperdiçados. Devem conhecer a melhor colocação desses móveis para permitir que o homem, tanto em casa como no escritório ou oficina trabalhe com gosto e eficiência ou repouse convenientemente. Além disso, o homem não é apenas um corpo vivo que ocupa e utiliza um espaço. Seja qual for o critério ao dimensionar, pintar, iluminar ou mobiliar um local, é fundamental considerar a emoção que ele cria em quem ocupa (NEUFERT, 1976, p. 18). importante lógica de utilidade funcionalidade na concepção de projeto. e 3 Projeto desenvolvido Visando uma alternativa para o problema de funcionalidade e conforto encontrado no apartamento analisado, desenvolveu-se um novo projeto tendo como base as mesmas condições (terreno, número de pavimentos e número de apartamentos no edifício, ausência de elevador), em que foi implantado o projeto anterior. No desenvolvimento desse projeto foram distribuídos quatro apartamentos por andar. Procurando atender todos os quartos com uma insolação adequada, foram projetados dois tipos de apartamentos, posicionados lado a lado longitudinalmente. O primeiro apartamento, Tipo 1, foi projetado com uma área privativa de 74,70m². Os quartos foram posicionados voltados para o norte de modo a receberem insolação durante todo o dia. A sala, cozinha e sacada foram concebidas longitudinalmente na parte mais interna do apartamento. A . s e rv . Á re a : 2 ,3 8 m C o z in h a ENTRADA Á re a : 6 ,0 6 m Bw c Á re a : 3 ,6 3 m H a ll Á re a : 1 ,5 5 m APTO T IP O 1 Á re a : 7 4 ,7 0 m S u ít e Á r e a : 1 1 ,3 8 m S a la Á r e a : 2 1 ,5 0 m Neufert (1976) determinou parâmetros de espaço baseados nas atividades e movimentos exercidos em cada cômodo, nas dimensões do corpo humano e dos móveis e objetos envolvidos nas atividades. Esses parâmetros, mesmo não exaurindo o problema da estética e do bem estar na construção, contribuem com uma Bw c Á re a : 3 ,6 0 m Q u a rto Á re a : 9 ,0 0 m Sacad a Á r e a : 3 ,9 8 m CROQUI 01: Apartamento Tipo 1; FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ No desenvolvimento do segundo apartamento, em virtude do espaço disponível, decidiu-se pela construção de apenas um banheiro. Os dois quartos foram posicionados para o leste ou oeste de modo a receberem insolação direta durante a manhã ou tarde. A área privativa resultante no projeto desse apartamento é de 65,05m². a disposição dos moveis atendem aos quesitos acima. A existência de uma pequena sacada contribui para tornar o ambiente mais aberto e agradável. 1º QUARTO APTO TIPO 2 SUÍTE APTO TIPO 1 Quarto Área: 11,27m Bwc Área: 3,63m ENTRAD A C o z in h a A . se rv. H a ll Á re a : 5 ,0 0 m Á r e a : 2 ,7 2 m Á r e a : 1 ,3 5 m APTO T IP O 2 Á r e a : 6 5 ,0 5 m S a cad a Á re a : 4 ,5 5 m S a la Suíte Á re a : 1 8 ,1 7 m Área: 11,38m CROQUIS 03 e 04: Primeiro quarto (apto Tipo 2) e suíte (apto Tipo 1); FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). Bw c C ir c . Á re a : 3 ,2 5 m Á r e a : 1 ,1 6 m Q u a rto Á r e a : 9 ,2 4 m Q u a rto Á re a : 1 1 ,2 7 m 4.2 Segundo quarto CROQUI 02: Apartamento Tipo 2; FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). 4 Análise da funcionalidade ambientes do projeto desenvolvido dos 4.1 Quarto de Casal Para garantir a funcionalidade da circulação, que de modo geral é mais crítica em volta da cama, é necessário projetar as passagens com largura mínima de 60cm. Entretanto, para tornar o ambiente agradável é necessário não justapor a mobília e dimensionar um espaço maior, de modo que, em um ambiente de permanência prolongada como o quarto, não se tenha a sensação de confinamento. Na análise dos quartos de casal, verificou-se que as dimensões do projeto e As funções de escritório e quarto de hóspedes são as atribuições mais frequentes para o segundo quarto. O espaço livre disponível nesse quarto contribui para a circulação e bem estar, favorecendo as condições para a permanência no ambiente. 2º QUARTO APTO TIPO 2 2º QUARTO APTO TIPO 1 Quarto Quarto Área: 9,24m Área: 9,00m CROQUIS 05 e 06: Segundo quarto nos aptos 1 e 2; FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 4.3 Sala e cozinha Analisando-se as salas observa-se que há um espaço apropriado entre o sofá e a TV e uma adequada proporção entre o espaço livre para circulação e o espaço ocupado pelos móveis. Verifica-se também que a largura das passagens é suficiente para atender a maior circulação de pessoas que ocorre no local. Na cozinha, a área livre com 1,25m de largura proporciona uma satisfatória área para circulação e preparo dos alimentos. A parede que separa o hall da cozinha, além de definir os ambientes, oferece um maior perímetro de alvenaria que permite a fixação dos móveis. COZINHA E SALA APTO TIPO 2 COZINHA E SALA APTO TIPO 1 Cozinha Hall Área: 5,00m Cozinha ENTRADA ÁREA DE SERVIÇO ÁREA DE SERVIÇO ENTRADA Área: 6,06m Área: 1,35m SACADA APTO TIPO 2 SACADA APTO TIPO 1 Sacada Área total: 3,98m Área livre: 3,21m² Sacada Área total: 4,55m Área livre: 3,64m² CROQUIS 09 e 10: Sacadas dos apartamentos 1 e 2; FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). 5 As vantagens econômicas do desenvolvimento do projeto com ambientes funcionais e confortáveis Na análise econômica do projeto foram avaliados: o aproveitamento do terreno através da área total construída, o custo de construção, o preço de venda, receita e o lucro. Hall SACADA Observou-se que o dimensionamento de espaços a partir das funções implícitas aos ambientes e as necessidades relativas a essas funções, resultou em dimensões e áreas superiores àquelas comumente adotadas no mercado imobiliário. Área: 1,55m Sala Área: 18,17m 5.1 Área total construída CIRCULAÇÃO Sala CIRCULAÇÃO Área: 21,50m SACADA Através da comparação entre a área total construída dos dois edifícios observou-se que o novo projeto é 22,9% maior que o edifício existente, refletindo em um maior custo de construção e um melhor aproveitamento do terreno. CROQUIS 07 e 08: Cozinha e sala dos apartamentos 1 e 2; FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010). 5.2 Custo de Construção As sacadas em curva projetam o usuário para fora e favorecem a estética. A possibilidade do uso de mesa e cadeiras contribui com a funcionalidade desse ambiente. O orçamento dos dois projetos foi fundamentado na quantificação de serviços e materiais utilizados na construção desses edifícios, e nos valores de mercado para materiais e serviços. O cálculo do custo unitário de cada serviço foi realizado a GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ partir das composições de custo da TCPO2 (1996) adaptadas aos métodos construtivos e produtividade da mão de obra empregada em Jaraguá do Sul-SC. O orçamento revelou que o custo de construção por metro quadrado do novo projeto (R$ 828,15/m²) é inferior ao custo do edifício existente (R$ 892,94/m²). A redução do custo unitário é mais expressiva nos gastos com administração, fundações (infraestrutura), alvenaria, revestimento, esquadrias, impermeabilização e instalações. A redução do custo por metro quadrado desses itens ocorreu porque as despesas aumentaram em uma proporção menor do que o acréscimo da área construída. Em alguns casos as despesas reduziram devido a características dos projetos, como ocorreu com a impermeabilização e as instalações hidráulicas. A economia na alvenaria, revestimentos e esquadrias ocorre porque as áreas dos cômodos aumentaram mantendo-se ou até reduzindo-se o número de ambientes, diminuindo assim a relação área de parede-área construída (conforme o quadro abaixo) e o consumo de esquadrias por m² de área construída. QUADRO 1: Relação alvenaria / área construída Projeto Novo Área de alvenaria Área total construída A. Alvenaria A. Construída 1.741,10m² 1.225,32m² 1,42 realizada em jornais e imobiliárias, fez-se uma previsão de receita para cada empreendimento. QUADRO 2: Previsão de receitas Quant. PROJETO DESENVOLVIDO Apartamento tipo 1 Apartamento tipo 2 Valor unit. 6 155.000,00 930.000,00 6 145.000,00 870.000,00 EDIFÍCIO EXISTENTE Apartamento Valor total R$ 1.800.000,00 R$ 1.620.000,00 12 135.000,00 1.620.000,00 FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (jul/2010) Um dos modos que o mercado imobiliário usa para avaliar imóveis é o preço por metro quadrado de área interna do apartamento. Conforme o gráfico abaixo se observa que os apartamentos do novo empreendimento possuem um preço por metro quadrado menor, revelando uma vantagem econômica para o comprador. 5.4 Lucro e rentabilidade Tendo como referência as despesas de empreendimentos de porte similar, produziu-se uma previsão de lucro conforme o Quadro 3. Edifício Existente 1.548,98m² 997,01m² 1,55 FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010) 5.3 Preço de venda e previsão de receita Com base numa pesquisa dos valores de venda de cada apartamento, 2 TCPO: Tabela de composição de preços para orçamentos GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ QUADRO 3: PREVISÃO DE LUCRO PROJETO DESENVOLVIDO Receita R$ 1.800.000,00 Terreno R$ Construção R$ 1.014.742,99 Impostos Comissão de vendas Despesas Administrativas R$ 99.000,00 R$ 90.000,00 R$ 32.000,00 Lucro Retorno R$ 314.257,01 21,15% 250.000,00 EDIFÍCIO EXISTENTE R$ 1.620.000,00 R$ 250.000,00 R$ 890.535,59 R$ 89.100,00 R$ 81.000,00 R$ 32.000,00 R$ 277.364,41 20,66% FONTE: Dados do arquivo do pesquisador (2010) Embora as taxas de retorno dos dois empreendimentos serem semelhantes, o novo projeto oferece um lucro maior (+R$36.892,60) no mesmo terreno. O melhor modo de atingir esse objetivo é partir de um projeto orientado à funcionalidade, estética e conforto. A primeira arquitetura já é feita pela natureza. O próprio corpo é a arquitetura que a natureza faz sobre o meu Em Si. Uma vez que o homem é posicionado como produto arquitetônico da natureza prossegue projetivamente a sua genialidade; continua a criar espaços como corpos apropriados, côngruos, corpos de espaço específico ao melhor viver, agir, mover-se do homem (MENEGHETTI 2003, p. 255). No projeto desenvolvido nesse estudo de caso, observou-se uma maior funcionalidade dos ambientes, menor custo unitário de construção, menor preço de venda por metro quadrado para o cliente e maior lucro para o construtor, comprovando uma maior eficiência do projeto voltado ao homem. 6 Considerações Finais Referências “O Homem é a medida de todas as coisas” Protágoras “Tudo que o homem cria é destinado ao seu uso pessoal” (NEUFERT, 1976, p. 18), o que implica em uma responsabilidade do homem em prover a si o útil e necessário. Não há lógica no desenvolvimento de um projeto arquitetônico que não seja para o conforto e vantagem do homem. O projeto de uma casa ou apartamento deve propiciar condições de bem estar, de bem viver. Uma casa adequada às necessidades humanas é um bem a mais a disposição do seu dono: proporciona vantagem, crescimento, bem estar. De modo contrário, o espaço ineficiente, a sala apertada ou o canto incômodo, propicia sempre um distúrbio que uma vez tolerado e consentido, parece fazer mal dentro do sujeito. JARAGUÁ DO SUL. Lei n. 1184, de 7 de junho de 1988. Código de Obras. LE CORBUSIER. Por uma Arquitetura. São Paulo: Perspectiva, 2006. MENEGHETTI, A. Dicionário de Ontopsicologia. São Paulo: Ontopsicológica Editrice, 2001. MENEGHETTI, A. Nova Fronda Virescit: introdução à Ontopsicologia par Jovens. Recanto Mastro: Ontopsicológica Editrice, 2006. v. 1. MENEGHETTI, A. OntoArte: O Em Si da Arte. Florianópolis: Ontopsicológica Editrice, 2003. NEUFERT, E. Arte de Projetar em Arquitetura. São Paulo: Gustavo Gili do Brasil, 1976. TORRICE, E. L’estetica in architetura. Nuova Ontopsicologia, Roma n. 1 p. 1621, jan. 1991. GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ VITRUVIO, Pollio. Tratado de Arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 2007. TCPO 10: Tabelas de composições de preços para orçamentos. 10. ed. São Paulo: Pini, 1996. Autores: Luiz Henrique Girardi: engenheiro civil; Especialista na área de Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Estela Maris Giordani: pedagoga, Especialização em Psicologia com abordagem em Ontopsicologia (UESP); Especialista em Ontopsicologia (UNICEUB); Mestre (UFRGS) e Doutora em Educação (UNICAMP); Professora e pesquisadora da Faculdade Antonio Meneghetti e da Universidade Federal de Santa Maria. Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 22/12/2010. GIRARDI, Luiz H.; GIORDANI, Estela M. Ambientes confortáveis e humanizados. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 6775, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens na sociedade atual Maria Tereza Andreola Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Ana Maris Petry Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) [email protected] Resumo: Neste artigo analisam-se os principais preditores na construção da liderança do jovem, definidos como: valor saúde, valor social, valor ambição, valor profissional e valor econômico. Descrevem-se os principais resultados da pesquisa sobre o estilo de vida dos jovens como fator de desenvolvimento do potencial de liderança, comprovando-se que a aplicação da teoria ontopsicológica apresenta resultados sólidos e efetiva competência para a formação do jovem líder. Palavras-chave: joven; estilo de vida; preditores de liderança. Abstract: This article reviews the main predictors of building leadership in the youth, defined as: health value, social value, value ambition, professional value and economic value. It describes the main results of the research about lifestyle of young people as a factor in development of leadership potential, proving that the application of Ontopsychological theory presents solid results and effective jurisdiction for the formation of the young leader. Keywords: young; lifestyle; predictors of building. 1 Introdução Em consequência da globalização, do desenvolvimento de uma cultura digital e da rede informática, afronta-se a problemática da perda da consciência do humanismo, reabrindo a pergunta fundamental: quem é o homem? Dentro deste contexto, os jovens se movem e agem de uma maneira cada vez mais veloz, construindo estilo, estereótipos e cultura próprios. Estão sujeitos ao bombardeamento de informações de uma cultura opinativa, fictícia, virtual, onde há sedução pelo consumismo (um consumismo destituído de um critério de utilidade e funcionalidade), como também pelo informacionismo (uso indiscriminado e excessivo da Internet, mídia, celular e outros), e são levados, nesta etapa da existência, a viver a própria vida em prazeres gratuitos e irresponsáveis. De fato, a juventude é o período crítico do desenvolvimento humano, o momento de maior aptidão para investir em si mesmo e, também, o momento de maiores perigos. O jovem intui, tem a evidência de que possui um potencial, e a juventude é a ocasião de obter as ferramentas para atuar este potencial, mas falta-lhe a lógica do sistema existencial e social, que exige preparação para exercer o ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. 76 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ efetivo protagonismo de liderança. Assim sendo, é fundamental uma pedagogia que coloque o jovem em condições de fazer a própria vida em exaltação e realização do melhor de si mesmo, vale dizer, se o jovem não tem unidade de ação com o evento vida, todo o investimento de sua força não produz seu desenvolvimento in progress. O presente trabalho aborda o tema da necessidade da formação da personalidade líder do jovem, mediante a aplicação da técnica ontopsicológica. Nas palavras de Meneghetti (2005a): O escopo prático é educar o sujeito a fazer e saber a si mesmo: fazer uma pedagogia de si mesmos como pessoas líderes no mundo; educar um Eu lógico-histórico com capacidades e condutas vencedoras (MENEGHETTI, 2005a, p. 21). Neste sentido, o objetivo desta investigação foi conhecer o estilo de vida dos jovens, diferenciando o estilo daqueles que realizam o processo de autenticação por meio da psicoterapia ontopsicológica dos que não o fazem. Na sequência, verificou-se a correlação entre o estilo de vida do jovem e a possibilidade de liderança. 2 Fundamentação Teórica 2.1 O jovem na visão Ontopsicológica Ao se propor estudar o jovem, é necessário se ter um conceito de partida, e para o escopo deste trabalho, o jovem será definido como “quem tem íntegro o potencial de poder dar evolução biológica, funcional, estética, carismática e, portanto, de liderança como top líder” (MENEGHETTI, 2005d, p. 343). Deste modo, o jovem não necessariamente é circunscrito em faixa etária, mas substancialmente é aquele que possui íntegro o potencial ôntico, ou seja, o princípio ou a essência do humano a ser desenvolvido no devir existencial. Deste conceito, abre-se a visão de homem que a Ontopsicologia esclarece como “protagonista responsável baseado em uma virtualidade capaz de atuação pessoal no ser” (MENEGHETTI, 2004, p. 129). A virtualidade é o potencial ôntico, sendo responsabilidade exclusiva e individual do homem mantê-lo e evoluí-lo por meio de ações que caracterizam protagonismo em todas as esferas: existencial; biológica; psicológica; e social. Além disso, possuir o potencial íntegro significa, segundo a Escola Ontopsicológica, que a atividade do potencial ou Em Si ôntico vivifica a existência do sujeito pela atuação histórica: Eu lógico-histórico e Em Si ôntico se contatam, tendo como resultado a autorrealização. Em termos etários, pode-se entender que a juventude é um período de transição à vida adulta. O jovem naturalmente possui a ânsia de entrar como sujeito capaz, no mundo dos adultos, possui o desejo de liberdade, de conquistar a autonomia, porém, sob quais pressupostos os jovens estão sendo atualmente orientados para atingirem este escopo como humanos autênticos? Somos todos formatados no feixe de estereótipos sociais (língua, educação, regras morais, ideología, etc.), propostos como modelos de comportamento, os quais ulteriormente se tornam hábitos fixos. Estes, quando se agigantam, produzem patologias de comportamento, de personalidade. Nesse sentido, a formação ao próprio potencial pressupõe a relativização dos estereótipos. Meneghetti (2005d) esclarece melhor a ação da educação na formação do jovem: Nós temos uma sociedade muito plana do ponto de vista cultural. Se olharmos os nossos jovens, a formação que tiveram na escola e na universidade vemos, por exemplo, que todos vão à discoteca, ou se endereçam à droga, ou às ocupações comuns, etc.; isto demonstra o resultado de ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ certa pedagogía (MENEGHETTI, 2005d, p. 314). Poder-se-ia perguntar: mas no mundo de hoje, tão estruturado, onde existe um sistemismo legal de violência, uma mídia de massas, uma cultura gratuita de assistencialismo centrado no “direito de” substituindo também o “dever de”, e apelos de superficialidade e consumismo de massa, ainda é possível dar novidade de horizonte ao jovem? De acordo com o propósito deste artigo, afirma-se que não apenas é possível: é necessário. O jovem deve ter a oportunidade do próprio crescimento. A Ontopsicologia possui o método exato para tal, abrindo o critério da vida, como explica Meneghetti (2005a): Após as descobertas da técnica ontopsicológica, descobre-se que o homem tem inato o critério no qual basear suas escolhas com sucesso; tem o critério para tornar constantemente exata a sua intuição (MENEGHETTI, 2005a, p. 12). Nesse sentido é necessária uma precisa formação pedagógica e de liderança, com cunho voltado à lógica ôntica, para que o potencial do jovem seja investido em reforço de si próprio e para o bem comum, pois perdendo tal potencial, todos perdem. Segundo Meneghetti: “Trair o próprio potencial é um pouco trair também o bem social” (2001c, p. 11). O escopo desta formação, portanto, é contribuir para que se faça autóctise histórica, mediante a aplicação da técnica ontopsicológica: A Ontopsicologia é um método racional, científico, instrumental que ensina como estar bem, como cuidar-se, e contemporaneamente como entrar na visão total do Em Si ôntico (MENEGHETTI, 2005d, p. 352). E por que jovens líderes? Porque a tensão ao protagonismo é intrínseca à natureza do humano. Deste modo, formar jovens implica que os mesmos sejam responsabilizados em sua autonomia, em sua criatividade, em seus dotes intelectuais e morais para que reconheçam a realidade do seu centro-força. Este ponto-força é o Em Si ôntico e, quando um jovem tem restituído o contato com seu próprio Em Si ôntico, por meio de uma mudança de mente e do contato com uma cultura superior diferente da cultura de opiniões, aprendem a fazer o justo investimento de si mesmo, tornando-se assim, o ponto-força de toda uma sociedade. Todas estas questões são intrínsecas à definição de líder: O líder é o centro operativo de diversas relações e funções, é aquele que sabe individuar a proporção de como se movem as relações da vida e sabe aplicar, a cada situação, a fórmula correta para resolvê-las e realizá-las econômica, política e socialmente (MENEGHETTI, 2005c, p. 20). Para tal, a formação ao jovem centra-se em três pontos basilares: a) Saber a si mesmo segundo seu projeto de natureza e não segundo a normotipia social; b) Capacidade de autonomia social e autonomia econômica; e c) A utilização do método e instrumentos ontopsicológicos para orientar o exercício existencial e reconstruir uma consciência autêntica. 2.2 A formação do jovem autoconhecimento e estilo de vida líder: A indicação do antigo mote délfico “conheça-te a ti mesmo”, sempre foi orientação basilar da filosofia clássica, da teologia e da psicologia na formação do humano como indivíduo e como sociedade. Porém, nem mesmo com todos os avanços ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ tecnológicos, a ciência, qualquer que seja, conseguiu definir com clareza “quem é o homem”, e esta incapacidade se evidencia pelos resultados: o homem permanece irresoluto. Surge então, o questionamento: qual o critério que define o que é o homem e sob quais orientações este atua a autorrealização como projeto de evolução individual e social de acordo com valores humanistas. No tema proposto, observa-se que a maioria dos jovens se encontra alheia ao conhecimento de si mesmo, ao interesse social e à experiência do bem maior que eles próprios fazem parte: a humanidade. Para a formação do jovem líder não se pode saltar o entendimento do que é a personalidade, cuja essência é a psique, como também é necessário ter a clareza sobre o inconsciente. Sem estes esclarecimentos a pedagogia ao jovem se torna direcionamento em adaptações e treinamentos ao próprio sistema e, assim, corre-se o risco de perder o homem em sua plenitude, o homem como resposta a um projeto proposto pela vida. Meneghetti (2002) afirma que “o homem, fundamentalmente, é unidade de ação” (MENEGHETTI, 2002, p. 70). Esta unidade é um “uno”, um núcleo, um “em si”, um princípio. Para entender a unidade pressupõe-se que exista um princípio que a faz unida, um princípio gerador que intenciona e mantém a individuação. Um “em si” que é e que se especifica indiviso e distinto, “aquilo que é”, denominado Em Si ôntico. “Em Si porque é algo que está consigo, é tudo a si mesmo” (MENEGHETTI, 1995, p. 12), ôntico porque se refere ao “em si” do ser. O Em Si ôntico contemporaneamente é metafísico e histórico. “É o princípio formal inteligente que faz autóctise histórica” (MENEGHETTI, 2001a). “Possui faculdade de presenciar a existência onde o ser se apela em três momentos dialéticos: Em Si ôntico – Eu a priori – Eu lógico histórico” (MENEGHETTI, 2004, p. 217). O Eu a priori é a informação virtual antes da ação decisional e voluntária do Eu lógicohistórico. Porém, não é entendido como um Eu fixo, mas sim, uma constante direcionalidade, indicando a escolha otimal em que o Eu pode agir a autorrealização como identidade originária. O Eu lógicohistórico é o resultado da intencionalidade do Em Si ôntico dirigindo o indivíduo à autorrealização. Do exposto até o momento, é forçoso abrirem-se dois conceitos fundamentais para o processo de personalização: identidade e responsabilidade. Identidade significa: “aquilo que o ser humano é neste lugar, o modo no qual o ser é aqui” (MENEGHETTI, 2004, p. 35). No período da juventude, em que o indivíduo percebe a ampliação de seus horizontes, do circunscrito familiar ao protagonismo social, deve compreender que a sua liberdade está condicionada à original identidade. Pode fazer diversas escolhas, ter inúmeras experiências, desde que não traia o seu potencial de natureza. Caso o jovem, em suas escolhas, se aproprie de algo distônico à própria identidade, produz anomalia individual e também social. As escolhas, neste caso, são entendidas como as possibilidades amplas de posicionamento nos diferentes modos de relacionamento, conduta, estilo de vida, que vai desde sexo até amor, amizade, cultura, modismo, etc. Nesse sentido, a pedagogia deve estar embasada fundamentalmente em um despertar a responsabilidade do ato de conhecer a própria identidade, da qual deriva a possibilidade de saber o que é útil e funcional ao próprio projeto que se é. Reconhecida a identidade, atua-se a vocação ôntica por intermédio de contínuas escolhas existenciais. Note-se, então, que o ato de personalizar-se implica contínuas escolhas, contínuos nascimentos do Eu. ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ “Homem se nasce, pessoa se torna, porque por trás do conceito de pessoa está implícito o conceito de Eu” (MENEGHETTI, 2001a, p. 177). Assim sendo, o homem é responsável por dar história à própria “tensão a ser”. Porém, Meneghetti (2003a), em sua obra, expõe que a maioria dos jovens não reconhece o apelo ôntico que constantemente os provoca a partir de sua interioridade, adormecendo na norma cotidiana. Perdido o endereço ôntico, a vida é somente matéria. Compreende-se então que a íntima substância de toda pedagogia é auxiliar o jovem a evoluir com responsabilidade. Responsabilidade significa “a situação psicológica na qual o sujeito é forçado a responder existencialmente, juridicamente ou moralmente” (MENEGHETTI, 2001a, p. 148). A partir do momento que existimos, não podemos evadir da responsabilidade de existir. Mas existir de que forma? Na forma como a própria natureza projetou o homem, ou seja, na sua original identidade. Segundo Meneghetti (2003c), o Eu não é dado, isto é, não existe um Em Si ôntico que se desperta como uma estrutura definitiva, porque a potencialidade virtual expressa o sentido de devir e este implica responsabilidade de autóctise histórica. Autóctise histórica significa “saber ser fiéis artesãos da projeção em ato, projetada pelo Em Si ôntico” (MENEGHETTI, 2001a, p. 19). A partir do “quanto se existe” e de “como se existe”, o indivíduo é apelado a responder. O “como se existe” é condicionado ao estilo de vida, ou seja, ao modo de colocar-se de forma racional, artesanal, voluntária e cotidiana por meio de constantes e coerentes pequenas escolhas que permitem a formalização da intuição. Torna-se importante esclarecer o que se entende por estilo de vida. Percorrendo a psicologia clássica, Alfred Adler (1956) dedicou seus estudos à análise do estilo de vida do homem. Para ele, o estilo de vida está estritamente relacionado aos primeiros anos de vida, em que a reação distintiva da criança em relação ao social e ao próprio e natural sentimento de inferioridade a leva a construir um modelo de comportamento. Ela tende à superação para alcançar e afirmar-se de maneira superior e segura no ambiente circunstante. Nesse sentido, o estilo de vida de um ser humano é sua individualidade que se exprime e se amolda em um determinado ambiente. “Estilo de vida é uma unidade, porque nasce das situações difíceis dos primeiros anos de vida e do esforço no sentido de um objetivo” (ADLER, 1956, p. 98). Este sentimento de inferioridade estimula ao movimento e à ação em que o indivíduo tende a estruturar objetivos de vida. O modo que cada um tenderá a superação define o específico e exclusivo estilo de vida de cada humano. Mas para poder compreender o estilo de vida é fundamental compreender as primeiras impressões vividas e elaboradas na primeira infância (4 a 5 anos de idade), denominadas protótipos (ADLER, 1956). Estas primeiras e principais impressões tornam-se o centro do estilo de vida adulto. Também para Meneghetti (2001b), os estereótipos aprendidos desde a infância por intermédio do aculturamento social constituem-se a base de modelos de comportamento, que com o passar dos anos tornam-se hábitos. Quando estes se enrijecem, impossibilitando o Eu de atuar segundo a urgência interior (identidade original) em interação ambiental, tem-se a manutenção de um estilo de vida não funcional. Segundo Adler (1956): Para a maioria das pessoas, o estilo de vida jamais se modifica. A pessoa é sempre a ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ mesma, com a mesma personalidade, a mesma unidade (ADLER, 1956, p. 115). Meneghetti (2009), ao analisar o humano em sua profundidade e extensão, constata um ‘eu fictício’ que interfere no processo de conhecimento e vontade. O homem experimenta um Eu que é reflexo dos cânones comportamentais da infância por quanto educado pelo ambiente familiar e relativa sociedade. Por isso, o homem age e reflete um Eu prótese, um Eu real para o indivíduo, mas não conforme o Eu a priori formalizado pela individuação de natureza. Praticamente, temos dois Eus: Eu lógico histórico prótese e Eu lógico a priori, ou o essente individuado (MENEGHETTI, 2009, s/n). Dessa situação, o homem tende à fixação de modelos comportamentais, experimentando a vida em repetições constantes, evadindo-se da possibilidade de evolução integral e criatividade, determinando, assim, a velhice precoce (MENEGHETTI, 2004). Recordando o conceito de jovem, anteriormente definido, em que é necessário manter íntegro, vivo, o potencial ôntico, a perda deste contato pelo Eu lógico-histórico resulta na estabilização de um ciclo biológico, isto é, na manutenção de um estado de maturidade fisiológica (MENEGHETTI, 2004). Segundo a Ontopsicologia, a verdadeira evolução é a passagem do ciclo biológico a uma dimensão da ação psíquica ou ciclo psíquico. O homem em ciclo biológico pesa de maneira muito forte as questões afetiva, sexual, possessiva, objetal. Na pessoa em ciclo psíquico todas estas referências não têm significado; isto é, o que importa é a capacidade da mente ser livre de tudo isso para exercitar uma função superior (MENEGHETTI, 2004, p. 281-282). O homem, segundo a Ontopsicologia, é de um modo, mas se reconhece e age de outro. O inconsciente existe enquanto não há contato entre o Eu e o Em Si ôntico. O aculturamento social estabiliza-se em comportamentos voluntários, emocionais e intelectuais por intermédio de hábitos que expressam um modelo caracterial no estilo de vida do sujeito. A psicoterapia de autenticação objetiva a refundação crítica da consciência, até que esta se torne funcional ao devir existencial do homem. Segundo Meneghetti (2010): A psicoterapia é personologia: fazer psicoterapia é fazer-se pessoa e para este dever é necessário um que saiba fazer ser pessoa, segundo os critérios interiores ou subjetivos da antropologia funcional do humano (MENEGHETTI, 2010, p. 15). A presença de um Eu lógicohistórico fictício justifica a necessidade da psicoterapia ontopsicológica ou psicoterapia de autenticação. Esta é a passagem instrumental a um nascimento de Eu autêntico. É uma escola de maturidade, tendo como escopo fundamental a reintegração do homem ao seu Em Si ôntico, isto é: Indicar como o homem é de fato (resultado histórico); como deveria ser (projeto segundo a natureza) e o que pode fazer para tornar-se autêntico (conforme o projeto de natureza) (MENEGHETTI, 2008b, p. 35). Do homem autêntico, isto é, daquele que possui capacidade de desenvolver-se segundo a própria identidade original podese então entender o conceito de estilo de vida segundo Meneghetti (2003b): “estilo de vida é um modo de dar forma ao meu potencial, é a economia estética no uso de mim” (MENEGHETTI, 2003b, p. 181). Nesse sentido, Meneghetti (2003b) acentua a necessidade da formação por meio de uma educação que estimule a vida suscitando no indivíduo o sentido último à vida do ser que possui. “A cultura deve ser ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ de tal modo preparada que o jovem constitua a partir dela, um estilo de vida, ou melhor ainda, um estilo de poder pessoal” (MENEGHETTI, 2003b, p. 181). Em seu livro “Pedagogia Ontopsicologica”, Meneghetti (2007b) sintetiza alguns pontos necessários ao jovem com vontade de preparar-se à liderança futura. Estes pontos são atitudes do “Líder Virtual” nos jovens: sacrifício continuado, confronto orgânico no “ninho social”, aprendizagem do que o faz superior, capacidade de afrontar as contradições dos outros e da vida, a ambição ao secreto poder do Em Si ôntico, autóctise cotidiana do próprio Eu lógico histórico, consciência da preciosa unicidade do próprio existir se confirmada pela progressiva realização interior (MENEGHETTI, 2007b, p. 212). Baseando-se nesses pressupostos, neste artigo foram verificadas tais atitudes por meio de cinco aspectos que representam a unicidade do estilo de vida dos jovens sob o enfoque da preparação à liderança: saúde; social; ambição; profissional; e econômica. 3 Metodologia Ao trazer os fundamentos filosóficos e psicológicos sobre o tema em questão, torna-se necessário acrescentar dados empíricos que evidenciem os pressupostos da pedagogia ontopsicológica para a formação da personalidade líder do jovem. Este artigo baseou-se em dados obtidos no estudo de Andreola (2003) com atualização de alguns dados em 2010. O escopo é demonstrar que a teoria ontopsicológica, bem como seu método e instrumentos aplicados, apresenta resultados sólidos e competência para a efetiva formação de jovens líderes. Nesta pesquisa, analisou-se a aplicação do instrumento de intervenção denominado consultoria ou psicoterapia de autenticação (MENEGHETTI, 2004). No espaço deste artigo, optou-se por apresentar sinteticamente os pontos mais relevantes da pesquisa citada, os quais expressam o objetivo deste trabalho e serão organizados conforme o que segue. O método de pesquisa utilizado é o exploratório e descritivo, realizado com 40 jovens com idade entre 20 e 25 anos, divididos em dois grupos: a) grupo experimental denominado grupo A, formado por 20 jovens em processo de psicoterapia de autenticação pelo período mínimo de seis meses; e b) grupo controle, denominado grupo B, formado por 20 jovens sem conhecimento da Ontopsicologia e de seus instrumentos, ambos constituídos por 60% do gênero feminino e 40% do gênero masculino. Todos residentes na região metropolitana de Florianópolis, Estado de Santa Catarina, Brasil. Para a coleta de informações foi utilizado um questionário semiestruturado, elaborado pela pesquisadora para atender os objetivos desta investigação. Com relação à análise e tratamento dos dados, utilizou-se análise comparativa entre os grupos, análise de conteúdo e análise onírica, segundo a ótica ontopsicológica. Todos os dados foram avaliados segundo cinco indicadores assim definidos: valor saúde; valor social; valor ambição; valor profissional; e valor econômico. Estes cinco valores, avaliados conjuntamente, foram definidos como representativos do estilo de vida do jovem. Os resultados obtidos foram analisados estatisticamente pelo levantamento das respostas e sua organização em tabelas, que refletiam a quantidade de respostas a cada uma das perguntas do questionário e seu valor percentual. O tratamento a essas questões foi feito, na maior parte dos casos, por meio do Teste Qui-quadrado, comparando- ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ se os dados obtidos nos dois grupos, A e B, proporcionando um nível de confiança adequado para fundamentar discussões sobre as diferenças e semelhanças entre os grupos. Em relação à análise de conteúdo, as questões abertas, que incitaram os respondentes a discorrer sobre fatos, escolhas, hierarquia de preferências e inclinações pessoais, foram analisadas depois de esmerada leitura de todas as respostas, criando-se categorias que possuíam o mesmo sentido conceitual. Para a análise onírica procedeu-se da seguinte forma: os sonhos relatados foram submetidos à avaliação de três psicólogos, conhecedores da teoria e da aplicação do método ontopsicológico. Cada psicólogo recebeu, juntamente com os 40 sonhos, um roteiro de orientações, a fim de atribuir notas (de 0 a 10) aos cinco valores (saúde, social, ambição, profissional e econômico). Nestes sonhos era avaliada a presença ou não de imagens que demonstrassem resultados positivos para o crescimento do sujeito. Este procedimento teve a finalidade de validar a categorização em valores e, quando dessa validação, alcançar uma média das avaliações, garantindo confiabilidade dos resultados obtidos. Todos os símbolos evidenciados nos sonhos foram classificados de acordo com o significado que consta no Prontuário Imagógico (MENEGHETTI, 1994). 4 Resultados da pesquisa empírica Os dados da pesquisa sobre o estilo de vida dos jovens e a correlação do desenvolvimento do potencial de liderança apontaram para resultados que estão divididos em três itens: questionário semiestruturado; análise quali-quantitativa dos sonhos; e estudo comparativo com grupo experimental. A partir do questionário semiestruturado analisado foram obtidos os resultados a seguir: 4.1 Valor saúde Definido, nesse caso, como a expressão de um completo bem estar físico. Neste aspecto, não se verificou diferenças importantes entre os grupos. Em sua maioria, não apresentaram histórico significativo de acidentes, nem de doenças psicossomáticas. Têm o hábito de dormir em torno de oito horas diariamente e todos praticam esportes. Este dado expressa que os jovens encontram-se todos em um estado de sanidade biológica. Relevante salientar que demonstraram uma espontaneidade com o organismo e o ambiente ao manterem como hábito em seu estilo de vida, a prática esportiva. As principais atividades de lazer indicadas pelos jovens dos dois grupos foram: natação; caminhadas; dança; ciclismo; mergulho; basquete; atletismo; surfe, entre outros, ou seja, todos os esportes que possibilitam um contato com a natureza. Meneghetti (2007b) em Pedagogia Ontopsicológica, salienta a necessidade da aprendizagem da criança deste contato, possibilitando experiências que enriqueçam e favoreçam a consciência com o mundo natural. Estes jogos possibilitam, por meio das interações dialéticas, conscientizar e compreender o egoísmo individual, favorecendo a confiança em si mesmo e a competência com a sociabilidade. 4.2 Valor social O valor social entendido como a qualidade das relações sociais que o jovem possui e o quanto é considerado em seu ambiente, define algumas diferenças entre os dois grupos, que merecem consideração. Este aspecto proporcionou avaliar a consciência social e a atitude participativa no contexto societário. ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Destaca-se a hierarquia de importância dada pelos próprios jovens, em relação às atividades realizadas no seu cotidiano. Segue abaixo o gráfico com a apresentação dos dados: GRÁFICO 1 – Hierarquia de importância das atividades realizadas no cotidiano FONTE: Andreola (2003). Uma significativa diferença foi observada no quesito que se refere à hierarquia de importância das atividades realizadas cotidianamente. Entre os jovens do Grupo A, a maioria mencionou como ‘muito importante’ atividades como “estudar”, em primeiro lugar, “organização dos próprios pertences” em segundo, e “trabalhar” em terceiro lugar. Para este mesmo quesito, os jovens do Grupo B elegeram como “muito importante” valores como “conversar com amigos” em primeiro lugar, “estudar” em segundo e “ler” e “namorar” em terceiro lugar. Se analisar o estilo de vida dos jovens, com ênfase no aspecto de desenvolvimento da personalidade líder, sabe-se que é necessário dedicar-se desde cedo à aprendizagem de técnicas que instrumentalizem ações de liderança. Assim, as relações afetivas são necessárias e válidas aos jovens, porém, transitórias e relativas ao escopo de interesse e utilidade social. Nesse aspecto, os dados revelaram maior aptidão de liderança nos jovens do grupo A. 4.3 Valor da ambição O valor ambição é compreendido como a capacidade volitiva que o jovem expressa (como deseja contribuir para a ação existencial e social), e o autoposicionamento como pessoa responsável. É a expressão de seu egoísmo funcional que instrumentaliza a realidade em vantagem de si e do contexto, portanto, é o exercício do potencial ôntico. Sobre este item, seguem os dados colhidos. Neste item, muito embora os jovens dos dois grupos tenham tomado consciência da ambição de serem líderes desde muito cedo, constatou-se algumas diferenças significativas quanto à percepção das prerrogativas para o exercício do tornar-se líder. Enquanto o Grupo A considera que ter filhos é uma opção existencial (90%), o Grupo B se manifesta em 65% como condição para autorrealização. Também sobre o casamento, os grupos se manifestaram de forma diferenciada, embora em menor escala. Neste caso, os jovens do Grupo A o veem como opção existencial e os do Grupo B, o consideram como condição para a autorrealização. Na sequência, questionou-se sobre quais seriam suas metas para o futuro em um ano, 5 anos e 10 anos, demonstrando resultados significativos em termos de ambição. As principais projeções dos jovens do grupo A, referidas como metas de curto prazo (um ano) referem-se a ampliação de conhecimento técnico e cultural (50%), liberdade financeira (30%) e desejo de conclusão de curso de graduação (25%). Os jovens do Grupo B, ao final do mesmo período (um ano) pretendem “ser ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ pessoas melhores” (25%), concluir a graduação (20%) e ampliar conhecimento técnico e cultural (20%). Para metas de 5 anos, os jovens do Grupo A projetaram adquirir independência financeira (35%) e atuação profissional autônoma (30%). Neste ponto, a ambição dos jovens do Grupo B é menos ousada, pois 65% deles pretendem ter titulação acadêmica (graduação) e emprego, em 35%. O Grupo A evidencia uma atitude de empregabilidade. Em 10 anos, os jovens do Grupo A buscam: serem líderes (50%) e terem destaque no campo de atuação profissional (35%). Os do Grupo B pretendem constituir família (45%), além de estabilidade financeira (35%). Além disso, é de se considerar que enquanto os jovens do Grupo A, em sua totalidade, realizam um processo de autoconhecimento por meio da psicoterapia ontopsicológica, evidenciase que o Grupo B, em sua maioria, não possui preocupação em conhecer seu potencial com o intuito de desenvolvimento criativo. Ambição não é apenas vontade de ser mais, mas está correlacionada ao ato de vontade centrado na identidade original do jovem. “O verdadeiro líder não é aquele que diz ‘Eu quero mais dinheiro’, mas aquele que tem vontade de ser mais, de demonstrar mais e ganhar mais” (MENEGHETTI, 2001d, p. 155). 4.4 Valor Profissional O valor profissional se refere ao que o jovem efetivamente e atualmente sabe fazer com qualidade, em termos de atividade produtiva, incluindo para análise aspectos como o domínio de outros idiomas e habilidades técnicas. A diferença dos dois grupos, A e B, na síntese do valor profissional, é bastante significativa, pois a maioria dos jovens do Grupo A (55%) tem domínio em três línguas contra 10% do Grupo B. Perguntando-se aos jovens: “o que você sabe fazer bem feito?”, obteve-se as seguintes afirmações: o Grupo A responde com 95% de domínio de habilidades técnicas contra 35% do grupo B neste quesito. O domínio de habilidades técnicas indica um ponto crítico que é a capacidade de atuar com competência e competitividade no mundo globalizado. Os resultados evidenciaram que o grupo A possui uma diferenciada preparação ao exercício profissional. O “saber fazer bem feito”, segundo a Escola Ontopsicológica, é à base da sustentabilidade econômica. 4.5 Valor Econômico O valor econômico deve ser entendido como o capital financeiro que proporciona certa independência para utilizar em treinamento e especialização do capital profissional. Os aspectos analisados foram: independência econômica; gestão econômica na atualidade; e projetos futuros. Segue a tabela com a exposição das informações recolhidas. Na síntese do valor econômico, quando se discorre sobre a administração financeira pessoal, ou seja, onde o jovem comumente gasta seu dinheiro, aparece uma significativa diferença entre os dois grupos. O Grupo A investe em autoconhecimento e formação técnica cultural (100%), ao passo que o Grupo B gasta em lazer (60%), deixando menor parcela para investir em formação técnica cultural (40%). No quesito: “Se você ganhasse muito dinheiro em que você investiria?” verificou-se que, em referência à aplicação financeira ideal, repete-se a diferença entre os grupos. Os jovens do Grupo A ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ respondem unanimamente que investiriam em negócios (100%), e 70% em formação profissional e pessoal (respostas com múltiplas escolhas), enquanto os jovens do Grupo B optariam por aquisição de bens (45%) e investiriam em ações de solidariedade (45%). Meneghetti (2008a) define que as características que qualificam a pessoa líder, além do dom natural, residem nos aspectos de domínio cultural (geral e específico), transcendência dos estereótipos (sexo, família, casamento, etc.) e conhecimento do inconsciente. A autonomia financeira não está relacionada à conta bancária, mas à capacidade e consequente liberdade do exercício de ser aquilo que se é. Do dever de ser autônomo economicamente, obtém-se o direito de ser. O não conhecimento de si mesmo, a fixação em determinados modelos culturais e a deficiência na formação técnico-cultural tendem a determinar uma debilidade na capacidade do jovem em enfrentar a vida. Toda a inteligência e o potencial percebidos na sua fase de ouro, dos 16 aos 25 anos, assim delimitada, são canalizados em ações ao vazio se levar em conta a funcionalidade à própria identidade, e, por conseguinte, às frustrações, tendendo a se estruturar em estilos de vida baseados em modelos propostos pela sociedade. Todas as estatísticas acima descritas indicam e confirmam as diferenças no estilo de vida que serão decisivas nas ações de liderança na vida adulta. 4.6 Análise dos sonhos Nesta sessão analisam-se os sonhos relatados pelos pesquisados. Segundo a Escola Ontopsicológica, o sonho é a expressão da atualidade psicodinâmica do sujeito. A partir desta análise, avaliou-se se o jovem encontra-se em situação responsável em relação à atuação do potencial ôntico em ação existencial. As imagens oníricas, teste de excelência na análise e diagnose da interioridade do sujeito, podem demonstrar se os comportamentos verificados externamente estão ou não coincidentes e reversíveis com a interioridade do jovem analisado. Para cada sonho foi realizada uma quantificação em escores de 0 a 10, a partir dos valores analisados e categorizados (valor saúde, valor social, valor ambição, valor econômico, valor profissional). A partir desta quantificação individual obtiveram-se as médias para demonstrar o Estilo de Vida de cada grupo: Grupo A e Grupo B. A representação gráfica destes valores é apresentada, neste trabalho, por meio de um pentagrama, denominado Pentagrama do Estilo de Vida. Neste instrumento determinou-se que cada vértice representa os valores médios de cada grupo no valor pesquisado, sendo que os escores numéricos atribuídos demonstram o nível de desenvolvimento de cada grupo analisado. O escore máximo para cada vértice ou valor analisado nos sonhos é 10 (dez) e o mínimo é 0 (zero). Todavia, é importante ressaltar que deve ocorrer certo equilíbrio entre todos os vértices do pentagrama, ou seja, não é fundamental que todos os vértices apresentem escores 10, mas que os vértices apresentem um equilíbrio entre as partes. Este equilíbrio demonstra harmonia no estilo de vida do jovem e desenvolvimento do seu potencial de liderança. Nos gráficos 2, 3 e 4 é possível ter uma visão geral dos aspectos investigados, novamente comprovando as diferenças alcançadas entre os grupos, em complemento às informações obtidas no questionário semi-estruturado. ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ GRÁFICO 2: Pentagrama do Estilo de Vida do Grupo A, segundo análise onírica. GRÁFICO 3: Pentagrama do Estilo de Vida do Grupo B, segundo análise onírica GRÁFICO 4: Pentagrama do Estilo de Vida da média das análises oníricas referentes aos Grupos A eB Na análise quantitativa dos sonhos, avaliando os valores considerados relevantes como preditores para o sucesso de liderança obteve-se média assim distribuída: Grupo A no valor saúde, média 7; valor social, média 6; valor ambição, média 6; valor profissional, média 4; e valor econômico, média 3,5. Já no Grupo B, o valor saúde apresentou média 4, valor social média 2,5, valor ambição média 1,5, valor profissional média 0,5 e valor econômico média 0,1. Desses dados podese analisar que no Grupo A os jovens apresentam-se saudáveis e ambiciosos. O valor ambição é considerado como o mais expressivo para medir a vontade do jovem em construir-se como autonomia responsável. Quanto mais elevado for o seu valor, maior a atitude do jovem desenvolver-se no aspecto profissional e econômico, demonstrando assim, maior capacidade de formalização em direção ao escopo de liderança, alvo desta pesquisa. O Grupo A, em relação ao Grupo B, possui um estilo de vida harmonioso, onde o jovem em suas ações atua em todas as áreas importantes para o crescimento integral do indivíduo: da consciência da sua identidade à consciência de utilidade funcional ao social. No Grupo B, evidencia-se uma desproporção destas áreas (saúde, social, ambição, profissional e econômica), pois os jovens deste grupo se focam em atuação social, o que demonstra uma adaptação aos modelos culturais, ausentando-se de sua intimidade. O núcleo central que se torna critério para constantes escolhas no devir existencial em crescimento, segundo a Escola Ontopsicológica, é o Em Si ôntico, o qual se expressa também por meio da ambição. Distanciado deste núcleo, perde-se o critério humanista, incorrendo em adaptações e fixações à cultura de norma. Por intermédio da análise onírica, colhe-se a exata posição da diferença entre os grupos, confirmando os dados estatísticos obtidos no questionário semiestruturado. Conclui-se, então, que o dado subjetivo didaticamente analisado com a metodologia ontopsicológica se expressa em objetividade racional, o que significa que, por meio da análise onírica, tem-se a leitura da intencionalidade psíquica na atualidade histórica. Exemplo ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ prático desta afirmação encontra-se no valor saúde, que enquanto analisado pelo aspecto do questionário, demonstrava ser idêntico em ambos os grupos, e quando analisado pelo valor da imagem onírica, apresentou diferenças importantes entre os grupos. Disso pode-se concluir que existem diferenças significativas no estilo de vida dos jovens em formação Ontopsicológica, em relação àqueles que desconhecem a Ontopsicologia. O Grupo A demonstra interesse em desenvolvimento na autonomia pessoal e profissional em constante treinamento a tal escopo. O Grupo B tende a focalizar o interesse na obtenção e manutenção de padrões de segurança e proteção, priorizando relações afetivas que proporcionam este status quo. Esta diferença é expressão do processo de psicoterapia ontopsicológica: conhecimento do inconsciente e relativização dos estereótipos, com crescente reforço da identidade nativa. 4.7 Estudo experimental comparativo com grupo Após sete anos da realização da pesquisa anterior, decidiu-se atualizar alguns dados dos jovens que se mantiveram em formação ontopsicológica. Do número de jovens pesquisados em 2003 (n=20), atualmente 45% deles (n=9) permanecem em formação ontopsicológica. A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas, buscando-se focalizar a posição atual de liderança e ação profissional e econômica, comparando estes resultados com as informações apresentadas em 2003. A faixa etária dos jovens atualmente é de 27 a 31 anos de idade. Quanto à situação acadêmica, em 2003 tinha-se um quadro de estudantes universitários e recém-formados. Atualmente, 100% destes jovens são graduados, 77% possuem titulação de especialistas e 11% de mestres. Quanto à atuação profissional, em 2003 o grupo era formado por estudantes, estagiários e trainees. Atualmente, constata-se que todos trabalham, e na análise das funções, 55% desempenham funções de sócios-gerentes e 45% de gerentes, sendo que dos sócios-gestores, 50% acumulam mais de uma função. Em relação à situação econômica, em 2003, do grupo analisado, 55% possuía independência financeira em até cinco salários mínimos. Atualmente, sete anos depois, encontra-se em posição de autonomia e crescimento econômico, assim distribuído: 33% ganham até dez salários mínimos e 67% mais de dez salários mínimos como renda pessoal. Da análise destes dados, conjuntamente com as metas propostas em 2003 em relação ao que gostariam de atingir em 10 anos, os relatos direcionavam para atingir posições de liderança social, bem como destaque profissional. Evidenciou-se que em sete anos foram concretizadas de forma efetiva estas expectativas. No que concerne à atitude profissional, observou-se nestes jovens um padrão que segue as seguintes características: capacidade produtiva; competitividade profissional; empregabilidade, que geram renda; capacidade de empreendedorismo; e desenvolvimento social. É relevante acrescentar que para estes jovens, o resultado econômico não representa apenas um meio de liberdade financeira pessoal, mas também, possibilidade de desenvolvimento social. Disto, pode-se concluir que a formação da personalidade líder do jovem na ótica ontopsicológica proporciona um efetivo exercício de liderança destacandose: desenvolvimento do potencial criativo do jovem; capacidade de desenvolvimento ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ econômico; e agente transformador social com valores humanistas. 5 Considerações Finais Neste artigo, demonstrou-se a correlação entre estilo de vida do jovem e desenvolvimento e atuação do seu potencial de liderança, indicando a importância da formação do jovem com aptidão a ser líder. Tal formação objetiva estimular a afrontar o percurso da juventude com responsabilidade e coerência no desenvolvimento de sua vocação ôntica. O líder nasce com potencial para realizar mais, mas para poder ser função social de evolução humanitária, ele perpassa por uma dura e solitária construção, desde a sua juventude, em um tirocínio voluntário, enfrentando sacrifícios que lapidam a sua originária decisão de ser. Com a pesquisa, foi demonstrada a validade da pedagogia ontopsicológica aplicada aos jovens e por meio da psicoterapia de autenticação, obteve-se resultados que se canalizam em um estilo de vida que auxilia no desenvolvimento do líder virtual dos jovens. Este estilo de vida se sintetiza nas seguintes atitudes: 1) confronto orgânico com ambiente social e de natureza, demonstrando sanidade biológica; 2) disponibilidade ao autoconhecimento; 3) disponibilidade ao sacrifício continuado para aprendizagem daquilo que o faz superior; 4) capacidade de afrontar as contradições dos outros e da vida, indicativos de uma maturidade social e psicológica; 5) ambição ao secreto poder do Em Si ôntico; 6) autóctise cotidiana do próprio Eu lógico-histórico, baseada na consciência da identidade original. Fio condutor é a atitude de conhecer a si mesmo, segundo o projeto de natureza e não segundo a normotipia social, a fim de desenvolver maturidade psicológica e social na construção de um projeto de vida vencedor. Para o processo de autoconhecimento é fundamental uma pedagogia adequada, fornecida pela Ciência Ontopsicológica, autenticando os valores humanistas dos jovens. A consciência da preciosa unicidade do próprio existir como homem inteligente é confirmada pela progressiva realização interior. Muitos ignorantes podem viver a vida porque não a conhecem e jamais poderão conhecê-la, mas o universo para os inteligentes é diferente, é algo sério, total. A inteligência não se compra, é algo que inerva o indivíduo na totalidade do concreto: ou existe, ou não existe (MENEGHETTI, 2004, p. 98). É importante salientar que a conquista do próprio primado é decorrência de experiências em investimentos responsáveis, exigindo constante dedicação e sacrifícios para evolução do potencial. Tudo o que o jovem assimila em sua formação, com o tempo pode tornar-se maturidade psicológica e integrar sua atuação profissional como líder. Experiências baseadas em um estilo de vida autêntico propiciam aprender as lógicas sociais e a lógica da vida, possibilitando a transcendência dos estereótipos, utilizandose o jogo da dupla moral (pessoal e societária). Concluindo, a teoria ontopsicológica, seu método e instrumentos aplicados apresentam resultados sólidos e competência para efetiva formação do jovem líder. Meneghetti (2004), ao se referir à psicoterapia de autenticação esclarece: “para uma verdadeira evolução é necessário autenticar os melhores, porque são eles os constituintes em evolução” (MENEGHETTI, 2004, p. 312). Neste contexto, “os melhores” significa aqueles jovens que possuem consciência de querer ser mais como sujeitos (e não apenas objetos) de vida e para a vida. ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Referências ADLER, A. A Ciência de Viver. 5. ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1956. ANDREOLA, M. T. O estilo de vida do jovem como fator de desenvolvimento do potencial de liderança. 2003. Trabalho de conclusão de curso (Especialização), Universidade Estatal de São Petersburgo, São Petersburgo-Rússia, 2003. MENEGHETTI, A. Prontuario Immagogico. 3. ed. Roma: Psicologica Editrice, 1994. _______. Il progetto “uomo”. Roma: Psicologica Editrice, 1995. _______. Dicionário de Ontopsicologia. São Paulo: Ontopsicologia Editrice, 2001a. _______. Em Si do Homem. São Paulo: Ontopsicológica Editrice, 2001b. _______. Il Leader Intellettuale cosa può e deve fare, Rivista Nuova Ontopsicologia. Roma: Psicologica Editrice, 2001c. _______. IsoMaster. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2001d. _______. Il monitor de deflessione nella psiche umana. Roma: Psicologica Editrice, 2002. _______. A arte de viver dos sábios. 3. ed. Florianópolis: Ontopsicologia Editrice, 2003a. _______. Filosofia Ontopsicológica. Florianópolis: Ontopsicologica Ed., 2003b. _______. O Nascimento do Eu. Recanto Maestro: Ontopsicológica Ed. 2003c. _______. Manual de Ontopsicologia. 3. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2004. _______. Fundamentos de filosofia. São Paulo: Ontopsicologia Editrice, 2005a. _______. Genoma ôntico. São Paulo: Ontopsicologica Editrice, 2005b. _______. O aprendiz líder. São Paulo: FOIL, 2005c. _______. Pedagogia ontopsicológica. 2. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2005d. _______. Pedagogia contemporanea: responsabilità e formazione del leader per la società del futuro. In: UNESCO. Paris, 2007a. _______. Pedagogia ontopsicologica. 4. ed. Roma: Ontopsicologica Editrice, 2007b. _______. A psicologia do líder. 4. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2008a. _______. Nova fronda virescit: Introdução à Ontopsicologia para jovens. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2008b. _______. Psicossomática do Câncer. Conferência proferida em Recanto Maestro, Brasil, nov., 2009. _______. Psicologia Filosofia Società: immagini e scriti di un pensiero. Roma: Psicologica Editrice, 2010. Autores: Maria Tereza Andreola: psicóloga, consultora, Especialização em Psicologia com abordagem em Ontopsicologia (UESP); Especialização MBA em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Ana Maris Petry: consultora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti; Mestranda em Filosofi (PUC-SP). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 21/12/2010. ANDREOLA, Maria T.; PETRY, Ana. Preditores de liderança no estilo de vida dos jovens da sociedade atual. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 76-90, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara Lilian Werner Philippi da Silva Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Soaria Schutel Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) [email protected] Resumo: A pesquisa tem como objetivo demonstrar como a implementação de um novo negócio em serviços de lavanderia pode contribuir para o desenvolvimento sustentável e a formação do jovem. Com isto, pretende relatar o processo de implantação do projeto; demonstrar como este projeto contribui para os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio; discorrer sobre a formação integral dos jovens no Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro e descrever como este estimula e apoia o empreendedorismo. Por meio de revisão de literatura, pesquisou-se os principais autores que abordam os temas de sustentabilidade e de que maneira acontece a formação do jovem, e através do estudo de caso verificou-se de forma prática como foi o passo a passo da implementação de um empreendimento de serviços de lavanderia. Pode-se concluir que é recomendável para a empresa prever suas ações de responsabilidade social desde o primeiro planejamento organizacional. Quanto à formação da jovem gestora, percebe-se que essa se deu por meio da experiência prática em um ramo de negócios até então por ela desconhecido e também, de forma muito marcante, ao vivenciar o modelo de gestão desenvolvido no Recanto Maestro. Palavras-chave: sustentabilidade; liderança; serviços. Abstract: The research aims to demonstrate how to implement a new business on laundry services can contribute to sustainable development and education of young. With this, describe the process of implementing the project; demonstrate how this project contributes to the eight Millennium Goals, discuss the formation of young people at the International Center for Art and Humanist Culture – Recanto Maestro, and describe how the Recanto Maestro encourages and supports entrepreneurship. Through literature review, surveyed the main authors who address the issues of sustainability and how the youth are being trained, and through the case study it was found as a practical step by step implementation of an enterprise service laundry. It was concluded that the company is recommended to provide their social responsibility since the first organizational planning. As to the formation of the young manager, you realize that this was done through practical experience in a line of business unknown and it also, quite remarkable, when experiencing the management model developed at the Recanto Maestro. Keywords: sustainability; leadership; services. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica- social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. 91 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ 1 Introdução Este trabalho tem por objetivo apresentar como uma lavanderia localizada em área rural no interior do Rio Grande do Sul (no Distrito Recanto Maestro, localizado no município São João do Polêsine-RS), pode funcionar com responsabilidade social. Vê-se aqui a possibilidade de se abordar o termo responsabilidade social porque este empreendimento nasce sem visar apenas finalidades econômicas, mas também preocupado com a garantia de novos empregos para a comunidade local, a oferta de formação profissional para os colaboradores contratados, o consumo de insumos produzidos na região e a relação otimal com o meio ambiente. Balizam a responsabilidade social da empresa os princípios e valores já presentes nas demais empresas do Distrito Recanto Maestro, e que são encontrados também na atividade profissional da Lavanderia. São princípios que permitiram ao Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro obter reconhecimento, em 2007, por ser uma iniciativa que contribui para o atingimento dos 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da Organização das Nações Unidas (ONU). Estudando documentos relacionados aos 8 ODM, tais como o Quarto Relatório Nacional de Acompanhamento dos 8 ODM, publicado em abril de 2010 pelo Governo Federal Brasileiro, percebe-se que a Lavanderia contempla o 2º Objetivo, que diz respeito à Universalizar a educação primária - Educação básica de qualidade para todos, e o 7º Objetivo, cujo enunciado é Garantir a Sustentabilidade Ambiental. A coerência com o 2º ODM se dá, como mostrarão os próximos itens desse artigo, tanto pela formação profissional da jovem empreendedora responsável pelo planejamento e administração de todo o desenvolver da empresa, como pela futura capacitação dos colaboradores que serão contratados para atuar na Lavanderia. Pretende-se que a capacitação não seja apenas uma etapa inicial, para admissão dos colaboradores, mas sim um constante estímulo e fornecimento de meios para que esses possam manter uma formação contínua. O critério nessa contratação se dá, principalmente, pela opção por mão-deobra local, auxiliando a ampliar assim a perspectiva dos moradores da região em relação à qualidade de vida e auxiliando no combate ao êxodo rural. Quanto à formação da jovem empreendedora, essa segue o exemplo do que é o perfil adotado no Projeto do Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro e também na Faculdade Antonio Meneghetti (AMF): a partir do momento em que se tem um colaborador que possa ampliar as próprias atividades profissionais auxiliando a gerenciar um serviço para o qual o Distrito possui demanda, são possibilitados os meios e é incentivado que o colaborador aprenda na prática como se faz o negócio para o qual se propôs. Dessa forma, a jovem empreendedora se pôs em ação à realização de uma série de atividades, desde setembro de 2009, para poder dar início à Lavanderia, tais como pesquisas sobre o funcionamento desse ramo empresarial (estudando tipos de serviços prestados, maquinários e produtos necessários; aspectos arquitetônicos demandados para o prédio; formas de construção e de logística de trabalho que causassem menos danos ambientais; investimentos financeiros necessários e leis pertinentes ao negócio); realização de estágios em cinco lavanderías em outros estados brasileiros com diferentes perfis de atuação; envolvimento na formatação da marca e identidade visual da empresa; definição do público alvo e das ferramentas de marketing para captação de clientes; e planejamento das ações da lavanderia voltadas ao desenvolvimento das pessoas e da sociedade. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica- social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. 92 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Quanto aos aspectos financeiros, a realização desse empreendimento foi pensada por meio de um modelo de financiamento já utilizado por outras empresas do Distrito Recanto Maestro. As empresas do Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro ao se desenvolverem geram recursos e esses recursos são investidos em novas empresas, que abrem oportunidades para novos empreendedores. A partir do momento em que administra a própria empresa, o novo empreendedor também vai gerar recursos e fornecê-los para criar novas oportunidades de investimento em novas empresas, formando, assim, um ciclo de desenvolvimento. É possível observar, portanto, que, apesar dessa iniciativa não estar relacionada com a garantia de ensino básico e de qualidade para todos, que é o principal enunciado do 2º ODM, ela está relacionada com a continuidade do crescimento e formação do jovem ao ingressar no mercado de trabalho, dando portanto, um desfecho adequado para a formação disponibilizada pelo 2º ODM. Quanto à relação com o 7º ODM, são explicitados nos próximos itens deste artigo que toda a opção de maquinário adotado para a Lavanderia e de tecnologias para a construção do prédio estão de acordo com a busca por um empreendimento sustentável e ecologicamente correto. Da mesma forma, procurou-se desde o início a coerência com a legislação ambiental que rege esse tipo de setor econômico, sendo a primeira lavanderia ecologicamente correta da região. Desta forma o presente artigo tem como objetivo geral: demonstrar como a implementação de um novo negócio no ramo de serviços pode contribuir para o desenvolvimento sustentável e a formação do jovem. E possui como objetivos específicos: a) relatar o processo de implantação do projeto; b) demonstrar como este projeto contribui para os 8 ODM; c) discorrer sobre a formação integral dos jovens no Recanto Maestro e d) descrever como o Recanto Maestro estimula e apoia o empreendedorismo. 2 Fundamentação Teórica O projeto de responsabilidade social da Lavanderia enfatiza dois fatores: o primeiro é o desenvolvimento e a formação do jovem (no caso, da empreendedora), e o segundo é a sustentabilidade ambiental do empreendimento. No que diz respeito a esses aspectos, realizou-se uma pesquisa de referencial teórico para embasar a percepção que já se tinha, na prática, quanto à aplicabilidade desses conceitos no case da empresa recém-criada. Os resultados dessa pesquisa estão relacionados a seguir. Em um primeiro momento, se buscou a definição do que era referido teoricamente ao se falar em jovem. Para tanto, apesar de não desconsiderar os autores que se referem a essa etapa como sendo uma faixa etária, considerou-se também como um período de vida marcado por determinadas características psíquicas. Ao considerar dessa forma, a pesquisa vai ao encontro do pensamento de Meneghetti (2005): “jovem é quem têm integro o potencial de poder dar evolução biológica, funcional, estética, carismática e, portanto, de liderança como top líder” (MENEGHETTI, 2005, p. 343). Considera-se relevante destacar também esse perfil do jovem para poder justificar a relevância do papel social que ele exerce ao direcionar seu potencial em empreendimentos profissionais. Quando vitalidade e agilidade se reúnem à boa vontade e capacidade técnica, a liderança é catalisada em prol de benefícios sociais e econômicos para a comunidade que o cerca (SCHUTEL, 2006). Segundo Rocco (2006), o potencial, a força e a inteligência SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ de um jovem são uma enorme riqueza para ele e para a sociedade, o jovem deve aprender todos os instrumentos necessários para se tornar autônomo. Visualiza-se também que, por vezes, é por meio de oportunidades práticas de exercitar determinada atividade profissional que o jovem vai desenvolver habilidades que ainda não adquiriu em sua formação acadêmica. Tarefas simples do dia-a-dia de uma empresa se tornam verdadeiras lições na escola da vida para que o jovem profissional comece, passo a passo, a desenvolver a sua base de conhecimento da área em que deseja atuar. Esse saber prático é construído também por meio do aspecto subjetivo de ter que assumir o papel de líder. Ao se ver no papel de um empreendedor, o jovem se dá conta da sua capacidade de assumir responsabilidades e de orientar outros profissionais para que sigam todos rumo à realização de um serviço ou produto. O exercício dessa liderança permite ao jovem educar sua personalidade para realizar o que tantos pensadores da gestão empresarial definem, de variadas formas, como uma das tarefas mais complicadas e, ao mesmo tempo, gratificantes para o ser humano: a liderança. Partindo desse princípio, pode-se abordar também um segundo momento do exercício da liderança: a capacidade de motivar e levar seus colaboradores a fazer o melhor pela empresa. Para Schein (1996), a capacidade de liderar está amplamente relacionada à motivação pessoal: Muito se diz a respeito da visão dos empresários, mas não o suficiente sobre a incrível energia que demonstram ao tentar uma abordagem após a outra, enfrentando sucessivos fracassos em seus esforços para iniciar uma empresa (SCHEIN, 1996, p. 83). Considera-se nesta pesquisa, portanto, que a liderança é uma peça chave de negócios em qualquer área do mercado. Para embasar essa prerrogativa, analisamos que também na obra de Maslow (2000) é possível identificar a orientação para a esse sentido, conforme segue: As pessoas que serão ótimos gerentes e líderes irão não apenas incorporar as tarefas técnicas como também compreender a importância do lado humano da empresa (MASLOW, 2000, p. 266). Os resultados de uma liderança bem exercida e que forneça a “energia” necessária para o negócio, refletirão seguindo a linha lógica aqui apresentada, diretamente na qualidade do produto ou serviço oferecido pela empresa. É o otimismo e são os valores do empreendedor que vão estar por trás do desempenho de sua equipe na oferta do produto ou serviço que ele se propõe a expor. Em Maslow (2000), encontra-se novamente apoio: O melhor de todo este novo negócio gerencial é que de onde quer que você comece, seja do ponto de vista do que é melhor para o desenvolvimento pessoal das pessoas ou do ponto de vista do que é melhor para se obter lucro e bons produtos, os resultados parecem os mesmos – o que é bom para o desenvolvimento pessoal também é bom para os nossos produtos (MASLOW, 2000, p. 193). Outro fruto do exercício de uma liderança eficaz é também o acréscimo na qualidade de vida dos colaboradores que atuam na empresa. Ao se exporem a um ambiente de trabalho harmônico e com objetivos equilibrados, eles estarão trabalhando, desenvolvendo aprendizado contínuo e crescimento profissional e humano. Neste ponto, percebe-se como necessário retomar a obra de Meneghetti (2008): “o verdadeiro líder é o momento providencial do espírito no mundo, como mão de auxílio para muitos” (MENEGHETTI, 2008. p. 21). SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Percebe-se também um melhor desempenho dos colaboradores e maior qualidade de vida quando se vêem expostos continuamente a tarefas que proponham certo desafio e novidade ao seu dia. Campos (1992), ao abordar o tema, ressalta que para o conceito de crescimento do ser humano se concretizar efetivamente, as pessoas devem fazer sempre serviços de valor agregado cada vez mais alto: Maior valor agregado para as pessoas significa trabalho no qual se escreve, fala, ordena, mostra, instrui etc., ao invés de mover, copiar, seguir, obedecer etc. (CAMPOS, 1992, p. 155). Importante notar que caberá também ao empreendedor e às demais lideranças que se forem estabelecendo em sua empresa o compromisso de indicar aos colaboradores as tarefas que deverão se empenhar para realizar. O empreendedor pode observar o perfil dos colaboradores para melhor indicar-lhes o setor a trabalhar, tomando assim um passo a mais em direção ao sucesso. É preciso, portanto, ver a empresa não só como um instrumento de produtividade e lucratividade. Percebê-la como sendo sim um ponto de devir para o empreendedor, mas também para os colaboradores e a comunidade que dela desfruta e a sociedade na qual essa empresa está inserida. A multiplicidade de formas nas quais se pode verificar os resultados do desenvolvimento de um negócio é, para Yoshimoto (1992), um dos bastiões que sustentam a construção da mesma. Para ele: O âmbito dos objetivos da empresa compreende, além de objetivos econômicos e financeiros, objetivos tecnológicos e objetivos sociais, referente aos funcionários e à sociedade na qual atua (YOSHIMOTO, 1992, p. 36). O segundo ponto que tange à responsabilidade social da Lavanderia está também entre os resultados percebidos no caminhar de um empreendimento planejado levando em consideração a sociedade em que está inserido: são as preocupações com a sustentabilidade ambiental. No caso da empresa abordada neste artigo, a sustentabilidade ambiental é um objetivo corporativo que está em nível de igualdade com finalidades como financeira, tecnológica e social. O plano de negócios da Lavanderia compõe-se assim num todo constituído por aspectos econômicos, sociais e ambientais de forma equânime. A sustentabilidade ambiental é um aspecto atualmente considerado também como relevante para a longevidade da própria empresa. Tanto é que, talvez, possa-se dizer que é somente um primeiro passo para o empresário o de se ater à sustentabilidade ambiental. O segundo seria o de atentar para a sustentabilidade como um todo. Vê-se a importância de a organização considerar diferentes âmbitos, além dos ambientais, na construção de sua sustentabilidade. São aspectos sociais, educacionais, de parceria com a comunidade e de preocupação com a saúde da equipe. O todo da sustentabilidade parece estar, inclusive, entre os segredos das empresas longevas, conforme dispõe Schein (1996): As organizações que sobreviveram e passaram por importantes transições durante muitas décadas parecem sempre ter sido um núcleo cultural basicamente funcional – um compromisso com o aprendizado e a mudança; um compromisso com as pessoas e com todos os grupos de interesse na organização, englobando clientes, empregados, fornecedores e acionistas; e um compromisso com a construção de uma organização saudável e flexível em primeiro lugar (SCHEIN, 1996, p. 88). Apesar dessa visão “utilitarista” dos cuidados com o meio ambiente e com os demais aspectos sociais para se preservar a SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ longevidade da empresa, é inegável que os resultados destes esforços sustentáveis serão refletidos para a comunidade e o planeta. No caso da lavanderia, um recurso natural diretamente envolvido e que poderia ser prejudicado é a água. Recurso esse, tão essencial para a vida no planeta, que está entre as preocupações-chave da ONU e também ocupa papel central no projeto ambiental da Lavanderia. Abordar a importância da água é essencial em um país que, tem entre suas principais riquezas naturais justamente os recursos hídricos. Recursos esses que, conforme anunciam especialistas se tornam cada vez mais valorizados no mundo contemporâneo. Righes (2009) aborda o tema para lembrar que especialistas consideram a água como uma verdadeira fonte de problemas futuros. Segundo relatório ambiental da ONU, em 2000, o consumo de água quase quadruplicou desde 1940. Assim a escassez de água poderá constituir uma emergência mundial, já que o ciclo hidrológico parece incapaz de acompanhar as demandas das próximas décadas (RIGHES, 2009). Em um país de amplos recursos naturais, mas que, ao mesmo tempo, conhece os riscos do desmatamento e dos maus tratos para com o meio ambiente, é preciso tomar especial cuidado em não destruir a natureza em prol do desenvolvimento econômico de uma região. Garcia (1992) afirma que os objetivos de crescimento e de defesa da ecologia são indissociáveis: Constituem-se, ambos, necessidades imperativas do nosso tempo, já não podendo ser vistas sob a falsa perspectiva da mútua exclusão (GARCIA, 1992, p. 18). Também para o Brasil, os cuidados com o meio ambiente vão refletir diretamente em benefícios econômicos e um crescimento social longevo. A sustentabilidade ambiental, segundo Fortes (1992), está inerente ao próprio conceito de desenvolvimento econômico. O desenvolvimento sustentável é a resposta, pois constitui uma visão que parte da premissa de que o desenvolvimento representa a condição básica para uma utilização sustentada dos recursos naturais (FORTES, 1992, p. 62). É importante ressaltar que, ao exercer uma atividade ecologicamente correta, a empresa dá o exemplo e ensina a seus colaboradores e a comunidade local que é possível desenvolver-se economicamente sem descuidar do meio ambiente que os cerca. Abrange assim um aspecto a mais do conceito de sustentabilidade, aqui visto como também sendo constituído pelos esforços em prol da educação ambiental de todos. Educação ambiental essa que se faz importante não somente para crianças e jovens estudantes, como também, para adultos que precisam retomar sua consciência do papel que desempenham junto ao meio ambiente, e de que uma mudança de hábitos em relação ao habitat natural da humanidade é necessária. Jacobi (2003) lembra que a educação ambiental vai auxiliar na formação de cidadãos mais conscientes. Segundo ele: A educação ambiental, como componente de uma cidadania abrangente, está ligada a uma nova forma de relação ser humano/natureza, e a sua dimensão cotidiana leva a pensá-la como somatório de práticas (JACOBI, 2003, p. 200). A sustentabilidade de forma geral é demonstrada nesta pesquisa como uma tarefa perene que persiste por tempo tão longo quanto for aquele da vida da empresa. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 3 Metodologia A pesquisa foi desenvolvida em forma de estudo de caso que segundo Gil (2008): Consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento (...), e revisão bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos (GIL, 2008, p. 44;54). Através desta metófica verificou-se de forma prática como foi o passo a passo da implementação de um empreendimento de serviços de lavanderia. 4 Análise dos resultados As etapas realizadas para implementação do empreendimento da Lavanderia foram de extrema importância para o crescimento da jovem empreendedora, pois ao realizar cada passo esta pode apropriar-se de uma série de novos conhecimentos sobre o tema da gestão e do empreendedorismo e também se dar conta da necessidade de ir em busca de teorias que embasassem as ações e o planejamento que precisou realizar para concretização de seu projeto. 1º Passo: Visita do consultor técnico em abertura de lavanderias Pode-se dizer que a implementação da Lavanderia iniciou, efetivamente, em setembro de 2009, com o convite para vinda de um consultor técnico em abertura de lavanderias que lecionou sobre o tema indicado. Em encontros expositivos, esse especialista forneceu diversas informações que foram a base para que se pudesse estruturar a série de passos que viriam na sequência, tendo como finalidade a abertura desse negócio. Foram abordados, nas aulas, temas tais como: a) tipos de máquinas e novas tecnologias no mercado (máquinas que não agredissem o meio ambiente); b) produtos químicos utilizados nos processos; c) quantidade de roupas processadas por dia; d) sugestões de fluxo interno da lavanderia; e) métodos para reaproveitamento de água; f) processos internos (tais como recepção e identificação das peças, separação por modo de lavagem e secagem, passadoria, consolidação das roupas e entrega ao cliente); g) fluxograma, etc. Um ponto de destaque da consultoria foi que ela possibilitou a empreendedora o primeiro contato com a descrição do maquinário que utiliza o Sistema WetCleaning1. Ao final do período de consultoria, as lições forneceram subsídios suficientes para que a empreendedora definisse que esse seria o tipo de maquinário adotado, pois, dentre as opções apresentadas, era o que estava mais alinhado a um dos principais focos da administração da lavanderia: a sustentabilidade ambiental. 2º Passo: fornecedores dos maquinários A pesquisa com os diversos fabricantes de máquinas que utilizam o Sistema WetCleaning foi realizada visando a melhor relação custo benefício para a empresa, mas também a compra de um equipamento que seguisse integralmente a meta de sustentabilidade ambiental desejada, ou seja, a completa não utilização de solventes. Definiu-se, assim, a compra do equipamento fornecido por uma empresa espanhola com anos de experiência na fabricação de máquinas para lavanderias. 1 Máquinas que lavam com água todos os tipos de roupas sem necessitar do uso de solventes, em um processo que se assemelha ao da lavagem a seco. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 3º Passo: Construção do prédio Foram realizados orçamentos com diversas construtoras da região na qual está situado o terreno alocado para edificação do empreendimento. Novamente, os critérios adotados para escolha da empresa que prestaria esse serviço foram o fornecimento da melhor relação custo benefício e a existência de critérios de cuidados com o meio ambiente no decorrer da obra. Após o levantamento de vários orçamentos e a apuração de informações junto aos gestores das empresas consultadas quanto aos métodos por eles utilizados em suas obras, foi escolhida uma construtora sediada na Região da Quarta Colônia de Imigração Italiana do Rio Grande do Sul – que é composta por nove municípios, entre eles, São João do Polêsine, onde é sediada a Lavanderia – para dar início a obra. A construção iniciou seguindo o projeto arquitetônico desenhado nos moldes ecobiológicos que são adotados no Distrito Recanto Maestro. O conceito de ecobiologia determina um tipo de construção em que se vê o foco no bem estar do ser humano, alinhado ao máximo grau possível de preservação do meio ambiente e também a um padrão estético que não destoe do restante da paisagem, sendo um conceito apresentado na obra de MENEGHETTI (2006). Durante a construção do prédio, a empreendedora realizou visitas de acompanhamento à obra com periodicidade diária, tornando-se assim responsável também por algumas decisões importantes quanto ao caráter estrutural do edifício. Dentre essas decisões, estavam: definição da posição e do tipo de tubulações que melhor se adequam às especificações de cada equipamento; determinação do local para a Estação de Tratamento de Efluentes; escolha das luminárias a serem instaladas e definição do layout da área externa do edifício (composta por calçadas, rampa de acesso para os clientes, placa de identificação do empreendimento com a logotipagem previamente definida, paisagismo, etc.). O acompanhamento desses aspectos se deu de forma que a empreendedora pode se apropriar do projeto e obter maior motivação para o crescimento profissional ao ter um envolvimento global com o negócio escolhido. Essas percepções foram constatadas pela empreendedora como sendo aspectos essenciais para a sua visão futura da Lavanderia. Percebeu-se também que, com este acompanhamento, será mais fácil, no futuro, o entendimento da gestora quanto aos diferentes momentos de decisão que deverá enfrentar, tendo em vista que conhecerá esse empreendimento a fundo, desde seu início. 4º Passo: Estação de tratamento de efluente A estação de tratamento deveria, segundo as pesquisas realizadas pela empreendedora, atender a dois requisitos básicos: 1) relação custo-benefício positiva para a empresa; 2) adoção de um sistema de funcionamento que permita a reutilização em 100%, da água utilizada na lavação. Foram pesquisadas, por meio de mídias como Internet (websites específicos) e catálogos impressos, além do contato com gerentes de outras lavanderias, diversas formas de estações de tratamento de efluentes fornecidas por empresas de todo o Brasil. Constatou-se que somente uma empresa catarinense apresentava os dois requisitos pré-estabelecidos pela Lavanderia. Esse foi, portanto, o fornecedor da estação de tratamento de efluentes escolhido pela empresa. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 5º Passo: Estágio in loco A empreendedora preocupou-se em vivenciar in loco o dia-a-dia de funcionamento de empresas do ramo de atuação que escolheu. A amostragem utilizada foi de cinco empresas, sendo quatro delas sediadas no município de Florianópolis-SC, e outra no maior centro empresarial do país, São Paulo-SP. O município de Florianópolis foi privilegiado pela pesquisadora porque essa é natural da cidade e possui ali contato de uma empresa de consultoria em legislação ambiental e saúde do trabalho que pode indicar lavanderias que seriam um considerável lócus para experimentação do meio empresarial de lavanderias. O tempo de permanência em cada uma das cinco empresas foi variado. O critério adotado era, basicamente, a diversidade dos serviços oferecidos pela empresa e a abertura que a pesquisadora conquistava em cada um desses empreendimentos para atuar nas diferentes funções da hierarquia organizacional. O maior tempo de estágio empreendido foram 20 dias em lavanderia da cidade de Florianópolis, que se destaca no mercado local por ser ecobiológica em sua produção. Foi ali que a empreendedora aprendeu modelos e obteve experiências valiosas quanto aos desafios e limites de um negócio ambientalmente sustentável. Apesar dessa experiência de destaque, não é possível desmerecer os demais estágios não remunerados exercidos pela empreendedora. Em cada um deles, era apropriado um conhecimento a mais quanto à rotina de trabalho de uma lavanderia. A experiência prática de vivências no ramo rendeu, portanto, alguns aprendizados chave, tais como: forma de dar entrada na roupa entregue para lavação e práticas de atendimento ao cliente; organização das peças de forma a identificar as roupas de cada cliente; procedimentos adotados para lavagem de cada tipo de peças; técnicas de secagem adequadas para cada tipo de peças (por ex.: varal, secadora, sombra ou exposição ao sol); regras de passadoria (critérios como temperatura do ferro, usar ou não sapata e que tipos de roupas adquirem brilho ao serem passadas); etapas do processo de consolidação da peça (se refere à forma de embalar a roupa quando a mesma está pronta), e, por último, a entrega do produto pronto ao cliente. A percepção da empreendedora quanto a essa experiência de campo obtida com os estágios foi, portanto, como sendo de caráter essencial por ampliar as percepções do negócio no que diz respeito a permitir uma real visualização de como seria o dia-a-dia da Lavanderia ao imaginar os processos e técnicas que observou nas cinco empresas visitadas, para serem aplicados no contexto de seu próprio negócio. Por meio de comparação entre as observações tomadas nas cinco lavanderias visitadas, pode concluir como funciona todo o fluxo da lavanderia (desde a entrada da roupa até a entrega da mesma para o cliente), e o que pode ser feito para aprimorar os próprios serviços. Vê-se como importante destacar também que o trabalho in loco contribui para o desenvolvimento do senso de humildade da jovem empreendedora. Ao realizar esses estágios, colocouse no papel de aprendiz tendo como mestres, por vezes, profissionais sem elevado grau de escolarização, mas com grande conhecimento prático do dia-a-dia de lavanderias. 6º Passo: Abertura da empresa Esta etapa compreende todos os procedimentos burocrático-legais essenciais para o início formal do empreendimento. Fazem parte desses SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ procedimentos burocráticos, entre outros, o contrato social, a integralização do capital, a escolha da razão social, a escolha do tipo de empresa e as providências para emissão do alvará de funcionamento. Toda a parte legal e fiscal para a abertura da empresa foi também gerenciada pela empreendedora. De tal experiência, pode obter, além do conhecimento sobre o que é abrir uma empresa, também a noção de vínculo com o poder público que significa a abertura de um negócio e, por consequência, a responsabilidade social nele envolvida, pois se admite que ao gerar um negócio que faz parte da economia produtiva do país se traz benefícios não só para o empreendedor, para o próprio negócio, bem como, para toda a sociedade que o cerca. 7º Passo: Legislação trabalhista Após abertura da empresa, foi preciso procurar informações sobre todas as leis trabalhistas que regem o funcionamento de uma empresa neste ramo de atuação. Era necessário, assim, se inteirar quanto à forma como é feita a contratação de colaboradores e verificar quais as obrigações contratuais da empresa perante o colaborador. Dentre essas, destacamos algumas que exigiram da empreendedora especial atenção e a aquisição de um conhecimento até então não acumulado: redação do contrato de trabalho; piso salarial a ser adotado; bonificações a serem concedidas; descontos tributários que precisam constar da folha de pagamentos; valores de vale transporte e alimentação; regulamentação do período de férias e do 13º salário; insalubridade, periculosidade e todas as leis de segurança e saúde. É importante ressaltar ainda que a empreendedora procurou, nesse ponto, consultar bibliografia referente e especialistas acerca dos procedimentos práticos de seleção de recursos humanos. Em um passo seguinte, iniciou o processo de recrutamento e seleção, entrevistando pessoas que se candidataram às vagas disponíveis na Lavanderia. Destacam-se como desafios nessa tarefa a observação, durante a entrevista de aspectos como perfil, modo de falar, características principais de personalidade e experiências profissionais que o candidato já teve. 8º Passo: Compras A escolha dos produtos químicos levou em conta a necessidade de se encontrar um produto biodegradável que atendesse da melhor forma possível às requisições técnicas do equipamento utilizado (por exemplo, formas de uso, quantidade utilizada em cada processo e equivalência com a ficha técnica de cada produto). Já os acessórios foram escolhidos tendo em vista a questão da praticidade de uso e da estética que garantem ao acabamento final da peça no momento da entrega. Em ambas as situações, foi também utilizado como critério, assim como nos momentos anteriores, a melhor relação custo-benefício para a empresa. Essa condição, porém, não superou em importância a observação de quais produtos químicos e quais acessórios garantiriam à lavanderia a prestação de serviço de alta qualidade, com diferencial competitivo em relação ao que se vê no mercado local e servindo aos consumidores de forma a auxiliar no acréscimo de sua qualidade de vida. 9º Passo: Licenciamento ambiental Considera-se que o licenciamento ambiental do empreendimento merece ser tratado como um passo a parte. Tal perspectiva se dá porque o licenciamento é SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ fator fundamental para o funcionamento da lavanderia ao certificar, perante o poder público e a sociedade e utilizando normas estabelecidas como padrões, que a empresa está realizando os seus processos e serviços em conformidade com o meio ambiente. Sendo esse um empreendimento que, desde sua idealização, foi pensado para estar de acordo com o 7º ODM – Garantir a sustentabilidade ambiental – tal etapa do licenciamento ambiental é vista como um real marco histórico. Para obtenção do licenciamento, foi preciso a empreendedora conhecer a legislação ambiental; relacionar documentos de identificação da fauna e flora existentes na região do Distrito Recanto Maestro; verificar localização via GPS2 desse; descrever de forma pormenorizada os maquinários e produtos químicos utilizados nos processos; e apresentar a forma como os efluentes do processo produtivo são tratados e a maneira de descarte dos resíduos gerados pela Estação de Tratamento de Efluentes. Vencidas todas essas etapas, foi feita pelo órgão pertinente, a verificação dos documentos entregues e, tendo em vista o aceite dos mesmos, foi outorgado para a Lavanderia o licenciamento ambiental. O licenciamento comprova, portanto, que a empresa está contribuindo para a sustentabilidade ambiental e social no que diz respeito a todo o seu processo produtivo. Cabe ressaltar que foi preciso à jovem empreendedora enxergar com clareza a oportunidade de construir uma base econômica para si ao empenhar seu tempo e esforços profissionais no desenvolver do projeto dessa Lavanderia. Com humildade, construiu, passo a passo, o conhecimento técnico para alcançar sua meta empresarial. Porém, a atuação desta empreendedora só foi possível graças ao modelo de gestão adotado no Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro. O modelo de gestão desse Distrito tem, entre seus preceitos, a formação de jovens, pois se percebe a necessidade de estimular o empreendedorismo entre jovens no Brasil. A competitividade acirrada no atual mercado de trabalho, por vezes, dificulta o ingresso dos profissionais mais novos e sem experiência em grandes empresas. Também, o dar início a um empreendimento próprio requer recursos financeiros cuja falta, por vezes, inviabiliza a realização de um sonho. 5 Considerações Finais No Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro, o aspecto financeiro é solucionado da seguinte forma: os investidores que atuam empresarialmente no Distrito destinam uma parte de seus proventos para a criação de novas empresas e novos postos de trabalho. Assim, o Distrito cresce de modo cíclico e sustentável. Para apoiar o andamento de todas as empresas nele sediadas, o Recanto Maestro cultiva ainda uma rede de consultores técnicos que prestam serviços a todos os empresários, sendo esta composta por profissionais como advogados, contadores e arquitetos. No caso específico da montagem da Lavanderia foi acionado também o auxílio de uma consultora especializada nos campos do Direito Ambiental, Saúde e Medicina do Trabalho e da Conformidade de empresas com as normas e ISO’s3 de padrão de qualidade. Essa consultora é também uma profissional que já realiza atividades no Recanto Maestro e apoiadora de diferentes projetos nele realizados. O apoio dessa rede de consultores, bem como o aporte financeiro 3 2 GPS: Global Positioning System. ISO: International Organization for Standardization. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ prestado por outros empreendedores do Recanto Maestro demonstraram-se essenciais para o sucesso do início do empreendimento da Lavanderia. Portanto, percebeu-se que é recomendável para a empresa prever suas ações de responsabilidade social desde o primeiro planejamento organizacional. Conforme visto ao longo deste artigo, no caso do projeto da Lavanderia, o planejamento antecipado fez com que as ações de responsabilidade social se tornassem parte integrante de cada passo tomado na montagem desse estabelecimento de serviços. A adoção programada das ações de responsabilidade social permite também que, ainda nos primeiros meses ou anos de funcionamento da empresa, essas iniciativas sejam ampliadas atuando em outras frentes. No caso da Lavanderia, um próximo passo está previsto com a instalação de placas fotovoltaicas4. Ao planejar ações de responsabilidade social e observar a legislação pertinente a seu campo de atuação, a empresa acaba prevenindo-se também de futuros problemas que podem vir a ocorrer por desconhecimento de alguma norma ou até mesmo falta de motivação da equipe que não vê a corporação como organismo preocupado com a sociedade em que está inserida. É possível, ainda, falar nos benefícios que a responsabilidade social traz para o próprio desempenho da empresa, tais como fatores econômicos, sociais, qualidade de vida para o empreendedor, colaboradores e a sociedade como um todo. A ideia de referenciar neste trabalho os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela ONU advém, como já foi dito, da utilização que a Lavanderia irá fazer dessas metas como guias para o desenvolvimento de sua 4 A energia solar fotovoltaica é a energia elétrica que se obtém diretamente do sol. responsabilidade social. Com a aplicação dos ODM no dia-a-dia empresarial, percebeu-se que a responsabilidade social corporativa deve ser planejada com base em um panorama de ações que estão sendo desenvolvidas a nível nacional e internacional. Tal afirmativa se dá porque, dessa forma, o empreendedor pode verificar como sua empresa pode ou já está contribuindo para os 8 ODM. Ao relacionar às ações desempenhadas pela empresa aos 8 ODM, a empreendedora percebeu que essa Lavanderia beneficiará, principalmente, dois objetivos conforme já citado. Serve como modelo para o setor privado e demonstra que esse pode auxiliar amplamente a formação de jovens para o mercado de trabalho e a preservação da sustentabilidade ambiental. Ao estudar documentos como o 4º Relatório Nacional de Acompanhamento dos ODM, a empreendedora concluiu ainda que, se pudesse adicionar uma colaboração à lista de ODMs, seria a de que se criasse um objetivo em que estivesse claramente dita a dedicação à formação de jovens líderes5. Até porque, é notória a crise internacional que se dá entre os jovens já formados no ensino superior em busca do primeiro emprego, ou as dificuldades de jovens que ainda não entraram no mercado de trabalho em atestarem a experiência profissional exigida em muitas vagas. Quanto à sustentabilidade ambiental, conclui-se que é preciso considerar os recursos naturais como verdadeiras partes do “ativo da empresa”. 5 Draª Pamela Bernabei. Informação verbal de aula/curso. Data: 02 a 04 de abril de 2010, no Módulo Optativo do MBA – O Empreendedor e a Cultura Humanista, intitulado “Crises planetárias: soluções para os Objetivos do Milênio (ODM) propostos pela ONU e pela Escola de Formação Ontopsicológica”, ministrado pelos professores Drª Hanifa Mezoui, Dr. François Loriot e Drª Pamela Bernabei, Faculdade Antonio Meneghetti (AMF). SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ A partir do momento que essa prioriza as questões ambientais, é implícito o ganho para todos de maneira global, em aspectos tais como: ganho econômico, respeito e orgulho da sociedade perante o negócio, exemplo para outras empresas, mudança cultural da sociedade e uma melhor qualidade de vida. Quanto à formação da jovem gestora, percebe-se que essa se deu por meio da experiência prática em um ramo de negócios até então por ela desconhecido e também, de forma muito marcante, ao vivenciar o modelo de gestão desenvolvido no Recanto Maestro. Esse desenvolvimento foi apoiado pelo suporte financeiro oferecido por outros empresários que investem no crescimento do Distrito. As dúvidas e passos da criação do empreendimento puderam ser discutidas com uma rede de consultores técnicos mantida pelo Recanto Maestro para uso de todas as suas empresas. Foi por meio da troca de experiências com os empresários apoiadores do seu projeto, com os consultores técnicos e com todos os que trabalharam para o nascimento da Lavanderia, que a empreendedora foi fundamentando as ações a serem tomadas no caminhar de seu novo empreendimento. Desta forma, fica evidente que os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio são metas essenciais para o desenvolvimento da sociedade, pois identificam o ser humano, a sociedade e os recursos naturais como um conjunto integrado, onde cada objetivo tem um escopo específico, mas que integralizando as ações de todos o objetivos se obtém a harmonia do todo (ser humano, sociedade e meio-ambiente). Referências CAMPOS, V. C. TGC: Controle de qualidade total (no estilo japonês). Belo Horizonte: Fundação Christiano Ottoni, Escola de Engenharia da UFMG. Rio de Janeiro: Bloch Ed, 1992. FORTES, M. A ecologia e o novo padrão de desenvolvimento sustentável. São Paulo: Nobel, 1992. GARCIA, C. M. A ecologia e o novo padrão de desenvolvimento sustentável. São Paulo: Nobel, 1992. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2008. JACOBI, P. Caderno de Pesquisa, n. 118, São Paulo, mar. 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100 -15742 0100008&script=sci_arttext&tlng=es. Acesso: 20 abr. 2010. MASLOW. A. H. Maslow no gerenciamento. Rio de Janeiro: Qualitymark Ed, 2000. MENEGHETTI, A. A Psicologia do Líder Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008. MENEGHETTI, A. Cozinha Viva. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2006. MENEGHETTI, A. Pedagogia Ontopsicológica. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2005. OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO – PRINCIPAIS INICIATIVAS DO GOVERNO FEDERAL. 4º Relatório Nacional de Acompanhamento. Brasília: Ipea, 2010. RIGHES, A. A. Água no planeta: características, disponibilidade e ciclo hidrológico. In: RIGHES, A. A.; BURIOL, G. A.; BOER, N. A água e educação: princípios e estratégia de uso e consercação. Santa Maria: Centro Universitário Franciscano, 2009. ROCCO, V. Auto-sustento: O primeiro dever de um jovem. Revista Nuova Ontopsicologia, n. 1/2006, maio, 2006. SCHEIN, E. D. O líder do futuro. Visões, estratégias e práticas para uma nova. São Paulo: Futura, 1996. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ SCHUTEL, S. Capacidade à prática líder. Revista Nuova Ontopsicologia, n. 1/2006, maio. 2006. YOSHIMOTO, T. Qualidade, produtividade e cultura: o que podemos aprender com os japoneses. São Paulo: Saraiva, 1992. Autores: Lilian Werner Philippi da Silva: empreendedora/administradora, graduação em Turismo-Gestão Hoteleira (UNISUL), graduanda em Administração (AMF), Especialista em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Soraia Schutel: administradora, professora da Faculdade Antonio Meneghetti (AMF); Mestre em Administração (UFSM); doutoranda em Administração (UFRGS). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 20/12/2010. SILVA, Lilian W. P. da; SCHUTEL, Soraia. Desenvolvimento do jovem líder e sustentabilidade econômica-social-ambiental: um estudo de caso da Lavanderia Acquachiara. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 91-104, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Residence de Autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens Ana Paula Mariano Pregadier Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Josiane Beatriz Piccin Barbieri Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) [email protected] Resumo: Este trabalho é o produto de uma pesquisa realizada com jovens abordando o tema autossustento. Teve como objetivo identificar a relação entre a compreensão dos jovens sobre o autossustento e a suas atitudes práticas entre aqueles que participam do Residence de Autenticação e aqueles que nunca tiveram esta vivência. O problema de pesquisa centrou-se na investigação do Residence de Autenticação como elemento facilitador e funcional, para o jovem, na conquista do autossustento. O Residence de Autenticação é um instrumento de intervenção da Escola Ontopsicológica, que consiste em um estágio full immersion, dirigido a grupos com diversificados interesses, de duração de três a sete dias, período no qual é realizada uma revisão crítica da consciência dos participantes. É composto por atividades práticas (visam evitar a dissociação entre fazer e pensar), metanoia interior (ação de reconduzir o sujeito a sua intencionalidade de natureza) e formação intelectual (dá uma base concreta e racional à ação do Residence). A pesquisa, de cunho qualitativo e quantitativo, foi realizada nos meses de março e abril do ano de 2009, com 82 jovens. Destes, 41 já haviam participado do Residence de Autenticação (G1) e 41 que nunca participaram e não conheciam tal instrumento de intervenção (G2). A coleta de dados foi realizada em duas etapas: a) questionário constituído por 39 questões objetivas e quatro questões discursivas – aplicado a todos os pesquisados; b) questionário constituído por nove questões objetivas e uma discursiva – aplicado apenas aos jovens que já haviam participado do Residence de Autenticação. Os dados demonstraram que, para ambos os grupos, o conceito de autossustento é o mesmo: “Ter independência, pagar todas as suas contas e ter liberdade”. No G1 observou-se coerência entre o conceito expresso e as atitudes dos jovens, ou seja, os mesmos 68% pesquisados que afirmaram se autossustentar, arcavam com todos os seus custos. Já, no G2, verificou-se incoerência entre o conceito expresso e as atitudes, pois 76% afirmaram se autossustentar, mas apenas 43% arcavam com todos seus custos. Sendo o Residence de Autenticação um instrumento que influencia positivamente na formação de jovens, é pertinente afirmar, com base nos resultados obtidos através desta pesquisa, que o seu uso, aliado à tomada de consciência do jovem sobre sua responsabilidade pessoal e social, favorece a conquista do autossustento. Palavras-chave: residence de autenticação; autossustento; jovem. Abstract: The current work is the result of a research fulfilled with young people concerning the self-sustainability. One of its goals was to identify the correlation between the young people understanding of self-sustainability and its practical aspect, PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. 105 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ among those who have participated in Authentication Residences and those who have not. The research focused on the investigation of the Authentication Residence as a functional element that facilitates the achievement of self-sustainability by the young person. The Authentication Residence is an instrument of the Ontopsychological School that consists of a full immersion course that aims to fulfill a critical review of the participants‟ consciousness. The duration is about three to four days and it is directed to people with an array of different interests. It comprehends practical activities (which intend to avoid the disassociation between thinking and doing), internal methanoia (process of retrieving the subject to his/her nature intentionality) and intellectual training (which gives a concrete and rational basis to the activities fulfilled during the Residence). The qualitative and quantitative aspects of the research were gathered in March and April of 2009 after a survey that analyzed 82 young people. Among those, 41 have already participated of an Authentication Residence (G1) and 41 have not and were unfamiliar with this instrument (G2). The data was gathered in two different moments: a) a questionnaire that consisted of 39 multiple choice questions and 4 open questions – applied with all researched people; b) a questionnaire that consisted of 9 multiple choice questions and 1 open question – applied only with those young people who have already participated in any Authentication Residence. The data demonstrate that, in both groups, the understanding of self-sustainability is the same: “Being independent, free and able to pay all the bills”. In G1 it was possible to detect coherence between the concept understanding and their attitudes, that is, all of those 68% that affirmed to be self-sustained, indeed were responsible for all their expenses. In G2, on the other hand, it was verified a divergence between the concept understanding and their attitudes: 76% affirmed to be self-sustained, but only 43% of whom were indeed responsible for all their expenses. Being an instrument that positively influences the young people‟s education, based on the results obtained throughout this research, it is possible to affirm that the Authentication Residence, along with the young person‟s comprehension of his/her social and personal responsibility, facilities the achievement of self-sustainability. Keywords: authentication residence; self-sustainability; young. 1 Introdução A preocupação com a formação do jovem e sua preparação para a vida adulta desperta a atenção e se apresenta como um tema contemporâneo importante para o desenvolvimento da vida do indivíduo e da sociedade. Hoje, quando consideramos a formação de um indivíduo jovem, é necessário observar mais fatores do que apenas a sua faixa etária. Se tomarmos como referência Osório (1989), Havighurst (citado por Ferreira, 1984), e Meneghetti (2005c), estes, além das características de maturação físicas e biológicas, definem como fundamentais os elementos de maturidade relacionados ao desenvolvimento psicológico, profissional e de autonomia, que determinam a transição da fase infantil para a fase adulta. Contemporaneamente às mudanças físicas que acontecem nesta transição, o jovem experimenta novas necessidades que despertam a atenção e a urgência em satisfazê-las. A inquietude causada por essas novas percepções traz à consciência ideias que até então apenas eram consideradas em jogos ou brincadeiras infantis, como por exemplo, trabalhar, ter a sua casa, dirigir um carro, ter um relacionamento e uma família (OSÓRIO, 1989). Entre as características dessa fase, a consciência da própria identidade e o desenvolvimento de um estilo de vida funcional a si (MENEGHETTI, 2003), são fatores relevantes e que estão interligados, onde é difícil alcançar a conquista plena de um, sem o desenvolvimento do outro. O mesmo tipo de interrelação ocorre quando PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ observamos a questão da conquista do autossustento e do trabalho. A atividade laborativa representa para o jovem um desafio, pois além de dar início à conquista do autossustento e auxiliar na ambientação ao mundo adulto, exige que o jovem assuma uma postura de autonomia e responsabilidade, arcando com as consequências geradas pelas suas escolhas. Para Rank: A grande conquista do adolescente está na aquisição de sua independência, que se realiza através da atuação de uma vontade consciente (RANK citado por FERREIRA, 1984, p. 59). Um aspecto que influencia no amadurecimento e dificulta a transição do jovem à fase adulta é abordado por MENEGHETTI (2005a): Alguém sempre decidiu por ele, alguém sempre lhe deu mais do que pedia e, nesta oferta aparentemente de amor, o ser humano estabiliza a sua personalidade como cristalização de comportamentos infantis, ao invés de evoluir em crescimento, autonomia e liberdade (MENEGHETTI, 2005a, p. 45). Para o desenvolvimento desta autonomia, faz-se necessária a responsabilização do jovem pelo seu crescimento. Por responsabilidade entendese a obrigação de responder pelas ações próprias ou de outros (HOUAISS, 1978). Portanto, trata-se de um conceito que diz respeito ao próprio indivíduo, que assume o papel de protagonista, respondendo em primeira pessoa pelas diversas situações com as quais se depara e colhendo seus resultados. Assim, a conquista do autossustento é uma tarefa de responsabilidade pessoal, que impõe ao jovem a necessidade de conhecer a si mesmo e agir de forma a construir meios históricos propícios para a sua realização, segundo sua identidade. Essa postura de autonomia e responsabilidade do jovem torna-se cada vez mais premente no contexto do trabalho, e isto se deve ao atual e dinâmico mercado competitivo, que exige das empresas um alto nível de qualidade e qualificação de seus colaboradores, não sendo mais possível esperar que as pessoas recémcontratadas se tornem suficientemente experientes até exercerem plenamente suas atividades, além de requerer cada vez mais rapidez para estas atingirem um bom nível de autonomia (FOIL, 2007). Neste sentido, o residence de autenticação pode ser um instrumento extremamente útil e funcional para o desenvolvimento da autonomia e responsabilidade dos jovens, os quais, a partir desta vivência, têm a oportunidade de adquirir uma consciência reversível com a realidade mercadológica, onde deverão atuar com competência e competitividade. 2 Fundamentação Teórica 2.1 Desenvolvimento e formação do jovem Viver em sociedade implica interação com outras pessoas, por esse motivo o momento de tomada de decisão é importante, pois um indivíduo, quando escolhe, afeta a sua vida e a de outros. Por isso, para o jovem, ter a consciência da responsabilidade de suas escolhas pode ser decisivo, principalmente no que diz respeito à atuação do seu próprio potencial. A formação do indivíduo é o desenvolvimento e atuação do potencial existente em si mesmo. Esse conceito de potencial refere-se a um possível, um predisposto pela natureza que só se faz real se for atuado. Para Aristóteles (2006), “a natureza nos dá a capacidade de recebê-las (virtudes), e tal capacidade se aperfeiçoa com o hábito” (ARISTÓTELES, 2006, p. 40). Assim como para Meneghetti (2006): PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Toda individuação tem o potencial necessário para atingir a autorrealização (...). É possível alargar o potencial através de uma adequada estrutura, que deriva das escolhas que o indivíduo faz: cada escolha entra em um jogo de escolhas já existentes, portanto, é determinada pelas escolhas precedentemente atuadas (MENEGHETTI, 2004, p. 274). Segundo Meneghetti (2004), “o indivíduo faz a si mesmo toda vez que atua o potencial como fato realizado” (p. 274). Se as escolhas são coerentes com o previsto pelo potencial e de acordo com o ambiente onde o sujeito se encontra, incrementa sempre mais o potencial, criando assim uma espiral ascendente evolutiva. Do contrário, se as escolhas feitas não são otimais, o potencial diminui progressivamente ou, caso o indivíduo permaneça na indecisão, evitando a responsabilidade da escolha, a situação anula o indivíduo, que se torna espaço de escolhas alheias. (MENEGHETTI, 2004). Nesse sentido, o indivíduo determina o próprio universo todas as vezes que age ou não age. Dessa forma, aprender a conquistar seu autossustento de forma responsável e sustentável, além de ser um exercício de desenvolvimento e crescimento para o jovem, é um benefício prestado para o progresso e avanço da sociedade, pois a partir da conscientização e responsabilização de cada indivíduo, pode ser possível a construção uma sociedade mais humana, capaz de perpetuar os recursos necessários ao bem estar das gerações vindouras. 2.1 O Residence de Autenticação Por ser um instrumento de formação e aperfeiçoamento de características que favorecem a autonomia e independência do indivíduo, o residence de autenticação foi escolhido como objeto de análise para identificar se pode ser funcional e beneficiar o jovem na obtenção do seu autossustento. O residence de autenticação é um instrumento de intervenção da Ciência Ontopsicológica que tem como função a autenticação da consciência do indivíduo, consentindo que esta esteja em conformidade com sua identidade. A exatidão da consciência favorece o sujeito na percepção das opções ótimas para si e minimiza a interferência de preconceitos ou referências externas que não condizem com a sua específica realidade e não fazem função ao seu crescimento, desenvolvimento e realização (MENEGHETTI, 2001). Autenticação significa que aquele homem, naquela idade, segundo uma logística de como a natureza o posicionou, o temperamento e os dotes que lhe deu, deve chegar a uma certa quota de maturidade: o Eu lógico-histórico10 deve ser correspondente ao previsto pelo desenho operativo da natureza naquele sujeito. (MENEGHETTI, 2004, p. 333). Segundo Meneghetti (2005b), a verificação existencial à qual o jovem se depara durante a participação de um residence de autenticação, é uma autoobservação profunda sobre a funcionalidade de cada uma das suas atitudes e posicionamentos, analisando os resultados correspondentes e se reposicionando caso seja necessário. Tratase de uma investigação sobre o seu estilo de vida, se é correspondente ao necessário para a plena atuação de seu potencial, aqui e agora, ou seja, no contexto e no momento histórico em que se encontra. “Residence” é um estágio full immersion com duração de três a sete dias, direcionado a um grupo selecionado de pessoas, durante o qual é efetuada uma verificação existencial. Enquanto instrumento psicossocial e ambiental, é marcado sobre a necessidade dos participantes de realizar um Eu lógicohistórico mais côngruo a si mesmo e funcional dentro do espaço comunitário no qual esses convivem: é uma contemporaneidade baseada sobre dois PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ fulcros: “o Iso e o social” (MENEGHETTI, 2005b, p. 21). Um residence é constituído por: a) atividades práticas que visam corrigir o comportamento do sujeito e evitar dissociação mental entre fazer e pensar, que de fato reduz o potencial da pessoa; b) metanóia interior, isto é, a ação de reconduzir o indivíduo ao seu ponto fundante, à sua intencionalidade de natureza, a qual – uma vez ativado – libera uma enorme capacidade de realização; c) formação intelectual contemporânea às dimensões precedentes e necessárias para dar uma base concreta e racional à ação do residence (MENEGHETTI, 2005b, p. 22). Entre os pressupostos de um indivíduo para a participação em um residence de autenticação, recomenda-se já ter um preparo psicológico através de um training ontopsicológico, que tenha compreensão dos termos e conceitos da Ciência Ontopsicológica e a disponibilidade à mudança/metanoia que, além da mudança de mente, constitui numa atitude de transformação que se reflete no comportamento e hábitos do sujeito. Segundo Meneghetti (2005b): O residence ontopsicológico é constituídos por cinco aspectos que o caracterizam e o especificam como instrumento de colocar no ponto existencial (MENEGHETTI, 2005b, p. 23). Estes 5 pontos são: 1) A análise psicológica do sujeito: utilizando as cinco análises diagnósticas com o objetivo de identificar o escopo segundo a identidade de cada sujeito; 2) O ambiente: o local escolhido deve ser ecologicamente saudável, simples, culturalmente humanista e feito para uma convivência serena; 3) Convivência profissional com um psicoterapeuta: durante alguns dias, que como técnico específico, coordena a dinâmica do residence; 4) Convivência ecológica: de forma a retomar o contato com a lógica da natureza da vida; 5) Individuação da especificidade do sujeito: segundo a forma do próprio Em Si ôntico. Ainda, conforme Meneghetti (2005b), entre os efeitos do residence, devido ao indivíduo estar centrado em seu ponto fundante, começa-se a obter resultados funcionais em todas as esferas da existência, desde que haja coerência no estilo de vida, que deve ser readequado à nova realidade que o sujeito conscientizou. 2.2 Porque estudar Autenticação o Residence de Essa pesquisa nasceu através da constatação de que a conquista da autonomia por parte dos jovens vêm se tornando sempre mais tardia, os quais permanecem mais tempo dependentes financeiramente da família. Segundo pesquisa realizada pela Escola Nacional de Ciência Estatística, órgão do IBGE, disponível no site do Sebrae-RJ, um quarto dos filhos que moram com os pais no Rio de Janeiro-RJ tem mais de 30 anos, sendo que: 29% dos adultos solteiros com mais de 30 anos moram com os pais, e, entre todos os filhos que moram com os pais, um quarto tem mais de 30 anos, sendo mais da metade (54%) homens, ao contrário do que se poderia imaginar. Esse é um fenômeno mundial. Nos EUA, por exemplo, é muito grande o número de filhos que voltam a morar com os pais depois de se formarem em universidades fora de seus estados, dai a expressão bumerangue (SEBRAE, 30/09/2008). 3 Metodologia Partindo dessa premissa, a formação dos jovens torna-se uma questão primordial para o desenvolvimento não apenas do PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ indivíduo, mas da sociedade como um todo. Isso porque, a partir de como se forma uma geração de jovens, apresenta-se a nova geração de adultos que estará à frente do mercado global público e privado. Portanto, uma formação de jovens que possibilite o desenvolvimento de uma forma mentis social e economicamente responsável torna-se imprescindível para a construção de uma sociedade autossustentável, em constante evolução e crescimento em prol do humano. Este artigo trata de uma investigação a cerca de como os jovens encaram e vivenciam o autossustento, e se o residence de autenticação consiste em uma ferramenta funcional a essa conquista. Os dados levantados para esta pesquisa foram obtidos através da aplicação de um questionário realizado com jovens na faixa etária de 17 a 32 anos, que para fins de análise estão separados em dois grupos: grupo um (G1), composto por 41 jovens de vários estados brasileiros, que já participaram de pelo menos um residence de autenticação; grupo dois (G2), composto por 41 jovens que nunca participaram de um residence de autenticação. O questionário utilizado para a coleta de dados foi composto por 39 questões objetivas e quatro questões discursivas, aplicado a todos os sujeitos da pesquisa, e um questionário adicional constituído por nove questões objetivas e uma discursiva, aplicado apenas aos que já haviam participado de um residence de autenticação. A aplicação do instrumento foi feita através do envio por email durante os meses de março e abril de 2009 para os sujeitos de ambos os grupos, que preferiram essa forma de comunicação, ou através de questionário impresso. O questionário impresso foi aplicado ao G1 durante o residence de autenticação nos dias 13, 14 e 15 de março de 2009, no Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro, localizado no Distrito Recanto Maestro, em São João do Polêsine-RS e, para o G2, nos dias nove, 10, 14 e 20 de abril de 2009, na cidade de São Paulo-SP. Todos os pesquisados responderam de forma voluntária e anônima ao questionário. Através dos dados obtidos, foi possível identificar o perfil da amostra e conhecer sua percepção sobre o conceito de autossustento, a relação deste com as atitudes adotadas pelos jovens e verificar se existe diferença nessa relação (conceito/atitude) entre os grupos pesquisados. Etapas realizadas para a análise de dados: 1) Identificação da amostra: identificação das características biográficas, sociométricas e sobre qual é o conceito os jovens pesquisados têm sobre o autossustento. 2) Relação entre conceito e atitude: identificação das atitudes dos jovens em relação à responsabilidade dos seus custos. Verificação da relação e análise entre as respostas das perguntas “Você se autossustenta?” e “Quem arca com seus custos de moradia, alimentação, vestuário e diversão?” O objetivo foi verificar se existe coerência entre a afirmação dos jovens de se autossustentar e a realidade vivenciada pelos mesmos. 3) Resultados percebidos após o residence de autenticação: identificação dos resultados percebidos pelos jovens após a participação no residence de autenticação. 4 Resultados 4.1 Caracterização da amostragem 1) Características biográficas: a amostra compõe-se de 82 jovens, classificados para fins de pesquisa, em dois grupos de acordo com o critério: ter vivenciado (G1) ou não (G2) a experiência PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ de um residence de autenticação. Verificou-se que, para o G1, as características principais são: faixa etária de 26 a 28 anos, sexo masculino (59%) e ainda estudam. E para o G2: faixa etária de 29 a 32, do sexo feminino (51%) e ainda estudam. 2) Análise de Escolaridade: existe, em ambos os grupos, a predominância de jovens que cursam ou já concluíram o ensino superior e que cursam ou já concluíram algum tipo de curso de pósgraduação, especialização ou MBA. No terceiro lugar de representatividade, temos uma inversão: para o G1 temos jovens com mestrado e doutorado em curso ou já completos e, para o G2, o terceiro resultado mais representativo são jovens com o ensino médio em curso ou completo. 3) Atividade Laborativa: para a questão “Você trabalha?”, para ambos os grupos foi verificado o mesmo resultado, onde 90% dos jovens de cada grupo responderam que trabalham, e 10 % que não trabalham. 4) Atitude de autossustento: analisando os jovens que trabalham, foi questionado: “Você se autossustenta?” e identificou-se, segundo a visão dos próprios jovens, que no G1 são 25 jovens (68%) e, no G2, 28 jovens (76%) se autossustentam. 5) Atitudes perante os custos de diversão, vestuário, moradia e alimentação: aos jovens que responderam que se autossustentam, foi questionado sobre quem arcava com suas despesas de diversão, vestuário, moradia e alimentação. Essas perguntas têm por objetivo analisar a relação e a coerência com a resposta dada na pergunta “Você se autossustenta?”. 6) Entendimento sobre Autossustento: no questionário a questão aberta: “Para você, se autossustentar significa:”, teve o objetivo de identificar qual o conceito de autossustento que os jovens possuem e se essa compreensão se reflete nas respostas sobre quem arca com seus custos (Figura 3). A tabulação dos dados foi feita a partir da quantidade de vezes que o conceito/palavra se repetiu, método que permitiu identificar quais conceitos melhor representam para o jovem o autossustento. 4.2 Relação entre conceito e atitude A partir do questionário aplicado e da tabulação dos dados, pode-se observar que o conceito percebido pelos jovens sobre autossustento tem uma convergência de ambos os grupos para uma mesma percepção. Na visão destes jovens, autossustento significa principalmente ter independência, poder pagar todas as suas contas e ter liberdade de escolha para poder alcançar os seus objetivos. Para haver coerência entre o conceito descrito e a atitude perante o autossustento, o percentual de jovens que arcam com seus custos deve ser sempre igual ou superior ao percentual de jovens que se autossustenta. No G1 verifica-se coerência entre o conceito de autossustento e as atitudes referentes à responsabilidade pelos custos com alimentação, moradia, vestuário e diversão, já que o percentual de jovens que arca com cada segmento de seus custos é sempre maior ou igual ao percentual de jovens que declara se autossustentar. Para o G2 se evidencia uma situação distinta, pois o percentual de jovens que arca com todos os seus custos é inferior ao percentual que declara se autossustentar, o que evidencia uma incoerência entre conceito e atitude para o autossustento. Essa incoerência fica confirmada quando é observada a figura 5 que demonstra quem arca com os custos dos jovens do G2. Do total de 41 jovens pesquisados, 28 declararam se autossustentar e apenas 16 destes são responsáveis por todos os seus custos PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ (moradia, alimentação, diversão e vestuário). Os demais 12 jovens, que declararam se autossustentar, não arcam com seus custos de alimentação e moradia. A partir desta análise, é demonstrado que, em parte do G2, existe uma situação de incoerência entre o que jovem pensa e acredita e o que de fato ele vive. Isso porque, mesmo entendendo autossustento como pagar todas as suas contas e declarar se autossustentar, ele não é o responsável por todos os seus gastos. Rocco (2006) no artigo “Autossustento: o primeiro dever de um jovem”, já aborda essa situação. A satisfação das necessidades básicas de sobrevivência como moradia e alimentação são encaradas como um dever dos pais, ficando como responsabilidade dos jovens apenas os seus gastos pessoais, e mesmo aqueles que arcam com todos seus custos, na maioria já estão acostumados a poderem sempre recorrer ao auxílio de seus pais quando necessário. Para Meneghetti (2007), essa forma de perceber a responsabilidade dos seus gastos leva a uma divergência entre o quê que o jovem pensa e o quê de fato vive em sua realidade cotidiana, sendo que esta se reflete e influencia em seu posicionamento e atitudes perante as ocorrências com as quais se defronta no mercado de trabalho. 4.3 Resultados percebidos após o residence de autenticação Para os jovens do G1, foi questionado sobre quais os resultados perceberam após a primeira participação em um residence. Os resultados mais percebidos são: melhoria no trabalho e na área financeira, desenvolvimento e crescimento, e foco nos objetivos e escolhas. A tabulação dos dados foi feita a partir da quantidade de vezes (frequência) com que o conceito/palavra se repetiu nas respostas fornecidas pelos pesquisados. Sendo o residence um instrumento para a autenticação da consciência do indivíduo, com o objetivo de ser função ao seu crescimento e desenvolvimento, e a partir das respostas obtidas nessa pesquisa, é pertinente afirmar que este influencia vantajosamente o posicionamento do jovem diante de seu autossustento. Para estes jovens, o conceito de autossustento, além de ser consciente, é aplicado ao dia-a-dia de forma a propiciar um estilo de vida funcional à conquista de seu desenvolvimento. 5 Considerações Finais Por meio da análise dos dados obtidos, podemos concluir que: a) Conceito percebido pelos jovens sobre o autossustento: observa-se a convergência de ambos os grupos para o mesmo conceito sobre o autossustento. Na visão dos jovens pesquisados, autossustento significa: ter independência, poder pagar as suas contas e ter liberdade de escolha para alcançar os seus objetivos. b) Coerência entre conceito percebido e atitudes para o autossustento: no G1 foi identificada coerência entre o conceito percebido e as atitudes adotadas perante o autossustento, pois os 25 jovens que declararam se autossustentar são os responsáveis por todos os seus custos. Já, para o G2, observou-se incoerência entre conceito e atitude, pois apenas 57% dos jovens que declaram se autossustentar são de fato responsáveis por todos seus custos. c) Utilização do residence de autenticação como instrumento funcional à conquista do autossustento: comparando as respostas dos grupos pesquisados – nas quais G1 expressa coerência e reversibilidade entre o conceito percebido e as atitudes adotadas – e G2, nas quais 43% dos jovens responderam se autossustentar e PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ não arcam com todos seus custos, pode-se afirmar que o residence de autenticação pode ser um instrumento funcional ao jovem para a aquisição de seu autossustento. Este instrumento de intervenção da Ciência Ontopsicológica auxilia o desenvolvimento e a formação de uma conceituação reversível com as atitudes e escolhas do jovem e com os resultados práticos de sua vida. Ao realizar essa pesquisa, verificouse que o autossustento é um dos pontos bases para o amadurecimento, e que a relação conceito e atitude nem sempre é clara para os jovens que, em alguns casos, acreditam viver uma situação, sendo que de fato experimentam outra. Ao longo deste estudo, percebe-se que existem campos de atuação e pesquisa que podem ser abordados e utilizados em vantagem do jovem e do mercado empresarial, pois a clareza na verificação dos fatos, o desenvolvimento da responsabilidade e a autonomia dos indivíduos são fatores prementes para o atual cenário competitivo. Posicionado o residence de autenticação como um instrumento de formação que favorece o incremento dessas características, este pode ser utilizado como uma metodologia de qualificação e aperfeiçoamento do jovem e de aceleramento de seu amadurecimento para o ingresso no mundo do trabalho e para a idade adulta. Ainda assim, para a ampla ratificação das conclusões obtidas neste trabalho, consideramos pertinente realizar a mesma pesquisa com outras amostragens. Referências ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006. FERREIRA, B. W. Adolescência. Teoria e pesquisa. 2. ed. Porto Alegre: Sulina,1984. FOIL. Formação Ontopsicológica Interdisciplinar Liderística (Org.). Psicologia Managerial. 2. ed. São Paulo: FOIL, 2007. HOUAISS. Pequeno Dicionário Koogan Larousse. Rio de Janeiro: Larousse do Brasil, 1979. MENEGHETTI, A. A arte de viver dos sábios. 3. ed. Florianópolis: Ontopsicologica Editrice, 2003. MENEGHETTI, A. Dicionário de Ontopsicologia. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2001. MENEGHETTI, A. Manual de Ontopsicologia. 3. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2004. MENEGHETTI, A. O Aprendiz Líder. Tradução e organização FOIL. São Paulo: FOIL: 2005a. MENEGHETTI, A. O Residence Ontopsicológico. 3. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2005b. MENEGHETTI, A. Pedagogia Ontopsicológica. 2. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2005c. OSORIO, L. C. Adolescente Hoje. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. ROCCO, V. Autossustento: o primeiro dever de um jovem. Revista Nova Ontopsicologia, n. 1, p. 8-15, maio. 2006. SEBRAE. Filhos morando mais tempo com os pais. 30/09/2008. Disponível em: http://www2.rj.sebrae.com.br/boletim/filhosmorando-mais-tempo-com-os-pais/Acesso em: 08 de mar. 2010. Autores: Ana Paula Mariano Pregardier: administradora, Especialista em Gestão de Negócios e Intuição(AMF); Especialista MBA em Gerenciamento de Projetos (FGV). Josiane Beatriz Piccin Barbieri: consultora, psicóloga; Especialização em Psicologia com abordagem em Ontopsicologia (UESP); professora da Faculdade Antonio Meneghetti (AMF); Mestranda em Filosofia (PUC-SP). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 21/12/2010. PREGADIER, Ana Paula M.; BARBIERI, Josiane. Residence de autenticação: relação entre conceituação e exercício do autossustento em jovens. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 105-113, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 __________________________________________________________________________________________________ Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas Joana de Jesus Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Adriane Maria Moro Mendes Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) [email protected] Resumo: O presente trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa realizada entre os meses de maio e junho de 2009 com profissionais envolvidos diretamente em processos de vendas. O objetivo da pesquisa foi verificar se vendedores de bom desempenho consideravam-se intuitivos, se usavam essa intuição durante o processo de vendas, e se, o que eles classificavam como intuição, era coerente com os conceitos sobre intuição estudados nesta pesquisa. A revisão bibliográfica perpassa obras na área de Marketing e Vendas analisando essas funções sob ótica humanista. Em seguida são revisados alguns estudos sobre o ser humano, especialmente no tema da intuição, buscando os principais fatos históricos dessa construção de conhecimento em autores como Sigmund Freud, Carl Jung entre outros, realizando um comparativo entre as teorias desenvolvidas durante os séculos XVIII e XX, categorizadas nesse texto como teorias clássicas, e os estudos mais recentes cujo principal autor é Antônio Meneghetti. E por fim, o confronto dos conteúdos bibliográficos com os resultados da pesquisa realizada, propondo uma reflexão sobre o tema da intuição de modo científico. Palavras-chave: intuição; vendas; marketing; inconsciente. Abstract: This paper presents the results of a survey conducted between the months of May and June 2009 with professionals directly involved with sales. The research objective was to determine whether vendors performed well regarded themselves as intuitive, this insight is used during the sales process, and what they classified as intuition, was consistent with intuition about the concepts studied in this research. The literature review permeates works in marketing and sales functions in analyzing these humanist perspective. They are then reviewed some studies on humans, especially in the topic of intuition, seeking the main historical facts of this construction of knowledge by authors such as Sigmund Freud, Carl Jung and others, making a comparison between the theories developed during the eighteenth and twentieth Categorized in this text as the classical theories, and recent studies whose main author is Antonio Meneghetti. Finally, a comparison of bibliographic content with the results of research, proposing a reflection on the topic of intuition in a scientific way. Keywords: intuition; sales; marketing; unconscious. * Texto publicado nos Anais do VII Convibra – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – 19 a 21/11/2010. JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. . 114 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 1 Introdução A atividade de vendas é realizada por diversos colaboradores dentro de uma empresa e não é exclusiva da equipe que está designada com foco na função de vender. Esta atividade é responsável por viabilizar a entrada de recursos e lubrificar todo o aparato empresarial e econômico. Sem recursos financeiros nenhuma boa ideia vai adiante. Nesse sentido, a venda cumpre uma função de grande destaque. No ato de vender existe uma intensa relação entre pessoas, ainda que sejam representadas pelas ferramentas que hoje a tecnologia proporciona. A intenção de cada parte, seja cliente ou fornecedor, está sempre presente, mesmo que inconscientemente. No final, sempre um “alguém” decide o que comprar e outro “alguém” decide como agir para vender. Em síntese, vender é um ato de relação humana com um escopo econômico, e como toda a relação humana apresenta aspectos racionais e não racionais. Os aspectos racionais são estudados através de modelos científicos que buscam descrever e analisar os processos de vendas cujos resultados obtidos vão até certo ponto. Os aspectos não racionais colecionam séries de estudos científicos e não científicos e suscitam a curiosidade visto que tratam sobre o pouco conhecido de cada um de nós. Estudar o uso da intuição no processo de vendas é, em primeiro lugar, aplicar racionalidade sobre um tema que ainda é abordado de modo confuso em diversas áreas. Este é um tema que se faz muito presente na leitura corrente, em revistas populares, artigos científicos e mídias. Em segundo lugar é uma provocação ao pesquisador posicionado contemporaneamente como instrumento e objeto de pesquisa. Este artigo objetiva pesquisar se vendedores de bom desempenho consideram-se intuitivos, se pensam fazer uso da intuição no processo de vendas, e se o que é entendido por eles como intuição é coerente com os conceitos sobre intuição estudados, mediante diversos autores, nesta pesquisa. Com esses objetivos, o presente artigo faz uma breve revisão sobre os principais conceitos da moderna gestão de vendas, dando ênfase principalmente aos pontos onde prepondera o fator humano, através de obras de autores da área de Marketing e Vendas. No que concerne ao estudo do ser humano, especialmente o tema da intuição, perpassa alguns fatos históricos, buscando um pouco da sua origem em cientistas como Sigmund Freud, Carl Jung entre outros, realizando um comparativo entre as teorias desenvolvidas durante os séculos XVIII e XX categorizadas nesse texto como teorias clássicas e os estudos mais recentes cujo principal autor é Antônio Meneghetti. 2 Fundamentação Teórica 2.1 Gestão e processo de vendas No contexto da moderna gestão de vendas, o foco tem estado nos seguintes pontos chaves (COBRA e TEJON, 2007): 1. Gestão de canais de marketing: gestão da via percorrida para que o produto chegue o mais rápido possível ao consumidor final. Por ex.: distribuidores, atacadistas, varejistas, etc. 2. Gestão de inteligência de vendas: é o processo de captura de informações que auxiliam na decisão sobre o que e onde vender. Apóia-se entre outros pontos, no relacionamento do vendedor com os seus clientes. 3. Gestão de produtos: é a contribuição que a gestão de vendas faz JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ no desenvolvimento de produtos que atendam as necessidades do mercado e estes variam constantemente. 4. Gestão de clientes: administrar a carteira de clientes. 5. Autogestão: trata da manutenção da motivação e da competência para enfrentar novos desafios. 6. Gestão financeira: gestão de desempenho, ou seja, estabelecer parâmetros e checar resultados. Toda a venda acontece mediante um processo. Processos são atividades sequenciais, predeterminadas, sistematizadas e repetíveis que têm como objetivo a transformação de algo em outro com mais eficiência. Sendo assim, o processo de vendas é constituído de uma série de atividades que visam à transformação dos esforços para vender em resultados mais eficientes através de atividades que aumentem as probabilidades de sucesso. Tendo como consequência, a melhoria dos lucros e a redução dos custos de venda de uma organização (ROMEO, 2008). Os benefícios de se dispor da estruturação no processo de vendas são diversos, como destaca Romeo (2008): - Aumento da velocidade na concretização dos negócios; - Alcance de resultados concretos superiores de vendas; - Aumento da exatidão nas previsões de concretização de vendas; - Unificação da linguagem de vendas, portanto, o aumento da cooperação entre as pessoas internas e externas da organização; - Redução dos custos de vendas; - Aumento da capacidade de inspeção e controle; - Melhoria da qualidade de vida dos envolvidos na venda, uma vez que os esforços despendidos são mais assertivos; - Melhoria no relacionamento com os clientes, baseando as abordagens em processos mentais e psicológicos da tomada de decisão e adquirindo maior capacidade de compreensão da pessoa que está diante do agente de vendas. O ciclo de negociação, segundo Romeo (2008), pode ser dividido em três estágios e cada estágio é interpretado segundo a ótica do vendedor ou do comprador. Considerando esses dois aspectos em paralelo, é possível entender qual a função complementar do agente de vendas a cada momento. 2.2 Vendedores e compradores são seres humanos Quando uma empresa grande ou pequena faz uma decisão de compra de qualquer natureza e através de qualquer mecanismo, há sempre por trás a decisão de uma pessoa, um ser humano diz o “sim” ou o “não”. Os clientes, portanto, precisam ser vistos como pessoas, que preferem relacionamentos focados em “toques humanos” desenvolvidos através das interações realizadas ao longo do tempo. As pessoas compram para sair da situação em que se encontram e chegar àquela em que gostariam de estar no futuro. O vendedor habilidoso ajuda o cliente a esclarecer o seu estado atual e o desejado, dando alternativas de passagem de um para o outro e os custos dessa atitude. No espaço entre onde estão e onde querem chegar, encontram-se as suas necessidades. Essas necessidades, no entanto, são modificadas por seus valores e sensações. Todos desejam se sentir bem e querem que os produtos adquiridos contribuam para isso. Algumas vezes as pessoas compram somente para ter a sensação agradável de estarem com um determinado vendedor (O’CONNOR e JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ PRIOR, 1997). A responsabilidade sobre o sucesso da venda está diretamente relacionada à figura do vendedor. Segundo Meneghetti (2005), o verdadeiro vendedor deve ser alguém vital; ele não vende porque tem uma mercadoria boa, mas é ele mesmo que co-envolve; é a pessoa que faz o comércio, não o objeto. Portanto, é preciso escolher e se tornar um agente de vendas que seja, sobretudo, um elemento vital. As pessoas preferem as relações com pessoas “vivas”, cheias de vitalidade, simpatia, emoções, amores, inteligência (MENEGHETTI, 2005). Essa força de atração e vitalidade, também chamada de carisma, é resultado da plena forma de inteligência e crescimento do sujeito. Carisma significa graça, é algo que excede gratuitamente da impostação da personalidade. Logo, um sujeito que tem carisma é produtivo, é agradável, um coquetel de bem estar, realiza negócios e atrai (MENEGHETTI, 2008). Essa inteligência, segundo a Escola Ontopsicológica, acontece em dois momentos: a inteligência consciente e a inteligência inconsciente. O ser humano é consciente somente representa cerca de 10 a 15% da inteligência real, nesse sentido, a maior parte fica inacessível à esfera de decisão voluntária (MENEGHETTI, 2008). 2.3 Considerações teóricas sobre intuição Segundo Parikh e cols. (1994), foram Myers e Briggs que, influenciadas pelos estudos sobre os tipos psicológicos de Jung, levaram o tema da intuição até as fronteiras das grandes organizações. Jung agrupou a intuição como uma função não racional, já que, segundo ele, constata apenas experiências, mas não as avalia e que não surge diretamente por estímulo externo, ou seja, não necessariamente por uma experiência real (SCHULTZ e SCHULTZ, 2002). São tão diversas as variações de percepção sobre a intuição, que Parikh e cols. (1994) procurou tabular de modo simplista um sumário sobre algumas áreas de especialidade e os vários pontos de vista do argumento. Muito embora os conceitos mais difundidos sobre o que é a intuição, como funciona, para que serve, sejam bastante imprecisos e muitas vezes até pouco críveis, este é uma capacidade humana inata (MENEGHETTI, 2007, p. 92). Porém, a intuição é bastante complexa de se definir, já que ocorre quando é necessária, sem nunca haver sido aprendida técnicamente pelo sujeito (PARIKH e cols., 1994). Segundo Houaiss (2004), a palavra intuição significa uma forma de conhecimento direta, clara e imediata, capaz de investigar objetos pertencentes ao âmbito intelectual, a uma dimensão metafísica ou à realidade concreta. Etimologicamente, a palavra intuição vem do latim “intus actionis que significa o dentro ou íntimo da ação, ou seja, conhecer os modos ou estruturas interiores de um projeto de ação ou evento (MENEGHETTI, 2001, p. 90). A intuição, portanto, consente operar a melhor escolha no contexto de diversos problemas ou diversas soluções. A intuição dá imagens, impressões, concepções, elaborados sistêmicos, experiências, campo semântico, etc. (MENEGHETTI, 2008). A intuição dá a direção tranqüila à vantagem integral (econômica e existencial, isto é, interior com todos os valores necessários) do operador, e conforme a ordem da vida ou da dinâmica dos eventos globais, ordem já intrínseca no ponto operativo do sujeito (MENEGHETTI, 2004, p. 45). JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Os estudos científicos mais sérios sobre a intuição não são populares, pelo contrário, são escurecidos pela sombra dos livros, web sites, cursos e consultorias que prometem o “desenvolvimento intuitivo”. …Ou ainda, marginalizados por teorias como as de Bornabeau que afirma não só que a intuição não possa ajudar, mas que também é desviante (CIVITENGA e cols. 2004, p. 24). capacidade de conhecer o que está no interior dos movimentos de mercado ou na individual interação entre cliente e fornecedor, qual a direção ideal para o projeto de cada parte envolvida e agir com maior precisão ao escopo escolhido. 2.4 A importância dos sonhos para racionalizar a intuição De acordo com Meneghetti (2007): Sobre as diversas descrições de intuição, há um ponto em comum: ela ocorre na esfera inconsciente do sujeito que deve ser hábil para relevá-la à sua consciência (MENEGHETTI, 2007). De fato, ao contrário de muitos autores que insistem em uma percepção focal e enfática (emoção decidida e forte), a intuição é colhida além de qualquer suspensão racional e emocional. A emocionalidade, visceral ou cerebral, está mais ligada a um efeito: 1) semântico, 2) complexual, 3) ou de consenso social. Ao invés disso, a informação que assinala o projeto otimal é simplicidade global que zera todo o peso do diverso (BERNABEI citado por MENEGHETTI, 2004). Do ponto de vista do vendedor, é preciso saber para onde o dinheiro está se movendo, qual o melhor produto, o melhor prazo, o melhor número, o melhor cliente que funcionará para ele como pessoa e para sua empresa. E dentro das diversas alternativas que uma realidade apresenta, tais como: uma variedade de nichos de mercado no qual deve escolher onde investir suas energias; uma infinidade de abordagens financeiras para apresentar ao cliente; ou vários produtos entre os quais escolher sobre qual dar mais ênfase em uma campanha – perceber qual é a alternativa que terá a melhor relação entre esforço e resultado. Para um contexto de vendas, de negociação, isso significa uma potencial Dentre as diversas funções dos sonhos noturnos, está a oportunidade de colher a intuição quando esta não foi relevada pela consciência do interessado (o sonhador) e pode ser reconhecida através da gráfica dos sonhos (MENEGHETTI, 2007, p. 26). A palavra sonho tem origem no latim “se omnium que significa o indivíduo em relação ao todo, a todos, de todos” (MENEGHETTI, 2001, p. 153). O estudo sobre os sonhos tem origem antiga, porém, foi Freud quem instaurou a era psicológica na pesquisa onírica. Ele considerava os sonhos a via mestra para o inconsciente. Afirmava que os sonhos são expressões de pressões inconscientes que procuram alcançar a consciência. O sonho, para Freud, é uma satisfação de desejos proibidos e não admitidos pelo Eu. Em 1899 publicou um livro no qual recusou todas as explicações sobrenaturais, físicas e definiu que o sonho é proveniente das esferas inconscientes da psique (CANGELOSI e cols., 2006). Já para Jung o sonho é uma autorepresentação espontânea da situação atual que o inconsciente expressa em forma de símbolos. Ainda para o mesmo autor, as informações dos sonhos são latentes não porque proibidas, mas porque inconscientes. São conteúdos de conflitos determinados pela evolução do Eu. JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Para a Escola Ontopsicológica, o sonho informa o todo da atividade orgânica holística, reflete o que já aconteceu na racionalidade psíquica, e quando completo fornece: a) a situação atual; b) a causa da situação; c) a solução. Também indica o erro ou o sucesso segundo a seguinte hierarquia: situação orgânica do sonhador (saúde); as referências afetivas e de segurança (afetos, relações de amizades, etc.); as pessoas de confiança no trabalho e no estudo, e a esfera social, dos negócios, etc. (CANGELOSI e cols., 2006). 3 Metodologia A pesquisa realizada é quantitativa e qualitativa, pois trata dados numéricos e teóricos, bem como subjetivos. Segundo Silva (2001) a pesquisa quantitativa refere-se a opiniões e informações que podem ser quantificáveis e traduzidas em números. Já a qualitativa, trata de um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e subjetivo do sujeito sem possibilidade de ser traduzido em números, mas sim, colhendo o sentido do fenômeno em estudo, para o sujeito. Nesse caso, o pesquisador é o instrumento chave. Do ponto de vista de seus objetivos, segundo Gil (1999) é uma pesquisa exploratória, pois visa proporcionar maior familiaridade com o problema com vistas a torná-lo explícito ou a construir hipóteses. Também é uma pesquisa explicativa, já que busca identificar os fatores que determinam ou contribuem para a ocorrência de determinado fenômeno. Além disso, é uma pesquisa de levantamento, já que envolve interrogação direta das pessoas cujo comportamento se deseja conhecer. O instrumento utilizado foi um questionário semi-aberto, elaborado previamente pela pesquisadora para atender aos objetivos específicos deste estudo. A estrutura de questões foi dividida em três esferas: a) Descrição do entrevistado: com 14 perguntas sobre identificação pessoal, estrutura familiar, vida profissional e aspectos de conhecimento pessoal; b) Estilo de vida: com 9 questões sobre atividades no tempo livre, utilização da renda pessoal, saúde, etc. c) Intuição: com 8 questões com o intuito de investigar o comportamento em relação aos sonhos, a frequência da lembrança desses sonhos, a percepção individual sobre o uso da intuição, e a auto avaliação sobre ser ou não intuitivo. 3.1 Resultados e discussões Os questionários foram enviados para 31 pessoas que atuam na área de vendas do tipo business to business (B2B) na região sul do Brasil com a seguinte distribuição: Rio Grande do Sul (31,58%), Paraná (15,79%) e Santa Catarina (52,63%). Todos possuem reconhecimento pelos seus pares por serem bons vendedores. Dos questionários enviados, 20 foram devolvidos e 19 considerados na análise do grupo, sendo um desqualificado por falta de respostas resultando num índice positivo de 64,51% de retorno. A seleção foi feita em base a rede de contatos da pesquisadora e o meio utilizado para envio foi o correio eletrônico. A aplicação dos questionários se deu entre o período de 10 de maio à 22 de junho de 2009. O instrumento combinou questões abertas (de respostas livres) e fechadas (com opção de sim e não), divididas em três categorias: características do entrevistado, estilo de vida e intuição. Os dados foram compilados para planilhas JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ excel e o conteúdo das respostas analisados individualmente, para depois formar-se uma análise mais ampla do grupo respondente. De todo o grupo, 84,21% são homens e 15,79% mulheres, cuja idade variou entre 23 e 56 anos, estando 36,84% entre 20 e 30 anos; 31,58% entre 31 e 40 anos; 15,79% entre 41 e 50 anos e 15,79% entre 51 e 60 anos. A maioria (78,95%) são empresários de pequenas e médias empresas. Todos os respondentes possuem irmãos, sendo 52,63% primogênitos, porém, 31,58% são distantes em mais de 4 anos de seu irmão mais novo, caracterizando aspectos de primogênitos e de filhos únicos. Quanto ao estado civil, 63,16% são casados, e com filhos (57,89%), onde 63,64% têm dois filhos. Com relação ao nível escolar, 42,11% possuem curso superior completo ou pós-graduação; 21,05% possuem curso superior incompleto, e 36,84% possuem ensino médio completo. Destaca-se ainda que 63,16% não falam outra língua. 3.1.1 Sobre serem intuitivos Quando questionados sobre serem intuitivos, 52,63% dizem que são sempre, 31,58% avaliam que são às vezes, e 15,79% não se consideram intuitivos. Dos jovens até 30 anos de idade, 85,71% se autoavaliam intuitivos sempre ou às vezes. Já nos respondentes com idade acima de 30 anos, os resultados são superiores, com 91,67%. Na pesquisa realizada por Parikh e cols. (1994) com administradores brasileiros, os resultados sobre a autoavaliação dos níveis de capacidade intuitiva também mostraram diferenças entre as faixas etárias, apresentando índices mais baixos em jovens de até 35 anos e mais altos em pessoas acima de 59 anos. Como sugestão de novos estudos, seria interessante pesquisar os fundamentos desses resultados e se constatados, quais razões levariam para essa distinção entre profissionais mais jovens e mais velhos. Algumas hipóteses são possíveis de serem traçadas, tais como: a) Esses jovens possuem mais experiência profissional, portanto, uma coleção mais apurada de ferramentas racionais que os permitiriam atuar a intuição de modo mais assertivo. Nesse sentido seriam mais seguros quanto a percepção intuitiva, a ação e os resultados. b) Possuem mais traquejo social e sabem quais características são mais valorizadas pelo mercado. A característica intuitiva é uma delas e se vender como um profissional intuitivo poderia representar uma vantagem competitiva. Segundo Petry (2007), a carência de um suporte racional sobre o conceito de intuição, colocou o argumento a serviço de um estereótipo brasileiro de não estudar, não saber e não conhecer. Nas altas esferas empresariais, ser intuitivo pode ser sinônimo de superioridade e os jovens aspirantes a empreendedores se adaptam dizendo serem intuitivos. c) Os jovens acima de 30 anos poderiam ter mais maturidade e autoconhecimento. Mesmo sem todo o suporte racional para individuar o conceito de intuição, poderiam alimentar a certeza de um impulso que os leva ao resultado otimal. O acúmulo de experiências como essas, daria mais convicção da capacidade de intuir. A análise das respostas não deixa claro que os entrevistados tenham um comportamento adaptativo ao estereótipo de ser intuitivo. Porém, no que diz respeito ao suporte racional necessário para a compreensão do fenômeno, pode-se inferir que de fato há uma carência. Os que afirmaram não serem intuitivos JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ trouxeram argumentos vagos, inexistentes ou admitiram que têm dificuldade com o tema. Como exemplo, S8 afirma: “Tento observar bastante o ambiente, mas não me considero uma pessoa intuitiva. Tenho muita dificuldade com esse tipo de coisa” (S8). Além disso, na pergunta seguinte sobre usarem a intuição na interação com o cliente, os que se declaram não intuitivos deram exemplos de seu uso. É possível notar uma dificuldade em distinguir, entender e posteriormente enquadrar-se ou não como um agente que faz uso da intuição. 3.1.2 A importância e função dos sonhos Após a pesquisa bibliográfica, considerou-se necessário investigar a respeito da atividade onírica dos respondentes, uma vez que esse aspecto daria um parâmetro de análise entre o conceito de intuição para cada um e a realidade da intuição sobre o prisma científico. A relevância da atividade onírica é atestada pela maioria dos entrevistados da pesquisa (55,56%) que dizem dar importância aos seus sonhos sempre ou às vezes. Desses, 45,45% o fazem por considerarem que os sonhos trazem respostas ou são premonitórios. No intuito de dar alguma explicação sobre a razão de se importar com os sonhos, S3 afirma: “O sonho (…) me faz lembrar e refletir coisas que normalmente não reflito”. S13 complementa: “... de uma maneira ou de outra é um exercício de vida”. Dos respondentes, 44,44% alegam já terem sonhado com algum resultado positivo ou negativo de vendas que depois veio a ocorrer. Dos entrevistados que não dão importância ao conteúdo dos sonhos (44,44%), a maioria considera que estes não têm conciliação com a vida real, acham irrelevante ou não acreditam nas informações dos sonhos. As razões para essas afirmações podem ser diversas. O estilo de vida pragmático, reforçado pela velocidade que a tecnologia proporciona, pode estimular o sujeito a um tipo de superficialidade e desinteresse sobre si mesmo. Também o estereótipo da preguiça e de uma cultura que não educa ao autoconhecimento impulsionam essa superficialidade que reduz o sujeito frente à potencialidade de perceber o todo de sua realidade. Por outro lado, existe uma grande dificuldade de correlacionar os símbolos oníricos com a realidade percebida pelo sujeito. O entrevistado S1 corrobora com essa afirmação quando diz: “...no meu caso nunca houve uma conciliação com a minha vida real”. Ou ainda, existe a possibilidade de confundir o significado de alguns símbolos, misturando-os com a própria opinião ou a opinião dos outros. Quanto maior a superficialidade do sujeito, mais os símbolos oníricos remeterão a realidades alheias. A inaptidão para interpretar os próprios sonhos é atestada por 72,22% dos respondentes. É clara a importância do conteúdo onírico, uma vez que parte diretamente do inconsciente, que corresponde em 80% ou mais à realidade do sujeito. Além disso, trata-se de uma oportunidade de trazer à consciência uma intuição não colhida, não percebida e premente. O sujeito S16 adverte justamente quando diz “muitas vezes, considero um sonho uma intuição”. Porém, os sonhos trazem informações em uma linguagem não habitual e desconhecida que demanda conhecimento racional e percepção semântica, este último, normalmente possível com a ajuda de um técnico capaz. Um dos dados preocupantes obtidos está sobre o fato de uma parte JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ significativa dos respondentes, embora releve os sonhos noturnos, não se lembrem ou lembrem com pouca frequência (61% nunca lembram ou lembram apenas uma vez por semana). Como visto na literatura estudada, as razões para tal podem ser diversas. No entanto, a regularidade da amnésia onírica representa um fator de alerta a esses profissionais que perdem uma grande parte da sua própria realidade. Outro fator preocupante é a representatividade da falta de importância dada sobre os sonhos e isso pode demonstrar uma fragilidade sobre o assunto na cultura geral. De fato os estudos mais populares sobre esse tema adotam um viés místico e possivelmente menos confiável sob alguns pontos de vista, motivando a falta de credibilidade da cultura dos sonhos. O entrevistado S5 demonstra essa falta de importância quando diz que “a única importância de lembrar é para contar para os outros”. Se o ser humano tem o interesse em descobrir o todo da sua realidade, os sonhos podem ser uma das vias de acesso ao inconsciente, que é ativo, sendo também a origen da intuição. Para tanto, é necessário que o sujeito realize um processo de autenticação, fazendo uso da metodologia adequada, operada através de um técnico capaz, que consinta compreender o mover-se da sua realidade inconsciente, assim como a linguagem pela qual ela se expressa, nesse caso específico, os símbolos oníricos. 3.1.3 Intuição aplicada ao processo de vendas O uso da intuição nas diversas etapas do processo de vendas pode potencializar as técnicas disponíveis, sejam metodologias de trabalho que ferramentas tecnológicas. A importância de conhecer melhor o que é a intuição e também de saber racionalizá-la é cada vez mais relevada. Parickh e cols. (1994) destaca que no futuro é possível que seja uma capacidade a partir da qual a eficácia dos administradores poderá ser julgada. A intuição é uma das novas fronteiras da administração, como declara Oppermann em Civitenga e cols. (2004). Também Hatala e Brown (2004), ressaltam que a: …Intuição será um aspecto de crescente importância no futuro da história da humanidade, podendo tornar-se a próxima vantagem revolucionária como um instrumento de elaboração de informações e de tomada de decisões em curto espaço de tempo (HATALA; BROWN citados por CIVITENGA e cols., 2004, p. 58). A grande maioria (84,21%) dos entrevistados afirma utilizar a intuição no processo de vendas sempre ou às vezes. Esse número é superior ao obtido no estudo realizado por Parikh e cols. (1994), onde apenas 46,5% dos entrevistados brasileiros afirmavam utilizar a intuição, seja em igual proporção que em maior proporção à razão, na vida profissional. Porém, para realizar a intuição na história fazem-se necessários os meios materiais que traduzam a forma mental do indivíduo no tecido histórico (FOIL, 2007). Quanto a o que concerne aos conhecimentos relacionados a outros pontos pertinentes ao processo de vendas, investigados nesta pesquisa, os resultados demonstram uma carência de formação técnica global. Das áreas de conhecimento que englobam questões envolvendo o indivíduo, seu cliente e sua empresa, há uma paridade entre a importância e o nível de conhecimento. Na medida em que as áreas de conhecimento tornam-se mais técnicas e de contexto econômico internacional, a distância entre o conhecimento e a importância tornam-se maiores. Os piores desempenhos foram JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ para Economia Internacional (31,58%), Matemática Financeira (36,84%) e Legislação da sua área (36,84%). No entanto, a importância de todas as 12 alternativas foi atestada, com percentuais acima de 65% para todas, com destaque às características técnicas do seu produto (100%) e as Técnicas de Marketing (100%). No entanto, a intuição para ser colocada em prática numa realidade de economia globalizada, precisa de soluções técnicas e conhecimento de ordem internacional. Muitas vezes um empreendedor pode não conseguir realizar sua intuição não porque esta seja falha ou ilusória, mas porque ele não detinha as ferramentas racionais necessárias para realizá-la. Toda grande inspiração, assim como uma bela música, precisa de meios, de instrumentos para ser tocada. Caso contrário, o virtuoso artista torna-se ninguém. Não é uma improvisação, mistério ou sorte, mas consequência de um potencial afinado continuamente (MENGHETTI, 2007). O estilo de vida declarado pelos respondentes não favorece ou favorece pouco a formação continuada, possível razão pela qual talvez existam as lacunas destacadas acima. A distribuição de tempo em relação às diversas atividades mostra que a dedicação é maior ao trabalho (52,95%) e à família (10,63%). As atividades de formação como estudo (4,21%), cursos de curta duração (1,05%) ou cursos complementares (0,84%) são as de menor representação. 4 Considerações Finais Através da pesquisa realizada foi possível verificar a percepção e o reconhecimento do uso da intuição entre a maioria dos respondentes. Também foi constatado seu uso durante o processo de vendas. Cabe lembrar que essa análise levou em consideração a intuição em interpretação livre por parte dos respondentes, sendo assim, trata-se da intuição do modo concebido por cada profissional. Após a pesquisa bibliográfica, verificou-se que do ponto de vista científico, a intuição parte do inconsciente e pode ser verificada através da análise onírica, sempre que o indivíduo não foi capaz compreender sua manifestação à consciência. Partindo desse ponto, para alcançar a resposta à última questão da pesquisa, optou-se por fazer perguntas indiretas, onde o foco principal era o sonho, sua importância e o nível de amnésia existente. Além disso, as respostas abertas nas questões diretas sobre a intuição permitiram fazer algumas deduções, conforme seguem. As descrições obtidas sobre as razões pelas quais os sujeitos entrevistados são intuitivos, parecem tratar principalmente de efeitos ou fenômenos que, na maioria das vezes, não são oriundos de uma intuição, como por exemplo: memória, experiências, crença, instinto. Dessa forma, conceito de intuição parece vago, impreciso e carente de embasamento científico. Os sonhos que poderiam ser uma ferramenta de obtenção da informação da intuição são relevados pela maioria dos respondentes, mas o nível de amnésia é bastante alto. Também a não relevância desses conteúdos é representativa, o que traz um ponto de atenção muito importante. Além disso, a maioria alega não ter instrumentação para compreender os conteúdos oníricos, o que por um aspecto pode ser positivo, evitando que se façam compreensões equivocadas, mas ao mesmo tempo mostra o pouco acesso à informações sobre esse assunto de modo mais consistente e científico. Também o preparo técnico sobre aspectos profissionais parece carente, JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ sustentado por um estilo de vida de pouca orientação à formação continuada. Nesse sentido, a base de historização de um processo intuitivo resta frágil. A conclusão que se chega ao final desse breve fragmento de análise sobre a intuição é que, o ser humano possui uma capacidade que permite uma resposta diretiva e instantânea diante das diversas demandas de decisão e solução que a vida propõe, ou seja, a intuição. Seja um vendedor que qualquer outro profissional pode utilizar essa capacidade se dispuser de um instrumento (a si mesmo e o seu próprio corpo) alinhado e íntegro, ou seja, exato. A solução parece ser a manutenção desse instrumento, através do autoconhecimento em sentido permanente, na leitura contínua a cada momento de si mesmo, da percepção organísmica e da construção técnica que permite a tradução das puslões intuitivas em ações práticas do dia-a-dia nas lógicas dos negócios. Referências CANGELOSI, A. e cols. Dossiê Sonho: nas profundezas do nosso real. Revista Nova Ontopsicologia, n. 2, dez. 2006. p. 30-61. CIVITENGA, N. e cols. Correnti di pensiero sull' intuizione. Terni: Foil, 2004. COBRA, M., TEJON, J. L. Gestão de Vendas: os 21 segredos do sucesso. São Paulo: Saraiva, 2007. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. HOUAISS, A. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. MENEGHETTI, A. Dicionário de Ontopsicologia. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2001. MENEGHETTI, A. A Psicologia do Líder. 4. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008. MENEGHETTI, A. Manual de Ontopsicologia. 3. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2004. MENEGHETTI, A. O Aprendiz Líder. São Paulo: Foil, 2005. MENEGHETTI, A. e cols. Atos do Congresso Business Intuition 2004. São Paulo: Foil, 2007. O’CONNOR, J., PRIOR, R. Sucesso em vendas com PNL: recursos de programação neurolinguística para profissionais de vendas. São Paulo: Summus, 1997. PARICK, J., NEUBAUER, F., LANK, A. G. Intuição: a nova fronteira da administração. São Paulo: Cultrix, 1994. ROMEO, R. Vendas B2B: como negociar e vender em mercados complexos e competitivos. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008. SCHULTZ, D. P., SCHULTZ, E. S. Teorias da Personalidade. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. SILVA, E. L. da. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 3. ed. Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001. Autores: Joana de Jesus: administradora; Especialização em Gestão de Negócios e Intuição (AMF). Adriane Maria Moro Mendes: Graduação em Farmácia e Bioquimica (UFSC) e em Psicologia (UNISUL); Especialização em Psicologia com abordagem em Ontopsicologia (UESP); Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento (UFSC). Professora Adjunta da Universidade Federal de Santa Catarina e professora convidada da Faculdade Antonio Meneghetti (AMF). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 20/12/2010. JESUS, Joana de; MENDES, Adriane M.M. Estudo exploratório sobre a aplicação da intuição no processo de vendas. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 114-124, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ A esquizofrenia demonstrada na legislação atual através da nova lei de estágio de estudantes Alessandro Spiller Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) [email protected] Josemar Sidinei Soares Faculdade Antonio Meneghetti (AMF) Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) [email protected] Resumo: Esse artigo pretende demonstrar que o sistema legal brasileiro, baseado em um conceito errôneo de Justiça Social, vem gerando um excessivo protecionismo e assistencialismo, que se traduzem em resultados que travam o empreendedorismo. Tal fato não condiz com o ideal humanista de um homem protagonista responsável, encontrando-se o ordenamento normativo cindido entre o que a lei impõe e o que deveria dispor para fomentar o crescimento do ser humano de forma holística, e consequentemente o crescimento do Brasil como liderança mundial. O objeto de estudo é a aplicação prática da Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008 junto aos seus destinatários. Os dados apresentados e discutidos nesse trabalho referem-se à aplicação de entrevistas a 23 pessoas divididas nos seguintes segmentos 06 partes concedentes; 03 Instituições de Ensino Superior privadas; 02 agentes de integração e 12 estagiários estudantes de cursos superiores. Os entrevistados foram selecionados pela amostragem aleatória simples, distribuídos na região de Bento Gonçalves-RS, Porto Alegre-RS e São João do Polêsine-RS. Trata-se de um estudo de caso realizado através da pesquisa de campo com abordagem qualitativa, sendo os dados coletados mediante entrevista semiestruturada. Os dados coletados foram processados mediante análise de conteúdo. Em base às percepções dos questionários coletados verifica-se uma cisão entre realidade e lei, com o aumento das dificuldades impostas pela legislação para formar o ser humano e manter um empreendimento em movimento de forma sustentável. Pode-se afirmar que o sistema legal cada vez mais impõe deveres e direitos sociais repassando os custos gerados para as entidades privadas, impedindo um maior crescimento econômico e a responsabilização do indivíduo. Os resultados obtidos nessa pesquisa acenam ser urgente a mudança desta tendência jurídico-social, resgatando a correlação direta entre a norma e o fato, entre a realidade e a lei, fomentando a valorização do ser humano, auxiliando o seu crescimento integral e gerando oportunidades iguais com responsabilização individual. Palavras-chave: esquizofrenia jurídica; sistema legal; justiça social; estágio de estudantes; sociedade. Abstract: This article intend to demonstrate that the Brazilian legal system has been begetting an excessive protectionism and welfarism with negative results which hinder entrepreneurship, based on a misconception of Social Justice. This fact is inconsistent with the idea of man protagonist responsible, meeting the normative SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-140, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ ordering split between what the law imposes and what should be dispose to foment the growth of the human being holistically, and Brazil's own growth as a world leader. The study object is the practical application of Law Number 11788 of September 25, 2008 to its recipients. The data presented and discussed in this paper refer to the application of 23 interviews effectuated with: 6 companies trainee provider; 3 universities, 2 agents of integration, 12 trainees which are university students. The interviewees were selected by simple random sampling, distributed in the region of Bento Gonçalves / RS, Porto Alegre and Sao Joao do Polêsine / RS. This is an inductive research, by the technique of field research with a qualitative approach, through case studies. The data collected were processed by content analysis. Based on the perceptions of questionnaires collected there was a split between reality and law, with increasing difficulties imposed by the legislation to form a human being and maintain a business moving in a sustainable manner. Moreover, it appears that the legal system increasingly requires "social rights and duties" and to pass the costs to private parties, preventing a greater economic growth and self empowerment of the individual. The results obtained in this study demonstrate the urgent need to change this juridical-social environment, rescuing the direct correlation between norm and fact, between reality and law, fomenting the valorization of human being, assisting in their full potential, creating equal opportunities, with individual responsibility, and not limiting them. Keywords: legal schizophrenia; legal system; social justice; training of students; society. 1 Introdução A Constituição Federal de 1988 trouxe importantes avanços para o Brasil, sendo considerada a “Constituição Cidadã”, já que o país saía de um regime ditatorial cujos direitos individuais não eram sequer garantidos1. Naquela oportunidade foi instituído um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida com a solução pacífica das controvérsias1. Já no seu Artigo 1º, foram estabelecidos como fundamentos do Estado Democrático de Direito, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa2. E por se tratar do mais 1 Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988. 2 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, importante texto legal de nosso país, o qual dá base a todo o sistema normativo decorrente, as demais normas infraconstitucionais devem observar e atender ao que foi então intencionado pelos representantes do povo como fundamento radical. Entretanto, justamente por estar se saindo de um regime totalitário, em um claro movimento dialético, a Constituição acabou por alargar em demasia os direitos individuais e sociais, conforme vem se verificando atualmente, sem atrelá-los aos seus correspondentes deveres. Acrescido a isso, registra-se que muitos dos conceitos de direitos individuais e sociais, por exemplo, liberdade, igualdade, bemestar, dignidade da pessoa humana, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-140, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, são subjetivos, gerando interpretações das mais variadas, conforme o referencial de seu intérprete. Como resultado, na sociedade atual observa-se uma maciça conscientização de direitos individuais, constatado pelo crescente número de processos judiciais em andamento no Brasil, e consagrada pela célebre frase: “Tenho e exijo os meus direitos”. Em decorrência, o Brasil vem passando por um enorme processo de “judicialização” e “litigiosidade”, onde, qualquer litígio, por mais singelo que seja, tem fortes propensões de desembocar no Poder Judiciário. De outro lado, a conscientização dos deveres dos cidadãos brasileiros não vem ocorrendo na mesma medida da conscientização dos seus direitos. E inclusive se verifica que tais deveres vêm sendo repassados por força de leis a terceiros, que não são seus titulares. O bônus fica com uns, e o ônus com outros. E quando isso acontece – conscientização de direitos sem a correlata conscientização de deveres – indubitavelmente ocorre uma cisão na formação da mentalidade da sociedade e dos homens que a constituem, uma vez que a relação direito-dever se perde. Essa cisão, consolidada e fortalecida pela própria lei, vem trazendo resultados perversos para o ser humano e para o próprio Brasil. Ora, não se pode nunca perder de vista que a sociedade é formada por pessoas. E estas são mais importantes que a lei, uma vez que a lei deve ser feita para servir ao homem, e não ao contrário3. A lei deve assegurar e 3 Nesse sentido, Reale (2010a) chegou a mesma conclusão, quando afirmou em relação ao Direito: “Se imaginarmos, na história da espécie, a experiência do Direito como um curso de água, diremos que esta corrente, no seu passar, vertiginoso ou lento, vai polindo as arestas e os excessos das normas jurídicas, para adaptá-las, cada vez mais, aos valores humanos concretos, porque o Direito é feito para a vida e não a vida para o Direito” (REALE, 2010a, p. 610). fomentar o crescimento do indivíduo como ser humano integral, permitindo inclusive a sustentação do protagonismo do Brasil como líder nesta nova economia globalizada, através de seus atores. Caso isso não ocorra, ela não terá funcionalidade e produzirá resultados perversos a se perpetrar no tempo. Desta forma, entendemos que somente poderemos manter uma sociedade de pessoas sadias, se esta sanidade vier a ser garantida e fomentada pela própria legislação, a qual deve ser sempre considerada com um produto do meio social na qual está inserida. Como a preservação da sanidade social necessariamente passa pela legislação, a lei somente pode ser considerada eficaz se aquilo que dispuser trouxer resultados positivos, gerando evolução individual e social. Assim, o objeto deste estudo é verificar se esta sanidade social está ou não sendo garantida adequadamente pela legislação, por meio do estudo prático da nova lei de estágio de estudantes, uma vez que essa lei modificou profundamente a relação entre empresas e universidades e entre mercado de trabalho e estagiário, o que desemboca naturalmente na qualidade da formação prática dos futuros profissionais através do estágio. 2 Fundamentação Teórica Chemama e Vandermersch (2007) afirmam que a esquizofrenia, segundo conclusão de Freud, faz com que a palavra seja entendida pelo indivíduo em seu sentido próprio, perdendo seu poder metafórico, ou se o mantém, traz na sua origem uma metáfora imprópria. Avançando no conceito, tais autores, ao citarem Lacan afirmam: De fato, somente essa metáfora permite, precisamente, apagar a coisa, dando, desse modo, seu poder ao símbolo, sua SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ capacidade de “irrealizar”, isto é, de transpor as coisas da ordem real para a ordem simbólica, tornando-nos capazes de lidar com sua ausência, ou seja, com sua presença simbólica. É esse poder de “irrealização” que, mesmo não estando por inteiro no símbolo em estado normal, faz falta na psicose. A esquizofrenia vem ilustrá-lo, de maneira exemplar, pela importância da irrupção do símbolo no real, sob a forma de cadeia rompida, alucinatória ou neológica (CHEMAMA e VANDERMERSCH, 2007, p. 128-129). Conforme Meneghetti (2008b), esquizofrenia é uma palavra de origem grega, cujo significado é cérebro dividido, sendo assim definida: Estado da mente em que as funções ou partes operativas não efetuam a unidade de informação e de juízo. Distingue-se da neurose na medida em que é inconsciente (MENEGHETTI, 2008b, p. 102). Com base nestas definições, e para fins do presente artigo, pode-se então considerar “esquizofrenia legal” a cisão existente entre as finalidades que a norma legal deveria garantir e fomentar na sociedade e nos homens que a constituem, e os resultados que ocasionam. As finalidades definidas no texto da lei se dirigem para um lado, e os resultados práticos decorrentes acabam se dando para outro. Não há unidade de informação e de juízo entre o que a lei diz, e os seus resultados. E essa cisão ocorre de forma inconsciente, sem que o legislador e o destinatário da lei se dêem conta. E, ainda, na maioria das vezes, inclusive, o legislador e o destinatário da lei acreditam fielmente estarem fazendo o melhor, garantindo direitos de alguns, quando na realidade estão ocasionando danos sociais incalculáveis, restringindo avanços de muitos. A boa-fé pode sim gerar danos, e não deve ser escusável nessa situação. Nesse particular, interessante notar que essa constatação não é nova, e já preocupava a civilização grega, conforme lição de Ferraz Júnior (2009), que chegou a criar uma denominação para tal fenômeno, anomia: Que significa não a falta da lei, mas um dissídio entre uma lei escrita e os supremos princípios do justo. Reciprocamente, a eunomia é o acordo entre a lei escrita e os princípios gerais do justo (FERRAZ JUNIOR, 2009, p. 221). Tal situação possui extrema importância por se tratar a lei de uma proposição que impõe um comportamento, um dever-ser, a todos os cidadãos de um determinado Estado. Ferraz Júnior (2010) esclarece a respeito: Os juristas, de modo geral, vêem a norma, primeiramente, como proposição, independentemente de quem a estabeleça ou para quem ela é dirigida. Trata-se de uma proposição que diz como deve ser o comportamento, isto é, uma proposição de dever-ser. Promulgada a norma, ela passa a ter vida própria, conforme o sistema de normas no qual está inserida. A norma pode até ser considerada o produto de uma vontade, mas sua existência, como diz Kelsen, independe dessa vontade. Como se trata de uma proposição que determina como devem ser as condutas, abstração feita de quem as estabelece, podemos entender a norma como imperativo condicional, formulável conforme proposição hipotética, que disciplina o comportamento apenas porque prevê, para sua ocorrência, sanção (FERRAZ JUNIOR, 2010, p. 75). Assim, independente de sua consequência na prática, enquanto a lei estiver em vigor, obriga a todos os que a ela estão submetidos, impondo severas sanções a que não a observe, uma vez que com isso pretende resguardar a coexistência harmônica da sociedade. Entretanto, não se pode esquecer que a lei é uma ferramenta da qual o SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Direito se utiliza finalidade social, e (1952), por se tratar ciência humana, não com a simples coexistência social: para impor uma como ensina Ráo o Direito de uma pode se satisfazer possibilidade da Não é essa a sua finalidade suprema, senão a de obter, por meio da coexistência social harmônicamente organizada, o aperfeiçoamento da coletividade mediante o aperfeiçoamento do indivíduo.Embora não se defina como a simples soma dos indivíduos que a formam, e, sim, como um todo orgânico dotado de ações e reações próprias, a sociedade não é um ser em sentido biológico, nem é capaz de sobreviver totalmente indiferente à sorte de seus membros, que não são seus meros instrumentos, mas a sua própria finalidade, pois a vida social é uma decorrência da natureza humana.Por uma suposta felicidade coletiva, política, social, ou econômica, não se deve pagar o preço do aviltamento do homem, da supressão total, ou totalitária, de sua liberdade espiritual, intelectual, cívica ou econômica, o preço, isto é, da destruição de sua personalidade.Assume, assim, o direito o caráter de fôrça social propulsora, quando visa proporcionar, por via principal aos indivíduos e por via de consequência à sociedade, o meio favorável ao aperfeiçoamento e ao progresso da humanidade (RÁO, 1952, p. 42). Como se observa, deve o Direito asumir, e por consequência a própria lei, uma função mais ampla, qual seja, permitir e fomentar o aperfeiçoamento do indivíduo, para possibilitar o progresso da humanidade. Assim, uma lei somente pode ser considerada válida e desta forma legitimamente obrigar, segundo Meneghetti (2005), se possuir “um ordenamento racional ao bem comum, ao bem do grupo, daqueles que deverão observá-la” (MENEGHETTI, 2005, p. 127), diversamente, a lei não é válida. E a lei tem por uma de suas finalidades, ainda conforme Meneghetti (2002) o bem do próprio corpo social: Seja em relação às partes componentes que ao conjunto das partes: deve ser um bem circular. Primeiro bem da lei é o coletivo, secundário o indivíduo. Mesmo se, na natureza, o indivíduo é o tijolo da ordem social, a lei deve pensar no conjunto; todavia, para salvaguardar esse conjunto, não pode esquecer o tijolo (MENEGHETTI, 2002, p. 145). Na realidade, Meneghetti (2002): prossegue O bom e o mau são verificados pelos resultados sociais: se uma lei – uma vez delineada – traz produção e bem-estar, então é boa, do contrário, é negativa (MENEGEHTTI, 2002, p. 145). Nesse sentido, Aristóteles, na obra Ética a Nicômaco (2008) também expressa uma ideia que deve ser aqui abordada, quando afirma que nas …disposições sobre todos os assuntos, as leis visam à vantagem comum, seja a de todos, seja a dos melhores ou daqueles que detêm o poder ou algo semelhante, de tal modo que, em certo sentido, chamamos justos os atos que tendem a produzir e a preservar a felicidade e os elementos que a compõem para a sociedade política. E a lei determina que pratiquemos tanto os atos de um homem corajoso (isto é, que não desertemos de nosso posto, nem fujamos, nem abandonemos nossas armas), quanto os atos de um homem temperante (isto é, que não cometamos adultério nem nos entreguemos à luxúria), e os de um homem calmo (isto é, que não agridamos nem caluniemos ninguém); e assim por diante com respeito às outras virtudes, prescrevendo certos atos e condenando outros. A lei bem elaborada faz essas coisas retamente, ao passo que as leis elaboradas às pressas não o fazem assim tão bem (ARISTÓTELES, 2008, p. 104195). SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Por essa leitura podemos concluir que as leis bem elaboradas, para assegurar vantagem para toda a sociedade, devem preservar e produzir as virtudes do homem, uma vez que preservando e fomentando tais virtudes individuais, se permite o ganho social, pois os homens crescem com suas virtudes se tornando homens melhores, e a sociedade no qual estão inseridos acaba avançando junto. Se, ao inverso, as leis não fomentarem as virtudes dos homens, mas sim seus vícios, elas estarão gerando diminuição ao ser humano, contaminando toda a sociedade na qual estão inseridas. Assim, caso a lei traga progresso funcional aos seus destinatários, é boa e válida. Do contrário, não é boa nem válida, acarretando um mal. Por outro viés, Reale (2010a) afirma que somente devem ser consideras leis perfeitas as que forem dotadas de fundamento ético, registrando, no entanto, que existem leis ...nascidas puramente do arbítrio ou de valores aparentes, que só o legislador reconhece. Entretanto, não deixam de ser jurídicas, porque possuem vigência. Daí um problema dos mais sutis e relevantes: o da obediência ou não às leis destituídas de fundamento ético e a sua positividade. Há, por outro lado, fenômenos curiosos de mudança de fundamento. Muitas vezes, os meios técnicos não alcançam os resultados previstos; o legislador pensa atingir um fim, mas a lei fica a meio caminho, insuficiente e incapaz de atingir o alvo colimado (REALE, 2010a, p. 591). Como se observa, não é incomum que as leis venham a ser propostas com um objetivo, mas alcancem outros com consequências imprevistas. Se isto ocorrer, mesmo considerando-se uma lei “imperfeita”, está não deixará de ser jurídica, e com isso, acabará construindo uma realidade diversa da que foi planejada, “com força de lei”. Reale (2010a) prossegue nos seus ensinamentos afirmando, então, que é atribuição do legislador evitar o divórcio entre a realidade e as normas que jamais tiveram razão de ser, porque conflitantes com os legítimos interesses da coletividade. Entretanto, em que pese a oportuna lição de Reale, não se pode esquecer que na sociedade atual, não é comum que os legisladores reconheçam este divórcio, evitando, ou mesmo corrigindo tal equívoco. O que na maioria das vezes acontece, é a lei se perpetuar, trazendo consequências por um longo período. Tal fato ocorre por diversas razões, destacando-se inicialmente as decorrentes do atual modelo eleitoral brasileiro, que embora reconhecido como verdadeiramente democrático, vem enfrentando uma séria crise institucional, pois se verifica cada vez mais que o mesmo contribui para uma formatação negativa nos políticos brasileiros responsáveis pela criação das leis, pois estes se sentem pressionados a criar e fazer proliferar leis assistencialistas e protecionistas, com o único objetivo de angariar votos da denominada “massa social”, garantindo assim a sua reeleição. Nesse sentido, Meneghetti (2007), ao falar sobre o real significado da democracia e o modo como é compreendida atualmente, explica que: Hoje, aquilo que é o poder, a autoridade republicana ou democrática – o poder do povo, que não é o povo entendido pelos atenienses ou pela antiga república romana – não está nas mãos de um deus, de uma fé dogmática, de um direito de natureza, de uma consequência de intrínseca honestidade nas relações entre as coisas, mas está sempre submetido ao poder do número, da onde da opinião do momento, daquela massa que parece prevalecer através das fontes de comunicação (MENEGHETTI, 2007, p. 47). SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ De certo modo, os políticos brasileiros são reféns desse sistema, pois precisam se eleger pelo voto quantitativo da massa, e para tanto, precisam trabalhar em função dela, não restando tempo, vontade ou mesmo a conscientização de tal fato, para buscar a correção dos erros legislativos. Precisam prestar contas à massa de que lá estão para atender os objetivos e anseios dela. Tal fato por si só é alarmante, pois impede o progresso do homem, já que massificando as leis, se massifica o próprio ser humano. Vivemos em uma democracia que não responsabiliza seus operadores, como o fazia a civilização grega, que possuía um interessante procedimento legislativo conforme lição de Ferraz Júnior (2009): ...assim, em Atenas, na reunião anula da Eclesia, no mês de Eatombeone (julho), votava-se se, em princípio, as leis deveriam ou não ser modificadas. Se a maioria achasse que não, o ordenamento não sofria qualquer mudança para o ano e as propostas de modificação eram consideradas prejudicadas. No caso contrário, qualquer cidadão poderia propor uma mudança, mas sob condições graves, como garantia pessoal por parte do proponente de que a nova lei seria de utilidade pública, respondendo ele em juízo, caso o contrário fosse verificado (FERRAZ JUNIOR, 2009, p. 216). Essa falta de responsabilização individual é prejudicial ao progresso do Brasil, e vem contribuindo para a formação de um cidadão desresponsabilizado e com tendência a esperar a resposta de terceiros, especialmente do Estado assistencialista. Entretanto, ficar nessa causa primeira seria ingenuidade e superficialidade. A real causa é mais radical, e está inserida na própria mentalidade da sociedade brasileira, e, portanto dos cidadãos e políticos que a constituem. Sem a exatidão do homem que se faz político, impossível a exatidão da lei e da própria sociedade. Ocorre que, conforme Meneghetti (2008a): Se perdeu a dimensão do homem segundo o projeto originário da vida. Uma vez que o ser humano é carente da própria verdade interior, conforme o projeto de natureza, encontra-se disperso e caótico (MENEGHETTI, 2008a, p. 19). Assim, para almejarmos uma verdadeira revolução na sociedade brasileira, e nas próprias leis que essa mesma sociedade projeta, é necessário conhecer melhor o ser humano, com a conscientização exata de seu real valor e objetivo. Aliás, o direito romano já tinha esse conceito como princípio, conforme se verifica em Cretella Júnior (2009): Daí o haver dito Justiniano: Vejamos antes as pessoas, pois é conhecer pouco o direito, se desconhecemos as pessoas, em razão das quais ele foi constituído (“Et prius de personis videamos. Nam parum est jus nosse, si personae, quarum causa constitutum est, ignorentur”. Institutas, I, 2, 12) (CRETELLA JUNIOR, 2009, p. 60). Como atualmente a sociedade está composta por pessoas que não se conhecem na integralidade, não resta dúvida que essa ignorância gera a esquizofrenia existencial individual, que por sua vez é geradora da esquizofrenia social, refletida por uma “esquizofrenia legal”. Os políticos legisladores sequer se dão conta desta cisão, cabendo a eles se conscientizarem de tal fato, buscando a própria exatidão para que com ela sejam capazes de restituir a sanidade à lei, uma vez que são eles os responsáveis pela criação das mesmas. Somente com políticos legisladores integralmente conscientes, teremos leis que despertarão paulatinamente a conscientização da sociedade brasileira. SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ E isto se torna dramaticamente relevante, pois uma das consequências da existência de qualquer lei é a formatação da educação de uma sociedade e de seus indivíduos, para o bem ou para o mal. Neste sentido educativo é a análise de Jaeger (2003) da obra As Leis de Platão, que considera ser o legislador um verdadeiro educador. Como educador, se impõe ao legislador estar atento aos efeitos práticos da lei que cria (diretos e indiretos; visíveis e não tão visíveis), especialmente em relação às implicações que causam na formação da mentalidade dos seus destinatários. Voltando as lições de Reale (2010b), lembra-se que o direito se torna autêntico não por ser declarado, mas sim por ser reconhecido pela sociedade, pois ela acaba vivenciando-o, como algo que se incorpora e integra na sua maneira de conduzir-se. Desta forma, muitas vezes acaba por se incorporar na sociedade uma lei “imperfeita”, que indubitavelmente educa os homens para a “imperfeição”. Acrescido a esta realidade vem o conceito de Justiça Social, o qual justificaria as leis sociais que consagram o assistencialismo e o protecionismo. Meneghetti (2007) traz importante reflexão sobre as diversas concepções da Justiça Social na história, lembrando que tal questão começou a se abrir nos tempos do Papa Leão XII (1810-19030) através da Encíclica Rerum novarum. Diz que para Marx, o conceito seria uma necessidade “no qual o operário tem direito à maisvalia: se não lhe é dada, ele a toma” (MENEGHETTI, 2007, p. 52-53), inclusive através da luta de classes. E na mentalidade ocidental tradicional, a Justiça Social é considerada como uma forma de caridade: é justo que quem tem mais dê a quem não tem. É uma forma de bem, e não de um dever, mas de uma opção. Para sua verificação, afirma Meneghetti (2007), a sociedade deve criar: Objetivos e instrumentos por meio dos quais os cidadãos possam realizar três coisas: 1) o bem de si mesmos; 2) o bem social, de cooperação, o interesse comum e 3) o bem ontológico – os cidadãos, no seu mundo interior, podem realizar também o bem transcendente (…) dentro de uma boa lei social, deveria estar presente esta constante logística: a manutenção de todos os seus componentes, para favorecer a harmonia, o bem-estar de todo o corpo, o conjunto, e escopos qualitativos (MENEGHETTI, 2007, p. 39-40). Assim, (2007), na prossegue Meneghetti …sociedade contemporânea, pode-se afirmar que uma democracia é justa quando realiza os seus escopos técnicos, e não altera os seus cidadãos contra a natureza deles. Uma justiça social é boa quando não deforma ou cria patologias nos próprios componentes, e consente e é operativa – através das suas leis – de um bem público, cívico: realiza aqueles fins para os quais a lei foi proposta. É uma verificação técnica, não moral, que nada tem a ver com as exigências interiores e metafísicas (MENEGHETTI, 2007, p. 40). Resume, ao final, que “é “justiça social” se aquilo que foi programado, ordenado, comandado, legislado é funcional ao escopo escolhido, desejado, prometido” (MENEGHETTI, 2007, p. 40). Como se observa, há um deslocamento no conceito comum de Justiça Social, baseado no assistencialismo e no protecionismo, para um novo conceito, agora baseado na responsabilização do indivíduo (realização do bem de si mesmo), como pedra SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ fundamental da sociedade no qual está inserido (bem social). Então, Justiça Social não é proteger e assistir, mas sim permitir e fomentar o crescimento social a partir do crescimento do indivíduo, responsabilizando este por seus avanços e eventuais retrocessos. E para tanto, a lei se mostra fundamental, especialmente por seu viés educador. Com estes fundamentos, agora se enfrentam os principais aspectos do qual trata a nova lei que dispõe sobre o estágio de estudantes (Lei n. 11.788/2008), uma vez que a mesma é instrumento para este estudo. Para tanto, é necessário iniciar tal análise pelo projeto de lei que a originou4, podendo se extrair da justificativa do referido projeto de lei os fundamentos éticos e os valores sociais e morais que o legislador reconhecia como importantes, e que pretendia preservá-los e fomentá-los no indivíduo e em toda a sociedade: a) propiciar uma melhor formação e qualificação dos indivíduos para o trabalho; b) modernizar a legislação até então existente, evitando desvirtuamentos e objetivando o preparo para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho; c) ampliar a formação acadêmica através do efetivo contato com o mundo do trabalho, concretizando os conteúdos teóricos; d) combater ao desemprego dos jovens; e) formar as futuras gerações de profissionais, mantendo e fomentando o progresso no mercado de trabalho; f) dar mais garantias e segurança aos jovens, incentivando um maior 4 Projeto de Lei do Senado nº 473 de 2003, apresentado em 18 de novembro de 2003 pelo Senador Osmar Dias. número de empresas na oferta de programas de estágio. Tal projeto de lei teve tramitação regular, e após a apresentação e debate de várias emendas, tanto no Senado quanto na Câmara de Deputados, resultou da sanção presidencial a Lei nº 11.788/298, que dentre os 22 artigos, estabelece: a) Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, visando à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam freqüentando o ensino regular (Art. 1º); b) O estágio visa ao aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho (Art. 1º, § 2º); c) O estágio não cria vínculo empregatício, desde que observados: i) matrícula e freqüência regular do educando em cursos de educação; ii) celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino; iii) compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e as previstas no termo de compromisso (Art. 3º); d) O estágio deverá ter acompanhamento efetivo pelo professor orientador da instituição de ensino e por supervisor da parte concedente (Art. 3º, § 1º); e) É vedada a cobrança de qualquer valor dos estudantes, a título de remuneração pelos serviços prestados pelos agentes de integração, sendo estes responsabilizados civilmente se SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ indicarem estagiários para a realização de atividades não compatíveis com a programação curricular estabelecida para cada curso (Art. 5º, §§ 2º e 3º); f) São obrigações das instituições de ensino: i) celebrar termo de compromisso com o educando e com a parte concedente, indicando as condições de adequação do estágio à proposta pedagógica do curso, à etapa e modalidade da formação escolar do estudante e ao horário e calendário escolar; ii) avaliar as instalações da parte concedente, e a sua adequação à formação cultural e profissional do educando; iii) indicar professor orientador, da área a ser desenvolvida no estágio, como responsável pelo acompanhamento e avaliação das atividades do estagiário; iv) exigir do educando a apresentação periódica de relatórios de atividades; v) zelar pelo cumprimento do termo de compromisso, reorientando o estagiário para outro local em caso de descumprimento de suas normas; vi) elaborar normas complementares e instrumentais de avaliação dos estágios de seus educandos; vii) comunicar à parte concedente do estágio, no início do ano letivo, as datas de realização de avaliações escolares (Art. 7º); g) São obrigações da parte concedente: i) celebrar termo de compromisso com a instituição de ensino e o educando, zelando por seu cumprimento; ii) ofertar instalações que tenham condições de proporcionar ao educando atividades de aprendizagem social, profissional e cultural; iii) indicar funcionário de seu quadro pessoal, com formação ou experiência profissional na área de conhecimento desenvolvida no curso do estagiário, para orientar e supervisionar até 10 estagiários simultaneamente; iv) contratar em favor do estagiário seguro contra acidentes pessoais; v) quando do desligamento do estagiário, entregar termo de realização do estágio com indicação resumida das atividades desenvolvidas, dos períodos e da avaliação de desempenho; vi) manter a disposição da fiscalização documentos que comprovem a relação de estágio; vii) enviar à instituição de ensino relatório de atividades, com vista obrigatória ao estagiário (Art. 9º); h) A jornada de atividade em estágio é definida entre a instituição de ensino, a parte concedente e o aluno estagiário, não podendo ultrapassar: i) 4 horas diárias e 20 horas semanais, no caso de estudante de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental; ii) 6 horas diárias e 30 semanais, no caso de estudantes do ensino superior, da educação profissional de nível médio e do ensino médio regular (Art. 10); i) Se a instituição de ensino adotar verificações de aprendizado periódicas ou finais, nos períodos de avaliação, a carga horária do estágio deve ser reduzida pelo menos à metade, para garantir o bom desempenho do estudante (Art. 10, § 2º). j) A duração do estágio, na mesma parte concedente, não poderá ser superior a 2 anos, exceto quando se tratar de estagiário portador de deficiência (Art. 11); SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ k) Estagiário recebe bolsa e auxíliotransporte – este último na hipótese de estágio não obrigatório (Art. 12); l) Assegurado ao estagiário, sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 ano, período de recesso remunerado de 30 dias, a ser gozado preferencialmente durante as férias escolares. Se o estágio for inferior a 1 ano, o recesso deverá ser concedido de maneira proporcional (Art. 13, §§ 1º e 2º); m) A manutenção de estagiários em desconformidade com a Lei n. 11.788/2008, caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para os fins da legislação trabalhistas e previdenciária (Art. 15); n) Limitação ao número máximo de estagiários em relação ao quadro de pessoal das entidades concedentes, por estabelecimento do estágio, nas seguintes proporções: i) 1 a 5 empregados: 1 estagiário; ii) 6 a 10 empregados: até 2 estagiários; iii) 11 a 25 empregados: até 5 estagiários; iv) acima de 25 empregados: até 20 % de estagiários (Art. 17 e seu § 1º); o) Assegurado às pessoas portadoras de deficiência o percentual de 10 % das vagas oferecidas pela parte concedente do estágio (Art. 17, § 5º). Por fim, não é demais lembrar que o estágio de estudantes tem como origem as Corporações de Ofício da Idade Média. Nelas, existiam três espécies de trabalhadores: os mestres, os companheiros e os aprendizes. Conforme Reis (2008): Os aprendizes eram jovens trabalhadores, submetidos à pessoa do mestre, de quem aprendiam o ofício. Essa aprendizagem era um sistema duro de trabalho, e os mestres sempre impunham aos aprendizes um regime férreo de disciplina, usando largamente dos poderes que lhe eram conferidos pelas normas estatutárias da corporação. Terminada a aprendizagem, subiam eles à categoria de companheiros, que eram oficiais formados, mas sem condições de ascenderem à maestria, pela compressão exercida pelos mestres, que desejavam, dessa forma, impedir a concorrência, e assegurar a transmissão dos privilégios das mestrias aos seus filhos ou sucessores (REIS, 2008, p. 46). Para o ingresso na Corporação de Ofício deveria o aprendiz pagar um valor ao mestre para custear as despesas do aprendizado e a da sua própria manutenção durante o período em que estivesse sob a orientação e educação deste. Isto se justificava por estar sendo passando ensinamentos valiosos e protegidos pela corporação. Esse sistema de ensino deu origem a grandes gênios da humanidade, como Leonardo Da Vinci, que foi aprendiz na oficina de Verrocchio; Michelangelo, aprendiz na oficina de Ghirlandaio; Rafael Santi, aprendiz na oficina de Pietro Perugino. 3 Metodologia Esta pesquisa é classificada como um estudo de caso, tendo por objeto a aplicação da Lei n. 11.788, que dispõe sobre o estágio de estudantes, junto aos diferentes públicos impactados pela mesma. A pesquisa tem abordagem qualitativa, sendo os dados coletados mediante entrevista semiestruturada, com aproximadamente 30 perguntas que versavam sobre o tema. As respostas foram analisadas mediante análise de conteúdo. Através da amostragem aleatória simples, foram realizadas 23 entrevistas, nas cidades de Bento Gonçalves-RS, Porto Alegre-RS e São João do Polêsine- SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ RS. A amostra de entrevistados foi composta por: - 06 partes concedentes, sendo 05 empresas privadas do setor industrial e do setor de serviços e uma entidade pública; - 03 Instituições de Ensino Superior privadas; - 02 agentes de integração privados; - 12 estagiários regularmente matriculados em uma das instituições participantes da pesquisa. Destes, 09 eram estudantes de Direito, 01 de Comércio Exterior e 02 de Administração. Ressaltamos que a maioria das entrevistas foram presenciais e conduzidas pelo próprio pesquisador, sendo que apenas uma pequena parte se deu por meio eletrônico. 4 Resultados e Discussão A análise dos dados coletados por meio das entrevistas revelou a percepção das partes envolvidas em relação a nova lei de estágios. Foi possível verificar os desdobramentos decorrentes da aplicação da mesma e fazer alguns prognósticos. Para facilitar a visualização dos resultados, optamos por apresentá-los sob a forma de itens, com um comentário global ao final do capítulo. Das 06 partes concedentes entrevistadas, apurou-se que estas assim se posicionam frente a nova realidade: a) Afirmam que a nova lei de estágios acarretou dificuldades na operacionalização desses, pois provocou maior burocracia e aumento imediato de custos; b) Dentro desta realidade, não pretendem contratar mais estagiários e ao fim dos estágios em andamento irão proceder com a migração dos melhores estagiários para o regime de contrato de trabalho; c) O desinteresse no prosseguimento de atividades envolvendo estagiários; encontra sua principal justificação na limitação da jornada da atividade de estágio, uma vez que esta fica dividida em 2h e 4h, totalizando as 6h definidas. Isso, segundo os entrevistados, impede uma maior produtividade e melhor integração com as atividades da parte concedente; d) Segundo eles, os agentes de integração e as instituições de ensino não estão preparados para o cumprimento das exigências da nova legislação; asseverando que as instituições de ensino não vêm informando as datas das provas, tampouco procederam com avaliações das instalações. Relatam que não ocorreram fiscalizações nas partes concedentes por parte de órgãos oficiais até o momento. A maioria dos entrevistados entende que a nova lei não proporcionará melhor formação e qualificação dos indivíduos para o trabalho, tampouco o desenvolvimento da cidadania, pois é limitadora em relação ao aprendizado e possui caráter assistencialista; que não favorece o desenvolvimento de atitudes empreendedoras, tão necessárias no cenário profissional brasileiro e mundial, onde o sistema de trabalho apresenta-se, cada vez mais, centrado sobre as pessoas que sobre as instituições. Como exceção ao que acima foi exposto, importa frisar que uma das partes concedentes entrevistadas se trata de um Órgão Público Federal, que afirmou não ter tido problemas com a nova lei, tendo compensado a redução da jornada com o aumento do número de estagiários em SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ seus quadros, entendendo ter sido a lei benéfica em todos os seus termos. Por sua vez, das entrevistas realizadas com as Instituições de Ensino, percebeu-se que: a) Receberam a nova lei com grande preocupação, em face da burocracia e as novas responsabilidades; b) Verificaram redução em torno de 50% nos firmamentos dos termos de compromisso de estágios; c) Referem-se à maior burocracia e aumento de custo, uma vez que foi designado profissional responsável para o acompanhamento do estágio; d) Não procederam ainda com avaliações das instalações das partes concedentes, confiando somente nos relatórios destas. Neste sentido, migram paulatinamente para atender as exigências da lei; e) Acreditam que a nova lei permitirá ao aluno, com o recesso e o limite de jornada, melhor aprendizado, pois poderá passar mais tempo na instituição de ensino; f) Afirmam que a nova lei não tem perfil de formação de empreendedor, mas sim irá fomentar a busca de emprego estável, que é o grande objetivo dos estudantes das universidades atualmente. Neste item podemos avaliar se este objetivo não seria decorrente de um ensino que não encontra meios de fomentar uma educação ao empreendedorismo, alimentando somente a cultura de empregado. Como exceção parcial, uma das instituições de ensino se mostrou melhor preparada para atender as exigências legais, inclusive fazendo avaliações das instalações das partes concedentes. As entrevistas com os agentes de integração destacaram os seguintes pontos: a) Diminuição das oportunidades de estágio após a nova lei ocasionada, no entender destes, pela limitação da jornada horária; b) Os estagiários demonstraram mais interesse pelos direitos e benefícios adquiridos que pelos deveres; c) A responsabilidade do seguro obrigatório foi transferida para as partes concedentes, gerando aumento de custos para estas, pois agora além dos custos diretos com o próprio estágio, ficam responsabilizadas pela formalização e pagamento do seguro referido; d) Aumento na burocracia e custos, uma vez que precisam controlar mais a atividade de estágio, em relação aos próprios estagiários, mas também em relação as partes concedentes e as Instituições de Ensino, para verificar se estão cumprindo com a legislação. Tal responsabilização acarreta aumento de burocracia e custo, este de forma indireta, pois precisam de mais pessoas para realizar tais encargos; e) Despreparo das instituições de ensino no atendimento da nova legislação. Por fim, em relação as entrevistas com estagiários, ficou evidenciado: a) Que estes desconhecem o que motivou a alteração legislativa, uma vez que não foi sua iniciativa; b) Que estes percebem a falta de vagas de estágios após a nova legislação; c) Que conhecem os benefícios adquiridos com a nova lei, especialmente a carga horária; SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ d) Que percebem o despreparo das Instituições de Ensino e dos agentes de integração em observar a nova lei; e) Que não utilizam o tempo livre para as atividades de estudo, mas para práticas de lazer; f) Que optam pela busca futura por emprego e concurso público, e não por empreendimento próprio; g) Entendem como positiva a alteração legislativa, pois afirmaram que existiam desvios, mas quando questionados sobre quais desvios e por quem praticados disseram não conhecêlos diretamente, mas de ouvir falar; h) Nenhum dos entrevistados referiu conhecer os deveres do estágio acarretados pela nova sistemática, mas tão somente os novos direitos adquiridos. Como se percebe pelos resultados expostos, houve flagrantes contradições nas posições expressas entre os destinatários da nova lei, demonstrando-se com isso a cisão entre o que a norma pretendia e o que se observa acontecer atualmente. A “esquizofrenia legal” se evidencia numa lei que nasce para incentivar e acaba por limitar a educação profissional por meio de estágios, pois fica evidente a inviabilidade da pretensão da nova lei quanto a formação dos indivíduos para o trabalho através do contato efetivo entre o mundo acadêmico e o mundo laboral já que verificou-se a diminuição do número de ofertas de programas de estágio e o encerramento destas atividades em uma grande parte das empresas. A lei analisada fez com que, concretamente, as oportunidades de estágio fossem diminuídas, prejudicando o aprendizado prático dos estudantes. Ademais, por ser excessivamente assistencialista e protecionista, ela acabará educando toda uma geração de futuros trabalhadores com essas premissas, trazendo prejuízos para a sociedade brasileira em curto espaço de tempo. Além disso, tolheu-se da iniciativa privada uma grande oportunidade de descobrimento de talentos, e o treinamento privado destes, pois a nova lei desestimula as empresas a investirem na formação pessoal de estagiários através de cursos realizados nas empresas. Os motivos que desencadearam a nova lei poderiam ser mais facilmente corrigidos com uma maior fiscalização na lei existente, sem ser necessária a alteração legislativa. A consequência direta da mudança é que os investimentos educacionais e cursos técnicos específicos custeados integralmente até então pelas empresas, que beneficiavam diretamente os jovens brasileiros, se perderão. O estudante, agora, deverá custear diretamente os cursos e treinamentos que tinha acesso através do incentivo das empresas privadas. Por tudo isso, forçoso é reconhecer que a lei, por como esta delineada, não é válida para a sociedade brasileira, devendo ser revista o quanto antes. 5 Consideração Finais Os resultados obtidos nessa pesquisa demonstraram a cisão entre a intenção do legislador quando formula as leis e a sua aplicação prática, pois a maioria delas vem se mostrando pouco operacionais e funcionais, indo de encontro a correta interpretação de Justiça Social – a que responsabiliza individualmente o ser humano pelo seu crescimento, e em decorrência, da própria sociedade na qual está inserido. SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ No caso estudado, a nova lei de estágio dos estudantes vem trazendo como consequência primária a limitação das ofertas de estágios pelas partes concedentes, preferindo estas a contratação de um empregado formal, firmando carteira de trabalho, regulandose a relação pela legislação trabalhista, em razão da burocratização e do aumento de custo decorrente, bem como pelo despreparo demonstrado pelas instituições de ensino. Em relação aos estudantes estagiários, verificou-se que os mesmos entenderam como benéfica a lei, sem se dar conta ainda que as oportunidades de estágio foram reduzidas drasticamente. Ademais, se verificou que os mesmos conhecem da lei os direitos, sem se preocupar com seus deveres. A lei de estágio dos estudantes não fomenta a valorização da livre iniciativa e do trabalho, mas sim procura assegurar e proteger uma equivocada Justiça Social, uma vez que impede o desenvolvimento do indivíduo e do corpo social no qual está inserido, não estimulando aos estudantes a superioridade da mais-valia meritocrática e da reciprocidade. Cada um deve ter o dever de contribuir para o bem social, conforme os seus meios e condições. Desta forma, evidencia-se na sociedade brasileira a “esquizofrenia legal”, havendo uma completa cisão entre o que a lei deveria trazer de benefícios reais e o que efetivamente produz. Esta lei, como a maioria, acarreta excessivo protecionismo e assistencialismo, com resultados negativos, travando o empreendedorismo e a própria livre iniciativa – que estão asseguradas constitucionalmente. As intenções e consequências das leis brasileiras não condizem com a ideia de homem protagonista responsável, encontrando-se o sistema legal cindido entre o que a lei impõe e o que deveria proporcionar para fomentar o crescimento individual e social. Está se educando os jovens brasileiros na busca constante de novos direitos, sem a preocupação dos correlatos deveres. A mentalidade que resulta desse modelo é do excessivo protecionismo e assistencialismo, sem a contrapartida necessária. Mais direitos sem deveres. Por força da nova lei de estágio, desde os bancos escolares, estaremos educando os futuros trabalhadores e cidadãos brasileiros a entender como normal e necessário o assistencialismo e o protecionismo, em lugar da iniciativa privada e do empreendedorismo. Tal fato, se permanecer, trará consequências nefastas para o Brasil, ferindo de morte o progresso econômico sustentável, bem como o crescimento individual dos brasileiros, sabidamente empreendedores. Assim, a mudança que se faz necessária é procurar retomar no homem a sua sanidade, para que esta, reforçada por leis válidas, consiga o retorno ao holístico humano, fomentando através das normas o crescimento da humanidade, e não a sua redução. Afinal, uma lei somente é boa se faz o ser humano progredir pelo trabalho e pela adequada educação. Lembra Meneghetti (2007) que em vez de ...novas leis, é preciso conhecer os nossos códigos e responsabilizar quem quer que participe daquela sociedade. É preciso dar-se conta de que existe uma sociedade com fortes obrigações que nos condiciona por toda parte. As regras são formalizadas e sancionadas pelo nosso consenso. Nós as esquecemos e acreditamos ser livres e cheios de direitos, enquanto os outros não observam as regras (...). Por uma questão de interesse individual, vamos redescobrir a nossa terra, vamos rever a nossa gente e repensar as nossas leis. Então, faremos e observaremos a nossa justiça social como consciência cívica (eu também sou os outros), e compartilhando a nossa liberdade com os direitos dos outros SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ ganharemos sanidade e amizade (MENEGHETTI, 2007, p. 104-105). E para tanto, sugerimos começar pela imediata modificação da nova lei de estágio dos estudantes, procurando inserir na legislação orientações que venham a educar e fomentar no espírito dos jovens estudantes brasileiros – futura força política e econômica da nação – a ideia da responsabilização pessoal, da meritocracia, do prazer no trabalho, da autorrealização, do autossustento. Tudo isto necessariamente convergindo para as necessidades fáticas da iniciativa privada responsável, supervisionado seriamente pelas instituições de ensino, baseado nesta nova ótica de Justiça Social proposta neste artigo. Com isso, estaríamos dando um primeiro passo, procurando afastar a “esquizofrenia legal” de uma lei específica, formadora e educadora dos jovens brasileiros, futuros condutores do país, o que certamente chamaria a atenção dos estudiosos e operadores do Direito para esta problemática, a qual vem imperando atualmente no sistema jurídico como regra, sem a devida atenção nas suas nefastas consequências. Afinal, não devemos nos esquecer que é necessário ultrapassar a sociedade de normas e conquistar a sociedade de pessoas, onde a pessoa é efetivamente mais importante que a lei, não podendo o indivíduo estar nunca em posição servil a esta. Referências ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2008. BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Con stituicao/Constituiçao.htm> Acesso: 27 de maio. 2010. BRASIL. Lei Federal n. 11.788, de 25 de setembro de 2008, que dispõe sobre o estágio de estudantes; altera a redação do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo DecretoLei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996; revoga as Leis nos 6.494, de 7 de dezembro de 1977, e 8.859, de 23 de março de 1994, o parágrafo único do art. 82 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e o art. 6o da Medida Provisória no 2.164-41, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_At o2007-2010/2008/Lei/L11788.htm> Acesso: 27 de maio. 2010. CHEMAMA, R.; VANDERMERSCH, B. Dicionário de Psicanálise. São Leopoldo: Ed. Unisinos, 2007. CRETELLA JÚNIOR, J. Curso de Direito Romano: o direito romano e o direito civil brasileiro no Novo Código Civil. 31. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009. FERRAZ JÚNIOR, T. S. Estudos de filosofia do direito: reflexões sobre o poder, a liberdade, a justiça e o direito. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas S/A, 2009. _______________. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2010. JAEGER, W. Paidéia. A Formação do Homem Grego. São Paulo: Martins Fontes, 2003. MENEGHETTI, A. A Psicologia do Líder. 4. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2008a. ____________. Dicionário de Ontopsicologia. 2. ed. Recanto Maestro: Ontopsicologica Editrice, 2008b. ____________. O critério ético do humano. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2002. ____________. A crise das democracias contemporâneas. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2007. SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ ____________. Fundamentos de Filosofia. São Paulo: Ontopsicologia Editrice, 2005. RÁO, V. O Direito e a vida dos direitos. São Paulo: Max Limonad Editor de Livros de Direito, 1952. v. I. REALE, M. Filosofia do Direito. São Paulo: Ed. Saraiva, 2010a. _____________. Lições preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 2010b. REIS, J. T. Relações de trabalho estágio de estudantes. Curitiba: Jurá Editora, 2008. Autores: Alessandro Spiller: advogado, sócio-administrador da Dupont, Spiller Advogados Associados; Especialista em Teoria Geral do Processo (UCS); Especialização em Gestão de Negócios e Intuição (AMF); profesor da Faculdade Antonio Meneghetti (AMF). Josemar Sidinei Soares: Doutor em Filosofia (UFRGS); Mestre em Educação (UFSM); Mestre em Ciência Jurídica (UNIVALI); professor Programas de Mestrado e Doutorado em Ciência Jurídica e professor Curso de Direito (UNIVALI); professor graduação e pós-graduação Faculdade Antonio Meneghetti (AMF). Recebido em: 05/12/2010. Aprovado em: 22/12/2010. SPILLER, Alessandro; SOARES, Josemar S. A Esquizofrenia demonstrada na Legislação atual através da nova Lei de estágio de estudantes. Revista Saber Humano, Recanto Maestro, n. 1, p. 125-141, fev. 2011. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ Linha Editorial Como enviar seus trabalhos Os trabalhos enviados devem seguir rigorosamente a norma ABNT (NBR 6023) visando a padronização das expressões científicas nos trabalhos publicados. 1 Objetivos A Revista Saber Humano, ISSN 2178-7689, da Faculdade Antonio Meneghetti tem como objetivo a publicação de trabalhos que sejam classificados nas seguintes modalidades: artigos/resultados de pesquisas, revisão de literatura (estudo teórico) e cases, nas áreas de Ciências Humanas e Ciências Sociais aplicadas, em especial áreas de Administração, Sistemas de Informação e afins. A Revista Saber Humano contará também com duas seções especiais: Seção Scio Ens que será destinada para outras áreas do conhecimento; e a Seção Episteme destinada à publicação de trabalhos inéditos. 2 Normas 2.1 Os trabalhos enviados para publicação devem ser inéditos, não sendo permitida a sua apresentação simultânea em outro periódico. 2.2 Os trabalhos deverão ser enviados exclusivamente via email – [email protected] -, sendo o arquivo do texto enviado tanto em formato DOC ou RTF (Word for Windows), quanto em PDF (Portable Document Format). 2.3 Serão aceitos artigos/resultados de pesquisas, revisão de literatura (estudo teórico) e cases nas línguas: português, italiano, espanhol e inglês. Os autores residentes fora do Brasil devem observar as mesmas regras de submissão. 2.4 O(s) autor(es) deve(m) enviar seus trabalhos já com a devida revisão ortográfica e sintática, com especial atenção à Reforma Ortográfica (2009-Brasil). 2.5 A publicação de um trabalho implica, automaticamente, a cessão integral dos direitos à Revista Saber Humano. 2.6 Deverá ser enviado por correio o Termo de Direitos Autorais, assinado pelo(s) autor(es) responsável, conforme ANEXO 1. Os artigos publicados têm seus direitos de publicação considerados doados à Revista por seus autores, não implicando ganhos financeiros para tal por parte dos autores. 2.6.1 A avaliação dos trabalhos é mantida através de um rigoroso sigilo de autores e avaliadores, não sendo divulgados para as partes os nomes envolvidos. As considerações serão feitas sempre por dois avaliadores e, no caso de discordância, um Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ terceiro avaliador será requisitado. Os critérios de avaliação são: originalidade; contribuição teórico-metodológica para a área em questão; qualidade técnica do texto; apresentação e metodologia. O resultado da avaliação é devolvido primeiro ao autor do artigo, que terá o prazo de 15 dias corridos para providenciar sugestões/correções e reencaminhar para a Revista. Posterior à publicação da Revista, será fornecido gratuitamente um exemplar da mesma para o(s) autor(es). 2.6.2 Para os trabalhos desenvolvidos a partir de pesquisas com seres humanos em programas de pós-graduação (Mestrado/Doutorado), em instituições oficiais de ensino e/ou pesquisa, deverá ser enviado conjuntamente o Parecer de Aprovação do Comitê de Ética de Origem. 2.7 No caso de artigos de discentes estes devem ter um orientador docente de cursos de graduação, conforme área de conhecimento do artigo, como co-autor. 2.8 Artigos fora das normas solicitadas não serão avaliados. É permitida a reprodução parcial dos artigos, desde que citada a fonte. 3 APRESENTAÇÃO 3.1 Estrutura 3.1.1 Artigo/Resultado de pesquisas: deverão conter título em português e título em inglês; resumo e palavras-chave (de 3 a 5); abstract e keywords (de 3 a 5); introdução; revisão da literatura e/ou fundamentação teórica; metodologia; resultados e discussão; considerações finais; e referências. Limites: texto com, no máximo, 17 páginas, já incluso referências, tabelas ou quadros, gráficos e figuras/imagens. 3.1.2 Revisão da literatura (estudo teórico): deverá conter título em português e título em inglês; resumo e palavras-chave (de 3 a 5); abstract e keywords (de 3 a 5); introdução revisão da literatura; discussão; conclusão; e referências. Limites: texto com, no máximo, 15 páginas já incluso referências, tabelas ou quadros, gráficos e figuras/imagens. 3.1.3 Cases – Deverão conter título em português e título em inglês; resumo e palavraschave (de3 a 5); abstract e key words (de 3 a 5); introdução; apresentação e discussão; conclusão; e referências. Texto com, no máximo, 8 páginas já incluso referências, bem como tabelas ou quadros, gráficos e figuras/imagens. 3.2 Folha de rosto Em separado, enviar também por e-mail uma folha de rosto do trabalho, contendo o nome(s) do(s) autor(es), titulação, instituição à qual está(ão) vinculado(s), currículo resumido e dados para contato (endereço completo para correspondência, e-mail e telefones). Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 3.3 Formatação de página: a. Margens superior e inferior: 2 cm b. Margens esquerda e direita: 3 cm c. Tamanho do papel: A4 d. Alinhamento do texto: justifcado e. Recuo especial da primeira linha dos parágrafos: 1,25 cm f. Espaçamento entre linhas: 1,5 linhas g. Controle de linhas órfãs/viúvas: desabilitado h. As páginas devem ser numeradas na margem superior canto direito. 3.3 Formatação de texto: a. Tipo de fonte: Times New Roman b. Tamanho da fonte: 12 c. Título em português: máximo de 90 caracteres d. Resumos em português e inglês: máximo de 250 palavras cada. O resumo deverá apresentar alinhamento justificado, apresentando a temática, contendo campo de estudo, objetivo, método, resultado e conclusão. O resumo deverá aparecer logo abaixo dos títulos (português, inglês). e. Deve ser observada a redação do texto de forma clara e fluente. Poderão ser utilizadas notas de rodapé quando necessário, quando o autor considerar importante detalhar alguma informação que não irá constar no texto principal. As notas de rodapé deverão ser inseridas ao fim de cada página, em fonte tamanho 10. 3.4 Citações de referências As citações poderão ser diretas – quando o autor utiliza-se de um texto original para extrair a citação, podendo reproduzi-lo literalmente. Ou indiretas – que o autor irá interpretá-lo, resumi-lo ou traduzi-lo, ou extrair uma informação de uma fonte intermediária. As citações deverão respeitar as normas da ABNT/2002 (NBR 10520) vide http://www.faculdadeam.edu.br/biblioteca, que deverão ser utilizadas para a redação dos trabalhos enviados para esta Revista. 4 REFERÊNCIAS Devem ser apresentadas em espaço simples, com alinhamento justificado, seguindo as normas da ABNT/2002 (NBR 6023), abaixo exemplificadas. 4.1. A exatidão das referências bibliográficas é de responsabilidade única e exclusiva dos autores. 4.2. As referências devem aparecer em ordem alfabética ao fim do corpo do trabalho. Exemplo: MOREIRA, D.A. Administração da produção e operações. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 1993. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ SILVA, R. O. da. Teorias da administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001 TOSCANI, L.V; VELOSO, P. S. Complexidade de algoritmos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2008. 256 p. 4.2.1. Nas publicações com até três autores, citam-se todos. 4.2.2. Nas publicações com quatro ou mais autores, cita-se o primeiro e, em seguida, a expressão latina et al. 4.3 Exemplos 4.3.1. Livro: TOSCANI, L.V; VELOSO, P. S. Complexidade de algoritmos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2008. 256 p. 4.3.2. Capítulo de livro: GOULART, S.; CARVALHO, C. A. O pesquisador e o design da pesquisa qualitativa em administração. In: VIEIRA, M. M. F.; ZOUAIN, D. M. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em administração: teoria e prática. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005, 119-140. 4.3.3. Organizador(es), Editor(es) ou compilador(es) como autor(es): VIEIRA, M. M. F.; ZOUAIN, D. M. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em administração: teoria e prática. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005. 4.3.4. Organização ou sociedade como autor: FOIL. Psicologia da organização. São Paulo: Foil, 2003. 4.3.5. Artigo de periódico: KATZENBACH, J. A disciplina das equipes. HSM Management, São Paulo, n. 17, p. 56-60, nov.-dez.1999. 4.3.6 Artigo em periódico on-line/internet: SILVA, M. Crimes da era digital. .Net, Rio de Janeiro, nov. 1998. Seção ponto de vista. Disponível em: <http://www.brasilnet.com.br/contexts/brasilrevistas.htm>. Acesso em: 04 mar. 2004 Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 4.3.7 Dissertação e tese: PEROTA, C. O sítio de Monsarás: evidências arqueológicas. 1979. 179 p. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1979. CARVALHO, J. M. A formação do professor e do pesquisador em nível superior no Brasil: análise do discurso do governo e da comunidade acadêmico-científica (19451964). 2 v. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação. Universidade Federal do Rio de Janeiro. 1992. 5 TABELAS OU QUADROS As tabelas, quadros e imagens deverão ser apresentadas no decorrer do texto, em seus respectivos espaços, não deverão ser enviadas em arquivos a parte. 5.1. Devem constar sob as denominações “Tabela” ou “Quadro” e ser numerados em algarismos arábicos. 5.2. A legenda deve acompanhar a tabela ou o quadro e ser posicionada abaixo destes ou indicada de forma clara e objetiva no texto ou em documento anexo. 5.3. Devem ser autoexplicativos e, obrigatoriamente, citados no corpo do texto na ordem de sua numeração. 5.4. Sinais ou siglas apresentados devem estar traduzidos em nota colocada abaixo do corpo da tabela/quadro ou em sua legenda. 6 FIGURAS/ IMAGENS 6.1. Devem constar sob a denominação “Figura” e ser numeradas com algarismos arábicos. 6.2. A(s) legenda(s) deve(m) ser fornecida(s) em arquivo ou folha impressa à parte. 6.3. Devem, obrigatoriamente, ser citadas no corpo do texto na ordem de sua numeração. 6.4. Sinais ou siglas devem estar traduzidos em sua legenda. 6.6. Devem possuir boa qualidade técnica e artística, utilizando o recurso de resolução máxima do equipamento/câmera fotográfica. 6.7. Devem ser enviadas gravadas em CD, com resolução mínima de 300dpi, nos formatos TIF ou JPG e largura mínima de 10 cm. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 6.8. Não devem, em hipótese alguma, ser enviadas incorporadas a arquivos de programas de apresentação (PowerPoint), editores de texto (Word for Windows) ou planilhas eletrônicas (Excel). 7 GRÁFICOS 7.1. Devem constar sob a denominação “Gráfico”, numerados com algarismos arábicos e fornecidos, preferencialmente, em arquivo à parte, com largura mínima de 10 cm. 7.2. A legenda deve acompanhar o gráfico e ser posicionada abaixo deste. 7.3. Devem ser obrigatoriamente, citados no corpo do texto, na ordem de sua numeração. 7.4. Sinais ou siglas apresentados devem estar traduzidos em sua legenda. 7.5. As grandezas demonstradas na forma de barra, setor, curva ou outra forma gráfica devem vir acompanhadas dos respectivos valores numéricos para permitir sua reprodução com precisão. 8 PROCESSO DE AVALIAÇÃO Os artigos enviados para publicação são avaliados preliminarmente pelos editores, que examinam a adequação do trabalho à linha editorial da Revista Saber Humano. Posteriormente, os artigos são encaminhados para apreciação sigilosa por pares. Caso sejam necessárias alterações/correções, os artigos serão devolvidos ao (s) autor (es) que terão o prazo de 15 (quinze) dias para efetuá-las e reencaminhar o artigo à Revista. O parecer final dos avaliadores da Revista ocorrerá da seguinte: a) Artigo aceito para publicação; b) Artigo aceito para publicação mediante alterações/correções; c) Artigo não aceito para publicação. Os autores são comunicados dos passos do processo por e-mail. Estima-se um prazo total de 30 (trinta) dias, desde o recebimento até o parecer sobre o artigo. A partir da aprovação final, o artigo é inserido na publicação da Revista de acordo com a programação das edições. Importante: 1. Envie pelo correio, um envelope com: - Termo de Cessão de Direitos Autorais, assinado pelo autor (es). Em caso de dúvida, entre em contato com a redação pelo telefone (55) 3289-1141. Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ 2. Os trabalhos devem conter imprescindivelmente, todos os dados para contato com o autor principal (endereço, telefones e e-mails), conforme solicitado na Folha de Rosto (item 3.2). 3. Todos os trabalhos enviados devem respeitar os limites máximos de tamanho de texto. 4. Dados para envio dos trabalhos: por e-mail para [email protected]; - por correio: enviar o Termo de Cessão de Direitos Autorais assinado (01 via) para: Faculdade Antonio Meneghetti-AMF A/C Revista Saber Humano Rua: Recanto Maestro, nº 338 Distrito Recanto Maestro São João do Polêsine – RS CEP: 97230-000 9 CONSELHO EDITORIAL A Revista Saber Humano tem um Conselho Editorial formado por pesquisadores nas áreas de Ciências Humanas e Ciências Sociais aplicadas, em especial áreas de Administração, Sistemas de Informação e afins, pertencente a diversos centros acadêmicos do Brasil e do exterior. Corpo Editorial Ana Claudia Valentini Montenegro (AMF – Mestranda em Administração/Univ. Presb. Mackenzie) Clarissa Mazon Miranda (Mestranda em Comunicação/UFSM) Estela Maris Giordani (AMF – Doutora em Educação/UNICAMP) Gabriela Rockenbach de Oliveira (AMF – Mestranda em Engenharia da Produção/UFSM) Josele Nara Delazeri de Oliveira (AMF – Mestre em Engenharia de Produção/UFSM) Leandra Calegare (AMF – Mestre em Engenharia de Produção/UFSM) Paolo Garcia Moreno Leonardi (AMF – Doutor em Ciências Políticas/Univerità degli Studi di Roma “La Sapienza”) Patrícia Wazlawick (AMF – Doutora em Psicologia/UFSC) Paula Silva Bazzo (AMF – Mestranda em Administração/UFSM) Soraia Schutel (AMF – Mestre em Administração/UFSM; Doutoranda em Administração/UFRGS) Viviane Disarz (AMF – Bibliotecária) Viviane Teresinha Biachi Brust (AMF – Especialista em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, Mestranda em Letras/Estudos Linguísticos UFSM). Comissão Editorial Patrícia Wazlawick (AMF – Doutora em Psicologia/UFSC) Paula Silva Bazzo (AMF – Mestranda em Administração/UFSM) Viviane Disarz (AMF – Bibliotecária) Revista Saber Humano número 1 | fev. 2011 ______________________________________________________________________________________________ ANEXO 1 Termo de Cessão de Direitos Autorais Nome da cidade, …. de ………………… de 20.... Eu (nós), [nome(s) do(s) autor(es)], autor(es) do trabalho intitulado [título do trabalho], o qual submeto(emos) à apreciação da Revista Saber Humano para nela ser publicado de forma impressa, on-line ou na forma por esta prevista, declaro(amos) concordar, por meio deste suficiente instrumento, que os direitos autorais referentes ao citado trabalho tornem-se propriedade exclusiva da Revista Saber Humano a partir da data de seu aceite final. Autorizo ainda a publicar a minha fotografia bem como meus dados com o intuito exclusivo de complementar os direitos autorais neste ato cedidos. __________________________ Nome completo RG: CPF: Revista Saber Humano Faculdade Antonio Meneghetti-AMF Rua Recanto Maestro, nº 338 | Distrito Recanto Maestro São João do Polêsine – RS | CEP: 97230-000 [email protected] | www.faculdadeam.edu.br