Joel Silva Ferreira Mata sem mais autoridade”82. Como se vê, o dote de Mécia Chacim demorara vários anos, após a sua morte, a integrar os bens do cenóbio, devido à natureza religiosa da comunidade que preferiu esperar, quando poderia, pela via judicial, requerer o seu direito, tanto mais que as dificuldades de subsistência eram, efectivamente grandes. Mais complexo e interessante é o processo judicial que envolve o património das irmãs Joana de Lordelo, freira do Mosteiro de Santos e Violante de Lordelo, freira do Mosteiro de Santa Clara do Porto. Por sentença de 6 de Abril de 1499, D. Manuel confirma, em última instância, o primeiro julgamento no qual interveio Nuno Gonçalves Maracote, juiz comissário, desembargador e ouvidor na Casa do Cível. Trata-se, com efeito, de uma acção judicial em que é autor João Lobato, fidalgo da casa do rei, morador em Lisboa, contra Joana de Lordelo e Violante de Lordelo, suas irmãs, a propósito das partilhas que, entendia o autor, lesavam francamente o seu património. Por outro lado, João Lobato não aceita a decisão do juiz Nuno Gonçalves Maracote “por causa da irmandade e parentesco que com as dictas partes tinha e asy per outros alguuns imcomvenientes que em allguua maneira ho poderia aver”83. A querela surge devido à herança que ficara por morte de Grimanessa de Lordelo, irmã das rés. João Lobato exigia, pelos instrumentos que apresentava (escrituras e autos) que lhe fossem entregues todos os bens e heranças deixadas pela referida Grimanessa de Lordelo “com os frutos e rendas dellos e que todo ello autor dizia lhe pertencer per trespasamento doaçam ou doaçoens que dizia lhe foram feitas da dicta herança e beens per pessoas a que pertenciam e em elles tiinha direito”84. Além disto, o autor pedia que as rés fossem obrigadas a pagar, “como herdeiras de sua may de certo dote que ella prometera a Fernam Foguaça cunhado dellas rees”85, apresentando João Lobato uma procuração de Fernão Fogaça, casado com Grimanessa de Lordelo, que lhe conferia poderes, para requerer em juízo o dote prometido, no valor de catorze mil e quinhentos reais. A questão prende-se com a forma como Grimanessa de Lordelo deixou, como sua herdeira, a irmã Joana de Lordelo, que João Lobato denunciava. O testamento feito pela defunta deixa “sua irmãa por sua herdeira em todos seus beens moves e de raiz os quaaes beens e heranças a dicta Johana de Lordello aceptara”86. João Lobato verifica que Grimanessa de Lordelo falecera no ano de 1480 e que, durante dezassete anos consecutivos, Joana de Lordelo se apropriou dos seus bens. Perante a acusação, Joana de Lordelo defende-se que de facto estava de posse, há mais de dez anos, dos bens e herança “que da dicta deffunta lhe ficaram e nunca por ello fora citada nem demandada antes senpre estevera en posse paciffica senam agora que a ho dicto autor demandava”87. A primeira sentença é desfavorável ao autor, João Lobato, que naturalmente recorre para a corte. O libelo apresentado novamente por si é muito complexo, dando-nos a relação familiar das rés e apontando o processo pouco claro, usado por cada uma para se apropriar do que, no entender do autor lhe pertencia. Afonso Gonçalves Maracote e Isabel de Lordelo foram casados e do seu matrimónio nasceram Guiomar de Lordelo, Filipa de Lordelo, Joana de Lordelo, Mécia de Lordelo (freira do Mosteiro de 82 Ibidem. 83 AN/TT, Mosteiro de Santos, cx.9, m.u., n.º 25 (752). 84 Ibidem. 85 Ibidem. 86 Ibidem. 87 Ibidem. 139