Duarte, MRT
Página i
MARISA RIBEIRO TEIXEIRA DUARTE
Sistemas públicos de educação básica e relações
intergovernamentais: a ação da União e a autonomia dos
sistemas locais de ensino
JULHO 2003
Marisa Ribeiro Teixeira Duarte
Sistemas
públicos
de
educação
básica
e
relações
intergovernamentais: a ação da União e a autonomia dos
sistemas locais de ensino
Tese apresentada ao Curso de Doutorado
da Faculdade de Educação da Universidade
Federal Fluminense, como requisito parcial
à obtenção do título de Doutor em
Educação.
Área de concentração: Movimentos sociais
e políticas públicas
Orientador: Prof. Dr. Osmar Fávero
Niterói
Faculdade de Educação da UFF
2003
Duarte, Marisa Ribeiro Teixeira
D812
Sistemas públicos de Educação Básica e relações
intergovernamentais : a ação da União e a autonomia dos
sistemas locais de ensino / Marisa Ribeiro Teixeira Duarte. Niterói : UFF/ FE, 2003.
482 f.
Tese – Doutorado em Educação
Orientador: Prof. Dr Osmar Fávero
1. Educação e estado - Teses 2. Educação –
Financiamento. 3. Federalismo - Brasil. 4. Descentralização
administrativa - Brasil. 5. Escolas publicas – Administração –
Avaliação. I. Título. II. Fávero, Osmar. III. Universidade Federal
Fluminense. Faculdade de Educação.
CDD – 379.1
Catalogação da Fonte : Biblioteca da FaE/UFMG
Tese defendida em 21 de julho de
2003 perante a banca examinadora
constituída pelos professores:
Prof. Dr. Osmar Fávero / UFF – orientador
Prof.ª Dr.ª Maria Ligia de Oliveira Barbosa / UFRJ
Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury / CAPES
Prof. Dr. Almerindo Janela Afonso / UMINHO
Profª. Drª. Dalila Andrade de Oliveira / UFMG
Para Gabriela e Marco Filho, amores
Duarte, MRT
Página i
AGRADECIMENTOS
O que não há somos nós, e a verdade está aí.
Sou quem falhei ser.
Somos todos quem nos supusemos.
A nossa realidade é o que não conseguimos nunca.
(PECADO ORIGINAL, Álvaro de Campos)
Eles não aparecem nas referências, mas sem sua colaboração esta tese não teria sido
possível. São funcionários públicos, alguns profissionais de educação e ao apontarem suas
perplexidades e conhecimento dos procedimentos, que orientavam a execução dos serviços
educacionais em diferentes municípios do estado, contribuíram para a formulação deste
tema de investigação. Auxiliaram, também, na obtenção de dados cujo acesso constituía
recurso de perpetuação de pequenos poderes.
Burocratas, em um país onde a burocracia constituiu-se com patrimonialismo, resistem às
tradicionais investidas tutelares e às atuais diretrizes gerenciais, com o objetivo de
preservar espaços de autonomia e construir relações de trabalho, onde o controle público
não se faça apenas sobre resultados, mas possa contribuir na adoção de procedimentos
capazes de democratizar e republicanizar instituições estatais. Mário, Sandra, Elzira, Vera,
Ricardo, Lili e tantos outros que tornaram esta tese possível, muito obrigada.
Aos mestres do ofício, pela orientação e apoio no desenvolvimento desta tese, por apontar
a importância política do pensamento de educadores brasileiro, por contribuírem em minha
formação como professora e estudante. E, especialmente por trabalharem como servidores
públicos, trazendo o Estado para o controle da cidadania.
Aos colegas do Departamento de Administração da Faculdade de Educação da UFMG,
pela regulamentação de um programa de qualificação docente, que priorizou uma formação
comum a todos os seus professores, em um contexto onde critérios de competição e
produtividade adquiriram centralidade. Em especial, à Dalila e Rosy por ser envolverem
nestes temas de estudo e compartilharem etapas de trabalho conjunto.
Por último e com toda a importância merecida, ao companheiro e amante que, por
caminhos
muito
próprios,
ajudou
a
tornar
este
trabalho
realidade.
Duarte, MRT
Página ii
SUMÁRIO
ordem
Título
APRESENTAÇÃO
1
1
1.1
Formulação institucional e reforma do sistema público de EB
2
1.2
Estrutura e sistema educacional: por que estudá-los?
5
1.2.1 Sistema público de educação no Brasil e sistemas de ensino
7
Anísio Teixeira e a elaboração de um projeto de sistema público de
educação básica no Brasil
10
1.3.1
1.3.2
1.4
Organização do sistema público de educação básica:
descentralização e órgãos locais de gestão colegiada
13
Centralização como intervenção reguladora
19
Organização do sistema público de educação básica: etapas e
modalidades de ensino
22
1.5
Verbas públicas para escolas públicas: financiamento da EB
26
1.6
A tradição desafortunada: ampliação do escopo da negociação política
29
Políticas sociais, descentralização e regime de colaboração
2.1
33
Regime de colaboração, descentralização e autonomia dos sistemas de
ensino
36
Relações intergovernamentais e regime de colaboração
39
2.2.1 Sistemas municipais de ensino e autonomia política do governo
local
39
2.2.2 Polifonia de vozes e hibridismo jurídico-político
41
2.2.3 Ruptura com o federalismo de integração no campo educacional
43
2.2.4 Relações predatórias à recentralização política pela União
47
2.3
A sistemática de recentralização: convênios e subvinculação
51
2.4
Gestão democrática dos sistemas de ensino e relações
intergovernamentais cooperativas
55
Regime de colaboração entre os entes federados: condições para o
atendimento nos sistemas públicos de Educação Básica
58
2.2
3
Xv
Sistema público de educação básica no Brasil um estudo com Anísio Teixeira
1.3
2
pág.
3.1
De verbas públicas para escolas públicas ao regime de colaboração
entre sistemas de ensino
60
Da atribuição de responsabilidades ao exercício de função supletiva e
redistributiva
63
3.3
Sistemas municipais de ensino e uma herança centralizadora e desigual
65
3.4
Autonomia dos sistemas municipais e sistema único de EB
68
3.2
Duarte, MRT
3.5
Relações federativas e função supletiva e redistributiva da União
71
3.6
Relações federativas e assistência a estados e municípios
77
3.6.1 A sistemática operacional do FNDE
78
Federalismo, regime de colaboração e assistência técnico-financeira:
diferenças na capacidade de atendimento.
81
Dispersão e redistribuição da receita pública nos municípios do estado de
Minas Gerais: critérios de orientação para análise dos efeitos do FUNDEF.
85
4.1
Consolidando alguns pressupostos
85
4.2
Referenciais e procedimentos
86
4.3
O FUNDEF e políticas redistributivas em educação
87
4.4
Capacidade fiscal dos municípios mineiros ou a lenda de Robin Hood.
90
4.5
Política de financiamento da educação e justiça redistributiva
100
4.6
Mecanismos redistributivos e redução das desigualdades
intermunicipais
103
3.7
4
Página iii
5 Sistemas públicos de ensino e capacidade de atendimento
105
5.1
Caracterização dos municípios selecionados
107
5.2
A demanda por educação básica: pop. residente, idade e escolarização
em quatro municípios do estado de Minas Gerais
108
5.2.1 Demanda e atendimento em Educação básica
110
O atendimento ofertado: crescimento dos serviços educacionais por
entidade mantenedora
116
5.3.1 O atendimento ofertado: crescimento dos serviços educacionais
por entidade mantenedora
119
5.3
6 Sistemas educacionais em perspectiva comparada: relações
intergovernamentais e autonomia da escola
127
6.1
Diretrizes globais de reforma educativa e relações intergovernamentais
128
6.2
A constituição de uma área de estudos em administração educacional e
os contextos de autonomia das escolas
131
Brasil e Portugal: tempos de rupturas e reforma(s) da educação escolar
básica
134
6. 4
Autonomia das escolas e dos governos locais
138
6. 5
Autarquias, educação escolar e ação social: governos locais e
descentralização
141
6.6
Receitas autárquicas, gastos em educação escolar e ação social
143
6.7
Um mecanismo de interação entre o centro e a(s) periferia(s): acordos
de cooperação técnico científica
146
6.7.1 Sistemática operacional das comparticipações (transferências
voluntárias)
152
6. 3
Duarte, MRT
6.8
Página iv
6.7.2 Acordos de cooperação técnico-científica: interação entre o centro
e a(s) periferia(s)
152
Gastos autárquicos na área educacional
153
6.8. 1 Gastos atomizados e com construções
154
6.8. 2 Gastos com serviços e unidades escolares
159
6.8.3 Relações entre centro(s) e periferia(s) e pagamento pelos serviços
efetuados
161
7
Referências e sínteses provisórias
165
8
Referências bibliográficas
171
9
Bibliografia consultada
181
10 Legislação referida
187
Duarte, MRT
Página v
RELAÇÃO DE QUADROS
Quadro
1
Demonstrativo das ações por níveis e modalidades de ensino
79
Quadro
2
Demonstrativo dos programas por nível ou modalidade de
79
ensino e destinatários
Quadro
3
Composição do FUNDEF, segundo origem dos recursos – 1998 89
- R$ em milhões
RELAÇÃO DE TABELAS
Tabela
1
Brasil - Taxas de Escolarização e de Atendimento por Nível de
Ensino - 1994/2000
1
Tabela
2
Percentual da População por Estágio de Proficiência - Brasil – 2001
2
Tabela
3
Evolução percentual da população residente
36
Tabela
4
Despesas com educação e receita de convênios em 04 municípios de
Minas Gerais – 1997 – em reais
52
5
Convênios firmados entre o Ministério da Educação e Cultura (MEC)
e dois municípios do estado de Minas Gerais
54
Tabela
6
Média e coeficiente de variação da receita corrente per capita anual
dos municípios do estado de Minas Gerais
90
Tabela
7
Municípios com receita corrente líquida per capita superior à média
dos municípios do estado, mais dois desvio padrão – Minas Gerais
98
Tabela
8
Composição percentual da receita arrecadada, nos municípios com
maior receita corrente líquida per capita do estado de Minas Gerais –
1999
101
Tabela
Tabela
9
Minas Gerais, agrupamento de municípios segundo a pop. residente – 105
2000
Tabela
10
Pop. residente, segundo a faixa etária, em quatro municípios do
estado de Minas Gerais
108
Duarte, MRT
Página vi
11
Taxa de crescimento da população residente, segundo a faixa etária,
em quatro municípios do estado de Minas Gerais
109
Tabela
12
Taxa de alfabetização da população residente com mais de 10 anos,
em quatro municípios de Minas Gerais – 2000
113
Tabela
13
Minas Gerais, resultado final do Censo Escolar - Matrícula por etapa
e modalidade da EB
116
Tabela
Tabela
14 Matrícula no ensino médio, em CAA 1, MG
Tabela
15 Município I - Receitas orçamentais por fonte de recursos
Tabela
16
Tabela
17 Município III - Receitas orçamentais por fonte de recursos (em
contos)
149
Tabela
18 Composição percentual das receitas autárquicas segundo a fonte
151
Tabela
19 Despesas correntes e de capital em Educação, Cultura e Turismo Município I - 2000
154
Tabela
20 Município I - Principais ações desenvolvidas em 2000 na área da
Educação
156
Tabela
21 Município II - Despesas correntes relativas à educação escolar
elementar – 2000
157
Tabela
22 Município III - Subsídios e transferências atribuídos a entidades
escolares – 2000
158
Tabela
23 Relação de encargos assumidos e não pagos - referentes a educação
escolar elementar – Município II – 2000
159
Tabela
24 Síntese do planejamento financeiro em projetos educativos das
escola, para o ano letivo 2000/2001
160
123
147
Município II - Receitas orçamentais por fonte de recursos (em
contos)
148
Duarte, MRT
Página vii
RELAÇÃO DE GRÁFICOS
Gráfico 1
Receita corrente líquida (log.10) do municípios de MG - 1996
92
Gráfico 2
Receita corrente líquida (log.10) do municípios de MG - 2001
94
Gráfico 3
Dispersão da receita corrente líquida per capita dos municípios do
estado de Minas Gerais – 1996 (em reais)
95
Dispersão da receita corrente líquida per capita dos municípios do
estado de Minas Gerais – 2001 (em reais)
96
Percentual de crianças excluídas da pré-escola por município,
segundo a idade
114
Gráfico 4
Gráfico 5
Gráfico 6
Percentual de inclusão na educação pré-escolar e ensino fundamental,
115
por município, segundo a idade
Gráfico 7
Percentual de exclusão escolar no ensino fundamental por município,
segundo a idade
116
Gráfico 8
Minas Gerais, evolução da matrícula no ensino fundamental regular
117
Gráfico 9
Minas Gerais, evolução da matrícula no ensino médio regular
118
Gráfico 10 Evolução da matrícula em EB regular por municípios (CAA 1 e CAA
2), segundo a entidade mantenedora.
120
Gráfico 11 Evolução da matrícula em EB regular por municípios (CAE 1 e CAE
2), segundo a entidade mantenedora.
121
Gráfico 12 Matrícula por etapa da educação básica, segundo a entidade
mantenedora - CAA 1, MG
122
Gráfico 13 Matrícula por etapa da Educação Básica, segundo a entidade
mantenedora - CAA 2
123
Gráfico 14 Matrícula por etapa da EB, segundo a entidade mantenedora - CAE 1
124
Gráfico 15 Matrícula por etapa da EB, segundo a entidade mantenedora - CAE 2
125
Duarte, MRT
Página viii
ANEXOI
Quadro
1 Proposições de ações ou programas educacionais por sistema de
ensino – Brasil – Municípios das capitais - 2000
1
Docume 1 Síntese de projetos educativos de escolas básicas do 1º ciclo nto
Portugal
10
Figura
9
1 Estrutura do sistema público de educação escolar
A N E X O II
Quadro
2 Minas Gerais, população residente, receita corrente líquida e
receita corrente líquida per capita, segundo os município - 1996
10
Quadro
3 Minas Gerais, população residente, receita corrente líquida e
receita corrente líquida per capita, segundo os municípios. 2001
27
A N E X O III
Quadro 4 Percentual de freqüência à escola por etapa e série, segundo a
idade – CAE 1 – 1996
Quadro 5 Freqüência à escola por etapa e série, segundo a idade – CAE 1
- 1996
Quadro 6 Percentual de freqüência à escola por etapa e série, segundo a
idade – CAE 2 – 1996
Quadro 7 Freqüência à escola por etapa e série, segundo a idade – CAE 2
- 1996
Quadro 8 Percentual de freqüência à escola por etapa e série, segundo a
idade – CAA 1 – 1996
Quadro 9 Freqüência à escola por etapa e série, segundo a idade – CAA 1
- 1996
Quadro 10 Percentual de freqüência à escola por etapa e série, segundo a
idade – CAA 2 – 1996
Quadro 11 Freqüência à escola por etapa e série, segundo a idade – CAA 2
- 1996
Quadro 12 Evolução da matrícula efetiva em quatro municípios de MG,
por etapa e modalidade da Educação Básica, segundo a
entidade mantenedora
A N E X O IV
Quadro
1
Quadro
2
Quadro
Figura
46
47
48
49
50
51
52
53
54
3
Minas Gerais - Grau de Urbanização 2000
Minas Gerais – Número de municípios por região de
planejamento
Condições de Vida nas Regiões de Planejamento de MG - 1991
55
56
2
Minas Gerais, regiões geográfica de planejamento
57
55
Duarte, MRT
Página ix
Duarte, MRT
Página ix
Public systems for elementary education and inter-agency relations:
actions from the federal government and the autonomy of local
education systems.
The fundamental question addressed in this study is related to the implementation of the
colaborative hierarchy, established by the Federal Constitution of 1988 (caput, art 211).
The objective deals with the apprehension of the concrete mechanisms of its
implementation.
The political-judicial autonomy established for the local elementary
educational system established is analysed in view of the restrictions imposed by the
higher levels of government. What is the type of autonomy of the system constructed after
1996? This analysis highlights the political nature of the relations between the educational
systems with the goal to expand the coverage of basic elementary education, which, in turn
would provide better access and equalize opportunities for all. The analysis of the relations
between the public financing network and the capacity of local government agencies to
implement educational policies has been prioritized in this study.
Key words: Brasil educational policy – Local educational systems – educational
administration
Sistemas
públicos
de
educação
básica
e
relações
intergovernamentais: a ação da União e a autonomia dos sistemas
locais de ensino
O problema geral implicado neste estudo relaciona-se com a efetivação do regime de
colaboração, estabelecido na Constituição Federal de 1988 (caput, art. 211). O objetivo do
estudo dirige-se para a apreensão dos mecanismos reais de seu exercício. A autonomia
jurídico-política estabelecida para os sistemas municipais de Educação Básica é analisada
frente às relações e restrições com os níveis superiores de governo. Qual o tipo de
autonomia dos sistemas de ensino construída após 1996? Esta análise destaca a natureza
essencialmente política das relações entre os sistemas de ensino como forma de expandir o
atendimento em Educação Básica, capaz de efetivar a ampliação do acesso e igualdade de
oportunidades. Privilegia-se a análise das relações entre as sistemáticas de financiamento
público e a capacidade de decidir e implementar políticas pelos governos locais.
Palavra chave: Política educacional no Brasil – Sistemas locais de educação básica –
Administração educacional
Duarte, MRT
Página x
GLOSSÁRIO1
Autarquia = em Portugal, instância administrativa de uma cidade pelos seus concidadãos.
No Brasil, entidade estatal autônoma, com patrimônio e receita próprios, criada por lei
para executar, de forma descentralizada, atividades típicas da administração pública.
Concelho = Circunscrição governamental de administração pública.
Rede particular = conjunto de escolas mantidas por entidades privadas em uma localidade
ou região.
Rede pública = conjunto de escolas criadas e mantidas exclusivamente pelo poder público
Sistema de ensino = conjunto de órgãos e entidades estatais e/ou privadas (lucrativas ou
não lucrativas) submetidas ao poder publico de um dos entes federados.
Sistema público de educação básica = conjunto de órgãos e entidades estatais, particulares
e/ou não governamentais submetidos ao poder normativo, de coordenação e avaliação
da União para a oferta de serviços educacionais.
Sistemas públicos de ensino ou sistemas públicos de educação básica = conjunto de órgãos
e entidades estatais submetidos ao poder públicos de um dos entes federados, detentor
de poder normativo, de coordenação e supervisão da oferta de serviços educacionais..
Transferências constitucionais obrigatórios = Dotações, independente de contraprestação
direta em bens ou serviços, derivadas da Lei constitucional, entre os entes federados
para repartição da receita tributária.
Transferências voluntárias = Dotações feitas entre a União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, com a correspondente prestação de serviços e/ou assinatura de termo de
convênio.
1
Na literatura pesquisada encontramos algumas imprecisões ou omissões quanto ao sentido dos termos
utilizados. Por este motivo optamos por anexar este glossário com o objetivo de explicitar o sentido utilizado
dos termos nesta tese.
Duarte, MRT
Página xi
SIGLAS E ABREVIATURAS
CAA
Capacidade de atendimento ampliada
CAE
Capacidade de atendimento esgotada
CF
Constituição Federal
CMA
Capacidade mínima de atendimento
CNE
Conselho Nacional de Educação
DASP
Departamento de Administração do Serviços Público
EB
Educação básica
EC n° 14/96
Emenda constitucional n° 14, promulgada em 12 de setembro de 1996
EF
Ensino fundamental
EI
Educação infantil
EM
Ensino médio
FUNDEF
Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental
ICMS
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
LDB ou LDBEN
MDE
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n° 9394, sancionada
em 20 de dezembro de 1996
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
PNE
Plano Nacional de Educação
Duarte, MRT
Página xii
APRESENTAÇÃO
"A que gênero de pesquisa um sociólogo da educação dedicava-se por volta de 1970?",
quando iniciava o trabalho como professora de sociologia da educação, após a greve de
docentes ocorrida em 1979 no estado de Minas Gerais. O estudo da (re)produção da(s)
desigualdade(s) escolar(es) constituía a categoria chave de pesquisas que, em sua maioria,
encerravam-se em um método onde se renunciava à interrogação sobre as razões da
desigualdade. A esta perspectiva PETITAT, dentre outros, contrapôs a necessidade de se
indagar sobre as razões da desigualdade de oportunidades escolares. Para tanto retomou a
história como método de apreensão do real (PETITAT, 1994: p. 5)
Em perspectiva diversa, a sociologia política da educação, pré anos 70, indagava sobre as
escolhas efetuadas e as possibilidades visíveis ou latentes. As razões da desigualdade eram
obscurecidas, por uma razão que pretendia intervir. A indagação subjacente relacionava-se
com os efeitos possíveis, com o intuito de balizar decisões e ações. O pesquisador
procurava projetar seu trabalho para um futuro, fundamentando tendências. Fundia-se
passado e futuro ao privilegiar possibilidades de decisão, suas causas e conseqüências.
Os planos de reconstrução escolar salvo o de países novos, como os
Estados Unidos, que receberam de chofre a nova civilização, e em
grande parte a criaram, sem quase passar pelos estágios anteriores,
eram planos de transação de acordos, de arranjos laboriosos entre as
novas exigências do tempo e as tradições arraigadas de
séculos.(TEIXEIRA, 1953. p.24)
A (des)igualdade escolar para esta sociologia política da educação constituía um desafio de
"construção institucional". Pretendia-se reformar o aparato de Estado, para promover
mudanças na estrutura de relações entre Estado e Sociedade, e simultâneo ao processo de
reforma do Estado, pretendia-se reconfigurar o desenho institucional de um modelo de
prestação de serviços sociais. Nesta engenharia política o formato institucional herdado do
passado orientava, condicionava e impulsionava diferenças entre atores, quanto às escolhas
a serem efetuadas. Mas, a indagação sobre as razões da desigualdade subsumia-se a um
esforço teórico-prático de engendrar arranjos institucionais, capazes de estabelecer
tratamentos mais universais ou menos diferenciados, para a prestação dos serviços sociais.
“o princípio da igualdade de oportunidades, abstratamente
considerado, nada tem particularmente de novo: ele não passa da
aplicação da regra de justiça a uma situação na qual existem várias
Duarte, MRT
Página xiii
pessoas em competição para a obtenção de um objetivo único, ou
seja, de um objetivo que só pode ser alcançado por um dos
concorrentes (como o sucesso numa corrida, a vitória num jogo ou
num duelo, o triunfo num concurso etc. Bobbio, 1997) .
Estes temas são importantes para a correta apreensão do objeto de análise desta pesquisa.
A relevância de precisar a capacidade de atendimento dos sistemas públicos de educação
básica justifica-se pela efetivação do princípio liberal de igualdades de oportunidades.
Mas, no contexto deste trabalho, o aplicamos a efetivação do princípio de autonomia
política dos sistemas de ensino. Objetivo estratégico de políticas públicas de educação, a
partir dos anos oitenta por, supostamente, ser capaz de obter maior efetividade no
atendimento escolar. No entanto, mesmo as políticas que objetivam apenas promoção de
maior eqüidade, pressupõem o reconhecimento de desigualdades como condição de
intervenção, simultaneamente a adoção de universais capazes de produzir sínteses na
diversidade.
FERRARO, 1999 ao realizar diagnóstico da escolarização de crianças e adolescentes de 5 a
17 anos no Brasil, com base em dados censitários reafirma repetidamente a importância da
regionalização desses estudos. Mas, seu diagnóstico tem por foco a categoria da exclusão,
apreendida como exclusão da escola – cuja forma extremada é o analfabetismo – e
exclusão na escola – expressa pelos números de evasão e repetência presentes no sistema
escolar brasileiro. A esta categoria agrega-se a categoria da desigualdade espacial
intergovernos, como pré-condição de inclusão dos sujeitos pela existência de um sistema
público de educação básica menos desigual.
A alteração do foco da(s) exclusão(ões) escolares para a desigualdade intersistemas,
modifica os termos da concepção de política subjacente. O termo exclusão, é articulado por
diferentes autores (FERRARO, 1999: 22-47) aos problemas derivados da organização e
funcionamento dos sistemas escolares. À primeira palavra contrapõe-se incluir, ou seja,
trazer para dentro algo que está fora. Implementar programas e ações que integrem os que
foram expulsos.
Ao segundo termo opõe-se igualdade, com o objetivo de estabelecer arranjos políticos
institucionais onde não se apresentam apenas diferenças. As mais diferentes análises que
Duarte, MRT
Página xiv
trabalham com exclusão da escola, exclusão na escola – a la gauche – ou evasão,
repetência e taxas de alfabetismo – a la droit – têm por horizonte a adoção diferenciada de
medidas político-educacionais. Para os primeiros trata-se, de priorizar a implantação de
novas formas institucionais de organização e funcionamento da educação capazes de
incluir sujeitos sociais desiguais. A ênfase política é posta na multiplicação de
organizações capazes de potencializar movimentos sócio-culturais os mais diversos. À
diversidade sócio-institucional subordinam-se, entretanto, medidas capazes de assegurar
padrões mais universais de gestão da res pública.
Para outros, as medidas necessárias relacionam-se à otimização da eficácia e por
decorrência
da
efetividade.
Correção
de
desequilíbrios
sócio-espaciais
e
intergovernamentais advém da implementação de programas e ações governamentais
capazes de promover maior concorrência. Um quasi-mercado, ou seja, um mercado
regulado pela coordenação do Estado. No entanto, esta perspectiva não desconhece a
importância de intervenções reguladoras sobre os mercados.
O horizonte de análise prioriza as desigualdades sócio-espaciais entre sistemas de ensino, a
relação entre financiamento e autonomia política passa a ser priorizada. Ou, sob ângulo
diverso, destacam-se medidas capazes de estabelecer condições materiais mais uniformes,
como patamar comum de diferenças posteriores. A escolha destes focos é repleta de
conseqüências. O reconhecimento da diversidade humana, cultural, social e política não
prescinde de universais que possibilitem intercâmbios. Como também o reconhecimento da
singularidade presente em indivíduos, grupos e sujeitos sociais requer mediações mais
complexas que possibilitem sua inclusão pelo reconhecimento da diferença em relação ao
outro.
Ao ressaltar capacidade de atendimento as questões sócio culturais adquirem relevância
para os atores internos participantes da condução do sistema de ensino. Supondo condições
básicas comuns de financiamento distribuídas por todo o país, a maior ou menor
efetividade do projeto político pedagógico articula-se com a cultura política presente na
localidade ou região.
Duarte, MRT
Página xv
O problema geral implicado neste estudo relaciona-se com a efetivação do regime de
colaboração, estabelecido na Constituição brasileira de 1988 (caput, art. 211) e o objetivo
a ser atingido envolve a apreensão dos mecanismos reais de seu exercício. A CF
determinou, especificamente para o oferta de serviços educacionais, o regime de
colaboração entre os entes federados. A autonomia jurídico-política estabelecida para os
sistemas municipais de Educação Básica é analisada frente às relações e restrições com os
demais níveis de governo. A perspectiva do estudo efetuado envolve o tipo de autonomia
dos sistemas de ensino engendrada pós 96, destacando a natureza essencialmente política
das relações entre os sistemas de ensino como forma de expandir o atendimento em
Educação Básica, capaz de efetivar a ampliação do acesso e igualdade de oportunidades.
Privilegiou-se a análise das relações entre as sistemáticas de financiamento público e a
capacidade de decidir e implementar políticas pelos governos locais.
Um dos temas recorrentes em diferentes estudos, que tratam das relações entre
descentralização, democratização e reforma das políticas sociais, aborda o reconhecimento
da importância relativa das análises de viés institucionalista na determinação das condições
de atendimento dos diferentes sistemas de ensino. Neste estudo, optamos por analisar as
modificações ocorridas nos sistemas públicos de educação básica no Brasil, tendo por
referência que a reforma empreendida, especialmente após 1996, é decorrência de tensões
entre fatores estruturais produzidos nos movimentos da sociedade civil e formas
institucionais que operam como condicionantes das ações dos diferentes agentes
envolvidos
neste
processo.
Destacamos,
como
foco
de
estudos,
as
relações
intergovernamentais que fundamentam o financiamento público da educação básica por
possibilitar a análise da dinâmica de reformas educacionais para à constituição de um novo
espaço público não estatal ou mercantil.
Iniciamos com a análise de concepções de sistema público elementar (educação básica)
presente no pensamento educacional brasileiro, interrogando sobre as diferentes
proposições
de
organização
da
sistemática
de
financiamento
e
relações
intergovernamentais sobre a estruturação de um sistema público descentralizado de
educação básica no país. A herança autoritária e algumas propostas defensoras da matriz
estatal do sistema público as articulavam com um papel protagonista da União. Qual a
formulação institucional adequada a um sistema público de educação escolar, capaz de
Duarte, MRT
Página xvi
assegurar descentralização e a universalização do acesso e permanência? A construção de
uma resposta a esta indagação se fez pela alternativa que foi negada, pelo reconhecimento
de que nossa realidade é o que não conseguimos?
Em segundo momento, abordamos como as relações entre União, estado subnacionais e
sistemas municipais de ensino configuram autonomia e descentralização político
administrativa. Procuramos recuperar a história das relações federativas no campo da
educação escolar básica, indagando sobre os procedimentos que promover cooperação
entre os entes federados.
O terceiro capítulo desenvolve os temas anteriores analisando posições de diferentes atores
que interviram de modo recessivo ou dominante (Cury, 1997) na construção do texto da
LDBEN, em especial quanto à autonomia política dos sistemas locais de ensino e suas
relações com os demais entes federados. Como medidas de financiamento da educação
articulam-se à promoção de maior igualdade inter-sistemas? Esta questão nos conduz ao
quarto capítulo, onde se apresentam elementos para análise dos efeitos do FUNDEF,
considerado nos últimos anos – governo FHC - como medida exemplar de política
redistributiva.
O quinto capítulo, indaga em perspectiva comparada sobre as reformas de ensino
implementadas no Brasil e Portugal. Pesquisa realizada sobre a atuação das autarquias
portuguesas no campo educacional, indaga sobre a superação e conseqüências da tradição
administrativa centralizada/descentralizada nos dois países. As diretrizes globais de
reforma da educação receberam prioridades e medidas diferenciadas nos dois países,
devido às influências de institucionalidades políticas distintas.
Encerramos este trabalho expondo a importância teórico-política da reflexão sobre a
configuração do sistema público de educação básica no Brasil. Apropriamos da acepção
habermasiana de esfera pública política para situarmos a reflexão sobre a organização do
sistema educacional como espaços tempos de formação humana em sociedade plural e
sobre regime político democrático. Retomamos, novamente, o tema anisiano da
configuração do sistema público, porém, situando o significado deste debate no contexto
das atuais reformas educacionais
1. Sistema público de Educação Básica no Brasil : um estudo com Anísio
Teixeira
Com Anísio Teixeira, a nossa realidade esteve marcada por outras
possibilidades históricas de realização democrática em educação,
certamente bem mais aceitáveis do que o padrões que hoje vigoram
entre nós (ROCHA, 1996: 219)
A implantação de um sistema público universal de educação básica constitui um desafio
que o país, no inicio do século XXI, procura ainda realizar. Na atualidade, as formulações
de políticas em torno desse desafio têm por horizonte a efetivação do direito à educação,
do princípio liberal de igualdade de oportunidades educacionais, os vínculos entre
descentralização e democracia e a estratégia de reforma do Estado em face da
reorganização da sociedade civil. Os embates envolvem temas como as relações entre os
entes federados, com os diversos segmentos do setor privado (lucrativos e não lucrativos)
em atuação no campo da educação escolar e com outras entidades organizadas da
sociedade civil (movimento docente, de pais, de diferentes grupos culturais, etc.). Quais as
características, procedimentos e amplitudes da prestação dos serviços necessários a
efetivação de um sistema público de educação básica? Autonomia, financiamento público e
efetividade social são princípios gerais que requerem medidas político administrativas de
operacionalização, repletas de conseqüências para o quotidiano das escolas básicas e para a
organização e funcionamento de um sistema público no país.
No Brasil, a prioridade política fixada, nos últimos anos, para a oferta do Ensino
Fundamental obrigatório tem assegurado acesso e maior permanência de quase todas as
crianças entre sete e 14 anos na escola.
TABELA 1
Brasil - Taxas de Escolarização e de Atendimento por Nível de Ensino 1994/2000
Ano
Taxa de Escolarização
Ensino Fundamental
Taxa de Atendimento
Ensino Médio
Bruta
Líquida
Bruta
Líquida
7 a 14 anos
15 a 17 anos
1994
110,2
87,5
47,6
20,8
92,7
68,7
2000
126,7
94,3
76,6
33,3
96,4
83,0
Fonte: MEC/INEP
No entanto, esta definição de política educacional se fez com alterações significativas nas
etapas anteriores e posteriores da educação básica: redução do atendimento público em
educação infantil e segmentação do ensino pós-obrigatório em médio propedêutico e
Duarte, MRT
Página 2
educação profissional. A ordem constitucional de erradicação do analfabetismo passou a
ser cumprida por programas compensatórios de caráter voluntário e assistencial, no
atendimento a jovens e adultos com escolarização insuficiente. O funcionamento das
escolas públicas de modo não seriado cresceu, nas mais diferentes regiões do país, como
um instrumento para ampliar anos de estudo dos muitos excluídos logo nas séries iniciais,
no entanto os dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica apresentam
informações preocupantes quanto à qualidade do ensino ministrado.
TABELA 2
Percentual da População por Estágio de Proficiência - Brasil – 2001
Área de Conhecimento /
Série
Muito Crítico
Língua Portuguesa - 4ª série
22,21
EF
Matemática - 4º série EF
12,53
Língua Portuguesa - 8ª série
4,86
EF
Matemática - 8º série EF
6,65
Crítico
36,76
Estágio
Intermediário Adequado
36,18
4,42
Avançado
0,43
39,79
20,08
40,89
64,77
6,78
10,22
0,01
0,06
51,71
38,85
2,66
0,14
Fonte: MEC/INEP/DAEB
A reforma empreendida no sistema educacional brasileiro, a partir da aprovação da
Emenda Constitucional n. 14 de 1996, dotou a União (Ministério da Educação) de
capacidade institucional para exercer atividades de coordenação político-pedagógica e
administrativa dos sistemas estaduais e municipais de educação básica. Estas atividades,
por sua vez, se fundamentam em um diagnóstico prévio e compreensivo da situação e dos
principais problemas do sistema educacional (DURHAM, 2000: 232), mas trazem também,
uma formulação acerca da estrutura de organização e funcionamento da educação escolar
básica para todo o país. Este o tema a ser abordado inicialmente.
1.1 Formulação institucional e reforma do sistema público de EB
Em seguida a aprovação da Emenda Constitucional nº 14 no Brasil, uma série de medidas
jurídico-políticas adotadas ao longo dos anos subseqüentes – 1997- 2001 – sistematizou
processo de reforma educacional no país com repercussões sobre a configuração do
sistema público de educação básica. Para além da atribuição de responsabilidades
compartilhadas dos entes federados, indagamos se as medidas implementadas neste
período produziram novos relacionamentos políticos-administrativos para a gestão do
Duarte, MRT
Página 3
sistema. Ou seja, qual a contribuição de diferentes medidas adotadas, especialmente na
área do financiamento público da EB para uma reestruturação sistêmica desta etapa da
educação escolar?
A primeira etapa da problematização efetuada envolveu indagações em torno do conceito
de sistema público de educação e sua relação com a efetividade do direito à educação
básica. Procuramos problematizar medidas jurídicas e políticas adotadas após a
promulgação da EC 14/96 analisando suas repercussões sobre a estrutura e organização do
sistema público de educação básica no país. Neste capítulo, mais especificamente, optamos
por um estudo comparativo do design1 institucional de sistema público de EB formulado
por Anísio Teixeira2, com o arranjo resultante da reestruturação empreendida após 1996. O
pressuposto subjacente considera que fatores institucionais – no caso o design institucional
– conferem incentivos e/ou circunscrevem as ações empreendidas por diferentes atores.
A forma como estão organizadas as instituições sistêmicas e o conjunto de regras que
orientam o seu funcionamento condicionam os resultados pretendidos.
Diferenciar e
avaliar as conseqüências possíveis de medidas político-administrativas no interior do
pensamento de matriz liberal pressupõe conferir à gestão das políticas públicas, em
1
O que designamos por “design” de um sistema de educação básica expressa uma imagem virtual provisória
da relação entre sua estrutura e a ação dos sujeitos que nela intervêm. Constitui um meio para comparações
entre passado/presente, entre alternativas, para estabelecer diferenças e/ou semelhanças e desse modo dar a
conhecer a complexidade do presente ao qual pertencemos. O design não é a estrutura do sistema, apenas um
recurso metodológico possível, que procura visualizar algo em movimento. Neste sentido, a reflexão
considera que o(s) sistema(s) de ensino, como subsistemas sociais Esta reflexão considera que o(s) sistema(s)
de ensino, como subsistemas sociais são produtos/produzidos pelas ações dos sujeitos em instituições. Para
Giddens a distinção entre estrutura, sistema e estruturação não põe em causa sua estreita interligação.
Observar a estrutura como algo que envolve uma ordem virtual de diferenças implica reconhecer a existência
de: a) conhecimento (...) b) práticas sociais organizadas através da mobilização recursiva do conhecimento e
c) capacidades que a produção dessas práticas pressupõe (GIDDENS, 1989).
2
Em contraposição à Reforma Campos/Capanema, promovida no decorrer das décadas de 30 e 40, no Brasil.
O estudo da literatura sobre a obra de Anísio Teixeira (ver bibliografia, especialmente Rocha, 1996 e Nunes,
2000) nos permite caracteriza-la como a de construção de um projeto institucional de organização do sistema
público de educação no país alternativo às concepções autoritárias e centralizadoras predominantes nas
gestões de Francisco Campos e Gustavo Capanema no Ministério da Educação
Duarte, MRT
Página 4
especial, das políticas sociais, um certo grau de autonomia face aos fatores econômicos
estruturais. Diferenciamos para fins analíticos como determinantes de formulação e
implementação das políticas sociais fatores de natureza econômica de fatores
institucionais, ambos com capacidades variáveis de intervenção sobre as políticas sociais,
em diferentes conjunturas.
Propomos, inicialmente, analisar o design, opções, possibilidades e limites da proposta
formulada por Anísio Teixeira de sistema educacional público para o Brasil e a comparar
às proposições hoje formuladas. Uma questão nos interroga: como se realizaram medidas
preconizadas nos anos 30 e 40 por este educador liberal? Premissa e conclusão deste
trabalho é o reconhecimento, que a obra deste educador dirigente expressava um projeto
liberal de educação escolar para o país3, mas com singularidades por tentar articular um
papel protagonista do Estado sob a égide da sociedade civil.
Destacar, na evolução do pensamento de Anísio Teixeira, a formulação institucional
necessária à efetivação de princípios e concepções político educativas constitui o
objetivo específico deste capítulo. Apreender a singularidade de sua proposta em relação
à atualidade requer um método capaz de destacar e formalizar, isto é, estabelecer conexões
entre elementos desprovidos de relações imediatas. Introduzir com Anísio Teixeira4 a
discussão sobre a constituição histórica do sistema público de educação significa indagar à
3
Dentre os comentaristas de Anísio Teixeira GANDINI, 1980 o enquadra em uma tradição liberal-
conservadora de base legalístico-burocrática. O identifica como representante da camada industrial e
considera que o projeto de Anísio Teixeira não se consolidou devido a emergência do Estado corporativoautoritário. TEIXEIRA, 1985 por sua vez, sintetiza sua postura de intelectual orgânico de formulador de uma
política congruente com interesses da burguesia industrial ascendente, setores médios e classe trabalhadora.
A investigação analítica, do projeto de sistema público de educação básica, em Anísio Teixeira supõe um
questionamento ao pressuposto teórico metodológico que circunscreve valores e ações políticas a interesses
mais imediatos de grupos e/ou classes sociais. Assumimos que algumas teorias conseguem captar, ou refletir
e revelar, uma espécie de continuidade na história, que permanece não obstante as transformações e através
delas: ou, pelo menos, uma continuidade dos problemas, aos quais a cada vez são dadas diferentes soluções
(BOVERO, 2000: 25)
4
NUNES, 2000 expõe os diversos embates travados pelo projeto anisiano, em especial, durante sua gestão na
Diretoria de Instrução pública do Distrito Federal (1931-1935).
Duarte, MRT
Página 5
atualidade sobre o cumprimento de uma herança não superada. O método analítico
orientado para a reconstrução conceitual e para a comparação de diferentes textos do autor,
constituiu a mediação escolhida para a construção do design de sistema nacional. Sem
desconhecer o condicionamento da inserção histórico social de toda uma produção
intelectual, o empenho em desvelar um projeto político de educação escolar para o país
tem por objetivo interrogar, até onde esta tradição permanece desafortunada5.
1.2 Estrutura e sistema educacional: por que estuda-los?
A concepção de sistema nacional de educação presente neste trabalho aproxima-se da
noção de estrutura como constructo lógico, porém produto não intencional e concreto de
inúmeras práticas sociais. Saviani (1974; 1981) distingue os termos da seguinte forma.
Sistema educacional é uma organização objetiva, concreta, e possui uma estrutura. Esta se
apresenta como um sistema que o homem não fez (ou fez sem o saber), enquanto que o
sistema pode ser comparado a uma estrutura que o homem faz e sabe que faz.
Este estudo considerou, de modo diverso, da distinção expressa por Saviani, que o sistema
nacional de educação é resultantes de múltiplas práticas e concepções sociais. O sistema se
faz numa sociedade onde apesar da extrema desigualdade, não se opera, ainda, a exclusão
tout court. A diferença a ser destacada entre estrutura e sistema é que a primeira subjaz
latente enquanto práticas, instituições, habitus historicamente construídos. O segundo se
faz presente pela incorporação de novas/outras práticas/ações, instituições e conflitos
capazes de produzir modificações nas estruturas que o conformaram/conformam.
A distinção entre sistema e estrutura nos permite investigar contra a imediatez do dado e a
convenção do constructus, um suporte invisível, razão necessária, suficiente e escondida
do dado, de sorte que o objeto real é constituído pela totalidade de suas manifestações
empíricas visíveis mais sua razão invisível, teoricamente estabelecida (CHAUÍ, s/d: 175).
Assim, o sistema público de educação básica, como produto de estruturações, detém certa
rigidez, que o torna capaz de resistir a voluntarismos políticos mais imediatos. A estrutura
5
Título de artigo publicado por LOVISOLO, In: BORGES DE ALMEIDA, 1989
Duarte, MRT
Página 6
de um sistema constitui um constructo lógico, que nos permite apreender a
interdependência entre unidades autônomas e visualizar o arranjo político institucional
resultante das relações entre o poder político, os interesses sociais em conflito e a força das
instituições preexistentes.
Autores como Lima (1998) ao analisar a autonomia relativa da organização escolar,
pressupõem tensões entre o sistema, a administração e os poderes centrais, por um lado, e a
escola e os atores escolares organizacionalmente ancorados por outro. Nesta perspectiva, a
análise sociológica das organizações escolares tem por intuito apreender as relações entre o
nível micro – a ação dos atores - e o nível macro – o sistema de ensino.
Para tanto é necessário admitir no plano teórico as tensões
estabelecidas entre o sistema, a administração e os poderes centrais,
por um lado, e a escola e os atores escolares organizacionalmente
ancorados por outro, tensões tanto mais importante quanto, no
terreno da ação em contexto escolar, nenhuma das partes exerce
hegemonicamente o controle total sobre a outra (Lima, 1996: 32).
Este referencial, tendo por foco a estruturação político-administrativa centralizada do
sistema de ensino português, permite reconhecer analiticamente uma macro-organização
do tipo policêntrico – em nosso viés conceitual um sistema público educacional – sem
ignorar assimetrias de poder e relações de subordinação, mas igualmente sem condenar as
organizações e os atores escolares à reprodução normativa e à aquiescência passiva. O
reconhecimento das assimetrias de poder e de relações de subordinação, entretanto, não
fornece, a nosso ver, elementos suficientes para a apreensão da estruturação dos sistemas
educacionais. Reafirmando os termos da análise de Chauí (s/d) tem-se que buscar sua razão
invisível, teoricamente estabelecida.
No Brasil, a autonomia política dos sistemas municipais de ensino confere existência
empírica na e pela relação com os demais entes federados a um sistema público
policêntrico, em permanente relação de interdependências tendo em vista o modo como
esta autonomia foi relativamente estruturada. Consideramos, entretanto, que o sistema
educacional brasileiro, do tipo policêntrico, dispõe como um dos eixos estruturadores – sua
razão invisível – a sistemática operacional de financiamento.
Duarte, MRT
Página 7
Ao iniciarmos o estudo dos projetos históricos possíveis esperamos, por um lado,
contribuir para que diferentes atores possam, sobre uma gramática, pactuar em sua
diversidade e por outro lado, expor perspectivas de organização do sistema público de EB.
Pensar este sistema como um constructo lógico, com o objetivo de comparar e avaliar a
importância relativa das partes que o constituem, permite a seleção de elementos cujas
modificações possam ser acordadas politicamente.
A importância deste tema para o campo educacional advém das implicações que o seu
reconhecimento como pré-existente tem na prática de muitos educadores. Os educadores
deixarão de pressupor um [modelo paradigmático] de sistema, passando a encarar a sua
construção, [diríamos, sua universalização na diversidade] como uma tarefa urgente que
precisa ser realizada (Saviani, 1998b). No entanto, para esta realização é necessário
configurar, reconfigurar e desfigurar alguns dos procedimentos, relações, normas ou
mesmo valores constitutivos do sistema educacional pela proposição de alternativas em
seus eixos estruturantes.
1.2.1 Sistema público de educação no Brasil e sistemas de ensino
O livro, “Educação brasileira: estrutura e sistema” (1981), constituiu referência
fundamental para análise de política educacional no Brasil, no decorrer da década de
oitenta. Nesta obra, Demerval Saviani pôs à prova a hipótese da inexistência de um sistema
educacional no país e convidou educadores a análise política de suas práticas e
fundamentos. A repercussão das questões suscitadas foi significativa na obra de autores
como WARDE, 1983, CUNHA, 1979; 1998, CURY, 1978, dentre outros, que retomaram a
crítica da política educacional empreendida no período autoritário.
A tese central exposta no livro parte da inexistência de um sistema educacional no Brasil:
o Autor levanta, entre outras, a hipótese de que a ausência de sistema
educacional está correlacionada à estrutura social de classes. Diz ele que a
sociedade de classes, “gerando conflito de interesses, tornaria difícil a
práxis intencional comum, sem a qual é impossível a construção do
sistema” (WARDE, 1983).
Simultaneamente, SAVIANI, disseca os usos e abusos do conceito de sistema na literatura
a respeito das leis de diretrizes e bases. Após demonstrar sua indefinição semântica na
Duarte, MRT
Página 8
literatura política, ele desenvolve a análise da noção de sistema educacional e do conceito
subjacente de sistema.
A construção da análise de SAVIANI submete-se a um duplo procedimento: partir do
fenômeno, procurando efetuar sua descrição para atingir uma visão dialético-sintética do
problema [sistema educacional brasileiro] pela mediação da análise. O ponto de partida é a
potencialidade da ação humana sistematizada, em face de um problema. Após esclarecer o
processo humano da atividade sistematizadora passa à análise de seu produto: o sistema,
como a unidade de vários elementos intencionalmente reunidos, de modo a formar um
conjunto coerente e operante (grifo nosso).
No entanto, esta concepção de sistema pressupõe que:
se o sistema nasce da tomada de consciência da problemática de
uma situação dada, ele surge como forma de superação dos
problemas que o engendraram. E se ele não contribuir para essa
superação ele terá sido ineficaz, inoperante, ou seja, incoerente do
ponto de vista externo. E tendo faltado um dos requisitos
necessários (a coerência externa), isso significa que, rigorosamente
falando, ele não terá sido um sistema (...) o sistema implica uma
ordem que o homem impõe a realidade (SAVIANI, 1981: 79-80)
A gênese de um sistema educacional requer, ainda na síntese de SAVIANI, a formulação
de uma teoria educacional capaz de indicar objetivos e meios que tornem possível a
atividade comum intencional. Para SAVIANI, o sistema comporta-se como uma estrutura
que o homem faz e sabe que faz.
Escrito no início da década de 70, a rigorosa construção teórica de “Educação brasileira:
estrutura e sistema” sustenta e projeta a política como expressão de uma intencionalidade
comum. Supõe um referencial teórico/prático mais universal, decorrente da superação da
desigualdade e capaz de abarcar e situar-se para além do diverso. A movia o imperativo
político de formação de um bloco histórico capaz de contrapor-se àquele que sustentou o
desenvolvimentismo do período militar-autoritário.
Duarte, MRT
Página 9
No Brasil o século XX encerrou-se, também, com um balanço das forças sociais formadas
em contraposição ao desenvolvimentismo autoritário. Este balanço reconhece nessas forças
uma vertente de matriz neoliberal - onde a defesa da primazia das relações mercantis
procura demonizar a intervenção estatal no campo social. Se sociedade civil no Brasil
significou oposição à ditadura militar encastelada no Estado6 a critica a intervenção e ação
estatal de matriz neoliberal tem como um dos eixos estruturantes a primazia das relações
mercantis com diretriz de fortalecimento da sociedade civil.
Outra vertente desse balanço ocupa-se em delinear as múltiplas potencialidades da
democracia face ao Estado e a sociedade civil. Nessa vertente, consideramos a
impossibilidade de um referencial capaz de abarcar e situar-se para além da diversidade do
social, o que exige da análise política um esforço capaz de explicar a sintaxe sistêmica, ou
seja, o modelo resultante das várias funções que regulam a interação das partes que
compõem o sistema em movimento. Mas se a primazia conferida as ações dos diversos
setores da sociedade civil pressupõe o exercício do controle público sobre as ações estatais,
estas, por sua vez, são regidas por normas e procedimentos capazes de efetivar direitos de
cidadania, independentes das relações de mercado.
Ao aproximar e diferenciar duas temporalidades este estudo procurou demonstrar como no
interior do liberalismo, as relações de estruturação de partes diversas produzem diferenças
sistêmicas significativas. A análise supõe acesso a elementos que caracterizam o
pensamento educacional de Anísio Teixeira e seu contexto de ação político-educativa7.
Com esta referência, certamente múltipla e não unívoca, a indagação, que orienta este
6
Ver COUTINHO, 1999 e Moraes, 2001
7
Ver a respeito: NUNES, C. (2000a) Anísio Teixeira: a poesia da ação; NUNES, C. 2000. Anísio Teixeira.
In: FÁVERO, MLA (org.) Dicionário dos educadores no Brasil; NUNES, C. Prioridade número 1 para a
educação. In: TEIXEIRA, AS. Educação não é privilégio. 5ª edição, Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1994;
GERIBELLO, WP. Anísio Teixeira. Análise e sistematização de sua obra. SP. Atlas, 1977. CHAVES, MW.
A afinidade eletiva entre Anísio Teixeira e John Dewey. In: Revista brasileira de Educação. São Paulo:
Anped: n.11 1999: BORGES de ALMEIDA, S. et. al. Chaves para ler Anísio Teixeira. Salvador: EGBA.
1990; TEIXEIRA, MMS. O significado pedagógico da obra de Anísio Teixeira. São Paulo: Loyola. 1985.
Duarte, MRT
Página 10
trabalho, refere-se aos fundamentos que aproximam e/ou diferenciam seu projeto das
concepções hoje predominantes. A ação político-administrativa deste educador deixou um
legado de projeto institucional, cristalizado em suas obras (NUNES, 2000: 28) e constituiu
o objeto de reflexões deste estudo. A pesquisa procurou, para tanto, destacar as
contribuições e posições de Anísio Teixeira relacionadas com a estrutura e funcionamento
de um sistema público de educação básica no Brasil.
O design do sistema em Anísio Teixeira revela, por sua vez e nos termos postos por
SAVIANI
(1982),
projetos
de
construção
do
sistema
educacional
por
educadores+políticos, que assumiram o liberalismo em sua práxis educativa. A hegemonia
neoliberal valeu-se de uma redução do escopo de questões presentes no pensamento
liberal, circunscrevendo-o às posições onde a defesa do mercado resulta num deus ex
machina. Anísio Teixeira, por sua vez, expressa uma concepção mais inclusiva, onde a
intervenção política no social resulta em maior intervenção do Estado sobre a
competitividade presente na sociedade civil. No entanto, procuramos neste capítulo
desenvolver uma reflexão sobre os eixos estruturantes de um sistema público de educação
básica constituído por unidades autônomas.
1.3 Anísio Teixeira e a elaboração de um projeto de sistema público de
educação básica no Brasil
A partir de três obras de Anísio Teixeira - Educação para a democracia (TEIXEIRA,
1953), Educação não é privilégio (TEIXEIRA, 1957) e Educação é um direito
(TEIXEIRA,1968) – procuramos sistematizar a concepção de sistema educacional público
pretendido pelo educador para o país. Estes livros trazem, ainda, um rigoroso trabalho de
detalhamento dos procedimentos e mecanismos necessários à consecução dos objetivos
pretendidos, simultaneamente ao aprofundamento teórico-político de suas concepções.
Organizados como transcrição de relatórios das atividades desenvolvidas, coletânea de
intervenções efetuadas em diferentes fóruns de disputa política e como sistematização
teórica das posições defendidas, fornecem um rico material que permite articular os
fundamentos gerais do pensamento educacional de Anísio Teixeira com os procedimentos
necessários à sua execução.
Duarte, MRT
Página 11
Em 1935, Anísio Teixeira apresentava Educação para a democracia: introdução à
administração educacional, como um livro de registro e documentação da reforma da
educação em marcha no Distrito Federal.
um livro vivido dia a dia, porque fundamenta e expõe uma obra
ainda mais vivida, intensa e afanosa, inacabável até por
definição...(ANÍSIO, 1953. Advertência do autor para a 1.a. edição)
Nesta obra, expôs ao país os fundamentos dos procedimentos adotados em suas
experiências político-administrativas, especialmente na direção da instrução pública do
município do Rio de Janeiro8. Sistematizar e fundamentar decisões e medidas político
administrativas tinha por objetivo documentar-se frente àqueles que o combatiam, como
também subsidiar outros educadores com posições correspondentes. Sua gestão no Distrito
Federal (1931-1935) pode ser lida como um grande esforço para construir uma concepção
e um sentimento de que a escola se situa na esfera pública e que, como tal, não pode ser
transformada em mera extensão da esfera privada (NUNES, 2000a: 10), mas
complementamos, pode ser lida também, como um esforço de constituição de uma esfera
pública neste país, pela interação entre Estado e sociedade civil.
Educação não é privilégio (maio de 1957) e, principalmente, Educação é um direito,
constituem obras-sínteses de suas experiências teórico-práticas. Produzidas no intervalo
democrático do pós-guerra ao início da década de sessenta, elas contêm a exposição das
posições políticas defendidas pelo educador como também o registro da evolução e
sistematização de suas idéias sobre a organização e funcionamento do sistema educacional
brasileiro. Na primeira Anísio expõe os fundamentos de seus embates no decorrer da
tramitação da LDB. Esta obra veio a lume como arma de combate, reforçando a postura
da defesa da escola pública, que era assumida em outros espaços de discussão (NUNES,
1994: 213). Na segunda, elaborada num contexto onde se vislumbrava o novo ciclo
político autoritário, Anísio explora com maior vigor os procedimentos adequados à sua
proposta de política educacional. Orienta o país, como um educador dirigente, expondo os
fundamentos e sistematizando procedimentos presentes em seu projeto.
8
ver: GERIBELLO, WP. Anísio Teixeira: análise e sistematização de sua obra. SP. Atlas, 1977.
Duarte, MRT
Página 12
Seu diagnóstico, quanto ao problema brasileiro de educação, trazia expresso a solução
aventada: um sistema escolar integral, desde a escola primária até a superior, preparando
homens para ocupações diversas. Para ele o reconhecimento das dimensões em números
absolutos do sistema educacional brasileiro não deveria obscurecer os problemas
decorrentes de sua estrutura e funcionamento. Dentre estes destacou: índices de evasão e
repetência, centralização e rigidez político administrativa e a organização da carreira do
magistério. Temas centrais no debate atual de política educacional no país.
A obra de Anísio Teixeira é expressiva dos embates no interior do movimento de reforma
político-administrativa, em curso no país, desde a década de trinta, no entanto, com
singularidades que a distinguem do projeto capitaneado pelo DASP e da Reforma
Educacional empreendida nas gestões CAMPOS e CAPANEMA. A frustração de sua
experiência, de reforma da instrução pública no Distrito Federal com o advento do Estado
Novo, é interpretada como a derrota de um projeto de democratização escolar por meio do
Estado (NUNES, 2000: 45). O período do governo provisório (1931-1934) foi uma fase
experimental de reorganização administrativa, no campo educacional a primeira grande
reforma seria efetuada um pouco mais tarde, já em plena vigência da Constituição de 1934,
sob a liderança de Gustavo Capanema.
A política administrativa pós-revolução de 30 evoluiu no sentido de colocar o(s) chefe(s)
do(s) executivo(s) como supremo coordenador dos serviços públicos e para tanto era mister
dotá-lo de instrumentos capazes de habilitá-lo a exercer o poder de coordenação
(WARLICH:
1987:8-24).
Neste
sentido,
a
modernização
político-administrativa
capitaneada pelo DASP, nas décadas de 30 e 40, reforçou a relação de dependência entre
os governos locais, os governos estaduais e a União. A modernização dos serviços públicos
(educacionais incluídos) se fez sob os princípios gerais do taylorismo (DUARTE, 1988),
porém com a centralização da capacidade decisória nos chefes dos executivos, de forma a
assegurar relações de tutela na prestação dos serviços.
A reforma do ensino do Distrito Federal na gestão de Anísio
constitui um processo de reinvenção do espaço escolar (e social) cuja
direção se fez – dentre outros aspectos - no sentido de: empurrar a
escola para fora de si mesma, ampliando sua área de influencia na
cidade; atravessar o espelho da cultura européia e norte-americana
para elaborar um conhecimento instrumental sobre a realidade e a
Duarte, MRT
Página 13
educação brasileiras; retirar o problema do governo da educação da
tutela da Igreja e do Estado; construir representações sobre a escola e
a sociedade, criando saberes e definindo prioridades; lutar contra os
"destinos escolares", procurando quebrar as barreiras hierárquicas
imposta por uma rígida divisão social (NUNES, 2000: 234).
As premissas que fundamentaram a reforma proposta por Anísio Teixeira, encontram-se
na sua recusa à organização de um sistema escolar decorrente de concepções apressadas e
fragmentadas da questão educacional e na defesa de um sistema de educação pública,
semelhante à "commun school" americana.9 Estas diretrizes são permanentes, no
pensamento político de Anísio Teixeira após suas viagens aos Estados Unidos, e perduram
nas obras consideradas.
A regionalização da escola que, entre nós, se terá de caracterizar
pela municipalização da escola, com administração local, programa
local e professor local concorrerá em muito para dissipar os
aspectos abstratos e irreais da escola imposta pelo centro, com
programas determinados por autoridades remotas de distantes e
servida por professores impacientes e estranhos ao meio, sonhando
perpètuamente com redentoras remoções (TEIXEIRA, 1958: 24-25)
A frase de Lobato sobre o papel da experiência americana em Anísio Teixeira indica sua
inserção em um projeto político nacional presente em um amplo espectro político. A
esperança na industrialização de base urbana do país por motivos diversos constitui o caldo
da formação política sob o qual emergiam proposições contraditórias10.
1.3.1 Organização do sistema público de educação básica: descentralização e
órgãos locais de gestão colegiada
Do diagnóstico às primeiras proposições de ação política, o tema da autonomia ou melhor,
da descentralização político administrativa, constitui o núcleo da construção institucional
proposta por Anísio Teixeira.
9
A expressão de Lobato, "Anísio lapidado pela América", explicita a mudança de rumos empreendida pelo
pensamento educacional de Anísio Teixeira, após cada viagem aos Estados Unidos. Em artigo publicado em
1924, ”À propósito da escola única”, ele faz uma defesa veemente da concepção dualista em educação. Já,
em “Aspectos americanos da educação”, publicado em 1928, apresenta comentários e observações sobre a
organização do sistema escolar americano, além dos fundamentos para o estudo da obra de Dewey
(Geribello, 1977). Esta segunda concepção, presente a partir de suas viagens aos Estados Unidos, predomina
em toda sua obra posterior.
10
Martins, 1987 caracteriza o clima intelectual do período 20 a 40 no Brasil.
Duarte, MRT
Página 14
O governo da educação se tem feito, através da história, por três aspectos
diversos. Ou a sua direção esteve nitidamente confiada à Igreja, que
detinha todo o poder de direção espiritual da sociedade (...); ou o seu
governo se transferia para o Estado, que, muita vez, fazia dela o
instrumento para formar e perpetuar as ideologias em que se baseava, e
alimentar a lealdade às suas próprias instituições, ou, num terceiro aspecto,
a educação era confiada a controle indireto da própria sociedade pelo jogo
das suas fôrças em desenvolvimento. (...) Encarado o assunto do ponto de
vista do regime mais consentâneo com o progresso e o desenvolvimento da
educação, nas suas linhas fundamentais, não se pode hoje, recusar ou
duvidar que o controle pelas forças sociais, e não somente pela Igreja ou
pelo Estado seja o mais favorável à livre e plena expansão das instituições
educativas. (...) Como, porém, a organização das escolas se tornou um
empreendimento tão vasto, tão complexo e tão custoso, que só o Estado,
com os seus recursos e os seus meios de ação, pode levá-lo a bom termo,
decorre daí a necessidade de ser o Estado quem deve, por coerência com o
regime democrático, abrir mão do governo da educação, para conservar,
tão somente, sobre a mesma o direito de lhe defender a liberdade e a
imparcialidade. Para isto, o Estado democrático organiza os serviços
educativos de modo a que se governem a si mesmos, obedecendo, tão
somente, às próprias influências ou às que se façam sentir na sociedade a
que se destinam. (...) Ensaiar-se-á, por esse modo, no país, o governo
autônomo da educação, confiando-se os seus destinos a corporações
representativas da sociedade, sem eiva de partidarismos de qualquer espécie
(Teixeira, 1953: 33-36 grifo nosso)
Rocha (1996) ao explorar o pensamento de Anísio Teixeira em Educação é um Direito,
também observa o aspecto nuclear da questão da autonomia dos sistemas educacionais
frente ao Estado. As experiências em funções executivas nos sistemas estaduais (Secretário
de Instrução Pública do Estado da Bahia - 1924 a 1928 - e Secretaria de Instrução Pública
do DF - 1931 a 1935) colocaram para o projeto político educacional de Anísio Teixeira a
tensão entre uma concepção que quer resgatar para a sociedade o papel determinante do
labor educativo e uma realidade, como ele a percebe, que impõe a exigência de um Estado
com função ativa na construção democrática (Rocha, 1996: 199).
Educação é um direito, obra síntese da práxis educativa de Anísio Teixeira pormenoriza os
arranjos institucionais para enfrentar tal tensão.
Defendemos, assim, para a educação um regime especial de
distribuição dos poderes públicos encarregados de ministrá-la, de
modo que, em ordens sucessivas, a União, o Estado e o Município se
vejam com parcelas diversas e conjugadas de poder e
responsabilidade, a ser exercidos por órgãos colegiados, de
Duarte, MRT
Página 15
composição leiga, ou seja, Conselhos de Educação, com um alto
grau de autonomia administrativa (Teixeira, 1968: 66)
Desse modo, Anísio Teixeira introduz o tema da colaboração entre os entes federados –
parcelas diversas e conjugadas de poder – e a reformulação do órgão gestor – os Conselhos
de Educação.
Compostos por representantes diretos dos pais de família e da comunidade, eleitos ou
nomeados por autoridades eleitas – porém de composição leiga, visto que no período a
Igreja Católica exercia posição hegemônica na defesa dos interesses privados- seriam
órgãos deliberativos de política e administração educacional. competindo-lhes a nomeação
das autoridades executivas11. O Conselho é o órgão deliberativo das funções de educação
e cultura promovidas pelo Estado. Não obstante, ele não é o órgão gestor dessas funções.
O encargo executivo é atribuído ao Diretor de Educação e Cultura. (...) O Conselho
delibera, mas a partir das propostas de Educação do Diretor (Rocha, 1996: 197).
A formulação de Anísio Teixeira, em 1957, sobre os Conselhos Escolares ampliava sua
atuação para o âmbito dos municípios12.
(...) teremos criado com o novo plano cerca de três mil unidades
administrativas escolares em todo o país, que tantos são os
municípios, com os seus conselhos de administração escolar,
representativos da comunidade, paralelos aos conselhos municipais
ou câmaras de vereadores, com poderes reais e não fictícios de
gestão autônoma do fundo escolar municipal e direção das escolas
locais (Teixeira, 1957: 60)
Tendo por referência o modelo americano de administração educacional pública, Anísio
Teixeira tensionou o poder deliberativo estabelecido para os Conselhos locais e estaduais
com as competências fixadas para o órgão executivo de administração dos serviços
11
Os Conselhos nomeariam as autoridades executivas dos serviços educacionais, do magistério e todo o
pessoal, constituindo-se, assim, em verdadeiras autarquias (TEIXEIRA, 1968: 81)
12
A Constituição brasileira de 1946 reconhecia os estados subnacionais como entes federados capazes de
organizar sistemas autônomos de ensino. A perspectiva de Anísio Teixeira, com fundamento em uma defesa
da instância local como instância de administração mais virtuosa, propugnava por maior autonomia de gestão
para os municípios.
Duarte, MRT
Página 16
educacionais Preservando a autonomia de ação pela diferenciação de composição e
competência desses órgãos, este político educador desenha espaços e momentos de
aproximação dos diferentes atores responsáveis pela administração dos sistemas.
Poderes locais reais e não fictícios de gestão constitui um dos desafios institucionais para a
boa governança presente, ainda, no início do século XXI. Televisão e jornais têm reiterado
denúncias de desvio de recursos dos Fundos de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental (FUNDEF) em diversas localidades. Qual a participação dos Conselhos
locais de Acompanhamento, previstos por disposição legal, na formulação e investigação
dessas denúncias? Sem poder normativo - deliberativo e sem recursos para investigações
mais acuradas, as ações a serem desenvolvidas subordinam-se à dedicação pessoal dos
membros empossados. Formular competências correlatas e regulamentar o processo de
escolha dos membros constituem medidas político-administrativas necessárias para uma
atuação mais efetiva. Um tema de preocupações na formulação de Anísio Teixeira e nos
debates da atualidade (ver Gohn, 2000)
O design formulado por Anísio argumenta quanto a importância dos órgãos colegiados
com poder deliberativo em face de recursos e projetos. Anísio Teixeira. na década de 30,
distinguia e tensionava com a atuação deliberativa dos Conselhos e a ação executiva do
Diretor de Instrução. Embora os primeiros constituíssem instâncias organizacionais a
serem implantada de fora13, Anísio Teixeira tinha por pressuposto em sua formulação a
relação político educativa dos órgãos de gestão coletiva com o poder público organizado
na burocracia.
a possibilidade de construção de identidade entre os atores sociais,
para além de suas diferenciações, e de identidade que se constrói na
sociedade, ainda que o Estado, como expressão holística da
sociedade, tenha papel ativo nesta construção. [Para ele] nem os
conflitos dos atores são irredutíveis, nem os atores se
complementam num todo orgânico e harmônico. Eles convivem com
suas diferenças e são capazes de estabelecer entre si uma
sociabilidade que não se afirma fundamentalmente pela coerção,
13
Do ponto de vista da engenharia social, Esman e Uphoff constatam que as organizações locais
"implantadas" de fora, apresentam elevado índice de fracasso. As organizações locais mais bem-sucedidas
representam iniciativas autóctones participativas em comunidades locais relativamente coesas. (PUTNAM,
1996: 104)
Duarte, MRT
Página 17
mas ao contrário é um processo positivo de construção (ROCHA,
1996: 206)
Liberdade para alocação de recursos próprios de acordo com suas necessidades, para
estabelecer regras de funcionamento das unidades escolares, observadas as diretrizes
nacionais e para definição de uma agenda de ações político-educativas aproximam o
projeto de autonomia em Anísio Teixeira das concepções defendidas na atualidade. Em
especial, a tensão projetada entre os Conselhos e o executivo aproxima o design político
anisiano das proposições que na atualidade defendem a criação de Fóruns permanentes de
educação nos sistemas municipais e estaduais14. Esses assumem a prerrogativa de deliberar
quanto as prioridades locais simultaneamente com a fiscalização do poder executivo. Sua
natureza é marcada pela presença de entidades cuja organização provêm de iniciativas
autóctones da sociedade civil e também com maior independência frente os interesses
locais.
os órgãos que a vão dirigir [a democracia brasileira de 1934] são
órgãos constitucionais, que retiram sua autoridade e competência
da própria lei magna do país. Devem, por isto mesmo, trazer
características que rasguem aos sistemas escolares brasileiros
novos rumos para o seu progresso mais eficaz e mais seguro. (...)
Ensaiar-se-á, por esse modo, no país, o governo autônomo da
educação, confiando-se os seus destinos a corporações
representativas da sociedade, sem eiva de partidarismo de qualquer
espécie e capazes de conduzir com segurança e estabilidade o seu
progresso e desenvolvimento. (...) Nenhuma organização satisfaz tão
bem a essa nova forma de direção quanto a de Conselhos, de
número reduzido de membros, com o que se consegue a moderação
de medidas, sem o entorpecimento do aparelho educativo (Teixeira,
1953: 37/38).
14
Quando da revisão do texto desta tese foi realizado, em Brasília, o Seminário “Reafirmando propostas para
a educação brasileira” onde se reafirmava: “O Fórum Nacional de Educação (FNE), a ser instituído, deve ser
a instância máxima de deliberação do SNE, com ampla representação dos setores sociais envolvidos com a
educação, responsável pela política nacional de educação e, principalmente, pela definição de diretrizes e
prioridades dos planos nacionais de educação e sobre a execução orçamentária para a área. Coerente com
essas diretrizes, o PNE - Proposta da Sociedade Brasileira colocou como uma de suas metas, a criação do
FNE e dos Fóruns Estaduais e Municipais, com atribuições deliberativas de acompanhamento, avaliação e
reorientação das políticas educacionais e de implementação do Plano Nacional de Educação, com a
participação democrática da sociedade civil organizada e da sociedade política, com garantia de
autonomia, orçamento e infra-estrutura” (Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, 2003).
Duarte, MRT
Página 18
A defesa da deliberação político educacional nos órgãos colegiados vis a vis com a
presença de direção técnico executiva da educação escolar, tem duas implicações
significativas em Anísio Teixeira. Em primeiro lugar, sua crítica à reforma administrativa
empreendida sob a égide do DASP, em segundo lugar sua concepção para organização dos
quadros de profissionais da educação básica. A formulação estabelecida para a autonomia
dos sistemas de ensino pressupõe, em Anísio Teixeira, uma visão estratégica, capaz de
articular a desconcentração do poder decisório e dos recursos necessários e a criação de
uma nova estrutura regulatória nos órgãos centrais de execução da política educacional.
Esta formulação foi-se explicitando ao longo de sua obra teórico/prática.
Os conselhos como órgãos de gestão da res pública, foram propostos por Anísio Teixeira
com o objetivo de impulsionar mudanças sociais no sentido da descentralização das
relações de poder. Como organismos de administração municipal seriam capazes de
incorporar esforços para aumentar o controle da sociedade civil [popular nos termos do
autor] sobre recursos e o funcionamento das instituições escolares.
Na década de 90 toma corpo na sociedade brasileira a formação de conselhos gestores,
concebidos como instrumentos de participação periódica e planejada, ao longo de todo o
circuito de formulação e implementação
de uma política pública (Gohn, 2000). Na
atualidade os conselhos gestores integram-se aos órgãos públicos vinculados ao Executivo,
porém diversamente da proposta anisiana, fragmentam-se quanto as diferentes áreas de
atuação no campo educacional e foram alijados de poder normativo e/ou deliberativo. A
política governamental no campo educacional a partir da segunda metade da década de
noventa incorpora atores organizados na gestão dos sistemas de ensino destacando apenas
competências genéricas associadas à fiscalização e supervisão.
A concepção de sistema em Anísio não é apenas a de um sistema burocrático estatal, a
presença da noção - inicialmente difusa - de controle pelas forças sociais e seu
detalhamento posterior, indica a importância de sua crítica em relação ao poder do Estado.
Embora pronuncie que somente o Estado, com os seus recursos e os seus meios de ação
Duarte, MRT
Página 19
poderá levar a termo o empreendimento de organização das escolas, reafirma a liberdade
de educação, como liberdade de oferta de serviços educacionais e gestão local autônoma.
1.3.2 Centralização como intervenção reguladora
Nas décadas de 20 e 30 a heterogeneidade da rede escolar era percebida pela convivência
de diferentes tipos de estabelecimentos de ensino primário, dando mostras de
discriminação na sua própria organização. As modificações introduzidas para
homogeneizar o diverso (Nunes, 1992: 166) podem ser sintetizadas em dois movimentos
distintos. Uma ação de centralização pedagógica e administrativa voltada para a
determinação de padrão(ões) mais uniforme(s) de educação escolar. Um movimento de
homogeneização pela classificação das instituições e práticas escolares, com o objetivo de
possibilitar a aferição comparativa de resultados.
As diretrizes e medidas adotadas de reformulação dos órgãos centrais de administração
expõem as características da centralização reguladora pretendida por Anísio Teixeira. O
relatório apresentado em 1928, após a primeira viagem aos Estados Unidos, informava
sobre suas primeiras idéias de centralização administrativa.
Disperso como se achava o ensino primário, entre a administração
estadual e as administrações municipaes, essas em numero superior
a 140, as disposições da lei se tornariam fictícias si não se fizesse a
unificação de todo o ensino.
A escola publica, em paiz de organização democrática incipiente,
deve ser a "escola única", mesmo em suas responsabilidades
administrativas.
Por outro lado, a nossa população não tem ainda a experiência
social necessária para julgar as opportunidades educativas que o
meio lhe oferece e, dahi a necessidade da regulamentação do
próprio ensino particular (Teixeira, A. 1928)
Em Educação e Democracia convivem a defesa apaixonada da autonomia do poder local e
a descrição minuciosa das medidas adotadas para o reaparelhamento dos órgãos centrais de
administração educacional. O argumento subjacente volta-se para a necessidade de um
tratamento técnico/científico das questões educacionais, capaz de embasar decisões
políticas. Seu texto, no entanto, revela uma preocupação de estabelecer nos órgãos centrais
condições para a realização de estudos comparativos dos sistemas locais.
Duarte, MRT
Página 20
Nunes (1992) considera que todas as iniciativas de Anísio Teixeira:
sinalizaram uma posição corajosamente combativa no campo de
lutas pela extensão dos serviços educativos, o que remetia, mesmo
contraditoriamente, para um movimento de redistribuição dos bens
sociais. Porquê a contradição? Porque, ao mesmo tempo em que a
gestão de Anísio Teixeira criava uma política de conjunto,
centralizava os serviços educativos. Esta centralização reforçou a
leitura da importância das iniciativas do Estado e, concretamente,
facilitou o desmantelamento dos seus serviços com seu afastamento
e o da sua equipe em 1935 (Nunes, 1992).
As obras de Anísio Teixeira estudadas não apresentam um defesa ou mesmo a descrição de
medidas adequadas à centralização dos serviços educacionais, nos moldes efetuados pelas
concepçöes mais autoritárias. Contêm, entretanto, uma descrição pormenorizada das
reformas empreendidas nos órgãos centrais capazes de dotá-los de capacidade para:
orientar a política educacional do sistema, traçando, esclarecendo e
consolidando os rumos e diretrizes gerais da educação pública: b)
organizar e administrar o aparelho escolar, conduzindo-o, pela
racionalização sistemática dos seus serviços e sua adequada
instalação, ao melhor rendimento possível; c) assistir e guiar o
professorado, estimulando, iniciativas, corrigindo desvios de
orientação e promovendo o seu constante desenvolvimento e
aperfeiçoamento (Teixeira, 1953: 112)
A estrutura técnico-administrativa organizada na Bahia e no Distrito Federal é datada face
às condições do período. Mas, sob a denominação genérica de serviços técnicos e
administrativos, ele procede à reorganização política de toda a burocracia encarregada da
administração escolar. Sua perspectiva atribui às instâncias burocráticas do órgão
executivo de educação a coleta de informações para o controle público da gestão
pedagógica e financeira dos sistemas de ensino, além de subsidiar o planejamento para o
desenvolvimento do sistema.
O tema da descentralização político administrativa, central no projeto de Anísio Teixeira,
não conduz a uma fragmentação de sistemas locais díspares e isolados. Sua articulação
provém, em primeiro lugar, das atribuições financeiras diferenciadas fixadas para os entes
federados e do cumprimento de diretrizes gerais em todo o espaço político nacional.
A escola primária seria, assim, federal, pelo cumprimento das
diretrizes e bases federais, estadual, pela organização e pelo
Duarte, MRT
Página 21
magistério, cuja formação e licenciamento ficariam atribuídos,
privativamente, aos Estados, e municipal, pela sua imediata direção
e administração e, por tudo isto, nacional - brasileira. (...) A escola
primária, embora uma instituição local, administrada por
autoridades locais e regida por professores de nomeação local, será
integrante de um sistema estadual de ensino, o qual, por sua vez,
obedece a diretrizes e bases federais, e, como tal, integra um sistema
nacional de educação. (TEIXEIRA, 1968: 56)
Para o educador, a defesa intransigente de sistemas estaduais autônomos supõe a existência
de um sistema escolar integral. A integração sistêmica é decorrência da noção de
equivalência pedagógica entre etapas e modalidades de educação básica, enquanto que a
diversidade decorre da influência exercida pelo espaço social local, aliada à autonomia
política administrativa assegurada à unidade escolar.
Estudos comparativos de sistemas autônomos de administração político pedagógica
constituíram bases para intervenções reguladoras. As reformas empreendidas visavam
dotar os órgãos centrais de critérios técnicos para o exercício de intervenções reguladoras,
quando se fizesse necessário. O combate ao clientelismo dar-se-ia pela elaboração de um
planejamento subsidiado em informações técnicas, o que não inviabiliza a negociação de
pública de interesses, mas desfocava a tutela política e o trato patrimonialista.
Em síntese, as concepções de Anísio quanto a descentralização político administrativa têm
por contrapartida:
- a distribuição de competências entre a União e os Estados, de forma a permitir a
unicidade do sistema educacional fundada no princípio da equivalência pedagógica,
estabelecida pela Constituição de 1946;
- a existência de órgãos colegiados (Conselhos municipais, estaduais e federal) para as
funções de educação e cultura promovidas pelo Estado, cujas deliberações decorrem das
proposições de políticas formuladas no âmbito do poder executivo;
- a ação reguladora do poder executivo encarregado de etapa ou modalidade de educação
básica.
- a provisão de recursos públicos de forma automática e permanente para as unidades
escolares e sistemas de ensino - financiamento mediante fundos específicos
- a formação comum do magistério e sua contratação pelo poder público local.
Duarte, MRT
Página 22
1.4 Organização do sistema público de educação básica: etapas e
modalidades de ensino
Ao comentar em “Educação para a Democracia”, sobre a educação pré-escolar (o termo é
utilizado na acepção hoje corrente de educação infantil) o educador destacava sua
importância, procedimentos adequados, condições que a produzem, porém em uma
perspectiva de assistência integral a infância pré-escolar. Em decorrência afirmava:
o problema da educação escolar põe tais exigências de recursos e de
pessoal, que não poderemos ambicionar muito mais do que os
atuais cinco anos, que em breve não chegarão para todos. Assim que
os pudermos prolongar, deveremos fazê-lo cada vez mais para a
frente, e não para os primeiros anos, quando a tarefa é mais difícil e
de resultados menos seguros (Teixeira, 1953: 57)
Educação elementar básica urbana e obrigatória, com cinco anos de duração, constituiu a
base do sistema público de educação escolar para Anísio Teixeira (FIG. nº1, ANEXO I, p.
33). Uma atualidade sombria no texto anisiano ao argumentar quanto à insuficiência de
recursos para expandir o atendimento público em educação infantil. Sem desconsiderar a
importância de uma formação adequada à primeira infância, estabelece como prioridade de
política pública a expansão e aprimoramento dos sistemas de ensino a partir da chamada,
na época, educação primária elementar15. A educação infantil – hoje correspondendo a
etapa de zero a seis anos – é destacada pela sua importância na formação dos indivíduos,
mas a manutenção e desenvolvimento de instituições públicas adequadas é defendida como
política assistencial com características de voluntariado.
15
Para Anísio Teixeira não se trata apenas da expansão quantitativa do sistema público elementar, mas de
enfrentar, também, o grave problema da evasão pela adequação da escola a uma sociedade em transformação.
o mal brasileiro é a falta de escolas, mas é também a própria escola existente. (Teixeira, 1953: 62). Nos
textos da década de 60 a prioridade política ao ensino primário resultava em obrigação preferencial do poder
público: estabelecer que os três governos da Federação ⎯ o federal, o estadual e o municipal⎯ devem dar
prioridade a essa despesa compulsória com o ensino primário, e somente depois de atendido este é que
podem realizar outras despesas com educação (Teixeira, 1961:3)
Duarte, MRT
Página 23
Seu sistema educacional compreendia da educação primária à universidade16, dele fazendo
um poderoso eixo transformador no campo cultural e educacional que interfere na vida
urbana e, ao mesmo tempo, produz conhecimentos sobre ela (Nunes, 1992). A defesa e o
aperfeiçoamento das pré-escolas existentes, a criação de instituições experimentais de
ensino constituem ações fundamentadas em um pragmatismo político, sendo seu projeto de
sistema público lastreado no ensino primário de base urbana (FIG. nº1, ANEXO I, p. 33).
A antinomia no projeto de sistema de ensino acha-se na proposta de desenvolvimento para
as escolas rurais. O diagnóstico formulado reconhece a necessidade da universalização da
educação escolar, porém "precisamos ter uma escola rural necessariamente diferenciada
da escola que busca preencher essa função no meio urbano" (Teixeira, 1953: 80).
O sistema integrado de educação escolar proposto por Anísio Teixeira, apresenta uma
dupla base: escolas urbanas e rurais. Nestas, devido à escassez de recursos financeiros (...),
à extrema ignorância da população adulta e o caráter primitivo de nossa vida (Teixeira,
1953: 82) às funções e organização das atividades escolares seriam diferenciadas.17 A
defesa permanente, da expansão e desenvolvimento da educação pública elementar,
inscreve o seu pensamento em contraposição a uma vertente política autoritária e
elitizante18 (expressa também, pela Igreja e por setores do aparato de Estado). No entanto,
a proposição de organização e funcionamento da educação rural - educação da maioria da
população brasileira como ele mesmo reconhece no período - subordina o esforço de
16
Nunes 1992 inscreve a educação pré escolar no projeto de sistema nacional de ensino de Anísio Teixeira.
No entanto, em sua obra verifica-se a permanência da posição defendida desde os anos trinta: de prioridade a
educação primária elementar urbana e a expansão dos estudos posteriores.
17
Anísio Teixeira enumera as funções da escola rural e formas de organização para atingir os objetivos
propostos. Destacamos a prioridade dada à alfabetização de crianças e adultos utilizando o espaço da escola
no período noturno e às condições organizacionais estabelecidas para tanto. Embora a crítica de Anísio a uma
escolarização voltada apenas para a alfabetização seja constante, em relação às escolas rurais considera: "A
escola teria o objetivo imediato do ensinar a ler e a escrever, não somente às crianças, com também aos
adultos. Essa leitura seria, porém, de aplicação direta a coisas da vida rural. Livros, publicações, informações
úteis e práticas seriam distribuídas através da escola a toda a população” (Teixeira, 1969).
18
Rocha, 1995 contrapõe as obras de Anísio Teixeira e Francisco Campos com paradigmáticas de projetos de
modernidade no campo educacional.
Duarte, MRT
Página 24
investimento na efetivação da igualdade de oportunidades escolares à exigüidade dos
orçamentos públicos. Em segundo plano, mas não menos importante, sua proposta
circunscreve o esforço político administrativo no campo da educação escolar àqueles
setores ligados ao nacional-desenvolvimentismo de base urbano industrial.
Rocha (1996) no posfácio a “Educação é um direito” destaca no pensamento de Anísio
Teixeira um entendimento substantivo de democracia, que o leva atentar para a exigência
de incorporação de todos os indivíduos em condições de igualdade, e não de forma
seletiva como foi característico da cultura política de 1930 e considera ter o autor sido
incansável na denúncia e na ação contra dualismo educacionais decorrentes de uma
tradição de cunho elitista em nossa história, fortemente arraigada nas profundas
desigualdades sociais que aqui vicejaram desde a colonização (Teixeira, 1953: 194-199)
Tanto em “Educação para a democracia”, quanto nos relatórios produzidos após suas
primeiras viagens, proposições sobre uma educação rural diferenciada coexistem com a
defesa da importância do ensino primário comum. Os argumentos, apresentados nestas
obras, pressupõem o espaço urbano como o lugar do moderno e o mundo rural como
atraso19.A etapa terminal da educação básica, por sua vez, consistiria em escolas
secundárias diversificadas. Um sistema de ensino secundário mais amplo e variado, no
lugar de um tipo único e uniforme de escola.
Além das diferenciações que proviriam da variedade de programas e
cursos, defendida nas primeiras páginas deste capítulo, dever-seiam permitir, com a devida fiscalização, ensaios de seriações, de
métodos, de planos de estudos, dando-se, assim, a cada escola uma
autonomia que só lhe podia aumentar a vitalidade e o sentido de
suas responsabilidades (Teixeira, 1953: 91).
O combate à centralização efetuada pela União é manifesto nas propostas de Anísio
Teixeira para o ensino secundário. Sua crítica à Constituição de 1934 retoma este tema
19
Não se trata apenas de uma concepção marcada pelas transformações das condições sociais, onde um
projeto de classe ou frações é engendrado. A primazia que Anísio Teixeira atribui à educação primária
urbana foi de encontro de uma posição política de autonomização do eleitorado urbano em relação à
ordenação política alicerçada nas oligarquias rurais. Os resultados eleitorais do período de redemocratização
do país demonstraram as conseqüências advindas desse processo.
Duarte, MRT
Página 25
defendendo uma função de legislação das diretrizes para a União – e de custeio e
manutenção, incluídas as escolas secundárias, para os estados e municípios20.
Educação escolar secundária diversificada – de acordo com as necessidades do meio –
após um ensino primário comum. Esta assertiva contrapõe-se a uma formação humanista
geral e a de cursos propedêuticos, predominantes no período. Pois, o atendimento às
necessidades econômico-sociais, induziria as unidades de ensino secundário (atual ensino
médio) a integrar a formação acadêmica com o domínio de procedimentos necessários às
atividades de trabalho.
Vale observar, também, que os conflitos que marcaram a
organização do sistema público na Capital da República de ensino
começam quando Anísio procura reformar o ensino secundário,
transformando as antigas escolas profissionais em escolas técnicosecundárias, com uma organização inspirada nas “escolas
compreensivas” norte-americanas. Nesse momento, ele teve de
travar verdadeira batalha com as autoridades federais para que
reconhecessem a validade dos cursos dessas escolas, sem a
fiscalização direta do Ministério da Educação, e fosse autorizado o
ingresso dos concluintes nos cursos superiores, mediante exame
vestibular (Lemme, 1988: 139 apud. Fávero, 2.000).
Coexistem semelhanças entre as formulações de Anísio Teixeira para o ensino secundário
e as mudanças empreendidas após a EC 14/96. Se o projeto de Anísio, para a organização
do ensino secundário, unificava as trajetórias de progressão no sistema publico de base
urbana, simultaneamente com a diversificação da etapa final da EB, estabelecia, também,
íntima conexão entre a expansão do sistema e o financiamento público.
A prioridade política à universalização do ensino fundamental, explicitada após as
Reforma Constitucional empreendida a partir de 1996, tem como efeito restrição ao
atendimento em Educação Infantil e maior segmentação do ensino médio em profissionais
e propedêutico. Este design institucional do sistema é inerente à lógica de formulação e
implementação da política educacional liberal, também presente na atualidade. Tende para
a universalização de um patamar básico – o ensino fundamental de oito anos hoje, o ensino
primário urbano no contexto dos anos 30 – gerando seletividade meritocrática, e não
20
Ver Teixeira, 1953: 235
Duarte, MRT
Página 26
exclusão tout court, nas demais etapas da EB21. O design anisiano, entretanto, ao priorizar
a ampliação do financiamento estatal e controle público especialmente nos espaços
urbanos, projetava a institucionalização de um sistema educacional cuja etapa terminal
indicava na diversidade uma formação comum para estudos posteriores e para o trabalho.
1.5 Verbas públicas para escolas públicas: o financiamento da educação
básica
A concepção de Anísio Teixeira orienta-se por um projeto integrado de financiamento,
onde coexistem recursos federais, estaduais e municipais22. Estes recursos destinam-se a
compor fundos específicos - uma idéia presente desde a década de trinta e permanente em
sua obra:
A grande reforma da educação é assim, uma reforma política,
permanentemente descentralizante, pela qual se criem nos
municípios os órgãos próprios para gerir os fundos municipais de
educação e os seus modestos mas vigorosos, no sentido de
implantação local, sistemas educacionais(...)Primeiro que tudo
teremos criado com o novo plano cerca de três mil unidades
administrativas escolares em todo o país, que tantos são os
municípios, com os seus conselhos de administração escolar,
representativos da comunidade, paralelos aos conselhos municipais
ou câmaras de vereadores, com poderes reais e não fictícios de
gestão autônoma do fundo escolar municipal e direção das escolas
locais. (Teixeira, 1957: 56-61)
A gestão do fundo escolar por Conselhos locais é diretamente inspirada na experiência
americana. Porém a composição deste fundo público, para Anísio Teixeira, decorre de uma
percepção fruto de sua perspectiva sobre a situação do país. Esta posição fundamentou o
princípio geral de financiamento da educação com base em fundos públicos originários de
recursos vinculados. O Estado – União, estados e município - teria um papel a
21
Cohn (1998: 105) afirma a presença desta lógica na formulação e implementação das políticas sociais a
partir dos procedimentos de Reforma do Estado implementados nos anos 90.
22
Anísio Teixeira explicita as vantagens dessa opção face as desvantagens do localismo: a escola primária,
embora uma instituição local, administrada por autoridades locais e regida por professôres de nomeação
local, será integrante de um sistema estadual de ensino, o qual, por sua vez, obedece a diretrizes e bases
federais, e, como tal, integra um sistema nacional de educação Além isto, a escola primária será mantida
com recursos municipais, estaduais e federais podendo cada um dos três poderes exercer, pelas condições
do financiamento, sua influência na escola (Teixeira, 1968: 56)
Duarte, MRT
Página 27
desempenhar na manutenção e desenvolvimento de um sistema de educação comum no
país, visto a impossibilidade das forças sociais arcarem esses cursos, devido as
desigualdades sociais e regionais.
Como, porém, a organização das escolas se tornou um
empreendimento tão vasto, tão complexo e tão custoso, que só o
Estado, com os seus recursos e os seus meios de ação, pode levá-lo a
bom termo, decorre daí a necessidade de ser o Estado quem deve,
por coerência com o regime democrático, abrir mão do governo da
educação, para conservar, tão somente, sobre a mesma o direito de
lhe defender a liberdade e a imparcialidade (TEIXEIRA, 1953).
A defesa intransigente da necessidade de vinculação de recursos tributários à manutenção e
desenvolvimento do ensino para todos os entes federados harmoniza-se com a postura de
luta por maior autonomia local e descentralização político administrativa, pois a
competência deliberativa dos conselhos municipais na aplicação dos recursos contribuiria
para maior integração das escolas com a sociedade local. O financiamento da educação
escolar deveria provir basicamente desses recursos, mas Anísio Teixeira não descartava o
pagamento privado não compulsório pelos serviços prestados ou mesmo contribuições
voluntárias. Em sua concepção estas possibilidades expressam o comprometimento dos
indivíduos para com a educação primária de qualidade.
Em “Educação para a democracia” e “Educação não é privilégio”, os recursos constitutivos
do fundo público teriam como destino as necessidades extraordinárias do serviço escolar,
enquanto que a manutenção das atividades rotineiras far-se-ia por meio da vinculação no
orçamento ordinário da educação pública. O critério para definição do montante necessário
foi fixado por Anísio Teixeira tendo por base uma determinada quantia por criança
escolar recenseada.(Teixeira, 1957: 206). Esta proposição difere da associação efetuada
entre custo e gasto por aluno na Lei nº 9424/96 (§1º art. 6º, ver, ainda Bassi, 1996).
Em “Educação é um direito” as proposições anteriormente anunciadas adquirem maior
precisão conceitual. O direito à educação obriga os entes federados a uma responsabilidade
solidária para com o financiamento do esforço comum. Os recursos vinculados passariam a
constituir fundos de educação a serem administrados localmente pelos Conselhos. As
Duarte, MRT
Página 28
medidas de distribuição dos recursos vinculados ao fundo escolar continham pressupostos
que possibilitavam ao poder central o exercício de intervenções reguladoras.
Para Anísio Teixeira (1968: 56) a distribuição dos recursos vinculados dar-se-ia com base
num regime de quotas parte do custo-padrão de educação para cada aluno.
Os elementos constitutivos desse custo seriam 1) vencimentos,
salários e despesas com o professorado, 2) despesas de
administração, compreendendo supervisão e serviços, 3) biblioteca e
material de ensino 4) serviços de assistência, alimentação e saúde
do aluno, e 5) equipamento e prédio escolar. (...)Para se achar o
custo-padrão por aluno-ano, proceder-se-ia de acôrdo com o
seguinte: A) despesas com o professorado, baseadas, em cada local,
no salário mínimo vigente, e que constituiriam 55% do custopadrão; B) outras despesas, acima enumeradas, que representariam
os restantes 45% do custo-padrão (Teixeira, 1968: 57-58).
Diversamente da opção atual, em Anísio Teixeira a adoção do custo aluno padrão foi
justificada pelo reconhecimento da existência de custos fixos, irredutíveis face as variações
de caixa dos recursos. A variedade do custo-padrão era considerada face a diferenças
regionais, mas sua fixação estabeleceria o patamar mínimo para aporte dos recursos
suplementaraes estaduais ou federais23. Este procedimento constante na formulação
anisiana reconhece por um lado a existência de desigualdades na capacidade de
financiamento dos municípios e aponta para uma ação suplementar redistributiva da União
e/ou dos estados subnacionais.
Sua sistemática de financiamento procura contrabalançar as exigências de um custo
mínimo por aluno ano com as desigualdades regionais de recursos. Neste sentido, a aposta
política implícita é a da regularização e permanência de recursos públicos para a educação
escolar e melhoria da eficácia através do controle efetuado por Conselhos locais.
23
Duarte & Teixeira (1999) afirmam que Anísio Teixeira concebe a ação supletiva da União pela existência
de escolas modelo. Esta concepção presente nos debates da década de 50, quando da elaboração da Lei de
Diretrizes e Bases, foi complementada com a sistemática de financiamento que previa aporte de recursos
estaduais e federais para o âmbito local.
Duarte, MRT
Página 29
A obrigatoriedade do financiamento estatal associa-se com as competências deliberativas e
de fiscalização dos Conselhos estaduais e /ou locais e as atribuições técnico avaliativas dos
órgãos centrais de administração educacional. Aos primeiros as ações empreendidas
objetivavam, nos termos de Anísio, zelar pelo bom uso do recurso desde a definição de sua
alocação até o momento da prestação de contas. Em termos atuais, sua formulação
institucional visava assegurar accountability e responsiveness na gestão educacional
contrapondo a atuação dos Conselhos, a ação técnica dos executivos de avaliação da
eficácia. Esta por sua vez, orientadora de ações supletivas e redistributivas das demais
instâncias governamentais24.
1.6 A tradição desafortunada: a ampliação do escopo de negociação política
Anísio Teixeira formulou, para este país, um projeto político administrativo de
institucionalização do sistema público de educação básica, em contraposição à reforma
administrativa implementada pelo DASP e diverso da concepção política autoritária de
Capanema e Campos. Ele estabeleceu diretrizes políticas gerais e desenhou arranjos
institucionais necessários para a universalização do sistema público de EB, moldado na
autonomia e diversidade.
Para além dos interesses imediatos de classes ou frações o pensamento político educacional
de Anísio Teixeira destacou a reflexão sobre a materialidade de instituições que possam
assegurar o respeito e a efetividade do direito à educação. Para a transformação deste
direito proclamado em bem material comum desdobrou-se numa constelação de lutas que
marcaram sua trajetória de vida. A vasta bibliografia existente a seu respeito revela os
momentos, atores e processos de lutas empreendidas pelo educador. No entanto comparar
os resultados historicamente alcançados e os proposições em implementação na atualidade
desnuda os limites da modernização efetuada nos sistemas de ensino e nos termos de
Francisco de Oliveira (1998), o atraso de nossas atuais vanguardas
24
Sobre a concepção de ação supletiva da União em Anísio Teixeira, ver Duarte & Teixeira (1999).
Duarte, MRT
Página 30
No contexto das décadas de 50 e 60, a obra teórico-prática de Anísio Teixeira propunha o
crescimento do sistema público de EB no país, sua gestão descentralizada e procedimentos
de financiamento capazes de articular as aspirações e lutas do povo, diríamos na
atualidade, os movimentos da sociedade civil, com uma organização e funcionamento
sistêmico. Em sua formulação as estratégias para tornar os agentes políticos sensíveis às
reivindicações populares tensionam com procedimentos político-administrativos que
orientam a prestação dos serviços educacionais pelo Estado. Encontramos na sua obra uma
formulação institucional que contempla por um lado, a defesa da democratização do
aparato estatal pela presença de atores sociais com atribuições deliberativas e, por outro
lado, da autonomia relativa de organização e funcionamento do sistema público frente a
grupos organizados, pela definição de relações intergovernamentais de financiamento que
normatizam intervenções reguladoras.
Existe um posicionamento comum entre Anísio Teixeira e Paulo Freire no início da década
de 60: o reconhecimento da inadequação do quotidiano da escola primária brasileira.
Verborrágica, memorizadora, domesticadora, burocrática são adjetivos, que procuram
traduzir um quotidiano escolar despido de criatividade e novidade. Acresce a esta
aproximação entre os dois educadores um diagnóstico que, por sua vez, legitima a
exigência de reformas voltadas para o combate à repetência, evasão e melhoria da
qualidade do ensino.
No entanto, Freire inscrevia, no período, suas críticas a Anísio Teixeira, precisamente
quanto às medidas sugeridas para sanear estes problema25.
Em que pese a seriedade dos estudos feitos e a honestidade com que
se trataram os problemas, não nos parecem suficientes os reparos
propostos como medidas saneadoras, o “ordenamento” das
matriculas nas escolas primárias e a maior flexibilidade do sistema
de promoções de uma série para outra. A que juntou ainda a
comissão acertadamente sugestões em torno do melhor preparo do
pessoal docente (Freire, 1961: 23).
25
Ver Freire, 1961. As críticas são dirigidas às propostas da comissão encarregada de apresentar à
presidência da República sugestões no campo educacional. Diferentes autores consideram que a ação
dirigente de Anísio Teixeira neste período influenciou os resultados dos trabalhos desta Comissão.
Duarte, MRT
Página 31
A crítica de Paulo Freire fundamentava-se no que lhe parecia ser solução meramente
administrativa e paliativa.
ao invés de continuarmos a "plantar" escolas ou unidades
pedagógicas sem vinculações sistemáticas e estreitas entre si e com
sua localidade, deveríamos tentar experiências de integração da
escola em sua comunidade local. (Freire, 1961:26)
As condições sociais subdesenvolvidas, segundo Freire, eram impeditivas de uma escola
verdadeiramente nacional - e por conseqüência de um sistema de educação popular. Sua
perspectiva redireciona politicamente as reformas para uma ação do poder público no
sentido de coordenar esforços diversos.
Seria interessante, um trabalho deste que o poder público criasse
unidades pedagógicas ajustadas às condições do meio e cuja
localização, devida e previamente estudada, lhes proporcionasse a
tarefa de dentro de uma cadeia de outras agências populares que
funcionaria como seus satélites. Estes centros, relacionando-se
sistematicamente com as demais agências de sua área - as que
mantivessem ou não escolas primárias - funcionariam como
testemunho de um orgânico trabalho pedagógico (Freire, 1961: 26).
O contraponto que Freire procurava estabelecer consistia na articulação entre o poder
público e a cultura do povo26. A critica iniciada desenvolvida por Freire em 1961,
fundamentava-se numa perspectiva teórica, que enfatizava o caráter socialmente
determinado dos conteúdos e processos educativos nas escolas. Apoiando-se em diferentes
referencias críticos ao pensamento liberal, Freire (1961) desfocou a importância de temas
ligados a institucionalidade política necessária a efetivação dos direitos. Sua ênfase
achava-se posta, no período, na formulação de uma concepção de educação escolar
vinculada ao desenvolvimento da cultura popular. Na obra de Anísio Teixeira, a nosso ver,
a ênfase nos procedimentos político administrativos necessários à gestão dos sistemas
educacionais pressupunha a crítica a modernização conservadora do aparato do Estado,
como mediação para o desenvolvimento da cultura popular.
26
A polissemia do termo tem sido analisada por diferentes estudos de sociologia educacional. Destacamos
dentre eles Chauí, 1979 por relacionar à noção seus vínculos com o autoritarismo.
Duarte, MRT
Página 32
Ao criticar a dicotomização dos termos modernização e democracia, Cury (1993:62)
afirmava: estamos diante do desafio de encontrarmos formas efetivas e concretas de uma
administração pública que seja eficiente, e com isto dê à educação uma qualidade
diferente, e democrática, e com isso se possa otimizar os recursos repassados com
transparência e controle [publico, acrescentamos]. Neste sentido, ao analisarmos a
configuração do sistema público de educação básica no país buscamos suporte na historia
do pensamento educacional com o objetivo de aquilatar alternativas e suas conseqüências.
Anísio Teixeira projetou em sua obra um arranjo institucional para o sistema público de
educação básica no país, o debate necessário que nos desafia, relaciona-se aos elementos
de configuração do sistema e suas conseqüências sobre a prestação de serviços capazes de
efetivar direitos, para além da situação de mercado.
Duarte, MRT
2. Políticas sociais, descentralização e regime de colaboração
O Brasil foi postergando essa questão e até hoje não conta com um
sistema de ensino organizado em âmbito nacional. Em decorrência,
o déficit foi se acumulando e neutralizando os esforços parciais que
se fizeram ao longo dos últimos cem anos. (...) Com efeito, o sistema
instalado e em pleno funcionamento implica a universalização não
apenas do acesso, mas da permanência e da conclusão (SAVIANI,
1997: 6-7)
A década de 90 e a hegemonia de uma ideologia que associa escolarização/
empregabilidade/competitividade produziram indagações quanto às bases de sustentação
político institucional de propostas que defendem a educação básica como direito de todos.
Como se organizam os serviços públicos que efetivam este direito? A resposta a esta
questão requer o detalhamento de um conjunto de instituições, suas funções e relações que,
por interdependência, moldam as possibilidades de acesso e gozo do direito à educação. A
reordenação do sistema educacional, por sua vez, se fez e se faz no interior do processo de
reforma das políticas sociais.
Uma nova articulação veio se esboçando entre as políticas econômicas e sociais desde a
última década, desenhando um novo perfil de sistema de proteção social. As políticas
sociais tornam-se cada vez mais não só reféns das diretrizes macroeconômicas, mas num
movimento paradoxal, elas em si vêm se constituindo como fonte potencial de poupança
para o setor privado ou como um novo mercado de investimento privado1 (Cohn, 2000).
Nesta perspectiva, a transferência de atribuições e responsabilidades de gestão da União
para os demais entes federados envolve, além de objetivos de maior eficiência e eficácia, a
articulação dos recursos disponíveis nos fundos públicos locais com empreendimentos
privados diversos geradores de valor.
Mas, neste mesmo contexto e, especialmente no Brasil, é requerido às políticas públicas o
preenchimento de sua dupla função no tratamento da questão social: a gestão do trabalho e
1
As políticas sociais, mesmo quando propostas como universais, tendem para a universalidade de um
patamar básico de acesso aos serviços sociais, gerando seletividade nos níveis mais complexos de serviços
sociais nos distintos setores (Cohn, 1998: 105)
Duarte, MRT
Página 34
os cuidados com a pobreza. A centralidade que a Educação Básica adquire no conjunto das
políticas sociais passa a ter por objetivo o preenchimento de duas funções distintas, porém
complementares: formar para a empregabilidade e para a integração social (Oliveira,
2000).
A reforma político administrativa do aparato estatal de prestação de serviços sociais
desenvolvida na segunda metade da década de noventa, incluído o sistema educacional,
orienta-se para a readequação da máquina estatal as necessidades relacionadas com a
geração de poupança para o setor privado, fortalecimento de novos nichos de mercado,
simultâneamente, com a certificação de habilidades e competências individuais
(empregabilidade) e integração social (assistência aos pobres e/ou excluídos). Em síntese, a
racionalidade política que preside os processos concretos de reorganização político
administrativa do sistema educacional orienta-se para o enfrentamento dos obstáculos à
compatiblização dessas funções.
Como modernizar o "velho aparato burocrático" para o exercício de suas funções em
decorrência das transformações econômicas e sociais? No campo administrativo, as
contradições reformistas entre os velhos procedimentos e novas formas de atuar adquirem
uma dimensão formativa mais aguda. Trata-se de instaurar novas relações entre sujeitos no
interior de instituições forjadas em contextos diferentes. Os problemas do desenho
institucional apropriado do sistema educacional público provêm do arranjo de
financiamento adequado ao preenchimento dessas funções contraditórias (econômicas e
sociais), simultaneamente, com a manutenção do aparato burocrático (normativo e de
procedimentos) pré-existente.
Descentralização político-administrativa adquire, por essas razões, uma dimensão
estratégica mais aguda. Arretche (2000) ao indagar sobre a emergência de um novo
desenho institucional para as políticas sociais no Brasil, que teria ultrapassado o modelo
centralizado previamente existente, afirma:
...em um processo de reforma do Estado no qual se
reconfigura o desenho institucional de um modelo nacional de
prestação de serviços sociais, sob um Estado federativo, com
marcadas diferenças regionais e dotado de uma esmagadora
Duarte, MRT
Página 35
maioria de municípios fracos, a capacidade fiscal e administrativa
das administrações locais influi no processo de reforma; mas estas
variáveis não são determinantes em si mesmas. Seu peso varia de
acordo com os requisitos postos pelos atributos institucionais das
políticas que se pretende descentralizar, vale dizer, dos custos
operacionais implicados na sua gestão, das dificuldades à
transferência de atribuições derivadas do legado das políticas
prévias e das prerrogativas legais estabelecidas constitucionalmente
(Arrechte, 2000: 73)
No entanto, conclui a autora, políticas efetivas de reforma, que instituam estratégias
duradouras de indução capazes de compensar obstáculos estruturais à descentralização, são
fatores decisivos para o redesenho institucional das políticas sociais. Este viés analítico
redimensiona a importância dos procedimentos de formulação e implementação das
políticas sociais para a consecução dos resultados pretendidos, mas subsumiu as
determinações estruturais dos procedimentos engendrados. Que medidas descentralizantes
melhor respondem as exigências de exercício das funções contraditórias estabelecida para
as políticas sociais?
Arrechte (2000) demonstrou o papel determinante de estratégias de indução –
compreendidas pela existência de programas ativos de transferência de atribuições e pela
formulação de um desenho institucional capaz de produzir incentivos à assunção de novas
tarefas - conduzidas por parte do nível de governo interessado na descentralização. A
autora selecionou para estudo, em relação à educação escolar, a municipalização das redes
de ensino fundamental e alguns dos programas conduzidos pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação do MEC (FNDE), para testar a importância relativa das
estratégias de indução e a possibilidade de emergência de iniciativas descentralizadas na
ausência de uma política ativa nesta direção (Arrechte, 2000: 23-74).
Acrescentamos, no entanto, que a descentralização das políticas sociais, para além da
obtenção de ganhos de efetividade, eficácia e eficiência têm por objetivo compatibilizar
funções contraditórias. Alcançar este objetivo constituiu um atributo sistêmico, para a qual
concorreram por ações e práticas diferenciadas suas partes constitutivas: os diferentes
sistemas de ensino.
Duarte, MRT
Página 36
2.1 Regime de colaboração, descentralização e autonomia dos sistemas de
ensino
No Brasil, um duplo resultado do ciclo nacional-desenvolvimentista autoritário acha-se por
um lado, na crise fiscal do Estado e por outro na urbanização da vida quotidiana. A
introdução de medidas indutoras de descentralização, especialmente a partir do governo
FHC, ocorreu em um contexto onde o Estado Central procurou transferir atribuições que
desonerassem o custo dos serviços prestados e recompor sua capacidade de promover
investimentos produtivos2. Ao mesmo tempo, os problemas derivados da gestão de
serviços sociais em grandes centros urbanos potencializaram-se em face da organização da
sociedade civil, das dimensões das populações a serem atendidas e da restrição/ineficácia
de gestão do fundo público3.
TABELA 3
Evolução percentual da população residente
Ano
Urbana
Rural
1960
1970
1980
1991
1996
2000
Brasil
45%
56%
68%
76%
78%
81%
Minas Gerais
Brasil
40%
55%
53%
44%
67%
32%
75%
24%
78%
22%
82%
19%
Minas Gerais
60%
47%
33%
25%
22%
18%
Fonte: IBGE
No mundo inteiro e no Brasil (TAB nº 3), a maioria da população vive atualmente em
centros urbanos que devem oferecer os serviços básicos que ela precisa e espera receber.
Dentro de um quadro de relativa escassez de recursos, partidos de esquerda ou de direita,
ocupando poder decisório nas instâncias municipais, vêem-se frente à construção de
alternativas para enfrentar os mais variados problemas no nível local. A revalorização dos
governos locais na América Latina guarda sua origem, simultaneamente, nos processos de
redemocratização impulsionados a partir do final da década de setenta e na reestruturação
2
Diferentes autores destacam que no decorrer do processo de redemocratização e com a aprovação da
Constituição Federal em 1988 ocorreu significativa elevação da receita dos governos estaduais vis a via a da
União, sem que ocorresse redefinição das atribuições correspondentes. Superar este desequilíbrio constituiu
um dos desafios a serem enfrentados pelas políticas de reforma no decorrer dos anos 90 (Afonso, 1995;
Abrucio, 1999; Arrechte, 2000).
3
Hobsbawm (1995) considera que o vertiginoso processo de urbanização ocorrido ao longo do século XX,
alterou significativamente as expectativas da sociedade em relação às tarefas do Estado. No Brasil, a
urbanização acelerou o seu ritmo especialmente após a segundo metade do século.
Duarte, MRT
produtiva
por
Página 37
que
passa
a
economia
capitalista
desde
este
período.
Esta
revalorização/reestruturação produz, por sua vez, um duplo movimento: por um lado.a
redefinição das bases de intervenção do Estado na esfera social e, por outro, as mudanças
organizacionais e de gestão no setor público. Essa tendência de revalorização é
acompanhada, ainda, por nova sistemática de relacionamento entre os setores público
estatal, público não governamental e privado (Santos, 1999).
Formas de tratamento das questões afetas ao poder local como educação, saúde, transporte
público e habitação defrontam-se com questões de eficiência, eficácia, efetividade
simultaneamente aos desafios do exercício da cidadania. Propor novas formas de fazer
política e de administrá-las não se restringe à universalização dos serviços prestados, mas
requer também avaliar o exercício do poder de decidir e sua partilha (Fachin & Chanlat,
1998: 15-19). É necessário avaliar, também, as restrições impostas à autonomia dos
governos locais, que não se limitam apenas a fatores financeiros e econômicos.
Este estudo tem por premissa a importância da autonomia política dos governos locais4
para o desenvolvimento da democracia, embora nem sempre concepções de
descentralização político administrativas contenham em si soluções democráticas
(Groisman, apud. Fachin & Chanlat, 1998: 11). Esta noção de autonomia destaca a
importância da iniciativa, da capacidade decisória, institucional e técnico-administrativa
presentes na esfera governamental, possibilitando a elaboração e implementação de um
projeto político-pedagógico que contemple as necessidades e a cultura local. Desse modo,
as possibilidades de autonomia dos sistemas municipais de ensino têm expressão na
formulação de um projeto político-educacional dos governos locais em colaboração com as
demais instâncias da federação.
4
Souza & Blumm (1999: 58) conceituam autonomia política dos governos locais como a capacidade de
definir e implementar uma agenda política e de políticas públicas própria, mesmo que minimamente.
Distinguem-no, por sua vez, do conceito de autonomia política local. Este busca investigar a capacidade das
elites dirigentes de perseguir, nos territórios locais, seus objetivos sociais, econômicos, políticos e
administrativos .
Duarte, MRT
Página 38
A perspectiva da análise deste capítulo envolve o tipo de autonomia dos sistemas de ensino
engendrada pós 96. Sem uma perspectiva ingênua de sempre valorizar de forma positiva o
movimento de descentralização/maior autonomia das instâncias subnacionais, pretende-se
destacar a natureza essencialmente política das relações entre os sistemas de ensino como
forma de expandir o atendimento em Educação Básica, capaz de efetivar a ampliação do
acesso e igualdade de oportunidades. No entanto, o tipo de autonomia dos sistemas de
ensino, além da efetivação de medidas de descentralização político-administrativa, acha-se
circunscrito por determinações estruturais da realização do fundo público que efetivam a
estrutura e funcionamento do sistema educacional no país. Inicialmente, indagamos, como
as relações intergovernamentais de descentralização/recentralização respondem à
efetivação de funções contraditórias postas às políticas sociais.
A configuração do sistema nacional de Educação Básica, com a aprovação da Emenda
Constitucional
n.º
14/965,
tem
como
referência
o
movimento
de
descentralização/recentralização ocorrido a partir dos anos 90 e as possibilidades de
autonomia político-pedagógica6 dos sistemas municipais. Privilegia-se a análise das
relações entre as sistemáticas de financiamento público e a capacidade de decidir e
5
Em 1995, a Câmara dos Deputados recebeu do Presidente da República a Mensagem nº 1.078/1995,
contendo a Proposta de Emenda Constitucional – PEC – que recebeu o número 233. A formulação desta
proposta pelo Executivo remonta ao documento intitulado “Plano de Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério”, divulgado em setembro de 1995 pelo MEC, que apresenta
uma proposta geral - ou o que chamou de uma “política esclarecida” - para reformar todo o sistema de
ensino. A proposta envolvia três aspectos: alterações na CF/1988 e na legislação educacional a fim de dirigir
os recursos de forma mais eficiente, estabelecimento de parâmetros nacionais para a carreira e a remuneração
do magistério, e reorientação da ação do MEC de forma a fortalecer o papel redistributivo e supletivo da
União (Oliveira, 2001:2) grifo meu.
6
A autonomia político pedagógica explicita a intencionalidade das ações educativas no âmbito do sistema de
ensino. Concepções de educação, de escolaridade, da relação ensino/aprendizagem, de avaliação etc, são
elaboradas e sistematizadas em uma proposta de natureza político-educativa. Este projeto expõe tanto o que o
sistema já é quanto o que ela poderá vir a ser, a partir das ações dos seus atores. Constitui um instrumento
específico de planejamento educacional por articular proposições de ordem pedagógica com recursos
institucionais, administrativos e financeiros.
Duarte, MRT
Página 39
implementar políticas, com o objetivo de analisar as relações intergovernamentais e a
autonomia dos governos locais.
Descentralização político-administrativa constitui neste estudo um dos elementos para a
análise da re-estruturação do sistema público de educação básica entre os entes federados.
O termo não é indicativo de um objetivo a ser alcançado, mas aponta para um dos
componentes da relação entre os entes governamentais em uma federação. À inovação
política posta pela Constituição de 1988 para as municipalidades efetiva-se com
capacidade fiscal, técnico-administrativa e decisória, com a elaboração de programas cujo
desenho institucional favoreça o desenvolvimento de relações compartilhadas (regime de
colaboração) e, ao mesmo, tempo promovam condições de enfrentamento das funções
estruturais das políticas sociais no país.
A reflexão sobre estas questões foi dimensionada neste capítulo à estratégia de indução
(processo normativo e programas de financiamento público) que possibilitou ampliar a
descentralização do atendimento (em face de atributos estruturais, Arrechte, 2000). Para
tanto, procuramos inicialmente identificar como a noção de autonomia dos governos locais
foi realizada, especialmente por setores e entidades da sociedade civil que
promoveram/promovem a redemocratização do país, para em seguida diferenciar os
espaços de autonomia dos governos locais nas atribuições fixadas para o sistema público
de educação básica.
2.2 Relações intergovernamentais e regime de colaboração
2.2.1 Sistemas municipais de ensino e autonomia política do governo local
A descentralização político-administrativa empreendida desde a Constituição de 1988 nas
políticas sociais, – em especial nas áreas de educação e saúde –, demonstra que a Reforma
do Estado têm repercussão significativa nas relações entre União, Estados e Municípios.
Em muitos países os resultados gerais das reformas não apontaram para a constituição de
um Estado mínimo, mas sim para a reconstrução da forma de intervenção e gestão do
aparelho estatal. Cortes ocorridos no poder central foram contrabalançados pelo
crescimento no nível local, especialmente, na prestação dos serviços sociais (Abrucio,
1999: 164).
Duarte, MRT
Página 40
A Constituição Federal de 1988 ampliou a faculdade de governar-se dos municípios no
Brasil. Estes foram promovidos à condição de entes federados e dispõem, no campo
educacional, de relativa soberania. Observadas as diretrizes gerais estabelecidas na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional7, os sistemas estaduais e municipais de ensino
dispõem de autonomia normativa e político-administrativa para estabelecer prioridades,
definir procedimentos e alocar recursos. Esta autonomia, no entanto, vem-se construindo
sobre a herança político-administrativa do ciclo autoritário-desenvolvimentista. Trata-se de
um alto grau de desigualdade material e institucional existente entre os sistemas de ensino
vis a vis uma homogeneidade de organização pedagógico-curricular das unidades escolares
regulares em todas as regiões do país8.
O texto da atual Lei de Diretrizes e Bases opera um duplo movimento em relação à
autonomia político-educativa dos sistemas de ensino: possibilita à União, aos Estados e
Municípios a livre organização de seus sistemas de ensino (§ 2o., art. 8) e estabelece,
apenas para os municípios, a atribuição de integração de seus órgãos e instituições oficiais
às políticas e planos educacionais da União e dos Estados (inc. I, art. 11). Mas, a Lei da
educação nacional assegura, ao mesmo tempo, liberdade de organização aos sistemas de
ensino (§ 2º, art. 8º) desde que observadas suas disposições. Atribui, ainda, à União e aos
estados subnacionais a possibilidade de elaborar políticas e planos educacionais inclusive
para o âmbito local (inc. 1º, art. 9º e inc. III do art. 10), desde que seja respeitado o regime
de colaboração.
Aos estabelecimentos de ensino, a LDB de 1996, autorizou a elaboração de sua proposta
pedagógica (inc. 1, art. 12) com a participação dos docentes (inc. II, art. 13 e inc. I do art.
7
A atual LDBEN (n°.9394/1996) foi considerada por diferentes analistas como propiciadora de maior
flexibilidade político-administrativa e concisa quanto a regulação nacional do sistema educacional (Cury,
1997; Saviani, 1998a,b).
8
A este respeito comenta Arretche: (...) foi um Estado dotado destas características [com relações
intergovernamentais próprias aos Estados unitários] que consolidou o sistema brasileiro de proteção social
(...) e moldou uma das principais características institucionais do sistema brasileiro: sua centralização
financeira e administrativa. (...) As fatias federais da oferta do ensino fundamental eram diretamente
formuladas, financiadas e implementadas por agências do governo federal (Arretche, 2000: 47)
Duarte, MRT
Página 41
14). No entanto, é negligente quanto à existência de um plano educacional e/ou projeto
pedagógico dos sistemas municipais de ensino, apesar de assegurar-lhes a possibilidade de
se organizarem em sistemas autônomos. Omissa quanto à necessidade de elaboração de
políticas e planos locais de educação, no entanto, a Constituição Federal e a atual LDB
ressaltam a integração entre os sistemas locais, estaduais e a União mediante regime de
colaboração. Esta ambigüidade dos textos legais decorre da presença de forças sociais
favoráveis à autonomia político-educacional dos sistemas de ensino estaduais e municipais
e outras promotoras de maior centralização e/ou subsidiariedade.
2.2.2. Polifonia de vozes e hibridismo jurídico-político
A associação entre democratização e descentralização esteve fortemente presente no
ideário político do período compreendido entre 1982-1992 (Kugelmas & Sola 2000: 69) e
foi transposta para o texto constitucional. A centralização político-administrativa, por sua
vez, constituiu um dos principais alicerces do modelo político dos períodos autoritários e a
base histórica de organização do sistema público de educação no país. Martins (2001) ao
comentar a descentralização como eixo das reformas do ensino destaca as ambigüidades
presentes no uso do termo e sentido político da fusão do termo com a noção de autonomia
da escola.
Os processos de descentralização político-administrativa possuem características
estruturais e institucionais distintas em cada formação social. As concepções de
descentralização forjadas no países capitalistas centrais destacam a importância da
autonomia da escola compreendida como uma estratégia de promoção de maior interação
entre o aparato estatal de educação escolar e uma sociedade civil, cada vez mais complexa.
Nesses países, via de regra, cabe ao Estado prover o sistema de escolas, estabelecendo uma
regulação ex post pela via das avaliações sistêmicas. Nos países semi-periféricos, em um
contexto agravado pela crise fiscal do Estado, a autonomia da escola configura a
possibilidade de buscar recursos próprios, em uma relação de “quasi-mercado” pelo
estabelecimento de parcerias com o setor privado (Martins, 2001)
O caráter híbrido da atual LDBEN brasileira é decorrência de seu histórico de tramitação.
Formulado inicialmente como projeto do Legislativo, com forte influencia de segmentos
Duarte, MRT
Página 42
organizados da sociedade civil, seu texto sofreu a superveniência de outra proposta
delineada a partir da definição do projeto político a ser implementado pelo governo federal
eleito em 1994. Aos mecanismos de descentralização presentes no texto da LDB foram,
também, sobrepostos instrumentos potenciadores de recentralização (Cury, 1997 e Vieira,
1998).
Há uma transferência de responsabilidades ainda que se mantenha
a figura de deveres compartilhados, seja por delegação, seja por
cooperação, seja por clareamento de atribuições. Neste caso podese falar em descentralização. Os municípios devem assumir
responsabilidades cada vez maiores face ao ensino fundamental e os
estados com o ensino médio. Ambos são reconhecidos como sujeitos
de sistemas de ensino (Cury, 1997: 98).
A LDB descentralizou para os governos locais a elaboração de normas complementares ao
seu sistema de ensino e relativas à gestão democrática (inc. III do art. 11 e art. 14).
Constituiu, também, como prerrogativa de autonomia dos sistemas, a definição de
parâmetros adequados de atendimento (art. 25, LDB). Observadas as diretrizes nacionais
estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, cabe, ainda, aos sistemas de ensino
estabelecer critérios para a seleção de conteúdos e experiências curriculares compondo
parte diversificada das propostas curriculares nas diferentes etapas e modalidades da EB.
Liberdade de organização e normatização dos procedimentos de gestão constituem
competências institucionais, que conferem a estados e municípios maior autonomia política
aos municípios no campo da educação escolar básica.
Neste sentido, o texto polifônico (Cury, 1997) da Lei de Diretrizes e Bases de 1996
configurou diretrizes jurídico-políticas, que apontam, simultaneamente, para a ampliação
da autonomia da escola, para a formulação de planos ou projetos político-educativos dos
sistemas de ensino e para uma integração intersistêmica mediada pelo regime de
colaboração. Este termo polissêmico, por sua vez, já previsto no texto constitucional como
mecanismo de relação intergovernamental no campo da educação, é explicitado pela ação
da complexidade de fatores estruturais e institucionais intervenientes no sistema público de
educação básica no país.
Duarte, MRT
Página 43
Em síntese, a Lei complementar da educação nacional é expressão do movimento político
de reestruturação das bases de intervenção do Estado. A ênfase político-ideológica nas
virtudes da descentralização e a maior autonomia constitucional dos municípios como
entes federados, presentes no início de sua tramitação defrontaram-se, na segunda metade
da década de 90, com uma série de medidas marcadas pelo reeenquadramento dos
governos locais pelo poder central (Kugelmas & Sola, 2000: 71).
Devido ao seu histórico, o texto da LDB é expressão de um duplo movimento presente na
sociedade brasileira: descentralizador e multiplicador de sistemas locais de ensino com
maior autonomia e diversidade, impulsionado pelos processos de reconstrução democrática
e recentralizador, voltado para integração dos sistemas de locais de ensino no
preenchimento das funções estruturais às políticas sociais. Este último movimento, por sua
vez, encontra suporte tanto numa sociabilidade político e administrativa autoritária, quanto
nos movimentos em prol da redução desigualdades regionais, econômicas e sociais9.
2.2.3 Ruptura com o federalismo de integração no campo educacional
Em primeiro movimento de análise destacamos a ruptura político-administrativa, no campo
da educação escolar básica, com a institucionalidade centralizada e autoritária, para
posteriormente analisarmos o significado do processo de recentralização. Dentre os
mecanismos que cumpriram o papel de homogeneizar a vontade política da camada
9
A literatura de interpretação da Lei de Diretrizes e Bases observa em diferentes aspectos a presença deste
movimento. O risco da fragmentação normativa coloca-se tanto com a instituição dos sistemas municipais de
ensino quanto com a construção da autonomia da escola. Os processos de descentralização geram a
necessidade de construir a unidade na diversidade... (ABREU, 1999: 141). Quando consideramos o segundo
projeto Darcy Ribeiro, isto é, o substitutivo apresentado em março de 1996 (...) vamos constatar que se trata
de um documento legal que está em sintonia com a orientação política dominante hoje em dia e que vem
sendo adotada pelo governo atual em termos gerais e, especificamente, no campo educacional. Em suma, a
política do ministério da Educação escolheu a via das alterações parciais. (...) Isto não significa que o
ministério não tenha uma política global para a área de educação. Certamente ele a tem. (SAVIANI,
1997:200). Poderíamos sintetizar do seguinte modo: 1º eixo: à dominância da flexibilidade (ao invés do
engessamento) se contrapõe a função complementar da normatização (não cartorial); 2º eixo: à dominância
da avaliação se contrapõe a função colaborativa que estrutura a federação republicana (ao invés da
subordinação) (CURY, 1997:109).
Duarte, MRT
Página 44
dirigente no pós-64, a nova forma da federação, com estados e municípios menos
autônomos em relação à União, desempenhou o papel mais relevante. Muito mais até que o
novo sistema partidário, que tem recebido atenção muito maior da pesquisa acadêmica.
Dentre as questões enfrentadas pelo regime pós 64 era crucial manter o poder sem quebrar
a unidades entre as várias facções, em meio a uma sociedade heterogênea e disponível aos
apelos de participação (Sallum Jr., 1996: 31).
Um conjunto de práticas e normas desenvolvidas no período militar vai dar forma ao
chamado federalismo de integração, termo que já aparecia em documentos oficiais da
época. Esses mecanismos eram compostos por um sistema de representação política que
privilegiava o voto interiorano e rural, pela introdução de eleições indiretas para o
preenchimento dos cargos majoritários, pelo sistema bipartidário, pelo controle da União
na área de segurança e pela reforma tributária. A essas medidas acrescentava-se, ainda, o
crescimento da presença direta do governo federal no âmbito regional (Sallum Jr, 1996:
32-38).
Além das agências regionais dos órgãos federais atuarem com mais recursos em
áreas que eram tradicionalmente de competência de estados e até de municípios, a
União pautava a atuação dos governos estaduais através de convênio entre os
distintos âmbitos da administração, transferindo-lhes verbas e fornecendo-lhes
assistência técnica. Assim programas estaduais de educação, por exemplo,
desenvolviam-se sob orientação e sob controle federais, mediante convenio entre a
secretaria do estado, o ministério da Educação, a secretaria estadual do
Planejamento e a Secretaria para a Articulação com Estados e Municípios do
Ministério do Planejamento. Isso valia, também para as agência descentralizadas
de cada estado, o que tendia a redirecionar seus vínculos de subordinação de fato
para as agências federais correspondentes, enfraquecendo ainda mais os governos
estaduais (Sallum Jr., 1996:41. grifo meu)
Para a concepção do federalismo de integração, o município era uma instância articulada e
subordinada ao poder estadual. Todo um sistema político de filtragem das divergências foi
construído no período subordinando-os à direção do poder estadual (Sallum JR., 1996). Os
mecanismos de financiamento da educação pública com recursos de contribuições e de
outras receitas utilizadas pela União favoreciam a implementação nos sistemas estaduais de
programas e projetos elaborados centralmente, valendo-se para tanto da sistemática de
convênios. Esta concepção centralizadora e tecnocrática do federalismo brasileiro, onde o
insulamento burocrático consistia no arranjo institucional apropriado à tomada de decisões,
Duarte, MRT
Página 45
não deteve as formas tradicionais de fazer política. O acesso privilegiado das elites locais,
de acordo com as circunstâncias da balança de poder, em detrimento de uma dinâmica
promotora da cidadania, expressou-se também pela sistemática de convênios no âmbito
educacional, dentre outros, onde cada instância governamental buscava reforçar relações
de dependência e subordinação com os demais entes da federação.
A ruptura tem um marco importante nas eleições municipais de 1974. Nestas o MDB –
Movimento Democrático Brasileiro venceu em 79 das 90 cidades com mais de 100.000
habitantes10. Revelaram-se, pela primeira vez, alternativas à integração construída pelos
governos autoritários e iniciam-se debates sobre a capacidade política e econômica de
administrar em oposição ao governo federal. Interesses e demandas do poder local
emergem no cenário nacional. Ao assumir governos municipais como partido de oposição,
o MDB descortina a viabilidade de uma estratégia política de esgarçamento do bloco no
poder.
O “pacote de abril11”, aprovado em 1977, permitiu a manipulação dos resultados eleitorais
de 1978, mas em 1982 tem-se a vitória da oposição nos principais estados do país (Franco
Montoro, em São Paulo; Pedro Simon, no Rio Grade do Sul; Tancredo Neves, em Minas
Gerais. Abrucio, 1999: 170-172). Estes eventos políticos impulsionaram debates sobre a
dependência dos governos estaduais e das principais cidades do país frente ao governo
federal.
10
Durante o regime autoritário, os municípios das capitais e outros considerados de segurança nacional
(aproximadamente 200) tinham seus prefeitos escolhidos pelas Assembléias Legislativas. A eleição direta
para prefeito destes municípios passa a ocorrer a partir de 1985.
11
A vitória do MDB nas eleições anteriores comprometia a agenda de abertura política lenta e gradual do
Governo Geisel. A Emenda Constitucional nº 08/77, alterou a legislação eleitoral vigente no país. As eleições
para governadores estaduais voltam a ser indiretas, 1/3 das cadeiras do Senado passaram a ser ocupadas por
parlamentares eleitos por voto indireto das assembléias estaduais (os chamados senadores biônicos), o
mandado do presidente foi alterado de 5 para 6 anos e as decisões do Congresso passaram a ser tomadas por
maioria simples.
Duarte, MRT
Página 46
A aprovação da Emenda Constitucional nº 24/83, designada como Emenda Calmon, e sua
posterior regulamentação pela Lei nº 7348/85, se fez no bojo deste processo. Ao elevar os
percentuais mínimos destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, em um
contexto de crescimento do percentual de participação dos estados e municípios no total
dos recursos públicos, a Emenda Calmon reafirmava princípios de organização dos
sistemas públicos de Educação Básica capazes de questionar os mecanismos de integração
dos entes federados. Em tese, a aprovação da Lei n.º 9348/85 comprometia a União com
maior dispêndio na função educação (Melchior, 1987:121), visto impedir o cômputo nos
gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino, dentre outros, aqueles provenientes
de recursos não oriundos de impostos. Os resultados da Emenda Calmon implicaram em
aumento de recursos para o ensino, especialmente no âmbito federal e no estabelecimento
de uma base de recursos menos sensível à conjuntura econômica (Gomes, 1988: 237-259).
Com a Nova República e a Constituição Federal de 1988, o tema da descentralização,
especialmente em relação aos aspectos fiscais, emerge no cenário político. O crescimento
da participação dos estados e municípios na receita de impostos, a partir da segunda
metade da década de oitenta, não tem contrapartida direta de encargos e responsabilidades.
A descentralização não nasceu de uma ação de política fiscal ou econômica, mas sim de
uma reação dos governos subnacionais, ou em favor destes, contra os poderes ditos
excessivos do centro (Afonso, 1995:10).
A vinculação de percentual da receita e a sistemática operacional estabelecida na Lei n.º
7348/85 não comprometiam estados e municípios das capitais com maior aporte de
recursos. A sistemática aprovada centrava-se no aporte de recursos da União, –
considerando em especial a necessidade de financiar o sistema federal de educação
superior –, e no maior comprometimento de receitas municipais com a manutenção da
educação básica (Melchior, 1987: 122). Esta legislação foi aprovada num contexto de forte
influencia política do conjunto dos governadores de estado demonstrando sua retomada da
capacidade de iniciativa política frente à União (Kugelmas & Sola, 2000: 68).
Impulsionada, por reivindicações e lutas travadas na sociedade civil por mais verbas para a
educação, a Emenda Calmon e sua sistemática operacional inserem-se em um conjunto de
iniciativas do período de redemocratização capazes de minar a concepção de federalismo
Duarte, MRT
Página 47
forjada pelos governos autoritários. Ao atribuir à União um percentual de gastos com
educação a aprovação da Emenda Calmon reafirmava para os demais entes federados a
possibilidade de obtenção de ganhos com a transferência/repartição dos recursos
tributários.
Para diferentes autores, neste período a questão da governabilidade foi posta em questão,
em razão dos encargos constitucionalmente estabelecidos sem uma definição precisa das
responsabilidades a serem compartilhadas e recursos necessários. O descompasso entre a
quantidade de demandas e a capacidade governamental de processá-las conteria um
potencial desestabilizador da dinâmica democrática. Para com a educação básica a
determinação constitucional de aplicação de recursos na erradicação do analfabetismo (art.
60 do ADCT) foi sistematicamente desobedecida por diferentes governos até sua
modificação
pela
Emenda
Constitucional
n.º
14/96.
Municípios
brasileiros
desconsideravam responsabilidades de oferta na educação básica e fomentaram o
financiamento dos níveis superiores da educação escolar, instituíram programas de garantia
de renda vinculada a educação, diversificando, desse modo, ações e prioridades no campo
educacional.
A aprovação da Emenda Constitucional no. 14/96 e da LDB, no Governo Fernando
Henrique Cardoso, contêm a explicitação dos novos rumos da política educacional
brasileira (Vieira, 1998: 7), onde se expressam as diretrizes de uma Reforma do Estado que
pretende superar a herança Vargas. Neste novo contexto, as relações intergovernamentais
estão em (re)construção no país, envolvendo simultaneamente descentralização e
recentralização.
2.2.4 Relações predatórias e recentralização política pela União
As relações intergovernamentais, após o final do regime autoritário, foram marcadas por
um padrão de competição não cooperativo. As relações dos estados com a União e deles
entre si caracterizam-se pelo fortalecimento dos governos estaduais frente à União e pelo
comportamento individualista e atomizado dos governadores. A aprovação do programa de
estabilização monetária – o Plano Real - produziu alterações significativas na
administração dos recursos financeiros estaduais, possibilitando à União iniciativas
Duarte, MRT
Página 48
políticas no sentido do enquadramento fiscal e reforma administrativa dos governos
estaduais (Abrucio, 1999: 173).
A descentralização estabelecida pela Constituição Federal de 1988, por sua vez, elevou a
participação relativa dos municípios no bolo tributário (Negri, 1997). No entanto, a
multiplicação do número de municípios, ocorrida especialmente na primeira metade da
década de 90, contribuiu para aumentar a dependência por recursos financeiros de outras
esferas de governo, minimizando os ganhos financeiros obtidos. As medidas de
recentralização tributária, implementadas desde a criação do Fundo Social de Emergências
em 1993, associadas à expansão da prestação de serviços sociais repercutiram sobre a
capacidade de financiamento dos municípios.
A agenda eleitoral introduziu um terceiro fator na redefinição das relações
intergovernamentais. As eleições presidenciais de 1994 ocorreram concomitantemente ao
pleito estadual e à disputa para o Congresso Nacional. Nessa eleição casada em quatro
importantes estados da federação, foram eleitos governadores fiéis à coalizão encabeçada
por Fernando Henrique Cardoso. Para o campo educacional destaca-se neste quadro, a
eleição de Eduardo Azeredo em Minas Gerais12, que possibilitou consolidar medidas de
um programa de reformas na Educação Básica, posteriormente difundidas em todo o país.
Ações implementadas pelo MEC como, a realização de exames únicos nacionais de
verificação do desempenho dos alunos e conseqüentemente das escolas têm sido
acompanhadas por um intenso programa de divulgação e implementação dos parâmetros
12
A Secretaria de Educação de Minas Gerais desenvolveu uma metodologia que estabelece uma relação entre
o montante mínimo de recursos que estado e município devem aplicar em educação e a correspondente
capacidade de atendimento gerada a partir destes recursos. Com isto, foi possível identificar municípios que
tinham uma capacidade maior de atendimento do que a que vinham oferecendo, enquanto, em outros
municípios, a situação era inversa, ou seja, municípios que estavam com um atendimento superior à sua
capacidade financeira (Amaral Sobrinho, 1994: 59). Em 1993 o governo de Minas Gerais firma acordo com o
Banco Interamericano (BIRD) para financiamento do ensino fundamental da rede pública estadual.
Denominado de PROQUALIDADE, o acordo continha um vasto programas de intervenções políticopedagógicas e administrativas de reforma dos sistemas públicos de educação básica no país (ver a respeito:
Oliveira, 1999 e Oliveira, 2000: 282-306)
Duarte, MRT
Página 49
curriculares nacionais. Estes, como também o conteúdo dos exames nacionais de
desempenho, contêm uma proposta político-educativa de governo, que se pretende
nacional. Efetua-se, desse modo, medidas de implementação de uma estratégia de indução
para recentralização e maior uniformização dos processos educativos.
É importante constatar que a nova LDB se afasta (em parte) desse equacionamento
da educação básica conectado com o preparo da criança e do jovem para o futuro,
para a vida adulta, para dar conta das demandas da sociedade. conexões ainda tão
repetidas nos PCN. A nova LDB define repetidamente e com clareza que a
educação básica encontra seu sentido e finalidade em colaborar com o pleno
desenvolvimento dos educandos, desde que conectada com o conjunto de processos
formadores que acontecem na família, no trabalho, nos movimentos sociais. Nesta
direção se debateram as reflexões e publicações de matrizes pedagógicas
sintonizadas com os movimentos sociais, com o trabalho, com a formação do
trabalhador. Podemos dizer que a LDB está mais marcada por essas matrizes
teórico-pedagógicas do que os PCN. Está mais próxima dos avanços havidos nas
últimas décadas na redefinição do papel social da educação básica como direito da
infância, adolescência e juventude ao pleno desenvolvimento humano. Uma
concepção mais desinteressada da educação básica. Os PCN voltam para uma
visão mais utilitária, aprender para, ainda que seja para aprender a ser
consciente, participativo, ou empregável (Arroyo, 2000)
Neste momento, não se pretende discutir o caráter mais ou menos utilitário dos PCN. O
texto citado constituiu uma importância referência das disputas que se travam em torno dos
instrumentos capazes de intervir na reconfiguração dos sistemas públicos de EB.
Estabelecido o princípio normativo legal das finalidades previstas para a educação básica, a
elaboração operacional desses princípios constitui um campo de disputa técnico-política.
Os programas de incentivo ao uso dos parâmetros curriculares vêm acompanhados da
transferência voluntária de recursos. Esta sistemática contrapõe-se à autonomia na
elaboração de propostas pedagógicas diferenciadas pelos governos municipais, pois ela
associa o repasse de recursos à realização de programas federais.
Arretche (2000) demonstra que estratégias de indução eficientemente desenhadas e
implementadas são capazes de promover um “design” institucional específico das políticas
e programas sociais, apesar da diferença de fatores estruturais (capacidade fiscal,
dimensões da população a ser atendida, etc.) presente entre os governos subnacionais e/ou
locais. Mas, se a capacidade de decidir dos sistemas municipais de ensino pode ser aferida
pela elaboração de sua proposta político pedagógica, a capacidade de implementar novos
Duarte, MRT
Página 50
projetos educativos acha-se relacionada, também, a sua capacidade de atendimento e ao
estabelecimento de relações intergovernamentais cooperativas.
Na última década, pesquisas têm demonstrado a tendência constante de aumento das
despesas com educação nos estados e municípios das capitais (Afonso, 1995; Souza &
Carvalho, 1999:46). Esta correlação entre aumento de despesas e elaboração de propostas
político-pedagógicas constitui um indicador importante de descentralização com
deslocamento da capacidade de implementar políticas por governos locais (Almeida 1995:
90). Mas o “design” de programas específicos desenvolvidos pela União, promovem a
recentralização da coordenação na formulação de políticas educativas no país.
No passado como no presente, diferentes esferas do Poder Públicas têm sido marcadas por
ações que, na prática, negam o regime de colaboração (Vieira, 1998: 14). Os debates
travados a este respeito centravam-se na partilha de responsabilidades para com o
financiamento e gestão das unidades escolares, onde concepções diferenciadas de sistema
de ensino fundamentavam as posições em disputa. Levantamento realizado sobre os
programas educacionais dos municípios das capitais revela, nos últimos anos, uma
dinâmica de apropriação/ressignificação de programas e propostas desenvolvidas pelo
poder central.
QUADRO 1 – ANEXO I
Nos 25 sites sobre educação escolar básica das prefeituras de capitais pesquisados,
propostas e ações relacionadas com os programas nacionais de alimentação escolar,
bibliotecas na escola, livro didático e saúde do escolar foram mencionadas (ver destaques
em negrito). Páginas web de quatro capitais trazem informações sobre a sistematização de
projetos político-pedagógicos próprios (Escola Plural, Belo Horizonted/MG; Escola
Cidadã, Porto Alegre/RS; Ação 2000 – Projeto Escola Nova, Fortaleza,/CE; Educação
Século. XXI, Goiânia/GO). No entanto, também nestes projetos verifica-se a presença de
ações e propostas relacionadas com os programas nacionais para o Ensino Fundamental.
Duarte, MRT
Página 51
As medidas jurídicas aprovadas após 1996 transferiram claramente responsabilidades para
o nível local de governo, mas foram omissas quanto à autonomia e autoridade política das
esferas subnacionais. Esta lacuna tem sido preenchida pela União por meio de intensa
proposição de programas associados ao repasse de recursos mediante convênios. Esta
sistemática tem possibilitado homogeneizar a gestão educativa e administrativa nos
diferentes sistemas de ensino do país13.
A principal fonte adicional de financiamento da educação no país, com a finalidade
específica de complementar despesas com o ensino fundamental, é constituída dos recursos
arrecadados com o salário educação. A quota federal gerenciada pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE) é destinada a estados, municípios e organizações
não governamentais, que desenvolvam ações ou metas previstas nos programas nacionais.
Esta transferência voluntária ao associar assistência técnica (implementação de programas)
e financeira (repasse de verbas) da União, promove a capacidade de implementar novas
ações no âmbito local, sem favorecer o crescimento da capacidade de decidir sobre as
propostas oferecidas.
A pesquisa realizada nos sites de educação das prefeituras das capitais indica a forte
influência da União na definição de projetos e ações pelos governos locais. As
transferências voluntárias são atrativas por possibilitarem acréscimos de recursos a
governos e entidades. Mas sua importância estratégica é fundamental para a
implementação da chamada segunda geração de reformas do Estado, onde a ampliação da
capacidade administrativa e institucional é prioridade (Heredia & Schneider, apud Souza,
1999:188).
2.3 A sistemática de recentralização: convênios e subvinculação
13
Em 1956-57 Anísio Teixeira já defendia os convênios como o meio mais eficaz de cooperação do MEC
sem quebrar a autonomia estadual. Afinal, pelos convênios, o MEC se proporiaa a equipar escolas que
pudessem oferecer seis anos de escolaridade primária, aos governos estaduais que aceitassem tal proposta
(NUNES, 1994: 209). Para Anísio Teixeira o esforço (suprir as condições necessárias ao ensino) decorreria
do interesse local, enquanto que a inteligência da direção, do espírito de estudo (elaboração de projetos e
programas) derivam da assitência técnica promovida pela União e Estados (TEIXEIRA, 1958a:: 29).
Duarte, MRT
Página 52
Pesquisa efetuada em quatro municípios do Estado de Minas Gerais apresenta indicações
sobre o peso relativo do repasse de recursos entre União, Estado e Municípios, no campo
educacional. Os municípios selecionados diferem-se por sua capacidade de financiar a
expansão do atendimento na educação escolar básica.
Tabela 4 – Despesas com educação e receita de convênios em 04 municípios de Minas
Gerais – 1997 – em reais
Município
Despesas
Despesas
Receitas total de
declarada com
declarada com EF
convênios
EI(creches e préregular
declarada
escolas)
Convênios com a Convênios com Valor convênios
União
o Estado
declarados na
pesquisados
pesquisados função educação
CAA 1
1.377.000,00
1.422.204,64
842.385,00
842.385,00
n/d
n/d
CAA 2
422.159,89
2471579,09
712.271,64
286.180,03
125.533,85
149.771,15
CAE 1
210.005,42
680.674,86
1.888.448,64
1.731.449,24
156.999,40
n/d
CAE 2
67.707,30
420.212,52
85.761,69
14.690,00
148.866,12
46.109,00
Fonte: Demonstrativo da receita e despesa/Prefeituras Municipais
Em dois municípios pesquisados, a receita declarada obtida mediante convênios e aplicada
na área de educação corresponde respectivamente a 35,5% e 68,1% do total de despesas
efetuadas com educação infantil14.
Eles apresentam indicações significativas sobre o
escopo destas operações. A literatura relativa às fontes de receita do setor público tem
destacado o crescimento das contribuições sociais (Abrucio, 1996, Negri, 1996) – no
campo educacional o salário educação – e a adoção de medidas que reduzem a participação
dos recursos tributários – fonte de transferências obrigatórias e dos percentuais mínimos
para educação.
Mesmo nos municípios mais ricos, com capacidade ampliada de atendimento (CAA), o
total de recursos arrecadados mediante convênios apresenta valores consideráveis. Os
14
O levantamento efetuado dos convênios fundamentou-se na documentação apresentada pela Prefeitura
Municipal. As planilhas “Demonstrativo da receita arrecadada e despesa realizada” são encaminhadas ao
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Foram pesquisados, ainda, os valores informados pela
Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda e da Secretaria Estadual de Fazenda do estado de
Minas Gerais
Duarte, MRT
Página 53
dados discriminam os recursos obtidos junto à União e ao governo estadual. Verifica-se, ao
comparar os valores obtidos nas cidades pesquisadas, o reduzido peso de critérios de
repasse relacionados ao tamanho da população ou mesmo a capacidade de atendimento do
sistema local.
Foram pesquisados, também, dois municípios com Capacidade de Atendimento Esgotada
(CAE). CAE 1 e CAE 2 apresentaram população de aproximadamente 34. 000 e 10.200 em
1996 e têm as despesas públicas financiadas basicamente pelas transferências do FPM,
58,8% e 72,5% do total da receita corrente. Municípios pobres e de pequeno porte são
representativos da grande maioria dos municípios mineiros. Apresentaram em 1996, receita
líquida per capita de R$ 130,87 e R$167,89, índice revelador de reduzida disponibilidade
para investimento público.
CAA1 e CAA2 são municípios com aproximadamente 250.000 e 100.000 habitantes
respectivamente. Apresentaram no ano anterior – 1996 - receita liquida per capita de
R$614,00 e R$ 367,00. Índices indicativos de boa disponibilidade de investimento público
por habitante em comparação com os demais municípios do estado de Minas Gerais. As
maiores parcela dos recursos municipais provem das transferências da cota parte do ICMS,
o que revela serem municípios com grande dinamismo econômico (FJP, 1999). Mesmo
para os dois municípios com Capacidade de Atendimento Ampliada (CAA) a presença de
recursos mediante convênios traduz em aporte financeiro expressivo.
TABELA 5
Convênios firmados entre o Ministério da Educação e Cultura (MEC) e dois
municípios do estado de Minas Gerais
Duarte, MRT
Ano de
início do
convênio
2000
1999
Página 54
Município CAA 2
objeto de convênio
Município CAE 1
concedente
valor do
convênio
material didático pedagógico
PDDE - manutenção de escola de
ed. especial
Equipamentos para escolas
municipais
Total anual
FNDE
R$3.964,74
FNDE
R$3.800,00
FNDE
R$6.100,00
R$13.864,74
formação professores
FNDE
R$6.000,00
programa saúde do escolar
PDDE - manutenção de escola de
ed. especial
FNDE
R$3.210,00
FNDE
R$3.800,00
Total anual
R$13.010,00
objeto de convênio
PDDE - manutenção de escola
de ed. especial
Reformar e equipar escola
Agrotécnica Federal*
Bolsa de estudos - Ensino
superior
Total anual
Reforma de prédios - Escola
técnica
Material pedagógico escola ed.
especial
PDDE - manutenção de escola
de ed. especial
Bolsa de estudos - docente 1º e
2º graus do SFE
Construção de prédio - Escola
técnica
Total anual
concedente valor do convênio
FNDE
R$3.200,00
SEMT/MEC
R$180.463,07
CAPES
R$11.593,42
R$195.256,49
SEMT/MEC
R$70.000,00
FNDE
R$7.233,00
FNDE
R$2.400,00
CAPES
SEMT/MEC
R$46.680,00
R$180.000,00
R$306.313,00
Fonte: SFCI/MF.
A relação de convênios firmados entre1999 e 2000 de dois municípios pesquisados (TAB
5) demonstra a presença dos mesmos programas estabelecidos pelo MEC na região sul
(CAA 2) do estado com características socioeconômicas completamente distintas do Vale
do Jequitinhonha (CAE 1). Estes municípios apresentam profundas diferenças nas
condições financeiras políticas e administrativas. No entanto, a transferência voluntária de
recursos mediante convênios constitui uma estratégia de indução eficiente para a adoção de
programas e projetos definidos centralmente. Os demonstrativos de receita, despesa,
folhetos e jornais locais atestam a presença dos programas nacionais de alimentação,
saúde, informática, etc., incorporados como diretrizes políticas locais das administrações
municipais. Os municípios passam a elaborar formalmente justificativas que nem sempre
contemplam as suas reais necessidades, ou seja, prioriza-se o que deve ser priorizado para
receber os recursos do MEC (Rosar & Souza, 1999:95).
É essa busca de homogeneização, de estabelecimento de modelo único para
o país, malgrado a defesa da tese da descentralização progressiva e da
autonomia paulatina, que vem caracterizando também a ações do
MEC/FNDE, para o repasse de recursos da quota federal do salárioeducação às escolas (Weber, 1998:11).
A literatura sobre a reforma educacional empreendida após a EC nº 14/96 têm destacado o
papel indutor do FUNDEF à municipalização do atendimento no ensino fundamental onde
predominava a oferta de vagas pelos estados subnacionais. Municipalização dos encargos
pode convidar à busca de maior autonomia na formulação de políticas locais de educação
básica. No entanto, a precariedade de recursos financeiros, materiais e humanos dirige
Duarte, MRT
Página 55
ações para a captação dos recursos disponíveis junto ao FNDE. Desde modo, a sistemática
de convênios possibilita recentralizar a formulação de diretrizes nacionais e assegurar sua
implementação nos municípios conveniados.
2.4
Gestão
democrática
dos
sistemas
de
ensino
e
relações
intergovernamentais cooperativas
O fortalecimento de marcos democráticos mais substantivos de descentralização em nível
local acha-se condicionado pelo grau de congruência entre capacidade real de
decidir/implementar do poder público local em cooperação com as demais instâncias de
governo. Mas marcos democráticos substantivos de descentralização requerem também:
¾ relações entre os governos e os cidadãos, potenciando formas de controle público
sobre as ações desenvolvidas;
¾ redução da dependência dos governos locais em relação à adoção de programas e
projetos elaborados pelo governo central pela via da capacitação técnico
administrativa;
¾ diversificação de formas de atendimento e operação dos serviços educacionais por
introdução de procedimentos capazes de assegurar acesso as informações
necessárias à tomada de decisão.
A efetivação destas condições para a grande maioria dos municípios brasileiros envolve
investimentos significativos nos procedimentos de gestão político-administrativa, como
também mudanças culturais expressivas. Capacidade técnica e política de negociar
convênios e parcerias e de formular diretrizes políticas atentas à realidade local sustentam
maior autonomia em contraposição a mera implementação de programas formulados
centralmente. Negociação de projetos com autonomia, por sua vez, demandam relações
entre agentes políticos e os cidadãos potenciando formas mais efetivas de controle público
das ações desenvolvidas.
Os procedimentos de assistência técnica e financeira formulados nos últimos anos pelo
FNDE estabelecem a forma do regime de colaboração e a sistemática de ação supletiva da
União. No entanto, a celebração de convênios possibilita a União reiterar uma relação de
subordinação político administrativa dos governos locais.
Para 2001 as normas para
Duarte, MRT
Página 56
assistência financeira mantêm a associação entre programas e ações a serem
disponibilizados recursos, como também limitam a celebração de convênios para
municípios de médio porte. Estes, por sua vez, terão os projetos examinados se elaborarem
propostas consorciadas com cidades circunvizinhas15.
A mudança anual das regras costuma induzir a formação de grupos interessados na
elaboração e intermediação de projetos. Municípios onde predomina um quadro de pessoal
do magistério com baixa qualificação provavelmente encontrarão maiores dificuldades
para elaborar programas e ações que possam atender suas reais necessidades. A contratação
de serviços especializados de terceiros, por sua vez, reforçaria o círculo vicioso, que
impede a superação da baixa qualificação inicial pela formação em serviço. Desse modo, a
normas estabelecidas para a assistência financeira da União dificultam a participação da
comunidade local (os profissionais de magistério pelo menos) na elaboração dos
programas e ações induzindo a execução das prioridades de política educacional fixadas
centralmente.
O aporte de recursos efetuado pelo FNDE operacionalizou um programa exitoso de
desconcentração da implementação de programas definidos centralmente. A engenharia
operacional desses programas, em que pese o reduzido atendimento efetivamente prestado
(Azevedo, 2002) sinaliza qual a estratégia de indução para a implantação local de
programas definidos centralmente. Especialmente, nos últimos anos, o número de
programas e ações financiadas pelo FNDE sofreu forte diversificação16. A ação supletiva
do MEC, pela via dos programas e projetos de assistência técnica e financeira, abrange
áreas relacionadas à assistência social (merenda escolar, paz na escola, saúde do escolar),
com a melhoria da infra estrutura da escola (biblioteca da escola, transporte escolar,
dinheiro direto na escola) e, ainda, de apoio a diferentes modalidades de educação básica
(EJA, áreas remanescentes de quilombos, educação indígena).
15
Ver: FNDE, resolução nº 13 de 26/04/2001
16
Pesquisa efetuada no site www.fnde.gov.br. em novembro de 2002 registrou um total de 12 projetos e
programas educacionais passíveis de financiamento pelos municípios
Duarte, MRT
Página 57
Ao associar programas formulados centralmente com sua implementação desconcentrada
esta sistemática proporciona a deliberação central sobre as prioridades de políticas sociais e
educacionais. Dessa modo, a formulação de programas e sua implementação atendem à
compatibilização de funções aparentemente contraditórias.
Nos programas promovidos pelo FNDE, até 2002, verificamos que assistência social
(saúde, alimentação, combate à violência) e qualificação escolar (alfabetização, letramento,
etc) eram áreas contempladas com o objetivo de direcionar recursos para regiões e/ou
setores onde se previa a necessidade de maior/menor combate à pobreza e/ou promoção de
empregabilidade. Os programas educacionais e assistenciais focavam regiões onde a
prioridade estava no atendimento assistencial em locais onde o Estado se fez ausente pela
insuficiência fiscal ou patrimonialismo dos governos locais e ao mesmo tempo, se faz
presente pela “assistência” aos necessitados.
Duarte, MRT
3.
REGIME
Página 58
DE
COLABORAÇÃO
ENTRE
OS
ENTES
FEDERADOS:
CONDIÇÕES PARA O ATENDIMENTO NOS SISTEMAS PÚBLICOS DE
EDUCAÇÃO BÁSICA.
Ter por horizonte ganhos de maior eficiência e eficácia na prestação de serviços
educacionais constitui objetivo pragmático para o qual podemos concorrer, se
conseguíssemos acordar quanto às finalidades, meios e resultados educacionais
pretendidos. Mas a elevação dos padrões de eficácia e eficiência requer, sobretudo no
campo da gestão dos sistemas públicos, ampliar os recursos financeiros disponíveis e
potencializar o uso de toda uma infraestrutura de bens e serviços dispersa de forma
desigual no território. Advogar a favor da otimização do uso de recursos públicos, em
contexto de retração da esfera pública não mercantil requer, na perspectiva deste estudo,
combinar a avaliação das diretrizes de focalização e de aporte de novos recursos com a
análise dos mecanismos de efetivação do regime de colaboração (art. 211, CF).
A centralidade posta na obtenção de ganhos de eficiência e eficácia na prestação de
serviços públicos, incluídos os educacionais, decorre, em última instância, da incapacidade
do Estado em sustentar o ritmo de expansão de seus serviços (Martins, 2001) mas, a
permanência e difusão dessas noções como valores na sociedade civil fundamenta-se em
experiências de exercício da cidadania onde há convivência com múltiplas formas de
desigualdade e privatização no uso e apropriação dos recursos estatais. Para além do
convite à participação na busca de soluções para situações-problema, a questão da
administração eficaz1 e eficiente das escolas e/ou dos sistemas de ensino envolve
princípios e normas de gestão pública capazes de assegurar a institucionalidade de uma
esfera pública não mercantil.
1
No início da década de 90, Mello (1994) divulga esta noção no Brasil na perspectiva dos estudos relativos à
administração local das escolas (Local Management of School). O estudo de Levacic, 1998 analise as
conseqüências dessas diretrizes para o sistema educativo inglês. Neste estudo, aproximamos à noção de
eficácia, referida em muitos trabalhos apenas como resultados obtidos, à noção de efetividade, enquanto
mudanças produzidas na ordem social e política. Ou seja, procuramos destacar que ganhos de eficiência e
eficácia contribuem para alterações na qualidade dos serviços prestados, desde que observados princípios de
intervenção reguladora, que assegurem medidas de políticas públicas redistributivas e focalizadas.
Duarte, MRT
Página 59
A efetivação do direito à educação escolar básica, seja por razões políticas seja por razões
ligadas ao indivíduo (Cury, 2002: 245-262) se fez com a intervenção do Estado na
prestação de um serviço, visando a resguardar cidadãos das externalidades postas pelo
mercado. No entanto, se destacamos a importância da institucionalidade necessária para a
efetivação de uma esfera pública não mercantil, consideramos que, para a educação escolar
básica, esta requer uma sistemática de financiamento capaz de promover maior autonomia
político-administrativa das unidades que constituem o sistema educacional, lado a lado
com medidas de intervenção capazes de promover a redução das desigualdades intrasistêmicas.
Esta referência de análise informa que o estudo efetuado considera que o ponto de chegada
– a reforma do sistema público de educação básica – se compôs e se compõe de medidas
político-administrativas capazes de produzir alterações complementares e superadoras da
institucionalidade existente2. Ou seja, as formas usuais de distribuição dos recursos
públicos vinculados a MDE requerem alterações capazes de enfrentar pontos que
obstaculizam a ampliação de parâmetros de igualdade na prestação dos serviços3.
Consideramos, desse modo, que a efetivação do direito à educação constituiu-se como um
atributo sistêmico, dependente da existência de um conjunto de instituições políticoeducacionais capazes de assegurar graus institucionais de igualdade sobre uma sociedade
civil desigual (ver: Bobbio, 1997 e 2000).
2
Santos, 1999 ao analisar a crise do reformismo destaca a importância da tarefa de refundação democrática
da administração pública e nesta o papel do terceiro setor. Seu horizonte político aponta para a criação de um
espaço público não estatal como resultante da imbricação progressiva, mas diferenciada, entre o Estado e o
chamado Terceiro Setor. Dentre os desafios para a consecução deste objetivo indaga sobre como
compatibilizar eficiência com eqüidade e democracia, descartando as proposições que defendem a
substituição do Estado pelo Terceiro Setor.
3
Questão semelhante foi formulada, anteriormente, por Velloso (2001:11): i) como se distribuem as fontes de
recursos públicos e a captação de verbas para a educação e como tal distribuição se afigura diante de
perspectivas da equidade? ii) quais são os principais óbices a uma captação de recursos mais eficiente para
a educação e qual é a sua origem?
Duarte, MRT
Página 60
3.1 De verbas públicas para escolas publicas ao regime de colaboração entre os
sistemas de ensino
A otimização dos recursos disponíveis para MDE era um valor presente nos estudos
inaugurais sobre financiamento da educação e nos primeiros debates travados no contexto
de elaboração da Lei de Diretrizes e Bases – primeira metade da década de noventa. Temas
como, recursos disponíveis por ente federado, receita vinculada a MDE, atribuição
diferenciada de responsabilidades para a oferta do ensino, mecanismos de subvenção ao
setor privado e adequação de despesas relacionadas a MDE, constituíram centros da
disputa no período, porém com importância e prioridades diferenciadas. No Brasil as lutas
travadas em torno da redução da pobreza nas décadas de 60 e 70 e o papel dirigente do
Estado na condução da industrialização e urbanização do país refletiram nos estudos sobre
financiamento, que procuravam demonstrar, além da existência de recursos malversados,
sua insuficiência e subordinação aos investimentos produtivos.
Os estudos relacionados ao “estado da arte” da produção intelectual na área de
financiamento da educação básica apresentam um grande número de temas e tópicos mais
específicos considerados pela literatura a respeito, especialmente após a década de noventa.
A fronteira dos estudos sobre financiamento da educação strictu sensu tem-se extravasado
nos últimos anos para situar-se no campo de estudos de política educacional (Velloso,
1998). Este movimento é impulsionado, por um lado, pelas repercussões da sistemática
operacional que visa efetivar princípios e valores e, por outro lado, por exigências de
compatiblização dialética do direito à igualdade e do direito à diferença (Cury, 2002) em
um sistema educacional desigual.
Por estas razões as pesquisas e reflexões na área do financiamento da educação tendem, na
atualidade, a se construírem em diálogo com os principais debates travados no campo da
política e administração da educação escolar no Brasil. Ao longo da década de noventa,
destacamos pelo menos, quatro grandes eixos temáticos que influenciaram as reflexões
contidas neste estudo4:
4
A ANPAE (1999) arrola 11 categorias de estudos e pesquisas para o campo da Política e administração da
Educação. 1.Escola, Instituições Educativas e Sociedade; 2.Direito à Educação e Legislação; 3.Políticas de
Duarte, MRT
Página 61
a) questões jurídico-políticas relativas à interpretação e análise das disposições legais após
a aprovação da EC nº 14 e LDBEN nº 9394 em 1996. Nesta área destacamos a coletânea
organizada por Fávero (1996) e os trabalhos de Cury, 1997; Abreu, 1999; Farenzena, 2001,
como referenciais das análises efetuadas sobre o contexto político e a ação de diferentes
atores sociais no processo legislativo.. Os estudos destacados caracterizam-se por explicitar
as diferentes posições em disputa nos momentos de elaboração do texto constitucional e da
atual Lei de Diretrizes e Bases, expondo como a redação no processo legislativo expressa
síntese de posições entre diferentes atores.
b) questões referentes à efetivação do princípio constitucional de gestão democrática do
ensino público. O termo é utilizado como denominador comum para diversas subáreas de
pesquisa, que envolvem temas como: estratégias de participação e gestão escolar;
articulação das escolas com a comunidade; procedimentos de avaliação escolar e
organização curricular, etc. Estudos e pesquisas tão diferenciados têm por pano de fundo a
noção polissêmica de autonomia administrativa e financeira da escola - utilizada de forma
imprecisa em grande parte dos trabalhos ou restrita à idéia de motivação dos atores para a
resolução de situações-problema – onde o acesso diferenciado a recursos financeiros
públicos ou privado constitui um dos pré-requisitos. A vasta bibliografia disponível tem
por interlocução o campo dos estudos internacionais relativos ao New Public
Management5. Destacamos, nesta área, por sua repercussão entre os profissionais de
educação e por condensarem perspectivas teóricas diferenciadas, o material didático
produzido pelos programas de formação à distância e em serviço do Estado de Minas
Gerais
(PROCAd),
do
Conselho
Nacional
de
Secretário
de
Educação
(PROGESTÃO/CONSEd) e, do Ministério da Educação (FUNDESCOLA). Estes estudos
sintetizam, pressupostos e temas de análise os mais diversos. Quanto à autonomia da
escola, observamos, ainda, os estudos sobre unidades escolares que adotam perspectivas de
Educação; 4.Público e Privado na Educação; 5. Financiamento da Educação; 6. Muncipalização e Gestão
Municipal; 7.Planejamento e Avaliação Educacionais; 8 Profissionais de Educação 9. Gestão de Sistemas
Educacionais; 10 Gestão da Universidade e 11.Gestão da Escola. Optamos por destacar eixos de discussão
presentes em uma ou mais das categorias assinaladas, de modo a destacar as aproximações efetuadas entre
diferentes obras que contribuíram na construção dos referenciais teóricos deste estudo.
5
Ver a respeito: Barzelay, 2000
Duarte, MRT
Página 62
gestão gerencial (Parente & Lück, 1999) e a coletânea organizada por Oliveira (1997), por
sua análise e crítica aos pressupostos do gerencialismo, em especial no estado de Minas
Gerais.
c)
questões
referentes
às
determinações
presentes
entre
reestruturação
econômica/globalização, políticas públicas e os agentes sociais. Neste grande eixo de
debates encontram-se análises sobre as externalidades e abrangência das reformas
educacionais em curso no país. Duas linhas interpretativas acham-se presentes. Por um
lado, estudos com posições diferenciadas, que focam a crise fiscal do Estado na ampliação
dos serviços que efetivam direitos sociais em um contexto de complexificação dos
interesses e ações presentes na sociedade civil. Por outro lado, estudos que privilegiam
efeitos da introjeção na esfera pública dos valores e procedimentos inerentes á lógica
capitalista e/ou a racionalidade político administrativa que preside os organismos
internacionais. Expressivos desta segunda linha interpretativa os artigos das coletâneas: “O
Banco Mundial e as políticas educacionais” (Tommasi, et al. 1996), Escola e trabalho:
políticas de administração dos sistemas de ensino (Duarte & Oliveira, 1999), o livro
Educação básica: gestão: gestão do Trabalho e da pobreza (Oliveira, 2000), como também
os diversos trabalhos sobre a influência do Banco Mundial na elaboração das diretrizes
nacionais de política educacional Com foco na crise fiscal do Estado brasileiro e suas
repercussões para a reforma educacional no Brasil situam-se os estudos produzidos pelo
Instituto de Pesquisas Aplicadas do Ministério do Planejamento (IPEA), o trabalho de
Arrechte (2000), como também os diferentes trabalhos que abordam, mais especificamente,
o estudo de gastos dos entes federados com políticas sociais. Destacamos, também, a
coletânea organizada por Gomes & Amaral Sobrinho (1992) pela sistematização pioneira
das diretrizes políticas que iriam fundamentar as medidas reformistas no decorrer da
década de 90;
d) questões relativas ao financiamento público e atribuição de responsabilidades para com
as diferentes etapas e modalidades da educação básica. Nesta área tem-se destacado
estudos relativos à municipalização do ensino fundamental (Oliveira et al. 1999; Azanha,
1995) e os impactos da implantação do FUNDEF. Teses e dissertações defendidas no
programa de pós-graduação da USP (Pinto, 2000; Bassi, 2001), os estudos produzidos com
o apoio da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) sobre os
Duarte, MRT
Página 63
efeitos do FUNDEF (Monlevade & Ferreira) como também, os estudos de Davies (2001),
relacionados com a sistemática de implantação do FUNDEF no Brasil, abordam este
campo temático tendo como principal referencial interpretativo a categoria de
municipalização.
Os debates desenvolvidos em torno dessas questões contribuíram para a problematização
sobre o regime de colaboração entre os entes federados. Como eixo da interpretação
efetuada, consideramos o caráter estruturante da sistemática de financiamento. O desafio
analítico a ser enfrentado relaciona-se com a avaliação dos efeitos gerados por variáveis
institucionais de formatação das medidas de financiamento. Como a reforma educacional
liderada pela União no período de 1996-2002, alterou o design dos sistemas públicos de
educação no país a partir da segunda metade da década de noventa.
3.2 Da atribuição de responsabilidades ao exercício da função supletiva e
redistributiva
Meses antes da aprovação da LDBEN em dezembro de 1996, a Emenda Constitucional nº
14 havia modificado o artigo 211 da CF de 1988, fixando para a União em matéria
educacional o exercício de função supletiva e redistributiva. No período, os debates
travados em torno do Projeto de Emenda Constitucional concentraram-se nas possíveis
alterações a serem impostas à sistemática de financiamento do ensino superior e nas
modificações introduzidas no art. 60 do ADCT. Mas a emenda incorporava ao texto
constitucional atribuições e mecanismos para o exercício da ação supletiva e redistributiva,
que estavam propostos desde as discussões iniciais da LDBEN.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos
Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e
exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva,
de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e
padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica
e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (art.
3º,EC 14/96)
Com os novos dispositivos, o texto constitucional desobrigava a União da aplicação de
recursos em programas de combate ao analfabetismo, fixava o mecanismo pelo qual darse-ia o exercício de sua função redistributiva – um fundo contábil – e vinculava a
assistência técnica e financeira à função supletiva (ABREU: 1999:42-45). Desse modo, a
Duarte, MRT
Página 64
reforma do texto constitucional incorporava princípios para a atuação da União na EB, cuja
importância relativa foi, posteriormente, elucidada com a aprovação da Lei de Diretrizes e
Bases. Eximindo o governo federal jurídica e politicamente da oferta direta de educação
escolar e responsabilizando estados e municípios para com o atendimento da educação
básica, a LDBEN de 1996 determinou, no entanto, a promoção de ações para correção de
disparidades de acesso e garantia de um padrão mínimo de qualidade6.
Art. 75. A ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados
será exercida de modo a corrigir, progressivamente, as disparidades
de acesso e garantir o padrão mínimo de qualidade de ensino
(LDBEN).
Este dispositivo da Lei complementar da educação nacional ampliou a atribuição fixada
para a União no texto constitucional reformado, que limitava a assistência técnica e
financeira aos estados, distrito federal e municípios. O que é mais significativo, ainda, para
o crescimento deste papel, encontra-se na autorização dada pela LDBEN, para o exercício
pela União da função supletiva diretamente nas escolas(§ 3o., art. 75, LDBEN).
Nas diversas fases de elaboração da nova Constituição Federal, as propostas e deliberações
sobre o financiamento da educação foram marcadamente atravessadas pelo conflito em
torno da exclusividade ou não-exclusividade da destinação de recursos públicos às
instituições educacionais públicas (Farenzena, 2001: 350). O tema da municipalização do
ensino obrigatório, nesse período embora polêmico, revestiu-se como de natureza
secundária à destinação dos recursos e definição de fontes de financiamento da educação
pública.
A prioridade dada ao tratamento desta disputa em estudos relativos a educação no período
constitucional, subsumiu o desvelamento de toda uma gama de posições em conflito, onde
a reconstrução do sentido dos termos e dos enunciados continha elementos para a
reordenação do sistema nacional de educação básica, efetuada nos período de 1995-2001,
6
A CF de 1988 determinava à União a prestação de assistência técnica e financeira aos estados e municípios
(§1º, art. 221). A LDBEN, por sua vez, atribuiu à União funções de coordenação e normativas, não previstas
no texto constitucional, além das funções redistributivas e supletivas (§1º, art. 8º, LDBEN) constantes no
texto constitucional revisado. As duas últimas a serem exercidas mediante assistência técnica e financeira aos
Estados, ao Distrito Federal e Municípios (§ 1º, art. 211, CF e inc. III do art. 9º, LDBEN)
Duarte, MRT
Página 65
governo FHC. As translações de sentido por que passaram termos como qualidade de
ensino, universalização do atendimento, papel da União ou mesmo, sua reconstrução com a
associação a outros significantes, além de expressões das posições em disputa,
sinalizaream os limites e possibilidades de reconfiguração dos procedimentos operacionais
das posições hegemônicas.
3.3 Sistemas municipais de ensino: uma herança centralizadora e desigual
Na década de oitenta, durante a elaboração da nova Constituição Brasileira foi apresentado
projeto pela Comissão de Sistematização que estabelecia no Ato das Disposições
Transitórias o prazo de cinco anos para a transferência aos Municípios do ensino préescolar e fundamental (art.40, ADCT). A forte reação apresentada por parte de educadores,
entidades e associações de classe foi imediata e no texto final da Constituição este artigo
foi suprimido (OLIVEIRA, et al. 1999: 27).
Nas diferentes versões de discussão do texto constitucional o tema da organização da
oferta do ensino obrigatório e infantil (inicialmente pré-escolas e, posteriormente educação
infantil, ou seja, creche + pré-escolar) sujeitou-se a duas diretrizes de política:
-
a transferência de encargos do atendimento educacional;
-
a autonomia na organização de sistemas municipais de ensino.
A primeira diretriz questionava o tema da universalização do atendimento público
apoiando-se na distribuição de encargos diferenciados entre os entes federados. Entre os
autores de emendas ao texto constitucional abrangendo esta diretriz identificamos políticos
e partidos com clara vinculação eleitoral de base clientelista e suporte patrimonialista
(Farenzena, 2001: 97-162). A segunda diretriz, cuja origem encontramos nas teses
municipalistas fortalecidas com o processo de redemocratização do país, provia da pressão
exercida pelos executivos municipais para a redistribuição dos recursos tributários e por
maior autonomia político administrativa. A critica formulada a essas diretrizes destacava a
desobrigação da União e dos estados subnacionais para com o financiamento direto à
educação básica como também a desconstrução do sistema nacional unitário de educação.
No entanto, os temas sobre maior autonomia e responsabilização dos entes federados
foram tratado, também, pelos setores considerados mais à esquerda do espectro político.
Duarte, MRT
Página 66
Desde 1988, na proposta de um documento básico apresentado à Comissão organizadora
da V CBE em Brasília, afirmava-se:
A assistência técnica e financeira da União fica condicionada à efetiva
aplicação do mínimo de 25% da respectiva receita de impostos pelos
Estados, DF e Municípios na manutenção e desenvolvimento do ensino, sem
prejuízo de outras penalidades da Lei (CBE, 1988: 12)
A obrigação para estados e municípios de aplicação de um percentual mínimo constituía a
primeira condição para o ingresso de recursos suplementares da União nos sistemas ensino,
desde as primeiras versões da Lei de Diretrizes formuladas no âmbito da sociedade civil.
Esta exigência pode ser encontrada em artigos, relatórios e pareceres de educadores
brasileiros desde as primeiras discussões sobre vinculação de recursos públicos para a
educação escolar7. Por sua vez, a ação suplementar de transferência voluntária de recursos
técnicos e financeiros para os entes federados – desde que cumpram a aplicação de
percentuais em MDE – vinculou-se também, nas proposições de textos legais, a critérios de
avaliação das condições sócio-educacionais.
art. 60 – A União prestará assistência financeira para o desenvolvimento da
educação nos Estados e Municípios visando corrigir as diferenças regionais
de desenvolvimento sócio-econômico, tendo em vista a renda per capita, a
população a ser escolarizada, o cumprimento das condições da carreira
nacional do magistério e o progresso quantitativo e qualitativo dos serviços
de educação (SAVIANI, 1988:7)
Ao apresentar uma das primeiras proposições de diretrizes e bases da educação, após a
aprovação da Constituição Federal em 1988, Demerval Saviani relacionava à prestação de
assistência técnica e financeira. por parte da União, exigências quanto à renda per capita
do sistema de ensino, demanda por escolarização, observância de um plano nacional de
carreira e controle de resultados.
A institucionalidade subjacente à proposta formulada por este educador para assistência
técnica e financeira da União reconhecia implicitamente a existência de sistemas
7
Rocha (2000) localiza no Convênio Nacional de Ensino Primário, promulgado em 1934, o estabelecimento
da cooperação financeira da União com os estados subnacionais, já os comprometendo com a aplicação de
15% dos recursos orçamentários para MDE. (Rocha, 2000: 100-1). Ver, ainda sobre ação supletiva (Duarte &
Teixeira, 1999).
Duarte, MRT
Página 67
municipais de ensino autônomos, como também o exercício de função regulatória pelo
Estado central. O artigo 60 do texto proposto em 1988 à sociedade brasileira estabelecia,
ainda, diretrizes que determinavam para a autoridade pública os critérios a serem
observados para a focalização da assistência técnica e financeira.
Em 1989, um ano depois de aprovada a Constituição Federal, a assembléia geral da Anped
divulgava, documento contendo propostas específicas para a Lei de Diretrizes e Bases.
Neste documento afirmava-se:
As transferências não constitucionais de recursos da União para os
Municípios (assistência financeira em geral, sob a forma de convênios,
auxílios e outras) devem ser intermediadas pelos governos estaduais, sendo
vedado à União realizar repasses diretos desses recursos aos Municípios.
A assistência financeira da União aos Estados, destes aos Municípios, e da
União aos Municípios, para fins de manutenção e desenvolvimento das
redes públicas de ensino fundamental e médio, deverão pautar-se por
critérios que tomem em conta: a) correção das diferenças do
desenvolvimento sócio-econômico; b) déficit da população a ser
escolarizada; c) cumprimento das condições de carreira do magistério; d)
indicadores de renda(ANPEd, 1989: 12).
O veto às transferências voluntárias diretas de recursos da União para Municípios era
afirmado em um contexto onde os governos estaduais assumiram maior protagonismo
político. O documento aprovado na Assembléia da Anped impedia negociações diretas
para assistência financeira entre União e Municípios, em contraposição ao dispositivo
constitucional que afirmava sua autonomia (caput, art. 18, CF). No entanto, em parágrafo
posterior do mesmo documento, a Assembléia Geral vinculou a critérios socioeconômicos
a assistência financeira aos municípios.
O documento reconhecia, embora implicitamente, a possibilidade de sistemas municipais
autônomos, mas acentuava a existência de desigualdades intersistêmicas para, em
seqüência, ressaltar o papel da União de articulação e coordenação na definição das
políticas educacionais. Em síntese, os educadores brasileiros, por sua entidade nacional,
defrontaram-se com a reconstrução das diretrizes gerais de um sistema de educação, tendo
por referência a existência de sistemas municipais de ensino autônomos, mas a defesa da
autonomia dos sistemas municipais foi minimizada pelo reconhecimento das desigualdades
Duarte, MRT
Página 68
preexistentes. No entanto, ao reafirmarem a importância de relacionar a ação de assistência
financeira [ação supletiva] a critérios objetivos de correção das desigualdades, os
educadores brasileiros reconheciam que a assistência técnica e financeira por parte da
União consistia em mecanismo eficaz de indução de políticas capazes de correção das
desigualdades inter e intra-sistêmicas.
3.4 Autonomia dos sistemas municipais e sistema único de EB
O tema das relações entre os entes federados já estava presente nas discussões iniciais da
LDBEN8. O documento da Anped, entretanto, é revelador de importantes concepções sobre
o sistema de educação básica entre setores considerados mais à esquerda no espectro
político. O texto defendia, em diferentes trechos, a fixação de parâmetros ou padrões
nacionais mínimos (curriculares, de duração do ano escolar, de qualidade para o conjunto
da unidade federada) como instrumentos capazes de assegurar um caráter unitário ao
ensino.(p.4). Este tema, ao longo da década de noventa, foi ressignificado, quando um
padrão mínimo tornou-se a medida da efetivação do direito.
Se a defesa da descentralização em sistemas municipais autônomos não era consensual
entre os setores considerados mais à esquerda, a matriz das diferentes posições pode ser
resgata nas concepções sobre as relações entre os entes federados.
art. 9º É da competência dos Estados e do Distrito Federal autorizar e
supervisionar o funcionamento dos estabelecimentos municipais e
particulares de educação anterior ao 1º grau, de 1º e de 2º graus (SAVIANI,
1988: p.5)
Saviani reiterando termos propostos por Lourenço Filho em 1961 quando das discussões
sobre o sistema nacional de educação, reafirma a centralização funcional, de uma parte das
ações de política educacional e a descentralização executiva (desconcentração), de outra
parte: financeira e administrativa. Nesta perspectiva, a unidade do sistema decorreria do
papel normativo dirigente assegurado para a União e/ou Estados, cabendo aos Municípios
prover e fiscalizar a execução dos serviços educacionais.
8
Duarte & Teixeira (1999) apresentam as diferentes proposições quanto ao papel da União para com a
educação básica no decorrer da tramitação do projeto de lei de diretrizes e bases da educação, na primeira
metade da década de noventa.
Duarte, MRT
Página 69
No esboço de sua proposta de texto para a nova LDBEN (1988) propositalmente evitou
utilizar a expressão "sistemas de ensino" para resguardar o caráter de unidade, que entendia
ser a marca distintiva da noção de sistema. Pela mesma razão evitou também a
multiplicação das instâncias normativas, que ficaram restritas a duas (SAVIANI, 1988: 3).
O tema da municipalização do ensino era tratado, em sua perspectiva, pela atribuição aos
governos locais de responsabilidade para com a oferta do ensino infantil (creches e préescolas) e educação obrigatória.
Em 1990, foi aprovado pela Comissão de Educação da Câmara o substitutivo do Dep.
Jorge Hage. O substitutivo, amplamente debatido com a sociedade civil, reafirmava, no art.
111, as condições para prestação de assistência técnica e financeira aos municípios, sendo
atribuição da União prestar assistência técnica e financeira aos sistemas de ensino,
visando a superação das desigualdades sociais e regionais. O reconhecimento de sistemas
municipais autônomos ficou subordinado, no substitutivo Jorge Hage, a aprovação da
solicitação prévia encaminhada ao órgão normativo do sistema estadual (§ 1º, art. 14). Nos
debates travados em torno deste projeto de Lei, o tema da autonomia dos sistemas
municipais adquire maior visibilidade. Ao comentar os aspectos a serem revistos no texto
do substitutivo, Saviani destaca:
[A constituição] não estendeu aos municípios a competência para legislar
em matéria de educação. Portanto, não tendo autonomia para baixar
normas próprias sobre educação e ensino, os Municípios estão
constitucionalmente impedidos de instituir sistemas próprios, isto é,
municipais de educação ou de ensino. Não obstante, o texto constitucional
deixa margem, no art. 211, para que se possa falar em sistemas de ensino
dos municípios (SAVIANI, 1997: 62).
As concepções de Demerval Saviani expressavam, no período, algumas das posições dos
educadores brasileiros reunidos nos Fórum em Defesa da Escola Pública. Esta entidade
congregava posições e grupos em defesa da educação pública, quando da elaboração da
LDBEN. A noção de autonomia dos sistemas municipais de ensino, para estes setores, era
conflitante com preocupações históricas voltadas para a superação das desigualdades
sociais/regionais e com a constituição de um sistema unitário de educação no país.
O projeto Jorge Hage sintetizou estas posições mais à esquerda do espectro político sobre o
sistema nacional de ensino. Subordinou a existência de sistemas municipais autônomos à
Duarte, MRT
Página 70
aprovação prévia por órgão estadual. Atribuiu a estados e municípios a oferta da educação
básica (inc. II e III do art. 17) e fixou para a União uma atuação prioritária na manutenção
de sua rede de ensino superior e tecnológica e uma atuação supletiva, corretiva das
desigualdades regionais, com relação à EB (inc. I do art.17). O substitutivo Jorge Hage,
apresentava novas fontes de financiamento para educação infantil e subvinculava recursos
para o combate ao analfabetismo, ampliando os termos do art. 60 do ADCT de 1988. Neste
projeto, posteriormente conhecido como projeto da sociedade civil, a ação supletiva da
União voltava-se para o tema da correção das desigualdades e a autonomia dos sistemas
locais de ensino era parcialmente reconhecida (ver, também, Farenzena, 2001).
Em um contexto político onde a iniciativa das proposições achava-se com setores
organizados da sociedade civil – reunidos no Fórum em defesa da escola pública – o
reconhecimento
das
desigualdades
regionais
fundamentava
posições
pró-maior
centralização político-administrativa pela União e de restrição a sistemas municipais
autônomos. Mas, no período subseqüente, o reconhecimento da diretriz de política
educacional para a prioridade de tratamento as desigualdades regionais e de capacidades
diferenciadas dos municípios, adquire suporte em outro enquadramento teórico: o
reconhecimento da crise fiscal do estado e da capacidade fiscal diferenciada dos sistemas
municipais de ensino.
... torna-se premente o estabelecimento de parâmetros para as novas
modalidades de interação entre municípios e estado, bem como a
indicação de prioridades para complementação de recursos por
parte da esfera federal, (...) Assim sendo, se tudo indica não ser
conveniente repassar para os municípios pequenos e pobres a
manutenção direta das redes de ensino fundamental, não há porque
continuar isentando os mais ricos da assunção de encargos maiores
e mais diretos na área. Também não há razão para continuar
poupando os municípios que mantêm redes próprias e bem providas,
de arcarem cada vez mais com a expansão da demanda na própria
localidade (Barreto, 1992: 27)
Ao assumirem posições de governo no âmbito local ou estadual, setores que combateram a
política educacional do período autoritário, defrontavam-se com a (in)capacidade fiscal dos
estados subnacionais e governos locais para a expansão do atendimento sob as mesmas
bases de financiamento estatal. A atribuição de responsabilidades diferenciadas constituirá,
para estas posições, contrapartida de autonomia política em decorrência da insuficiência de
recursos.
Duarte, MRT
Página 71
A divulgação do esboço do novo anteprojeto de lei pelo Senador Darcy Ribeiro, em 1992
explicitou as divisões entre educadores, entidades da sociedade civil e gestores que
combateram a política do período militar9. As eleições de 1990 resultaram em alterações
expressivas no Congresso Nacional e trouxeram para o primeiro plano do cenário político
proposições relativas à redução da ação do Estado. As diferentes posições quanto à
autonomia dos sistemas municipais passaram, agora, a ser demarcadas pela defesa de
maior ou menor intervenção da União na oferta direta de Educação Básica.
3.5 Relações federativas e função supletiva e redistributiva da União
A assistência financeira da União aos sistemas estaduais e municipais de ensino foi
condicionada, no projeto conhecido como Darcy Ribeiro, à ativa colaboração desses ao
sistema nacional de avaliação do rendimento escolar, num período em que o Ministério da
Educação iniciava a estruturação do SAEb. Esta modificação articulava pela primeira vez
nos textos de diretrizes e bases assistência financeira e avaliação sistêmica do rendimento
escolar, o polêmico substitutivo de 1992 acrescentava às finalidades das ações de
assistência técnica e financeira aos Estado e Municípios a promoção da avaliação
sistêmica. E no lugar da redução das desigualdades sociais e regionais o texto legal
passaria a indicar o desenvolvimento dos sistemas de ensino e o atendimento prioritário à
escolaridade obrigatória. O último objetivo restringia o escopo da assistência prestada pela
União e o primeiro relativizava prioridades em relação às diferenças sócio-econômicas.
O substitutivo Darcy Ribeiro concedia autonomia aos sistemas de ensino dos Estados, do
Distrito Federal e dos municípios. Estabelecia nítida definição de responsabilidades de
cada ente da Federação e prioridades quanto aos níveis de ensino. Neste substitutivo,
redistribuição e supletividade transformaram-se em princípios de doutrina, e o que é tão ou
mais importante, da afirmação destes princípios decorrem até mecanismos operativos
(USP/GT, 1995:1-2).s
9
A elaboração do substitutivo do Senador Darcy Ribeiro contou com a participação da Profª Eunice Ribeiro
Durham da USP, ligada a equipe do ex Ministro José Goldemberg, dos Profs Cândido Alberto Gomes e
Maria do Céu Jurema, da assessoria do Senado e do Prof. Jorge Ferreira, ligado a equipe que conduziu a
implantação dos CIEPs (Ribeiro, 1992: 20)
Duarte, MRT
Página 72
A alocação dos recursos para a manutenção e desenvolvimento do ensino
tem como critério básico os recursos materiais e humanos mínimos per
capita necessários para que seja assegurado a cada aluno matriculado o
padrão mínimo de qualidade
A partir de 1992/93 os dois projetos concorrentes no Senado Federal – o substitutivo do
Senador Cid Sabóia, que incorporava com modificações o projeto Jorge Hage e o proposto
pelo senador Darcy Ribeiro – disputam concepções diferenciadas sobre as relações entre
os entes federados no campo da educação escolar básica. Na versão que incorporou o
projeto da Câmara prevalecia uma concepção de intervenção reguladora do governo central
no provimento e controle ex ante dos serviços necessários à educação básica mediante
assistência técnica e financeira. Na segunda versão, o papel da União na prestação direta de
serviços é restringido, inclusive no que tange à Educação Superior; no entanto, sua função
de regulação ex post é ampliada (ver Cury, 1997 e Abreu, 1999).
Em 1996, a Emenda Constitucional nº 14/96 e a Lei de Diretrizes e Bases aprovada pelo
Congresso Nacional estabeleceram o predomínio da segunda concepção. À União funções
normativas de coordenação, redistritutivas e supletivas, aos estados e municípios
incumbência da oferta direta de Educação Básica e o exercício de funções normativas no
âmbito de seus sistemas de ensino. Esta posição é congruente com as diretrizes de Reforma
do Estado que ancoradas em novas estratégias de ampliação do atendimento, com
restrições de financiamento e avaliação dos resultados reestruturam o sistema público de
educação.
No entanto, o predomínio de uma versão na norma legal aprovada não elide as disputas
anteriormente travadas e o texto constitucional reformado, como a LDBEN, carregam em
muitos pontos vozes múltiplas (Cury, 1997). A leitura das competências atribuída à União
e dos mecanismos de exercício da ação supletiva permite recuperar posições formuladas
por outras vozes e não elididas do texto de diretrizes e bases. A fórmula final do artigo 75
da atual LDBEN introduziu e desse modo reconheceu a capacidade de atendimento
diferenciada dos sistemas de ensino, como critério verificador de disparidades
intersistêmicas.
Pode-se diante do exposto, ter uma idéia de como o dispositivo funcionaria:
o governo federal fixaria o custo mínimo da educação primária pelas
Duarte, MRT
Página 73
regiões; cada Município, em face de sua renda tributária, verificaria
quantas crianças poderia educar; fundado nesse fato, cada Estado
calcularia o número de crianças que lhe caberia educar, dentro daquele
custo mínimo adequado, a fim de constatar se os 20% de sua renda
tributária seriam suficientes; caso contrário, a União, nos termos da
Constituição viria em socorro, concedendo auxílio para o número de
crianças que faltasse (Teixeira, 1961:5)
Uma proposta de ação supletiva criteriosa, contando com recursos permanentes que
conjugasse esforços dos entes federados percorre a história da educação brasileira. Na
tradição liberal, expressa por Anísio Teixeira, os temas dos desequilíbrios inter-regionais,
das diferenças de atendimento e das desigualdades intersistêmicas acham-se presente,
como também, entre aqueles que participaram dos embates em torno da Constituição de
1988. A síntese jurídica, formulada na EC 14/96 e na LDBEN, deve ser lida a luz dessa
história. No entanto, estas proposições vêm sendo revistas com a implementação da
reforma educacional a partir da segunda metade da década de 90 – governo FHC.
A tradição liberal expressa por Anísio Teixeira, no contexto dos anos sessenta, propunha
que a ação supletiva da União fosse dirigida para aqueles estados e municípios que, mesmo
utilizando seus recursos vinculados não conseguissem atingir um custo-mínimo por aluno
face à demanda. O “socorro” da União devido à insuficiência de recursos, no entanto, é
precisado em algumas das proposições legislativas, após a aprovação do texto
constitucional (Saviani, 1988). O reconhecimento implícito, neste período, do regime
federativo no país promove a elaboração de normas que, por um lado reconhecem a
autonomia dos sistemas locais, mas por outro, compartilham obrigações entre poderes
autônomos10.
Podemos afirmar que na formulação das políticas educacionais a questão federativa, além
de pouco debatida, só recentemente tem sido abordada pelas posições mais críticas ao
sistema educacional erigido e organizado nos períodos autoritários (1930-1945 e 1964-
10
Ver, ainda, a respeito o artigo de Mascavo (1961)
Duarte, MRT
Página 74
1984)11. Uma proposta de ação supletiva criteriosa, voltada para o aperfeiçoamento dos
desequilíbrios políticos e sociais entre os entes federados, percorreu de modo recessivo, as
proposições de política educacional voltadas para a superação das desigualdades
educativas. No entanto, as críticas e denuncias produzida a este respeito, abordavam o tema
pelo viés da municipalização induzida (Rosar & Souza, 1999; Oliveira et al, 1999; Pinto,
2000 e outros), da autonomia da escola (Oliveira, 2000), ou do estudo comparativo da
formulação jurídico-política, silenciando-se quanto às dimensões e conseqüências de
relações intergovernamentais onde as unidades constitutivas da federação detêm autoridade
para deliberar em sua esfera de competência. É recorrente nos estudos sobre a defesa da
participação cidadã reivindicações por maiores recursos, seja no âmbito federal, estadual
ou municipal, sem a problematização dos mecanismos de repasse financeiro. Embora esta
perspectiva esteja presente na crítica formulada às agencias de financiamento
internacionais, internamente expressam a efetivação do regime de colaboração entre os
entes federados no país.
Se os estudos sobre financiamento, na atualidade, tendem a abordar diferentes aspectos de
política educacional deve-se, a nosso ver, ao caráter estruturante da sistemática de
financiamento sobre diretrizes jurídico-políticas de educação. A centralidade da
distribuição do fundo público para a reprodução das relações sociais (0liveira, 1998) exige
das políticas sociais o desempenho de funções contraditórias que, por sua vez, intervêm na
formulação e implementação de sua sistemática operacional.
3.5 Relações federativas e assistência aos estados e municípios
No estado de Minas Gerais, desde o início da década 90, políticas governamentais de
educação têm priorizado a expansão do atendimento público no ensino fundamental e
critérios de maior eficiência na gestão do sistema estadual de EB. Políticas estaduais de
educação básica, formuladas desde o início da década, defrontaram-se com questões
relacionadas ao regime de colaboração entre a “rede estadual” e as “redes municipais”.
Estudos apontando a racionalidade política que orientou a(s) reforma(s) mineira(s) da
11
Arrechte (2000) destaca que as políticas sociais, as organizações governamentais e os programas que
compõem o aparato diferenciado de proteção social no Brasil, construído nos períodos autoritários
estruturam-se com base na centralização de recursos e capacidade decisória e desconcentração da gestão.
Duarte, MRT
Página 75
década de noventa foram desenvolvidos por Oliveira, 1996 e 2002, mas medidas adotadas
neste período, para redistribuição de recursos financeiros apresentam diferenças em relação
a proposta adotada nacionalmente.
Em 1995, o governo de Minas Gerais aprovava a L. nº 12.04012, que dispunha sobre a
distribuição da parcela de receita do produto da arrecadação do ICMS. Conhecida como
Lei Robin Hood por seu caráter redistributivo, esta Lei estadual operacionalizava o
conceito de capacidade de atendimento dos sistemas municipais de ensino como um dos
recursos para redistribuição entre estados e municípios da cota parte do ICMS.
CMA é a capacidade mínima de atendimento do Município,
calculada pela relação entre 25% (vinte e cinco por cento) da
receita de impostos, do Município, compreendida a proveniente de
transferências, e o custo por aluno estimado pela Secretaria de
Estado da Educação (Anexo II, L. nº12.040/95).
Com a aprovação da Lei nº 9424/96, que regulamentou o FUNDEF, estabeleceu-se
nacionalmente o mecanismo de operacionalização da prioridade de atendimento no ensino
fundamental - recursos públicos estaduais e municipais subvinculados a um fundo
específico - e, deste modo, delimitou-se residualmente a parcela do fundo público a ser
destinado à educação infantil e ensino médio.
A sistemática operacional da Lei nacional e estadual tem por objetivo implementar
medidas redistributivas capazes de equalizar a capacidade de atendimento dos sistemas
públicos estadual e municipais, efetivando o princípio de igualdade de oportunidades.
O mecanismo básico de funcionamento da Lei nacional impõe um confisco, em conta
especial, de parte dos recursos vinculados a educação do Estado e Municípios, retornando
ao respectivo nível de governo na proporção das matrículas no ensino fundamental
(PINTO, 2000: 63). Verifica-se, desde modo, apenas a redistribuição de recursos para
homogeneizar disparidades intra-estaduais de capacidade fiscal dos municípios em cada
12
Revogada, posteriormente, pela Lei estadual n° 13.803 de 2000 que a reformulou, mantendo entretanto os
critérios de redistribuição dos recursos vinculados ao ICMS, com alteração dos percentuais de destinação
Duarte, MRT
Página 76
estado, sem possibilitar intervenções reguladoras da e na capacidade de formular e
implementar políticas dos sistemas públicos de ensino.
A Lei estadual, por sua vez, distribuía entre os municípios 25% (quota-parte) da
arrecadação do ICMS de acordo com um índice que contemplava, dentre outros fatores, o
número de alunos matriculados no ensino fundamental. Embora a maior parte dos recursos
retornasse ao município de onde provinha a arrecadação, a chamada Lei Robin Hood,
introduzia a redistribuição dos recursos tributários com fundamento em critérios
socioculturais. Tanto a Lei nacional (FUNDEF) quanto a estadual (Robin Hood)
autorizaram o poder executivo a arbitrar um custo mínimo/aluno/ano como referência
básica para um padrão mínimo de qualidade. E a referência para determinar este valor em
ambas as normas legais relaciona-se, apenas, às possibilidades fiscais do sistema público montante de recursos vinculados divididos pelo número de alunos matriculados no ensino
fundamental (FUNDEF) na rede municipal de ensino (Robin Hood).
Esta sistemática é indutora da expansão dos anos de atendimento no ensino fundamental,
como mecanismos de captação de recursos e redução do gasto/por aluno. Estimula, ainda, a
adoção de expedientes como a matrícula de crianças com idade inferior ou superior a faixa
etária correspondente ao Ensino Fundamental, a retenção de alunos nesta etapa da EB e,
também, o aumento do número de alunos por profissional de magistério de modo a
compensar o baixo custo mínimo fixado. Adotadas em um período onde as diretrizes de
política nacional de educação inspiravam-se em diretrizes formuladas pelo Banco
Mundial13 e os recursos do Banco apoiavam programas estaduais e nacional voltados para
o ensino fundamental, os mecanismos de redistribuição dos recursos subvinculados
apresentam elementos e procedimentos de redistribuição voltados para a otimização da
eficiência no uso dos recursos disponíveis e para reforçar a competição inter sistemas de
ensino.
13
Em 1995 o Banco Mundial divulgou o documento “Priorities and strategies for education: a World Bank
review”, onde medidas promotoras de eficiência e eficácia na gestão da educação eram assinaladas.
Duarte, MRT
Página 77
As conseqüências da implantação do FUNDEF para os municípios foram bastante
exploradas na literatura sobre a atual política de financiamento educacional (Pinto, 1999;
Monlevade, 1997; Castro, 1998; MEC, 2000; Oliveira, 2001; Davies, 2001). Sua função
redistributiva no âmbito dos estados ainda precisa ser melhor analisada14, no entanto, esta
sistemática de financiamento é complementada pela assistência financeira prestada pela
União, com base nos recursos do salário educação, administrados pela Fundação Nacional
de Desenvolvimento da Educação (FNDE). E a sistemática de transferências voluntárias
constitui um elemento de importância na indução de uma política educativa de governo
(Arrechte, 2000), como também, para efetivar o regime de colaboração entre os sistemas
de ensino.
A subvinculação de recursos ao Ensino Fundamental, mediante a criação de um fundo
específico, operacionalizou o exercício da função redistributiva da União, apesar da
definição arbitrária do custo-mínimo anual por aluno. No entanto, compete à União o
exercício de função supletiva, mediante assistência técnica e financeira, operacionalizada
pela transferência voluntária de recursos provenientes da contribuição social do salário
educação.
3.6 Relações federativas e assistência financeira a estados e municípios
Nos termos propostos pela LDBEN, a capacidade de atendimento dos sistemas de ensino
acha-se associada à relação existente entre o montante de recursos constitucionalmente
disponíveis para MDE e o custo anual do aluno, relativo ao padrão mínimo de qualidade. A
Lei estabeleceu exigências de uma ação supletiva para com os sistemas que ofertam a
Educação Básica, o que resulta na determinação da capacidade de atendimento do sistema
considerando as diferentes etapas a serem ofertadas – EI e EF para os sistemas municipais
e EF e EM para os estados.
A razão entre recursos constitucionais vinculados à EB e custo anual do aluno estabelece a
amplitude possível do atendimento. Se a matrícula apresentada pelo município superar este
valor, ocorre o esgotamento da capacidade de atendimento do sistema (CAE), enquanto
14
O capítulo 4 desta tese analise a capacidade redistributiva do FUNDO no estado de Minas Gerais
Duarte, MRT
Página 78
que o inverso indica a possibilidade de ampliação do atendimento no sistema (CAA).
Portanto, a determinação do custo anual do aluno por sistema de ensino, relativo ao padrão
mínimo de oportunidades educacionais, constitui o termo a ser definido.
A Lei 9424/96 (FUNDEF), que instituiu o mecanismo redistributivo a ser observado pela
União, ao prever a complementação dos recursos estabelece a razão entre a previsão de
receita total e a matrícula para a definição objetiva do custo mínimo por aluno no ensino
fundamental. O valor resultante constitui o parâmetro mínimo que obriga a intervenção
compensatória da União. Entretanto o Conselho Nacional de Educação diferencia este
mecanismo do disposto no art. 75 da LDBEN.
Note-se que o referido custo mínimo associado a padrões mínimos de
qualidade não deve ser assimilado ao valor mínimo por aluno mencionado
na Lei 9.424/96 (CNE, 1997)
Esta distinção fundamenta-se na diferença entre as duas funções atribuídas à União:
redistributiva e supletiva. O mecanismo redistributivo aprovado acha-se expresso na Lei
9424/96. No entanto, a função supletiva mediante assistência técnica e financeira a estados
e município recebeu um tratamento na LDBEN distinto da sistemática operacional
implementada a partir da EC n° 14 de 1996. Cada sistemática revela e fortalece padrões de
relacionamento intergovernamentais diferenciados.
3.6.1 - A sistemática operacional do FNDE
Em 1998, decreto da Presidência da República – no. 2520 de 19 de março – aprovou na
estrutura regimental do FNDE as competências de seu conselho deliberativo. Composto
por titulares de cargos comissionados do Ministério da Educação, a este órgão compete
deliberar sobre a assistência técnica e financeira a estados, municípios e estabelecimentos
particulares de ensino, dentre outras ações (item c, inc. I, art. 6o, D. 2520/98). Em janeiro
do ano seguinte, o conselho deliberativo divulga as normas para assistência financeira a
programas e projetos educacionais (Resolução 4, de 21/01/1999), válidas para o ano de
1999 e 2000 (Res. Nº 05 de 10/02/2000).
As normas estabelecidas, em 1999, pelo Conselho Deliberativo do FNDE definiam quais
as ações e programas passíveis de financiamento, quais as ações e programas destinados a
Duarte, MRT
Página 79
estados, municípios e/ou organizações não governamentais, como também o nível ou
modalidade de ensino onde poderão ser aplicadas (Quadros n.° 1 e 2).
QUADRO 1
Demonstrativo das ações por níveis e modalidades de ensino
nível/modalida
Destinatários
de de ensino
educação pré- municípios e distrito
¾ formação continuada de professores
escolar
federal
¾ material didático/pedagógico
Ensino
estados,
fundamental
federal e municípios
¾ manutenção física de escolas
educação
escolar
indígena
educação
estados e municípios
¾ formação continuada de professores
distrito
Ações
¾ formação continuada de professores
¾ material didático/pedagógico
de estados,
jovens
adultos
e federal, municípios e
especial
¾ formação continuada de professores
¾ material didático/pedagógico
ongs
estados,
educação
distrito
distrito
¾ capacitação de professores e técnicos
federal, municípios,
¾ material didático/pedagógico
ongs, INES e IBC
¾ equipamentos para escolas
¾ manutenção física de escolas
¾ adaptação de escolas
Fonte: Normas de assistência financeira/MEC - 1999
QUADRO 2
Demonstrativo dos programas por nível ou modalidade de ensino e destinatários
Programa
Aceleração
nível/modalidade de ensino
Destinatários
a
a
da ensino fundamental (1 . a 4 . estados, municípios e DF
aprendizagem
série)
apoio tecnológico
ensino fundamental
estados, municípios e DF
transporte escolar
ensino fundamental
municípios
educação especial
municípios e ONG
Fonte: Normas de assistência financeira/MEC – 1999
Duarte, MRT
Página 80
Os quadros demonstram como se articulam etapa/modalidade/ações e programas passíveis
de assistência financeira. Deste modo, a União pôde induzir a adoção de programas
definidos centralmente e assegurar sua execução descentralizada. Pois os municípios
deveriam elaborar projetos para as etapas/modalidades previstas dentre os programas
estabelecidos. O primeiro contemplava diretriz de regularização do fluxo escolar. O
segundo relaciona-se com a compra de kits de produtos para divulgação de conteúdos de
ensino. E o terceiro com a compra de equipamentos ou pagamento de serviços de terceiros.
Em 2001 o Conselho Deliberativo do FNDE altera novamente os critérios para assistência
financeira aos estados, municípios e ongs. Introduz o critério de regiões de atendimento
prioritário e estabelece, para cada estado da federação, uma relação de municípios-pólo,
que poderão pleitear assistência financeira. Esta nova sistemática exige, ainda, que os
municípios-pólo agreguem em sua proposta de execução outras cidades. Conseqüência
importante, advinda destes novos critérios, para os sistemas municipais de ensino
relaciona-se com a necessidade de definição de ações e programas comuns para uma
região, induzindo, desse modo, políticas de colaboração intersistemas municipais.
Esta sistemática operacionaliza o regime de colaboração, previsto na Constituição e
LDBEN, desconcentra a execução das ações e programas educacionais nos Municípios
e/ou Estados, deixando para a União a formulação e articulação entre diferentes políticas e
programas. A conseqüência mais imediata advinda para os sistemas municipais relacionase com a presença de um corpo técnico de especialistas capaz de formatar as necessidades
locais aos programas e ações estabelecidos centralmente. Este conjunto de procedimento é,
ainda, indutor de alterações nas relações entre os entes federados e destes com diferentes
segmentos de mercado.
As normas de assistência técnica e financeira aprovadas pelo Conselho Deliberativo do
FNDE reinterpretaram os termos da LDBEN para a função da União no que se refere à
educação básica.
A ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados será
exercida de modo a corrigir, progressivamente, as disparidades de
acesso e garantir o padrão mínimo de qualidade de ensino.
Duarte, MRT
Página 81
§ 1º. A ação a que se refere este artigo obedecerá a fórmula
de domínio público que inclua a capacidade de atendimento e a
medida do esforço fiscal do respectivo Estado, do Distrito Federal ou
do Município em favor da manutenção e do desenvolvimento do
ensino (art. 75, LDBEN).
O objetivo a ser perseguido envolve corrigir disparidades de acesso e garantir padrão
mínimo de qualidade e, para tanto, o repasse de recursos técnicos e financeiros deve
observar o diferencial da capacidade de atendimento assim como o esforço fiscal dos
sistemas municipais e estaduais de ensino. No entanto, a sistemática operacional adotada
prioriza a execução local de programas definidos centralmente. Nos termos da LDBEN a
União dispõe de poder concorrente com os sistemas estaduais e municipais cuja capacidade
de atendimento frente as suas atribuições acha-se esgotada.
3.7 Federalismo, regime de colaboração e assistência técnico-financeira: diferenças na
capacidade de atendimento
Qual a origem desta sistemática de colaboração e assistência técnico-financeira? Ao
estabelecer o regime de colaboração entre os entes federados, incluindo os municípios. a
Constituição Federal de 1988, estabeleceu para o campo educacional a questão política de
como articular ações entre as três esferas de governo (federal, estadual e municipal). A
resposta a esta questão requer um diagnóstico prévio: a revisão do papel do Estado na
formulação financiamento e implementação das políticas sociais e, mais especificamente
do direito à educação básica15.
A crítica aos modelos de intervenção do Estado no campo social foi corrente desde a
segunda metade dos anos 80, mas a formulação de mecanismos operacionais consistentes
15
No início da década de noventa o IPEA promoveu um amplo debate sobre temas ligados direta ou
indiretamente à pobreza e desigualdade de renda. Em setembro de 1990, realizou-se em Brasília o simpósio
intitulado: o desafio da escola básica: qualidade e eqüidade. Em novembro do mesmo ano, no seminário
sobre
“Eficiência, eficácia em políticas sociais”, pesquisadores do IPEA e acadêmicos convidados
apresentam análises sobre a vinculação entre gastos públicos, investimentos em educação e mudanças nos
paradigmas de ação do Estado no país (Gomes, C & Amaral Sobrinho, J., 1992) O foco das análises dirigiuse para a urgência de revisão dos processos de gestão da res publica no campo educacional. Com forte
fundamentação em pesquisas empíricas relacionadas ao gasto dos entes federados para com educação, estes
estudos promoveram o ressurgimento no debate educacional dos pressupostos da teoria do capital humano,
como também impulsionaram questões relativas à otimização do gasto com MDE.
Duarte, MRT
Página 82
com uma reformulação da ação do Estado foi explicitada, somente a partir da segunda
metade dos anos 90 (governo FHC). A reforma político-administrativa do sistema público
de educação básica, desde a aprovação da EC n° 1996, enfatizou temas como gestão
autônoma e responsável dos recursos públicos, municipalização e participação dos serviços
educacionais, porém sem equacionar padrões e limites do atendimento prestado. A
LDBEN, por sua vez, deixou a regulação do padrão de qualidade nos aspectos
infraestruturais em aberto para cada sistema de ensino (art. 25, LDBEN). Estas
indefinições promovem, por sua vez, maior autonomia decisória na composição de gastos
com MDE, mas também contribuem para rearticular relações entre o setor público e o
privado.
Neste sentido, os mecanismos, que efetivam o regime de colaboração entre os entes
federados como a sistemática operacional do FNDE, cumprem um importante papel na
definição de uma institucionalidade que opera simultaneamente com desconcentração
executiva e centralização decisória. Para Arrechte (2000), são incentivos adequados à
estratégia de indução de políticas nas esferas subnacionais e locais de governo e também
de transferência de responsabilidades. A conclusão formulada representou um passo
significativo no conhecimento sobre a descentralização de responsabilidades em sistemas
federados, por permitir superar as concepções que questionavam a superposição de
competências e atribuições entre as esferas de governo (Almeida, 2001: 26).
Entretanto, o federalismo brasileiro é assimétrico, posto que a autonomia estadual [e
acrescentamos, municipal] não tem, na prática, a mesma latitude para todos os membros da
federação (Kugelmas, et al. 1989). A instituição da federação visou acomodar, no aparato
institucional, setores sociais com graus diferenciados de participação e também
pluralidades territoriais e sociais com interesses em conflito16. No caso brasileiro, a
organização federativa foi, ainda, recorrentemente contraposta a longos períodos de
centralismo autoritário, que, como mencionamos, organizaram e expandiram o aparato
estatal de proteção social.
16
Para uma análise político institucional do sistema federal ver: Soares, 1998
Duarte, MRT
Página 83
Dale, 1999 ao analisar a difusão de diretrizes globais em formações políticas específicas,
considerou que estas se fazem em interação com as formas institucionais internas aos
Estados, que por sua vez reproduzem relações de poder e governance17. O conceito de
“governance without governement”(Dale, 1999) contribui para a apreensão do
mecanismos de internacionalização da agenda educativa, introduzindo um receituário
indiferenciado para vários países. Mas, permite, também, apreender a racionalidade que
preside nos últimos anos as relações intergovernamentais, entre os diferentes sistemas de
ensino no Brasil. A estratégia de indução expressa nos programas do FNDE, conferiram à
União capacidade de governance, dispensando-a, em contrapartida, do ônus decorrente das
ações e procedimentos de governo, especialmente em um contexto de expansão das
reivindicações de cidadania.
Considerando que o federalismo envolve a descentralização das instituições políticas, ou
seja, das instâncias responsáveis pela tomada de decisões, a sistemática operacional de
assistência técnica financeira do FNDE, adotada na última década do século vinte –
governo FHC -, apresenta-se predominantemente como indutora de restrições à formulação
de políticas e planos educacionais pelos municípios e estados com menor capacidade de
atendimento, promovendo nestes governos a execução de planos e programas definidos
centralmente. Os convênios firmados entre os entes federados, para o repasse de recursos
financeiros e execução dos programas educacionais, caracterizam-se mais por expressarem
uma estratégia de desconcentração do tipo top down (Karlsen, 2000: 530), capaz de
prevenir alternativas às diretrizes centrais e/ou promove-las territorialmente.
O texto da LDBEN é ambíguo quanto à autonomia dos sistemas municipais para
promoverem projetos político-pedagógicos próprios (capítulo 2), mas a rigor cabe ao
governo federal as funções de coordenação, supletivas e redistributivas (de equalização
e/ou promoção de igualdade de oportunidades). Por este motivo a conclusão apresentada
por Draibe (1998) ao analisar os primeiros resultados dos programas geridos pelo FNDE é
significativa:
17
Sobre o conceito de governance ver: Draibe, 1997.
Duarte, MRT
Página 84
[esses programas, Merenda Escolar, Dinheiro na Escola e TV Escola) têm
reproduzido nos seus resultados o mesmo padrão de heterogeneidade e
desigualdade, em geral desfavorável às escolas municipais, às escolas
pequenas e às escolas localizadas no Nordeste e no Norte “(Draibe, 1998)
A argumentação em torno desses resultados, por autores que tratam do regime de
colaboração, envolve questões como a “avalanche de programas sem um cuidado adequado
em sua formulação e gerenciamento” (Garcia, 2002: 74), ou ainda, a urgência de criação de
fórum institucional para o planejamento e avaliação dos programas com representação dos
entes federados, dentre outros (Machado, 2002: 130). Sem desconhecer a importância
dessas medidas, para promover maior racionalidade na formulação e implementação da
assistência técnica e financeira entre os entes federados, considera que em uma federação
desigual como a brasileira os arranjos contratuais decorrentes de convênios, devem
observar diretrizes institucionais relativas à capacidade de financiamento e esforço fiscal
efetuado pelos entes federados para com a educação básica.
O regime de colaboração, fixado no texto constitucional brasileiro (art. 211, CF),
pressupõe relações federativas com uma estruturação descentralizada. Ou seja, relações
intergovernamentais cooperativas, onde a(s) sistemática(s) de financiamento promove o
desenvolvimento de capacidade decisória (projetos políticos pedagógicos locais) com
intervenções reguladoras de natureza redistributiva e supletiva.
4. Dispersão e redistribuição da receita pública nos municípios
do estado de Minas Gerais: critérios de orientação para análise
do FUNDEF.
32. No caso do ensino médio, formularemos uma política que inclua
os jovens trabalhadores. Para tanto, o Fundef deve ser ampliado
para todo o ensino básico e contar com recursos suplementares do
governo federal, revertendo-se o atual processo de municipalização
predatória da escola pública. Além disso, a exemplo da saúde, a
educação tem que ser concebida como um sistema nacional
articulado, integrado e gerido em regime de colaboração (União,
estados e municípios) e de forma democrática, com a participação
da sociedade (PT – Programa de governo, 2002)
4. 1 Consolidando alguns pressupostos
A obtenção de ganhos de produtividade constituiu uma das preocupações centrais das políticas
de reforma da administração educacional implementadas no estado de Minas Gerais desde o
início da década de noventa e, posteriormente no país. Autores, com posições diferenciadas
quanto às perspectivas e resultados do programa mineiro de reforma educacional, enfatizaram
em seus estudos a maior racionalização na gestão dos recursos financeiros e administrativos
(Mello & Wey, 1994, FJP, 2000) ou a introjeção na esfera pública das noções de eficiência,
produtividade e racionalidade inerentes à lógica capitalista (Oliveira, 2000)1. O modus
operandi de administração da educação pública constituiu o foco da reforma, tanto na
percepção de seus defensores quanto de seus críticos.
Essas análises têm por pressuposto que, as diferentes políticas nacionais de reforma da
administração pública consistem em respostas a fatores externos à administração, como a crise
fiscal decorrente da reestruturação produtiva do capitalismo e/ou a complexificação de
interesses e movimentos sociais que propugnam pela ampliação e democratização dos gastos
que efetivam direitos sociais. No entanto, sem desconhecer as condicionalidades imposta pelas
lutas sociais e transformações econômicas, este estudo acrescenta que estas determinações
(reestruturação produtiva e democratização) não contêm per si um modelo prévio e geral dos
procedimentos de interação entre Estado e sociedade. Tais condicionalidades influenciaram
1
A associação desta dupla determinação das políticas de reforma do Estado acha-se presente em diferentes autores.
Mozzicafredo (2001:12) ao analisar o contexto das reformas administrativas nos países europeus destaca dentre os
fatores externos a evolução econômica e financeira dos países, o crescimento das expectativas dos cidadãos e das
novas formas de governance. Souza (1999) ao analisar as teorias sobre as trajetórias do welfare state, também, as
reúne em dois grandes grupos não mutuamente excludentes.
Duarte, MRT
Página 86
medidas e procedimentos, mas permeadas por um leque de opções administrativas capazes de
diferenciar resultados encontrados. Os sistemas político-institucionais presentes nos contextos
nacionais, subnacionais e/ou locais atuam no sentido de filtrar determinações globais de
reforma, interferindo em aspectos cruciais de reordenação das políticas sociais e afetando seus
resultados.
Por estas razões consideramos que a variação dos procedimentos e das medidas de utilização
do fundo público produz formas diversas de organização dos espaços públicos e instituições
sociais, redefinindo possibilidades de interação entre diferentes atores da sociedade civil e as
instituições do Estado e produzindo rumos diferenciados de Reforma. Ou seja, o modo de
administrar requer o domínio de conhecimentos, procedimentos e competências adequadas ao
funcionamento institucional, mas possibilita, também, a seleção de estratégias e instrumentos
capazes de delimitar e interferir na organização e funcionamento das instituições prestadoras e
conseqüentemente nos resultados dos serviços prestados.
4. 2 Referenciais e procedimentos
Os estudos voltados para a análise das alternativas de administração do fundo público
destinado ao financiamento das políticas sociais têm-se concentrado em duas linhas de
reflexão:
- estabelecer parâmetros de comparação e controle público dos recursos disponíveis e gastos
efetuados com o objetivo de desvelar alternativas e suas conseqüências. Neste caso, tendo por
referência concepções que analisam o papel dos gastos sociais como expressão das relações
políticas no interior do Estado e entre grupos e classes sociais (Esping-Andersen, 1990 e 19..)
- elaborar critérios norteadores de redistribuição dos recursos e focalização dos gastos públicos
com vistas à redução das desigualdades sociais. O esforço desenvolvido, neste caso,
fundamenta-se nas concepções que destacam o papel regulador do Estado no desenvolvimento
da economia capitalista (Offe, 1984; 1991).
Nas duas vertentes a centralidade adquirida pelos procedimentos de administração do fundo
público requer um duplo esforço dos estudos que se proponham a pensar os efeitos de
alternativas de gestão. Para atender à temática focada na segunda vertente, este estudo apoiouse na análise comparativa da receita arrecadada dos municípios mineiros, para posteriormente,
examinar as relações entre a composição da receita e de gastos em educação para quatro
municípios do estado de Minas Gerais, selecionados por apresentarem população e capacidade
fiscal diferenciada no período de 1996 e 2000. Consideramos que estes dados podem revelar
Duarte, MRT
Página 87
como, o modo de composição do fundo público destinado à educação e a estruturação dos
gastos, articulam interesses contraditórios de expansão da produção mercantil vis a vis com a
constituição de um espaço público não mercantil.
Indagamos, em um segundo momento, sobre a racionalidade que presidiu a vinculação entre
critérios de descentralização político-administrativa – forma administrativa de gestão mais
plural e participativa – e a formulação da política nacional de educação básica a partir da
segunda metade da década de 90. Neste segundo momento, consideramos que um novo design
do sistema nacional de educação básica teve por fundamento diretrizes nacionais de utilização
do fundo público – recursos vinculados e subvinculados a MDE – capazes de conferir as
diferentes instâncias de governo maior capacidade regulatória dos interesses locais de
reprodução dos investimentos de capital.
As informações referentes à evolução da receita dos municípios mineiros foram coletadas junto
à Fundação João Pinheiro (FJP, 2001) e os dados referentes à despesa obtidos nas prefeituras
municipais. Os valores de despesa realizada, considerados para este estudo, foram os
declarados pelas administrações locais e integram o documento denominado “Demonstrativo
da Despesa realizada”. Esses documentos constam, também, no Sistema Informatizado de
Parecer do Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCMG) e constituem uma base inicial da
análise efetuada pelo Tribunal nas contas municipais. Observamos que, as séries históricas
desses documentos não têm sido preservadas pelos governos locais, de modo acessível aos
cidadãos e pesquisadores, dificultando a realização dos estudos comparativos mais abrangentes
e o controle público. O TCMG não disponibilizava, quando iniciamos a realização desta
pesquisa, acesso ao conjunto de informações encaminhadas pelos municípios mineiros, o que
exigiu todo um esforço inicial de coleta dos dados nos municípios.
4. 3 O FUNDEF e as políticas redistributivas em educação
A importância da sistemática operacional do FUNDEF tem sido avaliada, quanto ao seu
mérito de induzir correções das distorções entre as redes de ensino estadual e municipais,
favorecendo um acréscimo na receita adicional bruta dos municípios. O FUNDEF traz,
portanto, a institucionalização de um tipo de simetria dentro de cada Estado, propiciando
uma das condições indispensáveis ao desenvolvimento do federalismo cooperativo. Criouse uma espécie de imposição de cooperação entre Estados e Municípios, pelo vínculo das
receitas com as matrículas reais desses entes federados, de modo a assegurar um padrão
Duarte, MRT
Página 88
mínimo de qualidade, mediante a adoção de critérios redistributivos dos recursos
(Machado, 2002: 126).
Os relatórios produzidos sobre os efeitos do fundo têm destacado seus efeitos
redistributivos, com um deslocamento expressivo de recursos dos estados subnacionais
para os municípios, nas regiões mais pobres do país. Em 21 Estados, verificou-se em 1998,
com a implantação do FUNDEF, uma transferência de recursos das redes estaduais para as
municipais. Apenas em Roraima, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo ocorreu
o inverso (MEC, 1999).
Estudos sobre as repercussões do FUNDEF em municípios paulistas destacam seu efeito
indutor a municipalização (assunção da matrícula pelos municípios), de expansão do
atendimento no ensino fundamental (promovendo sua quase universalização), bem como a
insuficiência do fundo para modificar o padrão de qualidade atestado nos indicadores
paulista do SAEb (Bassi, 2001: 194-203). Estas pesquisas assinalam para a importância do
debate sobre os efeitos do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental, ou seja,
qual a importância relativa de três dos seus objetivos estratégicos: a)promover efetiva
descentralização; b) promover a melhoria da qualidade da educação; c) promover política
de eqüidade. Não se trata de objetivos antagônicos, porém não são necessariamente
complementares·, seus pesos relativos relacionam-se com os efeitos produzidos por estado
da federação.
Uma primeira resposta a esta questão advém da resistência da União em elevar o valor
mínimo do gasto/por aluno/ano em um contexto de prioridade à política econômica de
controle do déficit público e ajuste fiscal. Acrescenta-se a isto a pressão sobre os governos
estaduais para realizarem ajustes fiscais, contenção de despesas e restrições ao
endividamento. Neste contexto, a expansão do ensino fundamental por meio de
municipalização representa uma estratégia de desconcentração dos encargos na prestação
de serviços e de promoção de obstáculos a medidas voltadas para a melhoria da qualidade,
tendo em vista a quase inexistência de recursos adicionais. O princípio de eqüidade é
assegurado pela oferta pública de um padrão mínimo de prestação de serviços, para todos
que não dispõem de acesso ao mercado (COHN, 2000).
Duarte, MRT
Página 89
Os efeitos do FUNDEF, nos estados onde ocorreu transferência de recursos para a rede
estadual, devem ser melhores analisados, especialmente quando consideramos a
composição tributária deste fundo (Quadro n° 3).
QUADRO 3
Composição do FUNDEF segundo origem dos recursos – 1998 -R$ EM MILHÕES
IMPOSTO E TRANSFERÊNCIAS
TOTAL
(A)
FUNDEF
(15% de A)
PARTICIPAÇÃO %
FPM
12.219,6
1.832,9
13,8
FPE
10.956,2
1.643,4
12,3
ICMS
58.392,4
8.759,0
65,8
IPI exp
1.586,6
238,0
1,8
LC 87/96
2.093,4
314,0
2,4
85.248,1
12.787,3
-
524,2
3,9
13.311,5
100,0
SUB – TOTAL
COMPLEMENTAÇÃO DA UNIÃO
TOTAL DO FUNDEF
FONTE: STN/MF
Os recursos provenientes da arrecadação de ICMS respondem por 65,8% da composição
do fundo, portanto a redistribuição dos valores provenientes dessa fonte de receita detém
um impacto expressivo para o aumento dos recursos subvinculados por ente federado
(Castro, 2001: 18).
O Estado de Minas Gerais caracteriza-se por apresentar um grande número de municípios e
elevada desigualdade sócio-econômica e fiscal entre eles. As regiões sul, central e
triangulo apresentam indicadores de condições de vida próximos aos dos estados da região
sul e São Paulo, enquanto que as regiões Noroeste, Jequitinhonha e Rio Doce apresentam
condições semelhantes aos estados do Nordeste brasileiro (ver: Anexo II) Por este motivo,
a transferência de recursos, nos termos da engenharia operacional do FUNDEF, sinaliza
para a redução de parcela da quota parte dos municípios na arrecadação do ICMS, em
benefício da rede de ensino estadual.
O FUNDEF em Minas sinaliza mais para uma crise de gestão das redes municipais de
educação, do que para uma melhoria efetiva da qualidade nas mesmas. O crescimento
dessas redes, acompanhado de uma provisão de recursos insuficiente, seja pela perda ou
pelo repasse de recursos inferior às necessidades das mesmas, pode gerar um impasse de
difícil equacionamento nas municipalidades. O mecanismo redistributivo, entretanto, tem
Duarte, MRT
Página 90
parecido a muitos o principal traço eqüitativo do FUNDEF. Distribuir os recursos de
acordo com um custo mínimo por aluno definido nacionalmente, entretanto, não promove
igualdade de oportunidades. O que este custo representa para as diferentes redes de ensino
fundamental no País pode variar de acordo com as necessidades das mesmas. Assim, o que
representa para umas é diferente do que representa para outras e, portanto, não é possível
promover igualdade de oportunidade homogeneizando custos para o financiamento de
realidades desiguais, sem contribuir para que as mesmas sejam mantidas, isto sem contar
que os custos definidos têm sido irrisórios para se discutir qualquer critério de qualidade.
(Oliveira, 2001).
4. 4 Capacidade fiscal dos municípios mineiros ou a lenda de Robin Hood.
O Estado de Minas Gerais apresentava em 2000 um conjunto de 853 municípios (IBGE, Censo
demográfico, 2000) extremamente diversificados quanto aos níveis de desenvolvimento
socioeconômico e capacidade de constituição do fundo público. Esta diversidade é expressa
pela grande variação da receita corrente presente desde 19962 (TAB nº 15).
Para o cálculo dos valores nominais médios os dados referentes ao município de Belo
Horizonte foram eliminados, por serem atípicos, com valores discrepantes em relação aos
demais.
TABELA 6
Média e coeficiente de variação da receita corrente e da receita corrente per capita anual dos
municípios do Estado de Minas Gerais3
Receita corrente (R$)
Receita corrente líquida per capita (R$)
Função
1996
2001
1996
20014
x
4.601.947,11
9.333.531,41
285,98
581,00
s
CV
2
±12.821.542,68
±25.170.482,09
±165,00
±311,77
278,6%
269,7%
57,7%
53,7%
A receita corrente é formada por recursos próprios (tributários, patrimonial, industrial e de serviços) e oriundos de
transferências (estadual e federal). Considerando que, nesta composição, a parcela mais significativa refere-se às
transferências correntes e aos recursos tributários (impostos mais taxas) podemos considerar para efeito
comparativo que a receita corrente aproxima-se do montante de recursos sobre os quais incides os percentuais
mínimos vinculados a MDE, estabelecidos pela Constituição Federal.
3
Os valores nominais médios foram calculados excetuando-se o município de Belo Horizonte (capital), por
apresentar grande discrepância em relação aos demais municípios do estado.
4
Os valores nominais e per capita referentes a 2001 foram calculados com base na relação da Receita corrente
líquida do Municípios Mineiros fornecida pelo TCMG, dividida pelo número de habitantes segundo o Censo
Demográfico de 2000 do IBGE.
Duarte, MRT
p<
Página 91
0,02
0,005
Fonte: FJP/MG -1996 e TCMG, Censo 2000/IBGE para 2001
Um coeficiente de variação superior a duas e ½ vezes que a média da receita corrente nominal
dos municípios, demonstra a grande desigualdade fiscal presente nas cidades mineiras no
decorrer do período 1996-2001 (TAB nº 15) e, também, uma pequena redução desta
desigualdade – de 278,6% em 1996 para 269,7% em 2001 – apesar do crescimento nominal da
receita corrente dos municípios do estado. Mesmo excluindo a cidade de Belo Horizonte, o
coeficiente de variação da receita corrente anual atesta uma diversidade de arrecadação que, à
primeira vista, fundamentaria a adoção de medidas redistributivas do fundo público como
forma de superar desigualdades na capacidade de prestação dos serviços sociais pelos governos
locais.
Para melhor apreensão dessa desigualdade fiscal elaboramos os gráficos de dispersão da receita
corrente do total dos municípios de Minas Gerais, exceto Belo Horizonte, utilizando o log10 dos
valores encontrados. (GRÁF. nº 1 e nº 2). Nestes gráficos os municípios, onde foi efetuado um
estudo mais abrangente da receita e despesa, foram assinalados em vermelho, com o objetivo
de destacar sua representatividade fiscal.
10,00
9,50
9,00
8,50
8,00
7,50
7,00
6,50
X = 6,4
6,00
5,50
Gráfico 1 - Receita corrente líquida(Log10) dos municípios de MG – 1996
Fonte: FJP/MG
Com receita corrente anual superior a R$ 100 milhões (log10 ≥ 8,0), encontravam-se apenas
cinco municípios em 1996: Betim, Contagem, Ipatinga, Juiz de Fora e Uberlândia. Cidades
Duarte, MRT
Página 92
com maior dinamismo industrial, sua superioridade fiscal em relação às demais decorre
basicamente dos repasses da cota-parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias
(ICMS)5. Verificou-se, também, um reduzido número de cidades – 15 municípios - cuja
receita corrente ultrapassava R$ 30 milhões anuais (log10 ≥ 7,48), portanto com receita
superior a média do estado mais dois desvio padrão em 19966. Esta dispersão demonstrou a
elevada desigualdade da receita arrecadada presente entre os municípios do estado em
1996 e constitui uma justificativa para a adoção de políticas fiscais redistributivas (GRAF.
nº 1).
É importante destacar, também, o elevado número de municípios - 624 - com receita corrente
inferior à receita média do Estado, ou seja, R$ 4.601.947,11(log10 ≤ 6,6). Em 1996, ainda não
havia encerrado o ciclo de criação de municípios no Estado. No período considerado neste
estudo, o número de municípios passou de 752 (dados constantes na Contagem da População
de 1996) para 853 cidades, de acordo com os dados do Censo Demográfico de 2000. Cresceu,
5
Até 1995, 94% do ICMS repassado aos municípios era proporcional ao valor adicionado fiscal (VAF) e
vinculava-se, basicamente, à atividade econômica de cada município. A Lei nº 12.040 de dezembro de 1995 (Lei
Robin Hood) introduziu novos critérios reduzindo a participação do VAF que, no entanto, permanece como
amplamente majoritário - 88,05% em 1996, 83,46% em 1997, 79,49% em 1998, 79,55% em 1999 e de 79,62% no
ano de 2000 (FJP, 1998:6). Esta Lei introduziu critérios diferenciados de redistribuição dos recursos provenientes
do ICMS para os municípios, dentre eles a capacidade de atendimento em educação infantil e fundamental.
6
Municípios com receita corrente anual superior a média da receita corrente dos municípios mineiros, mais dois
desvio padrão.- 1996
MUNICÍPIOS
Betim
Contagem
Divinópolis
Governador Valadares
Ipatinga
Itabira
Juiz de Fora
Montes Claros
Nova Lima
Poços de Caldas
Sete Lagoas
Timóteo
Uberaba
Uberlândia
Varginha
Receita corrente anual – 1996
151.931.898,67
153.805.884,85
35.062.592,89
41.604.557,99
97.023.079,55
54.783.873,25
157.757.496,76
37.994.122,98
30.318.629,58
46.210.431,32
36.411.769,14
33.945.319,56
69.778.989,49
148.444.968,12
42.260.063,92
Duarte, MRT
Página 93
portanto, o número de municípios com reduzida tributária e dependente das transferências
provenientes do FPM, para o financiamento de sua estrutura administrativa e política sociais.
A permanência da situação de desigualdade fiscal, o aumento do número de municípios
outliers (log10 ≥ 8,0, ou seja, receita corrente líquida superior a R$100 milhões) e o crescimento
do número de cidades com receita corrente inferior a média do estado pode ser demonstrado
pelo gráfico de dispersão da receita corrente líquida, relativo ao ano de 2001(GRAF nº 2). Em
2001 verificou-se variabilidade da receita corrente líquida bastante semelhante à encontrada
para a receita corrente em 1996. Com um acréscimo nos valores nominais, que podemos
atribuir à inflação do período e ao crescimento da arrecadação tributária, no intervalo de quatro
anos ocorreu o crescimento do número de cidades com receita corrente liquida anual superior a
R$ 100 milhões e portanto potencialmente aptas a contribuir para um fundo redistributivo7.
7
Municípios com receita corrente líquida anual superior a R$100 milhões - 2001
Municípios
Betim
Contagem
Governador Valadares
Ipatinga.
Itabira
Juiz de Fora.
Montes Claros.
Poços de Caldas
Sete Lagoas.
Uberaba.
Uberlândia
Receita Corrente
Liquida 2001
311.964.690,06
316.869.167,00
131.833.177,11
157.083.813,88
106.228.456,69
274.794.879,41
136.879.835,88
159.154.826,04
100.669.002,09
174.417.990,24
302.483.566,82
Log10 RC Líquida
8,49
8,50
8,12
8,20
8,03
8,44
8,14
8,20
8,00
8,24
8,48
Duarte, MRT
Página 94
9,0
8,5
8,0
7,5
7,0
x = 6,7
6,5
6,0
5,5
Gráfico 2 - Receita corrente líquida (Log10) dos municípios de MG - 2001
Fonte: TCMG
A comparação dos dados referentes a 1996 e 2001, período de implementação de políticas
fiscais redistributivas no estado de Minas Gerais, demonstrou a permanência da situação de
desigualdade fiscal aliada à pequena redução do espectro dessa desigualdade e justifica a
realização de estudos com o objetivo de analisar tanto os critérios norteadores de redistribuição
dos recursos, que constituem os fundos públicos, como os parâmetros de comparação da
composição desses recursos e estrutura de gastos, com vistas ao controle público e institucional
mais efetivo.
A evolução da dispersão da receita corrente dos municípios, demonstrada nos GRAF. n.º 1 e 2,
sugere a necessidade, mas ao mesmo tempo a pouca efetividade, das medidas redistributivas
implementadas no período. Se a dispersão da receita corrente anual revela grande desigualdade
de arrecadação, temos uma informação que advoga favoravelmente à adoção de medidas
redistributivas. No entanto, verificamos que a capacidade financeira dos municípios com maior
arrecadação nominal observa-se bem mais reduzida ao relacionarmos a arrecadação com a
população residente. A receita corrente líquida per capita (FJP: 1998) dos municípios mineiros
em 1996, já apresentava um coeficiente de variação muito menor – 57,7% - ao compararmos
com o coeficiente de variação da receita corrente nominal anual (TAB nº15). A receita corrente
per capita constitui um indicador mais efetivo para comparação da capacidade de investimento
dos governos locais em serviços públicos universais, pois permite aquilatar a disponibilidade
Duarte, MRT
Página 95
do fundo público por habitante. Por este motivo, o utilizamos como indicador da capacidade
fiscal dos municípios acompanhando estudos anteriores já realizados para o estado (FJP: 1998)
Os valores calculados pela Fundação João Pinheiro para o ano de 1996 constituíram a fonte de
informação para elaboramos o gráfico de dispersão da receita corrente líquida per capita8
(GRAF. nº 3). A grande maioria dos municípios apresenta uma receita corrente líquida per
capita inferior à média do estado. São poucos aqueles que possuem capacidade fiscal por
habitante superior a R$ 600,00 por ano (superior à média mais dois desvio-padrão) e, portanto,
capazes de contribuir com recursos para financiar despesas, que resultem na ampliação da
provisão e/ou da qualidade dos bens e serviços públicos destinados a sua população residente.
1.850
1.550
1.250
950
650
350
x= 286,21
50
Gráfico nº 3 - Minas Gerais - Dispersão da receita corrente líquida per capita – 1996
(em reais)
Fonte: FJP/MG
Se os gráficos 1 e 2 apresentam uma dispersão semelhante, indicativa da permanência de uma
situação de heterogeneidade das receitas corrente nominal e, se a receita per capita também
apresentou variação significativa (GRAF. 3), a adoção de políticas redistributivas constituiria
uma medida logicamente congruente com políticas de intervenção mais eqüitativas nesta
realidade. Existiriam, portanto, alguns poucos municípios no estado de Minas Gerais com
8
O estudo da FJP ao analisar a capacidade fiscal dos municípios mineiros utilizou, como um dos indicadores, a
receita corrente líquida (receita corrente + receita de capital - operações de crédito). Os valores de receita corrente
per capita e receita líquida per capita são muito próximos, apresentando pequenas variações apenas nos poucos
municípios que contraíram empréstimos no decorrer do ano.
Duarte, MRT
Página 96
capacidade fiscal ampliada e, portanto, em condições de financiar cidades onde a receita
pública por habitante é muito reduzida.
A dispersão encontrada para a receita corrente líquida per capita (GRAF. nº 3) reafirmou a
importância da adoção de medidas redistributivas. Verificamos também, em relação à receita
per capita, um grande número de municípios - 494 - com capacidade fiscal inferior à média do
estado (R$ 273,74 anuais). No entanto, os valores do fundo público por habitante não se
apresentaram tão desiguais (s = ±160,39 e cv = 58,5, TAB nº 15), como sugerem os gráficos de
receita corrente nominal. A capacidade fiscal por habitante dos municípios mineiros para o
financiamento dos serviços sociais, embora desigual, não apresentava em 1996, quando da
introdução das primeiras medidas redistributivas, desigualdade tão grande quanto a encontrada
em relação à dispersão da receita corrente anual.
5.000,00
4.000,00
3.000,00
2.000,00
1.000,00
x = 581,00
0,00
Gráfico 4 – Dispersão da receita corrente líquida per capita, em reais dos
municípios de MG – 2001
Fonte: TCMG e IBGE
Os primeiros efeitos das medidas redistributivas podem ser avaliados quando consideramos os
dados de receita corrente líquida per capita relativos a 2001 (GRÁF. nº 4).. A dispersão
observada neste ano revela, simultaneamente, maior concentração dos municípios com valores
médios per capita inferiores a média dos municípios do estado e o crescimento dos valores
médios nominais per capita. Cresceram os valores per capita da receita corrente líquida para
Duarte, MRT
Página 97
todos os municípios em comparação com 1996, mas a dispersão demonstra, também o
crescimento do número de municípios com capacidade fiscal per capita inferior á média no
estado (GRÁF. 3 e 4).
Por outro lado, a redução do coeficiente de variação da receita corrente per capita (de cv
57,7% para 53,7%), no período de 1996 a 2001, sinaliza para uma pequena redução da
desigualdade de capacidade fiscal dos municípios do estado. A criação de novos municípios
neste período constitui um dos fatores que podem ter afetado esta dispersão, como também os
fluxos migratórios inter-regionais no estado. No entanto, a análise estatística efetuada atesta a
permanência de uma situação de desigualdade fiscal no início do século XXI, sugestiva da
permanência e ampliação de medidas redistributivas.
Mas, ao compararmos a receita corrente e a receita corrente per capita de quatro municípios
selecionados neste estudo, verificamos que:
-
03 municípios foram selecionados por serem representativos de grupo de cidade com
receita corrente nominal mais elevada do Estado em 1996 e 2001, sendo um com
receita corrente superior a média mais dois desvio padrão, dois municípios situados em
uma faixa intermediária com receita corrente anual superior a média dos municípios do
estado e, finalmente, um município com receita reduzida, inferior a média do estado ;
-
os mesmos municípios apresentaram, no entanto, situação diferenciada em relação à
receita per capita. Apenas um município apresentou receita corrente per capita
superior a média mais um desvio padrão em 1996 e permaneceu próximo a esta
situação em 2001. Os demais municípios caracterizaram-se por apresentar receita per
capita igual ou inferior a média da capacidade fiscal per capita dos municípios do
estado.
Essa diversidade de situações dos municípios mineiros em relação à receita nominal e receita
per capita produz indagações sobre a sua capacidade contributiva para um fundo
redistributivo. Por este motivo procuramos destacar o que há para redistribuir. Para tanto,
selecionamos os municípios que apresentavam valores per capita mais elevados.
A TABELA 7 identifica, para 1996 e 2001 os municípios do estado de Minas Gerais, cuja
receita per capita é superior à média mais dois desvios padrão, ou seja R$594,80, portanto com
Duarte, MRT
Página 98
capacidade fiscal por habitante que permitisse financiar um fundo público redistributivo. Estes
municípios representavam apenas 3% dos municípios mineiros em 1996 e 20019.
TABELA 7
Municípios com receita corrente líquida per capita superior a média dos municípios do
estado, mais dois desvio padrão – Minas Gerais
1996
Municípios
Água Comprida
Antônio Prado de Minas
Araporã
Betim
Cachoeira Dourada
Carneirinho
Cascalho Rico
Cedro do Abaeté
Congonhas
Consolação
Doresópolis
Douradoquara
Grupiara
Ipiaçu
Onça do Pitangui
Paiva
Pedra Dourada
Pedro Teixeira
Pirajuba
Rochedo de Minas
Santa Vitória
São Francisco de Sales
São José da Varginha
São Sebastião do Rio Preto
Seritinga
Serra da Saudade
Tapira
Vargem Bonita
X
S
9
2001/2000
Municípios
RC per capita
RC per capita
1.027,60
626,05
834,22
609,07
1.295,37
669,84
1.267,76
801,63
703,22
637,73
866,84
1.214,01
1.778,40
617,21
603,46
712,10
680,45
654,86
681,04
611,81
595,11
658,41
621,91
678,12
623,17
1.370,35
1.039,34
688,64
Água Comprida
Araporã
Belo Oriente
Cachoeira Dourada
Carmésia
Carneirinho
Cascalho Rico
Cedro do Abaeté
Comendador Gomes
Consolação
Doresópolis
Douradoquara
Fortaleza de Minas
Fronteira
Grupiara
Indianópolis
Ipiaçu
Olímpio Noronha
Paiva
Passabém
Pedra Dourada
Pedrinópolis
Pirajuba
Rochedo de Minas
Santa Vitória
São João Batista do Glória
Serra da Saudade
Simão Pereira
1.928,23
3.197,61
1.245,33
4.240,06
1.260,92
2.597,65
1.532,31
1.637,14
1.207,13
1.227,15
1.796,75
1.656,40
1.329,63
1.346,87
2.388,28
1.237,07
1.673,69
1.229,44
1.298,27
1.301,19
1.270,04
1.311,38
1.358,22
1.280,02
1.289,49
1.282,20
2.541,65
1.237,59
827,42
±301,12
Tapira
Tapiraí
1.909,29
1.290,84
Ao considerar como critério de seleção os municípios que apresentam receita per capita superior a média mais
dois desvio padrão, este estudo estabeleceu um parâmetro da variação para uma comparação entre os municípios
do estado de Minas Gerais. Como critério comparativo de desigualdade intermunicipal a seleção dos municípios
outliers, tem por objetivo estabelecer as possibilidades de um esforço redistributivo no estado, a partir das
condições fiscais já presentes entre os municípios de Minas Gerais. Observa-se, ainda que os cálculos da CNTE,
nos termos do art. 6º da Lei nº 9424/96, estabeleciam, para o ano de 1996 o valor de R$419,00 para o custo mínimo
anual do aluno do ensino fundamental, enquanto decreto presidencial fixava em R$315,00, este valor para o
mesmo ano. Neste estudo, o valor considerado como parâmetro per capita deveria financiar todos os serviços
públicos municipais à população.
Duarte, MRT
Cv
Página 99
36,40%
X
1.670,06
S
±695,63
Cv
41,65%
* RC líquida referente a 2001 e pop. residente
referente a 2000.
Em 2001, o número de municípios com capacidade contributiva per capita foi pouco
acrescido, passando de 28 cidades para 30. Neste ano os valores per capita apresentaram um
crescimento sensível em relação ao 1996, indicativo do crescimento da arrecadação de tributos
em todos os municípios. Novamente, o coeficiente de variação da receita demonstrou a
amplitude da distribuição dos recursos per capita desses municípios, no entanto com níveis de
desigualdade sensivelmente inferiores aos da receita corrente nominal anual. Os valores per
capita (TAB nº 16) desses municípios em relação aos demais, reafirmaram possibilidades de
contribuição para um fundo redistributivo, visto disporem, em média, de recursos per capita
para investimentos duas vezes superiores à média do conjunto dos municípios do estado.
Se excetuarmos a cidade de Betim, com valores cinco vezes superiores a receita de Congonhas
(em segundo lugar), a média aritmética das receitas anuais desses municípios reduziu-se (para
R$ 3.485.132,56, cv 160,2) (TAB nº. 16 e ANEXO II). Estes municípios dispõem de
capacidade fiscal per capita ampliada e, portanto, estariam em condições de contribuir para um
fundo redistributivo. No entanto, ao considerarmos o montante de contribuição passível de ser
arrecadada, verificamos, que estes recursos não são capazes de alterar de modo substantivo o
coeficiente da desigualdade fiscal existente entre os municípios mineiros. Apenas eliminam
alguns poucos pontos mais externos em um gráfico de dispersão da receita, ou seja, ”Robin
Hood” não teria muito que redistribuir, face o número de cidades e dimensões da população a
serem assistidas.
O reduzido número de municípios com renda per capita acima de R$ 594,80 (média mais dois
desvio padrão) e o baixos valores nominais de receita corrente dos municípios com receita per
capita superior a R$ 800,00 (TAB nº 16) sugerem a insuficiência de políticas redistributivas
sob a base de financiamento dos recursos públicos municipais para o estado de Minas Gerais,
pois os valores disponíveis para a constituição de fundos redistributivos são bastante reduzidos.
4. 5 Política de financiamento da educação e justiça redistributiva
A lei estadual nº 12.040, de dezembro de 1995, recebeu ampla cobertura televisiva e
jornalística no estado, e ficou conhecida como “Lei Robin Hood”, por possibilitar
Duarte, MRT
Página 100
redistribuição dos recursos originários da arrecadação de ICMS10 como expressão da ação
reguladora do Estado. Esta Lei introduziu critérios diferenciados para distribuição da quota
parte dos municípios relativa à arrecadação do ICMS, com fundamento na adoção de critérios
redistributivos capazes de minimizar desigualdades intermunicipais.
No entanto, a engenharia operacional da Lei Robin Hood difere da Lei federal nº 9424/96, que
criou o FUNDEF, quanto à definição dos mecanismos de redistribuição fiscal. Ambas adotam
medidas de redistribuição, mas a Lei do FUNDEF pressupunha a existência de um número
significativo de municípios com capacidade contributiva para um fundo redistributivo. Ou seja,
a chamada Lei Robin Hood redireciona parcela dos recursos de municípios, que mais
contribuem com a arrecadação do ICMS, para aquelas cidades com maiores investimentos na
preservação do patrimônio ambiental e cultural, no atendimento à educação infantil e
fundamental, etc. ou observando critérios compensatórios como população e área cultivada.
Por sua vez, a Lei de FUNDEF pressupõe a existência de cidades com elevada receita fiscal
(impostos + transferências) e reduzido atendimento no ensino fundamental. A efetividade
redistributiva do FUNDEF no estado de Minas Gerais, pressupõe a combinação de municípios
com alta arrecadação tributária e capacidade fiscal (receita corrente líquida, per capita) em
níveis superiores à média do estado.
Ao analisarmos a composição da receita dos municípios com elevada receita corrente per
capita no período 1996-2001 - verificamos a origem das receitas que podem contribuiu
para a constituição de um fundo redistributivo e sua repercussão sobre o FUNDEF (TAB.
nº 16). Um reduzido número de municípios agrega recursos ao Fundo estadual do ensino
fundamental, na sua grande maioria, essas cidades recebem recursos do FUNDO. A Lei nº
9424/96 equalizou recursos já disponíveis para manutenção e desenvolvimento do ensino,
restringindo a capacidade de atendimento dos municípios com maior disponibilidade fiscal,
sem necessariamente favorecer a expansão dos recursos em cidades com reduzida
disponibilidade (inferior a média da receita corrente líquida dos municípios do estado). Seu
mecanismo estabelece um efeito perverso do fundo público de ensino fundamental (FUNDEF),
agravado pela interpretação estabelecida no Ministério da Educação para o artigo 6º da Lei
9424/96, pois apenas eliminou a existência de municípios com capacidade ampliada de
10 Esta Lei foi revogada em 2000 pela Lei estadual nº LEI 13.803, DE 27 DE DEZEMBRO, que, no entanto,
mantêm os princípios da legislação anterior alterando, apenas, alguns dos critérios de distribuição.
Duarte, MRT
Página 101
atendimento, sem alterar significativamente o gasto médio disponível para o ensino
fundamental.
A adoção de políticas fiscais redistributivas nos moldes do FUNDEF pressupõe a existência de
cidades com capacidade de atendimento ampliada (CAA) de prestação de serviços e atividades,
como também de municípios com essa capacidade de atendimento esgotada (CAE), para a
prestação dos serviços sob sua responsabilidade. No segundo ano de implantação do FUNDEF
e quarto ano de atuação da chamada Lei Robin Hood o coeficiente de variação da receita
corrente líquida per capita sofreu uma redução de 57,7 % para 50,3 %, valores pouco
expressivos, porém sugestivos de redução das desigualdades intermunicipais, no período 1996
a 2001, pela restrição de outliers.
Os estudos comparativos desenvolvidos por ESPING-ANDERSEN (1989 e 199..) destacam a
importância de apreender as diferenças nas formas específicas de gestão dos gastos
governamentais. Aplicamos esta recomendação às diferenças na adoção de medidas
redistributivas. Para apreender o processo de redistribuição de recursos aliado à ampliação da
qualidade na prestação dos serviços, destacamos e analisamos, em primeiro lugar, qual
desigualdade queremos reduzir – in casu capacidade fiscal per capita - para, em um segundo
momento, estudar a estruturação dos gastos efetuados. A seleção desta primeira variável como
independente para análise dos efeitos redistributivos do FUNDEF pressupõe que o acréscimo
no grau de cobertura do ensino fundamental é acompanhado de possíveis melhorias das
condições infraestruturais, por aumento de receita.
No entanto, verificamos que aqueles municípios que dispõe de maior capacidade fiscal, em sua
maioria, também receberam recursos do FUNDO. Municípios com população reduzida e
muitos com recursos provenientes basicamente do FPM não dispõem de receita anual em
valores insuficientes para contribuir para um fundo redistributivo.
TABELA 8
Composição percentual da receita arrecadada - Municípios com maior receita corrente
líquida per capita do estado de Minas Gerais– 1999
Municípios
Água Comprida1
R
R
Transf. União /
Transf.
Tributária/RC Impostos/RC
RC (%)
Estado/RC (%)
(%)
(%)
2,77
2,76
43,6
36,75
Antônio Prado de Minas1
1,59
0,65
68,8
24,26
Araporã1
2,02
1,37
16,3
68,37
13,74
11,23
12,4
59,85
Belo Oriente
Duarte, MRT
Betim
Cachoeira Dourada
Carmésia
Carneirinho
Cascalho Rico
Cedro do Abaeté
Comendador Gomes
Congonhas
Consolação
Doresópolis
Douradoquara
Fortaleza de Minas
Fronteira
Grupiara
Indianápolis
Ipiaçu
Olímpio Noronha
Onça do Pitangui
Passabém
Paiva
Pedra Dourada
Pedrinopolis
Pedro Teixeira
Pirajuba
Rochedo de Minas
Santa Vitória
São Francisco de Sales
São João Batista do Glória
São José da Varginha
São Sebastião do Rio Preto
Seritinga
Serra da Saudade
Simão Pereira
Tapira
Tapiraí
Vargem Bonita
Página 102
13,57
0,65
1,04
5,51
1,04
0,84
2,77
7,12
1,01
1,61
1,17
6,72
5,17
0,19
3,30
2,63
2,20
2,24
0,78
1,43
1,08
1,54
0,68
1,80
1,17
5,13
4,80
2,64
3,76
0,90
1,52
0,39
2,77
4,06
1,92
1,90
11,87
0,23
0,71
3,17
0,34
0,20
1,86
3,65
0,28
0,78
0,34
6,54
4,76
0,18
2,94
0,94
0,73
0,86
0,11
0,34
0,45
0,49
0,13
1,63
0,31
3,34
3,83
0,82
2,22
0,21
0,49
0,09
2,47
3,65
1,06
0,95
13,8
27,4
49,4
27,9
45,8
79,9
46,5
30,4
68,9
68,3
56,1
35,2
35,0
46,0
52,9
31,9
72,5
64,3
86,3
75,3
79,7
35,0
80,2
56,9
79,9
29,7
35,7
21,6
57,6
79,0
71,6
74,3
78,6
31,4
74,3
68,9
68,80
52,68
39,08
42,76
16,39
13,75
43,89
54,75
13,03
22,28
12,58
31,69
54,49
12,72
36,59
44,59
22,51
27,06
12,36
20,32
13,23
23,77
16,98
39,56
13,56
46,01
26,42
58,50
38,62
18,31
19,40
17,77
13,96
42,63
15,50
21,98
Fonte: Demonstrativo da receita arrecadada – Prefeituras Municipais
1 Os dados referem-se ao ano de 1998
A literatura sobre financiamento da educação no Brasil tem destacado o papel indutor do
FUNDEF à municipalização do ensino fundamental e a engenhosidade de sua arquitetura
política, que permitiu ao governo federal descompromissar-se de maiores investimentos
diretos para com a educação básica (Bassi, 2001:54; Oliveira, 1999; Dourado, 1999; Bassi
& Gil, 1999; Monlevade & Ferreira, 1998). Esta análise da dispersão e composição da
receita per capita dos municípios do estado de Minas Gerais aponta, entretanto, que a
Duarte, MRT
Página 103
função redistributiva do FUNDO é pouco efetiva, para a promoção de melhorias na
qualidade de prestação dos serviços, no Estado de Minas Gerais.
Ao divulgar o segundo balanço do FUNDEF, abrangendo os três primeiros anos de
implantação do Fundo, o então Ministro da Educação destacava:
...o volume de recursos redistribuídos pelo FUNDEF pode ser
obtido comparando-o com o volume de recursos do Fundo de
Participação dos Municípios, o FPM: 16% em 1998 devendo
alcançar 21% em 2000. Considerando-se apenas o conjunto dos
municípios que tem um ganho líquido de recursos com o FUNDEF,
esse volume deve alcançar o equivalente a 32% do FPM desses
municípios (MEC, 2002)
No entanto, no conjunto dos municípios que informaram ganho líquido com o FUNDO no
estado de Minas Gerais, encontramos também cidades com capacidade fiscal (receita
corrente líquida per capita) superior a média dos municípios mineiros mais dois desvio
padrão.
4.6
Mecanismos
redistributivos
e
redução
das
desigualdades
intermunicipais
O ponto em debate refere-se à análise dos efeitos do FUNDEF , como instrumento de
justiça redistributiva para redução das desigualdades intermunicipais. A justificativa da
importância redistributiva do FUNDO presente no Balanço do FUNDEF, 1998-2000
(MEC, 2002:16-28) considera:
a) os recursos vinculados à educação disponíveis em cada esfera de governo não
guardavam qualquer correspondência com o número de alunos atendidos pela
respectiva rede de ensino;
b) os municípios mais ricos, situados nas regiões mais desenvolvidas do país, não
aplicavam 25% das suas receitas no ensino obrigatório e na educação infantil;
c) nos municípios mais pobres, para acentuar as iniqüidades, os recursos vinculados à
educação não eram suficientes para assegurar a oferta de um Ensino Fundamental
que obedecesse a padrões mínimos de qualidade e ampla cobertura da demanda;
d) foram
intensamente
beneficiados
os
municípios
maiores
das
regiões
metropolitanas, onde também persistem elevados graus de carências educacionais,
sobretudo em suas extensas periferias. No entanto, em Salvador e Belo Horizonte,
no primeiro ano de implantação do Fundo, ocorreram reduções de receitas,
Duarte, MRT
Página 104
respectivamente, de 19% e de 17%. Essas regiões, todavia, passaram a obter ganhos
financeiros já a partir do segundo ano, por força da aceleração da municipalização
das escolas.
Em relação ao estado de Minas Gerais verificamos que os recursos vinculados à educação
(impostos e transferências) guardam relação com a capacidade fiscal dos municípios, no
entanto elevada capacidade fiscal não tem correspondência com o montante da receita
arrecadada. Os municípios “ricos” do estado não dispõem de capacidade contributiva
suficiente para reduzir iniqüidades no atendimento presentes nos municípios mais pobres.
E por último, o repasse de recursos do Fundo beneficia municípios considerados “ricos”.
A estratégia política de subvincular, aproximadamente, 15% das receitas de transferências
dos estados e municípios ao número de alunos matriculados no ensino fundamental produz,
nos termos do discurso legitimador do FUNDEF a equalização dos gastos por aluno,
reduzindo disparidades intermunicipais, mas, acrescentamos sem atacar a insuficiência
desses recursos, por não alterar significativamente os valores médios per capita
disponíveis para investimentos em educação no conjunto do Estado. Equalizou-se recursos
disponíveis, mas “Robin Hood” não dispunha de um fundo público suficiente capaz de
alterar a situação dos do grande número de municípios com capacidade fiscal inferior à
média do estado.
Às vertentes de análise que propugnaram por maior racionalidade administrativa como
diretriz de democratização da educação, os estudos efetuados sobre dispersão e
redistribuição de recursos públicos nos municípios apontam a importância de atentarmos
para as escolhas políticas que efetuamos no processo de elaboração dos instrumentos de
intervenção política. O modus operandi da gestão administrativa não articula
“automaticamente” diretrizes, meios e resultados. Para obter um efeito redistributivo mais
efetivo, pressupõe-se uma definição politicamente orientada e focalizada dos chamados
“municípios ricos” vis a vis com os “municípios mais pobres”.
5. SISTEMAS PÚBLICOS DE ENSINO E CAPACIDADE DE ATENDIMENTO1
Em Minas Gerais o Censo demográfico de 2000 indicava a presença de 5 865 270 crianças
e jovens com idade entre 1 a 17 anos. Faixa de escolaridade correspondente à educação
básica, neste grupo etário encontra-se 32.8% do total da população residente no estado.
Esta percentagem é semelhante à encontrada para o país como um todo - 34,0% do total da
população brasileira.2 No entanto, e de modo semelhante ao país, esta população reside em
cidades com dimensões bastante diferenciadas.
Os dados do Censo 2000 reafirmam o predomínio quantitativo dos municípios com menos
de 10.000 habitantes no estado3. A grande maioria dos municípios mineiros - mais de 75%
- apresenta população inferior a 20.000 habitantes (TAB. nº. 9), sendo que 130 novos
municípios foram desmembrados e criados na década de 904. Existem atualmente no Brasil
5.561 municípios, 1070 foram criados após a Constituição de 1988, e do total de
municípios brasileiros apenas 411 são considerados urbanos de acordo com os critérios da
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE (Baima, 2002).
Tabela nº 9 - MINAS GERAIS, agrupamento dos municípios segundo a população residente 2000
orde
grupos
Média
desvio padrão coeficiente de
nº de
m
variação
municípios
1
pop < x
2
pop > x e pop <
1s
pop >(x+1s) e
pop < (x+1s)
pop > (x+2s) e
pop < (x+3s)
pop > (x+3s)
3
4
5
7.270 hab
±4.162
57,30%
673
26.222 hab
±6.141
23,40%
110
60.951 hab
±11.962
19.60%
40
101.237hab
±11.754
11,60%
14
268.000hab
±132.554
49,50%
15
Fonte: IBGE.
1
Em 1996, em 48,5% do total dos municípios de Minas Gerais, 365, a participação da cota-parte do FPM na
receita corrente variava entre 60 e 80%, demonstrando o pouco dinamismo de suas economias (FJP: 1998.
p.42)
2
IBGE/Censo 2000.
3
Um município é composto por um ou mais distritos, sendo um definido como distrito-sede. Neste estudo a
população residente considerada refere-se sempre à população total do município. Os termos município e
cidade são utilizados de modo indistinto neste trabalho.
4
Em 1990 o estado de Minas Gerais contava com 723 municípios criados e instalados, em 1996 eram 756
municípios instalados e mais 97 não instalados, perfazendo no censo demográfico de 2000, 853 municípios
criados e instalados no estado.
Duarte, MRT
Página 106
Após agrupar os municípios de acordo com a população residente, verificou-se a
preponderância numérica das pequenas cidades, com população inferior a 10.000
habitantes (Grupo 1, TAB. nº 9). Estes dados indicam, ainda, a subdivisão da população
residente do estado em dois grandes grupos. Os habitantes das pequenas cidades, com
população inferior a 10.000 habitantes, onde residiam 46,6% da população do estado no
ano 2000 e aqueles que vivem em cidades de grande porte. Embora não sejam
numericamente expressivos, em municípios com população superior a cinqüenta mil
habitantes residem 41,5% da população do estado5. Verifica-se nesses dois grupos de
municípios maior variabilidade de seus contingentes populacionais (TAB nº 9), o que
traduz diferenças mais significativas quanto à demanda por educação, às transferências
intergovernamentais e atendimento existente.
Esta dupla situação influencia a autonomia político-educativa dos sistemas de ensino, por
afetar a composição de suas receitas6 e condicionar o atendimento prestado. Para a maioria
dos pequenos municípios, a receita fiscal provém basicamente de transferências
intergovernamentais. Esta realidade pode ocasionar, por um lado, maior isolamento e
fragmentação dos sistemas municipais com situações ainda mais precárias dos padrões de
qualidade infraestruturais. Por outro lado, pode incitar à interação entre cidades, com a
formação de sistemas únicos de ensino complementares. Estes efeitos decorrem de ações
políticas frente a realidades de desigualdades. No entanto, essas ações no conjunto das
relações intergovernamentais podem observar parâmetros de intervenção reguladora.
5
Pop. residente em MG = 17.891.494, população residente em cidades com até 10.000 habitantes =
15.652.968, ou seja, 87,5% do total da população do estado (IBGE/Censo 2000). População residente no total
dos municípios pertencentes ao 5ª agrupamento, incluindo o município da capital = 7.032.473, ou seja 39,3%
do total..
6
Sem desconhecer a lógica política de proliferação dos municípios brasileiros que ocorreu após a aprovação
da Constituição de 1988, a reflexão sobre capacidade de atendimento e relações intergovernamentais
considera que a adoção de medidas de caráter top down para a extinção de municípios deficitários (ver
Bressan, 2002) enfrentariam fortes resistências das populações locais.
Duarte, MRT
Página 107
5.1 Caracterização dos municípios selecionados
Os municípios selecionados para pesquisa observavam as seguintes características sóciodemográficas:
CAA 1 - localiza-se na região sul de Minas Gerais e nesta região habita 13% da população
total do estado. Trata-se de um dos vinte municípios de estado com maior receita corrente
líquida, desde 1996, no entanto sua receita corrente per capita aproxima-se da média dos
municípios do estado. Cidade de porte médio, situa-se em uma região e apresenta índices
de qualidade de vida superiores aos da grande maioria dos municípios do estado
CAA 2 - situa-se na região central onde concentra 36% da população mineira. Este
município encontra-se entre os 20 mais populosos do estado, apresenta receita corrente per
capita dentre as mais elevadas dos municípios mineiros e índices de qualidade de vida
superiores aos dos demais municípios da região.
CAE 1 - localiza-se na região noroeste e trata-se de uma cidade de médio porte, com
população superior a 20.000 habitantes. Receita corrente per capita inferior a média dos
municípios do estado, situa-se em região geográfica com baixos índices de qualidade de
vida e apresenta índices semelhantes ao de sua região.
CAE 2 - localiza-se na região de planejamento Jequitinhonha/Mucuri. Regiões com
estrutura econômica fortemente voltada para atividades agrícolas, com municípios menores
que apresentam baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). CAE 2 apresenta
população inferior a 10.000 habitantes situando-se no último agrupamento dos municípios
mineiros de acordo com sua população residente, e um dos mais baixos valores de receita
corrente per capita dentre os municípios do estado.
Em termos populacionais, CAA 1 e CAE 2 são representativos dos municípios de médio
porte, sendo o primeiro localizado em uma região geográfica que dispõe de elevados
padrões de qualidade de vida e o segundo em uma das regiões mais pobres do estado (ver
ANEXO III). No entanto, estes municípios diferem quanto à capacidade fiscal, sendo CAA
1 superior a média do estado e CAE 2 inferior à mesma média.
CAA 2 caracteriza-se por ser um município de grande porte populacional e elevada
capacidade fiscal, enquanto que CAE 2 é representativo do grande número de pequenos
municípios com baixa capacidade fiscal.
00000
Duarte, MRT
Página 108
5.2 A demanda por educação básica: população residente, idade e
escolarização em quatro municípios de Minas Gerais
Como se processou o atendimento em educação básica, em quatro municípios, no período
entre 1996 e 2000? A resposta a esta questão inicia-se por um diagnóstico sobre a
demanda. A escolarização da população residente, especialmente das faixas etárias
correspondentes à educação básica, deve ser levada em consideração na definição das
prioridades e recursos governamentais para os diferentes níveis e modalidades. Se o
objetivo é indagar sobre a capacidade de atendimento dos governos locais na efetivação do
direito à educação básica, a identificação dos índices de cobertura existentes
(inclusão/exclusão na e da escola) permite dimensionar e avaliar o esforço político e
financeiro a ser empreendido.
Nos termos da Lei de Diretrizes e Bases o comportamento prévio (esforço fiscal realizado
e capacidade de atendimento) dos governos locais deve condicionar o aporte de recursos e
programas educacionais de caráter supletivo e/ou redistributivo. Se o número de residentes
influencia a captação de recursos via tributação direta ou por diferenciar percentuais das
transferências obrigatórias, este fator há de ser considerado para aquilatar a capacidade de
atendimento dos sistemas públicos locais de educação básica. Uma avaliação
contextualizada do esforço fiscal de um município requer relacionar sua capacidade fiscal à
demanda por escolarização futura.
TABELA 10
População residente, segundo a faixa etária, em quatro municípios do estado de
Minas Gerais
Pop. de 0 a 4
Pop. de 5 a 9
Pop. de 10 a 19
Pop. Residente
Município
anos
anos
anos
1996
CAA 1
CAA 2
2000
93.166 106.776
1996
2000
1996
2000
1996
2000
8.506
9.245
8.490
9.423 18.014 20.038
249.451 306.675 27.728 32.802 28.484 32.284 56.716 65.399
CAE 1
50.139
36.720
5.108
3.325
5.773
3.561 12.422
8.402
CAE 2
10.216
10.204
1.319
952
1276
1.113
2.585
2.445
Fonte: IBGE - Contagem da população 1996 e Censo 2000, resultados preliminares
Três dos municípios selecionados são representativos da diversidade populacional
existente entre as cidades maiores - CAA 1, CAA 2 e CAE 1 - , enquanto que CAE 2 situa-
Duarte, MRT
Página 109
se no grupo das mais de 75% das cidades mineiras com população inferior a 10.000
residentes. Nas duas maiores cidades pesquisadas, ocorreram taxas positivas de
crescimento da população residente (CAA 1 e CAA 2) em um período de quatro anos,
enquanto que CAE 1 apresentou para o mesmo período diminuição significativa de sua
população.
TABELA 11
Taxa de crescimento da população residente, segundo a faixa etária em quatro
municípios do estado de MG
Pop. de 0 a 4
Pop. de 5 a 9
Pop. de 10 a 19
Pop. residente
Município
anos
anos
anos
1996/2000
1999/2000
1996/2000
19996/2000
CAA 1
14,6
8,7
11,0
11,2
CAA 2
22,9
18,3
13,3
15,3
CAE 1
-26,8
-34,9
-38,3
-32,4
CAE 2
-0,1
-27,8
-12,8
5,7
Fonte: IBGE/Contagem da população 1996 e Censo 2000, resultados preliminares
A tendência de crescimento da população residente por idade e por faixa etária condiciona
a transferência de recursos provenientes do FPM e influencia, em longo prazo, a
distribuição dos recursos do FUNDEF. Para as cidades identificadas como CAE 1 e CAE 2
os dados censitários apontam uma tendência de redução de seus percentuais relativos no
Fundo de Participação dos Municípios.
A estruturação do regime de colaboração entre os entes federados inicia-se pelo
reconhecimento da demanda existente pelo direito à educação básica7. Em relação ao
estado de Minas Gerais, a demanda por educação básica localiza-se em um grande número
de pequenos municípios dispersos pelo território. A evolução do crescimento da população
residente, de acordo com o porte dos municípios constitui um primeiro critério capaz de
fundamentar decisões quanto às obrigações e aos investimentos comuns a serem efetivados
pelos entes federados. Um critério orientador do aporte de recursos técnicos e financeiros
7
A forma de colaboração entre Estados e Municípios para a oferta de ensino fundamental deve assegurar
distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos
financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público (inc. II, art. 10 LDB). Este princípio
contido na LDB difere do critério estabelecido para a distribuição dos recursos dos FUNDEF, A distribuição
dos recursos, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, dar-se-á, entre o Governo Estadual e os
Governos Municipais, na proporção do número de alunos matriculados anualmente nas escolas cadastradas
das respectivas redes de ensino, considerando-se para esse fim (§ 1º , art. 2º, L. 9424/96).
Duarte, MRT
Página 110
aos governos locais deve relacionar-se aos movimentos migratórios da população no(s)
município(s). Direcionar recursos para cidades com forte crescimento populacional e/ou
com população migrante atende ao princípio de territorialização das políticas sociais.
5.2.1 Demanda e atendimento em educação básica
Outro princípio a ser observado, para a efetivação do regime de colaboração relaciona-se
ao percurso de atendimento8 pelas diferentes etapas e modalidades da educação básica.
Este termo explicita como os entes federados cumprem a prestação de serviços
educacionais de acordo com suas competências. O regime de colaboração, como também o
exercício da ação supletiva e redistributiva deverão, nos termos da Lei de Diretrizes e
Bases, observar este segundo critério como um parâmetro para o esforço fiscal efetuado.
A apreensão do percurso de atendimento em educação básica nos municípios pesquisados,
onde se inclui a oferta regular do ensino obrigatório, observa as características
apresentadas nos Quadros nº 5, 7, 9 e 11 (ANEXO III). Estas tabelas foram elaboradas,
com adaptações, a partir do modelo estabelecido por Ferraro (1999). Este autor ao realizar
diagnóstico da escolarização de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos no Brasil utilizou-se
das categorias “exclusão da escola” e “exclusão na escola” para reunir uma série de
fenômenos, que relacionam escolarização e condicionantes sociais.
Entendia que a noção de exclusão, desdobrada nas
categorias exclusão da escola e exclusão na escola, podia dar
unidade teórica a toda uma série de fenômenos, correntemente
conhecidos como não acesso à escola, evasão, reprovação e
repetência, todos relacionados com o processo escolar, mas tratados
com freqüência de forma estanque. A exclusão escolar na forma de
exclusão da escola compreende tanto o não acesso à escola, quanto
o que habitualmente se denomina evasão da escola. Já a categoria
exclusão na escola dá conta da exclusão operada dentro do
processo escolar, por meio dos mecanismos de reprovação e
repetência. (Ferraro, 1999: 24)
8
O termo “percurso de atendimento” sintetiza como se efetiva a oferta de educação escolar básica em um
município. Distinto da concepção de percurso escolar individual, o emprego deste termo refere-se à oferta
efetiva para o atendimento da população residente de acordo com a idade, medida por anos de estudo. O
parágrafo 2º do art. 208 da Constituição Federal importa em crime de responsabilidade da autoridade pública
competente a oferta irregular do Ensino Fundamental. Este dispositivo pressupõe uma oferta contínua e
estável do ensino obrigatório de acordo com as características da população de um Estado e/ou município.
No entanto, a efetivação da oferta regular do Ensino Fundamental tem repercussões na educação infantil e no
ensino médio. O percurso de atendimento retrata qual a oferta de ensino efetiva em um determinado sistema.
Duarte, MRT
Página 111
A partir dessas categorias Ferraro (1999) elaborou um modelo para diagnóstico da
escolarização, tendo como fonte principal os dados censitários da Contagem da População
1996. Este modelo foi readaptado para os fins deste estudo, considerando as competências
atribuídas à União, estados e municípios na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases9.
Por este motivo, a categoria de exclusão escolar (excluídos da escola) compõe-se das
crianças e jovens que nunca freqüentaram escolas ou com freqüência igual ou inferior a
quatro anos de estudos (excluídos da escolaridade obrigatória – Quadros nº 5,7, 9 e 11,
Anexo III).
Modelo para diagnóstico da escolarização
Ferraro, 1999: 28
Modelo adaptado para análise da
capacidade de atendimento dos sistemas
públicos municipais
Excluídos da escola
e/ou
percurso
até
insuficiente
de
Nunca freqüentaram
Não freqüência à
escola
Freqüência
fortemente defasada
Freqüência
levemente defasada
Freqüência na série
Excluídos da escola
Excluídos na escola
Freqüência
quatro
anos
estudos
Freqüência
fortemente defasada
Excluídos na escola
(idade/série)
e/ou oferta de
Freqüência
entre percurso irregular
cinco e oito anos de
estudo
Freqüência
Incluídos/ integrados levemente defasada Incluídos/integrados
na escola
na escola
Freqüência na série
9 Deve-se considerar a idade recomendada para cada série/nível de ensino, ou seja, 7 anos para a 1ª série do ensino fundamental, 8 anos
para a 2ª série e assim sucessivamente. O Censo Escolar coleta o ano de nascimento do aluno, com isso durante o ano o aluno pode
mudar de idade permanecendo na mesma série, por exemplo, é considerado aluno com distorção idade/série na 1ª série aquele que tem
idade acima do intervalo entre oito e nove anos (nascidos antes de 1988), conforme tabela abaixo
Ano de Nascimento
Idade em 1996
Após 1989
Até 6
1989
6a7
1988
7a8
191987
8a9
1986
9 a 10
1985
10 a 11
1984
11 a 12
1983
12 a 13
1982
13 a 14
Antes de 1982
14 ou mais
Fonte: MEC/INEP - Sinopse EB 1997. p. 131
(*) Para a 8ª série, seria adequado o ano de 1981 e não antes de 1982
Série adequada
1ª
2ª
3ª
4ª
5ª
6ª
7ª
8ª
Duarte, MRT
Página 112
esperada
esperada
Freqüência
antecipada na
relação série/idade
esperada
Freqüência
antecipada
na
relação série/idade
esperada
Os dados censitários de 1996 permitem precisar por município o número de crianças e
jovens que nunca freqüentaram escolas ou com escolarização precária - inferior a quatro
anos de estudos. Os procedimentos metodológicos adotados por Ferraro (1999) foram,
também, adaptados. De modo semelhante, os dados absolutos foram organizados por tipo
de freqüência, série, nível, modalidade da educação básica e segundo a idade - ver Quadros
nº 5,7, 9 e 11, Anexo III. Estes dados constituíram a base para elaboração dos percentuais
de atendimento por idade, para cada um dos municípios pesquisados (ver Quadros nº 4, 6,
8 e 10, Anexo III).
A exclusão da escola encontra-se em todos os municípios pesquisados (Quadros nºs 4, 6, 8
e 10), com índices expressivos para a faixa etária compreendida no ensino obrigatório e
alarmantes para a educação pré-escolar e ensino médio.
A Lei de Diretrizes e Bases responsabiliza a autoridade pública pela garantia da oferta
regular do ensino obrigatório e a constatação da existência de crianças e jovens excluídos
na escola, requer a adoção de formas de superação desta condição. Neste sentido, e nos
termos da LDBEN, o poder público municipal, é responsável pela adoção de programas
voltados para assegurar a permanência mínima de oito anos no ensino fundamental (art. 5º,
LDB). No entanto, ainda, de acordo com a LDBEN, para os municípios que apresentarem
capacidade de atendimento esgotada, deve-se estabelecer a co-responsabilidade entre as
instâncias estaduais e municipais, de modo a assegurar a oferta regular para todos de oito
anos de escolaridade (inc. II, art.10, LDBEN). Normas orientadoras do aporte de recursos
devem indicar procedimentos para assegurar o direito de permanência por este período, a
partir da avaliação da capacidade fiscal do município.
As informações censitárias permitiram desagregar a exclusão da escola em dois grupos.
Aqueles que nunca freqüentaram e um segundo grupo com percurso insuficiente. A
exclusão pela realização de percurso insuficiente - crianças e jovens que freqüentaram um
período de escolaridade igual ou inferior a quatro anos ou, que nunca freqüentaram
(Quadros nºs 4, 6, 8 e 10 – ANEXO III), acrescenta à responsabilidade do poder público
Duarte, MRT
Página 113
municipal e estadual a oferta de ensino fundamental na modalidade da educação de jovens
e adultos.
Em 2000, os quatro municípios pesquisados apresentavam taxas diferenciadas de
alfabetização da população residente com mais de dez anos
TABELA 12
Taxa de alfabetização da população residente com mais de 10 anos, em quatro
municípios de Minas Gerais – 200010
Municípios
Alfabetizados/pop.residente
CAE 1
78,7%
CAE 2
73,5%
CAA 1
94,2%
CAA 2
92,3%
Minas Gerais
Fonte: Censo demográfico 2000/IBGE
89,1%
O dados obtidos no censo demográfico realizado em 2000 sugerem a permanência entre a
faixa etária da escolaridade obrigatória, a sua existência entre jovens de 15 e 16 anos é
indicativa de uma oferta escolar incapaz de assegurar um atendimento adequado. Tanto a
exclusão por não ter acesso, quanto a exclusão por um percurso insuficiente são de
responsabilidade dos poderes públicos municipal e estadual (inc. II do art. 10º e inc. V do
art. 11 da LDB), estando atribuído a estas instâncias de governo a resolução desta situação.
Nos termos da Lei de Diretrizes e Bases, cabe, ainda, aos municípios a oferta pública da
educação infantil (inc. V, art. 11, LDB). Os dados coletados para 1996 revelam uma
expressiva demanda sem atendimento para esta faixa etária11. O atendimento, em todos os
municípios pesquisados, cresce apenas para a idade de 06 anos (Quadros nº 4, 6, 8 e 10,
Anexo III e GRAF. nº5). Inúmeros estudos têm reafirmado o déficit de atendimento nesta
10
O acesso à base de micro dados do Censo Demográfico de 2000, não havia sido disponibilizado pelo IBGE
até fevereiro de 2003.
11
A Contagem da População 1996 e os Censos Demográficos não informam sobre a permanência em escolas
para a faixa etária de 0 a 4 anos. Neste estudo, considera-se apenas a demanda por educação infantil
compreendida na faixa etária entre 4 e 6 anos, ou seja, por pré-escolas.
Duarte, MRT
Página 114
etapa12 e os dados censitários confirmam que nos quatro municípios pesquisados
aproximadamente 50% das crianças com idade de 05 anos não freqüentavam pré-escolas
em 1996 (Quadros nº 4, 6, 8 e 10, Anexo III).
% 100,0
de
ex
75,0
50,0
clu
sã
25,0
0,0
4anos 5anos 6anos 4anos 5anos 6anos 4anos 5anos 6anos 4anos 5anos 6anos
CAA 1
CAA 2
CAE 1
CAE 2
município e idade
nunca frequentaram
o 5
Gráfico 5 - Percentual de crianças excluídas da pré- escola por município, segundo a
idade
Fonte: IBGE –Contagem da população 1996
A educação pré-escolar pouco esteve presente na vida das crianças com quatro anos de
idade no decorrer de 1996, em todos os quatro municípios pesquisados. Apenas aos seis
anos um contingente mais expressivo de crianças freqüentou pré-escolas. O GRAF. nº 05
permite comparar o atendimento entre as cidades pesquisadas. Os índices para a faixa
etária de 4 a 6 anos só apresentam valores superiores a 70% de atendimento do total de
crianças em CAA 1, para a idade de 06 anos. Para os demais municípios verifica-se uma
exclusão mais acentuada da educação pré-escolar, especialmente em CAE 2, com
população residente inferior a 10.000 habitantes.
Ao comparar a evolução do atendimento segundo a idade para as quatro cidades
pesquisadas verifica-se que o esforço de inclusão na escola efetivava-se em 1996, para
crianças com idade entre 7 e 8 anos. Correspondendo às séries iniciais do ensino
12
Ferraro (1999:32) observa que, para o Brasil no período de 1980 até 1991, a redução absoluta do número
de excluídos da escola praticamente se limitou ao grupo de 7 a 14 anos. As sinopses estatísticas do Ministério
da Educação demonstram o expressivo crescimento da matrícula, do número de estabelecimentos de ensino e
funções docentes nesta etapa da Educação Básica (MEC/INEP, 1996).
Duarte, MRT
Página 115
fundamental, a permanência de elevados índices de distorção série idade (Quadros nº 4, 6,
8 e 10, Anexo III e GRAF. nº 6) e de baixo atendimento em educação pré-escolar informa
% de freqúência
sobre a necessidade de ampliar o atendimento em todos os municípios pesquisados.
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
idade em anos
CAA 1
CAA 2
CAE 1
CAE 2
Gráfico 6 - Percentual de inclusão na educação pré escolar e ensino fundamental por
município, segundo a idade
Fonte: IBGE –Contagem da população 1996
CAE 2 apresentou um percentual de atendimento, nos dois primeiros anos de idade
correspondentes às séries iniciais do ensino fundamental, comparável aos demais
municípios. A evolução dos percentuais de inclusão na escola, apresentados no GRAF nº
6, reiteram para além das questões relacionadas à distorção série/idade, graus diferenciados
de urgência no atendimento à demanda por educação pré-escolar. Constata-se que os
municípios maiores apresentaram índices de atendimento mais elevados - CAA 1 e CAA 2
- enquanto que os municípios menores - apresentavam índices semelhantes apenas para as
idades de 7 e 8 anos (GRAF. nº 6) em 1996.
Estes dados demonstram que, desde 1996, um patamar mínimo de escolarização, restrito
as quatro séries iniciais do ensino fundamental, achava-se presente em diferentes
municípios. No entanto, a existência de percentuais diferenciados de atendimento por etapa
e modalidade de ensino (GRAF. nº 6 e 7) acha-se relacionada com a demanda por
educação e a capacidade fiscal. Ou seja, uma acepção mais abrangente do conceito de
Duarte, MRT
Página 116
capacidade de atendimento de um sistema local de ensino, envolve relacionar população
residente, demanda por educação básica e capacidade fiscal.
Os dados municipais pesquisados confirmam o acesso ao ensino fundamental, mas a
permanência no ensino obrigatório acha-se em alguns municípios mais reduzida, já nas
séries iniciais. Com índice de exclusão de 47,9%, a freqüência à escolaridade obrigatória
em CAE 1 para crianças a partir dos 08 anos de idade caracteriza o foco prioritário de
qualquer intervenção a ser realizada. Esses dados indicam, ainda, que a exclusão na
educação infantil nesses municípios opera pela inexistência de atendimento, enquanto no
ensino fundamental ela se faz com o acesso à escola por mecanismos intra-escolares de
seletividade (FERRARO, 1999).
100,0
80,0
%
60,0
40,0
20,0
0,0
6
7
8
9
idade
CAA 1
10
11
12
13
14
em
CAA 2
CAE 1
CAE 2
Gráfico 7 - Percentual de exclusão escolar no ensino fundamental por município,
segundo a idade
Fonte: IBGE –Contagem da população 1996
5.3 O atendimento ofertado: crescimento dos serviços educacionais
por entidade mantenedora
Desde a aprovação da LDB (1996) e a implantação do FUNDEF (1998) verifica-se a
redução do atendimento nas escolas mantidas pelo governo estadual. Duarte & Oliveira
(1996) já destacavam a correlação entre o crescimento da matrícula nas escolas municipais
e particulares e a retração do atendimento nas escolas estaduais para todo o estado de
Minas Gerais. No entanto, a evolução do atendimento em educação básica por entidade
mantenedora destaca a regressão do atendimento pelo poder público estadual em etapas da
educação básica regular (TAB nº 12).
Duarte, MRT
Página 117
TABELA 13
Minas Gerais, resultado final do Censo Escolar - Matrícula por etapa e modalidade da EB
EJA
Ed.
Especial
EM
EF
préescolar
EB
mantene
dora
estadual
municipal
particular
1998
1999
2000
2001
2002
11.722
316.569
92.028
11666
319784
108058
12.207
324.165
112.742
16.817
347.241
124.968
33.050
339.699
128.098
estadual
2.161.575
2062693
1.916.498
1.822.179
1.810.226
municipal
1.495.983
1505666
1.508.467
1.492.677
1.487.744
particular
197.744
201780
203.657
213.405
220.027
estadual
553.172
738321
846.018
819.190
776.619
municipal
50.373
39300
30.842
27.556
27.447
particular
109.480
111356
105.448
101.976
100.586
estadual
municipal
particular
12.161
3.331
30.058
12606
3187
34541
10.074
2.762
31.373
10.179
2.903
36.186
10.189
2.796
39.950
estadual
municipal
particular
37.068
21.750
36.865
6116
9744
32764
2.839
19.263
33.063
3.814
42.135
18.967
2.767
46.822
19.392
Fonte: INEP/MEC acesso em 22/03/03
Os números referentes à matrícula em educação básica desconsideram, apenas, o
atendimento prestado pelo governo federal no estado, por ser pouco significativo.
R2 = 0,98
2.500.000
2.000.000
1.500.000
1.000.000
500.000
0
1998
1999
2000
2001
ensino
fundamental
ensino
fundamental
ensino
fundamental
2002
Gráfico 8 – Minas Gerais, evolução da matrícula no ensino fundamental regular.
Fonte: Inep/MEC – Censo escolar
Duarte, MRT
Página 118
A curva de tendência (GRAF 8) demonstra com precisão a redução na matricula ofertada
pelo poder público estadual, especialmente após a implantação do FUNDEF. Este
fenômeno
é
caracterizado
na
literatura
sobre
política
educacional
como
de
municipalização. No entanto, para Minas Gerais, verificamos um crescimento pouco
acentuado da matrícula no ensino fundamental, após a implantação do FUNDEF, ou seja, o
efeito indutor à municipalização verificou-se no estado, antes da implantação do fundo. A
possível perda de recursos, a partir da vigência das medidas redistributivas, promoveu a
assinatura de convênios de municipalização entre o governo estadual e os municípios. No
entanto, o segundo momento de retração da matrícula na rede estadual, após 1998, pode
está relacionado, também, com os programas estaduais e federal de ajustamento da
distorção série idade (Oliveira, 2001a). Ao analisar os dados desagregados da matrícula no
ensino fundamental, referente ao período 1990-1998, Oliveira (2001a) demonstra a
tendência ao decréscimo no atendimento nas séries iniciais, estas medidas conhecidas por
“correção de fluxo”, “progressão continuada” resultaram, no período de 1998-2002, em
redução no número de atendimento no ensino fundamental.
A retração na matrícula do ensino fundamental pela poder público estadual, nos termos da
atual Lei de Diretrizes e Bases, teria por justificativa a expansão da oferta regular no
Ensino Médio. No entanto, a atribuição fixada pela LDBEN e as metas definidas pelo
PNE não vêm sendo cumpridas para a expansão do atendimento no ensino fundamental
1.000.000
R2 = 0,98
800.000
600.000
400.000
200.000
0
1998
1999
2000
2001
2002
estadual municipal particula
Gráfico 9 – Minas Gerais, evolução da matrícula no ensino médio regular.
Duarte, MRT
Página 119
Fonte: Inep/MEC – Censo escolar
Nos últimos anos nem a versão reformada do texto constitucional (inc. II, art.208, CF) tem
sido observada. A retração na oferta regular de matrícula no ensino médio, confronta-se
com a exigência de progressiva gratuidade e obrigatoriedade. Os números do atendimento
no ensino médio regular registram o descumprimento pelo governo estadual de sua oferta
prioritária (e, art. 10, LDBEN), mas de que forma esta redução intervém nas formas de
colaboração entre estados e municípios?
5.3.1
Crescimento
dos
serviços
educacionais
em
quatro
municípios do estado de Minas Gerais
Os dados quantitativos referentes à matrícula foram coletados no Centro de Produção e
Administração de Informações da Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais, em
2001. A Secretaria de Estado dispõe de cadastro da matrícula efetiva (ou inicial)13
desagregado por município e etapa da educação básica para o Estado de Minas Gerais.
Estes dados foram confrontados com as informações constantes no Censo Escolar,
divulgado pelo INEP/MEC, a partir dos dados fornecidos pela Secretaria Estadual de
Educação. O Censo Escolar de 1996, no entanto, não apresentava, informações
desagregadas por município, por este motivo as informações deste ano referem-se apenas
ao Cadastro de Escolas, matricula, e docentes da Secretaria de Estado de Minas Gerais.
A evolução da matrícula nos sistemas públicos no período de 1996 - 2002 retrata a oferta
de educação básica prestada em cada município selecionado para esta pesquisa. Considerase que o movimento de expansão e/ou retração do número de alunos matriculados decorre
da interação entre políticas locais, estaduais e nacional. Sendo o resultado da interação de
políticas, as formulações e decisões de âmbito local também intervêm na configuração dos
sistemas municipais de educação básica. Para o estado de Minas Gerais como um todo
(TAB nº12) e nos quatro municípios pesquisados a participação da rede particular na oferta
de EB é quantitativamente pouco significativa.
13
Matrícula efetuada em 10/3.
.
Duarte, MRT
Página 120
Os dois municípios de maior população apresentaram processos distintos (GRAF. nº 10) de
evolução da matrícula na educação básica. Em CAA 1 o crescimento do atendimento pelo
governo municipal ocorre de modo gradativo, equiparando-se ao atendimento prestado
pela rede estadual em 2000. Verifica-se um movimento contínuo de crescimento da
matrícula na rede municipal pari passu da retração na rede estadual. A matrícula na rede
particular pouco se alterou neste mesmo período (GRAF. nº 10).
70.000
60.000
50.000
matrícula efetiva
40.000
30.000
20.000
10.000
0
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
CAA 1 estadual
CAA 2 estadual
CAA 1 municipal
CAA 2 municipal
CAA 1 particular
CAA 2 particular
Gráfico 10 - Evolução da matrícula na educação básica regular por municípios (CAA
1 e CAA 2), segundo a entidade mantenedora
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Em CAA 1 o crescimento da matrícula no conjunto das etapas da EB regular observa uma
curva constante, com a tendência de repartição da oferta entre o governo estadual e o
municipal no período. A rede estadual de ensino encerra o período com praticamente o
mesmo número de alunos atendidos que a rede municipal (GRAF. nº 10). Em CAA 2, no
ano de implementação do FUNDEF, o governo municipal supera o atendimento em EB
regular. Neste município, a atuação do governo estadual se fez de modo instável e os dados
quantitativos da matrícula são indicativos da ausência de uma oferta regular. Nos dois
municípios a matricula na rede particular mantêm-se estável, de 1996 a 2000, sendo que
em CAA 1 por todo o período. Nos dois municípios a rede estadual era responsável pela
Duarte, MRT
Página 121
parcela mais significativa do atendimento, sendo substituída em CAA 2 pela ampliação da
matrícula na rede municipal e, em CAA 1, no final do período estudado as duas redes
apresentam números semelhantes de alunos estudados.
A evolução da matrícula na educação básica como um todo ocorreu de modo diverso nos
demais municípios pesquisados (GRAF. nº 11). Em CAE 1 e CAE 2 o predomínio da
oferta estadual permanece por todo o período, enquanto que a matrícula em EB sofre
oscilações na rede municipal de CAE 1. Entre 1996 e 1997 ocorreu a redução no número
de matrículas tanto na rede estadual quanto na municipal nas duas cidades (GRAF. nº 11).
Esta redução pode estar relacionada à inconsistência dos dados constantes no cadastro da
SEE/MG, visto que a indisponibilidade de dados desagregados por municípios para 1996
impossibilitou aquilatar essas informações no censo escolar.
12.000
10.000
matrícula efetiva
8.000
6.000
4.000
2.000
0
1996
1997
1998
CAE 1 estadual
CAE 1 municipal
CAE 1 particular
1999
2000
2001
2002
CAE 2 estadual
CAE 2 municipal
Gráfico 11 – Evolução da matrícula na educação básica regular, por município (CAE
1 e CAE 2), segundo a entidade mantenedora
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Duarte, MRT
Página 122
A implantação do FUNDEF (1998) não interfere, do mesmo modo, no atendimento
prestado nos municípios. Tendência de crescimento das redes municipais, em CAA 1 e
CAA 2, pode ser demonstrada para o período. No entanto, a rede municipal de CAE 2
apresenta um atendimento em educação básica no período 96-02. Neste município,
verifica-se o crescimento da matrícula na rede estadual (GRAF. nº 11). Em CAE 1, por sua
vez, ocorre o crescimento mais expressivo do atendimento pela rede privada, verificandose retração da matrícula nas redes estadual e municipal no decorrer do período.
Nos quatro municípios pesquisados, a matrícula em EB regular concentra-se no ensino
fundamental regular (Quadro 12, ANEXO III). No entanto, o crescimento do atendimento
por entidade mantenedora - estadual e municipal - articula-se de modo diferenciado com o
crescimento da matrícula por etapa da educação básica. O predomínio de uma política
nacional de atendimento prioritário ao ensino fundamental, no período de 1996-2000,
encontrou respostas diferenciadas em cada uma das cidades pesquisadas.
Em CAA 1 a redução do número de matriculas na rede estadual de ensino fundamental é
progressivamente compensada pelo atendimento da rede municipal (GRAF. nº 12). No
entanto, esta ampliação não resulta em expansão da matrícula em Educação Infantil (préescolar), que permanece constante por todo o período14. A municipalização do ensino
fundamental ocorre a partir de 1996/97, porém sem aumento do número de matrículas em
pré-escolas municipais (GRAF. nº 12).
14
Para a matrícula em educação infantil (pré-escolar) no período o cv = 3.8%, retrata uma oferta regular do
atendimento prestado pelo município. Ver TAB nº
, ANEXO .
Duarte, MRT
Página 123
12.00
10.00
8.00
6.00
4.00
2.00
0
199
199
199
199
pré-escolar municipal
200
200
EF municipal
200
EF estadual
Gráfico 12 – Matrícula por etapa da educação básica regular, segundo a entidade
mantenedora – CAA 1, MG
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Como mencionado anteriormente, trata-se de um município com elevada capacidade fiscal
e onde a maior demanda por educação concentra-se na faixa etária por educação infantil e
ensino médio. No entanto, para esta etapa da EB não se verifica no município uma
tendência constante de crescimento da matrícula. O município tem investido recursos na
expansão do atendimento nesta etapa, ocorrendo inclusive retração por parte do poder
público estadual na oferta (TAB nº 13).
TABELA14
Matrícula no ensino médio, em CAA 1, MG
ano
estadual municipal particular
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
3856
3856
4132
4364
5231
4829
4436
85
85
109
156
183
270
320
1221
1221
1239
1326
1341
1496
1213
O segundo município analisado quanto à evolução do atendimento em EB, caracteriza-se
por dispor de elevada população e capacidade fiscal, em termos da média do estado.
Duarte, MRT
Página 124
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
1996
1997
1998
1999
pré-escolar municipal
2000
2001
EF municipal
2002
EF estadual
Gráfico 13 – Matrícula por etapa da educação básica regular, segundo a entidade
mantenedora – CAA 2, MG
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Em CAA 2 o município assumiu a oferta do ensino obrigatório desde 1996, com um
atendimento superior aos alunos matriculados em escolas estaduais, porém quase
inexistindo matrícula em pré-escolas públicas (GRAF. nº 13). Nestas duas cidades, por
processos diferentes, o atendimento prestado pelo poder público local (matrícula no ensino
fundamental) é superior ao estadual. No entanto, CAA 1 conjuga a expansão do
atendimento no ensino fundamental com uma oferta regular da matrícula em educação
infantil (pré-escolar). No segundo município - CAA 2 - o crescimento contínuo da
matrícula na rede municipal de ensino fundamental é acompanhado por redução da
matrícula em educação infantil (pré-escolar) pelo poder público local.
As repercussões sobre a educação infantil da prioridade de financiamento ao ensino
fundamental têm sido tratadas na literatura e debates educacionais da atualidade. No
entanto, ao comparar dois municípios do estado com capacidade fiscal superior à média
dos municípios, verifica a adoção de estratégias locais diferenciadas.
Duarte, MRT
Página 125
9.00
8.00
7.00
6.00
5.00
4.00
3.00
2.00
1.00
0
199
199
199
199
pré-escolar
200
200
EF
200
EF
Gráfico 14 – Matrícula por etapa da educação básica regular, segundo a entidade
mantenedora – CAE, 1, MG
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Nos dois municípios o poder público estadual encerrou a matrícula para educação infantil
(pré-escolar). A matrícula na rede estadual de ensino fundamental reduziu-se de modo
pouco significativo em CAA 2, enquanto que CAA 1 apresentou maior variação. Estes
dados questionam afirmativas que correlacionam de modo direto e linear a
municipalização do ensino com a retração na oferta de educação infantil. Onde a rede
estadual de ensino fundamental se manteve praticamente constante, ocorreu uma abrupta e
drástica redução na oferta de educação infantil.
No segundo grupo de municípios pesquisados, a matrícula da rede estadual de ensino
fundamental é superior à matrícula da rede municipal. Em CAE 1 a variação da matrícula
no período estudado é maior na rede municipal, ocorrendo, ainda, variação significativa da
matricula na rede municipal de educação infantil (pré-escolar). Neste caso, houve pouca
retração da matrícula na rede estadual de ensino fundamental e a matrícula na rede
municipal, excetuando o período de 96-97, também apresentou variação pouco
significativa. Trata-se de um município de médio porte, com reduzida capacidade fiscal e
Duarte, MRT
Página 126
situado em região geográfica com baixos índices de qualidade de vida. Neste caso,
verifica-se a ausência de uma oferta regular de ensino fundamental, em conseqüência da
redução progressiva do número de alunos atendidos na rede estadual e a variação ocorrida
na matrícula da rede municipal.
Em CAE 2, pequeno município situado na região do Vale do Jequitinhonha, a variação da
matrícula é significativa nas duas redes. A oferta do ensino obrigatório foi assumida pela
rede estadual neste período, no caminho inverso da tendência de municipalização (GRAF.
nº 15). Trata-se de um município com reduzida capacidade fiscal e representativo do
grande número de pequenos municípios existentes no estado. No entanto, os dados de
evolução da matrícula indicam que a redução ocorrida no ensino fundamental não tem
repercussões para a expansão da oferta do ensino médio.
2.000
1.500
1.000
500
0
1996
1997
1998
1999
2000
pré-escolar municipal
2001
EF municipal
2002
EF estadual
Gráfico 15 – Matrícula por etapa da educação básica regular, segundo a entidade
mantenedora – CAE 2, MG
Fonte: Inep/MEC e SEE/MG
Os municípios pesquisados foram agrupados, ainda, em: cidades de médio porte com
crescimento positivo da população residente e cidades de pequeno e médio porte com
crescimento negativo da população residente (TAB nº 10). Os municípios deste segundo
grupo apresentaram em relação ao atendimento da população:
- maiores índices de exclusão da educação pré-escolar para crianças com idade entre 4 e 6
anos (Quadros nº 4 e 6, ANEXO III);
Duarte, MRT
Página 127
- menor percentual de inclusão/ maior de exclusão de crianças na faixa etária da
escolaridade obrigatória (GRAF. nº 5 e nº 6);
- predomínio da matrícula na rede estadual de ensino fundamental;
- maiores coeficientes de variação da matrícula para a educação infantil e ensino
fundamental.
Em todos os municípios pesquisados a universalização de uma educação básica - da
educação infantil ao ensino médio - acha-se longe de efetivar. No entanto, o segundo grupo
de cidades retrata uma situação de maior precariedade no atendimento. A variabilidade
encontrada na matrícula por etapa da educação básica e entidade mantenedora, a maior
participação de crianças excluídas da e na escola informam sobre o atendimento numa rede
pública com oferta mais episódica, submetida a eventos que alteram trajetórias na
implementação de política de longo prazo.
Os dois grupos de municípios são representativos da diversidade existente nas cidades do
estado de Minas Gerais e brasileiras. Um grande número de municípios de pequeno e
médio porte (pop. residente até 50.000 habitantes) com baixos índices de escolarização e
poucas cidades maiores (com pop. residente igual ou superior a 100.000 habitantes) e taxas
de escolarização mais elevadas. Neste segundo grupo, o crescimento da matrícula na rede
municipal traduz um esforço de “municipalização” do atendimento. No primeiro grupo, a
forte presença da rede estadual no total da matrícula por todo o período aliado ao
crescimento da rede municipal, expõe as indagações quanto aos limites da
“municipalização” na efetivação do direito à edu0cação básica.
Duarte, MRT
6.
Sistemas
Página 127
educacionais
em
perspectiva
comparada:
relações
intergovernamentais e autonomia da escola
Este estudo é condicionado por uma singularidade presente no sistema educacional
brasileiro: a existência de autonomia política dos governos locais na gestão da educação
escolar básica (educação infantil e ensino fundamental). Esta condicionalidade orienta uma
perspectiva que indaga sobre os efeitos e tensões entre diretrizes globais de reforma
educativa em formações políticas específicas e procedimentos de gestão da res pública no
campo educacional. Duas referências orientam este estudo comparativo: a reforma políticoadministrativa dos sistemas de educação básica (financiamento e atribuição de
competências) e o papel das relações intergovernamentais na expansão da educação escolar
em dois países semiperiféricos.
A abordagem desses temas observou os seguintes procedimentos. Estudo de literatura em
Portugal – a partir da década de 90 – relativa ao tema da School based Management e a as
reformas educativas, com o objetivo de comparar, assinalando contextos de identidades ou
diferenças, os dois países. Levantamento e análise da bibliografia e legislação sobre a
atuação das autarquias, com destaque para os mecanismos de financiamento dos gastos
educacionais, com o objetivo de estabelecer o enquadramento jurídico-político desta
atuação. Em seguida, a pesquisa foi dirigida para o estudo das contas de gerência, ano
2000, de três municípios da região norte e entrevista com responsáveis pela aplicação e
acompanhamento dos gastos autárquicos na área (dois vereadores do Pelouro da educação,
03 técnicos de nível superior e um presidente de junta de freguesia, responsável pela
criação de uma pré-escola).
O ponto essencial consiste em indagar quanto à(s) ruptura(s) produzida(s) nas políticas de
administração centralizada do sistema educacional disseminadas nos períodos autoritários
tanto em Portugal quanto no Brasil. Se a reforma do sistema educacional é condicionada,
por um lado, pelos processos de mundialização1 e, por outro, pelas especificidades
1
Giddens 1997 apoia-se no termo globalização, diferenciando-o de uma concepção centrada na expansão
economia-mundo capitalista. Os debates sobre o tema, dentre outros aspectos, abordam a centralidade da
expansão do capital, como força capaz de contrapor-se ao poder político expresso pelos Estados. O termo
globalização correlaciona transformações sociais, políticas, culturas e econômicas a uma série de processos e
Duarte, MRT
Página 128
políticas internas dos países, a reflexão sobre as alterações político administrativas em
curso nos sistemas de ensino pode contribuir para visualizarmos efeitos e tensões do poder
de governance dos governos centrais.
Ao analisar os processos de descentralização político administrativo2, dos sistemas
educacionais nos dois países, procuramos averiguar como diretrizes globais de reforma
político-administrativa interagem com formas próprias de relações intergovernamentais. A
relação entre a gestão dos sistemas educacionais estatais e o sistema políticos é posta em
causa, numa tentativa inicial de análise comparada, que pressupõe a mediação da adoção
dos mecanismos de diretrizes globais de reforma por distintas tradições internas de
administração pública presente nos dois países3.
6. 1 Diretrizes globais de reforma educativa e relações intergovernamentais
Portugal e Brasil, com temporalidades e processos diferenciados, sofreram interveniências
significativas das reformas conservadoras difundidas a partir da reforma inglesa - período
Thatcher – e americana – governo Reagan (CATANI et al., 2000). Centro de irradiação de
princípios e medidas político administrativas de retórica descentralizante para as periferias,
é vasta a literatura que aponta seu caráter (re)centralizador. É ampla a literatura sobre a
importância das alterações efetuadas na gestão do sistema educativo na Inglaterra,
especialmente para a definição de políticas educativas - com a revalorização de uma base
curricular nacional e a centralização da formulação sobre os resultados pretendidos pari
passu com estratégias de implementação de gestão financeira transferidas para as unidades
escolares (LEVACIC, 1998: 332). Estas medidas políticas de administração foram
efeitos diferenciados por regiões ou países, diluindo por vezes a centralidade do empreendimento capitalista.
Dale (1999) elabora uma tipologia dos principais mecanismos que distinguem os processos de globalização,
contrapondo-os as posições que a reduzem à imposição de políticas semelhantes em todos os países. Neste
estudo o que se quer destacar com um uso mais ambíguo do termo mundialização é a centralidade da
expansão nas mais diferentes áreas (cultural, educacional e da administração pública) de um espaço-mundo
regido por empreendimentos subordinados à lógica mercantil. Jameson (2000) ao examinar os planos
distintos da globalização com o propósito de destacar sua coesão fundamental, aponta a centralidade da
expansão da forma mercadoria via novas tecnologias e embasada no expansão dos ‘livre mercado’.
2
Neste estudo a expressão político-administrativo expressa a relação entre a tomada de decisão e seu
exercício. O termo administração na teoria política clássica, relaciona e subordina os agentes, mecanismos e
instrumentos de distribuição (dosagem) do poder, a quem compete a formulação da norma e tomada de
decisões. Esta concepção acha-se, também, presente na analise weberiana da burocracia como instrumento de
dominação de base racional-legal. Neste sentido, uma determinada política concretiza-se e é expressão da
forma institucional pela qual se realiza.
3
Esta perspectiva de estudo comparativo acha-se presente em Schriewer, 1997
Duarte, MRT
Página 129
difundidas globalmente e sob diferentes denominações como autonomia da escola,
descentralização da política educativa, municipalização da educação, etc4.
Concomitante à reforma educativa nesses países e em simbiose com ela tem-se o
movimento conhecido como New Public Manegement5 (NPM). Este movimento vem
estruturando toda uma discussão contemporânea sobre mudanças organizacionais e
administrativas no setor estatal com influência na administração dos sistemas de ensino
(Angus, 1994; Power, 1997).
I define NPM abstractly as a field and policy discussion – conducted
internationally – about subjects concerning public managemente,
including public management policy, executive leadership. design of
programmatic organizations, and government operations (Barzelay,
2000: 231.grifo meu)
Os programas no campo da NPM têm por pressupostos estudos relacionados à teoria da
escolha racional e a teorias organizacionais de cunho empresarial (Barzaley, 2000). Tanto
as reformas educativas inglesa e americana, quanto os programas de reforma inspirados na
NPM privilegiaram a livre oferta de serviços públicos (educacionais incluídos) para a
“livre” escolha dos cidadãos-consumidores mediados pela introdução de formas mais
competitivas de financiamento, para a consecução de objetivos de maior eficiência e
eficácia.
Duas idéias força orientaram essas perspectivas modernizantes de Reforma do Estado. O
reconhecimento das organizações da sociedade civil como uma instância positiva de
realização de democracia versus um aparato de Estado, como instrumento de dominação
burocrática. Desse modo, desconcentração da prestação de serviços, especialmente na área
social, a entidades privadas foi considerada como potenciador da expressão da diversidade
e potencialidades existentes na sociedade civil6. Outro pressuposto relaciona-se a clivagem
entre fins/objetivos e meios/procedimentos. A burocracia é questionada por sua ineficácia,
4
Afonso (1995:76) já destacava o redirecionamento político-administrativo centralizador do Educational
Reform Act de 1988 com base defesa da autonomia da escola. No Brasil, Oliveira (1996) ressaltava a
centralidade da escola como núcleo de gestão em programas educativos formulados centralmente e
financiados pelo BIRD. Sobre a relação entre a autonomia das escolas na reforma educativa inglesa e as
políticas sociais neoliberais ver ainda: Afonso, 1999 e Ball, 19
5
NPM is an administrative philosophy (…) that emerged in the 1980s. (...) H & J asserted that NPM
influenced governments agend by establishing a climate of opinion in favor of its doctrines (Barzelay,
2000:235)
6
O termo, nesta perspectiva, designa uma instância positiva de realização plena e democrática das diferenças,
uma suposta esfera de autenticidade e de liberdade em face de interesses e a cultura (ver: Moraes: 2001:1416).
Duarte, MRT
Página 130
rigidez e pouca visibilidade na formulação de alternativas. Proposições políticoadministrativas de ênfase gerencialista passam a destacar resultados, produtividade
obnubilando a crítica às relações sociais que as construíram. Nesta perspectiva, a ênfase em
mecanismos de controle ex post pelos poderes centrais dos resultados obtidos – avaliação
sistêmica, por exemplo – é combinada com apelos à iniciativa local com o objetivo de
validação conseqüencial7
No entanto, podemos afirmar que essas diretrizes contêm um componente de modernização
dos sistemas educacionais construídos nos regimes autoritários no Brasil e em Portugal8.
Elas apontam uma preocupação de diversificação na oferta de bens e serviços com o intuito
de favorecer a expressão de necessidades sócio-culturais diferenciadas presentes na
sociedade civil (Durut-Bellat, 2001). Ao advogarem maior diversidade na oferta de
serviços para o atendimento a identidades e interesses plurais de cidadãos-consumidores,
contrapõe-se à tendência de uniformização curricular presente nos períodos autoritários.
Enfatizam, também, maior transparência na definição de metas e na alocação de recursos
públicos, como pré-requisito de competitividade (Pereira, 1996). O trato patrimonialista da
res publica é criticado por não favorecer a expansão competitiva dos mercados. Mas,
destacamos que a implementação desses princípios se fez (e faz) pela mediação das formas
institucionais
presentes
em
cada
formação
social,
dentre
elas
as
relações
intergovernamentais.
A difusão de diretrizes globais por mecanismos de decisões acordadas, a observância de
uma agenda ou de normas supranacionais (DALE, 1999) se faz em interação com as
formas institucionais “internas” aos Estados, que, por sua vez, reproduzem relações de
poder e governance. .Dentre essas formas institucionais internas, as relações
intergovernamentais adquirem relevância por possibilitar maior pluralismo no sistemas
políticos dos estados. A existência de diversos níveis de governo, dotados de autonomia
relativa, pode contribuir para o desenvolvimento de alternativas locais a decisões centrais
e/ou diretrizes globais.
7
Impactos da avaliação sobre os sistemas, determinando mudanças de pensamento, gerando novas atitudes e
promovendo novas ações (Vianna, 2003)
8
Em relação ao Brasil esta perspectiva acha-se presente em Cury, 1993; Duarte, 1997.
Duarte, MRT
Página 131
Propomos, sob estas referências, o estudo comparativo de aspectos das relações
intergovernamentais – central/local - nesses dois países, situados na semiperiferia do
capitalismo, com o objetivo de configurar singularidades de uma matriz9 políticoadministrativa que intervém nas reformas dos sistemas de ensino no Brasil e em Portugal.
Iniciamos o estudo pela discussão das formas e/ou estratégias institucionais de
descentralização/recentralização entre instâncias governamentais adotadas nas reformas
dos sistemas públicos de educação básica/elementar. Com este objetivo selecionamos três
focos de reflexão:
-
a relação entre a autonomia da escola e dos governos locais;
-
a participação dos governos locais no financiamento da educação escolar;
-
a participação dos governos locais na programação escolar.
No Brasil indagamos sobre a efetivação do regime de colaboração fixado no texto
constitucional (caput, art. 211, CF). Em Portugal, a investigação pretende aquilatar
estratégias de formulação de alternativas político-educativas pelas autarquias para o
sistema de escolas elementares.
6. 2 A constituição de uma área de estudos em administração educacional e os
contextos de autonomia das escolas
Sob o tema da(s) autonomia(s) da escola abrigam-se experiências como a introdução de
parcerias entre a escola e setores da comunidade local, ou o desenvolvimento de novas
propostas educativas articuladas a referências multiculturais, ou mesmo de reordenação dos
tempos e trajetórias escolares. Constituem um conjunto de intervenções distintas e com
objetivos diversos, passíveis de promover maior participação de diferentes atores como,
também, iniciativas voltadas para o gerenciamento desconcentrado das unidades
escolares10. O desafio analítico, proposto neste estudo, consiste em pensar a(s)
autonomia(s) da escola tendo por referência um novo espaço público, capaz de associar à
9
O uso do termo matriz corresponde a noção de design, indicativo que o objeto relaciona-se
fundamentalmente com escolhas político-administrativas formais e que propriedades emergentes das
organizações ou das intervenções organizacionais são conduzidas por poderes centrais ou individuais. Ver a
respeito: Barzelay (2000:230)
10
Lima, 1995 introduz a noção de recentralização por controle remoto com o objetivo de caracterizar o apelo
a autonomia e a permanência de um poder decisório centralizado.
Duarte, MRT
Página 132
promoção de novos formas institucionais de gestão da res pública11 com a ampliação da
autonomia dos espaços e instituições públicas frente aos grupos de interesse.
Uma referência recorrente em estudos de política educacional é a associação efetuada entre
descentralização político administrativa e a autonomia das unidades escolares12. Os
pressupostos dessas perspectivas encontram-se nos resultados de pesquisas divulgadas no
final dos anos setenta (Rutter, 1979; Brookover 1979), onde se evidenciou a influência da
escola na evolução dos alunos. Se as condições socioeconômicas e culturais das famílias
têm influência sobre o desempenho escolar, ficou comprovada igualmente a existência do
que os franceses chamam "efeito estabelecimento" (Cousin, 1998). Esse foco de pesquisa
demonstrava que a qualidade das escolas tem efeitos importantes sobre o desempenho dos
alunos. Ou seja, os modos de funcionamento das escolas podem ⎯ ou não ⎯ permitir que
se reduzam os efeitos negativos da situação socioeconômica das famílias (Lavinas &
Barbosa, 2000).
Estes estudos legitimaram a centralidade política atribuída a (re)organização das unidades
escolares (School-based Management - SBM), como um dos meios de promoção de
sucessos individualizados. E a disposição em estabelecer maior autonomia para as escolas
constituiu um dos elementos essenciais da estratégia adotada pelo governo conservador
inglês, no final dos anos oitenta, para modificar a estrutura de tomada de decisões entre os
níveis de governo e as escolas13. No entanto, as pesquisas sobre gestão escolar,
desenvolvidas nos últimos anos apontam, também, para a importância de reavaliar as
formas institucionais de gestão das escolas. A operação dos princípios centrados na SBM
11
Pazeto & Wittmann (1999) ao analisarem o conteúdo de 134 trabalhos relativos à gestão da escola,
observam que essa literatura apresenta como eixo comum de abordagem a associação entre democratização e
autonomia. Para esses autores, a ênfase posta na gestão da escola é decorrência de um contexto onde a escola
pública já não mais se contém no limite do estatal. Para corresponder aos novos anseios e expectativas da
sociedade, a escola requer a intermediação da comunidade e de suas instituições para assegurar-lhe a
dimensão pública e coletiva.
12
A literatura no Brasil sobre descentralização é extensa. Destacamos
13
Autores como Harris, 1994 consideram que as diretrizes da reforma inglesa expressam um ataque a
democracia local (ver, também Afonso, 1995: 76). Esta perspectiva acha-se também presente em Ball, 1994
ao analisar o caracter de empreendedorismo presente na reforma inglesa. No entanto, cabe distinguir a
restrição a formas de participação-cidadã inerente às perspectivas mais gerencialista e a inexistência nas
relações intergovernamentais inglesas (extensivo Grã-Bretanha) de um poder político municipal autônomo,
com competências próprias e capacidade de ação independente do governo central.
Duarte, MRT
Página 133
acha-se presente nos mais diferentes países.14 Se há controvérsias sobre modelos
organizacionais a serem adotados, foi conferido ao “efeito estabelecimento para o
sucesso/fracasso escolar” importância fundamental. É variada a literatura envolvendo
modelos diferenciados de School-based management (SBM), a partir da década de
noventa, tanto no sentido de destacar alternativas organizacionais necessárias a um padrão
de educação escolar, quanto reiterando uma postura crítica em face de obstáculos intra e
extra-escolares a serem previamente superados. Nesta literatura, os debates envolvem
diferentes arranjos organizacionais a que estão sujeitas as unidades escolares, ou um
agrupamento de escolas ou, ainda, escolas situadas em um determinados território15.
No entanto, ao encerrar a década de noventa, um outro tema acha-se mais presente em
estudos de administração educacional no Brasil e em Portugal: a intervenção dos governos
locais nas políticas educativas e administração do sistema de escolas de educação infantil e
ensino fundamental/básico. Em 2001, o II Congresso Luso Brasileiro de Educação
apresentou mais de noventa comunicações orais de pesquisadores portugueses e
brasileiros. Nos trabalhos previamente remetidos ao Congresso destacaram-se, também,
temas relacionados com a(s) autonomia(s) da escola16. No entanto, neste mesmo
Congresso, estudos ligados à municipalização do ensino fundamental no Brasil
(OLIVEIRA, C; FERNANDES, MD), a atuação dos secretários municipais de educação
(CASTRO, MLS), a configuração de agrupamentos de escolas e territórios educativos
(FALCÃO, MN & NOGUEIRA, C), às práticas de inspeção escolar (CASTRO, MLS), aos
programas socioeducativos autárquicos (GUEDES, G et al.) ou à avaliação e
monitoramento dos sistemas de ensino (DURAN, MC) - dentre outros e expostos em
diferentes sessões temáticas – já apontavam questões relativas às políticas ou à
administração pelos governos locais da educação escolar básica/elementar.
14
Em 1999, quando da realização do Fórum Português de Administração Educacional, gestores de diversos
países europeus destacaram a centralidade das escolas como lócus privilegiado de promoção de ações
educativas (Barroso, 1999). Conferencistas da Alemanha, Bélgica, Bielorussia, França, Noruega relataram a
importância de reflexões e procedimentos relativos a autonomia de gestão das unidades escolares O tema da
autonomia dos governos locais no campo educacional foi mencionado de modo circunstancial, sem maior
centralidade. Apesar do estatuto jurídico-político atribuído aos municípios na Europa ser muito variado
(Martins, 2001), são poucos os estudos comparativos sobre a atuação das cidades no campo da educação
escolar básica.
15
A noção de territórios educativos é polissêmica. Ver a respeito: SARMENTO, 1998:45-46
16
Este tema foi objeto de uma mesa redonda – Autonomia(s) da escola e centralização/descentralização. Ver:
Actas de resumos do II Congresso Luso Brasileiro. Braga: Uminho. 1999
Duarte, MRT
Página 134
Estes estudos, com diferenças de abordagem, correlacionaram a atuação dos sistemas
locais de ensino (Brasil)/das autarquias (Portugal), ao sistema de escolas de educação
elementar(Portugal)/básica(Brasil) e às políticas e programas educativos formulados pelo
governo central. Consideramos que, a melhor compreensão desta tríade relacional permite
a apreensão do fenômeno da reforma político-administrativa dos sistemas de ensino em
formações políticas específicas. As relações intergovernamentais presentes no dois países
contêm formas próprias de exercício político-administrativo, que intervêm nas políticas
educativas.
6. 3 Brasil e Portugal: tempos de rupturas e reforma(s) da educação escolar
básica
Em cerca de um mês professores e alunos de diversas escolas
substituíram reitores e directores por órgãos de gestão eleitos, por
diferentes processos, com diferentes denominações e composições
(Lima: 1998: 235).
Em Portugal, o 25 de abril de 1974 assinalou o movimento de deslocação do poder para as
escolas, para uma posterior reconstrução do paradigma da centralização (Lima, 1998: 219).
Os acontecimentos subseqüentes ao 25 de abril de 1974 produziram e difundiram formas
de autogestão que possibilitaram algumas inovadoras recriações ou reinvenções para uma
autonomia conjunturalmente conquistada, freqüentemente legitimadas em práticas de
democracia
direta
(AFONSO,
1999:22).
Ações
autogestionárias
desenvolvidas
especialmente nas escolas secundárias difundiram práticas mais participativas de gestão
das escolas, como também impulsionaram rupturas com o modelo político e administrativo
do período ditatorial17.
Na atualidade, uma agenda do tipo participativo e descentralizadora em Portugal tem a
experiência autogestionária imediatamente posterior à Revolução de 25 de abril18 apenas
por referência. Experiência presente nas formulações críticas à autonomia decretada e à
política de desconcentração empreendida nas duas últimas décadas, ela apresenta,
17
Sobre formas organizacionais de gestão escolar ver Lima, 2000.
Barroso, 2001 ao analisar a dicotomia reforma versus mudança nas escolas reafirma ser o período pós-25
de abril como um contexto das transformações mais significativas nos princípios, estruturas e práticas
educativas
18
Duarte, MRT
Página 135
entretanto, singularidades que permitem apreender a gênese do período posterior. Lima
(1998), embora reconheça a ação dos movimentos populares das organizações de base
durante o período revolucionário, chama a atenção para a centralidade política que
caracterizou este período e para a ausência de um projeto descentralizador e
democratizador da administração pública (Lima: 1998: 234).
Um segundo movimento – 1985 a 1995 - teve por diretriz a normalização de um modelo de
gestão das escolas capaz de contrapor-se à democracia direta (Lima, 1998; Afonso, 1998:
204-210). Um processo de modernização conservadora (Afonso, 1995:79) onde a
centralidade de proposições normativas relativas à gestão democrática das escolas se fez
com a recentralização político administrativa no Ministério da Educação. Esta segunda
conjuntura, pós-período revolucionário, induziu à desmobilização crescente dos atores
escolares utilizando-se de uma retórica de autonomia e participação (ver: Afonso, 1999:
123-124). Este contexto, é apresentado na literatura como de desconcentração,
historicamente capaz de penetrar no universo específico de cada escola19 (FORMOSINHO,
1998) e fundamenta-se na transferência de tarefas de gerenciamento para as unidades
escolares20.
A relação entre governo central, escolas e diretrizes globais de reforma fundamenta as
análises efetuadas, tanto nos programas governamentais, quanto na literatura crítica à
autonomia decretada. Ao advogarem ou criticarem a introdução de medidas ligadas SBM,
estes estudos minimizam a reflexão sobre a interação da administração das escolas com o
sistema político-administrativo presente nas relações intergovernamentais. A participação
autárquica na educação escolar, resgatada em estudos mais específicos, (Fernandes, 1998,
1999; Louro, 2000), tem por foco de discussão a consolidação de suas competências
educativas. A ênfase nestes trabalhos é colocada no enquadramento legislativo que
circunscreve as competências autárquicas no campo da educação escolar.
19
Formosinho (s/d) nomeia este período como: Anos 80 – retórica (des)centralizadora e prática de
centralização desconcentrada.
20
A mídia impressa portuguesa, nacional e regional especialmente no início dos anos letivos, publica
anúncios de escolas de educação básica e secundária para seleção de pessoal técnico administrativo e
prestação de pequenos serviços. É irônico observar os prazos e procedimentos fixados, registrando a
permanência do controle processual sobre a autonomia proclamada.
Duarte, MRT
Página 136
No Brasil, a década de oitenta foi marcada por diversos movimentos sociais, dentre estes
os professores e funcionários em atuação nos sistemas públicos de Educação Básica21.
Nestes movimentos, os anseios por mais democracia e participação presentes em muitas
regiões do país, foram sintetizados em reivindicações por eleições diretas (o movimento
pelas “diretas já” tem traduções nos mais diferentes setores, como, por exemplo, as
reivindicações por eleição para a direção das escolas). Reunindo docentes, funcionários e
estudantes, as greves e manifestações efetuadas ao longo dos anos oitenta, produziram
reivindicações por alterações nos procedimentos de gestão de pessoal (concursos, revisão
das normas de carreira), na organização das escolas (criação de conselhos de escolas e/ou
administrativos) e nas associações e entidades representativas desses segmentos. A
organização das escolas e do trabalho escolar foi posta em questão22 e reivindicações por
maior autonomia vieram a debate.
A década de noventa iniciou-se no Brasil, com um grande número de experiências de
gestão em educação sendo elaboradas e desenvolvidas em estados, municípios e escolas
nas diferentes regiões do país. E, embora, o tema da atuação dos municípios na educação
escolar estivesse presente nos estudos de administração educacional brasileiros desde o
pós-guerra23, é com a promulgação da Constituição de 1988 que este tema adquire novo
protagonismo. Por outro lado e, também, a partir da década de noventa, a descentralização
constituiu no Brasil uma estratégia governamental para a promoção de reformas em
diferentes setores sociais, inclusive dos sistemas de educação básica. Toda uma literatura
de crítica à municipalização foi produzida neste período, onde era denunciada a onda
política de desconcentração no campo educacional, induzida pelas agencias internacionais
de financiamento, pari passu a crise do poder central24
21
Em 1982 tem-se a eleição de governadores da oposição (MDB) nos principais estados do país (Franco
Montoro, em São Paulo; Pedro Simon, no Rio Grade do Sul; Tancredo Neves, em Minas Gerais). Estes
eventos políticos pressionaram o calendário de redemocratização do país e impulsionaram debates sobre a
dependência dos governos estaduais e das principais cidades frente ao governo federal.
22
Arroyo (1982) destacava a concepção emergente no período com o artigo intitulado: Professores e
trabalhadores se identificam. Que rumos tomará a educação brasileira?.
23
Os trabalhos de Anísio Teixeira na década de 40 e posteriormente os estudos sobre a coordenação da
Fundação Carlos Chagas nos anos oitenta já abordavam o tema das competências intergovernamentais quanto
à educação básica.
24
Nesta literatura, a crítica à política de indução dos municípios à assunção de maiores encargos com o
ensino fundamental é expressa pelo termo municipalização (Ver Oliveira, 1999).
Duarte, MRT
Página 137
Em Portugal o período de 1985 a 1995 foi caracterizado pela retomada da iniciativa
governamental sob inspiração neoliberal (AFONSO, 1998) e no Brasil, a eleição em 1995
de Fernando Henrique Cardoso, expressa a definição de rumos da Reforma do Estado,
anunciada desde o início da década (VIEIRA, 1998). Nos dois países, em primeiro
movimento, lutas sociais por democratização e afirmação de novos direitos repercutiram
nas unidades escolares, vistas como espaços de decisão e participação em ações
descentralizadas. Neste primeiro movimento, descentralização implicou em assunção de
autoridade e poder decisório dos níveis centrais para o âmbito das unidades escolares,
produzindo rupturas em formas clientelistas e patrimonialistas de gestão das organizações
escolares. Em segundo ato, proposições em defesa de maior autonomia das escolas
subordinavam-se a exigências de governance do poder central, por uma estratégia que
associava iniciativa local e controle ex post central.
Neste segundo momento, descentralizar indicava desconcentrar, com a transferência de
tarefas e responsabilidades para as escolas em Portugal (1985-1995) e para os governos
subnacionais no Brasil (1995 – 2000). Indicava também, o exercício de funções específicas
de controle processual e de resultados pelo poder central. Com temporalidades e processos
diferentes, verificaram-se, ainda, nos dois países todo um esforço jurídico, com o objetivo
de regular a gestão das escolas. Período de proliferação de atos normativos do poder
central a re-centralização em Portugal associou avaliação sistêmica com autonomia
gerencial. No Brasil, os mecanismos de vinculação e subvinculação dos recursos
financeiros25, associados à elaboração de parâmetros curriculares nacionais, promoveram a
adoção de uma concepção curricular e gerencial mais homogênea pelos sistemas de ensino
e escolas básicas.
A existência de um continuum nas reformas empreendidas em Portugal desde a segunda
metade da década de oitenta até a atualidade e no Brasil após a eleição de 1994, permite
afirmar a permanência da estratégia governamental de centralismo descentralizado
(Karlsen, 2000:525-538). Estratégia presente em ambos os países, após a segunda metade
25
A Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases vincularam a aplicação de 25% da receita
orçamentária de estados e municípios à educação básica. A Lei nº. 9424796, que criou o Fundo de
Desenvolvimento do Ensino Fundamental, subvinculou 15% desses recursos governamentais à aplicação no
ensino obrigatório (fundamental).
Duarte, MRT
Página 138
da década de noventa, sofre a interveniência de um terceiro agente: os governos locais. E a
ação desses “governos” constitui um dos vetores de interação entre o sistema políticoadministrativo e o sistema de escolas.
No Brasil, as eleições municipais vêm demonstrando o crescimento do número de
prefeituras sob governo de partidos de esquerda, em maior número do Partido dos
Trabalhadores. Essas administrações municipais têm-se caracterizado pela introdução de
novas formas institucionais de gestão pública como o orçamento participativo, a
elaboração de projetos político-pedagógicos para as escolas de educação básica, a
promoção de fóruns setoriais de discussão e deliberação e programas sociais
compensatórios inovadores como o bolsa-escola. A estratégia de desconcentração para a
implantação de programas centrais confronta-se com um ator que detém legitimidade
política e institucional para formular e implementar alternativas às diretrizes
centrais/globais de política educacional.
Em Portugal, o XII Congresso da Associação Nacional do Municípios (realizado em 2001)
debateu a transferência de competências na área de educação, conforme prevista na Lei no.
159/99. Neste encontro, foram levantadas questões gerais com o objetivo de enquadrar
negociações e o processo legislativo decorrente. Entrevistas efetuadas com pesquisadores e
gestores em administração educacional reiteraram a ocorrência de um certo consenso entre
as administrações autárquicas, no sentido de obstar a transferência de competências sem
prévia avaliação das conseqüências financeiras para os municípios.
6. 4 Autonomia da escola e dos governos locais
Nestes países semiperiféricos, Portugal e Brasil, medidas voltadas para a universalização e
efetividade das políticas sociais – escolarização de crianças e jovens incluída – ocorreram
simultâneas à reforma dos serviços estatais26. Nestes dois países, os processos de
redemocratização defrontaram-se com exigências de reforma político-administrativa dos
serviços públicos. Entretanto, uma diferença institucional substantiva entre a realidade
26
Em Portugal, a crise da escola de massas verificou-se no mesmo momento em que ocorreu sua expansão
(Stoer & Araújo, 1992). No Brasil, a universalização do ensino fundamental (obrigatório) constitui, ainda,
uma tarefa inconclusa no final do século XX, especialmente nas regiões mais pobres do norte e nordeste
(MEC-INEp, 1996).
Duarte, MRT
Página 139
brasileira e portuguesa deve ser destacada. A Constituição Brasileira de 1988 e a LDBEN,
aprovada em 1996, asseguraram aos municípios competência para se organizarem como
sistemas autônomos. A Lei faculta a todos os municípios brasileiros competências de
planejamento, execução e avaliação de ações próprias, desde que respeitado seus
dispositivos, a Lei de Diretrizes e Bases e observadas as diretrizes curriculares nacionais.
Desse modo, no Brasil a formulação e implementação (municipal) de política educacional
pode observar uma lógica de governo local, com autonomia legislativa e administrativa,
frente a ações dos demais atores locais. Este estatuto possibilita, ainda, aos governos locais
a adoção de medidas capazes de obstar decisões do nível central27.
Souza (2000), em estudo sobre o federalismo brasileiro argumenta que a redemocratização
no Brasil implicou descentralização política e financeira para os governos subnacionais;
elaboração de nova constituição, gerando novos pactos e compromissos políticos e sociais;
mudança no papel desempenhado pelos entes federados. O federalismo é uma das
instituições que foram reconstruídas após a redemocratização e a descentralização. No
entanto, as mudanças ocorridas não devem ser vistas como um movimento radical da
centralização para a descentralização. O federalismo brasileiro não se formou pela
dicotomia entre centralização versus descentralização, mas sim por um continuum entre
esses processos, o qual sempre guiou as relações de poder entre as esferas central,
regionais e locais (Bovo, 2000; Souza, 2000; Abrucio & Soares, 2001). As tensões
existentes no federalismo se localizam em questões que não foram enfrentadas pelos
regimes políticos anteriores, tais como as nossas históricas desigualdades sociais e
econômicas.
No desenho institucional brasileiro as escolas públicas municipais e escolas particulares de
educação infantil e ensino fundamental devem observar diretrizes de política educativa
fixadas pelos governos locais28. Portanto, a autonomia política não é da escola, mas dos
sistemas locais de ensino. Este desenho pode ter conseqüências importantes, pois incentiva
27
Em 1997 os partidos de oposição interpuseram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN no. 1627-0)
junto ao Supremo Tribunal Federal, questionando o art. 9º da Lei nº. 9424/96. O dispositivo legal
questionado fixada prazo de elaboração pelos estados e municípios de planos de carreira do magistério. A
medida liminar foi deferida quanto ao prazo fixado e encontra-se aguardando o julgamento do mérito.
28
Em um mesmo município encontram-se, ainda, escolas estaduais de educação básica e escolas particulares
de ensino fundamental mais ensino médio subordinadas aos governos estaduais. O número de escolas
federais de ensino fundamental e médio é muito pouco significativo.
Duarte, MRT
Página 140
a elaboração pelos governos locais de planos ou projetos político pedagógicos. E as
propostas e medidas adotadas no campo educacional podem constituir em mais um
elemento de escolha eleitoral, reforçando dimensões de uma democracia mais pluralista.
Em Portugal, os governos autárquicos observam o paradigma da “administração
napoleônica”, cuja lógica considera o poder público local como organização dependente,
reconhecida pelo poder central. No entanto, sendo dependente e tolerada não deixará esta
‘administração local’ de afirmar a sua própria lógica.(...) Será, pois, através de formas de
acesso às autoridades centrais que os actores locais poderão inserir-se no núcleo produtor
de decisões, interferindo nestas e aumentando a sua esfera de influência na conformação
de determinadas políticas (RUIVO, 1999: 285). Acresce, ainda, as transformações que se
vem processando na natureza das demandas pelos atores locais ao poder público. O ciclo
dos investimentos em infra-estrutura (construção civil especialmente) vem-se encerrando.
Reivindicações por construções escolares e compra de equipamentos tem sido alteradas por
questões relacionadas com a qualidade de ensino, conteúdo dos chamados tempos livres e
prolongamento da escolaridade (especialmente educação infantil)29.
A questão decorrente indaga a respeito de bases político-institucionais em Portugal para a
implantação e generalização de formas democráticas e participativas de gestão da res
pública, nestas incluídas as escolas. Ruivo (2000a) assinala, o crescimento do papel
político das autarquias em Portugal como de mediação entre centros e periferias,
contribuindo para tanto a ampliação da intervenção dos corpos burocráticos nessa relação;
a mudança na base social de recrutamento político e as transformações na vida política
local no sentido de sua complexificação em uma teia de grupos, associações e entidades
organizadas.
A legislação elaborada e reformada pelo poder central, nem sempre de forma negociada
com as autarquias, expressa além da normalização e enquadramento das práticas sociais
vivenciadas no período pós-revolucionário (Afonso, 1998) uma estratégia de
desconcentração do tipo top down capaz de prevenir ameaças à legitimação do poder
29
O estudo de Vilarinho (2000) ao analisar o período de revitalização das políticas de educação pré-escolar
em Portugal destaca a tensão presente entre as diferentes concepções de políticas educativas para a infância e
as reais demandas das crianças. Este estudo introduz o debate sobre novas demandas em torno da educação
da infância.
Duarte, MRT
Página 141
central e concretizar diretrizes formuladas centralmente (KARLSEN: 2000-530). A
natureza das atribuições transferidas às autarquias opera no sentido de desfocar
reivindicações e demandas do poder central. Situando-as no plano local, ao mesmo tempo
em que mantêm o poder de decisão no centro, as atribuições conferidas induzem à
elaboração de associações entre a baixa qualidade e/ou ausência dos serviços com
ineficiência/ineficácia administrativa do poder público local. O modelo de poder político
(SANTOS, 1993) não é posto em causa de modo direto, pois as reivindicações podem ser
circunscritas à administração concelhia30.
Nos dois países, porém sob bases jurídico-políticas diferenciadas, os governos locais têm
adquirido maior protagonismo face às questões relativas a educação escolas básica. No
entanto, o modus operandi dessa instância governamental é revelador das interações entre
o sistema político-administrativo de formações sociais específicas e diretrizes
centrais/globais de reforma.
6.5
Autarquias,
educação
escolar
e
ação
social:
governos
locais
e
descentralização
A cooperação que daqui resultar constituirá o verdadeiro alicerce
de uma reforma educativa em Portugal, até porque será, talvez, a
única alternativa ao paradigma da centralização (Lima, 1987: 18).
Em Portugal, o crescimento da intervenção autárquica na educação escolar elementar
(educação infantil e básica) pauta-se em uma dupla referência: a base normativa
promulgada no contexto de uma reforma “heterogênea” do Estado31 e, simultaneamente,
em uma cultura política balizada pelo poder decisório centralizado32. No entanto, a
legislação portuguesa não tem facilitado o desenvolvimento de políticas educativas locais
30
31
Lauglo (1996: 172-175) expõe as principais razões para redistribuir autoridade.
Santos (1993:40-4) designa como Estado heterogêneo aos contextos pós-revolucionários de governação
onde a heterogeneidade e a descontinuidade da estrutura social se teriam reproduzido na matriz política e
administrativa do Estado, através de diferentes modos de regulação social que foram ensaiados. Neste
sentido, a concretização das reformas do aparato de Estado vem-se processando nas diferentes áreas com
temporalidades e influencias diferenciada. Lima (1999) destaca nos estudos organizacionais e administrativos
da educação a descontinuidade entre as práticas de organização e administração das escolas e a produção
jurídica normativa. Estas referências reafirmam, para a realidade portuguesa, que a concretização de
diretrizes gerais de reforma no plano local constituiu-se como síntese de múltiplas influências.
32
A inexistência do Estado-providência ampliado em Portugal fundamenta-se em um deficiente nível de
penetração administrativa para a interiorização dos direitos sociais como direitos, favorecendo a construção
de um modelo de poder político privatizado (ver: Santos, 1987: 57). Isto é, de um modelo de poder
contemplador de uma distribuição acrescida de bens públicos a quem a esse poder tivesse acesso de forma
personalizada (Ruivo, 2000: 28).
Duarte, MRT
Página 142
(Louro, 1999: 153), seja por responder a diretrizes globais recentralizadoras ou devido às
contradições e conflitos internos ao Estado Central.
Em 1977, a Lei nº. 7933 dispunha sobre a estrutura e competência dos órgãos autárquicos
segundo os preceitos constitucionais. No entanto, o diploma legal que efetivamente previu
a transferência de atribuições para a administração local foi o Decreto Lei nº. 77/84
(Mozzicafredo, 1988:52-54). Elaborado desde um contexto onde o Estado introduzia
medidas jurídicas institucionais de enquadramento das práticas sociais (Afonso, 1998: 173178), este Decreto-lei transferia para o nível local atribuições de financiamento, execução e
gestão nas áreas de educação e ensino, cultura, tempos livres, desportos e saúde34. Em
1999, nova Lei – nº. 169 de 18 de setembro - modifica o quadro de competências, assim
como o regime jurídico de funcionamento dos órgãos, dos municípios e freguesias35.
Podemos sintetizar, correndo o risco de minimizar controvérsias importantes, as principais
competências legais das autarquias para a educação escolar infantil e 1o. ciclo do ensino
básico (art. 19o. Lei 159/99):
-
nas construções escolares (obras novas e reformas);
-
na aquisição de equipamentos (mobiliário, material elétrico-eletrônico, etc);
-
ação social escolar (área de desportos, alimentação, material didático, transportes
etc).
No entanto, a observação do enquadramento legislativo constitui parte das atividades dos
agentes políticos e administrativos locais. Por um lado suas atividades consistem em
dirimir conflitos em torno da aplicação de normas elaboradas centralmente, por outro lado,
a busca de soluções negociadas em face de demandas e/ou reivindicações locais coloca os
33
Não tem sido pródiga nas referências à educação, domínio que parece considerar implícito em outras
designações (...), exceptuando-se uma referência à rede escolar dos ensino pré-primário, básico, secundário e
médio e aos respectivos equipamentos escolares (Lima, 87:16)
34
O artigo 15º. do Decreto-lei 77/84 estipulava que as transferências previstas seriam objeto de
regulamentação, sendo aprovado a seguir os decretos DL 299-84, em relação aos transportes escolares e o DL
299-A/84, sobre a ação social escolar. De acordo com Fernandes (1998:34) o investimento dos municípios na
educação resultou da nova situação criada pelo 25 de abril e não propriamente da definição de competências
na Lei. Considera que está ainda por fazer um inventário adequado dessa situação, embora destaque a
construção e reparação de edifícios para a educação pré-escolar e primária, equipamentos e materiais
escolares, atividades de ocupação de tempos livres, etc. como as áreas de intervenção predominante.
35
art. 64: competências no âmbito da organização e funcionamento dos seus serviços: l) apoia ou
comparticipa no apoio a ação social escolar e às atividades complementares no âmbito dos projetos
educativos nos termos da lei; m) organizar e gerir os transportes escolares. No âmbito do apoio a atividades
de interesse municipal: deliberar em matéria de ação social escolar, designadamente no que respeita a
alimentação, alojamento e atribuição de auxílio econômico a estudantes.
Duarte, MRT
Página 143
governos locais frente a necessidade de acesso a canais de financiamento de suas políticas.
Esta multiplicidade de funções contribui para acentuar processos relacionais entre poder
central e periferias, reforçando a interação dessas instâncias pela mediação do fundo
público (RUIVO, 2000).
6. 6 Centro e periferias: mediações do e com o fundo público
A defesa de maior autonomia dos governos locais (das autarquias no caso português) no
trato de questões relacionadas à educação e cultura encontra ressonância em diretrizes
globais que identificam nesta instância governamental maior capacidade de mobilização e
negociação com os agentes locais capazes de desenvolver soluções para situações
problema. Encontra, também, ressonância nas estratégias de interação entre poder central e
periferias. Esta simbiose entre as relações intergovernamentais internas aos Estados e
diretrizes globais de modernização, possibilita a realização de reformas modernizantes com
a manutenção de relações autoritárias de poder e governance.
Entrevista realizada com presidente de Junta de Freguesia sobre a implantação de um
jardim de infância, em uma cidade na região norte de Portugal, é reveladora da relação
entre demandas locais, capacidade relacional e diretrizes centrais.
E há ainda muitos pais, que ainda hoje pensam que: porque só tenho a quarta classe
meu filhos não vão ter mais. E há pessoas que vêem os filhos como uma fonte de
rendimento. Há pessoas que querem que o filho tenha rapidinho a quarta classe, agora
já não tanto.. tiram logo no quarto ano, no sexto ano, para os por a trabalhar. Tem
muita gente a pensar assim. Então, nesses meios pequenos, onde toda gente quer ter
uma casa e um carro e, se possível, mais uma casa, está percebendo os filhos são uma
fonte de rendimento. Daí que ninguém reivindicava, hoje ...
Então o meu trabalho, ao longo destes anos porque eu digo que em conjunto podemos
fazer grandes coisas, individualmente não faremos tantas. Daí que hoje a associação
cultural e desportiva está de corpo e alma com a Junta de Freguesia e através da Junta
de Freguesia já tem conseguido subsídios estatais, camarários, do governo civil de
Braga distrital, para as suas atividades. A própria Igreja hoje já está conosco, porque
eu comecei a chamar as pessoas e dizer. Ou damos as mãos e trabalhamos juntos por
um único objetivo que é o desenvolvimento de nossa freguesia ou então não vamos a
lado nenhum.
P - Você participa de reuniões nas escolas? Quantas? Com qual freqüência?
Sim, agora por exemplo, no início do ano letivo fui convidada a estar, percebe..
P - Para?
Duarte, MRT
Página 144
Neste caso as professoras querem sempre que a Junta esteja, porque há obras a fazer
na escola, por isto ou por aquilo. Assim eu aproveito sempre e pego às vezes nas
questões dos pais, para os ajudar a pensar numa forma diferente de fazer o percurso
dos filhos. Por exemplo, ninguém quer fazer uma associação de pais e uma associação
de pais ou uma comissão de pais faz falta numa escola. Porque se eles querem
reivindicar melhores condições em termos de horários, perante a direção regional
escolar, tem mais peso a Associação de Pais, do que eu, Presidente de Junta, ou a
professora. Há que haver sempre, dentro da escola, um grupo de pessoas que se juntam
e discutem os problemas da escola. E só tem sido possível isto, porque eu digo, é
preciso. Por exemplo, voltando outra vez à instalação do pré-escolar.
É, antes d’eu assumir a presidência [da Junta de Freguesia] eu disse na Câmara: Ok,
vocês querem que eu seja a futura presidente da junta, eu só quero que me dêem logo
no início isto, que é o pré-escolar. Ah, mas não sei, mas não sei, é um bocado difícil..
Meus amigos eu preciso do pré-escolar. É uma coisa que eu venho trabalhando há
vários anos, não vem sido conseguido porque o governo que estava [nome] não tinha
dinheiro para isto. Hoje, o engenheiro Guterrez [primeiro-ministro] pensa igual a mim,
acha que o pré-escolar é fundamental em qualquer freguesia, eu quero um pré-escolar.
Como primeira obra eu quero um pré-escolar. Pronto e eles me disseram que sim.
Disseram que sim, toca logo a tratar do projeto.
Quando eu assumo a presidência, logo no ano seguinte, já tínhamos o projeto da escola
e depois no ano a seguir diziam. Pois D. [nome] se calhar este ano não pode ser, não
está no plano orçamentário da Câmara, porque... Eu disse: Desculpe lá, eu assumi um
compromisso com a freguesia da instalação de um pré-escolar e eu não quero mais
demoras. Ele tem de ser agora. Mas não dá.... Meus amigos, arranjem-se por onde
puder, entreguem a obra a Junta, a Junta faz e metem no próximo orçamento. Se é
assim que vocês fazem com algumas situações porque é que não vão fazer agora?
Portanto façam o favor. Ah, e tal, muita dificuldade. Então um dia fui falar com o
vereador da área financeira. E disse: Dr. [nome] o senhor foi das pessoas que aprovou
aqui a idéia há um ano atrás. Eu assumi a presidência convencida de que neste
primeiro ano a obra começaria. Portanto, eu sei que não vou por o pré-escolar a
funcionar neste meu primeiro ano, mas uma coisa eu lhe garanto. É que no próximo
ano, fazendo a obra este ano, no próximo ano eu vou ter a escola. Diz que não pode ser,
mas tem que ser Dr. [nome] senão eu vou me embora. Eu prometi às pessoas e eu não
dou a minha cara de barato. Eu só tenho uma cara, não tenho duas. Então se vamos
agora adiar, as pessoas vão dizer que eu os enganei (Entrevista realizada com
presidente de Junta de Freguesia em 01/10.01) .
Este depoimento demonstra, para além de uma atomização interventiva36 (Ruivo, 2000b), o
modo como se articulam as iniciativas locais, a administração camarária e políticas
36
Toda a panóplia de iniciativas locais pode ser levada a cabo sem que se detecte uma entidade que coordene
e oriente as iniciativas num mesmo objetivo comum. Apesar de existirem algumas instituições e associações
formais que promovem e desenvolvem iniciativas ...Neste caso, poderá até vir a registrar-se alguma
competição entre as diferentes entidades envolvidas, naquilo que será uma actividade fragmentada e
atomizada, não só ao nível das instituições que intervêm, mas também relativamente a cada projecto sectorial
(Ruivo, 2000b: 36-38).
Duarte, MRT
Página 145
estabelecidas centralmente. Revela, ainda, a modalidade de participação solicitada à
população local: dar visibilidade às reivindicações. A eleição da educação pré-escolar
como uma das prioridades do governo do partido socialista (1996) – hoje o Eng. Guterres
pensa igual
a mim - legitima uma luta de anos e as relações existentes com a
administração camarária acionam decisões e medidas que concretizam a obra – se é assim
que vocês fazem com algumas situações, por que é que não vão fazer agora? O acesso
personalizado àqueles que detêm o controle sobre os recursos camarários, associam-se
iniciativas de cumprimento de normas legais (o projeto da escola) e o fiel cumprimento de
uma promessa eleitoral.
Aguiar & Navarro (2000) ao analisarem o custo político marginal para os governos locais
na promoção da participação, destacam que em situações de informação imperfeita
somente onde existir confiança mútua entre governo e associações não haverá limitação
dos processos de participação cidadã. A entrevista transcrita revela, por sua vez, a
subdivisão das formas de participação dos atores: visibilidade das reivindicações pela
população, superação de obstáculos (políticos, normativos e/ou sociais) pelo poder
relacional e efetivação de diretrizes políticas do governo central. Desse modo, constituiu-se
um mecanismo singular de promoção de reciprocidade e confiança.
Daí que hoje a associação cultural e desportiva está de corpo e alma com a Junta de
Freguesia e através da Junta de Freguesia já tem conseguido subsídios estatais,
camarários, do governo civil.
Estes acontecimentos situaram-se na mesma temporalidade com uma agenda global de
reforma, que direcionava a formulação das políticas educativas para o plano central e
promovia iniciativas locais de autonomia na solução de problemas. A simbiose entre a
efetivação de diretrizes globais de reforma educativas e a permanência de um sistema
relacional de administração produz o que foi denominado como modernização
conservadora, ou seja, a interação eficaz entre um certo autoritarismo (poder relacional e
centralização decisória) e restrições à capacidade de organização e participação cidadã,
com apelos à iniciativa dos atores. Por articular o que consideramos como fundamentos
autoritários presentes no sistema político – o poder relacional (Ruivo, 2001) - com as
Duarte, MRT
Página 146
diretrizes de promoção da iniciativa local formas competitivas, porém reguladas, de acesso
ao fundo público tornam-se necessárias37.
A tradição sociológica brasileira – Leal, 1975 – destacou os auxílios da União, destinados a
suprir escassez de rendas, como o instrumento que mais eficazmente garantiam a fidelidade
das oligarquias subnacionais e locais. Em sua análise sobre o fenômeno do “coronelismo”
no Brasil, Nunes Leal assinalava dentre os elementos que compunham sua estrutura e
processo: a desorganização do serviço público local pela utilização do dinheiro, dos bens e
dos serviços públicos locais por um sistema de compromissos com o governo estadual
como também, a assistência técnica e fiscalização financeira prestada pelo estado
subnacional às municipalidades. Nesta tradição, as relações intergovernamentais no país
estão baseadas num modelo hierárquico de submissão e cooptação, predominando um
arranjo sistêmico onde o poder do “centro” decorre de promoção de reciprocidades
mediadas pelo uso do fundo público.
Em seus estudos sobre o poder local em Portugal, Ruivo (1993, 2000 e 2001) utilizou-se de
três aspectos para medir o grau de descentralização das autarquias comparativamente à
administração central: a) enquadramento financeiro das autarquias; b) enquadramento
legislativo e c) recursos técnicos humanos. Em seu enquadramento analítico este autor
considera que o dilema das relações entre o centro e os municípios deriva do peso e da
força do poder relacional que os autarcas são suscetíveis de ativar. Para este autor, o uso
hierarquicamente negociado de recursos públicos, a proliferação normativa do centro para
as periferias (governos locais) e a permuta de benefícios e cargos são, também, elementos
de estruturação de uma teia de relações de um Estado labiríntico.
6. 7 Receitas autárquicas e gastos em educação escolar e ação social
As principais bases de financiamento disponíveis, nos municípios pesquisados,
subdividem-se em duas grandes modalidades, que, por sua vez, articulam de modo
diferenciado a relação entre as autarquias, o governo central e as escolas. Impostos
próprios e transferências intergovernamentais apresentam-se nas contas de gerência
37
Popkewitz (1996) analisou o cenário da década de noventa, como de reconstrução de racionalidades
políticas de autogoverno dos indivíduos. Esta referência nos sugere a centralidade neste mesmo período da
racionalidade da formas de uso do fundo público para autocontrole do sistema político.
Duarte, MRT
Página 147
estudadas como as principais fontes de receitas, tanto correntes como de capital (TAB. 15,
16 e 77).
As bases de financiamento da ação camarária38 - quadro de receitas – revelaram nos três
municípios pesquisados o peso dos impostos diretos (52,8%, 54,4% e 38,8%
respectivamente - ver TAB. nº 15, 16, 17) na receita corrente. O estudo das contas de
gerência indicou que, dentre os impostos diretos, os que apresentaram maior participação
foram: contribuição autárquica e a SISA.39 Incidentes sobre a transmissão onerosa de bens
imobiliários, a dimensão deste imposto retrata a potencialidade do mercado imobiliário em
um município. Por este motivo, promover o crescimento da receita corrente local acha-se
associado a ações de promoção da construção civil. Neste sentido, a promoção de obras
novas e reformas nos prédios escolares constitui simultaneamente um mecanismo
suplementar de reforço aos empreendimentos de capitais locais e de atendimento a
demandas relacionadas a agenda eleitoral.
TABELA 15
Município I - Receitas orçamentárias por fonte de recursos (em escudos)
tipo
Item
Valor em escudos
receita corrente cobrada
%
Total
8.053.027.271
100
I diretos
4.249.163.160
488.027.218
52,8
6,1
Taxas, multas e
outros
713.906.965
8,9
Rendimentos de
propriedades
39.598.088
0,5
2.011.330.528
25,0
100
1.608.338.999
142.814.000
28.887.000
122.336.825
80.937.997
27.194.803
80,0
7,1
1,4
6,1
4,0
1,4
820.904
0,0
I. Indiretos
Transferencias
correntes
FGM
FCM
Outras
Jardins de infância
Transportes escolares
Fundos e serviços
autônomos
Adm. Autárquica
38
%
40
Os valores apresentados são referentes aos valores orçamentários. Informações precisas sobre a receita
arrecadada e despesa realizada não se encontravam disponíveis nas administrações locais. As categorias de
receita a que as autarquias podem aceder encontram-se legalmente determinadas. Destacam-se os impostos
municipais, as transferências da Administração Central e da Comunidade Européia, as taxas devidas pela
prestação de serviços administrativos e o produto resultante da alienação de bens.
39
ver a respeito: Baleiras, 1994: 13-15
40
Participação de outras Câmaras no Transporte Escolar
Duarte, MRT
Página 148
Vendas de bens e
prestação de
serviços
Outras receitas
correntes
527.473.599
6,6
23.527.713
0,3
2.153.590.159
100
Venda de bens de
investimento
88.628.049
4,1
Transferencias de
capital
1.967.267.913
91,3
100
FGM
FCM
Cooperação técnica e
financeira
FEDER
73.376.757
1.072.226.001
95.210.000
271.805.529
54,5
4,8
13,8
528.026.383
3,4
26,8
5.000.000
0,2
19.317.440
0,9
receita de capital cobrada
Total
Passivos
financeiros
Outras receitas de
capital
Reposições não
abatidas
pagamentos
Fonte: Contas de gerência 2000 – Município 1
Os impostos direitos arrecadados pelo município são significativos e no total da receita
sobressaem as transferências tanto correntes quanto de capital. Subtraído os recursos
provenientes dos fundos de transferência obrigatória, os recursos transferidos via
cooperação técnica e FEDER além dos recursos para jardins de infância têm participação
significativa no total das transferências correntes (Quadro 1).
TABELA 16
Município II - Receitas orçamentais por fonte de recursos (em contos)
item
valor em contos
%
%
Total
24.284.955
100
I diretos
14.480.728
59,6
I. Indiretos
2.600.684
10,7
Taxas, multas e outros
1.164.189
4,8
205.234
0,8
3.262.986
13,4
100
2.581.459
79,1
83.961
2,6
582.788
17,9
Setor privado: empresas
1.200
0,0
Setor privado: instituições
2.185
0,1
24
0,0
Rendimentos de propriedades
Transferencias correntes
Receita corrente
tipo
FGM
Fundos comunitários
Outras
Particulares: indenizações por prejuízos
Duarte, MRT
Página 149
Particulares: outras
11.359
Venda de bens não duradouros
Venda de serviços
21.289
0,1
2.542.509
10,5
Outras receitas correntes
7.334
Total receitas de capital
11.592.273
100
320.487
2,8
3.845.071
33,2
100
1.720.973
44,8
308.750
8,0
1.235.418
32,1
Outros
395.429
10,3
Setor público empresarial: empresas
184.500
4,8
Venda de bens de investimento
Transferencias de capital
receita de capital cobrada
0,3
FGM
Fundos comunitários
INH
Passivos financeiros
7.416.612
64,0
10.102
3,2
Outras receitas de capital
Fonte: Contas de gerência 2000 – Município 2
A participaçâo dos impostos diretos no total da receita corrente é expressiva (54,4%), o que
possibilitaria decisões mais autônomas na implantação de políticas no município 2. No
entanto, esta possibilidade é condicionada pela expressiva participação dos passivos
financeiras (64,0%) no total da receita de capital deste município (Tabela nº 16).
TABELA 17
Município III - Receitas orçamentais por fonte de recursos (em contos)
tipo
item
valor em contos
Total
I diretos
I. Indiretos
Vendas de bens e prestação de
serviços
Outras receitas correntes
%
7.174.040
2.780.700
248.000
1.194.030
100
38,8
3,5
16,6
18.200
0,3
2.352.830
563.880
32,8
1.441.940
340.890
450.000
120.000
7,9
10.000
0,1
Rendimentos de propriedades
Transferencias
correntes
receitas correntes
Taxas, multas e outros
%
FGM
FCM
Outras
Setor privado
100
61,3
14,5
19,1
5,1
Duarte, MRT
Página 150
Total receitas de capital
10.194.622
100
1.785.173
17,5
5.406.099
2.350
53,0
961.294
227.260
4.217.545
0,0
3.000.000
29,4
Outras receitas de capital
1.000
0,0
Reposições não abatidas
750
0,0
Transferên
cias de
capital
receitas de capital
Venda de bens de investimento
FGM
FCM
Adm central: outras
Activos financeiros
Passivos financeiros
100
17,8
4,2
78,0
Fonte: Contas de gerência 2000 – Município 3
No município 3 (TAB 17), são as tranferências de capital, especialmente as efetuadas pela
administração central que mais contribuem no total da receita. Neste caso, o acesso aos
níveis de decisão central constitui requisito a implementação de novas ações .
As transferências via Orçamento do Estado, são consideradas imprescindíveis, porém
insuficientes, para um eficaz funcionamento camarário (RUIVO, 2000: 103-114). E sua
utilização condicionada às competências de ação fixadas.41. Se estes fundos abriram às
autarquias perspectivas de intervenção mais vastas nos vários domínios das suas
atribuições, dentre eles a educação42 (PINHAL, 1997:183), como instrumentos de
transferência compulsória ou negociada de recursos contêm .mecanismos diferenciados de
41
Após promulgada a constituição portuguesa em 1976, foi aprovada a Lei n. 1, de 06 de janeiro de 1977,
criando o Fundo de Equilíbrio Financeiro. Este mecanismo de transferência sofreu readaptações em 1998 –
Lei no. 42/98 – que passaram a vigorar em 1999, subdividindo-se em Fundo Geral Municipal e Fundo de
Coesão Social
1. FGM → visa dotar os municípios de condições financeiras adequadas ao desempenho de suas atribuições.
Corresponde a 24%, da média aritmética simples da receita proveniente de impostos.
de acordo com a pop. residente
na razão direta do número de na razão direta da área
municípios
50%
30%
20%
Divisível por 3 unidades territoriais: continente, Açores e Madeira
2. FCM → visa fomentar a correção de assimetrias e é distribuído com base nos índices de carência fiscal
(ICF) e de desigualdade de oportunidades (IDO).
ICF de cada município = a diferença entre a captação média nacional de impostos e a respectiva do
município.
IDO = diferença de oportunidades positivas para as cidades de cada município.
42
É certo que a educação não constituía um domínio de intervenção prioritária das autarquias locais, atentas
no período aos graves problemas infraestruturais de seus territórios (PINHAL: 1997: 183)
Duarte, MRT
Página 151
controle pelo poder central sobre as ações a serem desenvolvidas no âmbito local. As
transferências compulsórias submetem-se a um controle processual e/ou de aplicações em
setores
previamente
definidos
(construções
e
reformas
em
prédios
escolares,
equipamentos, etc.).
A tabela 18, por sua vez, fornece indicações do peso relativo dos recursos via
transferências na composição da receita das autarquias portuguesas
TABELA 18
Composição percentual das receitas autárquicas segundo a fonte
Receitas correntes
Ano
Total
1995
1996
1997
1998
100
100
100
100
I. M sobre
veículos
I. M de Sisa
Contribuições
autárquicas
FEF
Outras
2,66
2,56
2,42
2,37
14,18
14,10
14,74
17,03
15,29
14,27
13,76
14,72
30,36
31,82
29,91
28,34
37,51
37,24
39,17
37,53
Receitas de capital
Ano
1995
1996
1997
1998
Total
Empréstimos
FEF
Outras
100
100
100
100
31,04
20,68
8,57
6,91
34,00
31,40
25,46
26,98
55,18
57,57
58,46
53,20
Fonte: INE. Contas de gerência das Câmaras Municipais.
Outra fonte significativa de recursos relacionam-se às transferências correntes e de capital
do governo central (via FGM e/ou contratações e/ou fundos comunitários43). Neste item de
receita e excetuando os Fundos - FGM e FCM - os recursos não especificados e constantes
como “outros” estão classificados como “transferências do setor público administrativo,
administração central”44. No entanto, cabe ressaltar que a sistemática de transferência,
especialmente via contratações, permite concretizar a implementação local de programas
definidos centralmente45. As diferentes modalidades de cooperação técnica e financeira
permitem estabelecer contratos-programas e acordos de colaboração entre o governo
central e os governos autárquicos.
43
Os quadros síntese de contas da gerência
Um estudo retrospectivo poderia indicar qual a tendência de crescimento nestas rubricas, para cada um dos
municípios pesquisados.
45
Segundo a Lei de Finanças Locais, não é permitida a atribuição pelo Estado de quaisquer formas de
subsídios ou comparticipações financeiras aos municípios e freguesias. Todavia, podem ser inscritas, no
Orçamento do Estado, por ministério, verbas para financiamento de projetos, considerados de relevância para
o desenvolvimento regional e local.
44
Duarte, MRT
Página 152
6.7.1 Sistemática operacional das comparticipações (transferências voluntárias)
A sistemática operacional utilizada46 distingue, de acordo com o montante de recursos a ser
disponibilizado, a celebração de contratos-programas – montante igual ou superior a 25%
das verbas atribuídas a título de receita do capital do FGM e do FCS – ou acordos de
colaboração. Os contratos programas, com recursos mais significativos, caracterizam-se
por estabelecer a forma institucional de execução de programas educativos definidos
centralmente. As administrações autárquicas tornam-se responsáveis por adequar às
especificidades e/ou realidade local prioridades definidas centralmente ou mesmo por
instâncias internacionais. Mas, estes contratos, estabelecem, ainda, contrapartidas
[comparticipações] camarárias.
Mediante contratos-programa o governo central pode definir linhas de atuação prioritárias
às administrações camarárias, como também induzir os procedimentos administrativos a
serem observados. Como estes contratos estabelecem prazos pré-delimitados de duração e
sua renovação não ocorre de modo automático, para a sua implementação se faz necessária
a contratação precária (a termo certo) de agentes especializados.
6.7.2 Acordos de cooperação técnico científica: interação entre o centro e a(s)
periferia(s)
Em 2000, o Ministério de Ciência e Tecnologia firmou protocolo com a Associação
Nacional dos Municípios Portugueses para a ligação das escolas de 1o. ciclo do Ensino
Básico à Rede Telemática Educativa. Conhecido como um programa de investimento para
ligação das escolas à rede internet, o protocolo firmado estabeleceu a exigência de um
termo de adesão das Câmaras, aquiescendo quanto às obrigações fixadas. Estas ficam,
também, obrigadas à contrapartida de 25% dos recursos, a disponibilizar técnico
responsável pelo acompanhamento educativo e pela instalação dos equipamentos de
informática47.
46
ver Decreto Lei 384/87, de 24.12.87
Constitui uma vertente dos programas operacionais do Quadro Comunitário de Apoio III: Programa
Operacional Sociedade da Informação (POSI) e do PRODEP III. Ver termo de protocolo entre Ministério e
ANMP.
47
Duarte, MRT
Página 153
Entrevista efetuado com vereador da educação [não foi autorizada a gravação] confirma a
candidatura da administração camarária ao programa mediante inscrição e aceite dos
termos gerais estabelecidos. No entanto, a aprovação final do termo de co-financiamento
subordinava-se à decisão do governo central.
Em dois municípios pesquisados os responsáveis técnicos pelo acompanhamento educativo
– entrevistados pela pesquisa sem autorização de gravação - não possuíam disponibilidade
de horários ou uma proposta pedagógica para a realização desta atividade. Considerando o
elevado número de escolas envolvidas no programa – 92 escolas no Município 1 e 98 no
Município 3 – podemos afirmar que, nestes casos, às autarquias assumiram parcela do
financiamento sem qualquer intervenção de caráter político-educativo. Observação e
entrevistas efetuadas a duas escolas das autarquias comprovou a instalação dos
computadores, no entanto, a administração autárquica viu-se forçada a assumir, além da
comparticipação acordada, outras despesas como, por exemplo, o seguro do equipamento e
mobiliário48.
Nos dois casos pesquisados, as Câmaras atuaram como agentes executivos, adequando a
implantação do programa elaborado pelo Ministério, às condicionalidades impostas pela
realidade do município.
6 8 Gastos autárquicos na área educacional
Em estudo sobre as finanças das autarquias locais, Baleiras (1994: 22-24) demonstra a
forte associação estatística presente entre despesas e receitas das municipalidades. Conclui
reconhecendo a eficácia do sistema de controle orçamental e indica a possibilidade de
alguma dependência funcional das despesas em relação às receitas transferidas da
Administração Central e da Comunidade Européia para as autarquias locais.
É ampla a literatura que demonstra o crescimento das despesas sociais públicas em
Portugal após o 25 de abril (ver a respeito: LOBO, 19 : 630). No entanto, permanecem
48
Não foi detectado nas entrevistas realizadas com vereadores da educação e funcionários das Câmaras
Municipais a elaboração ou execução de programas sócio-educativos de iniciativa camarária no sentido de
promover maior aproximação entre a administração pública e as escolas.
Duarte, MRT
Página 154
índices inferiores aos valores médios europeus e estes índices apontam para a necessidade
de um esforço mais consistente de investimentos no setor educacional, conquanto a
retórica de sua relevância para o desenvolvimento e democracia.
A participação das autarquias no que respeita a educação escolar acha-se influenciada, por
demandas de atores locais, pelas transferências de competências e por uma legislação que
confere atribuições específicas, notadamente de natureza executiva. No entanto, nas
últimas décadas têm crescido a intervenção das autarquias em matéria educativa e parece
surgir uma tentativa de construção de políticas educativas próprias, procurando uma
intervenção ao nível pedagógico (Candeias & Simões, 1999). Se as relações centro
periferia condicionam, mediante acordos e convênios, a elaboração autônoma de políticas
locais de educação, em segundo componente relacionado à importância de fundos públicos
com administração descentralizada também interfere na construção da autonomia política
de sistemas locais.
As contas de gerência estudadas49 revelam duas formas diferenciadas de gasto das
autarquias com a educação escolar básica, expressão de uma lógica decisória local que
interage com diretrizes centrais e globais:
6.8.1 Gastos atomizados e com construções
TABELA 19
Despesas correntes e de capital em Educação, Cultura e Turismo - Município 1 - 2000
%
Item
Designação da rubrica
pagamento
Despesas
correntes
Pessoal de quadro
49
246.597.395
12,75
63.131.555
3,27
37.269.188
1,93
6.008.492
0,31
pessoal em qualquer outra
situação
suplementos de remunerações50
prestações sociais diretas51
O instrumento de prestação de contas dos gastos efetuados apresentou variabilidade entre as autarquias.
Nas contas de gerência analisadas encontramos informações agregadas quanto a função a qual era destinada
os recursos em dois municípios e informações fragmentadas quanto ao destinatário final do pagamento
efetuado em outra. Observamos, ainda, a inexistência de um documento de prestação de contas que se
articula aos gastos efetuados, com funções e programas mais específicos.
50
subsídio de refeições = 31.983.100$, horas extraordinárias. = 2.567.098$
51
subsídio familiar a crianças e jovens = 5.848.592$
Duarte, MRT
Página 155
encargos sobre remunerações
outros custos com pessoal
37.812.035
1,96
4.164.350
0,22
31.002.353
1,60
74.807.771
3,87
111.517.476
5,77
27.373.819
1,42
transferências adm privada
257.107.018
13,30
outras despesas correntes
72.731.304
3,76
aquisição de bens e serviços
correntes - bens duradouros
aquisição de bens e serviços
correntes - bens não duradouros
aquisição de serviços52
transferências adm autárquica
despesas de capital
aquisição de bens de investimento
-
instalações desportivas e
recreativas
mercados e instalações de
fiscalização sanitária
Escolas
316.646.913
16,38
35.902.293
1,86
49.137.029
2,54
Outros
175.339.780
9,07
construção de instalações
desportivas
maquinarias e equipamentos
355.387.674
18,38
total do órgão
total do orçamento
31.580.725
1,63
1.933.517.170
100,00
10.748.100.656
17,99
Fonte: Contas de gerência - 2000 - Município I
As despesas efetuadas com instalações desportivas e reformas de escolas são significativas
no total de gastos efetuados na área (TAB. nº 19). Observa-se, ainda, que as despesas com
transferência à administração privada (prestação de serviços) já superam os gastos com
pessoal. Estes dados, por sua vez, são expressão de uma lógica política de ação do fundo
público destinado ao financiamento das políticas sociais: a destinação de recursos públicos
para a construção de equipamentos sociais (investimentos em infra-estruturas) e a
utilização da compra de serviços no mercado para despesas correntes na área contribuem
para promover investimentos locais atrelados a compromissos de reciprocidade política.
No entanto, existe um terceiro vetor de despesas que se relaciona com estes: a ação social
escolar.
TABELA 20
Município I - Principais ações desenvolvidas em 2000 na área da Educação
Valor em
Observações
Ações
atendimento
escudos
52
outros = 62.899.757, conservação de bens = 19.716.604$, transportes e comunicações = 11.403.000$
Duarte, MRT
Página 156
7161 alunos53
Transportes
escolares
passes
Auxílios
econômicos
249 passes
alunos carentes
1500 passes no
1º ciclo do EB
2513 alunos do 1º
ciclo
102 da EBM Telescola
Material
didático
jardins de
infância
1º ciclo
Subsídios
Reparações
Aquisição de mobiliário
Conservação
10.633.320$00
as escolas encaminham a listagem dos alunos,
com direito ao passe escolar
12.327.370$00
material escolar diverso (lápis,esferográficas,
cadernos, esquadros, livros, etc.)
7.131.382$00
para escolas consideradas mais carenciadas
1.271.000$00
1.210.000$00 à Universidade do Minho, Universidade Católica
e Escolas Secundárias
4.517.544$00 executadas em Jardins da Infância e Escolas de
1o. Ciclo pelas Juntas de Freguesia
13.178.279$00
587.744.000$00
37.991.990$00
Apoio sócio educativo
Ensino recorrente
Instalação de internet
visita de estudos
11 jardins de infância pré-aprovados para
construção, sendo 05 em execução
refeição e prolongamento do horário jardins de
infância à 707 alunos
2.641.936$00 material para suporte de refeição
37.440$00 Reparos
196.519$99 material didático
6.000.000$00 contrapartida da Câmara
7.200.000$00 Mobiliário
130.000$00 Seguro
5.923.100$00
construção da escola fixa de
trânsito
22.474.266$00
material e equipamentos para
escola de trânsito
839.364$00
admissão como membro das
130.000$00
cidades educadoras
O relatório lista, ainda, 12 outras atividades educativas promovidas ou que contaram com a
participação da Câmara sem especificar o custo.
Fonte: Município 1 - Relatório de Atividades do Ano 2000 p.72-84
Os dados constantes na TAB.20 demonstram dispersão e fragmentação de ações
assistenciais, que atende reforçam a lógica política de afirmação do poder relacional, pela
mediação do repasse de recursos na ação social escolar. Auxílios econômicos, materiais
didático para escolas consideradas carenciadas e transporte escolar são efetivados por
53
= 4590 alunos do 2o. E 3o. Ciclo do Ensino Básico e 2571 do Secundário
Duarte, MRT
Página 157
mecanismos de contatos com membros ou representantes da Câmara. Observação efetuada
pela pesquisa, no início do semestre letivo, permitiu comprovar o encaminhamento de
solicitações pessoais de subsídios para o transporte escolar feita por pais de alunos e/ou
presidentes de juntas de freguesia à secretaria do Pelouro da Educação. A dimensão
financeira deste atendimento acha-se especificada na TAB 20.
As despesas efetuadas com construções (TAB 19 e 20), prestações de serviços e ação
social efetivam mecanismos de intervenção político-administrativa que reforçam o poder
relacional. Por um lado, a expansão do número de instalações e equipamentos educativosociais com suporte em recursos públicos autárquicos, como mecanismos suplementar de
financiamento do mercado de construções, necessário a formação da receita autárquica
(participação dos impostos próprios no total da receita). Por outro lado, a contratação de
serviços para o gerenciamento dessas atividades e a realização pulverizada de ações
educativas reforça a dependência de recursos autárquicos para a realização de atividades
complementares ao ensino.
TABELA 21
Município II - Despesas correntes relativas à educação escolar elementar – 2000
Unidade
Designação da despesa
Valor em $
%
orgânica
órgãos da autarquia
Direcção municipal de
recursos humanos
Direcção municipal de
habitação e
desenvolvimento social
transferências para administração local acordos de cooperação - pré escolar
subsídio familiar a crianças e jovens
outras prestações familiares
outras prestações de ação social
alimentação cantinas escolares
ação social escolar
Total da despesa corrente
1.139.545.858
5,5
105.253.980
21.113.518
220.627
214.954.171
33.987.500
0,5
0,1
0,0
1,0
0,2
20.847.309.128
100
Fonte: Conta de gerência - Município II – 2000
A desconcentração da gestão (descentralização da administração financeira) – possibilita o
atendimento de demandas da população simultaneamente com o reforço de instrumentos
que asseguram a tutela do poder relacional, nos termos expressos por Ruivo (2000) e
constantes na tradição sociológica brasileira, como clientelismo político. O desafio
político-administrativo consiste em equilibrar demandas que associam a utilização do
fundo público para a promoção de assistência social – gestão da pobreza, nos termos
apresentados por Oliveira (2001) – com sua destinação para a realização de investimentos
que proporcionam a expansão de investimentos produtivos no âmbito dos mercados locais.
Duarte, MRT
Página 158
Ao analisar projetos educativos, apresentados pelas escolas às autarquias para solicitação
de recursos financeiros, encontramos vários ofícios de encaminhamento com termos
semelhantes a esses:
Exmo. Sr. Vereador do Pelouro da Educação da Câmara Municipal do
[nome da cidade]
Junto envio a V. Exa. uma cópia do Projecto Educativo da nossa escola
para o ano lectivo que está a decorrer.
Com os melhores cumprimentos.
Pelo Conselho Escolar, [segue assinatura]
Os recursos autárquicos constituem fonte necessária para “as atividades que pretendemos
realizar”. Independente do maior ou menor mérito dos projetos educativos propostos, a
realização de atividades de formação para além do ensino e, portanto, a efetivação de
maior autonomia político educativa das escolas, requer o ingresso de recursos.
TABELA 22
Município III - Subsídios e transferências atribuídos a entidades escolares – 2000
Especificação
Unidades atendidas Valor em $
Agrupamento de escolas
11
12.463.140
Associação de pais
7
16.587.090
Associação deantigos alunos da escola [nome]
1
100.000
Associação de país da escola EB [nome]
1
60.000
Associação para o Jardim da Infância das [nome]
1
1.504.289
Centro Infantil de [nome]
1
257.400
Diretor de escola primária de [nome]
85
24.731.150
Diretor de escola secundária de [nome]
1
210.000
Diretor de escola infantil de [nome]
1
113.100
Diretor de teleescola de [nome]
4
315.200
Escola de ensino básico mediatizado de
1
90.000
Escola EB 2 e 3 de [nome]
4
500.000
Fonte: Município III – Contas da gerência 2000
TABELA 23
Relação de encargos assumidos e não pagos - referentes a educação escolar elementar –
Município II – 2000
Valor da dívida
Descrição da dívida
Credor
em $
Ação social escolar
Ação social escolar
Agrupamento vertical [nome}
Directora escola no. [enumera-se 2 escolas]
de 1o. Ciclo
197.000
100.600
Duarte, MRT
Página 159
Encargos de instalações e
consumo de secretaria
Directora de jardim de infância escola no.
[Enumera-se duas escolas]
Escolas
Instalações desportivas e
recretativas
Escolas
Escolas
Creches e jardins de infância
nome do credor [entidade privada]
nome do credor [entidade privada]
5.758.943
210.600
nome do credor [entidade privada]
nome do credor [entidade privada]
nome do credor [entidade privada]
1.047.375
17.921.432
2.432.691
Total de encargos relativos a educação escolar
Fonte: Contas da gerência – Município II - 2000
6.300
27.674.941
6.8.2 Gastos com serviços e unidades escolares
Os projetos educativos elaborados pelas escolas no Município II (ver Anexo) evidenciam a
natureza da relação escolas/governo autárquico, na formulação do projeto das escolas. O
Pelouro da Educação solicitou de todas as escolas o envio dos Projetos Educativos das
Escolas. A iniciativa foi interpretada como uma possibilidade de acesso a aquisição de
bens e/ou pagamento de serviços. Estes projetos acham arquivados e realizamos a leitura
cuidadosa de 08 deles, selecionados aleatoriamente (ver Anexo).
TABELA 24
Síntese do planejamento financeiro em projetos educativos das escola, para o ano letivo
2000/2001
Projeto
contêm formulário para candidatura a financiamento de projeto pelo
governo central. Informa o valor dos recursos e discrimina genericamente
pedagógico 1
material de consumo e livros.
Projeto
o projeto discrimina entidades e pessoas intervenientes (incluindo a
Câmara) capazes de estabelecer apoio às escolas, sem informar quais os
pedagógico 2
recursos necessários.
Projeto
lista as possíveis entidades intervenientes (incluindo a Câmara) potenciais
fornecedoras de apoio. Não menciona recursos necessários para “novas”
pedagógico 3
atividades.
Projeto
Discrimina recursos humanos e materiais, sem explicitar tratar-se de novos
recursos ou da utilização dos disponíveis. Ênfase na avaliação com o
pedagógico 4
detalhamento dos instrumentos.
Projeto
Informa sobre condições precárias do imóvel. Propõe a intervenção de
outras entidades (incluindo a Câmara).
pedagógico 5
Projeto
pedagógico 6
Projeto
pedagógico 7
Lista recursos humanos e materiais (4 itens) necessários. Propõe a
intervenção da Câmara para apoio financeiro
Declara que a gestão dos recursos existentes constituem elementos
determinantes como estratégia de desenvolvimento do projeto educativo.
Solicita à autarquia especificamente apoio para transporte escolar em
visitas de estudo.
Duarte, MRT
Projeto
pedagógico 8
Página 160
Informa a necessidade de apoio financeiro para transporte escolar relativo
ao desenvolvimento das atividades previstas no programa
O conteúdo das atividades propostas nos projetos educativos elaborados pelas escolas
indicavam ações passíveis de serem realizadas com recursos disponíveis. Foram poucos os
projetos que condicionaram explicitamente a realização da proposta educativa ao ingresso
de novos recursos. Verificou-se, ainda, a dissociação entre o orçamento proposto (quando
existe um orçamento) e as atividades. Esta separação é sugestiva do reconhecimento
implícito da inadequação do instrumento formal (projeto pedagógico) para a obtenção de
recursos. A análise do conteúdo dos projetos educativos de algumas escolas demonstrou,
ainda, todo um esforço para elaborar novas proposições sem pedir novos meios. Estas
escolas listaram os recursos humanos e/ou materiais disponíveis como estratégicos para a
realização de todas as atividades propostas (TAB nº 24).
A necessária relação entre uma nova proposta educativa e novos recursos
humanos/financeiros é deslocada pela ênfase em princípios e diretrizes e mecanismos de
organização. Operação capaz de situar a educação escolar no campo de voluntarismo, em
um período de projeção do terceiro setor face ao aparato burocrático estatal, ou então como
mais uma entidade a ser objeto de assistência pelo poder público. Todos os projetos
analisados informavam quanto as possíveis entidades intervenientes – governo autárquico
sempre incluído – potencialmente capazes de fornecer apoio financeiro.
Em 1995, técnico do Pelouro da Educação do Município II, após um estudo dos projetos
das escolas, sintetizou uma série de atividades a serem desenvolvidas sob financiamento
camarário. Essas atividades previam, dentre outras, a realização de “Mostra de Lojas
Pedagógicas”; “Exposição de trabalhos dos Alunos das escolas de 1o. ciclo”, “Atividades
Lúdicas” e “Ciclo de Conferências”. Temas e atividades constantes nos projetos educativos
foram incorporados ao evento promovido pelo governo autárquico e a proposta
desenvolvida possibilitou a organização de um evento onde alunos e professores
participavam na dupla condição de expositores dos trabalhos realizados e ouvintes.
Em 2000, o Pelouro da Educação da Câmara – Município II - apresentou um projeto sócio
educativo, pelo 5o. ano consecutivo. Neste ano o projeto disponibilizou meios às escolas
Duarte, MRT
Página 161
para ações de formação a docentes, atividades com crianças, no estabelecimento de ensino
ou em locais da cidade e exposição dos trabalhos ao final do ano letivo (CMP, 2000:6). A
sistemática de apoio financeiro requer que os docentes interessados e/ou a escola
inscrevam-se, individualmente, em uma ou mais das atividades propostas. Estas, por sua
vez, apresentam conteúdo, calendário, recursos materiais e humanos estabelecidos pelo
governo autárquico.
As escolas e docentes receberam, no início do ano letivo 2000/2001, formulário com a
proposta, calendário e ficha de inscrição. Puderam selecionar entre 06 propostas de
formação para docentes e entre 20 atividades diversas a serem realizadas com as crianças.
As propostas foram executadas por entidades/pessoas privadas. O que requer a elaboração
de contratos entre o governo autárquico e os prestadores de serviços de terceiros
especializados.
Pesquisa nos arquivos camarários permitiu o acesso a documentação que expõe a
sistemática de financiamento adotada para a execução do projeto sócio-educativo. Esta
documentação financeira é relativa ao primeiro ano de realização, mas contêm elementos
que permitem visualizar nos procedimentos adotados a relação entre poder relacional e a
oferta de serviços para livre escolha de cidadãos consumidores.
6.8.3 Relações entre centro(s) e periferia(s) e pagamento pelos serviços
efetuados
Em 30 de janeiro de 1996,a vereadora da educação solicitou ao Diretor Municipal de
Finanças e Patrimônio a concessão de um abono transitório de 500.000$00 escudos,
“destinado ao pagamento a pronto do encargo resultante de acções de formação nas
várias áreas do projecto ‘Viver uma escola diferente’”.
Em março do mesmo ano, esclareceu ao Diretor de Finanças que o abono transitório
pedido, tem como base o pagamento a instituição sem fins lucrativos de ações
desenvolvidas no âmbito do projecto, [nome do projeto], iniciado em setembro de 1995.
Por tratar-se de um pedido de fundo específico, a Direção de Finanças informava a
necessidade de autorização prévia. Acrescentava a informação que
“o fundo permanente apenas deve ser utilizado em situação de caráter urgente. Por outro
lado, desde que os serviços a adquirir sejam com ‘pessoas em......’ deverão as respectivas
Duarte, MRT
Página 162
despesas ser visadas previamente pelo Tribunal de Contas, independentemente do valor.
Assim, solicita-se melhor explicitação quanto à urgência e utilização do fundo”.
Após os esclarecimentos da Vereadora da Educação a Directora do Departamento de
Finanças da Câmara despacha informando tratar-se de
“encargos assumidos, e com certeza já [ilegível], no âmbito do desenvolvimento de um
projeto, cuja execução das despesas deverão respeitar o enquadramento legal exigido e a
tramitação normal dos processos”(4.4.96).
Despacho subseqüente do Diretor Municipal de Finanças, no entanto, afirmava:
“Concordo. Deve dar-se prioridade no tratamento dos processos de despesa relacionado
com a iniciativa (16/4/96)”.
A seguir, manuscrito em folha sem timbre ou assinatura, o procedimento com solução de
pagamento adotada:
-
o pagamento aos formadores, não pode sair de um abono transitório, passa a sair
na rubrica 04 09 06;
-
Procedimento:
-
faz-se a requisição (com caráter urgente) para que a verba pedida seja
__bimentada (pode exceder os 100 contos).
depois da requisição autorizada, pede-se factura (ou outro documento) a entidade
-
que vai receber a verba. (se a entidade estiver isenta de IVA, tem de o mencionar,
na referida fatura. A fatura tem de ter data posterior à da autorização).
-
a entidade depois de receber a verba, envia-nos o respectivo recibo comprovativo.
Após, foram encontrados dois recibos, sem data, da Associação Nacional de Professores –
Secção [nome]: referente ao pagamento de uma formadora no valor de 86280$00 e
71680$00 respectivamente. Anexo, uma pequena nota sem assinatura ou data: “Sem efeito.
Ass. N. de Prof. vai ter de mandar recibos, mas só depois de receber”.
Segue, formulário de requisição (ajuste direto) com a designação:
“compra de serviços no âmbito do projeto [nome do projeto], de ações de formação no
valor de 157.960$00. No formulário consta a informação. “Autorizado com caráter de
urgência nos termos do Dec. Lei no. 55/95” e despacho determinando o pagamento”.
Duarte, MRT
Página 163
Consta, ainda, nos arquivos, um segundo formulário para pagamento de serviços (aluguel
de material) no valor de 117.000$00 escudos. Segue, folha com o carimbo e rubrica do
Pelouro da Educação com minuta de orçamento para pagamento de:
Prof. [nome] 26 ações de formação - 312 000$00 - Feita requisição em 96/05/14
Prof. [nome] 26 ações de formação – 157.060$00 - Feita requisição em 96/05/08
Prof. [nome] 12 ações de formação – 96.000$00 - Feita requisição em 96/06/29.
Afirmamos, anteriormente, que desafio analítico, proposto neste estudo, consiste em pensar
a(s) autonomia(s) da escola tendo por referência um novo espaço público, capaz de
associar à promoção de novos formas institucionais de gestão da res pública54 com a
ampliação da autonomia dos espaços e instituições públicas frente aos grupos de interesse.
Estudos que elaboraram a crítica as concepções de matriz neoliberal de autonomia da
escola em Portugal têm por referência a experiência autogestionária do período
revolucionário. Nesta perspectiva, o foco da crítica dirige-se para a desmobilização dos
atores pela atribuição de atividades de execução de programas formulados centralmente. A
pesquisa realizada demonstra que a desconcentração político-administrativa, no sistema
educativo centralizado de Portugal, produz simultaneamente: a) a mobilização de
diferentes atores (escolas, autoridades locais, etc) para diagnóstico de demandas e
proposição de alternativas de solução a situações-problema locais; b) a associação entre
demandas locais e sua ressignificaçäo, caso necessário, com programas e projetos
definidos centralmente; c) a utilização de fundos públicos locais como instrumento de
negociação para o reforço da capacidade relacional e de reciprocidade política.
54
Pazeto & Wittmann (1999) ao analisarem o conteúdo de 134 trabalhos relativos à gestão da escola,
observam que essa literatura apresenta como eixo comum de abordagem a associação entre democratização e
autonomia. Para esses autores, a ênfase posta na gestão da escola é decorrência de um contexto onde a escola
pública já não mais se contém no limite do estatal. Para corresponder aos novos anseios e expectativas da
sociedade, a escola requer a intermediação da comunidade e de suas instituições para assegurar-lhe a
dimensão pública e coletiva.
Duarte, MRT
Página 165
7. Referências e sínteses provisórias
Ao apontar os elementos que promovem a gênese da esfera pública burguesa Habermas
constitui como a primeira fonte do conceito a separação entre a capacidade reflexiva dos
indivíduos e a esfera da realização dos interesses materiais desses mesmos indivíduos. O
segundo elemento enfatizado por Habermas, para o surgimento de uma esfera pública, é a
mudança de postura da burguesia em relação ao poder se comparada com a postura de
outras classes dominantes. A burguesia é a primeira classe dominante cuja forma de
dominação econômica é independente do controle do exercício do poder político (Avritzer,
2000: 63-64). É neste distanciamento, destacado na analise habermasiana, que situamos a
tensão entre a determinação dos fatores estruturais e as formas institucionais de formulação
e implementação das políticas sociais.
Observando a reflexão habermasiana identificamos, na atualidade, possibilidades de
tensionar entre a intensidade dos condicionantes impostos por processos de reestruturação
econômica e crise fiscal – esfera da realização dos interesses materiais – e as formas
institucionais decorrentes do conjunto de procedimentos e ações provenientes de posições
de exercício do poder político. A universalização de serviços sociais que assegurem
direitos fundamentais como saúde e educação contribuem para ampliar e diversificar uma
esfera de atuação privada que, embora estruturalmente ligadas à forma burguesa de
produção e dominação, propiciam o desenvolvimento de subjetividades. Pois a
administração pública dos direitos sociais e coletivos, requer para sua universalização
normas impessoais que tensionam com interesses e/ou particularismos.
Habermas acrescenta, ainda, no contexto de surgimento da sociedade burguesa, o papel da
ciência das finanças e da doutrina da administração subordinando a esfera privada aos
órgãos do poder público.
A economia moderna não se orienta mais pelo oikos, pois no lugar
da casa colocou-se o mercado: transforma-se em “economia
comercial”. Na Cameralística do século XVIII (que deriva o seu
nome de camera, a câmara do tesouro do senhor feudal), esta
precurssora da Economia Política se coloca, por um lado, no mesmo
nível da Ciência das Finanças e, por outro, da doutrina que se
destacava da técnica agrária sintomaticamente como uma parte da
“policy”, a doutrina da administração propriamente dita: tão
Duarte, MRT
Página 166
estreitamente a esfera privada da sociedade burguesa é subordinada
aos órgãos do poder público.(...)
Ainda que isto seja dito por um preconceito muito espalhado, o
mercantilismo não favorece de jeito nenhum a empresa estatal; a
política empresarial exige, pelo contrário, ainda que por vias
burocráticas, montar e desmontar empresas privadas que trabalhem
capitalistamente. Por isso, a relação entre autoridades e súditos
acaba redundando na peculiar ambivalência de regulamentação
pública e iniciativa privada. Assim, é problematizada aquela zona
em que o poder público, mediante atos administrativos contínuos,
mantém ligações com as pessoas privadas. (...) Já que, por um lado,
um setor privado delimita nitidamente a sociedade em relação ao
poder público, mas, por outro lado, eleva a reprodução da vida
acima dos limites do poder doméstico privado, fazendo dela algo de
interesse público, a referida zona de contato administrativo contínuo
torna-se uma zona “critica” também no sentido de que exige a
crítica de um público pensante. (Habermas, 1984: 34-39).
Na perspectiva harbermasiana a instituição da “ciência da administração” se fez como um
instrumento político de intervenção ambígua do poder público na esfera da vida privada e
constituiu-se como procedimento de uma progressiva estatização da esfera privada
burguesa. Mas, para uma melhor apreensão da importância relativa da doutrina da
administração, como elemento de intervenção da esfera do poder público (Estado) sobre a
esfera pública política, retomamos o esquema habermasino:
Setor privado
Esfera do Poder Público
esfera pública política
Esfera pública literária (clubes, imprensa)
espaço íntimo da pequena
família
(intelectualidade
mercado de bens culturais
burguesa)
Corte
(sociedade
da
aristocracia da corte)
(Habermas, 1984:45)
Para Habermas (1984) a esfera pública política provia da literária, como um espaço de
intermediação, por meio da opinião pública entre o Estado e as necessidades da sociedade
(sociedade civil burguesa em sentido estrito).
O processo ao longo do qual o público constituído pelos indivíduos
conscientizados se apropria da esfera pública controlada pela
autoridade e a transforma numa esfera em que a crítica se exerce
Duarte, MRT
Página 167
contra o poder do Estado realiza-se com a refuncionalização da
esfera pública literária, que já era dotada de um público possuidor
de suas próprias instituições e plataformas de discussão
(HABERMAS, 1984: 68).
O que procuramos reter da analise habermasiana é a tensão entre a institucionalização de
uma privacidade ligada ao público e sua interrelação com a administração pública. A
constituição de uma esfera pública em que a crítica se exerce contra o poder do Estado se
fez concomitantemente, segundo Habermas, à institucionalização de uma privacidade
ligada ao público. Esta duplicidade se retroalimenta produzindo indivíduos críticos e pari
passu dotando a administração do Estado de impessoabilidade capaz de intervir em
assuntos privados (empreendimentos mercantis, incluído a cultura) em nome do interesse
geral.
No estudo habermasiano a precedência de uma esfera pública literária constituiu um exante, ou seja, um espaço da gênese da esfera pública política, visto pressupor a existência
de indivíduos livres capazes do exercício da crítica. Em 1985, Habermas introduz uma
substancial reformulação de seu conceito de esfera pública. Ele abandona uma concepção
unitária de esfera pública em favor de uma concepção multiforme, ainda que
lingüisticamente unida. Habermas fala de uma rede altamente diferenciada de esferas
públicas locais e supra-regionais, literárias, científicas e políticas, interpartidárias ou
específicas de associações dependentes dos media ou subculturais, em que ocorrem
processos discursivos de formação de opinião cujo principal objetivo é a difusão do
conhecimento e da informação (Silva, 2001:449).
A reformulação apresentada por Habermas, no entanto, mantêm da concepção original de
esfera pública seu poder emancipatório de proteção e recuperação do mundo da vida, que
sofre os efeitos de uma colonização sistêmica que o descaracteriza. Mais concretamente, a
economia e o aparelho burocrático do Estado destroem os processos comunicativos em
áreas como a cultura, a educação ou a socialização.(SILVA, 2001: 443).
Mas em seu primeiro movimento, ele aponta a contraditória institucionalização da esfera
pública no Estado de Direito burguês.
A esfera pública burguesa se rege e cai com o princípio do acesso a
todos. Uma esfera pública, da qual certos grupos fossem eo ipso
Duarte, MRT
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excluídos, não é apenas, digamos, incompleta: muito mais, ela nem
sequer é uma esfera pública. Aquele público, que pode ser sujeito do
Estado de Direito burguês, entende então também a sua esfera como
sendo pública neste sentido estrito: antecipa, em suas
considerações, a pertença, por princípio, de todos os homens a ela.
Simplesmente ser humano, ou melhor, pessoa moral, também é o
homem privado individual. Designamos o local histórico e social em
que se desenvolveu esta concepção de si mesmo: na esfera íntima,
ligada a um público, da pequena família patriarcal é que cresce a
consciência dessa, caso assim queira, humanidade sem forma
precisa. (...)
Sob tais pressupostos [da Economia política liberal clássica], mas
só com eles, cada um teria igualmente a chance de, com esforço e
“sorte” (o equivalente para a impenetrabilidade dos processos de
mercado, também rigorosamente determinados), conquistar o status
de proprietário e, com isso, de “homem”, as qualificações de um
homem privado com acesso à esfera pública: propriedade e
formação educacional (Habermas, 1984: 105-109).
“Transformação estrutural da esfera pública” permite uma interpretação da constituição de
espaços-tempos onde a generalização da forma mercantil produziu a superveniência da
abstração dos elementos imediatos da atividade concreta de trabalho (labor) e a extensão
entre os indivíduos da percepção das relações abstratas constitutivas da forma capitalista de
produção. Nesta perspectiva, a obra de Habermas possibilita inferir que a generalização da
forma mercadoria na produção e reprodução da vida social pela mediação do poder
administrativo estatal contribuiu, contraditoriamente, para o fortalecimento da esfera
pública política, ou seja, a reunião em público de indivíduos privados com o objetivo de
submeter ao crivo da crítica as decisões da autoridade pública.
Habermas funda a constituição da esfera pública política na existência prévia de interações
não colonizadas por relações mercantis, sua obra traz indicações do fortalecimento de
relações no sistema de poder (esfera estatal) que contraditoriamente também reforçariam
uma esfera pública política. Destacamos, desse modo, na apreensão efetuada da análise
habermasiana a mediação contraditória efetuada pelo poder administrativo estatal: de
colonização do mundo da vida e fortalecimento da esfera pública política.
A leitura formulada do texto habermasiano nos permite indagar sobre as implicações de
um sistema público descentralizado, com autonomia de suas partes constitutivas em tensão
Duarte, MRT
Página 169
com linhas ou eixos estruturantes fundados na política de financiamento, de uma legislação
educacional nacional e em normas orientadoras da intervenção supletiva e redistributiva do
poder central. Em outras palavras, nos apropriando livremente do texto habermasiano, os
sistemas locais e subnacionais ao disporem de autonomia na formulação e implementação
de projetos político-pedagógicos, contribuem para a expressão de pluralidades sócioculturais sob uma base político-administrativa mais homogênea.
Este o foco central do diálogo que iniciamos com a concepção de sistema exposta por
Demerval Saviani, simultaneamente com a critica a aspectos da política educacional
empreendida no período de 1996-2002. Pensar um sistema educacional plural envolve o
reconhecimento de espaços para singularidades, porém demarcadas por estruturações
capazes de obstaculizar sua fragmentação. O texto constitucional de 1988 estabeleceu a
magnitude destes espaços, ao abrigar a autonomia política dos governos locais e
simultaneamente, nomeou como regime de colaboração, relações intergovernamentais
capazes de configurar um sistema plural.
A tensão habermasiana, entre setor privado (sociedade civil) e poder público,
(administrativo) como necessária para a constituição de uma esfera pública política, remete
a indagações sobre o crescimento de expressões de diversidade político-educativas no país,
ou seja, a efetivação de um sistema educacional capaz de compor com esta diversidade. A
concepção subjacente a este estudo considera que a sistemática de financiamento público
constitui o pressuposto de articulação de um sistema, que possibilite falar em educação
básica comum e educações. Em outros termos, uma política de administração educacional
capaz de “colonizar” rupturas provenientes de desigualdades por intermédio de
intervenções reguladoras, mas também promotora de espaços de autonomia que expressem
diversidades sociais e culturais.
A reforma educacional, empreendida a partir de 1996, se fez na tensão entre fatores
estruturais e formas institucionais. Esta tensão em um sistema público do tipo policêntrico
requer o reconhecimento de medidas e procedimentos determinados por fatores estruturais:
uma concepção de regime de colaboração onde programas de assistência social procuram
deslocar
necessidades
infraestruturais
ou
projetos
político
educativos
locais.
Condicionalidades econômicas promovem políticas assistenciais na educação que, por sua
Duarte, MRT
Página 170
vez, reafirmam a importância de novos investimentos em política educacional. Pensar uma
ontogenia da reforma do sistema educativo requer uma reflexão sobre a origem das tensões
que o desenvolvem.
A referência habermasiana é incorporada por situar um ponto de observação onde a
distinção entre dois espaços não resulta em separação. Em “Transformação estrutural da
esfera pública” a distinção dos espaços – neste estudo autonomia do poder local/poder
central – resulta em uma esfera capaz de produzir tensões. Um regime de colaboração entre
sistemas educacionais com autonomia política, porém sob estruturações decorrentes de
uma sistemática de financiamento. O sistema público, sob esta perspectiva de observação,
adquire maior diversidade e, simultaneamente, certa unicidade nas relações que são
engendradas.
No entanto, acompanhando método de análise, as relações intrasistêmicas são mediações
em tensão. Analisamos, no caso brasileiro, os efeitos produzidos pelo exercício da função
supletiva e redistributiva da União, onde o preenchimento de funções, requeridas às
políticas sociais, contribui para a promoção de assistência social na educação e de políticas
educacionais nos sistemas locais de ensino. Ou ainda, com relação à sistemática
redistributiva do FUNDEF, que nos permite identificar como o modus operanti da
administração intervem na “colonização” pela via da equalização das diferenças nas
possibilidades de autonomia.
Com o objetivo de identificar conexões entre um viés de análise institucional com fatores
estruturais que condicionam deliberações de políticas, procuramos refletir sobre as tensões
presentes no interior do sistema público de educação básica. O sistema, desse modo, é
virtualmente (para efeitos de análise) apreendido em suas tensões, identificando espaços
onde gestores/administradores possam intervir promovendo mudanças.
Duarte, MRT
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BRASIL. Lei n.º 9394 de 20 de dezembro de 1996 - estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF.
BRASIL. Lei n.º 9424 de 24 de dezembro de 1996 - dispõe sobre o Fundo de Manutenção
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forma revista no art. 60, § 7.º do ADCT, e dá outras providências. Diário Oficial da
União, Brasília, DF.
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