18 • Público • Domingo 18 Abril 2010
Economia
Emprego a Sectores tradicionais a Inovação a Gestão
Alexandre Soares dos Santos: “Sucessão na
Jerónimo Martins começou há cinco anos”
A gestão executiva regressou às mãos da família Soares dos Santos. Pedro vai estar sob
os holofotes do pai e dos membros que fazem parte do conselho de administração
ENRIC VIVES-RUBIO
Ana Rute Silva
a Nos próximos anos, o conselho de
administração da Jerónimo Martins vai
ter os olhos postos em Pedro Soares
dos Santos, de 50 anos, casado e pai
de cinco filhos. Há cinco anos que o
pai, Alexandre Soares dos Santos, está
a preparar a sucessão do grupo desde
que saiu do cargo de presidente executivo, em 2004, segundo afirmou o
próprio numa conferência na quintafeira. Na altura, o administrador executivo, Luís Palha da Silva, foi o gestor
profissional escolhido para assegurar a
transição. Agora, chegou a vez do filho
Pedro agarrar as rédeas no negócio.
A gestão executiva regressa às mãos
da família Soares dos Santos numa altura em que a Jerónimo Martins quer
dar mais um salto de dimensão: continuar a expandir a sua cadeia de hard
discount na Polónia, a Biedronka, e
encontrar uma nova geografia para
crescer a longo prazo. O chairman
Alexandre Soares dos Santos, nascido
no Porto em 1934 e que geriu o grupo
desde 1969, mantém-se como o rosto
da cadeia de supermercados e cabelhe definir as opções de orientação
estratégica.
Como administrador-delegado,
o filho Pedro é o responsável pela
execução das decisões tomadas pelo
conselho de administração (CA), onde
estão António Borges, António Viana
Baptista (novo membro, ex-gestor da
Telefónica), Artur Santos Silva e Luís
Palha da Silva. Pedro assume ainda a
responsabilidade hierárquica sobre as
empresas do grupo e a direcção executiva (composta por um director de
operações, Pedro Pereira da Silva, de
recursos humanos, Marta Maia, e de
Finanças, Nuno Abrantes).
A relação entre Alexandre Soares
dos Santos e o filho é clara, garante
o chairman. Não haverá espaço para
confusões de papéis. “Cada um sabe
das suas responsabilidades”, disse ao
PÚBLICO. Ter um rosto independente
da família à frente da empresa não é
fulcral para separar as águas. “O que é
preciso é bons gestores. Na prática, a
equipa da Jerónimo Martins mantémse a mesma. Até aqui, comandei. Agora…”, diz Soares dos Santos.
Nomear um administrador-delegado que é também membro da família
é “perfeitamente normal” para Peter Villax, presidente da Associação
Portuguesa das Empresas Familiares
(APEF). O empresário, líder da Hovione, recorda o exemplo de William Clay
Ford, que assumiu o cargo de CEO da
Ford entre 2001 e 2006 depois de décadas de presidentes executivos que
não eram da família. “No caso de haver
membros da família que são também
Alexandre Soares dos Santos quer a empresa gerida pela famíli a
Negócio a crescer
O grupo tem apostado
no mercado polaco
• O grupo, cotado no PSI-20, teve
um resultado líquido de 200
milhões de euros em 2009, um
aumento de 22,8% face ao ano
anterior. Depois de uma fase
crítica, voltou aos lucros há
cerca de sete anos.
• O seu principal negócio é o
retalho alimentar. Dona dos
supermercados Pingo Doce, tem
também a cadeia Biedronka na
Polónia. Detém ainda o Recheio
e é accionista da Unilever em
Portugal.
• Recentemente, comprou as
lojas dos alemães da Plus no
mercado nacional e no mercado
polaco, aumentando o número
de lojas. Hoje emprega cerca de
54 mil trabalhadores.
gestores competentes, a APEF defende
que esta é até a melhor solução para o
governo da empresa”, acrescenta.
Por outro lado, membros do CA como António Borges ou Viana Baptista
“não podem pactuar com favoritismo”. Peter Villax continua: “Segundo
o que é publicamente conhecido de
Alexandre Soares dos Santos, nomeadamente o seu rigor e a sua exigência,
penso que o filho Pedro não vai ter a vida facilitada, antes pelo contrário”. As
empresas familiares têm objectivos de
negócio de longo prazo, que superam
gerações e garantem continuidade.
Paulo Azevedo, CEO da Sonae, tem
a mesma relação com Belmiro de Azevedo, pai e chairman, recorda José Neves Adelino, professor de Finanças da
Faculdade de Economia da Universidade Nova. Assumir as consequências
inevitáveis dos laços emocionais é vital para o negócio. “Esta transmissão
para o filho Pedro foi muito corajosa.
Foi sendo adiada até chegar ao momento em que, por razões várias, fosse viável. Neste momento a empresa
está madura para uma transmissão
destas”, aponta, garantindo que esta
opção “não é avessa às boas práticas
de governação”.
A Comissão do Mercado de Valores
Mobiliários recomenda que exista um
número suficiente de administradores não-executivos independentes.
Numa resposta ao PÚBLICO, a CMVM
Administrador desde 1995
Primeiro emprego foi no Pingo Doce
a O filho de Alexandre Soares dos
Santos começou cedo a carreira no
grupo Jerónimo Martins. Aos 23
anos era assistente de compras na
área de perecíveis do Pingo Doce e,
mais tarde, fez parte da direcção de
operações como gerente de loja.
Foi vendedor de gelados Olá, passou pelo marketing e vendas da Iglo/
Unilever, acumulando responsabilidades pela área de catering com a de
gestor de produto.
Deixa a Unilever e entra como
director adjunto de operações do
cash & carry Recheio, mas dois anos
mais tarde é nomeado director-geral da Arminho, empresa de Braga
adquirida pelo Recheio. A primeira
experiência internacional acontece
em 1992 na Booker, retalhista inglês
de produtos alimentares e parceiro
da Jerónimo Martins no modelo de
negócio de cash & carry. Um ano depois, regressa ao Recheio como director de operações e em 1994 chega
finalmente à direcção-geral, coordenando ao mesmo tempo a Operação
da Madeira (supermercados e cash
& carry entretanto comprados pelo
grupo).
Tem um lugar como administrador em 1995 e no processo de inPedro Soares dos
Santos começou
a trabalhar nas
empresas do
grupo, detidas
pela família, aos
23 anos. Agora
tem de as liderar
ternacionalização é escolhido para
liderar a entrada da Jerónimo Martins na Polónia.
Mais tarde, passa a estar focado
nos interesses do grupo fora de Portugal, nomeadamente no Brasil, onde o grupo compra os Supermercados Sé. A experiência brasileira não
correu bem.
Define a estratégia da Biedronka
polaca, relança a marca em 2000 e
opta por desinvestir no segmento
grossista e hipermercados naquele país. Só regressa a Portugal dois
anos depois, para ajudar a reestruturar o grupo que ganha, entretanto, novo enfoque, e decide vender
activos no Brasil. É também a Pedro
que cabe reposicionar o Pingo Doce
e relançar a marca.
esclarece que o actual chairman da
Jerónimo Martins não entraria nesta
categoria, antes de mais “por lhe ser
imputável posição accionista dominante na sociedade”. “Tal aspecto
deve ser compensado pelos restantes membros independentes e pela
forma encontrada para articular o
seu trabalho de fiscalização no seio
do CA”, continua. O regulador do
mercado diz ainda que a figura do
administrador-delegado é aceite à
luz das boas práticas de governo. A
independência necessária para gerir
os destinos da Jerónimo Martins vai
depender, sobretudo, da personalidade do pai.
Ana Maria Ussman, professor da
Universidade da Beira Interior e autora do livro Empresas Familiares,
diz mesmo que “o pai poderá cair na
tentação de interferir nas decisões
do filho, o que provoca desgaste no
filho e falta de credibilidade perante
o pessoal”. “Esta interferência é mais
provável entre pai e filho do que entre
pai e gestor profissional não-familiar”.
Um filho bem preparado terá maiores
probabilidades de conseguir lidar melhor com estas questões, se existirem,
acrescenta.
Na prática, a sucessão de Alexandre
Soares dos Santos começou a ser feita
desde o dia em que os filhos começaram a conhecer o negócio da família. A
formação começou cedo e a nomeação
de Pedro para administrador-delegado
só mostra que chegou a hora de trocar
de papéis.
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