Universidade Federal de Minas Gerais
Programa de Formação de Conselheiros Nacionais
Curso de Especialização em Democracia Participativa, República e Movimentos
Sociais
Pedro Paulo Sotero da Silva
A Experiência do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea: em busca de uma Democracia Participativa através da Accountability
Societal
MANAUS
2010
2
PEDRO PAULO SOTERO DA SILVA
A Experiência do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea: em busca de uma Democracia Participativa através da Accountability
Societal
Monografia apresentada à Universidade
Federal de Minas Gerais como requisito parcial
para a obtenção do título de especialista em
Democracia
Participativa,
República
e
Movimentos Sociais.
Orientadora: Prof. Dr. Tereza Cristina
Vale
MANAUS
2010
3
4
Dedico a minha noiva, Naza
5
Agradeço...
pelos integrantes do Fórum de Polítcas Popular de Públicas do Careiro da Várzea principalmente Chumana e
Antonio Castro.
Agradeço...
Ao companheiro de luta Ribamar, aos meus amigos Frank. Thay e Mary.
Agradeço...
pela tia Leia ao substituir minha mãe Joana.
Agradeço...
enfim, a tantas existências que proporcionaram essa caminhada de indeléveis descobertas.
6
Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida
Estes são os imprescindíveis
Bertold Brecht
7
SILVA, PEDRO PAULO SOTERO. A Experiência do Fórum Popular de Políticas
Públicas do Careiro da Várzea: em busca de uma Democracia Participativa através
da Accountability Societal. Monografia (Especialização em Democracia Participativa,
República e Movimentos Sociais). Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo elaborar uma reflexão sobre uma experiência de
democracia participativa protagonizada pelo Fórum Popular de Políticas Públicas do
Careiro da Várzea – FPPPCV diante do conceito na atual literatura de accountability
vertical, horizontal e principalmente a societal, procurando analisar as limitações e
avanços do fórum ao mesmo tempo que problematizando esses conceitos a partir
dessa experiência concreta. Neste sentido, percebeu-se que as democracia
brasileira está em um movimento onde representatividade já não é capaz de
estabecer um processo de accountability, necessitando que haja um movimento
social em direção a uma participação ativa através dos mecanismos institucionais
para o exercício da cidadania. A presente experiência do FPPPCV evidencia que os
movimentos sociais organizados e articulados em diversos níveis estão construindo
uma democracia que aos poucos está ampliando seu leque. Onde, em um município
pequeno, de geografia de várzea, congregou as organizações, mobilizou e articulouse em torno de uma agenda para buscar ativar os gestores públicos, para as
questões sociais. Além disso, inseriu-se nos conselhos gestores de políticas
públicas de assistencia social, da criança e do adolescente, da saúde, e da
educação para ser um dos meios no qual o FPPPCV faria engajamento junto a
administração pública fazer a construção da política pública social no município do
Careiro da Várzea. Ao analisar essa experiência de participação através dos canais
institucionalizados temos uma tensa relação com os gestores públicos, mas que ao
longo de 10 anos de atividade apresenta muitas conquistas, estagnações e até
mesmo retrocessos, característica que é propria dos movimentos sociais perante
conjunturas políticas que estão em constante processo de mudança, ao mesmo
tempo que exige da literatura da accountability um permanente re-ver de seus
conceitos. Por não ser um produto acabado, mas compreendido como um processo
a accountalibity vertical, horizontal e no caso investigado a societal, tem uma íntima
relação entre si, sabendo que a governança democrática depende da condição dos
cidadãos de atuarem e dos mecamismos institucionais que viabilizam o processo de
accountability.
Palavras Chaves: Fórum Popular de políticas Públicas do Careiro da Várzea FPPPCV; Accountability Vertical, Accountability Horizontal; Accontability Societal.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..............................................................................................
09
1 RELATO DO FÓRUM DE POLÍTICAS PÚBLICAS DO CAREIRO DA
VÁRZEA ........................................................................................................
11
1.1 História da Criação do Careiro da Várzea contada pelo povo ................
11
1.2 O surgimento do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea ...........................................................................................................
12
1.3 A formação como práxis .........................................................................
14
1.4 O FPPPCV nos Conselhos Gestores de Políticas Públicas ...................
16
1.5 Outras ações do fórum ...........................................................................
18
2 DE UMA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA PARA UMA
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988 ATRAVÉS DE ACCONTABILITY SOCIETAL ..............
19
2.1 A democracia brasileira após a Constituição Federal de 1988 ...............
19
2.2 Definindo as diversas formas de accountability ......................................
21
2.2.1 Accountability Societal: um novo conceito? .........................................
23
3 ACCOUNTABILITY SOCIETAL DO FPPPCV: CONQUISTAS E
DESAFIOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA DEMOCRACIA
PARTICIPATIVA ...........................................................................................
27
3.1 A primeira experiência de democracia participativa no Careiro da
Várzea ...........................................................................................................
27
3.2 Accountability Vertical e Horizontal e sua relação com o Fórum
Popular de Políticas Públicas do Careiro da Várzea – FPPPCV ..................
28
3. 3 Accountability Societal e sua relação com os Conselhos Gestores de
Políticas Públicas na experiência do Fórum Popular de Políticas Públicas
do Careiro da Várzea – FPPPCV .................................................................
29
CONCLUSÃO ...............................................................................................
33
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................
35
ANEXO 01 ....................................................................................................
37
9
INTRODUÇÃO
Atualmente vivemos uma conjuntura política onde a participação da
sociedade civil é imprescindível para o exercício do controle. Assim, é indispesável o
desenvolvimento de mecanismos que possibilitem essa participação. Várias são as
experiências que estão “pipocando” no Brasil, que nos remetem a uma reflexão
profunda para analisar como, efetivamente, as formas de participação no controle
dos recursos e das políticas públicas estão se constituindo no país.
Neste trabalho monográfico, com base na experiência do Fórum Popular de
Políticas Públicas do Careiro da Várzea – FPPPCV em debate com as reflexões
conceituais da atual literatura, procurou-se avaliar essa experiência para que possa
contribuir com a reflexão em torno do tema e principalmente para servir aos
militantes sociais de exemplo de que a participação da sociedade é imprescindível
para construir uma democracia, onde as políticas chegem àqueles que são
excluídos.
Essa democracia participativa tem muitas vezes esbarrado em dificuldades,
seja no aspecto estrutural das instituições públicas, seja no aspecto cultural, com
uma sociedade que ainda não está muito acostumada a exercer o seu direito de
fiscalizar, propor, e monitorar políticas públicas e também de fiscalizar os recursos
públicos.
O
desenvolvimento
do
conceito
de
controle,
que
chamaremos
de
accountability, dentro das suas diversas dimensões (vertical, horizontal e societal),
tem caminhado junto com a mudança cultural no povo brasileiro, principalmente os
segmentos historicante e socialmente mais subalternos no que diz respeito a
cidadania. A participação da sociedade é impulsionada na medida em que cresce a
consciência do exercício da cidadania ativa, que passa não apenas pela exigência
de que sejam atendidos direitos individuais, mas acima de tudo, o atendimento de
direitos do conjunto da sociedade, sendo um espaço de conquistas coletivas.
A partir desse contexto, procurou-se, neste trabalho, discorrer primeiramente
acerca dos conceitos de accountability vertical, horizontal e societal, sua importância
e principalmente suas limitações diante de democracias em desenvolvimento, como
é o caso da democracia brasileira e de muitas outras democracias latino
americanas, além de fazer uma co-relação entre essas formas, dando enfâse a
10
accountability societal para analisá-la diante da experiência do FPPPCV e a atuação
do fórum em relação a esse conceito.
Apesar de existirem muitas experiências alavancadas pelos movimentos
sociais, poucas são analisadas a luz das literaturas, por isso é salutar realizar este
presente trabalho, buscando delinerar como as ações do FPPPCV evidencia as
novas formas de intervenção da sociedade civil que vem se constituindo nas
democracias contemporâneas.
O objetivo geral é investigar como o Fórum Popular de Políticas Públicas do
Careiro da Várzea – FPPPCV, assessorado pela Cáritas A. de Manaus efetivou a
política de accountability societal no município do Careiro da Várzea. Os objetivos
específicos são: descrever o processo histórico de criação e as ações do FPPPCV
em diversas ações de accountability societal
que culminaram na criação dos
conselhos gestores de políticas públicas; fundamentar o conceito de accountability
diante da atual conjuntura política brasileira contextualizado as diversas dimensões
(vertical, horizontal e principalmente societal); e, co-relacionar a atuação do
FPPPCV com o conceitos de accountability, principalmente a societal, descrevendo
suas principais conquistas e limitações para o exercício da democracia participativa
no município do Careiro da Várzea.
A metodologia utilizada, inicialmente, foi uma leitura das bibliografias sobre
accountability como eixo para analisar as ações do Fórum Popular de Políticas
Públicas do Careiro da Várzea - FPPPCV. Em seguida, através de uma pesquisa
qualitativa, por meio da história oral, utilizando-se do instrumental da entrevista,
foram coletados os dados com os integrantes do FPPPCV para a sistematização das
etapas de constituição do mesmo. Esses dados foram comparados a uma outra
pesquisa que é a análise documental dos relatórios da Cáritas A. de Manaus.
Através destes dados descreveremos como foi o processo histórico do FPPPCV e
sua incidência na política de accountability societal no município do Careiro da
Várzea.
Reconhecendo a extenção e a profundidade desta temática não se espera
esgotar neste trabalho, mas apenas contribuir com o debate e com a reflexão sobre
esse aspecto tão relevante para o Brasil construir uma democracia democrática,
para a justiça social que é fiscalizar os recursos e as políticas públicas.
11
1 RELATO DO FÓRUM DE POLÍTICAS PÚBLICAS DO CAREIRO DA VÁRZEA
1.1 História da Criação do Careiro da Várzea contada pelo povo
Este é um registro de uma experiência que a exemplo de dezenas de outras
experiências no Brasil, que busca lutar com os movimentos sociais para que ocorra
a participação pública na elaboração e acompanhamento de políticas públicas
através da accountability societal. O principal objetivo deste texto, além de ser um
registro do que ocorreu, é servir como “testemunho” para que a sociedade,
principalmente as “Vítimas1 do sistema”, assumam um protagonismo ativo no que
denominamos accountability societal.
O município do Careiro da Várzea, localizado a 200 km da cidade de Manaus,
estado do Amazonas surgiu em 1987 a partir da reivindicação alavancada pela
Igreja Católica através dos agentes das Comunidades Eclesiais de Base, juntamente
com outras lideranças locais. A Igreja Católica local, através do seu pároco, teve um
papel importante neste processo, onde por meio dos agentes de pastorais se
buscava mobilizar o povo para ações reivindicatórias de direitos.
Como o próprio nome afirma o município possui uma geografia de várzea, o
que corresponde a algo entorno de 80% do seu território, que nos meses de abril a
agosto têm sua superfície submersa pelas águas do Rio Solimões. As
particularidades do Careiro da Várzea são notórias, basta observar o grande número
de flutuantes que cercam a cidade e pelas longas distâncias de uma comunidade a
outra, tornando o acesso somente pela via fluvial. Tais peculiaridades influenciam
diretamente na forma de articular as lideranças sociais para promover ações em
conjunto.
Quando o município teve sua primeira eleição em 1988, essas lideranças
conseguiram eleger o prefeito e quatro vereadores. Mas, ao longo do vosso
1
Ver Dussel, 2007. Ética da Libertação na Idade da Globalização e da Exclusão. 3° edição. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2007.
12
mandato, não responderam aos anseios do povo careirense, onde a cultura
paternalista e assistencialista se configurava na forma dos gestores se relacionarem
com a população. Depois desse período, o movimento social enfraquece e perde
sua capacidade de mobilização. Isso é devido à saída do pároco que era o apoiador
e o articulador político durante todo esse período e os padres que chegaram não
deram o mesmo apoio. Essas situações são muito comuns em mobilizações sociais
apoiados pela Igreja Católica.
1. 2 O surgimento do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da Várzea
Em 1991, com a chegada no município do Careiro da Várzea da Congregação
das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora de Aparecida e de outro pároco iniciou
um novo processo de articulação das lideranças locais, agentes das Comunidades
Eclesiais de Base, Igreja Assembléia de Deus, Igreja Batista, Pastorais da Criança,
Saúde e Juventude, Clube Estudantil, Associação de Pais e Mestres Comunitários e
Centro Direitos Humanos da Arquidiocese.
Esse movimento, em seu início, tendo em vista a grave situação social que
experimenta o povo do município do Careiro da Várzea e de modo especial a
Comunidade do Distrito do Km 13 (BR 319), onde cerca de mais de 200 famílias que
habitavam este local estavam desprovidas das condições sociais básicas que
possibilitam viver dignamente, onde as crianças e os adolescentes estavam
estudando em uma escola com péssimas condições estruturais. “Isso envolveu o
interesse da comunidade2”, dando início a um processo de organização de algumas
lideranças pelas seguintes reivindicações: reforma e ampliação da Escola Municipal
Balbina Mestrinho, posteriormente também à reforma e ampliação do posto de
saúde, implantação de aterro sanitário com coleta seletiva e um sistema de
abastecimento de água.
2
José Ribamar de Oliveira – Assessor da Cáritas Arquidiocesana de Manaus e Educador Popular pela Rede de
Educação Cidadã: fala proferida em entrevista no dia 18 de dezembro de 2009.
13
Durante esse período a Cáritas Arquidiocesana de Manaus3, entidade de
assistência social, foi chamada pelas lideranças eclesiais locais para um trabalho de
assessoria com todas as lideranças envolvidas. A partir de um processo formativo e
mobilizatório surge à necessidade de criar um fórum que articulasse e mediassem
politicamente às representações desse movimento, assim, iniciou uma grande
mobilização de lideranças. Vale salientar que neste período esse movimento
agregava cerca de 60 lideranças de 45 entidades locais.
Em 1999, surge o Fórum de Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea – FPPPCV como identidade representativa daquelas lideranças e como
espaço permanente de articulação e mediação política. No dia 13 de setembro de
2000, no Seminário “Resgatando a dívida para criar mais Vida”, Ir. Idelsa4 sintetizou
o fórum nas seguintes palavras:
O Fórum não se restringe a credos nem religiões; é aberto a todos; é um
espaço de organização, articulação e socialização de poder, de estudo,
debate e troca de saberes; é um espaço de bons estímulos; na troca de
saberes conhecemos os problemas e juntos articulamos propostas de
divulgação. Fórum é um espaço onde o povo aprende a função da política e
o exercício da cidadania; é um organismo legal e de caráter não partidário,
mas sim apartidário; uma nova forma de política que não exclui ninguém; é
um instrumento de fiscalização e denuncia... trata-se de um espaço de
discussão onde se cria propostas que intervém e influenciam na cena
pública.
O FPPCV se torna um espaço de mobilizar, fiscalizar, denunciar e propositor
políticas públicas até então não constituídas e quando constituídas, mas sem a
participação da comunidade local.
Nos anos de 1999 e 2000 o foco inicial foi a educação, onde o problema
pontual era a condição precária da Escola Balbina Mestrinho localizada no Distrito
do Km13, permitindo, posteriormente, a busca por outros direitos como problema do
posto de saúde, do meio ambiente e do abastecimento de água. Esse processo
mobilizatório ocorreu diante da conjuntura de implantação dos direitos da Criança e
do Adolescente (Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990. Conhecido como Estatuto da
3
A Cáritas Arquidiocesana de Manaus é um organismo da Igreja Católica que congrega uma rede de Cáritas de
atuação social composta por 162 organizações presentes em 200 países e territórios. Atua na defesa dos direitos
humanos e do desenvolvimento sustentável solidário na perspectiva de políticas públicas, com uma mística
ecumênica. Seus agentes trabalham junto aos excluídos e excluídas, muitas vezes em parceria com outras
instituições e movimentos sociais.
4
Ir. Idelsa Reginalli – Congregação das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora de Aparecida. Ata do FPPPCV
do dia 13 de outubro de 2000.
14
Criança e do Adolescente - ECA) alavancada pelo Conselho Nacional da Criança e
do Adolescente através da campanha Prefeito Criança e também das eleições
municipais do ano de 2000, ou seja, através das metas da Campanha Prefeito
Criança, articulado com várias entidades da sociedade civil5 de Manaus, o FPPPCV
realiza um seminário Resgatando dívidas para criar mais vida. O seminário foi
informativo e formativo, onde os candidatos a prefeito participaram assumindo diante
da sociedade o compromisso de adesão ao “Projeto Prefeito Criança” (ver anexo
01). Houve uma significativa participação da comunidade, contamos com o número
de umas mil pessoas vindas de vários distritos do município. Foi de fundamental
importância veicular a campanha no seminário, visto que a mesma visava a adesão
dos candidatos ao cargo de prefeito e apresenta 16 pontos a serem executado na
gestão do candidato eleito6.
Após a eleição, durante a posse do prefeito em 2001, o FPPPCV entregou as
metas do Projeto Prefeito Criança, mediante uma manifestação pública. Tais metas
se tornaram a agenda reivindicatória do FPPPCV durante os anos de 2001 a 2005.
Nas eleições de 2004, esse processo se repete.
1.3 A formação como práxis
Paralelamente as ações de reivindicação, os integrantes do fórum, através da
assessoria da Cáritas A. de Manaus passaram por um intenso processo de
capacitação com todos os representantes envolvidos. “A questão era como conciliar
a formação num movimento de ‘ação-reflexão-ação’”7, ou seja, uma práxis onde a
formação estava diretamente relacionada as ações reivindicatórias do FPPPCV. A
metodologia era capacitar na ação, perpassadas pelos princípios da educação
popular na perspectiva freiriana.
5
As entidades envolvidas: Cáritas Arquidiocesana de Manaus; Fórum Estadual de Defesa de direitos da Criança
e do Adolescente; Conselho Estadual de Direitos da Criança e do Adolescente; Pastora do Menor; e, Pastoral da
Criança.
6
Ver anexo 01: Metas Prefeito Criança.
7
Ir. Idelsa Reginalli. Entrevista concedida em 02 de fevereiro de 2010.
15
Neste sentido as lideranças do FPPPCV, passaram por um longo trabalho de
empoderamento conceitual na busca de qualificar a participação ativa nos conselhos
de políticas públicas (Criança e Adolescente, Saúde, Educação, Assistência Social),
fiscalização do orçamento público, bem como a sensibilização da população para os
direitos humanos e a cidadania. Foram seis cursos sobre Direitos Humanos e
Políticas Públicas, Ética, Cidadania e Participação Popular.
A Cáritas A. de Manaus constituiu em seu programa de assessoria organizar
o FPPPCV para que seja o articulador dos movimentos, das entidades e da
população usuária das políticas públicas referentes a saúde, educação e segurança
no município do Careiro da Várzea. Neste sentido, seu plano operativo tinha em sua
programação as seguintes ações: realização de mesa redonda com representantes
do Executivo, Legislativo e das Comunidades acompanhadas; construir comissões
para que acompanhe o andamento das propostas, estipuladas em metas, referentes
as áreas da educação, saúde e segurança; informar a população das comunidades
acompanhadas, através de folhetos informativos, sobre a importância do Conselho
Municipal de Saúde, da preservação do Meio Ambiente e dos Direitos Humanos;
promover um seminário com o tema: Meio Ambiente e Saúde Popular; participar das
sessões na Câmara de Vereadores e incentivar aos grupos acompanhados o estudo
da Lei Orgânica Municipal; realizar um senso nas comunidades acompanhadas e
promover eleições para a Associação Comunitária; montar um calendário de
reuniões ordinárias.
A partir desse plano operativo, podemos observar a metodologia de
organização do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da Várzea com a
assessoria da Cáritas A. de Manaus. As ações eram planejadas nas reuniões
ordinárias, que ocorriam mensalmente, abertas a todos. Os custos desses
processos eram divididos com a Cáritas A. de Manaus e a Igreja Católica do Careiro
da Várzea. Também é importante enfatizar que nessas reuniões o continuo processo
de formação que os representantes do fórum recebiam. Pois, “a ação se dava a
partir da educação [...] nós capacitava na ação”8. Isso demonstra que as ações do
fórum partiam de uma metodologia de estudo-ação.
8
Idem.
16
1.4 O FPPPCV nos Conselhos Gestores de Políticas Públicas
Mediante as conquistas como a reforma da Escola Municipal Balbina
Mestrinho, do posto de saúde e do reservatório com sistema de captação e
distribuição de água na comunidade do Distrito do Km 13 (BR 319) o FPPPCV
também decide de se mobilizar para pressionar o poder executivo do município para
a criação e participação efetiva da sociedade civil em alguns conselhos como o de
Saúde, Assistência Social, Criança e Adolescente. Pois, diante de uma realidade
marcada pelo modelo de política paternalista, clientelista e assistencialista este
trabalho logo culminou em de controle social sobre as ações dos gestores públicos
municipais.
O processo de para exigir do poder público municipal a criação dos conselhos
gestores foi intensa. O Conselho de Saúde foi criado pelo gestor público, mas sem
nenhuma participação da comunidade, o conselho foi homologado simplesmente
para cumprir a legislação. Em 2000, o FPPPCV faz um estudo da lei que sobre o
conselho propondo algumas mudanças que “os vereadores, por desconhecimento
dos próprios gestores, muitas pautas do fórum foram aprovadas”9. A partir deste
período os novos membros do conselho foram eleitos através de um intenso debate
com a sociedade civil promovida pelo FPPPCV, houve a primeira assembléia para a
escolha dos conselheiros da sociedade civil. “Na (conselho) saúde houve controle:
sabiam onde estava o recurso e onde estava sendo aplicado”10. Porém, após a
participação da sociedade “quando se fazia prestação de contas, os números
vinham em códigos que os conselheiros não entendiam”11. Mesmo com o constante
processo de capacitação dos membros do FPPPCV, haviam muitas limitações para
questões técnicas, como a contabilidade, por exemplo, devido a muitos terem
apenas o Ensino Fundamental.
9
José Ribamar de Oliveira – Assessor da Cáritas Arquidiocesana de Manaus e Educador Popular pela Rede de
Educação Cidadã: fala proferida em entrevista no dia 18 de dezembro de 2009.
10
Irmã Idelsa Reginalli – Congregação das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora de Aparecida. Entrevista
concedida em 02 de fevereiro de 2010.
11
Antonio Castro – Presidente da Associação de Agricultores do Curarizinho, agente de pastoral e militante do
FPPPCV.
17
Também a prefeitura criou o Conselho de Educação sem a participação da
sociedade civil comprometida. Neste conselho, houve muitas resistências para que
houvesse uma participação da sociedade civil a partir da organização do FPPPCV. A
primeira conquista foi à inserção dos membros do FPPPCV no conselho. A partir
daí, os representantes da sociedade civil tiveram outras conquistas, como a inserção
do calendário especial para o ano letivo das escolas12 e principalmente, o controle
dos aluguéis de barcos e outros serviços prestados por meio de terceirização.
Diante da conjuntura da política social, a partir do governo Lula, o programa
Fome Zero impulsionou um forte debate na área da Assistência Social. O FPPPCV e
a Cáritas A. de Manaus fomentou a efetivação dessas políticas sociais no município
do Careiro da Várzea, onde havia apenas a Secretaria de Ação Social. A primeira
conquista é a criação de uma Secretaria de Assistência Social, onde os pontos de
partida foram: a implantação do Programa Bolsa Família e que seu benefício
chegasse às famílias necessitadas e criação de outros programas e projetos na área
de assistência social. Paralelamente, cria-se o Conselho Municipal de Assistência
Social, que além de fiscalizar as ações dos programas de assistência social, exigia
do gestor a implantação de outros programas e sua respectiva fiscalização, como
por exemplo o Programa Erradicação do Trabalho Infantil – PET13 e o Programa de
Atenção Integral a Família – PAIF14.
Outra política social que, ao longo desse período foi muito fomentada, é a
Segurança Alimentar e Nutricional. Neste sentido é a criação do Conselho Municipal
de Segurança Alimentar e Nutricional, mas durou apenas 01 ano.
Mesmo com a participação nos Conselhos Gestores de Políticas Públicas
como o Conselho de Saúde, Educação, Assistência Social e de Segurança
Alimentar e Nutricional muitos membros do FPPPCV foram cooptados com cargos,
que por necessidade acabavam aceitando, outros foram ameaçados, como os
funcionários públicos que foram transferidos para lugares distantes. Isso
enfraqueceu a capacidade mobilizatória do fórum e também sua força política,
12
Nos meses de maio a julho é o período de enchente, onde as 80% das terras de várzea do município ficam
submersas pelas águas do Rio Solimões e nos meses de outubro à janeiro ocorre a vazante dos rios.
13
Sobre o programa consultar: www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-deerradicacao-do-trabalho-infantil-peti.
14
Sobre o programa consultar: www.mds.gov.br/programas/rede-suas/servicos-continuados-para-o-atendimentoa-crianca-a-familia-e-a-pessoa-idosa.
18
aqueles que eram integrantes do fórum e também conselheiros ficaram
sobrecarregados. Esses fatores, ao longo dos anos, acarretaram em poucas
lideranças sociais para continuar o processo de accountability societal a partir do
FPPPCV. Não houve renovação de lideranças e quando a Igreja Católica deixou de
apoiar financeiramente o fórum ficou desarticulado, resumindo sua atuação a
acompanhar os conselhos gestores através dos seus conselheiros.
1.5 Outras ações do fórum
Diante de uma reivindicação, o FPPPCV realizava diversas ações para cobrar
do gestor público uma posição. Podemos citar: abaixo-assinados; ofícios; chamados
para reuniões; cartas abertas; seminários; mesas de debate; até apoio do legislativo.
Além dessas ações foram organizadas pelo FPPPCV, campanhas sobre combate a
corrupção eleitoral e voto ético em anos eleitorais. Também, apoiou a criação de
associações comunitárias e de agricultores em vários distritos do município.
Uma recente conquista no ano de 2010 foi à homologação do decreto que cria
o Conselho Tutelar no município do Careiro da Várzea, onde o processo de eleição
dos conselheiros está acontecendo com a participação ativa dos membros do fórum,
conselheiros do Conselho de Assistência Social em parceria com a Secretaria de
Assistência Social.
A partir dessa experiência oriunda de um verdadeiro processo de militância de
lideranças da sociedade civil, organizadas em associações comunitárias, de
agricultores, de pais e mestres, Comunidades Eclesiais de Base, Igrejas
Pentecostais, etc. em parceria com entidades ligadas a Igreja Católica, e outros
espaços de organização para mobilização social é importante fazermos uma
reflexão a luz de pensadores que discutem sobre accountability societal ao mesmo
tempo fazermos o movimento inverso de colocarmos o conceito de accountability
societal e suas limitações diante de uma experiência concreta de controle.
19
2 DE UMA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA PARA UMA DEMOCRACIA
PARTICIPATIVA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ATRAVÉS DE
ACCONTABILITY SOCIETAL
2.1 A democracia brasileira após a Constituição Federal de 1988
Após a redemocratização do Brasil tem crescido nas últimas décadas a
aproximação da sociedade civil com a gestão dos recursos públicos pela
administração pública. Na Constituição Federal de 1988, os constituintes elegeram
como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[...] ‘construir uma sociedade livre, justa e solidária’, [...]
‘garantir o desenvolvimento nacional’, [...] ‘erradicar a pobreza
e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais’, [...] ‘promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, etnia, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas
de discriminação’ [...]. E que [...] ‘todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou
15
diretamente’ [...].
Além disso, essa constituição, também denominada de Constituição Cidadã,
assegurou três perspectivas novas e extremamente importantes para garantia da
participação direta do povo brasileiro, que são a “descentalização políticoadministrativa, a participação direta da população na construção direta das políticas
públicas e controle social do Estado”16.
Depois da CF de 88, nos mais de 20 anos de democracia, o Brasil
democrático moderno tem como um dos seus fundamentos constituintes a
democracia representativa. Com a grande complexidade dos processos políticos e
sociais atuais tem-se percebido que apenas a democracia representativa não atende
aos anseios da sociedade. Assim, têm surgido inúmeras experiências que procuram
aproximar a ação governamental da decisão e do controle direto dos cidadãos.
A incapacidade das instituições políticas vigentes de concretizar plenamente
os objetivos da Constituição, o aumento do sentimento de distância entre os
15
16
CF, Art. 3°, incisos I, II, III e IV.
Idem, Art. 204°.
20
eleitores e os representantes, motiva parte da sociedade civil a participar através de
diversos processos de organização e mobilização erigidos pelos movimentos sociais
e populares. O conjunto de iniciativas de ONGs, movimentos sociais e populares,
associações da sociedade civil e a mídia independente são analisados pela atual
literatura17 como elementos que estão contribuindo para melhorar a qualidade das
instituições públicas dos regimes representativos das democracias contemporâneas.
Neste sentindo, as intervenções dos diversos atores civis giram em torno de
uma política de direitos e de prestação de contas que demonstram uma renovação
cultural, onde o representado não permanece como sujeito passivo e assume um
papel de monitoramento ativo, principalmente, através dos mecanismos de
participação homologados pela Constituição Federal de 1988 como o plebiscito, o
referendo popular, as audiências públicas, a iniciativa popular de lei, além dos
canais institucionalizados próprios para o exercício de controle como os conselhos e
o orçamento participativo, que são espaços de diálogo e deliberação entre
sociedade civil e governo. Atualmente, outros espaços de controle, onde os
movimentos sociais tem se articulado e mobilizado fortemente como são os fóruns
de políticas públicas e a participação ativa em conferências setoriais.
Essas ações são analisadas na teoria democrática a partir do conceito de
controle social. Mas, segundo Avritzer (2009), esse termo dá uma impressão de que
é o Estado que faz controle sobre a sociedade18. Com isso, buscaremos analisar a
idéia de controle a partir do conceito accountability societal cunhado por pensadores
contemporâneos19. Para isso, desenvolveremos conceitualmente as diversas formas
de accountability20 diante da atual conjuntura política brasileira contextualizando as
diversas formas presentes de controle.
17
Ver em PERRUZOTI. Enrique. A política de Accountability Social na America Latina. Belo Horizonte:
UFMG, 2009.
18
Nas “Ciências Sociais, o conceito de controle social é geralmente caracterizado como circunscrevendo uma
temática relativamente autônoma de pesquisa, voltada para o estudo do conjunto dos recursos materiais e
simbólicos de que uma sociedade dispõe para assegurar a conformidade do comportamento de seus membros a
um conjunto de regras e princípios prescritos e sancionados”. ALVAREZ, Marcos César. Controle Social: notas
em torno de uma noção polêmica. São Paulo: São Paulo em Perspectiva, (18)1, p. 169, 2004.
19
Ver Catarina Smulovitz (2002); Enrique Peruzzotti (2002); Guillermo O’Donnell (1998); Leonardo Avritzer
(2002); só para citar alguns.
20
Esse termo ainda não traduzido para o português. Ver CAMPOS, Anna Maria. Accountability: quando
devemos traduzir para o português? Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro, v. 24, n° 2, 1990.
21
2.2 Definindo as diversas formas de accountability
Inicialmente vamos conceituar accountability como uma forma de controle, de
sujeição
do
poder
público
a
estruturas
formais
e
institucionalizadas
de
constrangimento de suas ações à frente da gestão pública, tornando-o obrigado a
prestar contas e a tornar transparente sua administração. Para Schendler21 (1999),
que distingue esse termo em duas conotações: a) Answerability: a capacidade de
um governo de dar resposta, ou seja, a obrigação de informar e explicar seus atos;
b) Enforcement: a capacidade das agências públicas de controle de impor sanções e
perda de poder para aqueles que violam os deveres públicos.
Tais conotações do conceito de accountability estão ligadas a três outras
noções que são: sujeitar o poder ao exercício de sanções; obrigar que este poder
seja exercido de forma transparente; e, forçar que os atos dos governantes sejam
justificados. Isso remete a dimensões que estão intimamente ligadas a answerability,
qual seja: informar as decisões; explicar tais decisões; sancionar as referidas
decisões, ou seja, a informação, a justificação e a punição como atos de
accountability.
Diante dos elementos constituintes do conceito de accountability, vamos
analisar suas três formas: a vertical, a horizontal e a societal, e ainda, apontando
para os seus limites diante de democracias como a brasileira e de outros países da
America Latina, que não constituiu uma democracia robusta como é a realidade de
países como o Estados Unidos e Alemanha altamente burocratizados.
A accountability vertical é o controle exercido pelo eleitorado nas eleições
periódicas e competitivas que “pode ou não” influir no agir dos representantes.
Um governo que queira se reeleger vai procurar ganhar o máximo de
legitimidade do eleitorado. Arato (2000, p.92), afirma que “accountability não
confina
os
mandatos,
mas
limita
e
restringe
o
comportamento
dos
representantes se eles têm interesse em se reeleger”. Mas, segundo O’Donnell,
a accountability vertical é insuficiente para o controle da ação governamental,
21
Ver SHENDLER, Andreas. Conceptualizing accountability. Lynne Rienner Publihers. Londres, 1999.
22
esse autor argumenta problematizando a questão da eleição e representação,
indagando sobre os limites do voto para induzir a atuação dos governantes no
sentido do ‘melhor interesse do cidadão’. Dessa forma, afirma que as eleições
não constituem o mecanismo democrático por excelência para induzir a
representatividade22.
Tendo pontuado a questão da insuficiência do mecanismo do voto, como
accountability vertical, para garantir a representatividade e, em certa medida, a
capacidade de governança do Estado, cabe a concepção de controle mútuo dos
poderes como instrumento de responsabilização governamental.
Para O’Donnell (1998, p.40) accountability horizontal se define em:
[...] existências de agências estatais que tem o direito e o poder legal e
que estão de fato dispostas e capacitadas para realizar ações, que vão
desde a supervisão de rotina a sanções legais ou até o impeachment
contra ações ou emissões de outros agentes ou agências do Estado que
possam ser qualificadas como delituosas.
Podemos compreender que accountability horizontal é um produto de uma
rede de agências, internas ao Estado. Entretanto, há a existência de outros
mecanismos de controle nas democracias contemporâneas, externas aos poderes
do executivo, do legislativo e do judiciário.
A fragilidade da accountability horizontal, especialmente em países da
América Latina, o que significa que os componentes liberais e republicanos em
muitas democracias ainda são frágeis. Podemos citar alguns desafios para sua
efetivação: autonomia, inclusive financeira, entre os poderes; a existência de
informação confiável e adequada; e, existência de redes bem estruturadas nacionais
e internacionais.
Para uma democracia adquirir um controle através da accountability horizontal
podemos citar: partidos de oposição com um papel importante, se não o principal, na
direção das agências; agências que desempenham um papel essencialmente
preventivo, tais como os Tribunais de Contas, altamente profissionalizados, dotadas
de recurso suficientes e independentes do governo; um judiciário altamente
22
O’Donnell, Guillermo. Accountability Horizontal e Novas Poliarquias. Lua Nova, N° 44,
1998.
23
profissionalizado, dotado de um orçamento independente dos outros poderes e
autônomo em suas decisões relativas a estes; informação confiável e adequada,
com mídia confiável e independente, assim como instituições de pesquisa e
disseminação; e, indivíduos especialmente políticos e outros líderes institucionais.
(O’Donnell, 1998).
Embora a accountability horizontal seja importante para o exercício do
controle ainda é insuficiente para garantir a legitimidade dentro das democracias.
Pois o conceito de soberania popular implícito na concepção da democracia exige
uma base de legitimidade que vai além da existência de mecanismos de cheks and
balances entre os órgãos do governo e também dos tradicionais mecanismos de
controle através das eleições.
2.2.1 Accountability Societal: um novo conceito?
Essa é uma concepção alternativa de accountability a partir de outra
perspectiva, que parte de uma raiz teórica que privilegia a dicotomia entre Estado e
sociedade civil, partilhando a idéia do controle da sociedade sobre a ação
governamental. Muitos autores23 acham que a accountability horizontal e vertical são
insuficientes para fazer controle, principalmente em democracias como à dos países
da America Latina. Este déficit é a espinha dorsal do ativismo cívico atualmente.
Para apresentar esse conceito, Peruzzotti em diversos trabalhos anteriores,
junto com Smulovitz (2002) utiliza o conceito de accountability societal para:
Englobar um conjunto diverso de iniciativas levadas a cabo por ONGs,
movimentos sociais, associações civis ou a mídia independente guiados por
uma preocupação comum em melhorar a transparência e a accountability
da ação governamental. Tal conjunto de atores e iniciativas incluem
diferentes ações destinadas a supervisionar o comportamento de
funcionários ou agências públicas, denunciar e expor casos de violação da
lei ou de corrupção por parte das autoridades, e exercer pressão sobre as
agências de controle correspondentes para que ativem os mecanismos de
investigação e sanção que correspondam. Este conjunto heterogêneo de
atores sociais desenvolve novos recursos que se somam ao repertório
23
Ver nota de rodapé n° 05.
24
clássico de instrumentos eleitorais e legais de controle das ações de
governo. (PERUZZOTTI, 2009, p. 11-12)
É importante abrir um parêntese para enfatizar as formas como esses atores
estão organizados. Para isso, Scherer-Warren24 define que a sociedade civil:
[...] não é uma esfera homogênea, representa interesses, conflitos, valores
de classe, de grupo identitários, de organizações diversificadas. Para a
autora existem quatro níveis de organizações na sociedade civil que
compõe o movimento social. O primeiro nível são as organizações de base
(ONGs, Terceiro Setor, Associações voluntárias, movimentos populares
locais e etc.) que se organizam entre si e também em uma rede mais ampla,
e vão ser também sujeitos de base constituinte desses movimentos sociais.
Neste sentido, esses atores participam do segundo nível, que são
compostos por organizações de articulação e mediação política (fóruns da
sociedade civil, da reforma urbana, da reforma agrária, de economia
solidária, etc.). Também compõem esse nível outras organizações em redes
que tratam de questões identitárias como, por exemplo, a articulação de
mulheres brasileiras, rede Mata Atlântica e etc. Esse nível articulatório
busca o empoderamento da sociedade civil representando as organizações
de base. Esse nível é também mediador e articulatório entre sociedade civil
e Estado, através de instituições e conselhos, por exemplo. Vale ressaltar
que os dois primeiros níveis possuem certa institucionalidade e
organizacidade. O terceiro nível é o da mobilização da esfera pública, ou
seja, é mais conjuntural. Como ocorre? Marchas, manifestações e
campanhas (locais, nacionais e internacionais). O que busca? Visibilidade
política através da mídia e os efeitos simbólicos dessa visibilidade para os
próprios atores dos movimentos sociais como para a sociedade. Exemplos:
Manifestação sobre reforma agrária, Marcha Mundial das Mulheres. É
importante não confundir essas ações como se fosse apenas isso o
movimento social, que conseqüentemente são criminalizadas pelos
aparelhos repressores, pois o movimento social é uma rede social que vai
além do protesto, o motivo de sua existência se dá, primeiramente, na
medida em que há uma construção de uma identidade em torno de
interesses e valores em comum no campo da cidadania; em segundo, na
definição de um conflito e/ou opositor; e, em terceiro, construção de um
25
projeto/utopia da sociedade (informação verbal) .
As formas utilizadas por esses atores para fazer accountability emprega
ferramentas institucionais e não institucionais (ações legais, participação de
monitoramento, denuncias na mídia, são alguns exemplos) que se baseia na ação
de múltiplas associações de cidadãos, movimentos, ou a mídia, objetivando expor
falhas do governo, trazer novas questões para a agenda pública ou influenciar
decisões políticas a serem implementadas pelos órgãos públicos (Smulovitz e
Peruzzotti, 2000, p. 07).
24
SCHERER-WARREN, Ilse. Disciplina sociais, ONGs, Terceiro Setor e a participação social: aspectos teóricoconceituais e trajetória no Brasil contemporâneo. Curso Democracia Participativa, República e Movimentos
Sociais. UFMG, 2009.
25
Idem. Vídeos disponibilizados na respectiva disciplina e curso.
25
Isso se deve a novas formas de intervenção civis organizadas em torno de
uma política de direitos e de prestação de contas, onde o Brasil é um exemplo que,
após a Constituição Federal de 1988, que homologa formas mecanismos legais de
participação, passando de uma democracia representativa para uma democracia
cada vez mais participativa. Segundo Peruzzotti:
A renovação na cultura política e das tradições democráticas da região se
traduz em uma relação mais complexa e tensa entre os cidadãos e seus
representantes políticos. Importantes setores da sociedade se negam a
exercer um papel meramente passivo, limitando à delegação eleitoral, e
assumem uma atitude ativa de supervisão permanente de seus
representantes de maneira a assegurar que os comportamentos dos
mesmos se enquadrem dentro das normas de responsabilidade e de
responsiveness que dão legitimidade ao vínculo representativo.
(PERUZZOTTI, 2009, p. 03)
Ao irmos especificando este conceito, podemos restringi-lo se continuarmos a
afirmar que essa modalidade de accountability é ativada somente por demanda e
dirigida por questões singulares, podendo vigiar ações governamentais (como
accountability horizontal), mas não necessitando de titulações constitucionais. Neste
sentido, como ficam os mecanismos dotados de titulação jurídica e constitucional,
como é o caso dos conselhos gestores de políticas públicas, e do orçamento
participativo, por exemplo, que podem ser considerados, também, elementos de
societal accountability. Outro fator reducionista é a própria participação da mídia
neste processo de accountability. Para que a noção de accountability societal possa
abranger outros mecanismos de participação é necessário reconsiderar essa
definição, incorporando nesse âmbito mecanismos que se apresentem uma
configuração jurídico-institucional, e que não sejam apenas mobilizadores de
sansões simbólicas.
É salutar ressaltar que a distinção feita entre accountability vertical (eleições),
accountability horizontal e accountability societal, reconhecendo que estas três
dimensões estão intimamente relacionadas. Para uma boa governança a efetivação
dos princípios democráticos, cujos pontos residem na soberania popular e controle
dos governantes pelos governados, coloca a questão da responsabilização como o
coração da governança democrática. Pois, isso depende de uma capacidade dos
cidadãos atuarem e dos mecanismos institucionais que viabilizam o controle sobre
as ações do governo.
26
A partir desse conceito de accountability societal, que busca abranger as
formas como os movimentos sociais estão buscando para fazer controle, podemos
analisar o FPPPCV a luz de uma literatura que atualmente que vem contribuindo
para
essas
próprias
experiências
cada
vez
mais
qualificar
suas
ações,
principalmente, porque traz elementos que ajudam a elucidar os espaços
institucionais que os movimentos sociais estão se inserindo.
Por fim, a accountability societal está se relacionando as múltiplas formas que
os movimentos sociais estão se configurando para a construção de uma democracia
realmente democrática. Esse conceito ajudar a refletir sobre as ações do FPPPCV?
E demonstrar quais foram as limitações e os avanços? Tais indagações é a reflexão
que desenvolveremos no próximo capítulo.
27
3 ACCOUNTABILITY SOCIETAL DO FPPPCV: CONQUISTAS E DESAFIOS PARA
A CONSTRUÇÃO DE UMA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA
3.1 A primeira experiência de democracia participativa no Careiro da Várzea
Com base nas considerações nos capítulos anteriores, onde delineamos
conceitualmente, no primeiro capítulo, o relato a experiência do Fórum Popular de
Políticas Públicas do Careiro da Várzea – FPPPCV, e em seguida, no segundo, as
formas de accountability, para agora problematizarmos essa experiência e
percebermos as conquistas e os desafios para o exercício do controle diante da
conjuntura onde a sociedade civil cada vez mais busca estar presente nos canais
institucionais de participação.
A experiência do FPPPCV levanta um questionamento fundamental. O que
seria democracia participativa para a os gestores públicos do Careiro da Várzea?
Por mais que existam métodos e técnicas participativas e democráticas que
viabilizam a participação popular na elaboração e acompanhamento das ações dos
gestores públicos, aceitar e contribuir neste processo de participação ainda não é
algo absorvido e desejado pelo poder público e tampouco pelas organizações civis
nos moldes em que são criadas, onde a cultura paternalista, personalista e
assistencialista é muito presente no município do Careiro da Várzea. Porém, o
FPPPCV surge neste cenário com uma grande particularidade, são resquícios dos
militantes que estiveram presente no processo de constituição do município apoiado
pela Igreja Católica em busca de construir uma cultura de participação.
A mobilização e organização das lideranças partiram, no primeiro momento,
de um problema social, que no caso era as péssimas condições da escola municipal
(conflito), que congregou os agentes que participavam de trabalhos pastorais
(identidade comum), e com o objetivo de buscar superar as condições de
28
subcidadania e de participar das questões políticas do município (projeto/utopia)26.
Isso evidencia o modo como surgiu esse movimento popular.
Pela particularidade da localidade (geografia de várzea), onde os acessos as
comunidades se dá somente pela via fluvial e pelas lideranças na maioria ligadas as
Comunidades Eclesiais de Base – CEBs e de outras denominações religiosas, esse
movimento popular decide criar o um fórum27 como espaço de mobilização para
agregar as lideranças em prol de discutir e acionar os mecanismos políticos de
implementação das políticas públicas. Estar organizado através de um Fórum
Popular de Políticas Públicas, para as lideranças, era adquirir uma identidade e
visibilidade frente à sociedade careirense e principalmente frente aos gestores
públicos.
3.2 Accountability Vertical e Horizontal e sua relação com o Fórum Popular de
Políticas Públicas do Careiro da Várzea – FPPPCV
Partindo do conceito de accountability vertical que está relacionada à
existência de eleições razoavelmente livres e justas, em que o eleitorado pode punir
ou premiar um mandatário, votando a favor ou contra ou aos candidatos que apóie
nas eleições seguintes podemos perceber que o FPPPCV simplesmente atuou em
realizar sensibilizações pelo voto ético28, principalmente durante o período eleitoral e
também em campanhas de combate a corrupção eleitoral29. Esta última está
relacionada a uma ação de accountability societal relacionado à dimensão da
accountability vertical, na possibilidade de denunciar de atos delituosos durante o
processo eleitoral. Tais ações foram muito tímidas e seus efeitos não resultaram em
mudanças visíveis no cenário político do Careiro da Várzea. Todavia, outra ação do
fórum, que se refere a reivindicações, foi a realização de seminários e mesas
26
SCHERER-WARREN, Ilse. Das ações coletivas às redes de movimentos sociais. Disponível em:
<http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_externo/file.php/21/modulo_VI/TextoObrigatório.pdf>. Acessado em:
29/10/2009.
27
Ver citação n°15 sobre a criação do FPPPCV.
28
A campanha pelo voto ético é realizada pela Igreja Católica e diversos outras entidades em todos os períodos
eleitorais.
29
Ver Campanha Combate a Corrupção Eleitoral no sitio: www.mcce.org.br.
29
redondas de debate chamando os candidatos a prefeito durante as eleições
municipais de 2000 e 2004 para a adesão a Campanha Prefeito Criança que trazia
uma serie de metas30 ao gestor público na área da criança e do adolescente, pois
isso era a pauta reivindicatória do FPPPCV durante as respectivas gestões
municipais.
Na dimensão da accountability horizontal que é a ação de agências legais
dentro do Estado para monitorar e até punir atos de agentes públicos. Esta forma de
accountability para funcionar dentro de uma esfera administrativa pública necessita
de uma organização robusta, onde os mecanismos de cheks and balances funcione
entre os órgãos públicos. Mas, como também foi exposto no segundo capítulo, esse
conceito, em democráticas onde a figura do prefeito (personalismo) é muito forte,
como é o caso do Careiro da Várzea, tornando essa forma de accountability ainda
muito precária. Muitas das iniciativas de apurar denuncias contra o gestor municipal
apresentadas pelo FPPPCV não resultaram em punição pelo judiciário porque este
sempre esteve atrelado ao executivo. Mesmo em casos onde a oposição estava
presente não houve uma resposta das agências judiciais. Isso também se dá pelo
fato de não haver uma mídia independente que buscasse tornar público as denuncia
e, com isso, formar a opinião pública para protestar simbolicamente por uma
resposta por parte dessas agências.
3. 3 Accountability Societal e sua relação com os Conselhos Gestores de Políticas
Públicas na experiência do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea – FPPPCV
A relação entre a sociedade civil e governo no Brasil contemporâneo parte de
um movimento social crítico e de controle. Isso vem sendo utilizado pelos
movimentos populares latino-americanos e principalmente os brasileiros para
caracterizar a luta pela inclusão e participação dos setores populares na definição
dos rumos de nossa sociedade através, principalmente, das políticas públicas como
instrumento transformador da realidade. Uma luta pela abertura de espaços para a
30
Ver anexo 01.
30
participação da sociedade civil nas diversas fases da política pública, desde a sua
formulação até seu monitoramento e avaliação, buscando o compartilhamento do
poder decisório entre Estado e sociedade e a garantia de direitos.
Neste sentido, partimos para a reflexão acerca do conceito de accountability
societal diante da experiência do Fórum Popular de Políticas Públicas do Careiro da
Várzea – FPPPCV.
A accountability societal vem ampliar significativamente o conceito da vertical,
sendo caracterizada como forma de atuação da sociedade no controle das
autoridades políticas, com ações de associações de cidadãos e de movimentos, com
o objetivo de expor os erros governamentais e ativar o funcionamento das agências
horizontais.
Uma primeira análise a partir desse conceito é perceber a forma de
organização do FPPPCV, onde o mesmo congrega associações civis como de
moradores, de agricultores e de pais e mestres, igrejas locais através de suas
pastorais, congregações religiosas, lideranças como professores e comunitários em
geral, além das entidades de assessorias como a Cáritas A. de Manaus. Outra
articulação é a relação com outros fóruns como os da criança e do adolescente em
nível estadual. Além da conexão a questões nacionais como algumas campanhas
como Voto Ético. Essa maneira de organização unificou o fórum e deu legitimidade
política para suas reivindicações.
A conseqüência de toda essa mobilização foi que o fórum se tornou “um bicho
papão” (informação verbal)31 para os gestos municipais, ou seja, a reação diante de
um processo de organização social inédito no município derivado da sociedade civil
sem nenhum atrelamento a prefeito e a vereador.
A sansão simbólica é um primeiro efeito de accountability própria da societal,
pois em todas as ações era cobrado do gestor público municipal uma posição.
Através de instrumentos como: chamados para reuniões; abaixo-assinados; cartas
abertas; e, ofícios.
31
Antonio Castro – Presidente da Associação Comunitária dos Produtores Rurais do Curarizinho – Careiro da
Várzea, em entrevista concedida em 09 de janeiro de 2010.
31
Após algumas experiências de debate com o executivo, onde o fórum levou
suas reivindicações32 que resultaram em respostas positivas. O FPPPCV resolve
ampliar sua participação em canais institucionais.
Daí surge um processo de se integrar aos conselhos já existentes como é o
caso do Conselho Municipal de Saúde e o de Educação. Haja vista que para
qualificar a participação era importante estar presente em espaços decisórios. Para
isso, muitas ações foram alavancadas como a mudança de alguns artigos da lei de
criação desses conselhos até realização de assembléias populares para escolhas
dos conselheiros da sociedade civil.
Aqui o conceito de accountability societal é problematizado porque ao tentar
defini-lo, podemos restringir a ações pontuais. Mas, o FPPPCV demonstra que
participar dos espaços institucionais de controle como os conselhos é fundamental
para qualificar a participação da sociedade civil, pois o papel dos conselhos é
extremamente estratégico para fazer accountability que vem no sentido de propor,
definir, monitorar e denunciar políticas públicas.
Nessa experiência do FPPPCV, a inserção em conselhos para cobrar do
gestor público o cumprimento de metas e constituição de políticas públicas,
principalmente na área social, diante de um contexto político nacional que é a
implementação de programas e projetos sociais que, para chegar na esfera
municipal, precisa da boa vontade do gestor municipal, caso não haja uma cobrança
por parte da sociedade civil. Diante disso, outra grande ação do FPPPCV foi a luta
para o executivo criar a Secretaria Municipal de Assistência Social do Careiro da
Várzea e consecutivamente o Conselho Municipal de Assistência Social.
Posteriormente, também a criação do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e
Nutricional.
Essas conquistas se tornam muito positivas para a implementação de projetos
e programas sociais no município do Careiro da Várzea. O acompanhamento dessas
políticas se torna a agenda do FPPPCV que é a representação da sociedade civil, já
os conselheiros derivados do fórum dentro dos conselhos são as lideranças que
32
É importante frisar que para construir as propostas do fórum eram feitas pesquisas e reuniões com a
comunidade.
32
pautam nesse espaço as reivindicações da sociedade, por ter caráter propositivo e
deliberativo. Aqui o exercício de accountability societal se torna complexo, pois além
de não perder sua autenticidade, autonomia e legitimidade ao estabelecer uma
constante interface com os gestores em espaços institucionais de controle.
Ao longo dos anos dos primeiros anos (1999 – 2003) o FPPPCV teve um
grande papel político. Porém, como os processos sociais são movimentos que
sofrem ao longo do tempo diversas fases, ou seja, são movimentos sociais
dinâmicos ao longo do tempo, diante das conjunturas políticas que se estabelecem.
Neste sentido, podemos citar algumas limitações da participação dos conselheiros
da sociedade civil que ao longo do tempo surgiram: burocratização, cooptação,
sonegação de informações principalmente do orçamento e rotinização. Um fator
dificultoso ao próprio FPPPCV foi não renovação de lideranças.
A representação governamental nos conselhos foi também limitada pelos
seguintes fatores: conselheiros indicados só para ocupar a vaga, desconhecendo a
política, principalmente de assistência social, além de participar de vários conselhos
ao mesmo tempo e sem poder de decisão.
Os desafios para que esses espaços sejam bem constituídos são importante
dois elementos: acesso a informação, principalmente do orçamento; e, autonomia da
sociedade civil, pois exige organização em espaços que não apenas os próprios
conselhos. É neste ultimo ponto que, para o exercício de accountability societal, se
constitui estrategicamente a participação do FPPPCV, que não se resume na
participação nos conselhos, os movimentos populares precisam estar em constante
acompanhamento e avaliação desses espaços e deve ser combinada e
complementada com outras formas de organização e mediação política.
Por fim, as considerações acerca dessa discussão aponta a necessidade
continuarmos nesse constante processo que é democratizar a democracia através
dos mecanismos legais de participação e principalmente de avaliar constantemente
os avanços, retrocessos estagnações que os movimentos sociais tem nessa relação
com a institucionalidade.
33
CONCLUSÃO
O objetivo do trabalho foi analisar a experiência do Fórum Popular de
Políticas Públicas do Careiro da Várzea - FPPPCV e o conceito de accountability
societal na construção da democracia participativa. Partiu-se do relato da atuação do
FPPPCV, seguindo da conceitualização de accountability vertical, horizontal e
societaI, para co-relacionar os aspectos conceituais da accountability em suas
dimensões e a axperiência própria do fórum.
Um primeiro aspecto a ser considerado é que o FPPPCV realizou uma
atuação inédita das lideranças locais na política pública do Careiro da Várzea, nesse
movimento cívico que a sociedade brasileira cada vez mais busca aperfeiçoar após
a redemocratização.
Outro aspecto importante é demostrar que a sociedade civil pode exercer um
excelente papel de controle, mesmo diante de conjunturas políticas em pequenos
municípios onde a figura do prefeito é muito forte e a sociedade civil não tem muita
cultura de participação em instâncias públicas e de acionar os orgãos fiscalizadores.
A forma de organização do FPPPCV demostrou que distintos segmentos
sociais podem se articular e se mobilizar entorno de uma agenda única. Construindo
uma atuação em conjunto e sistemática, com apoio externo de instituições como a
Cáritas A. de Manaus e de outros movimentos sociais que engendram as mesmas
reivindicações seja em esfera estadual, nacional ou internacional.
A ideia de accountability societal cunhada pelos pensadores contemporâneos
traz uma forte contribuição para entedermos como podemos analisar a própria
atuação social, onde neste caso, o FPPPCV pôde ser analisado para percebermos
os avanços, estagnações e retrocessos.
Vimos que o FPPPCV exerceu accountability societal mesmo que as formas
verticais e horizontais não estivessem tão presentes. Através dos conselhos
gestores de políticas públicas a sociedade careirence, organizda em um fórum,
buscou se engajar nos espaços públicos de participação política.
Outras sansões simbólicas como atos públicos, abaixo assinados e etc. foram
importantes para que os gestores públicos se sentissem pressionados e
34
percebessem a força política do FPPPCV, abrindo espaços para o diálogo e
atendendo as reivindicações.
Tais questões acimas descritas são exemplos que não deixam de ter
dificuldades, pois atualmente o FPPPCV se encontra muito desarticulado e sem
muitas
lideranças
para
atuarem
constantemente.
Isso
devido
a
força
desmobilizatória que a administração pública através da cooptação e de outros
modos como a criminalização dos movimentos sociais.
Mesmo assim, a accountability societal é um demostrativo que a participação
da sociedade civil é importantíssima para uma democracia. Indica que a sociedade
quer qualificar a tarefa das instituições públicas. Assim, é importante estimular o
controle com o intuito de derrubar os obstáculos e construir caminhos para a
democratização da democracia. Em países como o Brasil, onde a desigualdade
social é abrupta, a participação da sociedade mais desfavorecida e desprovida de
políticas públicas (as Vítimas) é o modo que acredito derrubar a diferença social
entre: pouquíssimos extremamente ricos e muitos muito pobres. A accountability
societal é um importante passo neste caminho.
35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Alda Judith. A “Revisão da Bibliografia” em Teses e Dissertações: meus
tipos inesquecíveis. Faculdade de Educação/UFRJ. Disponível em:
<http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_externo/file.php/21/M3_TEXTOS/Textos_de_
leitura_complementar/TextoC3.pdf>. Acessado em: 25 mar. 2009.
___________. O Planejamento de Pesquisas Qualitativas em Educação.
Faculdade de Educação/UFRJ. Disponível em:<http://sureco.grude.ufmg.br
/moodle_externo/file.php/21/M3_TEXTOS/TextoOb1.pdf>. Acessado em: 25 mar.
2009.
ARATO, Andrew. Representação, Soberania Popular e Accountability. Lua Nova,
N° 55, 2000
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 20.ed. São Paulo: Atlas,
2003.
Construindo a Plataforma dos movimentos sociais para a reforma do sistema
político no Brasil. Versão II. Disponível em: <http://www.reformapolitica.org.br>.
Acessado em: 15 mar. 2009.
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO. Disponível em:
<http://www.giea.net/legislacao.net/internacional/declaracao_direitos_homem_cidada
o_ 1789.htm>. Acesso em: 10 mai. 2009.
DUARTE, Rosália. Pesquisa Qualitativa: Reflexões sobre o Trabalho de Campo.
Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Disponível
em:
<http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_externo/file.php/21/M3_
TEXTOS/Textos_de_leitura_complementar/TextoC4.pdf>. Acessado: em 25 mar.
2009.
DUSSEL, Enrique. Ética da libertação: na idade da globalização e da exclusão.
Trad. Ephraim ferreira Ales, jaime A. Clasen, Lúcia M. E. Orth. 3° ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2007.
FONCESA, Claudia. Quando cada caso Não é um caso. Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_externo
/file.php/21/M3_TEXTOS/Textos_ de_leitura_complementar/TextoC1.pdf>. Acessado
em: 25 mar. 2009.
GOMES, Ana Maria Rabelo, FARIA, Eliene Lopes, BERGO, Renata Silva. Sobre o
projeto e o processo de pesquisa na elaboração de monografias. Disponível em:
<http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_externo/file.php/21/M3_TEXTOS/TextoOb2.pdf
> . Acessado em: 25 mar. 2009.
GRANJEIRO, J. Wilson. Administração Pública. 11a.ed. Brasília: Vestcon, 2003.
MINAYO, N. C. & SANCHES, O. Quantitativo-Qualitativo: Oposição ou
Complementaridade? Disponível
em:
<http://sureco.grude.ufmg.br/moodle_
36
externo/file.php/21/M3_TEXTOS/Textos_de_leitura_complementar/TextoC2.pdf>.
Acessado: em 25 mar. 2009.
NICOLAL, Jairo. Reforma Política no Brasil: Realizações e pespectivas.
Fortaleza: Fundação Konrad Adnauer.
ODALIA, Nilo. A Liberdade como meta coletiva. In: PINSKY, Jaime; PINSKY Carla
Bassanezi (orgs.), História da Cidadania. São Paulo: Contexto, 2003.
O’DONNELL, Guillermo. Accountability horizontal e Novas Poliarquias. Lua
Nova, N° 44, 1998.
PERRUZOTTI, Enrique. A política de Accountability Social na América Latina.
In. Sociedade Civil e participação/ Enrique Perruzotti, Marcio Simeone, Miguel
Arroio. Belo Horizonte: UFMG, 2009.
PINSKY Carla Bassanezi (orgs.). História da Cidadania. São Paulo: Contexto,
2003.
PONTUAL, Pedro. Desafios à construção da democracia participativa no Brasil:
a prática dos conselhos de gestão das políticas públicas. Observatório dos
Direitos do Cidadão Polis/IEE-PUC-SP. São Paulo, 2008.
PONTUAL, Pedro. Reformas Políticas: aperfeiçoando e ampliando
Democracia. Disponível em: <http:www.polis.org.br>. Acessado em: 10/02/2009.
a
PRZEWORSKI, A. O Estado e o Cidadão. Mimeo, 2000
QUEIROZ, Antônio Augusto de. Reforma Política, tópicos centrais. Disponível em
http://<www.inesc.org.br/biblioteca/textos-e-manifestos>. Acessado em: 10/02/2009.
SCHIER, Adriana da Costa Ricardo. A participação popular na administração
pública: o direito de reclamação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
SEMERARO, Giovanni. Gramsci e a sociedade civil: cultura e educação para a
democracia. Petrópolis: Vozes, 1999.
SILVA, Francisco Cruz da. Controle Social: Reformando a Administração para a
Sociedade. (Monografia) Salvador: 2001.
SMULOVITZ, Catarina e PERUZZOTTI, Henrique. Accountability Societal: outra
forma de controle. Mimeo, 2000.
37
ANEXO 01
Metas do Prefeito Criança:
• Proteger a saúde das crianças e dos adolescentes com ações preventivas e
educativas;
• Reduzir a mortalidade infantil;
• Reduzir a mortalidade materna;
• Garantir a segurança alimentar, promovendo educação, em saúde e nutrição
para as famílias;
• Tornar disponível à todas famílias água limpa, tratamento de esgoto e coleta
de lixo, em todas as residências;
• Oferecer ações de prevenção e retaguarda às crianças e jovens vítimas de
negligência, maus tratos, abusos, crueldade e opressão;
• Prevenir e erradicar o trabalho infantil, implementando as convenções 138 e
182 da Organização Internacional do Trabalho – OIT;
• Implementar medidas socioeducativas em meio aberto para os adolescentes
autores de atos infracionais;
• Possibilitar o acesso de todas as crianças à creche e pré-escola e melhorar a
qualidade da educação infantil;
• Possibilitar o acesso e garantir a permanência com sucesso da 1ª à 8ª série
de todas as crianças e jovens do município e melhorar a qualidade do ensino
da rede pública municipal;
• Oferecer esporte, lazer e cultura à todas as crianças e os adolescentes;
• Incluir no plano diretor do município a obrigatoriedade de espaços e
equipamentos públicos para as crianças e os adolescentes;
• Promover a capacitação profissional e a iniação ao trabalho para os jovens de
acordo com a lei;
• Promover o exercício da cidadania de crianças e adlescentes, oferecendo
informações e espaços de participação e implementação de ações de seu
interesse;
• Erradicar o analfabetismo infanto-juvenil;
• Assegurar o direito civil à todas crianças do município.
Download

Pedro Paulo Sotero da Silva - Secretaria