PIB E OS
DONOS
PATRIMÓNIO
OUTROS
DAS CIDADES Com
MUNDIAL
Os caminhos alternativos
Portugal tem cidades
o Cante Alentejano
a um indicador que tem
dominado a economia
e os economistas
que são uma referência
nos orçamentos
participativos do mundo
em destaque, o que leva
o património a ter o selo
da UNESCO?
Primavera 2015 Trimestral €1
montepio
CULTURA
KALAF
É UM DOS PROTAGONISTAS DO NOVO
GUIÃO CULTURAL QUE SE ESCREVE
NO PAÍS. UM ENREDO DE DIFERENTES
EXPRESSÕES QUE TRANSPIRA ARTE
NA ESCRITA, NA MÚSICA E NA RUA
número
17
série
ii
PUB
#17 SUMÁRIO
PRIMAVERA
2015
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Entrevista
Vhils, o
"incontornável"
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Kalaf
Ângelo
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Cidades para pedalar
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10 perguntas
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38
Dia do Voluntariad
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O agitador
tranquilo
COLABORADORES
PÁG.
20
PÁG.
22
PÁG.
26
Nesta edição...
Conheça
alguns temas
da próxima
edição
Vhils
Lídia Jorge
Kalaf
Reportagem
Artista plástico
Escritora
Escritor e músico
Começou com
graffitis e
agora utiliza
explosivos para
esculpir rostos
Um dia afirmou
que a escrita é
mais importante
do que a vida.
Lídia Jorge nunca
Em Lisboa tornou-se um homem
do mundo e hoje
vive do seu poder
de observação,
com dezenas
de metros de
diâmetro. Vhils
é um artista
com convicções
que quando
cria, gosta de
"perder o pé"
e reinventar-se
diariamente.
Olha para o
sucesso de
soslaio e prefere
concentrar-se no
próximo trabalho.
soube ser outra
coisa e conta-nos
o início do seu
percurso literário
desde os tempos
da faculdade.
Já Afonso Cruz
iniciou a sua
relação com
a escrita mais
tarde, mas
partilha a
mesma paixão
pelo ofício
da escrita.
simplesmente
acutilante.
Apaixonado por
design, o músico
que não sabe
dançar, dá ritmo
aos temas dos
Buraka Som
Sistema com
as suas palavras.
Kalaf não resiste
a contar uma
boa história
e a Montepio
conta-lhe a sua.
propriedade
#17
Montepio Geral – Associação
Mutualista, Rua do Ouro, 219-241
1100-062 Lisboa
Tel. 213 249 540
série
ii
PRIMAVERA 2015
diretor
António Tomás Correia
-adjunto
Rita Pinho Branco
diretor
coordenação
Esta revista foi redigida ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
Gabinete de Relações Públicas
Institucionais
p r o d u ç ã o
e
a r t e
f i n a l
Ana Miranda e Pedro Pinguinha
c o l a b o r a ç õ e s
Ana Sofia Calaça, António Ramalho
Eanes, Baptista-Bastos, Cristina Almeida,
Eudora Ribeiro, Francisco Moita Flores,
Helena C. Peralta, Helena Viegas, Maria
Abreu, Marisa Vitorino Figueiredo, Rita
Vaz da Silva, Sara Raquel Silva, Susana
Torrão (texto), Artur, Augusto Brázio,
Gonçalo F. Santos, João Cupertino, Luís
Viegas, Sílvia Lopes e Vera Marmelo
(fotografia), Ana Seixas (ilustração)
^ ESCOLHER SABORES
Quem define os sabores dos
mais importantes produtos
portugueses? Mostramos-lhe os rostos dos homens
e mulheres que fazem
do palato uma arte.
Empreendedorismo
^ ÁGUA NA BOCA
Conheça três startups
com muita garra que lhe
vão estimular o paladar.
Tendência
^ SUPER-HERÓIS
Na vida real, há portugueses
que fazem da melhoria da
nossa vida a sua missão.
Descubra o património
do nosso País
O Cante Alentejano foi
o último bem a ser considerado
Património Imaterial da
Humanidade. Portugal já
contava com o Fado e com
a Dieta Mediterrânica nesta
categoria, além de 15 locais
classificados como Património
Material da Humanidade.
p u b l i c i d a d e
editor
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6º, 1070-072 Lisboa
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MONTEPIO PRIMAVERA 2015
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d i r e t o r a
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t i r a g e m
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O Montepio é alheio ao conteúdo da publicidade
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EDITORIAL
A confiança
numa ideia
A história do Montepio é a história de uma boa ideia. O triunfo da
solidariedade e a afirmação da entreajuda. A dimensão prática de
quem não se resigna a um “cândido” otimismo. Um conforto certo
nos momentos de incerteza.
Mas a história do Montepio sempre foi, na sua essência, uma
história de pessoas. Quando pagámos a primeira pensão de viuvez,
em 1842. Quando contratámos o primeiro colaborador, em 1844.
Ou quando atingimos os 1 000 associados, em 1861.
Aos 175 anos de vida partilhamos a boa ideia de previdência
social com 650 mil associados que dão força ao Montepio para
continuar a fazer o que sempre fez: proteger poupanças. Garantir
o presente e o futuro.
Sabemos como, erradamente, somos vistos como um Banco
quando, na verdade, somos uma associação mutualista – a maior
de Portugal –, detida por 650 mil associados.
Comparar com outras organizações é não reparar no caminho de
cada um dos nossos associados, nos seus desafios diários, nas suas
preocupações, no seu presente e no futuro.
É esquecer uma história de confiança que se transmite de gerações em gerações, partilhada no seio de milhares de famílias
portuguesas e que é o garante de uma associação que foi a segurança social de muitos portugueses antes mesmo de existir um sistema
público de previdência.
Por isso, obrigado aos 650 mil associados
que depositam a sua confiança no Montepio.
Que partilham, juntos, um caminho e que
todos os dias alimentam a ideia da cidadania
ativa, do associativismo e da construção de um
melhor Portugal.
O Montepio
não é a história de uma vida.
É a história de muitas vidas.
650 mil que todos os dias
estimulam os 5 200 colaboradores
deste Grupo.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
GLOCAL
OS NOSSOS ANTEPASSADOS EMBARCARAM
HÁ MAIS DE 500 ANOS NUMA AVENTURA
CHAMADA DESCOBRIMENTOS. PELO CAMINHO,
DERAM “NOVOS MUNDOS AO MUNDO”,
TORNANDO GLOBAL ESTA “ESTRANHA FORMA
DE VIDA”, QUE DÁ NOME AO SENTIMENTO SAUDADE E TEM COMO LAR UM PEQUENO (GIGANTE)
PAÍS NA EXTREMIDADE OCIDENTAL DA EUROPA
1462
Cidade Velha
Cabo Verde
Também conhecida
como Ribeira Grande,
o seu povoamento deve-se
ao Infante D. Fernando,
irmão do Infante
D. Henrique. Primeiro posto
comercial nos trópicos.
1910
Ironbound
Newark, EUA
Data da chegada dos
primeiros imigrantes
portugueses àquela cidade
do Estado de Nova Jérsia.
As celebrações do Dia de
Portugal atraem mais de
500 mil pessoas ao bairro
de Ironbound.
1535 a 1732
Cidades
Históricas
Brasil
1878
Ukelele
São sete cidades cuja
arquitetura exibe o melhor
do barroco em terras do Novo
Mundo: Olinda (1535), São
Salvador da Bahia (1549), São
Cristóvão (1590), São Luís
(1615), Ouro Preto (1652),
Diamantina (1713) e Goiás
(1732), autênticos museus
vivos da influência
portuguesa.
Havai, EUA
120 madeirenses chegaram
ao Havai, a bordo do
Priscilla, para trabalhar
nas plantações de
cana-de-açúcar. Com eles
levaram a música do
cavaquinho, ou braguinha,
que fez tanto sucesso que
se tornou no instrumento
tradicional do Havai
(ukelele).
1868
Cacau
do Príncipe
1807
Sotaque carioca
Príncipe,
São Tomé e Príncipe
Rio de Janeiro,
Brasil
O “s” chiado e as vogais
abertas do sotaque carioca
são o resultado da fuga da
família real portuguesa
para o Rio de Janeiro.
Afinal, de um dia para o
outro, 15 mil portugueses
invadiram a Cidade
Maravilhosa.
Património da
Humanidade UNESCO
fora de Portugal
Bens de influência
portuguesa
Países
Continentes
A partir desta data foi
introduzida a cultura do
cacau na ilha do Príncipe.
Hoje esta ilha é um dos
principais produtores
mundiais de cacau de
Comércio Justo.
EXTENSÃO
GEOGRÁFICA
dos patrimónios de origem portuguesa
Fusos horários
23 569
Extensão total
Km
1571
Sabores
Nacionais
Nagasaki, Japão
Antes
de 1418
Igreja Santa
Maria de África
Ceuta, Espanha
Não é certo se foi mandada
construir pelo conde de
Arraiolos ou pelo Infante
D. Henrique. A igreja alberga
uma imagem do século VI
oferecida pelo imperador
bizantino Justino I ao
governador Procópio.
1602-1640
Ruínas da
Catedral
de São Paulo
1510
Goa
Índia
Afonso de Albuquerque
conquistou Goa sem sangue.
Um dos mais cobiçados
portos comerciais do mundo
do século XVI ainda
conserva a cultura
portuguesa na sua matriz.
Macau, China
Porto fundado por jesuítas
portugueses em 1571.
Da região são típicos dois
sabores originais da cozinha
portuguesa: a tempura
(fritura com polme)
e o kasutera (pão-de-ló).
Construída por jesuítas no
século XVII, a catedral foi
consumida pelo fogo em
1835, restando só a fachada.
É o símbolo de Macau.
1987
Questão
de Macau
China
É assinada a Declaração
Conjunta Sino-Portuguesa
sobre a Questão de Macau
que reconhece a autonomia
de Macau e marca a
transferência de soberania
para a China para dia 20 de
dezembro de 1999.
1956
Luanda
Angola
João António de Aguiar
projeta a atual cidade
de Luanda para 500 mil
habitantes. Atualmente
é a maior capital lusófona
do mundo. O novo plano
diretor da cidade está
a ser elaborado pelo
gabinete de arquitetura
Broadway Malyan.
1972-1975
Barragem
de Cahora-Bassa
Moçambique
O maior e mais grandioso
projeto dos últimos anos do
colonialismo. A sua albufeira
é a quarta maior de África.
Fornece eletricidade a
Moçambique, África do Sul
e Zimbabué.
1511
Malaca
Malásia
1502 a 1507
Ilha
de Moçambique
Mantém na sua traça
elementos da arquitetura
portuguesa do século XV
e XVI. Mas a maior
expressão lusitana está
na cultura da comunidade
cristang que remonta
aos Descobrimentos.
A presença portuguesa
ainda é visível na “cidade
de pedra”, paredes meias
com a “cidade de macuti”,
material local utilizado
para a construção de casas.
EXTENSÃO
TEMPORAL
da influência portuguesa
Da Reconquista Cristã à
integração de Macau na China
LÍNGUA
PORTUGUESA
língua mais
falada no mundo
dialetos portugueses
fora de Portugal
milhões de falantes
PUB
O MEU MUNDO
TENDÊNCIAS NA
ECONOMIA, SOCIEDADE,
VIDA E CULTURA
página 10
PATRIMÓNIO
MUNDIAL
Mais de 1 000 locais e 300
tradições estão protegidos
pela UNESCO. O Cante
Alentejano faz, agora, parte
do património português
que passou a ser de todos
página 16
Página 26
Página 32
A arte urbana é feita
de muitos rostos. Antes
catalogada como marginal,
hoje é encomendada
e reconhecida e são muitos
os que lhe dão cor e forma
nas paredes da cidade
Kalaf é um dos novos rostos
da elite cultural lisboeta.
Quem é este tranquilo
agitador de melodias
e palavras que cruza
a música, a escrita e
o fascínio pelo design?
O domínio deste indicador
económico está patente
nas economias e junto dos
economistas. Mas são muitas
as alternativas que o desafiam
e que prometem comparar
melhor os países
TEMA DE FUNDO
ENTREVISTA
DESAFIAR O PIB
1
o meu mundo
CULTURA
PATRIMÓNIO
MUNDIAL
10
PROTEGER
A MEMÓRIA
FUTURA
SALVAGUARDAR O PATRIMÓNIO
CULTURAL E NATURAL, ASSIM
COMO OS BENS CULTURAIS
INTANGÍVEIS, É O OBJETIVO
DA UNESCO COM AS LISTAS
DE PATRIMÓNIO MUNDIAL
E DE PATRIMÓNIO CULTURAL
IMATERIAL, QUE INCLUEM
MAIS DE 1 000 LOCAIS E
300 TRADIÇÕES POR
TODO O MUNDO
por helena c. peralta
fotografia augusto brázio
“Deixámos de fazer ruínas.”
É desta forma que o historiador
e professor João Bonifácio Serra
resume uma interessante conversa
sobre as atuais preocupações relativas
ao património, às cidades e à sua
conservação. Antes do ainda recente
cuidado com a preservação dos nossos
monumentos históricos – que surgiu
com mais força no final do século xix
e início do século xx – o património
edificado era votado ao abandono e
na maior parte dos casos chegou aos
nossos dias sob a forma de ruínas.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Entre as mais famosas edificações
do Homem são de salientar Machu
Picchu, no Peru, a Acrópole, na
Grécia, Angkor, no Camboja, ou o
Coliseu de Roma, em Itália. São vestígios vivos da história da Humanidade que nos ajudam a compreender o
passado, quem somos e como chegámos até aqui. Se fossem conservadas
em perfeitas condições muito mais
nos contariam, mas, provavelmente, não teriam a mesma beleza para o
nosso imaginário. A conservação do
património edificado – monumentos,
zonas históricas – prende-se sobretudo com a crescente importância das
cidades e a sua necessidade de atrair
turistas. “A ideia de classificar o património surgiu em França, no final
do século xix. Valorizar os monumentos acaba por ter duplo sentido:
por um lado, favorece a preservação
e o seu estudo, por outro, atrai o turismo cultural. O património entrou como valorização da oferta turística das
cidades e tem impacto real na economia das mesmas”, refere, a propósito, o especialista que foi consultor de
como Património Mundial, Guimarães foi eleito o quarto destino mais
recomendado. Responderam ao inquérito mais de um milhão de turistas, que distinguiram o Palácio de
Potala, na China, como o melhor destino, seguido de a Garganta de Ironbridge, no Reino Unido, e o Palácio
de Fontainebleu, em França.
? TRADIÇÃO
O Cante Alentejano
é de todos. Das
famílias, das
tabernas e dos
grupos corais, como
o da Casa do Povo de
Serpa, na imagem
Jorge Sampaio, enquanto Presidente
da República, e presidente da Fundação Cidade de Guimarães.
João Bonifácio Serra recorda como a distinção de Património Mundial, em 2001, foi importante para a cidade de Guimarães, tal como
a honra de ser Capital Europeia da
Cultura, em 2012, projeto no qual trabalhou durante mais de cinco anos.
“Portugal tem uma oferta turística que assenta muito em sol e praia,
mas começa a haver uma aposta cada
vez maior em nichos, como o turismo
de cidades, mais cultural. Com estas
duas distinções Guimarães acrescentou reconhecimento enquanto importante local histórico, uma programação cultural contemporânea, importante para atrair turistas”, refere.
E o berço da nação portuguesa tornou-se, em poucos anos, uma vedeta regional e um importante polo de
retenção de jovens. Segundo um estudo realizado pelo portal de viagens
TripAdvisor junto dos seus utilizadores, em parceria com a UNESCO, entre os 962 locais classificados à data
A importância
de ser Património Mundial
A UNESCO, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, fundada em 1945, após
a Segunda Guerra Mundial, tem
como objetivo a paz e a segurança
no mundo através da Educação, da
Ciência e da Cultura. A área da cultura, além do estímulo à criação e
criatividade e promoção da diversidade cultural, procura salvaguardar
o património através da preservação
de monumentos, de entidades culturais e de tradições.
Pa r a t a l fo r a m a s s i n a d a s
duas importantes convenções da
UNESCO – são sete na área da cultura – com o intuito de preservar o património à escala mundial: a primeira, a Convenção da UNESCO para
a Proteção do Património Mundial,
Cultural e Natural, adotada em 1972,
tem como objetivo proteger os bens
patrimoniais dotados de valor universal excecional, e Portugal ratificou-a em 1980; a segunda, mais recente,
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
11
1
o meu mundo
CULTURA
património mundial
ff
O FADO
A música
portuguesa
tem no Fado
o outro grande
representante
cultural
12
REGRAS
Critérios para a candidatura a património
S
ão dez os critérios da UNESCO para avaliar o valor universal excecional e
que permitem que determinado património possa candidatar-se às listas
representativas. Conheça-os a seguir, de forma resumida:
)1 Representar
uma obra-prima
do génio criador
do Homem
)2 Testemunhar
uma troca
de influências
consideráveis
durante um
certo período
ou determinada
área
)3 Ser
testemunho
único ou
excecional de
uma tradição
cultural
ou civilização
viva ou
desaparecida
)4 Constituir
exemplo
excecional
de um tipo
de construção
ou de um
conjunto
arquitetónico
ou tecnológico
de uma
paisagem
)5 Constituir
um exemplo
excecional da
fixação humana
ou ocupação de
um território
tradicional,
representativo
de uma cultura
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
)6 Estar direta
ou materialmente
associado a um
acontecimento
ou tradições
vivas, a ideias,
crenças ou obras
artísticas
)7 Representar
fenómenos
naturais ou
zonas de uma
beleza natural
e importância
estética
excecionais
)8 Ser exemplo
excecional
representativo
de grandes
estádios da
história da Terra
)9 Ser exemplo
excecional e
representativo
de processos
ecológicos e
biológicos em
curso de evolução
!0 Conter
os habitats
naturais mais
representativos
e importantes
para a
conservação
da diversidade
biológica
a Convenção da UNESCO para a
Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, assinada em 2003 e
ratificada por Portugal em 2008,
salvaguarda o património cultural imaterial, composto por tradições, artes, rituais, eventos festivos, saberes, conhecimentos e práticas, nomeadamente artesanato.
Como refere Clara Bertrand Cabral,
responsável pelas atividades da
UNESCO na área da cultura em Portugal, “estas duas convenções foram
muito bem aceites pelos países-membros”. A primeira foi ratificada por 191
Estados e a segunda por mais de 161.
Fazer parte das listas representativas da organização é um selo de
garantia do valor de determinado bem inscrito, material ou imaterial. Esta inscrição tem de ser aceite pelos diferentes países, representados em cada uma das convenções
por um comité composto por um número acordado de Estados que analisam as propostas apresentadas.
No caso do Património Mundial, Cultural e Natural, o Comité é composto por 21 países, com mandatos de
quatro anos. Portugal foi eleito para
este Comité em 2013 e vai exercer
funções até 2017. Seguindo as recomendações da UNESCO, comprometeu-se a não apresentar candidaturas
a Património Mundial até ao término
do seu mandato. “A Comissão Nacional da UNESCO reuniu um grupo de
especialistas para, até 2017, atualizar
a lista indicativa de bens portugueses
que podem, eventualmente, ser candidatos a Património Mundial”, explica Clara Bertrand Cabral.
Neste momento, a lista do património mundial inclui 1 007 bens materiais, distribuídos um pouco por todo
o mundo. Na Europa ficam 480 monumentos ou zonas naturais, na Ásia 231,
na América Latina e Caraíbas 130, em
África 89 e nos Estados Árabes 77.
Falamos de grandes monumentos como as pirâmides de Gizé, no Egito, a
Grande Muralha da China, a Estátua
da Liberdade, nos Estados Unidos,
LISTA
No topo cultural
Bens materiais e imateriais, por país,
na lista da UNESCO
PATRIMÓNIO MATERIAL
ITÁLIA
CHINA
ESPANHA
50
47
44
FRANÇA
ALEMANHA
39
39
ÍNDIA
MÉXICO
REINO UNIDO
RÚSSIA
EUA
32
32
28
26
22
PATRIMÓNIO IMATERIAL
JAPÃO
COREIA
22
17
ESPANHA
CROÁCIA
FRANÇA
14
14
13
MONGÓLIA
TURQUIA
12
BÉLGICA
ÍNDIA
12
IRÃO
12
11
10
inúmeras catedrais francesas ou Stonehenge, no Reino Unido, entre tantos outros locais de eleição.
Portugal tem 15 bens materiais
inscritos ao abrigo da Convenção de
1972, mas fica ainda muito aquém
dos 50 apresentados pela Itália e dos
47 da China, os dois países com mais
bens destacados (ver caixa).
A vizinha Espanha consegue um
honroso terceiro lugar no ranking,
com 44 locais inscritos nesta lista.
A UNESCO recomenda que sejam
desenvolvidos esforços para se alcançar uma distribuição geográfica e
tipológica mais equitativa dos bens e
que seja dada primazia à classificação de bens situados em países pouco representados e a candidaturas
em série e transnacionais. Porém,
Clara Bertrand Cabral garante que
“todas as candidaturas são vistas
com o mesmo olhar e têm de cumprir
os mesmos requisitos. Eventualmente, as candidaturas de países que não
têm qualquer bem inscrito poderão
ser analisadas com alguma benevolência, para que se obtenha uma Lista do Património Mundial geograficamente mais equilibrada”.
Já Rui Vieira Nery, musicólogo, historiador, diretor da Fundação
Gulbenkian e coordenador da candidatura do Fado refere que alguns países se excederam na apresentação
de novas candidaturas, como a Croácia e a China, pois há também algum
interesse geopolítico da sua parte.
“Espanha gastou imenso nas candidaturas para conseguir ter bens nas listas. A candidatura do Flamenco custou dez vezes mais que a do Fado”, diz.
Preservar o imaterial
Além dos 15 bens do Património
Mundial, Portugal tem já três inscritos na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade – a dieta mediterrânica, o Fado e o Cante Alentejano –, rol que no
seu total ascende a 314 itens. O caso
de Portugal é até de louvar, pois duas
das candidaturas apresentadas para o património intangível foram tidas como bons exemplos, fruto do
trabalho de muito tempo de preparação. Neste caso, os critérios para
a avaliação são bastante diferentes
do património material (ver caixa):
esta distinção tem de contribuir para
a visibilidade e consciência do bem
cultural intangível, encorajando o
diálogo com quem o representa, têm
de ser criadas medidas de salvaguarda, para proteger esse património,
e as comunidades devem ser envolvidas em todas as ações e processos
relacionados com os mesmos.
“Há uma diferença importante
nas duas listas. No caso do património físico procuram-se obras-primas e
são avaliadas pela sua complexidade,
técnica, escala, etc. No património
intangível a avaliação não é estética,
P&R
Clara Cabral
Responsável pelas atividades
da Comissão Nacional da UNESCO
na área da cultura em Portugal
Como se iniciou todo o processo
de proteção do património?
A UNESCO surgiu em 1945 após
a Segunda Guerra Mundial
e, sendo uma agência das Nações
Unidas, tem como objetivo principal
alcançar a paz e a segurança no
Mundo através da educação, da
ciência e da cultura; a proteção do
património é um dos instrumentos
para alcançar esse objetivo. Esta
necessidade surgiu pela primeira
vez em 1950, com a decisão de
construir a barragem de Assuão no
Egito, que inundaria o vale do Nilo
e os notáveis templos de Abu
Simbel. Uma mobilização
internacional alertou a opinião
pública em todo o mundo para
a urgência de se adotarem
medidas de proteção rápidas e bem
coordenadas, o que veio a acontecer,
salvaguardando o património.
Quais as vantagens para os países
distinguidos?
Desde logo é importante referir-se o reconhecimento e maior
visibilidade – nacional e
internacional – do património
classificado pela UNESCO, o que
de alguma forma contribuirá
para a sua proteção. Mas, além
dos objetivos principais, todo
este processo também acaba por
favorecer o turismo, que deverá
ser sempre desenvolvido de forma
sustentável, criando riqueza a favor
das regiões e das suas populações.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
13
1
o meu mundo
CULTURA
património mundial
14
o que se procura é uma lista representativa de tipos de práticas culturais que representem a identidade e autenticidade
de um povo”, explica Rui Vieira Nery.
Este responsável salienta ainda as vantagens associadas a este destaque internacional: há duas internas, que são
a necessária recolha de fontes, de memórias – o que implica muita investigação para a preparação da candidatura –,
e a salvaguarda e preservação do bem;
e há uma externa, que é a visibilidade
internacional dessa prática, que tem
como consequência natural o aumento
do interesse turístico. “O Fado, ao receber este selo de autenticidade, tem registado um acréscimo de procura, com
consequências para o setor profissional
associado ao mesmo”, refere.
Já o Cante Alentejano tem caraterísticas diferentes porque é um movimento amador e comunitário. “A ideia
de candidatar o Cante Alentejano já
tem alguns anos. Mas foi em 2011 que se
iniciou todo o processo”, recorda Paulo
Lima, diretor da Casa de Cante de
Serpa e coordenador da candidatura.
Integrou a lista em novembro de 2014
e já se nota o poder desta visibilidade:
em pouco meses surgiram mais de 30
novos grupos de Cante Alentejano, como revela o responsável. A cobertura
mediática da candidatura exponenciou o interesse dos jovens pelo Cante
e trouxe mais dignidade à população
local, que se sente orgulhosa da sua
tradição. Além disso, contribui para a
coesão e inclusão social, ajudando, por
exemplo, os mais idosos.
Os bens intangíveis podem ser inscritos na lista de salvaguarda urgente
ou na lista representativa. No primeiro caso é necessário que determinado
bem esteja em risco de desaparecer,
como acontece com o fabrico de chocalhos em Alcáçovas. Paulo Lima diz
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
que esta será uma nova candidatura de
Portugal, com caráter de urgência, pois
há apenas 13 artesãos que os fabricam
e quase todos com mais de 70 anos.
Como não têm aprendizes, a arte está
em risco de extinção. No segundo caso
tem de ser um bem representativo de
uma cultura como o Fado ou o Cante
Alentejano. Há ainda uma outra candidatura a ser ponderada que é o Carnaval de Torres Vedras, isto segundo
informações vindas a público através
da Câmara Municipal da cidade.
Seja qual for a lista da UNESCO
em que os bens se inscrevem, o objetivo é salvaguardar, proteger e conservar o passado para preparar o futuro.
1 Floresta
Laurissilva,
Madeira
1
2 Alto Douro
vinhateiro
3 Centro
histórico de Angra
do Heroísmo,
Açores
2
? O QUE SIGNIFICA
Proteger o património do planeta
é o resultado do esforço iniciado
na segunda metade do século xx.
Estar na lista é sinónimo de
reconhecimento e mais turismo.
3
CASO NACIONAL
Património Mundial em Portugal
Portugal tem 15 locais inscritos na lista do património material
da UNESCO. Na lista de património imaterial estão inscritos três bens.
PATRIMÓNIO MATERIAL E NATURAL
1983 | MOSTEIRO DOS JERÓNIMOS, LISBOA
| CONVENTO DE CRISTO, TOMAR
| MOSTEIRO DA BATALHA
| CENTRO HISTÓRICO DE ANGRA DO HEROÍSMO, AÇORES
1986 | CENTRO HISTÓRICO DE ÉVORA
1989 | MOSTEIRO DE ALCOBAÇA
1995 | PAISAGEM CULTURAL DE SINTRA
1996 | CENTRO HISTÓRICO DO PORTO
1999 | FLORESTA LAURISSILVA NA MADEIRA
2001 | CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES
| ALTO DOURO VINHATEIRO
2004 | PAISAGEM DA CULTURA DA VINHA DA ILHA DO PICO
1998/2010 | ARTE RUPESTRE DO VALE DO RIO COA E DE SIEGA VERDE,
PORTUGAL E ESPANHA
2012 | CIDADE QUARTEL FRONTEIRIÇA DE ELVAS E SUAS FORTIFICAÇÕES
2013 | UNIVERSIDADE DE COIMBRA, ALTA E SOFIA
PATRIMÓNIO IMATERIAL
2013 | DIETA MEDITERRÂNICA – CANDIDATURA CONJUNTA DE PORTUGAL,
MARROCOS, GRÉCIA, ESPANHA, CHIPRE, CROÁCIA E ITÁLIA
2011 | FADO
2014 | CANTE ALENTEJANO
PUB
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
1
o meu mundo
TEMA DE FUNDO
ARTE URBANA
UMA TELA
DO TAMANHO
DA RUA
16
CHEGARAM E INVADIRAM
AS RUAS DAS CIDADES SEM
PEDIREM LICENÇA. A OCUPAREM
AS FACHADAS DE PRÉDIOS
DEVOLUTOS OU EXTENSOS
MUROS, AS PINTURAS DE
ARTE URBANA NÃO SÃO
DISCRETAS, NEM DELICADAS.
QUEREM SER VISTAS, QUEREM
PROBLEMATIZAR
por marisa vitorino figueiredo
fotografia artur
Ninguém sabe ao certo quantas
são as pinturas urbanas nas ruas
de Lisboa. Ou do Porto. Ou em
todas as avenidas e becos de
Portugal. A verdade é que as
enormes telas ao ar livre estão a
assumir-se como um cartão de
visita do país e já valeram a Lisboa
um lugar entre as melhores cidades
do mundo para a arte urbana, pela
mão da famosa revista Condé Nast
Traveller.
No ranking publicado no final de
2014 a capital portuguesa está na
sexta posição, atrás de cidades como
Berlim, Buenos Aires, Los Angeles,
Londres e Melbourne.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Entre os muitos nomes internacionais que já deixaram a sua marca na
ebulição da arte urbana portuguesa,
como o italiano Blu e os brasileiros
Os Gémeos, está uma nova geração de
criadores nacionais que usam as paredes como telas de liberdade.
É o caso de Bordalo II, conhecido
pelas intervenções tridimensionais
que deixa nas ruas, híbridos entre a
escultura e o mural. O neto de Real
Bordalo, conhecido pelas suas aguarelas de Lisboa, tem sido apontado como um dos melhores representantes
da arte urbana mundial, mas não é o
único a marcar as paredes lisboetas
com técnicas fora do comum.
Add Fuel, por exemplo, costuma preparar stencils para pintar padrões de azulejos, repletos de elementos desconcertantes.
Gonçalo Ribeiro (MAR) e Tamara
Alves continuam a socorrer-se das
latas de spray, apesar de terem percursos muito diferentes. Ele é um dos
nomes mais conhecidos da arte urbana nacional, autor de murais em grande escala. Ela traz a selva à sociedade
com desenhos de animais ferozes, mimetizando emoções à flor da pele.
São traços muito diferentes que
surgem nas fachadas. Porém, todos
são acarinhados de igual forma pela
GAU – Galeria de Arte Urbana da
? Entre artistas
nacionais e
internacionais,
são muitos os
que expressam a
sua interpretação
do mundo nas
paredes das
cidades
Câmara Municipal de Lisboa que,
desde há cerca de sete anos, tem convidado diversos artistas para fazerem intervenções nas ruas da cidade. A estratégia funcionou e Lisboa é
hoje considerada uma das 25 melhores cidades desta corrente artística,
num ranking organizado pelo portal
Huffington Post.
A criação da GAU é, também, um
sinal de que a arte que ganha vida na
rua é cada vez mais aceite, muitas vezes encomendada pelas próprias autarquias – e empresas – como forma
de “limpar sem limpar”, nas palavras
de Tamara Alves. Neste jogo entre encomenda e intervenção cabe ao autor
“manter-se fiel a si próprio”, com a
certeza de que, sem o “empurrão” das
câmaras municipais “não seria possível ter murais com estas dimensões”,
acrescenta a artista.
Nascida em Nova Iorque, a street
art tornou-se “o primeiro fenómeno de
arte mundial graças à Internet”, lembra Add Fuel. No entanto, muitas vezes ainda é confundida com o graffiti,
atividade que lhe deu origem mas na
qual não se esgota. A fronteira entre
ambas é fluida e ainda pouco consolidada – até porque a street art está em
constante evolução. Os mais puristas remetem o graffiti para o lettering
(desenho de letras) a spray, feito de forma ilegal e territorial. A arte urbana
seria tudo o resto: expressões artísticas feitas na rua, com tinta de spray ou
qualquer outro material, de forma legal e a convite de festivais, autarquias
ou outras entidades. Mas há quem
chame de graffiti a tudo, ou quem
recuse, pura e simplesmente, qualquer tipo de rótulo. “Posso ser considerado, no máximo, um artista que
pinta num suporte diferente, num
material diferente”, refere MAR.
Migração artística
Os motivos desenhados nas paredes
são predominantemente urbanos.
Há influências do hip-hop, do multiculturalismo, da confusão da cidade e dos seus desperdícios. “Hoje já
se chama arte urbana a muita coisa.
São pinturas em grande escala, continuam na rua, mas já nem sequer existem só na grande cidade”, lembra Tamara Alves.
Exemplo disso é o Wool – Festival
de Arte Urbana da Covilhã, que tem
promovido intervenções em murais
na cidade serrana desde 2011. Foi na
cidade beirã que Tamara deixou uma
figura de três braços, uma homenagem às bordadeiras que fazem renda
de bilros, e que Bordalo II criou, com
lixo e sucata, um mocho tridimensional numa alusão à fauna local.
Nos azulejos de stencil de Add Fuel
assomam padrões de máquinas de
ROTEIRO
O que ver em Lisboa?
4
7
1
5
38
6
9
2
N
a amálgama de ruas
lisboetas há pedaços
de arte urbana escondidos
em becos e outros que ocupam
toda a fachada dos edifícios das
principais artérias.
É difícil escolher o que ver ou onde
ver e, consciente disto, a GAU reuniu, em livro, a street art de Lisboa.
Ao todo, são quase 200 referências
de obras de arte urbana,
com direito a mapa e fotografias
do local. Como o tempo é sempre
escasso, deixamos-lhe um roteiro
de nove obras que não pode perder
em Lisboa. Mas com a garantia
de que todas as outras também
merecem uma visita.
1Avenida
Fontes Pereira
de Melo | Os
Gémeos/ Blu
2 Jardim
do Tabaco |
PixelPancho/
Vhils
3 Lx Factory |
vários autores
4 Avenida
de Berna |
Mural 25 de
Abril | Add
Fuel/Draw/
KissMyWalls/
MAR
5 Alcântara
| Bordaleta |
Bordalo II
6 Avenida das
Índias – ARM
Collective
7 Avenida
Conselheiro
Fernando de
Sousa | Vários
autores
8 Pilares da
ponte 25 de
Abril | José
Carvalho/
Klit/Kruella
D’Enfer/
Mosaik/Regg/
Tamara Alves/
Violant
9 Mercado da
Ribeira – Galeria
UnderDogs
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
17
1
o meu mundo
TEMA DE FUNDO
arte urbana
2
1 Bordalo II
2 Add Fuel
3 MAR
1
4 Tamara Alves
18
MATERIAL
4
O que contém a mochila
de um street artist?
3
1
5
2
6
1 Latas (preto e
3
7
borracha
cores básicas)
4 Máscara
2 Caps (espécie
5 Caderno
por onde sai
8
3 Luvas de
branco são as
de tampas
4
(sketchbook)
/lápis
a tinta; vários,
6 Marcadores
para diversos
7 Comida
traços)
8 Água
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
tecelagem. E os ARM Collective, do
qual faz parte MAR, pegaram na figura tradicional do pastor e as ovelhas
para a desconstruir, num universo
muito próprio. A envolvente inspirou
os artistas e há muito para descobrir
nas ruas da cidade.
Como o Wool, são vários os festivais que dinamizam a street art.
O trabalho coletivo está no ADN da
arte urbana e são estas iniciativas que
dão visibilidade ao trabalho dos artistas, podendo até dar origem a novas
encomendas. “É um tipo de arte mais
social, enquanto nas outras estamos
fechados num ateliê”, refere Tamara. Da experiência em colaboração,
resultam novas inspirações, à medida que o spray é manuseado a várias
mãos. Add Fuel reforça a ideia, lembrando intervenções em duo e quarteto: “Trazem muitas experiências positivas, principalmente o feedback que
recebemos uns dos outros.”
Desenhos recriados
ou apagados
A arte urbana começa a chegar aos
museus, galerias e casas de particulares. Bordalo II, cuja exposição “World
Gone Crazy” esteve patente no Centro Cultural de Belém, valoriza esta nova dimensão. “Quando indoor, o
trabalho ganha durabilidade, torna-se
menos efémero e vulnerável. Podemos chegar a mais público, durante
mais anos”, explica.
Mas a casa da arte urbana será
sempre a rua. E lá fora, quanto maior
a pintura, melhor. “É um movimento
artístico que chega às pessoas, comunica com quem está na rua e funciona como um alerta para a arte, porque
a maioria das pessoas não vai a um
museu”, sublinha MAR. Na parede
da rua o desenho ganha novos sentidos, sentidos que o autor não controla. Exemplo disso é o caso caricato que
colocou uma das suas pinturas no seio
de uma polémica pública. Uma superfície comercial decidiu tapar, com
uma tela publicitária, o trabalho artístico, que tinha inclusive recebido apoio
da GAU. Após a remoção da tela, os
“É a melhor altura para ser mulher
e fazer arte urbana” Tamara Alves
Tem um percurso dito convencional: licenciatura de Artes Plásticas, mestrado de
Arte Contemporânea. Fora das aulas, Tamara Alves sempre teve o “bichinho de
experimentar”, de ir para a rua e criar. Talvez o mesmo que a levou, incentivada
pelos pais, a pintar as paredes do quarto, aos seis anos. Ou, com 14, a brincar com
as primeiras latas de spray. Nas suas criações a referência animal é constante,
como no Coração-Polvo que pintou na Calçada da Glória. “Transmito sentimentos
fortes e quero levá-los à letra”, num retorno ao animal dentro de nós, explica
a artista que acredita que “agora é a melhor altura para ser mulher e fazer arte
urbana”, num cenário em que há cada vez mais procura de artistas no feminino.
“Devolver o azulejo à rua” Add Fuel
personagens desenhados na fachada
de Alcântara não puderam continuar
sossegados: apanhados numa cheia,
“pareciam nadar por cima de água”,
ganhando novo cenário inesperado.
“A pintura acaba por ‘viver’, ter um
percurso muito próprio”, fora das intenções do artista. Arriscando-se também, a um desaparecimento precoce.
Depois de dias de trabalho a obra
fica sujeita à sua sorte. Pode ser riscada, tapada com novo desenho, pintada de branco ou, até, “sobreviver” uns
bons anos. Tudo depende de vários fatores, como o fácil (ou difícil) acesso à
pintura, o nome do artista na comunidade e o local escolhido. “Existe uma
tolerância zero em relação ao graffiti e
à street art; as peças pintadas nas ruas
duram, por vezes, poucas horas até
serem limpas ou destruídas por tinta
cinzenta morta”, acrescenta Bordalo
II que afirma que “nas ruas não há regras. Cada um tem a sua consciência”.
A incerteza do destino da obra não
retira a vontade de exprimir opiniões
e visões. Para os artistas, a rua, no seu
desafio e interpelação do mundo, dá
muito mais do que aquilo que tira.
Pensa-se na arquitetura portuguesa e chega-se, inevitavelmente, ao azulejo.
O quadrado de cerâmica tem caráter nacional e foi essa importância que levou
Add Fuel, nome artístico de Diogo Machado, a reapropriar-se dele como intervenção de arte urbana. Neste ato de “devolver o azulejo à rua” nascem murais de
stencil e spray que exploram infindáveis pormenores como mãos, olhos ou caveiras. “Gosto de pegar num conceito e ver o que resulta: algo mais irónico, ou algo
mais cómico, mais subtil.” Para o resultado final contribui a experiência de Add
Fuel como ilustrador e a sua obsessão, saudável, com padrões. “Fotografo muitos
azulejos e outro tipo de padrões quando ando na rua”, explica, salientando a importância do local envolvente para o desenho.
“A cidade do desperdício” Bordalo II
Uma borboleta criada com sucata e lixo. Uma tampa de esgoto em forma de moeda de um euro. Um contentor do lixo “remodelado” para parecer um hambúrguer.
As intervenções de Bordalo II ganham alma a partir dos vários elementos da
cidade. “A ideia é criar uma imagem da cidade a partir do desperdício da mesma,
é construir uma realidade a partir dos podres da sociedade”, explica o artista.
O plástico, como “cancro do planeta”, é o material de eleição nesta reconstrução
do que é urbano. Os objetos comuns são recriados e ganham novos sentidos.
Ao ponto de o site internacional Street Art News o considerar um dos melhores na
arte urbana mundial de 2014. A arte e a representação da cidade correm-lhe nos
genes. Bordalo II é neto de Real Bordalo, conhecido pelas aguarelas de Lisboa.
“Pegar numa personagem
e desconstruí-la” MAR
“Faço bonecos”, começa por explicar MAR sobre o seu universo de personagens estilizadas que vão ganhando lugar no mundo citadino. A frase “esconde” a importância do artista. Há 16 anos que trata por “tu” as paredes da
margem Sul e de Lisboa. Sozinho ou através do coletivo ARM Collective, as
suas intervenções em grande escala são uma referência. Especializado em
personagens, que partilham traços e cores muito próprias, o artista aposta em
trabalhos de maior dimensão para conseguir marcar a diferença. Fachadas de
prédios devolutos ou, de preferência, grandes murais – como o da Avenida das
Índias, onde o coletivo foi desafiado a recriar o imaginário d’Os Lusíadas.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
19
1
o meu mundo
ENTREVISTA
arte urbana
20
VHILS
O “INCONTORNÁVEL”
SE AS PAREDES FALASSEM, AS DE ALEXANDRE
FARTO, OU VHILS COMO É MAIS CONHECIDO,
TINHAM MUITO PARA CONTAR. CONDECORADO,
RECENTEMENTE, PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
COM A DISTINÇÃO DE CAVALEIRO DA ORDEM
MILITAR DE SANT’IAGO DA ESPADA, ESTÁ ENTRE
OS MAIS PROMISSORES JOVENS DO PLANETA,
SEGUNDO A PRESTIGIADA REVISTA FORBES
por helena viegas
fotografia vera marmelo e sílvia lopes
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
“Arte urbana” não é um rótulo que
aprecie. Como designa o que faz?
Parece-me redutor para descrever
uma realidade bem mais complexa.
A maior parte do meu trabalho
alimenta-se do meio urbano e recorre
a materiais provenientes da cidade,
mas vai muito mais além. Faço trabalho no espaço público das cidades, mas
também em espaços interiores e noutros contextos. Porque não pensar apenas em arte, seja qual for o meio onde
é produzida?
A frase “os graffitis já não são um
ato de rebelião” é sua. O que mudou?
Nesse contexto referia-me ao crescente apelo do radicalismo islâmico
à juventude europeia. Muitas formas
de contestação ao poder e às instituições associadas à juventude têm sido integradas na cultura dominante.
As subculturas que surgem nas margens são absorvidas pelo centro, deixam de cumprir essa função contestatária. A ausência desse espaço de
contestação pode tornar a juventude
mais vulnerável à radicalização política ou religiosa. No que respeita ao
graffiti, a verdade é mais complexa:
se por um lado tem sido absorvido
pelo mundo da comunicação visual
e da arte, por outro tem uma faceta
indomável que teima em apoderar-se do espaço público para exprimir a
sua vitalidade. É essa a sua natureza.
Sente nostalgia do tempo em que
o graffiti era um ato de rebelião?
Sim, porque guardo boas memórias
do que era um ato simples e puro,
sem interesses. O que faço hoje não é
graffiti, mas considero-o a minha escola de formação. Ensinou-me a lidar
com realidades complexas, a ler o espaço urbano, a ser minucioso e a trabalhar com certas superfícies, materiais e ferramentas.
A arte urbana tem uma forte componente social, de apelo à crítica e
à reflexão. São as caraterísticas da
“rebelião” do século xxi?
Trabalhar no espaço público sem autorização é um ato de rebeldia. Mas
o conteúdo dessa comunicação de-
? RETRATO
DE JACK
MUNDEY,
ativista que lutou
para preservar a
cidade australiana
de Sydney.
No seu trabalho
Vhils apela a uma
reflexão, não só
artística mas
também social
pende da intenção do interveniente.
Eu uso o meu trabalho para desenvolver uma reflexão que considero mais
de natureza social do que artística.
Gosto de chamar a atenção para determinados temas e interessa-me fazer pensar de forma crítica.
A experimentação é uma tentação
do artista?
Para mim, sempre foi uma componente muito importante do trabalho
e uma das que me dá maior prazer.
Gosto de mexer com os materiais,
de arriscar, de ver até onde consigo
levá-los. É da experimentação que
têm surgido muitos dos corpos de trabalho que tenho desenvolvido.
A desconstrução é o conceito que
o move?
Em certa medida sim, mas a desconstrução não surge isolada. Encontra-se ligada a um contexto e conteúdo específicos. Num primeiro momento, o meu trabalho encontra-se
ligado por uma reflexão sobre o presente modelo de desenvolvimento
socioeconómico, a vida nas sociedades urbanas contemporâneas e o desenvolvimento da identidade individual nestes contextos. Mas depois
cada corpo de trabalho é usado para
desenvolver uma reflexão mais particular. Um dos conceitos fundamentais é o recurso a técnicas destrutivas
como forma de criação. Este universo e o próprio conceito estão ligados
aos tempos do graffiti, quando usava
ferramentas destrutivas para cravar
o nome em vários tipos de superfícies com base numa técnica de stencil
invertida – criando através da remoção de camadas em vez da sua adição.
Ao escavar estas camadas vi que estava a expor fragmentos de outros, num
ato de arqueologia contemporânea.
Estes fragmentos refletem a energia caótica da cidade e o ritmo frenético das sociedades contemporâneas.
Decidi aplicar o mesmo processo às paredes, escavando camadas de modo a
criar composições semelhantes, e daí
alarguei o processo a outros suportes.
Surgiu, recentemente, numa lista da
revista Forbes de jovens promissores
com menos de 30 anos. O significa
para si o sucesso?
É gratificante que se interessem e
apoiem o meu trabalho, mas é apenas importante na medida em que
aumenta o acesso a mais recursos.
No caso dos projetos sociais ajuda a
chamar a atenção para estas realidades. Pessoalmente, não me importa
para nada. Oferece vantagens e inconvenientes, mas continuo a mesma
pessoa. Prefiro manter o foco no trabalho e nas questões que este levanta.
Qual é o estado da arte (urbana) em
Portugal?
Numa era de despromoção da cultura e criatividade artística em Portugal
tem sido positivo ver agentes culturais
a superarem as (muitas) dificuldades
para continuarem a produzir. A arte,
seja urbana, contemporânea ou contemporânea de inspiração urbana, parece-me estar viva e saudável. Faz-se
muito com pouco. As crises, sem menosprezar a sua dimensão trágica, podem oferecer oportunidades.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
21
1
o meu mundo
LETRAS
HISTÓRIAS
ESCREVER:
PORQUÊ?
PARA QUÊ?
22
PARA CRIAR A CRÓNICA DO
TEMPO QUE PASSA, EXPLICAR
A REALIDADE, TRANSMITIR
ETICAMENTE UMA IDEIA…
SÃO MUITOS OS MOTIVOS QUE
LEVAM UM AUTOR A ESCREVER.
FALÁMOS COM LÍDIA JORGE E
AFONSO CRUZ, DOIS ESCRITORES
COM IDADES, PERCURSOS
E OBRAS DIFERENTES QUE
EXPLICARAM O SEU AMOR
PELA ESCRITA E O MODO COMO
CHEGARAM ATÉ ELA
por susana torrão
fotografia artur e joão cupertino
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Tudo começou pela leitura. O gosto
pelos livros acompanha Lídia Jorge
e Afonso Cruz desde a infância.
Em Boliqueime, no Algarve dos anos
50, a autora de Os Memoráveis ou
Vale da Paixão encarava as histórias
que lia como ponto de partida.
“Só por si, um livro nunca me dava
satisfação. Acabando-o pensava em
escrever eu a minha história”, recorda. Vinte anos mais tarde, na Figueira da Foz, era a vez de Afonso Cruz.
“Sempre li muito e, como um copo
que vamos enchendo e há um dia
que extravasa, um dia também começamos a pôr cá para fora aquilo que
acumulámos”, explica. Ela sempre
teve como objetivo ser escritora, para
ele essa foi uma descoberta mais
tranquila. Encontram-se no olhar
crítico que têm sobre a realidade.
Dar sentido à vida
“Devoto tudo à escrita. Ponho-a acima de tudo. Naturalmente há limites.
A família – os nossos – fica de fora
desta contenda.” É assim que Lídia
Jorge explica a importância da escrita no seu quotidiano. Um dia chegou a
dizer que “escrever é mais importante
que a própria vida” e, apesar de reconhecer o caráter hiperbólico da frase,
assume que vê a vida como uma espécie de batalha a que a escrita pode
trazer alguma luz. “Não é arrogância,
é ambição de criar outro ponto de vista para tentar encontrar explicação
para a existência tal como é: com esta finitude, com esta permanente desinteligência entre os homens, o facto
de haver sempre desinteligência mesmo entre as formas mais superiores
de amor. Porquê? Porquê ambicionarmos viver fora do tempo? Porquê
o início do mundo? Porquê o fim do
mundo? Tudo isto são questões que
nós colocamos”, diz.
Desde que, aos dez anos, escreveu
as primeiras 33 páginas de Amores de
São João – “histórias sobre rapazes e
raparigas mais velhos do que eu e que
conhecia, para quem tentava criar histórias como as que lia no Júlio Dinis.
“Senti uma espécie de
libertação quando deixei a
faculdade e voltei a escrever
desembaraçadamente”
(Lídia Jorge)
Coisas muito ridículas e muito primitivas…” – Lídia Jorge trabalhou para
alcançar o objetivo de ser escritora.
Esse texto perdeu-se numa mudança de casa mas ainda existem os artigos que publicou em A Centelha, o jornal do Liceu Nacional de Faro do qual
chegou a ser diretora, bem como os
textos que escreveu na universidade,
em Lisboa. Até o estudo da literatura
se tornar paralisante. “Quando cheguei à Faculdade de Letras procurei
os livros e os autores com quem eu me
identificava. Foi um momento de recolha de informação, de descoberta de
autores, com uma intenção mais amadurecida. Nesse aspeto a Faculdade
de Letras foi muito importante, mas
também foi o momento em que duvidei de que era capaz. Estudava teoria
e análise literária, disciplinas de análise, de sobreaviso sobre a literatura, e
questionava-me: será que para escrever é preciso ter esta engrenagem na
cabeça? Só senti uma espécie de libertação quando deixei a faculdade e voltei a ser uma leitora desprevenida e a
escrever desembaraçadamente”, conta Lídia Jorge.
Viajar para partilhar
O início da relação de Afonso Cruz
com a escrita deu-se mais tarde, numa
altura em que o também ilustrador trabalhava como redator de publicidade.
“Foi a primeira vez que, profissionalmente, trabalhei com as palavras e não
com as imagens. Foi talvez aí que comecei a escrever com assiduidade”, recorda. Entretanto, Afonso Cruz foi acumulando viagens e conta hoje no currículo com mais de 60 países. “Acho que
a necessidade de partilhar e de nos expressarmos tem a ver com tudo aquilo
que acumulamos. E isso não se restrin-
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
23
1
o meu mundo
LETRAS
histórias
24
ge às leituras mas às experiências que
fomos tendo ao longo da vida. Apesar
de haver escritores que são muito precoces, acho que o processo normal e o
mais expectável é que adquiram uma
certa bagagem”, lembra.
O que o levava a partir era a busca pela diferença e a certeza de encontrar novas maneiras de pensar,
que podia confrontar com a rotina.
“Por nos afastarmos um pouco da nossa sociedade, quando olhamos de longe
vamos observá-la de maneira diferente. Quando viajo procuro sociedades
que possam fazer-me refletir e repensar o nosso padrão de vida. Os povos
indígenas da Amazónia ou algumas
tribos africanas têm diferenças mais
acentuadas, mas o limite da diferença
está entre o nómada e o sedentário, em
que a maneira de pensar é realmente
diferente”, explica Afonso Cruz.
Para o escritor, mais do que a forma é o conteúdo de cada acontecimento ou de cada experiência que
deve ser valorizado. Foi o que tentou
mostrar na sua Enciclopédia da História Universal, uma compilação de
factos inventados. “Nas nossas experiências – independentemente de terem sido factos ou não – o mais importante a retirar delas é o conteúdo que
encerram. E não sinto que uma obra
de ficção seja menos importante…
Por exemplo o Crime e Castigo será
sempre muito importante para mim,
independentemente do personagem
ter morto ou não aquelas senhoras
na vida real. Não é isso que importa.
E, em alguns momentos históricos,
também é mais importante retirar
o conteúdo do que as circunstâncias
que os acabam de promover no tempo e que, noutra época, deixam de ser
importantes”, afirma.
Importante mesmo é procurar a
essência das coisas. “É a ficção que
cria coisas. Costumo brincar e dizer
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
AFONSO CRUZ
A literatura
como
mensagem
O escritor da Figueira
da Foz faz das palavras
a sua arma para levar
ao mundo mensagens
globais. O papel que
acredita caber ao escritor
é o de personagem
ativa que contrabalance
as mensagens de
consumismo e que
promova lemas como
“sê crítico” ou “mais
criativo”. As viagens por
mais de 60 países também
são uma inspiração.
que se não fosse a ficção as rodas ainda eram quadradas”, diz Afonso Cruz.
Das crónicas e da ética
“Cronista do tempo que passa.” É assim que também se define Lídia Jorge. E, de facto, através dos seus romances é possível traçar uma espécie
de “história marginal” de Portugal ao
longo dos últimos 50 anos. Do país
rural e da forma como este se modifica em O Vale da Paixão, ao período
da revolução e o tempo que lhe é anterior em O Dia dos Prodígios, à guerra
colonial e ao regresso da mesma em
A Costa dos Murmúrios e Notícias da
Cidade Silvestre, passando pelos anos
de mudança e pela história da própria
democracia em livros como O Vento
Assobiando nas Gruas, Combateremos
a Sombra ou Os Memoráveis.
“Eu não sou capaz de escrever romance histórico. Por impotência!
Não tenho duas vidas. E tendo só uma
vida e não sabendo quando acaba tenho pressa e urgência em ser testemunha do meu tempo, que é aquilo
que acho que posso fazer melhor e
com alguma singularidade. Porque
nós podemos saber sobre o longínquo,
sobre aquilo que não é o nosso país ou
sobre lugares nenhuns, como muitas vezes se escreve. Mas a verdade é
que, tendo só uma vida e capacidade
de testemunhar a transformação da
sociedade, podemos desocultar a modernidade”, revela.
Já Afonso Cruz, que nos seus
livros e peças de teatro coloca em
cima da mesa questões tão atuais como a perda ou a religião, como é o caso de Para onde Vão os Guarda-Chuvas,
ou o materialismo da atual sociedade, usa a sua faceta de autor infanto-juvenil (onde começou como ilustrador) para passar mensagens globais.
Além do mais, encontra aqui um bom
veículo para transmitir preocupações
éticas e morais. “Somos bombardeados
constantemente com mensagens cujo
único objetivo é fazer-nos consumir,
mas não temos nada que nos diga ‘sê
bom’, ou ‘sê mais inteligente’ ou ‘mais
criativo’ ou ‘mais crítico’. Cabe à arte e
à literatura ter esse papel”, afirma.
Ou, nas palavras de Lídia Jorge, escritas no passeio à frente da biblioteca
de Penafiel: “Não há livro de instruções para salvar a vida. Só a literatura
se aproxima desse imenso livro”.
1
o meu mundo
OPINIÃO
António Ramalho Eanes
Ex-Presidente da República
Homens grandes assim
não morrem
NA UNIDADE E CONTINUIDADE, NA MEMÓRIA,
NA PERSONALIDADE DE SILVA LOPES* MUITO
CONTAM TANTO OS SEUS INVULGARES
TALENTOS DO ESPÍRITO QUANTO OS SEUS
IMPRESSIVOS DOTES DE TEMPERAMENTO,
QUE O SEU CARÁCTER TÃO BEM QUIS, E SOUBE,
ESCULPIR E, NOBREMENTE, ANIMAR.
Mas, socorrendo-me de Kant, o que sobremaneira conta em Silva
Lopes é “o valor do carácter que é moralmente, sem qualquer comparação, o mais alto, e que consiste em fazer o bem, não por inclinação, mas por dever”.
Essa preocupação ética do dever – servida por uma grande e
ininterrupta preparação, por um vivido e interiorizado cosmopolitismo, por uma experiência profissional de excepcional matriz,
diversidade e exigência, que o levaram a ser intransigentemente
fiel à verdade – somada à sua coragem, honestidade, prestígio intelectual e aos serviços prestados ao país, conferem a Silva Lopes, a
justo título, uma aristocracia de espírito.
São, realmente, essa fidelização ao dever e às respostas de saber
(sempre em procura de empenhada perfectibilização), a inteira
disponibilidade para servir o país, com empenho e competência, e
com desassombro também, não procurando agradar a quem exerce
o poder (um pouco à maneira de Mouzinho da Silveira) que fazem
de Silva Lopes não só, e como bem disse Luís Villalobos, “o economista que fez história” mas, também, o Homem que, na história colectiva, inscreveu presença harmoniosa, de referência e inspiração.
De referência e inspiração é Silva Lopes, pelo dever de verdade
que, com tocante humildade, sempre oferecia e que elegeu como
sol norteador, pela liberdade que defendeu e exigiu, tanto para si
como para os outros, pela igualdade diferenciadora por que se bateu e que impõe que a todos seja estendida a fruição do necessário
para assegurar uma vida digna.
Aliás, estas foram preocupações, e propósitos também, que o levaram, por vezes, ao combate político, que travou, recusando, sempre,
o recurso demagógico, que considerava forma maior da corrupção
política.
Referência não farei
a quanto, de forma empenhada e eficaz, serviu o país, no
país e no estrangeiro, exercendo funções políticas da
mais alta importância nacional, cargos da maior imporsereno como tância na administração pútudo o que blica e, ainda, no governo de
brota de fontes grandes instituições públicas
profundas (como o Banco de Portugal) ou
de grandes organizações da sociedade civil (o Montepio, por exemplo).
Acção de relevante trabalho e mérito teve, ainda,
no urgente processo de esclarecimento da opinião
pública, através de inúmeras conferências e intervenções mediáticas.
Mas incompleto ficaria este testemunho, de memória e preito de gratidão, se esquecesse que Silva Lopes, o Homem do Dever, sabia ser, também,
e era-o frequentemente, o homem de sorriso discreto, sereno, como tudo o que brota, com naturalidade,
de fontes profundas. Sorriso que oferecia aos amigos.
Sorriso, de tocante carinho, com que sempre olhava,
falava com os filhos e netos, ou deles dava notícia.
Encontrar Silva Lopes, descobri-lo, tê-lo
como amigo e amizade fazer também com a sua mulher e os seus filhos, usufruir dos seus ensinamentos,
inspirar-me no seu exemplo, foi uma graça, um dom
de excepcional valia que agradeço a Deus.
Aos filhos e netos de Silva Lopes, quero apenas dizer, neste tempo de partida, neste momento de despedida, quão orgulhosos, e gratos também, se devem sentir pelo pai e avô que têm,
pelo amor e exemplo que lhes deu, mas, também,
pelo muito que ele legou aos portugueses, à sua vida e história, na qual tem jus a referência e a lugar
especiais.
E digo – aos filhos e netos – o pai e avô que têm,
e não o que tiveram, porque homens grandes,
assim, não morrem. Nunca morrem.
Silva Lopes,
o Homem do
Dever, sabia ser,
também, e era-o
frequentemente,
o homem de
sorriso discreto,
NOTA: O autor continua a escrever segundo
* José Silva Lopes presidiu ao Montepio entre 2004 e 2008.
a chamada norma antiga.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
25
1
o meu mundo
ENTREVISTA
26
“Acreditava
ser possível
fazer vida e pagar
contas a escrever
canções. E consegui.”
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
KALAF ÂNGELO
O AGITADOR
TRANQUILO
QUEM É O HOMEM POR DETRÁS DA VOZ MELANCÓLICA
QUE CRUZA O AFRICANO KUDURO COM A MUNDIAL ELETRÓNICA
DOS BURAKA SOM SISTEMA? DEPOIS DE TER “COMPRADO” LISBOA,
KALAF PASSA OS DIAS A VENDÊ-LA PELO MUNDO,
NA MÚSICA E NOS LIVROS
por nuno alexandre silva
e miguel ferreira da silva
fotografia gonçalo f. santos
É a alma poética dos consagrados
Buraka Som Sistema e, por paixão
a Lisboa, já se declarou em livro.
Este angolano que celebra o design
na forma de vestir e de viver sabe
bem o que quer: contar histórias.
Chegou a Portugal aos 17 anos, vindo de Angola, e agora passa a vida a
cruzar o mundo. Qual é a sua terra?
Lisboa, sem dúvida nenhuma. Estive há poucos dias no Rio de Janeiro e
estava a vender Lisboa como um guia
turístico. Lisboa é o único lugar do
mundo que fala português onde consigo conviver com todos os mundos que
falam português. E isso é muito importante para o meu trabalho. Gosto muito de ir a outros sítios onde não falo
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
27
1
o meu mundo
ENTREVISTA
28
a língua, para despertar a curiosidade
e para explorar outros “eus” que habitam em mim. Mas a apontar uma “casa”, Lisboa reúne todas as caraterísticas que eu preciso. É a minha base.
Como era esta Lisboa quando chegou e como está agora?
Quando cheguei foi amor à primeira vista. Quando se é jovem não se tem a ideia
do “para sempre”. Pensamos que tudo é
temporário e eu também pensei que Lisboa seria temporária. Mas, com o passar do tempo, fui descobrindo as pessoas
que aqui habitam: cabo-verdianos, brasileiros, portugueses. Achei, também, o
Porto fascinante. No início ia constantemente a Serralves, ao Museu
de Arte Contemporânea, para conviver de perto com coisas que lia nos livros e que estavam ali. Gosto da proximidade que Lisboa tem de outras
cidades. Depois do Porto passei a ter essa relação com Madrid. O [museu] Rainha Sofia e o [museu] Prado são imbatíveis e estão tão perto. A minha cidade
escape passou a ser Madrid, mas só porque estava em Lisboa e tinha essa proximidade.
E como estão os portugueses?
Diferentes?
Sim. Acho que os portugueses que encontrei não estavam tão atentos a uma
realidade: o facto de Lisboa ser uma
das capitais africanas mais vibrantes,
e incluo as que estão em África.
Ganhou visibilidade com a música
nos Buraka Som Sistema. Era isso que tinha pensado para si ou não
pensa muito nisso?
Não era necessariamente, mas, assim
que pisei aqui a terra e me confrontei
com outros povos que falam a mesma
língua, foi muito claro que o que queria
fazer era contar histórias. O que mais
me cativou, durante esse contacto, foi
que a história não está a ser contada no
seu todo. Eu adorava que houvesse mais
pessoas a escreverem como eu escrevo,
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
a completarem aquilo que não consigo
completar, que não consigo expressar.
O meu ponto de vista não exclui nada.
Eu incluo. Sempre partindo do ponto de
que venho de Benguela...
Sente necessidade desse prefácio?
Sinto necessidade de contadores de histórias. Porque essa é a única forma de
eliminar os equívocos. Se contarmos
tudo, se expusermos tudo, mais facilmente conseguimos encontrar o equilíbrio social. Mais perto ficamos de uma
ideia mais humana, mais inclusiva. E eu
acho que fazemos pouco isso. Escreve-se
muito, em português escreve-se bastante, mas não o suficiente...
Temos apenas um prémio Nobel.
Mas podíamos ter quatro ou cinco. Eu sou do team Mia Couto. Estou
a torcer por ele. Que Deus nos oiça.
Quando pensou ser escritor?
Queria contar histórias e queria
estar perto das pessoas que contam histórias. Logo, a música, enquanto jovem,
foi a mais sedutora. A ideia de ficar em
casa a escrever livros não é muito atrativa. Então, decidi ser músico, mas descobri que não tinha talento para fazer música e decidi escrever canções. Acreditava que era possível fazer vida e pagar
contas a escrever canções. E consegui.
E ser poeta?
É difícil viver da poesia. O meu editor acha que devo escrever romances porque os consegue pôr no mercado. A poesia é difícil. Mas escrever
canções é um prazer que continuo.
Os meus poemas acabam sempre por
vazar para as canções, mas ainda não
consegui editar um livro de poesia.
Terá, certamente, oportunidade.
Sim, não tenho pressa. Acho que os
meus escritores favoritos só se descobriram aos 50 anos.
O que tem a dizer ao mundo? O que
procura transmitir na sua escrita?
Através das histórias conseguimos estar mais perto do sublime, no sentido em que todas as pessoas carregam
um génio dentro delas. E esse génio só
se revela quando se está em plena comunhão com o seu ser. Quanto mais
se tiver a plena certeza do que nos
“O pensamento
sob o qual nos regemos
não inclui os negros”
define, sem medos e sem dúvidas, mais
perto conseguimos estar dessa viagem.
E escrever tem-me tornado intransigente no sentido que estou mais perto
de chegar a esse lugar. De, realmente,
ser um fator de mudança. E eu escrevo
para me conhecer, conhecer os outros,
e, nesse ato, chegarmos a um consenso de que o que importa não é aquilo que nos é imposto pelo status quo.
A felicidade não reside naquilo que nós,
em grupo, acreditamos que é a felicidade, mas, simplesmente, aquilo que está guardado dentro de cada um de nós.
Não é uma pergunta de resposta fácil.
Estou sempre a fazer essa pergunta e
provavelmente quando encontrar a resposta vou deixar de escrever.
29
ORIGENS
De onde vem Kalaf?
Com dois livros
publicados,
Estórias de Amor
para Meninos de
Cor e O Angolano
que Comprou
Lisboa (Por
Metade do Preço),
Kalaf Ângelo, ou
Epalanga como
agora assina,
é o ponto de
encontro das
culturas que foi
experienciando
e que também
transporta para
as palavras que
dão corpo aos
discos dos Buraka
Som Sistema.
A “falta de jeito”
para tocar um
instrumento fê-lo encontrar nas
palavras o seu
porto de abrigo
e não esquece
as raízes. “Sou
fruto da geração
hip hop, geração
Internet, que olha
para a cultura e
não tem pudor
em tirar aquilo
que lhe interessa,
com vontade
de fazer arte
para consagrar
de forma a que
alguém, daqui a
20 anos, esteja a
fazer as mesmas
perguntas que
eu”, explica,
acrescentando
a influência de
Miguel Esteves
Cardoso no seu
trabalho.
“É provavelmente
das maiores
influências
que tenho. Não
necessariamente
no conteúdo, mas
na abordagem.
A forma como
ele escreve sobre
a cidade.”
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
1
o meu mundo
ENTREVISTA
30
O título O Angolano que Comprou Lisboa tem mais de metáfora da sua vida
ou de metáfora sociológica?
Para começar, é uma declaração de
amor à cidade de Lisboa. Só compra
quem gosta. É óbvio que a provocação
é viciante. Se eu escrevesse “O angolano que seduziu Lisboa” não ia ter a
mesma leitura. “O angolano que conquistou Lisboa” talvez ficasse mais
próximo. Mas o título do livro é, sem
dúvida, uma provocação. Para mim,
como angolano, e para os outros que
não são angolanos. Este livro começou a ser escrito quando editei o anterior, Estórias de Amor para Meninos de
Cor. Eu brincava com essa ideia de cor,
que é um termo bastante pejorativo.
A geração dos meus pais detesta
este termo. Mas senti que precisava de
tocar nas feridas para poder, depois,
iniciar a conversa.
O livro tem o kuduro e o kizomba,
muitas vezes, no papel principal.
Como é que vê esta relação entre a
nova agenda cultural e a economia?
Sem dúvida que a cultura precisa de
dinheiro para existir, mas acho que
não se devia pôr todas as fichas no
mesmo número. Porque isso tende a
deformar. A economia tem uma agenda muito clara, que é gerar mais dinheiro. E essa agenda pode atropelar
um conjunto de fatores importantes.
A preocupação devia ser criar mais e
pensar a longo prazo. Se calhar o importante não é gerar mais, mas preservar para décadas vindouras. O kuduro e o kizomba são mais soluções para apresentar ao mundo. Infelizmente
olhamos mais para quem consegue encher o Pavilhão Atlântico e não olhamos para quem só consegue encher
o B.Leza. Mas para haver o Pavilhão
Atlântico, tem de haver o B.Leza saudável e pujante. É como na economia.
Não se pode investir só nas sociedades anónimas e esquecer as pequenas,
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
HISTÓRIA
Buraka global
A história dos Buraka
Som Sistema, banda
que tem Kalaf como
vocalista, parece tirada
de um filme. Um projeto
musical que sai da
Amadora e conquista o
mundo. Que leva o nome
de um subúrbio lisboeta
e o coloca no mapa
das mais fulgurantes
sonoridades. A novidade
da ligação do zouk e
kuduro africanos com a
eletrónica foi a fórmula
que levou a banda de
Kalaf Ângelo, João
Barbosa (Branko), Rui
Pité (Dj Riot) e Andro
Carvalho (Conductor),
a pisar os mais
importantes palcos da
música do mundo, um
pouco por todo o planeta
e a colecionar prémios
internacionais.
Quanto ao segredo do
sucesso, Kalaf aponta
o caminho: “O facto
de Lisboa ter sido e
continuar a ser um
segredo para uma boa
parte do mundo foi
vantajoso para nós.
A música tem que ser
boa, mas quando se
tem um bom produto
o fator surpresa traz
vantagens.”
João Barbosa, um dos
quatro fundadores dos
Buraka, partilha com
Kalaf a marca de roupa
criada com o objetivo de
se adaptar a qualquer
época e qualquer
estação, a Rest of The
World. Além disso, a
história de parceria dos
dois músicos começou
em 2004, com a
Enchufada, a produtora
que reúne hoje muitos
músicos de novas
tendências musicais,
como Blaya, que faz
parte da formação atual
dos Buraka. Kalaf lembra
a importância do amigo.
“Nestes últimos anos,
com os Buraka a marcar
o passo, o João
Barbosa posicionou-se num lugar que não
tem paralelo. É quase
o Anthony Bourdain.”
o comércio de rua que mantém uma
sociedade e que contribui para a felicidade.
Viver em Portugal é mais fácil nesta
fase? Há menos preconceito com a
cor da pele?
Eu sofro sempre que falo sobre racismo. Acho que, hoje, o racismo clássico, como nós entendemos, tem-se vindo a transformar. Há pessoas
que não gostam da diferença, e depois há aquele racismo associado
a classes. Esse é mais grave. Não é
tão visível. Eu, com a gravata posta,
tenho um tratamento e, sem a gravata, tenho outro. São duas abordagens. Não só racial, porque nesse plano as coisas têm vindo a equilibrar-se.
Mas no plano económico e intelectual
há muita resistência. Porque o nosso modelo foi herdado do Iluminismo. Foi construído por pessoas que
não incluíram o negro na equação.
O pensamento sob o qual nos regemos não inclui os negros. Por racismo,
por discriminação... vamos evoluindo,
mas o pensamento está vigente. É como nas universidades. Os nossos professores estão a ensinar esses valores.
E não incluem os negros. No Brasil está
a discutir-se a ideia de quotas, uma discussão acesíssima sobre esse assunto,
nos dois planos: classe e raça. Uma professora de design, minha amiga, contava que os temas mais clássicos, como a
escola de Bauhaus e Eames, e no design
é tudo muito Bauhaus e Eames, não diziam nada aos alunos negros. Aquele
conhecimento não é aplicado na sua
realidade. Eles não ambicionam trabalhar no estúdio de design do arquiteto
“xpto”. Eles querem ir buscar o conhecimento e aplicar na favela.
É diferente de qualquer parte do
mundo?
Não é muito diferente e também está
presente em África. Porque estamos
a perpetuar um pensamento que já
devia ser confrontado há muito tempo. É urgente reequilibrar a balança.
Eu não sou apologista da ideia de quotas, mas está a ser aplicado e até está a
funcionar, não nego.
Kalaf diz que é vaidoso. Como vive
com essa vaidade?
Assento a minha vaidade em algo sólido que é a minha paixão pelo design, que
vai desde o vestuário até objetos. Voltando aos discos, sou do tempo em que ficávamos horas a olhar para a capa de um
disco. Essa relação com o objeto e com as
formas é algo que me definiu. Claro que
vou transpondo os meus interesses para outras áreas, como o vestuário. Olho,
por exemplo, para a geração Orpheu,
de Almada Negreiros, Sá Carneiro,
Pessoa. Aquela época em que os
homens andavam com chapéu e
havia um certo pudor em não sair de
casa mal amanhado. Claro que adoro a
t-shirt. Acho uma das peças de vestuário mais brilhantes que o homem
já criou. Tão simples, que funciona,
com qualquer forma, com qualquer
coisa. É a peça de vestuário mais brilhante. Mas como convivi muito com o
jazz e fui colecionando discos de vinil
ganhei um certo gosto por uma época,
por uma era, por uma forma e porque
é que as coisas são feitas dessa forma.
É incrível com uma peça de roupa consegue contar uma história, trazer ali todo um passado de memórias.
Há dias em que se sente mais Orpheu
e dias em que se sente mais jazz?
Há dias em que me sinto rock and roll,
leather jacket... também porque respeito essa ideia de uniforme. Eu estou a
conseguir reduzir o meu guarda-roupa às peças essenciais e todas elas respeitam essa ideia de uniforme.
Como o Einstein que tinha sempre
a mesma roupa?
Estou quase a chegar aí.
Com a dimensão que tem hoje há
quem o procure para “apadrinhar”
projetos musicais e literários?
Nem tanto. Eu estou naquela fase em
que gostava de aprender mais com
pessoas ligadas a outras áreas da cultura. Estou na fase em que gostaria
de perder mais tempo com arquitetos, mais tempo com economistas,
para entender como levar a experiência a mais pessoas e ser transformador na sociedade.
Está a escrever o primeiro romance
para publicar ainda este ano.
Sim, a correr contrarrelógio.
É mais ou menos autobiográfico
do que os outros dois livros?
Tenho em mãos um romance político, que se passa em Lisboa e... mais
não posso dizer.
Como é a sua vida hoje? É a que
sonhava?
A única coisa que me falta é tempo.
De resto, tudo bem. Esta coisa de ser
pioneiro numa corrente cultural rouba
tempo porque temos que estar atentos
a várias frentes. Perdemos tanto tempo
a criar a música como depois a pensar
como vai chegar às pessoas. E isso
rouba tempo. Por isso é que digo que
devia sempre haver mais.
31
Onde sai à noite em Lisboa?
Bairro Alto e Cais do Sodré.
Onde estão os novos sons de Lisboa?
Lux, Music Box, B.Leza e Doc’s.
Lição de viagem?
Não é preciso ter pressa.
Um escritor que o marca?
James Baldwin.
Um músico importante?
Rui Mingas.
Um realizador fundamental?
Mathieu Kassovitz, com O Ódio.
Um concerto memorável?
Buraka Som Sistema, em Coachella.
A revista Montepio agradece ao
Valverde Hotel a cedência do espaço
para a realização da entrevista.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
1
o meu mundo
OBSERVATÓRIO
RIQUEZA
HÁ VIDA
ALÉM DO PIB?
32
PROGRESSO
NUM MUNDO CENTRADO
NAS TRÊS LETRAS
DO PRODUTO INTERNO
BRUTO, HÁ QUEM
QUESTIONE A MEDIDA
DE CRESCIMENTO E CRIE
NOVAS FÓRMULAS PARA
AVALIAR O PROGRESSO
DAS ECONOMIAS.
A “DITADURA” DO PIB
PODE TER OS DIAS
CONTADOS? HÁ QUEM
DEFENDA QUE SIM
por maria abreu
ilustração ana seixas
O ritual repete-se. A cada três meses
sai um novo valor da evolução
do PIB, as três letras que hoje são
referência para qualquer economia
e que representam o produto interno
bruto. Cada divulgação é aguardada
com ansiedade. Enquanto um
crescimento, nem que seja mínimo,
é motivo de exaltação, uma descida
provoca ondas de críticas e desilusão. Governos e países totalmente
dependentes da evolução de um
único indicador. Mas será
o PIB o único modelo eficiente
para medir a riqueza de um país?
DESENVOLVIMENTO
RIQUEZA
FELICIDADE
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Um pouco por todo o mundo têm-se
multiplicado movimentos para explorar indicadores alternativos a este índice com o objetivo de incluir
outros fatores, como o desenvolvimento sustentável ou o bem-estar
das populações. Ainda que não tenha surgido um capaz de destronar
o PIB, há já vários indicadores que
visam substituí-lo.
Quando Simon Kuznets criou o
PIB, em 1934, o economista alertou
para o facto de o bem-estar de uma
sociedade não poder ser medido por
um indicador de rendimento nacional. Num discurso proferido em 1962,
o Nobel da Economia, galardoado devido à sua participação na criação do
índice, alertou que devem ser tidas
em conta distinções entre quantidade e qualidade do crescimento, entre
os seus custos e retornos, e entre curto e longo prazo. Objetivos para mais
crescimento devem especificar mais
crescimento de quê e para quê”.
Mais tarde, em 1968, foi o senador
norte-americano Robert Kennedy a
dizer que lamentava que o PIB não
incluísse “a beleza da nossa poesia ou
a força dos nossos casamentos, a inteligência do nosso debate público ou a
integridade dos nossos oficiais públicos”. As críticas seguiram-se e têm
sido vários os países e organizações
a apostarem em indicadores alternativos nos últimos anos, com o objetivo de colmatar as limitações do PIB.
O Índice de Desenvolvimento Humano, desenvolvido pelo Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Indicador de
Progresso Genuíno (GPI, sigla em
inglês) ou a Felicidade Interna Bruta (FIB) são algumas das alternativas
que colocam o “homem” mais no centro da análise. Mas, para já, permanece a primazia deste indicador a nível mundial. A capacidade de agregar dados indicativos da atividade
de uma determinada região ou país
num período de tempo, bem como
a possibilidade de medir a sua evolução histórica, dão ao PIB um estatuto específico, sendo para já o único
que permite comparar a taxa de crescimento a nível global.
Crescimento ou progresso?
Mas o que mede, afinal, o PIB?
Um carro, uma casa maior, umas férias caras. São tudo indicadores de
riqueza e que contribuem para aumentar o PIB de um país. O indicador mede a atividade económica
num determinado período através
da soma de todos os bens e serviços
1934
Data em que Simon Kuznets alertou
que o bem-estar de uma sociedade
não podia ser medido por um
indicador de rendimento nacional.
20
Número de estados, nos EUA,
que utilizam o indicador de GPI
(Indicador de Progresso Genuíno)
2006
Em julho de 2006, a New Economics
Foundation introduziu O Índice do
Planeta Feliz
produzidos nesse tempo. Mas, serão
estes verdadeiros sinais de crescimento? Luís Aguiar-Conraria, diretor do departamento de Economia da
Universidade do Minho, explica que
o “PIB mede o valor acrescentado gerado em todas as transações”.
No entanto, nem todas as transações são “boas”, “havendo transações
de que não gostamos”. “Por exemplo,
Duas formas de “medir” os países
EUA são o país mais rico do mundo pelo PIB...
... a Noruega lidera no desenvolvimento
PAÍS
PAÍS
IDH**
Noruega
Austrália
Suíça
Holanda
EUA
Alemanha
Nova Zelândia
Canadá
Singapura
Dinamarca
0,94
0,93
0,92
0,92
0,91
0,91
0,91
0,9
0,9
0,9
EUA
China
Japão
Alemanha
França
Reino Unido
Brasil
Itália
Rússia
Índia
PIB*
17 416
10 355
4 770
3 820
2 902
2 848
2 244
2 129
2 057
2 048
* PIB – PRODUTO INTERNO BRUTO EM MIL MILHÕES DE DÓLARES
** IDH – ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO=INDICADOR COMPOSTO QUE AGREGA PIB PER CAPITA, ESPERANÇA DE VIDA E ESCOLARIDADE
FONTE: FMI, PNUD
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
33
1
o meu mundo
OBSERVATÓRIO
há vida além do PIB?
na compra de coisas poluentes ou num
acidente que nos leva a pagar cuidados
médicos, temos o PIB a aumentar por
maus motivos”, conclui o docente da
Universidade do Minho. Luís Aguiar-Conraria lembra ainda o velho exemplo do patrão que casa com a empregada, o que é mau para o indicador, uma
vez que esta deixa de receber salário e
o seu trabalho passa a não ser contabilizado para o crescimento.
Também Isabel Cruz, socióloga especializada em Sociologia do
Consumo, realça que “o crescimento
34
INDICADORES
Cinco alternativas ao PIB
1 INDICADOR
DE PROGRESSO
GENUÍNO
O Gross Progress
Indicator (GPI)
pretende ser uma
alternativa ao
PIB e evoluiu do
Índice de Bem-estar Económico
Sustentável, criado
em 1989 por Herman
Daly e John Cobb.
Partindo dos aspetos
considerados pelo
PIB, o GPI ajusta-se depois a outros
fatores, como
os custos para a
economia de efeitos
negativos, o crime
ou a destruição de
recursos naturais.
O índice acrescenta
ainda o valor de
bens e serviços não
calculados. Este
indicador é utilizado
no Canadá e nos EUA.
2 ÍNDICE DE
DESENVOLVIMENTO
HUMANO
Com mais de duas
décadas, o IDH é
um reconhecido
indicador mundial,
desenvolvido pelo
PNUD, que procura
avaliar e medir
o bem-estar de
uma determinada
população.
O indicador é
calculado a partir
de três indicadores:
vida longa e
saudável, acesso
ao conhecimento
e padrão de vida
digno. Pretende
ainda medir o
impacto de políticas
económicas na
qualidade de vida.
A Noruega lidera
o ranking a nível
global.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
3 FELICIDADE
INTERNA BRUTA
Criado no Butão
como alternativa
ao PIB, o FIB
assenta em
quatro pilares:
desenvolvimento
sustentável,
preservação e
promoção dos
valores culturais,
preservação
do ambiente e
estabelecimento de
um bom governo de
forma democrática.
O país rejeitou desde
1971 o PIB como a
única métrica para
medir o crescimento.
4 ÍNDICE
DE RIQUEZA
INCLUSIVA
Lançado pelas
Nações Unidas,
o Índice de Riqueza
Inclusiva pretende
medir o progresso
das nações através
da análise de
todas as fontes
de capital de um
país, incluindo
capital humano,
manufaturado e
natural. O indicador
reúne informações
referentes à
educação, expetativa
de vida e recursos
naturais, além da
produção industrial.
5 ÍNDICE DO
PLANETA FELIZ
O Índice do Planeta
Feliz tem como
objetivo medir
a capacidade que
cada país tem para
proporcionar
um bem-estar
sustentável aos
seus cidadãos.
Introduzido
pela britânica
New Economics
Foundation em
julho de 2006,
o índice pretende
medir o nível de
eficácia dos países
para converter os
recursos naturais
em bem-estar social
através da análise
do grau de satisfação
da população, da
esperança média
de vida e das
políticas ambientais
praticadas pelo país.
jj
A FELICIDADE
INTERNA BRUTA
NO BUTÃO
A economia deste
reino no sopé dos
Himalaias está
indexada aos
valores budistas
Crise intensifica discussão
A crise financeira, que deixou
milhões de pessoas numa situação
económica de quase rutura, também
intensificou o debate em torno da
“ditadura” do crescimento medido
pelo PIB. O acesso mais fácil ao crédito e o incentivo a uma economia
centrada num consumo elevado serviram de rastilho àquela que seria a
maior crise desde a Grande Depressão, em 1929, período após o qual
viria a adoptar-se o PIB como medida de crescimento mundial. Os governos de todo o mundo foram obrigados a injetar biliões de dólares na
economia para incentivar o crescimento, o que suscitou ondas de indignação por parte dos cidadãos.
Em 2008 Nicolas Sarkozy, o
então Presidente francês, criou uma
comissão liderada por Joseph Stiglitz
e Amartya Sen para estudar uma
alternativa para medir o crescimento
em França. Também no Reino Unido,
em 2011, o primeiro-ministro David
Cameron realizou um inquérito com
PUB
económico não conduz necessariamente ao desenvolvimento”. Ao longo dos anos assumiu-se que este índice de crescimento é também um
indicador de bem-estar e desenvolvimento, sendo esta uma das principais limitações deste índice. Se o
objetivo “é medirmos o desenvolvimento sustentável, o bem-estar ou
até mesmo a ‘felicidade’ (conceito
subjetivo), teremos que recorrer a outros indicadores que não o PIB”, salienta a investigadora.
Arthur Wolf, professor da Universidade de Vermont, considera que
“o PIB é uma boa estatística de
resumo para comparar o bem-estar
de países de todo o mundo e a evolução num país ao longo do tempo”.
Para o economista, “não é, nem pretende ser, a única coisa que é importante para as pessoas num país”, destacando que as suas limitações são
bem conhecidas, “mas o PIB está
altamente correlacionado com valores não económicos que a maioria das
pessoas consideraria importantes:
taxa de mortalidade infantil, esperança média de vida, educação e literacia,
qualidade do ambiente e muitos outros
fatores”, explica. “É difícil sintetizar
num único indicador a nossa qualidade de vida. O PIB é um modo de sumarizar um conceito muito lato”, conclui.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
35
1
o meu mundo
OBSERVATÓRIO
CULTURA
há vida além do PIB?
36
o objetivo de perceber se os britânicos
estão “felizes” com a sua vida. Iniciativas que pretendem medir a qualidade
de vida dos cidadãos contabilizando
fatores não considerados no PIB, como a sustentabilidade e o impacto da
poluição na sociedade. “Não importa
quão depressa o PIB cresce, um sistema económico que falha em entregar
lucros à maioria dos seus cidadãos, e
na qual a maioria da população enfrenta um aumento de insegurança é,
num sentido fundamental, um sistema económico falhado”, escreveu Stiglitz num artigo publicado no final do
ano passado.
Também as Nações Unidas se
têm empenhado em ir além do PIB.
“Igualdade, dignidade, felicidade e
sustentabilidade são fundamentais às
nossas vidas, mas ausentes no PIB”,
disse Helen Clark, administradora
do PNUD aquando da apresentação
da proposta para criar o Índice de Desenvolvimento Humano Sustentável,
no Rio+20, em 2012. “O progresso precisa de ser definido e medido de uma
forma que represente uma perspetiva
mais ampla do desenvolvimento humano e o seu contexto”, acrescentou.
Butão é pioneiro
Mas foi num pequeno país dos Himalaias que se quebrou a corrente,
com a criação de um novo indicador. “Foi o rei do Butão, Jigme Singya Wangchuck, quem desenvolveu
e aplicou o FIB [Felicidade Interna
Bruta], designando-o como uma nova fórmula para medir o progresso
de uma comunidade ou nação”, explica Isabel Cruz. Nos EUA, o Estado de Maryland foi o primeiro a
adotar o GPI (Indicador de Progresso Genuíno), em 2010, quando o governador Martion O’ Malley lançou
a iniciativa para apresentar o GPI do
Estado através de uma ferramenta
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
online. Dois anos mais tarde, Vermont passou o GPI a lei. Agora, 20
Estados usam este indicador e o Oregon e Washington estão a caminhar
nesta direção.
Jon Erickson, professor de Economia Ecológica da Universidade
de Vermont, lembra, num texto publicado no blogue de sustentabilidade da instituição, que antes de 1940
não existiam indicadores destinados a medir o crescimento da economia, tendo a criação do PIB surgido justamente para resolver essa
lacuna. Mas este índice limita-se
a medir o tamanho de uma economia e a sua evolução. Para o docente, os líderes mundiais estão “obcecados” com o sobe e desce do PIB.
No entanto, Erickson questiona: isto
é crescimento? Quão rápido? Qual é
o PIB por pessoa? O mesmo responsável, um dos arquitetos do GPI neste Estado americano, adianta que
cada vez mais pessoas questionam o
tipo de crescimento e como o mesmo
é gerado. Estas questões não podem
ser respondidas apenas através da
evolução do PIB.
Eric Zencey, coordenador do projeto de GPI de Vermont do Instituto
Gund, da Universidade de Vermont,
que está a compilar uma atualização do indicador para Vermont, defende que a primazia do PIB tem os
dias contados. “Acredito que a nossa
dependência do PIB vai terminar e
que vamos utilizar um indicador melhor de benefício económico líquido
(ao contrário do bruto) criado pela
economia”, adianta à revista Montepio. E diz porquê: “Trata-se de senso comum. Todos os empresários sabem que um negócio sobrevive ou
morre não com base no seu negócio
bruto, mas no líquido após os custos.
É o mesmo com as economias nacionais e as civilizações.”
? O QUE SIGNIFICA
O PIB continua a marcar a agenda
económica, mas começa a haver
indicadores alternativos que melhor
refletem o desenvolvimento dos países
P&R
Isabel Cruz
Socióloga especializada em
Sociologia do Consumo
O PIB é o indicador mundial
reconhecido para medir o nível
de riqueza dos países. É o melhor
indicador para o fazer?
O PIB pode ser definido, de uma
forma simples, como o somatório de
todos os bens e serviços produzidos
numa economia em determinado
período de tempo. É o indicador
utilizado para medir o crescimento
económico. As críticas à utilização
deste indicador surgem quando
o mesmo é aplicado a outros
domínios (social e ambiental, entre
outros).
Alguns países e organizações têm
feito esforços para criar medidas
alternativas. Estão no caminho
certo?
A questão não é tanto encontrar
outros indicadores para o
crescimento. A ideia de que o
crescimento económico não gera
prosperidade nem uma melhor
qualidade de vida é hoje cada vez
mais forte. Existem diversos dados
que comprovam que o crescimento
reduz o nível de vida de grande
parte da população mundial,
agravando as desigualdades sociais.
As suas consequências sobre o
ambiente também são visíveis,
quer através da degradação dos
ecossistemas, quer do aumento das
emissões de carbono. Por último, a
ausência de justiça é mencionada
como um dos motivos que
fundamentam o questionamento
desta fórmula convencional de
alcançar a prosperidade.
1
o meu mundo
CRÓNICA
FRANCISCO MOITA FLORES
25 de Abril e
REVOLUÇÃO
Quarenta e um anos depois, repetem-se as efemérides,
fazem-se balanços. Não surpreende que neste momento
de crise aguda, já muito demorada e com enormes sacrifícios
da população, os discursos hesitem entre o lamento e um
futuro sebastiânico, tão desejado quanto mal percebido.
38
Porém, ao olhar para trás, tinha vinte e um anos
nesse dia, para além da saudade, sentimento que
debota qualquer juízo, qual foi o maior erro que o
País cometeu para podermos explicar o estado em
que nos encontramos? Fizeram-se coisas extraordinárias. Não era difícil, reconheça-se.
Tínhamos sessenta por cento de analfabetos, quase meio milhão de alcoólicos, índices de mortalidade infantil que rondavam os vinte por cento, as
auto-estradas chegavam de Lisboa a Cascais e a
Vila Franca de Xira. Mais de metade do território
não tinha água potável canalizada, nem esgotos,
nem sistema de saúde. O avião era um luxo. A relação com o exterior tornava-se uma verdadeira
aventura que só uma multidão de emigrantes conhecia pelo sofrimento.
Durante estes quarenta e um anos, assistimos e vivemos uma transformação radical.
O analfabetismo é residual, as taxas de mortalidade infantil são das melhores do mundo, multiplicaram-se auto-estradas, democratizou-se o avião,
a água, a rede sanitária, a iluminação pública chegou a todo o lado. Multiplicaram-se as universidades, modernizou-se a rede escolar, a censura fechou portas, as prisões políticas são, hoje, apenas
uma memória a reter.
A tudo isto, associou-se a revolução cibernética fazendo explodir as novas tecnologias, multiplicando ferramentas de trabalho e comunicação
até ao infinito.
Vencedores de tantos desafios, conquistadores de uma sociedade aberta, que faltou para sairmos da cauda da Europa no que respeita
à riqueza, ao crescimento sustentado, à pobreza endémica que persiste em cruzar os nossos
quotidianos?
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
No meu entender, não conseguimos enfrentar dois desafios históricos porque nunca se olhou
o futuro numa escala de média e longa duração.
O mais importante, foi o paradigma em que assentou o desenvolvimento do nosso sistema educativo. Montou-se o dispositivo que garantiu acesso de
todas as crianças à educação, prepararam-se professores e programas para responder a esse desafio e descurámos a dimensão humanista e competitiva do conhecimento. Destruiu-se o ensino profissional em nome de mitos classistas. Deixou de
se investir naquilo que era necessário apostar, na
formação de quadros especializados, com saberes
mais complexos. Acredito mesmo, que a crise que
vivemos, ainda que baixe a agressividade conjuntural, voltará enquanto não encararmos a Escola
como desafio estratégico para a cultura portuguesa em todos os domínios de actividade.
O segundo erro é velho. Tem séculos de agravamento e nunca houve coragem para o enfrentar. Herdámos um país desequilibrado demograficamente. Foi sempre assim. Sempre em movimento para o litoral. Concentrando riqueza,
crescimento, modernidade nas regiões de costa marítima, deixando mirrar mais de metade
do território. Hoje a paisagem demográfica é terrível. A tal ponto que 167 das 308 autarquias do
país gerem velhos e paisagens desertas. Crescem os lares e diminuem as escolas. Aumentam os cemitérios e contraem-se as maternidades e o resultado, a não ser enfrentado este terrível problema, é a contínua degradação dos saldos
fisiológicos. Este é o flagelo do Portugal de Abril.
A derrota maior com todas as consequências que
já sentimos em aflição. O grande desafio a vencer
para que a utopia nascida nesse dia de Liberdade continue a fazer sentido: só um país rejuvenescido pode sonhar o futuro com a confiança que
hoje não temos.
NOTA: O autor continua a escrever segundo a
chamada norma antiga.
A MINHA CIDADE
CAMINHOS A PERCORRER EM
MOBILIDADE, URBANISMO,
SOLIDARIEDADE
página 40
página 46
São cada vez mais as
autarquias a envolverem
os eleitores nas decisões
orçamentais. Cascais
e Funchal são dois casos
de sucesso internacional
Os tapetes de pedra que
cobrem o chão das cidades
contam histórias de um
país e de uma arte que
têm no calcário a sua
matéria-prima criadora
ORÇAMENTO
PARTICIPATIVO
CALÇADA
PORTUGUESA
2
a minha cidade
AUTARQUIAS
ORÇAMENTOS
PARTICIPATIVOS
PARTICIPAR
PARA CONFIAR
40
DAR AOS CIDADÃOS
A OPORTUNIDADE DE ESCOLHEREM
PROJETOS MAIS À SUA MEDIDA
AUMENTA A CONFIANÇA NO
PODER LOCAL. PORTUGAL FOI
UM DOS PAÍSES PIONEIROS
NA IMPLEMENTAÇÃO DOS
ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS
E JÁ É VISTO COMO
EXEMPLO A SEGUIR
por susana torrão
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Tomar o destino em mãos.
Avançar com propostas para
a cidade e decidir em comunidade
quais devem ir para a frente.
Em Portugal, nos últimos dois
anos, os orçamentos participativos
(OP) revelaram-se um instrumento
fundamental para reconstruir
a confiança entre os cidadãos
e o poder político local. Depois
de um começo tímido, em 2002,
Portugal é hoje um case study
a nível europeu. No final de 2014
estavam ativos 65 OP, alguns
dos quais, como é o caso do de
Cascais, convertidos em exemplo
internacional. Desde 2002
– data do início dos OP em
Portugal – até ao fim de 2014,
os portugueses decidiram
o destino de 54 milhões de euros
dos erários municipais
Em 2050, de acordo com dados das
Nações Unidas, 66% da população
mundial viverá em cidades. Facto
que atribui uma importância cada
vez maior ao modo como estas são
geridas, nomeadamente através da
aposta na democracia participativa.
Os OP surgiram nos anos 80 na cidade brasileira de Porto Alegre (ver
caixa) e estão hoje disseminados por
todo o mundo. O estudo Aprendendo com o Sul: o orçamento participativo no Mundo – um convite à participação global, da associação Engagement
Global, de Bona, publicado em 2012,
sublinha o facto de poderem ser encontrados OP “num largo espectro de
sociedades, culturas e sistemas políticos”, incluindo em regimes não democráticos. O estudo estimava que,
em 2012, o número de OP no mundo
variasse entre os 795 e os 1 469, estando mais de metade na América Latina. Na Europa a disseminação dos
OP fez-se rapidamente, em parte graças à participação dos responsáveis
políticos europeus nos fóruns sociais
de Portalegre e ao crescimento inicialmente registado em países como
Itália, Espanha e Portugal.
O poder da decisão
“Até 2013 tivemos duas grandes gerações de orçamentos participativos.
A primeira experiência data de 2002,
em Palmela. Nessa altura, a natureza dos OP era essencialmente consultiva. A grande evolução numérica e
qualitativa dá-se com os orçamentos
participativos deliberativos, em que
o cidadão decide investimentos públicos”, afirma Nelson Dias, sociólogo e presidente da associação In Loco,
organização que faz a monitorização
e acompanhamento de várias experiências de orçamento participativo
em Portugal.
O processo sofreu altos e baixos
ao longo dos últimos anos. Até 2013,
os OP em Portugal registavam aquilo a que se pode chamar “uma alta taxa de mortalidade”, que afetava
sobretudo os modelos em que os cidadãos podiam apresentar propostas mas não tinham poder decisório.
Os números falam por si: em 2009
apenas 15 OP estavam a funcionar, em 2010 tinham subido para 23,
aumentando para 33 nos dois anos
seguintes e voltando aos 23 em 2013.
Depois das últimas eleições autárquicas, no final de 2014, o número de
OP subiu em flecha, somando 65 experiências, 55 das quais deliberativas, que envolveram um montante
global de cerca de 14 milhões de euros – mais de um quarto dos 54 milhões atribuídos ao longo de 12 anos.
EM FOCO
Paris, o maior
OP da Europa
A capital
francesa teve
o seu primeiro
orçamento
participativo
global apenas
em 2014, mas
foi a chamada
“estreia em
grande”. Depois
da experiência
de OP em alguns
dos bairros
parisienses, a
câmara presidida
por Anne Hidalgo
atribuiu 5%
do orçamento
camarário ao OP
e avançou com
15 propostas que
submeteu ao voto
dos cidadãos.
Na edição deste
ano, aquele que
é o maior OP
da UE – com 75
milhões de euros
– torna-se mais
democrático.
Desta vez serão
os cidadãos, e
não a câmara, a
avançar com as
propostas para
votação.
ORIGENS
Uma história com 30 anos
Foi na cidade brasileira
de Porto Alegre
que surgiram as
primeiras experiências
de orçamentos
participativos, no
início dos anos 80.
À época, além de ter
movimentos sociais
com alguma força, Porto
Alegre caraterizava-se
por um nível de vida
superior ao da média
nacional e por elevados
níveis de desconfiança
face ao poder
central. O orçamento
participativo surgiu
com três objetivos:
democratizar, inverter
as prioridades em favor
dos desfavorecidos e
erradicar a corrupção
e melhorar as políticas
públicas.
As experiências destes
tipos de orçamento
foram-se disseminando
pelo Brasil, hoje o país
à escala mundial com
maior densidade de
OP – em 2012 tinha
mais de 200 OP ativos.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
41
2
a minha cidade
AUTARQUIAS
participar para confiar
jj
FUNCHAL
O último
OP teve a
participação de
505 pessoas
quando, em
média, este tipo
de inicativas
conta com 50
P&R
participantes
Nelson Dias
Presidente da associação In Loco
42
O que explica
o aumento
do número
de OP?
Por um lado
o resultado
das eleições
de 2013. Foi a
primeira eleição
depois da nova
legislação
que obrigou
ao limite de
mandatos, o que
provocou uma
certa renovação
nos quadros
das autarquias.
Além disso, há
um acentuar
da necessidade
dos eleitos se
aproximarem
dos cidadãos.
Por duas razões:
uma tem a ver
com a grande
desconfiança
que se foi
instalando
na sociedade
portuguesa, que
afasta cidadãos
e políticos,
e a outra a crise
financeira das
autarquias,
que leva a
uma maior
necessidade de
aproximação
entre quem
gere os recursos
públicos e os
munícipes.
Há a ideia
de que os
portugueses
são pouco
interventivos
na sociedade.
Os OP
permitiram-lhes uma
participação
mais direta?
Sim, sem
dúvida. Mas
há uma grande
diferença entre
OP e outras
formas de
participação:
nos OP os
cidadãos
controlam
o resultado,
são eles quem
o decide.
A participação
não é uma
variável
independente.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
“Os resultados que temos nos processos
deliberativos mostram que a participação aumenta de ano para ano. Inclusive,
há um número cada vez mais expressivo de pessoas que afirmam não votar
nas eleições mas participar nos OP”,
afirma Nelson Dias.
Confiar é preciso
Consoante os modelos e os países em
que é aplicado, um OP pode ter diferentes funções. Desde o fortalecimento da democracia e combate à corrupção, ao aumento da transparência ou
à abertura de estruturas até então demasiado herméticas. Em Portugal a
experiência não gerou um aumento
de transparência nas contas autárquicas (ver entrevista), mas os OP têm-se
revelado um instrumento poderoso
para restabelecer a confiança entre
os cidadãos e o poder político local.
Nelson Dias sublinha que as reservas existem de parte a parte. “Não são
apenas os cidadãos que desconfiam da
classe política, muitas vezes esta também duvida dos cidadãos. Considera
que estes se organizam em grupos de
interesse e não são capazes de pensar
o bem coletivo”, afirma. A experiência
dos OP tem possibilitado a reconstrução da confiança, permitindo aos responsáveis políticos entenderem que os
cidadãos são capazes de lançar propostas que vão ao encontro do bem coletivo e levado os cidadãos a terem mais
confiança nos políticos. “Muitas vezes,
em reuniões públicas do OP vi pessoas
a entrarem na sala com uma proposta
e a meio do debate abandonam a sua
proposta para darem o seu voto a uma
proposta de outra pessoa, porque reconhecem que é mais urgente”, afirma o
presidente da In Loco.
Além da cada vez maior preponderância de OP deliberativos,
Portugal tem outras caraterísticas
que o tornam um caso particular
dentro da União Europeia. A não
partidarização dos OP é uma delas.
“Temos OP em câmaras de diferentes cores partidárias, sem grandes
distinções metodológicas, embora
seja evidente que o partido com mais
OP é o PS, seguido do PSD, de coligações PSD/CDS e outras com o PS em
coligação. Todas as experiências da
CDU desapareceram em 2008 e 2009
e agora estão a ser retomadas, como é
o caso de Palmela, mas são consultivas”, explica Nelson Dias. A não partidarização acaba por funcionar como um seguro de vida para os OP.
Em Espanha, um dos países onde
numa fase inicial houve uma maior
proliferação de OP, estes tinham uma
vertente muito ideológica, aparecendo muito ligados à Esquerda Unida. Depois das eleições municipais
de 2011, com a derrota da Esquerda
Unida em grande parte das autarquias, os OP quase desapareceram.
Outra caraterística destacada por
Nelson Dias é o facto de, em Portugal os OP nunca terem tido objetivos sociais. “Nunca foi o seu objetivo
fazer chegar mais recursos públicos, investimento autárquico
às zonas mais desfavorecidas dos municípios”, afirma o sociólogo. Contudo, em
alguns casos foram os próprios cidadãos
a revelar essas preocupações, como aconteceu há dois anos em Lisboa com a aprovação do projeto Lisboa Acessível, que
torna parte da Avenida Fontes Pereira
de Melo e da Avenida da República acessível a pessoas com mobilidade reduzida.
PUB
Cascais e Funchal: casos
de sucesso
Os OP nacionais distinguem-se ainda por um conjunto de boas práticas
que têm marcado a diferença. “Alguns
são referências no contexto internacional e o que tem maior destaque é
o de Cascais. É uma experiência que
vai iniciar agora o seu quinto ano, com
uma metodologia muito bem concebida e um número cada vez maior
de participantes”, refere Nelson Dias.
Em 2014 o OP de Cascais teve 41 mil votos na fase final (Carlos Carreiras, o atual
presidente da autarquia, foi eleito com
28 mil votos), cerca de 20% da população
de Cascais, batendo o recorde a nível eu-
ropeu e ficando apenas atrás de Paris.
A adesão em massa pode ser explicada
pelo facto de qualquer pessoa, mesmo
não residente em Cascais, poder participar na votação feita via SMS, mas o presidente da autarquia desvaloriza a participação externa: “É muito residual.”
Os níveis de participação da população manifestam-se num cada vez maior
empenho na qualidade das propostas,
bem como no esforço para as divulgar
em verdadeiras “campanhas eleitorais”.
A cada um dos proponentes é dada possibilidade de criar um vídeo, através do
qual a proposta é apresentada, que é depois divulgado nas redes sociais. “Há ainda quem crie campanhas nas redes sociais, quem distribua folhetos ou faça t-shirts. Há um grande envolvimento, o
que também é possível porque, quanto
mais não seja, faz funcionar como vizinhos pessoas que de outra maneira
não se relacionariam. Um dos males
da nossa sociedade é que temos condóminos e deixámos de ter vizinhos”,
diz Carlos Carreiras.
O OP de Cascais é dos mais ele-
vados do país – 1,5 milhões de euros,
o equivalente a 6% do orçamento municipal – e tem taxas elevadas de execução. Tudo isto valeu-lhe o prémio
do Observatório Internacional da
Democracia Participativa e a eleição, no ano passado, como Capital
Mundial da Democracia Participativa. “Foi algo que nos deu bastante
projeção. Muitos dos nossos técnicos
e alguns políticos têm sido convidados para explicarem a nossa experiência, tanto em países do Norte da Europa como em países da América do
Sul e em África”, refere o presidente
da câmara.
Por seu turno, o Funchal tem agora o
seu primeiro OP mas já começou a fazer
história. A última reunião bateu recordes nacionais com a presença de 505 pessoas – a média nacional para este tipo de
reunião ronda os 50 indivíduos. “Não estávamos à espera de tanta gente”, admite
Domingos Rodrigues, vereador da Câmara do Funchal, que tutela a Unidade
de Democracia Participativa e Cidadania
da autarquia, apesar de logo na primeira
43
2
a minha cidade
AUTARQUIAS
participar para confiar
P&R
Carlos Carreiras
Presidente da Câmara de Cascais
65
ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS
ativos em Portugal em 2014
€1,5 milhões
VALOR DO ORÇAMENTO
PARTICIPATIVO de Cascais,
um case study mundial
44
reunião terem comparecido 120 pessoas.
A explicação para uma tão grande adesão pode estar no modelo de OP adotado.
Um OP deliberativo, totalmente analógico e aberto aos jovens, que podem
participar se tiverem 15 anos ou mais.
“O OP só faz sentido se for deliberativo. Adotámos um modelo o mais tradicional possível. Optámos pelo analógico não só para fomentar a participação e a votação presencial mas também
para uma maior credibilização. Além
disso, mais do que números – de participantes ou votantes – é importante iniciar um processo participativo efetivo
no qual os cidadãos discutem livremente e frente a frente as suas propostas e
opções”, afirma Domingos Rodrigues,
para quem este modelo garante ainda
a igualdade de oportunidades a todas as
faixas etárias.
A abertura a uma participação
efetiva dos jovens rapidamente deu
frutos. Foi deles a primeira proposta
aprovada para votação: a construção
do Skatepark do Funchal, com um orçamento previsto de 100 mil euros – o
montante máximo que pode ser atri-
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
buído a uma proposta. Os 300 mil euros alocados ao OP representam 2,5%
do orçamento camarário.
Ao longo de todo o processo, os funchalenses apresentaram um total de
248 propostas, das quais 42 foram para análise técnica, sendo 27 aprovadas para ir a votação, que terminou a
20 de março. Nos dez postos de votação fixos criados pela cidade e no autocarro que percorreu os locais menos
acessíveis e funcionou como 11º posto
de voto, os funchalenses escolheram entre propostas tão diversas como a criação de dois núcleos de proteção civil,
a plantação de um bosque alimentar ou
a garantia de acessibilidade ao mar por
parte dos cidadãos com necessidades
motoras especiais.
Gestão do dia-a-dia
Um exemplo interessante da resolução de problemas pelos OP aconteceu em São Domingos de Rana. “Há
dois anos, um dos projetos aprovados
no OP de Cascais foi a construção de
um passeio. O passeio era reclamado
há mais de 30 anos pela comunidade
porque permitiria a ligação a pé entre uma paragem de autocarro e uma
escola – os alunos tinham de passar
pela berma da estrada e os atropelamentos eram recorrentes. O OP permitiu que as pessoas que defendiam
esse projeto se organizassem e promovessem reuniões com o Instituto
de Estradas, a Câmara Municipal, a
Junta de Freguesia, e conseguissem
um consenso para que a obra fosse
viabilizada”, conta Nelson Dias.
Que balanço faz
da experiência
do OP?
É um balanço
muito positivo
os técnicos da
câmara, que
estão muito
envolvidos no
OP, tiveram de
que vem ao
encontro dos
nossos objetivos.
Há um
afastamento
cada vez maior
por parte dos
cidadãos em
relação à política
e aos políticos.
Isso cruzado
com níveis
de falta de
confiança cada
vez maiores, leva
à necessidade de
se promoverem
mecanismos
que aproximem
o cidadão
da decisão
e reforcem
os níveis de
confiança.
sair da sua zona
de conforto.
Hoje, com tantas
leis, o cidadão é
imediatamente
abafado com a
invocação de
um decreto-lei.
Aqui isso não
acontece. No OP
os técnicos têm
de dar a cara e
envolver-se com
as pessoas.
E, a um terceiro
nível, do cidadão,
que não está
habituado a este
poder.
Esperava esta
adesão?
Não tinha
qualquer tipo
de expetativa.
Por um lado,
os próprios
políticos não
estão habituados
a abrir mão
do poder, num
segundo nível
Tem havido
evolução no OP?
Os projetos têm
vindo sempre
a melhorar e
o OP tem-se
espalhado por
todo o concelho.
Mas é o número
de cidadãos que
participa que é
significativo:
2 408 pessoas
na última edição
do OP que
formularam 811
propostas.
PUB
2
a minha cidade
PATRIMÓNIO
CALÇADA
TAPEÇARIAS
DE PEDRA
A CALÇADA PORTUGUESA É UM SÍMBOLO
NACIONAL. PODEMOS NÃO REPARAR NOS
DESENHOS QUE VAMOS PISANDO, MAS O
CALCÁRIO BRANCO E PRETO QUE FAZ DE
TAPETE NAS CIDADES CONTA HISTÓRIAS DE
UM TRABALHO QUE SE CONFUNDE COM ARTE
46
por miguel ferreira da silva
fotografia artur
As cartas régias de D. Manuel I,
entre 1498 e 1500, promulgaram
um calcetamento para evitar que o
cortejo de aniversário do rei acabasse
manchado de lama. A solução passou por blocos de granito do Porto,
material capaz de suportar o peso
do Ganga, um rinoceronte branco
ornamentado com riquezas do
Oriente, a grande atração da festividade. Era o único dia do ano em que
o monarca se mostrava ao povo e a
manifestação da sua majestade era
demonstrada através de um rinoceronte branco e uma calçada. Daí a
expressão “quando o rei faz anos”.
Passaram quase 350 anos até a calçada portuguesa assumir a forma como a conhecemos, pela mão de Eusébio Pinheiro Furtado, militar e governador do castelo de São Jorge entre
1840 e 1846. Este tenente general decidiu pavimentar a fortaleza lisboeta
com pedras de calcário branco, cortadas a espaços por outras de basalto
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
negro. Estas pedras foram colocadas
por presidiários a quem chamaram
“grilhetas”. Reza a história que a cidade, em romaria, subiu à sua colina fortificada para admirar o mosaico que os cativos tinham assentado.
A Câmara gostou do trabalho e replicou a ideia no Rossio, em 1848.
Desta vez utilizando calcário “vidraço”, branco e negro, num desenho inspirado nos Descobrimentos, ao qual
foi dado o nome de Mar Largo por representar a curva da rota marítima
que permitiu aos heróis do mar ultrapassarem o Cabo das Tormentas
e encontrar o Brasil.
Durante os primeiros anos do
século xx, a calçada foi cobrindo
Lisboa até ao “Marquês de Pombal”.
Se Lisboa passava despercebida às
luzes da ribalta mundial da primeira metade do século xx, o calçadão
de Copacabana deu-se a conhecer
ao mundo em 1942 com o filme
Saludos Amigos, de Walt Disney, quando
Zé Carioca e o pato Donald dançaram
a “Aguarela do Brasil” com Maria do
Carmo Miranda, uma portuguesa de
Marco de Canaveses conhecida para
sempre como Carmen Miranda.
Poesia nas ruas
Ernesto Matos, Associado do
Montepio, é investigador, fotógrafo e designer, e a sua obra constitui
uma das mais completas recolhas fotográficas de calçada portuguesa em
Portugal e no mundo. “Calçada portuguesa é comunicação”, adianta.
“Para mim são obras de arte disponíveis 24 horas por dia”, refere, destacando a minúcia do trabalho executado pelos calceteiros. Ernesto
Matos relembra a expressão dos mestres calceteiros, que gabando-se do
seu trabalho diziam que em “cada
pedra que se encaixa não cabe nem
uma mortalha de tabaco”. No entanto,
o investigador critica a generalidade
dos trabalhos realizados hoje em dia.
“Já não se faz o emparelhar para encaixar”, alertando para a perda de qualidade que muitos pavimentos têm sofrido.
Adianta várias causas, desde o elevado custo e morosidade da colocação
da calçada portuguesa a motivos sociais. “É um trabalho muito duro
e ninguém quer um filho a fazer
calçada portuguesa”, conclui.
Hoje, como nos primórdios, os calceteiros são homens e mulheres que permanecem anónimos. Poucos são os que
notam as suas assinaturas, identidades
de um labor muitas vezes disfarçado no
padrão da empreitada.
Levantados do chão
Nos Olivais, em Lisboa, encontra-se a Quinta Conde dos Arcos.
O seu espaço funciona como um refúgio no meio da cidade, tal a calma que se sente na sua propriedade,
não obstante estar no centro de uma
das maiores freguesias lisboetas.
Ali fica a Escola de Calceteiros da
Câmara Municipal de Lisboa, que
ministra o curso de formação profissional nesta área desde 1986. Luísa Dornelas, responsável pela formação da
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
47
2
a minha cidade
PATRIMÓNIO
calçada
48
jj
ELEVAR
AO CUBO
A partir de uma rocha
com 15 toneladas,
procede-se à sua
desmultiplicação em
calçada.
A tecnologia envolve
guilhos, palmetas,
maços, martelos e o
saber fazer de quem
constrói ruas a partir
de uma montanha
Câmara Municipal de Lisboa (CML), refere que “o foco do curso é o munícipe”.
O curso tem 1 800 horas e dá equivalência de qualificação escolar
e profissional. Nesse ano e meio, além
das disciplinas curriculares, os alunos aprendem o que são rochas ornamentais, a história da calçada,
a técnica e algum treino prático.
Mas também aulas de desenho, medições e orçamentos. A ideia é “promover
a criação de autonomia e a perceção de
direitos e deveres na sociedade” junto
dos formandos, refere Luísa Dornelas.
A maioria dos alunos são cidadãos
com baixa qualificação, denotando
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
geralmente alguma “debilidade financeira e social”. Sabe que são pessoas
que não vão tornar-se empresários
de um dia para o outro, mas refere que
este é um mercado no qual “os habituais empregadores (estatais) terão de
se reinventar”, reconhecendo que o
futuro da calçada passa pelo “setor
privado ao qual caberá o interesse em
reformular” este trabalho com melhores rendimentos. Jorge Duarte, formado na Escola de Calceteiros, já executou vários trabalhos, no
Brasil, Venezuela, Holanda e Espanha, recordando-se de um trabalho seu em calçada executado no
interior do edifício do Montepio,
na Rua Áurea. Hoje é mestre calceteiro e formador da Escola de Calceteiros.
Montanhas de pedra
Na origem da calçada está uma montanha que os homens da pedra conhecem como as próprias mãos.
Uma máquina de perfuração separa
um bloco calcário com mais de 15 toneladas. Um homem sobe para o monólito e crava três guilhos com aurifícia precisão. Três pancadas com um malho e a
rocha abre pelo veio como uma fatia de
bolo. A visita à pedreira é feita por Celso Gonçalves, criador da marca Roc2c e
PUB
jj
APRENDER UMA ARTE
São 1 800 horas, ou ano e meio
de formação, para os aspirantes
a calceteiros. O curso é realizado
na Escola de Calceteiros da
Câmara Municipal de Lisboa,
na Quinta Conde dos Arcos, nos
Olivais, e dá equivalência de
qualificação escolar e profissional
trução assinalada pelo evento que foi a
Expo ‘98. Luísa Dornelas reconhece “o
boom que a Expo ‘98 significou para a
calçada portuguesa”, nomeadamente
no plano artístico, sendo disso exemplos o Alto Mar de Fernando Conduto,
Monstros Marinhos, de Pedro Proença,
Calçada do Mar Português, de Xana e
Caminho de Água, de Rigo, todos pavimentos situados no Parque das Nações.
Luísa Dornelas atenta que “a execução
técnica (da calçada) é muito importante”, reforçando a importância de “incorporar o valor estético com uma boa execução e teatralidade”. Celso Gonçalves
relembra que o mercado exigia “calçada portuguesa e o brio profissional ficou para segundo plano”.
especialista no comércio e aplicação de
pavimentos em pedra natural e calçada
portuguesa. “O que me fascinou foram
as máquinas da pedreira”, conta Celso
Gonçalves. Ex-jogador do Hóquei Clube de Turquel, iniciou a atividade em
1999. “Nessa altura havia 300 pedreiras a funcionar”, entre Barreirinhas e
Pé de Pedreira, localidades da freguesia
de Alcanede, encrustadas no Maciço
Calcário Estremenho da Serra de Aire
e Candeeiros. “Hoje a exploração está
reduzida a 30 ou 40 pedreiras”, comparando com a “época de ouro” da cons-
Calçada a referendo
No início de março, a junta de freguesia de Campolide, em Lisboa, procedeu a um referendo aos seus moradores sobre a mudança, nas suas
zonas históricas, de calçada portuguesa para outro pavimento.
As escolhas eram “calçada, tradicional à semelhança do que já existe” ou “outro tipo de pavimento contínuo, mais moderno e seguro”.
Apesar de só terem votado 350 moradores de 15 000 recenseados, ganhou o
“pavimento mais moderno e seguro”
com 61,5%. André Couto, presidente da
junta de freguesia de Campolide, decidiu proceder à consulta popular por
considerar que, em certas zonas, a tradição se sobrepunha à segurança. Luísa Dornelas afirma que “a segurança é
sempre uma prioridade”, adiantando
que “não choca se nalgumas áreas mais
perigosas se substitua a calçada por
2
a minha cidade
artesãos e artistas”. Luísa Dornelas partilha esta visão de alargamento do uso
da calçada “a uma utilização vertical”.
PATRIMÓNIO
calçada
^ O principal
núcleo da sua
exploração fica
na Serra de Aire
e Candeeiros,
onde se encontram
calcários com
várias tonalidades,
desde brancos a
cinzentos e negros
^ O tipo
de calcário
mais utilizado
na calçada
portuguesa
é o vidraço
^ As explorações de
calçada portuguesa estão
implantadas em flanco
de encosta suave, com
escavações que podem
atingir entre três a dez
metros de profundidade
^ A maior parte
da extração continua
a ser artesanal, ainda
que apoiada por alguns
meios mecânicos como
retroescavadoras ou
martelos pneumáticos
50
outro pavimento”. No entanto, prefere
realçar as qualidades da calçada portuguesa: “Confere uma imagem única a
Lisboa e é responsável pela intensidade de luz da cidade.” Além disso, são
“caminhos de um material com 90% de
reaproveitamento”, referindo ainda que
os “resíduos por um caminho levantado são menores” promovendo a “reutilização de materiais”. Por outro lado,
Luísa Dornelas reforça que “as cheias
em Lisboa são menos graves porque te-
mos calçada portuguesa”, uma vez que
“os espaços entre as pedras permitem
a drenagem e o escoamento” das águas.
Ernesto Matos afirma mesmo que
“a calçada portuguesa é um material
reciclável”, uma vez que a sua transformação “não sofre processos de industrialização”. Por outro lado, o investigador refere que a calçada portuguesa pode reinventar-se também na utilização,
como por exemplo ”fazer calçada nas
paredes, dando novas oportunidades a
SABER FAZER
Processo de extração de calçada
O processo é comum
em todas as pedreiras.
Primeiro procede-se
ao desmonte da rocha.
Este processo pode
envolver uma máquina
giratória ou explosivos,
como a pólvora negra.
De seguida recorre-se
ao martelo pneumático
para furar a rocha,
inserindo-se o guilho e
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
as palmetas.
Com um maço de seis
a oito quilos percute-se
o guilho até fraturar
a rocha. Depois, aplica-se a marreta para
reduzir o restante
a paralelepípedos com
40 por 20 centímetros.
Esta medida
permite minimizar o
desperdício.
Essas pedras são
então “traçadas“
com um pequeno
martelo, dando
origem a pedras
com as dimensões
de calçada portuguesa.
As pedras são
armazenadas em
estaleiro sendo
posteriormente
transportadas a granel.
Farol para o mercado
Celso Gonçalves confessa que “o facto de ter um site e de ter o trabalho
exposto é uma boa forma de angariar novos clientes”. Reforça a “confiança numa equipa com dez anos de
experiência”. Estar perto da produção da matéria-prima tem vantagem no controlo de qualidade. Neste
momento “tenho o ciclo fechado”,
afirma. “Faço o projeto, peço a pedra,
contrato a mão-de-obra e executo no
local”, conclui. Dos seus trabalhos
em calçada destaca os 22 000 m2 na
Avenida Dom José Alves Correia da
Silva, junto ao Santuário de Fátima,
e as parcerias com gabinetes de arquitetura de David Chipperfield, Gonçalo
Byrne e Siza Vieira no empreendimento de luxo Bom Sucesso, em Óbidos.
O processo industrial da transformação do calcário “nada tem a ver com
a calçada portuguesa”, diz Celso Gonçalves. “Onde nós temos uma pedra
com 15 toneladas, ali eles trabalham
com centenas.” A calçada portuguesa “continua a ser um trabalho artesanal” que recorre a “pequenas pedreiras onde se trabalha individualmente”.
As pedreiras nesta região, explica, “são
trabalhadas normalmente por uma
equipa de dois indivíduos com as máquinas”. Celso afirma que “as empresas
de exploração pagam uma renda à junta ou aos baldios”. Neste caso pertence
ao Conselho Diretivo dos Baldios, que
engloba as localidades de Valverde, Pé
da Pedreira, Barreirinhas e Murteira.
Apesar de haver muita procura,
Celso diz que não se tem assistido a
uma renovação dos trabalhadores das
pedreiras. “Há dez anos que não entra
ninguém novo”, refere, sem esquecer
que é uma profissão de desgaste e com
evidentes riscos associados. “Valorizar a
profissão” e “um plano de recuperação
das pedreiras” são medidas que considera urgentes para que não se perca
a primeira etapa das ruas portuguesas.
A MINHA ECONOMIA
PRODUTOS FINANCEIROS,
SUGESTÕES E
EMPREENDEDORISMO
página 52
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Conheça quatro startups
que fazem do verão
a sua estação principal,
mas que já afirmaram
o seu valor na nova vaga
de negócios de comércio
e turismo fora de época
Há mais de dois milhões
de portugueses a viver
fora de Portugal.
Como é que se alimenta
uma relação à distância
entre o banco e os
residentes no estrangeiro?
A moda é uma questão
de gosto e os gostos
portugueses não se
discutem, exportam-se,
como mostram algumas
empresas deste setor que
estão a fazer a diferença
NOVAS
EMPRESAS
FINANÇAS
PESSOAIS
NEGÓCIO
INTERNACIONAL
3
a minha economia
EMPREENDEDORISMO
NEGÓCIOS
STARTUPS
DE VERÃO
52
COM A CHEGADA DO
CALOR, O TRABALHO DOS
EMPREENDEDORES QUE
TENTAM IMPULSIONAR
NEGÓCIOS RELACIONADOS
COM O AR LIVRE OU
VOCACIONADOS PARA
O TURISMO AUMENTA
DE FORMA VERTIGINOSA.
PARA MUITAS STARTUPS
ESTA É A ÉPOCA ALTA
por ana sofia calaça
fotografia artur
No verão é tempo de empreender
e nos negócios ligados ao turismo,
as startups desdobram-se em esforços
para vencer no mercado. Com os
consumidores ávidos de novidades,
a capacidade de inovar é um segredo
para qualquer empresa recém-criada. Para os empreendedores que
“descobrem” negócios que permitem
tirar proveito do melhor que esta
época tem para oferecer, este é um
momento de oportunidade.
É o caso de Mónica Pena Ferreira
que lançou, em junho de 2013, a Monica Lisbon Rentals, uma imobiliária
que se dedica ao arrendamento turístico nos bairros históricos da capital.
Os apartamentos, batizados com nomes que marcam Portugal – Fado, Guitarra, Tejo –, localizam-se na encosta
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
do Castelo, com vista para o rio, e são
muito procurados por famílias atraídas pelo charme desta zona da cidade.
Na Startup Lisboa, uma incubadora de empresas onde esta jovem imobiliária tem sede, a empreendedora
não tem mãos a medir com o trabalho
no verão. “Lisboa está na moda e prevejo que o turismo vai continuar a expandir-se”, refere a jovem empresária.
A receita para que o seu negócio vá
abrindo ainda mais portas está na ponta da língua: “Trabalhar com confiança
e otimismo é essencial.”
São muitos os empreendedores que
estão a apanhar a nova onda de crescimento do turismo em Portugal. As receitas turísticas aumentaram 12% em
2014 em comparação com o ano anterior, de acordo com os mais recentes dados do Banco de Portugal, e o governo
reforça a mensagem lembrando que “este foi o melhor ano para o turismo” no
país. O recorde do setor estende-se também às dormidas e lucros da hotelaria,
que no ano passado cresceram, respetivamente, 11% e 12,8%, segundo o Instituto Nacional de Estatística.
Mas há mais dados que mostram a
tendência do turismo nacional e a dependência do estrangeiro. O estudo
“Desafios do Turismo em Portugal
2014”, da consultora PwC, indica que
“desde junho de 2010 as dormidas de
não residentes têm apresentado taxas de
crescimento positivas face ao mês homólogo, salvo as exceções verificadas no final de 2011 e maio de 2013, com especial
impacto em Lisboa, Algarve e Madeira, cuja dependência do turismo externo se situa entre os 75% em Lisboa e no
Algarve, e os 90% na Madeira”.
^ BERÇO
DO NEGÓCIO
A Startup Lisboa,
fundada com o apoio
do Montepio, apoia-se no dinamismo
da capital para atrair
clientes e investimento.
Nesta incubadora
já nasceram mais de
200 startups
que resultaram
na criação de cerca
de 700 postos
de trabalho
Investir no turismo e navegar
com vento favorável
A inovação e o empreendorismo são
ingredientes-chave para projetar a
imagem de Portugal como um destino
turístico diferenciado e atrativo.
Quem o lembra é José Diogo Madeira: “O turismo é uma área crucial para
o crescimento da economia portuguesa”, realça um dos fundadores do
Jornal de Negócios e que atualmente
lidera a Ezimute, uma plataforma
eletrónica que é uma fusão entre um
guia turístico e um espaço de reservas
on-line de tours, atrações e restaurantes.
A relação entre qualidade e preço é um
dos fatores que tem atraído turistas para
terras portuguesas. José Diogo Madeira explica que a aposta das companhias
aéreas nos voos low cost para Lisboa contribuiu para o crescimento do turismo
e considera que faz todo o sentido investir em força neste setor. “É mais fácil
aproveitar um mercado que esteja em
crescimento. O turismo é muito dinâmico em Portugal. É uma área que está a
crescer e no qual o país tem vantagens
competitivas. Navegar com vento favorável ajuda sempre”, sublinha.
Os dois empreendedores lembram
os ingleses, alemães ou russos que andam de t-shirt e calções, em pleno inverno, nas ruas de Lisboa. “O clima
agradável é um cartão-de-visita poderoso”, sublinha Mónica Pena Ferreira, defendendo que cada vez mais as
pessoas marcam as estadas de acordo
com as previsões meteorológicas e surgem muitas reservas de última hora,
mesmo na época baixa.
Um dos desafios das “startups de
verão” é superar com sucesso o obstáculo da sazonalidade, embora os empreendedores revelem que existe agora um
alargamento da chamada época alta.
“O verão é significado de muitos
turistas, mas a ocupação elevada estende-se entre os meses de março e outubro”, salienta a criadora da Monica
Lisbon Rentals. Também José Diogo
Madeira, da Ezimute, afirma que não
existe uma temporada baixa e alta na
capital, sublinhando que este será o melhor ano turístico de sempre em Lisboa.
Mas o que fazer nos dias de chuva?
Mónica Pena Ferreira conhece bem
a resposta: “Os portugueses procuram-nos nos períodos de inverno, o que é
bom para enfrentar a época baixa.
São pessoas que estão em projetos profissionais em Lisboa”, explica.
Quem quer fazer um piquenique?
Se verão é significado de bom tempo, natureza e refeições ao ar livre,
então é sinónimo de piqueniques.
A marca Anita Picnic, startup que
aposta em cestos e outros acessórios
totalmente feitos à mão, é um exemplo
de empreendedorismo que aproveita
o conceito de piquenique mas não se
rende ao clima.
“As pessoas têm a ideia de que
o cesto de piquenique só pode usar-se
P&R
João Vasconcelos
Diretor executivo
da Startup Lisboa
Que importância assume
a Startup Lisboa no
lançamento de novas
empresas e no estímulo
ao empreendedorismo
na capital?
Desde a sua abertura, a
Startup Lisboa já apoiou
mais de 200 startups e
promoveu a criação de mais
de 700 postos de trabalho.
O nosso papel é ajudar os
empreendedores a atraírem
clientes, investimento e a
desenvolverem modelos
de negócio escaláveis,
com base na associação
com mentores e parceiros
estratégicos.
Qual o papel das startups
de verão numa cidade
como Lisboa, um ponto
de atração de turistas
a nível mundial?
O turismo é um dos setores
que privilegiamos na
Startup Lisboa e estamos
sempre abertos a acolher
bons projetos nesta área,
de base tecnológica
e não só. O número de
visitantes que Lisboa
tem acolhido nos últimos
anos comprova que
Lisboa apresenta várias
janelas de oportunidade
neste setor para muitos
empreendedores lançarem
os seus negócios.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
53
3
a minha economia
EMPREENDEDORISMO
startups de verão
54
no verão, mas existem imensas formas
de surpreender alguém. O piquenique
pode ser o que se quiser. Depende da
imaginação. Já fui, por exemplo, entregar de bicicleta um cesto a casa de
uns namorados”, explica a designer de
moda Carla Cantante que, em conjunto com o diretor criativo Pedro Pires,
se lançou no mundo dos negócios.
“Há uns anos não havia ninguém
nos parques e jardins, agora estão
cheios. As principais alterações relacionam-se com o que está a acontecer
no país e no mundo. As pessoas têm
menos dinheiro, e quando não querem
fazer uma refeição fora de casa, vão
para o jardim e fazem um piquenique”,
acrescenta esta jovem, que tem como
meta expandir o negócio internacionalmente e já conseguiu clientes na
Alemanha, Grã-Bretanha e Argentina.
A exportação é uma das novas
tendências das startups que nascem
em Portugal. O número de empresas
recém-criadas que exporta no primeiro ano de vida aumentou de 8%, em
2007, para os 10%, em 2013, segundo
o “Estudo do Empreendedorismo em
Portugal: 2007-2014”, da consultora Informa D&B. Destas, metade do
volume de negócios advém das exportações, tendo atingindo os 67%,
a percentagem mais alta desde 2007.
O estudo refere ainda que no quinto
ano de atividade a taxa das empresas
exportadoras duplica.
Ideias originais para voar
mais alto
A multinacional AirHelp, com sede
na Polónia, lançou os dados em 2013
e apostou numa ideia à escala global:
ajudar os clientes das companhias
áreas a reclamarem e receberem
indemnizações por causa de problemas nos voos (atrasos, cancelamentos
ou overbooking), um negócio com mais
lucro no verão, quando o tráfego aéreo
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
aumenta devido aos períodos de férias.
Esta startup, que conseguiu captar
investidores em Silicon Valley, conta
com uma equipa de 50 jovens americanos, polacos, dinamarqueses, finlandeses, suecos, alemães, espanhóis e italianos espalhados por vários cantos do
planeta. A empresa tem como objetivo
ajudar os passageiros aéreos a fazerem
valer os seus direitos. Por exemplo,
se chegarem a um destino com um
atraso superior a três horas podem
pedir uma indemnização de 600 euros por pessoa, o que para uma família,
constituída por um casal e duas crianças, equivale a 2 400 euros.
Maria Tavares, 25 anos, licen­
ciada em Economia e com um
mestrado em Finanças pela
Universidade Nova de Lisboa, é a
country manager da AirHelp em
Portugal e está agora a expandir
a empresa para o Brasil. “Ser empreendedor está na moda, mas só vão
sobreviver os que têm ideias e acreditam nelas. Na Startup Lisboa, onde
tenho a minha base, há pessoas com
elevadas qualificações que estão
a lutar com todas as forças por uma
oportunidade”, defende, acrescentando que “o sonho move montanhas”.
1
1 José Diogo Madeira, responsável
pelo projeto Ezimute
2 Carla Cantante, fundadora da marca
AnitaPicnic
3 Maria Tavares, country manager
da AirHelp em Portugal
4 Mónica Pena Ferreira, fundadora
da imobiliária Monica Lisbon Rentals
Ezimute
NASCIMENTO Este guia
turístico on-line surgiu
no final do primeiro
semestre de 2014 para
criar um modelo de
negócio que serve,
em simultâneo, os
operadores turísticos
e os turistas que visitam
Lisboa. Na plataforma
digital é possível fazer
reservas para tours,
atrações turísticas
e restaurantes.
“O Ezimute premeia os
utilizadores e também
quem o recomenda.”
LEMA “Para quem
gosta de viajar…”
OBJETIVOS Depois
de ter chegado a Lisboa,
Porto, Alentejo e Algarve,
o objetivo é apostar
na internacionalização.
Espanha será o próximo
destino.
DESAFIOS A principal
dificuldade foi conseguir
colocar a funcionar
uma rede de parceiros,
denominados
embaixadores, embora
neste momento a adesão
seja tão grande que são
os próprios operadores
turísticos que pedem para
participar na plataforma
digital, explica o
responsável pelo projeto,
José Diogo Madeira.
Cada embaixador tem
um código, que permite
um desconto de 3%
nas reservas feitas
no Ezimute. Destas,
os parceiros ganham
4% nas tours ou atrações
e 50 cêntimos por pessoa
sentada num restaurante.
O Ezimute oferece mapas
turísticos da cidade
com o código de cada
embaixador, para serem
distribuídos aos amigos
e turistas.
PAPEL DA STARTUP
“Ter um espaço próximo
do centro da cidade é
o ideal devido à natureza
da nossa atividade.
Cruzar e trocar
experiências com outras
startups também é
muito importante porque
permite o acesso a uma
série de conhecimentos
que se estivéssemos
isolados num escritório
não conseguiríamos.”
AirHelp
NASCIMENTO Os criadores
da AirHelp são da Dinamarca,
onde esta startup nasceu em 2013,
mas entretanto a sede mudou para
Gdansk, na Polónia, com o objetivo
de aproveitar os recursos humanos
qualificados e o custo de vida mais
baixo neste país. A ideia é ajudar os
clientes das companhias aéreas a
reclamarem por causa de atrasos nos
voos, cancelamentos ou overbooking.
O passageiro terá que preencher um
formulário on-line com os pormenores
do voo e a equipa da AirHelp entra
de seguida em contacto com a
companhia e encarrega-se de todo
o processo, até aos tribunais, se for
necessário. Os serviços da AirHelp
funcionam para voos a partir
da Europa ou para a Europa.
LEMA “Não ganha, não paga.”
O serviço da AirHelp é totalmente
gratuito. Só no caso de o cliente ser
indemnizado é que será cobrada uma
taxa de 25% sobre o valor
da indemnização.
OBJETIVOS Recuperar o dinheiro
dos clientes.
DESAFIOS “É preciso gerir
expetativas. Temos um trabalho
inglório, que é ajudar pessoas
zangadas com companhias áreas,
o que nem sempre é fácil”, explica
Maria Tavares, country manager
da AirHelp em Portugal.
PAPEL DA STARTUP LISBOA
“A Startup Lisboa é identificada como
uma marca de sucesso, dá-nos uma
exposição e um selo de qualidade
maiores do que se estivéssemos
sozinhos”, refere.
3
2
Anita Picnic
NASCIMENTO A marca foi
lançada em maio de 2014
e surgiu de uma necessidade
pessoal da fundadora, Carla Cantante.
“Para festejar o aniversário do meu
filho, na primavera, queria organizar
um piquenique, mas não existiam
acessórios que me fascinassem.
E pensei: Porque não criar uma
marca de objetos de piquenique
que vá ao encontro do meu gosto
e das necessidades que existem?”,
recorda.
LEMA “Celebrar a vida ao ar livre.”
OBJETIVOS Crescer ao nível das
exportações e ver reconhecido
o trabalho dos artesãos da zona
da Guarda. “Cada peça demora
dois dias a ser concluída, o que tem
um valor incontornável, é quase
uma obra de arte”, explica.
DESAFIOS O maior obstáculo
é encontrar artesãos que tenham
vontade de fazer algo diferente.
“São pessoas de muita idade,
com uma noção de tempo e trabalho
diferente”, realça a designer.
PAPEL DA STARTUP LISBOA
“Esta incubadora de empresas é
importante para tirar algumas dúvidas,
mas nunca fazem o trabalho por nós.
Cada empreendedor tem que
desbravar o seu próprio caminho”,
explica Carla Cantante.
4
Monica Lisbon Rentals
NASCIMENTO A ideia
para esta imobiliária
de arrendamentos
turísticos surgiu de
forma espontânea,
aproveitando os edifícios
de que as fundadoras
eram proprietárias
no centro de Lisboa.
“Os estrangeiros
vinham bater à porta
para perguntar se
arrendávamos quartos
ou apartamentos
e, quando nos
apercebemos desta
situação, começámos
a remodelar os imóveis
para dar resposta
ao mercado”, explica
Mónica Pena Ferreira
que abriu esta startup
em conjunto com a mãe,
Isabel Sá Ferreira.
LEMA “Em Lisboa sejam
lisboetas.”
OBJETIVOS Manter
a qualidade dos
apartamentos.
DESAFIOS O grande
desafio é corresponder
às expetativas dos
clientes e o maior
obstáculo relaciona-se
com o crescente número
de alojamentos locais
que tem aparecido
em Lisboa.
PAPEL DA STARTUP
LISBOA “A Startup
Lisboa é um modelo
de sucesso que dá aos
seus incubados muita
segurança porque
atua ao nível do
networking de um modo
exímio”, defende Mónica
Pena Ferreira.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
55
3
a minha economia
FINANÇAS PESSOAIS
EMIGRAÇÃO
LONGE DA VISTA,
PERTO DA
MINHA CONTA
56
OS MAIS DE DOIS MILHÕES
DE PORTUGUESES
ESPALHADOS PELO
MUNDO PODEM REALIZAR
OPERAÇÕES BANCÁRIAS
COMO SE ESTIVESSEM
EM TERRITÓRIO
NACIONAL, COM TODA
A FACILIDADE,
COMODIDADE
E SEGURANÇA.
SAIBA COMO ESTAR
PERTO DO SEU BANCO
MESMO LONGE
DE PORTUGAL
por cristina almeida
EDUCAÇÃO
INFORMAÇÃO
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MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Rita Ferreira tem 28 anos e é
jornalista. Em setembro de 2012
comprou um bilhete de ida e volta,
fez as malas e partiu rumo ao Brasil.
Na conta bancária tinha o saldo
suficiente para se sustentar durante
três meses, mas na bagagem
carregava a expetativa de encontrar
melhores condições de emprego.
Em apenas duas semanas, Rita
recebeu uma proposta de trabalho.
Hoje é assessora do conselho de
administração de uma empresa
portuguesa com atividade no
Brasil, escreve artigos para várias
publicações e é correspondente
da Euronews, em São Paulo
O testemunho de Rita inclui-se no
retrato da nova vaga de emigração
portuguesa: mais jovem e qualificada do que no passado. Entre 2007 e
2012 saíram do País, em média, 80
mil pessoas por ano e os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística revelam que mais de 128 mil
portugueses deixaram Portugal em
2013. Os jovens entre os 20 e os 29
anos representaram 41,5% das saídas.
Estima-se que há no mundo cerca de 2,3 milhões de portugueses
emigrados e Portugal é mesmo o segundo país da União Europeia com
mais emigrantes em percentagem
da população (20,8%), de acordo com
os dados do relatório governamental
sobre emigração, da autoria da Secretaria de Estado das Comunidades
Portuguesas.
A dimensão da diáspora mais do
que justifica a aposta do setor financeiro na criação, ao longo de várias
décadas, de produtos e serviços direcionados exclusivamente para o segmento de residentes no estrangeiro.
A evolução da oferta bancária tem
acompanhado as alterações do fenómeno da emigração e está hoje totalmente adaptada aos novos perfis migratórios.
Um espaço único
A relação dos portugueses com a
banca é imune à mobilidade geográfica. O homebanking anula as fronteiras da gestão bancária e os escritórios de representação espalhados
pelo mundo são fundamentais para
garantir a proximidade e o acompanhamento especializado e permanente aos portugueses não residentes em Portugal.
Gerir a conta corrente, fazer pagamentos ou transferências, enviar
ou receber dinheiro, valorizar as poupanças e incrementar os investimentos, realizar projetos com acesso a financiamento e subscrever soluções
de proteção são opções acessíveis a
todos os portugueses que vivem, trabalham ou estudam no exterior.
Cinco dúvidas
frequentes
1 Como posso movimentar a minha
conta a partir do exterior?
Pode movimentar a sua conta com
toda a segurança e comodidade a
partir do Montepio24. Os serviços
Net24, Netmóvel24 e Phone24
permitem realizar todas as operações
e esclarecer qualquer questão.
Pode ainda dirigir-se a um dos
escritórios de representação do
Montepio na Alemanha, Bélgica,
Luxemburgo, Suíça, França, Estados
Unidos e Canadá.
2 Que transações podem
ser realizadas?
Pode realizar todas as transferências,
pagamentos e operações de gestão
diária, acompanhar as diversas
soluções de poupança e investimento,
realizar operações internacionais,
como transferências ou reservas
de moeda, e verificar contratos
de crédito ou dar instruções
para operações na bolsa.
3 Posso abrir um depósito
na moeda do país onde resido?
Sim, o Montepio disponibiliza
depósitos à ordem e a prazo em
moeda estrangeira, como franco
suíço, dólar americano e libra inglesa,
entre outras. As taxas de juro variam
em função da moeda, prazo
e montante. Desta forma, evita
os riscos cambiais se pretender
efetuar pagamentos em moeda
estrangeira.
4 Posso obter financiamento
para comprar casa em Portugal?
Sim, pode pedir um crédito para
realizar um investimento em
imobiliário. No Portal Montepio
Imóveis encontra uma vasta carteira
de imóveis para residência de férias,
para o seu regresso ou para viver
na reforma. Conheça as condições
especiais de financiamento
e as vantagens exclusivas.
5 Qual a linha de contacto?
A partir do estrangeiro ligue
+351 21 724 16 24.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
57
3
a minha economia
FINANÇAS PESSOAIS
emigração
Catarina Marques
Relações públicas numa ONG
em Dublin
58
“Continuo a
ter uma conta
bancária
em Portugal
e utilizo-a
maioritariamente
para efetuar
transações
bancárias com
familiares
e amigos.
Contudo,
também tenho
uma conta
bancária na
Irlanda. Entre
as minhas
operações
mais frequentes
estão as
transferências
para Portugal
e os
pagamentos
para algumas
contas de débito
direto que estão
associadas
à conta
portuguesa.
A distância
física não
alterou a minha
relação com
a banca.”
Além das contas que podem abrir
em Portugal, como qualquer cidadão
residente em território nacional, “os
emigrantes têm a possibilidade de
ser titulares de uma ou várias contas
especiais denominadas contas emigrante”, lê-se na página oficial da Secretaria de Estado das Comunidades
Portuguesas.
A abertura e a manutenção da
Conta Emigrante dependem da comprovação anual do estatuto de emigrante, concedido a quem exercer
uma atividade profissional remunerada no estrangeiro, mantendo aí a
sua residência permanente.
O estatuto é essencial para aceder
a produtos e serviços criados exclusivamente para os residentes no ex-
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
terior e é o passaporte para benefícios fiscais, como a isenção do imposto municipal sobre as transmissões
onerosas de imóveis (IMT).
Se viver no estrangeiro era sinónimo de abrir uma conta bancária
numa instituição do país de destino,
hoje a realidade é bem diferente tanto na emigração permanente como
na temporária.
Desde agosto de 2014, os portugueses residentes nos países da União Europeia, Islândia, Noruega, Liechtenstein, Suíça, Mónaco e San Marino beneficiam da área única de pagamentos
em euros (SEPA, na sigla anglo-saxónica). Na prática, podem utilizar uma
única conta bancária para efetuarem
todas as transações entre dois países
do espaço SEPA. Além de poderem
receber o ordenado na conta de Portugal, os cidadãos podem realizar transferências ou domiciliar os pagamentos de serviços prestados por qualquer
empresa europeia. Por exemplo, é possível pagar a luz, água ou gás de uma
residência no estrangeiro através de
um débito direto SEPA, indicando a
conta domiciliada em Portugal.
No espaço dos 34 países SEPA
não há diferenças nos preçários entre
operações nacionais e transfronteiriças.
A criação do conjunto único de
instrumentos de pagamentos torna-se ainda mais relevante numa altura
em que hierarquia dos países de destino da emigração portuguesa está a
sofrer alterações na sua composição.
Em 2010, mais de dois terços dos
portugueses emigrados viviam na
Europa e quase um terço na América
do Norte e do Sul. No resto do mundo
apenas viviam cerca de 3% dos portugueses emigrados. No mesmo ano,
seis dos dez principais países de emigração eram europeus.
Poupar em Portugal
Os dois países onde residem mais portugueses, França e Suíça, são a origem
de mais de metade do total de remessas recebidas em Portugal. O envio de
poupanças tem um peso importante
glossário
Três termos bancários que
entram no vocabulário de quem
muda de país para residir
— SWIFT
Representa o código que identifica
a instituição financeira e é essencial
para realizar uma transferência
internacional.
— SEPA
Significa área única de pagamentos
em euros. Facilita as transferências
a crédito, os débitos diretos e
a utilização de cartões entre 34
Estados-membros (União Europeia
e Islândia, Liechtenstein, Mónaco,
Noruega, Suíça e San Marino).
— IBAN
É o número internacional de conta
bancária, necessário para validar
transferências a crédito ou débitos
diretos no espaço SEPA.
3 057 milhões
VALOR DAS REMESSAS
de emigrantes em 2014
2,3 milhões
NÚMERO de portugueses emigrados
41,5%
PESO DOS JOVENS no total
da emigração
41,5
%
na balança de transações correntes do
País face ao estrangeiro, embora os valores atuais estejam muito longe do
pós-25 de Abril. Em 1979, as remessas
de capital enviadas por portugueses a
trabalhar no estrangeiro atingiram o
valor mais alto de sempre, chegando a
pesar mais de 10% do Produto Interno
Bruto (PIB) português.
Em 2014, o envio de dinheiro para Portugal ultrapassou, pelo segundo ano consecutivo, os três mil milhões de euros, representando cerca
de 2% do PIB.
As instituições bancárias desempenham um papel crucial na oferta
de soluções para quem trabalha no estrangeiro e quer poupar em Portugal.
Os vários mecanismos disponíveis englobam, por exemplo, as tradicionais
transferências, realizadas com toda a
segurança e comodidade através dos
escritórios de representação internacional, os vales postais ou o acesso a
serviços da rede especializada MoneyGram, com quase 350 mil pontos
de venda em mais de 200 regiões.
Agosto rima com aforro
O verão continua a ser, por excelência, a época do ano em que milhares de
portugueses a trabalhar no estrangeiro
regressam à sua terra natal e aproveitam para cuidar das suas poupanças
ou fazer investimentos. No entanto, os
bancos têm hoje campanhas ou promoções disponíveis durante todo o ano.
A possibilidade de subscrever as
aplicações de poupança em euros ou
em moeda estrangeira e a partir do
país de destino é uma das principais
especificidades da grande maioria da
oferta destinada aos residentes no exterior. Com prazos diversificados, as
aplicações garantem o capital investido e oferecem taxas de juro crescentes.
Uma das regras de ouro é escolher
um produto com um juro superior à taxa de inflação prevista para o país onde
se reside, para garantir ganhos reais.
A possibilidade de utilizar os cartões de débito, crédito ou pré-pagos
e aceder a financiamento bancário,
Soluções Residentes
no Estrangeiro
Quando a sua carreira lá fora
ganha cá dentro, ganhamos
todos.
Rita Ferreira
Jornalista em São Paulo
“Contactei o
meu banco
para me
informar do
preçário no
estrangeiro.
Só consegui
abrir uma
conta no
Brasil cerca
de nove
meses após
ter chegado.
Mantenho,
até hoje,
duas contas
bancárias
em Portugal.
Nos
primeiros
meses, usei
sempre
a conta
portuguesa.
Nunca senti
qualquer
dificuldade
ou tive
qualquer
problema.
O contacto
com o banco
à distância
é fácil.”
mesmo estando longe de Portugal,
é um indicador de que hoje a relação
com a banca não tem fronteiras.
A procura por crédito para adquirir habitação na terra natal tem
uma longa tradição, mas a jovem e
qualificada diáspora também apresenta outras necessidades, como o
crédito para formação ou para criação do próprio negócio, que os bancos acompanham.
A iniciativa empreendedora dos
novos emigrantes também motivou,
recentemente, o lançamento de várias medidas de incentivo ao regresso
de portugueses.
O Plano Estratégico para as Migrações até 2020 prevê que, ainda
este ano, seja lançado um projeto-piloto do Programa Mentores para
Emigrantes. O objetivo é “promover
experiências de entreajuda e apoio
entre cidadãos nacionais residentes e
não residentes, com vista ao apoio ao
regresso sustentado em projeto profissional”, explica o Plano.
Gerir o dia-a-dia
A Solução Montepio Consigo,
o Serviço Montepio 24
e o Extrato Digital são alguns
dos serviços disponíveis.
Realizar pagamentos
O Montepio apresenta-lhe
diversas opções para fazer
pagamentos ou transferências,
tais como cartões de Débito
e de Crédito, cartões Pré-Pagos
Montepio, transferências
SEPA e Serviço MoneyGram.
Incrementar poupanças
Os depósitos a prazo Montepio
Super Poupança, Montepio
Aforro Residentes no
Estrangeiro e Montepio Aforro
Plus Residentes no Estrangeiro
têm caraterísticas adequadas
a diferentes necessidades.
Concretizar projetos
O Montepio permite-lhe
o acesso a diversas opções de
financiamento, como o Crédito
Habitação, Crédito Automóvel e
Crédito Individual, entre outras
soluções. No Portal Montepio
Imóveis encontra condições
especiais de financiamento
e vantagens exclusivas.
Estar protegido
Conheça as soluções de
proteção criadas a pensar
nas suas necessidades.
Para assegurar o presente
e ajudar a planear o futuro
informe-se sobre a oferta
mutualista de poupança
e proteção que complementa
o sistema público
de Segurança Social.
Rede Internacional
Encontre os escritórios
de representação na Europa
e América do Norte (Suíça,
França, Reino Unido, Alemanha,
EUA e Canadá).
SAIBA MAIS
www.montepio.pt
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
59
3
a minha economia
INTERNACIONALIZAÇÃO
MODA
GOSTOS
NÃO SE
DISCUTEM,
EXPORTAM-SE
60
REINVENTAR É A
PALAVRA DE ORDEM
PARA A MODA
PORTUGUESA.
ESTA INDÚSTRIA TEM
SIDO CAPAZ DE DAR A
VOLTA E CONQUISTAR
TERRENO NOS MERCADOS
INTERNACIONAIS.
SAIBA COM QUE LINHAS
SE COSEM OS NEGÓCIOS
EM PORTUGUÊS
por ana sofia calaça
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
A moda evidencia estilos de vida e define identidades. Vestuário, calçado ou
joias falam por si e são um reflexo de
diferentes personalidades – irreverentes ou conservadoras, desportivas ou
clássicas –, mas a natureza cíclica e
mutável das preferências e gostos dos
consumidores obriga este setor a inovar constantemente para fazer frente
às exigências de um universo em permanente mudança.
Muitas empresas não resistiram à
crise de 2008 e à maior abertura do comércio internacional, mas as que se
mantiveram no mercado moderniza-
ram-se e asseguraram que a moda made in Portugal é de vanguarda e já está
muito focada na internacionalização.
Um setor dinâmico
O setor do têxtil e vestuário é hoje uma das mais importantes indústrias da economia portuguesa, com
cerca de 7 000 empresas, mais de
85% localizadas na região Norte, em
especial nas cidades do Porto e de
Braga, segundo dados da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal.
A provar o dinamismo desta indústria,
o ano de 2014 foi o melhor dos últimos
P&R
Pedro Pires
Diretor de Empresas Montepio
TIFFOSI
Calças de ganga
inovadoras
1 JEANS ONE SIZE Calças feitas
com um tecido “super elástico”
que se adapta a qualquer tamanho
ou formato de corpo.
2 JEANS ANTI-CELULITE
Aliam o efeito modelador a micro-cápsulas de creme anti-celulítico
incorporadas nas fibras do tecido.
3 JEANS IMPERMEÁVEIS
Calças de ganga à prova de chuva.
Foi utilizada uma técnica que permite
a impermeabilização dos jeans,
testada e comprovada em várias
lavagens.
onze anos para as exportações neste
setor, registando um valor exportado
de 4,6 mil milhões de euros e um crescimento de 8% face a 2013.
A proximidade faz de Espanha o
principal cliente externo do vestuário
nacional, com 32% das exportações,
representando o mercado que mais
cresceu em termos absolutos em 2014
(acréscimo de 139 milhões de euros).
França e Reino Unido, os outros
principais compradores, também estão a apostar mais na moda portuguesa, com 14% e 9% de quota, respetivamente, e foram o segundo e terceiro
destinos com maiores crescimentos
absolutos.
Se do estrangeiro aumentam as
encomendas de roupa, há também
mais pés para calçar. Considerado o
ex-líbris da economia portuguesa,
o calçado viu as exportações aumentarem 50% nos últimos anos, com as
empresas a venderem 95% da sua produção para 160 países de cinco continentes, de acordo com a Associação
Portuguesa dos Industriais de Calçado (APICCAPS).
Mas o modelo não ficaria perfeito
sem o adorno elegante dos números
de um ramo de negócio que conta já
com 5 000 empresas, na sua maioria
PME, e que representa um volume
de negócios de mil milhões de euros.
O comércio de joalharia e ourivesaria
cresceu a uma média anual de quase
19% entre 2008 e 2013, ao mesmo tempo que as vendas para o estrangeiro
Para muitas empresas, a internacionalização tem sido uma estratégia de resposta ao momento do
país. Como é que a ação do Montepio pode fazer a diferença?
O Montepio tem vindo a dotar-se
de condições que possam ir ao
encontro dos novos desafios das
empresas nacionais, que são também os nossos. A ação diferenciada
do Montepio passa cada vez mais
por cooperar com clientes, adequando a oferta e comportamento
à necessidade de cada cliente, nas
suas diferentes fases de internacionalização. O dinamismo de gestão,
o conhecimento dos mercados, com
presenças físicas estratégicas, quer
em Angola, através do Finibanco
Angola, quer em Moçambique,
via Banco Terra, os recursos mobilizáveis, a obtenção gradual de
capacidade criativa e o estabelecimento de relações de confiança ou
parceria com clientes são os fatores
que marcam a ação do Montepio.
Que soluções estão desenhadas
para responder aos desafios?
A missão será estar permanentemente ao lado do cliente, para que
este se sinta seguro e confiante
noutras geografias. Ambicionando
a verticalização de todo o processo
de internacionalização, o Montepio
tem soluções de assessoria em estudo de mercados, na sua abertura
de natureza e segurança financeira,
antecipando-se ao cliente enquanto primeira plataforma negocial em
geografias que tenham dimensão
percebida de bom negócio.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
61
3
a minha economia
INTERNACIONALIZAÇÃO
moda
LEMON JELLY
Vontade de inovar
62
A Lemon Jelly
nasceu em
2013, mas a sua
empresa-mãe,
a Procalçado, tem
quase 40 anos
de experiência na
produção de solas
de borracha para
outras marcas,
incluindo a
estilista Carolina
Herrera ou a
britânica Hunter.
A aventura de
lançar a primeira
marca de
calçado injetado,
totalmente
concebida,
desenvolvida
e produzida em
Portugal, tem
tido resultados
surpreendentes.
“A aceitação tem
sido realmente
boa, a nível
nacional e
internacional”,
garante o CEO
da empresa.
60%
PESO DAS EXPORTAÇÕES
José Pinto realça que as exportações
representam 60% do negócio.
“O mercado europeu tem grande
relevância por razões óbvias, mas
estamos também presentes noutros
mercados, como é o caso do Canadá,
China, Hong Kong e África do Sul.”
60
%
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
subiram 27%, com Hong Kong, Suíça e
França como os maiores destinos dos
produtos nacionais.
Especialistas em jeans
Revolucionar o mundo das calças de
ganga. É com esta ideia em mente que
a Tiffosi se tem afirmado pela aposta
em produtos inovadores. Filipe Pinto
Correia, administrador, explica que a
têxtil minhota “diferencia-se por ter
desenvolvido um conceito de ‘especialista em jeans’, que proporciona aos
clientes um ambiente de loja Denim
e um produto muito competitivo no
binónimo qualidade/preço”. Fundada em 1979, a Cofemel criou a marca
Tiffosi em 1991 e, há seis anos, a empresa foi comprada pelo Grupo VNC.
“A evolução é clara quando transformada em números. A empresa cresceu 80% em vendas ao consumidor final desde 2008”, de acordo com o administrador.
A marca portuguesa apresenta também um “forte crescimento
no mercado externo”. Desde 2012,
ano em que inaugurou a primeira
loja monomarca em Madrid, a Tiffosi
conseguiu “estar presente em cerca de
20 países e em mais de mil clientes
multimarca a nível internacional”.
O líder da Tiffosi sublinha ainda que
as encomendas para Espanha e França têm duplicado nas últimas coleções e que o processo de internacionalização já chegou igualmente ao
Médio Oriente, onde “o feedback dos
clientes tem sido positivo, mas as diferenças de sazonalidade deste mercado face à Europa têm representado um forte desafio na gestão das
coleções que lhe são apresentadas”.
Dentro de portas, 2015 é o ano para fazer nascer no mercado o conceito de
megastore (lojas com dimensões nunca inferiores a 500 m2). A marca quer
inaugurar um novo espaço quinzenalmente, sem perder de vista a expansão internacional.
“Nos próximos anos prevemos um
investimento de cerca de 30 milhões
de euros em lojas novas, com espe-
cial incidência no mercado espanhol,
o que contribuirá para o objetivo de
duplicar a dimensão da empresa nos
próximos cinco anos”, sublinha Filipe
Pinto Correia.
Calçado que cheira a limão
Fresca e divertida. É assim que a
Lemon Jelly se afirma no mundo do
calçado, com as suas galochas à portuguesa com um design inovador e acabamentos de qualidade. As cores alegres e vibrantes, assim como os tons
metalizados, representam uma tendência da moda e a Lemon Jelly promete não fugir à regra em 2015, imprimindo criatividade a sapatos de
plástico, a pensar em mulheres urbanas que “não têm nada a provar”.
As coleções da Lemon Jelly foram
concebidas com inspiração em algumas das melhores coisas da vida: as amizades, as férias de verão
e as viagens, os salpicos do mar e as
noites urbanas e cheias de glamour.
“Reinventamos modelos clássicos
através da mistura de diversos tipos
de plástico, com cor e estilo, além de
qualidade e conforto, indo ao encontro
de um público jovem”, assegura José
Pinto, CEO da marca.
Os sapatos Lemon Jelly são ideais
para dar ainda mais cor aos dias de
sol, mas existem igualmente em tons
mais sóbrios, como o preto ou castanho. José Pinto destaca também outros elementos que marcam a diferença: “Através da atenção aos pormenores e da aplicação de detalhes
feitos em materiais nobres e com
técnicas de elevada tecnologia, conseguimos acrescentar valor a um
tipo de calçado que, tradicionalmente, é visto como mais económico.”
Com preços entre os 70 e os 180 euros, estes sapatos revelam a paixão, dedicação e espírito de equipa que guiam o trabalho da marca.
“Os nossos sapatos são feitos com
muito amor, cuidado e diversão para se transformarem em companheiros fiáveis e coloridos, que sabem ao
mais doce dos doces: são como uma
> MACHADO JOALHEIROS A marca
está em Lisboa desde 2008 e pauta-se
pelo luxo das peças
explosão de gelado, gomas, rebuçados e chupa-chupas, e têm simultaneamente o som das gargalhadas e
o toque de uma carícia”, sublinha o
CEO da Lemon Jelly.
A tendência das joias
“Durante 134 anos, a Machado Joalheiro marcou e tenta marcar as ten-
dências da joalharia e relojoaria em
Portugal”, explica António Machado,
administrador e descendente do homem que fez crescer este negócio.
A empresa portuense, que é um
exemplo da tradição e experiência de
vários séculos, cria peças de joalharia
com design moderno voltado para as
novas gerações, que depois são expostas num ambiente de requinte nas lojas de Porto e Lisboa.
Respeitando a filosofia de criar
uma atmosfera seletiva, o responsável por esta casa centenária explica
que as lojas nos centros comerciais estão fora de hipótese. António Machado sublinha que qualquer “joalharia
fica melhor localizada na rua, onde
existe outra luz, outro brilho e mais
espaço”, que são um trunfo da marca
que tem montras com joias para todos os gostos, desde as clássicas (muitas vezes inspiradas em peças antigas
executadas pela marca) às vanguardistas. Os “preços são transversais”,
refere António Machado, realçando
que as criações exclusivas têm cada
vez mais procura por parte de clientes
“exigentes, conhecedores e apaixonados por joias”. O administrador garante: “Sempre foi a nossa tradição e continuaremos a apostar nessa vertente.”
Apesar de já ter atravessado vários séculos, a Machado Joalheiro está também de olhos postos no futuro:
“2015 é o ano do diamante, em todas
as suas formas e cores. E as nossas novas coleções vão nesse sentido.”
MACHADO JOALHEIROS
A história de uma casa centenária
O primeiro espaço da
Machado Joalheiro
chamava-se Ourivesaria
Cunha e nasceu em 1880,
na Rua do Loureiro,
uma das ruas mais
dinâmicas do Porto,
pela mão de Pinto da
Cunha, figura lendária
do mundo das joias.
Em 1914 a loja mudou-se
para a Rua 31 de Janeiro
e ali permanece até hoje,
num edifício classificado
como Património
Municipal. Pouco antes
da II Guerra Mundial,
Jacinto Machado
dos Santos (pai de
António Machado, atual
administrador),
começou a trabalhar na
ourivesaria, tornando-se mais tarde sócio da
empresa.
O nome da marca,
que hoje conhecemos,
só surgiu nos anos 80,
década em que chegou
à Avenida da Boavista.
Susana Bettencourt
Estilista
O que é que Lady Gaga e a moda
portuguesa têm em comum?
A resposta está na jovem
açoriana Susana Bettencourt,
a estilista lusa que tem dado
nas vistas e que já vestiu
a irreverente cantora norte-americana. Apesar das
celebridades, Susana sabe bem
quem faz a sua marca:
“Não crio as coleções a pensar
nos famosos. São as pessoas
reais que mantêm a minha
marca viva e sustentável.”
A aventura das malhas vai
tendo novos capítulos que se
somam aos de um começo em
família. “Aos cinco anos aprendi
a tricotar e a fazer crochet à mão
com a minha avó e madrinha.
Mas só depois de uma má
experiência na área de ciências
é que aceitei que o meu hobby
fosse a única coisa que me faria
feliz”, recorda. Felicidade que
está presente no trabalho e que
permite superar os obstáculos
“dos ‘nãos’ de concursos
e apoios”, ou dos encargos
de “apresentar coleções de
seis em seis meses”.
Ainda assim, é positiva a
opinião sobre o momento da
moda em português. “Estamos
cada vez mais fortes e com
mais iniciativas, como o boom
do Portugal Fashion.
O desafio mais complicado será
sempre o preço e transmitir um
conhecimento generalizado
da nossa existência”, explica.
"Persistência e uma grande dose
de loucura" são os ingredientes
que aponta para o sucesso.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
63
litros
159
Rússia
EUA
13,10%
Arábia Saudita
As maiores reservas provadas mundiais
são de países como Venezuela, Arábia
Saudita, Canadá, Irão e Iraque
12,90%
10,80%
Quota de produção
QUEM MAIS PRODUZ?
Um em cada três barris de petróleo produzido
no mundo vem de um destes países.
TODOS OS DIAS VEMOS E
OUVIMOS NOTÍCIAS SOBRE O
PREÇO DO BARRIL DO PETRÓLEO,
EXPLICAÇÕES SOBRE COMO
A GASOLINA SOBE E DESCE POR
CAUSA DO PREÇO DO CRUDE,
MAS SERÁ QUE SABEMOS
O QUE PRECISAMOS SOBRE
UMA MATÉRIA-PRIMA
QUE INFLUENCIA, E MUITO,
AS SOCIEDADES MODERNAS?
PORQUÊ UM BARRIL?
A conhecida medida utilizada para medir o petróleo,
o barril, é originária dos EUA, de uma altura em que na
Pensilvânia se intensificava a corrida ao "ouro negro".
Barril porquê? Porque se começou a transportar petróleo
em barris já utilizados, principalmente, no negócio do
vinho e do uísque. O barril de petróleo leva cerca de
159 litros (42 galões nos EUA).
A origem
A ascensão do "óleo da pedra" como
indústria começou no século xix.
Bacu, no Azerbaijão, é considerada
a cidade onde foi aberto o primeiro
poço petrolífero moderno, mas foi
na Roménia, e depois nos EUA, que
cresceu a forte indústria petrolífera.
A rivalidade que se agudizou
no Médio Oriente entre o império
britânico e o russo levou à corrida ao
"ouro negro", que abriu caminho ao
domínio na produção de países como Árabia Saudita, a Rússia e EUA.
O MUNDO
NUM BARRIL
D
E
S
C
O
D
I
F
I
C
A
D
O
R
64
milhões de euros
60
%
5 710
Transportes
10
%
Residencial/
comercial/
agricultura
Geração de
eletricidade
Indústria
FATURA ENERGÉTICA PORTUGUESA
Do total de 5 710 milhões de euros de
importações de energia portuguesa, 82%
dizem respeito a petróleo e produtos ligados
ao petróleo. O maior mercado de origem do
petróleo comprado é Angola, seguida pela
Arábia Saudita, Argélia e Cazaquistão.
5
%
25
%
Destino do petróleo consumido
QUEM MAIS CONSOME?
Um quinto de todo o petróleo consumido no mundo é da
responsabilidade dos EUA. China e Japão preenchem os outros lugares
do pódio dos maiores consumidores desta matéria-prima.
MILHÕES DE BARRIS
produzidos por dia
86,75
31%
PESO DO PETRÓLEO
na totalidade
de energia produzida
no mundo
Noruega
Reino Unido
Portugal
Alemanha
França
Espanha
Brasil
Angola
Venezuela
FONTE: BP, CHE VRON, DGE G, GLOBAL OIL PR ICE S, IE A, OPE P, UE
ONDE SE FORMAM OS PREÇOS?
Os preços de referência do petróleo
estão ligados, normalmente, a dois
mercados que são benchmark: West
Texas Intermediate (WTI, na América
do Norte) e Brent (mar do Norte).
O WTI descreve um tipo de petróleo
de baixa densidade que é referência
para a Bolsa de Mercadorias de Nova
Iorque (New York Mercantile Exchange)
enquanto o Brent é o tipo de petróleo
de referência em Roterdão. Os preços
negociados são, normalmente, futuros,
ou seja, o preço dos contratos a realizar
é determinado num momento anterior.
COMO SE TRANSPORTA
Todos os anos são transportados
milhares de milhões de toneladas de
petróleo. A vasta rede de pipelines que
levam o petróleo por via subterrânea
apresenta números impressionantes.
Por exemplo, o maior pipeline, Druzhba,
tem 4 mil quilómetros de comprimento
e liga a Rússia a vários países da
Europa. Além dos pipelines, os quatro
maiores petroleiros são os TI Europe,
TI Oceania, TI Africa e TI Asia. O maior
tem 380 metros de comprimento,
número idêntico ao da altura do Empire
State Building, nos EUA.
* Automóvel com consumo misto de 6 litros de gasolina 95 por 100 km. 1 de maio de 2015.
8 333
219
160
128
117
113
111
105
91
Quantos quilómetros faz com 10 euros*
Com o mesmo carro e a mesma quantia em
dinheiro esta é a distância em quilómetros
que consegue percorrer em cada país
ORÇAMENTOS FAMILIARES
O preço do petróleo afeta famílias
e empresas. Se a ida aos postos
de gasolina é o aspeto mais visível,
saiba o que se passa na Europa com
o mesmo preço do petróleo como
referência. Os impostos e os custos
de produção fazem a diferença
na hora de conduzir o automóvel.
65
BOLSAS MUNDIAIS
O preço do barril de petróleo também
é referência para os mercados
financeiros. Além de influenciar
as ações das empresas petrolíferas
e potenciais resultados das
companhias, pode também fazer variar
as unidades de participação dos fundos
de investimento que investem em
ações deste setor.
Outros investimentos, como os
Exchange-traded funds (ETF),
acompanham o preço da matéria-prima
e ganham ou perdem com a variação.
copos de plástico
65
velas de aniversário
170
540
escovas de dentes
pentes de bolso
750
1 barril de crude
dá para
produzir...
DIA A DIA
PUB
A MINHA VIDA
IDEIAS E DESCOBERTAS EM
LAZER, FAMÍLIA,
SAÚDE, CULTURA
página 68
página 72
Mais globalizados e mais
iguais. Num mundo cada
vez mais semelhante,
há uma nova vaga de
soluções que apostam
na individualização
e customização para
quem quer ser único
Há um Portugal para
percorrer em bicicleta.
Conheça quatro cidades
que são um exemplo
do investimento em
ciclovias e prepare-se
para deixar o carro
parado e pedalar
TENDÊNCIA
LAZER
página 74
página 76
A Bolsa Nacional de
Terras é um novo eixo
estratégico. Levar os
terrenos referenciados
a novos arrendatários
e proprietários que os
dinamizem é a missão
Óbidos é muito mais
que ginja e chocolate.
A nova onda literária
está a transformar a
famosa Rua Direita
num dos maiores destinos
turísticos da região Centro
VOLTAR À
TERRA
CADERNO
DE VIAGEM
4
a minha vida
TENDÊNCIA
À MEDIDA
TODOS
QUEREMOS
SER ÚNICOS
68
A RECUSA DA
MASSIFICAÇÃO E A
ROMANTIZAÇÃO DE TUDO
O QUE É VINTAGE CRIOU,
NA ÚLTIMA DÉCADA,
UMA NOVA TENDÊNCIA:
A PROCURA DE PRODUTOS
E SERVIÇOS ÚNICOS,
ADAPTADOS AO GOSTO
DE CADA UM E AOS SEUS
HÁBITOS
por rita vaz da silva
No tempo dos nossos avós,
o azeite e o leite eram aviados
em garrafas de vidro reutilizáveis.
Embalagens e sacos plásticos
eram coisas raras e no balcão
das mercearias não faltava
o livro de capa preta com a lista
dos fiados e a balança para
a venda a granel. As senhoras
iam às modistas fazer vestidos
e os senhores tiravam medidas
no alfaiate. Comprava-se
e vendia-se com conta,
peso e medida. Com gosto.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
não queremos ser iguais, seja por crise
de identidade, por nostalgia ou até por
egoísmo. Queremos ser únicos.
O despontar da sociedade de consumo trouxe uma sociedade mais homogénea nos hábitos, mas numa era de
transformações galopantes o que ontem era démodé volta a ficar in ao fim
de umas temporadas de hibernação.
Depois da institucionalização, na última década, dos conceitos retro, vintage e gourmet, está a renascer uma vaga
de personalização de serviços e produtos aliada à arte de bem servir por
quem recusa a massificação. Afinal, já
“Biclas” com pinta
Os hábitos diários do cliente são a
alma do negócio da iNBiCLA, empresa da região do Porto que faz bicicletas
personalizadas. Vítor Machado criou
o negócio do zero, aliando o gosto pessoal pelas bicicletas à formação em design de produto.
“Para criar uma bicicleta tenho de
ter elementos que me ajudem a adaptar o produto ao que o cliente necessita. Cada projeto começa de raiz com
um quadro sem pintura [peça triangular no centro da bicicleta] e depois
há uma negociação. O cliente chega
aqui e diz-me: ‘Quero uma bicicleta
para andar ao fim de semana numa
zona plana e com um cestinho para ir
buscar o pão’ ou ‘Faço cinco quilómetros por dia de casa para o trabalho e
tenho duas subidas.’ Esta informação
INBICLA
Duas rodas na moda
Como grande parte
das empresas que
oferecem bens e
serviços customizados
em Portugal, a iNBiCLA
depende muito do
“passa-palavra”, das
redes sociais e do
que está na moda
para angariar novos
compradores. “A maior
parte dos meus clientes
está em Lisboa e não na
região do Porto,
onde tenho a oficina.
O negócio cresceu porque
a bicicleta voltou a estar
na moda”, lembra Vitor
Machado, criador da
marca que faz bicicletas
únicas e cosmopolitas.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
69
4
a minha vida
TENDÊNCIA
à medida
70
é muito importante para a escolha dos
materiais, do design e das peças a utilizar”, descreve.
Para o cliente este serviço é vantajoso “pelo atendimento personalizado
e pelo produto único que leva para casa”. “A certa altura acabo por conhecer
tão bem as pessoas e a sua história que
já nos tratamos por tu”, conta o designer que começou por se aventurar no
ramo do mobiliário e “tropeçou no
negócio das bicicletas” por causa de
alguns amigos que lhe pediam para
criar “biclas para as namoradas”.
A criação começa pela história de
vida e passa depois à parte do design.
“Há clientes que sabem o que querem, outros não. Alguns trazem uma
fotografia para inspiração. Eu faço um
mock-up e depois apresento para aprovação.” Esta fase inicial demora cerca de uma semana. A construção da
bicicleta pode levar um mês. O preço
médio ronda os 550 euros.
Vítor personaliza qualquer parte
da bicicleta: o volante, o revestimento,
a estrutura, as cores, o selim, o cesto.
Cada veículo é numerado e exclusivo.
“Posso até inscrever o nome do cliente
ou uma frase se assim o quiser”, explica.
“Nunca faço a mesma coisa e até agora
ninguém me pediu para replicar alguma bicicleta que já tenha feito. Também
não me pediram ainda para criar peças
de raiz, por exemplo o travão. Compro
essas peças já prontas, mas se um dia
me pedirem posso vir a fazer.”
Cada cabeça, sua sentença
Únicos e exclusivos são os chapéus que
Cristina de Almeida desenha e fabrica no seu ateliê no Centro Comercial
Roma, em Lisboa. Muitas das suas
compradoras sentem-se tão aconchegadas com o atendimento especial
desta modista de chapéus que a convidam para almoçar ou para um chazinho numa nas pastelarias do bairro.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
“Fico muito lisonjeada mas recuso sempre. Às vezes tenho alguma pena mas
não há tempo, há sempre mais clientes
marcadas e chapéus para fazer.”
Com duas lojas na capital, uma on-line e outra em Bruxelas, A Fábrica dos Chapéus é uma empresa familiar, criada em 2008 por Cristina
e pelo marido, Luís Barbosa. Ambos
trabalhavam como gestores em multinacionais e deixaram para trás uma
carreira bem-sucedida para abraçar a
paixão pela chapelaria.
O casal repete muitas vezes a mesma frase: “Enquanto houver cabeças
vamos por cá andar.” A “Fábrica” tem
chapéus para todos os gostos e sentenças. E se nos mais de mil modelos disponíveis, tanto nas coleções de inverno
como de verão, não encontrar o que procura, Cristina e duas das colaboradoras que formou fazem chapéus à medida exata do que o cliente pretende.
Não há limites. “Posso arranjar penas
de pavão, mandar fazer um tecido ou
qualquer tipo de peça decorativa. Até o
molde de madeira para o chapéu podemos mandar fazer se não tivermos no
atelier o que o cliente quer. Quanto ao
chapéu propriamente dito, posso fazer
a aba com mais ou menos milímetros
ou com uma copa mais alta ou em qualquer cor. Posso adaptar ao rosto, à vida
e à roupa do cliente”, explica Cristina.
Algumas das encomendas chegam
de Angola e do Brasil. “Recebo muitos
e-mails com pedidos e depois dou continuidade através do Skype. Mostro os
chapéus que tenho, os modelos, os tecidos e vamos chegando a um acordo.”
A componente on-line é vital para as
vendas – além das encomendas por
COSTA DA MARINHA
Ajustar
os paladares
às estações
O cabaz da Costa
da Marinha
– Agricultura
Biológica tem
entre 9 a 15
produtos da
época e vai dos
cinco aos sete
quilos. Antes da
primavera, uma
das caixas pode
conter ervas
aromáticas e
condimentares,
como coentros,
salsa, tomilho,
orégãos, limonete
e hortelã, e
legumes como
alface, espinafre,
rúcula, abóbora,
batata-doce,
alho-francês
e brócolos.
No verão já há
mirtilos e figos.
e-mail e através das aplicações de conversação e vídeo – a loja on-line escoa
uma parte significativa das peças da
coleção para qualquer lugar no país e
no mundo. Curiosamente, a Internet
e a tecnologia que tanto contribuíram
para a globalização ajudam as pequenas empresas com produtos à medida
a vingarem no mercado onde a concorrência das grandes marcas é feroz.
Não há nada que não possa vender-se
on-line, há tecnologia para criar quase
tudo e o que não existe num país pode
encomendar-se noutro.
À “Fábrica” chegam também muitos pedidos para criação de réplicas.
“Copiam-se muito os casamentos
FÁBRICA DOS CHAPÉUS
Celebrar à medida
reais.” E restauram-se chapéus desgastados pelo tempo. “Um chapéu com
bom material dura 300 anos. Além
disso, a empresa também faz chapéus
para fardas, uma produção mais massificada que resulta em parcerias com
fábricas nacionais e estrangeiras. Entre os clientes institucionais incluem-se companhias aéreas e uma rede de
padarias nacional. A modista colabora igualmente com criadores de moda
nacionais e designers de outros países.
A relação com o cliente é um trunfo do negócio, defende Cristina de
Almeida. “O mundo mudou muito –
– é mais fácil uma pessoa chegar a
uma loja, desarrumar tudo, ver tudo
e ninguém falar com ela. O nosso caminho foi mais difícil, mas é mais cimentado, tem mais futuro. Para mim,
ter alguém que nos ouça e aconselha
não tem preço. Se não se for bem atendido não se volta e não se compra mais
naquela loja. É muito importante ter
uma aproximação muito educada ao
cliente, não de subserviência, mas de
se mostrar disponível para ajudar. Nisso serei sempre uma mulher à antiga.”
Cabazes ao gosto do freguês
Outra moda da última década, e um
mercado em pleno crescimento, é a
agricultura biológica. Cada vez mais
se consomem produtos biológicos,
cultivados num ambiente natural
que respeita o tempo de maturação
das plantas e não recorre a fertilizantes ou pesticidas químicos.
Paulo Freixinho, ator de teatro e
televisão há mais de 18 anos, decidiu
apostar neste nicho de mercado e lançou-se, aos 38 anos, numa atividade
paralela esperando “encontrar um
outro ânimo para viver neste país”.
Aproveitando um terreno familiar
de dois hectares na zona de Ovar,
criou, em 2013, um negócio de cabazes biológicos adaptados aos hábitos
de consumo dos seus clientes, a Costa
da Marinha – Agricultura Biológica.
Milliner formada
em Inglaterra,
a mentora da
chapéus mais
extravagantes
do mundo, as
Fábrica dos
Chapéus cria
sobretudo peças
para cerimónia.
Também faz
todos os anos 15
a 20 acessórios
para os clientes
portugueses que
se deslocam
ao desfile de
corridas Royal
Ascot. “As clientes
vêm cá fazer a
prova, trazem
os vestidos e os
sapatos. Depois
da festa ou evento,
enviam e-mails
com fotografias
da noiva ou das
convidadas.”
Os clientes recebem por e-mail a lista de produtos disponíveis ou combinam por telefone a composição da sua
caixa. “Os meus clientes são pessoas
muito atarefadas, que passam o dia
fora de casa e têm pouco tempo para
fazer compras. Também não têm condições para ter uma pequena horta”,
explica o ator, agricultor e estudante
de agronomia biológica na Escola
Agrária de Coimbra.
Os cabazes variam consoante o gosto do freguês, embora não permitam
muitas variações, já que se trata de
produtos hortícolas e frutícolas da época. “Têm de ser clientes que acreditem
no projeto e que entendam o conceito.
Sei o que cada pessoa gosta.”
Esta proximidade “é muito compensadora para quem compra e para
quem produz”. “A produção fica paga
e o consumidor recebe produtos mais
baratos e com uma qualidade incomparável ao que encontraria numa grande superfície.”
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
71
4
a minha vida
LAZER
EXERCÍCIO
CIDADES PARA
PEDALAR
EM PORTUGAL HÁ MAIS
DE 1 700 QUILÓMETROS DE
CICLOVIAS, MAS A BICICLETA
AINDA NÃO DOMINA O CENÁRIO
por sara raquel silva
ilustração ana seixas
Paulo Guerra dos Santos, coordenador do projeto
Ecovias de Portugal, acredita que falta dar passos
decisivos na legislação fiscal e rodoviária e no
investimento em ciclovias, mas encontra no país
locais onde já é aprazível circular em duas rodas.
Grândola, Ovar, Torres Vedras e Vila Real
de Santo António são as cidades de eleição.
72
Tipologia
Iniciados
Distância
44 km
Pistas
Ciclovia
das praias
Sizandro
e Barro
TORRES VEDRAS
VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO
Na rota
das Agostinhas
A ritmo
internacional
Nesta cidade bastante plana, onde circular de bicicleta é prática comum desde há gerações, a maioria das ciclovias
é dedicada ao lazer. No entanto, este
meio de transporte convive de forma
harmoniosa com os veículos motorizados na via pública, em parte por tradição mas também porque a autarquia colocou sinalização que protege
os velocípedes. As Agostinhas, bicicletas assim batizadas em honra a Agostinho da Silva, natural da cidade, estão disponíveis todos os dias das 8 às
20 horas e a sua utilização é gratuita.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Tipologia
Iniciados
(exceção da Boa
Vista que é para
experientes)
Distância
55 km
Pistas
Ecovia do Litoral,
Boa Vista, Cacela,
Rias Parque e Vila
Real de Santo
António-Monte
Gordo
Vias duplas para os residentes, turistas
e atletas que fazem o trajeto Vila Real
de Santo António-Monte Gordo e medidas para a acalmia do trânsito em meio
urbano são os trunfos desta cidade.
Adicionalmente, o concelho é atravessado pela Ecovia do Litoral, que percorre todo o litoral algarvio numa extensão
de cerca de 214 quilómetros.
Uma novidade: o concelho prevê, juntamente com os municípios fronteiriços
de Castro Marim e de Aiamonte (Espanha), criar uma rota ciclável na Ponte
Internacional do Guadiana.
^^
VILA REAL
DE SANTO ANTÓNIO
^^
BIAS, EM OVAR
A cidade foi premiada
A autarquia está
em 2014 pela promoção
a traçar uma ciclovia
da bicicleta
até Aiamonte
73
Tipologia
Iniciados
Distância
Mais de 50 km
Pistas
Avenidas Praia
Esmoriz, Praia
Cortegaça,
D. Manuel I,
Sá Carneiro,
da Régua,
do Emigrante,
D. Maria II, Estrada de Pardilhó,
Escolas, Rua das
Britas, ecopista do
Atlântico, Avenida
Raimundo Rodrigues e Maceda
OVAR
GRÂNDOLA
BIAS pela ria
Do passeio à BTT
A Rede de Mobilidade Ciclável
e Pedonal do Concelho de Ovar conta
com cerca de 60 quilómetros de extensão, sendo composta por pistas exclusivas, mistas e pelos trilhos da natureza, destacando-se a recente conclusão
da ecopista do Atlântico Esmoriz-Furadouro. A utilização deste meio de transporte é popular não só entre os turistas como entre os locais, que dispõem,
em alternativa ao meio de transporte
próprio, das Bias, bicicletas municipais
utilizadas por mais de 10 000 pessoas
por ano. A cidade recebeu, em 2014,
o Prémio Nacional da Mobilidade
em Bicicleta, na categoria Autarquias.
Tipologia
Iniciados
Distância
Mais de 10 km
Pistas
Alameda e Parque
O concelho tem cerca de 10 quilómetros
de ciclovias. Dois ficam na vila, junto à
Alameda José Amaro e à Alameda 22
de outubro. Os sete restantes pertencem à freguesia de Carvalhal e ligam
a aldeia à praia. Com pouco trânsito
e bastante plano, o concelho é desde
sempre convidativo à circulação a duas
rodas, que aumenta significativamente
no verão com a afluência dos turistas.
A prática de BTT é também popular
na zona da serra. Ao longo do ano realizam-se várias provas, destacando-se o inédito 1º Ciclo BTT de Grândola,
em abril, que juntou o ciclismo (44 km)
e BTT (22 km).
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
4
a minha vida
INICIATIVA
PROPRIEDADE
REGRESSAR
À TERRA
O PROJETO BOLSA
NACIONAL DE TERRAS REÚNE
A OFERTA DE PRÉDIOS RÚSTICOS
E MISTOS EM TODO O PAÍS.
UMA AJUDA ÍMPAR A QUEM
PRETENDE DEDICAR-SE
À AGRICULTURA OU
SILVICULTURA, MAS NÃO
DISPÕE DE TERRENO
PRÓPRIO
por sara raquel silva
74
Num inquérito realizado
pelo Ministério da Agricultura
junto de jovens agricultores
as opiniões foram unânimes:
havia vontade de trabalhar
a terra – encontrá-la é que
parecia uma missão impossível.
Foi então criada, em dezembro
de 2012, a Bolsa Nacional
de Terras, um projeto que
nasceu para facilitar o acesso
a prédios rústicos e mistos,
numa plataforma on-line.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
DADOS
Os números da “bolsa”
Como a propriedade está a chegar
aos utilizadores da plataforma
53
NÚMERO DE PRÉDIOS
rústicos cedidos
2 642
ÁREA, em hectares, de propriedade
cedida
NOTA: INFORMAÇÃO ATÉ FEVEREIRO DE 2015
A iniciativa permitiu que, até fevereiro deste ano, se tenham disponibilizado em valores acumulados 352
prédios rústicos para arrendamento e venda, totalizando uma área de
14 482 hectares (área equivalente ao
município de Albufeira). “O grande
objetivo é que este seja o principal repositório de informação da existência de terras em Portugal com potencial produtivo”, afirma Nuno Russo, coordenador nacional do projeto.
O balanço é positivo e contribui para o
sucesso do grande propósito da Bolsa
de Terras: “combater o despovoamento e o desemprego, através de um incentivo à fixação de populações e de jovens agricultores e contribuindo para
uma gestão eficiente da disponibilidade dos terrenos, valorizando a multifuncionalidade do território que deverá ser encarado como fonte de riqueza ao serviço de um desenvolvimento
sustentável”, adianta o responsável.
A plataforma digital é simples:
quem detém terrenos disponíveis insere-os no portal bolsanacionaldeterras.pt, descrevendo a sua dimensão,
localização e o tipo de cedência, que
pode ser venda, arrendamento ou contrato campanha. Também pode fazê-lo presencialmente junto de uma
Entidade Gestora Operacional da zona correspondente que, em última instância será responsável pela validação
da informação e celebração do contrato
de disponibilização com o proprietário,
além da verificação da conformidade
do prédio. Os interessados têm apenas
de consultar as ofertas e contactar os
proprietários, sem necessitarem de intermediários ou de sair de casa, o que é
sobretudo útil a quem pretenda deslocalizar-se. Os terrenos podem pertencer ao Estado, às autarquias, entidades
públicas ou entidades privadas, embora, no caso da cedência a terceiros ser
efetuada parte do Estado, o procedimento se concretize, por regra, através
de concurso, com ou sem negociação,
de modo a garantir transparência total.
Além de facilitar o acesso a propriedades, muitas vezes sem qualquer utilização, esta iniciativa “contempla incentivos fiscais como a redução em 75%
dos custos associados a atos de registo do prédio na conservatória e prevê
a redução ou isenção do pagamento do
IMI [Imposto Municipal Sobre Imóveis] rústico”, adianta o coordenador
do projeto.
O impulso da necessidade
Angélica Caçador, professora de Educação Física, residente em Ponte de
Lima, é um dos exemplos de “regresso à terra” através de um depositário
pertencente a uma autarquia (que em
breve se espera vir a integrar a Bolsa
Nacional de Terras). Tendo em conta a instabilidade profissional procurava um projeto paralelo ao ensino e
resolveu apostar na agricultura, mais
precisamente na produção de pequenos frutos. “Foi muito difícil encontrar
terreno, pois muitos tinham socalcos e
não possuíam área suficiente”, recorda. “Até que ao ter conhecimento desta
iniciativa tudo aconteceu rapidamente, pois a descrição da propriedade ficou logo acessível”. Angélica demorou
apenas duas semanas para descobrir
dois hectares na freguesia do Freixo,
terreno que agora arrenda. Hoje, além
de se sentir mais confiante no futuro,
garante ainda uma especial satisfação:
“Criar postos de trabalho na região”.
P&R
Nuno Russo
Coordenador da Bolsa Nacional
de Terras
Que novidades estão em carteira?
Prevê-se o desenvolvimento de funcionalidades da componente da procura de terras no Sistema de Informação – Plataforma Informática da
Bolsa de Terras, com vista à facilitação e melhoria contínua do acesso
às terras por parte dos interessados,
visando a maximização do número de terras cedidas via Bolsa de
Terras. Por outro lado, está prevista
a troca de experiências com outras
Bolsas de Terras europeias, em
particular com o Banco de Tierras
de Espanha, com o objetivo de troca
de experiências e conhecimentos
em projetos semelhantes.
É também nossa intenção estudar
a possibilidade de articulação da
Bolsa de Terras com outros sistemas de informação que contribuam
para o aumento de terras na Bolsa,
através de iniciativas conjuntas
e de colaboração com algumas
entidades parceiras da Bolsa
Nacional de Terras, incrementando
o envolvimento destas e de outras
entidades na disponibilização de
prédios na Bolsa de Terras. Por fim,
pretende-se ainda a integração de
um indicador de qualidade associado a inquérito junto dos proprietários, interessados e candidatos
ao Concurso das Terras do Estado.
Quais as expetativas para 2015?
Potenciar o conhecimento da Bolsa
de Terras e promover os seus resultados, valorizando a Bolsa de Terras e a
sua ampla utilização.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
75
4
NA
VILA
DOS
LIVROS
Ó
B
I
D
O
S
GPS
N 39° 21’ 34.6134”
W 9° 9’ 26.7726”
SE ANTES ERA APENAS UM LOCAL BONITO
PARA VISITAR, AGORA É UMA LOCALIDADE
QUE MARCA O PASSO NA CRIATIVIDADE.
ESTA É A PRIMEIRA VILA LITERÁRIA
NO PAÍS E QUER FAZER PARTE DA
REDE UNESCO DAS CIDADES CRIATIVAS
NA ÁREA DA LITERATURA
por helena c. peralta
fotografia câmara municipal de óbidos
76
É difícil imaginar cavaleiros a galope
ao lado das muralhas, dotes de princesas nas tradições reais e uma tão longínqua história numa vila de Óbidos
ladeada por dois dos maiores expoentes da civilização moderna: uma autoestrada e a linha férrea do Oeste.
A verdade é que a famosa Rua Direita
parece tirada dos livros de História.
Estão lá todos os símbolos da terra que
se acredita ter origens em 308 a. C.
e que foi tomada aos mouros em 1138.
A ginjinha e o chocolate são as estrelas, mas é um Portugal em miniatura
que está representado em pouco mais
de 200 metros nas tradicionais lojas
de souvenirs, na discográfica de Fado
ou mesmo nas ementas de alguns dos
restaurantes que preenchem a oferta
gastronómica da rua.
Mas Óbidos é agora muito mais que
História e turistas. A vila tem vindo
a reposicionar-se, destacando-se pela
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
? TRADIÇÃO
No município, que
tem três monumentos
nacionais, há sete
turistas por ano
por cada habitante
sua capacidade de inovação, criatividade e, sobretudo, pela programação
cultural que oferece. Como graciosamente diz Celeste Afonso, vereadora da Cultura da Câmara Municipal
de Óbidos, “José Saramago escreveu
que Óbidos era uma menina bonita à
espera de ser chamada para dançar.
Agora é ela que se levanta e que chama para a dança.”
É neste contexto que surge o projeto da Vila Literária, uma parceria entre a autarquia, a Editora Ler Devagar
e a Livraria Bichinho do Conto que envolve vários espaços. Museus, galerias,
… para passear
A cidade romana
de Eburobrittium,
que se acredita
tenha sido fundada
no século i a. C. ,
é uma das atrações
turísticas a conhecer
? TRADIÇÃO
Com nove
milhões de euros
de receitas do
turismo em 2013,
Óbidos só fica
atrás de Ourém
(Fátima) na
região Centro
ROTEIRO
EM
24 HORAS
09H30
Passear
no castelo,
muralha
e todo
o casario.
Passado medieval
O Mercado Medieval de Óbidos
é um dos pontos de interesse e o
palco da recriação histórica que
se organiza, em julho, há 14 anos.
A origem do castelo remonta ao
período romano ou aos castros
lusitanos, e foi conquistado por
D. Afonso Henriques em 1148.
Ginjinha
A criação deste licor ancestral
data de há muitos séculos, talvez
na Ásia, e acredita-se que a sua
origem se deva a fins medicinais.
As ginjas cultivadas no Oeste,
sobretudo no concelho de Óbidos,
são consideradas as melhores
da Europa.
Ligações úteis
cm-obidos.pt
vilaliteraria.com
facebook.com/vlobidos
facebook.com/
mercadobiologicodeobidos
mercado biológico, igreja, antigo edifício dos Correios, tudo está imbuído do
novo espírito literário. São milhares
e milhares de livros disponíveis (cerca de 170 mil títulos), em várias áreas
e em diferentes línguas, e muitos deles não se encontram com facilidade no mercado livreiro convencional.
A ideia embrionária surgiu com a ne-
cessidade urgente de requalificar a igreja de S. Tiago, uma construção do século xii, tendo-se decidido transformá-la
numa majestosa livraria. Mas, porquê
ficar apenas por aí? Desafiado a entrar
no projeto, José Pinho, responsável pela Ler Devagar, editora presente na LX
Factory, em Lisboa, sugeriu a criação
de uma rede de livrarias que transformassem a vila num original espaço de
procura literária. Existem já dez locais
reconvertidos e o Festival Internacional
de Literatura de Óbidos (FOLIO), que
acontecerá na segunda metade de outubro, é a nova coqueluche da vila.
11H00
Visitar
museus ou
galerias.
Três boas
sugestões:
Museu
Municipal
de Óbidos,
Museu Abílio
ou Centro
de Design.
13H00
Almoçar
num dos
muitos
restaurantes
da vila.
Esplanadas
não faltam.
16H00
Caminhar
na ecovia
na margem
da lagoa de
Óbidos até
às praias.
19H00
Terminar o
dia num dos
muitos bares
da vila.
12H00
Relaxar entre
livros. Pode
começar
na Livraria
da Adega
e terminar
na Livraria
Santigo, na
Igreja de
S. Tiago, junto
ao castelo.
14H30
Dar um salto
à lagoa de
Óbidos. Pode
andar de
barco, fazer
stand up
paddle ou
SUP Yoga.
17H00
Visitar a
fábrica
de ginja,
Frutóbidos,
onde ficará
a conhecer
a história
deste licor.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
4
a minha vida
PASSEIOS COM HISTÓRIA
RUÍNAS DE TROIA
HISTÓRIAS
DE PEIXE E SAL
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TROIA ACOLHEU
DURANTE SÉCULOS
UM COMPLEXO
INDUSTRIAL
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MONTEPIO PRIMAVERA 2015
À chegada às ruínas, ouve-se
apenas o vento nos pinheiros,
o marulhar das águas da lagoa,
o piar de uma ave e talvez o motor
de um barco a passar ao longe.
Há 2 000 anos, com 25 oficinas
de salga a funcionarem e 1 500
pessoas a trabalharem, o ambiente
seria muito diferente. Hoje é um
local sereno que já fervilhou com
a atividade de um dos principais
centros de produção conserveira
do Império Romano.
A visita começa pelas oficinas de salga.
As primeiras organizam-se em torno
de um pátio lajeado e, um pouco mais à
frente, surgem tanques mais pequenos.
Como refere Inês Vaz Pinto, investigadora responsável pelas visitas, este tipo
de divisão corresponde a fases diferentes da exploração. “Houve uma primeira fase da produção, entre o século i e
o século ii, em que as oficinas funcionavam num espaço único em torno de
um pátio central. Mais tarde, tanto a
oficina como o pátio foram divididos
em divisões mais pequenas”, explica.
Tal como hoje, também na época a sardinha era um peixe popular por estas
paragens. Os resíduos encontrados no
fundo dos tanques revelam que esta era
a principal espécie usada nas conservas, seguida da cavala e do carapau.
Além das conservas de peixe, as salgas
também produziam molhos. “Os peixes
eram postos em vasilhas, com sal às camadas, mel, vinho e ervas aromáticas,
ficando a macerar durante dois a quatro
meses. O peixe não apodrecia mas ia-se
liquefazendo, soltando um molho muito fino e apreciado no mundo romano, o
garum”, explica Inês Vaz Pinto.
rentabilização do espaço.
O caminho por entre os pinheiros conduz até à chamada Rua da Princesa,
cujo nome advém do facto de ter sido
escavada a mando de D. Maria I, ainda princesa, no século xviii. “As cidades de Pompeia e Herculano tinham
sido descobertas há pouco tempo e a
arqueologia estava na moda”, salienta
Inês Vaz Pinto. As escavações puseram
a descoberto uma casa familiar que, na
altura, devia erguer-se em dois andares
e onde uma placa com o nome Lucius
Cornelius Bocchus pode indicar uma
ligação das salgas a uma das famílias
mais importantes de Alcácer do Sal.
O terreno ondula suavemente até à
água, sendo a forma das dunas reveladora dos muitos edifícios que ainda se
escondem sob a areia.
De volta à entrada é ainda possível ver
as termas, onde a fornalha, o poço de
captação, o frigidarium (parte dos banhos frios) e o caldarium (zona aquecida) são perfeitamente identificáveis.
Locais de culto
A visita guiada inclui ainda a basílica
paleocristã do século iv e v. Como o
edifício não está ainda totalmente recuperado e beneficiado, só nas visitas
marcadas é possível apreciar os frescos
que decoram as paredes, bem como as
chamadas sepulturas de mesa.
Mesmo depois do fecho das salgas
o local permaneceu habitado até ao
século VI. Não se sabe ao certo o que
levou ao abandono do local, mas um
ditado popular de Setúbal pode dar
algumas pistas que remetem para o
degradar das condições naturais. Diz
o povo: “Grande peixe é a baleia que
no mar se criou, 30 dias choveu areia
quando Troia se arrasou.”
4
a minha vida
XXXXXXXXXXXXX
xxxxxxxxxxxxx
HISTÓRIA
Apogeu e morte
de um polo industrial
A exploração da unidade de salga
e conservas de peixe que existiu
na então ilha de Ácala – hoje parte
da península de Troia – durou entre
o segundo quartel do século i
e a primeira metade do século v.
A produção foi interrompida no final
do século ii, eventualmente devido
a um período de intensa crise
económica. As salgas voltaram
ao ativo no início do século iii
permanecendo em laboração por
mais dois séculos.
Com o tempo as ruínas foram
sendo cobertas de areia, mas nunca
totalmente, e permaneceram assim
na memória popular e nos registos
históricos. São monumento nacional
desde 1910.
Condições especiais
^ Isenção de pagamento de entrada
nas ruínas romanas;
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nos ferry boats da Atlantic Ferries
(na tarifa “viaturas Classe A”).
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A vida doméstica
Um pouco mais à frente ergue-se o edifício do mausoléu que acolhia diferentes tipos de rituais funerários: cremações, em nichos nas paredes, e inumações, no chão. Por trás do mausoléu,
uma elevação no terreno já teve diversos usos: oficina de salga, lixeira e cemitério, uma prova da necessidade de
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
79
4
a minha vida
CRÓNICA
BAPTISTA-BASTOS
SAMUEL,
DIAS
VULGARES
Samuel levantou-se mais cedo, como todas as sextas-feiras.
Arranjou-se com esmero. Às sextas-feiras encontra-se
com dois amigos para, no Jardim da Estrela, fazer uma partida
de cartas, numa mesa de pedra, reservada para isso. São quatro
jogadores eméritos e a sua fama alargou-se para outros bairros,
fazendo reunir uma pequena multidão em trono da mesa.
80
Samuel tem este nome em homenagem a um
miúdo judeu, do gueto de Varsóvia, celebrizado numa fotografia quando mostra, no braço
esquelético, o número de prisioneiro. O pai de
Samuel impressionou-se de tal forma com a
fotografia do miúdo judeu, assustado e desamparado, que baptizou o filho com o nome do outro.
Samuel gosta muito do nome e de contar as
origens dele. E conseguiu, numa antiga imagem de revista, obter a foto do miúdo, recortá-la e colocá-la numa moldura que ainda tem.
O jogo de bisca dos nove mantém-se há um ror
de anos. Dos seus outros parceiros dois foram,
como ele tipógrafos, um trabalhou numa fábrica de estampagem e o quarto era cangalheiro.
Antes do jogo, almoçam os quatro numa taberna de galegos, como eles velhos, ali para
Alcântara. Quase sempre é um cozido à portuguesa, vinho tinto e, no final, uma bagaceira.
Conversam ainda um bocado e, depois, a pé,
“para esmoer”, como dizem, dirigem-se para o
Jardim da Estrela, onde já os espera um grupo
de espectadores. Gostam do convívio semanal
e de ter mirones a observá-los.
Samuel põe gravata, penteia-se cuidadosamente e passa um pano de feltro pelos sapatos. Quando o tempo está ruim e amea-
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
ça chuva, usa chapéu castanho e gabardina.
Coloca o chapéu levemente inclinado para a esquerda, olha para o retrato da mulher, que morreu há pouco tempo, manda-lhe um beijo com os
dedos, e lá vai ele.
Gosta muito de caminhar, embora já sinta
certa dificuldade com um problema de circulação nas pernas. Porém não desiste. Pára algumas vezes, para descansar, até à paragem
do eléctrico que fica perto da taberna dos galegos velhos.
Os largos e as ruas, agora, estão praticamente vazios de miúdos. Apreciava vê-los,
a jogar à bola e em outras brincadeiras. Explicaram-lhe que os tempos são outros, como se ele
o não soubesse, e os miúdos ficam mais tempo
nas escolas, porque as mães trabalham fora, ou
estão com tablets, nas casas de uns e de outros,
a fazer jogos ou a ver filmes sob a vigilância
distraída das avós.
Tem três filhos, dois no Canadá e um em
Angola. Raramente lhe escrevem, e a saudade
vai esmaecendo-se. Tem pena que isso aconteça, mas a vida tem destas ciladas.
NOTA: O autor continua a escrever segundo
a chamada norma antiga.
MONTEPIO PRIMAVERA 2014
4
a minha vida
TESTEMUNHO
82
perguntas a...
MIGUEL ARAÚJO
Foram Os Azeitonas que revelaram o talento de Miguel Araújo, mas as composições
Esta entrevista foi realizada seguindo
do artista portuense são hoje cantadas por outros músicos portugueses, como
as premissas do famoso Questionário de Proust,
António Zambujo e Ana Moura.
que pretende refletir a personalidade do
No seu trajeto musical, o autor do single “Os Maridos das Outras” do álbum
entrevistado. O nome e popularidade deste
Cinco Dias e Meio, o primeiro em nome próprio, conta com parcerias com
questionário estão relacionados com as respostas
Nuno Markl e João Só. O ano de 2014 foi a consagração e levou-o aos palcos
dadas pelo escritor francês Marcel Proust.
do país com o apoio do Montepio.
Qual a figura histórica com quem
mais se identifica?
Identificar não, mas ambicionar
identificar-me: Inácio de Loyola.
Qual o seu maior medo?
Fantasmas.
Qual a sua ideia de felicidade
perfeita?
A felicidade de uma ideia feita.
Qual o seu maior feito?
Cantar em público.
Se morresse e ressuscitasse
como uma pessoa ou animal,
qual escolheria ser?
Não quereria nada disso, queria ir
diretamente para Além.
Quem são os seus heróis na vida real?
Jesus e os apóstolos.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
O que aprecia mais nos seus amigos
e família?
A companhia.
Se pudesse mudar algo em si, o que seria?
O sistema respiratório.
Qual o seu realizador favorito?
Não sou fã de cinema.
Qual o seu músico favorito?
Chico Buarque.
O MEU MONTEPIO
NOTÍCIAS INSTITUCIONAIS,
INICIATIVAS,
PROJETOS E COMUNICADOS
página 84
página 85
página 86
página 88
Os colaboradores Montepio
fazem a diferença.
O dia 15 de maio marcou
a agenda do Grupo e, mais
uma vez, a solidariedade
chegou a todo o país
Saiba como vai ser
a 3ª edição da Corrida
Montepio. Não deixe de
participar num evento que
junta a solidariedade a um
estilo de vida saudável
Invista em si e na sua
família com os descontos
e benefícios para
associados. Destaque para
um passatempo Repsol
que pode levá-lo a viajar
Não perca todas
as atividades
e iniciativas que
desenvolvemos
este trimestre para
os associados Montepio
VOLUNTARIADO
INICIATIVA
DESCONTOS
AGENDA
5
o meu montepio
SOLIDARIEDADE
DIA DO VOLUNTARIADO
SER SOLIDÁRIO
A 15 DE MAIO REALIZOU-SE
A TERCEIRA EDIÇÃO DO DIA
DO VOLUNTARIADO MONTEPIO.
A INICIATIVA CONTOU COM 400
COLABORADORES-VOLUNTÁRIOS
E INTERVENÇÕES EM 23
INSTITUIÇÕES DO PAÍS, INCLUINDO
AS REGIÕES AUTÓNOMAS
DA MADEIRA E DOS AÇORES
fotografia luís viegas
84
Um mar de solidariedade inundou
Portugal. E foi o Montepio que trouxe
essa força. No dia 15 de maio, 400 colaboradores demonstraram o seu empenho na concretização dos valores
de solidariedade e entreajuda, numa
ação de voluntariado corporativo sem
precedentes, uma das maiores realizadas em Portugal. Pela primeira vez
na história das ações de voluntariado
do Montepio estiveram envolvidas as
regiões do Alentejo, Açores e Madeira, num dia que ajudou a melhorar o
futuro de 23 instituições de dimensão
social, ambiental, cultural e ecológica.
Marcaram presença os administradores Pedro Almeida Ribeiro e Carlos
Beato, demonstrando que o voluntariado e o dever de cidadania são prerrogativas transversais a todo o Grupo
Montepio. Paula Guimarães, diretora do Gabinete de Responsabilidade
Social da Instituição, reiterou que “o
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Montepio tem como objetivo sensibilizar, valorizar e incentivar as práticas de voluntariado e contribuir para
a coesão social e disseminação da solidariedade pela comunidade.” A responsável refere que esta é uma das 60
ações levadas a cabo durante o ano pelos cerca de 1 300 voluntários do Grupo, representando 38% dos colaboradores no ativo e incluindo ainda colaboradores aposentados, promotores
comerciais e colaboradores de empresas que integram a cadeia de valor do
Grupo.
Carlos Beato, presente numa ação
na Mata da Machada, no distrito de
Setúbal, referiu que “no Montepio, as
palavras são iguais às atitudes e esta
é a prova que somos fortes e coesos,
que sabemos o que queremos e para
onde vamos. É a prova que acreditamos que, juntos, faremos sempre mais
e faremos sempre melhor”.
“É a prova
que acreditamos que, juntos,
faremos sempre mais e faremos
sempre melhor”.
Carlos Beato
Administrador da Associação
Mutualista Montepio
BENEFICIÁRIOS
Instituições
que o Montepio
apoiou
REGIÃO NORTE E GRANDE
PORTO
^Vila Verde, Habitat for
Humanity
^Barcelos, Casa da Saúde
de São João de Deus
^Braga, Serve the City
^Porto, Centro Social da Sé
Catedral do Porto
^Gaia, Parque Biológico de Gaia
^Porto, Sociedade Protetora
dos Animais
^Porto, Serve the City
(2 ações)
REGIÃO CENTRO
^Guarda, Associação Cultural
Social Freguesia de Panóias
^Buçaco, Mata da Buçaco
REGIÃO LISBOA
E GRANDE LISBOA
^Sintra, Casa de Saúde
do Telhal
^Sintra, CERCITOP
^Mafra, Patas Felizes
^Cascais / Sintra, Cascais
Ambiente
^Lisboa, Serve the City
^Sintra, CECD
^Sintra, Associação Korin
REGIÃO SUL
^Évora, CerciDiana
^Coina, Mata da Machada
^Setúbal, O Cantinho da Milú
^Monte das Pitas, Centro de
Lazer Montepio
REGIÕES AUTÓNOMAS
DA MADEIRA E DOS AÇORES
^Funchal, Casa do Voluntariado
^São Miguel, Lar Mãe de Deus
3.a Corrida Montepio
No próximo dia 25 de outubro,
Dia Nacional do Mutualismo,
milhares de portugueses
vão fazer da baixa pombalina
uma pista solidária,
na 3.a Corrida Montepio.
Reserve já o seu lugar.
Depois de uma participação recorde
superior a 10 mil pessoas na última
edição, 25 de outubro é o dia marcado para a 3.a Corrida Montepio.
Todos estão convidados a participar nesta celebração da solidariedade, do bem-estar e da vida saudável. Estarão disponíveis dois percursos: corrida (10 km) e caminhada (5
km). Ambos terão partida na Praça D. Pedro IV (Rossio) e a linha da
meta na Praça do Comércio. No caso da prova de meio-fundo, o percurso vai conduzir os atletas para junto
do Centro de Congressos de Lisboa
para depois retornarem pela Avenida
24 de Julho até à meta. Os participantes na caminhada vão ter pela frente um percurso que vai levá-los até
à Estação de Santa Apolónia e de volta
até à Praça do Comércio. As crianças
também vão poder participar em provas por escalão etário e em atividades
lúdicas com a marca Clube Pelicas.
O valor da inscrição de cada participante na 3.a Corrida Montepio reverte
^ CORRER
POR UMA
CAUSA
O Montepio
faz do
exercício um
convite à
solidariedade
para a Liga Portuguesa Contra o Cancro, transformando este evento numa
importante ação de solidariedade nacional. O ano passado foram reunidos
55 mil euros aplicados no apoio a crianças com necessidades. Contribua com
a sua presença para um futuro melhor.
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
85
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E BENEFÍCIOS
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na indústria da iluminação desde
a invenção da luz elétrica. Esta
tecnologia permite poupar nos
consumos e reduzir a produção
de calor, a emissão de CO2 e a
quantidade de material de difícil
reciclagem. Como principais
benefícios destaca-se a garantia
de 2 a 5 anos destes produtos, uma
poupança de energia superior a 80%,
um ciclo de vida útil entre 30 000 e
50 000 horas, uma elevada eficiência
(superior aos 80 Lm/W) e um feixe de
360° para as lâmpadas esféricas e de
86
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aos produtos comercializados através
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pós-laborais, 350€; mestrados,
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pedestres, BTT e de comboio (circuito
ou visita completa de comboio) e nas
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MONTEPIO PRIMAVERA 2015
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MONTEPIO PRIMAVERA 2015
87
AGENDA
ATIVIDADES EXCLUSIVAS
DA ASSOCIAÇÃO
MUTUALISTA MONTEPIO
25
JULHO
CRUZEIRO DAS
6 PONTES
NÃO PERCA PASSEIOS, ATIVIDADES
AO AR LIVRE, CURSOS, VISITAS
ORIENTADAS OU WORKSHOPS
CRIADOS A PENSAR EM SI E NA SUA
FAMÍLIA. MARQUE NA AGENDA,
RESERVE O DIA E INSCREVA-SE
PARA UMAS HORAS OU UM DIA BEM
PASSADOS
VISITA ORIENTADA
DIA 18 |
JULHO
10h | LISBOA
LISBOA 1886
G
ratuito
FÁBRICA A.M.A.R.
22 29
E
JULHO
SUNSET
NAS RUÍNAS
DE TROIA
PASSEIO COM HISTÓRIA
DIA 18 |
10h | PORTO
VISITA ORIENTADA
DE FRADES E SEREIAS”,
DIA 25 |
COM JOEL CLETO
VISITA GUIADA TEATRALIZADA – MUSEU
6
,5 € (do Lordelo à Afurada,
travessia de barco +1€)
DIA 18 |
15h | LISBOA
CONVENTO DOS CARDAES
4
€, 3,5€ para maiores de 65 anos,
gratuito até aos 10 anos
VISITA ORIENTADA
DIA 18 |
15h | PENAFIEL
QUINTA DA AVELEDA
5
€ (gratuito até 6 anos, inclusive)
AR LIVRE
1Oh | LISBOA
MEGA CIRCUITO DE ARBORISMO,
CANOAGEM E MINI-GOLFE
1 2€ (receção de participantes a partir
das 8h00)
AR LIVRE
9h | MONCHIQUE
ROTA DA ÁGUA - FONTE SANTA
DA MALHADA QUENTE
1 2,5€ ou 24,5€ (caminhada + almoço)
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
Gratuito
“UMA CASCATA E LENDAS
VISITA ORIENTADA
DIA 18 |
DIA 24 | 10h | VILA
DO CONDE
KAYAKS – NELO
88
DIA 16 |
VISITA ORIENTADA
10h | MATOSINHOS
DA QUINTA DE SANTIAGO
3€, gratuito até aos 3 anos
VISITA ORIENTADA
DIA 25 |
17h | PORTO
CRUZEIRO DAS 6 PONTES
Gratuito até aos 10 anos,
11,5€ adultos
AR LIVRE
DIA 26 |
PORTO
10h |
PASSEIO DE KAYAK
18,5€
AR LIVRE
DIA 19 |
10h30 | OLHÃO
CRUZEIRO COM ALMOÇO
NA RIA FORMOSA
4
0€
SUNSET
DIA 22 E 29 |
18h | TROIA
SUNSET NAS RUÍNAS
DE TROIA
G
ratuito
26
JULHO
PASSEIO DE KAYAK
16
AGOSTO
PASSEIO COM HISTÓRIA NO
PARQUE EDUARDO VII
PASSEIO COM HISTÓRIA
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“FRANCISCANOS, PIRATAS E NAZIS”,
COM JOEL CLETO. DA BOA NOVA
À MEMÓRIA PELOS PASSADIÇOS
CRUZEIRO NO TEJO – CAIS DA ROCHA
CONDE DE ÓBIDOS
DIA 8 |
AGOSTO
10h | MATOSINHOS
6
,5€
WORKSHOP
DIA 8 |
VISITA
AO SANTUÁRIO
E CRISTO REI
16h | MONTALEGRE/PISÕES
BARRAGEM DO ALTO RABAGÃO
G
ratuito
DIA 1 |
9h | ALBUFEIRA
MUSEU E CENTRO HISTÓRICO
DE ALBUFEIRA
2
,5€
AR LIVRE
DIA 1 |
10h | ILHA TERCEIRA
G
ratuito
VISITA ORIENTADA
16h | SAGRES
FAROL DO CABO DE S. VICENTE
G
ratuito
VISITA ORIENTADA
DIA 2 |
9h | SILVES
CASTELO DE SILVES E MUSEU
7
,5€
VISITA ORIENTADA
DIA 6 |
15h | ALMADA
SANTUÁRIO E CRISTO REI
3
,5€, gratuito < 7 anos,
2,5€ dos 8 aos 13 anos
AR LIVRE
DIA 8 | 9h | SERRA
DE MONCHIQUE
ROTA DA FONTE SANTA
– FORNALHA, ALFERCE
1 2,5€ ou 24,5€ (caminhada + almoço)
DIA 22 | 10h | VILA NOVA
DE FAMALICÃO
Gratuito
15h | PORTO
3
€
DIA 9 |
VISITA ORIENTADA
PARQUE DA DEVESA
TORRE DOS CLÉRIGOS
– (VISITA GUIADA À TORRE + EDIFÍCIO)
AR LIVRE
VISITA AO NAVIO-ESCOLA SAGRES
– PRAIA DA VITÓRIA
DIA 1 |
DIA 8 |
10h | LISBOA
Gratuito
VISITA ORIENTADA
PASSEIO COM HISTÓRIA
gratuito até aos 3 anos
PARQUE EDUARDO VII
VISITA ORIENTADA
DIA 8 |
15€, 7,5€ dos 3 aos 12 anos,
DIA 16 |
G
ratuito
6
15h | LISBOA
PASSEIO COM HISTÓRIA
10h | VIDAGO
INICIAÇÃO AO GOLFE
AGOSTO
DIA 15 |
VISITA ORIENTADA
DIA 22 |
14h30 | ÁGUEDA
MUSEU NACIONAL FERROVIÁRIO
– NÚCLEO DE MACINHATA DO VOUGA
Gratuito < 14 anos, 1€ dos 15 aos
10h | COMPORTA
PASSEIO DE KAYAK NA VALA REAL
8€
VISITA ORIENTADA
DIA 29 |
VISITA ORIENTADA
DIA 14 |
15h | LISBOA
GALERIA SUBTERRÂNEA – CASA DO
REGISTO/SÃO PEDRO DE ALCÂNTARA
(1 600 M)
5
€ adultos, 2,5€ estudantes,
gratuito até aos 12 anos
9h30 | RIO MAIOR
ROTA DE TURISMO SOLIDÁRIO
– COOPERATIVA TERRA CHÃ
“ROTA DO SAL E DO VENTO”
20,5€
VISITA ORIENTADA
DIA 30 |
10h30 | MAFRA
ABRIGO DO BURRO – BURRICADAS
VISITA ORIENTADA
DIA 15 |
25 anos, 2€ > 25 até 65 anos,
1€ > 65 anos
10H30 |ÁGUAS DE MOURA
CAVES ERMELINDA FREITAS
VISITA ÀS INSTALAÇÕES MAIS
PROVA DE VINHOS
4€
VISITA ORIENTADA
DIA 30 |
15h | PORTO
WORLD OF DISCOVERIES
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8€, 6€ dos 4 aos 12 anos,
gratuito até aos 3 anos
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www.montepio.org
Informações e inscrições
Gabinete de Dinamização Associativa
[email protected]
T. 213 249 230/1
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
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AGENDA
UM ESPAÇO
PARA PENSAR E AGIR
COM UMA AGENDA DINÂMICA,
O ATMOSFERA M, AGORA TAMBÉM
EM LISBOA, CONTINUA A APOSTAR
EM EVENTOS CULTURAIS, FORMAÇÃO
E TERTÚLIAS, DINAMIZANDO UM
ESPAÇO DE CIDADANIA
E CULTURA CONCEBIDO PARA
USUFRUTO DOS ASSOCIADOS
MONTEPIO, RESPETIVAS FAMÍLIAS
E TODA A COMUNIDADE
Sabia que...
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As atividades permanentes de que
os associados Montepio poderão
usufruir são:
f BookCrossing
f Clube de leitura
f Formações e cursos livres
f Atividades do Clube Pelicas
FINS DE SEMANA PAIS E FILHOS
f Hora do Conto
f Oficinas de escrita criativa
f FilhoSofia
f Atelier de ilustração infantil
f Filminhos à solta pelo País
JULHO E AGOSTO
PORTO
Ao longo destes dois meses, o espaço de
exposições do Porto acolhe os trabalhos
de Pintura dos alunos da Academia
Intergeracional Rutis – atmosfera m.
Uma seleção de obras dos 15 alunos e
professores das duas turmas de 2014/2015.
LISBOA
A Sociedade Portuguesa de Autores
promove uma homenagem ao artista
plástico e cenógrafo António Casimiro,
numa retrospetiva com obras do
autor; inclui desenhos e esboços de
cenários para televisão, cinema e teatro.
Pinturas e alguns documentos pessoais
completam esta mostra.
FORMAÇÃO
Aprender sem idade
Em setembro regressa a Academia
Intergeracional, em parceria com
a RUTIS, no Porto e em Lisboa.
Disciplinas como Envelhecimento
Ativo, Alimentação, Yoga, Informática,
Línguas, vão fazer parte da proposta
para o ano letivo 2015/2016.
Inscreva-se através dos e-mails:
[email protected] e [email protected]
^ ANTÓNIO CASIMIRO
é o artista em destaque,
nos meses de julho
e agosto, no espaço
de Lisboa
PORTO/LISBOA
PERMANENTE: BOOKCROSSING
Desde o dia em que se celebrou o
aniversário deste projeto internacional
– 23 de abril – os espaços atmosfera m
Porto e Lisboa passaram a ser pontos
oficiais de troca de livros; várias
dezenas de exemplares já viajaram
pelas mãos dos nossos visitantes,
encontrando novos destinos.
TOASTMASTERS CLUB
O Clube internacional de Comunicação
e Formação de Líderes escolheu os
espaços atmosfera m para abrir,
respetivamente, o Invicta Toastmasters
Club e Leadership Toastmasters Club.
Todos estão convidados a entrar,
pensar e… comunicar!
FINS DE SEMANA
Ao sábado há sempre uma atividade a
pensar nos mais novos: escrita criativa,
ilustração, filosofia, teatro, filmes
ou oficinas de brinquedos e xadrez
prenchem já as agendas dos visitantes
mais jovens.
ESPERAMOS POR SI
Mais
informações
sobre as atividades
dos atmostera m
em
www.montepio.pt/
atmosferam
PORTO | Rua Júlio Dinis, n.° 158/160 | contactos T.: 220 004 270 e-mail [email protected] |
horário Segunda-feira a sábado, das 9h30 às 19h30 (Biblioteca das 13h00 às 19h00) |
Encerrado aos domingos e feriados
LISBOA | Rua Castilho, n.° 5 | contactos T.: 210 002 730 e-mail [email protected] |
horário Segunda-feira a sexta, das 9h00 às 19h00 | Sábados, das 11h00 às 17h00 | Encerrado aos domingos
e feriados
Horário de agosto Segunda-feira a sexta, das 9h00 às 17h00
MONTEPIO PRIMAVERA 2015
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