PIB E OS DONOS PATRIMÓNIO OUTROS DAS CIDADES Com MUNDIAL Os caminhos alternativos Portugal tem cidades o Cante Alentejano a um indicador que tem dominado a economia e os economistas que são uma referência nos orçamentos participativos do mundo em destaque, o que leva o património a ter o selo da UNESCO? Primavera 2015 Trimestral €1 montepio CULTURA KALAF É UM DOS PROTAGONISTAS DO NOVO GUIÃO CULTURAL QUE SE ESCREVE NO PAÍS. UM ENREDO DE DIFERENTES EXPRESSÕES QUE TRANSPIRA ARTE NA ESCRITA, NA MÚSICA E NA RUA número 17 série ii PUB #17 SUMÁRIO PRIMAVERA 2015 @0 Entrevista Vhils, o "incontornável" @6 Kalaf Ângelo His ADE CI D HA IN 80 74 M 82 O MEU M ONT EP IO To do sq à ue te rem À rr a m os se ed r ú id nic a os Gostos não se Mod discut em, ex a portam -se 06 90 84 86 88 Re gr es sa r Sta INHA EC A MI O ON 56 AM 60 76 A ^4 Descodificador O mundo num barril 40 78 Orç a Par mento tici s pa par rtic par ipat a ivos con Ca f i a Ta lç r pe ad ça a ria s de pe dr a s rão cio de ve gó Ne rtups 68 Cidades para pedalar A ão igraç Exercício ID Em , da vista Longe ha conta perto da min &2 V 4 32 46 ica Crón os t a -B s a tista ri ó t Bap His Troia m e s co sd ems seio mana s iagbido a P o v r s e Ó de ína od Ru da rn e e d ri Ca op r P a s Fr lore F 52 raújo Miguel A A NH A MI 10 perguntas 5 38 Dia do Voluntariad o Montepio M EU M U 1 ita o a ic co M n ó cis Cr n DO ciado s O 32 N or Ag tu ga en da ln A o tm Ag m o e un sfe nd exc aA lusi ra do vas m tiv ida da A Des d sso con ciaç es tos ão e be nefí cios para asso Iniciativ a 22 anh P 16 ana Urb a Arte o da ru Pa er a eg ot Pr Gl oc al m o ta al la d di a a te un tur Um M fu io ia ón mór m e m tri 10 Esc tórias reve r: Po rqu ê? P Ob ara quê s Há er ? vi va da tó alé rio m do PI B? O agitador tranquilo COLABORADORES PÁG. 20 PÁG. 22 PÁG. 26 Nesta edição... Conheça alguns temas da próxima edição Vhils Lídia Jorge Kalaf Reportagem Artista plástico Escritora Escritor e músico Começou com graffitis e agora utiliza explosivos para esculpir rostos Um dia afirmou que a escrita é mais importante do que a vida. Lídia Jorge nunca Em Lisboa tornou-se um homem do mundo e hoje vive do seu poder de observação, com dezenas de metros de diâmetro. Vhils é um artista com convicções que quando cria, gosta de "perder o pé" e reinventar-se diariamente. Olha para o sucesso de soslaio e prefere concentrar-se no próximo trabalho. soube ser outra coisa e conta-nos o início do seu percurso literário desde os tempos da faculdade. Já Afonso Cruz iniciou a sua relação com a escrita mais tarde, mas partilha a mesma paixão pelo ofício da escrita. simplesmente acutilante. Apaixonado por design, o músico que não sabe dançar, dá ritmo aos temas dos Buraka Som Sistema com as suas palavras. Kalaf não resiste a contar uma boa história e a Montepio conta-lhe a sua. propriedade #17 Montepio Geral – Associação Mutualista, Rua do Ouro, 219-241 1100-062 Lisboa Tel. 213 249 540 série ii PRIMAVERA 2015 diretor António Tomás Correia -adjunto Rita Pinho Branco diretor coordenação Esta revista foi redigida ao abrigo do novo Acordo Ortográfico Gabinete de Relações Públicas Institucionais p r o d u ç ã o e a r t e f i n a l Ana Miranda e Pedro Pinguinha c o l a b o r a ç õ e s Ana Sofia Calaça, António Ramalho Eanes, Baptista-Bastos, Cristina Almeida, Eudora Ribeiro, Francisco Moita Flores, Helena C. Peralta, Helena Viegas, Maria Abreu, Marisa Vitorino Figueiredo, Rita Vaz da Silva, Sara Raquel Silva, Susana Torrão (texto), Artur, Augusto Brázio, Gonçalo F. Santos, João Cupertino, Luís Viegas, Sílvia Lopes e Vera Marmelo (fotografia), Ana Seixas (ilustração) ^ ESCOLHER SABORES Quem define os sabores dos mais importantes produtos portugueses? Mostramos-lhe os rostos dos homens e mulheres que fazem do palato uma arte. Empreendedorismo ^ ÁGUA NA BOCA Conheça três startups com muita garra que lhe vão estimular o paladar. Tendência ^ SUPER-HERÓIS Na vida real, há portugueses que fazem da melhoria da nossa vida a sua missão. Descubra o património do nosso País O Cante Alentejano foi o último bem a ser considerado Património Imaterial da Humanidade. Portugal já contava com o Fado e com a Dieta Mediterrânica nesta categoria, além de 15 locais classificados como Património Material da Humanidade. p u b l i c i d a d e editor Plot - Content Agency Av. Conselheiro Fernando de Sousa, 19, 6º, 1070-072 Lisboa Tel. 213 804 010 d i r e t o r a d e p r o j e t o Catarina Carneiro e d i t o r c h e f e e d i t o r e x e c u t i v o Nuno Alexandre Silva Certificado PEFC Este produto tem origem em florestas com gestão florestal sustentável e fontes controladas PEFC/13-31-011 www.pefc.org MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Miguel Ferreira da Silva d i r e t o r a Inês Reis d e s i g n d e a r t e Rita Barata Feyo, Sónia Garcia, João Caetano e Maria João Aires Filipa D' Avillez (917 967 472) Sónia Vigário (913 038 491) Tel. 213 804 010 | Fax 213 804 011 i m p r e s s ã o LiderGraf Sustainable Printing Rua do Galhano, 15 (E N 13), Árvore 4480-089 Vila do Conde | Revista trimestral | Depósito Legal nº 5673/84 | Publicação periódica | registada sob o nº 120133 t i r a g e m 465 300 exemplares O Montepio é alheio ao conteúdo da publicidade externa. A sua exatidão e/ou veracidade é da responsabilidade exclusiva dos anunciantes e empresas publicitárias. Aceite o desafio, participe na próxima edição e envie-nos as suas sugestões e comentários para [email protected] ou, se preferir, para Revista Montepio, Gabinete de Relações Públicas Institucionais, Rua General Firmino Miguel, 5, Torre 1, 7º, 1600-100 Lisboa EDITORIAL A confiança numa ideia A história do Montepio é a história de uma boa ideia. O triunfo da solidariedade e a afirmação da entreajuda. A dimensão prática de quem não se resigna a um “cândido” otimismo. Um conforto certo nos momentos de incerteza. Mas a história do Montepio sempre foi, na sua essência, uma história de pessoas. Quando pagámos a primeira pensão de viuvez, em 1842. Quando contratámos o primeiro colaborador, em 1844. Ou quando atingimos os 1 000 associados, em 1861. Aos 175 anos de vida partilhamos a boa ideia de previdência social com 650 mil associados que dão força ao Montepio para continuar a fazer o que sempre fez: proteger poupanças. Garantir o presente e o futuro. Sabemos como, erradamente, somos vistos como um Banco quando, na verdade, somos uma associação mutualista – a maior de Portugal –, detida por 650 mil associados. Comparar com outras organizações é não reparar no caminho de cada um dos nossos associados, nos seus desafios diários, nas suas preocupações, no seu presente e no futuro. É esquecer uma história de confiança que se transmite de gerações em gerações, partilhada no seio de milhares de famílias portuguesas e que é o garante de uma associação que foi a segurança social de muitos portugueses antes mesmo de existir um sistema público de previdência. Por isso, obrigado aos 650 mil associados que depositam a sua confiança no Montepio. Que partilham, juntos, um caminho e que todos os dias alimentam a ideia da cidadania ativa, do associativismo e da construção de um melhor Portugal. O Montepio não é a história de uma vida. É a história de muitas vidas. 650 mil que todos os dias estimulam os 5 200 colaboradores deste Grupo. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 GLOCAL OS NOSSOS ANTEPASSADOS EMBARCARAM HÁ MAIS DE 500 ANOS NUMA AVENTURA CHAMADA DESCOBRIMENTOS. PELO CAMINHO, DERAM “NOVOS MUNDOS AO MUNDO”, TORNANDO GLOBAL ESTA “ESTRANHA FORMA DE VIDA”, QUE DÁ NOME AO SENTIMENTO SAUDADE E TEM COMO LAR UM PEQUENO (GIGANTE) PAÍS NA EXTREMIDADE OCIDENTAL DA EUROPA 1462 Cidade Velha Cabo Verde Também conhecida como Ribeira Grande, o seu povoamento deve-se ao Infante D. Fernando, irmão do Infante D. Henrique. Primeiro posto comercial nos trópicos. 1910 Ironbound Newark, EUA Data da chegada dos primeiros imigrantes portugueses àquela cidade do Estado de Nova Jérsia. As celebrações do Dia de Portugal atraem mais de 500 mil pessoas ao bairro de Ironbound. 1535 a 1732 Cidades Históricas Brasil 1878 Ukelele São sete cidades cuja arquitetura exibe o melhor do barroco em terras do Novo Mundo: Olinda (1535), São Salvador da Bahia (1549), São Cristóvão (1590), São Luís (1615), Ouro Preto (1652), Diamantina (1713) e Goiás (1732), autênticos museus vivos da influência portuguesa. Havai, EUA 120 madeirenses chegaram ao Havai, a bordo do Priscilla, para trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar. Com eles levaram a música do cavaquinho, ou braguinha, que fez tanto sucesso que se tornou no instrumento tradicional do Havai (ukelele). 1868 Cacau do Príncipe 1807 Sotaque carioca Príncipe, São Tomé e Príncipe Rio de Janeiro, Brasil O “s” chiado e as vogais abertas do sotaque carioca são o resultado da fuga da família real portuguesa para o Rio de Janeiro. Afinal, de um dia para o outro, 15 mil portugueses invadiram a Cidade Maravilhosa. Património da Humanidade UNESCO fora de Portugal Bens de influência portuguesa Países Continentes A partir desta data foi introduzida a cultura do cacau na ilha do Príncipe. Hoje esta ilha é um dos principais produtores mundiais de cacau de Comércio Justo. EXTENSÃO GEOGRÁFICA dos patrimónios de origem portuguesa Fusos horários 23 569 Extensão total Km 1571 Sabores Nacionais Nagasaki, Japão Antes de 1418 Igreja Santa Maria de África Ceuta, Espanha Não é certo se foi mandada construir pelo conde de Arraiolos ou pelo Infante D. Henrique. A igreja alberga uma imagem do século VI oferecida pelo imperador bizantino Justino I ao governador Procópio. 1602-1640 Ruínas da Catedral de São Paulo 1510 Goa Índia Afonso de Albuquerque conquistou Goa sem sangue. Um dos mais cobiçados portos comerciais do mundo do século XVI ainda conserva a cultura portuguesa na sua matriz. Macau, China Porto fundado por jesuítas portugueses em 1571. Da região são típicos dois sabores originais da cozinha portuguesa: a tempura (fritura com polme) e o kasutera (pão-de-ló). Construída por jesuítas no século XVII, a catedral foi consumida pelo fogo em 1835, restando só a fachada. É o símbolo de Macau. 1987 Questão de Macau China É assinada a Declaração Conjunta Sino-Portuguesa sobre a Questão de Macau que reconhece a autonomia de Macau e marca a transferência de soberania para a China para dia 20 de dezembro de 1999. 1956 Luanda Angola João António de Aguiar projeta a atual cidade de Luanda para 500 mil habitantes. Atualmente é a maior capital lusófona do mundo. O novo plano diretor da cidade está a ser elaborado pelo gabinete de arquitetura Broadway Malyan. 1972-1975 Barragem de Cahora-Bassa Moçambique O maior e mais grandioso projeto dos últimos anos do colonialismo. A sua albufeira é a quarta maior de África. Fornece eletricidade a Moçambique, África do Sul e Zimbabué. 1511 Malaca Malásia 1502 a 1507 Ilha de Moçambique Mantém na sua traça elementos da arquitetura portuguesa do século XV e XVI. Mas a maior expressão lusitana está na cultura da comunidade cristang que remonta aos Descobrimentos. A presença portuguesa ainda é visível na “cidade de pedra”, paredes meias com a “cidade de macuti”, material local utilizado para a construção de casas. EXTENSÃO TEMPORAL da influência portuguesa Da Reconquista Cristã à integração de Macau na China LÍNGUA PORTUGUESA língua mais falada no mundo dialetos portugueses fora de Portugal milhões de falantes PUB O MEU MUNDO TENDÊNCIAS NA ECONOMIA, SOCIEDADE, VIDA E CULTURA página 10 PATRIMÓNIO MUNDIAL Mais de 1 000 locais e 300 tradições estão protegidos pela UNESCO. O Cante Alentejano faz, agora, parte do património português que passou a ser de todos página 16 Página 26 Página 32 A arte urbana é feita de muitos rostos. Antes catalogada como marginal, hoje é encomendada e reconhecida e são muitos os que lhe dão cor e forma nas paredes da cidade Kalaf é um dos novos rostos da elite cultural lisboeta. Quem é este tranquilo agitador de melodias e palavras que cruza a música, a escrita e o fascínio pelo design? O domínio deste indicador económico está patente nas economias e junto dos economistas. Mas são muitas as alternativas que o desafiam e que prometem comparar melhor os países TEMA DE FUNDO ENTREVISTA DESAFIAR O PIB 1 o meu mundo CULTURA PATRIMÓNIO MUNDIAL 10 PROTEGER A MEMÓRIA FUTURA SALVAGUARDAR O PATRIMÓNIO CULTURAL E NATURAL, ASSIM COMO OS BENS CULTURAIS INTANGÍVEIS, É O OBJETIVO DA UNESCO COM AS LISTAS DE PATRIMÓNIO MUNDIAL E DE PATRIMÓNIO CULTURAL IMATERIAL, QUE INCLUEM MAIS DE 1 000 LOCAIS E 300 TRADIÇÕES POR TODO O MUNDO por helena c. peralta fotografia augusto brázio “Deixámos de fazer ruínas.” É desta forma que o historiador e professor João Bonifácio Serra resume uma interessante conversa sobre as atuais preocupações relativas ao património, às cidades e à sua conservação. Antes do ainda recente cuidado com a preservação dos nossos monumentos históricos – que surgiu com mais força no final do século xix e início do século xx – o património edificado era votado ao abandono e na maior parte dos casos chegou aos nossos dias sob a forma de ruínas. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Entre as mais famosas edificações do Homem são de salientar Machu Picchu, no Peru, a Acrópole, na Grécia, Angkor, no Camboja, ou o Coliseu de Roma, em Itália. São vestígios vivos da história da Humanidade que nos ajudam a compreender o passado, quem somos e como chegámos até aqui. Se fossem conservadas em perfeitas condições muito mais nos contariam, mas, provavelmente, não teriam a mesma beleza para o nosso imaginário. A conservação do património edificado – monumentos, zonas históricas – prende-se sobretudo com a crescente importância das cidades e a sua necessidade de atrair turistas. “A ideia de classificar o património surgiu em França, no final do século xix. Valorizar os monumentos acaba por ter duplo sentido: por um lado, favorece a preservação e o seu estudo, por outro, atrai o turismo cultural. O património entrou como valorização da oferta turística das cidades e tem impacto real na economia das mesmas”, refere, a propósito, o especialista que foi consultor de como Património Mundial, Guimarães foi eleito o quarto destino mais recomendado. Responderam ao inquérito mais de um milhão de turistas, que distinguiram o Palácio de Potala, na China, como o melhor destino, seguido de a Garganta de Ironbridge, no Reino Unido, e o Palácio de Fontainebleu, em França. ? TRADIÇÃO O Cante Alentejano é de todos. Das famílias, das tabernas e dos grupos corais, como o da Casa do Povo de Serpa, na imagem Jorge Sampaio, enquanto Presidente da República, e presidente da Fundação Cidade de Guimarães. João Bonifácio Serra recorda como a distinção de Património Mundial, em 2001, foi importante para a cidade de Guimarães, tal como a honra de ser Capital Europeia da Cultura, em 2012, projeto no qual trabalhou durante mais de cinco anos. “Portugal tem uma oferta turística que assenta muito em sol e praia, mas começa a haver uma aposta cada vez maior em nichos, como o turismo de cidades, mais cultural. Com estas duas distinções Guimarães acrescentou reconhecimento enquanto importante local histórico, uma programação cultural contemporânea, importante para atrair turistas”, refere. E o berço da nação portuguesa tornou-se, em poucos anos, uma vedeta regional e um importante polo de retenção de jovens. Segundo um estudo realizado pelo portal de viagens TripAdvisor junto dos seus utilizadores, em parceria com a UNESCO, entre os 962 locais classificados à data A importância de ser Património Mundial A UNESCO, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, fundada em 1945, após a Segunda Guerra Mundial, tem como objetivo a paz e a segurança no mundo através da Educação, da Ciência e da Cultura. A área da cultura, além do estímulo à criação e criatividade e promoção da diversidade cultural, procura salvaguardar o património através da preservação de monumentos, de entidades culturais e de tradições. Pa r a t a l fo r a m a s s i n a d a s duas importantes convenções da UNESCO – são sete na área da cultura – com o intuito de preservar o património à escala mundial: a primeira, a Convenção da UNESCO para a Proteção do Património Mundial, Cultural e Natural, adotada em 1972, tem como objetivo proteger os bens patrimoniais dotados de valor universal excecional, e Portugal ratificou-a em 1980; a segunda, mais recente, MONTEPIO PRIMAVERA 2015 11 1 o meu mundo CULTURA património mundial ff O FADO A música portuguesa tem no Fado o outro grande representante cultural 12 REGRAS Critérios para a candidatura a património S ão dez os critérios da UNESCO para avaliar o valor universal excecional e que permitem que determinado património possa candidatar-se às listas representativas. Conheça-os a seguir, de forma resumida: )1 Representar uma obra-prima do génio criador do Homem )2 Testemunhar uma troca de influências consideráveis durante um certo período ou determinada área )3 Ser testemunho único ou excecional de uma tradição cultural ou civilização viva ou desaparecida )4 Constituir exemplo excecional de um tipo de construção ou de um conjunto arquitetónico ou tecnológico de uma paisagem )5 Constituir um exemplo excecional da fixação humana ou ocupação de um território tradicional, representativo de uma cultura MONTEPIO PRIMAVERA 2015 )6 Estar direta ou materialmente associado a um acontecimento ou tradições vivas, a ideias, crenças ou obras artísticas )7 Representar fenómenos naturais ou zonas de uma beleza natural e importância estética excecionais )8 Ser exemplo excecional representativo de grandes estádios da história da Terra )9 Ser exemplo excecional e representativo de processos ecológicos e biológicos em curso de evolução !0 Conter os habitats naturais mais representativos e importantes para a conservação da diversidade biológica a Convenção da UNESCO para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, assinada em 2003 e ratificada por Portugal em 2008, salvaguarda o património cultural imaterial, composto por tradições, artes, rituais, eventos festivos, saberes, conhecimentos e práticas, nomeadamente artesanato. Como refere Clara Bertrand Cabral, responsável pelas atividades da UNESCO na área da cultura em Portugal, “estas duas convenções foram muito bem aceites pelos países-membros”. A primeira foi ratificada por 191 Estados e a segunda por mais de 161. Fazer parte das listas representativas da organização é um selo de garantia do valor de determinado bem inscrito, material ou imaterial. Esta inscrição tem de ser aceite pelos diferentes países, representados em cada uma das convenções por um comité composto por um número acordado de Estados que analisam as propostas apresentadas. No caso do Património Mundial, Cultural e Natural, o Comité é composto por 21 países, com mandatos de quatro anos. Portugal foi eleito para este Comité em 2013 e vai exercer funções até 2017. Seguindo as recomendações da UNESCO, comprometeu-se a não apresentar candidaturas a Património Mundial até ao término do seu mandato. “A Comissão Nacional da UNESCO reuniu um grupo de especialistas para, até 2017, atualizar a lista indicativa de bens portugueses que podem, eventualmente, ser candidatos a Património Mundial”, explica Clara Bertrand Cabral. Neste momento, a lista do património mundial inclui 1 007 bens materiais, distribuídos um pouco por todo o mundo. Na Europa ficam 480 monumentos ou zonas naturais, na Ásia 231, na América Latina e Caraíbas 130, em África 89 e nos Estados Árabes 77. Falamos de grandes monumentos como as pirâmides de Gizé, no Egito, a Grande Muralha da China, a Estátua da Liberdade, nos Estados Unidos, LISTA No topo cultural Bens materiais e imateriais, por país, na lista da UNESCO PATRIMÓNIO MATERIAL ITÁLIA CHINA ESPANHA 50 47 44 FRANÇA ALEMANHA 39 39 ÍNDIA MÉXICO REINO UNIDO RÚSSIA EUA 32 32 28 26 22 PATRIMÓNIO IMATERIAL JAPÃO COREIA 22 17 ESPANHA CROÁCIA FRANÇA 14 14 13 MONGÓLIA TURQUIA 12 BÉLGICA ÍNDIA 12 IRÃO 12 11 10 inúmeras catedrais francesas ou Stonehenge, no Reino Unido, entre tantos outros locais de eleição. Portugal tem 15 bens materiais inscritos ao abrigo da Convenção de 1972, mas fica ainda muito aquém dos 50 apresentados pela Itália e dos 47 da China, os dois países com mais bens destacados (ver caixa). A vizinha Espanha consegue um honroso terceiro lugar no ranking, com 44 locais inscritos nesta lista. A UNESCO recomenda que sejam desenvolvidos esforços para se alcançar uma distribuição geográfica e tipológica mais equitativa dos bens e que seja dada primazia à classificação de bens situados em países pouco representados e a candidaturas em série e transnacionais. Porém, Clara Bertrand Cabral garante que “todas as candidaturas são vistas com o mesmo olhar e têm de cumprir os mesmos requisitos. Eventualmente, as candidaturas de países que não têm qualquer bem inscrito poderão ser analisadas com alguma benevolência, para que se obtenha uma Lista do Património Mundial geograficamente mais equilibrada”. Já Rui Vieira Nery, musicólogo, historiador, diretor da Fundação Gulbenkian e coordenador da candidatura do Fado refere que alguns países se excederam na apresentação de novas candidaturas, como a Croácia e a China, pois há também algum interesse geopolítico da sua parte. “Espanha gastou imenso nas candidaturas para conseguir ter bens nas listas. A candidatura do Flamenco custou dez vezes mais que a do Fado”, diz. Preservar o imaterial Além dos 15 bens do Património Mundial, Portugal tem já três inscritos na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade – a dieta mediterrânica, o Fado e o Cante Alentejano –, rol que no seu total ascende a 314 itens. O caso de Portugal é até de louvar, pois duas das candidaturas apresentadas para o património intangível foram tidas como bons exemplos, fruto do trabalho de muito tempo de preparação. Neste caso, os critérios para a avaliação são bastante diferentes do património material (ver caixa): esta distinção tem de contribuir para a visibilidade e consciência do bem cultural intangível, encorajando o diálogo com quem o representa, têm de ser criadas medidas de salvaguarda, para proteger esse património, e as comunidades devem ser envolvidas em todas as ações e processos relacionados com os mesmos. “Há uma diferença importante nas duas listas. No caso do património físico procuram-se obras-primas e são avaliadas pela sua complexidade, técnica, escala, etc. No património intangível a avaliação não é estética, P&R Clara Cabral Responsável pelas atividades da Comissão Nacional da UNESCO na área da cultura em Portugal Como se iniciou todo o processo de proteção do património? A UNESCO surgiu em 1945 após a Segunda Guerra Mundial e, sendo uma agência das Nações Unidas, tem como objetivo principal alcançar a paz e a segurança no Mundo através da educação, da ciência e da cultura; a proteção do património é um dos instrumentos para alcançar esse objetivo. Esta necessidade surgiu pela primeira vez em 1950, com a decisão de construir a barragem de Assuão no Egito, que inundaria o vale do Nilo e os notáveis templos de Abu Simbel. Uma mobilização internacional alertou a opinião pública em todo o mundo para a urgência de se adotarem medidas de proteção rápidas e bem coordenadas, o que veio a acontecer, salvaguardando o património. Quais as vantagens para os países distinguidos? Desde logo é importante referir-se o reconhecimento e maior visibilidade – nacional e internacional – do património classificado pela UNESCO, o que de alguma forma contribuirá para a sua proteção. Mas, além dos objetivos principais, todo este processo também acaba por favorecer o turismo, que deverá ser sempre desenvolvido de forma sustentável, criando riqueza a favor das regiões e das suas populações. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 13 1 o meu mundo CULTURA património mundial 14 o que se procura é uma lista representativa de tipos de práticas culturais que representem a identidade e autenticidade de um povo”, explica Rui Vieira Nery. Este responsável salienta ainda as vantagens associadas a este destaque internacional: há duas internas, que são a necessária recolha de fontes, de memórias – o que implica muita investigação para a preparação da candidatura –, e a salvaguarda e preservação do bem; e há uma externa, que é a visibilidade internacional dessa prática, que tem como consequência natural o aumento do interesse turístico. “O Fado, ao receber este selo de autenticidade, tem registado um acréscimo de procura, com consequências para o setor profissional associado ao mesmo”, refere. Já o Cante Alentejano tem caraterísticas diferentes porque é um movimento amador e comunitário. “A ideia de candidatar o Cante Alentejano já tem alguns anos. Mas foi em 2011 que se iniciou todo o processo”, recorda Paulo Lima, diretor da Casa de Cante de Serpa e coordenador da candidatura. Integrou a lista em novembro de 2014 e já se nota o poder desta visibilidade: em pouco meses surgiram mais de 30 novos grupos de Cante Alentejano, como revela o responsável. A cobertura mediática da candidatura exponenciou o interesse dos jovens pelo Cante e trouxe mais dignidade à população local, que se sente orgulhosa da sua tradição. Além disso, contribui para a coesão e inclusão social, ajudando, por exemplo, os mais idosos. Os bens intangíveis podem ser inscritos na lista de salvaguarda urgente ou na lista representativa. No primeiro caso é necessário que determinado bem esteja em risco de desaparecer, como acontece com o fabrico de chocalhos em Alcáçovas. Paulo Lima diz MONTEPIO PRIMAVERA 2015 que esta será uma nova candidatura de Portugal, com caráter de urgência, pois há apenas 13 artesãos que os fabricam e quase todos com mais de 70 anos. Como não têm aprendizes, a arte está em risco de extinção. No segundo caso tem de ser um bem representativo de uma cultura como o Fado ou o Cante Alentejano. Há ainda uma outra candidatura a ser ponderada que é o Carnaval de Torres Vedras, isto segundo informações vindas a público através da Câmara Municipal da cidade. Seja qual for a lista da UNESCO em que os bens se inscrevem, o objetivo é salvaguardar, proteger e conservar o passado para preparar o futuro. 1 Floresta Laurissilva, Madeira 1 2 Alto Douro vinhateiro 3 Centro histórico de Angra do Heroísmo, Açores 2 ? O QUE SIGNIFICA Proteger o património do planeta é o resultado do esforço iniciado na segunda metade do século xx. Estar na lista é sinónimo de reconhecimento e mais turismo. 3 CASO NACIONAL Património Mundial em Portugal Portugal tem 15 locais inscritos na lista do património material da UNESCO. Na lista de património imaterial estão inscritos três bens. PATRIMÓNIO MATERIAL E NATURAL 1983 | MOSTEIRO DOS JERÓNIMOS, LISBOA | CONVENTO DE CRISTO, TOMAR | MOSTEIRO DA BATALHA | CENTRO HISTÓRICO DE ANGRA DO HEROÍSMO, AÇORES 1986 | CENTRO HISTÓRICO DE ÉVORA 1989 | MOSTEIRO DE ALCOBAÇA 1995 | PAISAGEM CULTURAL DE SINTRA 1996 | CENTRO HISTÓRICO DO PORTO 1999 | FLORESTA LAURISSILVA NA MADEIRA 2001 | CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES | ALTO DOURO VINHATEIRO 2004 | PAISAGEM DA CULTURA DA VINHA DA ILHA DO PICO 1998/2010 | ARTE RUPESTRE DO VALE DO RIO COA E DE SIEGA VERDE, PORTUGAL E ESPANHA 2012 | CIDADE QUARTEL FRONTEIRIÇA DE ELVAS E SUAS FORTIFICAÇÕES 2013 | UNIVERSIDADE DE COIMBRA, ALTA E SOFIA PATRIMÓNIO IMATERIAL 2013 | DIETA MEDITERRÂNICA – CANDIDATURA CONJUNTA DE PORTUGAL, MARROCOS, GRÉCIA, ESPANHA, CHIPRE, CROÁCIA E ITÁLIA 2011 | FADO 2014 | CANTE ALENTEJANO PUB MONTEPIO PRIMAVERA 2015 1 o meu mundo TEMA DE FUNDO ARTE URBANA UMA TELA DO TAMANHO DA RUA 16 CHEGARAM E INVADIRAM AS RUAS DAS CIDADES SEM PEDIREM LICENÇA. A OCUPAREM AS FACHADAS DE PRÉDIOS DEVOLUTOS OU EXTENSOS MUROS, AS PINTURAS DE ARTE URBANA NÃO SÃO DISCRETAS, NEM DELICADAS. QUEREM SER VISTAS, QUEREM PROBLEMATIZAR por marisa vitorino figueiredo fotografia artur Ninguém sabe ao certo quantas são as pinturas urbanas nas ruas de Lisboa. Ou do Porto. Ou em todas as avenidas e becos de Portugal. A verdade é que as enormes telas ao ar livre estão a assumir-se como um cartão de visita do país e já valeram a Lisboa um lugar entre as melhores cidades do mundo para a arte urbana, pela mão da famosa revista Condé Nast Traveller. No ranking publicado no final de 2014 a capital portuguesa está na sexta posição, atrás de cidades como Berlim, Buenos Aires, Los Angeles, Londres e Melbourne. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Entre os muitos nomes internacionais que já deixaram a sua marca na ebulição da arte urbana portuguesa, como o italiano Blu e os brasileiros Os Gémeos, está uma nova geração de criadores nacionais que usam as paredes como telas de liberdade. É o caso de Bordalo II, conhecido pelas intervenções tridimensionais que deixa nas ruas, híbridos entre a escultura e o mural. O neto de Real Bordalo, conhecido pelas suas aguarelas de Lisboa, tem sido apontado como um dos melhores representantes da arte urbana mundial, mas não é o único a marcar as paredes lisboetas com técnicas fora do comum. Add Fuel, por exemplo, costuma preparar stencils para pintar padrões de azulejos, repletos de elementos desconcertantes. Gonçalo Ribeiro (MAR) e Tamara Alves continuam a socorrer-se das latas de spray, apesar de terem percursos muito diferentes. Ele é um dos nomes mais conhecidos da arte urbana nacional, autor de murais em grande escala. Ela traz a selva à sociedade com desenhos de animais ferozes, mimetizando emoções à flor da pele. São traços muito diferentes que surgem nas fachadas. Porém, todos são acarinhados de igual forma pela GAU – Galeria de Arte Urbana da ? Entre artistas nacionais e internacionais, são muitos os que expressam a sua interpretação do mundo nas paredes das cidades Câmara Municipal de Lisboa que, desde há cerca de sete anos, tem convidado diversos artistas para fazerem intervenções nas ruas da cidade. A estratégia funcionou e Lisboa é hoje considerada uma das 25 melhores cidades desta corrente artística, num ranking organizado pelo portal Huffington Post. A criação da GAU é, também, um sinal de que a arte que ganha vida na rua é cada vez mais aceite, muitas vezes encomendada pelas próprias autarquias – e empresas – como forma de “limpar sem limpar”, nas palavras de Tamara Alves. Neste jogo entre encomenda e intervenção cabe ao autor “manter-se fiel a si próprio”, com a certeza de que, sem o “empurrão” das câmaras municipais “não seria possível ter murais com estas dimensões”, acrescenta a artista. Nascida em Nova Iorque, a street art tornou-se “o primeiro fenómeno de arte mundial graças à Internet”, lembra Add Fuel. No entanto, muitas vezes ainda é confundida com o graffiti, atividade que lhe deu origem mas na qual não se esgota. A fronteira entre ambas é fluida e ainda pouco consolidada – até porque a street art está em constante evolução. Os mais puristas remetem o graffiti para o lettering (desenho de letras) a spray, feito de forma ilegal e territorial. A arte urbana seria tudo o resto: expressões artísticas feitas na rua, com tinta de spray ou qualquer outro material, de forma legal e a convite de festivais, autarquias ou outras entidades. Mas há quem chame de graffiti a tudo, ou quem recuse, pura e simplesmente, qualquer tipo de rótulo. “Posso ser considerado, no máximo, um artista que pinta num suporte diferente, num material diferente”, refere MAR. Migração artística Os motivos desenhados nas paredes são predominantemente urbanos. Há influências do hip-hop, do multiculturalismo, da confusão da cidade e dos seus desperdícios. “Hoje já se chama arte urbana a muita coisa. São pinturas em grande escala, continuam na rua, mas já nem sequer existem só na grande cidade”, lembra Tamara Alves. Exemplo disso é o Wool – Festival de Arte Urbana da Covilhã, que tem promovido intervenções em murais na cidade serrana desde 2011. Foi na cidade beirã que Tamara deixou uma figura de três braços, uma homenagem às bordadeiras que fazem renda de bilros, e que Bordalo II criou, com lixo e sucata, um mocho tridimensional numa alusão à fauna local. Nos azulejos de stencil de Add Fuel assomam padrões de máquinas de ROTEIRO O que ver em Lisboa? 4 7 1 5 38 6 9 2 N a amálgama de ruas lisboetas há pedaços de arte urbana escondidos em becos e outros que ocupam toda a fachada dos edifícios das principais artérias. É difícil escolher o que ver ou onde ver e, consciente disto, a GAU reuniu, em livro, a street art de Lisboa. Ao todo, são quase 200 referências de obras de arte urbana, com direito a mapa e fotografias do local. Como o tempo é sempre escasso, deixamos-lhe um roteiro de nove obras que não pode perder em Lisboa. Mas com a garantia de que todas as outras também merecem uma visita. 1Avenida Fontes Pereira de Melo | Os Gémeos/ Blu 2 Jardim do Tabaco | PixelPancho/ Vhils 3 Lx Factory | vários autores 4 Avenida de Berna | Mural 25 de Abril | Add Fuel/Draw/ KissMyWalls/ MAR 5 Alcântara | Bordaleta | Bordalo II 6 Avenida das Índias – ARM Collective 7 Avenida Conselheiro Fernando de Sousa | Vários autores 8 Pilares da ponte 25 de Abril | José Carvalho/ Klit/Kruella D’Enfer/ Mosaik/Regg/ Tamara Alves/ Violant 9 Mercado da Ribeira – Galeria UnderDogs MONTEPIO PRIMAVERA 2015 17 1 o meu mundo TEMA DE FUNDO arte urbana 2 1 Bordalo II 2 Add Fuel 3 MAR 1 4 Tamara Alves 18 MATERIAL 4 O que contém a mochila de um street artist? 3 1 5 2 6 1 Latas (preto e 3 7 borracha cores básicas) 4 Máscara 2 Caps (espécie 5 Caderno por onde sai 8 3 Luvas de branco são as de tampas 4 (sketchbook) /lápis a tinta; vários, 6 Marcadores para diversos 7 Comida traços) 8 Água MONTEPIO PRIMAVERA 2015 tecelagem. E os ARM Collective, do qual faz parte MAR, pegaram na figura tradicional do pastor e as ovelhas para a desconstruir, num universo muito próprio. A envolvente inspirou os artistas e há muito para descobrir nas ruas da cidade. Como o Wool, são vários os festivais que dinamizam a street art. O trabalho coletivo está no ADN da arte urbana e são estas iniciativas que dão visibilidade ao trabalho dos artistas, podendo até dar origem a novas encomendas. “É um tipo de arte mais social, enquanto nas outras estamos fechados num ateliê”, refere Tamara. Da experiência em colaboração, resultam novas inspirações, à medida que o spray é manuseado a várias mãos. Add Fuel reforça a ideia, lembrando intervenções em duo e quarteto: “Trazem muitas experiências positivas, principalmente o feedback que recebemos uns dos outros.” Desenhos recriados ou apagados A arte urbana começa a chegar aos museus, galerias e casas de particulares. Bordalo II, cuja exposição “World Gone Crazy” esteve patente no Centro Cultural de Belém, valoriza esta nova dimensão. “Quando indoor, o trabalho ganha durabilidade, torna-se menos efémero e vulnerável. Podemos chegar a mais público, durante mais anos”, explica. Mas a casa da arte urbana será sempre a rua. E lá fora, quanto maior a pintura, melhor. “É um movimento artístico que chega às pessoas, comunica com quem está na rua e funciona como um alerta para a arte, porque a maioria das pessoas não vai a um museu”, sublinha MAR. Na parede da rua o desenho ganha novos sentidos, sentidos que o autor não controla. Exemplo disso é o caso caricato que colocou uma das suas pinturas no seio de uma polémica pública. Uma superfície comercial decidiu tapar, com uma tela publicitária, o trabalho artístico, que tinha inclusive recebido apoio da GAU. Após a remoção da tela, os “É a melhor altura para ser mulher e fazer arte urbana” Tamara Alves Tem um percurso dito convencional: licenciatura de Artes Plásticas, mestrado de Arte Contemporânea. Fora das aulas, Tamara Alves sempre teve o “bichinho de experimentar”, de ir para a rua e criar. Talvez o mesmo que a levou, incentivada pelos pais, a pintar as paredes do quarto, aos seis anos. Ou, com 14, a brincar com as primeiras latas de spray. Nas suas criações a referência animal é constante, como no Coração-Polvo que pintou na Calçada da Glória. “Transmito sentimentos fortes e quero levá-los à letra”, num retorno ao animal dentro de nós, explica a artista que acredita que “agora é a melhor altura para ser mulher e fazer arte urbana”, num cenário em que há cada vez mais procura de artistas no feminino. “Devolver o azulejo à rua” Add Fuel personagens desenhados na fachada de Alcântara não puderam continuar sossegados: apanhados numa cheia, “pareciam nadar por cima de água”, ganhando novo cenário inesperado. “A pintura acaba por ‘viver’, ter um percurso muito próprio”, fora das intenções do artista. Arriscando-se também, a um desaparecimento precoce. Depois de dias de trabalho a obra fica sujeita à sua sorte. Pode ser riscada, tapada com novo desenho, pintada de branco ou, até, “sobreviver” uns bons anos. Tudo depende de vários fatores, como o fácil (ou difícil) acesso à pintura, o nome do artista na comunidade e o local escolhido. “Existe uma tolerância zero em relação ao graffiti e à street art; as peças pintadas nas ruas duram, por vezes, poucas horas até serem limpas ou destruídas por tinta cinzenta morta”, acrescenta Bordalo II que afirma que “nas ruas não há regras. Cada um tem a sua consciência”. A incerteza do destino da obra não retira a vontade de exprimir opiniões e visões. Para os artistas, a rua, no seu desafio e interpelação do mundo, dá muito mais do que aquilo que tira. Pensa-se na arquitetura portuguesa e chega-se, inevitavelmente, ao azulejo. O quadrado de cerâmica tem caráter nacional e foi essa importância que levou Add Fuel, nome artístico de Diogo Machado, a reapropriar-se dele como intervenção de arte urbana. Neste ato de “devolver o azulejo à rua” nascem murais de stencil e spray que exploram infindáveis pormenores como mãos, olhos ou caveiras. “Gosto de pegar num conceito e ver o que resulta: algo mais irónico, ou algo mais cómico, mais subtil.” Para o resultado final contribui a experiência de Add Fuel como ilustrador e a sua obsessão, saudável, com padrões. “Fotografo muitos azulejos e outro tipo de padrões quando ando na rua”, explica, salientando a importância do local envolvente para o desenho. “A cidade do desperdício” Bordalo II Uma borboleta criada com sucata e lixo. Uma tampa de esgoto em forma de moeda de um euro. Um contentor do lixo “remodelado” para parecer um hambúrguer. As intervenções de Bordalo II ganham alma a partir dos vários elementos da cidade. “A ideia é criar uma imagem da cidade a partir do desperdício da mesma, é construir uma realidade a partir dos podres da sociedade”, explica o artista. O plástico, como “cancro do planeta”, é o material de eleição nesta reconstrução do que é urbano. Os objetos comuns são recriados e ganham novos sentidos. Ao ponto de o site internacional Street Art News o considerar um dos melhores na arte urbana mundial de 2014. A arte e a representação da cidade correm-lhe nos genes. Bordalo II é neto de Real Bordalo, conhecido pelas aguarelas de Lisboa. “Pegar numa personagem e desconstruí-la” MAR “Faço bonecos”, começa por explicar MAR sobre o seu universo de personagens estilizadas que vão ganhando lugar no mundo citadino. A frase “esconde” a importância do artista. Há 16 anos que trata por “tu” as paredes da margem Sul e de Lisboa. Sozinho ou através do coletivo ARM Collective, as suas intervenções em grande escala são uma referência. Especializado em personagens, que partilham traços e cores muito próprias, o artista aposta em trabalhos de maior dimensão para conseguir marcar a diferença. Fachadas de prédios devolutos ou, de preferência, grandes murais – como o da Avenida das Índias, onde o coletivo foi desafiado a recriar o imaginário d’Os Lusíadas. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 19 1 o meu mundo ENTREVISTA arte urbana 20 VHILS O “INCONTORNÁVEL” SE AS PAREDES FALASSEM, AS DE ALEXANDRE FARTO, OU VHILS COMO É MAIS CONHECIDO, TINHAM MUITO PARA CONTAR. CONDECORADO, RECENTEMENTE, PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA COM A DISTINÇÃO DE CAVALEIRO DA ORDEM MILITAR DE SANT’IAGO DA ESPADA, ESTÁ ENTRE OS MAIS PROMISSORES JOVENS DO PLANETA, SEGUNDO A PRESTIGIADA REVISTA FORBES por helena viegas fotografia vera marmelo e sílvia lopes MONTEPIO PRIMAVERA 2015 “Arte urbana” não é um rótulo que aprecie. Como designa o que faz? Parece-me redutor para descrever uma realidade bem mais complexa. A maior parte do meu trabalho alimenta-se do meio urbano e recorre a materiais provenientes da cidade, mas vai muito mais além. Faço trabalho no espaço público das cidades, mas também em espaços interiores e noutros contextos. Porque não pensar apenas em arte, seja qual for o meio onde é produzida? A frase “os graffitis já não são um ato de rebelião” é sua. O que mudou? Nesse contexto referia-me ao crescente apelo do radicalismo islâmico à juventude europeia. Muitas formas de contestação ao poder e às instituições associadas à juventude têm sido integradas na cultura dominante. As subculturas que surgem nas margens são absorvidas pelo centro, deixam de cumprir essa função contestatária. A ausência desse espaço de contestação pode tornar a juventude mais vulnerável à radicalização política ou religiosa. No que respeita ao graffiti, a verdade é mais complexa: se por um lado tem sido absorvido pelo mundo da comunicação visual e da arte, por outro tem uma faceta indomável que teima em apoderar-se do espaço público para exprimir a sua vitalidade. É essa a sua natureza. Sente nostalgia do tempo em que o graffiti era um ato de rebelião? Sim, porque guardo boas memórias do que era um ato simples e puro, sem interesses. O que faço hoje não é graffiti, mas considero-o a minha escola de formação. Ensinou-me a lidar com realidades complexas, a ler o espaço urbano, a ser minucioso e a trabalhar com certas superfícies, materiais e ferramentas. A arte urbana tem uma forte componente social, de apelo à crítica e à reflexão. São as caraterísticas da “rebelião” do século xxi? Trabalhar no espaço público sem autorização é um ato de rebeldia. Mas o conteúdo dessa comunicação de- ? RETRATO DE JACK MUNDEY, ativista que lutou para preservar a cidade australiana de Sydney. No seu trabalho Vhils apela a uma reflexão, não só artística mas também social pende da intenção do interveniente. Eu uso o meu trabalho para desenvolver uma reflexão que considero mais de natureza social do que artística. Gosto de chamar a atenção para determinados temas e interessa-me fazer pensar de forma crítica. A experimentação é uma tentação do artista? Para mim, sempre foi uma componente muito importante do trabalho e uma das que me dá maior prazer. Gosto de mexer com os materiais, de arriscar, de ver até onde consigo levá-los. É da experimentação que têm surgido muitos dos corpos de trabalho que tenho desenvolvido. A desconstrução é o conceito que o move? Em certa medida sim, mas a desconstrução não surge isolada. Encontra-se ligada a um contexto e conteúdo específicos. Num primeiro momento, o meu trabalho encontra-se ligado por uma reflexão sobre o presente modelo de desenvolvimento socioeconómico, a vida nas sociedades urbanas contemporâneas e o desenvolvimento da identidade individual nestes contextos. Mas depois cada corpo de trabalho é usado para desenvolver uma reflexão mais particular. Um dos conceitos fundamentais é o recurso a técnicas destrutivas como forma de criação. Este universo e o próprio conceito estão ligados aos tempos do graffiti, quando usava ferramentas destrutivas para cravar o nome em vários tipos de superfícies com base numa técnica de stencil invertida – criando através da remoção de camadas em vez da sua adição. Ao escavar estas camadas vi que estava a expor fragmentos de outros, num ato de arqueologia contemporânea. Estes fragmentos refletem a energia caótica da cidade e o ritmo frenético das sociedades contemporâneas. Decidi aplicar o mesmo processo às paredes, escavando camadas de modo a criar composições semelhantes, e daí alarguei o processo a outros suportes. Surgiu, recentemente, numa lista da revista Forbes de jovens promissores com menos de 30 anos. O significa para si o sucesso? É gratificante que se interessem e apoiem o meu trabalho, mas é apenas importante na medida em que aumenta o acesso a mais recursos. No caso dos projetos sociais ajuda a chamar a atenção para estas realidades. Pessoalmente, não me importa para nada. Oferece vantagens e inconvenientes, mas continuo a mesma pessoa. Prefiro manter o foco no trabalho e nas questões que este levanta. Qual é o estado da arte (urbana) em Portugal? Numa era de despromoção da cultura e criatividade artística em Portugal tem sido positivo ver agentes culturais a superarem as (muitas) dificuldades para continuarem a produzir. A arte, seja urbana, contemporânea ou contemporânea de inspiração urbana, parece-me estar viva e saudável. Faz-se muito com pouco. As crises, sem menosprezar a sua dimensão trágica, podem oferecer oportunidades. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 21 1 o meu mundo LETRAS HISTÓRIAS ESCREVER: PORQUÊ? PARA QUÊ? 22 PARA CRIAR A CRÓNICA DO TEMPO QUE PASSA, EXPLICAR A REALIDADE, TRANSMITIR ETICAMENTE UMA IDEIA… SÃO MUITOS OS MOTIVOS QUE LEVAM UM AUTOR A ESCREVER. FALÁMOS COM LÍDIA JORGE E AFONSO CRUZ, DOIS ESCRITORES COM IDADES, PERCURSOS E OBRAS DIFERENTES QUE EXPLICARAM O SEU AMOR PELA ESCRITA E O MODO COMO CHEGARAM ATÉ ELA por susana torrão fotografia artur e joão cupertino MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Tudo começou pela leitura. O gosto pelos livros acompanha Lídia Jorge e Afonso Cruz desde a infância. Em Boliqueime, no Algarve dos anos 50, a autora de Os Memoráveis ou Vale da Paixão encarava as histórias que lia como ponto de partida. “Só por si, um livro nunca me dava satisfação. Acabando-o pensava em escrever eu a minha história”, recorda. Vinte anos mais tarde, na Figueira da Foz, era a vez de Afonso Cruz. “Sempre li muito e, como um copo que vamos enchendo e há um dia que extravasa, um dia também começamos a pôr cá para fora aquilo que acumulámos”, explica. Ela sempre teve como objetivo ser escritora, para ele essa foi uma descoberta mais tranquila. Encontram-se no olhar crítico que têm sobre a realidade. Dar sentido à vida “Devoto tudo à escrita. Ponho-a acima de tudo. Naturalmente há limites. A família – os nossos – fica de fora desta contenda.” É assim que Lídia Jorge explica a importância da escrita no seu quotidiano. Um dia chegou a dizer que “escrever é mais importante que a própria vida” e, apesar de reconhecer o caráter hiperbólico da frase, assume que vê a vida como uma espécie de batalha a que a escrita pode trazer alguma luz. “Não é arrogância, é ambição de criar outro ponto de vista para tentar encontrar explicação para a existência tal como é: com esta finitude, com esta permanente desinteligência entre os homens, o facto de haver sempre desinteligência mesmo entre as formas mais superiores de amor. Porquê? Porquê ambicionarmos viver fora do tempo? Porquê o início do mundo? Porquê o fim do mundo? Tudo isto são questões que nós colocamos”, diz. Desde que, aos dez anos, escreveu as primeiras 33 páginas de Amores de São João – “histórias sobre rapazes e raparigas mais velhos do que eu e que conhecia, para quem tentava criar histórias como as que lia no Júlio Dinis. “Senti uma espécie de libertação quando deixei a faculdade e voltei a escrever desembaraçadamente” (Lídia Jorge) Coisas muito ridículas e muito primitivas…” – Lídia Jorge trabalhou para alcançar o objetivo de ser escritora. Esse texto perdeu-se numa mudança de casa mas ainda existem os artigos que publicou em A Centelha, o jornal do Liceu Nacional de Faro do qual chegou a ser diretora, bem como os textos que escreveu na universidade, em Lisboa. Até o estudo da literatura se tornar paralisante. “Quando cheguei à Faculdade de Letras procurei os livros e os autores com quem eu me identificava. Foi um momento de recolha de informação, de descoberta de autores, com uma intenção mais amadurecida. Nesse aspeto a Faculdade de Letras foi muito importante, mas também foi o momento em que duvidei de que era capaz. Estudava teoria e análise literária, disciplinas de análise, de sobreaviso sobre a literatura, e questionava-me: será que para escrever é preciso ter esta engrenagem na cabeça? Só senti uma espécie de libertação quando deixei a faculdade e voltei a ser uma leitora desprevenida e a escrever desembaraçadamente”, conta Lídia Jorge. Viajar para partilhar O início da relação de Afonso Cruz com a escrita deu-se mais tarde, numa altura em que o também ilustrador trabalhava como redator de publicidade. “Foi a primeira vez que, profissionalmente, trabalhei com as palavras e não com as imagens. Foi talvez aí que comecei a escrever com assiduidade”, recorda. Entretanto, Afonso Cruz foi acumulando viagens e conta hoje no currículo com mais de 60 países. “Acho que a necessidade de partilhar e de nos expressarmos tem a ver com tudo aquilo que acumulamos. E isso não se restrin- MONTEPIO PRIMAVERA 2015 23 1 o meu mundo LETRAS histórias 24 ge às leituras mas às experiências que fomos tendo ao longo da vida. Apesar de haver escritores que são muito precoces, acho que o processo normal e o mais expectável é que adquiram uma certa bagagem”, lembra. O que o levava a partir era a busca pela diferença e a certeza de encontrar novas maneiras de pensar, que podia confrontar com a rotina. “Por nos afastarmos um pouco da nossa sociedade, quando olhamos de longe vamos observá-la de maneira diferente. Quando viajo procuro sociedades que possam fazer-me refletir e repensar o nosso padrão de vida. Os povos indígenas da Amazónia ou algumas tribos africanas têm diferenças mais acentuadas, mas o limite da diferença está entre o nómada e o sedentário, em que a maneira de pensar é realmente diferente”, explica Afonso Cruz. Para o escritor, mais do que a forma é o conteúdo de cada acontecimento ou de cada experiência que deve ser valorizado. Foi o que tentou mostrar na sua Enciclopédia da História Universal, uma compilação de factos inventados. “Nas nossas experiências – independentemente de terem sido factos ou não – o mais importante a retirar delas é o conteúdo que encerram. E não sinto que uma obra de ficção seja menos importante… Por exemplo o Crime e Castigo será sempre muito importante para mim, independentemente do personagem ter morto ou não aquelas senhoras na vida real. Não é isso que importa. E, em alguns momentos históricos, também é mais importante retirar o conteúdo do que as circunstâncias que os acabam de promover no tempo e que, noutra época, deixam de ser importantes”, afirma. Importante mesmo é procurar a essência das coisas. “É a ficção que cria coisas. Costumo brincar e dizer MONTEPIO PRIMAVERA 2015 AFONSO CRUZ A literatura como mensagem O escritor da Figueira da Foz faz das palavras a sua arma para levar ao mundo mensagens globais. O papel que acredita caber ao escritor é o de personagem ativa que contrabalance as mensagens de consumismo e que promova lemas como “sê crítico” ou “mais criativo”. As viagens por mais de 60 países também são uma inspiração. que se não fosse a ficção as rodas ainda eram quadradas”, diz Afonso Cruz. Das crónicas e da ética “Cronista do tempo que passa.” É assim que também se define Lídia Jorge. E, de facto, através dos seus romances é possível traçar uma espécie de “história marginal” de Portugal ao longo dos últimos 50 anos. Do país rural e da forma como este se modifica em O Vale da Paixão, ao período da revolução e o tempo que lhe é anterior em O Dia dos Prodígios, à guerra colonial e ao regresso da mesma em A Costa dos Murmúrios e Notícias da Cidade Silvestre, passando pelos anos de mudança e pela história da própria democracia em livros como O Vento Assobiando nas Gruas, Combateremos a Sombra ou Os Memoráveis. “Eu não sou capaz de escrever romance histórico. Por impotência! Não tenho duas vidas. E tendo só uma vida e não sabendo quando acaba tenho pressa e urgência em ser testemunha do meu tempo, que é aquilo que acho que posso fazer melhor e com alguma singularidade. Porque nós podemos saber sobre o longínquo, sobre aquilo que não é o nosso país ou sobre lugares nenhuns, como muitas vezes se escreve. Mas a verdade é que, tendo só uma vida e capacidade de testemunhar a transformação da sociedade, podemos desocultar a modernidade”, revela. Já Afonso Cruz, que nos seus livros e peças de teatro coloca em cima da mesa questões tão atuais como a perda ou a religião, como é o caso de Para onde Vão os Guarda-Chuvas, ou o materialismo da atual sociedade, usa a sua faceta de autor infanto-juvenil (onde começou como ilustrador) para passar mensagens globais. Além do mais, encontra aqui um bom veículo para transmitir preocupações éticas e morais. “Somos bombardeados constantemente com mensagens cujo único objetivo é fazer-nos consumir, mas não temos nada que nos diga ‘sê bom’, ou ‘sê mais inteligente’ ou ‘mais criativo’ ou ‘mais crítico’. Cabe à arte e à literatura ter esse papel”, afirma. Ou, nas palavras de Lídia Jorge, escritas no passeio à frente da biblioteca de Penafiel: “Não há livro de instruções para salvar a vida. Só a literatura se aproxima desse imenso livro”. 1 o meu mundo OPINIÃO António Ramalho Eanes Ex-Presidente da República Homens grandes assim não morrem NA UNIDADE E CONTINUIDADE, NA MEMÓRIA, NA PERSONALIDADE DE SILVA LOPES* MUITO CONTAM TANTO OS SEUS INVULGARES TALENTOS DO ESPÍRITO QUANTO OS SEUS IMPRESSIVOS DOTES DE TEMPERAMENTO, QUE O SEU CARÁCTER TÃO BEM QUIS, E SOUBE, ESCULPIR E, NOBREMENTE, ANIMAR. Mas, socorrendo-me de Kant, o que sobremaneira conta em Silva Lopes é “o valor do carácter que é moralmente, sem qualquer comparação, o mais alto, e que consiste em fazer o bem, não por inclinação, mas por dever”. Essa preocupação ética do dever – servida por uma grande e ininterrupta preparação, por um vivido e interiorizado cosmopolitismo, por uma experiência profissional de excepcional matriz, diversidade e exigência, que o levaram a ser intransigentemente fiel à verdade – somada à sua coragem, honestidade, prestígio intelectual e aos serviços prestados ao país, conferem a Silva Lopes, a justo título, uma aristocracia de espírito. São, realmente, essa fidelização ao dever e às respostas de saber (sempre em procura de empenhada perfectibilização), a inteira disponibilidade para servir o país, com empenho e competência, e com desassombro também, não procurando agradar a quem exerce o poder (um pouco à maneira de Mouzinho da Silveira) que fazem de Silva Lopes não só, e como bem disse Luís Villalobos, “o economista que fez história” mas, também, o Homem que, na história colectiva, inscreveu presença harmoniosa, de referência e inspiração. De referência e inspiração é Silva Lopes, pelo dever de verdade que, com tocante humildade, sempre oferecia e que elegeu como sol norteador, pela liberdade que defendeu e exigiu, tanto para si como para os outros, pela igualdade diferenciadora por que se bateu e que impõe que a todos seja estendida a fruição do necessário para assegurar uma vida digna. Aliás, estas foram preocupações, e propósitos também, que o levaram, por vezes, ao combate político, que travou, recusando, sempre, o recurso demagógico, que considerava forma maior da corrupção política. Referência não farei a quanto, de forma empenhada e eficaz, serviu o país, no país e no estrangeiro, exercendo funções políticas da mais alta importância nacional, cargos da maior imporsereno como tância na administração pútudo o que blica e, ainda, no governo de brota de fontes grandes instituições públicas profundas (como o Banco de Portugal) ou de grandes organizações da sociedade civil (o Montepio, por exemplo). Acção de relevante trabalho e mérito teve, ainda, no urgente processo de esclarecimento da opinião pública, através de inúmeras conferências e intervenções mediáticas. Mas incompleto ficaria este testemunho, de memória e preito de gratidão, se esquecesse que Silva Lopes, o Homem do Dever, sabia ser, também, e era-o frequentemente, o homem de sorriso discreto, sereno, como tudo o que brota, com naturalidade, de fontes profundas. Sorriso que oferecia aos amigos. Sorriso, de tocante carinho, com que sempre olhava, falava com os filhos e netos, ou deles dava notícia. Encontrar Silva Lopes, descobri-lo, tê-lo como amigo e amizade fazer também com a sua mulher e os seus filhos, usufruir dos seus ensinamentos, inspirar-me no seu exemplo, foi uma graça, um dom de excepcional valia que agradeço a Deus. Aos filhos e netos de Silva Lopes, quero apenas dizer, neste tempo de partida, neste momento de despedida, quão orgulhosos, e gratos também, se devem sentir pelo pai e avô que têm, pelo amor e exemplo que lhes deu, mas, também, pelo muito que ele legou aos portugueses, à sua vida e história, na qual tem jus a referência e a lugar especiais. E digo – aos filhos e netos – o pai e avô que têm, e não o que tiveram, porque homens grandes, assim, não morrem. Nunca morrem. Silva Lopes, o Homem do Dever, sabia ser, também, e era-o frequentemente, o homem de sorriso discreto, NOTA: O autor continua a escrever segundo * José Silva Lopes presidiu ao Montepio entre 2004 e 2008. a chamada norma antiga. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 25 1 o meu mundo ENTREVISTA 26 “Acreditava ser possível fazer vida e pagar contas a escrever canções. E consegui.” MONTEPIO PRIMAVERA 2015 KALAF ÂNGELO O AGITADOR TRANQUILO QUEM É O HOMEM POR DETRÁS DA VOZ MELANCÓLICA QUE CRUZA O AFRICANO KUDURO COM A MUNDIAL ELETRÓNICA DOS BURAKA SOM SISTEMA? DEPOIS DE TER “COMPRADO” LISBOA, KALAF PASSA OS DIAS A VENDÊ-LA PELO MUNDO, NA MÚSICA E NOS LIVROS por nuno alexandre silva e miguel ferreira da silva fotografia gonçalo f. santos É a alma poética dos consagrados Buraka Som Sistema e, por paixão a Lisboa, já se declarou em livro. Este angolano que celebra o design na forma de vestir e de viver sabe bem o que quer: contar histórias. Chegou a Portugal aos 17 anos, vindo de Angola, e agora passa a vida a cruzar o mundo. Qual é a sua terra? Lisboa, sem dúvida nenhuma. Estive há poucos dias no Rio de Janeiro e estava a vender Lisboa como um guia turístico. Lisboa é o único lugar do mundo que fala português onde consigo conviver com todos os mundos que falam português. E isso é muito importante para o meu trabalho. Gosto muito de ir a outros sítios onde não falo MONTEPIO PRIMAVERA 2015 27 1 o meu mundo ENTREVISTA 28 a língua, para despertar a curiosidade e para explorar outros “eus” que habitam em mim. Mas a apontar uma “casa”, Lisboa reúne todas as caraterísticas que eu preciso. É a minha base. Como era esta Lisboa quando chegou e como está agora? Quando cheguei foi amor à primeira vista. Quando se é jovem não se tem a ideia do “para sempre”. Pensamos que tudo é temporário e eu também pensei que Lisboa seria temporária. Mas, com o passar do tempo, fui descobrindo as pessoas que aqui habitam: cabo-verdianos, brasileiros, portugueses. Achei, também, o Porto fascinante. No início ia constantemente a Serralves, ao Museu de Arte Contemporânea, para conviver de perto com coisas que lia nos livros e que estavam ali. Gosto da proximidade que Lisboa tem de outras cidades. Depois do Porto passei a ter essa relação com Madrid. O [museu] Rainha Sofia e o [museu] Prado são imbatíveis e estão tão perto. A minha cidade escape passou a ser Madrid, mas só porque estava em Lisboa e tinha essa proximidade. E como estão os portugueses? Diferentes? Sim. Acho que os portugueses que encontrei não estavam tão atentos a uma realidade: o facto de Lisboa ser uma das capitais africanas mais vibrantes, e incluo as que estão em África. Ganhou visibilidade com a música nos Buraka Som Sistema. Era isso que tinha pensado para si ou não pensa muito nisso? Não era necessariamente, mas, assim que pisei aqui a terra e me confrontei com outros povos que falam a mesma língua, foi muito claro que o que queria fazer era contar histórias. O que mais me cativou, durante esse contacto, foi que a história não está a ser contada no seu todo. Eu adorava que houvesse mais pessoas a escreverem como eu escrevo, MONTEPIO PRIMAVERA 2015 a completarem aquilo que não consigo completar, que não consigo expressar. O meu ponto de vista não exclui nada. Eu incluo. Sempre partindo do ponto de que venho de Benguela... Sente necessidade desse prefácio? Sinto necessidade de contadores de histórias. Porque essa é a única forma de eliminar os equívocos. Se contarmos tudo, se expusermos tudo, mais facilmente conseguimos encontrar o equilíbrio social. Mais perto ficamos de uma ideia mais humana, mais inclusiva. E eu acho que fazemos pouco isso. Escreve-se muito, em português escreve-se bastante, mas não o suficiente... Temos apenas um prémio Nobel. Mas podíamos ter quatro ou cinco. Eu sou do team Mia Couto. Estou a torcer por ele. Que Deus nos oiça. Quando pensou ser escritor? Queria contar histórias e queria estar perto das pessoas que contam histórias. Logo, a música, enquanto jovem, foi a mais sedutora. A ideia de ficar em casa a escrever livros não é muito atrativa. Então, decidi ser músico, mas descobri que não tinha talento para fazer música e decidi escrever canções. Acreditava que era possível fazer vida e pagar contas a escrever canções. E consegui. E ser poeta? É difícil viver da poesia. O meu editor acha que devo escrever romances porque os consegue pôr no mercado. A poesia é difícil. Mas escrever canções é um prazer que continuo. Os meus poemas acabam sempre por vazar para as canções, mas ainda não consegui editar um livro de poesia. Terá, certamente, oportunidade. Sim, não tenho pressa. Acho que os meus escritores favoritos só se descobriram aos 50 anos. O que tem a dizer ao mundo? O que procura transmitir na sua escrita? Através das histórias conseguimos estar mais perto do sublime, no sentido em que todas as pessoas carregam um génio dentro delas. E esse génio só se revela quando se está em plena comunhão com o seu ser. Quanto mais se tiver a plena certeza do que nos “O pensamento sob o qual nos regemos não inclui os negros” define, sem medos e sem dúvidas, mais perto conseguimos estar dessa viagem. E escrever tem-me tornado intransigente no sentido que estou mais perto de chegar a esse lugar. De, realmente, ser um fator de mudança. E eu escrevo para me conhecer, conhecer os outros, e, nesse ato, chegarmos a um consenso de que o que importa não é aquilo que nos é imposto pelo status quo. A felicidade não reside naquilo que nós, em grupo, acreditamos que é a felicidade, mas, simplesmente, aquilo que está guardado dentro de cada um de nós. Não é uma pergunta de resposta fácil. Estou sempre a fazer essa pergunta e provavelmente quando encontrar a resposta vou deixar de escrever. 29 ORIGENS De onde vem Kalaf? Com dois livros publicados, Estórias de Amor para Meninos de Cor e O Angolano que Comprou Lisboa (Por Metade do Preço), Kalaf Ângelo, ou Epalanga como agora assina, é o ponto de encontro das culturas que foi experienciando e que também transporta para as palavras que dão corpo aos discos dos Buraka Som Sistema. A “falta de jeito” para tocar um instrumento fê-lo encontrar nas palavras o seu porto de abrigo e não esquece as raízes. “Sou fruto da geração hip hop, geração Internet, que olha para a cultura e não tem pudor em tirar aquilo que lhe interessa, com vontade de fazer arte para consagrar de forma a que alguém, daqui a 20 anos, esteja a fazer as mesmas perguntas que eu”, explica, acrescentando a influência de Miguel Esteves Cardoso no seu trabalho. “É provavelmente das maiores influências que tenho. Não necessariamente no conteúdo, mas na abordagem. A forma como ele escreve sobre a cidade.” MONTEPIO PRIMAVERA 2015 1 o meu mundo ENTREVISTA 30 O título O Angolano que Comprou Lisboa tem mais de metáfora da sua vida ou de metáfora sociológica? Para começar, é uma declaração de amor à cidade de Lisboa. Só compra quem gosta. É óbvio que a provocação é viciante. Se eu escrevesse “O angolano que seduziu Lisboa” não ia ter a mesma leitura. “O angolano que conquistou Lisboa” talvez ficasse mais próximo. Mas o título do livro é, sem dúvida, uma provocação. Para mim, como angolano, e para os outros que não são angolanos. Este livro começou a ser escrito quando editei o anterior, Estórias de Amor para Meninos de Cor. Eu brincava com essa ideia de cor, que é um termo bastante pejorativo. A geração dos meus pais detesta este termo. Mas senti que precisava de tocar nas feridas para poder, depois, iniciar a conversa. O livro tem o kuduro e o kizomba, muitas vezes, no papel principal. Como é que vê esta relação entre a nova agenda cultural e a economia? Sem dúvida que a cultura precisa de dinheiro para existir, mas acho que não se devia pôr todas as fichas no mesmo número. Porque isso tende a deformar. A economia tem uma agenda muito clara, que é gerar mais dinheiro. E essa agenda pode atropelar um conjunto de fatores importantes. A preocupação devia ser criar mais e pensar a longo prazo. Se calhar o importante não é gerar mais, mas preservar para décadas vindouras. O kuduro e o kizomba são mais soluções para apresentar ao mundo. Infelizmente olhamos mais para quem consegue encher o Pavilhão Atlântico e não olhamos para quem só consegue encher o B.Leza. Mas para haver o Pavilhão Atlântico, tem de haver o B.Leza saudável e pujante. É como na economia. Não se pode investir só nas sociedades anónimas e esquecer as pequenas, MONTEPIO PRIMAVERA 2015 HISTÓRIA Buraka global A história dos Buraka Som Sistema, banda que tem Kalaf como vocalista, parece tirada de um filme. Um projeto musical que sai da Amadora e conquista o mundo. Que leva o nome de um subúrbio lisboeta e o coloca no mapa das mais fulgurantes sonoridades. A novidade da ligação do zouk e kuduro africanos com a eletrónica foi a fórmula que levou a banda de Kalaf Ângelo, João Barbosa (Branko), Rui Pité (Dj Riot) e Andro Carvalho (Conductor), a pisar os mais importantes palcos da música do mundo, um pouco por todo o planeta e a colecionar prémios internacionais. Quanto ao segredo do sucesso, Kalaf aponta o caminho: “O facto de Lisboa ter sido e continuar a ser um segredo para uma boa parte do mundo foi vantajoso para nós. A música tem que ser boa, mas quando se tem um bom produto o fator surpresa traz vantagens.” João Barbosa, um dos quatro fundadores dos Buraka, partilha com Kalaf a marca de roupa criada com o objetivo de se adaptar a qualquer época e qualquer estação, a Rest of The World. Além disso, a história de parceria dos dois músicos começou em 2004, com a Enchufada, a produtora que reúne hoje muitos músicos de novas tendências musicais, como Blaya, que faz parte da formação atual dos Buraka. Kalaf lembra a importância do amigo. “Nestes últimos anos, com os Buraka a marcar o passo, o João Barbosa posicionou-se num lugar que não tem paralelo. É quase o Anthony Bourdain.” o comércio de rua que mantém uma sociedade e que contribui para a felicidade. Viver em Portugal é mais fácil nesta fase? Há menos preconceito com a cor da pele? Eu sofro sempre que falo sobre racismo. Acho que, hoje, o racismo clássico, como nós entendemos, tem-se vindo a transformar. Há pessoas que não gostam da diferença, e depois há aquele racismo associado a classes. Esse é mais grave. Não é tão visível. Eu, com a gravata posta, tenho um tratamento e, sem a gravata, tenho outro. São duas abordagens. Não só racial, porque nesse plano as coisas têm vindo a equilibrar-se. Mas no plano económico e intelectual há muita resistência. Porque o nosso modelo foi herdado do Iluminismo. Foi construído por pessoas que não incluíram o negro na equação. O pensamento sob o qual nos regemos não inclui os negros. Por racismo, por discriminação... vamos evoluindo, mas o pensamento está vigente. É como nas universidades. Os nossos professores estão a ensinar esses valores. E não incluem os negros. No Brasil está a discutir-se a ideia de quotas, uma discussão acesíssima sobre esse assunto, nos dois planos: classe e raça. Uma professora de design, minha amiga, contava que os temas mais clássicos, como a escola de Bauhaus e Eames, e no design é tudo muito Bauhaus e Eames, não diziam nada aos alunos negros. Aquele conhecimento não é aplicado na sua realidade. Eles não ambicionam trabalhar no estúdio de design do arquiteto “xpto”. Eles querem ir buscar o conhecimento e aplicar na favela. É diferente de qualquer parte do mundo? Não é muito diferente e também está presente em África. Porque estamos a perpetuar um pensamento que já devia ser confrontado há muito tempo. É urgente reequilibrar a balança. Eu não sou apologista da ideia de quotas, mas está a ser aplicado e até está a funcionar, não nego. Kalaf diz que é vaidoso. Como vive com essa vaidade? Assento a minha vaidade em algo sólido que é a minha paixão pelo design, que vai desde o vestuário até objetos. Voltando aos discos, sou do tempo em que ficávamos horas a olhar para a capa de um disco. Essa relação com o objeto e com as formas é algo que me definiu. Claro que vou transpondo os meus interesses para outras áreas, como o vestuário. Olho, por exemplo, para a geração Orpheu, de Almada Negreiros, Sá Carneiro, Pessoa. Aquela época em que os homens andavam com chapéu e havia um certo pudor em não sair de casa mal amanhado. Claro que adoro a t-shirt. Acho uma das peças de vestuário mais brilhantes que o homem já criou. Tão simples, que funciona, com qualquer forma, com qualquer coisa. É a peça de vestuário mais brilhante. Mas como convivi muito com o jazz e fui colecionando discos de vinil ganhei um certo gosto por uma época, por uma era, por uma forma e porque é que as coisas são feitas dessa forma. É incrível com uma peça de roupa consegue contar uma história, trazer ali todo um passado de memórias. Há dias em que se sente mais Orpheu e dias em que se sente mais jazz? Há dias em que me sinto rock and roll, leather jacket... também porque respeito essa ideia de uniforme. Eu estou a conseguir reduzir o meu guarda-roupa às peças essenciais e todas elas respeitam essa ideia de uniforme. Como o Einstein que tinha sempre a mesma roupa? Estou quase a chegar aí. Com a dimensão que tem hoje há quem o procure para “apadrinhar” projetos musicais e literários? Nem tanto. Eu estou naquela fase em que gostava de aprender mais com pessoas ligadas a outras áreas da cultura. Estou na fase em que gostaria de perder mais tempo com arquitetos, mais tempo com economistas, para entender como levar a experiência a mais pessoas e ser transformador na sociedade. Está a escrever o primeiro romance para publicar ainda este ano. Sim, a correr contrarrelógio. É mais ou menos autobiográfico do que os outros dois livros? Tenho em mãos um romance político, que se passa em Lisboa e... mais não posso dizer. Como é a sua vida hoje? É a que sonhava? A única coisa que me falta é tempo. De resto, tudo bem. Esta coisa de ser pioneiro numa corrente cultural rouba tempo porque temos que estar atentos a várias frentes. Perdemos tanto tempo a criar a música como depois a pensar como vai chegar às pessoas. E isso rouba tempo. Por isso é que digo que devia sempre haver mais. 31 Onde sai à noite em Lisboa? Bairro Alto e Cais do Sodré. Onde estão os novos sons de Lisboa? Lux, Music Box, B.Leza e Doc’s. Lição de viagem? Não é preciso ter pressa. Um escritor que o marca? James Baldwin. Um músico importante? Rui Mingas. Um realizador fundamental? Mathieu Kassovitz, com O Ódio. Um concerto memorável? Buraka Som Sistema, em Coachella. A revista Montepio agradece ao Valverde Hotel a cedência do espaço para a realização da entrevista. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 1 o meu mundo OBSERVATÓRIO RIQUEZA HÁ VIDA ALÉM DO PIB? 32 PROGRESSO NUM MUNDO CENTRADO NAS TRÊS LETRAS DO PRODUTO INTERNO BRUTO, HÁ QUEM QUESTIONE A MEDIDA DE CRESCIMENTO E CRIE NOVAS FÓRMULAS PARA AVALIAR O PROGRESSO DAS ECONOMIAS. A “DITADURA” DO PIB PODE TER OS DIAS CONTADOS? HÁ QUEM DEFENDA QUE SIM por maria abreu ilustração ana seixas O ritual repete-se. A cada três meses sai um novo valor da evolução do PIB, as três letras que hoje são referência para qualquer economia e que representam o produto interno bruto. Cada divulgação é aguardada com ansiedade. Enquanto um crescimento, nem que seja mínimo, é motivo de exaltação, uma descida provoca ondas de críticas e desilusão. Governos e países totalmente dependentes da evolução de um único indicador. Mas será o PIB o único modelo eficiente para medir a riqueza de um país? DESENVOLVIMENTO RIQUEZA FELICIDADE MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Um pouco por todo o mundo têm-se multiplicado movimentos para explorar indicadores alternativos a este índice com o objetivo de incluir outros fatores, como o desenvolvimento sustentável ou o bem-estar das populações. Ainda que não tenha surgido um capaz de destronar o PIB, há já vários indicadores que visam substituí-lo. Quando Simon Kuznets criou o PIB, em 1934, o economista alertou para o facto de o bem-estar de uma sociedade não poder ser medido por um indicador de rendimento nacional. Num discurso proferido em 1962, o Nobel da Economia, galardoado devido à sua participação na criação do índice, alertou que devem ser tidas em conta distinções entre quantidade e qualidade do crescimento, entre os seus custos e retornos, e entre curto e longo prazo. Objetivos para mais crescimento devem especificar mais crescimento de quê e para quê”. Mais tarde, em 1968, foi o senador norte-americano Robert Kennedy a dizer que lamentava que o PIB não incluísse “a beleza da nossa poesia ou a força dos nossos casamentos, a inteligência do nosso debate público ou a integridade dos nossos oficiais públicos”. As críticas seguiram-se e têm sido vários os países e organizações a apostarem em indicadores alternativos nos últimos anos, com o objetivo de colmatar as limitações do PIB. O Índice de Desenvolvimento Humano, desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Indicador de Progresso Genuíno (GPI, sigla em inglês) ou a Felicidade Interna Bruta (FIB) são algumas das alternativas que colocam o “homem” mais no centro da análise. Mas, para já, permanece a primazia deste indicador a nível mundial. A capacidade de agregar dados indicativos da atividade de uma determinada região ou país num período de tempo, bem como a possibilidade de medir a sua evolução histórica, dão ao PIB um estatuto específico, sendo para já o único que permite comparar a taxa de crescimento a nível global. Crescimento ou progresso? Mas o que mede, afinal, o PIB? Um carro, uma casa maior, umas férias caras. São tudo indicadores de riqueza e que contribuem para aumentar o PIB de um país. O indicador mede a atividade económica num determinado período através da soma de todos os bens e serviços 1934 Data em que Simon Kuznets alertou que o bem-estar de uma sociedade não podia ser medido por um indicador de rendimento nacional. 20 Número de estados, nos EUA, que utilizam o indicador de GPI (Indicador de Progresso Genuíno) 2006 Em julho de 2006, a New Economics Foundation introduziu O Índice do Planeta Feliz produzidos nesse tempo. Mas, serão estes verdadeiros sinais de crescimento? Luís Aguiar-Conraria, diretor do departamento de Economia da Universidade do Minho, explica que o “PIB mede o valor acrescentado gerado em todas as transações”. No entanto, nem todas as transações são “boas”, “havendo transações de que não gostamos”. “Por exemplo, Duas formas de “medir” os países EUA são o país mais rico do mundo pelo PIB... ... a Noruega lidera no desenvolvimento PAÍS PAÍS IDH** Noruega Austrália Suíça Holanda EUA Alemanha Nova Zelândia Canadá Singapura Dinamarca 0,94 0,93 0,92 0,92 0,91 0,91 0,91 0,9 0,9 0,9 EUA China Japão Alemanha França Reino Unido Brasil Itália Rússia Índia PIB* 17 416 10 355 4 770 3 820 2 902 2 848 2 244 2 129 2 057 2 048 * PIB – PRODUTO INTERNO BRUTO EM MIL MILHÕES DE DÓLARES ** IDH – ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO=INDICADOR COMPOSTO QUE AGREGA PIB PER CAPITA, ESPERANÇA DE VIDA E ESCOLARIDADE FONTE: FMI, PNUD MONTEPIO PRIMAVERA 2015 33 1 o meu mundo OBSERVATÓRIO há vida além do PIB? na compra de coisas poluentes ou num acidente que nos leva a pagar cuidados médicos, temos o PIB a aumentar por maus motivos”, conclui o docente da Universidade do Minho. Luís Aguiar-Conraria lembra ainda o velho exemplo do patrão que casa com a empregada, o que é mau para o indicador, uma vez que esta deixa de receber salário e o seu trabalho passa a não ser contabilizado para o crescimento. Também Isabel Cruz, socióloga especializada em Sociologia do Consumo, realça que “o crescimento 34 INDICADORES Cinco alternativas ao PIB 1 INDICADOR DE PROGRESSO GENUÍNO O Gross Progress Indicator (GPI) pretende ser uma alternativa ao PIB e evoluiu do Índice de Bem-estar Económico Sustentável, criado em 1989 por Herman Daly e John Cobb. Partindo dos aspetos considerados pelo PIB, o GPI ajusta-se depois a outros fatores, como os custos para a economia de efeitos negativos, o crime ou a destruição de recursos naturais. O índice acrescenta ainda o valor de bens e serviços não calculados. Este indicador é utilizado no Canadá e nos EUA. 2 ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO Com mais de duas décadas, o IDH é um reconhecido indicador mundial, desenvolvido pelo PNUD, que procura avaliar e medir o bem-estar de uma determinada população. O indicador é calculado a partir de três indicadores: vida longa e saudável, acesso ao conhecimento e padrão de vida digno. Pretende ainda medir o impacto de políticas económicas na qualidade de vida. A Noruega lidera o ranking a nível global. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 3 FELICIDADE INTERNA BRUTA Criado no Butão como alternativa ao PIB, o FIB assenta em quatro pilares: desenvolvimento sustentável, preservação e promoção dos valores culturais, preservação do ambiente e estabelecimento de um bom governo de forma democrática. O país rejeitou desde 1971 o PIB como a única métrica para medir o crescimento. 4 ÍNDICE DE RIQUEZA INCLUSIVA Lançado pelas Nações Unidas, o Índice de Riqueza Inclusiva pretende medir o progresso das nações através da análise de todas as fontes de capital de um país, incluindo capital humano, manufaturado e natural. O indicador reúne informações referentes à educação, expetativa de vida e recursos naturais, além da produção industrial. 5 ÍNDICE DO PLANETA FELIZ O Índice do Planeta Feliz tem como objetivo medir a capacidade que cada país tem para proporcionar um bem-estar sustentável aos seus cidadãos. Introduzido pela britânica New Economics Foundation em julho de 2006, o índice pretende medir o nível de eficácia dos países para converter os recursos naturais em bem-estar social através da análise do grau de satisfação da população, da esperança média de vida e das políticas ambientais praticadas pelo país. jj A FELICIDADE INTERNA BRUTA NO BUTÃO A economia deste reino no sopé dos Himalaias está indexada aos valores budistas Crise intensifica discussão A crise financeira, que deixou milhões de pessoas numa situação económica de quase rutura, também intensificou o debate em torno da “ditadura” do crescimento medido pelo PIB. O acesso mais fácil ao crédito e o incentivo a uma economia centrada num consumo elevado serviram de rastilho àquela que seria a maior crise desde a Grande Depressão, em 1929, período após o qual viria a adoptar-se o PIB como medida de crescimento mundial. Os governos de todo o mundo foram obrigados a injetar biliões de dólares na economia para incentivar o crescimento, o que suscitou ondas de indignação por parte dos cidadãos. Em 2008 Nicolas Sarkozy, o então Presidente francês, criou uma comissão liderada por Joseph Stiglitz e Amartya Sen para estudar uma alternativa para medir o crescimento em França. Também no Reino Unido, em 2011, o primeiro-ministro David Cameron realizou um inquérito com PUB económico não conduz necessariamente ao desenvolvimento”. Ao longo dos anos assumiu-se que este índice de crescimento é também um indicador de bem-estar e desenvolvimento, sendo esta uma das principais limitações deste índice. Se o objetivo “é medirmos o desenvolvimento sustentável, o bem-estar ou até mesmo a ‘felicidade’ (conceito subjetivo), teremos que recorrer a outros indicadores que não o PIB”, salienta a investigadora. Arthur Wolf, professor da Universidade de Vermont, considera que “o PIB é uma boa estatística de resumo para comparar o bem-estar de países de todo o mundo e a evolução num país ao longo do tempo”. Para o economista, “não é, nem pretende ser, a única coisa que é importante para as pessoas num país”, destacando que as suas limitações são bem conhecidas, “mas o PIB está altamente correlacionado com valores não económicos que a maioria das pessoas consideraria importantes: taxa de mortalidade infantil, esperança média de vida, educação e literacia, qualidade do ambiente e muitos outros fatores”, explica. “É difícil sintetizar num único indicador a nossa qualidade de vida. O PIB é um modo de sumarizar um conceito muito lato”, conclui. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 35 1 o meu mundo OBSERVATÓRIO CULTURA há vida além do PIB? 36 o objetivo de perceber se os britânicos estão “felizes” com a sua vida. Iniciativas que pretendem medir a qualidade de vida dos cidadãos contabilizando fatores não considerados no PIB, como a sustentabilidade e o impacto da poluição na sociedade. “Não importa quão depressa o PIB cresce, um sistema económico que falha em entregar lucros à maioria dos seus cidadãos, e na qual a maioria da população enfrenta um aumento de insegurança é, num sentido fundamental, um sistema económico falhado”, escreveu Stiglitz num artigo publicado no final do ano passado. Também as Nações Unidas se têm empenhado em ir além do PIB. “Igualdade, dignidade, felicidade e sustentabilidade são fundamentais às nossas vidas, mas ausentes no PIB”, disse Helen Clark, administradora do PNUD aquando da apresentação da proposta para criar o Índice de Desenvolvimento Humano Sustentável, no Rio+20, em 2012. “O progresso precisa de ser definido e medido de uma forma que represente uma perspetiva mais ampla do desenvolvimento humano e o seu contexto”, acrescentou. Butão é pioneiro Mas foi num pequeno país dos Himalaias que se quebrou a corrente, com a criação de um novo indicador. “Foi o rei do Butão, Jigme Singya Wangchuck, quem desenvolveu e aplicou o FIB [Felicidade Interna Bruta], designando-o como uma nova fórmula para medir o progresso de uma comunidade ou nação”, explica Isabel Cruz. Nos EUA, o Estado de Maryland foi o primeiro a adotar o GPI (Indicador de Progresso Genuíno), em 2010, quando o governador Martion O’ Malley lançou a iniciativa para apresentar o GPI do Estado através de uma ferramenta MONTEPIO PRIMAVERA 2015 online. Dois anos mais tarde, Vermont passou o GPI a lei. Agora, 20 Estados usam este indicador e o Oregon e Washington estão a caminhar nesta direção. Jon Erickson, professor de Economia Ecológica da Universidade de Vermont, lembra, num texto publicado no blogue de sustentabilidade da instituição, que antes de 1940 não existiam indicadores destinados a medir o crescimento da economia, tendo a criação do PIB surgido justamente para resolver essa lacuna. Mas este índice limita-se a medir o tamanho de uma economia e a sua evolução. Para o docente, os líderes mundiais estão “obcecados” com o sobe e desce do PIB. No entanto, Erickson questiona: isto é crescimento? Quão rápido? Qual é o PIB por pessoa? O mesmo responsável, um dos arquitetos do GPI neste Estado americano, adianta que cada vez mais pessoas questionam o tipo de crescimento e como o mesmo é gerado. Estas questões não podem ser respondidas apenas através da evolução do PIB. Eric Zencey, coordenador do projeto de GPI de Vermont do Instituto Gund, da Universidade de Vermont, que está a compilar uma atualização do indicador para Vermont, defende que a primazia do PIB tem os dias contados. “Acredito que a nossa dependência do PIB vai terminar e que vamos utilizar um indicador melhor de benefício económico líquido (ao contrário do bruto) criado pela economia”, adianta à revista Montepio. E diz porquê: “Trata-se de senso comum. Todos os empresários sabem que um negócio sobrevive ou morre não com base no seu negócio bruto, mas no líquido após os custos. É o mesmo com as economias nacionais e as civilizações.” ? O QUE SIGNIFICA O PIB continua a marcar a agenda económica, mas começa a haver indicadores alternativos que melhor refletem o desenvolvimento dos países P&R Isabel Cruz Socióloga especializada em Sociologia do Consumo O PIB é o indicador mundial reconhecido para medir o nível de riqueza dos países. É o melhor indicador para o fazer? O PIB pode ser definido, de uma forma simples, como o somatório de todos os bens e serviços produzidos numa economia em determinado período de tempo. É o indicador utilizado para medir o crescimento económico. As críticas à utilização deste indicador surgem quando o mesmo é aplicado a outros domínios (social e ambiental, entre outros). Alguns países e organizações têm feito esforços para criar medidas alternativas. Estão no caminho certo? A questão não é tanto encontrar outros indicadores para o crescimento. A ideia de que o crescimento económico não gera prosperidade nem uma melhor qualidade de vida é hoje cada vez mais forte. Existem diversos dados que comprovam que o crescimento reduz o nível de vida de grande parte da população mundial, agravando as desigualdades sociais. As suas consequências sobre o ambiente também são visíveis, quer através da degradação dos ecossistemas, quer do aumento das emissões de carbono. Por último, a ausência de justiça é mencionada como um dos motivos que fundamentam o questionamento desta fórmula convencional de alcançar a prosperidade. 1 o meu mundo CRÓNICA FRANCISCO MOITA FLORES 25 de Abril e REVOLUÇÃO Quarenta e um anos depois, repetem-se as efemérides, fazem-se balanços. Não surpreende que neste momento de crise aguda, já muito demorada e com enormes sacrifícios da população, os discursos hesitem entre o lamento e um futuro sebastiânico, tão desejado quanto mal percebido. 38 Porém, ao olhar para trás, tinha vinte e um anos nesse dia, para além da saudade, sentimento que debota qualquer juízo, qual foi o maior erro que o País cometeu para podermos explicar o estado em que nos encontramos? Fizeram-se coisas extraordinárias. Não era difícil, reconheça-se. Tínhamos sessenta por cento de analfabetos, quase meio milhão de alcoólicos, índices de mortalidade infantil que rondavam os vinte por cento, as auto-estradas chegavam de Lisboa a Cascais e a Vila Franca de Xira. Mais de metade do território não tinha água potável canalizada, nem esgotos, nem sistema de saúde. O avião era um luxo. A relação com o exterior tornava-se uma verdadeira aventura que só uma multidão de emigrantes conhecia pelo sofrimento. Durante estes quarenta e um anos, assistimos e vivemos uma transformação radical. O analfabetismo é residual, as taxas de mortalidade infantil são das melhores do mundo, multiplicaram-se auto-estradas, democratizou-se o avião, a água, a rede sanitária, a iluminação pública chegou a todo o lado. Multiplicaram-se as universidades, modernizou-se a rede escolar, a censura fechou portas, as prisões políticas são, hoje, apenas uma memória a reter. A tudo isto, associou-se a revolução cibernética fazendo explodir as novas tecnologias, multiplicando ferramentas de trabalho e comunicação até ao infinito. Vencedores de tantos desafios, conquistadores de uma sociedade aberta, que faltou para sairmos da cauda da Europa no que respeita à riqueza, ao crescimento sustentado, à pobreza endémica que persiste em cruzar os nossos quotidianos? MONTEPIO PRIMAVERA 2015 No meu entender, não conseguimos enfrentar dois desafios históricos porque nunca se olhou o futuro numa escala de média e longa duração. O mais importante, foi o paradigma em que assentou o desenvolvimento do nosso sistema educativo. Montou-se o dispositivo que garantiu acesso de todas as crianças à educação, prepararam-se professores e programas para responder a esse desafio e descurámos a dimensão humanista e competitiva do conhecimento. Destruiu-se o ensino profissional em nome de mitos classistas. Deixou de se investir naquilo que era necessário apostar, na formação de quadros especializados, com saberes mais complexos. Acredito mesmo, que a crise que vivemos, ainda que baixe a agressividade conjuntural, voltará enquanto não encararmos a Escola como desafio estratégico para a cultura portuguesa em todos os domínios de actividade. O segundo erro é velho. Tem séculos de agravamento e nunca houve coragem para o enfrentar. Herdámos um país desequilibrado demograficamente. Foi sempre assim. Sempre em movimento para o litoral. Concentrando riqueza, crescimento, modernidade nas regiões de costa marítima, deixando mirrar mais de metade do território. Hoje a paisagem demográfica é terrível. A tal ponto que 167 das 308 autarquias do país gerem velhos e paisagens desertas. Crescem os lares e diminuem as escolas. Aumentam os cemitérios e contraem-se as maternidades e o resultado, a não ser enfrentado este terrível problema, é a contínua degradação dos saldos fisiológicos. Este é o flagelo do Portugal de Abril. A derrota maior com todas as consequências que já sentimos em aflição. O grande desafio a vencer para que a utopia nascida nesse dia de Liberdade continue a fazer sentido: só um país rejuvenescido pode sonhar o futuro com a confiança que hoje não temos. NOTA: O autor continua a escrever segundo a chamada norma antiga. A MINHA CIDADE CAMINHOS A PERCORRER EM MOBILIDADE, URBANISMO, SOLIDARIEDADE página 40 página 46 São cada vez mais as autarquias a envolverem os eleitores nas decisões orçamentais. Cascais e Funchal são dois casos de sucesso internacional Os tapetes de pedra que cobrem o chão das cidades contam histórias de um país e de uma arte que têm no calcário a sua matéria-prima criadora ORÇAMENTO PARTICIPATIVO CALÇADA PORTUGUESA 2 a minha cidade AUTARQUIAS ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS PARTICIPAR PARA CONFIAR 40 DAR AOS CIDADÃOS A OPORTUNIDADE DE ESCOLHEREM PROJETOS MAIS À SUA MEDIDA AUMENTA A CONFIANÇA NO PODER LOCAL. PORTUGAL FOI UM DOS PAÍSES PIONEIROS NA IMPLEMENTAÇÃO DOS ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS E JÁ É VISTO COMO EXEMPLO A SEGUIR por susana torrão MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Tomar o destino em mãos. Avançar com propostas para a cidade e decidir em comunidade quais devem ir para a frente. Em Portugal, nos últimos dois anos, os orçamentos participativos (OP) revelaram-se um instrumento fundamental para reconstruir a confiança entre os cidadãos e o poder político local. Depois de um começo tímido, em 2002, Portugal é hoje um case study a nível europeu. No final de 2014 estavam ativos 65 OP, alguns dos quais, como é o caso do de Cascais, convertidos em exemplo internacional. Desde 2002 – data do início dos OP em Portugal – até ao fim de 2014, os portugueses decidiram o destino de 54 milhões de euros dos erários municipais Em 2050, de acordo com dados das Nações Unidas, 66% da população mundial viverá em cidades. Facto que atribui uma importância cada vez maior ao modo como estas são geridas, nomeadamente através da aposta na democracia participativa. Os OP surgiram nos anos 80 na cidade brasileira de Porto Alegre (ver caixa) e estão hoje disseminados por todo o mundo. O estudo Aprendendo com o Sul: o orçamento participativo no Mundo – um convite à participação global, da associação Engagement Global, de Bona, publicado em 2012, sublinha o facto de poderem ser encontrados OP “num largo espectro de sociedades, culturas e sistemas políticos”, incluindo em regimes não democráticos. O estudo estimava que, em 2012, o número de OP no mundo variasse entre os 795 e os 1 469, estando mais de metade na América Latina. Na Europa a disseminação dos OP fez-se rapidamente, em parte graças à participação dos responsáveis políticos europeus nos fóruns sociais de Portalegre e ao crescimento inicialmente registado em países como Itália, Espanha e Portugal. O poder da decisão “Até 2013 tivemos duas grandes gerações de orçamentos participativos. A primeira experiência data de 2002, em Palmela. Nessa altura, a natureza dos OP era essencialmente consultiva. A grande evolução numérica e qualitativa dá-se com os orçamentos participativos deliberativos, em que o cidadão decide investimentos públicos”, afirma Nelson Dias, sociólogo e presidente da associação In Loco, organização que faz a monitorização e acompanhamento de várias experiências de orçamento participativo em Portugal. O processo sofreu altos e baixos ao longo dos últimos anos. Até 2013, os OP em Portugal registavam aquilo a que se pode chamar “uma alta taxa de mortalidade”, que afetava sobretudo os modelos em que os cidadãos podiam apresentar propostas mas não tinham poder decisório. Os números falam por si: em 2009 apenas 15 OP estavam a funcionar, em 2010 tinham subido para 23, aumentando para 33 nos dois anos seguintes e voltando aos 23 em 2013. Depois das últimas eleições autárquicas, no final de 2014, o número de OP subiu em flecha, somando 65 experiências, 55 das quais deliberativas, que envolveram um montante global de cerca de 14 milhões de euros – mais de um quarto dos 54 milhões atribuídos ao longo de 12 anos. EM FOCO Paris, o maior OP da Europa A capital francesa teve o seu primeiro orçamento participativo global apenas em 2014, mas foi a chamada “estreia em grande”. Depois da experiência de OP em alguns dos bairros parisienses, a câmara presidida por Anne Hidalgo atribuiu 5% do orçamento camarário ao OP e avançou com 15 propostas que submeteu ao voto dos cidadãos. Na edição deste ano, aquele que é o maior OP da UE – com 75 milhões de euros – torna-se mais democrático. Desta vez serão os cidadãos, e não a câmara, a avançar com as propostas para votação. ORIGENS Uma história com 30 anos Foi na cidade brasileira de Porto Alegre que surgiram as primeiras experiências de orçamentos participativos, no início dos anos 80. À época, além de ter movimentos sociais com alguma força, Porto Alegre caraterizava-se por um nível de vida superior ao da média nacional e por elevados níveis de desconfiança face ao poder central. O orçamento participativo surgiu com três objetivos: democratizar, inverter as prioridades em favor dos desfavorecidos e erradicar a corrupção e melhorar as políticas públicas. As experiências destes tipos de orçamento foram-se disseminando pelo Brasil, hoje o país à escala mundial com maior densidade de OP – em 2012 tinha mais de 200 OP ativos. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 41 2 a minha cidade AUTARQUIAS participar para confiar jj FUNCHAL O último OP teve a participação de 505 pessoas quando, em média, este tipo de inicativas conta com 50 P&R participantes Nelson Dias Presidente da associação In Loco 42 O que explica o aumento do número de OP? Por um lado o resultado das eleições de 2013. Foi a primeira eleição depois da nova legislação que obrigou ao limite de mandatos, o que provocou uma certa renovação nos quadros das autarquias. Além disso, há um acentuar da necessidade dos eleitos se aproximarem dos cidadãos. Por duas razões: uma tem a ver com a grande desconfiança que se foi instalando na sociedade portuguesa, que afasta cidadãos e políticos, e a outra a crise financeira das autarquias, que leva a uma maior necessidade de aproximação entre quem gere os recursos públicos e os munícipes. Há a ideia de que os portugueses são pouco interventivos na sociedade. Os OP permitiram-lhes uma participação mais direta? Sim, sem dúvida. Mas há uma grande diferença entre OP e outras formas de participação: nos OP os cidadãos controlam o resultado, são eles quem o decide. A participação não é uma variável independente. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 “Os resultados que temos nos processos deliberativos mostram que a participação aumenta de ano para ano. Inclusive, há um número cada vez mais expressivo de pessoas que afirmam não votar nas eleições mas participar nos OP”, afirma Nelson Dias. Confiar é preciso Consoante os modelos e os países em que é aplicado, um OP pode ter diferentes funções. Desde o fortalecimento da democracia e combate à corrupção, ao aumento da transparência ou à abertura de estruturas até então demasiado herméticas. Em Portugal a experiência não gerou um aumento de transparência nas contas autárquicas (ver entrevista), mas os OP têm-se revelado um instrumento poderoso para restabelecer a confiança entre os cidadãos e o poder político local. Nelson Dias sublinha que as reservas existem de parte a parte. “Não são apenas os cidadãos que desconfiam da classe política, muitas vezes esta também duvida dos cidadãos. Considera que estes se organizam em grupos de interesse e não são capazes de pensar o bem coletivo”, afirma. A experiência dos OP tem possibilitado a reconstrução da confiança, permitindo aos responsáveis políticos entenderem que os cidadãos são capazes de lançar propostas que vão ao encontro do bem coletivo e levado os cidadãos a terem mais confiança nos políticos. “Muitas vezes, em reuniões públicas do OP vi pessoas a entrarem na sala com uma proposta e a meio do debate abandonam a sua proposta para darem o seu voto a uma proposta de outra pessoa, porque reconhecem que é mais urgente”, afirma o presidente da In Loco. Além da cada vez maior preponderância de OP deliberativos, Portugal tem outras caraterísticas que o tornam um caso particular dentro da União Europeia. A não partidarização dos OP é uma delas. “Temos OP em câmaras de diferentes cores partidárias, sem grandes distinções metodológicas, embora seja evidente que o partido com mais OP é o PS, seguido do PSD, de coligações PSD/CDS e outras com o PS em coligação. Todas as experiências da CDU desapareceram em 2008 e 2009 e agora estão a ser retomadas, como é o caso de Palmela, mas são consultivas”, explica Nelson Dias. A não partidarização acaba por funcionar como um seguro de vida para os OP. Em Espanha, um dos países onde numa fase inicial houve uma maior proliferação de OP, estes tinham uma vertente muito ideológica, aparecendo muito ligados à Esquerda Unida. Depois das eleições municipais de 2011, com a derrota da Esquerda Unida em grande parte das autarquias, os OP quase desapareceram. Outra caraterística destacada por Nelson Dias é o facto de, em Portugal os OP nunca terem tido objetivos sociais. “Nunca foi o seu objetivo fazer chegar mais recursos públicos, investimento autárquico às zonas mais desfavorecidas dos municípios”, afirma o sociólogo. Contudo, em alguns casos foram os próprios cidadãos a revelar essas preocupações, como aconteceu há dois anos em Lisboa com a aprovação do projeto Lisboa Acessível, que torna parte da Avenida Fontes Pereira de Melo e da Avenida da República acessível a pessoas com mobilidade reduzida. PUB Cascais e Funchal: casos de sucesso Os OP nacionais distinguem-se ainda por um conjunto de boas práticas que têm marcado a diferença. “Alguns são referências no contexto internacional e o que tem maior destaque é o de Cascais. É uma experiência que vai iniciar agora o seu quinto ano, com uma metodologia muito bem concebida e um número cada vez maior de participantes”, refere Nelson Dias. Em 2014 o OP de Cascais teve 41 mil votos na fase final (Carlos Carreiras, o atual presidente da autarquia, foi eleito com 28 mil votos), cerca de 20% da população de Cascais, batendo o recorde a nível eu- ropeu e ficando apenas atrás de Paris. A adesão em massa pode ser explicada pelo facto de qualquer pessoa, mesmo não residente em Cascais, poder participar na votação feita via SMS, mas o presidente da autarquia desvaloriza a participação externa: “É muito residual.” Os níveis de participação da população manifestam-se num cada vez maior empenho na qualidade das propostas, bem como no esforço para as divulgar em verdadeiras “campanhas eleitorais”. A cada um dos proponentes é dada possibilidade de criar um vídeo, através do qual a proposta é apresentada, que é depois divulgado nas redes sociais. “Há ainda quem crie campanhas nas redes sociais, quem distribua folhetos ou faça t-shirts. Há um grande envolvimento, o que também é possível porque, quanto mais não seja, faz funcionar como vizinhos pessoas que de outra maneira não se relacionariam. Um dos males da nossa sociedade é que temos condóminos e deixámos de ter vizinhos”, diz Carlos Carreiras. O OP de Cascais é dos mais ele- vados do país – 1,5 milhões de euros, o equivalente a 6% do orçamento municipal – e tem taxas elevadas de execução. Tudo isto valeu-lhe o prémio do Observatório Internacional da Democracia Participativa e a eleição, no ano passado, como Capital Mundial da Democracia Participativa. “Foi algo que nos deu bastante projeção. Muitos dos nossos técnicos e alguns políticos têm sido convidados para explicarem a nossa experiência, tanto em países do Norte da Europa como em países da América do Sul e em África”, refere o presidente da câmara. Por seu turno, o Funchal tem agora o seu primeiro OP mas já começou a fazer história. A última reunião bateu recordes nacionais com a presença de 505 pessoas – a média nacional para este tipo de reunião ronda os 50 indivíduos. “Não estávamos à espera de tanta gente”, admite Domingos Rodrigues, vereador da Câmara do Funchal, que tutela a Unidade de Democracia Participativa e Cidadania da autarquia, apesar de logo na primeira 43 2 a minha cidade AUTARQUIAS participar para confiar P&R Carlos Carreiras Presidente da Câmara de Cascais 65 ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS ativos em Portugal em 2014 €1,5 milhões VALOR DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO de Cascais, um case study mundial 44 reunião terem comparecido 120 pessoas. A explicação para uma tão grande adesão pode estar no modelo de OP adotado. Um OP deliberativo, totalmente analógico e aberto aos jovens, que podem participar se tiverem 15 anos ou mais. “O OP só faz sentido se for deliberativo. Adotámos um modelo o mais tradicional possível. Optámos pelo analógico não só para fomentar a participação e a votação presencial mas também para uma maior credibilização. Além disso, mais do que números – de participantes ou votantes – é importante iniciar um processo participativo efetivo no qual os cidadãos discutem livremente e frente a frente as suas propostas e opções”, afirma Domingos Rodrigues, para quem este modelo garante ainda a igualdade de oportunidades a todas as faixas etárias. A abertura a uma participação efetiva dos jovens rapidamente deu frutos. Foi deles a primeira proposta aprovada para votação: a construção do Skatepark do Funchal, com um orçamento previsto de 100 mil euros – o montante máximo que pode ser atri- MONTEPIO PRIMAVERA 2015 buído a uma proposta. Os 300 mil euros alocados ao OP representam 2,5% do orçamento camarário. Ao longo de todo o processo, os funchalenses apresentaram um total de 248 propostas, das quais 42 foram para análise técnica, sendo 27 aprovadas para ir a votação, que terminou a 20 de março. Nos dez postos de votação fixos criados pela cidade e no autocarro que percorreu os locais menos acessíveis e funcionou como 11º posto de voto, os funchalenses escolheram entre propostas tão diversas como a criação de dois núcleos de proteção civil, a plantação de um bosque alimentar ou a garantia de acessibilidade ao mar por parte dos cidadãos com necessidades motoras especiais. Gestão do dia-a-dia Um exemplo interessante da resolução de problemas pelos OP aconteceu em São Domingos de Rana. “Há dois anos, um dos projetos aprovados no OP de Cascais foi a construção de um passeio. O passeio era reclamado há mais de 30 anos pela comunidade porque permitiria a ligação a pé entre uma paragem de autocarro e uma escola – os alunos tinham de passar pela berma da estrada e os atropelamentos eram recorrentes. O OP permitiu que as pessoas que defendiam esse projeto se organizassem e promovessem reuniões com o Instituto de Estradas, a Câmara Municipal, a Junta de Freguesia, e conseguissem um consenso para que a obra fosse viabilizada”, conta Nelson Dias. Que balanço faz da experiência do OP? É um balanço muito positivo os técnicos da câmara, que estão muito envolvidos no OP, tiveram de que vem ao encontro dos nossos objetivos. Há um afastamento cada vez maior por parte dos cidadãos em relação à política e aos políticos. Isso cruzado com níveis de falta de confiança cada vez maiores, leva à necessidade de se promoverem mecanismos que aproximem o cidadão da decisão e reforcem os níveis de confiança. sair da sua zona de conforto. Hoje, com tantas leis, o cidadão é imediatamente abafado com a invocação de um decreto-lei. Aqui isso não acontece. No OP os técnicos têm de dar a cara e envolver-se com as pessoas. E, a um terceiro nível, do cidadão, que não está habituado a este poder. Esperava esta adesão? Não tinha qualquer tipo de expetativa. Por um lado, os próprios políticos não estão habituados a abrir mão do poder, num segundo nível Tem havido evolução no OP? Os projetos têm vindo sempre a melhorar e o OP tem-se espalhado por todo o concelho. Mas é o número de cidadãos que participa que é significativo: 2 408 pessoas na última edição do OP que formularam 811 propostas. PUB 2 a minha cidade PATRIMÓNIO CALÇADA TAPEÇARIAS DE PEDRA A CALÇADA PORTUGUESA É UM SÍMBOLO NACIONAL. PODEMOS NÃO REPARAR NOS DESENHOS QUE VAMOS PISANDO, MAS O CALCÁRIO BRANCO E PRETO QUE FAZ DE TAPETE NAS CIDADES CONTA HISTÓRIAS DE UM TRABALHO QUE SE CONFUNDE COM ARTE 46 por miguel ferreira da silva fotografia artur As cartas régias de D. Manuel I, entre 1498 e 1500, promulgaram um calcetamento para evitar que o cortejo de aniversário do rei acabasse manchado de lama. A solução passou por blocos de granito do Porto, material capaz de suportar o peso do Ganga, um rinoceronte branco ornamentado com riquezas do Oriente, a grande atração da festividade. Era o único dia do ano em que o monarca se mostrava ao povo e a manifestação da sua majestade era demonstrada através de um rinoceronte branco e uma calçada. Daí a expressão “quando o rei faz anos”. Passaram quase 350 anos até a calçada portuguesa assumir a forma como a conhecemos, pela mão de Eusébio Pinheiro Furtado, militar e governador do castelo de São Jorge entre 1840 e 1846. Este tenente general decidiu pavimentar a fortaleza lisboeta com pedras de calcário branco, cortadas a espaços por outras de basalto MONTEPIO PRIMAVERA 2015 negro. Estas pedras foram colocadas por presidiários a quem chamaram “grilhetas”. Reza a história que a cidade, em romaria, subiu à sua colina fortificada para admirar o mosaico que os cativos tinham assentado. A Câmara gostou do trabalho e replicou a ideia no Rossio, em 1848. Desta vez utilizando calcário “vidraço”, branco e negro, num desenho inspirado nos Descobrimentos, ao qual foi dado o nome de Mar Largo por representar a curva da rota marítima que permitiu aos heróis do mar ultrapassarem o Cabo das Tormentas e encontrar o Brasil. Durante os primeiros anos do século xx, a calçada foi cobrindo Lisboa até ao “Marquês de Pombal”. Se Lisboa passava despercebida às luzes da ribalta mundial da primeira metade do século xx, o calçadão de Copacabana deu-se a conhecer ao mundo em 1942 com o filme Saludos Amigos, de Walt Disney, quando Zé Carioca e o pato Donald dançaram a “Aguarela do Brasil” com Maria do Carmo Miranda, uma portuguesa de Marco de Canaveses conhecida para sempre como Carmen Miranda. Poesia nas ruas Ernesto Matos, Associado do Montepio, é investigador, fotógrafo e designer, e a sua obra constitui uma das mais completas recolhas fotográficas de calçada portuguesa em Portugal e no mundo. “Calçada portuguesa é comunicação”, adianta. “Para mim são obras de arte disponíveis 24 horas por dia”, refere, destacando a minúcia do trabalho executado pelos calceteiros. Ernesto Matos relembra a expressão dos mestres calceteiros, que gabando-se do seu trabalho diziam que em “cada pedra que se encaixa não cabe nem uma mortalha de tabaco”. No entanto, o investigador critica a generalidade dos trabalhos realizados hoje em dia. “Já não se faz o emparelhar para encaixar”, alertando para a perda de qualidade que muitos pavimentos têm sofrido. Adianta várias causas, desde o elevado custo e morosidade da colocação da calçada portuguesa a motivos sociais. “É um trabalho muito duro e ninguém quer um filho a fazer calçada portuguesa”, conclui. Hoje, como nos primórdios, os calceteiros são homens e mulheres que permanecem anónimos. Poucos são os que notam as suas assinaturas, identidades de um labor muitas vezes disfarçado no padrão da empreitada. Levantados do chão Nos Olivais, em Lisboa, encontra-se a Quinta Conde dos Arcos. O seu espaço funciona como um refúgio no meio da cidade, tal a calma que se sente na sua propriedade, não obstante estar no centro de uma das maiores freguesias lisboetas. Ali fica a Escola de Calceteiros da Câmara Municipal de Lisboa, que ministra o curso de formação profissional nesta área desde 1986. Luísa Dornelas, responsável pela formação da MONTEPIO PRIMAVERA 2015 47 2 a minha cidade PATRIMÓNIO calçada 48 jj ELEVAR AO CUBO A partir de uma rocha com 15 toneladas, procede-se à sua desmultiplicação em calçada. A tecnologia envolve guilhos, palmetas, maços, martelos e o saber fazer de quem constrói ruas a partir de uma montanha Câmara Municipal de Lisboa (CML), refere que “o foco do curso é o munícipe”. O curso tem 1 800 horas e dá equivalência de qualificação escolar e profissional. Nesse ano e meio, além das disciplinas curriculares, os alunos aprendem o que são rochas ornamentais, a história da calçada, a técnica e algum treino prático. Mas também aulas de desenho, medições e orçamentos. A ideia é “promover a criação de autonomia e a perceção de direitos e deveres na sociedade” junto dos formandos, refere Luísa Dornelas. A maioria dos alunos são cidadãos com baixa qualificação, denotando MONTEPIO PRIMAVERA 2015 geralmente alguma “debilidade financeira e social”. Sabe que são pessoas que não vão tornar-se empresários de um dia para o outro, mas refere que este é um mercado no qual “os habituais empregadores (estatais) terão de se reinventar”, reconhecendo que o futuro da calçada passa pelo “setor privado ao qual caberá o interesse em reformular” este trabalho com melhores rendimentos. Jorge Duarte, formado na Escola de Calceteiros, já executou vários trabalhos, no Brasil, Venezuela, Holanda e Espanha, recordando-se de um trabalho seu em calçada executado no interior do edifício do Montepio, na Rua Áurea. Hoje é mestre calceteiro e formador da Escola de Calceteiros. Montanhas de pedra Na origem da calçada está uma montanha que os homens da pedra conhecem como as próprias mãos. Uma máquina de perfuração separa um bloco calcário com mais de 15 toneladas. Um homem sobe para o monólito e crava três guilhos com aurifícia precisão. Três pancadas com um malho e a rocha abre pelo veio como uma fatia de bolo. A visita à pedreira é feita por Celso Gonçalves, criador da marca Roc2c e PUB jj APRENDER UMA ARTE São 1 800 horas, ou ano e meio de formação, para os aspirantes a calceteiros. O curso é realizado na Escola de Calceteiros da Câmara Municipal de Lisboa, na Quinta Conde dos Arcos, nos Olivais, e dá equivalência de qualificação escolar e profissional trução assinalada pelo evento que foi a Expo ‘98. Luísa Dornelas reconhece “o boom que a Expo ‘98 significou para a calçada portuguesa”, nomeadamente no plano artístico, sendo disso exemplos o Alto Mar de Fernando Conduto, Monstros Marinhos, de Pedro Proença, Calçada do Mar Português, de Xana e Caminho de Água, de Rigo, todos pavimentos situados no Parque das Nações. Luísa Dornelas atenta que “a execução técnica (da calçada) é muito importante”, reforçando a importância de “incorporar o valor estético com uma boa execução e teatralidade”. Celso Gonçalves relembra que o mercado exigia “calçada portuguesa e o brio profissional ficou para segundo plano”. especialista no comércio e aplicação de pavimentos em pedra natural e calçada portuguesa. “O que me fascinou foram as máquinas da pedreira”, conta Celso Gonçalves. Ex-jogador do Hóquei Clube de Turquel, iniciou a atividade em 1999. “Nessa altura havia 300 pedreiras a funcionar”, entre Barreirinhas e Pé de Pedreira, localidades da freguesia de Alcanede, encrustadas no Maciço Calcário Estremenho da Serra de Aire e Candeeiros. “Hoje a exploração está reduzida a 30 ou 40 pedreiras”, comparando com a “época de ouro” da cons- Calçada a referendo No início de março, a junta de freguesia de Campolide, em Lisboa, procedeu a um referendo aos seus moradores sobre a mudança, nas suas zonas históricas, de calçada portuguesa para outro pavimento. As escolhas eram “calçada, tradicional à semelhança do que já existe” ou “outro tipo de pavimento contínuo, mais moderno e seguro”. Apesar de só terem votado 350 moradores de 15 000 recenseados, ganhou o “pavimento mais moderno e seguro” com 61,5%. André Couto, presidente da junta de freguesia de Campolide, decidiu proceder à consulta popular por considerar que, em certas zonas, a tradição se sobrepunha à segurança. Luísa Dornelas afirma que “a segurança é sempre uma prioridade”, adiantando que “não choca se nalgumas áreas mais perigosas se substitua a calçada por 2 a minha cidade artesãos e artistas”. Luísa Dornelas partilha esta visão de alargamento do uso da calçada “a uma utilização vertical”. PATRIMÓNIO calçada ^ O principal núcleo da sua exploração fica na Serra de Aire e Candeeiros, onde se encontram calcários com várias tonalidades, desde brancos a cinzentos e negros ^ O tipo de calcário mais utilizado na calçada portuguesa é o vidraço ^ As explorações de calçada portuguesa estão implantadas em flanco de encosta suave, com escavações que podem atingir entre três a dez metros de profundidade ^ A maior parte da extração continua a ser artesanal, ainda que apoiada por alguns meios mecânicos como retroescavadoras ou martelos pneumáticos 50 outro pavimento”. No entanto, prefere realçar as qualidades da calçada portuguesa: “Confere uma imagem única a Lisboa e é responsável pela intensidade de luz da cidade.” Além disso, são “caminhos de um material com 90% de reaproveitamento”, referindo ainda que os “resíduos por um caminho levantado são menores” promovendo a “reutilização de materiais”. Por outro lado, Luísa Dornelas reforça que “as cheias em Lisboa são menos graves porque te- mos calçada portuguesa”, uma vez que “os espaços entre as pedras permitem a drenagem e o escoamento” das águas. Ernesto Matos afirma mesmo que “a calçada portuguesa é um material reciclável”, uma vez que a sua transformação “não sofre processos de industrialização”. Por outro lado, o investigador refere que a calçada portuguesa pode reinventar-se também na utilização, como por exemplo ”fazer calçada nas paredes, dando novas oportunidades a SABER FAZER Processo de extração de calçada O processo é comum em todas as pedreiras. Primeiro procede-se ao desmonte da rocha. Este processo pode envolver uma máquina giratória ou explosivos, como a pólvora negra. De seguida recorre-se ao martelo pneumático para furar a rocha, inserindo-se o guilho e MONTEPIO PRIMAVERA 2015 as palmetas. Com um maço de seis a oito quilos percute-se o guilho até fraturar a rocha. Depois, aplica-se a marreta para reduzir o restante a paralelepípedos com 40 por 20 centímetros. Esta medida permite minimizar o desperdício. Essas pedras são então “traçadas“ com um pequeno martelo, dando origem a pedras com as dimensões de calçada portuguesa. As pedras são armazenadas em estaleiro sendo posteriormente transportadas a granel. Farol para o mercado Celso Gonçalves confessa que “o facto de ter um site e de ter o trabalho exposto é uma boa forma de angariar novos clientes”. Reforça a “confiança numa equipa com dez anos de experiência”. Estar perto da produção da matéria-prima tem vantagem no controlo de qualidade. Neste momento “tenho o ciclo fechado”, afirma. “Faço o projeto, peço a pedra, contrato a mão-de-obra e executo no local”, conclui. Dos seus trabalhos em calçada destaca os 22 000 m2 na Avenida Dom José Alves Correia da Silva, junto ao Santuário de Fátima, e as parcerias com gabinetes de arquitetura de David Chipperfield, Gonçalo Byrne e Siza Vieira no empreendimento de luxo Bom Sucesso, em Óbidos. O processo industrial da transformação do calcário “nada tem a ver com a calçada portuguesa”, diz Celso Gonçalves. “Onde nós temos uma pedra com 15 toneladas, ali eles trabalham com centenas.” A calçada portuguesa “continua a ser um trabalho artesanal” que recorre a “pequenas pedreiras onde se trabalha individualmente”. As pedreiras nesta região, explica, “são trabalhadas normalmente por uma equipa de dois indivíduos com as máquinas”. Celso afirma que “as empresas de exploração pagam uma renda à junta ou aos baldios”. Neste caso pertence ao Conselho Diretivo dos Baldios, que engloba as localidades de Valverde, Pé da Pedreira, Barreirinhas e Murteira. Apesar de haver muita procura, Celso diz que não se tem assistido a uma renovação dos trabalhadores das pedreiras. “Há dez anos que não entra ninguém novo”, refere, sem esquecer que é uma profissão de desgaste e com evidentes riscos associados. “Valorizar a profissão” e “um plano de recuperação das pedreiras” são medidas que considera urgentes para que não se perca a primeira etapa das ruas portuguesas. A MINHA ECONOMIA PRODUTOS FINANCEIROS, SUGESTÕES E EMPREENDEDORISMO página 52 página 56 página 60 Conheça quatro startups que fazem do verão a sua estação principal, mas que já afirmaram o seu valor na nova vaga de negócios de comércio e turismo fora de época Há mais de dois milhões de portugueses a viver fora de Portugal. Como é que se alimenta uma relação à distância entre o banco e os residentes no estrangeiro? A moda é uma questão de gosto e os gostos portugueses não se discutem, exportam-se, como mostram algumas empresas deste setor que estão a fazer a diferença NOVAS EMPRESAS FINANÇAS PESSOAIS NEGÓCIO INTERNACIONAL 3 a minha economia EMPREENDEDORISMO NEGÓCIOS STARTUPS DE VERÃO 52 COM A CHEGADA DO CALOR, O TRABALHO DOS EMPREENDEDORES QUE TENTAM IMPULSIONAR NEGÓCIOS RELACIONADOS COM O AR LIVRE OU VOCACIONADOS PARA O TURISMO AUMENTA DE FORMA VERTIGINOSA. PARA MUITAS STARTUPS ESTA É A ÉPOCA ALTA por ana sofia calaça fotografia artur No verão é tempo de empreender e nos negócios ligados ao turismo, as startups desdobram-se em esforços para vencer no mercado. Com os consumidores ávidos de novidades, a capacidade de inovar é um segredo para qualquer empresa recém-criada. Para os empreendedores que “descobrem” negócios que permitem tirar proveito do melhor que esta época tem para oferecer, este é um momento de oportunidade. É o caso de Mónica Pena Ferreira que lançou, em junho de 2013, a Monica Lisbon Rentals, uma imobiliária que se dedica ao arrendamento turístico nos bairros históricos da capital. Os apartamentos, batizados com nomes que marcam Portugal – Fado, Guitarra, Tejo –, localizam-se na encosta MONTEPIO PRIMAVERA 2015 do Castelo, com vista para o rio, e são muito procurados por famílias atraídas pelo charme desta zona da cidade. Na Startup Lisboa, uma incubadora de empresas onde esta jovem imobiliária tem sede, a empreendedora não tem mãos a medir com o trabalho no verão. “Lisboa está na moda e prevejo que o turismo vai continuar a expandir-se”, refere a jovem empresária. A receita para que o seu negócio vá abrindo ainda mais portas está na ponta da língua: “Trabalhar com confiança e otimismo é essencial.” São muitos os empreendedores que estão a apanhar a nova onda de crescimento do turismo em Portugal. As receitas turísticas aumentaram 12% em 2014 em comparação com o ano anterior, de acordo com os mais recentes dados do Banco de Portugal, e o governo reforça a mensagem lembrando que “este foi o melhor ano para o turismo” no país. O recorde do setor estende-se também às dormidas e lucros da hotelaria, que no ano passado cresceram, respetivamente, 11% e 12,8%, segundo o Instituto Nacional de Estatística. Mas há mais dados que mostram a tendência do turismo nacional e a dependência do estrangeiro. O estudo “Desafios do Turismo em Portugal 2014”, da consultora PwC, indica que “desde junho de 2010 as dormidas de não residentes têm apresentado taxas de crescimento positivas face ao mês homólogo, salvo as exceções verificadas no final de 2011 e maio de 2013, com especial impacto em Lisboa, Algarve e Madeira, cuja dependência do turismo externo se situa entre os 75% em Lisboa e no Algarve, e os 90% na Madeira”. ^ BERÇO DO NEGÓCIO A Startup Lisboa, fundada com o apoio do Montepio, apoia-se no dinamismo da capital para atrair clientes e investimento. Nesta incubadora já nasceram mais de 200 startups que resultaram na criação de cerca de 700 postos de trabalho Investir no turismo e navegar com vento favorável A inovação e o empreendorismo são ingredientes-chave para projetar a imagem de Portugal como um destino turístico diferenciado e atrativo. Quem o lembra é José Diogo Madeira: “O turismo é uma área crucial para o crescimento da economia portuguesa”, realça um dos fundadores do Jornal de Negócios e que atualmente lidera a Ezimute, uma plataforma eletrónica que é uma fusão entre um guia turístico e um espaço de reservas on-line de tours, atrações e restaurantes. A relação entre qualidade e preço é um dos fatores que tem atraído turistas para terras portuguesas. José Diogo Madeira explica que a aposta das companhias aéreas nos voos low cost para Lisboa contribuiu para o crescimento do turismo e considera que faz todo o sentido investir em força neste setor. “É mais fácil aproveitar um mercado que esteja em crescimento. O turismo é muito dinâmico em Portugal. É uma área que está a crescer e no qual o país tem vantagens competitivas. Navegar com vento favorável ajuda sempre”, sublinha. Os dois empreendedores lembram os ingleses, alemães ou russos que andam de t-shirt e calções, em pleno inverno, nas ruas de Lisboa. “O clima agradável é um cartão-de-visita poderoso”, sublinha Mónica Pena Ferreira, defendendo que cada vez mais as pessoas marcam as estadas de acordo com as previsões meteorológicas e surgem muitas reservas de última hora, mesmo na época baixa. Um dos desafios das “startups de verão” é superar com sucesso o obstáculo da sazonalidade, embora os empreendedores revelem que existe agora um alargamento da chamada época alta. “O verão é significado de muitos turistas, mas a ocupação elevada estende-se entre os meses de março e outubro”, salienta a criadora da Monica Lisbon Rentals. Também José Diogo Madeira, da Ezimute, afirma que não existe uma temporada baixa e alta na capital, sublinhando que este será o melhor ano turístico de sempre em Lisboa. Mas o que fazer nos dias de chuva? Mónica Pena Ferreira conhece bem a resposta: “Os portugueses procuram-nos nos períodos de inverno, o que é bom para enfrentar a época baixa. São pessoas que estão em projetos profissionais em Lisboa”, explica. Quem quer fazer um piquenique? Se verão é significado de bom tempo, natureza e refeições ao ar livre, então é sinónimo de piqueniques. A marca Anita Picnic, startup que aposta em cestos e outros acessórios totalmente feitos à mão, é um exemplo de empreendedorismo que aproveita o conceito de piquenique mas não se rende ao clima. “As pessoas têm a ideia de que o cesto de piquenique só pode usar-se P&R João Vasconcelos Diretor executivo da Startup Lisboa Que importância assume a Startup Lisboa no lançamento de novas empresas e no estímulo ao empreendedorismo na capital? Desde a sua abertura, a Startup Lisboa já apoiou mais de 200 startups e promoveu a criação de mais de 700 postos de trabalho. O nosso papel é ajudar os empreendedores a atraírem clientes, investimento e a desenvolverem modelos de negócio escaláveis, com base na associação com mentores e parceiros estratégicos. Qual o papel das startups de verão numa cidade como Lisboa, um ponto de atração de turistas a nível mundial? O turismo é um dos setores que privilegiamos na Startup Lisboa e estamos sempre abertos a acolher bons projetos nesta área, de base tecnológica e não só. O número de visitantes que Lisboa tem acolhido nos últimos anos comprova que Lisboa apresenta várias janelas de oportunidade neste setor para muitos empreendedores lançarem os seus negócios. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 53 3 a minha economia EMPREENDEDORISMO startups de verão 54 no verão, mas existem imensas formas de surpreender alguém. O piquenique pode ser o que se quiser. Depende da imaginação. Já fui, por exemplo, entregar de bicicleta um cesto a casa de uns namorados”, explica a designer de moda Carla Cantante que, em conjunto com o diretor criativo Pedro Pires, se lançou no mundo dos negócios. “Há uns anos não havia ninguém nos parques e jardins, agora estão cheios. As principais alterações relacionam-se com o que está a acontecer no país e no mundo. As pessoas têm menos dinheiro, e quando não querem fazer uma refeição fora de casa, vão para o jardim e fazem um piquenique”, acrescenta esta jovem, que tem como meta expandir o negócio internacionalmente e já conseguiu clientes na Alemanha, Grã-Bretanha e Argentina. A exportação é uma das novas tendências das startups que nascem em Portugal. O número de empresas recém-criadas que exporta no primeiro ano de vida aumentou de 8%, em 2007, para os 10%, em 2013, segundo o “Estudo do Empreendedorismo em Portugal: 2007-2014”, da consultora Informa D&B. Destas, metade do volume de negócios advém das exportações, tendo atingindo os 67%, a percentagem mais alta desde 2007. O estudo refere ainda que no quinto ano de atividade a taxa das empresas exportadoras duplica. Ideias originais para voar mais alto A multinacional AirHelp, com sede na Polónia, lançou os dados em 2013 e apostou numa ideia à escala global: ajudar os clientes das companhias áreas a reclamarem e receberem indemnizações por causa de problemas nos voos (atrasos, cancelamentos ou overbooking), um negócio com mais lucro no verão, quando o tráfego aéreo MONTEPIO PRIMAVERA 2015 aumenta devido aos períodos de férias. Esta startup, que conseguiu captar investidores em Silicon Valley, conta com uma equipa de 50 jovens americanos, polacos, dinamarqueses, finlandeses, suecos, alemães, espanhóis e italianos espalhados por vários cantos do planeta. A empresa tem como objetivo ajudar os passageiros aéreos a fazerem valer os seus direitos. Por exemplo, se chegarem a um destino com um atraso superior a três horas podem pedir uma indemnização de 600 euros por pessoa, o que para uma família, constituída por um casal e duas crianças, equivale a 2 400 euros. Maria Tavares, 25 anos, licen ciada em Economia e com um mestrado em Finanças pela Universidade Nova de Lisboa, é a country manager da AirHelp em Portugal e está agora a expandir a empresa para o Brasil. “Ser empreendedor está na moda, mas só vão sobreviver os que têm ideias e acreditam nelas. Na Startup Lisboa, onde tenho a minha base, há pessoas com elevadas qualificações que estão a lutar com todas as forças por uma oportunidade”, defende, acrescentando que “o sonho move montanhas”. 1 1 José Diogo Madeira, responsável pelo projeto Ezimute 2 Carla Cantante, fundadora da marca AnitaPicnic 3 Maria Tavares, country manager da AirHelp em Portugal 4 Mónica Pena Ferreira, fundadora da imobiliária Monica Lisbon Rentals Ezimute NASCIMENTO Este guia turístico on-line surgiu no final do primeiro semestre de 2014 para criar um modelo de negócio que serve, em simultâneo, os operadores turísticos e os turistas que visitam Lisboa. Na plataforma digital é possível fazer reservas para tours, atrações turísticas e restaurantes. “O Ezimute premeia os utilizadores e também quem o recomenda.” LEMA “Para quem gosta de viajar…” OBJETIVOS Depois de ter chegado a Lisboa, Porto, Alentejo e Algarve, o objetivo é apostar na internacionalização. Espanha será o próximo destino. DESAFIOS A principal dificuldade foi conseguir colocar a funcionar uma rede de parceiros, denominados embaixadores, embora neste momento a adesão seja tão grande que são os próprios operadores turísticos que pedem para participar na plataforma digital, explica o responsável pelo projeto, José Diogo Madeira. Cada embaixador tem um código, que permite um desconto de 3% nas reservas feitas no Ezimute. Destas, os parceiros ganham 4% nas tours ou atrações e 50 cêntimos por pessoa sentada num restaurante. O Ezimute oferece mapas turísticos da cidade com o código de cada embaixador, para serem distribuídos aos amigos e turistas. PAPEL DA STARTUP “Ter um espaço próximo do centro da cidade é o ideal devido à natureza da nossa atividade. Cruzar e trocar experiências com outras startups também é muito importante porque permite o acesso a uma série de conhecimentos que se estivéssemos isolados num escritório não conseguiríamos.” AirHelp NASCIMENTO Os criadores da AirHelp são da Dinamarca, onde esta startup nasceu em 2013, mas entretanto a sede mudou para Gdansk, na Polónia, com o objetivo de aproveitar os recursos humanos qualificados e o custo de vida mais baixo neste país. A ideia é ajudar os clientes das companhias aéreas a reclamarem por causa de atrasos nos voos, cancelamentos ou overbooking. O passageiro terá que preencher um formulário on-line com os pormenores do voo e a equipa da AirHelp entra de seguida em contacto com a companhia e encarrega-se de todo o processo, até aos tribunais, se for necessário. Os serviços da AirHelp funcionam para voos a partir da Europa ou para a Europa. LEMA “Não ganha, não paga.” O serviço da AirHelp é totalmente gratuito. Só no caso de o cliente ser indemnizado é que será cobrada uma taxa de 25% sobre o valor da indemnização. OBJETIVOS Recuperar o dinheiro dos clientes. DESAFIOS “É preciso gerir expetativas. Temos um trabalho inglório, que é ajudar pessoas zangadas com companhias áreas, o que nem sempre é fácil”, explica Maria Tavares, country manager da AirHelp em Portugal. PAPEL DA STARTUP LISBOA “A Startup Lisboa é identificada como uma marca de sucesso, dá-nos uma exposição e um selo de qualidade maiores do que se estivéssemos sozinhos”, refere. 3 2 Anita Picnic NASCIMENTO A marca foi lançada em maio de 2014 e surgiu de uma necessidade pessoal da fundadora, Carla Cantante. “Para festejar o aniversário do meu filho, na primavera, queria organizar um piquenique, mas não existiam acessórios que me fascinassem. E pensei: Porque não criar uma marca de objetos de piquenique que vá ao encontro do meu gosto e das necessidades que existem?”, recorda. LEMA “Celebrar a vida ao ar livre.” OBJETIVOS Crescer ao nível das exportações e ver reconhecido o trabalho dos artesãos da zona da Guarda. “Cada peça demora dois dias a ser concluída, o que tem um valor incontornável, é quase uma obra de arte”, explica. DESAFIOS O maior obstáculo é encontrar artesãos que tenham vontade de fazer algo diferente. “São pessoas de muita idade, com uma noção de tempo e trabalho diferente”, realça a designer. PAPEL DA STARTUP LISBOA “Esta incubadora de empresas é importante para tirar algumas dúvidas, mas nunca fazem o trabalho por nós. Cada empreendedor tem que desbravar o seu próprio caminho”, explica Carla Cantante. 4 Monica Lisbon Rentals NASCIMENTO A ideia para esta imobiliária de arrendamentos turísticos surgiu de forma espontânea, aproveitando os edifícios de que as fundadoras eram proprietárias no centro de Lisboa. “Os estrangeiros vinham bater à porta para perguntar se arrendávamos quartos ou apartamentos e, quando nos apercebemos desta situação, começámos a remodelar os imóveis para dar resposta ao mercado”, explica Mónica Pena Ferreira que abriu esta startup em conjunto com a mãe, Isabel Sá Ferreira. LEMA “Em Lisboa sejam lisboetas.” OBJETIVOS Manter a qualidade dos apartamentos. DESAFIOS O grande desafio é corresponder às expetativas dos clientes e o maior obstáculo relaciona-se com o crescente número de alojamentos locais que tem aparecido em Lisboa. PAPEL DA STARTUP LISBOA “A Startup Lisboa é um modelo de sucesso que dá aos seus incubados muita segurança porque atua ao nível do networking de um modo exímio”, defende Mónica Pena Ferreira. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 55 3 a minha economia FINANÇAS PESSOAIS EMIGRAÇÃO LONGE DA VISTA, PERTO DA MINHA CONTA 56 OS MAIS DE DOIS MILHÕES DE PORTUGUESES ESPALHADOS PELO MUNDO PODEM REALIZAR OPERAÇÕES BANCÁRIAS COMO SE ESTIVESSEM EM TERRITÓRIO NACIONAL, COM TODA A FACILIDADE, COMODIDADE E SEGURANÇA. SAIBA COMO ESTAR PERTO DO SEU BANCO MESMO LONGE DE PORTUGAL por cristina almeida EDUCAÇÃO INFORMAÇÃO Guias de Emigração Ei Montepio Conheça tudo o que precisa de saber em ei.montepio.pt MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Rita Ferreira tem 28 anos e é jornalista. Em setembro de 2012 comprou um bilhete de ida e volta, fez as malas e partiu rumo ao Brasil. Na conta bancária tinha o saldo suficiente para se sustentar durante três meses, mas na bagagem carregava a expetativa de encontrar melhores condições de emprego. Em apenas duas semanas, Rita recebeu uma proposta de trabalho. Hoje é assessora do conselho de administração de uma empresa portuguesa com atividade no Brasil, escreve artigos para várias publicações e é correspondente da Euronews, em São Paulo O testemunho de Rita inclui-se no retrato da nova vaga de emigração portuguesa: mais jovem e qualificada do que no passado. Entre 2007 e 2012 saíram do País, em média, 80 mil pessoas por ano e os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística revelam que mais de 128 mil portugueses deixaram Portugal em 2013. Os jovens entre os 20 e os 29 anos representaram 41,5% das saídas. Estima-se que há no mundo cerca de 2,3 milhões de portugueses emigrados e Portugal é mesmo o segundo país da União Europeia com mais emigrantes em percentagem da população (20,8%), de acordo com os dados do relatório governamental sobre emigração, da autoria da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas. A dimensão da diáspora mais do que justifica a aposta do setor financeiro na criação, ao longo de várias décadas, de produtos e serviços direcionados exclusivamente para o segmento de residentes no estrangeiro. A evolução da oferta bancária tem acompanhado as alterações do fenómeno da emigração e está hoje totalmente adaptada aos novos perfis migratórios. Um espaço único A relação dos portugueses com a banca é imune à mobilidade geográfica. O homebanking anula as fronteiras da gestão bancária e os escritórios de representação espalhados pelo mundo são fundamentais para garantir a proximidade e o acompanhamento especializado e permanente aos portugueses não residentes em Portugal. Gerir a conta corrente, fazer pagamentos ou transferências, enviar ou receber dinheiro, valorizar as poupanças e incrementar os investimentos, realizar projetos com acesso a financiamento e subscrever soluções de proteção são opções acessíveis a todos os portugueses que vivem, trabalham ou estudam no exterior. Cinco dúvidas frequentes 1 Como posso movimentar a minha conta a partir do exterior? Pode movimentar a sua conta com toda a segurança e comodidade a partir do Montepio24. Os serviços Net24, Netmóvel24 e Phone24 permitem realizar todas as operações e esclarecer qualquer questão. Pode ainda dirigir-se a um dos escritórios de representação do Montepio na Alemanha, Bélgica, Luxemburgo, Suíça, França, Estados Unidos e Canadá. 2 Que transações podem ser realizadas? Pode realizar todas as transferências, pagamentos e operações de gestão diária, acompanhar as diversas soluções de poupança e investimento, realizar operações internacionais, como transferências ou reservas de moeda, e verificar contratos de crédito ou dar instruções para operações na bolsa. 3 Posso abrir um depósito na moeda do país onde resido? Sim, o Montepio disponibiliza depósitos à ordem e a prazo em moeda estrangeira, como franco suíço, dólar americano e libra inglesa, entre outras. As taxas de juro variam em função da moeda, prazo e montante. Desta forma, evita os riscos cambiais se pretender efetuar pagamentos em moeda estrangeira. 4 Posso obter financiamento para comprar casa em Portugal? Sim, pode pedir um crédito para realizar um investimento em imobiliário. No Portal Montepio Imóveis encontra uma vasta carteira de imóveis para residência de férias, para o seu regresso ou para viver na reforma. Conheça as condições especiais de financiamento e as vantagens exclusivas. 5 Qual a linha de contacto? A partir do estrangeiro ligue +351 21 724 16 24. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 57 3 a minha economia FINANÇAS PESSOAIS emigração Catarina Marques Relações públicas numa ONG em Dublin 58 “Continuo a ter uma conta bancária em Portugal e utilizo-a maioritariamente para efetuar transações bancárias com familiares e amigos. Contudo, também tenho uma conta bancária na Irlanda. Entre as minhas operações mais frequentes estão as transferências para Portugal e os pagamentos para algumas contas de débito direto que estão associadas à conta portuguesa. A distância física não alterou a minha relação com a banca.” Além das contas que podem abrir em Portugal, como qualquer cidadão residente em território nacional, “os emigrantes têm a possibilidade de ser titulares de uma ou várias contas especiais denominadas contas emigrante”, lê-se na página oficial da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas. A abertura e a manutenção da Conta Emigrante dependem da comprovação anual do estatuto de emigrante, concedido a quem exercer uma atividade profissional remunerada no estrangeiro, mantendo aí a sua residência permanente. O estatuto é essencial para aceder a produtos e serviços criados exclusivamente para os residentes no ex- MONTEPIO PRIMAVERA 2015 terior e é o passaporte para benefícios fiscais, como a isenção do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT). Se viver no estrangeiro era sinónimo de abrir uma conta bancária numa instituição do país de destino, hoje a realidade é bem diferente tanto na emigração permanente como na temporária. Desde agosto de 2014, os portugueses residentes nos países da União Europeia, Islândia, Noruega, Liechtenstein, Suíça, Mónaco e San Marino beneficiam da área única de pagamentos em euros (SEPA, na sigla anglo-saxónica). Na prática, podem utilizar uma única conta bancária para efetuarem todas as transações entre dois países do espaço SEPA. Além de poderem receber o ordenado na conta de Portugal, os cidadãos podem realizar transferências ou domiciliar os pagamentos de serviços prestados por qualquer empresa europeia. Por exemplo, é possível pagar a luz, água ou gás de uma residência no estrangeiro através de um débito direto SEPA, indicando a conta domiciliada em Portugal. No espaço dos 34 países SEPA não há diferenças nos preçários entre operações nacionais e transfronteiriças. A criação do conjunto único de instrumentos de pagamentos torna-se ainda mais relevante numa altura em que hierarquia dos países de destino da emigração portuguesa está a sofrer alterações na sua composição. Em 2010, mais de dois terços dos portugueses emigrados viviam na Europa e quase um terço na América do Norte e do Sul. No resto do mundo apenas viviam cerca de 3% dos portugueses emigrados. No mesmo ano, seis dos dez principais países de emigração eram europeus. Poupar em Portugal Os dois países onde residem mais portugueses, França e Suíça, são a origem de mais de metade do total de remessas recebidas em Portugal. O envio de poupanças tem um peso importante glossário Três termos bancários que entram no vocabulário de quem muda de país para residir — SWIFT Representa o código que identifica a instituição financeira e é essencial para realizar uma transferência internacional. — SEPA Significa área única de pagamentos em euros. Facilita as transferências a crédito, os débitos diretos e a utilização de cartões entre 34 Estados-membros (União Europeia e Islândia, Liechtenstein, Mónaco, Noruega, Suíça e San Marino). — IBAN É o número internacional de conta bancária, necessário para validar transferências a crédito ou débitos diretos no espaço SEPA. 3 057 milhões VALOR DAS REMESSAS de emigrantes em 2014 2,3 milhões NÚMERO de portugueses emigrados 41,5% PESO DOS JOVENS no total da emigração 41,5 % na balança de transações correntes do País face ao estrangeiro, embora os valores atuais estejam muito longe do pós-25 de Abril. Em 1979, as remessas de capital enviadas por portugueses a trabalhar no estrangeiro atingiram o valor mais alto de sempre, chegando a pesar mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) português. Em 2014, o envio de dinheiro para Portugal ultrapassou, pelo segundo ano consecutivo, os três mil milhões de euros, representando cerca de 2% do PIB. As instituições bancárias desempenham um papel crucial na oferta de soluções para quem trabalha no estrangeiro e quer poupar em Portugal. Os vários mecanismos disponíveis englobam, por exemplo, as tradicionais transferências, realizadas com toda a segurança e comodidade através dos escritórios de representação internacional, os vales postais ou o acesso a serviços da rede especializada MoneyGram, com quase 350 mil pontos de venda em mais de 200 regiões. Agosto rima com aforro O verão continua a ser, por excelência, a época do ano em que milhares de portugueses a trabalhar no estrangeiro regressam à sua terra natal e aproveitam para cuidar das suas poupanças ou fazer investimentos. No entanto, os bancos têm hoje campanhas ou promoções disponíveis durante todo o ano. A possibilidade de subscrever as aplicações de poupança em euros ou em moeda estrangeira e a partir do país de destino é uma das principais especificidades da grande maioria da oferta destinada aos residentes no exterior. Com prazos diversificados, as aplicações garantem o capital investido e oferecem taxas de juro crescentes. Uma das regras de ouro é escolher um produto com um juro superior à taxa de inflação prevista para o país onde se reside, para garantir ganhos reais. A possibilidade de utilizar os cartões de débito, crédito ou pré-pagos e aceder a financiamento bancário, Soluções Residentes no Estrangeiro Quando a sua carreira lá fora ganha cá dentro, ganhamos todos. Rita Ferreira Jornalista em São Paulo “Contactei o meu banco para me informar do preçário no estrangeiro. Só consegui abrir uma conta no Brasil cerca de nove meses após ter chegado. Mantenho, até hoje, duas contas bancárias em Portugal. Nos primeiros meses, usei sempre a conta portuguesa. Nunca senti qualquer dificuldade ou tive qualquer problema. O contacto com o banco à distância é fácil.” mesmo estando longe de Portugal, é um indicador de que hoje a relação com a banca não tem fronteiras. A procura por crédito para adquirir habitação na terra natal tem uma longa tradição, mas a jovem e qualificada diáspora também apresenta outras necessidades, como o crédito para formação ou para criação do próprio negócio, que os bancos acompanham. A iniciativa empreendedora dos novos emigrantes também motivou, recentemente, o lançamento de várias medidas de incentivo ao regresso de portugueses. O Plano Estratégico para as Migrações até 2020 prevê que, ainda este ano, seja lançado um projeto-piloto do Programa Mentores para Emigrantes. O objetivo é “promover experiências de entreajuda e apoio entre cidadãos nacionais residentes e não residentes, com vista ao apoio ao regresso sustentado em projeto profissional”, explica o Plano. Gerir o dia-a-dia A Solução Montepio Consigo, o Serviço Montepio 24 e o Extrato Digital são alguns dos serviços disponíveis. Realizar pagamentos O Montepio apresenta-lhe diversas opções para fazer pagamentos ou transferências, tais como cartões de Débito e de Crédito, cartões Pré-Pagos Montepio, transferências SEPA e Serviço MoneyGram. Incrementar poupanças Os depósitos a prazo Montepio Super Poupança, Montepio Aforro Residentes no Estrangeiro e Montepio Aforro Plus Residentes no Estrangeiro têm caraterísticas adequadas a diferentes necessidades. Concretizar projetos O Montepio permite-lhe o acesso a diversas opções de financiamento, como o Crédito Habitação, Crédito Automóvel e Crédito Individual, entre outras soluções. No Portal Montepio Imóveis encontra condições especiais de financiamento e vantagens exclusivas. Estar protegido Conheça as soluções de proteção criadas a pensar nas suas necessidades. Para assegurar o presente e ajudar a planear o futuro informe-se sobre a oferta mutualista de poupança e proteção que complementa o sistema público de Segurança Social. Rede Internacional Encontre os escritórios de representação na Europa e América do Norte (Suíça, França, Reino Unido, Alemanha, EUA e Canadá). SAIBA MAIS www.montepio.pt MONTEPIO PRIMAVERA 2015 59 3 a minha economia INTERNACIONALIZAÇÃO MODA GOSTOS NÃO SE DISCUTEM, EXPORTAM-SE 60 REINVENTAR É A PALAVRA DE ORDEM PARA A MODA PORTUGUESA. ESTA INDÚSTRIA TEM SIDO CAPAZ DE DAR A VOLTA E CONQUISTAR TERRENO NOS MERCADOS INTERNACIONAIS. SAIBA COM QUE LINHAS SE COSEM OS NEGÓCIOS EM PORTUGUÊS por ana sofia calaça MONTEPIO PRIMAVERA 2015 A moda evidencia estilos de vida e define identidades. Vestuário, calçado ou joias falam por si e são um reflexo de diferentes personalidades – irreverentes ou conservadoras, desportivas ou clássicas –, mas a natureza cíclica e mutável das preferências e gostos dos consumidores obriga este setor a inovar constantemente para fazer frente às exigências de um universo em permanente mudança. Muitas empresas não resistiram à crise de 2008 e à maior abertura do comércio internacional, mas as que se mantiveram no mercado moderniza- ram-se e asseguraram que a moda made in Portugal é de vanguarda e já está muito focada na internacionalização. Um setor dinâmico O setor do têxtil e vestuário é hoje uma das mais importantes indústrias da economia portuguesa, com cerca de 7 000 empresas, mais de 85% localizadas na região Norte, em especial nas cidades do Porto e de Braga, segundo dados da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal. A provar o dinamismo desta indústria, o ano de 2014 foi o melhor dos últimos P&R Pedro Pires Diretor de Empresas Montepio TIFFOSI Calças de ganga inovadoras 1 JEANS ONE SIZE Calças feitas com um tecido “super elástico” que se adapta a qualquer tamanho ou formato de corpo. 2 JEANS ANTI-CELULITE Aliam o efeito modelador a micro-cápsulas de creme anti-celulítico incorporadas nas fibras do tecido. 3 JEANS IMPERMEÁVEIS Calças de ganga à prova de chuva. Foi utilizada uma técnica que permite a impermeabilização dos jeans, testada e comprovada em várias lavagens. onze anos para as exportações neste setor, registando um valor exportado de 4,6 mil milhões de euros e um crescimento de 8% face a 2013. A proximidade faz de Espanha o principal cliente externo do vestuário nacional, com 32% das exportações, representando o mercado que mais cresceu em termos absolutos em 2014 (acréscimo de 139 milhões de euros). França e Reino Unido, os outros principais compradores, também estão a apostar mais na moda portuguesa, com 14% e 9% de quota, respetivamente, e foram o segundo e terceiro destinos com maiores crescimentos absolutos. Se do estrangeiro aumentam as encomendas de roupa, há também mais pés para calçar. Considerado o ex-líbris da economia portuguesa, o calçado viu as exportações aumentarem 50% nos últimos anos, com as empresas a venderem 95% da sua produção para 160 países de cinco continentes, de acordo com a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado (APICCAPS). Mas o modelo não ficaria perfeito sem o adorno elegante dos números de um ramo de negócio que conta já com 5 000 empresas, na sua maioria PME, e que representa um volume de negócios de mil milhões de euros. O comércio de joalharia e ourivesaria cresceu a uma média anual de quase 19% entre 2008 e 2013, ao mesmo tempo que as vendas para o estrangeiro Para muitas empresas, a internacionalização tem sido uma estratégia de resposta ao momento do país. Como é que a ação do Montepio pode fazer a diferença? O Montepio tem vindo a dotar-se de condições que possam ir ao encontro dos novos desafios das empresas nacionais, que são também os nossos. A ação diferenciada do Montepio passa cada vez mais por cooperar com clientes, adequando a oferta e comportamento à necessidade de cada cliente, nas suas diferentes fases de internacionalização. O dinamismo de gestão, o conhecimento dos mercados, com presenças físicas estratégicas, quer em Angola, através do Finibanco Angola, quer em Moçambique, via Banco Terra, os recursos mobilizáveis, a obtenção gradual de capacidade criativa e o estabelecimento de relações de confiança ou parceria com clientes são os fatores que marcam a ação do Montepio. Que soluções estão desenhadas para responder aos desafios? A missão será estar permanentemente ao lado do cliente, para que este se sinta seguro e confiante noutras geografias. Ambicionando a verticalização de todo o processo de internacionalização, o Montepio tem soluções de assessoria em estudo de mercados, na sua abertura de natureza e segurança financeira, antecipando-se ao cliente enquanto primeira plataforma negocial em geografias que tenham dimensão percebida de bom negócio. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 61 3 a minha economia INTERNACIONALIZAÇÃO moda LEMON JELLY Vontade de inovar 62 A Lemon Jelly nasceu em 2013, mas a sua empresa-mãe, a Procalçado, tem quase 40 anos de experiência na produção de solas de borracha para outras marcas, incluindo a estilista Carolina Herrera ou a britânica Hunter. A aventura de lançar a primeira marca de calçado injetado, totalmente concebida, desenvolvida e produzida em Portugal, tem tido resultados surpreendentes. “A aceitação tem sido realmente boa, a nível nacional e internacional”, garante o CEO da empresa. 60% PESO DAS EXPORTAÇÕES José Pinto realça que as exportações representam 60% do negócio. “O mercado europeu tem grande relevância por razões óbvias, mas estamos também presentes noutros mercados, como é o caso do Canadá, China, Hong Kong e África do Sul.” 60 % MONTEPIO PRIMAVERA 2015 subiram 27%, com Hong Kong, Suíça e França como os maiores destinos dos produtos nacionais. Especialistas em jeans Revolucionar o mundo das calças de ganga. É com esta ideia em mente que a Tiffosi se tem afirmado pela aposta em produtos inovadores. Filipe Pinto Correia, administrador, explica que a têxtil minhota “diferencia-se por ter desenvolvido um conceito de ‘especialista em jeans’, que proporciona aos clientes um ambiente de loja Denim e um produto muito competitivo no binónimo qualidade/preço”. Fundada em 1979, a Cofemel criou a marca Tiffosi em 1991 e, há seis anos, a empresa foi comprada pelo Grupo VNC. “A evolução é clara quando transformada em números. A empresa cresceu 80% em vendas ao consumidor final desde 2008”, de acordo com o administrador. A marca portuguesa apresenta também um “forte crescimento no mercado externo”. Desde 2012, ano em que inaugurou a primeira loja monomarca em Madrid, a Tiffosi conseguiu “estar presente em cerca de 20 países e em mais de mil clientes multimarca a nível internacional”. O líder da Tiffosi sublinha ainda que as encomendas para Espanha e França têm duplicado nas últimas coleções e que o processo de internacionalização já chegou igualmente ao Médio Oriente, onde “o feedback dos clientes tem sido positivo, mas as diferenças de sazonalidade deste mercado face à Europa têm representado um forte desafio na gestão das coleções que lhe são apresentadas”. Dentro de portas, 2015 é o ano para fazer nascer no mercado o conceito de megastore (lojas com dimensões nunca inferiores a 500 m2). A marca quer inaugurar um novo espaço quinzenalmente, sem perder de vista a expansão internacional. “Nos próximos anos prevemos um investimento de cerca de 30 milhões de euros em lojas novas, com espe- cial incidência no mercado espanhol, o que contribuirá para o objetivo de duplicar a dimensão da empresa nos próximos cinco anos”, sublinha Filipe Pinto Correia. Calçado que cheira a limão Fresca e divertida. É assim que a Lemon Jelly se afirma no mundo do calçado, com as suas galochas à portuguesa com um design inovador e acabamentos de qualidade. As cores alegres e vibrantes, assim como os tons metalizados, representam uma tendência da moda e a Lemon Jelly promete não fugir à regra em 2015, imprimindo criatividade a sapatos de plástico, a pensar em mulheres urbanas que “não têm nada a provar”. As coleções da Lemon Jelly foram concebidas com inspiração em algumas das melhores coisas da vida: as amizades, as férias de verão e as viagens, os salpicos do mar e as noites urbanas e cheias de glamour. “Reinventamos modelos clássicos através da mistura de diversos tipos de plástico, com cor e estilo, além de qualidade e conforto, indo ao encontro de um público jovem”, assegura José Pinto, CEO da marca. Os sapatos Lemon Jelly são ideais para dar ainda mais cor aos dias de sol, mas existem igualmente em tons mais sóbrios, como o preto ou castanho. José Pinto destaca também outros elementos que marcam a diferença: “Através da atenção aos pormenores e da aplicação de detalhes feitos em materiais nobres e com técnicas de elevada tecnologia, conseguimos acrescentar valor a um tipo de calçado que, tradicionalmente, é visto como mais económico.” Com preços entre os 70 e os 180 euros, estes sapatos revelam a paixão, dedicação e espírito de equipa que guiam o trabalho da marca. “Os nossos sapatos são feitos com muito amor, cuidado e diversão para se transformarem em companheiros fiáveis e coloridos, que sabem ao mais doce dos doces: são como uma > MACHADO JOALHEIROS A marca está em Lisboa desde 2008 e pauta-se pelo luxo das peças explosão de gelado, gomas, rebuçados e chupa-chupas, e têm simultaneamente o som das gargalhadas e o toque de uma carícia”, sublinha o CEO da Lemon Jelly. A tendência das joias “Durante 134 anos, a Machado Joalheiro marcou e tenta marcar as ten- dências da joalharia e relojoaria em Portugal”, explica António Machado, administrador e descendente do homem que fez crescer este negócio. A empresa portuense, que é um exemplo da tradição e experiência de vários séculos, cria peças de joalharia com design moderno voltado para as novas gerações, que depois são expostas num ambiente de requinte nas lojas de Porto e Lisboa. Respeitando a filosofia de criar uma atmosfera seletiva, o responsável por esta casa centenária explica que as lojas nos centros comerciais estão fora de hipótese. António Machado sublinha que qualquer “joalharia fica melhor localizada na rua, onde existe outra luz, outro brilho e mais espaço”, que são um trunfo da marca que tem montras com joias para todos os gostos, desde as clássicas (muitas vezes inspiradas em peças antigas executadas pela marca) às vanguardistas. Os “preços são transversais”, refere António Machado, realçando que as criações exclusivas têm cada vez mais procura por parte de clientes “exigentes, conhecedores e apaixonados por joias”. O administrador garante: “Sempre foi a nossa tradição e continuaremos a apostar nessa vertente.” Apesar de já ter atravessado vários séculos, a Machado Joalheiro está também de olhos postos no futuro: “2015 é o ano do diamante, em todas as suas formas e cores. E as nossas novas coleções vão nesse sentido.” MACHADO JOALHEIROS A história de uma casa centenária O primeiro espaço da Machado Joalheiro chamava-se Ourivesaria Cunha e nasceu em 1880, na Rua do Loureiro, uma das ruas mais dinâmicas do Porto, pela mão de Pinto da Cunha, figura lendária do mundo das joias. Em 1914 a loja mudou-se para a Rua 31 de Janeiro e ali permanece até hoje, num edifício classificado como Património Municipal. Pouco antes da II Guerra Mundial, Jacinto Machado dos Santos (pai de António Machado, atual administrador), começou a trabalhar na ourivesaria, tornando-se mais tarde sócio da empresa. O nome da marca, que hoje conhecemos, só surgiu nos anos 80, década em que chegou à Avenida da Boavista. Susana Bettencourt Estilista O que é que Lady Gaga e a moda portuguesa têm em comum? A resposta está na jovem açoriana Susana Bettencourt, a estilista lusa que tem dado nas vistas e que já vestiu a irreverente cantora norte-americana. Apesar das celebridades, Susana sabe bem quem faz a sua marca: “Não crio as coleções a pensar nos famosos. São as pessoas reais que mantêm a minha marca viva e sustentável.” A aventura das malhas vai tendo novos capítulos que se somam aos de um começo em família. “Aos cinco anos aprendi a tricotar e a fazer crochet à mão com a minha avó e madrinha. Mas só depois de uma má experiência na área de ciências é que aceitei que o meu hobby fosse a única coisa que me faria feliz”, recorda. Felicidade que está presente no trabalho e que permite superar os obstáculos “dos ‘nãos’ de concursos e apoios”, ou dos encargos de “apresentar coleções de seis em seis meses”. Ainda assim, é positiva a opinião sobre o momento da moda em português. “Estamos cada vez mais fortes e com mais iniciativas, como o boom do Portugal Fashion. O desafio mais complicado será sempre o preço e transmitir um conhecimento generalizado da nossa existência”, explica. "Persistência e uma grande dose de loucura" são os ingredientes que aponta para o sucesso. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 63 litros 159 Rússia EUA 13,10% Arábia Saudita As maiores reservas provadas mundiais são de países como Venezuela, Arábia Saudita, Canadá, Irão e Iraque 12,90% 10,80% Quota de produção QUEM MAIS PRODUZ? Um em cada três barris de petróleo produzido no mundo vem de um destes países. TODOS OS DIAS VEMOS E OUVIMOS NOTÍCIAS SOBRE O PREÇO DO BARRIL DO PETRÓLEO, EXPLICAÇÕES SOBRE COMO A GASOLINA SOBE E DESCE POR CAUSA DO PREÇO DO CRUDE, MAS SERÁ QUE SABEMOS O QUE PRECISAMOS SOBRE UMA MATÉRIA-PRIMA QUE INFLUENCIA, E MUITO, AS SOCIEDADES MODERNAS? PORQUÊ UM BARRIL? A conhecida medida utilizada para medir o petróleo, o barril, é originária dos EUA, de uma altura em que na Pensilvânia se intensificava a corrida ao "ouro negro". Barril porquê? Porque se começou a transportar petróleo em barris já utilizados, principalmente, no negócio do vinho e do uísque. O barril de petróleo leva cerca de 159 litros (42 galões nos EUA). A origem A ascensão do "óleo da pedra" como indústria começou no século xix. Bacu, no Azerbaijão, é considerada a cidade onde foi aberto o primeiro poço petrolífero moderno, mas foi na Roménia, e depois nos EUA, que cresceu a forte indústria petrolífera. A rivalidade que se agudizou no Médio Oriente entre o império britânico e o russo levou à corrida ao "ouro negro", que abriu caminho ao domínio na produção de países como Árabia Saudita, a Rússia e EUA. O MUNDO NUM BARRIL D E S C O D I F I C A D O R 64 milhões de euros 60 % 5 710 Transportes 10 % Residencial/ comercial/ agricultura Geração de eletricidade Indústria FATURA ENERGÉTICA PORTUGUESA Do total de 5 710 milhões de euros de importações de energia portuguesa, 82% dizem respeito a petróleo e produtos ligados ao petróleo. O maior mercado de origem do petróleo comprado é Angola, seguida pela Arábia Saudita, Argélia e Cazaquistão. 5 % 25 % Destino do petróleo consumido QUEM MAIS CONSOME? Um quinto de todo o petróleo consumido no mundo é da responsabilidade dos EUA. China e Japão preenchem os outros lugares do pódio dos maiores consumidores desta matéria-prima. MILHÕES DE BARRIS produzidos por dia 86,75 31% PESO DO PETRÓLEO na totalidade de energia produzida no mundo Noruega Reino Unido Portugal Alemanha França Espanha Brasil Angola Venezuela FONTE: BP, CHE VRON, DGE G, GLOBAL OIL PR ICE S, IE A, OPE P, UE ONDE SE FORMAM OS PREÇOS? Os preços de referência do petróleo estão ligados, normalmente, a dois mercados que são benchmark: West Texas Intermediate (WTI, na América do Norte) e Brent (mar do Norte). O WTI descreve um tipo de petróleo de baixa densidade que é referência para a Bolsa de Mercadorias de Nova Iorque (New York Mercantile Exchange) enquanto o Brent é o tipo de petróleo de referência em Roterdão. Os preços negociados são, normalmente, futuros, ou seja, o preço dos contratos a realizar é determinado num momento anterior. COMO SE TRANSPORTA Todos os anos são transportados milhares de milhões de toneladas de petróleo. A vasta rede de pipelines que levam o petróleo por via subterrânea apresenta números impressionantes. Por exemplo, o maior pipeline, Druzhba, tem 4 mil quilómetros de comprimento e liga a Rússia a vários países da Europa. Além dos pipelines, os quatro maiores petroleiros são os TI Europe, TI Oceania, TI Africa e TI Asia. O maior tem 380 metros de comprimento, número idêntico ao da altura do Empire State Building, nos EUA. * Automóvel com consumo misto de 6 litros de gasolina 95 por 100 km. 1 de maio de 2015. 8 333 219 160 128 117 113 111 105 91 Quantos quilómetros faz com 10 euros* Com o mesmo carro e a mesma quantia em dinheiro esta é a distância em quilómetros que consegue percorrer em cada país ORÇAMENTOS FAMILIARES O preço do petróleo afeta famílias e empresas. Se a ida aos postos de gasolina é o aspeto mais visível, saiba o que se passa na Europa com o mesmo preço do petróleo como referência. Os impostos e os custos de produção fazem a diferença na hora de conduzir o automóvel. 65 BOLSAS MUNDIAIS O preço do barril de petróleo também é referência para os mercados financeiros. Além de influenciar as ações das empresas petrolíferas e potenciais resultados das companhias, pode também fazer variar as unidades de participação dos fundos de investimento que investem em ações deste setor. Outros investimentos, como os Exchange-traded funds (ETF), acompanham o preço da matéria-prima e ganham ou perdem com a variação. copos de plástico 65 velas de aniversário 170 540 escovas de dentes pentes de bolso 750 1 barril de crude dá para produzir... DIA A DIA PUB A MINHA VIDA IDEIAS E DESCOBERTAS EM LAZER, FAMÍLIA, SAÚDE, CULTURA página 68 página 72 Mais globalizados e mais iguais. Num mundo cada vez mais semelhante, há uma nova vaga de soluções que apostam na individualização e customização para quem quer ser único Há um Portugal para percorrer em bicicleta. Conheça quatro cidades que são um exemplo do investimento em ciclovias e prepare-se para deixar o carro parado e pedalar TENDÊNCIA LAZER página 74 página 76 A Bolsa Nacional de Terras é um novo eixo estratégico. Levar os terrenos referenciados a novos arrendatários e proprietários que os dinamizem é a missão Óbidos é muito mais que ginja e chocolate. A nova onda literária está a transformar a famosa Rua Direita num dos maiores destinos turísticos da região Centro VOLTAR À TERRA CADERNO DE VIAGEM 4 a minha vida TENDÊNCIA À MEDIDA TODOS QUEREMOS SER ÚNICOS 68 A RECUSA DA MASSIFICAÇÃO E A ROMANTIZAÇÃO DE TUDO O QUE É VINTAGE CRIOU, NA ÚLTIMA DÉCADA, UMA NOVA TENDÊNCIA: A PROCURA DE PRODUTOS E SERVIÇOS ÚNICOS, ADAPTADOS AO GOSTO DE CADA UM E AOS SEUS HÁBITOS por rita vaz da silva No tempo dos nossos avós, o azeite e o leite eram aviados em garrafas de vidro reutilizáveis. Embalagens e sacos plásticos eram coisas raras e no balcão das mercearias não faltava o livro de capa preta com a lista dos fiados e a balança para a venda a granel. As senhoras iam às modistas fazer vestidos e os senhores tiravam medidas no alfaiate. Comprava-se e vendia-se com conta, peso e medida. Com gosto. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 não queremos ser iguais, seja por crise de identidade, por nostalgia ou até por egoísmo. Queremos ser únicos. O despontar da sociedade de consumo trouxe uma sociedade mais homogénea nos hábitos, mas numa era de transformações galopantes o que ontem era démodé volta a ficar in ao fim de umas temporadas de hibernação. Depois da institucionalização, na última década, dos conceitos retro, vintage e gourmet, está a renascer uma vaga de personalização de serviços e produtos aliada à arte de bem servir por quem recusa a massificação. Afinal, já “Biclas” com pinta Os hábitos diários do cliente são a alma do negócio da iNBiCLA, empresa da região do Porto que faz bicicletas personalizadas. Vítor Machado criou o negócio do zero, aliando o gosto pessoal pelas bicicletas à formação em design de produto. “Para criar uma bicicleta tenho de ter elementos que me ajudem a adaptar o produto ao que o cliente necessita. Cada projeto começa de raiz com um quadro sem pintura [peça triangular no centro da bicicleta] e depois há uma negociação. O cliente chega aqui e diz-me: ‘Quero uma bicicleta para andar ao fim de semana numa zona plana e com um cestinho para ir buscar o pão’ ou ‘Faço cinco quilómetros por dia de casa para o trabalho e tenho duas subidas.’ Esta informação INBICLA Duas rodas na moda Como grande parte das empresas que oferecem bens e serviços customizados em Portugal, a iNBiCLA depende muito do “passa-palavra”, das redes sociais e do que está na moda para angariar novos compradores. “A maior parte dos meus clientes está em Lisboa e não na região do Porto, onde tenho a oficina. O negócio cresceu porque a bicicleta voltou a estar na moda”, lembra Vitor Machado, criador da marca que faz bicicletas únicas e cosmopolitas. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 69 4 a minha vida TENDÊNCIA à medida 70 é muito importante para a escolha dos materiais, do design e das peças a utilizar”, descreve. Para o cliente este serviço é vantajoso “pelo atendimento personalizado e pelo produto único que leva para casa”. “A certa altura acabo por conhecer tão bem as pessoas e a sua história que já nos tratamos por tu”, conta o designer que começou por se aventurar no ramo do mobiliário e “tropeçou no negócio das bicicletas” por causa de alguns amigos que lhe pediam para criar “biclas para as namoradas”. A criação começa pela história de vida e passa depois à parte do design. “Há clientes que sabem o que querem, outros não. Alguns trazem uma fotografia para inspiração. Eu faço um mock-up e depois apresento para aprovação.” Esta fase inicial demora cerca de uma semana. A construção da bicicleta pode levar um mês. O preço médio ronda os 550 euros. Vítor personaliza qualquer parte da bicicleta: o volante, o revestimento, a estrutura, as cores, o selim, o cesto. Cada veículo é numerado e exclusivo. “Posso até inscrever o nome do cliente ou uma frase se assim o quiser”, explica. “Nunca faço a mesma coisa e até agora ninguém me pediu para replicar alguma bicicleta que já tenha feito. Também não me pediram ainda para criar peças de raiz, por exemplo o travão. Compro essas peças já prontas, mas se um dia me pedirem posso vir a fazer.” Cada cabeça, sua sentença Únicos e exclusivos são os chapéus que Cristina de Almeida desenha e fabrica no seu ateliê no Centro Comercial Roma, em Lisboa. Muitas das suas compradoras sentem-se tão aconchegadas com o atendimento especial desta modista de chapéus que a convidam para almoçar ou para um chazinho numa nas pastelarias do bairro. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 “Fico muito lisonjeada mas recuso sempre. Às vezes tenho alguma pena mas não há tempo, há sempre mais clientes marcadas e chapéus para fazer.” Com duas lojas na capital, uma on-line e outra em Bruxelas, A Fábrica dos Chapéus é uma empresa familiar, criada em 2008 por Cristina e pelo marido, Luís Barbosa. Ambos trabalhavam como gestores em multinacionais e deixaram para trás uma carreira bem-sucedida para abraçar a paixão pela chapelaria. O casal repete muitas vezes a mesma frase: “Enquanto houver cabeças vamos por cá andar.” A “Fábrica” tem chapéus para todos os gostos e sentenças. E se nos mais de mil modelos disponíveis, tanto nas coleções de inverno como de verão, não encontrar o que procura, Cristina e duas das colaboradoras que formou fazem chapéus à medida exata do que o cliente pretende. Não há limites. “Posso arranjar penas de pavão, mandar fazer um tecido ou qualquer tipo de peça decorativa. Até o molde de madeira para o chapéu podemos mandar fazer se não tivermos no atelier o que o cliente quer. Quanto ao chapéu propriamente dito, posso fazer a aba com mais ou menos milímetros ou com uma copa mais alta ou em qualquer cor. Posso adaptar ao rosto, à vida e à roupa do cliente”, explica Cristina. Algumas das encomendas chegam de Angola e do Brasil. “Recebo muitos e-mails com pedidos e depois dou continuidade através do Skype. Mostro os chapéus que tenho, os modelos, os tecidos e vamos chegando a um acordo.” A componente on-line é vital para as vendas – além das encomendas por COSTA DA MARINHA Ajustar os paladares às estações O cabaz da Costa da Marinha – Agricultura Biológica tem entre 9 a 15 produtos da época e vai dos cinco aos sete quilos. Antes da primavera, uma das caixas pode conter ervas aromáticas e condimentares, como coentros, salsa, tomilho, orégãos, limonete e hortelã, e legumes como alface, espinafre, rúcula, abóbora, batata-doce, alho-francês e brócolos. No verão já há mirtilos e figos. e-mail e através das aplicações de conversação e vídeo – a loja on-line escoa uma parte significativa das peças da coleção para qualquer lugar no país e no mundo. Curiosamente, a Internet e a tecnologia que tanto contribuíram para a globalização ajudam as pequenas empresas com produtos à medida a vingarem no mercado onde a concorrência das grandes marcas é feroz. Não há nada que não possa vender-se on-line, há tecnologia para criar quase tudo e o que não existe num país pode encomendar-se noutro. À “Fábrica” chegam também muitos pedidos para criação de réplicas. “Copiam-se muito os casamentos FÁBRICA DOS CHAPÉUS Celebrar à medida reais.” E restauram-se chapéus desgastados pelo tempo. “Um chapéu com bom material dura 300 anos. Além disso, a empresa também faz chapéus para fardas, uma produção mais massificada que resulta em parcerias com fábricas nacionais e estrangeiras. Entre os clientes institucionais incluem-se companhias aéreas e uma rede de padarias nacional. A modista colabora igualmente com criadores de moda nacionais e designers de outros países. A relação com o cliente é um trunfo do negócio, defende Cristina de Almeida. “O mundo mudou muito – – é mais fácil uma pessoa chegar a uma loja, desarrumar tudo, ver tudo e ninguém falar com ela. O nosso caminho foi mais difícil, mas é mais cimentado, tem mais futuro. Para mim, ter alguém que nos ouça e aconselha não tem preço. Se não se for bem atendido não se volta e não se compra mais naquela loja. É muito importante ter uma aproximação muito educada ao cliente, não de subserviência, mas de se mostrar disponível para ajudar. Nisso serei sempre uma mulher à antiga.” Cabazes ao gosto do freguês Outra moda da última década, e um mercado em pleno crescimento, é a agricultura biológica. Cada vez mais se consomem produtos biológicos, cultivados num ambiente natural que respeita o tempo de maturação das plantas e não recorre a fertilizantes ou pesticidas químicos. Paulo Freixinho, ator de teatro e televisão há mais de 18 anos, decidiu apostar neste nicho de mercado e lançou-se, aos 38 anos, numa atividade paralela esperando “encontrar um outro ânimo para viver neste país”. Aproveitando um terreno familiar de dois hectares na zona de Ovar, criou, em 2013, um negócio de cabazes biológicos adaptados aos hábitos de consumo dos seus clientes, a Costa da Marinha – Agricultura Biológica. Milliner formada em Inglaterra, a mentora da chapéus mais extravagantes do mundo, as Fábrica dos Chapéus cria sobretudo peças para cerimónia. Também faz todos os anos 15 a 20 acessórios para os clientes portugueses que se deslocam ao desfile de corridas Royal Ascot. “As clientes vêm cá fazer a prova, trazem os vestidos e os sapatos. Depois da festa ou evento, enviam e-mails com fotografias da noiva ou das convidadas.” Os clientes recebem por e-mail a lista de produtos disponíveis ou combinam por telefone a composição da sua caixa. “Os meus clientes são pessoas muito atarefadas, que passam o dia fora de casa e têm pouco tempo para fazer compras. Também não têm condições para ter uma pequena horta”, explica o ator, agricultor e estudante de agronomia biológica na Escola Agrária de Coimbra. Os cabazes variam consoante o gosto do freguês, embora não permitam muitas variações, já que se trata de produtos hortícolas e frutícolas da época. “Têm de ser clientes que acreditem no projeto e que entendam o conceito. Sei o que cada pessoa gosta.” Esta proximidade “é muito compensadora para quem compra e para quem produz”. “A produção fica paga e o consumidor recebe produtos mais baratos e com uma qualidade incomparável ao que encontraria numa grande superfície.” MONTEPIO PRIMAVERA 2015 71 4 a minha vida LAZER EXERCÍCIO CIDADES PARA PEDALAR EM PORTUGAL HÁ MAIS DE 1 700 QUILÓMETROS DE CICLOVIAS, MAS A BICICLETA AINDA NÃO DOMINA O CENÁRIO por sara raquel silva ilustração ana seixas Paulo Guerra dos Santos, coordenador do projeto Ecovias de Portugal, acredita que falta dar passos decisivos na legislação fiscal e rodoviária e no investimento em ciclovias, mas encontra no país locais onde já é aprazível circular em duas rodas. Grândola, Ovar, Torres Vedras e Vila Real de Santo António são as cidades de eleição. 72 Tipologia Iniciados Distância 44 km Pistas Ciclovia das praias Sizandro e Barro TORRES VEDRAS VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO Na rota das Agostinhas A ritmo internacional Nesta cidade bastante plana, onde circular de bicicleta é prática comum desde há gerações, a maioria das ciclovias é dedicada ao lazer. No entanto, este meio de transporte convive de forma harmoniosa com os veículos motorizados na via pública, em parte por tradição mas também porque a autarquia colocou sinalização que protege os velocípedes. As Agostinhas, bicicletas assim batizadas em honra a Agostinho da Silva, natural da cidade, estão disponíveis todos os dias das 8 às 20 horas e a sua utilização é gratuita. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Tipologia Iniciados (exceção da Boa Vista que é para experientes) Distância 55 km Pistas Ecovia do Litoral, Boa Vista, Cacela, Rias Parque e Vila Real de Santo António-Monte Gordo Vias duplas para os residentes, turistas e atletas que fazem o trajeto Vila Real de Santo António-Monte Gordo e medidas para a acalmia do trânsito em meio urbano são os trunfos desta cidade. Adicionalmente, o concelho é atravessado pela Ecovia do Litoral, que percorre todo o litoral algarvio numa extensão de cerca de 214 quilómetros. Uma novidade: o concelho prevê, juntamente com os municípios fronteiriços de Castro Marim e de Aiamonte (Espanha), criar uma rota ciclável na Ponte Internacional do Guadiana. ^^ VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO ^^ BIAS, EM OVAR A cidade foi premiada A autarquia está em 2014 pela promoção a traçar uma ciclovia da bicicleta até Aiamonte 73 Tipologia Iniciados Distância Mais de 50 km Pistas Avenidas Praia Esmoriz, Praia Cortegaça, D. Manuel I, Sá Carneiro, da Régua, do Emigrante, D. Maria II, Estrada de Pardilhó, Escolas, Rua das Britas, ecopista do Atlântico, Avenida Raimundo Rodrigues e Maceda OVAR GRÂNDOLA BIAS pela ria Do passeio à BTT A Rede de Mobilidade Ciclável e Pedonal do Concelho de Ovar conta com cerca de 60 quilómetros de extensão, sendo composta por pistas exclusivas, mistas e pelos trilhos da natureza, destacando-se a recente conclusão da ecopista do Atlântico Esmoriz-Furadouro. A utilização deste meio de transporte é popular não só entre os turistas como entre os locais, que dispõem, em alternativa ao meio de transporte próprio, das Bias, bicicletas municipais utilizadas por mais de 10 000 pessoas por ano. A cidade recebeu, em 2014, o Prémio Nacional da Mobilidade em Bicicleta, na categoria Autarquias. Tipologia Iniciados Distância Mais de 10 km Pistas Alameda e Parque O concelho tem cerca de 10 quilómetros de ciclovias. Dois ficam na vila, junto à Alameda José Amaro e à Alameda 22 de outubro. Os sete restantes pertencem à freguesia de Carvalhal e ligam a aldeia à praia. Com pouco trânsito e bastante plano, o concelho é desde sempre convidativo à circulação a duas rodas, que aumenta significativamente no verão com a afluência dos turistas. A prática de BTT é também popular na zona da serra. Ao longo do ano realizam-se várias provas, destacando-se o inédito 1º Ciclo BTT de Grândola, em abril, que juntou o ciclismo (44 km) e BTT (22 km). MONTEPIO PRIMAVERA 2015 4 a minha vida INICIATIVA PROPRIEDADE REGRESSAR À TERRA O PROJETO BOLSA NACIONAL DE TERRAS REÚNE A OFERTA DE PRÉDIOS RÚSTICOS E MISTOS EM TODO O PAÍS. UMA AJUDA ÍMPAR A QUEM PRETENDE DEDICAR-SE À AGRICULTURA OU SILVICULTURA, MAS NÃO DISPÕE DE TERRENO PRÓPRIO por sara raquel silva 74 Num inquérito realizado pelo Ministério da Agricultura junto de jovens agricultores as opiniões foram unânimes: havia vontade de trabalhar a terra – encontrá-la é que parecia uma missão impossível. Foi então criada, em dezembro de 2012, a Bolsa Nacional de Terras, um projeto que nasceu para facilitar o acesso a prédios rústicos e mistos, numa plataforma on-line. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 DADOS Os números da “bolsa” Como a propriedade está a chegar aos utilizadores da plataforma 53 NÚMERO DE PRÉDIOS rústicos cedidos 2 642 ÁREA, em hectares, de propriedade cedida NOTA: INFORMAÇÃO ATÉ FEVEREIRO DE 2015 A iniciativa permitiu que, até fevereiro deste ano, se tenham disponibilizado em valores acumulados 352 prédios rústicos para arrendamento e venda, totalizando uma área de 14 482 hectares (área equivalente ao município de Albufeira). “O grande objetivo é que este seja o principal repositório de informação da existência de terras em Portugal com potencial produtivo”, afirma Nuno Russo, coordenador nacional do projeto. O balanço é positivo e contribui para o sucesso do grande propósito da Bolsa de Terras: “combater o despovoamento e o desemprego, através de um incentivo à fixação de populações e de jovens agricultores e contribuindo para uma gestão eficiente da disponibilidade dos terrenos, valorizando a multifuncionalidade do território que deverá ser encarado como fonte de riqueza ao serviço de um desenvolvimento sustentável”, adianta o responsável. A plataforma digital é simples: quem detém terrenos disponíveis insere-os no portal bolsanacionaldeterras.pt, descrevendo a sua dimensão, localização e o tipo de cedência, que pode ser venda, arrendamento ou contrato campanha. Também pode fazê-lo presencialmente junto de uma Entidade Gestora Operacional da zona correspondente que, em última instância será responsável pela validação da informação e celebração do contrato de disponibilização com o proprietário, além da verificação da conformidade do prédio. Os interessados têm apenas de consultar as ofertas e contactar os proprietários, sem necessitarem de intermediários ou de sair de casa, o que é sobretudo útil a quem pretenda deslocalizar-se. Os terrenos podem pertencer ao Estado, às autarquias, entidades públicas ou entidades privadas, embora, no caso da cedência a terceiros ser efetuada parte do Estado, o procedimento se concretize, por regra, através de concurso, com ou sem negociação, de modo a garantir transparência total. Além de facilitar o acesso a propriedades, muitas vezes sem qualquer utilização, esta iniciativa “contempla incentivos fiscais como a redução em 75% dos custos associados a atos de registo do prédio na conservatória e prevê a redução ou isenção do pagamento do IMI [Imposto Municipal Sobre Imóveis] rústico”, adianta o coordenador do projeto. O impulso da necessidade Angélica Caçador, professora de Educação Física, residente em Ponte de Lima, é um dos exemplos de “regresso à terra” através de um depositário pertencente a uma autarquia (que em breve se espera vir a integrar a Bolsa Nacional de Terras). Tendo em conta a instabilidade profissional procurava um projeto paralelo ao ensino e resolveu apostar na agricultura, mais precisamente na produção de pequenos frutos. “Foi muito difícil encontrar terreno, pois muitos tinham socalcos e não possuíam área suficiente”, recorda. “Até que ao ter conhecimento desta iniciativa tudo aconteceu rapidamente, pois a descrição da propriedade ficou logo acessível”. Angélica demorou apenas duas semanas para descobrir dois hectares na freguesia do Freixo, terreno que agora arrenda. Hoje, além de se sentir mais confiante no futuro, garante ainda uma especial satisfação: “Criar postos de trabalho na região”. P&R Nuno Russo Coordenador da Bolsa Nacional de Terras Que novidades estão em carteira? Prevê-se o desenvolvimento de funcionalidades da componente da procura de terras no Sistema de Informação – Plataforma Informática da Bolsa de Terras, com vista à facilitação e melhoria contínua do acesso às terras por parte dos interessados, visando a maximização do número de terras cedidas via Bolsa de Terras. Por outro lado, está prevista a troca de experiências com outras Bolsas de Terras europeias, em particular com o Banco de Tierras de Espanha, com o objetivo de troca de experiências e conhecimentos em projetos semelhantes. É também nossa intenção estudar a possibilidade de articulação da Bolsa de Terras com outros sistemas de informação que contribuam para o aumento de terras na Bolsa, através de iniciativas conjuntas e de colaboração com algumas entidades parceiras da Bolsa Nacional de Terras, incrementando o envolvimento destas e de outras entidades na disponibilização de prédios na Bolsa de Terras. Por fim, pretende-se ainda a integração de um indicador de qualidade associado a inquérito junto dos proprietários, interessados e candidatos ao Concurso das Terras do Estado. Quais as expetativas para 2015? Potenciar o conhecimento da Bolsa de Terras e promover os seus resultados, valorizando a Bolsa de Terras e a sua ampla utilização. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 75 4 NA VILA DOS LIVROS Ó B I D O S GPS N 39° 21’ 34.6134” W 9° 9’ 26.7726” SE ANTES ERA APENAS UM LOCAL BONITO PARA VISITAR, AGORA É UMA LOCALIDADE QUE MARCA O PASSO NA CRIATIVIDADE. ESTA É A PRIMEIRA VILA LITERÁRIA NO PAÍS E QUER FAZER PARTE DA REDE UNESCO DAS CIDADES CRIATIVAS NA ÁREA DA LITERATURA por helena c. peralta fotografia câmara municipal de óbidos 76 É difícil imaginar cavaleiros a galope ao lado das muralhas, dotes de princesas nas tradições reais e uma tão longínqua história numa vila de Óbidos ladeada por dois dos maiores expoentes da civilização moderna: uma autoestrada e a linha férrea do Oeste. A verdade é que a famosa Rua Direita parece tirada dos livros de História. Estão lá todos os símbolos da terra que se acredita ter origens em 308 a. C. e que foi tomada aos mouros em 1138. A ginjinha e o chocolate são as estrelas, mas é um Portugal em miniatura que está representado em pouco mais de 200 metros nas tradicionais lojas de souvenirs, na discográfica de Fado ou mesmo nas ementas de alguns dos restaurantes que preenchem a oferta gastronómica da rua. Mas Óbidos é agora muito mais que História e turistas. A vila tem vindo a reposicionar-se, destacando-se pela MONTEPIO PRIMAVERA 2015 MONTEPIO PRIMAVERA 2015 ? TRADIÇÃO No município, que tem três monumentos nacionais, há sete turistas por ano por cada habitante sua capacidade de inovação, criatividade e, sobretudo, pela programação cultural que oferece. Como graciosamente diz Celeste Afonso, vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Óbidos, “José Saramago escreveu que Óbidos era uma menina bonita à espera de ser chamada para dançar. Agora é ela que se levanta e que chama para a dança.” É neste contexto que surge o projeto da Vila Literária, uma parceria entre a autarquia, a Editora Ler Devagar e a Livraria Bichinho do Conto que envolve vários espaços. Museus, galerias, … para passear A cidade romana de Eburobrittium, que se acredita tenha sido fundada no século i a. C. , é uma das atrações turísticas a conhecer ? TRADIÇÃO Com nove milhões de euros de receitas do turismo em 2013, Óbidos só fica atrás de Ourém (Fátima) na região Centro ROTEIRO EM 24 HORAS 09H30 Passear no castelo, muralha e todo o casario. Passado medieval O Mercado Medieval de Óbidos é um dos pontos de interesse e o palco da recriação histórica que se organiza, em julho, há 14 anos. A origem do castelo remonta ao período romano ou aos castros lusitanos, e foi conquistado por D. Afonso Henriques em 1148. Ginjinha A criação deste licor ancestral data de há muitos séculos, talvez na Ásia, e acredita-se que a sua origem se deva a fins medicinais. As ginjas cultivadas no Oeste, sobretudo no concelho de Óbidos, são consideradas as melhores da Europa. Ligações úteis cm-obidos.pt vilaliteraria.com facebook.com/vlobidos facebook.com/ mercadobiologicodeobidos mercado biológico, igreja, antigo edifício dos Correios, tudo está imbuído do novo espírito literário. São milhares e milhares de livros disponíveis (cerca de 170 mil títulos), em várias áreas e em diferentes línguas, e muitos deles não se encontram com facilidade no mercado livreiro convencional. A ideia embrionária surgiu com a ne- cessidade urgente de requalificar a igreja de S. Tiago, uma construção do século xii, tendo-se decidido transformá-la numa majestosa livraria. Mas, porquê ficar apenas por aí? Desafiado a entrar no projeto, José Pinho, responsável pela Ler Devagar, editora presente na LX Factory, em Lisboa, sugeriu a criação de uma rede de livrarias que transformassem a vila num original espaço de procura literária. Existem já dez locais reconvertidos e o Festival Internacional de Literatura de Óbidos (FOLIO), que acontecerá na segunda metade de outubro, é a nova coqueluche da vila. 11H00 Visitar museus ou galerias. Três boas sugestões: Museu Municipal de Óbidos, Museu Abílio ou Centro de Design. 13H00 Almoçar num dos muitos restaurantes da vila. Esplanadas não faltam. 16H00 Caminhar na ecovia na margem da lagoa de Óbidos até às praias. 19H00 Terminar o dia num dos muitos bares da vila. 12H00 Relaxar entre livros. Pode começar na Livraria da Adega e terminar na Livraria Santigo, na Igreja de S. Tiago, junto ao castelo. 14H30 Dar um salto à lagoa de Óbidos. Pode andar de barco, fazer stand up paddle ou SUP Yoga. 17H00 Visitar a fábrica de ginja, Frutóbidos, onde ficará a conhecer a história deste licor. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 4 a minha vida PASSEIOS COM HISTÓRIA RUÍNAS DE TROIA HISTÓRIAS DE PEIXE E SAL A PENÍNSULA A QUE HOJE CHAMAMOS TROIA ACOLHEU DURANTE SÉCULOS UM COMPLEXO INDUSTRIAL ROMANO DE SALGA DE PEIXE QUE EXPORTAVA CONSERVAS PARA TODO O IMPÉRIO por susana torrão 78 fotografia tróia resort SAIBA MAIS RUÍNAS ROMANAS DE TROIA Tel. 265 499 400 | 939 031 936 www.troiaresort.pt [email protected] MONTEPIO PRIMAVERA 2015 À chegada às ruínas, ouve-se apenas o vento nos pinheiros, o marulhar das águas da lagoa, o piar de uma ave e talvez o motor de um barco a passar ao longe. Há 2 000 anos, com 25 oficinas de salga a funcionarem e 1 500 pessoas a trabalharem, o ambiente seria muito diferente. Hoje é um local sereno que já fervilhou com a atividade de um dos principais centros de produção conserveira do Império Romano. A visita começa pelas oficinas de salga. As primeiras organizam-se em torno de um pátio lajeado e, um pouco mais à frente, surgem tanques mais pequenos. Como refere Inês Vaz Pinto, investigadora responsável pelas visitas, este tipo de divisão corresponde a fases diferentes da exploração. “Houve uma primeira fase da produção, entre o século i e o século ii, em que as oficinas funcionavam num espaço único em torno de um pátio central. Mais tarde, tanto a oficina como o pátio foram divididos em divisões mais pequenas”, explica. Tal como hoje, também na época a sardinha era um peixe popular por estas paragens. Os resíduos encontrados no fundo dos tanques revelam que esta era a principal espécie usada nas conservas, seguida da cavala e do carapau. Além das conservas de peixe, as salgas também produziam molhos. “Os peixes eram postos em vasilhas, com sal às camadas, mel, vinho e ervas aromáticas, ficando a macerar durante dois a quatro meses. O peixe não apodrecia mas ia-se liquefazendo, soltando um molho muito fino e apreciado no mundo romano, o garum”, explica Inês Vaz Pinto. rentabilização do espaço. O caminho por entre os pinheiros conduz até à chamada Rua da Princesa, cujo nome advém do facto de ter sido escavada a mando de D. Maria I, ainda princesa, no século xviii. “As cidades de Pompeia e Herculano tinham sido descobertas há pouco tempo e a arqueologia estava na moda”, salienta Inês Vaz Pinto. As escavações puseram a descoberto uma casa familiar que, na altura, devia erguer-se em dois andares e onde uma placa com o nome Lucius Cornelius Bocchus pode indicar uma ligação das salgas a uma das famílias mais importantes de Alcácer do Sal. O terreno ondula suavemente até à água, sendo a forma das dunas reveladora dos muitos edifícios que ainda se escondem sob a areia. De volta à entrada é ainda possível ver as termas, onde a fornalha, o poço de captação, o frigidarium (parte dos banhos frios) e o caldarium (zona aquecida) são perfeitamente identificáveis. Locais de culto A visita guiada inclui ainda a basílica paleocristã do século iv e v. Como o edifício não está ainda totalmente recuperado e beneficiado, só nas visitas marcadas é possível apreciar os frescos que decoram as paredes, bem como as chamadas sepulturas de mesa. Mesmo depois do fecho das salgas o local permaneceu habitado até ao século VI. Não se sabe ao certo o que levou ao abandono do local, mas um ditado popular de Setúbal pode dar algumas pistas que remetem para o degradar das condições naturais. Diz o povo: “Grande peixe é a baleia que no mar se criou, 30 dias choveu areia quando Troia se arrasou.” 4 a minha vida XXXXXXXXXXXXX xxxxxxxxxxxxx HISTÓRIA Apogeu e morte de um polo industrial A exploração da unidade de salga e conservas de peixe que existiu na então ilha de Ácala – hoje parte da península de Troia – durou entre o segundo quartel do século i e a primeira metade do século v. A produção foi interrompida no final do século ii, eventualmente devido a um período de intensa crise económica. As salgas voltaram ao ativo no início do século iii permanecendo em laboração por mais dois séculos. Com o tempo as ruínas foram sendo cobertas de areia, mas nunca totalmente, e permaneceram assim na memória popular e nos registos históricos. São monumento nacional desde 1910. Condições especiais ^ Isenção de pagamento de entrada nas ruínas romanas; ^ 10% nas viagens realizadas nos ferry boats da Atlantic Ferries (na tarifa “viaturas Classe A”). Mais informações em montepio.pt/vantagens-associado A vida doméstica Um pouco mais à frente ergue-se o edifício do mausoléu que acolhia diferentes tipos de rituais funerários: cremações, em nichos nas paredes, e inumações, no chão. Por trás do mausoléu, uma elevação no terreno já teve diversos usos: oficina de salga, lixeira e cemitério, uma prova da necessidade de MONTEPIO PRIMAVERA 2015 79 4 a minha vida CRÓNICA BAPTISTA-BASTOS SAMUEL, DIAS VULGARES Samuel levantou-se mais cedo, como todas as sextas-feiras. Arranjou-se com esmero. Às sextas-feiras encontra-se com dois amigos para, no Jardim da Estrela, fazer uma partida de cartas, numa mesa de pedra, reservada para isso. São quatro jogadores eméritos e a sua fama alargou-se para outros bairros, fazendo reunir uma pequena multidão em trono da mesa. 80 Samuel tem este nome em homenagem a um miúdo judeu, do gueto de Varsóvia, celebrizado numa fotografia quando mostra, no braço esquelético, o número de prisioneiro. O pai de Samuel impressionou-se de tal forma com a fotografia do miúdo judeu, assustado e desamparado, que baptizou o filho com o nome do outro. Samuel gosta muito do nome e de contar as origens dele. E conseguiu, numa antiga imagem de revista, obter a foto do miúdo, recortá-la e colocá-la numa moldura que ainda tem. O jogo de bisca dos nove mantém-se há um ror de anos. Dos seus outros parceiros dois foram, como ele tipógrafos, um trabalhou numa fábrica de estampagem e o quarto era cangalheiro. Antes do jogo, almoçam os quatro numa taberna de galegos, como eles velhos, ali para Alcântara. Quase sempre é um cozido à portuguesa, vinho tinto e, no final, uma bagaceira. Conversam ainda um bocado e, depois, a pé, “para esmoer”, como dizem, dirigem-se para o Jardim da Estrela, onde já os espera um grupo de espectadores. Gostam do convívio semanal e de ter mirones a observá-los. Samuel põe gravata, penteia-se cuidadosamente e passa um pano de feltro pelos sapatos. Quando o tempo está ruim e amea- MONTEPIO PRIMAVERA 2015 ça chuva, usa chapéu castanho e gabardina. Coloca o chapéu levemente inclinado para a esquerda, olha para o retrato da mulher, que morreu há pouco tempo, manda-lhe um beijo com os dedos, e lá vai ele. Gosta muito de caminhar, embora já sinta certa dificuldade com um problema de circulação nas pernas. Porém não desiste. Pára algumas vezes, para descansar, até à paragem do eléctrico que fica perto da taberna dos galegos velhos. Os largos e as ruas, agora, estão praticamente vazios de miúdos. Apreciava vê-los, a jogar à bola e em outras brincadeiras. Explicaram-lhe que os tempos são outros, como se ele o não soubesse, e os miúdos ficam mais tempo nas escolas, porque as mães trabalham fora, ou estão com tablets, nas casas de uns e de outros, a fazer jogos ou a ver filmes sob a vigilância distraída das avós. Tem três filhos, dois no Canadá e um em Angola. Raramente lhe escrevem, e a saudade vai esmaecendo-se. Tem pena que isso aconteça, mas a vida tem destas ciladas. NOTA: O autor continua a escrever segundo a chamada norma antiga. MONTEPIO PRIMAVERA 2014 4 a minha vida TESTEMUNHO 82 perguntas a... MIGUEL ARAÚJO Foram Os Azeitonas que revelaram o talento de Miguel Araújo, mas as composições Esta entrevista foi realizada seguindo do artista portuense são hoje cantadas por outros músicos portugueses, como as premissas do famoso Questionário de Proust, António Zambujo e Ana Moura. que pretende refletir a personalidade do No seu trajeto musical, o autor do single “Os Maridos das Outras” do álbum entrevistado. O nome e popularidade deste Cinco Dias e Meio, o primeiro em nome próprio, conta com parcerias com questionário estão relacionados com as respostas Nuno Markl e João Só. O ano de 2014 foi a consagração e levou-o aos palcos dadas pelo escritor francês Marcel Proust. do país com o apoio do Montepio. Qual a figura histórica com quem mais se identifica? Identificar não, mas ambicionar identificar-me: Inácio de Loyola. Qual o seu maior medo? Fantasmas. Qual a sua ideia de felicidade perfeita? A felicidade de uma ideia feita. Qual o seu maior feito? Cantar em público. Se morresse e ressuscitasse como uma pessoa ou animal, qual escolheria ser? Não quereria nada disso, queria ir diretamente para Além. Quem são os seus heróis na vida real? Jesus e os apóstolos. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 O que aprecia mais nos seus amigos e família? A companhia. Se pudesse mudar algo em si, o que seria? O sistema respiratório. Qual o seu realizador favorito? Não sou fã de cinema. Qual o seu músico favorito? Chico Buarque. O MEU MONTEPIO NOTÍCIAS INSTITUCIONAIS, INICIATIVAS, PROJETOS E COMUNICADOS página 84 página 85 página 86 página 88 Os colaboradores Montepio fazem a diferença. O dia 15 de maio marcou a agenda do Grupo e, mais uma vez, a solidariedade chegou a todo o país Saiba como vai ser a 3ª edição da Corrida Montepio. Não deixe de participar num evento que junta a solidariedade a um estilo de vida saudável Invista em si e na sua família com os descontos e benefícios para associados. Destaque para um passatempo Repsol que pode levá-lo a viajar Não perca todas as atividades e iniciativas que desenvolvemos este trimestre para os associados Montepio VOLUNTARIADO INICIATIVA DESCONTOS AGENDA 5 o meu montepio SOLIDARIEDADE DIA DO VOLUNTARIADO SER SOLIDÁRIO A 15 DE MAIO REALIZOU-SE A TERCEIRA EDIÇÃO DO DIA DO VOLUNTARIADO MONTEPIO. A INICIATIVA CONTOU COM 400 COLABORADORES-VOLUNTÁRIOS E INTERVENÇÕES EM 23 INSTITUIÇÕES DO PAÍS, INCLUINDO AS REGIÕES AUTÓNOMAS DA MADEIRA E DOS AÇORES fotografia luís viegas 84 Um mar de solidariedade inundou Portugal. E foi o Montepio que trouxe essa força. No dia 15 de maio, 400 colaboradores demonstraram o seu empenho na concretização dos valores de solidariedade e entreajuda, numa ação de voluntariado corporativo sem precedentes, uma das maiores realizadas em Portugal. Pela primeira vez na história das ações de voluntariado do Montepio estiveram envolvidas as regiões do Alentejo, Açores e Madeira, num dia que ajudou a melhorar o futuro de 23 instituições de dimensão social, ambiental, cultural e ecológica. Marcaram presença os administradores Pedro Almeida Ribeiro e Carlos Beato, demonstrando que o voluntariado e o dever de cidadania são prerrogativas transversais a todo o Grupo Montepio. Paula Guimarães, diretora do Gabinete de Responsabilidade Social da Instituição, reiterou que “o MONTEPIO PRIMAVERA 2015 Montepio tem como objetivo sensibilizar, valorizar e incentivar as práticas de voluntariado e contribuir para a coesão social e disseminação da solidariedade pela comunidade.” A responsável refere que esta é uma das 60 ações levadas a cabo durante o ano pelos cerca de 1 300 voluntários do Grupo, representando 38% dos colaboradores no ativo e incluindo ainda colaboradores aposentados, promotores comerciais e colaboradores de empresas que integram a cadeia de valor do Grupo. Carlos Beato, presente numa ação na Mata da Machada, no distrito de Setúbal, referiu que “no Montepio, as palavras são iguais às atitudes e esta é a prova que somos fortes e coesos, que sabemos o que queremos e para onde vamos. É a prova que acreditamos que, juntos, faremos sempre mais e faremos sempre melhor”. “É a prova que acreditamos que, juntos, faremos sempre mais e faremos sempre melhor”. Carlos Beato Administrador da Associação Mutualista Montepio BENEFICIÁRIOS Instituições que o Montepio apoiou REGIÃO NORTE E GRANDE PORTO ^Vila Verde, Habitat for Humanity ^Barcelos, Casa da Saúde de São João de Deus ^Braga, Serve the City ^Porto, Centro Social da Sé Catedral do Porto ^Gaia, Parque Biológico de Gaia ^Porto, Sociedade Protetora dos Animais ^Porto, Serve the City (2 ações) REGIÃO CENTRO ^Guarda, Associação Cultural Social Freguesia de Panóias ^Buçaco, Mata da Buçaco REGIÃO LISBOA E GRANDE LISBOA ^Sintra, Casa de Saúde do Telhal ^Sintra, CERCITOP ^Mafra, Patas Felizes ^Cascais / Sintra, Cascais Ambiente ^Lisboa, Serve the City ^Sintra, CECD ^Sintra, Associação Korin REGIÃO SUL ^Évora, CerciDiana ^Coina, Mata da Machada ^Setúbal, O Cantinho da Milú ^Monte das Pitas, Centro de Lazer Montepio REGIÕES AUTÓNOMAS DA MADEIRA E DOS AÇORES ^Funchal, Casa do Voluntariado ^São Miguel, Lar Mãe de Deus 3.a Corrida Montepio No próximo dia 25 de outubro, Dia Nacional do Mutualismo, milhares de portugueses vão fazer da baixa pombalina uma pista solidária, na 3.a Corrida Montepio. Reserve já o seu lugar. Depois de uma participação recorde superior a 10 mil pessoas na última edição, 25 de outubro é o dia marcado para a 3.a Corrida Montepio. Todos estão convidados a participar nesta celebração da solidariedade, do bem-estar e da vida saudável. Estarão disponíveis dois percursos: corrida (10 km) e caminhada (5 km). Ambos terão partida na Praça D. Pedro IV (Rossio) e a linha da meta na Praça do Comércio. No caso da prova de meio-fundo, o percurso vai conduzir os atletas para junto do Centro de Congressos de Lisboa para depois retornarem pela Avenida 24 de Julho até à meta. Os participantes na caminhada vão ter pela frente um percurso que vai levá-los até à Estação de Santa Apolónia e de volta até à Praça do Comércio. As crianças também vão poder participar em provas por escalão etário e em atividades lúdicas com a marca Clube Pelicas. O valor da inscrição de cada participante na 3.a Corrida Montepio reverte ^ CORRER POR UMA CAUSA O Montepio faz do exercício um convite à solidariedade para a Liga Portuguesa Contra o Cancro, transformando este evento numa importante ação de solidariedade nacional. O ano passado foram reunidos 55 mil euros aplicados no apoio a crianças com necessidades. Contribua com a sua presença para um futuro melhor. MONTEPIO PRIMAVERA 2015 85 DESCONTOS E BENEFÍCIOS PARA ASSOCIADOS DESCUBRA MAIS VANTAGENS EM SER ASSOCIADO/A MONTEPIO Agiledlusa ILUMINAÇÃO LED A iluminação LED é a maior revolução na indústria da iluminação desde a invenção da luz elétrica. Esta tecnologia permite poupar nos consumos e reduzir a produção de calor, a emissão de CO2 e a quantidade de material de difícil reciclagem. Como principais benefícios destaca-se a garantia de 2 a 5 anos destes produtos, uma poupança de energia superior a 80%, um ciclo de vida útil entre 30 000 e 50 000 horas, uma elevada eficiência (superior aos 80 Lm/W) e um feixe de 360° para as lâmpadas esféricas e de 86 chama. O desconto de 15% é relativo aos produtos comercializados através do site agiledlusa.com Código de acesso para associados Montepio: LED_MG2015 Lisboa www.agiledlusa.com 15% desconto 20% desconto Oferta Danefísio Incentivos ao Ensino FISIOTERAPIA AO DOMICÍLIO A Danefísio oferece 20% de desconto nos serviços de consultas de fisioterapia, tratamentos de fisioterapia e tratamentos de terapia da fala. Estes descontos são aplicáveis na clínica e ao domicílio. Ribeira Grande Tel. 296 701 786 UNIVERSIDADE EUROPEIA Oferta para associados com seis meses de vida associativa ou mais, a ser aplicada e fracionada no pagamento das mensalidades, liquidadas por débito direto, referentes aos seguintes montantes anuais: licenciaturas globais, 750€; licenciaturas, 450€; licenciaturas pós-laborais, 350€; mestrados, 550€; mestrados pré-Bolonha, 450€; mestrados internacionais, 850€; Executive Masters-A ou Executive Masters-B, desconto de 20%; pós-graduações, desconto anual de 5%. www.europeia.pt 20% desconto Tapada Nacional de Mafra 20% de desconto para associados e 10% para os familiares nos percursos pedestres, BTT e de comboio (circuito ou visita completa de comboio) e nas aventuras ao amanhecer/anoitecer. 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DA BOA NOVA À MEMÓRIA PELOS PASSADIÇOS CRUZEIRO NO TEJO – CAIS DA ROCHA CONDE DE ÓBIDOS DIA 8 | AGOSTO 10h | MATOSINHOS 6 ,5€ WORKSHOP DIA 8 | VISITA AO SANTUÁRIO E CRISTO REI 16h | MONTALEGRE/PISÕES BARRAGEM DO ALTO RABAGÃO G ratuito DIA 1 | 9h | ALBUFEIRA MUSEU E CENTRO HISTÓRICO DE ALBUFEIRA 2 ,5€ AR LIVRE DIA 1 | 10h | ILHA TERCEIRA G ratuito VISITA ORIENTADA 16h | SAGRES FAROL DO CABO DE S. VICENTE G ratuito VISITA ORIENTADA DIA 2 | 9h | SILVES CASTELO DE SILVES E MUSEU 7 ,5€ VISITA ORIENTADA DIA 6 | 15h | ALMADA SANTUÁRIO E CRISTO REI 3 ,5€, gratuito < 7 anos, 2,5€ dos 8 aos 13 anos AR LIVRE DIA 8 | 9h | SERRA DE MONCHIQUE ROTA DA FONTE SANTA – FORNALHA, ALFERCE 1 2,5€ ou 24,5€ (caminhada + almoço) DIA 22 | 10h | VILA NOVA DE FAMALICÃO Gratuito 15h | PORTO 3 € DIA 9 | VISITA ORIENTADA PARQUE DA DEVESA TORRE DOS CLÉRIGOS – (VISITA GUIADA À TORRE + EDIFÍCIO) AR LIVRE VISITA AO NAVIO-ESCOLA SAGRES – PRAIA DA VITÓRIA DIA 1 | DIA 8 | 10h | LISBOA Gratuito VISITA ORIENTADA PASSEIO COM HISTÓRIA gratuito até aos 3 anos PARQUE EDUARDO VII VISITA ORIENTADA DIA 8 | 15€, 7,5€ dos 3 aos 12 anos, DIA 16 | G ratuito 6 15h | LISBOA PASSEIO COM HISTÓRIA 10h | VIDAGO INICIAÇÃO AO GOLFE AGOSTO DIA 15 | VISITA ORIENTADA DIA 22 | 14h30 | ÁGUEDA MUSEU NACIONAL FERROVIÁRIO – NÚCLEO DE MACINHATA DO VOUGA Gratuito < 14 anos, 1€ dos 15 aos 10h | COMPORTA PASSEIO DE KAYAK NA VALA REAL 8€ VISITA ORIENTADA DIA 29 | VISITA ORIENTADA DIA 14 | 15h | LISBOA GALERIA SUBTERRÂNEA – CASA DO REGISTO/SÃO PEDRO DE ALCÂNTARA (1 600 M) 5 € adultos, 2,5€ estudantes, gratuito até aos 12 anos 9h30 | RIO MAIOR ROTA DE TURISMO SOLIDÁRIO – COOPERATIVA TERRA CHÃ “ROTA DO SAL E DO VENTO” 20,5€ VISITA ORIENTADA DIA 30 | 10h30 | MAFRA ABRIGO DO BURRO – BURRICADAS VISITA ORIENTADA DIA 15 | 25 anos, 2€ > 25 até 65 anos, 1€ > 65 anos 10H30 |ÁGUAS DE MOURA CAVES ERMELINDA FREITAS VISITA ÀS INSTALAÇÕES MAIS PROVA DE VINHOS 4€ VISITA ORIENTADA DIA 30 | 15h | PORTO WORLD OF DISCOVERIES G ratuito 8€, 6€ dos 4 aos 12 anos, gratuito até aos 3 anos 8 AGOSTO WORKSHOP DE INICIAÇÃO AO GOLFE SAIBA MAIS www.montepio.org Informações e inscrições Gabinete de Dinamização Associativa [email protected] T. 213 249 230/1 MONTEPIO PRIMAVERA 2015 89 AGENDA UM ESPAÇO PARA PENSAR E AGIR COM UMA AGENDA DINÂMICA, O ATMOSFERA M, AGORA TAMBÉM EM LISBOA, CONTINUA A APOSTAR EM EVENTOS CULTURAIS, FORMAÇÃO E TERTÚLIAS, DINAMIZANDO UM ESPAÇO DE CIDADANIA E CULTURA CONCEBIDO PARA USUFRUTO DOS ASSOCIADOS MONTEPIO, RESPETIVAS FAMÍLIAS E TODA A COMUNIDADE Sabia que... 90 As atividades permanentes de que os associados Montepio poderão usufruir são: f BookCrossing f Clube de leitura f Formações e cursos livres f Atividades do Clube Pelicas FINS DE SEMANA PAIS E FILHOS f Hora do Conto f Oficinas de escrita criativa f FilhoSofia f Atelier de ilustração infantil f Filminhos à solta pelo País JULHO E AGOSTO PORTO Ao longo destes dois meses, o espaço de exposições do Porto acolhe os trabalhos de Pintura dos alunos da Academia Intergeracional Rutis – atmosfera m. Uma seleção de obras dos 15 alunos e professores das duas turmas de 2014/2015. LISBOA A Sociedade Portuguesa de Autores promove uma homenagem ao artista plástico e cenógrafo António Casimiro, numa retrospetiva com obras do autor; inclui desenhos e esboços de cenários para televisão, cinema e teatro. Pinturas e alguns documentos pessoais completam esta mostra. FORMAÇÃO Aprender sem idade Em setembro regressa a Academia Intergeracional, em parceria com a RUTIS, no Porto e em Lisboa. Disciplinas como Envelhecimento Ativo, Alimentação, Yoga, Informática, Línguas, vão fazer parte da proposta para o ano letivo 2015/2016. Inscreva-se através dos e-mails: [email protected] e [email protected] ^ ANTÓNIO CASIMIRO é o artista em destaque, nos meses de julho e agosto, no espaço de Lisboa PORTO/LISBOA PERMANENTE: BOOKCROSSING Desde o dia em que se celebrou o aniversário deste projeto internacional – 23 de abril – os espaços atmosfera m Porto e Lisboa passaram a ser pontos oficiais de troca de livros; várias dezenas de exemplares já viajaram pelas mãos dos nossos visitantes, encontrando novos destinos. TOASTMASTERS CLUB O Clube internacional de Comunicação e Formação de Líderes escolheu os espaços atmosfera m para abrir, respetivamente, o Invicta Toastmasters Club e Leadership Toastmasters Club. Todos estão convidados a entrar, pensar e… comunicar! FINS DE SEMANA Ao sábado há sempre uma atividade a pensar nos mais novos: escrita criativa, ilustração, filosofia, teatro, filmes ou oficinas de brinquedos e xadrez prenchem já as agendas dos visitantes mais jovens. ESPERAMOS POR SI Mais informações sobre as atividades dos atmostera m em www.montepio.pt/ atmosferam PORTO | Rua Júlio Dinis, n.° 158/160 | contactos T.: 220 004 270 e-mail [email protected] | horário Segunda-feira a sábado, das 9h30 às 19h30 (Biblioteca das 13h00 às 19h00) | Encerrado aos domingos e feriados LISBOA | Rua Castilho, n.° 5 | contactos T.: 210 002 730 e-mail [email protected] | horário Segunda-feira a sexta, das 9h00 às 19h00 | Sábados, das 11h00 às 17h00 | Encerrado aos domingos e feriados Horário de agosto Segunda-feira a sexta, das 9h00 às 17h00 MONTEPIO PRIMAVERA 2015 PUB PUB