R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Lisboa • Ano 108º • Vol. CIV • Nº 569-572 • pp 1 - 90 • Jan - Dez 2009
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Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias
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Director
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Editor
Co-editor
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Conselho Editorial
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José Robalo Silva
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José Oom Vale Henriques
Luís Anjos Ferreira
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Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias
Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa
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É permitida a reprodução do conteúdo desta revista
The reproduction of the contents of this publication is permitted
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We wish to establish exchange with other publications
Os trabalhos submetidos para publicação são analisados por especialistas
Papers submitted for publication are peer reviewed
A Revista Portuguesa de Ciências Veterinárias foi fundada em 1902
Publicação Semestral
Tiragem 1000 exemplares
Preço 25,00 Euro
Índice
Artigos de revisão
Nutrigenômica: situação e perspectivas na alimentação animal
Nutrigenomics: state of the art and perspective in animal feeding
5
Fernanda M. Gonçalves, Marcio N. Corrêa, Marcos A. Anciuti, Fabiane P. Gentilini,
Jerri Teixeira Zanusso, Fernando Rutz
Abordagem clínica de feridas cutâneas em equinos
Clinical approach in equine skin wounds
13
Júlio C. Paganela, Leandro M. Ribas, Carlos A. Santos, Lorena S. Feijó, Carlos E.W. Nogueira,
Cristina G. Fernandes
Utilização de bloqueio anestésico para exodontia do dente carniceiro em cão
Block anesthesic used to do exodontia of canassial tooth in dog
19
Víviam N. Pignone
Memórias científicas originais
Transferência embrionária em bovinos leiteiros na Ilha Graciosa (Açores): programa
experimental de transferência de embriões sexados e congelados da raça Holstein Frísia
Embryo transfer in dairy cattle at Graciosa Island (Azores): an experimental trial of sexed
and frozen-thawed transfer of Holstein Friesian embryos
25
João Chagas e Silva
Exatidão da ultra-sonografia para diagnóstico de gestação aos 28 dias após inseminação
e sua contribuição na eficiência reprodutiva em fêmeas Nelore e cruzadas
Accuracy of the ultrasonography for pregnancy diagnosis at 28 days after insemination
and its contribution in the reproductive efficiency on Nelore and crossbred females
31
Adriana Gradela, Thiago Danieli, Tiago Carneiro, Denílson Valin Torres,
Cássio Roberto Gradela, Vanessa Sobue Franzo
Estudo do balanço eletrolítico alimentar para suínos machos castrados em acabamento
mantidos em ambiente de alta temperatura
Study of feed electrolyte balance of finishing castrated male pigs under high environmental
temperature
37
Anilce A. Bretas, Rony A. Ferreira, Patrícia C.B. Vale, Humberto P. Couto, Walter E. Pereira
Estudo casuístico de dermatites por reacção de hipersensibilidade em cães e gatos
Case study of dermatitis hypersensitivity reaction in dogs and cats
45
Sílvia Silva, Sara Peneda, Rita Cruz, Helena Vala
Parâmetros ecocardiográficos de cães cronicamente infectados com Trypanosoma cruzi
(Cepa Colombiana)
Echocardiographic parameters of dogs chronically infected by Trypanosoma cruzi
(Colombian strain)
55
João P.E. Pascon, Marlos G. Sousa, Aparecido A. Camacho
Caracterização de agressões entre canídeos (83 casos)
Characterization of dog-to-dog aggression (83 cases)
Sofia Mouro, Cristina L. Vilela, Manuela R.E. Niza
61
Avaliação bacteriológica de anéis de lula, Dorytheutis plei (Blainville, 1823) (Mollusca:
Cephalopoda), congelados e irradiados
Bacteriological evaluation of squid rings, Dorytheutis plei (Blainville, 1823) (Mollusca:
Cephalopoda), frozen and irradiated
71
Flávia A. A. Calixto, Robson M. Franco, Eliana F. M. Mesquita, Helio C. Vital, Erika Murayama
Comunicações breves
Redução de fenda palatina, secundária a tumor venéreo transmissível, com obturador
palatino
Reduction of cleft palate, secondary to transmissible venereal tumor, with palatal prosthesis
77
Liliana M. R. Silva, Fernando J. R. Magalhães, Ana Margarida A. Oliveira, Maria Cristina O. C.
Coelho, Sílvia V. Saldanha
Tronco celíaco-mesentérico em gato
Celiac mesenteric trunk in cat
83
Magno S. Roza, Fernanda M. Pestana, José M.F. Hernandez, Bárbara X. Silva, Marcelo AbiduFigueiredo
Electrocution accident in free-ranging bugio (Alouatta fusca) with subsequent amputation
of the forelimb: case report
Acidente elétrico em bugio de vida livre (Alouatta fusca) com consequente amputação do
membro torácico: relato de caso
Melissa P. Petrucci, Luiz A. E. Pontes, Fábio F. Queiroz, Márcia C. Cruz, Diogo B. Souza,
Leonardo S. Silveira, Ana B. F. Rodrigues
87
ARTIGO DE REVISÃO
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Nutrigenômica: situação e perspectivas na alimentação animal
Nutrigenomics: state of the art and perspective in animal feeding
Fernanda M. Gonçalves*, Marcio N. Corrêa, Marcos A. Anciuti,
Fabiane P. Gentilini, Jerri Teixeira Zanusso, Fernando Rutz
Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
Resumo: O objetivo desta revisão é relatar a situação de
estudos em nutrigenômica em sistemas de produção animal
discutindo perspectivas quanto à utilização prática das interações entre nutrição e genótipo e os benefícios produtivos
relacionados. A importância da nutrição para a saúde e sua
influência na ocorrência de doenças já é comprovada cientificamente por instituições de pesquisa. A conversão metabólica de
componentes da dieta atua como um mecanismo de controle
para a expressão genética. Desta forma, estudos em nutrigenômica têm despertado o interesse de cientistas, buscando
entender a maneira como a alimentação regula a expressão de
genes. O conhecimento de que a interação dieta-genoma possa
contribuir para resolução de doenças crônicas ainda é discutido
mundialmente, e o mecanismo de atuação de componentes
dietéticos em nível molecular, ainda não foi evidenciado. Em
sistemas intensivos de produção animal, esta área de estudos
contribuirá para um melhor aproveitamento dos ingredientes
das rações os quais representam um percentual considerável nos
custos de produção. A necessidade em fornecer ingredientes
naturais e biodisponíveis em dietas para animais, motiva a pesquisa em nutrição e alimentação animal para o conhecimento de
como determinados nutrientes irão atuar nos sistemas orgânicos
e, conseqüentemente, melhorar o desempenho zootécnico e
padrão sanitário dos efectivos animais. De acordo com o que foi
descrito, o artigo de revisão abordará a aplicação desta ciência
em sistemas de produção animal bem como os estudos já
desenvolvidos nesta área.
Summary: The aim of this review is to discuss the worldwide
studies in nutrigenomics applied in farm animals systems,
considering the perspectives about practical applications of
nutrition gene interaction for animal health and the related
benefits. The value of nutrition for health and its influence in
many diseases is proved by researches laboratories and institutions. The metabolic conversion of chemical elements of diets
also acts like a control mechanism for genetic expression.
Therefore, the interest of nutrigenomics researches appears to
be stronger, were scientific communities searches for answers
about how food can regulated gene expression. The evidences of
diet and genome interaction contribution for the wellness in
chronic diseases conditions still remains in discussion, and the
mechanisms by which nutrients perform molecular changes are
still to be explained. In intensive animal production systems,
*Correspondência: [email protected]
Tel/fax: +55 53 32757274
this area of knowledge will contributed for a better used of diets
ingredients, which represented a considerable high cost in the
activity. The needed to offer natural and available ingredients in
animal diets motivates research in animal nutrition and feeding
into the explanation of the acting mechanism of the nutrients in
organics systems in order to increase the performance and
sanitary condition of animals. According to that, this review will
address the application of nutrigenomics concepts in animal
production systems and the research development in this field.
Introdução
Em sistemas de produção animal que visam obter
alimentos para consumo humano, a maior parte dos
custos, independente da espécie animal a ser explorada, concentra-se nas despesas com a alimentação dos
rebanhos. Estima-se que tal despesa represente de
70 a 80% do total de recursos despendidos em um
sistema de produção animal intensivo. A precisão
na determinação dos ingredientes ideais que irão
favorecer índices zootécnicos de interesse pode ser a
solução para reduzir esse custo com alimentação
(Berchielli et al., 2006).
Um adequado consumo de macro e micronutrientes
que considere a idade, a constituição genética e o
metabolismo de cada indivíduo, permite uma melhoria na saúde e na eficiência produtiva a um baixo custo
em relação a outros procedimentos (Ames, 2004).
A importância da interação entre nutrição e saúde é
evidente em um sistema de produção animal, ainda
que fatores ligados a ambiente e manejo também
influenciem o desempenho produtivo do indivíduo e
do rebanho por conseqüência. Nesse contexto, alguns
alimentos poderão apresentar-se como componentes
bioativos na proteção do organismo contra enfermidades que possam acometer os rebanhos (Afman e
Muller, 2006; Ferguson, 2006), sendo que alguns
elementos como, selênio, vitamina E, ácido ascórbico
e carotenos, por exemplo, já foram identificados como
agentes protetores.
Com o desenvolvimento de métodos bioquímicos e
de técnicas de biologia molecular, a elucidação dos
5
Gonçalves FM et al.
mecanismos químicos de ação de constituintes da
dieta, assim como seus efeitos subseqüentes em
mecanismos homeostáticos relacionados à condição
de saúde ou doença, está avançando de forma rápida e
gradual. O mapeamento do genoma humano e ensaios
realizados em modelos biológicos também possibilitaram a condução de estudos e a identificação de
genes responsáveis por reações específicas ligadas a
mudanças dietéticas em indivíduos susceptíveis a
determinadas enfermidades. Ainda que parte da
informação sobre os genes que constituem o código
genético, suas respectivas localizações no cromossoma, estrutura e função tenham sido identificadas,
ainda serão necessários estudos sobre a forma
orquestrada em que os genes atuam no metabolismo
(Marti et al., 2005). Essas interações são estudadas
pela genômica da nutrição, ciência conhecida como
nutrigenômica. O termo faz referência ao modo como
certos nutrientes interagem com os genes de um
sistema orgânico em particular, favorecendo a síntese
de proteínas de forma benéfica ao indivíduo.
Atualmente, muitas publicações na área de nutrição e
saúde humana têm utilizado conceitos de nutrigenômica para estudar a prevenção e, em menor
potencial, o tratamento de doenças multifatoriais
(Sedová e Seda, 2004; Ferguson, 2006; Trujillo et al.,
2006). Assim, trata-se de uma área da ciência em
expansão e que ainda necessita de muitos estudos para
que ações sejam adotadas a fim de maximizar os
benefícios do melhor entendimento das interações
gene-nutrientes. Ainda são escassos na bibliografia
mundial, estudos ou revisões que procurem informar
técnicos e pesquisadores dedicados as áreas de
ciências biológicas e agrárias sobre os conceitos e
aplicações da nutrigenômica em sistemas de produção
animal.
O objetivo desta revisão é relatar a atual situação
de estudos de nutrigenômica bem como discutir
perspectivas do conhecimento e entendimento das
interações entre nutrição e genótipo para a saúde
animal e, conseqüentemente, os benefícios produtivos
relacionados.
Nutrigenômica: estado da arte
A combinação de dados através de projetos
para mapeamento do genoma das espécies, e a
disponibilidade de ferramentas de alta tecnologia para
a investigação da expressão gênica, permitem o
esclarecimento sobre a complexa interação entre
nutrição e genoma a qual afeta diretamente a função
celular. Embora a nutrigenômica seja uma ciência
recentemente descoberta, o conhecimento de que
componentes dos alimentos afetam a expressão de
determinados genes e, por conseqüência, a expressão
fenotípica, já esta claramente evidenciada (Bergmann
et al., 2006).
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RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11
As informações obtidas a partir de estudos de nutrigenômica poderão orientar para a elaboração de uma
dieta mais específica considerando a condição de
saúde dos animais e a composição nutricional dos
alimentos, o que poderá proporcionar melhores
respostas metabólicas e, conseqüentemente, de
produção. Esta nova ciência permitirá a prevenção de
doenças importantes em humanos como obesidade,
hipertensão e diabetes, bem como otimizar as terapias
para estas enfermidades. Em animais também poderão
ser prevenidas enfermidades prevalentes, em especial
àquelas ligadas a condição nutricional do indivíduo
(Sedová e Seda, 2004), como é o caso da cetose, por
exemplo, uma enfermidade de etiologia metabólica a
qual acomete principalmente rebanhos leiteiros com
condição corporal acima do preconizado no momento
do parto (Ingvartsen, 2006). Desta maneira, poderão
ser prevenidas doenças de origem metabólica em
função de uma correta nutrição dos rebanhos
(Goodacre, 2007), através do mapeamento de genes
relacionados a expressão de determinadas características da espécie, sexo, padrão racial, genético e que
potencialmente sejam suprimidos por componentes
funcionais das dietas. Em aves domésticas, já foram
descritas várias diferenças no pareamento de bases
(2,8 milhões) entre linhagens (International Chicken
Polymorphism Map Consortium, 2004), evidenciando
a ampla diversidade genética em uma mesma espécie
e, até mesmo, em um mesmo gênero.
A utilização das ferramentas para a pesquisa em
nutrigenômica permitirá estudar os mecanismo de
nutrientes ou alimentos bioativos sobre a expressão
(transcrição e tradução) e sobre o metabolismo de
genes, especialmente sobre o mecanismo molecular e
requerimento de nutrientes (Jiang et al., 2004; Trujillo
et al., 2006), bem como sobre a forma em que
alimentos bioativos podem interagir entre si. Neste
contexto a nutrigenômica apresenta algumas premissas básicas (Trujillo et al., 2006):
- a dieta e os componentes dietéticos podem alterar
o risco de desenvolvimento de doenças, modulando os
processos múltiplos envolvidos com o início, a
incidência, a progressão e/ou severidade;
- os componentes do alimento podem agir no
genoma, direta ou indiretamente, alterando a
expressão dos genes e dos produtos destes;
- a dieta pode potencialmente compensar ou
acentuar efeitos de polimorfismos genéticos;
- as conseqüências de uma dieta são dependentes do
estado da saúde ou da doença e da genética de cada
indivíduo;
- intervenções na dieta baseadas fundamentalmente
no conhecimento das necessidades nutricionais e no
genótipo, podem ser utilizadas para o desenvolvimento de planos nutricionais individualizados que
otimizem a saúde e previnam ou minimizem os efeitos
das doenças crônicas.
A possibilidade de adequar a alimentação às carac-
Gonçalves FM et al.
terísticas do código genético de cada indivíduo, a fim
de prevenir o desenvolvimento de certa enfermidade
identificada geneticamente, tem estimulado pesquisadores de todo o mundo a aprofundar conhecimentos
nesse segmento de pesquisa. Em estudos de laboratório, pesquisadores já verificaram que a lunasina
encontrada na soja, influencia 123 genes envolvidos
no surgimento do câncer de próstata auxiliando a
interrupção no crescimento do tumor. Também foi
evidenciado que o brócolis estimula a ação de genes
envolvidos na produção de antioxidantes que atuam
mantendo as artérias saudáveis (Moraes e Colla,
2006). Assim como a soja e o brócolis apresentam
efeitos benéficos para saúde humana, atuando como
coadjuvantes na prevenção de doenças, outros
alimentos poderão igualmente atuar como suportes
em tratamentos de doenças crônicas em animais de
produção, uma vez que sejam estudadas e evidenciadas suas propriedades terapêuticas. Alguns alimentos
têm sido estudados a fim de elucidar seus princípios
ativos, entretanto, informações concretas de como
estes componentes nutricionais atuam no processo
de síntese de aminoácidos e proteínas, em nível de
código genético, e a maneira como serão aplicadas,
ainda não são totalmente esclarecidas.
Na área de clínica veterinária, alguns marcadores
biológicos têm sido utilizados como ferramentas para
diagnóstico definitivo de alguma doença ou, até
mesmo, como medida de profilaxia. Um exemplo, é a
utilização de biomarcadores para a detecção de
exposição à aflatoxinas (Lino et al., 2007), as quais
inibem a síntese proteica e do DNA, promovem stress
oxidativo, induzem a fragmentação do DNA e interrompem o ciclo celular (Lino et al., 2004). Nos estudos em nutrigenômica, utilizam-se técnicas como o
microarranjo para analisar as adaptações metabólicas
que são induzidas pelas variações da nutrição (Bauer
et al., 2004). O microarranjo (gen chip) é uma técnica
experimental da biologia molecular que busca medir
os níveis de expressão de transcritos em larga escala,
isto é, medindo muitos (em alguns casos todos)
transcritos simultaneamente. O desenvolvimento da
tecnologia de microarranjo permite aos cientistas uma
ferramenta para examinar sítios potenciais de ação de
componentes alimentares e suas interações com vários
processos celulares. Com o uso desta ferramenta,
diversos genes e sua expressão relativa são avaliados
simultaneamente em células normais e doentes, antes
ou depois da exposição a diferentes componentes
dietéticos. Como exemplo de tal evolução, cita-se o
progresso do projeto do genoma suíno e de aves, o
qual apresentou consideráveis avanços quanto ao
entendimento da seqüência de nucleotídeos associada
a genes específicos de suínos permitiu a produção
comercial de microarranjos individuais (gen chip) que
podem ser utilizados para avaliação de 23256
transcrições correspondentes a 20201 genes do genoma desta espécie (Caetano et al., 2004).
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Estas informações podem auxiliar a descoberta de
novos biomarcadores para o diagnóstico de doenças e
a predição de prognóstico, além de novas alternativas
terapêuticas (Trujillo et al., 2006).
O surgimento dos estudos em nutrigenômica e em
nutrigenética, dois campos com diferentes abordagens
para a elucidação da interação entre dieta e genes,
possui um objetivo final em comum: otimizar a saúde
através de uma dieta personalizada e fornecer
poderosa aproximação para decifrar a complexa
relação entre moléculas nutricionais, polimorfismo
genético e o sistema biológico por inteiro (Mutch et
al., 2005). A nutrigenômica descreve o uso de ferramentas para investigar um sistema biológico em
particular, de acordo com um estímulo nutricional
que irá permitir o conhecimento de como nutrientes
influenciam mecanismos metabólicos e de controles
homeostáticos. Por outro lado, a nutrigenética visa
compreender como o tipo genético de um indivíduo
coordena a resposta deste a uma dieta, e isto considerando o polimorfismo genético. O polimorfismo
genético é reconhecido como um fator que pode
alterar a resposta a componentes da dieta (efeito da
transcrição nutricional) por influenciar a absorção,
metabolismo ou sítio de ação (Kussmann et al., 2006).
A nutrigenômica em sistemas de produção
animal
Os estudos que estão sendo realizados na área da
nutrigenômica são, em maior parte, desenvolvidos em
humanos. Desta maneira, ainda serão necessários
muitos ensaios para determinar e compreender os
benefícios advindos de nutrientes que sabidamente
são responsáveis por contribuir para um desempenho
produtivo satisfatório, mas que ainda não foram
consolidados em relação a possíveis interações com
determinados genes em diferentes espécies. Neste
contexto inserem-se os minerais, nucleotídeos,
aminoácidos, as vitaminas, dentre outros elementos
orgânicos que podem modificar a transcrição de genes
com o potencial de alterar as respostas biológicas e
metabólicas envolvidas em processos como o crescimento e a diferenciação celular.
Siske et al. (2000) observaram maior peso dos ovos
quando utilizaram zinco e manganês, ambos na forma
orgânica, nas dietas de aves produtoras de ovos. Em
uma primeira análise, não se observa uma correlação
entre a suplementação de tais minerais e o incremento
de solutos e líquidos na composição do ovo. No
entanto, estes elementos atuam ativamente como
co-fatores em processos enzimáticos importantes para
o organismo. A enzima anidrase carbônica, por
exemplo, necessita da presença de zinco para catalisar
a reação que produz ácido carbônico a partir de água
e dióxido de carbono (Slattery et al., 2004), necessária
para a formação da casca. É possível que outras
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Gonçalves FM et al.
reações orgânicas sejam direta ou indiretamente
influenciadas por diferentes minerais, e que interações
entre estes e o conteúdo genético do indivíduo
ocorram durante a exposição. A utilização de nutrientes com maior biodisponibilidade ao organismo
poderá fornecer as quantidades ideais de um determinado mineral após o estabelecimento da dieta gênica
para uma raça ou linhagem.
Em um experimento com cobaias, observou-se que
ratos alimentados com uma dieta pobre em selênio
demonstraram um aumento na expressão de genes
envolvidos no processo de danificação do DNA, no
estresse oxidativo e no controle do ciclo celular e,
ainda, apresentaram redução na expressão de genes
envolvidos na detoxificação (Sreekumar et al., 2002).
Blanchard et al. (2001) utilizaram arranjos de cDNA
para demonstrar mudanças na expressão gênica intestinal induzida por deficiência de zinco em roedores.
Estes estudos indicam que o perfil de expressão
genética pode ser utilizado para a detecção de doses
subótimas de micronutrientes essenciais utilizados
nas dietas comerciais para as diversas espécies de
interesse zootécnico.
Os componentes do alimento com potencial bioativo modificarão diversos processos simultaneamente.
Assim, um dos desafios no campo da pesquisa é a
identificação de quais processos, ou a interação entre
processos, serão mais importantes para proporcionar
uma mudança fenotípica (Trujillo et al., 2006). Outro
aspecto relevante a ser observado é a identificação de
quais doenças poderão ser prevenidas ou debeladas
por uma intervenção através da dieta. No estudo da
relação nutrição-gene também deverá ser considerado
o fator ambiental como um agente modulador da
resposta, a qual será única frente às variadas
condições ambientais. A progressão de um fenótipo
saudável para um fenótipo de doença crônica deve
ocorrer por mudanças na expressão de genes ou por
diferenças na atividade de proteínas e enzimas
(Kaput e Rodriguez, 2004), sendo estas ativadas ou
suprimidas por agentes extrínsecos ao animal.
Um grande número de componentes dietéticos pode
alterar eventos genéticos e, de tal modo, influenciar
a saúde. Além dos nutrientes essenciais, tais como
cálcio, zinco, selênio, folato, vitaminas C e E, existe
uma variedade de classes de nutrientes não essenciais
e de componentes bioativos que parecem influenciar
de maneira significativa a saúde. Estes compostos
essenciais e não essenciais do alimento, sabidamente
modificam um número de processos celulares
associados à prevenção de doenças, incluindo o
metabolismo carcinogênico, o balanço hormonal,
mecanismos de sinalização celular, controle do ciclo
celular, apoptose e angiogênese (Davis e Uthus,
2004). A vitamina E, por exemplo, é um potente
seqüestrador de radicais livres e o mais poderoso
antioxidante lipossolúvel da natureza (Souza et al.,
2006), sendo associada à defesa das membranas extra
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RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11
e intracelulares contra espécies reativas que danificam
as células, conferindo, conseqüentemente, proteção ao
conteúdo genético destas estruturas. Souza et al.
(2006) relataram efeitos positivos para força de
cisalhamento (força de corte) em músculos de frangos
de corte suplementados com níveis crescentes de
vitamina E nas dietas, atribuindo esta maior firmeza
à função de proteção da vitamina E às injúrias na
membrana celular durante o processo de congelamento. Contudo, tal resultado pode ser utilizado para uma
investigação mais profunda, associando a composição
estrutural muscular de frangos suplementados com
vitamina mais firme à expressão de genes para a
síntese de proteínas estruturais da fibra muscular, por
exemplo. Desta forma, uma avaliação genômica da
ação da vitamina E no organismo animal conduziria a
uma determinação mais específica sobre a função
estrutural deste nutriente.
Uma questão sobre o selênio interessante de ser
destacada é que estudos demonstraram que este
mineral reduz a incidência de câncer no fígado,
próstata e nos pulmões de humanos (Clark et al.,
1996). Entretanto os indivíduos não respondem da
mesma forma a suplementação com selênio, já que a
variabilidade genética consiste em um dos fatores que
contribuem para o nível e o tipo de resposta. A
glutationa peroxidase é uma enzima dependente de
selênio que atua no sistema antioxidante da membrana
celular. Um polimorfismo no códon 198 da glutationa
peroxidase em humanos resulta em uma substituição
de leucina por prolina, sendo este mecanismo associado ao aumento do risco de câncer de pulmão (Singh et
al., 2006). Não foram identificadas neste estudo as
causas que influenciaram este polimorfismo, no
entanto, tal alteração pode estar relacionada a quantidade de selênio que é necessária para otimizar a
atividade da enzima. A eficácia do uso de selênio com
diferentes alelos para a glutationa peroxidase não é
totalmente conhecida (Hu e Diamond, 2003).
A atividade da vitamina D constitui um outro
exemplo sobre os efeitos mediados pela expressão
genômica de receptores para a mesma. Por sua vez,
a expressão de genes para estes receptores são
dependentes dos níveis de cálcio na dieta e do
consumo de Vitamina D (Slattery et al., 2004). Dada a
importância desta vitamina nos mais diferentes
processos fisiológicos dos animais, informações que
possam maximizar os benefícios de seus efeitos,
implicaram em novas aplicações de conceitos
nutricionais na formulação de dietas para animais de
produção.
A nutrigenômica em nutrição animal promete ser
uma alternativa de grande utilidade principalmente em
sistemas de produção intensiva, onde a alimentação
contribui, associada a outros fatores inerentes ao
ambiente e métodos de manejo, com uma parcela
significativa para a melhoria do desempenho zootécnico dos lotes, bem como na rentabilidade econômica
Gonçalves FM et al.
das unidades. Para este aumento na eficiência
biológica, a aplicação de novas tecnologias em
produção animal serão responsáveis por custos de
produção mais baixos e competitivos. Nos domínios
metabólico, genético, reprodutivo e produtivo, novas
técnicas que não apresentem riscos à saúde pública
e que sejam eticamente aceitas pelo consumidor,
permitirão aplicar no próximo século e nos sistemas
de produção intensiva, tecnologias de produção
que incrementem o setor primário de produção de
alimentos (Portugal, 2002).
Os princípios de nutrigenômica a serem aplicados
para animais de produção, poderão não ter somente o
objetivo de prevenir doenças relacionadas a alterações
genéticas, mas também correlacionar à utilização de
certo nutriente em uma dieta animal com o aumento
de índices produtivos. As descobertas a serem realizadas na próxima década utilizando ferramentas
moleculares, tais como os microarranjos, irão revolucionar nosso entendimento básico sobre a fisiologia
dos rebanhos e auxiliarão a definir novos métodos
para o controle nutricional dos animais. Em longo
prazo, provavelmente a transcrição destes perfis será
capaz de fornecer diversas ferramentas elementares
para a avaliação do status nutricional e fisiológico de
um indivíduo, animal ou grupo de animais (Dawson,
2006). As técnicas utilizadas para a elucidação da
genômica nutricional não são diferentes daquelas
utilizadas nas pesquisas em genética molecular. Uma
rede integrada que simultaneamente examina a
genética e associa polimorfismo com doenças ligadas
a dietas (nutrigenética), nutrientes induzindo a
metilação do DNA e a alteração da cromatina
(epigenômica nutricional), nutrientes que induzem
mudanças na expressão gênica (transcriptômica nutricional) que alteram a formação e/ou bioativação de
proteínas (proteômica) irá permitir um completo
entendimento da inter relação entre dieta e desenvolvimento de doenças (Davis e Milner, 2004).
Alimentos funcionais
O termo “funcional”, bioativo ou nutracêutico, vem
sendo aplicado como conceito de alimentos que
proporcionam um benefício fisiológico adicional além
das qualidades nutricionais básicas. Tais alimentos
também são vistos como promotores de saúde, sendo
muitas vezes associados a um tratamento profilático à
instalação ou retardo de alterações pré- estabelecidas
(Moraes e Colla, 2006).
Variações entre os alimentos ingeridos não somente
influenciam o consumo de componentes bioativos
como alteram o metabolismo celular, influenciando os
sítios de ação de ambos nutrientes essenciais e não
essenciais (Milner, 2004).
Segundo Diplock et al. (1999) foi definido consensualmente o conceito europeu de alimento funcional
RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11
como “um alimento em que está satisfatoriamente
demonstrado possuir efeito benéfico em uma ou mais
funções fisiológicas alvo, para promover a saúde e
bem-estar e/ou reduzir o risco de doença”. Um
alimento funcional deve assim configurar-se, e seus
efeitos devem ser demonstrados em doses que possam
ser normalmente esperadas em uma dieta. Embora
associado, este conceito não deve ser confundido
com o conceito de nutracêutico, o qual se refere a
um composto químico presente naturalmente nos
alimentos ou substâncias encontradas naturalmente
na natureza possíveis de ser ingeridas, como as
ervas aromáticas, por exemplo, que sabiamente são
benéficas para o organismo humano na prevenção ou
tratamento de uma ou mais doenças, reforçando as
reações fisiológicas.
Embora, a maioria das substâncias de ocorrência
natural benéficas a saúde originem-se de plantas,
também existem diversos componentes fisiologicamente ativos em produtos de origem animal que
devem ser destacados devido a função em potencial na
promoção de saúde como, por exemplo, os ácidos
graxos conjugados encontrados em produtos cárneos,
principalmente (Prates e Mateus, 2002).
As recomendações nutricionais variam conforme
a espécie, sexo, categoria linhagem ou raça e,
considerando estas características, diversos manuais
são elaborados baseados em exigências específicas.
Em muitas situações a formulação das dietas não
permitem a máxima expressão do potencial genético
dos animais de produção, desconsiderando o manejo
nutricional como favorecedor do desempenho. A
maioria das vezes, tal medida é realizada através
de ensaios que avaliam o desempenho dos animais
submetidos a uma dieta e também por estudos de
digestibilidade que determina, através das excretas do
animal, a porção do alimento ingerido que realmente
foi aproveitada pelo organismo. Estes ensaios, comuns
nos estudos de nutrição animal, necessitam de um
melhor aproveitamento de seus resultados, sendo
necessário o conhecimento do sistema orgânico que
está sendo favorecido por determinado nutriente.
Nesse sentido, estudos de nutrigenômica permitiriam
o entendimento do efeito de alimentos bioativos nas
diversas funções celulares.
Embora os estudos em nutrigenômica tenham
progredido consideravelmente, a complexidade da
interação entre nutrientes e genes promove questionamentos ainda não esclarecidos, impossibililitando a
aplicação dos benefícios relacionados a este novo
conceito nos sistemas de produção animal.
Conclusão
Considerando o que foi relatado nessa revisão,
entende-se que a variação genética individual pode
influenciar a maneira com que nutrientes são assimi9
Gonçalves FM et al.
lados, metabolizados, armazenados e excretados pelo
organismo.
Certamente o estudo da nutrigenômica permitirá
uma maior compreensão de fatores ambientais e
comportamentais que influenciam o fenótipo, possibilitando a formulação de dietas que favoreçam a
condição de cada sistema de produção animal em
especial, personalizando estas unidades de produção.
O sucesso em aplicação deste novo conceito em
nutrição possibilitará a maximização dos índices de
produtividade e, conseqüentemente, a rentabilidade da
atividade agropecuária.
Para tal, muitos estudos ainda precisam ser desenvolvidos a fim de identificar e validar o potencial
de alimentos ou componentes nutricionais que determinarão características ou condições desejáveis
no organismo animal ou mesmo minimizar as não
desejáveis.
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11
ARTIGO DE REVISÃO
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Abordagem clínica de feridas cutâneas em equinos
Clinical approach in equine skin wounds
Júlio C. Paganela*, Leandro M. Ribas, Carlos A. Santos, Lorena S. Feijó,
Carlos E.W. Nogueira, Cristina G. Fernandes
Universidade Federal de Pelotas – RS – Brasil
Resumo: Problemas cutâneos são comuns em eqüinos e
freqüentemente determinam complicações e dificuldades
diagnósticas. Devido à alta incidência de lesões cutâneas em
eqüinos registrados no HCV no período de 2000 a 2008, e ao
fato de que abordagem de feridas cutâneas em eqüinos está
ligada à rotina dos profissionais especializados nessa espécie,
acredita-se na importância do estudo desse assunto. Assim
sendo, o artigo tem por objetivo realizar uma revisão do tema
abordando os aspectos clínicos do processo cicatricial, complicações na cicatrização e as principais formas de tratamento
alopático e fitoterápico, com o objetivo de auxiliar o profissional desde o manejo inicial da ferida até o completo reparo
tecidual.
Palavras-chave: feridas cutâneas, cicatrização, eqüinos
Summary: Skin problems in the horse are a common occurrence and can often be complicated and difficult to diagnose.
Due to the high incidence of equine cutaneous injuries, registered in Veterinarian Clinical Hospital, during the period of
2000 to 2008, and considering that the approach of cutaneous
wounds in equines stand together with the routine of equine
practioneers, its necessary to clarify this issue. In this way, clinical aspects about healing process, proud flesh complications
and the major allopathic or phytotherapic therapy are rewiwed
with the aim to support practitioners conduct from the initial
manipulate of wound until the complete tissue repair.
Keywords: cutaneous wounds, proud flesh, equine
Introdução
ferimentos localizados nos membros locomotores.
O Hospital de Clínicas Veterinária (HVC) da
Universidade Federal de Pelotas/RS disponibiliza
atendimento clínico a eqüinos provenientes da região
Sul do Estado do Rio Grande do Sul. Os cavalos da
raça Crioula e os cavalos de tração (carroça) compõem
a maioria dos atendimentos na rotina hospitalar. A
partir de um estudo retrospectivo dos casos clínicos
registrados no HVC entre os anos 2000 e 2008, pôde-se registrar alta incidência (37%) de afecções
cutâneas entre os eqüinos atendidos. Destes, 63%
sofreram lesões que variaram entre lacerações,
perfurações, incisões e contusões. Os 37% restantes
foram acometidos por neoplasias, dermatites e proliferação de tecido de granulação exuberante. A grande
maioria destas lesões evoluíram para cicatrização,
sendo que as neoplasias e as cicatrizes exuberantes
foram as alterações com maiores complicações e
demora para resolução.
Para alguns autores, a cicatrização da pele é alvo de
estudos pelo interesse clínico, científico e econômico
(Hussini et al., 2004; Ribas et al., 2005). Em geral a
cicatrização de feridas apresenta prognóstico favorável, porém as feridas cutâneas freqüentemente
não evoluem do modo desejado. Neto (2003) cita o
exemplo de feridas localizadas nas extremidades
distais, as quais são, em geral, complicadas pela falta
de tecido de revestimento, má circulação, movimento
articular, maior predisposição para contaminação e
conseqüente infecção.
Este artigo de revisão tem por objetivo descrever
aspectos clínicos da cicatrização por segunda intenção
de feridas cutâneas na espécie eqüina, buscando
contribuir para a definição da abordagem adequada
deste tipo de lesão na rotina clínica eqüina.
Devido ao comportamento ativo e de reações rápidas, o cavalo está predisposto a traumatismos (ou
agressões traumáticas ou lesões), principalmente
quando sua função está associada a atividades esportivas ou de tração. Além dos fatores ligados a sua
natureza, as pastagens sujas e instalações inadequadas
podem ser consideradas fatores de risco a ocorrência
de feridas traumáticas. Segundo Neto (2003), os ferimentos de pele representam uma das mais freqüentes
ocorrências na clínica de eqüídeos, principalmente os
Tipos de feridas cutâneas em eqüinos
*Correspondência: [email protected]
A classificação das feridas é útil para a seleção do
tratamento apropriado, assim como para a previsão da
recuperação final. As classificações que se baseiam no
13
Paganela JC et al.
grau de contaminação microbiana incluem lesões
limpas, limpas-contaminadas, contaminadas e sujas
ou infectadas. Segundo Romatowski (1989) este sistema de classificação foi desenvolvido para humanos
e classifica o nível de contaminação potencial tanto
em feridas eletivas como traumáticas.
Muitas feridas abertas em cavalos estão contaminadas ou sujas no momento inicial do exame devido
à natureza do animal e seu ambiente. Feridas
contaminadas são lesões traumáticas com menos de
seis horas de evolução, na qual pêlo e outros fragmentos teciduais estão presentes (Daly, 1985). Feridas
sujas são caracterizadas pela presença de edema e
supuração. Entretanto, o tempo entre a ocorrência de
exposição, aderência e subseqüente multiplicação e
invasão bacteriana do tecido varia dependendo do tipo
e quantidade de organismos presentes. Muitas feridas
podem ser elevadas à categoria de limpas-contaminadas e fechadas após meticulosa limpeza e debridamento completo ou radical (Romatowski,1989).
Classicamente as feridas são divididas em abrasões,
contusões, hematomas, incisões, lacerações e perfurações. As lacerações são provavelmente as mais
comuns entre os eqüinos. São geralmente produzidas
por objetos angulares, tais como cercas de arame
farpado e por mordidas. Os bordos deste tipo de lesão
são geralmente irregulares e o dano se estende aos
tecidos subjacentes. Outro tipo comum de ferida são
as perfurações, produzidas por objetos cortantes que
se caracterizam por serem superficiais, pequenas e de
profundidade variável. São tipos especiais de ferida,
porque embora a perda tecidual seja mínima, a injúria
das estruturas mais profundas após penetração pode
resultar em debilidade (Neto, 2003). Para Ribas et al.
(2005) outro tipo comum de ferida na espécie eqüina
está relacionada ao ambiente e ou tipo de instalação
em que o animal está, tais como cercas, porta de
cocheira, mata-burro, onde o animal coloca o membro
em local estreito e a partir de movimento brusco,
ocorre a laçada causando dano interno sem lesão
externa aparente além da alopecia. Nestes casos
ocorre lesão de tecido subcutâneo com edema, exsudação e ruptura da pele.
Processo (mecanismos) de cicatrização
A cicatrização é um processo corpóreo natural de
regeneração concomitante dos tecidos epidérmico e
dérmico. Após uma lesão, um conjunto de eventos
bioquímicos complexos e orquestrados se estabelece
para reparar a o dano. Usualmente o processo cicatricial é dividido em cinco fases principais: coagulação,
inflamação, proliferação, contração da ferida e remodelação (Fazio et al., 2000; Mandelbaum e Santis,
2003).
A fase de coagulação marca o início do processo,
imediatamente após o surgimento da ferida. Nesta
14
RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18
fase, substâncias vasoativas, proteínas adesivas,
fatores de crescimento e proteases são liberadas e
ditam o desencadeamento de outras fases (Terkeltaub
e Ginsberg, 1998). A vasoconstrição descrita neste
momento ocorre a fim de minimizar a hemorragia.
Em seguida, o processo inflamatório inicia-se com a
vasodilatação, migração de células brancas e proteínas
plasmáticas, propiciando uma barreira de defesa na
ferida (Stashak, 1994). Nesta fase se consolida a
secreção de proteases como hialuronidase, colagenases
e hemolisinas são responsáveis por inibir a ação bacteriana durante a cicatrização, visto que as bactérias
agem prolongando a fase inflamatória (Hackett et al.,
1983)
A proliferação é dividida em três subfases:
reepitelização, fibroplasia e neovascularização. Na
reepitelização ocorre a migração de queratinócitos
não danificados das bordas dos anexos epiteliais
quando a ferida é de espessura parcial, e apenas das
margens epidérmicas em casos de feridas de espessura
total. Os diferentes fatores de crescimento são responsáveis pelos aumentos de mitoses e conseqüente
hiperplasia do epitélio (Mandelbaum e Santis, 2003).
A fibroplasia ocorre a partir de fibroblastos, os quais
são células mesenquimais diferenciadas que proliferam
na região mais superficial da ferida. Concomitantemente há o desenvolvimento de novos capilares por
brotamento endotelial (Stashak, 1994). A neovascularização verificada nesta fase fornece metabólitos e
oxigênio para nutrir tecido de reparação que prolifera
na área lesional. A nova rede vascular expande-se
para o centro da lesão proporcionando uma aparência
rosada e exuberante (Neto, 2003).
Neste momento, se estabelece o tecido de granulação
que consiste primariamente em vasos sangüíneos neoformados, fibroblastos e produtos de fibroblastos,
incluindo o colágeno fibrilar, elastina, fibronectina,
proteases, glicosaminoglicanas sulfatadas e não sulfatadas. O tecido de granulação é produzido três a quatro
dias após a indução da lesão como um passo intermediário entre o desenvolvimento da malha formada
por fibrina/fibronectina e a reestruturação de colágeno
Berry e Sullins (2003). À medida que o fluxo sangüíneo e a oxigenação são restabelecidos, o principal fator
desencadeador da angiogênese é reduzido e os vasos
neoformados começam a diminuir (Neto, 2003).
A partir deste evento, inicia-se a fase de contração
das paredes marginais da lesão. Esta ação é realizada
pelos fibroblastos ativados, os quais se diferenciam
em miofibroblastos. Os miofibroblastos contêm fibras
intracelulares de actina e miosina e formam conexões
especializadas, ou fibronexus, com a matriz extracelular e outras células dentro da cavidade da lesão.
Segundo Borjrab (1982) estas propriedades possibilitam aos miofibroblastos contrair ativamente e gerar a
tensão necessária para fechar o defeito. Os miofibroblastos aproximam as margens da ferida, forçando as
fibras de colágeno a se sobreporem e se entrelaçarem
Paganela JC et al.
e, desta maneira, dar o suporte para diminuir o tamanho da lesão.
A fase final do processo cicatricial consiste na
remodelação tecidual. Ao contrário das outras fases de
cicatrização, a remodelação dos componentes do
colágeno e matriz, como ácido hialurônico e proteoglicanas, persiste por longo tempo após o ferimento e
é o período no qual os elementos reparativos da cicatrização são transformados para tecido maduro de
características bem diferenciadas (Neto, 2003).
As várias fases da reparação não devem ser
consideradas como ações seqüenciais. Cada fase da
cicatrização deve contribuir com seu efeito no tempo
e intensidade certos (Fazio et al., 2000; Mandelbaum
e Santis, 2003). Os mecanismos moleculares que
regulam as diferentes fases da cicatrização ainda não
são totalmente compreendidos, porém aparentemente,
as citocinas são mediadores celulares críticos.
Citocinas são glicoproteínas sinalizadoras lançadas
pela maioria das células nucleadas no corpo, que
atuam através de receptores específicos na superfície
celular para causar estimulação autócrina, parácrina e
ou endócrina causando migração celular, proliferação
e síntese (Theoret, 2005).
Tipos de cicatrização
Cicatrização por primeira intenção
A cicatrização por primeira intenção ocorre quando
os bordos da ferida estão próximos e se unem novamente com rapidez. Ocorre em feridas não contaminadas (McGavin e Zachary, 2007).
O manejo de uma ferida como passível de cicatrização por primeira intenção é indicada após incisões
cirúrgicas, e consiste em aproximar os bordos da lesão
por meio de suturas, favorecendo a cicatrização devido a diminuição do tempo da fase inflamatória e de
remodelação do colágeno, obtendo uma melhor contração da ferida e posterior reepitelização (Auer e
Stick, 1999; Mandelbaum e Santis, 2003).
Cicatrização por segunda intenção
As feridas cujos bordos estão distantes, não
apresentam uma aposição dos mesmos ou ainda que
estejam contaminadas por agentes infecciosos ou
contenham corpos estranhos, geralmente cicatrizam
pelo processo de segunda intenção (McGavin e
Zachary, 2007).
A cicatrização por segunda intenção é complexa e
uma ferida é tratada como tal, quando a cicatrização
por primeira intenção não é justificável. Depende
inteiramente da neovascularização e remodelação da
matriz celular para restaurar a perda de tecido através
da contração da ferida para restabelecer a tensão normal do tecido e reduzir o tamanho da cicatriz (Auer e
Stick, 1999).
Fatores que contribuem para a utilização da cica-
RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18
trização por segunda intenção no manejo de feridas
são: o nível de contaminação, volume de tecido perdido e situações em que a cicatrização por primeira
intenção falhou (Neto, 2003).
Complicações na cicatrização cutânea em eqüinos
As complicações na cicatrização cutânea decorrem
de anormalidades em qualquer um dos componentes
básicos do processo de reparo e pode ser agrupadas
em: 1) formação excessiva de componentes do reparo;
2) formação de contraturas e 3) a deficiência de
formação de tecido cicatricial (McGavin e Zachary,
2007).
Em eqüinos são reconhecidas especialmente as dificuldades decorrentes da formação excessiva de tecido
de granulação em feridas cutâneas localizadas em
extremidades. Este aspecto constitui um desafio para
o médico veterinário que elege, para determinados
casos, a cicatrização por segunda intenção como
método de tratamento, seja pelas condições locais e
tempo decorrente da lesão ou pela falta de tecido para
recobrimento.
A cicatrização por segunda intenção na porção
distal dos membros em eqüinos pode ser lenta e
complicada. Estas feridas curam mais lentamente que
aquelas no tronco por exibirem taxas relativamente
baixas de epitelização e contração (Wilmink et al.,
1999). Berry e Sullins (2003) afirmam que o menor
suprimento sanguíneo, menor tensão de oxigênio,
temperatura mais baixa e a presença de quantidades
insuficientes de citocinas determinam os diferentes
padrões de cicatrização entre as diversas regiões
anatômicas do eqüino.
Wilmink et al. (1999) relatam que há diferenças na
cicatrização entre eqüinos e pôneis. Feridas similares
na região dorsal do metatarso cicatrizam lentamente
em eqüinos se comparados com pôneis, devido à
contração da ferida nos pôneis ser mais intensa ocorrer em maior. Análises histológicas das lesões
mostraram uma fase inflamatória prolongada nos
eqüinos embora com menos organização dos miofibroblastos comparado com os pôneis (Wilmink et al.,
1999). As taxas lentas de epitelização foram atribuídas
à inibição de células migratórias e inibição da atividade mitótica pelo tecido exuberante de cicatrização
(Bertone et al., 1985).
Embora não se possa definitivamente acelerar o
processo de cicatrização, é importante entender que
vários fatores afetam adversamente a taxa de cicatrização das feridas. Entre estes fatores está a má
nutrição, hipovolemia, hipotensão, hipóxia, hipotermia, infecção, trauma e o uso de medicamentos de
ação anti-inflamatória (Neto, 2003). Vale lembrar que
para Blackford et al. (1991) o efeito de uma única
dose de esteróides em cavalos pode não criar um
impacto nas diferentes fases de cicatrização, assim
como flunixina de megluminaqualitativamente não
15
Paganela JC et al.
parece influenciar a fase proliferativa ou as fases
subseqüentes da cicatrização de feridas (LefebvreLavoie et al., 2005).
Sabe-se ainda que a presença de um número maior
que 105 bactérias por grama de tecido lesional
significa que, se a ferida não tiver assistência, não
cicatrizará por primeira nem por segunda intenção
(Hackett et al., 1983).
Tratamento
Ainda que muitas alternativas diferentes de tratamento sejam reconhecidamente satisfatórias para o
manejo de determinada ferida, o método selecionado
deve fornecer um ambiente favorável, permitindo
progressão natural para não retardar processo de
reparação (Neto, 2003).
Em relação à conduta clínica, a cicatrização por
segunda intenção é recomendada em função do tempo
decorrido, do grau de contaminação e da perda de
tecido lesado (Hussni et al., 2004). O tratamento
baseia-se na higienização da lesão e conseqüentemente o curativo local com pomadas que favorecem a
cicatrização. Existe uma variedade de preparações
tópicas para a cicatrização de feridas em eqüinos,
porém, a escolha e composição do fármaco a ser usada
deve ser avaliada criteriosamente, já que muitos destes
produtos são ineficientes e caros, ou prejudiciais à
cicatrização, por serem irritativos ou estimularem a
proliferação de tecido de granulação exuberante
(White e Maltodextran, 1995). Além disso, é necessário avaliar a localização anatômica da lesão para
estabelecer o prognóstico e tratamento adequado.
Embora Wilmink et al. (1999) tenha mostrado que a
melhor taxa de contração é a razão pela qual as feridas
no corpo curam significativamente mais rápidas do
que as localizadas nos membros de eqüinos, nenhum
tratamento é ainda viável para superar os fenômenos
particulares na cicatrização, tal como a proliferação de
tecido de granulação exuberante. Hanson (2006) relata que para este caso é indicada a remoção cirúrgica
por ser um método simples e eficaz, comparada a
outros métodos como o uso de drogas cáusticas.
Pomadas a base de Ketanserina são efetivas na
prevenção da formação de tecido exuberante nos
membros dos eqüinos. Este princípio tem ação
antagônica na indução de serotonina, um mediador da
atividade de macrófagos.
O manejo inicial é direcionado para isolar a ferida
de contaminantes de origem exógena e endógena e
preparar a pele vizinha para a manipulação durante o
tratamento e cicatrização. Na área ao redor da ferida
deve-se realizar tricotomia e preparação antisséptica
para facilitar uma avaliação precisa da mesma e estruturas adjacentes (Auer e Stick, 1999).
O aspecto mais importante na preparação de feridas
traumáticas para cicatrização é o desbridamento cirúr16
RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18
gico, o qual consiste na remoção de tecido morto e
desvitalizado para reduzir os níveis de bactérias
patogénicas e oportunistas. A irrigação ou lavagem é
um meio comum para limpeza de feridas traumáticas.
Os benefícios gerais da lavagem da ferida incluem a
remoção de pequenas e grandes partículas endógenas,
bactérias e tecido desvitalizado (Auer e Stick, 1999).
O uso de bandagens ou gesso minimiza a formação
de tecido exuberante de granulação pelo seu efeito de
imobilização e por evitar contaminações. O enfaixamento da ferida ainda protege contra traumas e
dissecação, além de aplicar pressão superficial e
manter o medicamento tópico na área lesionada.
As combinações de anti-inflamatórios esteróides e
antibióticos tópicos diminuem marcantemente a
produção de líquidos, permitindo trocas menos
freqüentes de bandagens. Em estudo realizado com
um pequeno grupo de animais, as lesões tratadas com
esteróides tópicos cicatrizaram mais rápido do que
aquelas nas quais eles não foram utilizados (Barber,
1989). São necessários mais estudos, com um maior
número de animais para avaliar o seu benifício nestes
casos. Histologicamente, não se observou nenhuma
diferença entre feridas tratadas com combinação de
esteróides e antibióticos e aquelas tratadas de outra
maneira (Blackford et al., 1991).
Tratamento alopático
Para o tratamento de feridas recomenda-se a
aplicação de antimicrobianos na lesão, no qual destaca-se o uso do iodo-povidine (Moens et al., 1980).
Soluções de iopo-povidine estão disponíveis comercialmente em várias formulações (solução, creme,
spray). Diversos estudos in vitro realizados por Payne
et al. (1999) evidenciaram a eficácia do iodo-povidine
como um agente anti-séptico, já que seus componentes possuem ação de amplo espectro contra
bactérias, esporos, fungos, leveduras, vírus e protozoários. Este composto é disponível comercialmente
em várias formulações como solução, creme e spray,
sendo sua concentração ideal entre 0,1 e 0,2% (10-20
ml p/ 1000 ml) para a lavagem da ferida, pois soluções
mais concentradas podem ser citotóxicas para os neutrófilos (Stashak, 1994). Solução de iodo-povidine
com açúcar cristal, combinados até atingir uma
consistência pastosa, constitui um agente hipertônico
que age por osmose para retirar o exudato da ferida
(Berry e Sullins, 2003).
A água oxigenada tem sido amplamente usada como
anti-séptico e desinfetante e é amplamente utilizada
como anti-séptico na concentração de 3%, devido ao
seu largo espectro antibacteriano, principalmente para
bactérias Gram positivas e algumas Gram negativas
(Drosou et al., 2003).
Soluções tópicas a base de clorexidina são frequentemente utilizadas no tratamento de feridas. Tem
ação antibacteriana em Staphylococcus aureus,
Paganela JC et al.
Pseudomonas aeruginosa e bactérias não esporuladas
(Payne et al., 1999).
A eficácia do tratamento a base de clorexidina não
é bem caracterizada. Em revisão feita por Drosou et
al. (2003), vários trabalhos relatam a utilização de
clorexidina, porém o autor conclui que os resultados
são insuficientes para afirmar sobre a melhora na
cicatrização, principalmente em feridas abertas.
Embora a nitrofurazona tenha efeito antimicrobiano
contra microorganismos Gram-positivos e Gram-negativos, segundo Berry e Sullins (2003) não deve
ser utilizada, já que demonstrou retardo na contração
da ferida, epitelização e reparação no geral.
O mel de abelha tem muitas propriedades, incluindo
um amplo espectro com ação antimicrobiana, ação
antiinflamatória além de estimular novos fatores de
crescimento de tecido. O efeito estimulatório do mel
na cicatrização de feridas pode estar relacionado a
auto regulação de citocinas inflamatórias nos monócitos (Tonks et al., 2003).
Os enxertos biológicos derivados de tecidos como
pele ou placenta são relatados como promotores da
cicatrização por retardarem a formação do tecido
exuberante de cicatrização, visto que induzem uma
resposta inflamatória branda, promovem e mantém um
ambiente úmido que conduz a regeneração e migração
de células epiteliais e agem como uma barreira
anti-bacteriana que protege a ferida contra infecções
(Purna e Babu, 2000).
Tratamento fitoterápico
A literatura refere o uso de fitoterápicos em
diferentes enfermidades com diversas indicações
terapêuticas, sendo alguns deles de uso consagrado e
pertencentes à farmacopéia (Heggers e Kucukcelebi,
1995).
Muitos estudos são realizados na tentativa de se
detectar a eficácia do uso de plantas na cicatrização de
feridas. Segundo Solorzano et al. (2001) as fitoestimulinas do Triticum vulgare ativam fenômenos da
cicatrização ao estimular a mitose e motilidade dos
fibroblastos, além de aumentar a síntese de fibras
colágenas e glicosaminoglicanas pelos fibroblastos.
De acordo com Souza et al. (2006) o uso do creme à
base de Triticum vulgare aumentou o número de vasos
sangüíneos neoformados encontrados durante o período inicial da reparação das feridas tratadas em relação
aos controles, demonstrando que o tratamento influenciou de maneira positiva no processo de cicatrização.
A babosa (Aloe vera) é um excelente cicatrizante e
antinflamatório, devido aos seus constituintes,
principalmente os mucilaginosos, o que a torna uma
boa opção para o tratamento tópico de lesões de pele
(Rovatti e Brennan, 1959). Ribas et al. (2005)
comparou o extrato aquoso de Triticum vulgare
(Bandvet®) com o extrato aquoso de babosa. O
primeiro apresentou tempo de cicatrização menor,
RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18
sem processos irritativos ou presença de secreções.
Martins e Alves (2003) compararam o uso tópico de
fitoterápicos na cicatrização cutânea em eqüinos,
avaliando as observações macroscópicas, histopatológica e a retração centrípeta do halo da lesão nos
primeiros quinze dias. Esse estudo demonstrou que o
barbatimão (Stryphnodendron barbatimao Martius)
teve efeito benéfico na cicatrização, seguido pela
calêndula (Calendula officinalis). Os resultados do
grupo controle foram superiores ao confrey
(Symphitum officinalis).
Considerações finais
A elevada incidência de lesões cutâneas na espécie
eqüina, demonstrada na rotina do Hospital de Clínicas
Veterinária, mostra a demanda por técnicos capacitados, seja tratador ou cavalariço que realizem serviços
de enfermagem, tal como curativos. Pois o Médico
Veterinário intervindo de maneira correta, na rotina de
clínica de eqüinos mostra que protocolos baseados na
higiene diária, com limpeza das feridas, retirada do
tecido morto, proteção e hidratação são efetivos na
maioria dos casos, exceção nas neoplasia.
E que apesar de a cicatrização, principalmente nos
membros locomotores dos equinos ser mais lenta
devido a fatores como: maior facilidade de contato
com sujidades, pouco tecido e menor vascularização.
A orientação de pessoal treinado para seguir realizando curativos diários é essencial para o sucesso do
tratamento.
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ARTIGO DE REVISÃO
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Utilização de bloqueio anestésico para exodontia do dente carniceiro em
cão
Block anesthesic used to do exodontia of canassial tooth in dog
Víviam N. Pignone*
Associação Brasileira de Odontologia Veterinária (ABOV)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Resumo: A utilização de bloqueios anestésicos pelos médicos
veterinários está sendo mais empregada na rotina, associada à
anestesia geral, especialmente na odontologia veterinária. Os
bloqueios regionais de nervos são os mais empregados,
destacando-se aqueles realizados no nervo infra-orbitário,
maxilar, mentoniano e alveolar inferior. O quarto pré-molar
superior, também conhecido como "dente carniceiro", é o maior
dente dos carnívoros, responsável por rasgar os alimentos. Por
ser um dente muito utilizado, é mais predisposto a afecções,
como fratura dental com ou sem exposição pulpar, lesão
periapical e doença periodontal podendo o cão desenvolver uma
fístula infraorbitária. Embora existam tratamentos que zelam
pela preservação do elemento dental, como cirurgia periodontal
e tratamento endodôntico, muitas vezes os proprietários optam
pela exodontia deste dente, sendo o custo do procedimento um
dos fatores limitantes. O presente artigo tem como objetivo
apresentar as principais causas de exodontia do dente
carniceiro, mostrando como é feita a exodontia mediante dessensibilização da área através de bloqueio anestésico.
Summary: The utilization of anesthetic blocks by veterinarians
is becoming more widely employed in the routine, pertaining to
general anesthesia, especially in veterinary dentistry. The
regional nerve blocks are the most commonly used, especially
those performed on the nerves infraorbital, maxillary, mental
and inferior alveolar. The fourth upper premolar, also known as
"carnassial tooth," is the largest carnivorous tooth, used for tearing meat. Being a very used tooth, it is more prone to
affection, such as dental fracture with or without pulpal exposure, periapical lesion and periodontal disease, predisposing
the dog to develop an infraorbitary fistula. Although there
are treatments which strive for dental preservation, such as
periodontal surgery and endodontic treatment, most of the times
owners opt for exodontia, being the procedure cost the leading
factor. This article aims to show the main causes of carnassial
tooth exodontia, demonstrating the exodontia technique through
desensitization of the area through anesthetic block.
*Correspondência: [email protected]
Tel: +55 51 33773900; 92499962
Introdução
O controlo da dor, tanto na medicina humana como
na veterinária, tem se destacado nos últimos anos. A
utilização de bloqueios anestésicos tem sido cada vez
mais empregada na rotina, associada à anestesia geral,
sobretudo durante os procedimentos odontológicos
em animais (Lopes e Gioso, 2007).
A anestesia local apresenta alguns benefícios
destacando-se a diminuição da sensibilização central à
dor, a minimização da reação tissular inflamatória,
redução da quantidade de anestésico geral requerida
durante o procedimento cirúrgico, e diminuição da
dose e freqüência dos analgésicos empregados no pós-operatório (Hellyer e Gaynor, 1998; Holmstrom e
Frost-Fitch, 1998; Gross e Pope, 2002).
Os bloqueios regionais de nervos são mais comumente empregados nos procedimentos odontológicos
em animais, sendo que os mais utilizados são o
bloqueio infra-orbitário e bloqueio maxilar, na maxila,
e bloqueio mentoniano e bloqueio alveolar inferior, na
mandíbula (Lopes e Gioso, 2007; Holmstrom e FrostFitch, 1998).
Dentre os 42 dentes permanentes apresentados
pela espécie canina, o quarto pré-molar, também
denominado "dente carniceiro", é um dos principais
dentes, responsável por rasgar os alimentos (Wiggs e
Lobprise, 1997; Harvey e Emily, 1993; Gioso, 2007).
Por ser um dente muito utilizado pelo cão, torna-se
mais predisposto a afecções como fratura dental com
ou sem exposição pulpar, lesão periapical, e doença
periodontal, podendo evoluir para uma fístula infra-orbitária (Wiggs e Lobprise, 1997; Bolson e Pachaly,
2004; Roza, 2004; Gioso, 2007).
Entretanto, apesar da existência de tratamentos
que zelam pela preservação do elemento dental, como
cirurgia periodontal e tratamento endodôntico, a
realização da extração dental, denominado exodontia,
ainda é uma das intervenções cirúrgicas mais freqüentes na clínica de cães e gatos, sendo o custo um
dos fatores limitantes (Gioso, 2007).
19
Pignone VN
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Todavia, o quarto pré-molar superior, por se tratar
de um dente tri-radicular, necessita alguns cuidados
especiais, como conhecimento anatômico, além da
técnica de exodontia complexa (Gioso, 2007), sendo o
bloqueio anestésico do nervo maxilar o indicado para
a dessensibilização da área na realização do procedimento (Wiggs e Lobprise, 1997; Lopes e Gioso,
2007).
minimizando os riscos de toxicidade anestésica
(Cortopassi e Fantoni, 1999), além de prevenir ou
minimizar a hemorragia no trans-operatório (Gross e
Pope, 2002). Contudo, é importante ressaltar que a
toxicidade dos anestésicos locais está associada com a
administração intravascular acidental ou a administração de altas doses do agente anestésico (Klaumann
et al., 2007).
A escolha do agente anestésico varia de acordo com
o procedimento cirúrgico a ser realizado, período
hábil de analgesia e necessidade de controlo da dor
pós-operatória. A dose utilizada para dessensibilização dos nervos da mandíbula e da maxila varia de
acordo com o porte do animal, porém preconiza-se o
uso de volumes pequenos de anestésico, aplicados
lentamente, evitando lesar pequenos ramos nervosos
(Holmstrom e Frost-Fitch, 1998; Cediel e Sanches,
1999).
As dose dos anestésicos locais utilizados em cães
citados anteriormente estão representadas na Tabela 1,
exceto da articaína que não foi encontrada a dose
para a espécie canina, sendo que em humanos, foi
encontrada na literatura apenas a dose máxima deste
fármaco (7 mg/kg) (Lopes e Gioso, 2007).
Anestesia local
Os anestésicos locais consistem em substâncias
químicas responsáveis por impedir geração e condução de impulso nervoso de maneira reversível, por
ação direta na membrana da fibra nervosa (Muir e
Hubbell, 1995; Mclure e Rubin, 2005; Lopes e Gioso,
2007).
Na odontologia veterinária, os anestésicos locais
mais utilizados são a lidocaína e a bupivacaína, com
período de ação curto e longo, respectivamente (Lanz,
2003; Klaumann et al., 2007). Entretanto, outros
anestésicos locais como a mepivacaína, a prilocaína e
a articaína são amplamente utilizados na odontologia
humana e vêm sendo empregados na prática veterinária odontológica, sendo estes com duração de ação
moderada (Fantoni e Cortopassi, 2002; Malamed,
2005; Mclure e Rubin, 2005). Além desses, ainda se
encontra a ropivacaína, caracterizada por apresentar
período hábil e de latência semelhantes ao da bupivacaína, efeito vasoconstritor e menor toxicidade cardíaca
e no SNC (De Negrini e Ivani, 2005; Malamed, 2005;
Mclure e Rubin, 2005).
A adição de vasoconstritores aos anestésicos locais
possui a função de controlar as ações vasodilatadoras,
retardando a absorção deste pelo sistema vascular,
Bloqueio anestésico do nervo maxilar
A realização de qualquer bloqueio anestésico deve
ser precedida de anti-sepsia tópica, com intuito de
diminuir transitoriamente a microbiota bacteriana
local (Malamed, 2005), sendo o gluconato de clorexidina 0,12% o anti-séptico de eleição na prática odontológica veterinária (Evers e Haegerstam, 1991).
O bloqueio do nervo maxilar é um método bem
eficaz para promover dessensibilização de uma hemi-
Tabela 1 - Principais agentes anestésicos locais utilizados na odontologia veterinária na espécie canina
Agente anestésico
Lidocaína 2%
Lidocaína com
epinefrina
Bupivacaína 0,5%
Dose/volume recomendados
2 mg/kg
Dose máxima
5 mg/kg
Período de latência
5 a 10 minutos
Período de duração
1h a 1h e 30min
0,1 ml de 1:1.000
(0,1 mg epinefrina)
ND
ND
3h e 30min
1 mg/kg
2 mg/kg
20 a 30 minutos
4a6h
Lidocaína +
Bupivacaína
1 mg/kg +
0,25 mg/kg
ND
5 a 10 minutos
Efeito mais rápido,
porém menor duração
Morfina
0,1 mg/kg
ND
ND
Maior eficácia e
prolongamento da analgesia
Buprenorfina
0,01 mg/kg
ND
ND
Maior eficácia e
prolongamento da analgesia
Mepivacaína 3%
Não disponível
9 mg/kg
1,5 a 2 minutos
ND
Ropivacaína 0,5%
0,5 a 2 mg/kg
Não disponível
8 a 10 minutos
ND
Fontes: Lopes e Gioso (2007); Egger e Love (2009). ND = não disponível.
20
Pignone VN
Figura 1 - Técnica anestésica para o bloqueio do nervo maxilar em cão
na fossa pterigopalatino (seta preta). Notar a área dessensibilizada pelo
bloqueio em destaque. Fonte: Lopes e Gioso, 2007.
maxila, reduzindo o volume dos demais fármacos
administrados (Malamed, 2005; Lopes e Gioso, 2007).
Este bloqueio é efetuado a partir da administração
do anestésico local na região da fossa pterigopalatina,
localizada caudalmente ao último molar superior
(segundo molar), ao final do processo alveolar do osso
maxilar (Figura 1). O bloqueio do nervo maxilar
promove a dessensibilização dos ramos deste nervo –
nervo infra-orbitário, nervo alveolar maxilar caudal,
nervo pterigopalatino e nervo nasal caudal (Cediel e
Sanches, 1999).
O bloqueio também pode ser realizado através
da via percutânea. Neste caso a agulha deverá ser
introduzida através da pele formando um ângulo de
90 graus em direção medial, ventral a borda do arco
zigomático e aproximadamente 0,5 cm caudal ao
canto lateral, e então avança para a fossa pterigopalatina. Caso a agulha tocar o ramo da mandíbula,
esta deverá ser direcionada para fora no sentido
cranial (Egger e Love, 2009).
O diâmetro da agulha para realizar o bloqueio deve
ser de 25 a 29 G. A cabeça do paciente deve ser
elevada, fazer a aspiração da seringa antes de injetar
e aplicar uma pressão digital sobre o forame, seguido
da administração lenta do anestésico local com a
finalidade de facilitar este movimento caudamente ao
forame. Não é recomendável avançar com a agulha
dentro do forame, pois aumenta a chance de lacerar o
nervo (Egger e Love, 2009).
Afecções no "dente carniceiro"
O quarto pré-molar superior ou "dente carniceiro" é
o maior dente da arcada superior dos cães, responsável
por rasgar os alimentos. Por este motivo, fica evidente
sua predisposição a afecções, como a doença periodontal e os problemas endodônticos (Wiggs e
RPCV (2009) 104 (569-572) 19-24
Lobprise, 1997; Gioso, 2007).
A doença periodontal avançada, a lesão periapical e
lesões iatrogênicas são as causas mais freqüentes de
fístula deste dente (Bolson e Pachaly, 2004; Roza,
2004). Na doença periodontal, a fístula resulta quando
uma bolsa periodontal maxilar profunda progride para
o ápice do dente, lisando o osso entre o ápice do
alvéolo e a cavidade nasal ou o seio maxilar (Hedlund,
2007). Essa afecção geralmente é causada por trauma,
fratura ou periodontite. Um trauma contusivo sem
traumatismo evidente na superfície dental pode causar
necrose pulpar com abcesso periapical secundário
(Birchard e Sherding, 2003).
Os sinais clínicos apresentados pelo paciente com
alteração pulpar evidente consistem em dor à percussão, fístula, fractura coronal ou radicular, escurecimento dental, sialorreia, além de dificuldade de
alimentação e fricção do focinho no chão ou com a
pata (Wiggs e Lobprise, 1997).
O diagnóstico é baseado na anamnese, nos sinais
clínicos e no exame físico. Entretanto, o diagnóstico
definitivo é feito através da radiografia intra-oral
realizada com o paciente sob anestesia geral utilizando a técnica da bissetriz (Gioso, 2007).
O tratamento frente a uma doença periodontal
avançada, lesão periapical extensa, presença de fístula
infra-orbitária consiste na exodontia deste dente
(Gioso, 2007).
Exodontia
A exodontia ou extração dentária é uma das intervenções cirúrgicas mais freqüentemente realizada em
pequenos animais, sendo que o paciente deve estar sob
anestesia geral, com ou sem bloqueio regional ou
anestesia local (Gioso, 2007; Lopes e Gioso, 2007).
Para executar tal procedimento é fundamental o
conhecimento anatómico, bem como os princípios
básicos que devem ser tomados quando se realizar a
exodontia, seja por via alveolar (dente luxado dentro
do próprio alvéolo) ou extra-alveolar, quando o
acesso se dá pela remoção do osso da face vestibular
(Wiggs e Lobprise, 1997; Gioso, 2007):
- Lesar o mínimo possível as estruturas vizinhas;
- Separar a gengiva do dente antes de luxá-lo
(sindesmotomia) (Figura 2A);
- Realizar odontosecção em dentes multiradiculares
(Figura 2B);
- Luxar o ligamento periodontal com alavancas;
- Promover a avulsão total do dente com o fórceps,
sem fraturar a raiz (Figura 2C).
O quarto pré-molar do cão é o maior dente da
arcada superior, e apresenta 3 raízes, a mesiovesti21
Pignone VN
bular, a mesiopalatina e a distal, considerada uma
exodontia complexa. Portanto, a separação das raízes,
denominada odontosecção, facilita a exodontia devido
à divergência destas (Harvey e Emily, 1993; Wiggs e
Lobprise, 1997; San Roman et al., 1999; Roza, 2004;
Gioso, 2007). A odontosecção é realizada com uma
broca diamantada FG (friction grip) acoplada a
caneta de alta rotação, devendo-se ter o cuidado de
não lesar os tecidos moles (Gioso, 2007).
Técnicas inapropriadas de extração do quarto
pré-molar superior podem resultar em complicações
oftálmicas graves causadas pela penetração do elevador na órbita ou no globo ocular, provocando celulite
orbitária, abscesso orbitário ou endoftalmite (Birchard
e Sherding, 2003).
Após realizada a exodontia, recomenda-se a síntese
dos tecidos moles com fios absorvíveis, dentre eles a
poliglactina 910 é a mais utilizada (Conn et al., 1974;
Horton et al., 1974) (Figura 2D).
As complicações da exodontia que podem existir
consistem na fratura de raiz, hemorragia intensa,
infecção, alveolite seca, deiscência dos pontos, fístula
e corrimento nasal (Gioso, 2007).
RPCV (2009) 104 (569-572) 19-24
Discussão
O emprego dos anestésicos locais para a realização
de bloqueios de nervos regionais tem-se destacado na
odontologia veterinária, sendo a lidocaína e a bupivacaína os mais utilizados, embora já existam outros
fármacos que possuem efeito mais prolongado e
menor toxicidade, como a ropivacaína, que são
utilizados geralmente em humanos (Fantoni e
Cortopassi, 2002; Gross e Pope, 2002; Lanz, 2003; De
Negrini e Ivani, 2005; Malamed, 2005; Mclure e
Rubin, 2005; Klaumann et al., 2007; Lopes e Gioso,
2007).
O "dente carniceiro" possui importante papel na
alimentação dos carnívoros, porém na presença da
doença periodontal não tratada, pode evoluir para uma
lesão perio-endodôntica, causando lesão periapical e
desencadeando a fístula infra-orbitária. Esta lesão
promove muita dor e sinais clínicos muitas vezes
imperceptíveis pelo proprietário e pelo clínico geral,
sendo tratada por longos períodos somente com a
administração de antibióticos, não removendo o
agente desencadeante (Wiggs e Lobprise, 1997;
Figura 2 - Passos da exodontia do dente carniceiro.
(A) Sindesmotomia; (B) Realizando odontosecção; (C) Avulsão dentária; (D) Síntese com fio poliglactina 910 (Víviam Nunes Pignone).
22
Pignone VN
Birchard e Sherding, 2003; Roza, 2004; Gioso, 2007).
Mesmo existindo tratamento endodôntico e cirurgias
periodontais que se preocupam com a manutenção do
quarto pré-molar superior, estas necessitam de um
acompanhamento clínico e radiográfico em um período
de tempo predeterminado pelo cirurgião, precisando o
paciente passar por uma nova anestesia o que eleva
ainda mais o custo do tratamento. Por esse motivo, a
exodontia é um dos tratamentos mais realizados, com
maior chance de sucesso e resolução imediata e menor
custo (Harvey e Emily, 1993; Wiggs e Lobprise, 1997;
Gioso, 2007).
As regras básicas para executar a exodontia de
dentes devem ser seguidas passo-a-passo, considerando a odontosecção uma etapa fundamental, principalmente do quarto pré-molar superior que é tri-radicular,
a menos que haja uma reabsorção óssea com intensa
mobilidade dental (Gioso, 2007).
Conclusão
A utilização do bloqueio anestésico para a exodontia
dos dentes é uma técnica fácil de ser realizada e muito
útil na rotina odontológica veterinária, contudo, é de
suma importância o conhecimento anatómico da cavidade oral, principalmente sua inervação, para evitar
complicações.
A doença periodontal e as afecções endodônticas
são as patologias que mais atingem o quarto pré-molar
superior, causando destruição do periodonto e abcessos periapicais, que podem resultar em fístula
infra-orbitária. Nestes casos, a radiografia intra-oral
torna-se necessária para obter o diagnóstico definitivo. Um dos tratamentos mais realizados consiste na
exodontia do elemento dental.
A realização da odontoseccção em dentes tri-radiculares, como o "dente carniceiro", deve ser relevante,
principalmente se tratando de raízes divergentes,
facilitando a extração dentária, impedindo danos aos
tecidos adjacentes, sendo indicado a realização de
sutura gengival com fio absorvível.
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R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Transferência embrionária em bovinos leiteiros na Ilha Graciosa (Açores):
programa experimental de transferência de embriões sexados e congelados
da raça Holstein Frísia
Embryo transfer in dairy cattle at Graciosa Island (Azores): an experimental
trial of sexed and frozen-thawed transfer of Holstein Friesian embryos
João Chagas e Silva*
Secção de Reprodução e Obstetrícia/CIISA, Faculdade de Medicina Veterinária,
Avenida da Universidade Técnica, Polo Universitário da Ajuda, 1300-477 Lisboa, Portugal
Resumo: A transferência de embriões obtidos in vivo
representa a 2ª geração das tecnologias reprodutivas e é
aplicada comercialmente, no caso dos bovinos, há mais de 30
anos. Actualmente, são transferidos em todo mundo, mais de
meio milhão desse tipo de embriões, o que representa um
significativo negócio internacional. A Secretaria Regional da
Agricultura e Florestas do Governo da Região Autónoma dos
Açores, através da sua Direcção Regional do Desenvolvimento
Agrário, tendo em conta o elevado estatuto sanitário e o apreciável efectivo bovino leiteiro da Ilha Graciosa, considerou-a
como cenário privilegiado para a execução de um programa
experimental de transferência de embriões sexados e congelados. Foram transferidos, ao longo de um período de 16 meses,
um total de 76 embriões congelados, 65 sexados e 11 não
sexados. Os resultados agora registados, face aos obtidos por
outros autores, podem ser considerados bastante bons: 63,1%
(41/65) de taxa de gestação aos 45-60 dias para os embriões
sexados e 63,6% (7/11) para os não sexados. Este facto revela
que, nas condições de maneio produtivo a que as novilhas da
Ilha Graciosa estão sujeitas, é possível a transferência com
sucesso de embriões sexados e congelados.
Summary: Embryo transfer collected in vivo is the second
generation of reproductive biotechnologies and has been used
on cattle farms for more than thirty years. More than 500.000
embryos of these kinds are transferred worldwide annually,
which represents a great international trade. The Regional
Secretary of Agriculture and Forestry from Government of
Azores, by the way of its Regional Direction of Agricultural
Development, considering the high sanitary level and the
number of dairy cattle females, chose Graciosa Island as the
right location for the implementation of an experimental
program of transfer of sexed and frozen Holstein Friesian
imported embryos. 76 frozen-thawed embryos have been
transferred, during a 16 months’ time period, 65 sexed and 11
non sexed. The results obtained in this experimental work may
be considered good, compared to the field trials from others
workers: 63,1% (41/65) of 45-60 days pregnancy rate with
sexed embryos and, 63,6% (7/11) with non sexed embryos.
*Correspondência: [email protected]
Telef. +351213602053; Fax +351213652827
These results show that it was possible, with success, to transfer
sexed frozen-thawed Holstein Friesian imported embryos to
virgin heifers recipients raised on local management conditions
of Graciosa Island.
Introdução
Há mais de três décadas que a transferência de
embriões (TE) obtidos in vivo é aplicada comercialmente nos bovinos (Thibier, 2005). Relativamente à
inseminação artificial (IA), apesar dos custos de aplicação serem superiores e a eficiência inferior, o futuro
da TE encontra-se garantido, pois está intimamente
associado a programas de melhoramento genético,
sendo de registar que a grande maioria dos touros IA
de todo o mundo, são obtidos através dela. É igualmente ferramenta privilegiada para a conservação ex
situ de genes de espécies/raças ameaçadas de extinção
e ainda, com o desenvolvimento de protocolos
eficientes de congelação-descongelação, tem vindo a
demonstrar ser a forma mais segura, em termos
sanitários, de intercâmbio de genes entre regiões e
continentes (Hasler, 2003; Thibier, 2005). Em 2002,
foram transferidos em todo o mundo, 538 312
embriões bovinos colhidos in vivo (Thibier, 2002),
valor (ainda que sub-estimado, pois inúmeras equipas
de TE não fornecem dados) que revela, desde 1975,
uma tendência para estabilização (Thibier, 2005) e
representa um expressivo negócio de cariz internacional (Hasler, 2003).
Em Portugal, a bovinicultura leiteira valoriza muito
mais as vitelas (para substituição ou para venda) que
os machos (quase sem valor comercial, com excepção
dos raros que são recrutados por Centros de IA). Os
vitelos obtidos por TE representam pois, globalmente,
um sério prejuízo económico para a exploração
leiteira (Lopes da Costa et al., 2002).
25
Silva JC
A utilização de embriões sexados permite aumentar
a eficiência económica dos programas de TE (Willett
e Hillers, 1994) e a taxa de ganho genético, quer ao
nível de uma exploração, quer de um núcleo de
selecção (Colleau, 1991). A determinação do sexo de
embriões pré-implantação de bovinos com recurso à
técnica da reacção em cadeia da polimerase (PCR) e
protocolo electroforético (Shea, 1999) ou não-electroforético (Bredbacka, 1998) é um serviço oferecido por
algumas unidades comerciais de TE, revelando elevadas taxas de eficiência e de precisão (Hasler, 2003).
Porém, a necessidade da obtenção de uma biópsia
embrionária (6-8 blastómeros) exige um técnico
experimentado (Hasler, 2003), eleva o risco de contaminação do embrião por agentes patogénicos
(Wrathall e Sutmöller, 1998) e diminui a sua viabilidade após a congelação (Shea, 1999).
A Ilha Graciosa, uma das nove ilhas do arquipélago
dos Açores, situada no extremo noroeste do Grupo
Central (Longitude 28º 05’ W e Latitude 39º 05’ N),
possui um elevado estatuto sanitário, sendo considerada Ilha oficialmente indemne de brucelose (Decisão
da Comissão nº 2002/588/CE, de 11 de Junho),
de tuberculose e leucose, facto que poderá estar
associado, até ao momento, à ausência de uma expressiva importação de animais vivos do exterior. A
importância de manter esse estatuto sanitário aliada à
necessidade de promover o melhoramento genético,
de uma forma rápida e sustentada, levou a Secretaria
Regional da Agricultura e Florestas, do Governo da
Região Autónoma dos Açores, através da sua Direcção
Regional do Desenvolvimento Agrário, a assinar um
protocolo de cooperação com a Faculdade de
Medicina Veterinária de Lisboa. Foi então, delineado e
executado, por um período inicial de 18 meses, um
Programa Experimental de Transferência Embrionária
em Bovinos Leiteiros, naquela Ilha, com a finalidade
de aferir resultados do uso da técnica para a obtenção
de fêmeas de elite, a partir da aquisição de embriões
congelados da raça Frísia Holstein (na sua grande
maioria sexados), adaptadas às condições ambientais
locais, que poderão vir a contribuir decisivamente,
para o melhoramento genético dos efectivos leiteiros
da região.
Material e métodos
Os trabalhos decorreram entre Janeiro de 2008
e Maio de 2009, distribuídos por 4 períodos de transferências embrionárias: Fevereiro de 2008, Abril de
2008, Janeiro de 2009 e Abril de 2009.
Embriões
Foram adquiridos 65 embriões sexados e congelados
para transferência directa: 43 de origem canadiana,
26
RPCV (2009) 104 (569-572) 25-30
provenientes de 13 diferentes emparelhamentos e
processados por 4 equipas de TE distintas; e 22 de
origem francesa, de 6 emparelhamentos, processados
por uma única equipa. Todos os embriões tinham 7
dias (dia 0 = dia do cio superovulatório - SOV).
Adicionalmente, foram adquiridos 11 embriões não
sexados e congelados para transferência directa, de 4
emparelhamentos diferentes, processados por única
equipa e pertencentes ao Núcleo OMTE (Ovulação
Múltipla e Transferência Embrionária) Juvenil da
extinta Divisão de Selecção e Reprodução Animal
(Venda Nova-Amadora). Todos os embriões tinham
7,5 dias (dia 0 = dia do cio SOV).
Animais
Maneio geral das novilhas na Ilha
Na Ilha Graciosa, as fêmeas são enviadas para a
pastagem ("os cerrados") a partir dos três meses de
idade e aí permanecem até parirem. Durante todo ano,
as novilhas alimentam-se dos pastos, sem qualquer
suplementação, com excepção dos meses de Julho e
Agosto. Nesse período, com os pastos secos, é-lhes
fornecida silagem de milho ou de erva e feno de
azevém. Não é administrado concentrado.
Em função da qualidade da pastagem, são visitadas
de 4 em 4 ou de 8 em 8 dias, para mudança das cercas
ou de pastagem. De uma forma geral, as novilhas são
beneficiadas por cobrição.
As fêmeas seleccionadas para o programa eram
todas novilhas, na sua grande maioria da raça Frísia,
com idades compreendidas entre os 14 e os 24 meses
e pelo menos 350 kg de peso vivo.
Profilaxia médica e sanitária
As novilhas disponibilizadas (n = 263), pertencentes
a 20 produtores, foram desparasitadas com fenbendazole (7,5 mg/kg de peso vivo, administrados por via
oral, em dose única, Panacur® Suspensão 10%,
Intervet Portugal-Saúde Animal, Lda.), vacinadas
contra o IBR/IPV com a vacina viva e marcada
Bovilis® IBR (2 mL de vacina reconstituída, administrados por via IM, Intervet Portugal-Saúde Animal,
Lda.) e sujeitas a uma colheita de sangue para
pesquisa do antigénio BVD para a identificação e
eliminação de animais persistentemente infectados.
Estas intervenções ocorreram sempre, a mais de 3
semanas da data das transferências.
Selecção das novilhas
As fêmeas foram seleccionadas para o programa de
sincronização de cios em função da sua condição
corporal (≥ 2,25 e < 4) e ciclicidade (só foram
aprovadas, as fêmeas cíclicas) (n = 136).
As novilhas foram sujeitas a um exame do estado
geral e a um exame ginecológico, tendo sido elimi-
Silva JC
RPCV (2009) 104 (569-572) 25-30
nadas todas as novilhas que não pudessem ser
admitidas no programa de sincronização ou que de
alguma forma inviabilizassem uma transferência
embrionária (n = 127).
Protocolo de sincronização e de detecção
de cios
O protocolo de sincronização de cios escolhido foi
o da dupla aplicação de dose luteolítica de um análogo
de síntese da PGF2alfa (2 mL administrados por via
IM, com onze dias de intervalo, Veteglan, Calier
Portugal, S.A.).
A detecção dos cios teve início 24 horas após a
segunda administração do análogo de síntese da
PGF2alfa e prolongou-se por 3 dias (com, pelo menos,
três períodos de observação diários, de cerca de 30
minutos cada), tendo sido os respectivos proprietários
os responsáveis pelo registo da data e hora dos
eventos comportamentais e físicos da fêmea em cio.
Só foram aceites para TE as novilhas com uma
assincronia de +12 horas a –12 horas (n = 99), relativamente à idade do embrião a transferir.
Transferência directa dos embriões
As transferências foram executadas sempre pelo
mesmo técnico e tiveram lugar em 4 locais distintos: 2
explorações particulares, com "cornadis" como dispositivo de imobilização das fêmeas (pelo pescoço e
diante da mangedoura) e 2 estações de pesagem de
animais, dispondo cada uma delas do seu tronco
balança.
Todas as novilhas com cio detectado e registo de
reflexo de imobilização (RI) foram sujeitas a um
exame ginecológico prévio para a identificação,
localização e avaliação de um corpo lúteo (CL) com
desenvolvimento adequado, relativamente ao dia da
TE (dia 7 do ciclo éstrico).
As fêmeas seleccionadas (n = 76) foram imobilizadas, com os membros anteriores elevados 35 cm,
relativamente ao pavimento e foram sujeitas a uma
anestesia epidural baixa com cloridrato de lidocaína
(5 mL por animal, Anestesin®, Laboratório Sorológico,
Portugal).
Os embriões foram descongelados de acordo com o
protocolo aconselhado pela equipa de TE responsável
pelo seu processamento e transferidos por via
não-cirúrgica com auxílio da cânula de transferência
miniaturizada Cassou (IMV Technologies, L’ Aigle,
France), um por receptora, para o corno uterino
ipsilateral ao ovário com o CL, profundamente e sem
provocar traumatismo (Figura 1). Entre a descongelação do embrião e o final da transferência foram
dispendidos entre 5 a 12 minutos (7,63 ± 0,15 minutos).
Figura 1 - Transferência não-cirúrgica com recurso à cânula de transferência miniaturizada Cassou.
Diagnóstico de gestação
O diagnóstico de gestação realizou-se por palpação
transrectal aos 45-60 dias (dia 0 = dia do cio da receptora) e foi efectuado sempre pelo mesmo técnico.
Foi aconselhado aos proprietários de receptoras
sujeitas à TE que mantivessem o sistema de detecção
de cios para registo de eventuais situações de retorno
ao cio, aos 12 dias após a transferência e por um
período de 5 dias. A detecção inequívoca de um cio
deveria ser aproveitada para a beneficiação da fêmea.
Análise estatística
Na análise dos dados foi usado um programa
informático de estatística (SPSS® Statistics, versão
17.0). Para além dos métodos descritivos (Média ±
E.P.) foi utilizado o Teste de Mann-Whitney U na
comparação de idades e de condição corporal entre
receptoras aprovadas e rejeitadas para o programa de
sincronização de cios e entre as aprovadas e rejeitadas
para TE, em virtude da distribuição não paramétrica
dos dados. O Teste de Qui-Quadrado de Pearson foi
usado na comparação das taxas de gestação em função
da origem do embrião sexado (Correcção de Yates) e
em função da época da TE. O nível de significância
foi determinado para um grau de confiança de 5%
(p < 0,05).
Resultados
Das 263 novilhas pertencentes a 20 produtores, com
idade e condição corporal médias de 18,01 ± 0,31
meses e 2,60 ± 0,02, respectivamente, apresentadas
para o programa de desparasitação e vacinação,
apenas 136 (idade e condição corporal médias, respectivamente de 17,53 ± 0,37 meses e de 2,63 ± 0,03),
27
Silva JC
RPCV (2009) 104 (569-572) 25-30
pertencentes a 19 produtores, foram seleccionadas
para a fase seguinte. As causas para a rejeição de 127
fêmeas (idade e condição corporal médias, respectivamente de 18,52 ± 0,50 meses e de 2,55 ± 0,04) foram
as seguintes: gestação (39); anestro (31); deficiente
condição corporal (27); free-martinismo (7); quistos
ováricos (6); infecção por descorna (3); idade excessiva (3); infantilismo genital (3); útero unicórnio (2);
aplasia segmental (2); fotossensibilização (1);
agenésia ovárica (1); fêmea repetidora (1); e luxação
da bacia (1).
As receptoras aprovadas para o programa de
sincronização revelaram, relativamente às não
aprovadas, diferenças não significativas quanto à
idade (17,53 ± 0,37 versus 18,52 ± 0,50 meses, p >
0,05), mas significativas quanto à condição corporal
(2,63 ± 0,03 versus 2,55 ± 0,04, p < 0,01).
Noventa e nove das novilhas tratadas com PGF2alfa
(72,8%) foram detectadas pelos seus proprietários (n =
17) como tendo revelado RI e a sincronia desejada.
Previamente à TE, todas elas foram sujeitas a um
exame ginecológico para ser avaliada a sua adequação
à condição de receptora, tendo sido eliminadas 23
fêmeas (23,2%) pelas seguintes razões: anovulação
(n = 7); cobrições não desejadas (n = 6); quistos
ováricos (n = 5); anestro (n = 2); CL de desenvolvimento inadequado (n = 2; e deficiente condição
corporal (n = 1).
Não foram registadas diferenças significativas entre
a idade e a condição corporal das receptoras aprovadas
para TE e as rejeitadas (17,46 ± 0,52 meses e 2,67 ±
0,04 versus 16,93 ± 0,66 meses e 2,57 ± 0,06, p >
0,05).
Por conseguinte, foram realizadas 76 TE, para as
quais se utilizaram 65 embriões sexados, 43 canadianos e 22 franceses e, os 11 não sexados, de origem
portuguesa. Os dados relativos à eficiência do
processo e as taxas de gestação aos 45-60 dias para
cada um dos tipos de embrião e para as diferentes
épocas de transferência são apresentados nos Quadros
1 a 3.
Apesar de numericamente superior, a taxa de
gestação obtida com embriões sexados de origem
canadiana (67,4%) não foi significativamente
diferente da obtida com os de origem francesa
(54,5%) (p = 0,46). Não foram igualmente encontradas, diferenças significativas entre as taxas de
gestação em função da época de TE (71,4% x 64,0% x
56,3% x 57,1%, p = 0,76), a despeito de as duas
primeiras fases de TE terem revelado valores numericamente superiores.
Discussão e conclusões
A rejeição de 48,3% (127/263) das novilhas para o
programa de sincronização de cios resultou, essencialmente, do elevado número de fêmeas gestantes, em
anestro e com deficiente condição corporal. Este
cenário sugere um medíocre controlo reprodutivo dos
Quadro 1 - Taxa de gestação em função do tipo de embrião
Tipo do Embrião
Sexado
Não Sexado
Totais
*
Nº de Transferências
65
11
76
Nº de Gestações
41
7
48
Taxa de Gestação (%)
41/65 (63,1)*
7/11 (63,6)*
48/76 (63,2)
Nº de Gestações
29
12
7
Taxa de Gestação (%)
29/43 (67,4)*
12/22 (54,5)*
7/11 (63,6)
Nº de Gestações
13
2
15
11
5
16
9
Taxa de Gestação (%)
13/17 (76,5)
2/4 (50,0)
15/21 (71,4)*
11/18 (61,1)
5/7 (71,4)
16/25 (64,0)*
9/16 (56,3)*
8
8/14 (57,1)*
não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos (p > 0,05)
Quadro 2 - Taxa de gestação em função do tipo e origem do embrião
Tipo de Embrião
Sexado
Não Sexado
*
Origem do Embrião
Canadiana
Francesa
Portuguesa
Nº de Transferências
43
22
11
não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos (p > 0,05)
Quadro 3 - Taxa de gestação em função da época das transferências
Época das TE
1ª Fase
Fev. 2008
2ª Fase
Abr. 2008
Tipo de Embrião
Sexado
Não Sexado
Totais
Sexado
Não Sexado
Totais
Sexado
Nº de Transferências
17
4
21
18
7
25
16
3ª Fase
Jan. 2009
4ª Fase
Sexado
14
Abr. 2009
* não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos (p > 0,05)
28
Silva JC
efectivos no que às cobrições indesejadas diz respeito
e, igualmente, um aproveitamento por parte dos
proprietários do programa gratuito de desparasitação e
vacinação, com a apresentação de animais sem as
condições ideais (por ex. idade e peso). O facto de a
idade média das fêmeas reprovadas ter sido numericamente superior (ainda que a diferença não tenha sido
significativa), em conjunto com uma condição
corporal média inferior e significativamente diferente,
relativamente às novilhas aprovadas, parece ter dado
maior evidência à eficiência do processo selectivo,
quanto à eliminação das fêmeas menos capazes.
Por seu turno, a taxa de detecção de cios (72,8%) foi
indicadora de boa eficácia dos produtores no registo
dos dados comportamentais e físicos das fêmeas que
exibiram estro, tendo em conta as condições de
maneio a que as novilhas estão sujeitas na Ilha. Porém,
onze das eliminadas para TE (47,8%: anovulação – 7;
anestro – 2; e CL de desenvolvimento inadequado – 2)
poderão tê-lo sido em virtude de uma incorrecta interpretação dos sinais de cio. No entanto, na globalidade,
os produtores demonstraram que foram capazes de
alterar a rotina habitual das suas explorações de forma
a respeitarem as exigências de um correcto protocolo
de detecção visual de cios.
São vários os trabalhos que referem resultados de
campo com embriões sexados e congelados: Chagas e
Silva e Cidadão (1997) obtiveram uma eficiência de
54,5%, após a transferência de 22 embriões da raça
Frísia Holstein, importados do Canadá; Shea (1999)
registou uma taxa de gestação de 37% (91/244) entre
1992 e 1997 e atribuíu a baixa eficiência à falta de
experiência técnica, uma vez que, em 1998, ainda que
com apenas 29 transferências, já tinham melhorado os
resultados para 66%; Lacaze et al. (2007), após a
transferência de 205 embriões, ao abrigo de um
programa comercial, conseguiram uma taxa de
gestação de 51,7%.
Tendo em consideração os dados atrás referidos, o
presente trabalho, com os registos de uma taxa de
gestação global de 63,2% (48/76) e das parcelares de
63,1% (41/65) para os embriões sexados e de 63,6%
(7/11) para os embriões não sexados, revelou elevada
eficiência.
Os resultados agora obtidos indicam que, nas
condições de maneio produtivo a que as novilhas da
Ilha Graciosa estão sujeitas, é possível a transferência,
com sucesso, de embriões sexados e congelados.
Porém, apenas foi ultrapassada a primeira fase do
Programa. Resta esperar que os proprietários, com a
colaboração/supervisão dos Serviços, saibam recriar
eficientemente, as fêmeas de elite que já estão a
nascer, de forma que as mesmas possam expressar
cabalmente o seu potencial genético, quer em termos
de produção de embriões de 2ª geração, perpetuando o
ciclo com menores custos, quer em termos produtivos.
RPCV (2009) 104 (569-572) 25-30
Agradecimentos
O autor agradece ao Director Regional do
Desenvolvimento Agrário, Eng. Joaquim Pires, o convite para elaborar um protocolo de colaboração entre
a Direcção Regional do Desenvolvimento Agrário e a
Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa, para o
que garantiu todas as condições necessárias à
obtenção dos resultados agora registados.
Agradece igualmente ao Presidente do Conselho
Directivo da Faculdade de Medicina Veterinária,
Prof. Doutor Luís Tavares, a autorização para a
participação/execução da componente técnica do
protocolo e pelo apoio a cada momento.
À Eng. Ana Luísa Pavão (DRDA) e ao Eng. Hélder
Bettencourt (SDAG) pela colaboração na elaboração
do protocolo, na selecção e acompanhamento dos
produtores nas várias fases do trabalho de campo e,
sobretudo, pelo espírito de equipa que se estabeleceu.
A todos os técnicos do SDAG que, de alguma
forma, participaram no Programa, pois também a eles
se devem os resultados agora obtidos.
A todos os produtores que cederam as suas novilhas
para receptoras e que, interiorizando as exigências da
tecnologia, contribuiram activamente para o sucesso
desta fase do Programa
Por fim, à Prof. Doutora Isabel Neto pela ajuda no
tratamento estatístico dos dados.
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R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Exatidão da ultra-sonografia para diagnóstico de gestação aos 28 dias após
inseminação e sua contribuição na eficiência reprodutiva em fêmeas Nelore
e cruzadas
Accuracy of the ultrasonography for pregnancy diagnosis at 28 days after
insemination and its contribution in the reproductive efficiency on Nelore
and crossbred females
Adriana Gradela1*, Thiago Danieli2, Tiago Carneiro3, Denílson Valin Torres3,
Cássio Roberto Gradela4, Vanessa Sobue Franzo5
1
Universidade Federal do Vale do São Francisco, Campus de Ciências Agrárias, Petrolina-PE, Brasil.
2
Curso de Medicina Veterinária, Unicastelo, Descalvado, SP, Brasil.
3
DG Torres, São João da Boa Vista, SP, Brasil.
4
Médico Veterinário Autônomo. Naviraí, MS, Brasil.
5
Universidade Federal do Tocantins, Campus de Araguaína, Araguaína-TO, Brasil.
Resumo: Este estudo avaliou a acurácia do diagnóstico de
gestação em fêmeas cruzadas (G1) e Nelore (G2) aos 28 dias
após inseminação e seu efeito sobre perdas embrionárias e a
eficiência reprodutiva. A acurácia do método foi obtida calculando-se a sensibilidade, especificidade e valores preditivos
positivo e negativo (VPP e VPN). Fêmeas que não retornaram
ao estro entre 18 e 24 dias após a primeira inseminação (n= 170)
foram examinadas por ultra-sonografia no dia 28 e por palpação
transretal no dia 42 para confirmação da gestação. As não
prenhes receberam prostaglandina e uma segunda inseminação
após visualização do estro. Das 44% (22/50; G1) e 80%
(96/120; G2) prenhes à primeira inseminação, 0% retornou ao
serviço, 0% apresentou perdas embrionárias e 0% apresentou
abortamentos, resultando numa taxa de parição de 69,4%
(118/170). Das 100% (28/28; G1) e 100% (24/24; G2) prenhes
à segunda inseminação, 0% retornou ao serviço, 0% apresentou
perdas embrionárias e 0% abortamentos, resultando numa taxa
de parição de 100% (52/52). A taxa de parição total foi de 100%
(170/170) e o intervalo de partos foi reduzido de 15 para 12,9
meses. A sensibilidade, a especificidade e VPP e VPN foram de
100%, sem a ocorrência de dúvidas ou erros. Este estudo
sugere que a ultra-sonografia aos 28 dias após inseminação é
exata para o diagnóstico precoce de gestação, não causa perdas
embrionárias e, quando associada à re-sincronização do estro,
contribui para o aumento da eficiência reprodutiva.
Palavras-chave: acurácia, ultra-sonografia, sensibilidade,
especificidade, VPP, VPN
Summary: This study evaluated the accuracy of pregnancy
diagnosis in crossbred (G1) and Bos indicus (G2) females at 28
days after insemination and its effect on embryonic losses and
* Correspondência: [email protected]
Tel: +55 87 8812 9495
reproductive efficiency. The accuracy of the method was
obtained calculating sensibility, specificity, positive and negative predictive values (PPV and NPV). Females that did not
return to estrus between 18 and 24 days after the first insemination (n = 170) were examined by ultrasound at day 28 and by
transrectal palpation at day 42 for confirmation of pregnancy.
The non pregnant received prostaglandin and a second insemination after viewing of estrus. Of 44% (22/50; G1) and 80%
(96/120; G2) pregnant at first insemination, 0% returned to
service, 0% showed embryonic losses and 0% had abortions,
resulting in a calving rate of 69.4% (118/170). Of 100% (28/28;
G1) and 100% (24/24; G2) pregnant at the second insemination,
0% returned to service, 0% showed embryonic losses and 0%
had abortions, resulting in a calving rate of 100% (52/52). The
total birth rate was 100% (170/170) and the calving interval has
been reduced from 15 to 12.9 months. The sensitivity, specificity, PPV and NPV were 100% without any occurrence of
questions or errors. This study suggests that ultrasound at
28 days after insemination is accurate for the early diagnosis
of pregnancy, does not cause embryonic losses and, when
combined with resynchronization of estrus, contributes to the
increase in reproductive efficiency.
Keywords: accuracy, ultrasound, sensibility, specificity, PPV,
NPV
Introdução
O diagnóstico de gestação é um componente chave
dos programas de manejo reprodutivo de rebanhos
que visam melhorar o desempenho reprodutivo
(Thompson et al., 1995), pois contribui para a
diminuição do tempo para re-inseminação de vacas
vazias e, conseqüentemente, para redução dos dias
abertos (Oltenacu et al., 1990). Ademais, o diagnóstico precoce da gestação torna-se aconselhável quando
31
Gradela A et al.
protocolos para sincronização do estro com inseminação artificial em tempo fixo (IATF) e transferência
de embriões são utilizados. Nestes casos, os animais
não prenhes podem ser alocados em novo protocolo de
sincronização ou no rol de receptoras muito mais
rapidamente, o que pode desempenhar uma função
chave numa estratégia de manejo reprodutivo para
operações comerciais com gado bovino.
Os benefícios econômicos do diagnóstico de
gestação dependem de vários fatores como: o período
em que o diagnóstico é realizado após inseminação, a
acurácia do diagnóstico, seu efeito na mortalidade
embrionária, a eficiência da detecção do estro e as
medidas adotadas quando as vacas são encontradas
vazias (De Vries et al., 2005). Embora a palpação
transretal seja ainda o mais popular método para
diagnosticar se vacas estão prenhes ou vazias, quando
elas não são vistas em estro (Rosenbaum e Warnick,
2004), o uso da ultra-sonografia vem crescendo a cada
ano (Fricke, 2002). A data para realização da ultra-sonografia tem sido objeto de estudo (Pierson e Ginther,
1984; Boyd et al., 1988; Kastelic et al., 1989; Badtram
et al., 1991; Szenci et al., 1995; Nation et al., 2003),
entretanto sem um consenso. Sabe-se que a acurácia é
comprometida se os exames são realizados muito precocemente (Kastelic et al., 1989; Badtram et al., 1991;
Nation et al., 2003) e, embora melhores resultados
tenham sido observados após o dia 25 pós-IA (Fissore
et al., 1986; Pieterse et al., 1990; Fricke, 2002),
Nation et al. (2003) verificaram que diagnósticos
realizados antes do dia 30 eram precoces e pouco
confiáveis, devido ao risco de perdas embrionárias.
A diminuição da acurácia do diagnóstico pode levar
a conclusões errôneas, fazendo com que mais vacas
verdadeiramente vazias sejam diagnosticadas como
prenhes (falso positivos) e mais vacas verdadeiramente prenhes sejam diagnosticadas como vazias
(falso negativos) (Badtram et al., 1991; Szenci et al.,
1995; Filteau e Descôteaux, 1998). Erros no diagnóstico geram altos custos, pois um diagnóstico falso
positivo resulta em atraso na re-inseminação de vacas
vazias (De Vries et al., 2005) e um falso negativo pode
levar a abortamento se prostaglandina é administrada
(Romano et al., 2004; De Vries et al., 2005). Como o
custo de um animal prenhe ser induzido ao abortamento é muito maior, um teste de prenhez deve
apresentar valor preditivo negativo (VPN) de 100%
(De Vries et al., 2005). Ademais, altos valores de
sensibilidade e especificidade são desejáveis, devido
ao grande impacto econômico que causam, pois
aumento da sensibilidade e especificidade de 95%
para 97,5% resulta num ganho de U$0,10 a U$4,70
por vaca (Oltenacu et al., 1990), enquanto que uma
redução na sensibilidade e especificidade de 98% para
92% reduz a receita líquida de U$0,10 a U$0,20 por
vaca por ano (De Vries et al., 2005).
Com base em dados da literatura e diante da falta
de consenso sobre a melhor data para realização do
32
RPCV (2009) 104 (569-572) 31-35
diagnóstico precoce de gestação, este estudo teve
por objetivo avaliar a acurácia da ultra-sonografia
transretal aos 28 dias pós-IA e seu efeito sobre perdas
embrionárias e a eficiência reprodutiva em fêmeas
cruzadas e Nelore.
Material e métodos
Foram utilizadas fêmeas Girolando (Bos taurus X
Bos indicus) (n=50, G1), em regime confinado de
criação da parição até a secagem e sediadas no
município de São João da Boa Vista/SP, localizada a
uma latitude de 21º 58´ 0´´ S, longitude de 46º 47´ 0´´
O e altitude de 767 m e Nelore (Bos indicus) (n= 120,
G2), criadas em regime extensivo no município de
Naviraí/MS, localizado a uma latitude de 23º 8´ 0´´ S,
longitude de 54º 13´ 0´´ O e altitude de 362 m. Em
ambos os grupos, o intervalo entre partos (IDP) dos
animais era de 15,08 ± 3,90 meses. Após um período
de espera voluntário da parição à primeira inseminação de 45 dias, o trato reprodutivo de cada animal
foi examinado por palpação transretal e ultra-sonografia para avaliação da involução uterina normal e
condições de ciclicidade (presença de corpo lúteo).
Dez dias após esta avaliação, fêmeas cíclicas foram
submetidas ao seguinte protocolo de IATF: no dia 0
receberam um dispositivo intravaginal de liberação de
progesterona (CIDR®, Pfizer, Brasil) e uma injeção de
2 mg de benzoato de estradiol (Estrogin®, Farmavet,
São Paulo, Brasil) i.m.; no dia 7, 0,530 mg de
cloprostenol sódico (Ciosin®, Schering-Plough,
Brasil) i.m e no dia 9, o dispositivo foi removido e
1,0 mg de cipionato de estradiol (ECP, Pfizer, Brasil)
i.m., administrado simultaneamente. No dia 11 (48 h
após a retirada do dispositivo) foram administradas
400 UI de hCG (Vetecor®, Calier, Brasil) i.v. e a IA
realizada 12 h depois com sêmen proveniente da
Lagoa da Serra, Sertãozinho-SP, e por um inseminador experiente.
Animais que não retornaram ao estro entre 18 e 24
dias após inseminação (n=170) foram examinados por
um técnico experiente para diagnóstico da gestação
por ultra-sonografia transretal (Aloka® Modelo SSD
500 e sonda de 5 MHz) no dia 28. A visualização da
vesícula embrionária, do concepto e de sua viabilidade
(Curran et al., 1986; Kastelic et al., 1988) através da
ecogenicidade do líquido amniótico e presença
de batimentos cardíacos (Fissore et al., 1986) foi
considerada como prenhez positiva. Aos 42 dias o
diagnóstico foi confirmado por palpação transretal.
Um animal diagnosticado como prenhe no primeiro
exame, mas como não prenhe no segundo exame,
devido à alteração da econogenicidade do líquido
amniótico e ausência de batimentos cardíacos (Fissore
et al., 1986), foi estabelecido como morte embrionária. Quando o diagnóstico era negativo aos 42 dias
após a inseminação, os animais foram tratados com
Gradela A et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 31-35
prostaglandina F2α (PGF2α) e inseminados após a visualização do estro.
Foram calculadas as taxas de prenhez, de morte
embrionária (total de prenhes aos 28 dias - total de
prenhes aos 42 dias/total de animais avaliados x 100);
abortamento (total de prenhes aos 42 dias - total de
paridas/total de animais avaliados x 100); de dúvidas
(diagnósticos inconclusivos decorrentes de artefatos
de técnica, animais inquietos e da dificuldade devido
ao posicionamento do trato genital entre animais
cruzados e puros/total de avaliações x 100); de erros
(total de falsos positivos e negativos/total de avaliações
x 100) e de acertos (total de prenhes e não prenhes
corretamente identificadas/total de avaliações). Para
analisar os resultados foi utilizado o teste quiquadrado
(X2) com nível de significância de 0,05%. Nas
situações em que os valores foram menores do que 5
utilizou-se o Teste de Fisher.
Os resultados ultra-sonográficos foram comparados
calculando-se a sensibilidade, a especificidade e os
valores preditivos positivo (VPP) e negativo (VPN)
usando uma tabela de contingência 2x2. A sensibilidade é a probabilidade que a vaca prenhe seja
diagnosticada como positiva pelo ultra-som, a especificidade é a probabilidade de que o ultra-som tenha
detectado uma vaca vazia, o VPP é a probabilidade de
que a vaca detectada como prenhe está realmente
prenhe, enquanto que o VPN é a probabilidade de que
uma vaca não prenhe é detectada como vazia pelo
método do ultra-som (Broaddus, 2006).
(52/170) como não prenhes e aos 42 dias esses índices
foram mantidos à palpação transretal. Aos 28 dias
após a segunda inseminação, as taxas de prenhez não
diferiram (p>0,05) entre os G1 (100%) e G2 (100%) e
aos 42 dias esses índices também foram mantidos à
palpação transretal.
As taxas de dúvidas, erros e acertos no diagnóstico
precoce de gestação não diferiram entre os grupos
(p>0,05) tendo sido de 0%, 0% e 100% em ambos os
grupos. Deste modo, a sensibilidade, a especificidade,
o VPP e o VPN foram todos de 100%, resultando
numa acurácia (proporção de prenhes e não prenhes
corretamente identificadas) de 100%.
As taxas de perdas embrionárias e abortamentos não
diferiram entre os grupos (p>0,05) tendo sido de 0% e
0%, respectivamente, após as duas inseminações.
Deste modo, ambos os grupos apresentaram, após o
repasse da IA, taxa de prenhez total de 100% (p>0,05)
e o IDP foi reduzido de 15 para 12,9 meses em ambos
os rebanhos.
Discussão
Embora alguns estudos tenham sugerido a
possibilidade de diagnóstico de gestação usando
ultra-sonografia transretal aos 25 ou 26 dias de
gestação (Fissore et al., 1986; Pieterse et al., 1990;
Barros e Visintin, 2001; Fricke, 2002), poucos abordaram a acurácia (sensibilidade, especificidade, VPP e
VPN) do método. Este foi o objetivo deste estudo que
também avaliou as conseqüências práticas do diagnóstico precoce da gestação, comparando-os em fêmeas
bovinas cruzadas e Nelore.
O ultra-som foi capaz de detectar 100% das fêmeas
prenhes aos 28 dias após a inseminação, as quais
foram confirmadas por palpação transretal aos 42
dias. A sensibilidade foi ligeiramente superior à relatada por Pieterse et al.. (1990) entre os dias 26 e 33
(97,7%), Hanzen e Laurent (1991) entre 26 e 70 dias
pós-IA (97%), Nation et al. (2003) entre os dias 28 e
35 de gestação (96%) e Real et al. (2006) entre os dias
Resultados
Os resultados dos exames ultra-sonográficos para
avaliar as taxas de gestação, perdas embrionárias,
abortamentos e animais paridos após a primeira e
segunda inseminações são apresentados na Tabela 1.
Aos 28 dias após a primeira inseminação, as taxas de
prenhez foram menores (p<0,05) no GI (44%) do que
no G2 (80%) e, das 170 fêmeas avaliadas, 69,4%
(118/170) foram classificadas como prenhes e 30,6%
Tabela 1 - Taxas de gestação, de perdas embrionárias e de abortamentos aos 28 (por ultra-sonografia) e 42 dias (por palpação transretal) após a primeira e segunda inseminações artificiais e taxa de prenhez total de fêmeas Girolando (G1) e Bos indicus (G2)
IA
1ª IA
2ª IA
a,b
Grupos
Categorias
Animais gestantes aos 28 dias pós-1ª IA
Perdas embrionárias
Animais gestantes aos 42 dias pós-1ª IA
Abortamentos
Animais gestantes aos 28 dias pós-2ª IA
Perdas embrionárias
Animais gestantes aos 42 dias pós-2ª IA
Abortamentos
Animais paridos
G1
(n=50)
22
0
22
0
28
0
28
0
50
G2
%
44a
0a
44
0
100
0
100
0
100
(n=120)
96
0
96
0
24
0
24
0
120
%
80b
0a
80
0
100
0
100
0
100
Total
(n=170)
118
0
118
0
52
0
52
0
170
%
69,4
0
69,4
0
100
0
100
0
100
Valores na mesma linha indicam diferença estatística (p < 0,05).
33
Gradela A et al.
26 e 30 de gestação (79%). Apenas Filteau e
Descôteaux (1998) após o dia 32 e Romano et al.
(2003) observaram resultados semelhantes aos 29 dias
pós-estro em vacas e aos 26 dias em novilhas. A
especificidade foi de 100%, não tendo havido perda
da capacidade de detecção de fêmeas vazias, ao
contrário de outros relatos da literatura (Pieterse et al.,
1990; Hanzen e Laurent, 1991; Real et al., 2006).
Com isto, não foram observados falsos negativos ou
positivos, reforçando a exatidão do método. Estes
resultados contradizem outros relatos (Barros e
Visintin, 2001; Romano, 2004), que atribuíram a ocorrência de erros à maior dificuldade na interpretação
das imagens quando os batimentos cardíacos não são
observados. A persistência de falsos positivos durante
os estágios iniciais da prenhez pode explicar porque
a especificidade e o VPP nunca atingem 100%
(Romano, 2004). Neste estudo, a não ocorrência de
erros resultou em VPP e VPN máximos, fato apenas
observado por Filteau e Descôteaux (1998) e Szenci et
al. (1999) em relação ao VPN.
No presente estudo, o exame ultra-sonográfico não
ocasionou morte embrionária (Ball e Logue, 1994;
Hughes e Davies, 1989; Barros e Visintin, 2001),
contradizendo o observado por Nation et al. (2003) e
Vasconcelos et al. (1997), que consideraram, respectivamente, os períodos de 28 a 35 dias e 28 a 42 dias
após inseminações precoces para detecção segura da
gestação, devido à alta incidência de mortalidade
embrionária. Isto se deveu à facilidade de visualização
dos batimentos cardíacos e à experiência do técnico
em não ocasionar trauma à vesícula amniótica, pois
manipulações excessivas do trato genital foram evitadas, e sugere que aos 28 dias a técnica pode ser
inócua para a detecção precoce da gestação.
O tratamento de fêmeas não prenhes com prostaglandina aos 42 dias após a IA diminuiu o intervalo
entre partos dos animais estudados, o qual foi inferior
ao reportado tanto para fêmeas Nelore (Souza et al.,
1994; Gonçalves et al., 1996; Viu et al., 2008) como
Girolando (Facó et al., 2005; Ruas et al., 2007;
McManus et al., 2008). Entretanto, a exatidão do
diagnóstico aos 28 dias após inseminação permite
inferir que a PGF2α poderia ter sido administrada neste
dia sem a necessidade de confirmação do diagnóstico
aos 42 dias após IA, o que teria reduzido ainda mais o
intervalo entre partos.
Este estudo demonstra a exatidão da ultra-sonografia transvaginal aos 28 dias após inseminação, pois
dúvidas ou erros são eliminados se os batimentos
cardíacos fetais são visualizados, resultando em altos
VPP e VPN. A ultra-sonografia não causa morte
embrionária e, se associada à re-sincronização do
estro, contribui para o aumento da eficiência reprodutiva, aumentando as taxas de prenhez e reduzindo o
intervalo entre partos.
34
RPCV (2009) 104 (569-572) 31-35
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35
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Estudo do balanço eletrolítico alimentar para suínos machos castrados em
acabamento mantidos em ambiente de alta temperatura
Study of feed electrolyte balance of finishing castrated male pigs under
high environmental temperature
Anilce A. Bretas1*, Rony A. Ferreira2, Patrícia C.B. Vale1, Humberto P. Couto3,
Walter E. Pereira4
1
Laboratório de Zootecnia e Nutrição Animal – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF)
Avenida Alberto Lamego, 2000. Campus dos Goytacazes-RJ CEP: 28013-600
2
Faculdade de Ciências do Departamento de Zootecnia Campus II – Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)
3
Laboratório de Zootecnia e Nutrição Animal – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF)
4
Centro de Ciência Agrária – Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Resumo: Avaliou-se o efeito do Balanço Eletrolítico (BE) em
rações com diferentes níveis eletrolíticos para suínos na fase de
terminação (acabamento) criados em alta temperatura. Foram
utilizados 200 suínos machos castrados com peso médio de
68,8±3,4 kg, distribuídos em delineamento experimental
inteiramente aleatório, com cinco tratamentos: T1s/supl ração
sem suplementação de eletrólitos com 191 mEq/kg; T2 ração
suplementada com bicarbonato de sódio com 250 mEq/kg; T3
ração suplementada com NaHCO3 e cloreto de potássio 250
mEq/kg; T4 ração suplementada com NaHCO3 300 mEq/kg; e
T5 ração suplementada com NaHCO3 e KCl 300 mEq/kg.
Utilizando quatro repetições, sendo 10 animais por unidade
experimental. No encerramento do experimento o peso médio
foi 110,1 ± 2,6 kg. As variáveis avaliadas foram consumo de
ração (CR), ganho de peso (GP), consumo de nitrogênio (CN),
consumo de lisina (CL), eficiência de utilização de nitrogênio
para ganho (EUNG), eficiência de utilização de lisina para
ganho (EULG), conversão alimentar (CA) e os parâmetros
fisiológicos frequência respiratória (FR), temperatura retal
(TR). A temperatura média manteve-se em 29,34±2,06 °C com
umidade relativa (UR) do ar de 70,4 ± 9,2% e TGN de 31,59 ±
2,53 °C e ITGU em 80,98 ± 2,89. Os níveis de BE melhoraram
(P<0,05) o GP, CL e a EULG. Os demais parâmetros de desempenho avaliados não foram afetados pelos tratamentos (P>0,05).
A suplementação com 250 ou 300 mEq/kg com bicarbonato de
sódio e/ou cloreto de potássio pode ser usada para corrigir o
balanço eletrolítico no stresse calórico.
with sodium bicarbonate (NaHCO3) with 250 mEq/kg; T3 diet
supplemented with NaHCO3 and potassium chloride (KCl) with
250 mEq/kg; T4 diet supplemented with NaHCO3 with
300 mEq/kg; T5 diet supplemented with NaHCO3 and KCl
300 mEq/kg. Ten pigs and 4 replications were used per experimental unit. The study was finished when the average weight of
the animals was 110.1±2.6 kg. The performance parameters
evaluated were the feed intake, the daily gain (DG), finished
weight, nitrogen intake, lysine intake (LI), efficiency of N
utilization for weight gain, efficiency of L utilization for weight
gain (ELUWG) and the gain:feed ratio and physiologic
parameters to respiratory frequency and rectal temperature. The
average temperature was 29.34±2.06 °C with relative humidity
of 70.4 ± 9.2% and black globe temperature of 31.59 ± 2.53 °C
and black globe humidity index calculated 80.98 ± 2.89. The
levels of EB improved (P<0.05) the DG, LI and ELUWG. The
others performance parameters evaluated weren’t influenced by
treatments (P>0.05). The supplementation with sodium bicarbonate and or potassium chloride with 250 or 300 mEq/kg can
be used to correct electrolyte balance under heat stress.
Palavras-chave: equilíbrio ácido-base, suínos, stresse calórico,
bicarbonato de sódio, cloreto de potássio
A região Nordeste do Brasil possui um rebanho
suíno com alto potencial genético, porém com produtividade inferior em comparação às demais regiões do
país, em virtude, principalmente, das características
climáticas da região (Carvalho et al., 2004). É importante considerar a temperatura ambiente, como um dos
principais elementos climáticos não só por causa do
efeito direto sobre a intensidade das trocas térmicas,
como indiretamente pela influência que exerce sobre
os demais componentes do bioclima.
Segundo Perdomo (1998), a adequação do meio
deve ter caráter permanente, independentemente da
maior ou menor habilidade genética do suíno, uma vez
Summary: The effect of Dietary Electrolyte Balance (EB) in
rations with different levels of electrolytes for growing swine
under high environmental temperatures was evaluated. Two
hundred male castrated pigs with initial average weight of
25,3±1.3 kg were allocated in five treatments, using a
completely randomized experimental design: T1 diet without
supplemented electrolyte 191with mEq/kg; T2 diet supplemented
*Correspondência: [email protected]
Keywords: electrolyte balance, swine, heat stress, sodium
bicarbonate, potassium chloride
Introdução
37
Bretas AA et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
que a estabilização e melhoria do conforto térmico são
fundamentais para elevar o nível de independência das
edificações em relação ao clima, visando a otimização
do desempenho.
A manutenção do equilíbrio ácido-básico tem
grande importância fisiológica e bioquímica, visto
que as atividades das enzimas celulares, as trocas
eletrolíticas e a manutenção do estado estrutural
das proteínas são profundamente influenciadas por
pequenas alterações na concentração hidrogeniônica
(H+) do sangue (Macari e Furlan, 1994). O balanço
eletrolítico da ração pode exercer influência no
equilíbrio ácido-básico e, consequentemente, afetar os
processos metabólicos relacionados ao crescimento, à
resistência a doenças, à sobrevivência ao stresse e ao
desempenho do animal (Vietes et al., 2005).
Segundo Mogin (1980), o sódio, o potássio e o
cloreto são fundamentais na manutenção da pressão
osmótica e equilíbrio ácido base dos líquidos corporais. Como forma de prevenção para o desequilíbrio
ácido básico a suplementação de rações através do uso
de compostos como bicarbonato de sódio (NaHCO3)
e cloreto de potássio (KCl) tem sido utilizada em
regiões de clima quente. Diante do exposto, este
trabalho teve como objetivos avaliar o desempenho de
suínos em terminação (acabamento) mantidos em
condições naturais de calor recebendo rações com
diferentes balanços eletrolíticos.
Material e métodos
Foram utilizados 200 suínos cruzados (Landrace X
Large White) machos castrados, em fase de acabamento, em delineamento experimental inteiramente
aleatório, cinco tratamentos com diferentes níveis de
mEq/kg de ração suplementadas ou não com bicarbonato de sódio e/ou cloreto de potássio e quatro
repetições, onde a unidade experimental foi composta
por 10 animais na baia. Os animais foram alojados em
galpão (alpendre) de alvenaria, coberto com telha de
fibrocimento em duas águas, sem forro, com piso de
cimento parcialmente ripado, dividido em baias iguais
de 3,25 m x 2,60 m cada baia, provido de bebedouro
tipo chupeta e comedouro fixo semi automático de
concreto com cinco divisões.
As rações experimentais (Tabela 1) foram formuladas seguindo as recomendações de Rostagno et al.
(2005), preparadas à base de sorgo e farelo de soja,
sendo que suas fórmulas serviram para satisfazer as
exigências nutricionais de suínos machos castrados de
alto potencial genético com desempenho médio na
fase de terminação.
Foram utilizadas cinco rações experimentais T1
(s/supl): ração sem suplementação de eletrólitos
formulada com 191 mEq/kg; T2 (supl B): ração com
suplementação de bicarbonato de sódio (NaHCO3) ou
(B) formulada com 250 mEq/kg; T3 (supl B+C): ração
Tabela 1 - Composição das rações experimentais
Ingredientes
Sorgo
Farelo de soja
Óleo de soja
Suplemento mineral:vitamínico2
Sal comum
L- lisina HCl
Bicarbonato de sódio
Cloreto de potássio
Total
Proteína Bruta (%)1
EM (kcal/kg)1
BE (mEq/kg)3
Lisina total (%)1
Cloro (%)4
Sódio (%)4
Potássio (%)4
Cálcio (%)4
Fósforo total (%)4
1
72,680
19,600
3,400
4,000
0,220
0,100
100,000
2
71,900
19,600
3,400
4,000
0,240
0,100
0,760
100,000
17,70
3,450
199
0,890
0,190
0,270
0,530
0,700
0,530
17,69
3,440
250
0,880
0,260
0,400
0,590
0,702
0,529
Tratamentos
3
4
71,415
71,484
19,600
19,600
3,400
3,400
4,000
4,000
0,225
0,230
0,100
0,100
0,760
1,186
0,500
100,000
100,000
Composição Nutricional
17,61
17,64
3,415
3,420
250
300
0,870
0,880
0,250
0,270
0,390
0,510
0,600
0,610
0,701
0,703
0,528
0,527
5
70,479
19,600
3,400
4,000
0,235
0,100
1,186
1,000
100,000
17,63
3,410
300
0,870
0,280
0,500
0,630
0,701
0,528
Composição calculada segundo Rostagno et al. (2005).
Conteúdo em kg: selênio 8 mg, flúor 485 mg, vitamina B12 520 mg, ácido fólico 8,8 mg, vitamina A 93.000 ui/kg, vitamina D3 24.000 ui/kg,
manganês 836 mg, fósforo 49 g, cálcio 190 g, ácido pantotênico 173 mg, promotor de crescimento (mananoligossacarídeos) 1.485 mg, vitamina
K3 53 mg, iodo 29,5 mg, cobalto 3,6 mg, vitamina E 106 mg, niacina 426 mg, riboflavina 71 mg, antioxidante (betahidroxitolueno-BHT) 9 mg,
tiamina 13,3 mg, sódio 58,5 g, cobre 2.126 mg, solubilidade de fósforo (P) em ác. Cítrico a 2% (mín) 90%, zinco 2.049 mg, ferro 1.820 mg,
piridoxina 13,3 mg, biotina 0,42 mg, qsp1000 g.
3
BE - Balanço Eletrolítico da ração calculado conforme Patience (1990), BE = (Na/23 + K/39 – Cl/35,5)x 1000.
4
Análises realizadas no Laboratório de Solos – Universidade Estadual do Maranhão (UEMA).
1
2
38
Bretas AA et al.
com suplementação de NaHCO3 ou (B) e cloreto de
potássio (KCl) ou (C) formulada com 250 mEq/kg; T4
(supl B): ração com suplementação de NaHCO3 ou (B)
formulada com 300 mEq/kg; T5 (supl B+C): ração
com suplementação de NaHCO3 ou (B) e KCl ou (C)
formulada com 300 mEq/kg. Para a correção do
balanço eletrolítico, as rações dos tratamentos T2 e T4
continham apenas bicarbonato de sódio (NaHCO3) e
as rações dos tratamentos T3 e T5 continham
(NaHCO3) e cloreto de potássio (KCl), que foram
adicionados em substituição ao sorgo da ração, sendo
os demais ingredientes mantidos em sua concentração.
Os valores de balanço eletrolítico (BE) das rações
experimentais foram calculados, considerando o peso
molecular de cada elemento químico, de acordo com
a recomendação de Patience (1990), por meio da
fórmula: BE = (Na/23 + K/39 – Cl/35,5).
As condições ambientais do galpão foram monitoradas (7, 12 e 17 horas), utilizando termohigrômetro
digital, termômetro de máxima e mínima e termômetro de globo negro, mantidos em uma baia vazia no
centro do galpão à meia altura do corpo dos animais.
As leituras dos equipamentos foram utilizadas para o
cálculo do índice de temperatura de globo e umidade
(ITGU), segundo metodologia de Buffington et al.
(1981). Para o cálculo do ITGU foi utilizada seguinte
equação a seguir "ITGU = Tgn + 0,36 Tpo – 330,08",
onde: ITGU = índice de temperatura de globo e umidade; Tgn = temperatura de globo negro (em Kelvin);
Tpo = temperatura do ponto de orvalho (em Kelvin).
Foram realizadas as pesagens diárias das sobras e do
resíduo de ração. As pesagens dos animais foram
realizadas no início e no final do experimento, para a
avaliação do ganho de peso. Para cálculo do CN, foi
considerado consumo de proteína bruta (PB) dividido
pelo coeficiente 6,25. A eficiência de lisina e de
nitrogênio, ambos para ganho, foi avaliada através do
consumo médio de lisina necessário para os animais
converterem em ganho de peso.
O modelo estatístico utilizado foi Yij = µ + ti + eij,
em que Yij (Completely Randomized Design) = efeito
do tratamento i na repetição j, µ = média geral das variáveis, ti = efeito do tratamento i, eij = erro aleatório
associado a cada observação ij. As análises estatísticas
de desempenho foram realizadas utilizando-se os
procedimentos do SAS versão 7.0 (SAS, 2005),
efetuando-se a soma de quadrados dos tratamentos
decomposta em contrastes ortogonais para análise dos
efeitos de balanço eletrolítico sobre as variáveis de
desempenho em 5% de probabilidade.
Resultado e discussão
Durante todo o período experimental a temperatura
média manteve-se em 29,34 ± 2,06 °C, com umidade
relativa do ar de 70,4 ± 9,2% e temperatura do globo
negro de 31,59 ± 2,53 °C. O índice de temperatura de
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
globo e umidade (ITGU) foi de 80,98 ± 2,89. A utilização de índices bioclimatológicos na suinocultura
permite a precisão de uma avaliação da situação
ambiental, e também uma comparação de animais
mantidos em diferentes regiões (Ferreira, 2005).
Em pesquisa realizada por Whittemore (1980) foi
observado uma faixa estreita de conforto térmico para
suínos na fase de terminação com valores entre 16 a
27 °C para suínos acima dos 50 kg de peso vivo. De
acordo com Pointer (1978) e (Baêta e Souza, 1997), a
temperatura de conforto térmico para esta categoria
animal é de 25 °C.
A temperatura média observada 29,34 °C foi
superior à temperatura máxima da zona de conforto
térmico para os animais na fase de terminação, dessa
forma há evidência que os suínos estavam em
condições de moderado stresse por calor.
O valor do ITGU obtido neste estudo demonstrou
que os animais durante todo o período experimental
estavam submetidos ao stresse por calor. Segundo
Ferreira (2005), os valores de ITGU próximos de 80
podem caracterizar o efeito do stresse calórico para
suínos em fase de terminação. Outros valores de
ITGU foram observados por (Tavares et al., 2000;
Tavares et al., 2005), Kiefer et al. (2005), Ferreira et
al. (2007) e Orlando et al. (2007), sendo respectivamente 81,1 e 79,7; 82,8; 82,2 e 82,9 caracterizando o
stresse por calor para suínos em fase de terminação.
Os resultados de consumo de ração (CR), ganho de
peso (GP), conversão alimentar (CA), peso final (PF),
consumo de nitrogênio (CN), consumo de lisina (CL),
eficiência de utilização de lisina para ganho (EULG)
e eficiência de utilização do nitrogênio para ganho
(EUNG) são apresentados na Tabela 2.
Os resultados observados sobre o consumo de ração
(CR) não foram diferentes (P>0,05) entre os tratamentos avaliados.
Pelos resultados obtidos pode-se notar que a
suplementação de eletrólitos melhorou (P<0,05) o
ganho de peso (GP) dos animais. Observou-se que os
suínos que receberam a suplementação de eletrólitos
nas rações apresentaram um aumento médio de 3,59%
no ganho de peso quando comparado com os suínos
que receberam ração sem correção do balanço
eletrolítico.
Silva (1999) relatou que elevadas temperaturas
ambientais parecem ter efeito depressivo mais pronunciado em suínos modernos com alto potencial
genético, uma vez que o ganho diário de peso é prejudicado. Por outro lado, em um estudo conduzido por
Moreira et al. (2003), utilizando suínos com médio
potencial genético, o menor ganho diário de peso proporcionado pela elevada temperatura foi compensado
pela melhora na conversão alimentar.
Não foram observados diferenças (P>0,05) na
conversão alimentar e peso final dos animais, demonstrando que a suplementação contribuiu efetivamente
para melhora de desempenho dos suínos.
39
Bretas AA et al.
O balanço eletrolítico obtido pela suplementação
de sódio, potássio e cloreto nas rações (tratamentos
3 e 5) pode ter deprimido o apetite dos suínos.
Provavelmente, em função de que as concentrações
de potássio (0,60 e 0,63%) e sódio (0,39 e 0,50%)
ultrapassaram a tolerância dos animais. Rostagno
et al. (2005) prescreveram, respectivamente, 0,52%
de potássio e 0,17% de sódio para suínos de alto
potencial genético e desempenho médio na fase de
terminação.
Hannas (1999), em sua revisão, relatou que os
suínos em stresse por calor não apresentaram piora na
conversão alimentar, entretanto, os prejuízos econômicos podem ser decorridos em função do maior número
de dias para que os animais atinjam o peso de abate.
Os resultados observados para a consumo de
nitrogênio (CN) e eficiência de utilização de
nitrogênio para ganho (EUNG) não foram diferentes
(P>0,05) quando se utilizou a correção de balanço
eletrolítico. Contudo, os tratamentos 3 e 5 apresentaram diminuição no CN, valores não-significativos,
quando as rações apresentaram suplementação com
cloreto de potássio (KCl).
Provavelmente, o KCl pode ter ocasionado a
inclusão de compostos ácidos, dessa maneira proporcionando uma diminuição sobre o valor do balanço
eletrolítico no organismo. A quantidade consumida
desses íons nas rações produz uma estreita relação
com os mecanismos compensatórios que envolvem a
mobilização desses íons fundamentais para o equilíbrio acidobásico.
Houve influência dos tratamentos (P<0,05) sobre o
consumo de lisina (CL) e eficiência de utilização de
lisina para ganho (EULG). Pelos resultados obtidos
pode-se notar que a suplementação de eletrólitos
melhorou (P<0,05) o consumo de lisina (CL) e a
EULG dos animais. Observou-se que os suínos que
receberam a suplementação de eletrólitos nas rações
apresentaram um aumento médio de 3,24% no
consumo quando comparado com os suínos que não
receberam rações com o balanço eletrolítico corrigido.
Observou-se que os suínos que receberam a suplementação de eletrólitos nas rações apresentaram um
aumento médio de 5,44% na eficiência de utilização
de lisina quando comparado com os suínos que não
receberam rações com tratamento do balanço
eletrolítico corrigido.
O valor obtido para o consumo diário de lisina 30,13
g/dia em rações com 0,90% de lisina, trabalhando com
suínos machos castrados com 95 aos 122 kg obtido
por Arouca et al. (2007) foi superior ao obtido neste
trabalho (21,49 g/dia) onde os suínos receberam
rações com 0,89% de lisina. A ingestão de lisina total
exigida pelo suíno depende do apetite ou do potencial
de ingestão de alimento, da taxa de deposição de carne
magra e da eficiência desta deposição, o que poderia
explicar as diferenças observadas de acordo com
Hannas et al. (1999).
40
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
O consumo de lisina diário é responsável pela
deposição de tecido muscular na carcaça e o desempenho pode estar associado diretamente ao nível de
lisina nas rações (Oliveira et al., 2002).
Os resultados de consumo diário de sódio, do
consumo de potássio e consumo de cloro estão
demonstrados na Tabela 3.
A correção do balanço eletrolítico da ração para 250
ou 300 mEq/kg proporcionou maiores consumos
(P<0,05) dos três elementos estudados. Uma vez que
o consumo voluntário de ração não foi influenciado
entre os tratamentos, os consumos de sódio, de potássio
e de cloreto variaram de acordo com a concentração
destes eletrólitos nas formulações.
Dentre os animais que receberam ração suplementada
com eletrólitos, aqueles que receberam rações com
300 mEq/kg apresentaram maior consumo de potássio
(P<0,05) em relação aos que consumiram rações com
250 mEq/kg.
O teor de ingestão de sódio na dieta, a concentração
de sódio plasmática e a carga de sódio filtrado podem
influenciar as taxas de excreção do potássio. Neste
caso, o excesso de potássio na dieta provoca um
aumento da eliminação deste e uma diminuição na
eliminação de hidrogênio (H+). Como os íons sódio e
potássio aumentaram sua concentração em relação à
concentração do cloreto, ocasionou dessa maneira
uma diminuição da eliminação de H+, sendo esta
reação caracterizada como resposta à alcalose
metabólica provocada por uma alimentação aniônica
(Swenson e Reece, 1993).
A taxa de excreção de K+ pela urina é variável,
estando ligada à concentração plasmática de Na+ e ao
estado de hidratação dos animais, sendo que as perdas
podem ser causadas pelo aumento no consumo de
água, já que o gradiente osmótico favorece o movimento de água do fluído intracelular para urina,
podendo transportar o K+. O aumento de K+ resulta em
maior perda urinária, sendo que os suínos têm pouca
capacidade de conservar o K+ corporal (Salvador et
al., 1999).
O maior consumo de sódio apresentado pelos
animais que receberam rações com eletrólitos pode ter
influenciado o resultado observado para consumo de
cloreto quando comparado ao tratamento 1 sem suplementação oferecido aos suínos apresentado na Tabela
3. Assim, caso ocorra no organismo excesso de sódio,
o excesso de cloreto acompanha a excreção de sódio
que será eliminado pela urina através da ação dos rins.
Este mecanismo do organismo tem como objetivo
a manutenção do equilíbrio das quantidades de
cátions-ânions (Del Claro, 2003; Pound et al. 2005).
As necessidades de cloro para animais em terminação
poderiam atingir 2,5 g/dia dependendo das condições
ambientais, conforme NRC (1998).
O aumento no consumo de Cl- deprime a excreção
de H+ e a reabsorção de HCO3- pelos rins. Isto pode
contribuir com uma acidificação do sangue e esta
Bretas AA et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
Tabela 2 - Consumo de ração (CR), ganho de peso (GP), conversão alimentar (CA), peso final (PF), consumo de nitrogênio (CN),
consumo de lisina (CL), eficiência de utilização de nitrogênio (EUNG) e eficiência de utilização de lisina (EULis) de suínos em
terminação, mantidos em condições naturais de calor recebendo rações com diferentes balanços eletrolíticos
Tratamentos
1 (s/supl)
2 (supl B)
250 mEq/kg
3 (supl B+C)
250 mEq/kg
4 (supl B)
300 mEq/kg
5 (supl B+C)
300 mEq/kg
CV (%)
QMresíduo
Contrastes
T1vs T2+T3+T4+T5
T2+T3 vs T4+T5
T2 vs T3
T4 vs T5
CR
(g/dia)
2.528
GP
(g/dia)
766
2.536
CA
3,30
PF
(kg)
110,50
CN
(g/dia)
71,58
CL
(g/dia)
21,49
EUNG
(gGP/g)
10,60
EULis
(gGP/gLis)
33,73
811
3,13
111,19
71,60
22,31
11,33
36,36
2.440
776
3,14
109,82
69,75
22,23
10,84
35,12
2.557
821
3,11
112,69
71,18
22,30
10,69
34,14
2.415
4,97
0,187
770
5,54
0,355
3,14
3,31
0,298
22,01
3,20
0,197
11,43
4,17
0,426
37,04
4,72
0,153
NS
NS
NS
NS
*
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
109,03
70,13
4,98
4,95
0,187
0,290
Significância
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
*
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
*
NS
NS
NS
* significativo 5% pelo teste T.
Tabela 3 – Consumos de sódio, de potássio e de cloreto por suínos em fase de terminação, alimentados com rações contendo diferentes balanços eletrolíticos
Tratamentos
1 (s/suplementação)
2 (B) 250 mEq/kg
3 (B+C) 250 mEq/kg
4 (B) 300 mEq/kg
5 (B+C) 300 mEq/kg
CV(%)
QMresíduo
Contrastes
T1vs T2+T3+T4+T5
T2+T3 vs T4+T5
T2 vs T3
T4 vs T5
Sódio
7,29
11,15
10,73
13,55
13,70
4,97
0,956
Consumo diário
Potássio
14,32
16,45
16,89
16,21
17,26
4,93
0,683
*
*
NS
NS
*
NS
NS
NS
Cloreto
Na
5,13
1,42
7,25
1,54
7,04
1,52
7,18
1,89
7,67
1,79
4,92
0,901
Significância
*
NS
NS
NS
-
Proporção
K
2,79
2,69
2,40
2,26
2,50
-
Cl
1,00
1,00
1,00
1,00
1,00
-
-
-
* significativo 5% pelo teste T.
parece ser uma resposta apropriada para a alcalose
(Salvador et al., 1999).
As funções do cloreto estão relacionadas à regulação da pressão osmótica extracelular e à manutenção
do equilíbrio ácido-base no organismo animal
(Andrigueto et al., 2002; Bertechini, 2006).
Os tratamentos 4 e 5 utilizando o balanço eletrolítico
de 300 mEq/kg apresentaram maior relação Na:Cl que
os demais tratamentos. O bicarbonato de sódio tem
sido usado na tentativa de minimizar as perdas pelo
stresse calórico, particularmente durante o verão, além
de contribuir com sódio sem incorporar o cloro.
As necessidades de cloro são inferiores às de sódio
e o uso de cloreto de potássio deve ser limitado até a
satisfação das necessidades de cloro, assim que este se
complementa com as necessidades de sódio.
Conforme observado pela proporção Na:Cl no tratamento 2, esta foi a relação que mais se aproximou do
valor 1,58:1, recomendado pelo NRC (1998), para
esta categoria animal.
Os resultados referentes às respostas fisiológicas de
freqüência respiratória (FR) e temperatura retal (TR)
apresentados pelos animais estão apresentados na
Tabela 4.
Os resultados observados para freqüência respiratória (FR) e da temperatura retal (TR) não foram
diferentes (P>0,05) entre os tratamentos analisados.
Os resultados encontrados pelos tratamentos indicam
que este mecanismo de controle homeotérmico foi
eficiente nestes animais.
41
Bretas AA et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 37-43
Tabela 4 - Resultado de freqüência respiratória (FR) em movimento por minuto (mov/min) e temperatura retal (TR) em (ºC) de suínos
em terminação dos 68,8 aos 110,1 kg alimentados com rações contendo diferentes balanços eletrolíticos
Tratamentos
1 (s/suplementação)
2 (supl B) 250 mEq/kg
3 (supl B+C) 250 mEq/kg
4 (supl B) 300 mEq/kg
5 (supl B+C) 300 mEq/kg
CV(%)
QMresíduo
Contrastes
T1vs T2+T3+T4+T5
T2+T3 vs T4+T5
T2 vs T3
T4 vs T5
FR (mov/min)
71,57 ± 0,73
70,64 ± 0,27
69,64 ± 0,20
70,00 ± 0,80
69,99 ± 0,38
4,22
0,322
Ferreira (2005) citou que a FR de suínos poderá
passar de 44 mov/min aos 21 °C, para 82 mov/min aos
32 °C. Os resultados encontrados neste estudo, tanto
de FR quanto de TR são característicos de suínos em
condições de stresse por calor. Os valores de TR
observados são semelhantes àqueles obtidos por
Tavares et al. (2000) (39,6 °C) e por Orlando et al.
(2001) e Tavares et al. (1999), (39,4 °C), sendo que
ambos estudaram suínos em stresse por calor.
O dióxido de carbono é o produto final da oxidação
completa de carboidratos, lipídeos e proteínas. Assim,
o metabolismo animal gera, de forma contínua,
grandes quantidades de CO2 nas células, tornando a
pCO2 tecidual mais elevada do que a pCO2 sangüínea.
Dessa maneira, uma vez que existe diferença de
pressão, o CO2 difunde-se a partir das células para o
sangue e o plasma.
Os pulmões são responsáveis por uma maior taxa de
excreção diária de ácido carbônico (H2CO3) e CO2 em
comparação com os rins. Por essa razão, a ventilação
alveolar e a excreção de CO2 têm grande influência no
equilíbrio acidobásico. O incremento da tensão de
CO2 do sangue e a depleção de íons bicarbonato
causam um aumento na profundidade respiratória.
Nesse caso, os suínos conseguem aumentar o volume
de ar inspirado e expirado através do aumento da profundidade respiratória, ou seja, o ar inspirado penetra
com mais profundidade nos pulmões, permitindo que
o volume de ar seja trocado por números menores de
movimento respiratório (Dibartola, 2007).
Conclusão
A correção do balanço eletrolítico em rações
contendo 250 ou 300 mEq/kg, suplementadas com
bicarbonato de sódio e/ou cloreto de potássio influenciou o desempenho para ganho de peso, consumo de
lisina e eficiência de utilização de lisina para suínos
em terminação (70-100 kg). Os resultados encontrados pelos tratamentos indicam que o mecanismo de
controle homeotérmico foi eficiente nestes animais.
42
TR (ºC)
39,49 ± 0,02
39,57 ± 0,07
39,59 ± 0,05
39,54 ± 0,17
39,35 ± 0,10
2,96
0,561
Significância
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
NS
Agradecimentos
Aos funcionários, em especial, ao Gerente Geral o
Sr. José de Souza da Granja Agrolusa S/A, localizada
em São Luis – Maranhão.
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43
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Estudo casuístico de dermatites por reacção de hipersensibilidade em cães
e gatos
Case study of dermatitis hypersensitivity reaction in dogs and cats
Sílvia Silva1, Sara Peneda2, Rita Cruz1, Helena Vala1,3*
1
Escola Superior Agrária de Viseu, Instituto Politécnico de Viseu. Estrada de Nelas, Quinta da Alagoa, Ranhados,
3500-606 Viseu, Portugal
2
Hospital Veterinário do Porto, Travessa Silva Porto 4200-475 Porto
3
Centro de Estudos em Educação, Tecnologias e Saúde, Escola Superior Agrária de Viseu, IPV, Estrada de Nelas,
Quinta da Alagoa, Ranhados, 3500-606 Viseu
Resumo: Os autores apresentam um estudo das dermatites
causadas por reacção de hipersensibilidade em animais de
companhia, dando enfoque à sua distribuição por sexo, raça e
idade, baseado na análise da casuística dermatológica do
Hospital Veterinário do Porto.
Num total aproximado de 1177 consultas de canídeos, 554
diziam respeito a consultas dermatológicas e, num total de 388
consultas em felinos, 109 eram do foro dermatológico. Em
canídeos, foram diagnosticados 73 casos de hipersensibilidade
cutânea e em felídeos foram diagnosticados 13 casos. Na população canina, a reacção de hipersensibilidade que obteve maior
número de casos foi a Dermatite Alérgica à Picada de Pulga,
tendo-se seguido a Urticária e o Angioedema, a Dermatite
Atópica e, por último, a Hipersensibilidade Alimentar.
Em felídeos verificou-se maior incidência da Atopia, tendo-se
seguido a Dermatite Alérgica à Picada de Pulga e a Hipersensibilidade Alimentar.
Palavras-chave: Reacção de hipersensibilidade cutânea,
Dermatite Alérgica à Picada de Pulga, Urticária, Angioedema,
Dermatite Atópica, Hipersensibilidade Alimentar, canídeo,
felídeo.
Summary: The authors present a study of cutaneous hypersensitivity reaction distribution in small animals, by age, sex and
breed, based on the dermatologic cases of the Veterinary
Hospital of Porto. Among a total of 1177 examined dogs, 554
presented dermatological findings, in 73 of which, cutaneous
hypersensitivity reaction diagnosis was established, while in the
feline population, in a total of 388 cases, 109 dermatological
conditions were observed, of which 13 were hypersensitivity
reactions. In the canine population, the more representative
hypersensitivity was Flea Bite Hypersensitivity, followed by
the Urticaria and Angioedema, Atopic Dermatitis and, for last,
Food Hypersensitivity. The feline population revealed larger
incidence of Atopic Dermatitis, followed by Flea Bite
Hypersensitivity and Food Hypersensitivity.
*Correspondência: [email protected]
Keywords: Cutaneous hypersensitivity reaction, Flea Bite
Hypersensitivity, Urticaria, Angioedema, Atopic Dermatitis,
Food Hypersensitivity, canine, feline.
Introdução
As consultas de dermatologia em pequenos animais
representam 25 a 30% do total das consultas
veterinárias, merecendo, cada vez mais, maior
destaque na prática clínica diária, sendo objecto de
estudos constantes devido, não só à sua incidência,
mas também à relação de proximidade crescente entre
animais e humanos (Machicote, 2005; Yotti, 2005;
Brazis, 2007). Um dos motivos de procura de consultas
desta especialidade é o aparecimento de doenças do
foro alérgico, cuja principal manifestação clínica é o
prurido. Nestas, incluem-se a Dermatite por Alergia à
Picada da Pulga, a Dermatite Atópica, a Hipersensibilidade Alimentar e a Urticária e o Angioedema.
Apesar de existirem muitos factores imunológicos
que contribuem para as reacções de hipersensibilidade
cutânea (Olivry et al., 2001), outros defendem a
existência, simultânea, de uma relação directa com as
reacções de hipersensibilidade retardada, associadas à
Imunoglobulina E (IgE), em resposta à exposição
directa (inalação, ingestão) a alergenos ambientais,
como o fundamento para o aparecimento deste tipo de
reacção de hipersensibilidade cutânea (Deboer, 2004;
Hillier et al., 2001).
A Dermatite Alérgica à Picada de Pulga (DAPP) é a
reacção de hipersensibilidade com maior incidência
em Portugal, devido ao clima propício ao desenvolvimento do ciclo da pulga, principalmente na Primavera
e no Verão, seguindo-se a Dermatite Atópica (DA),
causada principalmente pela inalação de alergenos
(Day, 1999; Medleau e Knilica, 2006).
A Hipersensibilidade Alimentar (HA) é a terceira
reacção de hipersensibilidade cutânea mais comum e
45
Silva S et al.
tem como principal etiologia a ingestão de proteínas,
nomeadamente a ingestão de carne bovina, a qual se
encontra presente na maior parte das rações comercializadas, podendo estas estar na origem do aparecimento
deste tipo de reacção de hipersensibilidade (Jeffers et
al., 1994; Wills et al., 1996; Day, 1999; Medleau e
Knilica, 2006).
A Dermatite Alérgica de Contacto é o quarto tipo de
reacção de hipersensibilidade mais frequente e é
causada pela exposição directa da pele a materiais
de natureza variada que incluem desde materiais
orgânicos, vegetais e urinários, até materiais sintéticos
(produtos de limpeza com base amoniacal, solventes,
fenóis, entre outros). Esta reacção de hipersensibilidade pode também ocorrer devido ao contacto directo
com material plástico de bebedouros, tapetes e carpetes.
A Urticária e o Angioedema são as reacções de hipersensibilidade menos frequentes (Day, 1999; Medleau e
Knilica, 2006) e neste trabalho serão analisadas em
simultâneo.
São inúmeras as terapêuticas utilizadas na resolução
dos casos de reacção de hipersensibilidade cutânea
que, de um modo geral, incluem desde o controlo de
ectoparasitas, no caso da DAPP, passando pelas dietas
de restrição alimentar, no caso da HA, até terapia
médica com imunomoduladores, no caso da Urticária e
do Angioedema, bem como a utilização de autovacinas
e técnicas de hipossensibilização especifica na DA
(Ackerman e Nesbitt, 1998; DeBoer e Hillier, 2001;
Scott et al., 2001; DeBoer, 2004; Medleau e Knilica,
2006). O principal desafio na abordagem terapêutica
das reacções de hipersensibilidade cutânea é seleccionar a combinação farmacológica mais eficaz, de
forma a manter sob controlo todos os sinais clínicos
específicos destas dermatopatias, contribuindo para a
melhoria da qualidade de vida dos animais.
O presente estudo foi realizado no Hospital
Veterinário do Porto, durante o primeiro semestre de
2007, e teve como objectivo o acompanhamento das
consultas de Dermatologia de animais de companhia e
o registo dos casos diagnosticados como reacção de
hipersensibilidade cutânea, de forma a aprofundar
a sua distribuição nos utentes das consultas desta
especialidade num hospital do Norte de Portugal.
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Programa de Computador (QVET) do HVP.
A selecção de amostras de casos a considerar neste
estudo baseou-se na recolha de informações sobre o
animal, com base na análise dos questionários,
disponibilizados pelo Serviço de Dermatologia do
HVP, aos proprietários dos pacientes com sintomatologia do foro dermatológico (Quadro 1), na
anamnese, no exame clínico, na avaliação das lesões
dermatológicas e outros eventuais sinais clínicos,
procedendo-se posteriormente à realização dos meios
auxiliares de diagnóstico.
O diagnóstico dos casos de reacção de hipersensibilidade cutânea foi efectuado com base na anamnese,
no exame clínico e ainda com recurso aos seguintes
meios auxiliares de diagnóstico:
Meios auxiliares de diagnóstico imediatos
a) Raspagens cutâneas: superficiais (Notoedes,
D. gatoi) e profundas (D. cati);
b) Observações com a Lâmpada de Wood
(O. cynotis);
c) Colheitas de pêlos (DTM - dermatofitose,
Tricograma - alopécia auto-infligida);
d) Escovagens de pêlos (observação de fezes de
pulga);
e) Provas da fita adesiva (Cheyletiella).
Meios auxiliares de diagnóstico não imediatos [HI];
f) Culturas fúngicas;
g) Biópsias cutâneas (Auto-imune/Neoplasia);
h) Testes serológicos (Hipersensibilidade);
i) Dietas de restrição (HA);
j) Controlo de pulgas (DAPP).
O diagnóstico de reacção de hipersensibilidade
cutânea foi estabelecido após a exclusão do diagnóstico
de ectoparasitoses, incluindo sarna sarcóptica e demodécica e quando, concomitantemente, se observaram
lesões dermatológicas provocadas por auto-traumatismo, bem como otites recidivantes, mesmo na ausência
de prurido corporal.
As dietas de restrição e o controlo de pulgas foram
mais utilizados como meio de diagnóstico terapêutico
de exclusão, devido ao seu baixo custo e à sua fiabilidade, enquanto os testes serológicos se realizaram
com o intuito de prevenir o contacto com os alergenos
e para eleger a composição alergénica, em caso de
implementação de imunoterapia específica do
alergeno (dessensibilização).
Material e métodos
Os dados apresentados foram obtidos durante o
acompanhamento das consultas de Dermatologia do
Hospital Veterinário do Porto (HVP), no período
compreendido entre Janeiro e Junho de 2007. Neste
período, foram realizadas um total de 1177 consultas
a canídeos e 388 a felídeos, tendo-se registado 554 e
109 casos do foro dermatológico, em cada espécie,
respectivamente.
A informação respectiva foi recolhida através do
46
Resultados
Foram diagnosticados 73 casos de reacção de
hipersensibilidade cutânea em canídeos, ou seja,
13,2% do total de casos que se apresentaram nas 554
consultas dermatológicas realizadas nesta espécie,
durante o período de realização deste trabalho.
Na espécie felina, foram diagnosticados 13 casos de
reacção de hipersensibilidade cutânea, ou seja, 11,9%
Silva S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Quadro 1 - Questionário Dermatológico do Hospital Veterinário do Porto
Queixa principal
Há quanto tempo surgiram as primeiras lesões? ___
Como iniciaram e evoluíram as lesões? ___
Existe história prévia de lesões de pele? ___
Prurido
Tem prurido? Sim___ Não ___
Classificar na escala de 1-5: ___
Quando? Constantemente ___Esporadicamente ___À noite ___
Onde? Cabeça ___ Membros ___ Axilas ___ Região Lombar ___ Generalizado ___
Dieta
O que come habitualmente? Ração enlatada ___ Ração seca ___ Restos de mesa ___ Carne___
Bebe mais água do que o habitual? Sim___ Não ___
Come mais algum tipo de alimentos (ex: vitaminas, tostas biscoitos)? ___
Variação das lesões
Caso a dermatite ocorra com periodicidade anual, as lesões pioram: Na Primavera? ___ No Verão? ___
No Outono? ___
No Inverno? ___
As lesões estão presentes durante todo o ano? Sim ___ Não ___
Se sim, existem períodos em que se atenuam? Sim ___ Não ___
Existe algo que contribua para a melhorar ou agravar a sintomatologia? ___
Quando se iniciaram as lesões? E como evoluíram? ___
Há história prévia de lesões cutâneas? ___
Habitat
Coabita com outros animais? Sim ___ Não ___
Se sim, com quais? Gatos ___ Cães ___ Aves ___ Outros ___
Tem conhecimento se algum destes animais teve ou tem problemas de pele? Sim ___ Não ___
Existem humanos coabitantes com problemas de pele? Sim ___ Não ___
Onde dorme o animal? ___
Banho e Pulgas
O banho exerce influência? Melhora ___ Agrava ___ Indiferente ___
Que produto/champô utiliza? ___
Qual a frequência dos banhos? Semanal ___ Mensal ___ Semestral ___ Outra ___
Quando foi a última vez que observou pulgas neste animal? E nos cohabitantes? ___
Qual é o tratamento e a frequência que tem utilizado para controlo de pulgas? ___
O tratamento é instituído aos coabitantes? Sim ___ Não ___
Medicação
Utilizou medicação prévia? Sim ___ Não ___
Se sim, qual o tipo de medicação? Champôs ___ Banhos ___ Injectáveis ___ Comprimidos ___
Cremes/Pomadas ___ Outro ___
Data do último tratamento: __/__/__
Resposta obtida: Nenhuma ___ Alguma ___ Boa ___
do total de casos das 109 consultas dermatológicas
realizadas nesta espécie.
Em canídeos, as reacções de hipersensibilidade
cutânea foram a quarta dermatopatia mais observada
nas consultas de dermatologia, depois das doenças de
etiologia bacteriana, dos tumores e das doenças de
causa idiopática. As reacções de hipersensibilidade
cutânea em felídeos também foram a quarta
dermatopatia cutânea mais verificada, em simultâneo
com as alterações de queratinização, depois das
doenças de etiologia fúngica, das doenças de causa
idiopática e das neoplasias.
Caracterização da população canina com quadro
de reacção de hipersensibilidade cutânea
As dermatites causadas por reacção de hipersensibilidade, diagnosticadas na amostra de canídeos deste
estudo, incluíram a DAPP (Figura 1), a DA, a HA, a
Urticária e o Angioedema. A DAPP foi a que obteve
maior número de diagnósticos (n=35; 47,9%), seguindo-se a Urticária e o Angioedema (n=18; 19,1%), a
DA (n=14; 16,5%) e, por último, a HA (n=6; 5,5%)
(Figura 2).
A média de idades dos canídeos que se apresentaram à consulta de dermatologia foi de 4,5 anos.
Contudo, todos os casos de reacções de hipersensibilidade cutânea diagnosticados, surgiram em canídeos
com idades compreendidas entre os 8 meses e os 3
anos de idade, tendo sido a idade média de 1,55 anos.
Os casos com diagnóstico de Urticária e Angioedema
(Figura 3) obtiveram a média de idades de 3 anos,
seguindo-se a DA com a média de 1,5 anos e, por fim,
a HA e a DAPP que registaram as médias de idades
mais baixas, respectivamente 8 e 9 meses (Figura 4).
Dos canídeos consultados (n=554) durante esse
47
Silva S et al.
período, houve maior incidência do número de
machos (n=298; 53,8%) do que de fêmeas (n=256;
46,2%). Esta predisposição sexual também se manteve
nos casos diagnosticados como reacção de hipersensibilidade cutânea (machos n=45; 61,6% e fêmeas
n=28; 38,8%), conforme distribuição apresentada na
Figura 5.
A raça que evidenciou maior incidência de doenças
do foro dermatológico foi a SRD (n=286), tendo-se
seguido a raça Labrador Retriever (n=47) e a Pastor
Alemão (n=42). Quanto aos casos diagnosticados
como reacção de hipersensibilidade cutânea, a SRD
(n=37) também foi a raça com maior incidência,
seguindo-se as raças Labrador Retriever (n=14) e a
Pastor Alemão (n=9).
A raça que apresentou mais casos de DAPP e de
Urticária e Angioedema foi a SRD (n=29 e n=7,
respectivamente), a raça predominante na DA (Figura
6) foi a Labrador Retriever (n=7) e na HA (Figura 7)
contabilizaram-se mais casos na raça Pastor Alemão
(n=3), conforme distribuição apresentada no Quadro 2.
Caracterização da população felina com quadro de
reacção de hipersensibilidade cutânea
Os tipos de reacção de hipersensibilidade cutânea
diagnosticados em felídeos incluíram a DA (Figura 8),
a DAPP e a HA.
A DA (n=6; 46,1%), foi a que obteve maior número
de casos clínicos, seguindo-se a DAPP (n=5; 38,5%)
e, por último, a HA (n=2; 15,4%) (Figura 9).
Os felídeos com problemas do foro dermatológico
apresentaram uma média de idades de 3,9 anos.
A idade dos felídeos com casos de reacção de
hipersensibilidade cutânea situou-se entre os 6 meses
e os 2 anos de idade, tendo sido a média de idades de
1,4 anos. A DA registou-se em felídeos com a média
de idades de 2 anos, a DAPP com a de 1,5 anos e a HA
(Figura 10) com a de 6 meses (Figura 11).
Durante o período no qual decorreu este estudo,
registou-se um total de 109 felídeos consultados no
HVP, havendo maior incidência do número de machos
(n=69; 63,3%) do que de fêmeas (n=40; 36,7%).
Quanto aos quadros de reacção de hipersensibilidade cutânea diagnosticados, a espécie felina revelou
a predominância do número de fêmeas (fêmeas n=7;
53,8% e machos n=6; 46,2%), conforme distribuição
apresentada na Figura 12.
Os felídeos que se apresentaram à consulta de
dermatologia eram maioritariamente da raça Europeu
Comum (n=103), seguindo-se as raças Persa (n=5) e
Siamês (n=1).
Todos os casos de reacção de hipersensibilidade
cutânea em felídeos foram diagnosticados unicamente
na raça Europeu Comum.
48
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Discussão
No primeiro semestre de 2007, foram realizadas 554
consultas dermatológicas a canídeos e 109 a felídeos,
representando, respectivamente, 47,1% e 28,1% do
total de consultas do HVP, o que significa que as
doenças do foro dermatológico mantêm elevada
expressão no número de consultas realizadas a
animais de companhia, o que está de acordo com a
bibliografia (Mur, 1997; Ackerman e Nesbitt, 1998;
Scott et al., 2001; Medleau e Knilica, 2006).
Os tipos de reacção de hipersensibilidade cutânea
obtiveram, em ambas as espécies de animais de
companhia, o 4º lugar entre as dermatopatias mais
frequentemente diagnosticadas. Estes resultados estão
de acordo com Brazis (2007), que referem que a
incidência desta doença, tal como na Medicina
Humana, tem vindo a manter-se elevada (Deboer,
2004).
Os canídeos observados apresentavam idades
compreendidas entre os 8 meses e os 3 anos de idade,
pelo que se encontravam enquadrados nas faixas
etárias descritas para as situações de reacção de
hipersensibilidade cutânea (Medleau e Knilica, 2006),
ao contrário de outras dermatopatias (Debraekeleer,
2006; López, 2007).
Nos canídeos, a DAPP foi a hipersensibilidade mais
diagnosticada, o que está de acordo com a bibliografia
consultada (Day, 1999; Beugnet et al., 2009), que a
indica como a hipersensibilidade mais frequente,
devido às condições climatéricas favoráveis ao
desenvolvimento do ciclo da pulga, o que, consequentemente, vai determinar a sua grande incidência
nos meses mais quentes.
A média de idade obtida na DAPP foi de 8 meses de
idade, o que está de acordo com o facto da DAPP se
encontrar descrita em cães muito jovens, podendo, na
maioria dos casos, surgir em animais com menos de
seis meses de idade (Ackerman e Nesbitt, 1998).
O segundo tipo de reacção de hipersensibilidade
cutânea mais identificado foi a Urticária e o
Angioedema, contudo segundo Day (1999), estas
reacções de hipersensibilidade deveriam ocupar um
lugar com menor destaque, uma vez que são consideradas menos frequentes, contradizendo, desta forma,
os resultados obtidos. Julgamos que estes resultados
contraditórios se devem ao aparecimento de um maior
número de insectos provocado pelo volume crescente
de resíduos urbanos produzidos na cidade do Porto e
também devido às temperaturas elevadas que se registaram nos últimos anos.
A Urticária e o Angioedema foram observados em
cães com a idade média de 3 anos, contudo os autores
Medleau e Knilica (2006) referem que estas são pouco
comuns em cães, podendo ocorrer em qualquer fase
da vida do animal.
Silva S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Figura 1 - DAPP Dermatite pruriginosa na zona dorsolombar acompanhada de hiperqueratose, em canídeo (Fotografia gentilmente cedida
pelo HVP, 2007).
35
18
14
HA
DA
Urticária e
Angioedema
6
DAPP
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Figura 2 - DAPP - Tipos de reacção de hipersensibilidade cutânea em
canídeos.
1,5
2
0,9
1
DAPP
HA
DA
0,8
Urticária e
Angioedema
0
HA
3
40
35
30
25
20
15
10
5
0
DA
3
Urticária e
Angioedema
4
DAPP
Figura 3 - Urticária (à esquerda) e Angioedema (à direita) em canídeo (Fotografia gentilmente cedida pelo HVP, 2007).
Sexo F
Sexo M
Figura 4 - Média de idades dos canídeos com quadro de reacção de
hipersensibilidade cutânea.
Figura 5 - Distribuição por sexo dos canídeos com quadro de reacção de
hipersensibilidade cutânea.
Figura 6 - DA congestão e alopécia periocular em canídeo (Fotografia
gentilmente cedida pelo HVP, 2007).
Figura 7 - HA eritema abdominal em canídeo (Fotografia gentilmente
cedida pelo HVP, 2007).
49
Silva S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Quadro 2 - Distribuição por raça dos canídeos com reacção de hipersensibilidade cutânea
Diagnóstico
DAPP
Urticária e
Angioedema
DA
HA
Raça
SRD
P. Alemão
G. Afegão
Labrador Retriever
Jack Russel
Pinher
Beagle
SRD
West Highland
White Terrier
Labrador Retriever
Weimaraner
P. Alemão
Labrador Retriever
SRD
Para o caso da DAPP, assim como para a Urticária e
o Angioedema, não foi encontrada nenhuma predisposição racial, uma vez que estas surgiram em animais
de varias raças, o que está de acordo com Scott et al.
(2001), que defendem a não predisposição racial
destas reacções de hipersensibilidade cutânea.
Não se registaram casos de Dermatite Alérgica de
Contacto, no período em que este estudo decorreu,
apesar de Day (1999) considerar esta reacção de
hipersensibilidade como sendo mais frequente do
que a Urticária e o Angioedema. Podemos atribuir a
ausência de registo de casos com este tipo de hipersensibilidade à sua dificuldade de diagnóstico.
A terceira reacção de hipersensibilidade cutânea
com maior incidência foi a DA o que está de acordo
com a bibliografia consultada, que a refere como
sendo uma das mais frequentes em cães (Day, 1999;
Medleau e Knilica, 2006).
A DA apresentou uma média de idades de 1,5 anos,
o que está de acordo com alguns autores que defendem que os primeiros sintomas se manifestam entre o
primeiro e o terceiro ano de idade (Scott et al., 2001;
Sub-total
29
6
1
5
3
1
1
7
Total
35
18
4
7
14
3
3
2
1
6
Medleau e Knilica, 2006; Fraser et al. 2008).
A DA foi diagnosticada em canídeos das raças West
Highland White Terrier, Labrador Retriever e também
a Weimaraner, o que é confirmado por Scott et al.
(2001), que referem as raças West Highland White
Terrier e Labrador Retriever como as mais afectadas
por este tipo de reacção de hipersensibilidade e por
Pico et al. (2008) que referem a West Highland White
Terrier.
A HA foi a quarta reacção de hipersensibilidade
cutânea mais frequente, no entanto, segundo Jackson
(2007), esta dermatopatia é considerada o terceiro tipo
de hipersensibilidade mais frequente.
Segundo Jackson (2007), os sinais clínicos da HA
tornam-se evidentes nos cachorros ou em adultos
jovens, antes dos 3 anos de idade, contudo, as
primeiras manifestações podem surgir desde os seis
meses até aos doze anos de idade. Os resultados
obtidos enquadram-se neste intervalo, embora mais
próximos do limite inferior, com uma média de idades
de 0,9 meses.
Neste estudo, a HA foi observada em canídeos das
8
6
6
5
4
Figura 8 - DA lesão alopécica na zona inguinal de um felídeo.
50
DAPP
DA
0
HA
2
2
Figura 9 - Tipos de reacção de hipersensibilidade cutânea em felídeo.
Silva S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
Figura 10 - HA queílite (à esquerda) e blefarite unilateral (à direita) num felídeo (Fotografia gentilmente cedida pelo HVP, 2007).
1
0,6
0,5
HA
DAPP
DA
0
3
2
3
3
2
HA
1,5
1,5
7
6
5
4
3
2
1
0
DAPP
2
2
DA
2,5
Sexo F
Sexo M
Figura 11 - Média de idades com quadro de reacção de hipersensibilidade cutânea em felídeos.
Figura 12 - Distribuição por sexo, dos felídeos com quadro de reacção
de hipersensibilidade cutânea.
raças Labrador Retriever, Pastor Alemão e SRD,
estando de acordo com alguns autores consultados
(Jackson, 2007) que referem a Labrador Retriever
como a raça que apresenta um risco acrescido de
desenvolver este tipo de manifestação de reacção de
hipersensibilidade, contrariamente ao verificado por
Picco et al. (2008) num estudo retrospectivo realizado
na Suiça, em que estas três raças não foram registadas
como predispostas para este tipo de reacção de
hipersensibilidade.
Todos os casos de reacção de hipersensibilidade
cutânea em canídeos apresentaram uma ligeira
predominância do número de machos em relação ao
número de fêmeas, contudo, estes resultados não estão
exactamente de acordo com alguns autores que defendem que não existe predisposição sexual em nenhuma
destas reacções de hipersensibilidade (Ackerman e
Nesbitt, 1998; Matheus, 1998; Scott et al., 2001;
Jackson, 2007). A justificação pode ser encontrada
devido ao maior número de machos que se apresentou
às consultas de dermatologia.
As reacções de hipersensibilidade cutâneas diagnosticadas em felídeos registaram o total de 13 casos,
tendo sido a DA a que obteve maior número de casos,
seguindo-se a DAPP, e, por último, a HA. Contudo, tal
como acontece na espécie canina, a DAPP é descrita
como sendo a que afecta maior número de felídeos,
seguindo-se a DA e a HA (Day, 1999). No entanto, a
diferença obtida entre o número de casos obtidos na
DAPP e na DA não foi significativa, pelo que
podemos afirmar que os resultados vão de encontro ao
que é defendido pela bibliografia.
No que se refere à idade, verificou-se que as
reacções de hipersensibilidade cutâneas afectaram os
felídeos entre os 6 meses e os 2 anos de idade, contudo, os autores defendem que, de um modo geral, estas
dermatopatias em felídeos podem surgir em qualquer
idade (Medleau e Knilica, 2006).
Ackerman e Nesbitt (1998) referem que, em
felídeos, a idade do aparecimento da DA é variável,
podendo surgir desde os seis meses aos oito anos de
idade, embora, a maioria dos casos observados ocorram em gatos jovens, com idade variável entre os seis
meses e os três anos de idade. A média de idades obtida (2 anos) encontra-se na faixa etária, mencionada
pelos autores, como sendo a mais frequente. Também
as médias de idades obtidas nos casos diagnosticados
como DAPP (1,5 anos) e HA (0,6 meses) se
enquadravam nas faixas etárias descritas para estas
reacções de hipersensibilidade (Medleau e Knilica,
51
Silva S et al.
2006).
A espécie felina revelou a predominância quase
irrelevante do número de fêmeas, nos casos de
hipersensibilidade diagnosticados, o que está de
acordo com as várias referências bibliográficas da não
existência de predisposição sexual (Ackerman e
Nesbitt, 1998; Guaguère e Prélaud, 1999; Jackson,
2007).
A única raça afectada por estas reacções de
hipersensibilidade foi a Europeu Comum. Contudo, os
autores Guaguère e Prélaud (1999) referem que não
existe predisposição racial para nenhum tipo de
reacção de hipersensibilidade cutânea na espécie
felina. Como tal, os resultados obtidos podem
significar, apenas, que a raça Europeu Comum foi a
mais consultada, facto também verificado nas
restantes doenças do foro dermatológico.
A abordagem terapêutica seguida nos casos clínicos
descritos consistiu numa terapia convencional conservativa, que incluiu desde o controlo de ectoparasitas,
passando pelo tratamento médico sintomático
(anti-histaminícos, anti-inflamatórios e suplementos
com ácidos gordos essenciais), com antibioterapia
dirigida nos animais afectados com piodermatites
secundárias, até à implementação de técnicas de
imunoterapia alergeno-específicas, sempre baseada
num bom algoritmo de diagnóstico (clínico e
serológico), de acordo com os manuais de dermatologia e artigos científicos (Ackerman e Nesbitt, 1998;
Scott et al., 2001; DeBoer e Hillier, 2001; DeBoer,
2004; Medleau e Knilica, 2006). De acordo com estes
autores, e com base nos fundamentos imunológicos,
os testes serológicos realizados não devem ser utilizados na avaliação inicial do paciente como testes de
triagem mas sim após a obtenção de um diagnóstico
clínico definitivo, com o objectivo de identificar os
alergenos específicos, com vista à realização de
autovacinas (DeBoer e Hillier, 2001; Griffin e
Hillier, 2001; Deboer, 2004; Prélaud, 2005) e da
sua implementação, no âmbito de um programa de
dessensibilização. Este programa consiste na aplicação, a um animal sensível, de doses gradualmente
crescentes de extratos do alergeno, em intervalos de
tempo predeterminados, na tentativa de reverter o
estado de hipersensibilidade.
Foi possível concluir que as consultas do foro
dermatológico continuam a representar um número
muito significativo das consultas em canídeos e
felídeos e que as reacções de hipersensibilidade
cutânea constituem um número significativo dessas
consultas (13,2%) no Norte do Portugal.
Em canídeos, a DAPP foi a reacção de hipersensibilidade mais frequente, seguida do Angioedema e
Urticária, da DA e da HA, afectando os animais mais
jovens, pertencentes às raças SRD, Labrador Retriever
e Pastor Alemão.
Em felídeos, a DA foi a hipersensibilidade mais
frequente, seguindo-se a DAPP e a HA, afectando
52
RPCV (2009) 104 (569-572) 45-53
maioritariamente gatos jovens, da raça Europeu
Comum.
A distribuição obtida encontra-se de acordo com
outros estudos de casuística internacionais, ressaltando, contudo, o número elevado de casos de
Angioedema e Urticária em canídeos, bem como a
ausência de casos diagnosticados de Dermatite
Alérgica de Contacto e a DA com maior número de
casos registados do que a DAPP, em felídeos.
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RPCV (2009) 104 (569-572) 55-60
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Parâmetros ecocardiográficos de cães cronicamente infectados com
Trypanosoma cruzi (Cepa Colombiana)
Echocardiographic parameters of dogs chronically infected by
Trypanosoma cruzi (Colombian strain)
João P.E. Pascon1*, Marlos G. Sousa2, Aparecido A. Camacho1
1
Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP,
Câmpus de Jaboticabal – SP, Brasil
2
Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade Federal do Tocantins,
Câmpus de Araguaína – TO, Brasil
Resumo: No continente Americano, aproximadamente 15
milhões de pessoas são acometidas pela doença de Chagas. O
cão é considerado modelo experimental, mas também é afetado
por essa doença ainda desconhecida pelos médicos veterinários.
Desta forma, foram caracterizadas, as anormalidades ecoDopplercardiográficas de cães cronicamente infectados com a cepa
Colombiana do Trypanosoma cruzi. A ecoDopplercardiografia
revelou inversão das ondas E e A mitral (0,71±0,17), diminuição no tempo de relaxamento isovolumétrico e hipocinesia
septal, confirmando a disfunção diastólica presente nos cães
avaliados. Portanto, a caracterização ecocardiográfica destes
cães, traz subsídios técnicos que possibilitam o reconhecimento
desta afecção, que a despeito de sua importância é pouco
conhecida na espécie canina.
Palavras-chave: Animal, cardiomiopatia, doença de Chagas
Summary: On the American continent, almost 15 million
people are affected by Chagas disease. Dogs are considered to
be an excellent experimental model to study Chagas disease,
and are also affected by although the disease is infrequently
recognized by Veterinarians. As a result, the characterisation of
echocardiograph abnormalities was performed in dogs which
had a chronic experimental infection with Trypanosoma cruzi
(the Colombian strain). The spectral Doppler echocardiography
showed E and A mitral wave reversal (0.71±0.17), decrease
in the isovolumetric relaxation time and septal hypokinesy
confirming the presence of diastolic dysfunction present. In this
way, the echocardiograph characterisation of the animals in this
study increases the knowledge about this condition, increasing
the awareness for recognition of this frequent and important
disease, but until now obscure for the canine species.
Keywords: Animal, cardiomyopathy, Chagas disease
*Correspondência: [email protected]
Tel: +55 (16) 3209-2626
Introdução
A cardiomiopatia chagásica ou tripanossomíase
sul-americana é uma doença que há muitos anos aflige
o continente Americano. Evidências foram encontradas em cadáveres mumificados, na América do Sul,
com aproximadamente 4.000 anos de idade, contendo
material gênico do Trypanosoma cruzi (Guhl et al.,
1997). Popularmente conhecida como doença de
Chagas, é provocada pelo protozoário hemoflagelado
Trypanosoma cruzi (Chagas, 1909abc), pertencente à
ordem Kinetoplastida, família Trypanosomatidae,
gênero Trypanosoma, seção Stercoraria, e transmitida
por intermédio das fezes dos vetores conhecidos
popularmente no Brasil como barbeiros, nos países
latino-americanos como “chinche” e nos Estados
Unidos da América como “Kissing bug”, pertencentes
à ordem Hemítera, família Reduviidae, subfamilia
Triatominae (WHO, 1974).
Atualmente, 15 milhões de pessoas que habitam o
território compreendido entre o México e a Argentina
são afetadas por esta doença (WHO, 2007), e 28
milhões vivem sob o risco de adquiri-la (WHO, 1991),
representando assim um dos maiores problemas de
saúde das Américas do Sul e Central (Prata, 1994).
Segundo Wanderley e Corrêa (1995), Marin Neto et
al. (1999), a globalização imprime importante participação na disseminação da doença, a exemplo da
estimativa sorológica positiva para doença de Chagas
em meio milhão de pessoas nos Estados Unidos da
América.
Nos cães, pouco se conhece acerca da real incidência e suas implicações clínicas ao longo do tempo, em
condições naturais. Estudos envolvendo 50 cães de
proprietários portadores da doença de Chagas, na cidade
de Botucatu-SP, e regiões próximas, indicaram 86%
de cães positivos para T. cruzi, em pelo menos um dos
testes aplicados (xenodiagnóstico, hemocultura e
55
Pascon JPE et al.
PCR), demonstrando a ocorrência do ciclo de transmissão e disseminação da doença, ainda nos dias de
hoje (Lucheis et al., 2005). A prevalência sorológica
positiva em cães, na região rural do estado do Mato
Grosso do Sul, foi recentemente descrita em 22,7%
(Souza et al., 2009). Embora presente, menor
prevalência foi observada nos cães do estado norte
americano do Texas, com 2,6% de positividade
(Shadomy et al., 2004).
Clinicamente, os cães afetados apresentam vasta
gama de sinais clínicos, variando de assintomáticos à
ocorrência de óbito súbito, dificultando o diagnóstico.
Neste intuito, a ecocardiografia vem se mostrando
ferramenta fundamental, com capacidade de detectar
alterações prévias a anormalidades eletrocardiográficas
ou radiográficas, auxiliando no diagnóstico e controle
do quadro patológico. Em adição, a ecocardiografia
é um exame dotado de singular sensibilidade, de
execução rápida, não possuindo caráter invasivo
(Acquatella et al., 1980; Mady et al., 1997; BorgesPereira et al., 1998; Marques et al., 2006). Entretanto,
o desconhecimento do clínico veterinário sobre esta
afecção, aliado a diferenças de comportamento natural
entre as cepas e a falta de estudos a longo prazo,
subestimam a real incidência desta doença nesta
espécie.
Desta forma, concebeu-se o presente ensaio com o
intuito de se avaliar as possíveis alterações ecoDopplercardiográficas de cães cronicamente infectados
pelo T. cruzi, cepa Colombiana, na tentativa de suprir
parte da deficiência encontrada pelo profissional
atuante na cardiologia e clínica médica de pequenos
animais, bem como na conscientização dos mesmos
sobre a importância deste diagnóstico para saúde
pública.
Material e métodos
Indução da cardiomiopatia chagásica crônica e
cronologia experimental
O T. cruzi (cepa Colombiana), cultivado em
camundongos albinos pelo Departamento de
Parasitologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas
de Ribeirão Preto, pertencente à Universidade de São
Paulo – Brasil, foi inoculado, via intraperitoneal, em
treze cães, sem raça definida, fêmeas, com idade entre
um e dois anos e peso corporal médio de 11,64±3,5,
na dose de 1.000 tripomastigotas por quilograma de
peso vivo. Antes e após três anos da inoculação, os
animais foram submetidos ao teste sorológico de
imunofluorescência indireta (RIFI), na diluição de
1:20 até 1:5120. Cada soro-controle negativo foi
diluído a 1:40.
Os animais foram mantidos em canis individuais,
higienizados diariamente, recebendo água e ração
“ad libitum”, durante todo período experimental.
56
RPCV (2009) 104 (569-572) 55-60
Previamente, os cães foram imunizados para os vírus
da cinomose, hepatite infecciosa canina, parvovirose,
rotavirose e dois sorovares da bactéria leptospira.
Durante os 10 anos de infecção, amostras sanguíneas
e eletrocardiográficas mensais foram coletadas, interpretadas e retratadas em publicação recente (Pascon et
al., 2010). Entretanto, ao final do protocolo experimental (10 anos) e aquisição do recurso diagnóstico,
os sete cães sobreviventes e assintomáticos foram
submetidos à avaliação ecocardiográfica única. Seis
cães apresentaram morte súbita durante este período e,
portanto, não participaram deste estudo.
Ecocardiografia
O estudo ecocardiográfico foi realizado por meio de
aparelho de ecodopplercardiografia (Aparelho 300 S
Pandion Vet – Pie Medical). Os modos bidimencional,
modo – M e Doppler (pulsado, contínuo e de fluxo em
cores) foram desenvolvidos com transdutor bifreqüencial de 5,0 – 7,5 MHz, sendo os dados armazenados na
memória do aparelho para posterior mensuração e
cálculo. As variáveis ecocardiográficas analisadas
incluíram: diâmetro interno do ventrículo esquerdo
(DIVE) e direito (DIVD), espessura do septo
interventricular (SIV) e espessura da parede livre do
ventrículo esquerdo (PLVE), sendo todas as referidas
variáveis verificadas no fim da diástole (d) e no fim
da sístole (s), somente o DIVD foi mensurado apenas
na diástole. As variáveis foram calculadas com base
em imagens ecocardiográficas obtidas através do
modo-M da janela paresternal direita, em seu eixo
transversal, no plano das cordas tendíneas, sendo
considerado como valor final a média de três ciclos
cardíacos.
Os índices funcionais, como fração de encurtamento [FS=(DIVEd-DIVEs)/DIVEd x 100] e fração de
ejeção (EF) foram calculados por meio do modo-M
(método de Teicholz), o débito cardíaco (DC), por sua
vez, foi obtido pela imagem espectral bidimensional
do fluxo sanguíneo pulmonar, utilizando o recurso
Doppler pulsado. O tempo de relaxamento isovolumétrico (TRIV), também foi calculado na janela
paresternal esquerda, corte apical cinco câmaras, pelo
Doppler da via de saída do ventrículo esquerdo. O
diâmetro da aorta e do átrio esquerdo foram mensurados no modo bidimensional, na janela paresternal
direita, eixo transversal, plano dos vasos da base,
e posteriormente foi calculada a relação átrio
esquerdo/aorta.
Por meio da ecocardiografia Doppler, foram identificados os fluxos sangüíneos no coração, grandes
vasos e quantificados quanto à direção, velocidade e
turbulência, estabelecendo a presença ou ausência de
insuficiência valvar decorrente de regurgitações
(Möise, 1988, 1994; Bond, 1991; Henik, 1995; Kienle
e Thomas, 1995).
A função diastólica do miocárdio foi analisada pelos
Pascon JPE et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 55-60
parâmetros ecocardiográficos de TRIV, relação das
ondas E/A do fluxo mitral e observação dos padrões
de relaxamento miocárdico.
Comitê de ética
O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética
para o uso de animais, por respeitar os critérios adotados pela Escola Brasileira de Experimentação (nº do
protocolo: 017551-07).
Resultados
As variáveis ecoDopplercardiográficas descritas na
metodologia acima, encontram-se organizadas sob a
forma de tabelas (Tabelas 1, 2 e 3). A disfunção
diastólica foi alteração mais frequentemente observada
e constatada pelo padrão invertido da relação Doppler
espectral transmitral das ondas E/A (Figura 1A e Tabela
3), juntamente com a hiposinesia do septo interventricular (Figura 2) e diminuição do TRIV (Tabela 2).
Figura 1 - Imagens ecocardiográficas, obtidas de cães adultos, fêmeas, portadores de cardiomiopatia chagásica crônica. A, imagem paresternal apical
esquerda e fluxo Doppler transmitral espectral, ilustrando a inversão das ondas E e A (disfunção diastólica). B, imagem apical esquerda quatro câmaras,
evidenciando regurgitação em valva tricúspide em Doppler em cores e contínuo (setas).
Tabela 1 - Valores individuais, médios e desvios-padrão das dimensões ventriculares durante a sístole e diástole, atriais esquerdas,
aórticas e índices funcionais obtidos de sete cães adultos, fêmeas, portadores de cardiomiopatia chagásica crônica.
DIVDd
SIVd
DIVEd
PLVEd
SIVs
DIVEs
PLVEs
EF%
FS%
dAO
dAE
AE/AO
Área AE
ES
Slope
Peso (Kg)
M8
0,47
0,86
3,2
1,08
1,12
1,55
1,15
84
52
2,21
2,35
1,06
6,97
0,29
7,3
10,8
R1
0,81
0,86
2,9
0,81
1,1
2,09
1,26
56
28
1,94
1,99
1,03
7,36
0,31
12,1
12
R2
0,34
0,81
3,08
0,97
1,03
1,82
1,19
73
41
2,34
2,48
1,06
9,58
0,22
1,01
15,5
Animais
M1
0,4
0,81
3,26
0,81
1,08
1,89
1,35
74
42
1,8
2,1
1,17
11,35
0,29
5,3
16,4
M4
0,36
0,74
2,95
0,58
0,99
1,6
1,08
79
46
1,55
2
1,29
7,41
0,45
5,9
8,3
M5
1,03
0,74
2,54
0,76
0,99
1,84
1,03
56
27
1,53
1,75
1,14
4,97
0,4
12,2
6,7
M10
0,72
0,92
3,38
1,01
1,62
1,89
1,44
76
44
1,33
2,32
1,74
9,39
0,25
10,1
11,8
Média±DP
0,59±0,26
0,82±0,06
3,04±0,27
0,86±0,17
1,13±0,22
1,81±0,18
1,21±0,14
71,14±10,96
40,00±9,25
1,81±0,37
2,14±0,25
1,21±0,25
8,15±2,10
0,32±0,08
7,70±4,06
11,64±3,51
DIVDd - Diâmetro interno do ventrículo direito em cm; SIVd/s - Septo interventricular durante a diástole/sístole em cm; DIVEd/s- Diâmetro interno
do ventrículo esquerdo durante a diástole/sístole em cm; PLVEd/s - Parede livre do ventrículo esquerdo durante a diástole/sístole em cm; EF% - Fração
de ejeção; FS% - Fração de encurtamento; dAO - Diâmetro da artéria aorta em cm; dAE - Diâmetro do átrio esquerdo em cm; AE/AO - Relação AE/AO;
Área AE - Área do AE em cm2; ES - Distância do ponto E ao septo em cm; Slope - Slope da onda E mitral em cm/s; DP - Desvio Padrão.
Tabela 2 - Valores individuais, médios e desvios-padrão do DC, TRIV e PPE obtidos de sete cães adultos, fêmeas, portadores de
cardiomiopatia chagásica crônica.
DC
L/minuto
L/kg
TRIV
PPE
Peso (Kg)
M8
R1
R2
Animais
M1
M4
M5
M10
Média±DP
1,08
0,1
69
61
10,8
2,61
0,21
54
58
12
2,1
0,13
64
61
15,5
2,34
0,14
61
61
16,4
1,25
0,15
42
64
8,3
1,15
0,17
54
70
6,7
0,84
0,07
58
75
11,8
1,62±0,70
0,14±0,04
57,43±8,6
64,29±6,04
11,64± 3,51
DC - Débito cardíaco; TRIV - Tempo de relaxamento isovolumétrico em milisegundos; PPE - Período de pré-ejeção em milisegundos; DP - Desvio
padrão.
57
Pascon JPE et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 55-60
Apenas um cão (M5) apresentou regurgitação
tricúspide com velocidade 3,23 m/s e gradiente de
regurgitação 41,8 mmHg (Figura 1B). As imagens
ecocardiográficas deste animal foram compatíveis
com o diagnóstico de degeneração mixomatosa de
valva tricúspide, não correlacionada à doença de
Chagas. Não foi observada cardiomegalia em nenhum
cão, a luz deste exame complementar.
Discussão
O exame auxiliar ecoDopplercardiográfico mostrou-se exequível e muito eficiente na observação da
função hemodinâmica dos cães com cardiomiopatia
chagásica crônica. Embora existam diversos indicadores ecocardiográficos da função diastólica, os picos
de velocidades das ondas E (PEV) e A (PAV), a
relação PEV/PAV e TRIV se destacam pela fácil
realização e extrema relevância (Nishimura e Tajik,
1997). No presente trabalho, a disfunção diastólica do
ventrículo esquerdo foi principalmente evidenciada
pelo padrão invertido da relação Doppler espectral
transmitral das ondas E/A, corroborando os dados de
Barros et al. (2002), Alves (2003) e Carod-Artal et al.
(2003). Em menores proporções, o TRIV e a hipocinesia septal também indicaram a presença de disfunção
diastólica.
Segundo Schober e Fuentes (2001), a idade dos cães
influencia inversamente nos índices PEV/PAV e TRIV.
Pereira et al. (2009), porém, não observaram correlação significativa entre a idade e o TRIV de cães.
Figura 2 - Imagen paresternal direita, eixo transversal, em nível cordal,
evidenciando hipocinesia de septo interventricular (seta), obtida de cão
adulto, fêmea, portador de cardiomiopatia chagásica crônica.
Neste contexto, a idade dos cães aqui avaliados exige
cautela na interpretação dos resultados. Entretanto, a
análise macro e microscópica do miocárdio dos cães
infectados revelaram intensa fibrose cardíaca, não
deixando dúvidas quanto à presença de disfunção nos
cães deste ensaio.
Clinicamente, a disfunção cardíaca apresentada não
resultou em sintomatologia, exceto pela ocorrência de
morte súbita em seis dos sete cães estudados, em
período de 30 dias (M10) há 13 meses (M5) após
avaliação ecocardiográfica. Um cão (M8) foi sacrificado após tentativas terapêuticas mal sucedidas para
mastocitoma em região distal de membro torácico e
pescoço, diagnosticado três anos após o fim do período experimental. Desta forma, assim como observado
Tabela 3 - Valores individuais, médios e desvios-padrão dos fluxos mitral, pulmonar, aórtico e tricúspide, obtidos de sete cães
adultos, fêmeas, portadores de cardiomiopatia chagásica crônica.
Mitral
PEVm/s
PAVm/s
PEV/PAV
PPGE mmHg
PPGA mmHg
Pulmonar
VMAX m/s
GMAX mmHg
Aorta
VMAX m/s
GMAX mmHg
Tricúspide
PEVm/s
PAVm/s
PEV/PAV
PPGE mmHg
PPGA mmHg
Peso (kg)
M8
R1
R2
Animais
M1
M4
M5
0,45
0,68
0,66
0,8
1,8
0,5
0,74
0,67
1
2,2
0,43
0,63
0,63
0,7
1,6
0,46
0,64
0,71
0,8
1,6
0,55
0,82
0,67
1,2
2,7
0,5
1
0,7
2
-
0,74
2,2
0,78
2,4
0,9
3,3
0,65
1,7
10,8
12
15,5
M10
Média±DP
0,43
0,73
0,58
0,7
2,1
0,57
0,51
1,11
1,3
1
0,48±0,05
0,68±0,09
0,71±0,17
0,93±0,24
1,86±0,54
0,84
2,8
0,84
2,8
0,64
1,6
0,71±0,12
2,07±0,70
0,87
3
1,04
4,3
0,86
3
1,02
4,1
0,87±0,13
3,11±0,90
16,4
0,9
0,55
1,63
3,3
1,2
8,3
0,45
0,65
0,69
0,8
1,7
6,7
0,51
0,25
2,04
1
0,3
11,8
0,62±0,24
0,48±0,20
1,45± 0,69
1,70±1,38
1,07±0,70
11,64± 3,51
PEV - Pico de velocidade da onda E; PAV - Pico de velocidade da onda A; PPGE - Pico do gradiente de pressão da onda E; PPGA - Pico do gradiente
de pressão da onda A; VMAX - Velocidade máxima do fluxo; GMAX - Gradiente máximo do fluxo; DP - Desvio padrão.
58
Pascon JPE et al.
para outras afecções cardíacas (Werner et al., 1993),
a disfunção diastólica comportou-se como indicador
prognóstico para cardiopatia experimental utilizada.
Em seres humanos com cardiomiopatia chagásica,
durante o período assintomático, o exame ecocardiográfico também se destaca por detectar alterações
diastólicas precoce às sistólicas, mesmo na ausência
de sinais clínicos ou eletrocardiográficos sugestivos
(Marin-Neto et al., 2000, Marques et al., 2006).
Embora as considerações descritas para seres
humanos se assemelhem aos resultados aqui apresentados, não foi observada disfunção sistólica, nem
realizada avaliação ecocardiográfica pareada que
permitisse tais considerações.
De acordo com Barros et al. (2002), a miocardite
chagásica implica danos às fibras do miocárdio,
componentes do sistema de sustentação, interstício,
sistema excitocondutor e integridade vascular, de
forma focal, podendo culminar em disfunção ventricular, detectável por meio da ecocardiografia Doppler.
Possivelmente, a fibrose miocárdica promovida pela
infecção experimental pelo T. cruzi, em sua fase
crônica, possa ser responsável pela disfunção diastólica observada, bem como pela ocorrência de morte
súbita por arritmias ventriculares.
Cardiomegalia pode ser percebida durante o exame
ecocardiográfico de animais (Meurs et al., 1998;
Alves, 2003) e seres humanos com doença de Chagas
(Barros et al., 2002; Carod-Atal et al., 2003; Nunes et
al., 2004). Todavia, no presente estudo experimental,
não houve dilatação de câmaras, mostrando o comportamento da cepa Colombiana envolvida, levando
principalmente a um quadro de fibrose do miocárdio,
resultando em disfunção diastólica. Hipocinesia de
septo interventricular foi detectada nos cães experimentados, corroborando os dados de Alves (2003) em
cães, Borges-Pereira et al. (1998) e Marques et al.
(2006) em seres humanos, portadores de cardiomiopatia chagásica crônica.
De acordo com as condições em que esse estudo foi
realizado, conclui-se que a cardiomiopatia chagásica
crônica (cepa Colombiana), em cães, é caracterizada
sob o aspecto ecocardiográfico por disfunção diastólica.
Desta forma, o presente ensaio ajuda a desmistificar a
doença de Chagas na espécie canina, chamando atenção
para sua característica ultrasonograficas, trazendo informações singulares para o clínico veterinário.
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R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Caracterização de agressões entre canídeos (83 casos)
Characterization of dog-to-dog aggression (83 cases)
Sofia Mouro*, Cristina L. Vilela, Manuela R.E. Niza
CIISA/Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa
Av. da Universidade Técnica, Pólo Universitário Alto da Ajuda, 1300-477 Lisboa – Portugal
Resumo: A agressividade é considerada um comportamento
multifactorial, frequentemente observada em canídeos, dirigida
na sua maioria contra animais da mesma espécie. Este estudo,
que teve como objectivo fazer uma primeira abordagem
sistematizada das agressões entre canídeos, reuniu 83 casos
observados na Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade
Técnica de Lisboa, e na Clínica Veterinária Azevet, em Azeitão.
A informação foi recolhida através de um questionário aplicado
aos proprietários dos animais presentes à consulta, aqui considerados como "agredidos". Verificaram-se em média 7,5
agressões mensais, tendo a maior parte ocorrido no exterior,
quer na via pública (43,4%) quer no exterior das habitações
(42,2%). Do total dos canídeos envolvidos nas agressões, 54,2%
eram de raça pura, a maioria eram machos inteiros e 13,3% dos
agressores pertenciam a raças legalmente consideradas como
potencialmente perigosas. A maioria dos canídeos habitava no
exterior e tinha acesso à via pública. Observou-se uma probabilidade significativamente mais elevada de animais jovens
agredirem outros mais idosos. Pelo menos 52,8% dos
agressores eram reincidentes e 13,2% tinham previamente
demonstrado agressividade dirigida contra humanos. As medidas de contenção legalmente estipuladas não eram cumpridas
em 34,4% dos animais. Pelo menos 16,3% não possuiam
vacina anti-rábica actualizada e em 39,2% o estado vacinal
era desconhecido. As características multifactoriais da
agressividade em canídeos, com aspectos inerentes ao animal,
ao proprietário e ao ambiente envolvente, requerem o estabelecimento de parcerias multidisciplinares, que possibilitem a
delineação de medidas preventivas eficazes.
Summary: Aggression is a multifactorial behavior pathology
frequently observed in dogs, mostly directed to the same animal
species. This study, that aimed at performing a first evaluation
of aggression between dogs, comprises 83 cases presented at the
Faculty of Veterinary Medicine, Technical University of Lisbon,
and at a private practice (Azevet, Azeitão). The information was
gathered though a questionnaire applied to the owners of the
dogs present to consultation, here considered as "bitten dogs".
The average number of monthly aggressions was 7.5, the
majority of which (43.3%) took place outdoors, either in public
places or outside the houses (42.2%). From the total of dogs
involved in the aggressions, 54.2% were from pure breeds,
mostly intact males, and 13.3% of the aggressors belonged to
breeds legally considered as potentially dangerous. The majority of the dogs lived in yards and had access to public spaces. A
significant higher probability of younger animals to injure older
*Correspondência: [email protected]
dogs was observed. At least 52.8% of the aggressors were
re-incident, and 13.2% had previously shown aggressive
behavior patterns towards humans. The legally stipulated
restraining methods were not followed in 34.4% of the animals.
At least 16.3% of the dogs were not immunized against rabies,
and the vaccinal status was unknown in 39.2% of the cases. The
multifactorial scope of dog-to-dog aggressions, with aspects
related to the animal itself, to the owner and to the environment,
requires the establishment of multidisciplinary partnerships,
which may allow for the design of efficient preventive
measures.
Introdução
As agressões por canídeos são frequentes, geralmente
dirigidas contra animais da mesma espécie (Kolata et
al., 1974), embora a maioria das publicações se refira
sobretudo às dirigidas contra seres humanos (Goldstein
et al., 1978; Ordog, 1986; Feder et al., 1987; Griego et
al., 1995; Freud et al., 1997; Garcia, 1997), sendo
escassas as informações disponíveis na literatura
veterinária (Kelly et al., 1992; Griffin e Holt, 2001;
Shamir et al., 2002; Meyers et al., 2007).
A agressividade é considerada uma patologia
comportamental de origem multifactorial. O comportamento padrão de um canídeo, a demonstração de
agressividade para animais da mesma ou de outra
espécie, e a reincidência como agressor ou como
agredido, são importantes para a caracterização
comportamental dum animal (Overall, 1997). A determinação do local onde as agressões ocorrem, bem
como a caracterização dos animais envolvidos, são
essenciais para o estabelecimento de medidas preventivas (Cornwell, 1997). Estes factores não têm sido
devidamente valorizados, pelo que se sabe muito
pouco sobre o comportamento dos cães envolvidos em
agressões, havendo aspectos que necessitam ser aprofundados. Não se encontram documentados numa
base de dados nacional, o número e gravidade de
agressões infligidas por canídeos a seres humanos. No
entanto, dados recolhidos nos Estados Unidos revelam
um aumento do número e da gravidade destas
agressões (Sacks et al., 2000; CDC, 2003) o que,
61
Mouro S et al.
aliado à maior divulgação mediática, levou a que
muitos países, incluindo Portugal, tivessem desenvolvido legislação com o objectivo de diminuir a sua
incidência.
Este estudo teve como objectivo fazer uma primeira
abordagem sistematizada de agressões entre canídeos
cujos proprietários habitam nas regiões de Lisboa e de
Setúbal. De entre os parâmetros estudados incluem-se
a determinação do local onde as agressões ocorreram,
a caracterização dos animais envolvidos, o seu habitat,
o seu acesso à via pública e o seu eventual envolvimento prévio noutras agressões. Foi ainda avaliado o
grau de cumprimento da legislação vigente quanto à
utilização dos métodos de contenção obrigatórios, e
estado de imunização contra a raiva.
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
acesso dos animais à via pública e, em caso afirmativo,
a utilização de meios de contenção, nomeadamente
trela e/ou açaimo. Por fim, foi averiguada a existência
de história de envolvimento anterior em agressões, seja
como agressor ou como agredido e se, mesmo sem
concretizar a agressão, os animais demonstravam sinais
de agressividade em relações a outros animais e/ou
seres humanos. O estado vacinal em relação à prevenção da raiva foi determinado com base no boletim
de vacinação; sempre que este não foi apresentado, o
estado vacinal foi considerado desconhecido.
Os dados foram processados com o auxílio das
aplicações informáticas EXCEL 2000 e SPSS 12.0 for
Windows. A análise descritiva foi realizada através da
distribuição de frequências. A média foi utilizada para
caracterizar as tendências centrais das variáveis. A
análise estatística foi realizada através do teste t.
Material e métodos
Este estudo decorreu entre Outubro de 2004 e
Agosto de 2005 e incidiu sobre 83 casos de agressão
entre canídeos. As vítimas foram apresentadas para
consulta no Hospital Escolar da Faculdade de
Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa
(61,4%) e na Clínica Veterinária Azevet (38,6%), em
Azeitão, Setúbal. A informação foi recolhida através
de um questionário, preenchido pelo médico veterinário assistente em conjunto com o proprietário. Foi
obtido consentimento informado de todos os proprietários para a inclusão dos seus animais no estudo. Face
à impossibilidade de determinar com rigor qual o
canídeo que despoletou a agressão, o animal presente
à consulta é aqui considerado como "agredido", e o
outro animal envolvido como "agressor". Assim, um
canídeo foi definido como agredido quando o motivo
da consulta foi a presença de lesões devidas à agressão
levada a cabo por outro cão. Contudo neste estudo não
foi averiguado se a agressão foi ou não despoletada
pelo próprio animal.
O questionário visou determinar o local onde
ocorreu a agressão e recolher dados referentes ao
animal agredido. Sempre que o proprietário assistiu à
agressão, foram também recolhidos dados sobre o
agressor.
Foi recolhida informação sobre o sexo, raça, idade,
estado reprodutivo e anterior envolvimento dos
canídeos em agressões, tanto contra humanos como
contra animais. Os canídeos foram considerados
cruzados quando descendiam de progenitores de raças
diferentes, podendo um deles ser de raça indeterminada. Foram considerados de raça indeterminada quando
definidos pelos proprietários do agredido como
"rafeiros". Os animais foram considerados de raça
desconhecida quando esta não foi determinada ou
reconhecida. A idade foi registada em anos completos.
Foram ainda registados o local da agressão e o habitat
dos animais envolvidos (via pública, exterior ou
interior das habitações). Outro dos dados colhidos foi o
62
Resultados
As agressões foram documentadas principalmente
durante os meses de Fevereiro (16,7%), Novembro
(14,5%) e Janeiro, Maio e Junho (9,6% cada), como
explicitado no Gráfico 1.
As agressões ocorreram principalmente no exterior,
quer na via pública (36/83, 43,4%) quer em propriedade privada, no exterior das habitações (35/83,
42,2%). Os registos com caracterização completa
de animal agredido e agressor corresponderam maioritariamente a casos de canídeos pertencentes ao
mesmo proprietário.
Dos 83 canídeos agredidos, 22 (26,5 %) eram de
raça indeterminada, 14 (16,9%) eram cruzados e 47
(56,6%) de raça pura. Estes últimos pertenciam a 20
raças diferentes (Gráfico 2a), estando mais representadas as raças Caniche e Labrador Retriever (ambas
14
12
10
8
6
4
2
0
Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun
Jul Ago
Gráfico 1 - Distribuição mensal das agressões entre canídeos (n=83).
Mouro S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
a)
INDETERMINADA
CRUZADA
CANICHE
LABRADOR RETRIVIER
HUSKY SIBERIANO
EPAGNEUL BRETON
ROTTWEILER
DOBERMAN
BOXER
FILA BRASILEIRO
CÃO ÁGUA
COCKER INGLES
COCKER SPANIEL
POINTER
FOX TERRIER
GOLDEN RETRIVIER
PASTOR ALEMÃO
PASTOR BELGA
PEQUINOIS
PERDIGUEIRO
PINCHER
SHAR-PEI
Gráfico 3 - Relação entre a idade do canídeo agredido e a do canídeo
agressor, em cada agressão (n=39).
0
5
10
15
20
25
N
b)
INDETERMINADA
DESCONHECIDA
PASTOR ALEMÃO
PITT BULL
LABRADOR RETRIVIER
BOXER
CRUZADA
EPAGNEUL BRETON
GRAND’ANOIS
HUSKY SIBERIANO
ROTTWEILER
SERRA DA ESTRELA
BRACO
BOUVIER FLANDRES
CÃO ÁGUA
DOGUE ARGENTINO
GOLDEN RETRIVIER
MASTIM PIRINÉUS
MALAMUTE DO ALASCA
SHAR-PEI
0
5
10
N
15
20
Gráfico 2 - Raça dos canídeos envolvidos em agressões intra-específicas (N=83). Distribuição de frequências para esta variável: a) dos
agredidos; b) dos agressores.
com 8/83, 9,6%), seguidas de Husky Siberiano e de
Rottweiler (ambas com 4/83, 4,8%). A raça dos agressores foi apurada em 65/83 (78,3 %) dos casos, sendo
43 (66,2%) animais de raça pura, distribuidos por 17
raças (Gráfico 2b). As mais representadas foram a Pit
Bull e a Pastor Alemão, ambas com 7/83 (8,4%). Os
canídeos agressores de raça indeterminada foram
responsáveis por 19 das agressões (22,9%).
A idade média dos animais agredidos foi 5,5 anos (1
a 15), tendo a maioria menos de 5 anos de idade
(50/83, 60,2%) (Gráfico 3). A idade dos agressores foi
apurada em 39 casos (47%), sendo inferior a 5 anos
em 30 animais (76,9%), e apresentando um valor
médio de 3,79 anos (1 a 12) (Gráfico 3). O teste t para
variáveis dependentes, efectuado a partir dos resultados das 39 agressões em que a idade de ambos os
animais envolvidos foi determinada, demonstrou a
existência de uma diferença estatisticamente significativa entre a idade do agressor e do agredido
(p=0,0211). Estes resultados revelam que, em cada
agressão, o agressor é mais jovem do que o respectivo
agredido, de forma estatisticamente significativa
A maior parte das agressões ocorreu entre animais
do mesmo sexo (n=47, 56,6%), principalmente entre
machos (n=37, 44,6%), na sua maioria inteiros (78,3%
dos agredidos e 38,6% dos agressores eram machos
inteiros) (Tabela 1).
Dos 83 animais agredidos, a grande maioria
habitava em propriedade privada, 36 no exterior
(43,4%), e 26 no interior (31,3%) das habitações. O
habitat do canídeo agressor foi apurado em 55 casos
(66,3%). Destes, a maioria também habitava em
propriedade privada, 35 no exterior (42,2%) e 11
no interior (13,3%) das habitações. Habitavam na
via pública um dos agredidos (1,2%) e dois dos
agressores (3,6%). A maioria dos machos inteiros
envolvidos em agressões tinha acesso à via pública
(N=60); destes, 43 foram agredidos e 17 identificados
como agressores.
Tinham acesso à via pública 56 dos 83 animais agredidos (67,5%). Destes, e de acordo com a informação
dos proprietários, 22 utilizavam sempre trela (39,3%),
15 utilizavam-na esporadicamente (26,7%) e 19 nunca
a utilizavam (34%), sendo o açaimo utilizado apenas
Tabela 1- Relação entre o sexo e o estado reprodutivo dos agredidos e dos agressores (n=83)
Agredidos
Macho inteiro
Macho castrado
Fêmea inteira
Fêmea castrada
Macho
inteiro
29
1
1
1
Macho
castrado
0
1
0
0
Macho
?
6
0
2
0
Agressores
Fêmea
inteira
3
0
5
1
Fêmea
castrada
0
0
0
1
Fêmea
?
2
0
2
1
Desconhecido
25
0
2
0
63
Mouro S et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
em um dos canídeos agredidos (1,8%). Dos 36
animais agredidos na via pública (43,4%), 12 não
utilizavam trela (33,3%), e destes, apenas 11 a usavam
sempre (30,6%) (Gráfico 4a); apenas um dos animais
vítima de agressão na via pública utilizava açaimo. A
variável "acesso à via pública" foi apurada em 58 dos
agressores (69,9%), tendo-se verificado 34 (58,6%)
respostas afirmativas. Observou-se ainda que 77% dos
agressores de raça indeterminada com respostas
válidas tinham acesso à via pública, comparativamente a 53,7% dos canídeos de raça pura. Dos 34
agressores com acesso à via pública, a trela nunca
era utilizada em 12 deles (35,3%). Este método de
contenção era sempre usado em 19 dos casos (55,9%),
sendo-o esporadicamente em 3 dos canídeos (8,8%)
(Gráfico 4b). O açaimo era utilizado em 3 dos
agressores com acesso à via pública (8,8%), quando
aí transitavam. Dos 90 animais com acesso a esse
local, 34,4% (19 agredidos e 12 agressores) nunca
utilizavam trela.
Sim
Às vezes
Não
Não responde
a)
Pelo menos 31 dos 83 animais agredidos (37,3%)
já tinham sido anteriormente vítimas de agressão
por outros cães. Os agressores reincidentes corresponderam a 19 das 36 respostas válidas (52,8%). A
manifestação prévia de agressividade pelos agressores
foi apurada em 38 (45,8%) casos. Essa manifestação
tinha sido dirigida contra outras espécies em 42,1%
das respostas válidas, nomeadamente contra gatos
(n=12), seres humanos (n=5) e outros (n=1).
Em 65 dos 166 animais envolvidos nas agressões,
incluindo agressores e agredidos, não foi possível
determinar o estado vacinal contra a raiva de 39,15%,
o que corresponde a 18,1% dos agredidos e 60,2% dos
agressores (Gráfico 5). A vacinação dos canídeos
agredidos estava actualizada em 50 dos casos (60,2%)
e desactualizada em 18 (21,7%). Nos agressores,
verificou-se que 24 estavam vacinados (28,9%) e
9 não estavam vacinados ou tinham a vacinação em
atraso (10,8%).
Sim
Às vezes
Não
b)
13,89
30,56
35,3
55,9
33,33
8,8
22,22
Gráfico 4 - Utilização de trela (%): a) nos animais agredidos na via pública (n=36) ; b) nos agressores com acesso à via pública (n=34).
Vacinado
Não vacinado
Desconhecido
a)
b)
Vacinado
Não vacinado
Desconhecido
18,1
28,9
21,7
60,2
60,2
10,8
Gráfico 5 - Estado vacinal contra a raiva: a) dos agredidos; b) dos agressores.
64
Mouro S et al.
Discussão
Este estudo incidiu sobre 83 casos de agressão entre
canídeos. Não foi possível estimar a incidência e
prevalência destas agressões nas regiões em estudo,
uma vez que a amostra foi definida por conveniência,
incluindo apenas animais levados à consulta pelo seu
proprietário. Os resultados referentes à caracterização
das agressões e dos animais envolvidos, correspondem assim a frequências relativas face ao total da
amostra considerada.
Devido a agressão, foram assistidos mensalmente,
em média, 7,5 canídeos, valor muito semelhante ao
descrito na literatura (Kelly et al., 1992; Griffin e
Holt, 2001; Shamir et al., 2002). Contudo, outros
trabalhos referem resultados diferentes, tanto no
sentido de valores superiores como inferiores, o que
poderá refletir diferenças existentes nos países onde
os estudos foram realizados (Sherman et al., 1996;
Baranyiová et al., 2003).
As agressões ocorreram ao longo de todo o ano,
com picos nos meses de Fevereiro e Novembro (16,7%
e, 14,5%, respectivamente), seguidos de Janeiro, Maio
e Junho (9,6% cada). Estes dados não estão em concordância com outros, que reportam, nos Estados
Unidos, picos de agressão nos meses de Verão
(Langley, 1994; Kahn et al., 2003), o que foi atribuído
a um maior acesso ao exterior ou a alterações de habitat em períodos de férias, em que tanto os donos como
os animais passam mais tempo no exterior (Shamir et
al., 2002). Os resultados por nós obtidos podem ser
devidos ao facto de haver um maior número de
animais com acesso à via pública durante todo o ano e
ao facto de a fiscalização sobre o cumprimento do
legalmente instituído sobre meios de contenção ser
muito deficiente.
Os canídeos agressores foram identificados em
78,3% das agressões, o que está de acordo com o
referido por outros autores (Kahn et al., 2003).
Em relação à raça dos animais envolvidos verificou-se que a maioria dos animais envolvidos nas
agressões era de raça pura, o que está de acordo com
outros autores (Beaver, 1993; Roll e Unshel, 1997;
Sherman et al., 1996; Griffin e Holt, 2001). No
entanto, um número apreciável de animais agredidos
(n=36, 43,4%) e de agressores (n=22; 33,8%) não
pertenciam a raças puras. Do total dos agressores,
13,3% pertenciam a raças, ou cruzamentos de raças,
consideradas "potencialmente perigosas" pela actual
legislação portuguesa (Port nº 422/2004), nomeadamente Pit Bull, Rottweiler e Dogue Argentino. Estes
resultados poderão, à semelhança do observado
noutros países (Clifford, 1984; Wright, 1991;
Williams e Williams, 1992; Quinlan e Sacks, 1999;
Monti, 2000; Sacks et al., 2000; Wapner e Wilson,
2000), colocar em causa a discriminação racial dos
canídeos patente na legislação. No entanto, os resultados poderão ter sido influenciados pela legislação
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
vigente desde 2004, reflectindo uma melhor contenção dos animais ou uma maior consciencialização dos
proprietários de outros cães, que os levará a evitar o
contacto com animais de raças consideradas potencialmente perigosas. No presente trabalho, Pastor
Alemão (8,4%) e Pit Bull (8,4%) foram as raças mais
representadas no grupo dos agressores. Estas raças
foram referidas como as mais implicadas em agressões fatais a humanos (Wright, 1991; CDC, 1997;
Sacks et al., 2000; Allen, 2001). Para determinar com
rigor qual a verdadeira perigosidade de determinada
raça, é necessário conhecer não apenas o número
de agressões perpetradas por cães dessa raça, mas
também o número de animais dessa raça que existe na
população em geral, e o tempo que estes têm de contacto com seres humanos e/ou com outros animais
(Williams e Williams, 1992; Quinlan e Sacks, 1999).
A educação de um cachorro é de extrema importância na modelação do seu comportamento (Roll e
Unshelm, 1997). Contudo, alguns autores defendem
que a agressividade tem uma base hereditária, sendo
mais comum em certas raças (Abraham, 1995; Allen,
2001). Outros, pelo contrário, alegam que os animais
cruzados são os principais responsáveis não só pelas
mordeduras a seres humanos (Wright, 1991), mas
também pela maioria das mortes (Overall e Love,
2001). São por isso necessárias algumas precauções
na interpretação dos resultados respeitantes à raça do
agressor, uma vez que é consensual que a avaliação
da agressividade dum cão deve ter em conta outros
factores, sendo defendido que a variabilidade individual seria o factor mais importante (Clifford, 1984). A
eleição de raças perigosas depende, junto da opinião
pública, mais da sua popularidade do que de estudos
epidemiológicos realizados em grande escala. Os
meios de comunicação social têm, em muito, contribuído para a opinião generalizada de que algumas
raças de cães são inerentemente violentas (Wapner e
Wilson, 2000). Tem sido contestada a imposição de
leis rígidas, baseadas apenas na raça do animal, com a
finalidade de prevenir situações de agressão, devido a
esta medida se ter revelado notoriamente insuficiente
(Monti, 2000). Estas decisões são frequentemente o
resultado de processos políticos pragmáticos, por
vezes sujeitos a interesses económicos, nomeadamente por parte das seguradoras (Wapner e Wilson,
2000). Acresce ainda que, a identificação de raças em
canídeos se reveste de alguma complexidade, sendo
necessário criar métodos práticos e objectivos para
este fim (Sacks et al., 2000). Não podemos ignorar
que o facto de determinadas raças serem consideradas
perigosas se deve, sobretudo, ao seu mau uso ou
descuidada posse pelos proprietários de animais
dessas raças, o que pode resultar em casos de morte
inaceitável de cidadãos. Actualmente é difícil, em
termos legais, determinar quais os proprietários
obrigados a cumprir legislação especial. Tal como a
maioria dos autores, defendemos ser mais importante
65
Mouro S et al.
penalizar o proprietário de um animal com comportamento agressivo, que seja cronicamente irresponsável,
do que os proprietários cujos canídeos pertençam a
determinada raça (Monti, 2000; Sacks et al., 2000).
Relativamente à idade dos animais envolvidos nas
agressões, verificou-se que os agressores eram em
média mais jovens do que os agredidos, sendo patente,
em ambos os grupos, um declínio do número de
animais com o avanço da idade. Este facto foi
constatado por outros autores (Baranyiová et al.,
2003), podendo ser determinado não só pela distribuição etária da população em geral, mas também pela
experiência adquirida nos confrontos ao longo da
vida, pela educação proporcionada pelos proprietários
ou pelos hábitos adquiridos com a idade, que podem
com o envelhecimento conduzir a um menor contacto
com outros animais. Na amostra em estudo observou-se um risco significativamente maior de agressão por
animais mais jovens a outros mais velhos, do que o
inverso.
Verificou-se que a maioria dos canídeos envolvidos
nas agressões pertencia ao mesmo sexo e eram
machos inteiros, o que está de acordo com outras
descrições (Kolata et al., 1974; Hart e Hart, 1985;
Beaver, 1993; Sherman et al., 1996; Overall, 1997;
Griffin e Holt 2001; Shamir et al., 2002; Baranyiová
et al., 2003). A castração, ao afectar a componente
hormonal modeladora do comportamento (Overall,
1997), pode reduzir em 50 a 60% a agressividade
dirigida contra outros cães (Hart e Hart, 1985), pelo
que a legislação que determina a esterilização
obrigatória de canídeos, sempre que esteja em risco a
segurança de pessoas ou outros animais (Decreto-Lei
nº 312/2003) pode ter algum papel preventivo destas
agressões.
Foram recentemente introduzidas no nosso país
determinações legais (Despacho nº 10819/2008),
aplicáveis aos animais de raças definidas como potencialmente perigosas, bem como aos resultados de
cruzamentos daquelas raças entre si ou com outras
(Portaria nº422/2004). A legislação actual obriga à sua
esterilização a partir dos 4 meses de idade, e proíbe a
sua reprodução ou criação, se os animais não
estiverem inscritos nos livros de origem oficialmente
reconhecidos, bem como a sua entrada em território
nacional sem a autorização da Direcção-Geral de
Veterinária. Em Portugal, os canídeos machos não são
castrados por rotina. Não é possível concluir no nosso
estudo se os machos inteiros apresentam maiores
tendências agressivas, ou se apenas se encontram mais
representados na população.
Os resultados deste estudo revelam que 43,4%
dos agredidos e 63,6% dos agressores habitavam no
exterior. Esta variável não foi incluída nos outros
estudos disponíveis na bibliografia. Apesar de não
ter sido possível incluir a variável "habitat" como um
factor de risco para o envolvimento em agressões,
devido ao tamanho da amostra e à inexistência dum
66
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
grupo de controlo, os resultados sugerem que o local
onde os animais vivem diariamente pode influenciar
não apenas o seu carácter, mas também a probabilidade do seu envolvimento em agressões.
Dado que a maioria dos animais na nossa amostra
tinha acesso à via pública, local onde ocorreu a maior
parte das agressões, considerámos importante avaliar
o cumprimento das disposições legais relativas à
utilização de métodos de contenção. Verificámos que,
do total de animais com acesso a locais públicos
envolvidos em agressões, 34,4% nunca utilizavam
trela, não cumprindo com as determinações legais.
Apenas 30,6% dos animais agredidos na via pública, e
55,9% dos agressores com acesso a este local,
utilizavam sempre trela. É possível que a maior frequência de utilização constante de trela em agressores
com acesso à via pública possa advir do facto de estes
animais serem reconhecidos pelos proprietários como
mais agressivos, do que os pertencentes ao grupo dos
agredidos. No entanto, este resultado pode ter sido
afectado pelo número reduzido de agressores em que
esta variável foi apurada.
Verificou-se que apenas um pequeno número dos
animais pertencentes ao grupo dos agressores
utilizava açaimo quando circulava na via pública.
Estes canídeos pertenciam a raças consideradas potencialmente perigosas, nomeadamente Pit Bull Terrier
e Rottweiler, em que a utilização deste método de
contenção é obrigatória. Duas destas agressões
ocorreram no interior das habitações, e a outra no
exterior, mas em propriedade privada. Estes agressores só utilizavam açaimo na via pública, não o
utilizando nos locais onde ocorreram as agressões.
Apenas um dos animais vítimas de agressão na via
pública utilizava açaimo. Alguns proprietários rejeitam
a utilização de açaimo nos seus canídeos, alegando
que a sua utilização, ao encontrar-se muito pouco
difundida no nosso país, pode impedir o animal de se
defender, o que conduzirá ao agravamento das lesões
sofridas em caso de agressão. No entanto, esta posição
será completamente indefensável assim que a
legislação for efectivamente cumprida por todos os
proprietários.
A análise dos resultados obtidos neste estudo
revelou que 52,8% dos agressores eram reincidentes.
Uma taxa de reincidência de 88% é referida por Roll
e Unshelm (1997), realçando que 31% dos cães
envolvidos em agressões tinham sido previamente
reconhecidos pelos seus proprietários como "inimigos".
Estes resultados sugerem que as agressões entre
canídeos não são um acontecimento esporádico,
encontrando-se frequentemente associadas a comportamentos declaradamente agressivos. Neste enquadramento, grande parte das agressões entre canídeos
podem ser evitadas se os proprietários as prevenirem
com base em comportamentos prévios (Roll e
Unshelm, 1997).
De entre os animais em estudo, mais de um oitavo
Mouro S et al.
dos agressores tinham demonstrado anteriormente
agressividade dirigida contra humanos. Apesar disto,
verificou-se que 60% destes animais tinha livre
acesso à via pública, e que apenas 20% utilizava trela
e nenhum utilizava açaimo. Estes resultados vêm
reforçar a importância da utilização dos métodos de
contenção estipulados legalmente para quando os
animais circulam em espaços públicos (Decreto-Lei
nº 314/2003). A vigilância dos animais pelos proprietários, quando circulam nestes locais, é também
extremamente importante, porque os canídeos que
vagueiam na rua podem tornar-se mais agressivos do
que os vadios (Overall e Love, 2001). No nosso estudo
registámos que 1,2% dos agredidos e pelo menos
3,6% dos agressores habitavam na via pública. O
controlo dos animais vadios ou errantes é também
essencial para diminuir o número de agressões, pelo
que a lei vigente que estipula que esses animais devem
ser capturados e recolhidos no canil municipal
(Decreto-Lei nº 314/2003) se reveste de uma extrema
importância.
A possibilidade de transmissão da raiva através
de mordedura por canídeos constitui uma grande preocupação em termos de saúde pública. No presente
estudo, não foi possível determinar o estado vacinal
contra esta doença em 18,1% dos agredidos e em
60,2% dos agressores. Acresce ainda o facto de,
mesmo com esta elevada taxa de vacinação desconhecida, 16,3% dos animais envolvidos em agressões
não estarem protegidos contra esta doença. Entre os
agressores, a vacinação actualizada foi confirmada
através da apresentação do boletim de saúde apenas
em 28,9% dos casos, valor bastante inferior ao
descrito no estudo realizado por Freud et al., (1997),
em que a taxa vacinal de canídeos que agrediram seres
humanos foi de 67%. No entanto, nesse trabalho não
é referido se a vacinação foi confirmada pela apresentação do boletim de vacinas, ou se foi apenas
baseada na informação fornecida pelo proprietário.
Verificámos que, quando um canídeo é vítima de
agressão por outro cão, nem sempre é possível determinar se o agressor está convenientemente vacinado
contra esta doença, não só pela ausência de confirmação pela apresentação do boletim de vacinas, mas
também porque em alguns casos o agressor não pode
ser sequer identificado. Para manter o nosso país
indemne de raiva, a profilaxia realizada através da
vacinação é obrigatória para todos os canídeos.
Contudo não existem dados completos sobre a taxa de
vacinação contra a raiva.
A prevenção de agressões levadas a cabo por
canídeos é um tema polémico, muito discutido na
literatura científica (Cornwell, 1997; Rieck, 1997;
Chevallier e Sznadjer, 1999; Monti, 2000; AVMA,
2001; Presutti, 2001; Keuster et al., 2005). Ao ser
reconhecido e aceite que a agressividade é um
problema multifactorial, a sua prevenção envolve a
determinação do local onde estas ocorrem, a
RPCV (2009) 104 (569-572) 61-69
caracterização dos animais envolvidos, a avaliação
do cumprimento das normas impostas legalmente,
para além da educação e responsabilização dos
proprietários no sentido de evitarem situações e
comportamentos de risco. O presente estudo demonstrou que o risco de agressão é superior na via pública
e que, as normas relativas à obrigatoriedade legal da
utilização de métodos de contenção são raramente
cumpridas nos canídeos que circulam em locais
públicos. Outro facto que se constatou foi a presença
de animais errantes ou vadios na via pública, o que
aumenta a probabilidade de ocorrência de agressões,
pelo que estes animais deveriam ser controlados de
forma mais eficaz.
Embora o nosso país esteja indemne de raiva, a
vacinação dos canídeos não deve ser descurada, uma
vez que esta doença existe em alguns países europeus
(WHO, 2005).
O número de agressões por canídeos poderá ser
diminuído através do melhoramento dos serviços de
controlo animal, da actualização e divulgação das
medidas legais existentes e de estratégias políticas e
educacionais que visem diminuir os comportamentos
inapropriados tanto dos animais como dos seus
proprietários (Sacks et al., 2000; Keuster et al., 2005).
É urgente a realização de mais estudos sobre factores de
risco que possam contribuir para o estabelecimento de
normas de protecção contra agressões, levadas a cabo
por canídeos (Ozanne-Smith et al., 2001; Lakestani et
al., 2005). A redução da incidência de mordeduras por
canídeos requer o envolvimento activo de toda a
comunidade, tendo os meios de comunicação social
um papel essencial na divulgação de informação
responsável que possa contribuir para a educação da
sociedade civil.
São necessários estudos futuros, que avaliem os
motivos que despoletaram a agressão e o perfil dos
proprietários dos cães envolvidos.
Face às características multifactoriais da agressividade em canídeos, com aspectos inerentes ao animal,
ao proprietário e ao ambiente envolvente, o aprofundamento deste tema só será possível através da
elaboração de parcerias multidisciplinares, que permitam a compreensão da agressividade nas suas várias
componentes e assim possibilitem a delineação de
medidas preventivas eficazes.
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69
RPCV (2009) 104 (569-572) 71-75
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Avaliação bacteriológica de anéis de lula, Dorytheutis plei (Blainville, 1823)
(Mollusca: Cephalopoda), congelados e irradiados
Bacteriological evaluation of squid rings, Dorytheutis plei (Blainville, 1823)
(Mollusca: Cephalopoda), frozen and irradiated
Flávia A. A. Calixto1*, Robson M. Franco1, Eliana F. M. Mesquita1,
Helio C. Vital2, Erika Murayama3
1
Universidade Federal Fluminense/UFF, Faculdade de Veterinária, Departamento de Tecnologia dos Alimentos,
Rua Dr. Vital Brazil Filho n. 64 – Niterói, Rio de Janeiro 24230-340
2
Laboratório de Irradiação de Materiais da Divisão de Defesa Química, Biológica e Nuclear do Centro
Tecnológico do Exército (CTEx)
3
Médica Veterinária graduada pela UFF
Resumo: Cerca de 80% dos desembarques pesqueiros de
cefalópodes, na costa sul do Brasil, são de duas espécies de
lulas neríticas (Dorytheutis plei e D. sanpaulensis). Sabendo-se
que pescado é um produto altamente perecível, exigindo
cuidados especiais na manipulação e preparo. O tratamento com
radiações ionizantes destrói microrganismos existentes no
alimento e inibe alterações bioquímicas decorrentes da deterioração. O objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade
bacteriológica de anéis de lula, Dorytheutis plei (Blainville,
1823), congelados e irradiados e comparar os resultados obtidos
entre o grupo controle e grupos irradiados. Foram analisadas 24
amostras, separadas em três grupos, de acordo com a dose de
radiação absorvida: 0 kGy (controle), 1,5 kGy e 3,0 kGy.
Realizaram-se contagens de unidades formadoras de colónias
bactérias heterotróficas aeróbias mesófilas e psicrotróficas para
a verificação da qualidade bacteriológica das amostras e comparar os resultados obtidos com o uso da irradiação, analisando
a eficiência do processo. As amostras estavam abaixo do limite
sugerido para degradação de pescado. Observou-se uma
redução acentuada (aproximadamente dois ciclos logarítmicos)
na população de bactérias mesófilas e psicrotróficas nas
amostras irradiadas em comparação com a amostra controle,
sendo a radiação gama eficaz na melhoria da qualidade
bacteriana, semelhante ao processo de pasteurização. Dentre as
doses investigadas, 1,5 kGy mostrou-se a mais apropriada para
os microrganismos mesófilos, enquanto que a dose de 3,0 kGy
se mostrou mais eficiente para os microrganismos psicrotróficos.
Summary: Approximately 80% of cephalopods captured along
the southern coast of Brazil belong to two species of neritic
squids (Dorytheutis plei and D. sanpaulensis). Due to their very
short shelf-lives, special procedures have to be followed in order
to handle and processe safely and adequately those products.
This work had evaluated the efficiency of irradiation in the
conservation of meat samples of Dorytheutis plei (Blainville,
1823). Its main aim was to study the effects of the exposure
to gamma radiation on the microbiological stability of frozen
squid rings. Twenty-four selected samples were grouped
*Correspondência: [email protected]
Tel/Fax: +55 21 2629-9533
according to the absorbed dose: 0 kGy (control), 1.5 kGy and
3.0 kGy. The monitoring of the samples throughout the storage
time was undertaken by microbiological (aerobic mesophilic
and psycotrophic bacteria) analyses. A substantial reduction in
the population of bacteria was found in the irradiated samples
(about two log cycles). Among the investigated doses, 1.5 kGy
proved to be most suitable for mesophilic while the dose of 3.0
kGy was more efficient for psychrotrophic microorganisms.
Introdução
Moluscos cefalópodes são importantes recursos
pesqueiros. No Brasil, a sua captura é bastante significativa, quer seja feita de maneira indireta por rede de
arrasto ou direta por linha. A principal espécie de
cefalópodes pescada na costa brasileira e comercializada é a Dorytheutis plei.
Os cefalópodes podem ser consumidos de várias
formas, seja fresco como "sashimi", seja após diversos
tipos de processamento como produto seco, enlatado,
congelado e em alimentos à base de pescado. Possuem
alto valor protéico e baixo teor de gordura, o que os
torna elemento importante na dieta humana.
Quando beneficiada em anéis, a lula é muito
manipulada, o que pode levar ao aumento da microbiota contaminante, sobretudo se existirem deficiências
nas Boas Práticas de Fabrico. Conseqüentemente, o
tempo de conservação do pescado, que, em geral,
já é limitado, pode diminuir com o aumento da
contaminação por microrganismos deteriorantes e até
patogênicos, o que pode pôr em risco a saúde do
consumidor (Germano e Germano, 2003).
O tratamento com radiações ionizantes tem como
finalidade prolongar a vida útil dos alimentos, pela
destruição da microbiota ou inibição de alterações
bioquímicas, sem que ocorra aumento significativo de
71
Calixto FAA et al.
sua temperatura (Ordóñez et al., 2005; Fellows, 2006).
Em geral, a maioria das bactérias patogênicas não se
reproduz em temperaturas abaixo de 5 ºC, logo o
emprego combinado de conservação em baixas
temperaturas com a irradiação pode ser bastante
vantajoso (Herson e Hulland, 1980).
O objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade
bacteriológica de anéis de lula, Dorytheutis plei
(Blainville, 1823), congelados e irradiados e comparar
os resultados obtidos entre o grupo controle e grupos
irradiados.
Material e métodos
Foram utilizadas 24 amostras de 250 g cada de anéis
de lula congelados, Dorytheutis plei (Blainville,
1823), provenientes do Município de Cabo Frio,
Estado do Rio de Janeiro, Brasil. As amostras foram
transportadas em caixas de poliestireno expandido
para o Laboratório de Irradiação de Materiais da
Divisão de Defesa Química, Biológica e Nuclear do
Centro Tecnológico do Exército (CTEx).
As 24 amostras foram separadas aleatoriamente em
três grupos de 08 amostras e identificados: o grupo
controle (0 kGy), o grupo irradiado com 1,5 kGy e o
grupo irradiado com 3,0 kGy. O grupo controle não
foi submetido à radiação gama. Os outros grupos
foram expostos a uma fonte de Césio-137 (Cs137) no
irradiador de pesquisa do CTEx.
O irradiador de pesquisa do CTEx é do tipo
"cavidade blindada" e sua fonte de Césio-137 (Cs137)
de 46 kCi é capaz de suprir as duas câmaras de
irradiação (cujo volume total efetivo é de aproximadamente 100 litros) com uma taxa de dose máxima de
1,8 kGy/h.
As amostras a serem irradiadas com 1,5 e 3,0 kGy
foram inseridas em duas gavetas metálicas, as quais
foram posicionadas próximas do centro das câmaras
de irradiação, no interior do irradiador. Todas as
amostras foram posicionadas de forma a minimizar
variações na taxa de dose.
Estima-se um erro máximo de ±10% na dose de
uma determinada amostra, atribuído principalmente
aos gradientes verticais e horizontais da taxa de dose
presentes nas câmaras de irradiação (Vital, 2000).
O grupo controle permaneceu durante todo o
processo armazenado em caixa de poliestireno
expandido, colocada do interior da sala do irradiador,
para que permanecesse em condições semelhantes
àquelas experimentadas pelos grupos irradiados.
Imediatamente após a irradiação, as amostras foram
novamente acondicionadas nas caixas de poliestireno
expandido para o transporte e posteriormente armazenadas sob congelação, onde foram mantidas até a
realização das análises. Para a realização das análises,
as amostras foram descongeladas em geladeira de um
dia para o outro.
72
RPCV (2009) 104 (569-572) 71-75
As análises bacteriológicas foram realizadas no
Laboratório de Controle Microbiológico de Produtos
de Origem Animal do Departamento de Tecnologia de
Alimentos da Faculdade de Veterinária da
Universidade Federal Fluminense (UFF), baseadas na
Instrução Normativa da Secretaria de Defesa
Agropecuária nº 62 (Brasil, 2003).
As análises foram realizadas sobre uma amostra
de cada grupo/dia, as quais descongelavam durante
a noite anterior. As análises foram realizadas com
todas as medidas de assépsia, evitando contaminação
externa.
Foram retiradas, homogenea e aleatoriamente,
25 g de cada amostra. De maneira asséptica, a porção
foi transferida para um envelope de polietileno,
previamente esterilizado. A unidade analítica foi
homogeneizada em 225 mL de solução salina
peptonada a 0,1%, necessário para obter-se a diluição
inicial (1:10) com auxílio de "Stomacher"® em velocidade média por dois minutos.
As diluições por miniaturização de cada amostra
foram realizadas pela transferência, com auxílio de
pipeta automática, de 100 µL, homogeneizada, em
microtubos tipo "eppendorf", estéreis e contendo
900 µL de mesma solução diluente, produzindo a
segunda diluição (10-2). As diluições subseqüentes
foram obtidas da mesma maneira, transferindo 100 µL
da diluição 10-5 (Franco e Leite, 2005).
A contagem de bactérias heterotróficas aeróbias
mesófilas (CBHAM) e contagem de bactérias
heterotróficas aeróbias psicrotróficas (CBHAP), por
sementeira por incorporação, foi realizada pela inoculação de 100 µL das diluições homogeneizadas, com
auxílio de pipeta automática, em placas de Petri esterilizadas e descartáveis, previamente identificadas com
o grupo de amostra, diluição e tipo de contagem. Em
cada placa de Petri inoculada, foi vertido o meio de
cultura Ágar Padrão para Contagem (APC) fundido e
arrefecido à temperatura de 45 ºC, em quantidade
suficiente para cobrir a superfície da placa (cerca de
20 mL). O inóculo foi homogeneizado com o APC
através de movimentos circulares suaves, em formato
de oito, por cinco vezes, no sentido horário e antihorário, sobre superfície plana.
Após a solidificação do meio, as placas foram invertidas e incubadas e em estufa, com temperatura a
35 ºC, por 48 horas para CBHAM e em geladeira, com
temperatura próxima a 7 ºC, por 10 dias (APHA,
1985) para a CBHAP.
Passado o tempo de incubação, as colónias
desenvolvidas foram contadas com auxílio de lupa
em contador de colónias tipo Quebec®.
Na análise estatística foram utilizados métodos não
paramétricos pela não constatação da normalidade. O
teste de Kruskal Wallis comparou mais de dois grupos
de dados independentes simultaneamente e o teste de
Mann-Whitney foi utilizado para as comparações
múltiplas.
Calixto FAA et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 71-75
Tabela 1 - Descrição estatística dos resultados obtidos de CBHAM dos grupos de anéis de lula não irradiados (controle) e irradiados
com dose 1,5 e 3,0 kGy, expressa em Unidade Formadora de Colônia por grama do alimento (UFC/g)
Grupos
Controle
1,5 kGy
3,0 kGy
n
Média
8
8
8
1,2 x 106
1,1 x 104
4,2 x 105
Desvio
padrão
2,1 x 106
2,1 x 104
1,2 x 106
Mínimo
Máximo
Mediana
3,1 x 104
0
0
5,2 x 106
6,0 x 104
3,3 x 106
2,0 x 105
2,5 x 102
5,1 x 103
Intervalo
interquartílico
3,0 x 106
1,7 x 104
1,0 x 104
Tabela 2 - Descrição estatística dos resultados obtidos na CBHAP dos grupos de anéis de lula não irradiados (controle) e irradiados
com dose 1,5 e 3,0 kGy, expresso em Unidade Formadora de Colônia por grama do alimento (UFC/g)
Grupos
Controle
1,5 kGy
3,0 kGy
n
Média
8
8
8
4,9 x 104
7,3 x 102
1,9 x 102
Desvio
padrão
3,7 x 104
7,7 x 102
2,6 x 102
Mínimo
Máximo
Mediana
2,1 x 104
0
0
1,4 x 105
1,9 x 103
6,5 x 102
3,8 x 104
3,2 x 102
1,0 x 102
Resultados
7
A descrição estatística da CBHAM consta na
Tabela 1. As amostras do grupo controle teve a média
de contagem de 1,2 x 106 UFC/g. Nas amostras
irradiadas com dose de 1,5 kGy foi constatado uma
média de 1,1 x 104. Os que receberam 3,0 kGy
tiveram valores superiores ao outro grupo irradiado,
encontrando média de 4,2 x 105. Apesar da diferença
entre os grupos não ser estatisticamente significativa,
houve uma redução de até dois ciclos logarítmico nos
grupos de amostras irradiadas comparados ao grupo
controle.
Na Tabela 2, encontram-se demonstrados os dados
estatísticos da CBHAP. As amostras controle tiveram
média de 4,9 x 104 UFC. O grupo irradiado com
1,5 kGy teve a média de 7,3 x 102. As amostras que
receberam dose de 3,0 kGy, apresentaram uma média
de 1,9 x 102. Os resultados foram decrescentes à medida que o alimento foi submetido ao processamento e
ao aumento de dose.
Os valores em UFC/g foram convertidos para
logaritmos (log UFC) para caracterizar o crescimento
microbiano normal e levar a uma projeção de prazo de
vida comercial do produto a fim de analisar os dados
do ponto de vista da tecnologia e produção. A Figura 1
compara graficamente os dados dos três grupos.
O teste de Kruskal-Wallis, ao nível de significância
de 0,05, evidenciou diferença estatisticamente significativa entre os grupos analisados (H = 16,838; g.l. = 2;
valor-p = 0,033).
O teste de Mann-Whitney, ao nível de significância
de 0,05, indicou as seguintes diferenças estatistica-
6
Intervalo
interquartílico
9,2 x 103
1,5 x 103
4,5 x 102
Log (UFC Médio)
5
4
3
BAC FRIA
2
Mes–filos
1
N=
8
8
Controle
4
7
1,5 kGy
5
5
3,0 kGy
Ps
Psicrotróficos
GRUPO
Figura 1 - Diagrama de caixa e hastes expressando os resultados em log
de UFC médio da CBHAM e CBHAP nos diferentes grupos.
mente significativas apresentadas no Quadro 1, onde
se comparou o grupo indicado na linha com o grupo
indicado na coluna da tabela.
Observou-se diferença estatisticamente significativa
entre o grupo controle e os grupos irradiados, e inexistência da mesma entre os grupos irradiados, caracterizando uma eficácia na redução da CBHAM com o
uso do processo de conservação por radiação ionizante, independentemente da dose utilizada.
Quanto à CBHAP, o teste de Kruskal-Wallis, ao
nível de significância de 0,05, evidenciou diferença
estatisticamente significativa entre os grupos estudados (H = 14,330; g.l.= 2; valor p= 0,001).
O teste de Mann-Whitney, ao nível de significância
de 0,05, indicou as diferenças estatisticamente significativas apresentadas no Quadro 2.
Quadro 1 - Comparações múltiplas entre os três grupos de
amostras para a CBHAM pelo teste de Mann-Whitney
Quadro 2 - Comparações múltiplas entre os três grupos de
amostras para a CBHAP pelo teste de Mann-Whitney
Grupos
Grupos
Controle
1,5 kGy
1,5 kGy
U=3
valor-p = 0,028
SIM
------
3,0 kGy
U=6
valor-p = 0,045
SIM
U = 8,5
valor-p = 0,730
NÃO
Controle
1,5 kGy
1,5 kGy
U=0
valor-p = 0,0003
SIM
------
3,0 kGy
U=0
valor-p = 0,002
SIM
U = 10
valor-p = 0,268
NÃO
73
Calixto FAA et al.
Da mesma forma que para a CBHAM, para a
CBHAP notou-se diferença estatisticamente significativa (Quadro 2) entre o grupo controle e os grupos
irradiados, e inexistência de diferença estatisticamente
significativa entre os grupos irradiados, sendo o uso
da radiação gama justificável assim como o referente
ao da CBHAM.
Portanto, em comparação com o grupo controle
houve uma redução estatística do crescimento logarítmico de UFC/g de dois e um ciclo nas contagens dos
grupos irradiados a 1,5 kGy e 3,0 kGy, respectivamente. Com base nestes dados sugere-se menor carga
microbiana deteriorante no alimento, e conseqüentemente uma melhor qualidade bacteriológica dos
produtos irradiados.
Comparando as médias obtidas nas CBHAM e
CBHAP entre os grupos irradiados e grupo controle, a
redução do logaritmo de UFC de mesófilas e de
psicrotróficas apresentou comportamento diferente.
Em CBHAM, observou-se uma redução de dois e um
ciclos logarítmicos dos grupos irradiados a 1,5 kGy e
3,0 kGy, respectivamente, sendo o grupo com maior
dose de irradiação com resultado inferior ao de menor
dose. Diferentemente na CBHAP, houve uma diminuição de dois ciclo logarítmicos em ambos os grupos
irradiados comparados com o controle, e ainda o
grupo com maior dose de irradiação obteve melhor
resultado. Esses dados refletem que a dose de 1,5 kGy
se mostrou mais efetiva para as bactérias mesófilas
e a dose 3,0 kGy apresentou melhor dose para as
psicrotróficas.
Discussão
Segundo Forsythe (2002), a degradação de peixes
ocorre ao atingir valores de contaminação de carga
bacteriana superiores a 108 /g, assim, todas as amostras
encontravam-se dentro do limite estabelecido, indicando que não presenciavam índices de deterioração.
Pelos padrões de limites microbiológicos da FAO
(2007), pescados podem ter até 105 /g de crescimento
de bactérias aeróbias mesófilas e moluscos até 5 x 105 /g
de crescimento de bactérias aeróbias, o que indicaria
que o grupo controle encontrava-se fora deste limite
para as bactérias mesófilas.
A radicidação, processamento de irradiação de alimentos com aplicação de dose entre 1 e 10 kGy, tem
ação de pasteurização e é empregada em sucos de frutas, carnes e pescado retardando a deterioração dos
alimentos (Evangelista, 2005). A redução bacteriana
encontrada neste estudo assemelha-se ao pretendido
com o processo de pasteurização.
Pesquisa realizada com duas diferentes marcas com
determinação de contagem média de bactérias
heterotróficas aeróbias mesófilas com Loligo [sic]
plei congelado na Venezuela teve como resultados
3,1 x 106 UFC/g na Marca A e 3,8 x 106 UFC/g
74
RPCV (2009) 104 (569-572) 71-75
(Briceño e Bejarano, 2007) números superiores aos
encontrados no trabalho, indicando que essas
amostras analisadas na Venezuela possuem um índice
mais alto de contaminação. Enquanto que, no mesmo
estudo venezuelano, a contagem média de bactérias
heterotróficas aeróbias psicrotróficas obtiveram
resultado ainda mais expressivos de 1,0 x 107 UFC/g
na Marca A e 1,4 x 107 UFC/g na B que indica que
essas bactérias podem deteriorar os alimentos sob
congelação (Briceño e Bejarano, 2007), valores muito
mais elevados do que os determinados nesse ensaio.
Estudo realizado com Loligo [sic] plei armazenado
em contato direto (CD) com gelo e sem contato direto
(CI) com gelo, em CBHAP após um dia de captura
obteve o número de 8 x 102 UFC/g de amostra. Este
número teve um crescimento após 12 dias de
estocagem aparecendo 5 x 106 para amostras CD e 4 x
106 UFC/g para CI (Lapa-Guimarães et al., 2005). No
primeiro dia de análise Lapa-Guimarães et al. (2005)
obtiveram menor contaminação desse pescado do
que os desse experimento para os grupos controle e
1,5 kGy, embora no segundo exame (após 12 dias)
encontraram resultados superiores que pode ser explicado porque o produto foi estocado refrigerado ao
invés de congelado.
Dias (2002) encontrou resultados positivos nas
CBHAM e CBHAP comparando as amostras não
irradiadas e irradiadas com 2,0 kGy de dose, resfriadas e congeladas de ostra-de-mangue (Crassostrea
rhizophorae), constatando um crescimento muito
significativo de microrganismos aeróbios mesófilos
em amostras do grupo controle observando eficácia
do tratamento na conservação do produto. Neste estudo,
Dias (2002) verificou nas amostras congeladas uma
redução média de 98,91% para as bactérias heterotróficas aeróbias mesófilas, resultado semelhante ao
encontrado com dose de irradiação de 1,5 kGy nos
anéis de lula, contudo, os números determinados por
CBHAP na ostra-de-mangue foram em insignificante
tanto para o grupo controle como para o irradiado a
2,0 kGy, diferentemente dos psicrotróficos presentes
nos anéis de lula congelados.
Valente (2002), em estudo da eficácia da radiação
gama em mexilhões (Perna perna), encontrou nas
amostras irradiadas com 2,0 kGy uma redução da
carga de bactérias heterotróficas aeróbias mesófilas
(57,95%) e psicrotróficas (91,18%) comparados aos
altos valores encontrados no grupo controle, esta
redução foi inferior ao presente estudo tanto paras as
doses de 1,5 kGy quanto 3,0 kGy para mesófilos e
uma redução superior a dose de 1,5 kGy aplicada aos
anéis de lula e abaixo da encontrada na dose mais alta.
Diferença expressiva de valores de variâncias é
relatada entre os diferentes dias de estocagem em
refrigeração ou congelamento nas bactérias aeróbias
psicrotróficas do grupo controle e irradiadas (Dias,
2002). Este trabalho não determinou a variação de
crescimento entre períodos de estocagem.
Calixto FAA et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 71-75
Conclusão
de Veterinária, Universidade Federal Fluminense, 89.
Evangelista J (2005). Tecnologia de alimentos. 2ª ed. Editora
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FAO (2007). The Codex Alimentarius Commission and the
FAO/WHO Food Standards Programme. Special
Publications. Food Labelling: complete texts. FAO, Roma,
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Fellows PJ (2006). Irradiação. In: Tecnologia do processamento de alimentos: príncipios e prática, 2ª edição.
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Herson AC e Hulland ED (1980). Conservas alimenticias:
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Valente AM (2002). Verificação da eficácia da radiação
gama em mexilhões [(Perna perna (Linnaeus, 1758)],
através da contagem de bactérias heterotróficas aeróbias
mesófilas e bactérias heterotróficas aeróbias psicrotróficas. Monografia (Especialização em Irradiação de
Alimentos) – Faculdade de Veterinária, Universidade
Federal Fluminense, 40.
Vital HC, Pires LFG, Lima RQ, Vellozo SO (2000).
Experimentos dosimétricos no Irradiador Gama do IPE.
Livro de resumos do V ENAN. Rio de Janeiro, 15-20.
Conclui-se, pelos resultados encontrados na análise
bacteriológica, que a irradiação gama é eficaz na
redução da carga bacteriana, de aproximadamente
dois ciclos logarítmicos, mesófilos e psicrotróficos,
nas doses de 1,5 e 3,0 kGy, semelhante ao processo de
pasteurização.
Dentre as doses investigadas, 1,5 kGy mostrou-se a
mais apropriada para promover uma redução da carga
microbiana dos microrganismos mesófilos – a maior
parte dos microrganismos patogênicos tem ótimo
crescimento desta faixa de temperatura. Enquanto que
a dose de 3,0 kGy mostrou mais eficiente para os
microrganismos psicrotróficos, que, atualmente, são
os principais responsáveis por deterioração de alimentos resfriados e congelados.
Agradecimento
À Médica Veterinária Ivone Costa Soares por todo
auxílio durante a realização das análises.
Bibliografia
APHA American Public Health Association (1985).
Standard methods for the examination of water and wastewater. 16. ed. Ed. APHA (Washington).
Brasil (2003). Ministério da Agricultura, Pecuária e
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Seção 1, Página 14.
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bacterias frecuentes en camarones (Litopenaeus schmitti),
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congelados producidos en Cumaná, Estado Sucre,
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Microbiologia, 27, 31-37.
Dias JFB (2002). Redução da carga bacteriana da ostra-de-mangue (Crassostrea rhizophora) in natura, resfriada e
congelada, através da radiação gama. Monografia
(Especialização em Irradiação de Alimentos) – Faculdade
75
COMUNICAÇÃO BREVE
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Redução de fenda palatina, secundária a tumor venéreo transmissível, com
obturador palatino
Reduction of cleft palate, secondary to transmissible venereal tumor, with
palatal prosthesis
Liliana M. R. Silva1*, Fernando J. R. Magalhães2, Ana Margarida A. Oliveira1,
Maria Cristina O. C. Coelho2, Sílvia V. Saldanha2
1
Universidade de Évora, Portugal
Universidade Federal Rural de Pernambuco, UFRPE, Recife, Brasil
2
Resumo: Um canídeo, de raça Pastor Alemão, de 5 anos,
recebido na clínica cirúrgica do Hospital Veterinário da
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), apresentava uma fenda no palato duro, central e longitudinal, de 15 mm
por 39 mm, secundária a um tumor venéreo transmissível
(TVT). Após a realização de duas cirurgias reconstrutivas sem
sucesso, a fenda foi encerrada com um obturador palatino em
resina acrílica autopolimerizável, cuja confecção, em alginato,
foi feita com base num molde da maxila do animal. O aumento
do peso corporal, a ausência de sinais clínicos e a boa adaptação
do paciente ao obturador confirmam a eficácia do sistema obturador palatino como alternativa à reconstrução clássica, com a
utilização dos tecidos regionais, para o encerramento da fenda
palatina.
Palavras-chave: fenda palatina, obturador palatino, placa
palatina
Summary: A 5 years old, German shepherd dog, examined
at the surgical services of UFRPE ´s Veterinary Hospital,
presented a cleft palate, central longitudinal with 15 mm by
39 mm, secondary to transmissible venereal tumor. After two
unsuccessful reconstructive surgeries, it was occluded by a
polymethylmethacrylate palatal prosthesis, which was made
based on the animal´s maxilla mold. The body weight increase,
the lack of clinical signs and the patient´s adjustment to the
prosthesis confirm the efficacy of reduction cleft palate with
palatal prosthesis.
Keywords: cleft palate, palatal prosthesis
Introdução
O palato duro separa as cavidades oral e nasal. É
formado pelos ossos palatino, maxilar e incisivo.
Dorsalmente é revestido por epitélio nasal e na face
bucal por epitélio cornificado (Contesini et al., 2004).
Tem oito a dez rugas palatinas de cada lado da rafe
mediana (Ellenport, 1998). O palato duro é delimitado
*Correspondência: [email protected]
Tel: 93 730 36 50; Fax: 252 372 181
lateralmente pelos sulcos palatinos, caudalmente
pelos forâmenes palatinos maiores e rostralmente
pelas fissuras palatinas. A artéria palatina maior
emerge no forâmen palatino e dirige-se rostralmente
pelo respectivo sulco. Como é uma estrutura vascular
fundamental para a mucosa, merece especial atenção
durante os procedimentos cirúrgicos, de modo a
garantir a sua integridade (Gioso e Carvalho, 2005).
A fenda palatina pode ser de origem congénita ou
adquirida. Constitui uma comunicação anormal entre
as cavidades oral e nasal, permitindo a passagem de
alimentos e líquidos para a cavidade nasal (Santin et
al., 2008). As fendas palatinas adquiridas podem ser
consequência de traumas, infecções crónicas,
extracções dentárias ou outras odontopatias, ou ser
secundárias a intervenções cirúrgicas anteriores,
radioterapia ou neoplasias (Smith, 2000;
Sivacolundhu, 2007). As neoplasias estão entre as
principais causas de lesão óssea palatina. Contesini et
al. (2004) referem que o mastocitoma, a epúlide
fibromatosa, o fibrossarcoma, o fibromeloblastoma e
o osteossarcoma são as neoplasias mais frequentes. O
tumor venéreo transmissível (TVT) foi descrito por
Papazoglou et al. (2001) como sendo causa de fenda
palatina em 2 dos 6 cães presentes no seu estudo.
O TVT é um tumor de células redondas, cuja
disseminação ocorre principalmente por via venérea
ou por transplante directo de células neoplásicas
(Santos et al., 2008).
Está descrito como uma patologia cosmopolita,
principalmente em países tropicais e subtropicais, em
que existam cães errantes (Santos e Shimizu, 2004).
No Brasil, embora o TVT seja bastante frequente
(Lefebvre et al., 2007), existem poucos trabalhos que
avaliem estatisticamente a sua incidência (Dabus et
al., 2008).
Apesar da sua localização mais frequente ser o
aparelho genital externo de machos e fêmeas, pode
apresentar outras localizações, como o tecido subcutâ77
Silva LMR et al.
neo (Santos e Shimizu, 2004), ou a cavidade nasal ou
oral, justificado pelo comportamento social de lamber
ou farejar a genitália externa de outros animais
(Papazoglou et al., 2001; Dabus et al., 2008).
Sousa et al. (2000) referem que o Labrador
Retrivier, o Rottweiller, o Pastor Alemão e o Boxer,
são algumas das raças mais predispostas.
O diagnóstico definitivo é realizado por avaliação
citológica, pois para além de ser uma técnica simples,
minimamente invasiva e indolor, é realizada com
rapidez e baixo custo, produz menos distorção da
morfologia celular, e tem eficácia de 90 % para o
diagnóstico de neoplasias (Dabus et al., 2008).
O sulfato de vincristina, na dose de 0,025 mg/kg
(Santos et al., 2008) ou 0,5 a 1,0 mg/m2, administrado semanalmente por via endovenosa, durante 6 a 7
semanas consecutivas, é eficaz para a regressão total
do tecido tumoral, em todas as suas localizações
(genital ou não) (Sousa et al., 2000; Papazoglou et al.,
2001).
As fendas palatinas congénitas apresentam maior
incidência em raças braquicéfalas (Tobias, 2006).
Uma vez que podem ser hereditárias, animais que as
apresentem não devem ser utilizados como reprodutores (Griffiths e Sullivan, 2001). Segundo Hedlund
(2007), as fendas palatinas adquiridas não apresentam
predisposição racial, sexual ou etária.
Os sinais clínicos mais frequentes são rinite,
descarga nasal serosa ou mucopurulenta, tosse,
espirros (Lee et al., 2006), pneumonia por aspiração e
perda de condição corporal (Tobias, 2006).
Várias técnicas cirúrgicas têm sido descritas para a
correcção de defeitos no palato duro. Griffiths e
Sullivan (2001), Contesini et al. (2004), Hedlund
(2007), Sivacolundhu (2007) e Souza et al. (2007)
referem a utilização de enxertos mucoperiosteais, de
enxertos da mucosa palatal ou gengival ou lingual, a
aplicação de próteses de resina acrílica autopolimerizável, de cartilagem auricular ou outras membranas
biológicas, ou de botões para septo nasal de silicone,
entre outros. Recentemente Ophof et al. (2008)
realizaram um estudo sobre um implante substituto da
mucosa para a correcção de fenda palatina.
A utilização de próteses de resina acrílica
autopolimerizável está indicada em casos de recidivas
de cirurgias correctivas (Smith, 2000; Roehsig et al.,
2001; Lee et al., 2006). Roehsig et al. (2001)
utilizaram a resina acrílica directamente no defeito do
palato do animal para a sua obliteração, enquanto que
Lee et al. (2006) fixaram a prótese de resina com cola
instantânea e bandas plásticas no seu paciente.
As complicações mais frequentes deste tipo de
cirurgia estão relacionadas com a tensão da linha de
sutura, hemorragia, infecção e retracção cicatricial da
ferida cirúrgica (Contesini et al., 2004).
O sucesso da cirurgia reconstrutiva depende, em
larga escala, da preservação da vascularização dos
enxertos (Smith, 2000) e da capacidade do enxerto
78
RPCV (2009) 104 (569-572) 77-82
resistir ao stress mecânico induzido pela mastigação,
deglutição e movimentação traumática permanente da
língua no palato regional (Sivacolundhu, 2007).
O prognóstico é favorável nos pacientes com pequenas fendas (Tobias, 2006) ou nos pacientes em que são
corrigidas cirurgicamente, pois elimina-se o risco de
aspiração de alimentos para a via respiratória (Silva et
al., 2006). Animais que não sejam tratados cirurgicamente geralmente são eutanasiados ou acabam por
morrer devido a pneumomia por aspiração (Corrêa,
2008).
Descrição do caso
Um canídeo, de raça Pastor Alemão, de 5 anos de
idade, macho inteiro, foi referenciado para a clínica
cirúrgica do Hospital Veterinário da Universidade
Federal Rural de Pernambuco, por apresentar uma
fenda palatina. O proprietário referiu dificuldades na
alimentação do animal e os frequentes espirros e
secreção nasal mucopurulenta. Três meses antes, o
paciente tinha sido tratado com sulfato de vincristina
devido a um tumor venéreo transmissível (TVT)
localizado nas cavidades nasal e oral. Após o tratamento e remissão do TVT, os médicos veterinários que
o acompanhavam verificaram a existência de uma
fenda palatina, o que levou à realização de uma
cirurgia reconstrutiva com um enxerto de avanço.
Contudo, ocorreu a deiscência da sutura no período
pós-cirúrgico.
Ao exame físico, o paciente apresentava as
constantes vitais dentro dos parâmetros fisiológicos
e o peso corporal de 25 kg. Os exames hematológicos
e as radiografias torácicas não revelaram alterações
patológicas. Uma vez que o paciente não permitia
um detalhado exame da cavidade oral, procedeu-se à
tranquilização com acepromazina (0,1 mg/kg, IM) e
atropina (0,044 mg/kg, IM). Para a anestesia
administrou-se propofol (4 mg/kg, IV). Comprovou-se
a presença de uma fenda central longitudinal no
palato duro, de 15 mm por 39 mm (Figura 1).
Recomendou-se ao proprietário a administração de
alimentação pastosa e prescreveu-se ampicilina
(20 mg/kg, PO, TID, 7 dias).
Na segunda visita (Dia 7) realizou-se um molde
para se confeccionar um obturador palatino que
vedasse a fenda, até à realização de nova cirurgia
reconstrutiva. O paciente foi sedado, utilizando o protocolo anteriormente referido, e entubado com sonda
endotraqueal nº. 8,5. Previamente à moldagem efectuou-se uma citologia por aposição, sendo negativa para
a presença de células de TVT na amostra analisada.
Utilizou-se um molde individualizado preenchido
com alginato. Introduziu-se o molde no fundo de saco
gengivolabial até à tuberosidade maxilar, aplicando
pressão no sentido ventrodorsal, até completa gelificação do alginato. Removeu-se o molde da cavidade
Silva LMR et al.
bucal do animal e preencheu-se com gesso pedra
melhorado tipo IV, para obter o modelo de trabalho
(Figura 2). Neste modelo foi aplicado isolante para
resinas acrílicas (seco com jactos de ar). O obturador
palatino foi confeccionado em resina acrílica
autopolimerizável e com grampos de retenção
ortodônticos (Figura 2).
O proprietário continuou a administrar ampicilina
(20 mg/kg, PO, TID, 14 dias) e alimentação pastosa.
No 21º dia após a primeira consulta, procedeu-se a
uma cirurgia reconstrutiva, utilizando uma membrana
de pericárdio bovino conservada em glicerina a 98%,
e à colocação do obturador palatino. Após pré-medicação e indução conforme acima descrito, a anestesia
foi mantida com isoflurano. Para a cobertura da analgesia e antibioterapaia pré-cirúrgicas, administrou-se
tramadol (2 mg/kg, IV) e ampicilina (20 mg/kg, IV).
O paciente foi colocado em decúbito dorsal e
procedeu-se à assepsia da fenda palatina, com
clorhexidina a 2,0% e soro fisiológico, sob pressão
com seringa de 10 mL, para remoção da secreção
nasal mucopurulenta e dos resíduos alimentares
presentes (Figura 3). Para evitar falsos trajectos colocou-se gaze cirúrgica dobrada no pós boca.
Procedeu-se ao reavivamento dos bordos da fenda e
fixou-se uma película de pericárdio bovino, do mesmo
tamanho da fenda, através de uma sutura interrompida
simples com poliglatictina 910 com triclosan (Vicryl
Plus 2/0). Após obliteração da fenda, provou-se e
adaptou-se o obturador. Em seguida iniciou-se o
processo de remoção mecânica da placa bacteriana na
face vestibular dos dentes pré-molares e molares com
pedra-pomes. Este processo permitiu ainda aumentar
o atrito da superfície dentária, para que aumentasse o
grau de adesão do sistema obturador à região a intervencionar. De seguida, procedeu-se à lavagem com
soro fisiológico e posterior fixação da placa palatina.
A fixação dos grampos efectuou-se com ionómero de
vidro.
Depois da recuperação da anestesia, o paciente tentou remover o obturador com os membros anteriores.
Verificou-se que os grampos ortodônticos interferiam
com a oclusão e optou-se pela remoção da prótese
para correcção dos defeitos apresentados. Foi
recomendado ao proprietário, mais uma vez, a administração de alimentação líquida e fria. Prescreveu-se
meloxican (0,1 mg/kg, PO, BID, 5 dias), metronidazole 125 mg e espiramicina 750.000 UI (12,5 mg/kg e
75.000 UI/kg, PO, SID, 7 dias) e higienização da
cavidade oral com gluconato de clorhexidina a 0,12%,
TID.
Cinco dias depois, o animal regressou ao Hospital
Veterinário para colocação do novo obturador palatino. O proprietário referiu que, durante este período, o
animal tinha espirrado frequentemente, causando a
ruptura da membrana biológica. Para a construção do
novo modelo palatino, seguiram-se os mesmos princípios do anterior, sendo modificado na sua estrutura de
RPCV (2009) 104 (569-572) 77-82
fixação. Neste caso, criaram-se 6 pontos de tensão (3
em cada aresta maior da placa), com fio ortodôntico
duro elástico de 0,7 mm, em forma helicoidal, para
garantir maior resistência da placa de resina acrílica
autopolimerizável. O animal foi submetido aos
mesmos procedimentos descritos anteriormente até à
fixação do obturador. Os fios de cerclage 0,6 mm
foram introduzidos nos pontos de tensão do obturador
e nos espaços interproximais, e apertados em torno
dos dentes 107, 108, 109, 207, 208 e 209 para fixar o
obturador (Johnstone, 2002) (Figura 4).
De forma a impedir o traumatismo da mucosa bucal,
as extremidades dos fios de cerclage foram recobertas
com resina composta fotopolimerizável. Utilizou-se
pedra-pomes na face vestibular dos dentes prémolares e molares para aumentar o atrito e remover
mecanicamente a placa bacteriana. Lavou-se com soro
fisiológico e secou-se para evitar humedecimento da
face dentária. Aplicou-se ácido fosfórico a 37% no
esmalte dentário, por 15 s para promover o embricamento da resina fotopolimerizável. Lavou-se com soro
fisiológico, secou-se a superfície e aplicou-se a resina
fluída, fotopolimerizando-a em seguida. Aplicou-se a
resina composta fotopolimerizável e polimerizou-se
de novo.
Após a remoção da sonda endotraqueal, verificou-se a perfeita oclusão dentária, comprovando que a
fixação com fios de cerclage não impedia a correcta
mastigação do animal. Indicou-se ao proprietário a
continuação da medicação anteriormente prescrita,
utilização de colar isabelino e reavaliação em 7 dias.
Na reavaliação, 7 dias após a colocação do
obturador, o animal tinha aumentado 1,5 kg de peso
corporal e o proprietário referiu a ausência dos sinais
clínicos iniciais. Para uma mais cuidadosa e segura
reavaliação, realizou-se o mesmo protocolo de
sedação já referido. Verificou-se que a porção cranial
da fenda não estava totalmente encerrada pelo obturador, permitindo a passagem de alimentos líquidos
para a cavidade nasal. Decidiu-se anestesiar o
animal e corrigir o obturador palatino para perfeita
obliteração da fenda. Depois de remover a cerclage
dos dentes 207, 208 e 209, limpou-se o obturador,
adicionou-se a resina acrílica autopolimerizável e
procedeu-se ao acabamento e polimento. Voltou-se a
fixar o obturador como anteriormente relatado.
Indicou-se ao proprietário que seguisse os mesmos
cuidados pós-cirúrgicos anteriores e agendou-se
reavaliação em 15 dias.
Na visita seguinte, 21 dias após a colocação do
obturador, o animal apresentava ganho de 1,0 kg de
peso corporal desde a última reavaliação (26,5 kg),
continuava sem sinais clínicos e o seu estado geral era
satisfatório.
No último contacto com o proprietário (dia 36), o
paciente apresentava peso corporal de 29 kg, revelando um ganho de 5 kg desde a colocação do obturador palatino modificado.
79
Silva LMR et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 77-82
Discussão
do defeito ósseo e a interdigitação do acrílico com os
bordos irregulares do osso, o que favorece a sua estabilidade, mas tem como principal desvantagem a
exposição dos tecidos à reacção exotérmica que
ocorre durante a polimerização do acrílico (Goelzer et
al., 2003).
Devido à moldagem natural, após a adaptação e
fixação do obturador palatino, verificou-se a
existência de uma pequena fenda não encerrada pelo
obturador, e que foi preenchida com resina acrílica.
Segundo Lee et al. (2006), uma vez que este defeito
não era funcional e o paciente não apresentava sinais
clínicos, não havia necessidade de correcção do obturador. Estes autores não corrigiram o defeito no seu
caso e o animal permaneceu com a prótese durante 30
meses, sem quaisquer sinais clínicos.
A fixação do obturador palatino recorrendo a fio de
cerclage constitui uma desvantagem desta prótese,
pois é necessário anestesiar o paciente para a colocação e remoção da mesma, ao contrário da fixação
adoptada por Lee et al. (2006) com cola instantânea e
bandas plásticas, que permite os mesmos procedimentos com o paciente consciente. Contudo, a fixação
com fio de cerclage não interfere na oclusão, sendo
essa a sua principal vantagem.
A alimentação pastosa ou fluida nas primeiras
semanas no pós-operatório é defendida por Smith
(2000), Griffiths e Sullivan (2001), Contesini et al.
(2004), Silva et al. (2006) e Sivacolundhu (2007). No
entanto, Roehsig et al. (2001) referem a utilização de
sonda nasogástrica, orogástrica ou faringostomia, até
completa cicatrização. O acesso a objectos duros que
possam causar trauma, como brinquedos ou ossos,
devem ser evitados (Tobias, 2006; Sivacolundhu, 2007).
A administração de antibiótico no pós-operatório é
importante para o êxito da reparação da fenda palatina
(Contesini et al., 2004). A antibioterapia de largo
espectro de acção, como a associação metronidazol e
espiramicina, deve ser administrada durante 10 a 14
dias, especialmente se existirem sinais clínicos de
rinite (Smith, 2000).
A higiene da cavidade oral no pós-operatório deve
ser realizada com gluconato de clorhexidina a 0,12%,
pois, como referido anteriormente, apresenta acção
antibacteriana e supressora dos mecanismos adesivos
das bactérias (Goelzer et al., 2003).
O uso do colar isabelino foi indicado para os
primeiros dias após a colocação do obturador palatino,
para evitar que o animal tentasse removê-lo com os
membros anteriores.
A incompatibilidade da resina acrílica com tecidos
do organismo não foi encontrada na revisão de
literatura, tal como descrito por Roehsig et al., 2001.
No paciente não foram registadas quaisquer alterações
dos tecidos em contacto com a resina acrílica. Foi
recomendado o acompanhamento do paciente a cada
30 dias, para reavaliação do obturador palatino e do
comportamento dos tecidos contíguos.
No caso descrito, a fenda palatina surge como resultado da natureza invasiva e localmente destrutiva do
TVT (Papazoglou et al., 2001).
Devido à comunicação entre as cavidades oral e
nasal e à possibilidade de ocorrência de pneumonia
por aspiração, considera-se importante para a avaliação pré-cirúrgica a realização de radiografias
torácicas, que não revelaram alterações patológicas
(Lee et al., 2006).
A limpeza das cavidades oral e nasal no período
pré-cirúrgico é indispensável para evitar contaminação nos pontos de sutura e rinite (Silva et al., 2006).
O anti-séptico mais adequado é a clorhexidina, por
ter uma acção antibacteriana e supressora dos
mecanismos adesivos das bactérias (Goelzer et al.,
2003).
A cirurgia da fenda palatina está associada a uma
elevada taxa de insucesso, sendo a deiscência da
sutura a complicação mais comum no pós-operatório,
entre o sétimo e o décimo dias (Souza et al., 2007).
Para Smith (2000) e Griffiths e Sullivan (2001), a
tensão no local da sutura é a causa mais frequente de
deiscência. O insucesso da correcção pode estar
também relacionado com a cronicidade da fenda
palatina, o estado de saúde do paciente (Souza et al.,
2007) e a irritação e inflamação causadas pelo movimento da língua sobre a ferida cirúrgica (Lee et al.,
2006), como ocorreu no presente caso após a cirurgia
reconstrutiva com a membrana biológica. O facto do
paciente ter acesso ao exterior da casa e a alimentos
grosseiros e rígidos também contribuiu para a recidiva
da fenda palatina.
As complicações da cirurgia são minimizadas se
forem considerados princípios básicos da cirurgia do
palato, como refere Sivacolundhu (2007). Estes
incluem: realizar enxertos de dimensões um pouco
maiores que o defeito, manter a vascularização do
enxerto, reavivar os bordos do tecido a suturar, evitar
colocar as suturas sobre o defeito e manipular o
tecido delicadamente.
A escolha do tipo de fio utilizado na cirurgia de
reconstrução prendeu-se com o facto de ser o fio mais
adequado de entre os disponíveis no Hospital no
momento da cirurgia.
A utilização de uma prótese palatal foi referida
por vários autores. Lee et al. (2006) consideram-na
efectiva na protecção da vascularização e da ferida
cirúrgica. Neste caso, o obturador palatino encerrou
completamente a fenda palatina como referido por
Roehsig et al. (2001).
A realização de um modelo de trabalho a partir do
qual se confeccionou o obturador foi referido por Lee
et al. (2006), mas Roehsig et al. (2001) e Goelzer et
al. (2003) moldaram a resina acrílica, na sua fase de
massa plástica, directamente no defeito. Essa técnica
apresenta como vantagens o completo preenchimento
80
Silva LMR et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 77-82
Figura 1 - Mensuração de fenda palatina de canídeo, Pastor Alemão, de
5 anos de idade, do sexo masculino.
Figura 2 - Modelo de trabalho em gesso pedra melhorado tipo IV e
obturador palatino (seta amarela).
Figura 3 - Resíduos alimentares removidos da cavidade nasal, comprovando a comunicação entre cavidades oral e nasal.
Figura 4 - Obliteração da fenda palatina, secundária a TVT, com obturador palatino.
O aumento do peso corporal, a ausência de sinais
clínicos e a boa adaptação do paciente ao obturador
confirmam a eficácia do obturador palatino modificado na redução da fenda palatina.
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b l n S h o w B a c k = Fa l s e & i d C o n t e n t Ty p e = 1 2 7 4 ,
em 18/01/2009, 22, 12.
COMUNICAÇÃO BREVE
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Tronco celiaco-mesentérico em gato
Celiac mesenteric trunk in cat
Magno S. Roza, Fernanda M. Pestana, José M.F. Hernandez,
Bárbara X. Silva, Marcelo Abidu-Figueiredo*
UFRRJ – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/Instituto de Biologia/Anatomia Animal. Br 465 Km 07 s/n.Seropédica
Resumo: Com o objetivo de relatar uma variação vascular não
descrita anteriormente em felinos, descreve-se neste trabalho a
origem comum das artérias celíaca e mesentérica cranial através
de um tronco comum em três gatos, sem raça definida, machos,
adultos e de porte médio. Esta variação denominada então de
tronco celíaco-mesentérico já foi descrita em algumas espécies
de animais domésticos, como em cães, ovinos, caprinos,
bovinos, e também em humanos. Essa variação foi analisada,
medida e descrita no presente trabalho. O conhecimento da
presença do tronco celíaco-mesentérico em felinos contribuirá
para um melhor entendimento das alterações anatômicas que
possam ocorrer na vascularização abdominal desta espécie, bem
como é de fundamental importância para realização de
angiografias e procedimentos clínico-cirúrgicos que envolvam
esta região.
Palavras-chave: tronco celíaco-mesentérico, gato, variação
vascular
Summary: With the intention to report a vascular variation not
previously noticed in felines, this article describes the single
origin of the celiac and cranial mesenteric arteries through a
common trunk in three adult, cross breed male cats. This vascular variation is called celiac mesenteric trunk and was already
described in some species of domestic animals, such as dogs,
sheep, goats, cows and also in humans. This variation was
analyzed, measured and described in this report. The knowledge
of the presence of the celiac mesenteric trunk in cats will
contribute to a better understanding of the anatomical alterations that may occur in the abdominal vascularization, and is
also important for angiographic and surgical procedures that
involve this region.
Keywords: cat, vascular variation, celiac mesenteric trunk
Introdução
Dentre os ramos viscerais da porção abdominal da
aorta, as artérias celíaca e mesentérica cranial
possuem grande relevância em anatomia clínico –
cirúrgica e nos procedimentos angiográficos, pois são
responsáveis pela irrigação de importantes vísceras
*Correspondência: [email protected]
como fígado, estômago, baço, pâncreas e intestinos
(Nayar et al., 1983).
Esses vasos emergem da face ventral da artéria aorta
abdominal em sua porção mais cranial. Geralmente, a
artéria celíaca origina-se logo após a passagem da
artéria aorta pelo hiato aórtico do diafragma,
enquanto a artéria mesentérica cranial situa-se caudalmente em relação à primeira, afastando-se por
milímetros de distância (Getty, 1981; Berg, 1978;
Evans e Christensen, 1979; Nickel et al., 1981; Dyce
et al., 1997; Schaller, 1999; König e Liebich, 2004).
Vários autores estudaram a ramificação da artéria
celíaca em animais domésticos (Sleight e Thomford,
1970; Enge e Flatmark, 1972; Borelli e Boccalletti,
1974; Schmidt et al., 1980; Bednarova e Malinovsky,
1984; Machado et al., 2000; Niza et al., 2003; AbiduFigueiredo et al., 2005, 2008), demonstrando que seu
arranjo e ramificações são muito variáveis e que o
conhecimento exato desta variabilidade é de grande
importância no estudo prático e teórico, em animais
de experimentação e domésticos (Bednarova e
Malinovsky, 1984).
Estudos sobre as diferenças da vascularização
abdominal existente entre ovinos, cães, suíno e coelhos
demonstraram que as artérias celíaca e mesentérica
cranial têm sua emergência separadamente uma da
outra, sendo a primeira mais cranial (Nayar et al.,
1983). Entretanto, na literatura existem relatos de
casos em que as ambas as artérias tiveram sua origem
em um único ramo denominado de tronco celíacomesentérico. Esta variação anatômica foi relatada em
ovinos (Langenfeld e Pastea, 1977); bubalinos
(Machado et al. 2000); caprinos (Ferreira et al. 2001);
cães (Schmidti e Schoenaui, 2007) e humanos (Çavdar
et al., 1997; Çiçekcibasi AE et al., 2005).
Tendo em vista que esta é uma variação vascular
rara em gatos, e que possui importância clínico-cirúrgica, relatamos a origem das artérias celíaca e mesentérica cranial por um tronco comum, denominado
tronco celíaco-mesentérico.
No decorrer das atividades práticas de dissecção
realizadas nas disciplinas do Laboratório de Anatomia
83
Roza MS et al.
Animal do Departamento de Biologia Animal da
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
(UFRRJ), observou-se alteração na origem da artéria
celíaca em três gatos.
Os gatos foram posicionados em decúbito lateral
direito. Em seguida, o tórax foi aberto e dissecado
para evidenciação da porção torácica da artéria aorta,
que foi canulada utilizando sonda plástica flexível de
aproximadamente 0,4 cm de diâmetro e 10 cm de
comprimento. Desse modo, o sistema arterial foi
"lavado" com solução fisiológica de NaCl a 0,9%,
sendo realizado a seguir a fixação com solução de
formaldeído a 10% conforme técnica anatômica
padrão. Os vasos foram preenchidos com solução de
Petrolátex S65 corado. As peças permaneceram acondicionados em cubas com solução de formaldeído a
10% por 5 dias para polimerização do látex. Os
cadáveres foram dissecados, rebatendo-se as vísceras
abdominais para a evidenciação dos ramos viscerais
da porção abdominal da artéria aorta. Com um
paquímetro de precisão, foram obtidas medidas de
largura e comprimento do tronco e de seus ramos, bem
como da distância entre a emergência do tronco até a
emergência da artéria renal esquerda. Todas as
fotomacrografias foram obtidas com máquina digital
Nikon coolpix 4300.
Animal 1: Gato de aproximadamente três anos de
idade, mestiço, do sexo masculino. O tronco comum
denominado celíaco-mesentérico emergiu entre a
segunda e terceira vértebras lombares (L2-L3).
Apresentou 0,3 cm de comprimento e 0,5 cm de
largura, desde a sua origem até a bifurcação nas
artérias celíaca e mesentérica cranial. A artéria celíaca
apresentou 0,5 cm de comprimento e 0,3 cm de
largura, enquanto para a artéria mesentérica cranial as
medidas foram 3,5 e 0,3 cm, respectivamente. Essa
variação vascular posicionou-se a 2,4 cm da artéria
renal esquerda. Os principais ramos da artéria celíaca
foram a artéria hepática, seguida pela formação de um
tronco comum entre as artérias gástrica esquerda e a
lienal, o tronco gastro-lienal.
Animal 2: Gato de aproximadamente três anos de
idade, mestiço, sexo masculino. O tronco celíacomesentérico emergiu na segunda vértebra lombar
(L2). Apresentou 0,4 cm de comprimento e 0,44 cm de
largura, desde a sua origem até a bifurcação nas
artérias celíaca e mesentérica cranial. A artéria celíaca
apresentou 0,9 cm de comprimento e 0,3 cm de
largura e a artéria mesentérica cranial 2,1 cm de comprimento e 0,34 cm de largura. Essa variação
vascular posicionou-se a 2,2 cm da artéria renal
esquerda. Os principais ramos da artéria celíaca
observados foram a artéria hepática, seguida pela
formação de um tronco comum entre as artérias
gástrica esquerda e a lienal, o tronco gastro-lienal.
Animal 3: Gato de aproximadamente 4 anos de
idade, mestiço, sexo masculino. O tronco comum
denominado celíaco-mesentérico emergiu na terceira
84
RPCV (2009) 104 (569-572) 83-86
Figura 1 - Fotomacrografia da origem comum entre as artéria celíaca
(ac) e a artéria mesentérica cranial ( amc ) formando o tronco celíacomesentérico (tcm) no animal 1.
aa = artéria aorta ; tcm= tronco celíaco-mesentérico ; amc = artéria
mesentérica cranial;
ac = artéria celiaca; ah = artéria hepática; tgl = tronco gastro-lienal ; age
= artéria gástrica esquerda; al = artéria lienal.
vértebra lombar (L3). Apresentou 0,3 cm de comprimento e 0,4 cm de largura, desde a sua origem até a
bifurcação nas artérias celíaca e mesentérica cranial.
A artéria celíaca apresentou 0,5 cm de comprimento e
0,3 cm de largura e a artéria mesentérica cranial 3,1 cm
de comprimento e 0,3 cm de largura. Essa variação
vascular posicionou-se a 2,2 cm da artéria renal
esquerda. Os principais ramos da artéria celíaca
observados foram a artéria hepática, seguida pela
formação de um tronco comum entre as artérias
gástrica esquerda e a lienal, o tronco gastro-lienal.
Discussão
Embora vários autores tenham descrito com
uniformidade a artéria celíaca e os seus ramos, este
vaso apresenta freqüentes variações, que podem
ocorrer em todos os níveis (Niza et al., 2003).
Em relação ao local da origem, o tronco celíacomesentérico emergiu da porção ventral da aorta
abdominal, próximo ao hiato aórtico do diafragma,
concordando com os resultados obtidos por outros
autores, que estudaram o comportamento da artéria
celíaca em outros mamíferos e relataram que ambas as
artérias celíaca e mesentérica cranial emergem da face
ventral da aorta abdominal (Kennedy and Smith,
1930; Sleight and Thomford, 1970; Enge and
Flatmark, 1972; Berg, 1978; Evans and Christensen,
1979; Schmidt et al., 1980; Getty, 1981; Nickel et al.,
1981; Bednarova and Malinovsky, 1984; Dyce et al.,
1997; Schaller, 1999; Niza et al., 2003; König e
Leibich, 2004; Abidu-Figueiredo et al., 2005, 2008).
Machado et al. (2000) porém relatam que a origem da
artéria celíaca em fetos de bubalinos ocorre em nível
da aorta torácica, independentemente da artéria
Roza MS et al.
RPCV (2009) 104 (569-572) 83-86
Figura 3 - Fotomacrografia da origem comum entre a artéria celíaca (ac)
e a artéria mesentérica cranial (amc) formando o tronco celíaco-mesentérico (tcm) no animal 3.
aa = artéria aorta; tcm = tronco celíaco-mesentérico; amc = artéria
mesentérica cranial;
ac = artéria celiaca; ah = artéria hepática; tgl = tronco gastro-lienal;
age = artéria gástrica esquerda; al = artéria lienal.
Figura 2 - Fotomacrografia da origem comum entre a artéria celíaca (ac)
e a artéria mesentérica cranial (amc) formando o tronco celíaco-mesentérico (tcm) no animal 2.
aa = artéria aorta; tcm = tronco celíaco-mesentérico; amc = artéria
mesentérica cranial;
ac = artéria celiaca; ah = artéria hepática; tgl = tronco gastro-lienal;
age = artéria gástrica esquerda; al = artéria lienal.
mesentérica cranial.
Variações na forma da emergência da artéria celíaca
têm sido relatada em outros mamíferos, como a
presença do tronco celíaco-mesentérico formado pela
artéria celíaca e mesentérica cranial em ovinos
(Lancenfeld e Pastea, 1977), búfalos (Machado et al.,
2000), caprinos (Ferreira et al., 2001), bovinos
azebuados (Peduti Neto e Santis Prada, 1970), cães
(Schmidti e Schoenaui, 2007) e humanos (Çavdar et
al., 1997; Çiçekcibasi AE et al., 2005). Ainda no
homem uma ocorrência rara tem sido verificada, que
é a formação de um tronco único denominado tronco
celíaco-bimesentérico, formado pelas artérias celíaca,
mesentérica superior e mesentérica inferior (Bergman
et al., 1988; Nonent et al., 2001).
Variações anatômicas, raridades e má formações são
achados clínicos pouco freqüentes, e como os próprios
nomes sugerem, fogem do padrão pré-estabelecido
para a espécie em questão, aquele que ocorre com
maior freqüência, claramente conhecido como normal. Na tentativa de adotar uma nomenclatura mais
esclarecedora possível, será considerada variação
aquela alteração morfológica ou topográfica de certo
órgão, desde que não altere sua fisiologia (Sykes et
al., 1963), embora Willam e Humpherson (1999)
correlacionem estas variações com predisposições à
certas enfermidades. Já Sanudo et al. (2003), afirmam
que anomalias e má formações acarretam de alguma
forma alterações na fisiologia do órgão. De acordo
com Didio (1998), pode ser considerada raridade toda
estrutura que ocorra com uma freqüência de 1 a 2%
dentro de uma população.
Estudos complementares com número maior de
animais podem esclarecer em que situação se
enquadra os gatos. A observação da emergência
comum das artérias celíaca e mesentérica cranial por
um tronco comum observado em gato diverge da
origem individualizada dessas artérias mencionada
por Getty (1981), Nickel et al. (1981) e Dyce et al.
(1997).
Conclusão
A emergência das artérias celíaca e mesentérica
cranial por tronco comum em gatos é um achado
importante, pois esta variação, mencionada por
diversos pesquisadores em outras espécies, é rara em
gatos. A existência do tronco celíaco-mesentérico
nessa espécie tem importância significativa do ponto
de vista clínico-cirúrgico, com aplicabilidade prática
nos procedimentos que envolvam a vascularização
85
Roza MS et al.
da região abdominal. Além disso, estudos futuros,
baseados na freqüência da aparição dessa alteração
vascular, poderão elucidar a sua classificação, sendo
considerada raridade ou variação anatômica, proporcionando a inclusão do assunto nos compêndios de
anatomia veterinária comparativa.
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COMUNICAÇÃO BREVE
R E V I S TA P O R T U G U E S A
DE
CIÊNCIAS VETERINÁRIAS
Electrocution accident in free-ranging bugio (Alouatta fusca) with
subsequent amputation of the forelimb: case report
Acidente elétrico em bugio de vida livre (Alouatta fusca) com consequente
amputação do membro torácico: relato de caso
Melissa P. Petrucci, Luiz A. E. Pontes*, Fábio F. Queiroz, Márcia C. Cruz,
Diogo B. Souza, Leonardo S. Silveira, Ana B. F. Rodrigues
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – UENF
Hospital Veterinário da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro
Campos dos Goytacazes/RJ – Brasil
Summary: Bugios as well as other species of the Brazilian
fauna, are animals of wide geographic range which have been
included in the endangered species list. In Brazil, these
monkeys can be found in the Atlantic Forest, between the states
of Bahia and Rio Grande do Sul. They are also known as
guariba or barbado according to the region they live. This report
describes a high voltage wire electric shock accident that
burned the left anterior limb of a six-month old bugio (Allouatta
fusca) that took place in the region of Campos dos
Goytacazes/RJ. After a clinical evaluation of the limb, loss of
sensibility in the arm and forearm affected area was diagnosed,
accompanied by a loss of muscular mass and overall superficial
necrosis. The muscle-skeleton damage to that member required
its amputation. After the animal recovery, it was reintegrated
into its natural habitat without any adaptation problems.
Keywords: Bugio, Alouatta fusca, electric shock, burn
Resumo: Os Bugios, bem como outras espécies da fauna
brasileira, são animais de distribuição geográfica ampla, que
foram incluídos na lista de espécies ameaçadas. No Brasil, esses
macacos podem ser encontrados na Mata Atlântica, entre os
estados da Bahia e Rio Grande do Sul. Eles também são
conhecidos como guariba ou Barbado, segundo a região em que
vivem. Este relato descreve um acidente por choque elétrico em
fio de alta tensão que queimou o membro anterior esquerdo de
um bugio (Allouatta fusca) de seis meses de idade na região de
Campos dos Goytacazes / RJ. Após uma avaliação clínica do
membro afetado, foi diagnosticada a perda de sensibilidade no
braço e antebraço e a área foi acompanhada por perda de massa
muscular e necrose superficial global. Devido ao dano ao
músculo-esquelético foi necessária a amputação do membro.
Após a recuperação do animal, este foi reintegrado ao seu habitat natural, sem quaisquer problemas de adaptação.
Palavras-chave: Bugio, Alouatta fusca, choque elétrico,
queimaduras
*Correspondência: [email protected]
Bugios are primates placed in the family Cebidae,
genus Alouatta, which occupy a large geographic area
from Mexico to Argentina. In Brazil they can be found
in the Atlantic Forest, from the state of Bahia up to the
state of Rio Grande do Sul, and they receive different
names, guariba or barbado, according to the region
they inhabit (Silva, 1994; Silva et al., 1996). There are
two subspecies known in Brazil, the Alouatta fusca
fusca, in the south part of the state of Bahia through
Espírito Santo, and Alouatta fusca clamitans, found in
the south of Espírito Santo up to the state of Rio
Grande do Sul and farther to the north of Argentina
(Buss et al., 1997).
As many other species of the Brazilian fauna, the
bugio is part of the list of endangered species
(IBAMA, 1989; Fonseca et al., 1994). Their habitat is
distributed along the most populated areas of the
country, jeopardizing its survival due to hunting,
deployment of their environment and accidental
killing in areas next to the cities. The ever expanding
urban areas, mainly those related to non planed or
illegal human settlements, is the most common cause
of devastation of these monkeys’ habitats (Buss et al.
1997). The negative impact becomes worse because
the capture of bugios for pets is a common practice,
since finding young orphan monkeys occurs frequently.
They are also victims of dog attacks, electrocution and
gun shots.
Bugios are herbivore, thus their diet is made up of
fruit, leaves, seeds and flowers. They are mostly active
during the day and have the vocal communication as
their main characteristic. Like other species of the
genus Alouatta, bugios have large bodies, prehensile
tails and hairless faces. Male monkeys have a reddishbrown color shifting to gold on the back and their
beards might be red or black. The females are usually
paler in color, going from dark brown to light yellow
87
Petrucci MP et al.
(Buss et al., 1997; Chiarrelo, 1992). Aside from the
differences between primates and humans, there are
similarities in the body structure related to posturing
and to the existence of five fingers on each hand
(Champneys, 1871; Di Dio et al., 2003). Differences
in structure, location, origin and insertion of some
muscles reflect the diversity among species (AversiFerreira et al., 2005 e 2006). Different species of
primates that live in distinct areas, there can be found
muscles of same anatomy and function, as in the
pronator quadratus that assists in pronation of the
forearm and hand (Champneys, 1871).
In September of the year 2006, a six-month old
bugio (Alouatta fusca) was conducted to the
Veterinary Medical Center at UENF, the northern Rio
de Janeiro state university veterinary hospital. The
animal had severe electrical burns on its left anterior
member, caused by high voltage electrical wire contact.
That monkey was found fainted on the ground, in a
private rural land, within the vicinities of Imbé, in the
city of Campos dos Goytacazes/RJ. According to what
the people who found it said, the animal had the first
aid procedures done in a veterinary clinic. The
injuries, caused by the electrical shock, were cleansed
and administered of enrofloxacin oral solution. The
medication was administered for ten days showing no
obvious results. After that period, the bugio was taken
to the Wild Animal Research Center, "Núcleo de
Estudos e Pesquisa de Animais Selvagens – NEPAS",
at UENF.
At the first physical examination the animal showed
signs of severe dehydration, anorexia, apathy, tachycardia and body temperature close to 37.9 ºC. A
clinical evaluation of the injured member indicated a
low temperature and any movements in the fingers,
lack of sensitivity on the arm and forearm, loss of
muscle mass, dispersed superficial necrosis, pus and
exposed epiphyses of the radius and ulna bones.
Blood and urine samples were collected and
analyzed. The evaluation of the biochemical compounds of the blood, including the plasma, did not
reveal any important alterations, but confirmed the
severe dehydration condition. Excrement examination
by sedimentation showed no endoparasites eggs.
A macroscopical examination of the wounded area
showed muscle-bone injuries throughout the carpus
region up to the body of the humerus. Superficial and
deep muscle layer damages in the medial and lateral
regions of the limb were also observed (Figure 1).
Parts of the humerus, radius, ulna, the carpus bones
and the interosseous ligaments of the forearm radioulnar, dorsal, lateral collateral and medial collateral radiocarpal, ulnocarpal palmar and accessory
metacarpal - were affected as well, characterizing an
overall lesion of the member.
The bugio, who weighed 1 kg, was anesthetized
with cetamin (7.0 mg/kg) and diazepam (0.5 mg/kg),
followed by the debridement of the wounds. After
88
RPCV (2009) 104 (569-572) 87-90
Figure 1 - Superficial and deep muscle layer damages in the medial and
lateral regions of the limb of a bugio.
doing the debridement of the injuries, necrotic tissue,
they were covered with bandages impregnated with
ointment containing silver sulfadiazine.
The next step was the administration of enrofloxacin
oral solution (5 mg/kg), once a day, during ten days
and banamine (0.5 mg/kg), IM once a day for four
days. The first evaluation took place after seven days,
being necessary a new debridement procedure. The
treatment, including the bandage, was carried out for
twenty one days. Since the wounds were not healed
after that period of time, the animal was sent to the
surgery center for the amputation of the affected limb
(Figure 2). Intramuscular cetamin (15 mg/kg) and
diazepam (1 mg/kg) were administered for the bugio
to undergo surgery, being necessary, afterwards,
intravenous cetamin (2 mg/kg). For maintenance,
isoflurane administration was initiated, set at universal
calibration.
The limb was amputated near the umeral-radioulnar
articulation (Figure 2). As for the post-surgical treatment, carprofen was prescribed (4 mg/kg once a day
for five days), enrofloxacine (5 mg/kg once a day for
ten days), both PO, and rifocin was sprayed over the
surgery wound for ten days. After the tenth day, the
Figure 2 - Amputation of the affected limb in the surgery center.
Petrucci MP et al.
stitches were removed and the proper cicatrisation,
according to the elapsed time, could be observed. The
surgical cut borders joined without the need for post
treatment.
Choosing to amputate part of the limb was a decision made because of the extent of the area affected by
the lesions - necrosed areas, muscular degeneration
and ligament ruptures - which were the cause of lost of
sensitivity on the extremity of the member (Figure 2).
Once amputated, the bugio was placed into a natural
habitat in the private propriety where it was first found
and was taken care of by the people of the area, who
gave it the right food and water. Its adaptation to a life
without one of the limbs, even living in the treetops,
was surprisingly faster considering the period between
the animal’s release, after the surgery, and the time it
was last seen back into the propriety.
The main concern about the survival of wild
animals with amputated limbs is about post-surgical
stress and adapting to new circumstances. The bugio
was adopted by the owner of the hotel "Bicho Souto",
located in an area of environmental preservation,
where it is being fed and monitored over the past three
years (1095 days) and were not observed stress behaviors, demonstrating a positive adaptation to the
new situation. The animal reported has completely
adapted to limb loss, managing to get around without
difficulty (Figure 3) with the help of the tail for over-
Figure 3 - Bugio viewing the left limb amputated, three years after the
amputation surgery.
coming obstacles (Figure 4). The surgical wound and
burn achieved a satisfactory outcome, only still
remaining the presence of alopecia in the burn area.
Other cases have been reported with success, a deer
(Mazana gouazoubira) with amputated forelimb was
observed for thirty days, adapting well to amputation
(Quessir, 1993). A wolf with amputation of the right
forelimb was observed for ten months and no clinical
complications were noted (Carissimi et al., 2005) and
a southern tamandua (Tamandua tetradactyla) showed
good recovery from ambulation, appetite and response
to external stimuli after 45 days of surgery (Robinson
et al., 2009).
RPCV (2009) 104 (569-572) 87-90
Figure 4 - Animal with the left limb amputated using the tail as a support and moving in telephone wires at the Hotel.
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