VESTÍGIOS SOBRE A ARITMETICA EM ESCOLAS
PRIMÁRIAS DA REGIÃO DE VASSOURAS (RJ), DE 1880
A 1900
Lucia Maria Aversa Villela
Universidade Severino Sombra, Brasil
[email protected]
RESUMO
O texto objetiva trazer reflexões sobre o processo de escolarização em fins
do século XIX, no Município de Vassouras (RJ), e a aritmética veiculada
nas escolas de primeiras letras. Trata-se de um estudo historiográfico, que se
baseia, dentre outras fontes, em relatórios endereçados à presidência da
Câmara Municipal. Aponta-se indícios sobre os espaços escolares,
mobiliários, solicitações de materiais e provas aplicadas por bancas
examinadoras, quer na seleção de professores ou na certificação de alunos.
Palavras-chave: escolas de primeiras letras – século XIX – Arithmetica
– Vassouras (RJ).
ABSTRACT
The text aims to bring reflections on the process of schooling in the late
nineteenth century, in the municipality of Vassouras (RJ), and the
Arithmetica conveyed in schools of first letters. It is a historiographical
study, which is based, among other sources, on reports addressed to the
President of Hall. It points evidences about the school spaces, furniture,
material requests and tests applied by examination boards, either in the
selection of teachers or certification of students.
Keywords: Primary schools – nineteenth century – Arithmetica –
Vassouras (RJ)
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28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil
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Introdução
Várias pesquisas têm abordado peculiaridades sobre intervalos de tempo e delimitações
geográficas trazendo informações que auxiliam, com maior cientificidade, a composição de
visões históricas mais amplas. Neste caso, centro foco em uma região situada na região
centro-sul fluminense do Vale do Rio Paraíba do Sul, distando cerca de 120 km da capital do
Rio de Janeiro e considero as duas últimas décadas do século XIX.
Quem hoje visita a cidade de Vassouras percebe que viveu momentos de opulência e, ao
buscar sua história, verá que a província foi a maior exportadora mundial de café em meados
do século XIX. De acordo com Petrucelli (1994), em 1870 Vassouras era responsável por
66% do comércio mundial de café.
O atual Município de Vassouras é, em extensão, bem menor do que o era no período a
que se propõe o presente estudo.
Tabela 1: Dados sobre a Região de Vassouras em 1887 e em 2010
Superfície (em km2)
População
Densidade demográfica (hab/km2)
Total de escolas
1887
2010
1.048,4
19.085
18,2
15
552,4
33.950
61,5
64
% de aumento
ou redução
-53%
+ 78%
+ 238%
+ 326%
Fontes: reflexões da autora a partir de Almeida (1889) e IBGE (2007, 2010).
Neste intervalo de cerca de treze décadas muitas foram as marcas históricas deixadas
nesta região e, certamente, há que se buscar outros informes, além dos postos na Tabela 1, que
nos permitam tecer considerações sobre as condições de escolarização e a aritmética
veiculada em suas escolas de primeiras letras nos vinte anos contemplados neste texto.
Em consonância com as concepções teórico-metodológicas de historiadores, tais como
Chartier (1990) e Prost (2008), confronto dados históricos de natureza diversa, embora
privilegie as fontes primárias pertencentes ao Arquivo Público da Secretaria Municipal de
Educação de Vassouras (APSMEV). Este acervo encontra-se sobre a guarda do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), seção Vassouras, que, por motivos
alegados pela gerência local, infelizmente tem se mantido fechado aos pesquisadores externos
desde fins de abril de 2011 até o presente momento (31/08/2012). Esta inclusive é uma
justificativa da delimitação temporal tomada neste artigo, uma vez que o levantamento que
vinha sendo feito não se completou. Deste acervo constam provas aplicadas em exames para
seleção de professores e provas de alunos, bem como mapas trimestrais de frequência, recibos
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de pagamento, inventários de bens existentes nas escolas e demais relatórios enviados por
professores à Câmara Municipal de Vassouras.
Conto também com informes existentes em relatórios de Assembleias da Província do
Rio de Janeiro (JACOB, 2001) e legislações imperiais (CÂMARA DOS DEPUTADOS,
1881-1889), além de dados já sinalizados por outros pesquisadores. Com este conjunto de
fontes busco também compor hipóteses de como se processava a formação de professores na
Escola Normal da referida província, privilegiando a aritmética ali abordada.
Ao longo da pesquisa volto sempre meu olhar às práticas e representações
(CHARTIER, 1990) e às concepções sobre cultura escolar (JULIA, 2010; VIÑAO FRAGO,
2007). Creio que assim é possível melhor tecer a história das disciplinas escolares
(CHERVEL, 1990).
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Compondo a leitura espaço-temporal do contexto a ser pesquisado
O processo de extração de ouro e pedras preciosas das Gerais estava em declínio em
fins do século XVIII e, na virada para o século XIX, novos ventos traçaram os rumos da
economia brasileira, surgindo o interesse de se investir na monocultura cafeeira nestas terras.
Isto porque a cultura de tais grãos no Haiti, iniciada 1715 e que em 1784 já cobria 50% do
mercado mundial, vinha decaindo após a declaração da independência daquele país em 1791.
Na segunda metade do século XVIII a cultura cafeeira ocupava a baixada fluminense e
o entorno da cidade do Rio de Janeiro. No século XIX, atendendo às demandas dessa cidade
cuja população crescera vertiginosamente após a vinda da família real para as terras
brasileiras, pouco a pouco este plantio caminhou para as províncias do interior. A
interiorização desta cultura deu margem, no período de 1861 a 1864, ao reflorestamento da
Mata da Tijuca (LESSA, 2005, p. 103), maior área replantada em perímetro urbano que
possuímos e excelente ponto turístico da cidade do Rio de Janeiro.
As terras férteis praticamente virgens do Vale do Paraíba do Sul, em escarpas e
declives, e o clima ameno atendiam às necessidades dos cafezais.
2.1. Vassouras: origem e importância socioeconômica
Em fins do século XVII a região em estudo era habitada por indígenas que ofereciam
forte resistência aos viajantes e aos poucos donos de terras que iniciavam suas roças e criação
de animais. Mas, dentre os inúmeros caminhos construídos ao longo do século XVIII a fim de
melhor escoar as riquezas extraídas das Gerais, surgiu um próximo à margem direita do
Paraíba que propiciou o surgimento do Arraial de Vassouras nas proximidades da Estrada da
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Polícia. Esse Arraial transformou-se na sede da antiga Vila de Nossa Senhora do Alferes e
posteriormente, pelo Decreto de 15/01/1833, passou a ser a Vila de Vassouras (MOURA,
1860, p. 335). A comarca de Vassouras foi criada em 13/04/1835 (MOURA, 1860, p. 336).
Passou à categoria de Cidade de Vassouras em setembro de 1859, no auge da produção de
café. Em consequência desse crescimento econômico da região, surgiu a concentração de
capital nas mãos dos fazendeiros e a venda de títulos de nobreza. A cidade passou a ser
conhecida como a “Cidade dos Barões” e tida como a capital econômica da Província do Rio
de Janeiro, cujo porto, em consequência, tornou-se o maior exportador de café do mundo.
Lessa (2005) nos informa sobre a crescente exportação do café proveniente de terras
brasileiras nessa época: “[...] em 1796 há registro de uma exportação de 8.500 arrobas (uma
arroba = 14,64kg) pelo porto do Rio de Janeiro. Pelo mesmo porto, em 1808, são exportadas
82.200 arrobas” (LESSA, 2005, p. 102). Em praticamente uma década, o volume de café
exportado por este porto quase decuplicou: era chegada a fase do “ouro negro”.
Quando começou o acúmulo de capital em Vassouras “para cá [se] deslocam as
novidades vindas da Europa. São as casas de moda, as companhias teatrais, os colégios para
meninos e meninas” (MEDEIROS, 2002, p. 32). Timidamente as escolas começaram a surgir
a partir de 1833.
Se este perfil caracterizou o período áureo da cultura cafeeira em Vassouras, de 1850
até os anos 1880, os dados dos censos de 1872 e 1890 nos dão indícios de que o município
chegou ao Brasil República com outros horizontes.
Tabela 2: Vassouras, população segundo a cor nos anos dos censos
Cor
Branca
Parda
Negra
TOTAL
1872
2.764
1.797
6.103
10.664
1890
4.046
2.223
3.397
9.996
Fonte: Recenseamentos de população, 1872 e 1890, apud Petruccelli, 1994.
A população branca aumentara em torno de 47%, enquanto a parda, por volta de 24%.
Já os de raça negra sofreram uma redução em torno de 44%. Com relação a esta redução,
sabe-se ser fruto da abolição dos escravos, oficializada em 13 de maio de 1988. No que
concerne ao aumento da população branca, sinalizo que encontramos no APSMEV, em listas
de frequência deste período, a presença de alguns alunos imigrantes na região.
Vê-se em jornal local - O Vassourense - que a virada de 1880, além de lhes trazer
problemas com a febre amarela, já apontava um decréscimo de poder socioeconômico:
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Vassouras, esta cidade de magníficos edifícios, de ruas largas e bem
calçadas, de praças luxuosamente ajardinadas; Vassouras, cujos habitantes
são, na maior parte, pertencentes à classe superior da sociedade. Já não é o
que foi outr´ora, commercialmente fallando. [...]: tudo isso fazia de
Vassouras uma Londres em miniatura com a diferença porém de ser
allumiada por esse brilhante sol americano,... (O VASSOURENSE,
19/02/1882 apud TEIXEIRA, 2010, p. 3).
A região serviu à história econômica do país desde a primeira metade do século XVIII,
quando produzia anil, bicho da seda, abelhas, porcos, um pouco da cana de açúcar e recebia
em algumas estalagens os tropeiros que traziam o ouro das Gerais para o Rio de Janeiro. Foi
de seu solo que, no século XIX, os braços escravos retiraram do solo o “ouro negro” para os
barões do café. Foi do ventre de suas escravas que, em alguns casos e antes da Lei do Ventre
Livre (LEI nº 2040 de 28/09/1871), vieram os lucros das fazendas voltadas à procriação. Foi
nessa mesma terra já saturada pela monocultura cafeeira que, em fins do século XIX e
primeiras décadas do século XX, imigrantes estrangeiros ainda colocaram seus projetos de
vida. Chegara a hora dos esforços se concentrarem na criação de gado, sem que trouxesse à
região o esplendor de outrora. Enquanto isso, o plantio do café migrava vorazmente para as
terras de São Paulo, em busca de terrenos férteis, embora nesta nova fase o cultivo se pautasse
em novas bases.
2.2. A Instrução Pública na Província do Rio de Janeiro em fins do século XIX
O Ministério de Pombal, em 1755, já sinalizava a importância de se incentivar o estudo
do idioma português, posto que fosse considerado um instrumento de dominação, e, com
relação às escolas de primeiras letras, no artigo 7º afirmava que:
[...] haverá em todas as povoações duas escolas publicas, uma para os meninos na qual se lhes
ensine a doutrina christã, a ler, escrever, e contar na forma que se pratica em todas as escolas
das nações civilizadas; e outra para as meninas, naqual além de serem instruidas na doutrina
christã, se lhes ensinará a ler, escrever, fiar, fazer renda, costura e todos os mais ministerios
proprios daquele sexo. (MOURA, 1860, p. 165).
Percebe-se na proposta de Pombal que os rudimentos de aritmética estariam reservados
apenas aos meninos.
A primeira lei de ensino no Brasil Império só surgiu em 1827. Essa lei mandou “crear
escolas de primeiras letras em todas as cidades, villas e logares mais populosos do Imperio”
(LEI IMPERIAL, de 15/10/1827) e estabeleceu normas para o funcionamento de tais
estabelecimentos. Seriam escolas mútuas (método lancasteriano) e estabelecia o que caberia
aos professores ensinar:
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Art. 6º. Os Professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de
arithmetica, pratica de quebrados, decimaes e proporções, as noções mais
gerais de geometria pratica, a grammatica da língua nacional, e os princípios
de moral christã e da doutrina da religião catholica e apostolica romana,
proporcionados á comprehensão dos meninos; preferindo para as leituras a
Constituição do Imperio e a Historia do Brazil. (LEI IMPERIAL, de
15/10/1827)
Esta Lei, apesar de oferecer igualdade de vencimentos aos professores de ambos os
sexos (Art. 13), dava direito ao estudo de meninas, mas lhes oferecia também um ensino
diferenciado. Diferentemente do recomendado por Pombal em 1755, esta lei apontava-lhes a
necessidade destes conhecimentos, mas lhes restringia a amplitude:
Art. 12. As Mestras, além do declarado no art. 6º, com exclusão das noções
de geometria e limitando a instrução da arithmetica só ás suas quatro
operações, ensinarão também as prendas que servem á economia domestica;
e serão nomeadas pelos Presidentes em Conselho, aquellas mulheres, que
sendo brasileiras e de reconhecida honestidade, se mostrarem com mais
conhecimentos feitos na fórma do art. 7º. (LEI IMPERIAL, de 15/10/1827)
Nessa Lei Imperial, o artigo 7º estabelecia que os candidatos devessem ser “examinados
publicamente perante os Presidentes, em Conselho”, enquanto que no artigo 5º, comentava
que os professores já em exercício que se sentissem sem “a necessária instrução deste ensino,
irão instruir-se em curto prazo e á custa dos seus ordenados nas escolas das capitães” (LEI
IMPERIAL, de 15/10/1827). Criou-se assim a necessidade de melhor formar os professores e
a primeira escola normal do continente americano foi inaugurada em 1835, em Niterói (RJ).
A Lei nº 10, de 10/04/1835, que autorizava a criação “na Capital da Província do Rio de
Janeiro huma Escola Normal para nella se habilitarem as pessoas, que se destinarem ao
magistério de instrução primária”, seguindo os moldes da Lei de 1827, atribuía no artigo 2º ao
diretor a missão de ensinar:
Primo: a ler e escrever pelo methodo Lancasteriano, cujos princípios
theoricos e práticos explicará. Segundo: as quatro operações de Arithmetica,
quebrados, decimaes e proporções. Tertio: noções geraes de Geometria
theorica e pratica. Quarto: Grammatica de Língua Nacional. Quinto:
elementos de Geographia. Sexto: os princípios de Moral Christã, e da
Religião do Estado. (Lei nº 10, de 10/04/1835)
Em relatório de 1º de março de 1836, elaborado por Joaquim José Rodrigues Torres,
então Presidente da Assembleia Legislativa da Província do Rio de Janeiro, vê-se que tal
escola “começou a ter exercicio no fim de Outubro próximo passado, com a boa estrea de
haver sido nomeado seu Director o Tenente Coronel José da Costa Azevedo” (TORRES,
1836, p. 3) e que havia sido incluído no orçamento, além do ordenado do diretor e as
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gratificações dos dez alunos pensionistas e do aluguel da casa para aulas, uma quantia a ser
destinada a “impressão e encadernação d’huma obra, que o Tenente Coronel Costa Azevedo
se propõem traduzir para uso da Escola; a da impressão de suas lições de Arithmetica e
Grammatica da Lingua Nacional aos discípulos d’ella” (TORRES, 1836, p. 5).
A precariedade da instrução pública na Província do Rio de Janeiro em fins da década
de 1830 e o alcance da formação oferecida pela Escola Normal estão explícitos no relatório do
Conselheiro José Paulino Soares de Souza, em relação ao ano de 1839:
Vinte e cinco são as escolas publicas de primeiras letras que hoje existem na
Provincia, das quais quatro são de meninas. Dos 21 professores existentes,
10 forão alumnos da escola normal e 18 sómente se achão em exercicio,
visto que os de Itaborahy, Barra Mansa e Pirahy ainda não abrirão as suas
escolas, o que terá lugar brevemente. Das quatro escolas de meninas, huma a
de Angra dos Reis, ha pouco provida ainda não foi aberta. [...] As 21 hoje
em exercicio, são freqüentadas por 853 meninos e 76 meninas que perfazem
a totalidade de 929 Alumnos. [...] A Escola Normal já tem produzido 13
Alumnos, que fizerão exame, tendo 12 entrado, em concurso. Dez estão
providos em cadeiras de instrução primaria, como acima disse, e 3 recusarão,
depois de promptos, seguir carreira do magistério” (SOUZA, 1851, p. 3335).
Nesse relatório existia uma previsão de 48$000 reis para a compra de doze livros de
geometria de Vilella Barboza que seriam usados na Escola Normal. Essa Escola existiu até
1851, embora possamos acompanhar em relatórios posteriores a esta data (JACOB, 2001) que
outros espaços para a formação de professores se seguiram a esse. Em todos esses textos fica
claro que existiram dificuldades dos diretores para enfrentar problemas de ordem
administrativa, gerir os gastos, driblar problemas de baixa frequência e sonhar com melhores
recursos didáticos.
Destacamos, por exemplo, o que o diretor da Escola Normal, José Carlos d’AblausbaryLuz, em seu relatório de 26/07/1870 e na parte referente à segunda cadeira, Arithmetica e
Metrologia, que estava a cargo do engenheiro Pedro de Alcântara Lisboa, afirmava: “o ensino
da metrologia é comum a ambos os sexos, mas o da arithmetica estende-se mais para o sexo
masculino” (d’ABLAUSBARY-LUZ, in SILVA, 1870, A1-15). Em seu texto, arrolava as
reclamações do Professor Lisboa:
Deploro todavia que a Escola Normal não possua ainda em sua biblioteca
alguns methodos de ensino recommendaveis, e o material para facilitar o
estudo da arithmetica e do systema métrico. De entre dezenas de compendios
que convém á instrução primaria e profissional essencialmente praticos,
citarei as diversas obras de F. Delille, de Villequet, de Dumont. O necessario
de Carpentier, o quadro synoptico de Deleschamps, o quadro de Linares, a
escala metrica de Demkés, a caixa de Bonnet, o aparelho de Level ainda não
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se achão na Escola Normal do Rio de Janeiro! (LISBOA apud
d’ABLAUSBARY-LUZ, in SILVA, 1870, A-16).
O conhecimento do Professor Lisboa sobre materiais didáticos que lhes seriam úteis e a
falta que faziam em seu ofício foi destacada por seu diretor e, mais ainda – ampliada - pois
d’Ablausbary-Luz afirmava que o professor poderia ter anexado a “estes objectos o quadro de
Magin e o excellente methodo com quadros muito commodos de M. Tarnier”
(d’ABLAUSBARY-LUZ in SILVA, 1870, A-16). Se por um lado tudo isso mostrava certa
erudição e conhecimento de novas tendências no ensino por parte desses profissionais, por
outro lado denotava a dependência deles com relação a materiais manipuláveis no seu dia a
dia em sala de aula, até porque este relatório nos informa que a então segunda cadeira só era
cursada por três alunos e cinco alunas. Se a Escola Normal próxima à Corte não possuía tais
recursos, que dirá os estabelecimentos onde estes futuros professores iriam trabalhar? Fica a
curiosidade com relação a como, por exemplo, o Professor Lisboa enfrentava tal situação.
De março de 1874 a dezembro de 1875 aconteceu outra tentativa de se criar um novo
local com este mesmo fim. Era de caráter particular e subvencionada pelo governo tendo o
nome de Escola Normal Livre do Município Neutro do Rio de Janeiro.
Em 1876, através do Decreto n° 6.379, o Ministro do Império, José Bento da Cunha
Figueiredo, tentou instalar Escolas Normais públicas e estatais: uma, em regime de externato,
para professores e outra, em regime de internato, para professoras primárias. Mas a Escola
Normal pública e gratuita concretizou-se somente em 1880.
Por meio do Decreto n° 8.025 de 16 de março de 1881 ficou estabelecido que:
Artigo 1°: A Escola Normal tem por fim preparar professores primários de
1° e 2° graus: o ensino nela distribuído será gratuito, destinado a ambos os
sexos, e compreenderá dois cursos – o de ciências e letras e o de artes.
Artigo 2°: O curso de Ciências e Letras se comporá das seguintes matérias:
Instrução Religiosa, Português, Francês, Matemática Elementar, Corografia
e História do Brasil. Cosmografia, Geografia e História Geral, Elementos de
Mecânica e Astronomia, Ciências Físicas, Ciências Biológicas, Lógica e
Direito Natural e Público. Economia Social e Doméstica, Pedagogia e
Metodologia.
Artigo 3°: O curso de Artes abrangerá as seguintes disciplinas: Caligrafia e
Desenho Linear, Música Vocal, Ginástica, Trabalhos de Agulha (para
alunas). (DECRETO n° 8.025, 16/03/1881, art. 1°, 2° e 3°). (MARTINS,
2009, p. 8-9)
O artigo 2º do Decreto nº 8.025, de 16/03/1881, mais uma vez, demarcou espaço para os
conhecimentos matemáticos na formação desse professor que atuaria na escola elementar. Ao
se analisar o artigo 7º desse Decreto, que estabelecia as matérias que seriam propostas no
currículo da Escola Normal, vê-se a indicação de uma matemática para além da que seria
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ministrada na escola de primeiras letras: se Aritmética: estudo completo, teórico e prático
estava como uma das quatro cadeiras da primeira série, na segunda série tinha-se como uma
das quatro cadeiras a de Álgebra, geometria e trigonometria: Álgebra até equação do 2º Grau
a uma incógnita inclusive. Geometria elementar, estudo completo; exercícios e problemas;
noções de trigonometria retilínea (SILVEIRA, 1954).
Ano a ano, ao se acompanhar os relatórios da Assembleia Legislativa da Província do
Rio de Janeiro, torna-se possível observar o fluxo de escolas que eram abertas e outras
fechadas em cada município. Poderiam ser municipais, particulares subvencionadas ou apenas
particulares. No relatório de 1881 (CAMPOS, 1881, p. 20-21), por exemplo, há o registro de
que houve um aumento de cerca de 65% no número de escolas subvencionadas em relação às
criadas até 15 de março, pois foi “concedida subvenção a 21 escolas para o sexo masculino e
10 para o sexo feminino” (sendo uma de cada sexo no Município de Vassouras), perfazendo
um total de 79 escolas subvencionadas em toda a Província.
3
As Escolas de Vassouras em Fins do Século XIX e a Aritmética
As dificuldades existentes em educação no resto do país se repetiam nessa região.
Baixos salários e a grande distância entre as escolas eram fatores que dificultavam a criação
de novos núcleos de ensino. O despreparo dos professores e a filosofia vigente de um ensino
mnemônico predominavam.
Dentre as experiências significativas registradas na história da educação de Vassouras,
Medeiros citou que em 1854 foi criado o Colégio Fernandes: ele atendeu a 250 alunos
oriundos de várias localidades ao longo dos seus onze anos de existência. “Aí se ensinavam as
primeiras letras, caligrafia, geografia, desenho, latim, francês, inglês, música, filosofia,
retórica, francês (conversação), piano, canto e todos os preparatórios” (MEDEIROS, 2002, p.
74). Neste ponto, percebo que mesmo no famoso Colégio Fernandes não aparecia explicitado
o ensino de aritmética, apesar de Matoso (1978, p. 36) ter afirmado que na região de
Vassouras, desde 1933, havia sido “introduzido por determinação da Regência o estudo de
Aritmética nas escolas primárias, conforme se verifica de um ofício existente no arquivo da
Câmara Municipal”.
O Diretor de Instrução Pública da Província do Rio de Janeiro, Josino do Nascimento
Silva, informava nos mapas anexos a seu relatório de 11/8/1880, o quantitativo de escolas e
população em cada uma das Freguesias do Município de Vassouras em 31/12/1979 (SILVA,
1880, M-3).
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Tabela 3: Quadro das escolas existentes em 31/12/1879 no Município de Vassouras,
e proporção com a população de cada Freguesia
Freguezia
População
Nossa Senhora da Conceição de Vassouras
Santa Cruz de Mendes
Nossa Sra da Conceição do Paty do Alferes
São Sebastião dos Ferreiros
Sacra Família do Tinguá
Total
4.461
1.647
6.353
2.123
4.501
19.085
Nº
de
escolas
3
2
3
2
6
16
Uma escola
por habitantes
1.487
823
2.117
1.061
750
1.193
Fonte: Relatorio do Director de Instrucção Publica da Província do Rio de Janeiro
(SILVA, 1880, M-3)
Na Tabela 3 vê-se que o Município de Vassouras, em fins de 1879, a situação em
relação à educação era crítica. Observemos que a população citada por Silva (1880) é a
mesma que aparece na Tabela 1, citada por Figueiredo (1889): é que ambos se basearam na
informação do “quadro organizado pela directoria de obras publicas em 1878” (ALMEIDA,
1889) e que, portanto, havia dificuldades em se ter informes censitários mais atualizados.
As condições de funcionamento destes espaços escolares eram muito precárias. Um
exemplo disso é o pedido que os professores Emilia Amalia de Oliveira e Eduardo Ernesto de
Oliveira fizeram por escrito, em 14 de outubro de 1882, ao Presidente da Câmara Municipal
de Vassouras solicitando "um auxílio na concessão de uma pena d'água para cada uma das
salas onde trabalham as escolas. [...] A estes estabelecimentos públicos concorre diariamente,
Ilmo Srs, um número superior a cem alunos de ambos os sexos" (APSMEV, 14/10/1882). O
documento foi assinado primeiro pela professora Emilia (percebe-se que a caligrafia é dela em
todo o texto) e depois pelo professor Eduardo.
Em outro relatório, de 7 de janeiro de 1885, da Escola Municipal do Ribeirão, o
professor Luiz Antonio de [...] Cardoso relata que é o responsável por esta escola a partir da
sua criação em 1 de abril de 1883 e que, desde então está tem funcionado em “casas gratuitas
offerecidas pelos philantropicos e beneméritos cidadões Pedro Nolasco da Costa e Souza e
Antonio Braz de Souza” (APSMEV, 07/1/1885). Pelos documentos encontrados destacamos
que essa gratuidade de espaços não era uma prática, pois encontramos outros comunicados
afirmando valores de aluguéis cobrados por salas em casas e até mesmo autorizações da
Câmara para que fossem feitas mudanças para outros endereços mais baratos.
Voltando ao documento emitido pelo professor Cardoso, já citado, pensamos ser
relevante a transcrição das informações que se seguem:
Matricularão-se oitenta e cinco alunnos quase todos analphabetos, e que
d’estes retirarão-se por mudança dos pais, trinta e cinco, com principios
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priliminares d’instrução, isto é, sabendo ler, escrever e contar, e freqüentam
cincoanta, inclusive 11 particulares. [...] Esta escola é util, e acha-se bem
colocada por ocupar a arêia d’uma legua quadrada, sem haver outra; em cuja
existem cerca de dusentos analphabetos de ambos os sexos e mais
augmentará o numero com a criação da colonia da Estiva e outras que possão
estabelecer. [...] A escola a meu cargo acha-se dividida e dois lugares,
distantes d’uma a outra, uma légua, o que me causa despesas e
inconveniencias incalculaveis.
Durante os primeiros seis mezes da fundação, os meninos forão afectados
das epidemias reinantes, sarampo e coculuxe, as quais cooperarão pª atraso
dos alunos em começo de sua carreira.
Outro sim, declaro que a frequencia nas estações chuvosas e de roça torna-se
irregular; por que os moradores sendo paupherrimos occupão os meninos, e
outros são rebeldes por falta de uma Penna qualquer, que os obrigue ao
cumprimentos dos seus deveres. (APSMEV, 07/1/1885)
Confrontando estes registros aos mapas de frequência encontrados e notícias de jornais
da época, percebemos vários problemas enfrentados pelos profissionais que atuavam naquelas
escolas. Trabalhavam com turmas multe seriadas, de população flutuante cujas datas de
inscrição e saída eram bem variáveis. Dependendo da época das colheitas, das chuvas ou por
conta de epidemias, a frequência se reduzia (para alunos de ambos os sexos). Havia
problemas também de locomoção para o professor, envolvendo despesas e tempo: no exemplo
citado, as salas distavam “uma légua”.
Como terceiro exemplo de documento do APSMEV que confirma as condições de
trabalho nestes espaços escolares, aponto a relação de pertences existentes na escola de S.
Domingos, em Mata-Cães, em 1890:
5 cadeiras de pau em mau estado
1 meza com 3,m 7 de comprimento e 1,m3 de largura, em bom estado
2 bancos de mesmo comprimento, sem encosto e no mesmo estado.
3 outros de 1,m5 dous dos quais em mau estado
1 taboa para calculo de 1m 2 também em bom estado
1 relogio de parede já desconsertado e em mau estado quando tomei conta
desta escola
Todos estes pertences foram dados à escola, há mais de doze annos pelo seu
fundador.
5 louzas pequenas fornecidas a 25 de Novembro ultimo pela Camara
Municipal
Mata-Cães, 15 de Janeiro de 1890
O professor
Francisco Moreira de Vasconcellos (APSMEV, 15/1/1890)
O símbolo do metro era escrito exatamente em cima da vírgula existente entre a parte
inteira (3) e a parte decimal (7). Em todas as outras medidas lineares este tipo de registro se
mantinha nessa posição. Também 1m² era escrito como 1m 2 .
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O inventário dos bens da escola de S. Domingos, arrolado pelo professor Vasconcellos,
é um exemplo contundente do estado de penúria destes ambientes. Este tipo de inventário é
um dos muitos desta natureza que encontramos naquele acervo e todos se assemelhavam em
termos de possibilidades e recursos. Parece-nos que todas as escolas, em janeiro de 1890 e,
portanto atendendo à nova estrutura criada pós-proclamação da república, tiveram que emitir
tais relatórios.
Ao longo de nossas visitas ao IPHAN percebemos que nos documentos emitidos após
15 de novembro de 1889 houve a mudança da responsabilidade da educação da presidência da
Câmara Municipal para um Intendente da Instrução Pública. Muda também o tratamento
usado pelos emissores ao redigir os ofícios: estes não eram mais endereçados ao “Illmo Exmo
Snr Presidente e Membro da Camara Municipal de Vassouras” e simplesmente ao “Cidadão”,
sendo este o “Cidadão Intendente da Instrução Publica Martinho Leopoldo Nobrega”, como
aparecia no final dos documentos.
Outro fator que depunha contra o bem estar destes professores era a forma como eram
pagos.
Figura 1: Recibo de pagamento de professor, correspondente ao período de 11/7 a 20/8/1889
Rs 80 000
Subsidiado
Recebi do Sr Procurador da Camara a
quantia de 80.000 rs oitenta mil reis,
meus vencimentos como professor
interino da Eschola Municipal da Varsea
a contar do dia 11 de Junho à Agôsto do
corrente anno. Para constar dou o
presente recibo e outro no livro
competente para um só effeito.
Vassouras, 2 de Outubro de 1889
Ataliba Gomes Couto
(APSMEV, 1/10/1889)
Os professores só eram pagos por seus serviços após a entrega do relatório e da relação
de frequência do trimestre. O documento (figura 1) mostra o recibo de pagamento ao
professor Ataliba Gomes Couto, relativo ao período letivo de 11 de julho a 20 de agosto de
1889, pelo qual só recebeu o pró-labore em 02 de outubro!
Ao se analisar os mapas trimestrais de frequência é possível perceber outras nuances
sobre os momentos ali vividos. O mesmo professor Ataliba, em relatório sobre a "Matrícula
dos alunnos da Eschola Municipal de Massambará de 21 de Agôsto à 30 de Setembro de
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1889", citava que a turma compunha-se de 23 alunos de 7 a 14 anos. Destes alunos, apenas 8
possuíam sobrenome e, ao lado do nome dos demais, aparecia a palavra “liberto”. O mesmo
acontece na coluna pais ou tutores. É interessante observar que na coluna "Gráu de instrução
nas epochas das matrículas" vê-se 1 aluno na 1ª série, 6 na 3ª série e os demais na 4ª série.
Consta do referido mapa o visto do inspetor e o pague-se.
A seleção dos professores era feita por provas, que eram aplicadas por uma equipe. No
documento, assinado por José Queirós Carneiro Mattoso e Rodolfo Monsoro Carneiro, estava
explícito que a comissão foi "nomeada pela Camara Municipal de Vassouras para examinar o
Senhor João Xavier de Sousa Junior, pretendente a uma das escolas subvencionadas pela
mesma Camara" (APSMEV, 14/11/1887). As provas foram de "arithmetica, inclusive
systhema metrico, portugues, doutrina". Na figura 2 veem-se as questões sobre os
conhecimentos de matemática propostas ao candidato, onde, das quatro questões, três
envolviam o sistema métrico. O cruzamento de tais informações com o que temos sobre o
processo de implantação desse conteúdo, nos mostra como este vinha sendo apropriado pela
cultura escolar ao longo do século XIX.
Figura 2: Prova de “arithmetica e systhema métrico” de exame de seleção para professor
1º Quais são as unidades do systema métrico decimal?
2º Como se formão os múltiplos e submúltiplos?
3º Converter 25 braças, uma vara e 4 palmos a metros?
4º Achar o juro de 3:425$000 a 9% em 5 annos?
(APSMEV, 14/11/1889)
Em Zuin (2007) há um extenuante trabalho de pesquisa que nos aponta o quão lento e
penoso foi o percurso de inserção desses conhecimentos nas escolas do Brasil e de Portugal.
Zuin cita que um primeiro livro brasileiro, de 1832, acenava com as mudanças trazidas pelo
sistema de unidades francesas, que lá fora oficializado em 1801. A Lei Imperial nº 1157, de
1962, oficializara o uso desse sistema de medidas no Brasil, o que foi corroborado por um
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Regulamento em 1872, mas o povo não aceitava tais mudanças. As reações adversas se
faziam presentes: a chamada Revolução do Quebra-Quilo (1871-1974), agitava o Rio de
Janeiro e vários estados do nordeste.
Como se vê, apesar de todo esse embate de forças, treze anos depois desses movimentos
populares, temos nesse documento (figura 2) uma prova de quanto era valorizado esse saber
junto ao professorado e provavelmente junto aos alunos.
Temos na figura 3 um segundo exemplar de prova, aplicada a outro candidato, em 1888.
A prova de aritmética constou de quatro contas (com números enormes!) e, ao lado vê-se que
o candidato usou a "prova dos nove". No parecer dos avaliadores consta que o candidato "foi
arguido em doutrina cristã, grammatica, analyse, arithmetica, contabilidade e systema
metrico". O parecer é datado de 2 de janeiro de 1888, mesma data em que foi dada a entrada
no pedido para que houvesse o exame.
Figura 3: Prova aplicada em exame de seleção para professor, folhas 1 e 2
(APSMEV, 2/1/1888)
Através do que já foi analisado até agora (1869 a 1890) me foi possível listar vários
autores de compêndios de aritmética que circulavam naquela região, como os de aritmética de
Backer, o que abre outras possibilidades de pesquisa em História da Educação Matemática,
como, por exemplo, compará-los com os manuais didáticos já analisados por Valente (2007)
ou outros manuais franceses e americanos.
3.1 Documentos do APSMEV que citam livros de aritmética
Aqui, particularmente, visamos listar alguns documentos encontrados no APSMEV que
nos apontam manuais de aritmética que permeavam o cotidiano escolar daquela região, nas
últimas décadas do século XIX.
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Como exemplo de livros citados em tais fontes, vemos a referência a Rudimentos de
Arithmetica de Barker. Em carta de maio de 1884, o Prof José Eulálio de Andrade, da Escola
Municipal de Graminha em Sacra Familia do Tingua, acusa que recebeu do Sr Antonio
Martins dos Santos a doação de certa quantia para a compra de livros e, dentre outros
elencados, vê-se que, de matemática, adquiriu quatro exemplares da publicação de Barker
acima citada.
Ao procurarmos mais informações sobre este autor e obra, deparamo-nos com o verbete
Antonio Maria Barker, existente no “Diccionario Bibliografico Portuguez”, de Innocencio
Francisco da Silva (SILVA, MDCCCLXVII). Barker nasceu no Porto, Portugal, em 23 de
dezembro de 1792 e morreu no Rio de Janeiro, em 07 de setembro de 1853, para onde migrara
desde 1810. Durante o tempo em que viveu no Rio de Janeiro dedicou-se ao magistério
público,
[...] chegando a ser geralmente conceituado como um dos melhores mestres
de instrucção publica primaria. Declarada a independencia em 1822, foi pelo
Governo imperial nomeado membro de commissoes importantes, relativas
ao melhoramentos da educação da infancia, e aperfeiçoamento dos methodos
d’ensino. (SILVA, MDCCCLXVII, p. 241)
Silva lista as obras escritas por Barker e, dentre elas, está a décima sétima edição de
“Rudimentos arithmeticos ou taboadas de sommar, diminuir, multiplicar e dividir com as
principais regras dos quebrados e decimaes”, de trinta e duas páginas, publicada no Rio de
Janeiro, em 1862, pela “Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve & Cª”.
Valente nos fala sobre esta obra:
O texto de Barker em sua grande parte é escrito na forma de perguntas e
respostas. Sempre que considera necessário, faz advertências e sugestões aos
professores, no trabalho com os seus Rudimentos Arithmeticos. A obra,
assim, reúne conteúdos da aritmética elementar entremeada de sugestões
didáticopedagógicas aos professores. (VALENTE, 2006, p. 80)
O comentário de Valente (2006) ratifica o que Silva afirmara em sua obra de 1867:
ambos citam o quanto essa publicação de Baker visava o aperfeiçoamento de métodos de
ensino.
Certamente os quatro exemplares comprados pela Escola de Graminha, em 1884, seriam
de alguma edição desta publicação. Observemos que, mesmo cerca de trinta anos após a
morte de Barker, seus Rudimentos ainda estavam circulando e à venda na região em estudo.
Conseguimos analisar uma versão sem data, mas pela ortografia pode-se ver sem bem
posterior (figura 4).
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Figura 4: Capa e exemplo de página da Taboada Barker nova e ampliada (s/d)
Em outro documento (uma lista de requisição de materiais), o Prof A. Francisco
Marques, da “Escola Mixta Municipal da Estação de Vassouras” (APSMEV, 4/5/1895)
solicitava ao então presidente da Câmara Municipal, Bernardino Augusto Frazão, a compra de
dez arithmeticos de A. Trajano. Possivelmente o professor Francisco estava se referindo ao
livro Aritmética Elementar Ilustrada, cuja primeira edição data de 1879 (VALENTE, 2007, p.
164) e cujas inúmeras tiragens atravessaram a primeira metade do século XX.
Um terceiro documento tomado como exemplo, é o recibo onde a professora Honorina
Antunes de Azevedo, da “Escola publica do sexo feminina, em Macacos, segundo distrito do
Municipio de Vassouras” (APSMEV, 15/7/1896) informa ter recebido da “Directoria de
Instrução Publica” vários livros, estando entre eles “15 Taboadas de Povoa [...] 6 arithmetica
de Felisberto de Carvalho” (APSMEV, 15/7/1896).
Dentre as várias obras de autoria de Felisberto, certamente este documento de 1896 está
se referindo ao livro Aritmética das Escolas Primárias.
Segundo Silva (2009), Felisberto era filho do professor primário Honorato Inácio de
Carvalho e de Adelaide H da Cruz Pereira de Carvalho, nasceu em Niterói, em 1850, e morreu
no Rio de Janeiro, em 1898.
Antes de se tornar um conhecido autor de obras didáticas, Felisberto Rodrigues Pereira
de Carvalho exerceu inúmeras atividades. Além de jornalista e músico, foi professor, ofício
este que começou a desempenhar ainda muito jovem, aos 13 anos, lecionando para adultos e
menores em um curso noturno que acontecia em sua própria casa. Além de diretor da Escola
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Preparatória anexa à Escola Normal, foi nomeado professor da então Escola Normal, em
Niterói, município em que nasceu. Foi também nomeado "lente repetidor" de Pedagogia na
Escola Normal da Corte e da cadeira de Português no Colégio Pedro II. Em seguida, foi
escolhido para secretário do Pedagogium, e mais tarde, seu diretor. Apenas seis anos antes de
sua morte, começou a publicar sua coleção de livros de leitura. (SILVA, 2009, p. 2)
Esta autora ainda nos afirma que as publicações de Carvalho circularam por cerca de
setenta anos e que, ao se analisar os prefácios de seus livros, vê-se a preocupação do autor
para com os seus “pares”.
Como percebemos pelos exemplos citados há fortes vestígios de que livros de aritmética
de autores como Barker, Trajano e Felisberto de Carvalho circularam pela região do então
Município de Vassouras, em fins do século XIX, embora fosse esta região afastada da capital.
Todos eles foram professores que tiveram suas obras publicadas por décadas e, de alguma
forma, preocuparam-se também com a formação de professores.
4
Considerações finais
Percebemos que, mesmo em fins do século XIX, havia um pequeno quantitativo de
escolas de primeiras letras e de professores na Província do Rio de Janeiro. Lembramos que
estes números, mesmo deficitários, estavam alargados pela existência de escolas particulares
subvencionadas e de professores aprovados via exames de seleção realizados sobre
responsabilidade de comissões locais, nomeadas pelas próprias câmaras municipais, sem que
necessariamente estes candidatos tivessem cursado a Escola Normal.
Pelos exemplos de provas aplicadas a professores que encontramos no APSMEV vê-se
que não havia uma homogeneidade na elaboração de tais instrumentos. O que provocava tais
desníveis? Seriam divergências entre concepções por parte das bancas do que deveria ser de
domínio do docente? Haveria interesses outros em facilitar o exame para este ou aquele
candidato? Mesmo desconsiderando-se as diferenças dos graus de dificuldade nas provas aqui
apresentadas, é possível termos um panorama do que aquela comunidade considerava como
sendo a aritmética necessária aos seus docentes.
Estas informações nos sinalizam a precariedade de instalações e de materiais em que
estas classes funcionavam. Também nos esclarecem com relação às distâncias percorridas por
estes professores e como se dava o seu pagamento, sempre bem depois do término de cada
trimestre. Mas estas limitações de materiais também aconteciam na própria capital da
província, na Escola Normal ali existente. Quanto aos livros de aritmética, observamos
naquela região a circulação de alguns nomes também conhecidos até mesmo na capital da
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Província. A tabuada de Backer, o livro de Trajano e o de Felisberto de Carvalho aparecem
em relatórios deste Município.
Ao trazer estes resultados que nos permitem levantar hipóteses sobre a cultura escolar
que permeava aquela comunidade, esperamos estar contribuindo para os estudos em história
da educação matemática no Brasil. Tais reflexões nos ajudam, não só a tecer conjecturas
sobre o passado, quanto a entender ranços detectados em nossas ações profissionais, bem
como nos auxiliam a melhor traçar rumos para as nossas ações docentes.
Agradecimentos
Este texto é um recorte da pesquisa A Matemática do Ensino Primário em Vassouras,
RJ: analisando um século de provas de alunos (1869-1969), com prazo até meados de 2013 e
financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), à
qual agradecemos. Estes agradecimentos também são extensivos aos demais membros da
equipe do Laboratório de Pesquisa em História da Educação Matemática (LaPHEM), da USS.
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vestígios sobre a aritmetica em escolas primárias da região