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CONCEPÇÕES DE SAÚDE E DE ATIVIDADE FÍSICA RELACIONADA À SAÚDE NAS
REPRESENTAÇÕES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA PRATICANTES DE EXERCÍCIOS
FÍSICOS REGULARES DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE ADAPTADO
DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA.
Lilanne de Fátima Lins Ribeiro
Graduanda em Licenciatura em Educação Física
Orientador: Prof. Ms. Gilmar Mercês de Jesus
Universidade Estadual de Feira de Santana
RESUMO
Na literatura, pouco se discute a relação entre saúde e deficiência. Sabe-se que, historicamente, essa
relação fora explicada de diversas maneiras. O olhar sobre a deficiência tem mudado, bem como sua
relação com a saúde, que outrora atrelada apenas ao conceito de ausência de doença, passa a ser
compreendida como um processo multi fatorial. Daí a importância de correlacioná-las a partir dos
novos olhares.
1 INTRODUÇÃO
Têm sido documentado recentemente pesquisas que discutam saúde no enfoque de saúde
coletiva. No entanto, ainda são escassos trabalhos que retratem questões de pessoas portadoras de
deficiências. Na literatura, pouco se discute a relação entre saúde e deficiência. Sabe-se que,
historicamente, essa relação fora explicada de diversas maneiras.
Em diversos momentos históricos, observam-se formas distintas de se entender a saúde.
(FARINATTI; FERREIRA, 2006). Da mesma forma, os conceitos sobre os portadores de deficiências
passaram por várias mudanças, no decorrer da história (CARVALHO; ROCHA; SILVA, 2006), tendo,
contudo, uma íntima relação com o que se entendia por saúde.
Nas novas construções sobre o entendimento de saúde, ainda é pouco discutida a sua relação
com pessoas deficientes, e a concepção que esse grupo social tem acerca da mesma.
No que se refere à relação entre atividade física e saúde acha-se, na literatura, pesquisas que
comprovam os efeitos benéficos que estes podem proporcionar (ANTUNES et al., 2006; TOMÉ;
VALENTINI, 2006). No entanto, alguns poucos trabalhos, como exemplo o de Coyle e Santiago
(1995) citado por Mello et al., (2005), têm surgido na tentativa de analisar os possíveis efeitos
saudáveis que as atividades físicas regulares podem proporcionar aos deficientes.
Entendendo que a saúde é um processo sob influência de fatores biológicos psicológicos,
sociais, educacionais, culturais e políticos e não uma causalidade, surge a problemática desse projeto:
quais as concepções de saúde e de atividade física relacionada à saúde nas representações de pessoas
com deficiência praticantes de exercícios físicos regulares do Núcleo de Educação Física e Esporte
Adaptado (NEFEA) da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)?
Diante disso, o proposto trabalho traz como objetivo geral tal problemática e como específico,
descrever as concepções de saúde e de atividade física relacionada à saúde dos sujeitos pesquisados.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
A partir de um olhar epistemológico, conceituar saúde tem sido uma tarefa difícil desde a
Grécia antiga. Numa perspectiva histórica e geral, Farinatti e Ferreira (2006), discorrendo acerca da
evolução das concepções de saúde, afirmam que esta pode ser entendida da seguinte forma: a) visão
mágico-religiosa do processo de saúde-doença em que as doenças advinham de forças sobrenaturais,
como forma de punição em decorrência à desobediência de condutas, b) como um estado de ausência
de doenças, que perpetuou desde a Era de Hipócrates (460-337 a.C) até a Organização Mundial De
Saúde (OMS) a partir de 1947, classificar como c) completo estado de bem estar físico, mental e
social.
Nos séculos XVII e XVIII, os avanços científicos nas ciências biológicas permitem a
descoberta de doenças originadas por germes, revigorando ainda mais o conceito de saúde como a
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ausência de doença (WESTPHAL, 2007, in: CAMPOS, 2007).
A primeira tentativa de mudança de definir saúde como a ausência de doença se deu com a
(OMS), ao afirmar que “a saúde traduz um estado completo de bem estar físico, mental e social, não
consistindo apenas na ausência de doenças ou enfermidades” (WHO, 1947, p.1, apud FARINATTI e
FERREIRA, 2006, p. 47).
No entanto, o conceito da OMS também tem sido alvo de muitas críticas, onde a saúde não
deve ser considerada como um estado e sim um processo para se alcançar objetivos individuais e/ou
comunitários no âmbito social, biológico e psicológico (FARINATTI; FERREIRA, 2006).
Avançando sobre o entendimento da concepção de saúde, criou-se um conceito mais amplo – a
Carta de Ottawa – em 1986, na I Conferência Internacional de Promoção de Saúde, no Canadá. O
documento supracitado diz que o completo bem-estar alcançado é determinado por fatores biológicos,
sociais, econômicos, culturais, educacionais, ambientais e políticos (WESTPHAL, 2007).
Assim, a saúde é conhecida cada vez e pelo tanto que se vive. Trata-se de decidir, a partir de
possibilidades postas, quais objetivos almejarem, através de oportunidades de escolha, que num
entendimento mais subjetivo da carta de Ottawa, poderia estar relacionado com possibilidades de
integração social e capacidade para participar da vida social.
2.1 Saúde e deficiência.
De acordo com a antiga concepção de saúde, separando a saúde “normal”- ausência de
doenças - da “anormal” – enfermidades – os grupos humanos que pertenciam à “anormalidade”, e aqui
em especial nos referimos às pessoas portadoras de necessidades especiais, passaram a viver à margem
da sociedade.
Na antiguidade clássica, em sociedades escravistas romanas e gregas, a valorização do corpo
perfeito fez com que pessoas “defeituosas” fossem eliminadas do convívio social (CARVALHO;
ROCHA; SILVA, 2006).
Alguns pensadores filosóficos da Antiguidade Clássica, a exemplo de Platão (428-348 a.C) e
Sêneca (4 a.C), citados por Silva (1986 apud CARVALHO;ROCHA;SILVA 2006) acreditavam ser a
deficiência uma monstruosidade e que para esta o melhor era a morte. O primeiro defendia que deveria
deixar morrer os indivíduos com corpo mal organizado. E Sêneca afirmava que deveriam afogar os
deficientes para se distinguir as coisas inúteis das saudáveis.
No entanto, para uma melhor compreensão em relação à deficiência, devem ser considerados
todos os períodos históricos. Períodos considerados por Carvalho, Rocha e Silva (2006), como
abandono ou extermínio; institucionalização; integração e inclusão.
Na etapa de extermínio ou abandono – considerado também como momento de separação
(MARQUES; MOURA e CASTRO; SILVA, 2001), são levadas em consideração a Era Primitiva e a
Antiguidade, na primeira, como o indivíduo deveria procurar subsídios que garantissem a sua
sobrevivência a partir do que a natureza lhe proporcionava aqueles que não tinham condições de fazê­
lo, eram deixados para trás. Na segunda, em cidades como Esparta, que vivia da guerra, via esses
sujeitos imperfeitos como um “peso”, promovendo o extermínio.
Para o período da Idade Média existem divergências na visão de outros autores (MARQUES;
MOURA E CASTRO; SILVA, 2001), no trato com a deficiência. Eles afirmam que nesse momento,
chamado de etapa de proteção, com o movimento reformista da Igreja, a morte foi substituída pela
segregação, havendo a criação de asilos e hospitais que recolhiam os deficientes. Já para Carvalho,
Rocha e Silva (2006), nesse momento, os reformistas mantinham os mesmos procedimentos que não
iam de encontro ao novo período histórico, evidenciado pelo desprezo que Martinho Lutero (1483 –
1546) nutria por esse grupo social (CARVALHO; ROCHA e SILVA, 2006).
Para Carvalho, Rocha e Silva (2006) a segregação ocorreu na sociedade moderna (século XVI
e XVIII), período que chamaram de institucionalização. Diferentemente, Marques, Moura e Castro e
Silva (2001), colocam que nesse período, com as idéias iluministas, houve já uma emancipação (nome
dado a esta etapa por eles), passando a observar a deficiência com novos olhos.
Já o século XX é considerado como o momento da Integração, que defende uma ação de
normalizar os deficientes, modificando-os com necessidades educacionais especiais, para que
assemelhassem o máximo possível aos outros cidadãos, e então ser inseridos e integrados ao convívio
social (BRASIL, 2000, p.16 apud CARVALHO; ROCHA e SILVA, 2006, p.49).
No entanto, este paradigma passou a ser criticado devido a sua proposta de querer cessar as
diferenças. E o questionamento não é que se deva acabar, mas sim que a sociedade deva se organizar
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de forma que todos possam viver coletivamente. Surge então a mais nova etapa, a da Inclusão. Dessa
forma, passam a ganhar relevância novos entendimentos acerca do modo de encarar os deficientes, a
respeito da relação entre deficiência, desenvolvimento e aprendizado (CARVALHO; ROCHA; SILVA
2006). Uma das vertentes que tem pensado esse trinômio é baseada na idéia de que qualquer
desenvolvimento humano é adquirido através de suas relações e experiências de vida. Abordagem essa
oferecida pela psicologia soviética que defende uma abordagem sócio-psicológica. Sendo assim,
fatores sociais, políticos e econômicos seriam determinantes na aprendizagem, e na construção da
personalidade, uma vez que, como afirma Vigotsky (1997) citado por Carvalho; Rocha e Silva (2006)
o defeito por si só não decide o destino da personalidade, senão as conseqüências sociais e sua
realização sócio-psicológica.
2.2 Atividade Física, Deficiência e Saúde.
É pensando também numa melhora dos fatores sociais e psicológicos dos indivíduos, que
alguns estudos têm se preocupado em analisar os benefícios que a atividade física pode vir a contribuir
para a saúde dos indivíduos. (ANTUNES et al., 2006; TOMÉ; VALENTINI, 2006; MATSUDO,
MATSUDO; BARROS NETO, 2000).
Na verdade a prática de tais atividades, bem como os efeitos destas na aptidão física
(MATSUDO; MATSUDO; BARROS NETO, 2000; OLIVEIRA FILHO; SALLES, SALVETTI 2005)
sempre existiu desde a Era Primitiva, com a realização da caça, pesca etc. E, atualmente, o exercício
físico tem sido reconhecido cientificamente, como de grande valor para uma sociedade que se
apresenta com alto grau de índices de estresse, ansiedade e sedentarismo (Antunes et al., 2006; Tomé e
Valentin, 2006).
No entanto, essas questões são pouco discutidas no que se refere às pessoas com deficiência.
Coyle e Santiago (1995 apud MELO et al., 2005), por exemplo, pesquisaram os efeitos que o exercício
físico (no caso mais específico o exercício aeróbico) promoveria aos deficientes físicos, e concluíram
que houve mudanças significativas na aptidão física e nos sintomas de depressão dos indivíduos.
Considerando os efeitos psicológicos da prática de atividades físicas, muitos são os parâmetros
de análise. No estudo de Tomé e Valentin (2006), os resultados encontrados corroboram com outros já
existentes (citados pelos mesmos), no tocante à diminuição da ansiedade e agressividade, quando
comparados aos indivíduos hipocinéticos. Estima-se também que os efeitos psicológicos positivos
adquiridos são sensações de capacidade e eficácia, o amento das interações sociais e o fortalecimento
do auto-conceito e auto-estima.
Além disso, há indícios de que haja também uma melhora da função cognitiva (aprendizado,
informação, percepção, memória, raciocínio) (ANTUNES et al., 2006).
Como já fora dito, se a concepção de saúde interpretada pelo tanto que se vive e o
desenvolvimento humano também é adquirido pelas nossas experiências, não se pode ter uma visão
fragmentada do homem, mas sim de uma forma holística, entendendo que o seu equilíbrio advém das
inter-relações de fatores que permeiam a vida de forma individual e coletiva. Dessa forma, conceitos
devem ser construídos através de possibilidades impostas e oportunidades de escolha.
3 METODOLOGIA
Este estudo de caso terá um cunho exploratório de abordagem qualitativa (MINAYO, 2004).
A amostragem será realizada com 40 pessoas com deficiência praticantes de exercícios físicos
regulares do NEFEA da UEFS na cidade de Feira de Santana – Bahia. Na coleta de dados será
utilizado como instrumento uma entrevista com roteiro não estruturado composto por 05 questões
(Quadro 1). Para análise dos dados será utilizado o método de Análise de Conteúdo ( BARDIN, 1977
apud TRIVIÑOS, 1987) que é estruturada em três etapas: pré-análise; descrição analítica e
interpretação final. Nesse estudo serão respeitadas as normas do conselho nacional de saúde, através
da Resolução 196/96, para pesquisa com seres humanos.
Quadro 1
01. O que você entende por saúde;
02. Comente/fale sobre a sua saúde;
03. O que você faz para melhorar a sua saúde;
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04. Você acha que a atividade física tem alguma relação com a saúde;
05. O que mudou na sua saúde depois da prática da atividade física;
4 REFERÊNCIAS
ANTUNES, Hanna K. M. et al. Exercício físico e função cognitiva: uma revisão. Rev. Bras. Med.
Esporte,
Niterói,
v.12,
n.2,
mar./abr.
2006.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/pdf/rbme/v12n2/v12n2a11.pdf>. Acesso em: 2 mar. 2008.
CARVALHO, Alfredo Roberto de; ROCHA, Jomar Vieira da; SILVA, Vera Lúcia Ruiz. Pessoa com
deficiência na história: modelos de tratamento e compreensão. In:
CARVALHO, Alfredo Roberto de. et al. Pessoa com deficiência: aspectos teóricos e práticos.
Cascavel, PR: EDUNIOESTE, 2006, p.15-56.
FARINATTI, P. de T. Veras; FERREIRA, Marcos Santos. Saúde, promoção da saúde e educação
física: Conceitos, princípios e aplicações. Rio de Janeiro: EdEURJ, 2006.
MATSUDO, S. M.; MATSUDO, V. K. R.; BARROS NETO, T. L. Efeitos benéficos da atividade
física e saúde mental durante o processo de envelhecimento. Rev. Bras. Ativ. Fis. Saúde. V.5, n.2,
abr./jun. 2000. Disponível em: <http://bases.bireme.br>. Acesso em 12 mar. 2008.
MELLO, Marco Túlio de. et al. O exercício físico e os aspectos psicobiológicos. Rev. Bras. Med.
Esporte,
Niterói,
v.
11,
n.3,
mai./jun.
2005.
Disponível
em:
http://www.scielo.br/pdf/rbme/v11n3/a10v11n3.pdf. Acesso em: 18 fev. 2008
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8. ed.
Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco, 2004.
TOMÉ, Tiago Hoff; VALENTINI, Nadia Cristina. Benefícios da atividade física sistemática em
parâmetros psicológicos do praticante: um estudo sobre ansiedade e agressividade. Rev. educ. fis.,
Maringá, v.17, n.2, jul./dez. 2006. Disponível em: <http://bases.bireme.br>. Acesso em: 26 fev. 2008.
TRIVINOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
qualitativa em educação: o positivismo, a fenomenologia, o marxismo. São Paulo: Atlas, 1987.
WESTPHAL, Márcia Faria. Promoção de Saúde e Prevenção de Doenças. In: CAMPOS, Gastão
Wagner de Souza. Tratado de saúde coletiva. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Ed. FIOCRUZ,
2006, p.635-667.
Endereço
Autora: Lilanne de Fátima Lins Ribeiro
Endereço: Rua Palmerindo, n. 45, Cond. Luís Eduardo Prisco Viana, Bl. H, Apt. 303, Bairro
Conceição I.
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