Gislaine Angélica Rodrigues Silva
“Caracterização e envolvimento de
esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e
Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera:
Silvanidae)”
Orientadora: Prof.ª Dr.ª
Ana Silvia Lapenta
Maringá – 2007
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca Central - UEM, Maringá – PR., Brasil)
S586c
Silva, Gislaine Angélica Rodrigues
Caracterização e envolvimento de esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis
(Coleoptera: Silvanidae) / Gislaine Angélica Rodrigues Silva. -Maringá : [s.n.], 2007.
38 f. : il. color.
Orientador : Profª. Drª. Ana Silvia Lapenta.
Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Maringá. Departamento
de Ciências Biológicas, 2007.
1. Esterase. 2. Organofosforado. 3. Resistência a inseticidas. 4.
Oryzaephilus mercator. 5. Oryzaephilus surinamensis.
I. Universidade Estadual de Maringá. Pós-Graduação em
Ciências Biológicas (área de concentração Biologia
Celular). II. Título.
CDD 21.ed. - 572.77
A Deus, minha inspiração.
A minha mãe, uma mulher admirável.
Agradecimentos
A Deus, por seu amor e sua fidelidade em minha vida.
Aos meus pais Gilson e Rute, por tudo que sou e tudo o que vir a ser,
por acreditarem e apoiarem mais essa conquista. A minha irmã Aline por sua
amizade e seu companheirismo e a Duda, minha sobrinha amada.
A UEM, ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas e ao
Departamento de Biologia Celular e Genética, pela estrutura e oportunidade.
Aos professores, cujo auxílio foi relevante.
Ao CNPq, pelo apoio financeiro.
A minha orientadora Ana Silvia, pela disponibilidade em me orientar e
desenvolver este trabalho, por sua paciência, pelo apoio e aprendizado. Quero
agradecer sua amizade e seu exemplo profissional, o qual admiro.
Aos professores Maria de Fátima, Maria Cláudia, Sandra Collet, Erasmo
Renesto e José Ricardo, pelo aprendizado, e especialmente, agradeço a
Claudete Mangolin, pela oportunidade, dedicação e direcionamento nos meus
primeiros experimentos.
Aos membros da banca, professoras Luciana Paes de Barros Machado e
Claudete Aparecida Mangolin.
Aos técnicos Sérgio e Valmir por todo o auxílio, o qual foi importante
para a realização deste trabalho.
As minhas amigas e companheiras de pesquisa, Débora, Ana Luíza,
Adriana e Lara, pelo desenvolvimento da pesquisa.
A Adriana Rezende, Fábio, Suzana, Liriana, Tati, Cristiano, Ivone e Ana
Paula e a todos os colegas e amigos do laboratório pelo ambiente agradável de
trabalho.
Aos meus amigos de graduação e pós-graduação.
As minhas amigas Carol Gaburo, Carol Emanuelle, Joicy, Léia, Lilian,
Adriana Heidemann e Amanda, pelo companheirismo em todos os momentos.
Ao Edner, meu namorado, pelo seu incentivo e carinho.
A Fernanda, uma amiga muito especial que tem estado ao meu lado
nesses oito anos, comemorando comigo mais esta etapa.
A minha amiga, irmã, Araceli, por acrescentar coisas boas e dividir
muitos momentos.
Apresentação
Esta dissertação é composta por um artigo, o qual foi concluído a partir de
estudos sobre o envolvimento das esterases na resistência aos inseticidas em duas
espécies de insetos praga: Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis. Este
artigo será diagramado de acordo com as normas da revista Biochemical Genetics, a
qual será submetido para a publicação.
“Caracterização e envolvimento de
esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e
Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera:
Silvanidae)”
“Caracterização e envolvimento de
esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e
Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera:
Silvanidae)”
Gislaine Angélica Rodrigues Silva e Ana Silvia Lapenta
“Caracterização e envolvimento de esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera: Silvanidae)”
Resumo
Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis são espécies cosmopolitas de
insetos praga que atacam diversos grãos e produtos armazenados, causando prejuízos na
comercialização destes. Uma estratégia de controle destes insetos é obtida por meio do
uso de inseticidas, porém, várias espécies têm se mostrado resistente a estes compostos.
Mecanismos metabólicos de resistência a inseticidas envolvendo as esterases têm sido
estudados, pois estas estão relacionadas com a detoxificação. Este trabalho foi
conduzido com o objetivo de identificar e caracterizar as esterases, verificar a
toxicidade dos organofosforados malathion e clorpirifós-metil em diferentes linhagens
destas espécies e, também, analisar o possível envolvimento destas enzimas nos
mecanismos de resistência a estes inseticidas. Por meio da técnica de eletroforese em
gel de poliacrilamida foram identificadas sete esterases em quatro linhagens de O.
mercator, destas três são colinesterases, duas carboxilesterases e duas acetilesterases.
Em duas linhagens de O. surinamensis foram encontradas cinco esterases, destas, quatro
foram identificadas como colinesterases. Todas as linhagens foram submetidas a
bioensaios com o malathion e clorpirifós-metil. Em O. mercator, dentre as linhagens
naturais, a OmLA apresentou maior resistência, sendo que esta, pode estar associada
com a maior sensibilidade das esterases OmEST-3 e 4 e pela presença da OmEST-1,
específica desta linhagem. Em O. surinamensis, pôde ser observado que na linhagem
OsLPA, mais resistente, também houve uma maior sensibilidade das esterases aos
inseticidas testados. Isto é indicativo de que estas esterases possam estar relacionadas
com mecanismos de detoxificação aos inseticidas por seqüestro destes. A espécie de O.
surinamensis, quando comparada com a de O. mercator, apresentou uma elevada
resistência, verificado pelo cálculo da CL50. Esta maior resistência pode estar
relacionada com duas esterases: a OsEST-2, por apresentar homologia com a OmEST-1,
cuja presença foi verificada somente na linhagem resistente OmLA e, a OsEST-5, por
ser uma enzima altamente expressa nesta espécie, sendo que em O. mercator não foi
encontrada nenhuma enzima com altos níveis de expressão.
“Characterization and involvement of esterases in their resistance to insecticides in
Oryzaephilus mercator and Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera: Silvanidae)”
Abstract
Oryzaephilus mercator and Oryzaephilus surinamensis are worldwide pestering insect
species which attack grains and stored products with subsequent commercial liabilities.
Although insect control strategy favors the use of insecticides, several species are
resistant to the chemical compounds involved. Esterases resistant metabolic
mechanisms to insecticides have been investigated owing to their relationship with detoxification. Current research identifies and characterizes the esterases, checks the
toxicity of the organophosphates malathion and chlorpyriphos-methyl in different insect
strains, and analyzes possible involvement of esterases in resistance mechanisms to the
above insecticides. Esterases analysis by polyacrylamide gel electrophoresis technique
detected seven esterases in four strains of O. mercator, or rather, three cholinesterases,
two carboxylesterases and two acetylesterases. Five esterases, four of which were
identified as cholinesterases, were detected in two O. surinamensis strains. All strains
underwent bioassays with malathion and chlorpyriphos. Since OmLA exhibited the
greatest resistance in O. mercator, within natural strains, it may be associated to the
higher sensitivity of esterases OmEST-3 and 4 and by OmEST-1, proper of the strain.
There was a higher esterase sensitivity to insecticides under analysis in the more
resistant O. surinamensis OsLPA strain. This fact shows that these esterases may be
related to de-intoxification mechanisms to insecticides by their sequestration. When
compared to O. mercator, species O. surinamensis is highly resistant, as CL50
evidences. High resistance may be related to OsEST-2 esterases by being homologous
to OmEST-1, verified only in OmLA-resistant strains; and to OsEST-5, a highly
significant enzyme in the species. No highly significant enzyme has been found in O.
mercator.
“Caracterização e envolvimento de esterases com a resistência a inseticidas em
Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera: Silvanidae)”
Gislaine Angélica Rodrigues Silva1 e Ana Silvia Lapenta1
1
Departamento de Biologia Celular e Genética, Universidade Estadual de Maringá,
Avenida Colombo 5790, 87020-900, Maringá-Pr, Brasil.
Resumo
Eletroforese em gel de poliacrilamida foi usada para analisar padrões de esterases
durante o desenvolvimento de insetos praga. Sete esterases em Oryzaephilus mercator
foram identificadas: três colinesterases, duas carboxilesterases e duas acetilesterases,
dentre estas, uma esterase foi específica para adultos. Cinco esterases foram encontradas
em O. surinamensis sendo quatro colinesterases. Linhagens dos insetos praga O.
mercator e O. surinamensis foram também expostas ao malathion e clorpirifós-metil.
Baseado na estimativa da CL50, OmLPT-10, OmLA de O. mercator e OsLPA de O.
surinamensis foram as linhagens mais resistentes para ambos inseticidas, sendo
verificado uma sensibilidade maior de algumas de suas esterases. Estas esterases de
linhagens resistentes ao malathion e clorpirifós-metil têm suposto papel conferindo a
resistência aos organofosforados. As colinesterases OmEST-1 e OsEST-5 parecem estar
envolvidas com a resistência. Estes resultados sugerem que a maior resistência pode
estar relacionada com a detoxificação enzimática por propriedades de seqüestro.
Palavras-chave: Oryzaephilus mercator; Oryzaephilus surinamensis; esterases;
resistência a inseticida; organofosforado.
“Characterization and involvement of esterases in their resistance to insecticides in
Oryzaephilus mercator and Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera: Silvanidae)”
Gislaine Angélica Rodrigues Silva1 e Ana Silvia Lapenta1
1
Departamento de Biologia Celular e Genética, Universidade Estadual de Maringá,
Avenida Colombo 5790, 87020-900, Maringá-Pr, Brasil.
Abstract
Esterases pattern types during the development of pestering insects were analyzed by
polyacrylamide gel electrophoresis. Seven esterases, three cholinesterases, two
carboxylesterases and two acetylesterases, were identified in Oryzaephilus mercator,
one of which was proper to adults. Five esterases, of which four were cholinesterases,
occurred in O. surinamensis. Pestering insect strains of O. mercator and O.
surinamensis were also exposed to malathion and chlorpyriphos-methyl. OmLPT-10,
OmLA of O. mercator and OsLPA of O. surinamensis were the most resistant strains to
the two insecticides, according to CL50 estimates. However, higher sensitivity has also
been verified in some esterases. Esterases of malathion-resistant strains and
chlorpyriphos provide resistance to organophosphates. Cholinesterases OmEST-1 and
OsEST-5 may be involved in resistance. Results suggest that highest resistance may be
related to enzymatic detoxification by sequestration qualities.
Key words: Oryzaephilus mercator; Oryzaephilus surinamensis; esterases; resistance to
insecticides; organophosphate.
Introdução
O besouro de grãos Oryzaephilus surinamensis (Coleoptera; Silvanidae) é
considerado mundialmente a maior peste de produtos armazenados, particularmente
atacando grãos (Lee et al., 2000). Assim como Oryzaephilus surinamensis, a espécie
Oryzaephilus mercator (Coleoptera; Silvanidae) ataca grãos já infestados ou
defeituosos, preferindo produtos de cereais e sementes de oleaginosas, mas de acordo
com Athié e Paula (2002), esta espécie não é considerada uma das principais pragas de
grãos armazenados no Brasil.
As esterases estão envolvidas em inúmeros processos biológicos importantes nos
insetos, alguns deles já bem estabelecidos. Vários trabalhos têm demonstrado que
determinadas esterases desempenham um importante papel no controle dos níveis de
hormônio juvenil (HJ) (Bownes, 1989; Yamamoto et al., 1988), algumas estão presentes
no aparelho reprodutor masculino de várias espécies, sendo importantes para a saúde
reprodutiva do macho (Vermunt et al., 1998, Mikhailov e Torrado, 2000), outras
parecem ter função em processos digestivos (Healy et al., 1991) e também estão
envolvidas com a resistência aos inseticidas (Haubruge et al., 2002; Barata et al., 2004;
ffrench-Constant et al., 2004; Rossiter et al., 2001a,b; Lee e Lees, 2001).
O sistema isoenzimático das esterases é constituído por quatro classes de
enzimas, as carboxilesterases (E.C. 3.1.1.1), as colinesterases incluindo
as
acetilcolinesterases (E.C 3.1.1.7) e as pseudocolinesterases (E.C. 3.1.1.8), as
acetilesterases (E.C. 3.1.1.6) e as arilesterases (E.C. 3.1.1.2). Cada classe tem sido
definida por sua especificidade ao substrato, sua sensibilidade a diferentes tipos de
inibidores e por seus resíduos de aminoácidos no sítio ativo (Oakeshott et al., 1993).
O papel realizado pelas esterases nos mecanismos de resistência aos inseticidas
tem sido amplamente estudado em insetos mostrando-se de fundamental importância.
Duas classes de esterases estão envolvidas neste processo, as colinesterases e as
carboxilesterases. Dentre as colinesterases, a acetilcolinesterase regula os níveis de
acetilcolina por catalisar a hidrólise desta nos terminais dos impulsos nervosos.
Inseticidas organofosforados e carbamatos ligam-se ao sítio ativo desta enzima e a
inibem irreversivelmente, gerando um acúmulo de acetilcolina, resultando na morte do
inseto (Aldridge, 1950). Outras colinesterases podem estar relacionadas com processos
de detoxificação metabólica como a EST-9 em Drosophila melanogaster (Healy et al.,
1991).
Estudos demonstraram que os insetos podem adquirir insensibilidade a
inseticidas por mutações em ponto em acetilcolinesterases, a substituição de
aminoácidos no sítio ativo da enzima foi encontrada em populações de Drosophila
melanogaster (Menozzi et al., 2004). Fournier (2005) verificou que mutações em
acetilcolinesterase tem sido descritas em muitas espécies de insetos e que pode-se
observar uma resistência modificada aos inseticidas. Em insetos praga como em
Rhyzopertha dominica (Coleoptera: Bostrichidae) populações resistentes mostraram
uma maior atividade de acetilcolinesterase que em populações suscetíveis, sugerindo
que mudanças nesta enzima poderiam contribuir com a resistência aos organofosforados
(Guedes et al., 1997).
A resistência aos inseticidas envolvendo as carboxilesterases, ocorre sempre pela
detoxificação metabólica por meio da hidrólise de ésteres carboxílicos (Hemingway e
Karunaratne, 1998). Este mecanismo leva a um considerável aumento na atividade desta
enzima nos organismos resistentes, como é o caso da MCE (Malathion-specific
carboxilesterase) em linhagens resistentes do inseto Anisopteromalus calandrae (Baker
et al., 1998) e Tribolium castaneum (Haubruge et al., 2002). Subramanyam et al. (1989)
detectaram que todas as linhagens de campo de Tribolium castaneum testadas nos
Estados Unidos, apresentaram resistência ao malathion e que esta resistência está
associada com as carboxilesterases que estão envolvidas com a detoxificação deste
composto.
Rossiter et al. (2001a) estudando espécies de Oryzaephilus surinamensis,
verificaram que as esterases estão fortemente envolvidas no mecanismo primário de
resistência ao clorpirifós-metil, e que podem possivelmente ter papel na resistência ao
fenitrothion. Neste mesmo estudo, análises quantitativas e qualitativas das esterases
permitiram observar um elevado aumento nos níveis de atividade das esterases em duas
linhagens altamente resistentes ao clorpirifós-metil e diferentemente resistentes ao
fenitrotion, também foi possível observar diferenças qualitativas nas esterases entre
estas duas linhagens. Estas esterases foram classificadas como β-esterases e as
diferenças qualitativas nas propriedades das β-esterases, sendo a conformação estrutural
a principal diferença entre elas, destas duas linhagens de O. surinamensis altamente
resistentes ao clorpirifós-metil e diferentemente resistentes ao fenitrothion, foram
propostas como uma explicação das diferenças na sensibilidade e resistência ao
fenitrothion (Rossiter et al., 2001b).
Um outro estudo envolvendo a resistência a inseticidas em linhagens de
Oryzaephilus surinamensis realizado por Conyers et al. (1998), mostrou que dentre os
sistemas enzimáticos testados, as isoenzimas com elevada atividade foram as esterases,
sendo estas as responsáveis pela maior resistência aos organofosforados nas linhagens
de O. surinamensis e, purificaram e caracterizaram uma acetilcolinesterase envolvida
nesta resistência. Lee et al. (2000) observaram que uma maior atividade hidrolítica das
esterases estavam positivamente relacionadas com um aumento na resistência das
linhagens de O. surinamensis ao organofosforado fenitrotion e, por meio de
zimogramas, verificaram as diferenças no padrão de bandas entre a linhagem resistente
e a suscetível, identificando a esterase envolvida com resistência ao inseticida, a qual foi
purificada e caracterizada.
Uma vez que as esterases desempenham um importante papel na resistência aos
inseticidas, a identificação, a caracterização funcional e a análise genética deste sistema
isoenzimático em Oryzaephilus mercator e O. surinamensis são importantes para o
entendimento
dos
mecanismos
que determinam
organofosforados, usados no controle destes insetos.
a resistência a
compostos
Materiais e métodos
Manutenção das linhagens de Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis
em laboratório
Para a realização deste estudo foram utilizadas quatro linhagens de Oryzaephilus
mercator (OmLA, OmLV, OmLPT e OmLPT-10) e duas linhagens de O. surinamensis
(OsLE e OsLPA). Essas linhagens foram obtidas em residência (OmLA) e em lojas de
produtos processados (OmLV, OmLPT, OsLE e OsLPA) na cidade de Maringá, Paraná.
A linhagem OmLPT-10 foi derivada da linhagem OmLPT, a qual foi exposta por oito
meses a uma concentração de malathion de 0,05 µg/g. Os insetos foram mantidos em
laboratório a temperatura ambiente em culturas montadas com ração para cães e
sementes de girassol, levemente triturados.
Determinação da CL50
A concentração letal que mata 50% dos insetos (CL50) foi calculada para cada
uma das linhagens e para cada diferente inseticida, sendo estes, os organofosforados
malathion e o clorpirifós-metil. O fator de resistência (FR) foi obtido pela razão entre a
CL50 da população mais resistente e a CL50 da população mais suscetível de cada
espécie (Ceruti e Lázzari, 2003). Os ensaios foram realizados em recipientes de cultura,
contendo o inseticida a ser testado e mais 50 g de alimentação usual. Diferentes
concentrações dos organofosforados foram testadas, para o malathion, as concentrações
usadas estiveram entre 10 µL e 220 µL e, para o clorpirifós-metil, as concentrações
estiveram entre 5 µL e 200 µL. Cada bioensaio foi feito com uma destas concentrações,
utilizando-se água como solvente para cada inseticida. A concentração foi estimada em
micrograma do inseticida por grama de meio (µg/g).
Para cada bioensaio foram colocados 25 adultos, não sexados e sem idade
definida, em recipientes de vidro que foram vedados com tecido voal e elásticos para
evitar a fuga. Os insetos permaneceram expostos aos tratamentos durante 24 h, quando
então, a mortalidade foi avaliada. Os indivíduos sobreviventes foram então congelados e
submetidos posteriormente à análise eletroforética para verificação das esterases.
Réplicas de dois a quatro de cada bioensaios foram realizados para cada concentração
de inseticida.
A CL50 foi estimada pelo método Sperman-Kaber modificado por Hamilton et
al. (1977), utilizando-se o softwar JSPEAR.
Identificação das esterases
Neste trabalho foi empregado a eletroforese em gel de poliacrilamida (PAGE),
técnica modificada de Davis (1964) e Laemmli (1970). A técnica foi realizada em gel
vertical em um sistema descontínuo. Para tanto, foram utilizados géis de resolução a
11% de concentração acompanhados de géis de empilhamento a 4% de concentração.
As amostras foram maceradas individualmente a 0°C em 25 µL de tampão TrisHCl 1,5 M pH 8,8 para Oryzaephilus mercator e em 30 µL para O. surinamensis,
contendo glicerol a 10%. Após a maceração, um volume de 15 µL do sobrenadante de
cada amostra de O. mercator ou 10 µL do sobrenadante de O. surinamensis foi aplicado
no gel. Em O. mercator foram analisados cerca de 260 insetos e para O. surinamensis,
aproximadamente 160 insetos.
Os géis foram submetidos à eletroforese por cinco horas, a uma voltagem
constante de 200 V, utilizando-se para o preenchimento dos compartimentos superiores
e inferiores da cuba, o tampão Tris-glicina 0,1 M pH 8,3. Após a corrida eletroforética,
os géis foram pré-incubados em 50 mL de tampão fosfato 0,1 M pH 6,2. Após 30
minutos o tampão foi retirado e foi adicionado a solução de coloração. Esta solução é
composta por tampão fosfato 0,1 M pH 6,2 (50 mL), por n-propanol (5 mL), pelo
corante Fast Blue RR Salt (0,06 g) e pelos substratos α-naftil acetato e β-naftil acetato
(0,03 g e 0,02 g, respectivamente), previamente solubilizados em acetona (1 mL). Após
cerca de uma hora de incubação no escuro à temperatura ambiente, as esterases foram
visualizadas nos géis como bandas pretas ou vermelhas, indicativas da presença de α e
β-esterases, respectivamente.
Especificidade ao substrato
Os géis foram tratados com o método de coloração usual, usando separadamente
os substratos α-naftil acetato e β-naftil acetato, 0,05 g de cada, para realizar o teste de
especificidade ao substrato. Um gel controle foi preparado com as condições usuais de
coloração.
Tratamento com inibidores para caracterização bioquímica das esterases
Para o teste com inibidores, os géis foram pré-incubados em tampão fosfato 0,1
M pH 6,2 e depois submetidos à coloração na presença dos mesmos. Simultaneamente
ao gel tratado foi preparado um gel controle contendo as mesmas amostras. Os
inibidores utilizados foram o sulfato de eserina na concentração de 1 mM; malathion a
0,3 mM; fenilmetilsulfonila (PMSF) a 10 mM para Oryzaephilus mercator e 7,8 mM
para O. surinamensis; iodoacetamida (IAC) na concentração de 10 mM; paracloromercuriobenzoato (pCMB) a 1,5 mM e o carbaril a 0,0745 mM. Os inibidores
foram dissolvidos diretamente no tampão fosfato 0,1 M pH 6,2, com exceção do PMSF
que foi previamente dissolvido em 1 mL de metanol e adicionado ao tampão de
incubação.
Secagem dos géis
A técnica empregada para secagem dos géis foi baseada no método de Ceron et
al. (1992). Os géis foram banhados em solução de gelatina comercial a 5%, prensados
em um bastidor entre duas folhas de papel celofane e deixados à temperatura ambiente
por três a quatro dias para secagem.
Resultados
Estudo das esterases em Oryzaephilus mercator
Padrão de esterases e expressão durante o desenvolvimento
A análise no padrão de esterases em cerca de 260 indivíduos nas linhagens
OmLA, OmLPT e OmLV indicou a presença de 15 enzimas, que com base na afinidade
pelo substrato, sensibilidade aos inibidores e velocidade de migração foram atribuídas
como produtos da expressão de sete loci gênicos para as esterases. Estas bandas foram
identificadas ao longo do desenvolvimento em Oryzaephilus mercator para a linhagem
OmLV, analisando as fases de larva, pupa e adulto (tabela 1).
Destes sete loci gênicos identificados, seis foram representados por mais de uma
banda, sendo considerados polimórficos, estas esterases apresentaram estrutura
monomérica (tabela 1). De acordo com o padrão de esterases durante o
desenvolvimento o locus para a OmEST-7 está presente somente em adultos. As
OmEST-4 e 5 só foram detectadas nas larvas e adultos, as demais esterases estão
presentes em todas as fases de desenvolvimento. A OmEST-1 esteve presente somente
na linhagem OmLA e a OmEST-2 ausente nesta mesma linhagem. As demais esterases
estiveram presentes nas três linhagens analisadas, a OmLA, OmLPT e OmLV (figura
1).
Caracterização das esterases quanto à especificidade ao substrato e padrão
de inibição
As esterases foram caracterizadas quanto a sua especificidade aos substratos αnaftil acetato e β-naftil acetato. Para as três linhagens analisadas foi observada uma
mesma caracterização enzimática. As OmEST-1, 4, 5, 6 e 7 são enzimas que
hidrolisaram preferencialmente α-naftil acetato e a OmEST-1 hidrolisou exclusivamente
o substrato α-naftil acetato, sendo consideradas α-esterases. As OmEST-2 e 3
hidrolisaram exclusivamente o substrato β-naftil, sendo consideradas β-esterases (figura
2).
Para a caracterização do padrão de inibição foram testados o malathion, o sulfato
de eserina, o carbaril, o para-cloromercuriobenzoato (pCMB), a fenilmetilsulfonila
(PMSF) e o iodoacetamida (IAC). Com exceção do PMSF e o IAC que indicam a
presença de um resíduo de serina e cisteína, respectivamente, os inibidores possibilitam
a classificação das esterases em carboxilesterases, acetilesterases, colinesterases e
arilesterases. Três colinesterases foram identificadas, as OmEST-1, 5 e 7, que diferiram
na inibição por malathion, como observado para a OmEST-7, a ausência de inibição. As
OmEST-4 e 6 foram classificadas como carboxilesterases, devido à inibição por
malathion e não inibição pela eserina e duas acetilesterases, as OmEST-2 e 3 nas quais
não houve inibição. O inibidor iodoacetamida não alterou a atividade das esterases
enquanto que o PMSF inibiu todas as esterases, com exceção da OmEST-1. Este padrão
de inibição foi verificado para as três linhagens analisadas de Oryzaephilus mercator, a
OmLA, OmLPT e OmLV (tabela2).
Estudo das esterases em Oryzaephilus surinamensis
Padrão de esterases e expressão durante o desenvolvimento
Indivíduos de Oryzaephilus surinamensis das duas linhagens (OsLPA e OsLE)
foram analisados quanto ao padrão de esterases, aproximadamente 160 insetos e,
somente a linhagem OsLPA analisada quanto à expressão nas diferentes fases de
desenvolvimento, larva, pupa e adulto. No zimograma apresentado na figura 2 estão
representadas as 11 enzimas observadas para esta espécie, que foram atribuídas como
produtos de cinco loci gênicos.
O padrão de esterases foi o mesmo para larvas e adultos, sendo os cinco loci
para as esterases expressos em ambas às fases. Já na fase de pupa pôde-se observar a
ausência da OsEST-4. Quanto à sua estrutura molecular, as OsEST-1, 2 e 5 puderam ser
classificadas como monoméricas.
Caracterização das esterases quanto à especificidade ao substrato e padrão
de inibição
A análise da especificidade nas duas linhagens permitiu caracterizar as OsEST1, 2 e 4 como α-esterases por hidrolisar preferencialmente o α-naftil acetato e a OsEST3, β-esterase, por hidrolisar preferencialmente o β-naftil acetato. Já a OsEST-5
apresentou afinidade a ambos os substratos sendo caracterizada como α,β-esterase
(figura 2).
Para a caracterização bioquímica aos inibidores foram analisadas as esterases
das duas linhagens e para o padrão de inibição não foi observada diferença entre elas.
As enzimas de Oryzaephilus surinamensis submetidas aos inibidores paracloromercuriobenzoato (pCMB), fenilmetilsulfonila (PMSF) e iodoacetamida (IAC)
foram insensíveis a estes, mas foram sensíveis à eserina e ao malathion, com exceção da
OsEST-4 que não apresentou inibição por malathion. Desta forma, todas as esterases
analisadas de O. surinamensis foram classificadas como colinesterases (tabela 2).
Comparação do padrão de esterases entre Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus
surinamensis
Uma análise comparativa das esterases entre as duas espécies (figura 2 e 3)
considerando a velocidade de migração, comportamento com relação aos inibidores e
afinidade aos substratos mostrou uma homologia em OmEST-1 e OsEST-2
(colinesterases, α-esterases e monoméricas) e entre as OmEST-3 e OsEST-3 (βesterases), apesar da OsEST-3 não ter sido analisada quanto ao padrão de inibição
(tabela 1).
Estudo da toxicidade dos organofosforados malathion e clorpirifós-metil
Análise da CL50 em Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis
Bioensaios utilizando o malathion em linhagens de Oryzaephilus mercator
mostraram que a OmLPT-10 e a OmLA, cujas CL50 foram de 0,2687 µg/g e 0,1295
µg/g, respectivamente, foram mais resistentes que as linhagens OmLPT e OmLV, com
CL50 de 0,0963 µg/g e 0,0617 µg/g, respectivamente. A linhagem OmLPT-10
apresentou um fator de resistência (FR) de 2,78 em relação a sua linhagem de origem, a
OmLPT. Os resultados dos bioensaios em relação ao clorpirifós-metil para esta mesma
espécie mostraram que a linhagem OmLA, com CL50 de 0,1269 µg/g, também
demonstrou maior resistência que a OmLPT e a OmLV, com CL50 de 0,0903 µg/g e
0,0342 µg/g, respectivamente. O FR das duas linhagens resistentes foi de 3,71 e 2,64,
respectivamente, em relação à OmLV, a mais suscetível (tabela 3).
Os bioensaios realizados com Oryzaephilus surinamensis em relação ao
malathion e clorpirifós-metil mostraram que a linhagem OsLPA apresentou maior CL50
que a OsLE, frente a ambos inseticidas (tabela 3), mas demonstrou uma diferença maior
na sensibilidade ao malathion, no qual a CL50 da OsLPA foi de 0,9484 µg/g e a CL50 da
OsLE foi de 0,5877 µg/g, com um FR de 1,61.
Uma comparação entre as duas espécies aponta que as linhagens de
Oryzaephilus surinamensis possuem um valor de CL50 elevado em relação às linhagens
mais resistente de O. mercator. A linhagem natural mais resistente de O. mercator, a
OmLA, apresentou CL50 de 0,1295 para o malathion e CL50 de 0,1269 para o
clorpirifós-metil, enquanto que em O. surinamensis a linhagem OsLPA, a mais
resistente, apresentou CL50 de 0,9484 para o malathion e CL50 de 0,3888 para o
clorpirifós-metil.
Análise das esterases de Oryzaephilus mercator tratados com malathion e
clorpirifós-metil
A análise das esterases, em insetos expostos ao malathion (tabela 4), indicou
variações na sensibilidade destas entre as linhagens. A OmEST-1, presente somente em
OmLA, foi inibida totalmente em insetos expostos a 0,075 µg/g e 0,1 µg/g, quando
realizados bioensaios com malathion, já a OmEST-2, ausente somente em OmLA, foi
inibida parcialmente em 0,1 µg/g e 0,2 µg/g para a OmLPT-10. A OmEST-3, presente
em todas as linhagens, foi totalmente inibida nas concentrações de malathion 0,075
µg/g e 0,1 µg/g testadas para a OmLA e foi parcialmente inibida em 0,1 µg/g e 0,2 µg/g
para OmLPT-10. Entretanto, nas linhagens mais sensíveis ao malathion esta não foi
inibida. Essa sensibilidade maior da OmEST-3 de OmLA pode ser observada também
em insetos expostos ao clorpirifós-metil (tabela 5). A OmEST-4, presente em todas as
linhagens, foi inibida somente em OmLA, em insetos expostos a concentrações de 0,072
µg/g e 0,12 µg/g em bioensaios com o clorpirifós-metil.
Análise das esterases de Oryzaephilus surinamensis tratados com malathion
e clorpirifós-metil
Nos bioensaios realizados com o malathion para as concentrações de 0,3 µg/g e
0,4 µg/g, pôde-se observar que houve uma inibição parcial para as OsEST-1, 2 e 3
somente para a linhagem OsLPA. Já na concentração de 0,8 µg/g a inibição parcial
ocorreu para a linhagem OsLE para as mesmas esterases (tabela 6).
O comportamento das esterases em linhagens testadas com o inseticida
clorpirifós-metil não apresentou variações quando comparadas com o padrão de
esterases de insetos não expostos.
Discussão
Embora Oryzaephilus mercator não seja considerada uma espécie importante
como praga no Brasil (Athié e Paula, 2002), ele é amplamente encontrado infestando
produtos processados na região de Maringá, PR, BR, uma vez que não houve
dificuldade para a obtenção deste inseto para a realização deste trabalho. Já
Oryzaephilus surinamensis é considerado uma importante praga responsável por
prejuízos econômicos (Athié e Paula, 2002). Entretanto, poucos estudos têm sido
realizados em O. mercator e O. surinamensis no Brasil.
Considerando a importância de ambos insetos praga, neste trabalho foram
realizados estudos sobre a resistência destes insetos em relação a inseticidas, a qual foi
verificada por meio da análise das esterases. As esterases constituem um grupo
heterogêneo de enzimas que apresentam em comum a propriedade de hidrolisar ésteres.
A detecção dessas enzimas é feita utilizando-se substratos sintéticos como ésteres de
naftil e a caracterização das diferentes classes tem sido realizada com base na
especificidade ao substrato, sensibilidade aos diferentes tipos de inibidores e os resíduos
de aminoácidos presentes no sítio ativo da enzima.
Em Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis foram identificadas,
pelo sistema PAGE, 15 e 11 esterases como produtos de sete e cinco loci,
respectivamente. Este padrão de esterases está em concordância com o padrão
encontrado para algumas espécies de insetos, como exemplo em Triatoma infestans, em
que foi verificada a presença de seis loci para esterases (Tavares et al., 1998). Já para
outros insetos, um número maior de esterases foi encontrado, como por exemplo em
Aedes aegypti foram identificadas por meio da técnica de eletroforese 23 bandas como
produto da expressão de oito loci gênicos (Lima-Catelani et al., 2004) e no coleóptera
Lasioderma serricorne, 14 loci para esterases foram responsáveis pela expressão de 26
esterases presentes durante o desenvolvimento (Rissato, 2006).
O estudo das esterases durante o desenvolvimento em Oryzaephilus mercator
indicou a presença de três esterases específicas. As OmEST-4 e OmEST-5 estão
presentes nas fases de larva e adulto e a OmEST-7 somente na fase adulta. Já em O.
surinamensis foi observado somente uma esterase com expressão diferencial durante o
desenvolvimento, a OsEST-4, expressa nas fases de larva e adulto e não sendo expressa
na fase de pupa . As demais esterases estão presentes em todas as fases de
desenvolvimento (larva, pupa e adulto). Outros estudos realizados sobre o padrão de
esterases e expressão durante o desenvolvimento em insetos, mostram esterases
específicas, como observado as EST-3, 7 e 8 encontradas somente em estágio larval
(Lima-Catelani et al., 2004); em Drosophila melanogaster, dentre as 22 esterases
estudadas, oito foram específicas de larva e nove foram encontradas em pupas e adultos
(Healy et al., 1991).
A caracterização funcional dessas enzimas segundo os critérios de Holmes et al.
(1968) apud Lapenta et al. (1998) permitiu a identificação de duas acetilesterases, duas
carboxilesterases e três colinesterases em Oryzaephilus mercator. Em O. surinamensis
todas as enzimas estudadas foram caracterizadas como colinesterases uma vez que
foram sensíveis ao sulfato de eserina.
O sulfato de eserina tem sido muito utilizado em trabalhos científicos para a
identificação das acetilcolinesterases nos insetos, neste trabalho, no entanto, três
esterases para Oryzaephilus mercator e quatro para O. surinamensis apresentaram
sensibilidade a este composto, sendo consideradas colinesterases. Esse número de
colinesterases pode indicar que além da presença de acetilcolinesterases que atuam no
sistema nervoso central do inseto, podem ocorrer também colinesterases que atuam em
processos digestivos e de detoxificação, como já indicado em Drosophila melanogaster
(Healy et al.,1991; Campbell et al., 2003).
Para muitas espécies de insetos, a classe das carboxilesterases é a mais freqüente
neste sistema isoenzimático. Isto pode ser observado em Drosophila melanogaster
(Healy et al.,1991), no qual 10 enzimas foram classificadas como carboxilesterases, seis
como colinesterases e três como acetilesterases. Em Aedes aegypti, das 23 bandas
presentes, 12 foram classificadas como carboxilesterases e somente três foram
colinesterases (Lima-Catelani et al., 2004).
A seqüência de resíduos de aminoácidos no sítio ativo da enzima tem sido um
critério adicional para classificação das esterases, principalmente em mamíferos. As
carboxilesterases e colinesterases apresentam uma seqüência consenso de octapeptídeos
(Chatonnet e Lockridge, 1989; apud Healy et al., 1991) e essas são consideradas
constituintes de uma família multigênica das colinesterases/carboxilesterases (Oakeshott
et al., 1993). As carboxilesterases, colinesterases e possivelmente as acetilesterases
contêm um resíduo de serina no seu sítio ativo. Já as arilesterases que são sensíveis aos
reagentes sulfidrílicos apresentam ao invés da serina, um resíduo de cisteína (Oakeshott
et al., 1993).
O PMSF é um indicador da presença deste resíduo de serina no sítio ativo,
entretanto, no presente trabalho, somente as OmEST-2, 3, 4, 5, 6 e 7 foram inibidas
totalmente ou parcialmente por este composto. É possível que nas demais
colinesterases/carboxilesterases encontradas, este resíduo de serina presente no sítio
ativo não esteja acessível ao PMSF.
As espécies de Oryzaephilus mercator e O. surinamensis são muito semelhantes
morfologicamente, sendo bastante difícil a sua diferenciação. Essa diferenciação é feita
pela observação da cabeça. Segundo Athié e Paula (2002), O. mercator, possui a cabeça
com formato retangular e uma região posterior aos olhos inconspícuas, menor que 1/3
dos seus comprimentos, enquanto que, em O. surinamensis, a cabeça apresenta um
formato próximo do triangular e olhos menores, com região posterior distinta
equivalente a 2/3 de seus comprimentos. Entretanto, os padrões para as esterases obtido
com o sistema PAGE permitem diferenciar as duas espécies. Somente duas esterases
entre estas duas espécies parecem apresentar homologia como mostrada entre as
OmEST-1 e OsEST-2, OmEST-3 e OsEST-3.
A análise da CL50 é uma importante ferramenta no estudo da resistência em
insetos praga sendo útil no manejo desta. A observação dos valores obtidos para as
CL50 em relação ao malathion e ao clorpirifós-metil para as linhagens de Oryzaephilus
mercator, mostrou que há diferenças entre estes valores no que se refere à sensibilidade
a estes compostos. Dentre as linhagens naturais, a OmLA apresentou uma maior
resistência quando exposta ao malathion em relação às demais. O cálculo da CL50 em
bioensaios para o clorpirifós-metil, também demonstrou esta mesma relação de
sensibilidade, sendo a OmLA a mais resistente. Em O. surinamensis, a linhagem
OsLPA apresentou uma maior resistência em relação à OsLE para o malathion, mas
quando expostas ao clorpirifós-metil, os valores das CL50 mostraram uma mesma
sensibilidade entre estas linhagens. Bioensaios realizados com malathion para quatro
linhagens diferentes do inseto praga Lasioderma serricorne também mostrou variações
na sensibilidade para este inseticida e a mesma relação de resistência foi verificada para
o clorpirifós-metil. A linhagem mais resistente ao malathion, a LRV, apresentou um FR
de 2,54 em relação à linhagem mais suscetível, a LP, quando calculado a CL50 (Rissato,
2006).
Para a linhagem OmLPT-10 de Oryzaephilus mercator, previamente exposta ao
malathion, obteve-se um FR de 2,8 em relação a sua linhagem natural, a OmLPT e, um
FR de 4,35 em relação à linhagem mais suscetível, ressaltando assim, esta linhagem
como a mais resistente, mesmo quando comparada com a OmLA. Possivelmente o
malathion atuou como um agente seletivo determinando essa maior resistência de
OmLPT-10.
Dentre os três principais sistemas enzimáticos estudados por Conyers et al.,
(1998), as esterases são as mais relacionadas com mecanismos de detoxificação e
insensibilidade aos inseticidas, devido a sua capacidade de hidrolisar ligações ésteres.
Uma vez que os organofosforados, carbamatos e piretróides possuem ligações ésteres,
estes podem ser detoxificados pela hidrólise desta ligação (Lee et al., 2000).
No presente trabalho, a análise das esterases em insetos expostos aos inseticidas
revelou que, apesar de um padrão similar das esterases, houve uma resposta diferencial
destas enzimas entre as linhagens de mesma espécie. De uma forma geral, as linhagens
mais resistentes de Oryzaephilus mercator e O. surinamensis apresentaram enzimas
mais sensíveis aos organofosforados.
Em Oryzaephilus mercator, a OmLA, linhagem natural mais resistente, também
apresentou uma esterase adicional, a colinesterase OmEST-1, que foi sensível quando
estes insetos foram expostos a diferentes concentrações do organofosforado malathion e
clorpirifós-metil. Embora colinesterases estejam confinadas amplamente ao sistema
nervoso central, colinesterases com funções não colinérgicas já tem sido descritas em
tecido não-neural (Chatonnet e Lockridge; 1989 apud Tavares et al., 1998). Assim é
possível que a OmEST-1 seja uma colinesterase não colinérgica, e que tenha um papel
nesta resistência maior observada para a OmLA. Esterases possivelmente não
colinérgicas, já foram encontradas em outras espécies, como por exemplo a EST-9 em
D. melanogaster (Healy et al., 1991) e a EST-2 em Triatoma infestans (Tavares et al.,
1998). Além da OmEST-1, a linhagem OmLA também apresentou como diferencial das
linhagens mais sensíveis, uma inibição em duas esterases, as OmEST-3 e 4, quando os
insetos foram expostos ao malathion e clorpirifós-metil, sendo que estas esterases
também foram inibidas na linhagem resistente OmLPT-10.
Os insetos da linhagem mais resistentes de Oryzaephilus surinamensis, a
OsLPA, analisados também mostraram uma inibição parcial nas esterases para os
insetos expostos ao malathion, mas nenhuma esterase sensível ao clorpirifós-metil foi
encontrada. Considerando que nas linhagens mais resistentes (OmLA, OmLPT-10 e
OsLPA) foram encontradas esterases que apresentaram maior sensibilidade aos
organofosforados testados em comparação com as mesmas esterases em linhagens
sensíveis, sugere-se que estas esterases possam estar relacionadas com os mecanismos
de detoxificação envolvendo o seqüestro do inseticida organofosforado, explicando a
ausência destas em insetos expostos.
Mecanismos de detoxificação envolvendo uma esterase em linhagem resistente
de Oryzaephilus surinamensis foi sugerido por Lee et al.(2000). Neste trabalho foi
observado que esta enzima purificada pode ter um importante papel na detoxificação do
organofosforado fenitrothion, por seqüestro deste inseticida.
A resistência maior de Oryzaephilus surinamensis em comparação com O.
mercator, tanto para o malathion quanto para o clorpirifós-metil, pode em parte, ser
explicada pela presença da OsEST-5, uma colinesterase que apresentou uma coloração
intensa e espessa nos géis analisados desta espécie, indicando a presença de grande
quantidade desta enzima. A presença de bandas fortemente coradas em O. surinamensis
também foram observadas em um estudo realizado por Rossiter et al., (2001a). Estes
autores utilizando o sistema PAGE, observaram alta atividade esterásica em linhagens
de O. surinamensis resistentes ao clorpirifós-metil, esta alta atividade produziu bandas
fortemente coradas e espessas nos géis. De acordo com estes resultados, foi sugerido
por Rossiter et al., (2001a) que o sistema PAGE pode vir a ter uma aplicação na rápida
detecção de resistência ao clorpirifós-metil, sendo esta resistência diagnosticada por
bandas fortemente coradas e espessas comparadas no gel com um padrão de bandas em
insetos de resistência conhecida. Um aumento nos níveis da atividade de esterases em
O. surinamensis, detectado por meio da técnica de eletroforese (PAGE), foi observado
somente para a linhagem resistente e não para a suscetível, sugerindo que a produção de
grande quantidade desta enzima participa do mecanismo de resistência e que
provavelmente ocorreu por seqüestro ou por metabolização dos inseticidas (Conyers et
al., 1998). Além da OsEST-5, O. surinamensis apresenta a OsEST-2 homóloga a
OmEST-1, presente somente na linhagem mais resistente de O. mercator, podendo
também, esta enzima, estar envolvida com a maior resistência de O. surinamensis.
A diferença na resposta destas duas espécies frente aos inseticidas pode refletir a
evolução de mecanismos de resistência diferenciados entre elas, provavelmente
decorrentes de uma história de exposição diferenciada aos inseticidas, variando no tipo
de inseticida empregado e na quantidade deste. Diferença que pode ser observada
quando considerado o produto no qual o inseto foi coletado, seja ele em grãos ou em
alimentos já processados. Estes dados revelam a importância do manejo de qualquer
inseto praga quanto à aplicação do inseticida. Assim, o estudo das esterases de insetos
praga e sua relação com os inseticidas, pode ser uma ferramenta útil na detecção e no
entendimento desta resistência, possibilitando um controle mais efetivo e evitando a
evolução desta resistência nestes insetos pragas.
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1
2
3
4 5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
OmEST-7
+
OmEST-6
OmEST-5
OmEST-4
OmEST-3
OmEST-2
OmEST-1
Figura 1. Esterases em adultos de três linhagens de Oryzaephilus mercator.
Amostras 1 a 6 = OmLA; 7 a 12 = OmLV e 13 a 18 = OmLPT.
1 2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
+
OmEST-7
OmEST-6
OmEST-5
OsEST-5
OmEST-4
OsEST-4
OsEST-3
OmEST-3
OmEST-2
OmEST-1
OsEST-2
OsEST-1
Figura 3. Comparação das esterases de adultos para duas linhagens de
Oryzaephilus surinamensis com as esterases de Oryzaephilus mercator. Amostras 1
e 2 = OmLV de O. mercator, 3 a 10 = OsLPA e 11 a 18 = OsLE de O.
surinamensis.
Tabela 1 - Caracterização das esterases em Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis
Esterase
Classe
Grupo
Linhagem
Estrutura
Fase do
Molecular
Desenvolvimento
OmEST-7
Colinesterase
α
LA, LPT, LV
Monomérica
A
OmEST-6
Carboxilesterase
α
LA, LPT, LV
Monomérica
L, P, A
OmEST-5
Colinesterase
α
LA, LPT, LV
Monomérica
L, A
OmEST-4
Carboxilesterase
α
LA, LPT, LV
Monomérica
L, A
OmEST-3
Acetilesterase
β
LA, LPT, LV
Monomérica
L, P, A
OmEST-2
Acetilesterase
β
LPT, LV
Monomérica
L, P, A
OmEST-1
Colinesterase
α
LA
OsEST-5
Colinesterase
α,β
LPA, LE
Monomérica
L, P, A
OsEST-4
Colinesterase
α
LPA, LE
L, A
OsEST-3
β
LPA, LE
L, P, A
OsEST-2
Colinesterase
α
LPA, LE
Monomérica
L, P, A
OsEST-1
Colinesterase
α
LPA, LE
Monomérica
L, P, A
OmEST = Esterase em Oryzaephilus mercator; OsEST = Esterase em Oryzaephilus surinamensis;
α = α-esterase; β = β-esterase; - sem definição
Tabela 2 - Classificação das esterases em insetos adultos frente à diferentes classes de inibidores
Espécie
Esterase
Inibidores
pCMB Malathion Eserina/Carbaril
PMSF Iodoacetamida
Oryzaephilus
EST-7
+++
+++
mercator
EST-6
+++
+++
EST-5
+
+
+
EST-4
++
+
EST-3
+
EST-2 **
+
EST-1 *
+
+
Oryzaephilus
surinamensis
EST-5
++
+
EST-4
++
EST-3
EST-2
++
+
EST-1
++
+
N/C = Não Classificada; +, ++, +++ = graus de inibição; - = não inibida
* = Esterase presente na linhagem LA
** = Esterase ausente na linhagem LA
-
-
-
-
Classe
Colinesterase
Carboxilesterase
Colinesterase
Carboxilesterase
Acetilesterase
Acetilesterase
Colinesterase
Colinesterase
Colinesterase
N/C
Colinesterase
Colinesterase
Tabela 3 - Valores da CL50 (µg/g) e o fator de resistência para adultos de Oryzaephilus mercator e Oryzaephilus surinamensis
Malathion
Espécie
O. mercator (LPT-10)
O. mercator (LA)
O. mercator (LPT)
O. mercator (LV)
O. surinamensis (LPA)
O. surinamensis (LE)
n
200
400
400
300
750
200
CL50 em µg/g (95% I.C.)*
0,2687 (22,52-32,09)
0,1295 (10,56-15,88)
0,0963 (8,62-10,76)
0,0617 (5,52-6,90)
0,9484 (78,49-114,60)
0,5877 (46,90-73,67)
* Concentração Letal 50% (CL50) e intervalo de confiança (I.C.)
n = número de insetos analisados
FR = Fator de Resistência
** = insetos não expostos
Clorpirifós-metil
FR
4,35
2,09
1,56
1,61
-
n
**
300
200
400
300
300
CL50 em µg/g (95% I.C.)*
FR
0,1269 (11,05-14,58)
0,0903 (5,57-14,64)
0,0342 (2,88-4,07)
0,3888 (35,88-42,13)
0,3726 (27,15-51,16)
3,71
2,64
1,04
-
Tabela 4 - Comportamento das esterases em Oryzaephilus mercator expostos ao malathion
Esterases
0,05 µg/g
0,075 µg/g
0,1 µg/g
LA LPT LV
LA
LPT LV
LA
LPT LV LPT-10
OmEST-7
OmEST-6
OmEST-5
OmEST-4
OmEST-3
+++
+++
++
OmEST-2 **
++
OmEST-1 *
+++
+++
+,++,+++ = Graus de Inibição; - = não inibida
* = Esterase presente na linhagem LA
** = Esterase ausente na linhagem LA
0,2 µg/g
LPT-10
++
++
Tabela 5 - Comportamento das esterases em Oryzaephilus mercator expostos ao clorpirifós-metil
Esterases
0,036 µg/g
0,072 µg/g
0,12 µg/g
LA
LPT
LV
LA
LPT
LV
LA
LPT
LV
OmEST-7
+++
++
++
++
++
+
++
++
+
OmEST-6
++
++
++
++
+
++
+
OmEST-5
+++
++
++
++
++
OmEST-4
++
++
OmEST-3
+++
+
++
++
++
++
OmEST-2 **
+
++
++
OmEST-1 *
+++
++
++
+,++,+++ = Graus de Inibição; - = não inibida
* = Esterase presente na linhagem LA
** = Esterase ausente na linhagem LA
0,3 µg/g
LPT-10
-
Tabela 6 - Comportamento das esterases em Oryzaephilus
surinamensis expostos ao malathion
Esterases
0,3 µg/g
0,4 µg/g
0,8 µg/g
LPA
LE
LPA
LE
LPA
LE
OsEST-5
OsEST-4
OsEST-3
++
++
++
OsEST-2
++
++
++
OsEST-1
++
++
++
+,++,+++ = Graus de Inibição; - = não inibida
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Gislaine Angélica Rodrigues Silva “Caracterização e envolvimento