UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
MESTRADO – ARQUITETURA E URBANISMO
Simone Sousa Silva
O SER E O OUTRO:
AGENCIAMENTOS PROGRAMÁTICOS EM TERRITÓRIOS QUE
PROVOQUEM ARQUITETURAS DO ACONTECIMENTO
Linha
Moderno
de
pesquisa:
e
Urbanismo
Contemporâneo:
Representação e Intervenção.
Junho – 2013
Simone Sousa Silva
O SER E O OUTRO:
AGENCIAMENTOS PROGRAMÁTICOS EM TERRITÓRIOS QUE
PROVOQUEM ARQUITETURAS DO ACONTECIMENTO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação
em
Arquitetura
e
Urbanismo da UPM - Universidade
Presbiteriana Mackenzie como requisito
parcial à obtenção do título de mestre em
Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora Profa. Dra. Eunice Helena Sguizzardi Abascal
Área de concentração: Projeto de Arquitetura e Urbanismo
Linha de pesquisa: Urbanismo Moderno e Contemporâneo: Representação e Intervenção
3
S586a Silva, Simone Sousa.
Agenciamentos programáticos em territórios que provoquem
arquiteturas do acontecimento. / Simone Sousa Silva – 2013.
113 f.: il.; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013.
Bibliografia: f. 109-113.
1. Infraestrutura. 2. Urbanismo. 3. Agenciamentos programáticos.
I. Título.
CDD 711.4
4
Dedicatória
Em memória de minha tia Maria José.
À minha mãe e ao João Paulo
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço especialmente a minha orientadora, Eunice Abascal, que foi uma grande amiga,
presente de forma decisiva neste período, será inesquecível em minha vida e formação, por
sua compreensão, apoio, ensinamentos.
Agradeço aos membros da banca, por suas contribuições. Ao prof. Nelson Brissac, por
despertar em mim o desejo de olhar para as cidades e por isso, escolher a arquitetura como
parte de minha vida. Ao prof. Igor Guatelli, por me fazer acreditar que é possível projetar
arquitetura conceitual e com ela novos mundos.
À CAPES pela bolsa concedida que muito contribuiu para que se realizasse a pesquisa.
Agradeço ao prof. Dorival Campos Rossi, que orientou meus primeiros passos em direção à
realização de um trabalho conceitual em arquitetura e mudou a rota.
Agradeço ao João Paulo, pela paciência em minhas horas de desespero, pelo apoio,
companheirismo e amor, por fazer parte de minha vida, mesmo quando me ausentei em
virtude dos estudos.
Agradeço também aos amigos e familiares que são importantes em minha vida, em especial as
minhas amadas tias e aos amigos que participaram deste processo, representados pelo
Dawerson, Carolina Nery, Bruno Dias, Renata, Gláucia, Silvana, aos meus alunos.
Ao Téo, pela alegria!
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................................................11
1.
POSSÍVEIS
ARTICULAÇÕES
ENTRE
FILOSOFIA
E
ARQUITETURA.................................................................................................................................20
1.1. As articulações
entre a Filosofia e a Arquitetura: Traçando o Por
vir...........................................................................................................................................................21
1.1.1. Valorização da Condição Espacial pela Desfuncionalização da Linguagem..............................25
1.1.2. Novas Tecnologias Promovendo Novas Possibilidades Plásticas..............................................27
1.2. Cartografias do Desejo.................................................................................................................37
1.2.1. A Aldeia Global e as Experimentações Projetuais na Segunda Metade do Século XX..............39
2. FORÇAS CONCEITUAIS E PROJETUAIS: MATERIALIZAÇÕES.............................................49
2.1. A Força do Trabalho Conceitual...................................................................................................50
2.1.1. Reflexões sobre as Inscrições Materiais.....................................................................................52
2.1.2. Viaduto Spittelau e a Inscrição Suplementar de Zaha Hadid: Criação de Novas Dinâmicas
Urbanas................................................................................................................................................54
2.3. Parque de La Villete, Les Folies: Sobreposições e Dissociações....................................................58
3. ARQUITETURA COMO SUPORTE INFRAESTRUTURAL........................................................62
3.1. O Processo Infraestrutural............................................................................................................63
3.1.1. Mobilidade e Desenvolvimento Urbano.....................................................................................68
3.2. Estações Metroviárias e as ações que podem provocar.................................................................71
4. Análise dos Casos.................................................................................................................77
4.1. O Caso da Estação Sé e a Reconfiguração da Praça.....................................................................78
4.2. Estações de Metrô: Instauração de Não- Lugares?.......................................................................88
4.2.1. O Caso da Estação Sumaré.......................................................................................................91
4.2.2. O Caso da Estação Tamanduateí...............................................................................................100
4.2.3. A Integração Física..................................................................................................................104
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................107
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................................109
7
RESUMO
Nesta pesquisa, busca-se estudar as mudanças sofridas nas últimas décadas pela cidade, pelos
espaços públicos, em permanente publicação, ao colocar-se aberto à alteridade e pela
arquitetura em consequência de fatores como a globalização, a terceira revolução urbana, o
desenvolvimento tecnológico; provocando a investigação por outras experiências projetuais
em um espaço urbano que conta com a justaposição de dissociados territórios e tensões entre
situações.
A caracterização da mobilidade urbana e as interações entre o usuário do metrô da cidade de
São Paulo com as obras de arte instaladas e os espaços das estações, o projeto arte cidade e
seus processos de mediação que partem da premissa da importância da promoção de
micropolíticas urbanas que se formam se desfazem pelo movimento de contágio e com a
própria arquitetura a partir de um colocar-se para, um suporte de incremento infraestrutural,
ser que se constrói e se fortalece com articulações, com um além de si próprio a ser
fortalecido pelo público, ou seja, a cidade e seus habitantes, observando sua dimensão urbana.
Este trabalho tem por objetivo dissertar sobre categorias de produção do espaço urbano
contemporâneo e seus resultados pragmáticos, centrando-se em evento, disjunção e
ressignificação. Como método optou-se pela seleção de algumas Estações do metroviário de
São Paulo, entre eles, as estações Sé, Tamanduateí e Sumaré, cujos espaços adquirem outras
significações a partir da multiplicidade da experiência espacial, o que se evidencia pela
articulação com outros suportes, tais como o Projeto Arte no Metrô. Procura-se entender essas
espacialidades como chave para uma compreensão das relações entre dimensões arquitetônica
e urbana, e as questões que se refletem por sua característica de articuladores urbanos.
Numa análise transdisciplinar sob a luz de experiências do enfrentamento urbano,
desenvolvidos por alguns autores, filósofos, urbanistas e sociólogos, considerando seus
conflitos, possibilidades, agenciamentos, conceito desenvolvido por Gilles Deleuze e Félix
Guatari (1997) o que corresponde a uma geografia das relações, dá consistência e une
elementos heterogêneos e suas relações, trabalhando em simbiose, mas sempre pressupondo
territórios.
A cidade sempre esteve ligada às formas de manifestação pública, de modo que o
desaparecimento do ambiente público faz desaparecer também a vida urbana. Para Flusser
(1983), São Paulo não é uma verdadeira cidade, pois falta-lhe, ao lado do espaço privado
8
(oikos) e do político (agora), a dimensão cultural, pois na síntese dessas três determinações
consiste a vida urbana.
A arte urbana constitui uma forma de comunicação pública, catalisadora de participação ativa
e confronto discursivo, uma importante realização na produção deste ambiente; a arquitetura
deve colocar-se como prática crítica, como força produtiva de interação e favorecer o
desenvolvimento de novas formas de espaço público e vivências.
Palavras-chave: Infraestrutura, Urbanismo, Agenciamentos Programáticos.
9
ABSTRACT
This research seeks to study the changes undergone in recent decades the city, the public
spaces in permanent publication, to put yourself open to otherness and architecture as a result
of factors such as globalization, the third urban revolution, technological development,
leading to investigation by other experiences projetuais in an urban space that relies on the
justaposition of dissociated territory and tensions between situations.
The characterization of urban mobility and interactions between users of the subway in São
Paulo with the artwork installed and the space station, the city and its art design processes of
mediation that have assumed the importance of promoting micro urban formed disintegrate
the movement of contagion and the architecture itself from one place to an increase
infrastructural support, be that builds and strengthens with joints, with a beyond himself to be
strengthened by the public , ie, the city and its inhabitants, noting its urban dimension.
This paper aims to elaborate on the production categories contemporary urban space and its
pragmatic results, focusing on event, disjunction and reframing. The method was chosen
selection of some of the subway stations of São Paulo, between them, the stations Cathedral
Tamanduateí and Sumaré, whose spaces acquire other meanings from the multitude of spatial
experience, as evidenced by the interaction with other media, such as the Underground Art
Project. It seeks to understand these spatialities as key to an understanding of the relationships
between architectural and urban dimensions, and issues that are reflected by its characteristic
urban articulators
In disciplinary analysis in the light of experience of confronting urban, developed by some
authors, philosophers, sociologists and planners considering its conflicts, possibilities,
assemblages, a concept developed by Gilles Deleuze and Félix Guatari (1999) which
corresponds to a geography of relations , gives consistency and unite heterogeneous elements
and their relationships, working symbiosis, but always assuming territories.
The city has always been linked to forms of public expression, so that the disappearance of
the public environment is also disappearing urban life. For Flusser (1983), São Paulo is not a
real city, it lacks, next to the private (oikos) and the politician (now), the cultural dimension,
as in the synthesis of these three determinations is urban life.
Urban art is a form of public communication, catalyst active and confrontational discourse, an
important achievement in producing this environment; the architecture should stand as critical
10
practice, as a productive force of interaction and foster the development of new forms of
space public and experiences.
Keywords: Infrastructure, Urbanism, Programmatic joints.
11
INTRODUÇÃO
As interlocuções entre filosofia e arquitetura manifestaram estas articulações através de obras
como “Aestheticcs” de Hegel, onde a arquitetura é pensada de forma estética, o conceito de
espaço e a plástica do século XX apresentado na conferência, “Construir, Habitar, Pensar”,
realizada por Heidegger em 1951.
Recentemente, Jacques Derrida e Deleuze, filósofos pós-estruturalistas, provocaram
deslocamentos dos sentidos estabelecidos para abrir caminho a novas possibilidades para o
exercício do pensamento crítico e das relações sociais, frutos de uma cultura que carece de
outras maneiras de percepção do mundo; Dessa maneira, a cidade, nossa matéria de estudo,
passa a ser interpretada como palimpsesto de experiências geradoras de múltiplos significados
singulares.
Tais deslocamentos nas estruturas estáveis do pensamento, no caso da arquitetura, por
exemplo, dos pressupostos teóricos que prescrevem um fazer arquitetônico, com sentidos e
significados cristalizados por paradigmas históricos então representados em alguns pares
ideais como programa-uso, espaço-função, forma-função, contexto- identidade.
Esse pensamento histórico tradicional acaba excluindo características do pensamento e da
cultura das cidades, como complexidade, mediação, diferença, privilegia efeitos imagéticos,
esvaziam qualquer enfrentamento das complexidades das cidades atuais.
A partir de um posicionamento transdisciplinar, adotado para relacionar conceitos advindos
da filosofia e da arquitetura, procura-se investigar a premência de uma arquitetura calcada na
força de estratégias espaciais que ao serem acionadas possibilitem combinações
programáticas com aparição de situações inusitadas, para isso, precisa-se ativar a potência do
lugar.
Trata-se de um processo de acolhimento do desejo de potência e produção do imprevisível
para que despertem a intensidade do lugar, ou seja, em intervenções urbanas que
potencializem tensões programáticas, produzindo movimentos de desterritorializações e
reterritorializações, em conexões extrínsecas, fora da sua natureza, por exemplo, em uma
arquitetura suporte, baseada em oposições e não em hierarquias opressivas que rechaçam o
imprevisível, Derrida (2001) fala em uma oni-potência-outra, ao contrário de um usuário
contemplativo, os acontecimentos seriam estimulados por esta absoluta potência de alteridade,
12
em locais que dependeriam da atuação do público para que sejam momentaneamente
programados.
Intervenções, suportes que produzem o inteiramente outro no lugar em que são instaladas em
função do desejo de atuação e ocupação do usuário ativo, criador.
Estas intervenções devem estimular interrogações e são estruturas de hospitalidade
incondicional.
Os espaços vazios, os interstícios urbanos, têm se tornado peças estratégicas no processo de
acolhimento do outro, do desejo de potência e produção do inusual.
As estratégias de projetação crítica da tradição de um lugar, com as descodificações de
pressupostos teóricos, pode produzir uma transgressão dos sentidos do lugar, com uma força
diferencial conceitual e transformadora.
A questão irá examinar o espaço, lugar de imprevistas habitabilidades, e seus devires urbanos
e arquitetônicos, buscamos o lugar do acontecimento, do evento, do imprevisível.
Estas instabilidades e indefinições no espaço surgem como crítica ao espaço regido por
prescrições e determinações formal-compositivas tidas como harmônicas e ao desejo de
manterem-se invioláveis ao tempo.
A arquitetura funda o espaço da morada, e assim, contribui na estruturação de lógicas
territoriais, ao ativar este espaço, iremos desta maneira, inquirir a matéria como agenciadora
de situações que serão ativadas com uma ação neste espaço e não somente como objeto a ser
contemplado, já que de fato, dificilmente o é.
De fato, a arquitetura em sua inscrição material vincula-se às artes, pois se liga ao campo dos
afectos e abre a possibilidade da liberação de forças vitais e garante atuação criativa no
espaço, aproxima-se de um campo de experimentações, já que a pluralidade de lógicas
espaciais exige diversas formas de abordagem do assunto.
Gilles Deleuze e Félix Guattari, em suas interpretações sobre alguns conceitos de Bergson e
Espinosa, trabalham principalmente com o conceito de afeto, um movimento essencial entre
partículas que compõem um corpo. Segundo Spinoza, nós somos fabricados como autômatos
espirituais, desta forma, há o tempo todo ideias que se sucedem em nós, e de acordo com essa
sucessão de ideias, nossa potência de agir ou nossa força de existir é aumentada ou é
13
diminuída de uma maneira contínua, sobre uma linha contínua, e é isso que nós chamamos
afeto (affectus) e de força de existir, potência de afetar e ser afetado. O afecto é inumano
porque não se identificaria à pulsão nem ao sentimento; é pensamento, uma potência plástica,
nós, temos a potência de inventar novos afectos.
“O affectus é, portanto a variação contínua da força de existir de alguém, na
medida em que essa variação é determinada pelas ideias que ele tem. Porém,
ainda uma vez, "determinada" não quer dizer que a variação se reduza às
ideias que ele tem, uma vez que a ideia que eu tenho só dá conta de sua
consequência, a saber, que ela aumente minha potência de agir ou ao
contrário a diminua em relação à ideia que eu tinha imediatamente antes, e
não se trata de uma comparação, trata-se de uma espécie de deslizamento, de
queda ou de elevação da potência de agir,” (DELEUZE, 1978).
Estes estudos concentrar-se-ão no processo de interação-tensão, sujeito-objeto, através do uso
dos suportes infraestruturais, para o exame destas relações, pois em sua condição flexível,
adaptam-se às imprevisibilidades refletindo em agenciamentos.
A arquitetura suporte, aberta a contaminações e deslocamentos, sem que origem e finalidade
estejam ligadas, possibilita as ações imprevistas e a suplementaridade espaço-funcional?
Para a análise utilizamos os conceitos de filósofos pós-estruturalistas, como “Khôra”,
proveniente do conceito de Platão, trabalhado em livro de mesmo nome por Derrida (1992), o
de Entre, de Derrida (1967), o de “Agenciamento” de Deleuze (1980), o de “Virtualização”
também de Deleuze (1998) e o de “Disjunção”, do arquiteto Bernard Tschumi (1994).
Estes conceitos vão de encontro a uma arquitetura preocupada em gerar emergências, revelar
potenciais latentes.
O conceito de agenciamento maquínico, trabalhado por Deleuze e Guattari (1997), em Mil
Platôs, diz respeito aos procedimentos de desterritorialização de elementos e de suas relações
de alteridade a ideia de arquitetura como em um estado de devir, contrariando a ideia de
estabilidade.
O conceito de Khôra, para Derrida (1992), seria um receptáculo, onde interpretações externas
deixariam marcas de suas interpretações e apesar disso, Khôra, jamais se deixaria atingir ou
esgotar-se por tais interpretações, seria capaz de adquirir as mais diversas formas e ao mesmo
tempo permanecer em sua condição original.
14
Tais conceitos traduzem o modo com o qual buscamos analisar os espaços infraestruturais em
arquitetura, pois não há submissão do significado a verdades pré- estabelecidas.
O conceito do entre, incorporado à arquitetura abre a possibilidade de questionar a
transitividade ou intransitividade da arquitetura, até que ponto o desenho pode determinar
usos e funções dos espaços, provendo-os de significados e importância de um e outro através
de sua configuração formal.
Este conceito é um ponto de inflexão, uma estratégia arquitetural advinda da filosofia, com
potencial transformador.
A
arquitetura
do
evento,
assim
denominada
por
Derrida
e
trabalhada
pelos
desconstrucionistas, abre-se para pensarmos algo considerado como não compreensivo ou
mesmo, inclassificável, por não ser adequado aos padrões vigentes em arquitetura.
Esta arquitetura que buscou interlocuções com a filosofia pós-estruturalista, caracterizou-se
por problematizações do existente e passaram a considerar em suas práticas de projetação os
devires históricos, ou o que não é comumente aceito, escolhendo como instrumento de
efetivação para sua ação, o espaço e suas potencialidades.
Estes arquitetos adotam a postura na qual o vir a ser substitui o ser dogmático dos modernistas
racionalistas, garantindo uma arquitetura dos eventos no espaço.
Em oposição a uma realidade centrada, Deleuze e Guattari (1995) falam de uma realidade
rizomática, múltipla, não significante, heterogênea, constituída de coexistências e platôs em
constantes deslocamentos, jamais estáveis.
Com isso, busca-se uma desmontagem, desterritorialização de uma arquitetura que ao
contrário de preocupar-se em ser algo, esteja mais preocupada em vir a ser.
Este trabalho é uma discussão da produção do espaço urbano contemporâneo como
instauração de vivências provocadas pela articulação entre cidade e espaços infraestruturais,
livres de pré-configurações, como estes vêm adquirindo uma concepção de projetação cada
vez mais próxima de estratégias que fundam o acontecimento, o devir.
Em que medida o modo de projetar e processar em nosso caso, arquiteturas, espaços e
intervenções, implica em uma nova pragmática, novas formas de pensar e planejar a relação
com os sentidos e significados é o que nos motiva a investigação.
15
Embasados nestes conceitos que perpassam de maneira transdiciplinar a filosofia e a
arquitetura, nos detemos em modelos binários sancionados pela arquitetura moderna, com
postulados universais, como o programa/uso, espaço/função, contexto/identidade, para traçar
construções mentais e projetuais que atravessam devires arquitetônicos e urbanos para a
atualização em lugares do “acontecimento” que marcam habitabilidades, inscrições
momentâneas, instáveis, que chegam sem ser anunciados.
A partir da segunda metade do século XX, as tecnologias da inteligência passaram a compor a
ferramenta projetual dos objetos de design e arquitetura; portanto, as alterações nos sistemas
de produção implicam em uma revisão nos sistemas de representação, derivando, como
discute Dorival Rossi (2003), em outra noção de projeto, processo e produto de objetos e
signos, que por terem adquirido a dimensão da interatividade com a tecnologia agora são
sensíveis e reagentes ao comando do usuário e às relações com estes novos ambientes.
Segundo Pierre Lévy (1996), vivemos em um movimento geral de virtualização, a essência de
todas as transformações em curso, que afeta desde os corpos, o funcionamento econômico, o
exercício da inteligência e não somente a informatização ou a comunicação. Atinge a
constituição do “nós”, ao contarmos com comunidades, empresas, democracias virtuais, tratase de uma mutação que ultrapassa qualquer processo de informatização, ela apresenta-se
como o movimento do devir- outro, heterogênese do humano.
As coisas só possuem limites bem definidos no real. A virtualização trata do deslocamento do
ser para a questão, é algo que “põe em causa a identidade clássica, o pensamento apoiado em
definições, determinações, exclusões, inclusões e terceiros excluídos. Por isso a virtualização
é sempre heterogênese, devir outro, processo de acolhimento da alteridade”. (LÉVY, 1996,
p.25)
A cultura digital inaugurou um novo campo de relações, o da dimensão virtual da linguagem,
como arquitetos convêm questionar até que ponto os objetos de arquitetura se tornaram
sensíveis, não por sua dimensão tecnológica apenas, mas principalmente pela inclusão de
novas lógicas, já que põem em jogo novos processos de criação, o processo de transformação
de um modo de ser em outro, movimento que buscamos investigar.
Quando pensamos acerca da criatividade, de juízos abductivos para estes produtos de design e
arquitetura, frutos de novos processos e projetos, não se pode determinar um percurso linear e
16
discreto desse juízo: a função interativa da linguagem, adquirida no uso das novas tecnologias
em nosso cotidiano, produz mudanças de pensamento e comportamento.
O conceito de homogêneo foi superado pelo de hiperdiversidade, assim, o espaço óptico se
transmuta em háptico, tático, sensível a nossa interlocução, reagente. Neste sentido, a
experiência humana passa a interagir com a não humana, ou seja, a experiência humana deixa
de ser global porque passa a ser confrontada com forças que não seguem as mesmas leis do
corpo e do cérebro humanos; tem experimentado a interlocução com forças e objetos
inanimados que, por força de seu projeto de design, adquirem algumas das dimensões
humanas, especialmente a capacidade de comunicação e resposta, como diz Francastel em
Arte e Técnica nos séculos XIX e XX (1963).
Quando operamos a linguagem estabelecemos parâmetros lógicos de inteligência, portanto,
segundo o pensamento de filósofos pós-estruturalistas, como situações arquitetônicas e
urbanas são capazes de deslocar sentidos historicamente aceitos e compreendidos, para
abrirmos espaços aos questionamentos e às deslimitações do objeto arquitetônico favorecendo
os processos de mediação com a cidade e de potencialização de micropolíticas urbanas
produzidas a partir de rastros, a presença desativada, tecendo as relações de proxemia e
diastemia, baseadas em proximidade e fusão ou em contaminações por irradiação, ou seja,
pela superação daquilo que parece ser da natureza ou próprio do objeto, algo territorial, pela
hibridização ou hiperdiversidade, como tratamos acima.
Quando falamos em arquitetura e urbanismo não podemos deixar de falar nos corpos que
transitam e habitam as nossas cidades contemporâneas, que adquiriram novas velocidades e
conquistaram novos espaços, também superaram o que parece ser exclusivamente de sua
natureza. Lança-se ao exterior e reverte a exterioridade técnica ou a alteridade biológica em
subjetividade concreta.
Segundo Pierre Lévy, essa virtualização é analisável apenas como mudança de identidade,
passagem de uma solução particular a uma problemática geral, a virtualização do corpo é uma
heterogênese do humano. “Meu corpo pessoal é a atualização temporária de enorme
hipercorpo híbrido, social e tecnobiológico”.
Com as transformações em nossos paradigmas de pensamento, nossas ações no espaço,
também sofreram mudanças, gerando novos processos e novas percepções, que podemos
observar em conceitos como o de corpomídia, proposto por Greiner e Katz (2005), no que diz
17
respeito aos processos comunicativos envolvidos na relação do corpo com o ambiente, nos
sugere que o processo evolutivo seleciona informações por contaminação para a constituição
do corpo.
Assim como a arquitetura, estabelecem uma articulação, um encontro, entre o que chega a
adição e o já existente, um ser com que se fortalece ao formar-se com presenças além dele
próprio.
Não é uma série estática de representações, neste sentido a comunicação não pode ser restrita
a significados, pois nem tudo o que comunica opera em sistemas de mensagens já codificadas.
Há comunicação de estados e vínculos de sentidos que modificam os corpos. Esses processos
têm lugar no tempo real de mudanças que ainda estão por vir no ambiente, quem dá início ao
processo é o sentido do movimento. É o movimento que faz do corpo um corpomídia.
“Porém, o que chega a partir da miríade quase infinita de situações espaciais
e soluções formais criada pela diafanidade da arquitetura é algo a ser
discutido em nosso tempo; tempo em que as condições mínimas do homem
político composto pelo ser –com, o ser em comunicação, o estar
concomitante e o espaço compartilhado, associadas à acentuação das
incertezas, da imprevisibilidade dos acontecimentos e seus desdobramentos
incontroláveis-o porvir do qual nos fala Jacques Derrida, fazem parte da
agenda do dia e se tornam desafios a serem enfrentados.” (GUATELLI,
2012)
Portanto, buscamos em algumas estações do metroviário de São Paulo e nas situações que
constroem na cidade, uma intersecção entre infraestruturas e composições estético/ artísticas,
potencializando relações agenciadoras de condições a serem ativadas por ações no espaço,
que interfiram nos modos de existência daí resultantes.
“Porém, talvez a arquitetura seja mais do que isso. A arquitetura é um
suporte que permite a expressão artística não apenas a quem a concebe, mas
também a quem recebe e a usa. Ela abre a possibilidade da liberação de
forças vitais (élan) por quem vai usá-la onde quer que essas forças estejam
represadas, pois dá condições de uma atuação criativa no espaço; o exercício
deixa de ser apenas visual para transformar-se em fonte fecunda de
experimentações. Podemos dizer que a experiência estética arquitetônica é
capaz de atravessar vários campos da atividade humana”. (GUATELLI,
2012)
A partir da segunda metade do séc. XX passamos a questionar a ideia de metanarrativa
(Lyotard, 2002). Tanto na arte quanto na arquitetura, buscamos formas de engajar o indivíduo
sob pontos de vista menos restritivos. A teoria da Arquitetura buscou apropriar-se de análises
narrativas de outras disciplinas, traduzindo-as em práticas espaciais que convidam o indivíduo
a completar o edifício com sua própria estória (JAMESON, 1998). Traduziam-se em espaços
18
que propunham ao usuário a experimentação de diferentes percepções e ações. Ao apresentar
uma camada dinâmica, manipulada através de uma interface, apresenta uma nova relação
entre indivíduo e edifício, sujeito e espaço, corpo e ambiente, neste jogo, incomensurável da
arquitetura e das artes, o primeiro só é completo através da interação com o segundo.
Neste período vimos o surgimento de novas formas industrial, cultural e social que por serem
revolucionárias e flexíveis no espaço e no tempo, levaram a novas formas de pensar e
representar o mundo (HARVEY, 1989). Nossa percepção do espaço e do tempo se alterou,
assim como passamos a pensar e perceber o espaço construído de maneira diferente. Essas
novas formas trouxeram à arquitetura e ao urbanismo, a necessidade de constante mudança e
inovação, surge à dimensão da informação.
O conceito de duração, caro às novas configurações espaciais e ao novo encadeamento
histórico da dimensão da informação, trata de um movimento que é condição para se penetrar
numa realidade imanente e criadora; o de devir, movimento que é da ordem do imperceptível,
atua em dupla direção e que faz a constituição do espaço oscilar entre a linha, a partícula e o
imaterial.
"Devir é nunca imitar, nem fazer como, nem se conformar a um modelo, seja
de justiça ou de verdade. Não há um termo do qual se parta, nem um ao qual
se chegue ou ao qual se deva chegar. Tampouco dois termos
intercambiantes. A pergunta 'o que você devém? ' é particularmente estúpida.
Pois à medida que alguém se transforma, aquilo em que ele se transforma
muda tanto quanto ele próprio. Os devires não são fenômenos de imitação,
nem de assimilação, mas de dupla captura, de evolução não paralela, de
núpcias entre dois reinos." (DELEUZE, Conversações.)
Analisaremos arquiteturas que potencializem agenciamentos. Enfocando em intervenções
urbanísticas contemporâneas e modernas, que se caracterizam pelo surgimento de novas
matrizes teóricas. Determinam o debate sobre os processos de produção do espaço construído
e não construído, do espaço simbólico, do projeto em escala urbana, as relações entre arte e
cidade e seu papel nas intervenções atuais. Abordam ainda, temas ligados ao estudo e análise
crítica das transformações da cidade contemporânea.
Espaços públicos são em geral, lugares de transição, sobretudo espaços de publicação, de um
ser com e um ser em si mesmo em processo, da constituição incondicional da alteridade,
encontraria, na arquitetura edificada, um aliado na defesa dessa abertura ao outro, das
vibrações dos sentidos dados e da contestação ao estabelecido?
19
Em oposição a uma realidade homogênea, Deleuze e Guattari (1995) falam de uma realidade
rizomática, heterogênea, não significante, a-conclusiva, constituída de coexixtências em
constantes deslocamentos em função das possibilidades de articulação. No pensamento
deleuziano, um rizoma é um campo de intensidades que não começa e nem conclui, está no
meio, entre as coisas, por isto analisamos nosso objeto de estudo sobre esta vertente,
buscando no ato de projetação ativar o pensamento crítico, rizomático, intermezzo.
Buscamos olhar para a arquitetura com o potencial de um vir a ser.
Portanto, em um primeiro momento a pesquisa corresponde ao projeto, às hipóteses do
trabalho em função do problema colocado, à base filosófica e metodológica do raciocínio,
definem-se os princípios rizomáticos da arquitetura e do urbanismo, da arte e da cidade. Em
um segundo momento, os instrumentos de prospecção e avaliação para verificar a validade
das hipóteses, tomando as Estações Sé, Tamanduateí e Sumaré do metroviário de São Paulo
como objeto deste estudo.
20
Capítulo1
POSSÍVEIS ARTICULAÇÕES ENTRE A FILOSOFIA E A ARQUITETURA
21
1.1. As articulações entre a Filosofia e a Arquitetura: Traçando o Por vir
Jacques Derrida, procura em seus escritos, especialmente os que tratam do logocentrismo, em
quais sentidos conceitos filosóficos podem ser incorporados em outras atividades; podemos
ver o discurso pós-estruturalista presente nas mais diversas áreas.
Em entrevista à Eva Meyer (1988), denominada “Escrever é um modo de morar”, citada por
Igor Guatelli em sua tese de doutoramento (2005), o filósofo busca uma maneira de relacionar
arquitetura, filosofia e escrita. Para Derrida, cada linguagem sugere uma disposição no espaço
e dele se aproxima, comparando-se à abertura de um caminho a ser criado.
Entretanto as linguagens não podem determinar os caminhos que partem do edifício, “que são
criados a partir de sua materialização/espacialização, que não sabemos onde nos levarão, mas
que sempre gravarão sua passagem na forma de escrever do arquiteto”, diz Derrida,
recorrendo a Heidegger, ainda, nos fala que, “seria interessante recordar que no início a
arquitetura não era uma arte de representação, enquanto a pintura, o desenho e a escultura
sempre puderam imitar algo cuja existência supõe. Na arquitetura existe a imitação de (riscos)
do gravado, da ação de riscar, na forma de planta, elevação, croqui e que podem ser
associados à escrita”. (GUATELLI, 2005, p. 31.).
Segundo seu pensamento, em arquitetura, os objetos/edifícios, são assim como para a
literatura, acontecimentos estéticos e de leitura, mas como nos lembra Guatelli (2005), não
trata-se de lê-los, no sentido de entendidos, mas sentidos, através das linguagens adotas e
traduzidas em formas.
Ao utilizar de linguagens, os autores não deveriam ter como premissa o estabelecimento de
verdades, mas a criação de um lugar onde o leitor/usuário pode abrigar-se, sentir, e, criar seus
próprios significados, advindos de suas interpretações.
Na tese de Igor Guatelli (2005), há uma menção em especial ao pensamento de Barthes que
considero interessante às analogias entre a arquitetura, o texto e a filosofia e que são similares
ao que Deleuze e Guattari desenvolvem sobre a linguagem em os Mil Platôs; em Le plaisir Du
texte, Barthes fala em perdas ocasionadas quando um texto possui um sistema fixo de
representação, como um sistema centrado, constituído por significados pré-determinados. O
autor comenta também sobre a necessidade de:
22
“(...) textos em estado de significantes, da multiplicidade de significados,
intransitivos, um lugar de constantes deslocamentos e rupturas, das
diferenças, das contradições e ambiguidades, dos fragmentos, atópico(...)
texto de gozo: é aquele que coloca em estado de perda, aquele que
desconforta (talvez até a um certo vazio), que faz vacilar as plataformas
históricas culturais e psicológicas do leitor, a consistência de seus gestos, de
seus valores e de suas crenças, coloca em crise sua relação com a
linguagem” (GUATELLI, 2005, p. 32)
Há esforços históricos no sentido de compreender a arquitetura e o desenho em arquitetura
aos textos, como manifestos de pensamentos, como no caso do movimento moderno, com
posições claramente dogmáticas, totalizadoras ou como pregador de questionamentos e
desestabilizador de sentidos.
Para Derrida (1967), um signo pode conter múltiplos significados, em arquitetura, nos
edifícios entendidos como signos linguísticos, quase sempre buscou-se associá-los a
significados, garantindo um único sentido entre forma e valor de uso.
Formas específicas em arquitetura passaram em um determinado momento a ser associadas a
uma função e a um significado. Ao pensar em diagramas para associá-los à arquitetura,
Eisenman, em Diagram Diaries (1999), afirmou que o substrato da forma, pudesse ser
deslocado dos pressupostos programáticos, para preservar assim, a singularidade dos objetos,
separando-os de verdades pré-estabelecidas, “significaria um processo que poderia deslocar a
forma de suas relações assumidas anteriormente com uma função, significado e estética, sem,
ao mesmo tempo, necessariamente negar a presença dessas condições”. (EISENMAN, 1999,
p.27 apud GUATELLI, 2005, p. 34).
Eisenman classifica o diagrama como algo original da escrita arquitetônica, entende a linhatraço como forma de representação arquitetural, como uma escrita, a linha-traço expressa em
um espaço plástico e não discursivo capaz de revelar estruturas latentes, com desenhos não
pré-estabelecidos, contrário aos discursos em que resume-se a um instrumento de ilustração e
materialização de sentenças organizadas.
Para Eisenman (1999), há a história de uma arquitetura de traços, de linhas invisíveis,
diagramas que tornam-se visíveis através de significados. É traço de uma condição
intermediária (a linha-traço ou o texto-traço). O diagrama pode ser material e cultura histórica
não traduzida em discursos acabados, em significados previamente estabelecidos e estáveis,
mas é um material em estado de latência, capaz de ser manipulado para desta forma, adquirir
23
os mais diversos sentidos e significados, são o que o arquiteto denomina por diagramas de
instabilidade.
Eisenman, Derrida, Deleuze, Barthes, entre outros, falam do poder figural, inserido em um
espaço textual, não se trata do texto legível, mas do escriptível, como nos diz Guatelli (2005)
a linha em sua forma linha-letra ou linha-traço, vista em seu estado significante, instável, em
que a divisão figura-fundo seria desfeita, possibilitando múltiplas leituras.
Os diagramas de instabilidade, considerados enquanto escritas de pura presença, que não
constroem-se a partir de referências contextuais e representações históricas, mas sim, como
um receptáculo aberto às mais diversas interpretações, distante de significações apriorísticas,
apresentam infinitas possibilidades de inscrever marcas.
“Eisenman, ainda em Diagram Diaries(1999, p.23) afirma que o diagrama
arquitetural deve ser concebido como uma série de superfícies ou camadas
constantemente em regeneração e, ao mesmo tempo, capazes de reter
múltiplas séries de traços (...) entendido como um estrato de traços
superpostos, oferece a possibilidade de uma abertura do visível em direção
ao articulável, para o que está no interior do visível”. (GUATELLI, 2005,
p. 37)
O diagrama arquitetural é o espaço da escrita arquitetônica quer seja baseada em valores
estáveis, quer seja numa escrita instável, capaz de produzir desenhos para além de seu próprio
significado ou objetos que se constituem para além do que é visto, mas na possibilidade de
sua constante representação crítica.
O ato ordenador com regras e prescrições normativas do projeto arquitetônico presente no
exercício de projetação dos racionalistas modernos é incongruente com o pensamento crítico
ativado pelos questionamentos das estruturas estáveis do pensamento realizado pelos filósofos
pós-estruturalistas e que ecoou nas reflexões sobre a arquitetura e o urbanismo
contemporâneos, onde o projeto é capaz de significar e ressignificar repetidamente.
A possibilidade de um não condicionamento do uso do interior em função de um significado
proveniente da forma exterior, nos mostra o quanto é delicado o controle de destinações
espaciais, aqui os significados são significantes postos em relação com outros significantes,
como nos diz Bennington (1996), ou seja, em outras palavras, as manifestações geradas a
partir de diferentes apropriações, em condição de ser algo além do que é.
A relação interior e exterior deixa de ser amparada na ideia de totalidade e conduzida pela
lógica de composição que contempla um dentro e um fora e passa a representar um suporte de
24
suposições ainda porvir para a montagem de situações e apropriações dinâmicas, em um
espaço aberto a questionamentos, não falamos em forma-matéria, mas encontramos a força de
projetual de nossas questões em arquitetura na matéria-forma.
A instabilidade nos textos dos filósofos pós-estruturalistas como Derrida e Deleuze, poderiam
ser alcançadas nas contaminações do discurso, também os espaços residuais presentes nas
cidades estariam abertos aos processos de apropriação, e aí podermos já traçar um paralelo
entre as questões apresentadas pela filosofia e a arquitetura que propomos e buscamos ao
analisar os espaços suportes.
Os textos Derridianos, são suportes de suposições e apresentam traço (Derridiano) que
expressa um significante em constante significar, aberto aos mais diversos registros,
possibilita a enunciação do outro, pois são menos assertivos e mais reflexivos ao mesmo
tempo em que buscam a desestabilização da linguagem. Tanto códigos linguísticos ou
estéticos-arquitetônicos, cedem espaço aos acontecimentos, para Derrida as presenças
ausentes, traduzem-se no que não mais está dentro e fora do texto, em arquitetura as
circunstâncias espaciais, programáticas, manipuladas podem sugerir a montagem de situações
espaciais e o surgimento de acontecimentos.
No processo de engendramento de um dentro e um fora em arquitetura, o espaço gerado
ganha força de outras significações, os interstícios, passam a ser entendidos como um entre
coisas o que reside no processo de desarticulação do que aparenta ter um grau de definição,
nestes espaços ao considerarmos que acompanham o “traço” como elemento de ligação no
momento em que articulam e montam situações espaciais a partir de um programa,
enfraquecem processos identitários e representações e valorizam a alteridade.
Escolhemos para nosso estudo, estações de metrô que em suas inscrições materiais enquanto
espaços infraestruturais possibilitam a emergência dos acontecimentos, mas a força destes
processos encontra-se no elemento articulador, o entre um ponto e outro, a linha de
deslocamento fortalece as duas pontas e cria lugares, o espaço gerado é mais importante que a
forma-matéria, pois são heterogêneos, múltiplos e não hierarquizados.
25
1.1.1. Valorização da Condição Espacial pela Desfuncionalização da Linguagem
A arquitetura desconstrutivista ou desconstrucionista explora uma escrita instável,
responsável por romper com valores históricos, primeiro, em nível formal, mas com
consequências espaciais como a descontinuidade, instabilidade, desequilíbrio, planos
fraturados e linhas diagonais, com o intuito de questionar, desestabilizar os sentidos e
desenvolver um método de pensar através dos projetos e aí, nestas experimentações espaciais
e na averiguação crítica, encontramos voz semelhante às questões que buscamos trazer com a
arquitetura infraestrutural.
Os arquitetos Peter Eisenman e Bernard Tschumi, são para estudiosos como Jencks (1996), os
que mais se aproximam do discurso de Jacques Derrida, por exemplo, no projeto para o
parque La Villete, intitulado Choral Works, puderam aplicar conceitos desenvolvidos por
Derrida como os de lugar-não lugar, território; não trabalham com concepções pré-definidas,
mas com estratégias projetuais.
Procuram propostas que contaminem os códigos, disseminem os conceitos e desta maneira,
atinjam uma ausência absoluta que lhes garantirá uma fuga da representação.
Para Eisenman, não somente o desconstrucionismo, mas o procedimento que pode estar
presente nas estratégias de projetação, “refere-se a algo que diz respeito à natureza
indeterminada das coisas, como um processo de questionamento onde tudo está sob suspeita
(...) não mais havendo uma relação direta entre signo e significado (...) o objeto está em
completa flutuação”. (GUATELLI, 2005, p.76)
A questão que se levanta é o repúdio a qualquer tipo de representação que significações
apriorísticas vindas com pensamentos dominantes que se impuseram, no sentido de eliminar a
possibilidade de manifestação do outro.
Isto quer dizer, u ma tentativa de contraposição ao preceito que se impôs de que o exterior
necessariamente deve representar o interior, que a forma seguiria a função do edifício,
ocorrendo uma correspondência direta, exterior/ interior, forma/função, pares que
fundamentaram um processo de funcionalização da linguagem pelo Movimento Moderno.
Derrida considera a linguagem como um sistema de diferenças, onde um significante pode
manifestar diversos significados; em seu pensamento, o interior ou o espaço significante
(conceito de entre), existe independentemente do exterior, do significado dado, o exterior
26
seria o acidental, não previsto, onde diversos significados poderiam acessar o interior, a
conjunção do espaço estaria justamente numa relação entre o objeto externo e a experiência
interna.
Essa defesa por uma linguagem capaz de significar e ressignificar, viria em contraposição ao
que separa interior e exterior e ao que eliminaria a possibilidade de potencialização de uma
condição espacial entre e de um não condicionamento e direcionamento de apropriação e uso
do interior em função de significados advindos da forma exterior, pois o que acontece é a
mistura de ambos, com a ocorrência de apropriações dinâmicas, tanto na escrita, quanto na
arquitetura.
A desfuncionalização da linguagem passa por uma contaminação da forma e esvaziamento de
seus signos, junto à valorização da condição espacial entre, através do entrelaçamento de
interior e exterior, ou seja, a neutralidade buscada estaria vinculada a intenção de
esvaziamento dos sentidos dados a priori e não à ausência de forma, à desmaterialização,
incentivando o surgimento de sentidos múltiplos e simultâneos, não há a necessidade do
significante vir acompanhado de um significado, ou do significar constante para o significado.
“(...) a valorização do entre, das ausências e não das presenças, ou dos
significantes, daquilo que poderia significar em detrimento dos significados
apriorísticos ou de um significado último que fosse a verdade do objeto,
abrindo espaço para o acidente, o arbitrário, o imprevisto (...)” .
(GUATELLI, 2005, p. 83)
Tanto na escrita, quanto na arquitetura, pensa-se em um primeiro momento que tudo seja
tomado como traço num processo de desfuncionalização da linguagem, considerando-o como
aquele que propicia a enunciação do outro a partir do existente, capazes de significar, adquirir
um significado, voltar a ser traço e ressignificar.
O que buscamos em nossa investigação é uma condição que permaneça em estado
significante, considerando os significados que vierem, já que são as manifestações das
diversas apropriações dos espaços que estudaremos, sempre aberta alteridade, ao vir a ser e
aos registros externos.
27
1.1.2. Novas Tecnologias Promovendo Novas Possibilidades Plásticas
As cidades são sobreposições de histórias, culturas, formas urbanas e arquitetônicas, que
organizam nossas referências culturais e críticas com o ambiente natural e condicionam nossa
fruição cotidiana.
A arquitetura é o meio responsável pelo qual o homem transmite as informações que lhe
permitem organizar o território em que vivem. Para se realizar como extrato cultural, segundo
Fábio Duarte (1999), a técnica, que sempre foi considerada intermediária entre as intenções e
o objeto construído adquire autonomia com a Revolução Industrial.
Ainda, segundo Duarte (1999), a técnica é uma operação mental, possibilita a interação entre
o homem e a obra, a evolução para a tecnologia produz o desenvolvimento da cultura humana,
pois os instrumentos tecnológicos trazem mesmo inativos, suas potencialidades.
Na transformação da técnica em tecnologia, a indústria e o comércio foram consequências do
progresso que gerou o aumento da população urbana e a mudança na configuração das
grandes cidades.
Detectamos neste processo as mudanças territoriais e também as mudanças temporais, onde
não mais caberiam equilíbrios estáveis, o ritmo das transformações passaria a ser cada vez
mais rápido e profundo.
“Giulio Carlo Argan identifica que foi com essa explosão das cidades ligada
aos avanços tecnológicos que se originou um campo específico na
arquitetura, que englobava não só questões formais e técnicas, mas a
complexidade de relações entre os homens e a sociedade que ocorria nas
cidades, que agora apresentavam a necessidade de ser planejadas. Esse
campo é o urbanismo, que serviu ao mesmo tempo como síntese de
inquietações e propulsor de propostas da arquitetura moderna”. (DUARTE,
1999)
Neste período, os primeiros projetos urbanos em cidades industriais surgem, o plano do barão
Haussmann para Paris, com abertura de bulevares e vias com fins de incrementação do fluxo
urbano, o Eixample de Idelfonso Cerdá para Barcelona, responsável pela ampliação da cidade
em blocos ordenados com largas vias de circulação, linhas de bonde e introdução de técnicas
higienistas nos planos.
As tecnologias possuem suas próprias lógicas que condicionam produtos e o meio onde se
inserem, com isso trazendo novas configurações para as cidades.
28
O comércio em larga escala, propiciou o desenvolvimento das linhas férreas para o transporte
dos produtos. Ferrovias necessitavam de estações de parada e galpões, fazendo com que os
trens metropolitanos subterrâneos também favorecessem a criação de novos tipos de
edificações nas cidades.
Joseph Paxton construiu em 1851, o Palácio de Cristal, proporcionando novas potencialidades
estéticas a partir de possibilidades tecnológicas, como placas de vidros e segmentos metálicos
pré-fabricados que se inseriram nos espaços do cotidiano urbano. A partir de 1865, com
tecnologia e desenho semelhantes à Galeria Vittorio Emanuelle II, galerias/ruas espalharam-se
por Paris, Nápoles, Bruxelas.
Otto Wagner utilizou esta tecnologia de estruturas metálicas e placas de vidro cobrindo
grandes vãos na estação Karlplatz de metrô em Viena. “Desse mesmo período são algumas
estações de metrô construídas em Paris por Hector Guimard, estas com linhas claramente art
nouveau, sendo que Otto Wagner já prenunciava em seus projetos uma racionalização formal
que seria vigente na arquitetura moderna”. (DUARTE, 1999)
As possibilidades plásticas dadas pelas novas tecnologias propiciaram também uma
criatividade plástica dos novos meios.
Um novo pensamento para as cidades frente às novas tecnologias deu origem ao movimento
moderno, que buscou a transformação das cidades em seus aspectos sociais, estruturais,
ideológicos e estéticos, propunham-se construir globalmente as cidades, os arquitetos
modernos projetaram as interações máquina/cidade, como nos assegura Fábio Duarte (1999).
Também partimos para a construção de nossa investigação da cultura advinda com as
tecnologias digitais que produziu não apenas uma mudança espacial em nossas cidades, com a
“crise das matrizes espaciais”, mas como prevemos também ideológica, social e
especialmente lógica, novas lógicas de pensamento são promovidas e com isso, novas
experimentações projetuais emergiram na segunda metade do século XX.
Os filósofos pós-estruturalistas, neste período, passam a contestar as verdades históricas em
diversos campos do conhecimento, propondo deslocamentos dos sentidos preestabelecidos e
abrindo novas possibilidades, desta forma, nos parece deveras coerente à escolha por tal
referencial teórico para uma construção crítica do fazer arquitetural e da análise das dinâmicas
sociais contemporâneas.
29
Os meios de comunicação de massa difundidos nos anos 60, falando em tecnologias da
informação, fizeram de Marshall Mcluhan o teórico que prognosticou um mundo retribalizado
por meios eletrônicos. Arquitetos atentos aos meios tele-tecnológicos propuseram novas
possibilidades espaciais. Buckminster Füller propôs geodésicas, com o fim de transformar as
características dos relacionamentos entre os homens e ambientes, o grupo Archigram projetou
as cidades instantâneas, que “aportariam e desapareceriam sem deixar rastros físicos, apenas
conexões informacionais”, como nos diz Fábio Duarte (1999).
Um período em que nos deparamos com novas formas de produção industrial, cultural e
social, que por serem revolucionárias e flexíveis no espaço e no tempo, levaram a novas
formas de representar e perceber o mundo (HARVEY, 1989).
Nossa percepção do espaço e do tempo foi alterada com o surgimento da dimensão da
informação e com isso passamos a pensar o espaço construído de maneira diferente, o que
trouxe à arquitetura e ao espaço urbano e a necessidade de mudança.
Segundo Duarte (1996), o universo das tecnologias eletrônicas e digitais se torna o novo
território de projetação e construção de propostas arquitetônicas.
Mas procuraremos outros territórios de projetação, tão cambiantes quanto os digitais, frutos
de uma mesma revolução dos meios de representação e das estruturas do pensamento, mas
que se inscrevem em situações em que “des-limitam”, que abrem espaço/forma, propondo
projetos não acabados em permanente reconstrução, como defende Igor Guatelli (2005), em
constantes processos de virtualização.
O deslocamento no estatuto do saber no qual a sociedade ocidental passou na segunda metade
do século XX refere-se ao seu ingresso na cultura pós- moderna e na era pós- industrial.
O período determinado como pós-moderno como o dissemos, caracteriza-se pelo
deslocamento em diversas áreas do conhecimento, para nós especialmente nos conceitos de
espaço/tempo.
O modo de produção capitalista tem como mote a constate mudança das práticas e processos
de produção, exigindo uma constante atualização de nosso aparato conceitual, influindo na
organização de nosso cotidiano, segundo Harvey (1996).
30
Novos modos de produção, flexíveis espacialmente e temporalmente, em contraposição ao
modo fordista altera nossa percepção e representação a respeito destas dimensões, produzindo
o que Fábio Duarte denominou de “crise das matrizes espaciais”.
Este novo modo de produção trouxe consigo novas configurações urbanas, influenciadas pelo
pensamento pós-moderno, ao produzir impactos em nossa percepção e também no ambiente
construído, em uma população crescentemente urbana, precisamos considerar tais impactos
sobre as práticas sociais. “(...) o ambiente construído constitui em elemento complexo de
experiência urbana que há muito é um cadinho vital para se forjarem novas sensibilidades
culturais”. (HARVEY, 1996)
Práticas sociais não são diretamente determinadas pelo espaço construído, adaptamos usos
contemporâneos a formas antigas. A cidade possui um constante fluxo de usos e processos e
por essa condição que apresenta, já não há como lidar com situações pré-determinadas.
“Percebemos as noções de tempo e espaço na pós- modernidade como comprimidas”
(HARVEY, 1996). Esta condição é resultante de uma crise de representação que se iniciou
com a primeira crise de acumulação capitalista de 1846 e que a partir de então, ocasionou
mudanças culturais. O espaço deixou de ser visto como absoluto e as conexões com terras
distantes passaram a ser comumente percebidas. A ideia de uma rede global em que
acontecimentos em um local podem ter efeitos em outros passou a vigorar, influenciando a
experiência individual e trazendo mudanças para os sistemas de representação existentes
(HARVEY, 1996).
É preciso assegurar que falamos nas mudanças dos sistemas representacionais, porque essas
transformações abriram espaços para novas sensibilidades e novas possibilidades de
projetação.
O avanço técnico influenciou a crise de representação em 1846 com o uso em grande escala
de técnicas de representação mecânica, levando à disseminação de informações, arte e cultura
para parcelas cada vez maiores da população. (HARVEY, 1996). A rede global de
distribuição das informações foi chave para uma percebida diminuição das dimensões
temporais e espaciais; o acesso textual à informação progrediu e permitiu que artefatos cada
vez mais complexos pudessem ser distribuídos globalmente, transformando as residências em
nódulos terminais de uma série de serviços, produtos e artigos informacionais.
31
As crises de representação parecem ser próprias ao modo funcional do capitalismo, sendo
sempre precedidas ou contemporâneas a uma crise de superacumulação (HARVEY, 1996). As
pressões por inovação, a constante procura por novos mercados e a flexibilidade do capital no
espaço e no tempo estão constantemente desafiando o nosso aparato perceptivo. As crises de
representação do espaço e do tempo nos levam a conceber novas maneiras de pensar e sentir.
(HARVEY, 1996)
“O estatuto atual do espaço e do tempo coloca em questão as próprias dimensões materiais,
desafiando as noções de próximo e distante” (VIRILIO, 1993). Esta crise das dimensões afeta
como representamos e percebemos o mundo, colocando em conflito o espaço material
percebido, o que nos traz uma questão importante, já que a arquitetura é um instrumento de
medida, como nos diz Paul Virilio (1993).
Bauman (2001) apresenta a fluidez como uma metáfora para a contemporaneidade. “Os
fluidos, por assim dizer, não fixam o espaço e nem prendem o tempo. Enquanto os sólidos
têm dimensões claras, mas neutralizam o impacto e, por tanto, diminuem a significação do
tempo”. Associada a “leveza” à mobilidade e a inconstância, no pensamento de Bauman é o
que leva à construção de “liquidez”, enquanto figura de linguagem à pós-modernidade, “(...)
sabemos pela prática que quanto mais leves viajamos, com maior facilidade e rapidez nos
movemos. Essas são razões para considerar “fluidez” ou “liquidez” como metáforas
adequadas quando queremos captar a natureza da presente fase, nova de muitas maneiras na
história da modernidade”.
Ao mesmo tempo questiona se a modernidade não foi fluida desde sua concepção, “(...) Se o
“espírito” era “moderno”, ele o era na medida em que estava determinado que a realidade
deveria ser emancipada da “mão morta” de sua própria história- e isso só poderia ser feito
derretendo os sólidos ( isto é, por definição, dissolvendo o que quer que persistisse no tempo e
fosse ifenso a sua passagem ou imune a seu fluxo)”. (BAUMAN, 2001)
Com esta citação de Bauman (2001), buscamos referendar a escritura, que nos assegura que as
mudanças nos novos meios de representação nos trouxeram, ou seja, modificaram nosso
estatuto conceitual e perceptivo, afetaram a busca do saber, condensaram as dimensões de
espaço/tempo e nos levaram a conceber novas maneiras de pensar e sentir, deslocamentos
próprios do desenvolvimento do capitalismo, mas que neste momento colocam em conflito o
espaço material percebido, o que nos traz a questão da arquitetura enquanto inscrição
32
material, que ao contrário não perde sua força projetual, pois possui a potencialidade de
desajustar o sentido dado ao ressignificar o objeto.
E ao contrário do que defende Paul Virilio (1993), a virtualização, dinâmica própria da
filosofia deleuziana, não é uma desrealização, mas “criação de pensamento que procede por
virtualização” (ALLIEZ, 1996) e um dos vetores de criação de realidade. Os estudos
monográficos de Deleuze, sobre o pensamento de Hume, Bergson, Nietzsche, Kant, Espinosa,
Leibniz, propõem uma gênese de sua filosofia, que não tem outra questão que não a do
pensamento, uma filosofia do acontecimento. Portanto, como pretende Paul Virilio (1993), a
virtualização não se contenta em aniquilar o tempo ou o espaço, ela inventa qualitativamente
novas espacialidades.
Resta-nos buscar estratégias de reativação de um rastro urbano, um vazio, um interstício de
algo que construa dinâmicas capazes de provocar reações.
Portanto, o objetivo da pesquisa, que se deixe claro, não se atém à digitalização da
informação, à linguagem Virtual, mas à Virtualização da Linguagem tal quais os pressupostos
definidos em Deleuze.
“O Design Virtual (a arquitetura se insere neste conceito) instaura a Virtualização da
Linguagem- diferença e repetição, duração e precisão- e suas relações se estendem a
fronteiras de todas as linguagens, transpassando a própria semiosfera.” (ROSSI, 2003).
“A virtualização constitui justamente a essência, ou a ponta fina da mutação em curso. (...)
Ela se apresenta como o movimento mesmo do “devir-outro”. (LÉVY, 1996)
Trata-se de transformações de um modo de ser em outro, como já mencionamos neste
trabalho, assim como o processo de desterritorialização e outros fenômenos espaço-temporais
e seguindo os pressupostos teóricos de Gilles Deleuze, não se limita ao território das
tecnologias eletrônicas e digitais, mas constitui uma filosofia do acontecimento, “quanto à
prática e à realidade dessa filosofia que não tem de resto outra questão que não a do
pensamento e das imagens do pensamento que as animam”. (ALLIEZ, 1996)
“A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus, força,
potência”. (LÉVY, 1996)
O virtual é um complexo problemático, um complexo de situações que acompanha um
acontecimento e exige uma resolução, reorganiza uma problemática que receberá diversas
33
interpretações e será chamada de processo de atualização. “Por outro lado, o virtual constitui a
entidade: as virtualidades inerentes a um ser, sua problemática, o nó de tensões, de coerções e
de projetos que o animam , as questões que o movem, são uma parte essencial de sua
determinação”. (LÉVY, 1996)
Já a atualização é criação de uma forma a partir de uma configuração dinâmica de forças
como nos diz Pierre Lévy (1996), é uma produção de qualidades novas e transformação de
ideias, um devir que alimenta de volta o virtual. (LÉVY, 1996)
Em arquitetura, a atualização de um projeto em situação de utilização desencadeia conflitos,
desbloqueia situações, desqualifica certas competências, instaura uma nova dinâmica,
micropolíticas urbanas se formam e se desfazem e instauram uma condição frágil para o
surgimento da alteridade, como concebe Deleuze, configura o movimento do devir-outro,
enfim a atualização responde ao virtual, à problematização.
Sobre a filosofia Deleuziana, como diria Roberto Machado citado por Éric Alliez, “Mais do
que anunciar um novo pensamento, ela é uma suma de pensamentos que relaciona por
expressarem, em maior ou menor grau a diferença”.
A filosofia Deleuziana é por excelência concepção do Virtual, “que em nada se assemelha a
pura e simples ausência de existência”, como diz Pierre Lévy.
Porém em como as situações urbanas que proporcionamos com nossos projetos, que serão
aqui examinadas, a adição, o suplemento, deforma o existente e propicia que uma situação ou
objeto potencializado em seu ser, adquira a possibilidade de um vir a ser, fazendo com que
venha a fazer parte de uma nova condição espaço/ temporal. O além da obra, o além da
existência que se compõem com o que já pertencia ao território e posiciona-se com o outro,
trazendo a emergência da alteridade, hibridizada, fundida a algo além dela.
Foulcault diz que Deleuze opera seu pensamento ao dispor filosofias em devir, constitui um
Pensamento- Acontecimento, a criação de um pensamento que procede por virtualização, um
movimento de “problematização” da história da filosofia sob o nome de desterritorialização,
como indica Pierre Lévy,” se virtualizar consiste antes de tudo em transformar a atualidade
inicial em caso particular de uma problemática mais geral. (...) Isso fazendo, a virtualização
fluidifica as distinções instituídas, aumenta os graus de liberdade, cava um vazio motor”.
(LÉVY, 1996)
34
Como se Deleuze levasse o pensamento à potência de “flutuantes nós de acontecimentos em
interface recíproca e reciprocamente envolvidos num único e mesmo plano de imanência. (...)
criação problematizante que coincide com a emergência do novo, que não tem por sujeito
senão o virtual, cujo ato não é senão um complemento ou um produto”. (ALLIEZ, 1996)
O plano de imanência funciona como um crivo no pensamento, um movimento infinito que
vem a nós como algo pensável, não sendo algo transcendental, pois é justamente o contrário,
pois não precede o que o preenche, mas se constitui como algo problematizável. Em nosso
caso, enquanto arquitetos e urbanistas o plano de imanência funcionaria como a situação com
a qual nos deparamos e de onde extraímos questões responsáveis por uma experiência
reflexiva e de elaboração conceitual além do senso comum para uma ação de projetação, por
exemplo.
Se realização é a ocorrência de um estado pré-definido, a atualização é a solução exigida por
um complexo problemático, em nosso caso, resposta à justaposição de dissociados territórios,
forças disjuntivas e permanentes tensões entre situações. Já a virtualização é a dinâmica do
movimento, o processo que constitui os movimentos de territorialização, desterritorialização e
reterritorialização presentes no plano de imanência.
“A virtualização pode ser definida como o movimento inverso da
atualização. Consiste em uma passagem do atual ao virtual, em uma
“elevação à potência” da entidade considerada. A virtualização não é uma
desrealização (a transformação de uma realidade num conjunto de
possíveis), mas uma mutação de identidade, um deslocamento do centro de
gravidade ontológico do objeto considerado: em vez de se definir
principalmente por sua atualidade (uma “solução”), a entidade passa a
encontrar sua consistência essencial num campo problemático. Virtualizar
uma entidade qualquer consiste em descobrir uma questão geral à qual ela se
relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa interrogação e em
redefinir a atualidade de partida como resposta a uma questão particular”.
(LÉVY, 1996)
Se tomarmos o projeto de Zaha Hadid em Viena, inicialmente destinado à habitação social,
sobre um viaduto de Otto Wagner de um ramal férreo desativado, transformado em ciclovia
que se prolonga ao longo de um canal do rio Danúbio que corta a cidade e a estação de metrô
spittelau, nos deparamos com o processo de virtualização, uma atualidade redefinida para
responder a uma questão particular, sobre uma quase-ausência, o viaduto, Hadid insere
inscrições que o ressignificam e o reforçam, entretanto, restituído em potência conectora
territorial, o ramal férreo re-significado transforma-se em ciclovia, as três linhas
infraestruturais urbanas, as três linhas de força, ou seja, viaduto por onde passa a ciclovia, o
35
metrô e o rio, passam a fazer parte de uma nova condição espaço-temporal, como o disse
Lévy, mutação de identidade, não se trata mais do viaduto apenas ou do projeto de habitação,
mas da hibridização, superação do que parece ser próprio de algo, deslocamento do objeto que
ao se definir por sua atualidade(solução), encontra a sua consistência num campo
problemático, é sobre o território do deslocamento, da passagem e ligação,que anuncia-se um
território de articulação e permanência.
A virtualização é um dos principais vetores de criação de realidade, porém o virtual, com
muita frequência “não está presente”, segundo Pierre Lévy (1996).
Seus elementos são nômades, o viaduto que se torna ciclovia, contém o metrô, desloca, ao
mesmo tempo adiciona o lugar da permanência, o abrigar, habitar, mas também o local da
passagem possibilita a articulação entre situações, o fortalecimento da linha conectora que em
sua existência reduzida localmente gera urbanidade ao conectar as duas pontas, como nos diz
Guatelli, uma organização que se atualiza numa pluralidade de versões.
Uma condição incessante em direção à alteridade, rumo aos deslocamentos que se traduzem
em novas funções, em novas possibilidades espaciais, são apresentadas nestas experiências de
projetação no qual encontramos sua analogia em conceitos como o de hospitalidade de
Derrida.
Derrida nos diz: “A hospitalidade precede a propriedade” e escreve que em última instância o
que permanece no aparelho psíquico é a pulsão de propriedade, para além do princípio de
prazer ou do princípio de realidade, representando um ideal de busca de estabilidade,
“retenção de energia em um reservatório que estruturaria o sujeito, dando-lhe identidade e
preservando-o da recaída ou retorno ao estado inercial, característico do inorgânico, estado
equivalente à morte”. (CARVALHO, 2005)
Consciência e propriedade se equivalem na função de proteger o aparelho psíquico dos
estímulos vindos do exterior.
O suplemento desconstrutor para o movimento que lança o sujeito para a constituição de seu
domínio interno é o conceito de exapropriação, duplo movimento da subjetividade em direção
ao sentido na busca por apropriá-lo, mas ao mesmo tempo desejando que continue
estrangeiro, que permanece onde só há alteridade.
36
“Se houvesse a possibilidade de reapropriação total do sentido,
exaustivamente e sem vestígio, não haveria sentido. Por isso há esse
movimento de apropriação finita, passageira e precária, definindo-se como
exapropriação”. (CARVALHO, 2005)
Derrida realiza a síntese do paradoxo, ao aproximar o prefixo “ex” da uma base que indica o
movimento de delimitação, algo se destitui no momento em que se instaura e ao mesmo
tempo constitui a formulação da convivência com a angústia, de onde surge a estranheza.
“A experiência com o outro é da ordem de uma ultrapassagem do conhecimento pelo logos.
Ou se está no logos ou se está na experiência: A experiência do outro (do infinito) é
irredutível, ela é, portanto a experiência por excelência. (...) Nada pode, portanto abalar tão
profundamente o logos- grego- a filosofia- quanto essa irrupção do totalmente outro”.
(CARVALHO, 2005)
Tudo se constrói com a constatação de que há uma separação infinita como condição inicial
para a hospitalidade. O sujeito encontra-se diante da escolha que o precedeu, implicando nela
a capacidade de acolhimento. Ter aceitado o sim do outro, é a condição para a experiência do
a-dieu, jogo de expressão que Derrida estabelece com o adeus.
“O a-dieu implica a experiência da invocação ao infinito e a busca do que
não está mais outrora, não está mais aqui, mas ali, mais adiante, de uma
extensão da subjetividade na direção de uma aproximação com esse rosto
que se anuncia como chegante, mesmo que seja disjunto de toda simetria do
contato e de toda reciprocidade que existe (...). A experiência da
aproximação implica a interrupção da simetria e da comensuralidade”.
(CARVALHO, 2005)
Derrida disse que um mínimo de idealidade é necessário para preservar uma identidade, mas
para prosseguir desestabilizando, essa é uma condição. Paragens do eu, que se dirigem ao que
advém e que pode chegar pela fronteira. O acolhedor é acolhido pela visitação do outro. Sua
propriedade se despossui porque se torna hóspede de uma visitação. Experiência de passagem
para a experiência do sujeito.
Alguns autores como Michel Serres levantam questões com relação à filosofia heideggeriana
do “ser-aí”, do alemão filosófico clássico, Dasein, que significa existência, no que diz respeito
à presença na era da informatização e das redes digitais, embora etimologicamente a palavra
“existir vem precisamente do latim sistere, estar colocado e do prefixo ex, fora de. Existir é
estar presente ou abandonar uma presença? Dasein ou existência? Tudo se passa como se o
alemão sublinhasse a atualização (a solução) e o latim a virtualização”. (LÉVY, 1996)
37
A virtualização faz com que um objeto ou situação se torne “não presente”, se
desterritorializam, momentaneamente separam-se do espaço físico ou geográfico para o
campo de problematizações, porém não são totalmente independentes do espaço/ tempo de
referência, uma vez que devem se inserir em suportes físicos e se atualizar aqui ou alhures, ela
inventa velocidades qualitativamente novas, espaço/ tempo mutantes.
O viaduto de Otto Wagner, momentaneamente se desterritorializa ao abandonar o espaço
geográfico para ocupar o espaço das problematizações e atualiza-se ao abrigar o conjunto
habitacional, desabilita sua função de linha conectora e de deslocamento, diríamos que
assume um estado de não presença para inscrever o território de permanência, onde se
reterritorializa primeiramente com uma nova qualidade e novamente se reterritorializa na
ciclovia e no metrô como linha de deslocamento.
Além da desterritorialização, outro caráter da virtualização, a passagem do interior ao
exterior, e vice-versa, o efeito Moebius, declina-se em vários registros que produzem reações
na arquitetura, das relações entre público e privado, subjetivo e objetivo, mapa e território.
A subjetividade e a significação abrem novos meios de interação e possibilitam uma enorme
quantidade de tipos de espacialidade e duração.
Por exemplo, um novo tipo de transporte modifica o sistema de proximidades, ou seja, o
espaço pertinente para as comunidades humanas. Quando se constrói uma rede ferroviária
aproximam-se algumas cidades conectadas pelos trilhos, outras não conectadas são afastadas,
criam-se vários sistemas de proximidade e espaços práticos coexistem.
O aumento da comunicação e generalização dos transportes rápidos participa do mesmo
movimento de virtualização da sociedade, da “mesma tensão em sair da presença”. (LÉVY,
1996). A revolução dos transportes metamorfoseou o espaço. Cada novo agenciamento,
acrescenta um espaço/tempo, uma cartografia especial em que as durações se interferem e se
respondem.
A virtualização, passagem à problemática, deslocamento do ser para a questão, é algo que
interroga a identidade clássica. Por isso é sempre heterogênea, devir outro, processo de
acolhimento da alteridade.
38
1.2. Cartografias do Desejo
Procuramos considerar novas práticas semióticas advindas da escrita e do projeto
arquitetônico, forjadas na abertura, em relações de proxemia, proximidade e fusão e
diastemia, relações baseadas em contaminações, produzindo hibridizações.
O conhecimento da etimologia da palavra design, projeto, portanto arquitetura é importante
para deslocarmos os sentidos preestabelecidos e abrirmos potencialidades novas.
A etimologia nos informa acerca do simbolismo e evolução de uma palavra, nos dando o
referencial sobre o discurso ao qual se vincula como diz Michel Foucault, compreendendo
assim, mais um paradigma aos já existentes.
“A primeira coisa que nos vem à mente quando pensamos na palavra Design, seria projeto,
como uma forma de estabelecer alguma diferença entre Arte e Design, questão amplamente
discutida ao longo do século XX.” (ROSSI, 2003).
Quando nos referimos a uma palavra diversos conceitos encontram-se conectados.
“Encontramos como noção de drawing o ato ou o instante do desenho, o
processo de decidibilidade por alguma coisa dentre muitas escolhas. A arte
ou técnica de representação de um objeto ou linhas (outilining) de uma
figura, plano, ou esboço, enquanto draft, do inglês medievo, draght, do
Inglês antigo, Dragan, o ato de desenhar a trama e, além disso, a quantidade
“de fios” do desenho, esboços preliminares, esquemas, e o “drawing out”.
Design, do Francês medievo designer, do Latim medieval designare ( de+
signare) significa diagrama, criação, invenção, constructo, forma, “frame”,
intenção, significação, invenção, propósito, indício, sinal, achar meios para,
projeto. Por sua vez, a palavra projeto (Project) partícula modificada do
francês medieval projeter, do inglês antigo porjeter (do latim porro, do
Grego pro, que significa para frente, adiante+ jeter, atirar, lançar, arremessar,
do latim projectus. Enfim, a correlação da palavra design ao étimo projeto é
muito mais próxima e concernente da palavra design, deriva-se a palavra
desígnio (do Português, intenção, projeto) e desire (do Francês medievo
desirer, do latim desiderare, de + sider- , sidus (heavenly body), desejo.”
(ROSSI, 2003)
Portanto, a ideia de projeto encontra-se no que a mente produz e lança, falamos aqui sobre o
por vir, procurando desta forma, não comprometer com nossas operações em favor de uma
linearidade do processo, ao buscarmos erroneamente similares como base para o lançamento
de um projeto recaindo sobre o mesmo paradigma com a falsa impressão que criamos
linguagem, quando o caminho ainda é o mesmo, já que a qualidade destas intervenções não é
de âmbito estrutural, operamos com os mesmos paradigmas, gerando, falsamente, novos
sintagmas.
39
A noção de projeto como projectil lança o desafio de pensá-los numa sociedade em que
caminham rumo aos vários passados firmados. Macluhan diz que, “o passado foi embora
naquela direção. Quando confrontados com uma situação inteiramente nova, tendemos a ligarnos aos objetos ao sabor do passado mais recente. Olhamos o presente através de um espelho
retrovisor. Caminhamos de costas em direção ao futuro.” (apud ROSSI, 2003).
1.2.1 A Aldeia Global e as Experimentações Projetuais na Segunda Metade do Século
XX
A concepção de mundo que temos para MacLuhan está ligada ao uso e aprimoramento da
tecnologia sobre nossas formas de conhecimento, transformam nossas percepções, tendo em
um primeiro momento uma ordenação lógica linear, da ordenação de fatos e eventos, com isso
teríamos perdido a capacidade de conexões criativas de modo a abrangermos aspectos além da
predominância de nosso campo visual. Nossa compreensão do mundo se daria pela divisão e
compartimentalização de eventos e percepções, entretanto, cada evento poderia nos provocar
diferentemente de acordo com os estímulos que dariam aos nossos órgãos sensoriais.
Ainda nos diz que a palavra impressa além de privilegiar um de nossos sentidos, a visão, foi
responsável pelo fortalecimento das identidades nacionais, logo acentuado pela criação da
máquina a vapor e das malhas ferroviárias, a palavra escrita ganha um meio de transporte
territorial para suportar sua difusão. MacLuhan cita que os investimentos dos jornais foram
responsáveis em grande parte pela construção da malha ferroviária inglesa. O binômio escrita,
estrada de ferro, foi responsável pelo fortalecimento dos Estados no século XVIII.
Com o surgimento da tecnologia radiofônica, as cidades ganhavam a possibilidade de que
suas características ímpares, a diferenciação local de grupos fosse reacendida ao contrário das
homogeneizações nacionalizantes, adquiriam dimensões intercontinentais e recebiam
influências, inaugurando a dimensão elétrica das cidades e proporcionando uma
multiplicidade informacional.
Para Fábio Duarte, o revolucionário meio de informação que transformaria definitivamente as
concepções espaciais, políticas e temporais no mundo, seria a primeira transmissão televisiva.
A tão citada frase o “meio é a mensagem”, sintetiza o pensamento de MacLuhan, para quem o
meio é um conjunto complexo de eventos que influencia e age sobre populações inteiras. O
caráter tecnológico dos meios possui maior força do que as informações veiculadas por eles.
40
Para ele a “aldeia global” seria a ligação informacional do mundo através de redes de circuitos
elétricos, constituída por meios de informação à distância, um mundo fragmentado que daria
lugar a um universo orgânico onde todos os eventos se relacionariam tecnologicamente.
A dinâmica lógica dos novos meios de comunicação redireciona as novas propostas
arquitetônicas.
O universo informacional descolado do territorial interferia diretamente nas cidades,
referências culturais diversas homogeneizavam estruturas urbanas aptas às novas transmissões
de informação que ordenam o mundo.
Apontamos algumas propostas e projetos de intervenções arquitetônicas e urbanísticas a partir
de uma mudança de paradigmas proveniente do uso de novas tecnologias em meados do
século XX e que modificaram nossas formas de conhecimento, para chegarmos até as ideias
de Gilles Deleuze, Félix Guattari e Jacques Derrida e as interlocuções que construíram entre
seu pensamento e os recursos que abriram para um ato de projetação crítica, através do
deslocamento dos sentidos preestabelecidos, das verdades históricas, junto às alterações dos
sistemas de produção, que implicaram em revisões das noções de projeto, processo e produto
de objetos e signos.
Algumas destas reflexões e propostas estão ligadas a amplificação dos territórios da
arquitetura que irão desde a força do objeto arquitetônico inscrita nas estratégias espaciais
esboçadas, até a criação de ambientes que dependem cada vez menos de suportes físicos e se
insere topologicamente no mundo todo entre os nós e redes digitais que o englobam e não se
encontra em lugar nenhum, talvez aqui ou ali, mediada por uma máquina.
A arquitetura na era digital é a extração de formas apresentadas pelas hipóteses criadas nas
interfaces homem/ máquina/ espaço.
Mas ambas têm correspondências com as questões de Jacques Derrida e de Gilles Deleuze.
Fábio Duarte cita que a partir dos anos 60, o arquiteto Kisho Kurokawa, propõe no Japão o
movimento metabolista, baseando o planejamento das cidades em crescimentos orgânicos,
espaciais e temporais. De acordo com atividades e expansões das estruturas urbanas, adquiria
outro papel numa superestutura urbana, metáfora arquitetônica para a interligação global dos
meios de comunicação. Um entrelaçamento de sistemas informacionais que configura o
41
universo onde se inseria a arquitetura, os módulos trocando informações, comporiam as novas
paisagens das cidades.
Projetos arquitetônicos e urbanos não se definiam em áreas métricas, mas em processo, os
ciclos temporais e espaciais em constante evolução urbana global, eram informacionalmente
interpenetrados estruturando-se via meios globais de informação, com módulos espaciais
ligados e definidos pelo tempo.
Por exemplo, uma casa teria um módulo de um ano e os espaços sociais, módulos de 25 a 625
anos, entretanto aos metabolistas escapou que os avanços tecnológicos , quando consideramos
hoje, por exemplo, as redes digitais de informação, onde as interações se dão em tempo real,
sem consideração aos espaços geográficos e métricos, ao pensarmos em módulos metabolistas
teríamos várias cósmopoles, definida em 100.000 km em relação ao seu desenvolvimento
espacial.
Kurokawa considerava as cápsulas como a revolta individual à massificação urbana.
Estas ideias arquitetônicas são regidas pelas teletecnologias, onde fatos locais reconfiguram
aspectos globais, como nos diz Fábio Duarte e prossegue com a pesquisa de outras
experiências.
Para o arquiteto americano Richard Buckminster Füller, o que era fundamental em suas
considerações eram os aspectos organizacionais sinergéticos dos elementos físicos e
energéticos do universo.
O primeiro ponto de mudança em relação á produção artística é o deslocamento do objeto
para o processo, que entendem o universo como elementos em operação, considerando a
inclusão ao invés da exclusão.
“É nesse sentido que se baseia a ideia- chave de Füller, a sinergia. Em um
lugar da compartimentalização por ele denunciada deveríamos estar atentos
às passagens do sistema global do universo, que seriam circularmente
interligadas e ordenadas topologicamente numa estrutura geodésicareferente à forma da Terra, mas estruturada no elemento mínimo da
ordenação da natureza, o tetraedro. A topologia como a definição de padrões
de “interligação estrutural das constelações de eventos”. (Füller, 1985,
apud Duarte, 1999)
Füller propõe que pensássemos também na poluição informacional, armazenada em nossos
cérebros ou incorporada ao ambiente a fim de minimizá-las para maximizar as
potencialidades dos meios, pensamentos e territórios.
42
“Considera que a palavra sinergia é a única que dá o sentido do
“comportamento dos sistemas totais não previstos pelos comportamentos
separadamente observados de quaisquer das partes isoladas do sistema ou de
quaisquer subconjuntos das partes dos sistemas.” (FÜLLER, 1985, apud,
DUARTE, 1999)
Essa concepção de entendimento e ação no mundo que Füller trabalha em seus projetos
arquitetônicos.
Os estudos de Füller para a construção de sua geodésica partiram de trabalhos com formas
triangulares e tetraédricas, que combinadas formavam esferas, com esses projetos encontrou a
forma sintética de suas concepções sinergéticas de compreensão e ação no mundo.
O projeto mais significativo da equipe de Füller foi a geodésica construída para o Pavilhão
Americano na Expo 67 em Montreal, assim que inaugurada a feira, caractrizou-se como a
transformação arquitetônica contemporânea.
Seu pensamento sinergético discorria sobre a totalidade que só seria compreendida se
levássemos em consideração a relação entre elementos e como o conjunto pode transformar a
interação com o ambiente. Füller pretendia mudar o ambiente, o que possibilitaria o
surgimento de um novo homem integrado com seu ambiente, global.
O desenvolvimento de tecnologias de informação deu aos arquitetos uma visão global de seu
território de ação e produziu uma estética própria.
À princípio o grupo Archigram com suas ideias buscava criar uma “modesta moléstia”
(DUARTE, 1999), sua constituição se deu ao se aproximarem para discutir arquitetura
contemporânea,descrito assim pelo próprio Peter Cook.
“Resolveram criar uma revista, nos anos 60. O nome veio da ideia da
urgência das informações: mais simples e rápido que um jornal, como um
“aerograma” ou “telegrama”: ARCHI (tecture) GRAM.” (DUARTE,
1999).
Souberam traduzir seus projetos em linguagem gráfica contemporânea, com bricolagens
retroalimentando o meio, a linguagem usada e as mensagens, buscavam discutir a arquitetura
naquele momento.
43
“O arquiteto Hans Hollein, em texto sobre o impacto do Archigram para a
arquitetura na época, escreve que o estilo internacional moldado pelos
modernistas estava estagnado, que seus dogmas tinham sido formulados
havia muito tempo e não se adequavam à multiplicidade e variabilidade das
transformações que ocorriam no mundo- e claro, nas cidades. Era hora de
discutir ideias em vez de objetos, “Konzeptie” ao invés de “Rezeptie”.
(HOLLEN, 1989, apud DUARTE, 1999)
O pensamento sobre as cidades deveria se dar com o rompimento de barreiras rígidas e
imóveis, utilizaram a linguagem dos HQs com o intuito de contruir um novo olhar e novas
concepções sobre o meio urbano, já apontavam para diferenças nas necessidades e objetivos
que deveriam ser vistos globalmente de maneira quase individual, pois os homens que
moviam as cidades o fariam por ideais próprios aos seu microcosmo, buscou-se a ruptura com
a estandardização, um dos paradigmas do modernismo.
A ruptura com a ideia de standard na sociedade de massas identificava o Archigram com
discussões de Le Corbusier e Jean Prouvé, como com Füller e os metabolistas japoneses.
Living City foi o primeiro projeto que reuniu todo o grupo em uma exposição onde
tridimensionalizaram pela primeira vez suas reflexões, de forma imagética e espacial sobre a
multiplicidade, maleabilidade e efemeridade dos ambientes urbanos, desintegrando-se após o
evento e produzindo uma corrente de informações que contagiavam os próprios trabalhos do
grupo e de outros arquitetos, coerente com as discussões e postura que apresentavam.
O Plug- in- City, trabalho de Peter Cook, ligado ao Plug-in-Capsule de Chalk e com a ideia
dos edifícios expandíveis. Investigava o que aconteceria todo o ambiente urbano pudesse ser
programado e estruturado para que estivesse em constantes mutações arquitetônicas.
No projeto Instant City o grupo trabalhou com a escala urbana, uma metrópole dinâmica,
conectada e criando uma rede de informações que cobririam uma malha de cidades que se
conectariam no momento em que o evento ocorresse.
Havia uma preocupação do grupo em utilizar os conhecimentos tecnológicos existentes e
aplicá-los às situações reais neste projeto, mapearam as atividades e utilidades urbanas
existentes nesses lugares de forma que pudessem ser integrados ao sistema informacional
urbano a ser criado, com o intuito de ser um sistema complementar, articulador e dinamizador
de um processo urbano.
Fábio Duarte o aponta como uma metametrópole: a metalinguagem da metrópole
contemporânea.
44
Ao final, com o Instant City, o Archigram chegou quase à imaterialidade, transformavam-se
no design de suas ideias, de estruturas de informação.
Os meios tecnológicos, cada vez mais presentes em nossas cidades, não podem, ser
desconsiderados por nós, arquitetos e construtores em nosso ambiente urbano, já que apontam
novas possibilidades.
A cidade de Groningen, na Holanda, vem sendo local de experimentações de projetos urbanos
e arquitetônicos.
Daniel Libeskind reuniu profissionais de diversas áreas que trabalham ideias de acessos e
limites nas cidades contemporâneas e o projeto das Video Folies, que se constituiu na
construção de pavilhões onde as pessoas usufruíssem da exibição de vídeos e que os edifícios
fossem objeto de reflexões sobre a lógica própria das imagens assistidas.
Em 1990, como parte da exposição deconstrutivista realizada por Philiph Johnson no MoMa
em Nova York, Peter Einsenman, Rem Koolhaas, Zaha Hadid, Coop Himmelblau e Bernard
Tschumi, se depararam com a proposta de discutir a imaterialidade das imagens eletrônicas
concretizando-se na materialidade arquitetônica, tendo em vista novas concepções estéticas
das imagens, os organizadores queriam discutir o contexto dessa arte em espaços públicos,
questionaram se os vídeos trariam uma reconcepção do espaço urbano.
Do século XIX para o século XX, os meios de produção e representação tiveram papel
transformador na arquitetura. Os sistemas de transportes trouxeram a ideia de movimento e a
intenção de que a obra fosse apreendida pelo deslocamento. Assim, era necessária a
determinação de percursos, imagens em movimento.
Bernard Tschumi descreve seu projeto “Les Folies”, para o Parque de La Villette dizendo:
“Em suas disrupção e disjunção, em suas características de fragmentação e
dissociação, as circunstâncias culturais de hoje sugerem a necessidade de
descartar categorias estabelecidas de significado e contextualismo histórico
(...) o projeto rejeita o contexto, encorajando a intertextualidade”.
(TSCHUMI, 1994 apud GUATELLI, 2012).
O percurso entre os prédios existentes passa a ser mais importante que os edifícios, os
intervalos preenchidos pela movimentação de pessoas em direção à cidade da Música, Ciência
e Tecnologia, do Zenith e do Grande Halle, como diz Gatelli (2012).
45
Sua estratégia de sobreposição de linhas e pontos, ou seja, percursos e folies, são distribuídos
em uma matriz cartesiana.
Com a intenção de desestabilizar, os pares conceituais utilizados na arquitetura, forma/função,
programa/contexto, programa/significado, síntese/harmonia, como defende Guatelli (2012),
usa estratégias como sobreposição e fragmentação, “(o que implica que em nenhum momento
uma parte pode tornar-se uma síntese do todo ou uma totalidade autossuficiente),
intencionando a rejeição da ideia de síntese em favor da ideia de dissociação e análise
disjuntiva do edificado, sobretudo quanto aos binômios forma-uso, forma-função, signosignificado.” (GUATELLI, 2012).
Seu objeto é pulverizado pelo parque, as Folies podem abrigar e significar os mais diversos
usos, para que reproduzam a dinâmica urbana.
“Tschumi desloca, assim, a questão da arquitetura, naquele momento: no
lugar de ambientes grandiosos e que têm a presença formal como principal
questão, propõe uma arquitetura de espaçamentos programáticos de
programas intercambiáveis no espaço e no tempo, onde as ações imprevistas
que ali ocorrem e ocorreriam incessantemente seriam camadas de
significações por vir de um território esvaziado quanto aos seus significados
e sentidos apriorísticos”. (GUATELLI, 2012)
Esses pontos de intensidade que são as Folies, representam articulações entre os espaços e as
edificações, são responsáveis pelos acontecimentos não previstos.
Para a dispersão da multidão pelo parque que se concentrava nos edifícios, a estratégia seria a
interação dessa multidão dispersa, com o intuito de desestratificar o espaço e o povoar mais
uniformemente, ocorre o desmantelamento de qualquer sentido hierárquico ou de qualquer
tentativa de construção de um discurso totalizador.
“Esse aparente paradoxo, a dissociação tomando lugar em um espaço de
reagrupamento, faz parte da estratégia para a desestabilização desses pares
de conceito. Para Tschumi, o projeto atacou diretamente a relação de causa e
efeito, forma e função, forma e programa, substituindo essas oposições por
novos conceitos de contiguidade e sobreposições. A proximidade das sempre
programadas e reprogramadas Folies dos grandes equipamentos
promovedores de multidão seria a possibilidade de geração de tensões,
fundamental para o advento do inesperado”. (GUATELLI, 2012)
Derrida desenvolve a superposição de textos que se interpenetram e se articulam pela
argumentação, com isso objetiva a desconstrução, a abertura para os questionamentos e o
pensamento, criando condições do porvir.
46
As Folies, concebidas como infraestruturas, “construções abertas e sem usos predefinidos”
(GUATELLI, 2012) são potencializadoras de acontecimentos por sua própria condição, a
relação entre os edifícios do parque seria delicado sem as Folies, “o deslocamento é
tensionado passa a ser constantemente interrompido por “acasos”, sobretudo em um nível tátil
sensorial, por esses objetos de condição indefinida, imprevisível, que se oferecem as mais
diversas apropriações e conjecturas”. (GUATELLI, 2012)
Peter Einsenman projetou para Groningen a Video Folie, “The Pattern of Electron Beam, e
mesmo antes da exposição deconstrutivista para o MoMa em 1988, já possuía fortes contatos
com a filosofia de Jacques Derrida, e sua relação com as discussões entre arquitetura e as
tecnologias contemporâneas da imagem foram motivo de exposição em 1985, intitulada Les
Immatériaux, duas propostas se destacam, “Visitas Simuladas”, um ônibus onde as janelas
eram monitores de vídeo e “Profundidade Simulada”, conjunto de três hologramas,
demonstram um questionamento do arquiteto frente às imagens contemporâneas de
representação.
O projeto que desenvolveu para o concurso para o Parque La Villette, denominado Choral,
assumidamente é uma referência aos conceitos desenvolvidos pela filosofia de Derrida em seu
livro Khôra (1995), onde discute as noções de Timeu de Platão sobre o receptáculo de
qualidades cambiantes, que recebe inesgotáveis interpretações, toma-lhes as formas e as
esvanece sem vestígios, khôra não é isso nem aquilo, mas ao mesmo tempo ambos.
“Não promete nem ameaça ninguém. Permanece estrangeiro à pessoa,
nomeando somente a iminência, e ainda uma iminência estrangeira ao mito,
ao tempo e à história de toda promessa e de todas as ameaças possíveis”.
(DERRIDA, 1995)
Com o conceito de dobras de Deleuze, Einsenman construiu novas relações entre opostos
clássicos, como horizontal/vertical, fundo/figura, interior/exterior.
De forma sintética, para Deleuze as dobras são construções labirínticas múltiplas. Não são
constituições de volumes e planos tendo como paradigmas os eixos x, y e z, podem existir
pontos x, y, z, dispersos em um corpo elástico dividido em fragmentos menores, redivididos,
compondo um espaço topológico, sem referências ontológicas e eixos geométricos, não
formam uma geometria estática, mas um fluxo espacial, temporal e material.
47
No projeto de Einsenmam para o Centro de Artes da Emory University, foram aplicados
princípios harmônicos da música para redesenhar condições topológicas, criando
deformações/ transformações no edifício.
Sua VideoFolie está inserida em seu trabalho que partilha do conceito das “dobras”, elétrons
atravessam a tela da esquerda para a direita, compondo a imagem.
“O projeto é baseado no zigue-zague entre os movimentos horizontais e
verticais, e o visitante do pavilhão segue esses percursos como que
assumindo o papel dos elétrons, nunca com um ponto estático de orientação,
mas aludindo aos movimentos da eletricidade para formar imagens de
vídeo”. (DUARTE, 1999)
“Khôra nos chega, e como o nome. E quando um nome vem, rapidamente diz mais que o
nome, o outro nome e o outro, simplesmente, do qual anuncia justamente a irrupção”
(DERRIDA, 1995). Khôra não é isso ou aquilo, mas pode anunciar ou apresentar isso e
aquilo.
Lugar, localização ou território, Khôra não propõe um fechamento de significados, mas sua
mutabilidade, apta a todas as possibilidades sem se tornar nenhuma delas, rompe com os
significados incontestes, deixando livre outras construções sígnicas.
Derrida rompe com significações apriorísticas de objetos ou palavras, para a efetividade de
signo-possibilidades. Em “A escritura e a diferença”, descola o signo do eixo
significante/significado que o aprisiona e o abre como elemento sem significações prévias,
onde não há significado intrínseco, primeiro, mas permite a geração de outros significantes e
significados com aproximação e/ou atrito entre eles.
Já Peirce rompe com a relação dicotômica signo/objeto, propõe que tal relação se dê por um
processo interpretante, que pode acontecer diversas vezes, garantindo que capturemos várias
facetas de um mesmo objeto e seus signos, dinamizando suas potencialidades de diversidades
de estímulos.
Nos projetos de arquitetura, as intervenções estudadas, os objetos e signos, em um momento
estão substituindo um objeto, ora sendo ele próprio objeto de substituição de outro signo.
Para Peirce, o signo é uma construção mental entre significantes e significações, de forma que
todo significante, para se valer de uma intelecção, passa por operações de significação.
Rompe com uma relação unívoca de um objeto ou significante com um significado, deste
48
modo, a força da atividade interpretante de seu pensamento não busca a exclusão de
significados, mas elevá-los, gerando novas e infinitas cadeias.
Em Arquitetura essas elevações de significados dos signos são possibilitadas por
deslocamentos, desdobramentos de discursos formais e significadores, como o ato
organizador do projeto arquitetônico com suas regras e normas em desdobramentos entre as
naturezas das linguagens espaciais, filosóficas, científicas e artísticas que constroem a
arquitetura e o urbanismo, potencializando o porvir.
Einsenman, na interlocução de sua arquitetura com conceitos oriundos da filosofia, trabalha
com a ideia de Dobras em Deleuze.
Deleuze explica sobre o barroco em Leibniz que as dobras são um corpo flexível, com partes
coerentes que formam uma dobra, que são divididas ao infinito que sempre conservam certa
coesão, são oscilações que apontem para singularidades que emergem de um mesmo corpo. É
um momento específico no espaço e no tempo, pontos de um mapeamento de relações
diferenciais nômades e sem distâncias geométricas definidas, um deslocamento dos espaços
que leva ao conceito de Khôra, receptáculo que possibilita inúmeras situações. Inúmeras
possibilidades em um labirinto de dobras sobre/entre dobras que apontam ao “espírito da
matéria”; e como diz Deleuze, a matéria-dobra é a matéria- tempo.
49
Capítulo 2
FORÇAS CONCEITUAIS E PROJETUAIS: MATERIALIZAÇÕES
50
2.1. A Força do Trabalho Conceitual
Como argumentamos no primeiro capítulo, sobre a relação transdisciplinar que estabelecemos
entre filosofia, texto e arquitetura, para a construção de nossa investigação, essas matérias em
um primeiro momento, aparentemente distintas, mas que concatenadas fazem desse processo
surgir um espaço onde não há mais um discurso hierárquico, não existe a autoridade de um
texto sobre outros; os centros, localizados numa única área, deslocam-se para zonas
intermediárias, para um espaço entre os textos e a relação que instituem.
Com os conceitos de entre e rizoma, oriundos do pensamento dos filósofos Derrida, Deleuze e
Guattari, respectivamente, não temos a prevalência da hierarquia, do discurso dominante,
abrem espaço ao objeto híbrido, a uma estrutura não centrada, aberta à ambivalência dos
sentidos.
Sobressai o intersticial, o entre, compondo um lugar aberto às experimentações, ao evento, à
criação, permanecendo sempre em processo, sempre por vir, são deslocamentos constantes e
pluralidade de significados e sentidos, possibilitados pela interceptação de textos ou objetos
diferentes no gênero e nos objetivos, estimulando o desenvolvimento do saber, pelas
transgressões dos sentidos que opera, pelos devires que surgem dos cruzamentos das
linguagens, isto se refere tanto ao espaço imaterial, relativo ao cruzamento dos textos, quanto
ao material, no tocante às situações proporcionadas pela arquitetura.
A forma, linguagem utilizada pela arquitetura, representação de uma ideia, adquire sentido e
significado, ao contrário do que muitos arquitetos querem crer, a partir das mais diversas
apropriações que motiva, constituindo com este posicionamento uma arquitetura do espaço,
composta por espaços entres, não determinados, residuais, intersticiais; neste sentido, o
significante não precisa manter uma relação causal, não necessita estar representado por um
significado.
Buscamos aqui, a desregulamentação, a disjunção e o deslocamento entre significante e
significado, entre forma e função, para possibilitar o advento do entre espaços, que está em
constante processo, transgredindo valores históricos arquitetônicos para, desta forma, surgir
outras possibilidades de projetação e de ocupação dos lugares.
O programa sempre fez parte do processo arquitetural, que se vinculava aos valores de uma
determinada época, mas não se traduzia em formas ideais, era flexível o suficiente para
dissociar-se do conteúdo, verdadeiro evento, pois serve aos diversos usos e manifestações e
51
apenas com o advento do funcionalismo e a busca por uma correspondência entre formafunção, resultante de um novo ideário e com ele uma nova linguagem, a flexibilidade, as
possibilidades de manipulação e intervenção foram reduzidas; produto deste ideário manifesto
pelo movimento moderno, o desejo do arquiteto por controle e definição, junto às concepções
que correspondem forma ao conteúdo, ou imposições entre significantes propostos e
significados surgidos, procura impedir o surgimento de eventos, acontecimentos, mas ao
contrário, o rompimento com o originalmente proposto, constantemente eclode, pois
apropriações não conseguem ser pré-determinadas.
A força do fazer arquitetônico atual está atrelada às questões relativas ao espaço, enquanto
meio interativo, composto por eventos, acontecimentos imprevistos, produzindo rotinas e
lógicas diversas, suporte de suposições.
A imagem do lugar baseada na relação espaço-uso é substituída pela relação espaço-tempo, as
imagens dos lugares vão se alterando em virtude de ações que ocorrem nesses lugares, sempre
em processo.
Espaço segundo o qual, como pontuou Igor Guatelli, se “daria a possibilidade de ocorrência
do virtual, ou seja, a realidade da qual ainda não possuímos o conceito”, para Deleuze ou
ainda, “onde se criaria a possibilidade de chegada de algo que não nos deixaria os mesmos,
segundo Derrida. Ou seja, nos espaços não pré-configurados, nos entres, que teríamos
condição para o devir, para a constituição do acontecimento, resultante também de uma
desregulamentação da arquitetura baseada na ligação causal entre forma e função, abrindo
espaço ao não desenho (não intencional), capaz de absorver os registros deixados sem eleger
um único como adequado e em seguida voltar a condição de significante, à espera de novas
intervenções.
Relação clara com o conceito de Khôra, estabelecido por Derrida, região ou receptáculo que
ganharia forma a partir de interpretações externas, deixando impressões e mesmo assim, não
se deixaria atingir ou esgotar, mas seria capaz de adquirir diversas formas e permanecer em
sua condição original, assim seria também a condição entre na arquitetura, em que os espaços
assimilariam às diferentes solicitações, sem se exaurir e retomar a condição inicial.
O espaço intermediário, infra-arquitetural está aberto às significações entre os espaços
definidos, que são catalisadores das ações dos usuários, dos acontecimentos inesperados que
rompem, mas transitórios, permanecem sempre em processo, em que o programa, mutável é
52
sempre solicitado e conformado por diversas manifestações; como khôra, em estado de
significante, à espera de eventos para a prática do conflito, em que nos distanciaríamos do que
somos para abrir espaço ao outro.
Ao possibilitar o entre, o arquiteto estaria contribuindo para a instalação de uma atitude
questionadora, estimulando outras formulações, além do habitual; um fazer arquitetural
relacionado ao pensar, ao refletir crítico, momento necessário nesse processo de rompimento
com a realidade que nos é apresentada, abrindo a possibilidade da diferença, do processo de
diferenciação, através da experiência do espaço e, da possibilidade do contato com o outro,
entendendo-o como aquilo em que estamos nos tornando, mas ainda não consciente; a
condição entre, não sugere nem presença ou ausência absolutos, mas produção de diferenças e
alteridade.
O conceito de entre, rompe com a cultura funcionalista do movimento moderno, entretanto
não é desprovido de função, pois abriga o outro ao anteriormente imaginado, apenas não está
atrelado a permanências e não há uma forma adequada para contê-lo.
2.1.1 Reflexões sobre as inscrições materiais
As cidades convivem em movimentos de conflito e ruptura e por isso exigem novas
experimentações projetuais dada a sua complexidade, há forças territoriais em permanente
tensão entre situações.
Por isso, buscamos a arquitetura em sua relação para com, ser que se fortalece e se constitui
em articulações, partindo da importância da constituição de micropolíticas urbanas,
produzindo-se por misturas em relações de contágio e proximidade, superando o que parece
ser da natureza de algo além dela própria para posicionar-se quase fundir-se com o outro.
As inscrições territoriais, condição material da própria arquitetura, reforçariam ou resignificariam um quase ausente, alterando sua dinâmica e estabelecendo relações com a
adição, o que chega e o existente, produzindo o encontro ou o acontecimento, resultando em
novas
combinações
entre
infraestruturas
e
supraestruturas
e
criando
condições
complementares e suplementares, por exemplo, através da arte pública ou da própria
urbanidade da arquitetura.
Pensaremos o programa em arquitetura como uma estratégia capaz de gerar uma condição
suplementar e não de fixar sentidos e significados para essa arquitetura, construções de
53
dinâmicas que provoquem reações; segundo Edward Soja (1989) o espaço deve ser entendido
em sua materialidade e em suas formas de organização e produção social.
Buscamos com esta investigação, que um objeto seja potencializado em seu ser, adquirindo
novas possibilidades de um vir a ser, no momento em que uma inscrição suplementar no
território deforma esse ser existente e abre espaço para um suporte em interação permanente
com as pessoas, intensificando sua importância urbana; inserido em um movimento constante
de desterritorializações e reterritorializações, sempre ressignificado.
“Retomando a ideia de matrizes espaciais parte da inter-relação dos
conceitos de espaço, território e lugar, tem-se que a desterritorialização pode
ser sintetizada como o processo que ocorre na organização de uma porção do
espaço, pela inserção ou transformação de técnicas, ideias ou objetos,
alterando o regime de influências de fixos e fluxos. Esse processo é um dos
responsáveis pelas crises e redefinições das matrizes espaciais, podendo
afetar diretamente os objetos e as ações do espaço, bem como a hierarquia de
valores que determinam a identidade de um lugar ou o regime de influências
de um território”. (DUARTE, 2002)
Dentro das intersecções que fizemos com conceitos advindos da filosofia, para que o objeto
seja potencializado, buscamos o entre, o intervalo, o lugar dos eventos constituídos por uma
arquitetura que produz através destes, espaços autônomos, onde há um mínimo de
intervenção, com um máximo de acontecimentos espontâneos.
Em intervenções que podem ser programáticos funcionais ou formais, traremos dois exemplos
que utilizam estratégias de projetação destes intervalos no espaço arquitetônico com distintas
características.
Intenta-se que arquitetura seja materialização de conceitos, que se encontram nas estratégias
de projetação potencializados nos programas, edifícios, implantações e na importância do
suplementar, daquilo que vem a mais, fazendo com que o projeto seja um meio para a
ocorrência de eventos imprevistos; certezas estáveis são trocadas pela noção de desagregação
da estabilidade dessas arquiteturas.
Os dois projetos escolhidos como referências aos estudos que serão realizados com os objetos
escolhidos, são: O Parque de La Villette, do arquiteto Bernard Tschumi e o Viaduto Spittelau,
da arquiteta Zaha Hadid.
54
2.2. Viaduto Spittelau e a Inscrição Suplementar de Zaha Hadid: Criação de Novas
Dinâmicas Urbanas
Como nos diz Igor Guatelli (2005), o espaço público é o espaço da permanente publicação, de
um colocar-se infinito, em processo.
Faz parte da arquitetura sua ação de colocar-se em presença do público, e desta forma se
compor com algo além de si mesma.
Os sistemas urbanos atuais exigem novas experiências de projetação, pois são complexos e
compostos de rupturas e indefinições, justaposição de dissociados territórios que constituem
permanentes tensões entre situações diferenciadas.
O projeto que será apresentado, da arquiteta Zaha Hadid, de 1994, localizado na cidade de
Viena, produz o que Guatelli (2005) chama de deslimitação do objeto arquitetônico e analisa
os possíveis processos de mediação e amálgama com a cidade que este projeto de arquitetura,
objeto deslimitado, pode produzir.
Vista do conjunto projetado por Zaha Hadid sobre o viaduto Spitellau, desenhado por Otto Wagner. Foto: Igor Guatelli
Uma das estratégias de projetação entende que o espaço urbano constitui-se de micropolíticas
que se formam e desfazem-se e é capaz de produzir diferenças pela mistura, por isso o objeto
55
arquitetônico para ativar estes lugares e para gerar urbanidade efetiva um colocar-se para, ao
constituir um suporte de incremento infraestrutural que se constrói a partir de articulações,
com algo além de si a ser fortalecido pela ação do público.
A arquitetura entendida como um querer ser algo além dela, conectando-se com o outro em
um processo de encadeamentos espaciais, partindo da noção de alteridade, ao posicionar-se
com o outro, possibilitaria a emergência de novos sentidos, ao permitir que marcas e
inscrições a contaminem.
Localizado ao Norte de Viena, sobre a estação de metrô Spittelau e o viaduto, projeto do
arquiteto Otto Wagner de um ramal férreo desativado, o edifício de Zaha Hadid, previsto para
ser habitação social, passou a habitação de estudantes, por estar ao lado de uma Universidade.
Sob os arcos do viaduto há a previsão de se instalarem restaurantes, lojas, bicicletário.
Hadid insere inscrições que ressignificam o lugar, a presença quase ausente do viaduto
desativado, como observa Guatelli em Arquitetura do Entre Lugares (2010), trata-se de um
desenvolvimento mútuo, entre o edifício, a adição, aquilo que chega e o viaduto desativado,
constitui um ser com, fortalecido por esta relação com o outro.
Vista do conjunto projetado por Zaha Hadid sobre o viaduto Spitellau, desenhado por Otto Wagner. Foto: Igor Guatelli
56
O antigo ramal férreo possui sua característica de linha conectora fortalecida ao ser
ressignificada quando adquire a função de ciclovia que se prolonga pelo rio Danúbio liga a
cidade e é articulado tanto com o edifício que se coloca para com ela, a linha conectora, e a
estação de metrô, através de seu projeto, adição suplementar, Hadid desajusta o sentido
anteriormente firmado, altera a dinâmica daquele território.
O viaduto adquire a condição de um vir a ser no momento em que uma inscrição suplementar,
chega e deforma o ser existente.
O projeto de Hadid possui três blocos de apartamentos em estruturas independentes da
estrutura do viaduto, conecta-se com o canal do rio Danúbio através de deques em dois níveis,
junto aos arcos do viaduto e outro na cota do metrô, um suporte de pura potência territorial
urbana, onde há uma permanente situação de interação entre pessoas.
Deck inferior de acesso ao metrô. Foto: Igor Guatelli
57
O programa adicional traz outras possibilidades de existência para as linhas infraestruturais
urbanas, sobre o território do deslocamento, a adição, a inscrição material, insere no território
a articulação e a permanência, contamina-se com o viaduto Spittelau, e contribui para sua
formação suplementar, de superação, o projeto cria um novo sistema ao compor-se com o
viaduto, o metrô e o rio.
Vista desde o canal mostrando os três blocos com os decks inferior e superior. Foto: Igor Guatelli
O viaduto passa a ser um suporte fundamental aos blocos habitacionais, deixa de ser apenas
uma infraestrutura, ao mesmo tempo os edifícios passam a ser uma demarcação na passagem
pelo viaduto e não apenas pontos no território.
Simultaneamente concentração e dispersão, ponto e linha, “a potência ainda por vir desse
projeto está em sua capacidade de proporcionar mobilização e mobilidade”. (GUATELLI,
2010, p.73)
O projeto de Zaha Hadid se liga a uma linha urbana, potencializando sua importância e
constituindo um sistema, onde tornam-se aptos a provocar o indeterminado, o acontecimento,
através de seu programa adicional inscrito que produz urbanidade onde anteriormente em
nível local, a linha conectora tinha sua urbanidade reduzida, embora cumpra seu papel
articulador na macroescala.
O programa aqui é pensado como um agenciamento de elementos potencializadores de tensão,
situações montadas para transformarem-se em liberadores de acontecimento.
58
2.3. Parque de La Villete, Les Folies: Sobreposições e Dissociações.
Bernard Tschumi (1998), diz ser seu projeto, Les Folies para o parque La Villete, o maior
edifício descontínuo e o primeiro a trabalhar com conceitos de sobreposição e dissociação.
O destaque se dá para as relações entre os edifícios, para os percursos, ocupados pelas pessoas
que ali circulam em direção aos edifícios presentes no parque.
Tschumi projeta sobre o parque, por meio de uma sobreposição de linhas, que
corresponderiam à circulação, pontos, os edifícios e superfícies, topografia, pisos e
pavimentos. Pelo parque percebem-se estruturas vermelhas que chamou de Les Folies.
Com a intenção de desestabilizar os pares teóricos, forma- função, programa-contexto,
estrutura-significado, utiliza-se de sistemas de sobreposição e fragmentação, na prática, uma
parte não pode ser a síntese do todo, rejeitando a ideia de síntese em favor da disjunção, como
vemos na oposição dos pares, forma-uso, forma-função, signo-significado, assim o próprio
objeto de Tschumi é explodido em unidades menores e fragmentado pelo parque.
As Folies são módulos vermelhos de dez metros, projetados sem função pré-determinada,
podem abrigar e significar diversos usos, mutáveis, de modo a reproduzir as dinâmicas das
cidades.
As Folies. Foto: coisasdaarquitetura.wordpress.com
59
Tschumi propõe uma arquitetura de espaçamentos programáticos, de programas que
permutam-se e em que as ações que ali ocorreriam seriam possibilidades de significações por
vir, pontos de pura intensidade, pois tratam-se de articulações entre espaço e edificações as
atividades e seu uso por parte do público, produziriam os eventos.
Para o arquiteto, na movimentação das pessoas pelo espaço, entre as Folies, estruturas que
promoveriam o evento, por seus usos diversos, potencializariam também os edifícios
existentes e seriam responsáveis por manifestações imprevistas, instaurariam o evento e
desestratificariam o espaço para uma ocupação uniforme do parque.
As unidades dissociadas no espaço estariam articuladas por um plano cartesiano imaginário,
essa estratégia procura desestabilizar pares de conceitos.
A proximidade das Folies dos edifícios onde se dariam grandes eventos, criariam tensões que
possibilitariam o inesperado.
O projeto de Tschumi, tomando como referência o conceito de entre de Derrida, cria um
espaço sem significados apriorísticos, mas aberto a significações e ressignificações, capaz de
registrar impressões externas e logo voltar à situação original.
As Folies, pensadas como infraestruturas, utilizam-se de polos catalisadores de pessoas, são
quatro dispersos nas extremidades do parque, as cidades da música, da ciência e tecnologia, o
grande Halle, local multimídia, e o Zenith, sala de espetáculos.
Fonte: japaraomoleskine.com
60
Locais de aglomeração, mas estagnados, estes edifícios, articulam-se com as Folies, já que
estas estruturas garantem a conexão entre eles e são potencializadoras de acontecimentos
entre os prédios.
Na filosofia Derrida se utiliza da superposição dos textos, interpretando um texto dentro de
outro, articulados pela argumentação, possibilitando a abertura aos questionamentos,
condições que elege como necessárias ao porvir e cria assim, um lugar, um entre que sugere
diversas maneiras de compreensão pelo leitor que passa a ser criador também, cria suas
marcas interpretativas.
Ao projetar um espaço por camadas justapostas, cada uma representando um sistema, porém
articulados pelo plano cartesiano imaginário, Tschumi, promove em arquitetura, uma região
entre, com diversas possibilidades de interpretação, aí chamamos atenção às referências e
correspondências entre filosofia e arquitetura.
O arquiteto Bernard Tschumi, desenvolve como já o mencionamos, conceito de violência da
arquitetura, onde todo ato, promovido pelos espaços arquitetônicos, produzem um encontro de
corpos, ora o corpo viola o espaço, ora o espaço viola o corpo, é um encontro entre potências
de afeto.
“Entrar num edifício pode ser um ato delicado, mas ele viola o equilíbrio de
uma geometria precisamente ordenada. Os corpos esculpem todos os tipos de
espaços novos e inesperados através de movimentos fluidos ou errantes. A
arquitetura, então, é apenas um organismo engajado em constante troca com
os usuários cujos corpos avançam contra regras cuidadosamente
estabelecidas pelo pensamento arquitetural. (...) Cada porta implica um
movimento de atravessar a sua estrutura. Cada espaço arquitetural implica e
deseja a presença intrusiva que o habitará.” (TSCHUMI, 1999).
Para Tschumi, quando um corpo atravessa um espaço, articula uma duração e constitui um
híbrido de matéria e memória, despertando nossa percepção diante do surgimento de um
desequilíbrio.
61
Parque de La Villete. Vista das camadas justapostas. Fonte: coisasdaarquitetura.wordpress.com
62
Capítulo 3
ARQUITETURA COMO SUPORTE INFRAESTRUTURAL
63
3.1. O Processo Infraestrutural
Acerca do suporte Derrida diz que, assim como Khôra, é lugar e receptáculo, diferença,
intervalo e interstício, ainda fala que deve manter-se heterogêneo a tudo o que recebe, amorfo,
para tomar sobre si todas as formas.
Para Derrida, khôra, seria o receptáculo do que chega sem ser anunciado, por isso constitui
uma ameaça ao estabelecido.
Comparando o subjétil na definição derridiana e os suportes infraestruturais, são espaços
flexíveis e ao mesmo tempo, indispensáveis na construção, organização, funcionamento tanto
na arquitetura quanto no urbanismo; são apropriados de diferentes formas, favorecendo o
surgimento de eventos inesperados, capazes de absorver e registrar, assim como khôra,
manifestações e usos e logo, voltar à condição infraestrutural, de suporte.
Há estruturas capazes de absorver significados diversos e diferentes do projetado pelo autor,
como infraestruturas que são ocultadas por edifícios ou lugares urbanos, já que são
consideradas, em sua maioria como elementos articuladores entre pontos distantes.
As infraestruturas vêm sendo encaradas como elementos potencializadores de eventos, sem
que sejam direcionados a maneiras pré-determinadas de usos, exatamente por não se tratarem
de espaços dominantes ou possuírem uma forma determinada, ajustam-se às diversas
apropriações e manifestações.
A possibilidade de combinações entre os espaços dominantes, motivadores de ocupação e os
infraestruturais, intensificadores de usos, justifica a existência e garante a vitalidade dos dois
espaços, embora as infraestruturas arquitetônicas ao contrário de edifícios ou lugares, não
possuam uma percepção e apropriação imediatas, esta característica garante a criação por
parte dos usuários.
O processo infraestrutural passa pela valorização dos intervalos, dos interstícios, trabalha a
relação entre um mundo materializado, estável e o campo das impermanências, possibilita o
surgimento de eventos e converte-se numa estratégia projetual, intencional.
A arquitetura lida com questões culturais, sociais e técnicas, mas não deve ignorar àquelas
relacionadas ao significado, neste sentido o conceito de entre para os espaços infraestruturais,
seria o elemento articulador de situações, absorvendo enquanto suporte diversos significados.
64
O entre como um espaço infraestrutural é articulador. Assim temos uma condição dinâmica de
diferenciação, tomando diversas configurações, espaços são articulados por contaminações,
onde o interior revela sua força projetual no exterior, por exemplo; dentro e fora da estrutura
ao mesmo tempo, coloca-se entre ser um complemento e um suplemento à arquitetura, como
já foi citado é o que faz Zaha Hadid em seu projeto em Viena, o conjunto de blocos de
apartamentos sobre uma estação de metrô spittelau e um viaduto (projeto do arquiteto Otto
Wagner) e de um ramal férreo desativado, hoje transformado em uma ciclovia (que se
prolonga ao longo de um canal do rio Danúbio, atravessando a cidade), segundo Guatelli, o
programa adicional inscrito, que será o conjunto de apartamentos, fortalece uma situação ao
trazer outras possibilidades de existência para as três linhas infraestruturais urbanas: o
viaduto, o metrô e o rio. Essas linhas de força infraestruturais passam a fazer parte de uma
nova condição espaço temporais, o programa é uma estratégia de reativação de um elemento
urbano que até então não era usado, poderíamos dizer que não era visto, percebido, em nível
local tem sua existência reduzida, incapaz de gerar urbanidade, mas em sua dimensão global,
com a articulação criada, infra e supraestruturas, favorecem a invenção de outra situação, um
por vir urbano.
O exterior é o que vem de fora, constituindo uma condição suplementar, não chegaria para
completar algo, mas para desestabilizar os sentidos tidos como adequados ao suporte.
Com essa arquitetura, resultante de um deslocamento das verdades históricas, tomada como
descontrucionista e seguidora de preceitos advindos da filosofia pós-estruturalista, pensada
com conceitos, desviou-se o interesse para os intervalos, os vazios, isto significa que o espaço
não é mais secundário à forma; o espaço entre as formas constitui o lugar para as ações não
previstas, geradora de conflitos que resultam em novas relações, onde função e forma são
enriquecidas, como condições para o porvir, as possibilidades de atividades, são
possibilidades programáticas, originárias das intervenções e do movimento dos usuários no
espaço, por isso nunca completamente terminado, mas aberto às diversas manipulações do
público.
Procuramos questionar como o programa, nessas arquiteturas pode se constituir, já esteve
quase sempre vinculado às definições idealizadoras e totalizantes, que determinavam usos
adequados.
O programa passa a ser compreendido como programação de situações geradoras de
acontecimentos, ativando o suporte e o lugar urbano enquanto a articulação garante a força
65
projetual desses elementos, utilizando-se muitas vezes de um mínimo efeito programático
para obter um máximo efeito urbano.
O mínimo programático é uma estratégia para um processo de ativação e ocupação de espaços
urbanos, ocorrem em suportes urbanos que serão atingidos por um movimento de
desterritorialização para logo se reterritorializarem.
François Ascher (2011) em seu livro, Os novos princípios do urbanismo, publicado em 2001,
elabora o conceito de “neourbanismo”, advindo do processo detectado e denominado por ele
na obra, como a “terceira revolução urbana moderna”, uma nova etapa de modernização das
sociedades ocidentais, fruto do impacto causado pelas chamadas, tecnologias da inteligência,
que produziram efeitos como o da conexão planetária e geram novas formas de pensar e agir,
assim questiona e atualiza categorias que estavam contidas nas concepções das cidades.
Investiga neste processo, o da concepção de seu pensamento, como criar cidades justas, que
funcionem e sejam atrativas para a sociedade hipertextual, participante do capitalismo
cognitivo.
O urbanismo moderno determinava planos de longo prazo para as cidades aplicando diretrizes
de organização espaciais definidas através dos planos diretores.
Como na sociedade e nas cidades contemporâneas não há como controlar o futuro, o conceito
de “neourbanismo” é definido justamente por não corroborar deste princípio, mas por elaborar
múltiplos projetos de natureza variada, dispõe de uma gestão estratégica para sua
implementação conjunta, leva em consideração desdobramentos e mudanças. “Articula de
forma inovadora as oscilações, o curto e o longo prazo, a pequena e a grande escala, os
interesses gerais e particulares. É, ao mesmo tempo, estratégico, pragmático e com senso de
oportunidade.” (ASCHER, 2011).
Nesta nova concepção de urbanismo o projeto não é “somente um desígnio acompanhado de
um desenho” (ASCHER, 20011), mas é responsável por revelar potencialidades e limitações.
Ele (o neourbanismo) substitui essa linearidade, diagnóstico, a identificação das necessidades
e a elaboração eventual dos cenários, a definição de programa, o projeto, a realização e a
gestão, por um processo heurístico, interativo, incremental e recorrente: “através de ações que
servem simultaneamente para elaborar e provar hipóteses, com realizações parciais que
reinformam o projeto e permitem procedimentos mais cautelosos e duráveis, pelas avaliações
66
que integram o feedback e que traduzem na redefinição dos elementos estratégicos.”
(ASCHER, 2001).
O neourbanismo, segundo Ascher (2001) não busca simplificar realidades complicadas e se
esforça, antes de tudo, em dar conta de territórios e situações complexas. Seu desempenho é
obtido pela variedade, flexibilidade e capacidade de reação.
O neourbanismo deve combinar possibilidades de conceber espaços múltiplos de n dimensões
sociais e funcionais, hiperespaços que articulem o real e o virtual, repelindo estratégias
conservadoras e advogando em favor de ações experimentais.
Ascher (2001) afirma que, a sociedade hipertexto, composta de multipertinências, de
mobilidades e de territórios sociais de geometria variável, confronta o neourbanismo com uma
diversidade de interesses e com uma complexidade de desafios que dificilmente podem se
materializar em interesses coletivos estáveis e aceitos por todos.
O urbanismo moderno com sua ideologia funcionalista esforçou-se por generalizar suas
concepções globais para as cidades.
“O neourbanismo, por outro lado, admite a complexidade e deve propor uma
variedade de formas e ambientes arquitetônicos e urbanos a uma sociedade
cada vez mais diferenciada na sua composição, nas suas práticas e gostos.
Confrontando com uma cidade cada vez mais móvel, nas quais os atores
ampliam a sua capacidade de escolha de localização, o neourbanismo deve
seduzir. Esforça-se em propor um tipo de urbanismo à la carte, que oferece
combinações variadas de qualidades urbanas.”(ASCHER, 2001)
O neourbanismo enfrenta grupos sociais diversificados, territórios social e espacialmente
heterogêneos. Necessita de novas formas de concepção e realização das decisões públicas.
O neourbanismo que se esboça, trata-se menos de fazer planos do que de aplicar dispositivos
que os elaborem, é um urbanismo reflexivo, onde o conhecimento e a ação são produzidos
antes, durante e depois da ação, torna-se, plenamente, um instrumento de conhecimento e
negociação; é um urbanismo multissensorial, que enriquece a urbanidade do lugar.
Há pouco espaço para o inesperado em arquitetura, para a imaginação social, mas nesta
arquitetura que privilegia os espaços entre, os interstícios, busca-se o seu enriquecimento e do
sujeito que a usa, introduzindo-o em um processo de questionamentos de crenças e valores,
em favor da aceitação do outro.
67
Também o sujeito é levado a refletir e à desestabilização, pois seu sistema de crenças é
questionado, assim pode transgredir, estaria porvir, assim como os espaços infraestruturais,
esses espaços livres de pré-configurações, instáveis, não constituídos, estabelecendo
articulações com os espaços estáveis, dominantes; esse homem, da mesma forma que a
arquitetura, está sempre em processo, abandona suas posições iniciais, deslocando-se a outros
pontos, resultado das diversas apropriações do espaço que constituem a passagem de um
sujeito passivo para um ativo, devido ao exercício da reflexão e da capacidade de exercer sua
liberdade.
O entre espaço em arquitetura, estabelece um campo rico à construção da subjetividade do
usuário e apesar de ser um gesto intencional de projetação, não determina uma finalidade,
nem intenta previsibilidades quanto a sua efetivação.
Como diz Bernard Tschumi (1999), na arquitetura, o que se deve interessar é sua capacidade
de servir e agir como recipiente.
Esse momento de instabilidade e desequilíbrio da chamada “Era da cultura”, da terceira
revolução urbana, foi explorado por Fábio Duarte no que ele chamou de “crise das matrizes
espaciais”. Duarte classifica o espaço em três categorias: o espaço conforme postulado
enquanto grandeza absoluta; o território desenhado pela geografia e delimitando as fronteiras;
e o lugar, marcado pela cultura enquanto espaço do cotidiano; e nos coloca o problema de que
hoje vivenciamos a crise dessas matrizes, a dissolução dos limites precisos dessas categorias
do espaço, e, por consequência, uma transformação nas formas de percepção do indivíduo.
Fábio Duarte revela ainda que a crise dessas matrizes começa com a emergência da tecnologia
e com a constituição de um espaço global que tende à desterritorialização. “Os veículos
tecnológicos atingiram o limite do tempo extensivo, reduzindo as distâncias no tempo que
permitiam a apreensão da procura, ao contrário, reconhecer nesse próprio desequilíbrio
emergente uma nova possibilidade para o processo de criação na arquitetura” (Duarte, 2002).
Criamos categorias espaciais especialmente em relação ao tempo em arquitetura, mas que
hoje, derivados de novos processos culturais, estão fragilizadas. Investigaremos relações
envolvidas entre agenciamentos, fruto da mistura, do contágio entre elementos heterogêneos,
que ao interagirem levam a um movimento contínuo de territorializações, desterritorializações
e reterritorializações, ou seja, todo estado territorializado, estável, pode ser reterritorializado
por situações que o desestabilizam e o impelem a ser outro em um movimento escorregadio e
68
efetivo, afetivo, de devires, constituição de máquinas desejantes entre arquitetura e
urbanismo, arte e cidade.
“O sentido do espaço só existe a partir da experiência do ‘eu’; portanto, o
sentido do espaço da arquitetura não está no interior da abstração do espaço,
no interior da arquitetura, na relação utilitária entre o cheio e o vazio, e
tampouco nas entranhas das paredes. Qualquer sentido que se possa atribuir
está fora dele, muito além de sua superfície. Está no interior de quem o
vivencia, está nas pessoas que nele se deslocam constantemente.
Curiosamente transportamos o sentido do espaço para qualquer lugar aonde
formos. O espaço não é como crê a maioria dos arquitetos, uma realidade
rígida e válida para todos. Ele em si é tão plástico e imaterial como o próprio
tempo, variando com os indivíduos, com os povos, com as épocas, e,
principalmente, com os pontos de vistas. Não existe um espaço objetivo e
autônomo do ser humano. Existem diferentes maneiras de perceber e
compreender esse espaço ‘bruto’, lá fora, sem significação, à espera de
minha chegada.” (FUÃO, 2004).
3.1.1. Mobilidade e Desenvolvimento Urbano
A globalização e o processo de metapolização das cidades se sustentam das tecnologias de
transporte e de comunicação e alimentam seu crescimento, em nada essas tecnologias
enfraquecem a concentração metropolitana ou substituem as cidades reais por virtuais.
Os meios de transporte presenciais e os contatos diretos continuam sendo os meios de
comunicação privilegiados; a acessibilidade e a possibilidade do encontro são mais do que
nunca, riquezas urbanas, como assegura Ascher (2010).
No entanto, as telecomunicações contribuem para uma modificação dos sistemas de
mobilidade urbana, de bens e de pessoas e cria novas estruturas espaciais, por exemplo, o
comércio digital substitui parte da mobilidade física pelo transporte de informações, porém
não encerra o comércio tradicional o recompõe.
O uso de meios de transporte rápido, como o metroviário ou as ferrovias, junto as tecnologias
de informação e comunicação, afetam o centro geométrico das cidades, que deixa de ser o
lugar mais acessível em favor de multicentralidades.
A terceira revolução urbana não gera uma cidade imóvel, digital, mas uma cidade que se
move e se comunica, exigindo decisões de deslocamentos, animada por eventos e na qual a
qualidade dos lugares mobilizará sentidos e atuações.
69
O desenvolvimento de meios de transporte e telecomunicações abre para os indivíduos
vínculos entre espaço e tempo: “a distâncias físicas não se traduzem mais em tempos fixos de
deslocamentos, mas mudam conforme os modos de transporte e comunicação e segundo as
horas”. (ASCHER, 2010, p. 68)
Segundo Ascher (2010) os cidadãos podem arbitrar em um ritmo crescente entre uma
mudança de local (deslocamento) e uma mudança temporal (dessincronização). As
ferramentas que permitem modificar o tempo e o lugar das atividades humanas constituem
uma das principais características da nova revolução urbana.
Técnicas de dessincronização e ressincronização, de deslocamento e substituição são cada vez
mais solicitadas no cotidiano dos cidadãos das cidades contemporâneas.
Com isso, vemos que necessidades de comunicação, deslocamentos de bens e pessoas, enfim,
infraestruturas junto ao desenvolvimento urbano e socioeconômico sempre estiveram
enlaçadas e esta relação aumenta e se revigora é o que observamos nas cidades e em especial
na cidade de São Paulo, onde os objetos de pesquisa deste estudo concentram-se.
A economia da cidade de São Paulo, ou seja, todo o seu parque industrial, desde o princípio
beneficiou-se do sistema urbanístico e de infraestrutura para se desenvolver, atendiam a uma
lógica incipiente que era a do café, em um primeiro momento. A rede ferroviária oferecia
vantagens de infraestrutura, a São Paulo Railway (1867), ao interligar a capital do Estado, ao
litoral e interior.
A situação geográfica da cidade foi estratégica para que se tornasse polo industrial, além do
recurso hídrico disponível do rio Tietê que assegurava a operacionalização de máquinas e a
geração de energia.
As fábricas concentraram-se nos terrenos baratos e de topografia suave das várzeas do
Tamanduateí e do Tietê acompanhando o traçado da linha férrea, conformou também a
ocupação pelas moradias operárias dos bairros da Lapa, Água Branca, Barra Funda, Bom
Retiro, Brás, Pari, Belenzinho, Tatuapé, Mooca e Ipiranga, assim, condicionaram o
povoamento para novas direções.
Na década de 40, o sistema rodoviário passou a suprir a obsolescência do sistema ferroviário e
desta forma, Anchieta, Dutra e Anhanguera, recebem as novas indústrias, entretanto, não
excluem por completo a localização fabril junto às várzeas com a construção das marginais
70
junto aos rios, nesta logística, passaram a compor eixos de articulação das rodovias com
bairros e distritos industriais.
A dimensão metropolitana foi assumida nas intervenções que buscavam sanar problemas
oriundos de um crescimento espraiado e periférico. Surgiram propostas de planejamento
urbano anterior à oficialização da rede básica de metrô da cidade de São Paulo em 1968.
O Programa de Melhoramentos Públicos (1950) de Robert Moses previa a circulação com
maior atenção para o aumento do transporte público.
Os planos posteriores contemplavam desde uma reorganização do espaço físico até a
racionalização e eficiência da rede de transportes coletivos. O raciocínio é pela busca de um
urbanismo que ampare o desenvolvimento com o tema recorrente da urbanização.
O Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (1971), com caráter regulamentador do
espaço em vigor por quase duas décadas, verteu grande parte dos investimentos às obras
viárias de incentivos á indústria automobilística. A Lei Geral de Zoneamento (1972) obteve
na Zona de Usos Especiais (Z8) base legal para planos de reurbanização das áreas entorno das
estações de metrô na década de 70.
Ao longo dos anos 60 e 70, a cidade passou a dispersar-se em suas atividades produtivas,
juntamente uniformizaram-se os problemas de escassez de infraestrutura e ganhou
notoriedade os problemas referentes à aglomeração urbana, como acessibilidade, áreas de
expansão e do transporte público.
Durante a década de 70, o sistema metroviário pouco influenciou a formação de núcleos
urbanos, já que inicialmente foi implementado na consolidada malha urbana, desta forma
perseguiu o crescimento urbano, atravessando o território para atender à demanda de um
transporte rápido e de alta capacidade. O primeiro metropolitano de São Paulo teve o primeiro
trecho da Linha Norte/ Sul em operação a partir de 1975.
A primeira versão de transporte subterrâneo em Londres já havia surgido em 1863, na época
um aglomerado de habitantes de mais de cinco milhões de habitantes, entretanto, a primeira
metade do século XX foi marcada pela expansão dos transportes individuais em decorrência
da produção automobilística.
71
Diante dos inúmeros problemas urbanos causados pela intensa produção automobilística,
associado ao espraiamento da ocupação, intensificou-se a demanda por transporte coletivo
público.
A implantação do metrô então passou a ser uma solução para o transporte urbano, a despeito
de análises negativas, constatações sobre o impacto positivo do metrô nas cidades, trouxeram
não apenas um satisfatório desempenho no transporte público, também ressaltou sua melhor
capacidade de preservar centros urbanos, servindo como elemento de requalificação.
Diríamos que melhor do que requalificar, compõe favoravelmente, ou possui a capacidade
para colocar-se com a cidade e gerar a reativação de sistemas urbanos que em nível local
possam ter suas capacidades reduzidas.
3.2. Estações Metroviárias e as Ações que podem Provocar
A estação é o principal componente de uma infraestrutura de transporte, pois é dela que se dá
o acesso aos usuários, além de seu poder de provocar reações e interferências por intermédio
das articulações que cria.
Spit & Bertolini (1998) definem estas estruturas, segundo Natália de Carvalho como:
“(...) É um nó: um ponto de acesso a trens e, cada vez mais, a outros sistemas
de transporte; e, ao mesmo tempo, é um lugar: uma específica seção da
cidade com concentração de infraestruturas, mas também com uma
diversificada coleção de edifícios e espaços abertos”. (SPIT &
BERTOLINI, 1998, p.09, Apud, Macedo, p. 62).
A percepção das estações vinculadas aos conceitos de nó e lugar colocavam as estruturas em
uma posição ativa, reagente com o espaço urbano é também estruturante de toda uma rede ou
sistema socioeconômico, já que conecta espaços urbanos, atividades e pessoas.
As estações quando implantadas, incorporam e atuam em parte da cidade, tornando-se um
lugar de onde expandem sua área de influência.
Compreendidas com a linha que conjugam, é neste percurso que geram seus efeitos, inclusive
negativos, como é o caso da especulação imobiliária, da expectativa de alteração de uso e
ocupação do solo.
72
A evolução das metrópoles contemporâneas tem demandado novas tecnologias que acabam
por facilitar a mobilidade nas cidades, procurando ajustar-se ao espaço público, disponível
para todos, como local reconhecidamente de criação e comunicação social.
A segunda Linha do metroviário de São Paulo, o trecho Leste/Oeste, entra em operação em
1979, servindo uma região de alta densidade populacional, e não consegue suprir à demanda,
neste momento a instituição recorre a vários tipos de campanhas como estratégia de
aproximação com o público, tendo por objetivo amenizar estes problemas.
Entre estas campanhas, a Ação Cultural, iniciada em 1970, se caracterizou por eventos
transitórios de cunho artístico-cultural, como por exemplo, eventos musicais, exposições
itinerantes e foi oficializada em 1986 na época da implantação do projeto Arte no Metrô.
Atualmente o projeto Arte no Metrô possui mais de cem obras de arte implantadas nesses
espaços, entre painéis, murais, esculturas e outras obras permanentes, uma trajetória de trinta
e nove anos (1974-2013) em que este projeto vem sofrendo transformações conceituais
concomitantemente às mudanças ocorridas nos projetos dos espaços arquitetônicos das
estações. Na primeira linha, Norte/Sul, os espaços arquitetônicos não tinham sido projetados
para comportar obras de arte, o foco estava nas questões técnico-operacionais que visavam a
total eficiência no funcionamento do sistema.
A arte, enquanto suplemento, programa adicional a ser inscrito ao metrô, adota a lógica das
transformações ocorridas projetualmente nos espaços infraestruturais, advindas das mudanças
conceituais de projetação e da própria arte, supra-estrutura, implantada neste contexto e em
permanente metamorfose.
Na relação entre arte e espaço público, permeiam o terreno no qual a arte urbana se instaura
com maior ou menor força e significação. Participando assim, do processo de produção
simbólica do espaço urbano, a arte urbana, compreendida no plano das relações sociais e
agenciamentos, não pode ser estetizada, mostra os conflitos, contradições e relações de poder
que constituem o espaço.
73
“Nesse contexto, processos de estetização, tratados como recursos de
estratégias econômicas, têm sido desenvolvidos em vários planos da
realidade material, urbana e social. Do ponto de vista urbano, têm sido
associados às disputas pelas diferentes formas de capital cultural estimuladas
pela competição entre as cidades. Tal competição- espelhando aquela que
ocorre entre as empresas à busca de localidades sempre mais vantajosas –põe
em relevo a dotação estética e infraestrutural dos lugares, atentando ao
potencial das suas particularidades históricas, artísticas e culturais”.
(HARVEY, 1993)
Associa-se a questões de identidade social e urbana, de gênero e expressões culturais que
possam vir a ocorrer, às condições de democracia.
A arte urbana como prática crítica, pode potencializar a ideia de tornar a cidade disponível
para todos os grupos sociais e com relação aos propósitos estéticos, o desafio a códigos de
representação dominantes, a introdução de novas linguagens e a redefinição de novos valores
e outras possibilidades de apropriação e usufruto dos espaços urbanos físicos e simbólicos.
Percorre vias de interrogação sobre a cidade e sobre como tem sido socialmente construída,
representada e experienciada.
Em um primeiro momento a concepção do partido arquitetônico, onde a obra de arte se faz
ausente, visto que os projetos arquitetônicos, imbuídos de características da modernidade,
visavam tão somente à eficiência do conforto e da funcionalidade para a rápida passagem dos
usuários por estes espaços. Neste momento foi observado, ainda, que o artista plástico era
chamado para com sua obra dissimular, uma necessidade técnica da arquitetura tendo muitas
vezes que fazer propostas em situações críticas quanto à liberdade de escolha ou problemas
com inusitados suportes, como foram os exemplos emblemáticos vivenciados pelas artistas
plásticas Renina Katz, na estação Sé e posteriormente Maria Bonomi na estação Luz.
Num segundo momento, a obra de arte comparece somente após a conclusão da arquitetura e
mostra que em alguns casos a sua presença é inadequada ou até invisível; num terceiro
momento, em que há mudanças na postura do arquiteto do projeto, entre estes, Roberto
Macfadden, ao pensar e prever, desde o início, espaços para posterior inclusão de obras de
arte; ainda neste terceiro momento, um caso mais exemplar, surge com uma feliz conjunção
de posturas do arquiteto João Batista Martinez Correia e da artista plástica Amélia Toledo
para a produção simultânea de arquitetura e da obra de arte ocorrida recentemente na
experiência com a estação Arcoverde no Rio de Janeiro. Também podemos citar o caso da
Estação Sumaré em São Paulo, projeto do arquiteto Roberto Loeb com as obras de Alex
Fleming.
74
O projeto Arte no Metrô, como tentativa de aproximação da empresa com o público,
propiciou um novo enfoque para esta questão envolvendo novas relações de interação entre a
criação de espaços públicos e sua dinâmica de uso pelo habitante da cidade.
Neste contexto, a interação entre Arte/Usuário permite reflexões sobre os possíveis caminhos
para que sua ocorrência, mesmo que não seja de maneira ideal, ofereça estímulos que
minimizem os obstáculos que impedem a comunicação com a obra de arte através de suas
linguagens e possibilidades de se manifestar como arte pública.
A transformação do uso do espaço urbano gerada pela modernidade modifica o
comportamento dos usuários da cidade, cujo objetivo é chegar ao final do trajeto, que é o seu
destino, pois “o durante” é passageiro e não importa, por ser opaco e desfocado. A paisagem
passa rapidamente através da janela do seu carro, do trem do metrô ou de outros meios de
transporte, modificando a percepção das relações tempo-espaço, causando uma espécie de
vertigem das linhas de fuga, como Virílio denomina a sensação de duplicação das linhas de
fuga no ajuste do olhar, quando se está em grande velocidade. (VIRÍLIO. 2005, p.111)
A cidade passa a ter a dinâmica de uma máquina, criando solicitações que não são mais
características do comportamento humano, nem de sua escala e sim, características de uma
sociedade que entra num processo que Augé chama de supermodernidade, organizada pela
superabundância de fatos, por superabundância espacial e pela individualização das
referências.
A dimensão do mundo da supermodernidade não é exatamente a dimensão que conhecemos,
pois o espaço construído não é apenas o espaço físico, mas também os efeitos que afetam a
consciência do tempo e do espaço, assim como a percepção do meio.
A conformação inicial dos espaços arquitetônicos foram complementados com a posterior
colocação de obras de arte que fazem parte do projeto Arte no Metrô. Este projeto surgiu em
decorrência de necessidades de solução de conflitos gerados por usuários da linha
Leste/Oeste.
Uma primeira apreensão das obras, quando foram instaladas com um caráter mais funcional,
faz com que os usuários apresentem uma postura de assimilação utilitária ou de não
reconhecimento de sua existência.
75
Neste espaço funcional das estações de metrô cuja modernidade se impõe através do projeto
arquitetônico e onde os usuários atravessam tais espaços sem o contemplarem, os artistas se
defrontam com um desafio de fazerem visíveis as suas obras. Há mais de cem obras,
distribuídas em várias estações do metropolitano de São Paulo.
A Estação Sé, pioneira na implantação de arte, interna e externamente aos seus espaços é um
importante ponto nodal, cruzamento das principais linhas: azul, Norte/Sul e vermelha,
Leste/Oeste comporta um enfoque mais demorado pelas suas características.
Como se dá a apropriação dos espaços e serviços do metrô pela população, há um impacto
coletivo, sociopolítico.
Hoje o metrô faz parte do que Augé (2005) chama de supermodernidade, definida e
caracterizada por três itens que fazem parte do tempo contemporâneo advindo das intensas
transformações ocorridas durante o século XX, que são o excesso de tempo, o excesso de
espaço e o excesso de referências individuais.
O excesso de tempo é gerado pela diminuição do distanciamento necessário para assimilar os
acontecimentos históricos, levando-nos a uma percepção acelerada através dos meios de
comunicação de massa e digital.
O excesso de espaço muda a escala, pois o transporte ultrarrápido nos transporta em pouco
tempo a qualquer parte do mundo, e a comunicação em rede nos mantém conectados aos
lugares mais remotos da face da terra e do espaço. (AUGÉ. 2005, p 34)
Os parâmetros da modernidade e da supermodernidade podem auxiliar no entendimento do
período em que se implantou o metropolitano na cidade de São Paulo, a arquitetura e o
ambiente que condicionaram a conduta dos usuários e a sua percepção do entorno.
O metropolitano de São Paulo iniciou comercialmente a operação em 1974, introduzindo os
usuários da cidade a uma nova era de tecnologia da velocidade. Esse processo transforma a
paisagem urbana, criando vazios à espera de valorização estimulados pela especulação
imobiliária e a expulsão da população de baixa renda para periferias mais distantes, ao mesmo
tempo em que reformula os espaços urbanos em torno das estações de metrô, como praças,
comércio, serviços e outros equipamentos públicos, inclusive de integração com outros meios
de transporte como trens, ônibus e automóveis.
76
Um breve histórico das decisões que nortearam a implantação da rede metroviária para a
cidade de São Paulo permite compreender e situar diferentes perfis e demandas de usuários
em função das regiões que se organizam por classes sociais sinalizando reflexos na definição
e escolha de critérios.
A linha Norte/Sul se contrapôs à linha Leste/Oeste caracterizada, segundo estudos, pela
necessidade de atender a um maior contingente populacional de trabalhadores. Entretanto, a
implantação da Leste/ Oeste exigia acordos institucionais com as ferrovias estaduais e
federais, o que requeria negociações mais complexas e mais demoradas.
Essas premissas apontaram como primeira opção a linha Norte/Sul (1975), chamada de linha
azul, e a segunda, linha Leste/Oeste (1978), vermelha, tendo a Estação Sé, como ponto de
conexão das duas linhas.
A linha verde (1991), primeira linha não radial liga Vila Madalena à Vila Prudente, unindo os
espigões das avenidas Paulista e Dr. Arnaldo, eixo econômico e financeiro e polo de cultura
com os bairros da região sudeste e próximos à Via Anchieta, atingindo a região de
Sapopemba. Este traçado comporta o maior complexo hospitalar da cidade de São Paulo, que
pela importância e excelência abrange extensão estadual e nacional. A linha verde ainda se
conecta com as estações Paraíso e Ana Rosa da linha azul; e a linha lilás (2002) que liga
Capão Redondo à estação Santa Cruz da linha azul, ainda não concluída totalmente.
A linha 4 - amarela (em execução) conectará a região do Morumbi à Estação da Luz.
Articulará a futura linha 7 - celeste à linha 2 - verde, à linha 3 - vermelha e aos ônibus urbanos
provenientes de Taboão da Serra e eixo Francisco Morato e aos bairros V. Sonia, Butantã e
Pinheiros.
A construção da Linha Leste /Oeste, que entra em operação a partir de 1979, produziu
renovação urbana, acarretando desapropriações, consistiu na demolição de áreas deterioradas,
canalização de córregos, construção de viadutos entre outras operações. Passa a entrar em
operação com a linha Sé-Brás, seu fluxo se dá em direção contrária à Linha Norte/Sul.
O Terminal Tietê é inaugurado em 1982 e intensifica a demanda da infraestrutura
metropolitana.
O metrô de São Paulo busca uma aproximação com o usuário através da implantação do
programa Arte no Metrô como suporte.
77
Capítulo 4
ANÁLISE DOS CASOS
78
4.1. O CASO DA ESTAÇÃO SÉ E A RECONFIGURAÇÃO DA PRAÇA.
A Praça da Sé, espaço público por excelência, local de significativas manifestações, passou
durante os anos 70 por um processo de reconfiguração e intervenção visual.
Contrariando o projeto, o local passou a ser cada vez mais degradado, e com a implantação do
metrô em seu subterrâneo, pensou-se que a situação poderia ser revertida.
O que pesquisadores verificaram, como a museóloga, Radha Abramo, foi que a Estação da Sé,
desencadeou o processo de agravamento da situação. A praça imensa e os respiradouros do
metrô causaram a poluição visual do local.
Para o projeto de reestruturação, foi proposto o museu das esculturas, foram instaladas 15
esculturas na praça e uma no interior da estação, em 78 foram instalados dois murais na
estação: Colcha de Retalhos de Cláudio Tozzi e Sem Título de Renina Katz.
Os espelhos d’água e as cascatas, construídos em escala reduzida, não se integram ao
conjunto. Platôs, escadas impedem o cruzamento de maneira mais acessível. Como diz
Lucrecia Ferrara, “o espaço foi projetado para a escala do monumento e não do uso”.
Os elementos, as obras artísticas e mesmo os componentes da praça, não proporcionaram um
uso adequado aos usuários que contribuísse social e culturalmente para a diversidade do
público.
O projeto não condiz com o uso para lazer, manifestações cívicas, circulação ou informação
para a população.
A ilegibilidade do espaço, a poluição visual e por fim, o usuário como elemento catalisador,
passa a ser questionado neste contexto do projeto, pois o deixa de ser, na medida em que
ignora seus elementos, que encontra dificuldade em seu uso.
Seguindo o que já acontecia em estações do mundo inteiro, amplos espaços de mezaninos,
jardins internos e externos, corredores de acesso às plataformas e plataformas de embarque e
desembarque, ou seja, esses elementos infraestruturais, sem prefigurações, que aceitam
qualquer uso, passaram a serem entendidas como espaços propícios às intervenções, ao
surgimento dos eventos, registram tais solicitações, mas a qualquer momento voltam a sua
condição infraestrutural.
79
A inserção da arte aconteceu com a introdução de apresentações de música e de algumas
obras plásticas, os usuários responderem positivamente o que resultou no projeto Arte no
Metrô, idealizado pela historiadora e museóloga, Radhá Abramo, tomou forma com a
inauguração da estação Sé em 1978, mas só tomou força em 1988.
Portanto, apesar do Projeto Arte no Metrô não ser nosso objeto de estudo, mas no caso das
estações, arte, arquitetura e infraestrutura estão conceitualmente imbricadas na fundação do
metrô em São Paulo.
O significado da arte urbana e sua concretização no domínio público se dão em meio a
espaços permeados por conflitos. Marcio Glycério Freitas, um dos coordenadores do projeto
Arte no Metrô, afirma que entre as primeiras iniciativas para amenizar a descontinuidade
criada entre a Praça da Sé e a estação subterrânea que se descobriu “a monumentalidade das
estações e a adequação da arquitetura para conter obras de arte”. Em seu texto reforça a ideia
de estreitar relações com os usuários através da arte, A arte aliada à técnica poderia valorizar a
arquitetura e levar aos espaços áridos do metrô maior qualidade de vida.
A escala monumental da Praça produz o que observamos como microterritorialidades e
micropolíticas, criou-se grupos que se encontram em localidades estratégicas, são aqueles
destinados à venda de drogas, moradores de rua que unem-se para dormirem com mais
segurança em outros pontos. Ao mesmo tempo, há espaço para as pessoas que desejam apenas
sentar-se e permanecer na praça, realizar atividades esportivas, enfim, dinâmicas peculiares
acontecem também pela descontinuidade entre o espaço e a estação, diríamos que
movimentos de instauração de lugares e não lugares são continuamente produzidos, aqui e
alhures.
A estação Sé, assim como a praça, possui uma escala monumental, a arte enquanto suporte
segundo o depoimento de um dos coordenadores do Projeto Arte no Metrô, procurou
amenizar esta descontinuidade, que constatamos ao vermos no interior do metropolitano em
muitos pontos, espaços subutilizados.
Entretanto, há uma tentativa de gerar urbanidade quando ocorre a inserção da claraboia e a
integração do ambiente subterrâneo com o entorno que se dá nestas aberturas para a
penetração da luz natural.
80
Estação Sé, sombra em movimento da queda d’água.
Foto: Wellington Nagano
Fonte: Foto da Autora
81
Fonte: Foto da Autora
Fonte: Foto da Autora
82
Fonte: Foto da Autora
Estação Marechal Deodoro. Fonte: skyscrapercity.com
83
Estação Marechal Deodoro. Fonte: Metrô
Na estação Marechal Deodoro, acontece algo semelhante, grandes vãos são abertos para a
entrada de Luz natural, onde encontra-se um projeto paisagístico e obras de arte, mas não há
articulação alguma com a cidade, já que este espaço é inacessível e toda a estação encontra-se
cercada por grades.
84
Estação Sé. Fonte: Metrô
85
Estação Sé. Fonte: Metrô
86
Estação Sé. Fonte: Metrô
87
Fotos: Praça da Sé. Fonte: Ewely Branco Sandrin
88
4.2. Estações de Metrô: Instauração de Não Lugares?
O conceito de lugar ocupa uma posição fundamental nas reflexões sobre a arquitetura,
recentemente devido aos avanços tecnológicas, reflexões estas, mais afeitas à ideia de aldeia
global desenvolvida por MacLuhan que precipitam o homem para uma cultura do lugar sem
lugar.
“O lugar é o espaço habitado e a garantia de coerência e ligação entre as
coisas e o mundo. É através do lugar que a realidade é alcançada e é por
meio da realidade que o lugar é mantido. O ser do lugar está na qualidade de
ser causa, isto é, de não ser inerte ou passivo, o lugar é causa de, e não
causado por”. (SIMÃO, 2011)
A identidade humana e a liberdade estão ligadas ao pertencer a um lugar e a arquitetura seria a
concretização do seu habitar.
A hospitalidade em sentido Derridiano é infinita, incondicional, experiência do acolhimento
ao estrangeiro, movimento do pensamento aberto e voltado ao impossível ou ao outro, à
iminência do que vem e acontece.
No pensamento derridiano a hospitalidade é sempre uma coisa desconhecida, não é do
domínio do saber tornado programa de ação, mas do domínio da invenção, do pensar e este já
é paradoxalmente o agir, responder em ato, “para quem hospitalidade e responsabilidade
incondicionais são o verso e o reverso de uma mesma atitude”. (BERNARDO, 2005)
Já Marc Augé (1994), defende que os lugares são identitários, históricos, um espaço que não
se configura como relacional, identitário ou histórico, constituirá um não lugar.
Lugares e não lugares seriam polaridades fugidias, o primeiro nunca é totalmente apagado e o
segundo não se realiza totalmente. “Os não lugares, contudo, são a medida da época; (...), as
vias férreas, ferroviárias, rodoviárias e os domicílios móveis considerados “meios de
transporte”, os aeroportos (...), enfim redes a cabo ou sem fio, que mobilizam o espaço
extraterrestre para uma comunicação tão estranha que muitas vezes só põe o indivíduo em
contato com uma outra imagem de si mesmo”. (AUGÉ, 1994)
Augé segue com a definição de Michel de Certeau,
“Ele não opõe, por sua vez, os “lugares” aos “espaços”, como os lugares aos não lugares. O
espaço para ele é um lugar praticado, “um cruzamento de forças motrizes”: são os passantes
que transformam em espaço a rua geometricamente definida pelo urbanismo como lugar”.
89
Para Michel de Certeau, praticar o espaço é a experiência de no lugar, ser outro e passar ao
outro, experiência da diferenciação e do reconhecimento de si.
Porém como diz Augé (1994), se espaço for a consideração da prática dos lugares, existem
espaços onde o indivíduo é a penas espectador, sem que a natureza deste o importe de fato.
Do ponto de vista dos artistas e do Projeto Arte no Metrô, Regina Silveira, por exemplo,
define os espaços das estações como “secos e limpos”, passagens “despersonalizadas para
trânsito rápido”, “olhares indiferentes”, características interpretadas como um “desafio para os
artistas” (SILVEIRA, 2012). Para Amélia Toledo, “são um campo de percurso de pedestres e
ao mesmo tempo estágios desse percurso. Locais de pedestres que convivem com o piso, com
as paredes, com o teto” (TOLEDO, 2012). Carlos Fajardo, em referência ao livro de Michel
de Certeau, “Invenção do Cotidiano”, entende que lugares como metrô, estações de trem, “são
o que a gente pode dizer que é o espaço é um lugar praticado”, assim a rua geometricamente
definida por um urbanismo, é transformada em espaço pelos pedestres” (FAJARDO, 2012).
Para Waldemar Zaidler, em entrevista, não se tratam de espaços de passagem e nem de não
lugares.
“A questão do espaço não é uma questão inerente ao espaço. É uma troca e
que envolve o ser vivente naquele espaço. A ontologia do espaço é dividida
com o ser que nele vive. O espaço de passagem está muito mais ligado a
uma questão da ambiência, que é revelada neste espaço, e a ambiência
depende de quem tá ali. Então qualquer espaço é espaço de passagem e
nenhum espaço é espaço de passagem”. (ZAIDLER, 2012)
Os artistas, Regina Silveira, Amélia Toledo, Carlos Fajardo e Waldemar Zaidler, concederam
estes depoimentos à pesquisadora, Ewely Branco Sandrin em 2012.
No espaço que configura a Praça da Sé, por sua monumentalidade, assim como, na estação,
inscrição material do metroviário na cidade, observa-se que de fato, como afirma Lucrécia
Ferrara, “o espaço foi projetado para a escala do monumento e não do uso”, não há uma
prática efetiva do espaço, nem ao menos o reconhecimento de si, pela própria ilegibilidade do
lugar.
Portanto, também não há geração de urbanidade; pois o indivíduo é apenas espectador e o que
buscamos é a prática do espaço, a sua tomada pelo usuário para as mais diversas
manifestações.
90
De fato, o metrô é uma linha de deslocamento, mas sua força projetual pode ativar lugares,
tanto nos pontos que liga em escala urbana, quanto em escala local, devido às possibilidades
de apropriação que pode gerar; é o caso da estação Sumaré, aonde a estação e a linha de
deslocamento do metrô que chega e compõe-se com o viaduto, promovem diferenciados usos,
inclusive permanências, prática de esportes na estrutura, o viaduto, e não apenas translado.
São estas arquiteturas infraestruturais que provocam o acontecimento que buscamos como
referências de projetos que deslocam, desestabilizam para gerar conflito e criação.
91
4.2.1. O caso da Estação Sumaré
A maior parte dos espaços em arquitetura encontra-se pré-configurada em programas que
refletem culturas e valores rereferentes a uma época. Ao contrário, os espaços infraestruturais,
como já o dissemos, funcionam momentaneamente dissociados de forma e conteúdo.
A Estação Sumaré suporte adicional, o programa inscrito no já existente, passa por um
processo de mutação de suas funções, pontas de desterritorializações e reterritorializações, ou
seja, o viaduto da Av. Doutor Arnaldo que compõe com a estrutura metroviária, e desta
maneira, potencializa usos diversos para si, como a prática de esportes, como o rope jump, por
exemplo.
Capazes de superar aquilo que parece ser da natureza do objeto ou território para que a partir
desta condição frágil se estabeleça um movimento de contaminação suplementar, uma
condição hibridizada, assim discutem-se possibilidades de “des-limitação” do objeto
arquitetônico e de mediação com a cidade.
A infraestrutura, sempre ocultada, passa a desempenhar um importante papel formal,
funcional e simbólico da própria arquitetura e da cidade, flexíveis quanto às possibilidades de
ocupação, esses suportes vazios estruturam e organizam o funcionamento dos espaços
principais.
O espaço metropolitano é constituído por uma justaposição de territórios em permanentes
tensões e articulações, agenciamentos que garantem a condição de um poderoso suplemento,
constituindo uma ameaça ao estabelecido.
O programa adicional inscrito em uma condição arquitetônica ou urbana produz uma nova
racionalidade que se permite contaminar por outra intuição de espaço, um meio interativo,
constituído por eventos.
Daí justifica-se a abordagem da averiguação em consoante com o pensamento filosófico pósestruturalista, responsável pelos deslocamentos de verdades históricas, tecendo portando, uma
crítica aos sentidos e significados aceitos como princípios arquitetônicos incontestes.
A arquitetura enquanto inscrição material possui a potencialidade de desajustar o sentido dado
ao ressignificar um lugar. Resta-nos buscar estratégias de reativação urbana, de algo que
construa dinâmicas capazes de provocar reações.
92
A virtualização é um dos vetores de criação de realidade, uma filosofia do acontecimento. A
virtualização não se contenta em aniquilar o tempo ou o espaço, ela inventa qualitativamente
novas espacialidades, produz contaminações constitutivas.
O virtual é um complexo problemático, um complexo de situações que acompanha um
acontecimento e exige uma resolução, reorganiza uma problemática que receberá diversas
interpretações e será chamada de processo de atualização. “Por outro lado, o virtual constitui a
entidade: as virtualidades inerentes a um ser, sua problemática, o nó de tensões, de coerções e
de projetos que o animam , as questões que o movem, são uma parte essencial de sua
determinação”. (LÉVY, 1996, p. 16)
Em arquitetura, a atualização de um projeto em situação de utilização desencadeia conflitos,
desbloqueia situações, desqualifica certas competências, instaura uma nova dinâmica,
micropolíticas urbanas se formam e se desfazem e instauram uma condição frágil para o
surgimento da alteridade, configura o movimento do devir-outro, enfim a atualização
responde ao virtual, à problematização, mais do que anunciar um novo pensamento, ela é uma
suma de pensamentos que relaciona por expressarem, em maior ou menor grau a diferença.
Proporcionamos situações urbanas, que denominamos agenciamentos programáticos ao
articular elementos heterogêneos que ao interagirem, produzem pontas de desterritorializações
e reterritorializações em territorialidades aparentemente estáveis, é o caso do estudo que
fazemos, com a adição das estações de metrô, interferências e reações são provocadas, com
isso, capacidades urbanas antes reduzidas, por intermédio dessa articulação, formam um
microecossistema em permanente influência com a cidade, geramos outras situações, um
porvir urbano, essas localidades se fortalecem.
Ao deformar o existente propiciamos que uma situação ou objeto potencializado em seu ser
(um local na cidade, um viaduto, como o Doutor Arnaldo, que citamos) adquira a
possibilidade de um “vir a ser”, fazendo com que venha a fazer parte de uma nova condição
espaço-temporal. Algo como um para além da obra, além da existência, que se compõem com
o que já pertencia ao território, à pré-existência, e posiciona-se com o outro, trazendo a
emergência da alteridade, hibridizada, fundida a algo para além dela.
Se tomarmos o projeto da estação de metrô Sumaré em São Paulo, sob o viaduto da Avenida
Doutor Arnaldo que atravessa Avenida Sumaré, compondo com o viaduto, sua estrutura é
93
independente, adição, poderoso suplemento que fortaleceu tanto a avenida quanto o próprio
viaduto, que também é uma linha de deslocamento na cidade.
Fortalecimento dos dois eixos, tanto o transversal, no qual o viaduto e a própria linha do
metrô encontram-se, rotação do eixo da linha verde e da composição do metroviário,
tradicionalmente implantado longitudinalmente na cidade, fortalecimento também do eixo
longitudinal composto pela avenida, pela própria arquitetura da estação com sua visibilidade,
volta-se para a cidade e vice-versa, em seus vidros temperados e contemplados com outra
adição, as obras de Alex Fleming, O corpo e a identidade, obras que integram a instalação da
Estação Sumaré do Metrô de São Paulo que remetem a fotos de documentos burocráticos
culturalmente revivificadas por textos literários de escritores brasileiros.
Fonte: Foto da autora
Seus elementos geram uma percepção mutante: o viaduto compõe-se com o metrô, deslocam
os sentidos dados, ao mesmo tempo em que adicionam o lugar da permanência, o abrigar,
habitar, com o uso da estrutura (o viaduto), o uso da localidade facilitado pela linha
metroviária, à contemplação da Avenida Sumaré possibilitada pela visibilidade da Estação em
seus espaços constituídos por vidros temperados e da obra de Alex Fleming que leva a
94
construção de um olhar sobre a nossa própria identidade, constitui também o local da
passagem e da articulação entre situações, o fortalecimento da linha conectora que em sua
existência reduzida localmente gera urbanidade ao conectar as duas pontas (as extremidades
da Linha Verde do metrô), uma organização que se atualiza numa pluralidade de versões.
O viaduto, momentaneamente se “desterritorializa”, ao abandonar o espaço geográfico para
ocupar o espaço das problematizações e atualizar-se, ao abrigar a Estação Metroviária,
desabilita sua função de linha conectora e de deslocamento, diríamos que assume um estado
de não presença para inscrever o território de permanência, onde se re-territorializa
primeiramente com uma nova qualidade e novamente se verifica o mesmo processo no metrô
enquanto linha de deslocamento.
Fonte: Felipe Golfeto
95
Fonte: blogspot.
Viaduto da Avenida Doutor Arnaldo visto da Avenida Sumaré
Fonte: http://blagus.blogspot.com.br/2009/07/vida-de-ponte.html
No parapeito do viaduto Doutor Arnaldo para saltar, os esportistas denominam esta prática de “rope jump”
A expansão da comunicação e generalização dos transportes rápidos participa do mesmo
movimento de virtualização da sociedade, da “mesma tensão em sair da presença” (LÉVY,
1996, p. 23). A revolução dos transportes metamorfoseou o espaço e cada novo agenciamento,
96
acrescenta um espaço-tempo, uma cartografia especial, em que as durações se interferem e se
respondem.
A força dos projetos encontra-se, em um sentido deleuziano, nas situações que pode gerar
pelos agenciamentos programáticos, ou seja, estratégias de montagem dos suportes que
podem proporcionar articulações de maneira não programada e situações instáveis com
relação aos usos.
Uma situação definida por um “entre ser uma coisa e outra”, produzido na “articulação do
definido em direção ao indefinido” (GUATELLI, 2012, p. 23). Ou seja, permite que a partir
de algo existente, emane o outro, o novo, nesse processo, provocado pela troca construída
entre os projetos, um ser- com, que se fortalece ao constituir-se com algo além dele próprio,
corroboram para que reforcem e re-signifiquem os objetos, o espaço.
A força destas intervenções, como o dissemos, encontra-se além delas, está no que produzem,
em um primeiro momento, no deslocamento dos significados associados aos projetos
considerados, que propicia manifestações geradas com as diversas apropriações. Segundo
Guatelli “a dimensão infraestrutural da arquitetura representa a possibilidade do
desprendimento de pontas da cadeia previamente montada em direção a encadeamentos
outros” (GUATELLI, 2012, p. 106).
A função infraestrutural nas cidades sempre foi o de articular dois pontos distantes, sem
participar das dinâmicas sociais locais, entretanto observamos que um processo de mudança
vem se estruturando, as infraestruturas passam a ser compreendidas como projetos
intencionais potencializadores de acontecimentos, ou seja, ao facilitar o aparecimento de
manifestações imprevistas, que seriam os eventos, a prática infraestrutural toma a condição de
estratégia técnica, é articuladora e sem condicionar formas ajustadas a uma única função, mas
abertas as diferentes possibilidades de apropriação, transformam-se em arranjos que
asseguram o vigor das cidades.
Espaços dominantes motivariam a ocupação desses espaços infraestruturais, estes, forças de
significação, por sua flexibilidade de apropriação, seriam intensificadores de usos também dos
espaços dominantes, os objetos, a arquitetura edificada ou os lugares que muitas vezes são
ativados enquanto tal, por essas infraestruturas.
A estação Jardim São Paulo, localizada na zona Norte da cidade, por exemplo, possui um
acesso em diferentes níveis ao jardim, propiciando lugares ventilados e luminosos, pois a
97
estação está localizada em um fundo de vale, e suas plataformas de embarque alcançam a cota
de dez metros abaixo da terra.
As águas pluviais foram canalizadas através de um tubo de concreto armado protendido que
como um canal elevado cruza transversalmente a estação. Alguns pontos organizam a cidade
em torno dele e essas decisões técnicas acabam por responder a uma instalação humana
A lógica das estações projeta uma ideia na horizontal e vertical e como mencionam os
arquitetos Abílio Guerra e Cristina Jorge Camacho, “pode chegar a ser útil e fascinante
porque começar a descrever algumas estações é praticamente narrar algumas partes da cidade;
ambas as histórias são inseparáveis” (2000, e PP. 2).
Na Linha 1- Azul, os arquitetos tiraram partido das interações entre o terreno e a construção
subterrânea, relação que pode ser observada nos elementos estruturais das estações.
Com a inserção da claraboia no centro da Estação Sé, o paradigma de isolamento subterrâneo
das estações é superado.
Estação Marechal Deodoro, obra G.Guanaes
Estação Sé.Foto: Cristiano Mascaro
98
Aberturas maiores voltadas à superfície, platôs, insuflam à ocupação desses espaços, para que
sejam usados das mais diferentes maneiras.
Estação São Bento
Segundo o arquiteto Ivan Piccoli (SANTOS, 2000, p. 60-63) a arquitetura foi o elemento que
provocou a busca por novos conceitos e novas tecnologias de construção das estações no
trecho sob a Av. Paulista, a forma curva resultante do método NATM, túnel mineiro adotado
como sistema construtivo resultante de novas técnicas de escavação do solo, foi determinante
para execução das plataformas.
A redução dos impactos no ambiente pode ser conferida nas coberturas dos acessos às
Estações, através do uso de materiais translúcidos, a presença do metrô é marcada com o
mínimo de interferência na paisagem.
O arquiteto Abílio Guerra cita um exemplo bastante interessante e emblemático do quanto a
lógica das infraestruturas estão imbricadas com a das cidades. No bairro do Chiado, numa
posição estratégica, uma estação de metrô levava a alguns armazéns e através de um túnel se
ligava com outra via importante.
A Estação, ‘Baixa-Chiado”, revestida de azulejos brancos e dourados, aproveitam sistemas de
iluminação indireta para disseminar a luz, obra de Ângelo de Sousa, que proporciona um
deslocamento subterrâneo que emerge abaixo dos sótãos de um velho edifício. “Siza, neste
projeto viu que não havia nada que pudesse substituir o trabalho do tempo: o que o tempo
cria, nós não podemos projetar. Agora o tempo pertence ao metrô” (GUERRA; CAMACHO,
2000.).
O que observamos nestes projetos, em especial o caso da Estação Sumaré que compõe com o
viaduto Doutor Arnaldo e das demais Estações do Metroviário de São Paulo mencionadas,
99
Estação Sé, Marechal Deodoro, São Bento e Jardim São Paulo, é o quanto a lógica das
Infraestruturas, espaços livres de pré-configurações, estão entrelaçadas com a cidade, sua
força de projetação encontra-se nas dinâmicas e situações montadas.
São situações que contemplam questões relativas ao espaço, que ao reativar sistemas urbanos
que em nível local possuem sua existência reduzida, geram urbanidade, ao promover
interações e acontecimentos imprevistos, que produzem outras rotinas e lógicas.
100
4.2.2. O Caso da Estação Tamanduateí
A estação Tamanduateí integra as vias da CPTM com as vias do metrô, a estação está situada
entre a Rua Guaramiranga e a Avenida Presidente Wilson. Em seu entorno está o Central
Plaza Shopping a Leste, galpões industriais a Oeste e ao Sul e o viaduto Grande São Paulo ao
Norte.
A estação Possui um mezanino compartilhado, entre as plataformas elevadas do metrô e as
plataformas da CPTM, na superfície.
Organiza-se da seguinte maneira:
Térreo- Acesso à passarela de transposição pela Guaramiranga de um lado e a Presidente
Wilson de outro.
Segundo nível- intermediário: salas operacionais do metrô e da CPTM.
Terceiro nível- mezanino: Hall de distribuição do metrô e da CPTM.
Quarto nível- Plataformas do metrô.
Corte Longitudinal da Estação Tamanduateí. Fonte: Metrô
101
Imagem aérea da Tamanduateí.
Fonte: Metrô
Os ambientes foram construídos sob as vias do metrô, com exceção da passarela de
transposição que se destaca em paralelo ao mezanino, ligada a ele por duas passarelas
secundárias transversais à primeira, passarelas, escadas rolantes, são protegidas por pórticos
de concreto armado.
102
Vista aérea da estação Tamanduateí.Fonte: coisasdaarquitetura.wordpress.com
Vista aérea da estação Tamanduateí. Fonte: coisasdaarquitetura.wordpress.com
103
Fotos Estação Tamanduateí. Fonte: Metrô.
104
Exceto pela passarela de transposição, a estação está dividida em duas partes, de um lado, as
áreas do metrô e do outro, as áreas da CPTM, o mezanino é o único espaço compartilhado.
O acesso às plataformas da CPTM é feito a partir de dois conjuntos de escadas fixas e
rolantes, um de cada lado do mezanino. A plataforma Nordeste da CPTM servirá à futura
linha do expresso ABC, prevista no plano de expansão da rede.
As plataformas do metrô são acessadas por dois conjuntos de escadas fixas e rolantes que
sobem ao nível superior em uma estrutura de concreto que sobressai. As plataformas laterais
servem às duas vias.
O fechamento é feito em vidro e fixado aos pórticos metálicos.
Corte Transversal da Estação Tamanduateí. Fonte: Metrô
4.2.3 A integração Física
O mezanino compartilhado da Estação Tamanduateí está situado sob as vias do metrô.
Atravessa transversalmente as vias da CPTM.
A transferência gratuita dos passageiros é feita longitudinalmente no mezanino.
O Projeto
O cruzamento da linha do metrô se dá sobre a ferrovia na superfície em uma região onde há
predominância de galpões industriais, onde a estrutura é compartilhada. O mezanino único
sob as vias do metrô e transversal às linhas da ferrovia na superfície. As circulações
prevalecem em sentido longitudinal e transversal.
105
A passarela de transposição livre da ferrovia, separada do mezanino, conduz os passageiros
por passarelas secundárias.
Proporcionando melhor organização espacial do fluxo e facilidade de orientação, o
dimensionamento do mezanino e das passarelas não apresenta áreas ociosas.
A transferência gratuita é facilitada pelo mezanino integrado, isto facilita o fluxo dos
passageiros.
Implantação do mezanino integrado na estação Tamanduateí.
Fonte:
A separação institucional do metrô e da CPTM aparece nos elementos construtivos, tipos
diferentes de coberturas nas plataformas, elementos de vedação vermelhos para a CPTM e
brancos para o metrô e estruturas de concreto aparente com formas diferentes no fechamento
das escadas que levam às plataformas.
106
Podemos dizer que apenas destes pontos de vista, construtivos desde o posicionamento das
estruturas de circulação até o uso de cores para uma maior legibilidade do espaço, já nos
trazem novos elementos para análise das estações de metrô.
Enquanto a Sé principia uma articulação com a cidade e com os usuários, mas ainda cria estes
espaços vazios, devido às escalas monumentais e pela falta de legilibilidade, que a fizeram
gerar a necessidade de um suporte programático adicional, como é o caso do Projeto Arte no
Metrô, para uma aproximação e melhor uso infraestrutural do espaço por parte dos usuários, a
estação Sumaré garante a primazia da arquitetura quando propõe uma estrutura que tece
conexões variadas com a cidade, pela potencialização de infraestruturas distintas, pela geração
de urbanidade e inventividade nos usos criados e pelo vínculo com a obra que exerce um
impacto inusual, de igualdade identitária, com os usuários do metroviário e com os habitantes
da cidade que trafegam pela Avenida Sumaré, somos todos nós, estamos nos enxergando em
nossas estruturas urbanas.
A estação Tamanduateí, com este caráter de conexão com a cidade e visibilidade, articula
territórios, onde há uma presente tensão entre situações.
A favela da Vila Prudente à Heliópolis, conectadas, posiciona-se com outros elementos da
região, trazem outras possibilidades de existência, linha conectora que desloca e liga, reativa
um sistema urbano, há a invenção de um porvir urbano.
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
108
Ao contrário de uma arquitetura que induz a determinados usos pelas relações entre forma e
função, advindos dos idealismos modernos, a arquitetura infraestrutural, aberta ao
acontecimento e à apropriação inesperada, inusual que só os usuários e as dinâmicas que a
cidade gera podem provocar, favorecem o livre pensar e as ações emancipadoras, as ações
sociais são fortalecidas devido a fragilização de sentidos.
Segundo Deleuze (1987), os corpos são definidos por sua capacidade de interagir com outros
corpos, assim como a arquitetura em sua inscrição material se insere no mundo, interatuando.
Os agenciamentos programáticos, articulando diversas situações em constante tensão,
juntando elementos heterogêneos, que nesta relação produzem cadeias de desterritorializações
e reterritorializações em territorialidades aparentemente estáveis, conduzindo a imaginação
um campo fértil, a possibilidade da escolha, à produção de novas ideias e ao porvir.
Possibilitando o surgimento de um campo de possibilidades pelo enfraquecimento das
verdades absolutas, teríamos assim, uma arquitetura de perfil difuso, em que os espaços
vazios, expectantes, nos incentivariam a uma experiência inconclusa, heterogênea.
Constituiremos espaços de hospitalidade incondicional, de uma arquitetura que não institui
um domínio, mas abre-se a novas humanidades possíveis.
Projetar com o pensamento voltado para programações espaciais é pensar em práticas sociais
com potencial para eclodir nesses suportes arquitetônicos, despertando a intensidade do lugar.
Esses espaços Infraestruturais que entendemos aqui como espaços suportes, seriam capazes de
registrar os eventos que os marcariam sem, no entanto, adquirir sentidos adequados
permanecendo continuamente em processo, onde o programa será continuamente solicitado e
moldado por ações.
Pensamos, nestas relações entre arquitetura, cidade e homens, o fazer coletivo, em como são
apreendidas as qualidades do espaço e dos objetos não condicionados aos pragmatismos, mas
sob a perspectiva de quem vivencia os espaços, privilegiando em nossa investigação outras
estratégias de construção da cidade.
109
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMO, Radhá. A filosofia do projeto Arte no Metrô. In: Companhia do Metropolitano de
São Paulo. Arte no Metrô. São Paulo: Alter Market, 1994.
ABRAMO, Radhá. Praça da Sé, Cidade Universitária, Metrô. In: Seminários de Arte Pública
(I) SESC. São Paulo: SESC, 1995.
ALLIEZ, Éric. Deleuze Filosofia Virtual (Trad. Heloísa B. S. Rocha). São Paulo: Ed. 34,
1996.
ALLIEZ, Éric. Gilles Deleuze: Uma Vida Filosófica (coord. da trad. Ana Lúcia de Oliveira).
São Paulo: Ed. 34, 2000.
ARANTES, Otília B. F., ARANTES, Paulo E., Um ponto Cego no Projeto Moderno de
Jürgen Habermas. Arquitetura e Dimensão Estética depois das Vanguardas. São Paulo:
Brasiliense, 1992.
ARANTES, Otília. O lugar da Arquitetura depois dos modernos. São Paulo: Edusp, 1995.
ASCHER, François. Os novos princípios do urbanismo. São Paulo: Romano Guerra, 2010.
AUGÉ, Marc. Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Trad.
Maria Lúcia Pereira. Campinas, SP: Papirus, 1994.
AUGÉ, Marc. Por uma antropologia dos mundos contemporâneos. trads. Clarice Meireles e
Leneide Duarte. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.
BALLANTYNE, Andrew. Deleuze & Guattari for Architects. New York:Routledge, 2007.
BARBOSA, Ane Mae. Alex Flemming, antologia nos limites do corpo. Arquitextos, São
Paulo,
02.015,Vitruvius,
aug
2001
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/02.015/858>. Acesso: 15/09/2011
BARTALINI, Vladimir. Os córregos ocultos e a rede de espaços públicos urbanos.
Arquitextos,
São
Paulo,
09.106,
Vitruvius,
mar
2009
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/09.106/64>. Acesso: 18/11/2012
BATES, Donald. Una conversación entre Líneas con Daniel Libeskind. Revista El Croquis:
Daniel Libeskind 1987-1996. Madri, vol.80, nº4, 1996.
110
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2001.
BAUMAN, Zygmunt. O mal estar da pós- modernidade. Trads. Mauro Gama & Cláudia
Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
BENNINGTON, Geoffrey & DERRIDA, Jacques. Jacques Derrida. Trad. Ana Maria Skinner.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996.Tradução da primeira edição francesa, publicada em
1991 por Éditions Du Seuil, Paris, na coleção Les Contemporains.
BERGSON, Henri. A Evolução Criadora. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
BERNARDO, Fernanda. Mal de Hospitalidade. In: Evando Nascimento (org). Jacques
Derrida: pensar a desconstrução. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2005.
BEY, Hakim. TAZ: Zona Autônoma Temporária. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2004.
CACHE, Bernard. Earth Moves: The Furnishing of Territories. Traduzido por Anne (tradutor)
Boyman e Michael (editor) Speaks. Cambridge, MA e London: MIT Press, 1995.
CARMELO, Luis. Signo, Tempo e Consciência: Gilles Deleuze e Antônio Damásio.
Disponível em http:// www.bocc.ubi.pt/pag/carmelo-luis-deleuze-damasio.pdf. Acesso em 20
de Junho de 2005.
CARVALHO, Luis Fernando, Medeiros. Sobre a Hospitalidade. In: Evando Nascimento
(Org.). Jacques Derrida: Pensar Desconstrução. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2005.
CASEY, Edward. The Fate of Place: A Philosophical History. University of California Press,
1998.
DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. São Paulo: Ed. 34, 2004.
______________. Nietzsche e a Filosofia..Lisboa: Rés Editora, s/d.
______________. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 1998.
______________. Espinosa Filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002.
______________. A Dobra: Leibniz e o Barroco. Campinas:Papirus Editora, 1988. Tradução
Luiz B. L. Orlandi.
111
______________. O que é a filosofia? Col. Trans, 2 ed., São Paulo:Editora 34, 1997 Tradução
Bento Prado Jr. E Alberto A. Muñoz.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs. Devir-Intenso, Devir-Animal, DevirImperceptível. Volume IV. Col. Trans, Rio de Janeiro: Ed. 34, 1997.Trad. Suely Rolnik.
______________________________. Mil platôs: Capitalismo e Esquizofrenia. Volume I.Col.
Trans, Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995.Trad. Aurélio G. Neto e Célia P. Costa.
______________________________. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Volume II. Col
Trans, Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995. Ana L. de Oliveira e Lúcia C. Leão.
______________________________. Mil platôs: Capitalismo e Esquizofrenia. Volume III.
Rio de Janeiro: Ed. 34, 1996. Trad. Aurélio G. Neto, Ana L. de Oliveira, Lúcia C. Leão, e
Suely Rolnik.
______________________________. Mil platôs: Capitalismo e Esquizofrenia.Volume V.
Rio de Janeiro: Ed. 34, 1997. Trad. Peter P. Pelbart e Janice Caiafa.
DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. Trad. Eloísa Araújo Ribeiro. São Paulo: Ed.
Escuta, 1998.
DUARTE, Fábio. Crise das matrizes espaciais: arquitetura, cidades, geopolítica e
tecnocultura. São Paulo: Perspectiva, 2002.
DUARTE, Fábio. Arquitetura e Tecnologias da Informação- Da Revolução Industrial à
Revolução Digital. São Paulo: Fapesp/ Ed. Unicamp, 2003.
EISENMAN, Peter. O fim do clássico: o fim do começo, o fim do fim. In: Kate Nesbitt.
(Org). Uma Nova Agenda para a arquitetura: Antologia Teórica 1965-1995. São Paulo: Cosac
Naify, 2005.
FERRARA, Lucrécia D’Alessio. Olhar Periférico São Paulo:Edusp, 1993.
FLUSSER, Vilém. Pós- História. Vinte Instantâneos e um Modo de Usar. São Paulo: Livraria
Duas Cidades, 1983.
FOUCAULT, Michel. As Palavras e as Coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1987. Tradução
Salma T. Muchail.
112
FRANCASTEL, Pierre. Arte e Técnica nos Séculos XIX e XX. Lisboa: Edições Livro do
Brasil, 1963. Tradução Humberto D’Ávilla e Adriano de Gusmão
FUÃO, Fernando Freitas. O sentido do espaço. Em que sentido, em que sentido? Revista
Eletrônica
Vitruvius,
arquitexto
048.
Disponível
em:
<
<http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq048/arq048_02.asp>. Acesso: 28/11/11.
GREINER, Christine. O corpo: Pistas para Estudos Indisciplinares. São Paulo: Annablume,
2005.
______________. Corpo e Processos de Comunicação. Fronteiras, Estudos Midiáticos, Rio
Grande do Sul, v. 3, n. 2
______________. O Meio é a Mensagem: Porque o Corpo é Objeto da Comunicação. Húmus,
Caxias do Sul, v. 1, n. 1
GREINER, C; KATZ, H. A Natureza Cultural do Corpo. Lições de Dança 3. Rio de Janeiro:
UniverCidade, 2001.
GUALANDI, Alberto. Deleuze. São Paulo: Estação Liberdade, 2003.
GUATARRI, Félix. Caosmose: Um Novo Paradigma Estético Tradução Ana Lúcia de
Oliveira e Lúcia Claudia Leão. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.
GUATELLI, Igor. Arquitetura dos Entre-Lugares: sobre a importância do trabalho conceitual.
São Paulo: Ed. Senac, 2012.
GUATELLI, Igor. O MAXXI e o delírio de Zaha Hadid em Roma. Projetos, São Paulo,
11.129,Vitruvius,
set
2011<
http://www.arquitextos.com.br/revistas/read/projetos/11.129/4043>
acessado
em:
21/11/
2011.
GUATELLI, Igor. O(s) Lugar(es) do entre na Arquitetura Contemporânea. São Paulo: USP,
2005. Tese de Doutoramento, Filosofia moderna francesa (área de concentração Língua e
Literatura Francesa).
GUERRA, Abilio; CAMACHO, Cristina Jorge. O metrô de São Paulo e outras histórias
metroviárias
(editorial).
Arquitextos,
São
Paulo,
01.006,
Vitruvius,
nov
2000
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.006/953>. Acesso: 18/11/2012
113
LEVY, Pierre. O que é o virtual? São Paulo: Ed. 34, 2003
______________. A Inteligência Coletiva. Por uma Antropologia do Ciberespaço. 2. ed., São
Paulo: Edições Loyola, 1999. Tradução Luiz P.Rouanet.
LYOTARD, Jean- François. O Pós-Moderno.3. ed., Rio de Janeiro: Agir, 1988. Tradução
Ricardo C. Barbosa.
NASCIMENTO, Evandro (org.). Jacques Derrida: pensar a desconstrução. São Paulo: Estação
Liberdade, 2005.
NOVAK, Marcos. Transmitting Architecture: The Transphysical City. Novembro, 1996.
Disponível em: <http://www.ctheory.net/articles.aspx?id=76>. Acessado em: 20/06/04
PALLAMIN, Vera M. (org); LUDEMANN, Marina.(coord.). Cidade e Cultura: esfera pública
e transformação urbana. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.
PALLAMIN, Vera M. Arte Urbana: São Paulo: Região Central (1945-1998): Obras de caráter
temporário e permanente.São Paulo: Annablume: Fapesp, 2000.
PEIXOTO, Nelson Brissac. Intervenções Urbanas: Arte/ Cidade. São Paulo: Ed. Senac, 2002.
PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens Críticas: Robert Smithson: arte, ciência e indústria. São
Paulo: Ed. Senac; Fapesp, 2010.
PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens Urbanas. São Paulo: Ed. SENAC, 1996.
ROSSETI, Regina. Movimento e Totalidade em Bergson: a Essência Imanente da Realidade
Movente. São Paulo: Edusp, 2004.
ROSSI, Dorival. Transdesign- Folias da Linguagem, Anarquias da Representação. São Paulo:
PUC- SP, 2003. Tese de Doutoramento, Programa de Estudos Pós-Graduados em
Comunicação e Semiótica.
SANDRIN, Ewely Branco. Arte/Arquitetura/Design: Tecnologias atuais nas estações de
metrô de São Paulo. SãoPaulo: FAUUSP, 2012. Tese de Doutoramento, Design e Arquitetura.
SANTOS, Ivan Lubarino Piccoli. Arquitetura Subterrânea do Metrô de São Paulo, evolução e
novos projetos. Engenharia (São Paulo), São Paulo, v. 539, p. 60-63, 2000.
114
SILVA, Robson Canuto. Urbanismo Paramétrico: Parametrizando Urbanidade. Recife:
Editora Universitária: UFPE, 2010.
SIMÃO, Inês, C. O que é a Arquitetura? Gilles Deleuze e a Ontologia da Arquitectura.
Dissertação de Mestrado. Universidade Técnica de Lisboa, 2011. Faculdade de Arquitectura.
SOUZA, Gabriel G. E. Territórios Estéticos: A experiência do Projeto Arte Cidade em São
Paulo (1994-2002). São Paulo: Ed. Annablume, 2011.
TSCHUMI, Bernard. Architecture and Disjunction. Cambridge: The MIT Press, 1996.
Download

Simone Sousa Silva