Movimento Encontros de Jovens Shalom
Semana IV – O Sentido do Jejum
É Quaresma, tempo propício à oração, à conversão do coração ou, simplesmente, ao
mero cumprimento de ritos que certamente apaziguam consciências, mas pouca
mudança provocam no nosso jeito de viver a fé e o compromisso cristão.
Vem a propósito o sentido de jejum, que a Igreja recomenda e até nos apresenta num
dos cinco mandamentos. Fará sentido jejuar hoje?
São muitas as formas como podemos ver o jejum: desde um simples rito ascético
(esquecer as necessidades temporais para elevar o espírito), até um hábito saudável
(muitos defendem que o choque do jejum é muito benéfico para o organismo), ou
mesmo um gesto filantrópico (privar-me de alimento, em benefício dos mais
necessitados).
Creio que, visto por qualquer destes prismas, o jejum perde o seu sentido como prática
cristã.
Prefiro entendê-lo numa tríplice dimensão: memorial, celebrativa e oblativa.
Memorial: ao iniciar a sua vida pública, Jesus foi para o deserto onde jejuou ao longo
de 40 dias (Mt.4,1-2). O jejum quaresmal recorda-nos (faz memória) esse episódio da
vida de Jesus e vai mais longe: põe-nos em sintonia com o mistério da
encarnação/salvação que foi a presença do Filho de Deus no nosso meio. Jejuar, mais
que mero rito de privação, é um exercício místico/contemplativo que nos leva a
encontrar com Cristo para com Ele saborearmos, meditarmos na sua vida, na sua
mensagem, nas suas atitudes, na sua morte e ressurreição.
Celebrativo: ao contemplarmos o Mistério, somos convidados a mergulhar nele, a
comungarmos dele, a conformarmos a nossa vida com a dele, para o tornarmos
presente e actuante no tempo de hoje. Longe de se reduzir a uma penitência, o jejum
torna-se dinâmico, quase me atrevo a dizer festivo: “quando jejuardes, não mostreis
um ar sombrio... perfuma a cabeça e lava o rosto” (Mt. 6,16-17). Celebrar é diferente
de comemorar: enquanto comemorar nos remete ao passado e nos faz recordação do
acontecimento, celebrar torna o acontecimento presente, fazendo-nos assumi-lo e
aceitá-lo como dom de Deus, que nos faz participantes da vida de seu Filho.
Oblativo: ao recordar e celebrar o Mistério, também eu sou convidado a colocar a
minha vida, a minha pessoa nas mãos de Deus para que, no seguimento de seu Filho,
eu possa ser instrumento do seu amor. Nesta terceira dimensão, o jejum, longe de ser
mero acto filantrópico, torna-se o fruto da minha entrega; a expressão, o sinal da
minha doação pessoal à causa da dignificação do meu irmão, em quem Deus manifesta
o seu rosto. «A esmola evangélica não é simples filantropia: trata-se antes de uma
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expressão concreta da caridade, virtude teologal que exige a conversão interior ao
amor de Deus e dos irmãos, à imitação de Jesus Cristo, que, ao morrer na cruz, Se
entregou totalmente por nós», diz-nos Bento XVI na sua mensagem para esta
Quaresma.
E porque, quando partilhamos os dons, os primeiros beneficiados somos nós, «todas
as vezes que por amor de Deus partilhamos os nossos bens com o próximo
necessitado, experimentamos que a plenitude de vida provém do amor e tudo nos
retorna como bênção sob forma de paz, satisfação interior e alegria» diz-nos ainda o
Papa.
Talvez, assim, faça sentido jejuar: porque se torna marco de conversão, sinal da minha
relação profunda com Deus que me habita e a quem me entrego; com Cristo a quem
sigo; com os irmãos, a quem sirvo...
Pega na tua Bíblia e lê com atenção Mt. 6, 1-18.
Repete a leitura quantas vezes precisares até assimilares bem o seu conteúdo
Memoriza e saboreia os versículos que tocarem mais de perto o teu coração
Deixa que Deus te toque e interpele a tua vida
Pára… faz silêncio...!
Parábola dos poços
Era o país dos poços. Qualquer visitante estranho que chegasse àquele país, só via
poços: grandes, pequenos, feios, bonitos, ricos, pobres... À volta dos poços, pouca
vegetação. A terra estava seca!
Os poços falavam entre si, mas à distância; havia sempre um pedaço de terra entre um
e outro. Na realidade quem falava era a boca do poço... a conversa acontecia na
superfície da terra. E dava a impressão que ao falar ressoava um eco, porque na
verdade a fala provinha de lugares ocos. Como a boca dos poços estava oca, os poços
davam a sensação de vazio, de angústia... e cada um procurava encher esse vazio
como podia: com coisas, ruídos, sensações raras, livros, sabedorias... Havia poços com
a boca tão larga que permitia colocar nela muitas coisas. As coisas, com o tempo,
passavam de moda: então, com as mudanças, chegavam continuamente coisas novas
aos poços, coisas diferentes... e quem possuía muitas coisas era o mais respeitado,
admirado... mas, no fundo, o poço nunca estava contente com o que possuía. A boca
estava sempre ressequida e sedenta.
Bem no fundo... a maioria dos poços, pelas frechas deixadas por entre as coisas
acumuladas na boca, deixavam perceber algo misterioso... os seus dedos roçavam,
uma vez por outra, a água no fundo do poço. Diante desta sensação tão rara, uns
sentiam medo e procuravam não voltar a senti-la. Outros, encontravam tantas
dificuldades por causa das coisas que abarrotavam das suas bocas, que se punham a rir
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e logo esqueciam aquilo que se "encontrava no fundo"... Falava-se também na
superfície da terra, daquelas experiências profundas que muitos sentiam...mas havia
quem risse bastante e dissesse que tudo era ilusão...
Até que houve alguém que começou a olhar mais para o fundo do poço e,
entusiasmado com aquela sensação que experimentou no seu interior, procurou ficar
quieto... mas, como as coisas que abarrotavam da sua boca incomodavam procurou
libertar-se delas. E, aos poucos, os ruídos silenciaram, até chegar o silêncio completo.
Então, fazendo-se silêncio na boca do poço, pôde escutar-se o barulho da água lá no
fundo...e sentiu uma paz profunda, uma paz que vinha do fundo do poço. Então o poço
experimentou que esta era justamente a razão de ser. No fundo, ele sentia-se ele
mesmo. Até então acreditava que a sua razão de ser era ter uma boca larga, rica e
embelezada, bem cheia de coisas...
E assim enquanto os outros poços tratavam de alargar a sua boca, para que nela
coubessem mais coisas, este poço, olhando para o seu interior, descobriu que aquilo
que ele tinha de melhor estava bem no fundo e que, quanto mais profundidade tivesse
mais poço seria. Feliz com a sua descoberta, procurou tirar água do seu interior, e a
água, ao sair, refrescava a terra e tornava-a fértil e logo as flores brotavam ao seu
redor...
A notícia espalhou-se rapidamente... As reacções foram diversas: uns mostravam-se
cépticos, outros sentiam saudade de algo que, no fundo, percebiam também... outros
ainda desprezavam "aquele lirismo" e outros acharam perda de tempo tirar água do
seu interior. A maioria optou por não fazer caso, pois na verdade estava muito
ocupada em trocar as coisas na entrada da boca do poço... muitos estavam satisfeitos
com as sensações experimentadas fora.
Sem dúvida alguns tentaram fazer a experiência de se libertar das coisas que enchiam
a boca... e encontravam água no seu interior. A partir de então, as surpresas destes
foram aumentando. Comprovaram que, por mais água que tirassem do interior do
poço, este não esvaziava. A seguir, aprofundando mais para o interior, descobriram
que todos os poços estavam unidos por aquilo que lhes dava razão de ser: a água.
Assim começou uma comunicação profunda entre eles, porque as paredes dos poços
deixaram de ser barreiras entre eles. Comunicaram-se em profundidade, sem se
preocuparem com a abertura da boca. A descoberta mais sensacional veio depois,
quando os poços já viviam em profundidade: chegaram à conclusão que a água que
lhes dava vida não nascia lá mesmo, em cada poço, mas vinha, para todos, procedente
de um mesmo lugar...e procuraram seguir a corrente da água.
E descobriram o manancial! O manancial estava bem longe: na montanha do país dos
poços...e ninguém sabia da sua presença. Mas estava lá! A montanha sempre esteve
lá. Umas vezes apenas visível entre as nuvens, outras, mais radiante... e nunca
perceberam a montanha. Desde então os poços que haviam descoberto a razão do seu
ser, esforçaram-se por aumentar o seu interior e aumentar a sua profundidade, para
que o manancial pudesse chegar mais facilmente até eles. E a água que tiravam de si
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mesmos tornou fértil a terra ao seu redor. Enquanto isso, lá fora, na superfície, a
maioria dos poços continuava a aumentar as suas bocas, procurando ter sempre mais
coisas.
Olha agora para a tua vida.
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Como está a boca do teu poço? Como está o interior? O manancial encontra
espaço para "fluir"?
A minha conversa com os outros poços...acontece ao nível da boca, ou vem da
profundidade?
Estou vivendo na "boca" ou "na profundidade" em contacto com o manancial?
Repara bem na boca do teu poço: está cheia de quê? Identifica tudo o que a
preenche e te impede de comunicar com os outros ‘poços’. Faz uma lista com tudo
isso. Depois olha bem a lista: de que é que precisas prescindir para criar relações,
para te encontrares verdadeiramente com os outros, para criares laços?
Em que é que gastas mais tempo: telemóvel, computador, Net, televisão, curtir, …?
Fazer jejum… fazer abstinência para olhares o outro, ires ao seu encontro, dar-lhe
importância, perceber o que ele significa na tua vida…
Desafio: pega a carta desta IV semana e escreve nela o teu compromisso. Determina
um tempo específico de um determinado dia em que vais privar-te do teu
________________, para ires ao encontro de alguém que precise de ti, da tua ajuda,
da tua atenção… do teu serviço.
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