PSICOPEDAGOGIA
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOPEDAGOGIA • Nº 87 • 2011 • ISSN 0103-8486
EDITORIAL / EDITORIAL ....................................................................................................... 217
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
• Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados ....................................... 219
• Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução
das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P ........................................ 226
• Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor .............. 237
• Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas
a intervenção fônica computadorizada ........................................................................... 246
• Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem ................................... 256
ARTIGOS ESPECIAIS / SPECIAL ARTICLES
• Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção ............................................ 262
• Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática
sob as lentes da transferência em Freud ......................................................................... 273
• Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos................................................. 283
ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES
• Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico .....................293
• Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações
para uma prática eficaz .................................................................................................... 306
RESENHA / REVIEW
• Adolescência: as contradições da idade .......................................................................... 321
30
ANOS
VOLUME
28
Associação Brasileira
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do Caribe em Ciências da Saúde BIREME
2) Clase - Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales y Humanidades. Universidad
Nacional Autónoma de Mexico
3) Edubase - Faculdade de Educação, UNICAMP
4) Bibliografia Brasileira de Educação - BBE
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5) Latindex - Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Científicas
de América Latina, El Caribe, España y
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Brasileiro em Ciência e Tecnologia –
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Federal de Psicologia
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Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia /
Associação Brasileira de Psicopedagogia. - Vol. 10, nº 21 (1991). São
Paulo: ABPp, 1991Quadrimestral
ISSN 0103-8486
Continuação, a partir de 1991, vol. 10, nº 21 de Boletim da
Associação Brasileira de Psicopedagogia.
1. Psicopedagogia. I. Associação Brasileira de Psicopedagogia.
CDD 370.15
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Diretoria da Associação
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2011/2013
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Mônica H. Mendes
Neide de Aquino Noffs
Nívea Maria de Carvalho Fabrício
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Maria Cristina Natel
Maria Helena Bartholo
Maria José Weyne Melo de Castro
Maria Katiana Veluk Gutierrez
Maria Teresa Messeder Andion
Marisa Irene Siqueira Castanho
Quézia Bombonatto
Rosa Maria Junqueira Scicchitano
Silvia Amaral de Mello Pinto
Sônia Maria Colli de Souza
Sônia Maria G. de Sá Küster
Sônia A. Monção Gonçalves
Viviane Massad de Aguiar
Yara Prates
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SP
Associação Brasileira
de Psicopedagogia
sumário
EDITORIAL / EDITORIAL
• Maria Irene Maluf.........................................................................................................................217
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
• Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados
Study on the writing in sheltered children and adolescents
Márcia Siqueira de Andrade.........................................................................................................219
• Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução
das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P
Analysis of association between the academic performance, the speed of execution
of tasks and behavior of children from EACI-P
Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca; Thiago da Silva Gusmão Cardoso;
Mauro Muszkat; Orlando Francisco Amodeo Bueno..................................................................226
• Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor
Studies on Psychopedagogy, teacher’s stress and sleep disorders
Luiza Elena Ribeiro do Valle; Rubens Reimão; Sigmar Malvezzi...............................................237
• Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas
a intervenção fônica computadorizada
Written production analysis of children with developmental dyslexia submitted
to a computerized phonological intervention
Darlene Godoy de Oliveira; Karen Kaufmann Sacchetto; Karen Ueki;
Patrícia Botelho da Silva; Elizeu Coutinho de Macedo...............................................................246
• Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem
Visual perception of students with learning disabilities
Aline Viganô de Souza; Simone Aparecida Capellini.................................................................256
ARTIGOS ESPECIAIS / SPECIAL ARTICLES
• Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
Burnout: soul’s disease in education and its prevention
Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini.....................................................................................262
• Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática
sob as lentes da transferência em Freud
An autopsy on the origins of the problems of learning mathematics under
the lens of transfer in Freud
Laerte Fonseca...............................................................................................................................273
• Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos
Andragogy in Psychopedagogy: the role with adults
Neide de Aquino Noffs; Carla Maria Rezende Rodrigues..........................................................283
ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES
• Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
The application of virtual digital technologies in the psychopedagogical context
Ana Margô Mantovani; Bettina Steren dos Santos.....................................................................293
• Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações
para uma prática eficaz
Literacy methods: definition of procedures and considerations for effective practice
Alessandra Gotuzo Sebra; Natália Martins Dias.........................................................................306
RESENHA / REVIEW
• Adolescência: as contradições da idade
Adolescence: the contradictions of the age
Luiza Elena L. Ribeiro do Valle; Maria José Viana Marinho de Mattos....................................321
EDITORIAL
E
sta edição da revista Psicopedagogia tem como fio condutor a busca da
qualidade na formação dos professores, psicopedagogos e o aprimoramento de sua ação profissional, uma relação complexa e dinâmica, da
qual depende o sucesso da aprendizagem de todos os nossos alunos. A partir
de meados do século XX, como todos sabemos, a escola se organizou frente
às novas realidades mundiais, tornando-se simultaneamente uma escola para
todos e uma escola para cada um.
Para atender a essa demanda, inicialmente trazemos neste número da Psi­­­
copedagogia, o artigo “Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados”, de Márcia Siqueira de Andrade, uma pesquisa cujo objetivo é identificar
a qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas.
Dando seguimento, temos outra pesquisa, “Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento
da criança a partir da EACI-P”, apresentado por Maria Fernanda B. Coelho da
Fonseca, Thiago da Silva Gusmão Cardoso, Mauro Muszkat e Orlando Francisco Amodeo Bueno, que comprova ser possível, por meio da aplicação da
EACI-P, obter dados para compreender o comportamento e a aprendizagem da
criança, fundamentando intervenções precoces, e detectando fatores de risco
ou proteção para aprendizagem, caso estejam preservados ou prejudicados.
Em “Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do profes­­
sor”, Luiza Elena Ribeiro do Valle, Rubens Reimão e Sigmar Malvezzi nos trou­­­
xeram um assunto importante e de atualidade para todos os profissionais da
Educação e da Psicopedagogia. Já sabemos que os sintomas de estresse e os
distúrbios do sono repercutem na aprendizagem de nossos alunos, mas, neste
trabalho, os autores enfatizam os problemas associados à ocorrência de transtornos com o professor, o responsável pelo processo de ensino.
“Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento
submetidas a intervenção fônica computadorizada” é também um artigo de
gran­­­­­­­de relevância para os psicopedagogos que trabalham com crianças em
fase de alfabetização. Escrito por Darlene Godoy de Oliveira, Karen Kaufmann
Sacchetto, Karen Ueki, Patrícia Botelho da Silva e Elizeu Coutinho de Macedo,
este estudo objetivou verificar mudanças no padrão de escrita de disléxicos
submetidos à intervenção com o software Alfabetização Fônica Computadorizada, por meio da análise dos tipos de erros ortográficos.
“Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem”, de Aline
Viganô de Souza e Simone Aparecida Capellini, é um artigo baseado em uma
pesquisa em que se procurou caracterizar os achados de percepção visual de
escolares com distúrbios de aprendizagem.
É de Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini o Artigo Especial “Burnout:
a doença da alma na educação e sua prevenção”, que tem como intuito propor
uma reflexão sobre os novos caminhos da educação no século XXI, para a
compreensão da síndrome – burnout, sintoma de uma educação adoecida que
leva professores e alunos a um sofrimento psicofisicoespiritual. “Uma autópsia
nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud” é o ensaio teórico apresentado por Laerte Fonseca, cujo
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 217-8
217
EDITORIAL
 objetivo é fomentar as discussões dos conceitos psicanalíticos nos ambientes
formais nas salas do Ensino Básico, utilizando-se do mecanismo da transferência como conceito psicanalítico para compreender as origens dos problemas
de aprendizagem matemática.
“Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos” é o artigo de Neide
de Aquino Noffs e Carla Maria Rezende Rodrigues, que relatam a pesquisa que
vem sendo desenvolvida no NAPAp/PUC-SP (Núcleo de Apoio Psicopedagógico
à Aprendizagem). A referida pesquisa nos leva a observar que a Psicopedagogia,
durante décadas, se preocupou em desenvolver ações com crianças e adolescentes em idade escolar e, neste texto, abordam as contribuições dessa ação na
ampliação do campo de atuação de aprendizagem com adultos: a andragogia.
Dois artigos de revisão se apresentam nesta edição. “Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico”, de Ana Margô Mantovani e
Bettina Steren dos Santos, nos reafirma a necessidade do psicopedagogo atender
à demanda da geração digital, a necessidade de vivenciar experiências com tais
tecnologias, a fim de desenvolver competências didático-pedagógicas, aliadas a
competências tecnológicas-digitais, que lhe viabilizem interagir e utilizar essas
ações em sua prática psicopedagógica, tanto institucional como clínica.
Em “Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considera­
ções para uma prática eficaz”, Alessandra Gotuzo Sebra e Natália Martins Dias
apontam para uma promissora posição oriunda de algumas iniciativas acadêmicas e de setores do governo, que tem revelado uma possível aproximação
en­­­tre as diferentes práticas educacionais ligadas à alfabetização e as mais
atuais evidências científicas.
Uma resenha encerra esta edição de dezembro de 2011. É de autoria de
Luiza Elena L. Ribeiro do Valle e Maria José Viana Marinho de Mattos e versa
sobre o livro “Adolescência: as contradições da idade”.
Agradecemos, em nome desta Associação, aos que participaram das três
edi­­­ções da revista Psicopedagogia, quer nos enviando seus trabalhos, quer
tra­­­balhando no Conselho Editorial desta publicação. Somos gratas também
por toda gentileza da UNIFIEO, nossa parceira no II Simpósio Nacional de
Psicopedagogia da ABPp, muito especialmente à Profª Dra. Márcia Siqueira.
E não podíamos deixar de expressar aos nossos associados, amigos e colaboradores o nosso muito obrigada, pelo apoio, confiança e incentivo recebidos.
Ao nos despedirmos deste ano, já deixamos a todos o convite para o grande
Congresso da ABPp de 2012, sob a responsabilidade do Conselho Nacional,
de Quézia Bombonatto (Presidente da ABPp Nacional) e de Luciana Barros de
Almeida (Vice-Presidente da ABPp Nacional). Aguardem!
A todos, um abraço cordial e os votos de Boas Festas! Até 2012!
Maria Irene Maluf
Editora
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 217-8
218
Estudo sobre a escrita
em crianças
e adolescentes abrigados
ARTIGO
ORIGINAL
Estudo sobre a escrita em crianças
e adolescentes abrigados
Márcia Siqueira de Andrade
RESUMO – Objetivo: Esta pesquisa teve como objetivo identificar a
qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas. Mé­­­
todo: Participaram do estudo 20 estudantes das 2ª, 3ª e 4ª séries do ensino
fundamental de escolas da rede pública, de ambos os sexos, com idades entre
8 e 14 anos, atendidas em instituição privada caracterizada por “abrigo”.
Os dados foram coletados por meio do teste Avaliação de Dificuldades na
Aprendizagem da Escrita-ADAPE. Resultados: Os resultados revelaram
que a maioria dos participantes aglutina-se abaixo da média de acertos.
Conclusão: A vivência institucional pode proporcionar prejuízos cognitivos
às crianças abrigadas, especialmente em relação à aprendizagem da escrita.
UNITERMOS: Aprendizagem. Escrita. Institucionalização.
Márcia Siqueira de Andrade – Doutora em Psicologia
da Educação pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, Programa de Psicologia Educacional
do Centro Universitário FIEO, São Paulo, SP, Brasil.
Correspondência
Márcia Siqueira de Andrade
Centro Universitário FIEO - UNIFIEO
Programa de Pós-graduação em Psicologia Educacional
Campus Vila Yara – Bloco Prata
Av. Franz Voegelli, 300 – Vila Yara – Osasco, SP, Brasil –
CEP: 060190-20
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25
219
Andrade MS
de problemas sociais, associados à situação de
po­­­breza e ao perfil de distribuição de renda no
Brasil. Ao falarmos da criança institucionalizada,
observamos que, mesmo recebendo cuidados
alimentares, higiênicos e médicos, ela caminha
tardiamente, demora a falar e tem dificuldade
para estabelecer ligações significativas10.
Embora a Lei nº 8069, que dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA11,
preconize a desinstitucionalização no atendimento de crianças e adolescentes em situação
de abandono, valorizando o papel da família, as
ações locais e as parcerias no desenvolvimento
de atividades de atenção, as mudanças no panorama do funcionamento das instituições de
abrigo ainda não foram incorporadas por todas
as instituições brasileiras.
Para Carvalho12, o ambiente institucional não
se constitui no melhor ambiente de desenvolvi­­
mento, pois o atendimento padronizado, o alto ín­­­­­
dice de criança por cuidador, a falta de ativida­­des
planejadas e a fragilidade das redes de apoio social e afetivo são alguns dos aspectos re­­­­­­­­lacionados
aos prejuízos que a vivência insti­­­tucional pode
operar no indivíduo. Para Bowlby13, a criança que
vive em instituição, sem a presença de uma pessoa significativa, poderá ter seu desenvolvimento
prejudicado, pois foi privada total ou parcialmente
de se vincular afetivamente a alguém que lhe
ofe­­­­reça apoio, proteção e cuidados.
Para Altoé14, em geral, abrigos de proteção ou
“internatos” apresentam um atendimento mais
impessoal e despersonalizado, dificultando a
construção de laços afetivos e significativos,
levando à pobreza nos relacionamentos interpessoais. Também refere que a instituição deixa
marcas no indivíduo que passa ali anos de sua
infância e adolescência, marcas que influenciam
sua trajetória e sua inserção na vida social, podendo dificultar seu desenvolvimento psicológico, da inteligência e criatividade15.
Grusec e Lytton16 afirmam que, mesmo em
ins­­­tituições de alta qualidade, a inteligência
e a autonomia de crianças deste contexto são
mar­­­cadamente menores do que aquelas que
foram cuidadas em suas casas. Isto sugere que
INTRODUÇÃO
Estudos sobre as dificuldades de leitura e
es­crita estão sendo amplamente realizados em
uma variedade de idiomas1-4. Na perspectiva de
Sternberg e Grigorenko5, as dificuldades de leitura e escrita são decorrentes de uma interação
entre fatores biológicos, cognitivos e sociais. Para
Bartholomeu et al.6, os problemas emocionais
também interferem negativamente na aprendizagem da escrita. Para esses autores, crianças
ansiosas e com pobre autoconceito, denotando
sentimentos de inadequação e culpa relacionados a impulsos agressivos mal-elaborados, com
preocupação pelos impulsos sexuais, dificuldades de comunicação e timidez, apresentam
pro­­­­blemas de aprendizagem da escrita.
Marturano e Parreira7 compreendem que
exis­­­­te uma relação entre baixo rendimento es­­­
co­­­lar e problemas emocionais/comportamentais,
pois estes tanto podem ser decorrentes das
dificuldades escolares, como serem precedidos
pelas mesmas, causando-as. Uma criança com
baixo rendimento escolar pode apresentar dificuldades quanto a suas habilidades sociais, que
associadas a falhas educacionais e condições
familiares podem agravar-se.
Este estudo teve como objetivo investigar a
qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas. Esta pesquisa justifica-se
tendo em vista que o Levantamento Nacional de
Abrigos para Crianças e Adolescentes8 encontrou
cerca de 20 mil crianças e adolescentes vivendo
em 589 abrigos pesquisados no Brasil, na sua
maioria meninos (58,5%) entre 7 e 15 anos de
ida­­­­de (61,3%), negros e pobres, com percentual
de analfabetos entre os adolescentes de 15 a 18
anos de 19,2%.
Além disso, as estatísticas governamentais,
como as demonstradas pelo Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Básica (SAEB)9, demonstram um quadro preocupante em termos
de desempenho em leitura e escrita no Ensino
Fundamental.
As instituições de abrigo fazem parte da rede
de apoio de muitas famílias brasileiras, há mui­­­
tas décadas, principalmente em decorrência
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25
220
Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados
a segurança emocional, derivada da existência
de relações estáveis na vida da criança, pode
contribuir para o funcionamento intelectual
adequado.
Segundo Yunes17, a institucionalização pode
ou não constituir um risco para o desenvolvimento. Esta condição dependerá dos mecanismos
através dos quais os processos de risco operarão seus efeitos negativos sobre eles, sendo o
risco entendido como as condições ou variáveis
que estão associadas a uma alta possibilidade
de ocorrência de resultados negativos ou não
desejáveis18.
Estudos mais antigos apontaram os prejuízos
cognitivos que a vivência institucional proporcionava para as crianças abrigadas, tal como
dé­­­ficit intelectual, especialmente no desenvolvimento da linguagem16,19.
tes utilizam recursos de escola, centros de lazer,
praças e também a rede municipal de saúde. Na
ocasião da pesquisa, o abrigo acolhia 125 crianças e adolescentes entre zero e 18 anos, com uma
relação de um cuidador para 20 crianças.
Instrumentos
Foram utilizados neste estudo:
a) um questionário de identificação, no qual
os participantes informaram os seguintes
aspectos: nome, idade, sexo, série e insti­
tuição de ensino à qual pertenciam;
b) Escala de Avaliação de Dificuldades na
Aprendizagem da Escrita (ADAPE)20 apli­
cado para identificar as dificuldades dos
participantes em escrita. O referido instrumento tem sido largamente empregado
em pesquisas sobre avaliação de dificuldades na aprendizagem da escrita3,21,22.
O texto contém 114 palavras, com 60 delas
apresentando algum tipo de dificuldade classificada como encontro consonantal (tarde, campo
bastante, quando, contaram, festinha, Vanda,
aniversário, Amparo, brincadeiras, engraçadas,
esparadrapo, jogando, mercúrio, companheiros,
Márcio, brincar, crianças, gostam, perto, Jumbo,
correndo, gente, Valter, estava, certo, voltar, di­­­
vertido, pensando, quente, vontade), dígrafo,
(quando, lhe, festinha, chácara, chegou, machucou, joelho, achou, necessário, passar, burrico, companheiros, Cássio, cachorro, vizinho,
chegaram, correndo, quente, velhos, tenho),
sílaba composta (alegre, sobre, brincadeiras, esparadrapo, crianças, brincar, outros, engraçadas,
atrás) e sílaba complexa (José, sobre, engraçadas,
necessário, seus, Márcio, Adão, crianças, não,
sai, gente, difícil, certo, casa, pensando, verão,
visitar, aniversário). Além disso, a escala avalia
também o uso correto de parágrafos, uso correto
da letra maiúscula e acentuação.
Para essa avaliação, as palavras são utilizadas
na composição de um texto que conta uma história. O instrumento empregado tem uma única
versão de aplicação para crianças de 2ª 3ª e 4ª
séries, utilizando diferentes escalas de avaliação
para cada uma das séries.
MÉTODO
Participantes
Foram incluídos no estudo 20 participantes,
de ambos os sexos, sendo oito meninas e 12
meninos, com idades compreendidas entre oito
e 14 anos, atendidas em uma instituição privada
que se caracteriza por “abrigo”. A composição
da amostra partiu de uma listagem, fornecida
pela Instituição de abrigo. Dentre as crianças
selecionadas aleatoriamente, algumas estavam
institucionalizadas em consequência do abandono, outras foram acolhidas na instituição por
serem vítimas de violência doméstica (física e
sexual), negligência parental ou decisão judicial.
O tempo de institucionalização dos participantes da amostra variou de três meses a 10 anos e
frequentavam a 2ª, 3ª e 4ª séries do ensino fun­­­
damental de escolas da rede pública estadual,
predominando alunos da 2ª série.
O abrigo que atendia os participantes por oca­­­
sião da pesquisa está localizado em uma cidade
da região oeste do Estado. Existe desde 1939, funcionando como uma Sociedade Civil de Caráter
Assistencial, tendo como finalidade a proteção e
educação da criança, com duração indeterminada e sem fins lucrativos. Encontra-se inserido na
comunidade, na qual essas crianças e adolescen-
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25
221
Andrade MS
50 – 79 erros; e dificuldade de aprendizagem média (categoria 3 – DA média), 80 ou mais erros.
A escala para a terceira e quarta série é a
seguinte: sem indícios de dificuldade de aprendizagem até 10 erros (categoria 1A); dificuldade
de aprendizagem leve (categoria 1B – DA leve),
de 11 – 19 erros; dificuldade de aprendizagem
média (categoria 3 – DA média), 20 – 49 erros e
dificuldade de aprendizagem acentuada (categoria 4 – DA acentuada), 50 ou mais erros.
Procedimentos
Este estudo caracterizou-se por ser de risco
mínimo aos participantes e foi aprovado pelo
Co­­­mitê de Ética em Pesquisa da instituição
promotora (Protocolo: 097/2009), tendo seguido
os preceitos éticos que regem a realização de
pesquisas com seres humanos23,24. Foi obtido
o Termo de Concordância da Instituição, bem
como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado pelos diretores do
abrigo que mantêm a guarda formal das crianças
e adolescentes que ali vivem. Além disso, foi
assegurada aos participantes a voluntariedade
de sua participação e obteve-se um assentimento
verbal das crianças e adolescentes.
O instrumento foi aplicado coletivamente no
abrigo, em horário combinado com antecedência, por uma equipe de pesquisa composta pelo
pesquisador responsável e por acadêmicos previamente treinados.
O meio utilizado foi o ditado, como uma forma objetiva de avaliar a dificuldade de aprendizagem em linguagem escrita. No momento
da aplicação, foi explicado que seria efetuado
um ditado de um texto, as palavras lidas uma a
uma e não repetidas, além de os participantes
da pesquisa serem orientados para escrever
todas as palavras. Foi entregue uma folha em
branco para cada um para que escrevesse as
palavras ditadas.
RESULTADOS
A pontuação alcançada por cada participante
é apresentada na Tabela 1.
No que concerne aos erros por palavras no
ditado, evidenciou-se que grande parte dos participantes obteve 114 pontos de erros no ditado,
pontuação máxima (55%), tendo também uma
grande concentração de sujeitos com pontuação
entre 75 e 95 (30%). Dessa forma, a maioria dos
sujeitos aglutina-se abaixo da média, apresentando dificuldade de aprendizagem da escrita
acentuada.
Por sua vez, a minoria dos casos (15%) concentra-se nas pontuações de até 10 erros. Estes
casos referem-se a crianças do sexo feminino
com poucos meses de vida institucional. Constatou-se que os meninos obtiveram uma pontua­
ção média de erros maior no ADAPE: (M=108;
DP= 2,5) média - aritmética dos meninos, contra (M=60,6; DP= 0,6) média - aritmética das
meninas, o que corrobora os resultados obtidos
por outros pesquisadores25-27, que indicam que
os meninos apresentam mais dificuldades de
aprendizagem na escrita, quando comparados
às meninas.
Análise de dados
Para a correção dos ditados, cada palavra foi
considerada uma unidade e qualquer erro ortográfico ou ausência de palavra foi considerada
erro, assim como acentos e letras maiúsculas e
minúsculas indevidas, sendo a soma dos erros
a pontuação de cada criança. Foi atribuído um
ponto para cada erro e zero para acerto, sendo
a pontuação máxima possível 114.
Os participantes foram categorizados segundo o critério ADAPE. A escala do instrumento
pa­­­ra segunda série é a seguinte: sem indícios de
dificuldade de aprendizagem (DA) pertencentes
à categoria zero até 20 erros; dificuldade de
apren­­­dizagem leve (categoria 2 – DA leve), de
DISCUSSÃO
Os resultados evidenciaram que crianças e
adolescentes abrigados apresentam problemas
na aprendizagem da escrita, podendo ser considerados, na sua maioria (80%), como analfabetos,
ou seja, considerando o conceito de alfabetizado
utilizado pelo IBGE28 nas suas estatísticas, não
conseguem ler ou escrever um bilhete simples
no idioma que conhecem.
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222
Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados
Tabela 1 – Pontuação alcançada pelos participantes.
Idade
Tempo na
instituição
Escolaridade
(série)
Nº de erros
Feminino
11
8 meses
3ª
6
Feminino
14
10 anos
4ª
114
Feminino
9
3 meses
2ª
7
Feminino
9
5 meses
2ª
5
Feminino
8
6 anos
2ª
78
Feminino
11
8 anos
3ª
86
Sexo
Feminino
12
10 anos
4ª
114
Feminino
9
5 anos
2ª
75
Masculino
9
7 anos
2ª
95
Masculino
9
8 anos
3ª
114
Masculino
10
9 anos
3ª
114
Masculino
9
5 anos
2ª
80
Masculino
10
8 anos
3ª
114
Masculino
8
5 anos
2ª
114
Masculino
14
10 anos
4ª
114
Masculino
8
6 anos
2ª
95
Masculino
9
9 anos
2ª
114
Masculino
10
9 anos
3ª
114
Masculino
9
7 anos
2ª
114
Masculino
10
8 anos
3ª
114
Vários estudos confirmam que crianças que
são institucionalizadas com pouca idade e per­­­­
manecem nessa situação por vários anos, apresentam problemas de desenvolvimento cognitivo10,13,15,29. O tempo de institucionalização, no
caso dos participantes desta pesquisa, parece
configurar-se um fator importante, visto que
aque­­las crianças com mais tempo no abrigo e
que lá chegaram com poucos anos de vida apresentaram maiores dificuldades na aprendizagem
da escrita, enquanto as crianças e adolescentes
com poucos meses de institucionalização apresentaram um desempenho satisfatório.
Os problemas de aprendizagem dessas crianças e adolescentes parecem ser decorrentes, dentre outras variáveis, da insegurança emocional
e material fruto da ausência de familiares e de
um ambiente estimulador, já que o alto índice de
criança/adolescente por cuidador no abrigo em
pauta não favorece a construção de laços afetivos e significativos de forma a contribuir para o
funcionamento intelectual adequado.
Para Santos e Graminha30, a exposição das
crianças a um número maior de adversidades
afeta seu desenvolvimento na escola. Mesmo
considerando que as crianças e adolescentes par­­­
ticipantes deste estudo foram abrigadas por viverem num contexto de abuso sexual, maus tratos
e abandono, apresentando uma história de vida
repleta de sofrimento e privações, espera-se que
a institucionalização traga um contexto possível
de desenvolvimento e superação dos prejuízos
afetivos e intelectuais, proporcionando a recuperação e crescimento psicológico. Porém, para que
isso seja possível as instituições de abrigo devem
estar configuradas em unidades pequenas, com
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Andrade MS
poucos integrantes, mantendo um atendimento
personalizado, estimulando a participação em
atividades comunitárias e preservando o grupo
de irmãos, entre outros pontos31.
Os resultados obtidos na presente pesquisa
confirmaram dados encontrados na literatura da
área, contribuindo assim para a generalização
do conhecimento a respeito da aprendizagem
da escrita de crianças e adolescentes abrigados.
Nesse sentido, diante dos resultados encontrados, entendemos ser importante desenvolver estudos nesta área, a fim de garantir formas de atuação
que favoreçam a efetivação dos direitos previstos
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
SUMMARY
Study on the writing in sheltered children and adolescents
Purpose: The present study had as propose to identify the quality of the
learning of the writing among institutionalized infants. Methods: Twenty
infants, living in a shelter, of both sexes, aged between 8 and 14 years old,
took part in this study. The data were collected through the test ADAPE Assessment of Learning Difficulties in Writing. Results: Results revealed that
most participants agglutinate is below the average of hits. Conclusion: The
institutional experience provides cognitive damage to sheltered children,
particularly in language development.
KEY WORDS: Learning. Handwriting. Institutionalization.
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Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados
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Artigo recebido: 11/8/2011
Aprovado: 8/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25
225
Fonseca MFB
et al.
ARTIGO
ORIGINAL
Análise da associação entre o
desempenho acadêmico, a velocidade de
execução das tarefas e o comportamento
da criança a partir da EACI-P
Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca; Thiago da Silva Gusmão Cardoso; Mauro Muszkat; Orlando Francisco Amodeo Bueno
RESUMO – Objetivo: Esse trabalho busca analisar a associação entre o desempenho
acadêmico, a velocidade de execução das tarefas, e os problemas de comportamento in­­­
fantil, avaliados pela EACI-P, bem como as inter-relações entre esses problemas de com­­­
por­­tamento, desempenho e a inteligência estimada das crianças. Método: Trata-se de um
estudo transversal com a avaliação do com­­por­­tamento por meio de escala padronizada,
com­­­paração entre as idades e análise de associação entre as variáveis do instrumento
(EACI-P) segundo classificação do professor. Resultados: Os resultados da avaliação dos
professores quanto à presença ou não de problemas de comportamento nas 84 crianças
avaliadas revelam que 7,9% (7) crianças apresentam Hiperatividade/Problema de Conduta,
2,2% (2) crianças apresentam um nível abaixo do esperado para sua idade e nível de es­­­
colarização no que se refere ao Funcionamento Independente/Socialização Positiva, 13,5%
(12) apresentam Inatenção, 5,6% (5) têm sintomas de Neurotismo/Ansiedade e 1,1% (1)
vi­­­vencia um processo de Socialização Negativa. O desempenho foi associado aos escores
de desatenção e hiperatividade. A velocidade de execução foi associada à socialização
negativa e o escore de QI foi negativamente correlacionado com todas as variáveis com­­­
portamentais, exceto funcionamento independente. Conclusão: É possível por meio da
aplicação da EACI-P obter dados para compreender o com­portamento e a aprendizagem da
criança, fundamentando intervenções precoces. Comportamento, desempenho aca­­­dê­­mico,
velocidade de execução e inteligência foram fatores de risco ou proteção para apren­­­dizagem,
caso estejam preservados ou prejudicados. A relação professor-aluno-escola é fundamental
para o desenvolvimento psicossocial da criança, a partir da mediação dessa tríade po­demse evitar problemas de aprendizagem, comportamentos e relacionamentos interpessoais.
UNITERMOS: Comportamento. Criança. Aprendizagem.
Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca – Pedagoga,
Psi­­­­­­­copedagoga, Mestre em Ciências da Saúde da
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/SP).
Thiago da Silva Gusmão Cardoso – Psicólogo, Mes­­­trando
em Educação e Saúde na Infância e Adolescên­­cia
UNIFESP/Guarulhos.
Mauro Muszkat – Neuropediatra da UNIFESP/SP, Coor­­­
denador do Núcleo de Atendimento Neuropsicológico
Infantil/CPN.
Orlando Francisco Amodeo Bueno – Chefe da Disci­­
plina de Psicobiologia/ UNIFESP/SP.
Correspondência
Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca
Rua Ernesto de Oliveira, 400 apto 41B – Vila Mariana –
São Paulo, SP, Brasil – CEP 04116 170
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
226
Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas
e o comportamento da criança a partir da EACI-P
mais específica, já que nos critérios diagnósticos
de muitos transtornos psiquiátricos está pre­
sente a necessidade de que o comportamento
seja observado ou se manifeste em mais de um
contexto, clínico, familiar e escolar, por exemplo.
Embora, o EACI-P apresente características psi­­­
cométricas muito favoráveis no que se refere à
medida da percepção do professor quanto ao
com­­­portamento da criança na sala de aula, não
deve ser utilizada como instrumento único de
diagnóstico. O comportamento apresentado pela criança
no ambiente escolar deve ser bastante obser­
vado durante as atividades, pois pode ser por
esse caminho que possibilita uma investigação
mais precisa de uma provável dificuldade ou
trans­­­torno de aprendizagem. Comportamentos
desatentos, impulsivos, agressivos, hiperativos,
depressivos entre outros determinam muitas
vezes uma condição, que por meio de interven­­
ções pode ser superado. Além disso, a visão
do professor sobre o comportamento do aluno
constrói ou destrói uma condição, portanto, é
fundamental que o profissional da educação
mantenha a sensibilidade única sobre cada
criança, independente de seu status social, situa­
ção familiar e condições de desenvolvimento,
pois o importante é que consiga em seus olhares
e ações motivar seus alunos para o aprendizado.
Pesquisa realizada por Santos e Graminha12,
em uma escola Pública Estadual no interior
de São Paulo, aponta que o problema de com­
portamento representa uma forte condição de
ris­co para problemas de aprendizagem e que
o trabalho com crianças com dificuldades de
aprendizagem deve considerar aspectos ligados
ao comportamento. Manifestam ainda em seus
estudos que, na escala preenchida por pais e
professores, professores discriminam melhor, e
aponta para a forte associação entre dificuldades
de aprendizagem e comportamento. Concluíram
que os professores avaliam melhor problemas de
comportamento do que baixo rendimento acadê­
mico dos alunos, tendo uma alta sensibilidade
para detectar crianças com problemas emocio­
nais/comportamentais. Ainda no mesmo estudo
INTRODUÇÃO
A Escala de Avaliação do Comportamento
Infantil para o Professor (EACI-P) é um ins­
trumento individual de preenchimento pelo
professor, que fornece uma estimativa do fun­
cionamento da criança na escola em relação a
cinco dimensões diferentes de comportamentos,
sendo aplicadas para crianças de 4 a 14 anos. A
construção da escala partiu de um amplo grupo
de itens obtidos da Conners Teacher Rating Scale
– CTRS-391, ADDH – Comprehensive Tea­­­­cher Rating Scale – ACTeRS2 e dos critérios diagnósticos
do DSM-III3 e DSM-III-R4 da American Psychiatric Association para os transtornos infantis da
atenção com ou sem hiperatividade.
No Brasil, o instrumento foi adaptado e nor­­­
matizado por Brito5 numa amostra de 1.608 crian­­­
ças, de ambos os sexos, da região metropolitana
do Rio de Janeiro, demonstrando sensibilidade
na identificação de problemas de comportamen­
to compatíveis com condições psiquiátricas des­­
critas no DSM-III-R4. Novos estudos foram con­
duzidos na década de 90 por Brito et al.6, desta
vez numa amostra composta por 2.082 crianças,
com média de idade de 11,2 anos, sendo 62,4%
do sexo feminino, frequentando escolas do Rio
de Janeiro e revelou a alta confiabilidade do ins­
trumento, correlação teste re-teste de 0,7. Desde
então, o instrumento vem sendo aplicado em
várias pesquisas no país, servindo como uma im­
portante escala de avaliação no diagnós­tico dife­
rencial de transtornos psiquiátricos que cur­­­sam o
desenvolvimento infantil, como o Trans­­­torno do
Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e
Transtornos do Comportamento Disruptivo7-11.
A Escala foi desenvolvida para fins de pes­
quisa e triagem em serviços clínicos e psicope­
dagógicos, como instrumento de auxílio a profis­­­­
sionais e pesquisadores na compreensão de
al­­­gumas dimensões importantes do comporta­
mento da criança. A ideia subjacente à utilização
da escala é de que a informação obtida por meio
da visão do professor é fundamental para todo
o processo de avaliação, diagnostico e monito­
ramento do tratamento. A escala pode também
ser utilizada para uma investigação nosológica
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
227
Fonseca MFB et al.
concluem que o baixo rendimento acadêmico foi
mais frequente entre meninos, e as meninas com
alto rendimento. Sugerem, ainda, que as crian­
ças que apresentam baixo rendimento acadêmi­
co estão em desvantagem de desenvolvimento
em relação às crianças com alto rendimento, uma
vez que no baixo rendimento acadêmico foram
maiores: a incidência de crianças com desem­
penho escolar inferior ao esperado, o número
de crianças com inteligência abaixo da média
ou intelectualmente deficientes e o número de
crianças com resultados visomotores abaixo do
esperado para a idade.
Barra et al.13, analisando a opinião dos pro­­­
fessores sobre o rendimento acadêmico, o com­­
portamento de escolares e a necessidade de ser­­­­­­
viços especializados por não estarem respondendo
às demandas da escola, concluíram que os profes­
sores avaliam melhor problemas de comportamen­
to do que baixo rendimento acadêmico dos alunos,
tendo alta sensibilidade para detectar crianças com
problemas emocionais/comportamentais.
Machado et al.14, em pesquisa focalizando
a sala de aula e a avaliação feita pelos profes­
sores, concluíram que o grupo de crianças com
dificuldades de aprendizagem apresentava mais
problemas de comportamento, principalmente
ligados à externalização, reforçando a ideia de
que as crianças que apresentam dificuldades
para aprender também são avaliadas como tendo
mais problemas comportamentais.
Ainda D´Abreu e Marturano15, em um levan­
tamento na literatura de estudos prospectivos e
longitudinais investigando a associação entre
problemas de comportamento externalizantes e
baixo rendimento escolar no Ensino Fundamen­
tal, sugerem a influência de variáveis anteceden­
tes como condições adversas na família e baixo
nível socioeconômico, e indicam que a associa­
ção traz prognóstico ruim para as crianças, como
comorbidades com transtornos psiquiátricos,
posteriores problemas acadêmicos e de compor­
tamento anti-social, evidenciando a situação de
risco psicossocial em que se encontram.
Para Ferreira16, em seu artigo de revisão sobre
autoconceito e desempenho escolar, concluiu
que todos os onze artigos revisados encontraram
uma correlação positiva entre autoconceito e de­
sempenho escolar, ou seja, crianças com desem­
penho acadêmico satisfatório tendem a ter um
bom autoconceito e aquelas com desempenho
escolar ruim tendem a apresentar autoconceito
diminuído.
Peixoto17 no seu estudo demonstra que as va­
riáveis cognitivas (Q.I e fator “g” de inteligência)
influenciam os problemas de aprendizagem e de
comportamento. Os problemas de aprendizagem
e de comportamento de acordo com a percepção
dos professores foram subdivididos em doze
ca­­­tegorias distribuídas conforme os aspectos
ava­­­liados: 1) aspectos mais ligados à cognição
(raciocínio, atenção e memória); 2) aspectos
mais ligados a aprendizagem (cálculo, leitura­
-escrita e motivação); 3) aspectos mais ligados
ao comportamento perturbador em sala de aula
(hiperatividade, indisciplina e oposição); e 4)
as­­­pectos mais ligados ao comportamento não
perturbador (autoconfiança, inibição e apatia).
Os resultados de Peixoto17 revelam que a dife­
rença nas médias das variáveis cognitivas entre
os grupos de alunos referidos pelos professores
como sem problemas ou com problemas nos doze
indicadores de aprendizagem-comportamento
são sempre favoráveis aos alunos do grupo sem
problemas, com exceção das categorias indisci­
plina e autoconfiança.
Em síntese, no estudo de Peixoto17, a percep­
ção dos professores é consistente com os resulta­
dos obtidos nas variáveis cognitivas, pois os alu­
nos referidos pelos professores sem problemas
tendem a obter melhores resultados nas variáveis
cognitivas. Outro achado interessante é que a
diferença nas médias é maior nas categorias
relativas à cognição-aprendizagem, sendo mais
elevada no conjunto dos indicadores relativos
à cognição (raciocínio, atenção e memória) do
que na aprendizagem propriamente dita (leitura­
-escrita, cálculo e motivação).
No estudo realizado por Miranda-Casas et
al.18, crianças com TDAH e com dificuldades
de aprendizagem da matemática solucionaram
menos problemas da vida real e realizaram
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
228
Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas
e o comportamento da criança a partir da EACI-P
ope­­­rações aritméticas mais lentamente em com­­­
paração ao grupo controle. Para Simões19, crian­
ças com TDAH, principalmente com déficits de
prejuízo atencional, tendem a apresentar escores
mais baixos nos códigos e procurar símbolos
no WISC-III, por conta de uma velocidade de
pro­­­cessamento mais baixa, apresentando um
desempenho mais lentificado e não necessaria­
mente incapacidade de realização da tarefa. Des­­
taca-se, desta forma, a necessidade de medidas
de velocidade de execução de tarefas ou confor­
me o seu nome mais conhecido, velocidade de
processamento para identificação do TDAH e de
outras dificuldades de aprendizagem, como da
matemática, leitura e escrita.
Para Cunha20, a velocidade de processamento
reflete a velocidade psicomotora e mental, sendo
importantes medidas de desempenho em testes
a serem consideradas no psicodiagnóstico.
Esse trabalho busca analisar a associação
entre o desempenho acadêmico, a velocidade de
execução das tarefas, e os problemas de com­
portamento infantil, avaliados pela EACI-P, bem
como as inter-relações entre esses problemas de
comportamento, desempenho e a inteligência
estimada das crianças.
instrumento, porém o preenchimento ocorreu de
maneira individualizada, sem a participação da
psicóloga, orientadora ou pedagoga da escola.
Foram critérios para seleção dos professores: que
os mesmos fossem o regente da sala e conhe­
cessem a criança por pelos menos dois meses.
Participantes
Participaram do estudo 84 crianças, com
idades entre 6 e 12 anos, média de 8,95 anos
(dp=2,0) de uma Escola Pública Municipal na
zona Sul de São Paulo, sendo 43,8% das crianças
do sexo masculino.
Instrumentos
Foi utilizada como principal instrumento a
escala de Avaliação do Comportamento Infantil
para o Professor – EACI-P: escala preenchida
pelo professor composta de 62 itens que avaliam
o comportamento da criança em cinco dimen­
sões – Hiperatividade/Problema de Conduta,
Fun­­­cionamento/Independência/Socialização
Positiva, Inatenção, Neurotismo/Ansiedade e
Socialização Negativa.
A escala apresenta uma seção para avaliação
do desempenho acadêmico (bem abaixo, abai­
xo, médio, acima e bem acima) e velocidade de
execução das atividades (lento, médio e rápido),
sempre considerando a criança em relação à
turma, questões referentes à repetência, nível de
compatibilidade da criança com a série, leitura,
ditado e aritmética. O EACI-P permite também
a coleta de informações descritivas sobre com­
portamentos relevantes, atendimentos terapêu­
ticos realizados, indicação de necessidades de
encaminhamento e/ou atendimentos, interesses
de estudos e dados sobre problemas de aprendi­
zagem na família da criança.
São sintomas avaliados pelo instrumento
conforme os seus cinco fatores/dimensões:
a) FATOR I - Hiperatividade/Problema con­
duta: Constantemente se mexe (mesmo
sentado); emite sons ou ruídos constan­
temente; pedido tem que ser imediata­
mente atendido (facilmente frustrável);
irrequieto, hiperativo, excitável, impul­
MÉTODO
Trata-se de um estudo transversal com a ava­
liação do comportamento por meio de escala pa­
dronizada, comparação entre as idades e análise
de associação entre as variáveis do instrumento
(EACI-P) e o desempenho escolar e velocidade
de execução da criança, segundo classificação
do professor.
Procedimentos
A avaliação consistiu de duas etapas. Na
primeira etapa, foi avaliado o coeficiente de in­­
teligência (Q.I) estimado das crianças, obtido
através da escala Weschler (Wisc-III), conside­
rando apenas o subteste de vocabulário e cubos,
o que determina um Q.I estimado. Na segunda
etapa, foi avaliado o comportamento das crianças
por meio da escala EACI-P. Os professores foram
orientados sobre o preenchimento adequado do
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
229
Fonseca MFB et al.
triste; chora com frequência e facilidade;
isola-se das outras crianças; submissa, tí­­­
mida e medrosa.
e) FATOR V - Socialização Negativa: Parece
não ser aceita pelo grupo; não tem espírito
esportivo; parece não ter liderança; não se
relaciona bem com o sexo oposto; não se re­­­
laciona bem com a criança do mesmo sexo.
sivo, mal humorado; perturba colegas;
provoca confusões; humor muda drasti­
camente com rapidez; matreiro, se faz de
esperto, destrutivo, mente, tem explosões
de raiva, comportamento imprevisível;
desafiador, atrevido, excessiva exigência
de atenção; provoca outras crianças ou
interfere com as suas atividades; teimoso,
sempre mudando de atividade, grita em
sala; dificuldade em esperar a sua vez,
sempre correndo ou pulando, frequente­
mente responde antes que se complete
a pergunta; tem dificuldade em brincar
quieto, fala excessivamente, frequente­
mente interrompe ou se intromete nas
atividades dos outros; frequentemente
perde objetos de uso na escola e em casa
(ex brinquedos, livros); participa das ta­­
refas que envolvem perigo sem considerar
as possíveis consequências, tenta envol­
ver o outro em confusão, começa briga
sem nenhum motivo, ridiculariza outro de
modo malicioso.
b) FATOR II - Funcionamento Independen­
te/Socialização Positiva: trabalha de for­
ma independente, persistem em tarefas
por um bom tempo, completa deveres
com pouca assistência; segue instruções
simples corretamente; funciona bem em
sala de aula, executa corretamente uma
sequência de instruções, comporta-se bem
com os colegas; comunicação verbal clara
e concatenada, comunicação verbal não
correta, compreende normas e regras so­
ciais; sabe fazer novos amigos, enfrenta
situações confiantes.
c) FATOR III - Inatenção: desatento, não
ter­­­­­­mina o que começa, dificuldades em
se con­­­centrar nos deveres escolares; difi­
cul­dades em fixar em uma brincadeira
ou jogo; dificuldades em organizar suas
atividades e deveres; muitas vezes parece
não prestar atenção ao que está sendo dito
a ele.
d) FATOR IV - Neurotismo/Ansiedade: extre­
mamente sensível; extremamente sério ou
Análise dos dados
Foi utilizado para análise dos dados o pro­
grama estatístico SPSS versão 15.0 (Statistical
Package for the Social Sciences). Para análise
dos dados categoriais, foram aplicados os testes
do Qui-quadrado e correlação V de Cramer. Na
análise dos dados numéricos, foi utilizada a
ANOVA (Análise de Variância) por idade, para
determinar se havia diferenças nos fatores do
EACI-P que fossem sensíveis à idade da criança
e correlação de Sperman entre o QI estimado do
WISC-III e os fatores do EACI-P. As variáveis do
instrumento referentes ao ponto de corte que
eram variáveis escalares foram convertidas no
programa em variáveis categoriais, através da
dicotomização do valor do ponto de corte nas
ca­­­tegoriais 0-1 (0 = abaixo do ponto de corte e
1= acima do ponto de corte), permitindo a com­
paração com outras varáveis do instrumento. As
variáveis que foram analisadas por meio do teste
de associação para variáveis categoriais foram
velocidade (lento, médio e rápido) e desempenho
(bem abaixo, abaixo, médio, acima e bem acima).
RESULTADOS
Os resultados da avaliação dos professores
quanto à presença ou não de problemas de
comportamento, nas 84 crianças avaliadas,
revelam que 7,9% (7) apresentam Hiperativi­
dade/Proble­­ma de Conduta, 2,2% (2), um nível
abaixo do es­­­pe­­rado para sua idade e nível de
escolarização no que se refere ao Funcionamento
Indepen­dente/Socialização Positiva, 13,5% (12),
Inatenção, 5,6% (5) têm sintomas de Neurotis­
mo/Ansiedade e 1,1% (1) vivencia um processo
de Socialização Negativa. A análise de como
esses problemas de comportamento influencia
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
230
Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas
e o comportamento da criança a partir da EACI-P
a velocidade de execução da criança e seu de­
sempenho escolar podem ser visualizados nas
Tabelas 1 a 4.
Os resultados das Tabelas 1 e 2 revelam que
somente a socialização negativa está associada
significativamente à velocidade de execução das
crianças (χ² = 8,98; significante para p < 0,01; V de
Cramer = 0,34), explicando 11,6% dessa variação.
Os resultados das Tabelas 3 e 4 demonstram
que o desempenho da criança é significativa­
mente associado aos fatores do EACI-P de Ina­­­
tenção (χ² = 30,60; significante para p < 0,01; V de
Cramer = 0,61) e Funcionamento Independente/
Socialização Positiva (χ² = 9,52; significante
para p<0,05; V de Cramer = 0,35). A Inatenção
é o fator que mais explica as variações no de­
sempenho das crianças, sendo responsável por
37,2% dessa variação, seguido do nível de Fun­
cionamento Independente/Socialização Positiva
que explicam 12,5% da variação.
Os resultados da Tabela 5 demonstram que
crianças de 6 a 12 anos, quando comparadas
entre si nos fatores do EACI-P, somente apresen­
tam diferenças estatisticamente significativas no
fator Funcionamento Independente/Socialização
Positiva (p<0,05), sendo melhor o desempenho
das crianças mais velhas.
Quando correlacionados os fatores do EACI-P
entre si e com o Q.I estimado do WISC-III, obser­
va-se que o Q.I apresenta correlações negativas
e significativas com a maior parte dos fatores do
EACI-P, exceção do fator Funcionamento/Inde­
pendência. Todavia, todas as correlações entre
o Q.I e os fatores são pequenas, mas já demons­
tram que conforme o Q.I aumenta num sentido,
os fatores crescem no sentido oposto. A correla­
ção mais alta é entre os fatores Hiperatividade
e Inatenção, sendo está correlação significativa
e positiva (ρ = 0,79 e p<0,01). Existem também
correlações moderadas, estatisticamente signifi­
Tabela 1 – Relação entre Velocidade e os fatores Hiperatividade, Inatenção e Socialização Negativa
do EACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer.
Hiperatividade (n = 7)¹
Velocidade
Presença nº
(%)
Ausência nº
(%)
Inatenção (n = 12)²
Presença nº
(%)
Socialização Negativa (n = 1)*³
Ausência nº
(%)
Presença nº
(%)
Ausência nº
(%)
Lento
1 (12,5%)
7 (87,5%)
1 (12,5%)
7 (87,5%)
___
8 (100%)
Médio
6 (9,2%)
59 (90,8%)
11 (9,6%)
54( 55,4%)
___
63 (100%)
Rápido
___
8 (100%)
___
8 (100%)
1 (12,5%)
7 (87,5%)
7 (8,6%)
74 (91,4%)
12 (14,8%)
69 (85,2%)
1 (1,3%)
78 (98,7%)
Total
¹ χ² = 0,93; p = 0,62; V de Cramer = 0,10; ² χ² = 1,65; p = 0,43; V de Cramer = 0,14; *³ χ² = 8,98; significante para
p < 0,01; V de Cramer = 0,34 (11,6%).
Tabela 2 – Relação entre Velocidade e os fatores Funcionamento/Independência e
Neurose/Ansiedade do IACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer.
Velocidade
Funcionamento/Independente (n = 2)¹
Neuroticismo/Ansiedade (n = 5)²
Presença nº (%)
Ausência nº (%)
Presença nº (%)
Ausência nº (%)
Lento
___
8 (100%)
___
8 (87,5%)
Médio
2 (3,1%)
63 (96,9%)
4 (6,2%)
61 (93,8%)
___
8 (100%)
1 (12,5%)
7 (87,5%)
2 (2,5%)
79 (97,5%)
5 (6,2%)
76 (93,8%)
Rápido
Total
¹ χ² = 0,50; p = 0,62; V de Cramer = 0,07; ² χ² = 1,65; p = 0,43; V de Cramer = 0,14.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
231
Fonseca MFB et al.
cativas e positivas entre Inatenção e Socialização
Negativa (ρ = 0,58 e p<0,01) e entre Neurose/
Ansiedade e Socialização Negativa (ρ = 0,66 e
p<0,05) – Tabela 6.
DISCUSSÃO
Os resultados referentes à frequência de
pro­blemas de comportamento na amostra de
crianças estudadas são diferentes das fre­quên­
Tabela 3 – Relação entre Desempenho e os fatores Hiperatividade, Inatenção e Socialização Negativa
do EACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer.
Desempenho
Hiperatividade/conduta
(n = 7)¹
Inatenção
(n = 12)*²
Socialização Negativa
(n = 1)³
Presença nº
(%)
Ausência nº
(%)
Presença nº
(%)
Ausência nº
(%)
Presença nº
(%)
Ausência nº
(%)
___
7 (100%)
1 (14,3%)
6 (85,7%)
___
7 (100%)
Acima
1 (3,8%)
25 (96,2%)
1 (3,8%)
25 (96,2%)
___
25 (100%)
Médio
2 (6,2%)
30 (93,8%)
2 (6,2%)
30 (93,8%)
1 (3,1%)
31 (96,9%)
Abaixo
3 (25%)
9 (75%)
4 (3,3%)
8 (66,7%)
___
11 (100%)
Bem Acima
Bem Abaixo
1 (25%)
3 (75%)
4 (100%)
___
___
4 (100%)
Total
7 (8,6%)
74 (91,4%)
12 (14,8%)
69 (85,2%)
1 (1,3%)
78 (98,7%)
¹ χ² = 7,07; p = 0,13; V de Cramer = 0,29; *² χ² = 30,60; significante para p < 0,01; V de Cramer = 0,61 (37,2%); ³ χ² = 1,48;
p= 0,82; V de Cramer = 0,13.
Tabela 4 – Relação entre Desempenho e os fatores Funcionamento/Independência e
Neurose/Ansiedade do EACIP, através do teste χ² (qui-quadrado) e V de Cramer.
Desempenho
Funcionamento/Independente (n = 2)*¹
Presença nº (%)
Ausência nº (%)
Neuroticismo/Ansiedade (n = 5)²
Presença nº (%)
Ausência nº (%)
Bem Acima
___
7 (100%)
___
7 (100%)
Acima
___
26 (100%)
___
26 (100%)
Médio
1 (3,1%)
31 (96,9%)
4 (12,5%)
28 (87,5%)
Abaixo
___
12 (100%)
___
12 (100%)
Bem Abaixo
1 (25%)
3 (75%)
1 (25%)
3 (75%)
Total
2 (2,5%)
79 (97,5%)
5 (6,2%)
76 (93,8%)
*¹ χ² = 9,52; significante para p<0,05; V de Cramer = 0,35 (12,5%); ² χ² = 7,62; p = 0,10; V de Cramer = 0,30.
Tabela 5 – Análise do desempenho de crianças de 6 a 12 anos nos fatores do EACIP, utilizando a ANOVA.
Fatores
N
Min.
Max.
Média
Dp
P
Hiperatividade
81
___
81
17,56
22,04
0,86
Inatenção
81
___
18
5,16
6,1
0,58
Funcionamento/Independência
81
___
36
17,53
12,75
0,03*
Neuroticismo/Ansiedade
80
___
21
3,93
4,33
0,11
Socialização Negativa
79
___
10
1,9
2,82
0,52
* significante para p < 0,05.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
232
Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas
e o comportamento da criança a partir da EACI-P
Tabela 6 – Correlação de Spearman entre os fatores do EACIP e o QI estimado do WISC.
Variáveis
WISC
HIPER
INATE
FUNIND
NEUSE
SONE
WISC
1,00
- 0,30**
-0,38**
-0,01
-0,22*
-0,28*
HIPER
-0,30**
1,00
0,79**
0,16
0,41**
0,46**
INATE
-0,38**
0,79**
1,00
0,11
0,50**
0,58**
-0,01
0,16
0,11
1,00
0,26*
0,04
FUNIND
NEUSE
-0,22*
0,41**
0,50**
0,26*
1,00
0,66*
SONE
-0,28*
0,46**
0,58**
0,04
0,66*
1,00
Legenda: WISC – QI estimado do WISC; HIPER - Hiperatividade; INATE – Inatenção; FUNIND – Funcionamento/Independência;
NEUSE – Neurose/Ansiedade; SONE – Socialização Negativa. * significativa para p<0,05; **significativa para p<0,01.
cias encontradas em outros estudos8,10. No es­
tudo de Brito et al.8, que avaliou 402 crianças do
Rio de Janeiro, por exemplo, verificou-se que
11,9% das crianças apresentaram Inatenção e
4,2% Hiperatividade/Problemas de conduta,
enquanto que, no nosso estudo com crianças da
cidade de São Paulo, as frequências para esses
domínios foram de 13,5% e 7,9%, respectiva­
mente. As médias também das crianças por nós
avaliadas nos instrumentos foram diferentes,
enquanto que no estudo de Brito et al.8 as médias
foram: Hiperatividade/Problemas de conduta
(M=17,5), Inatenção (M=5,1), Funcionamento
Independente/Socialização Positiva (M=17,5),
Neurotismo/Ansiedade (M=5,0) e Socialização
Negativa (M=2,6); no presente estudo, elas
foram: Hiperatividade/Problemas de conduta
(M=12,7), Inatenção (M=3,3), Funcionamento
Independente/Socialização Positiva (M=24,6),
Neurotismo/Ansiedade (M=3,9) e Socialização
Negativa (M=1,9) (Tabela 5). Esses achados re­
velam que existem diferenças para a frequência
de problemas de comportamento entre crianças
do Rio de Janeiro e São Paulo, se significativas
ou não, depende da realização de outros estudos,
inclusive as diferenças encontradas relativas às
médias para as subescalas do EACI-P apontam
para a necessidade de normas específicas para
a população de crianças do Estado de São Paulo.
Os resultados referentes à velocidade de
execução (Tabelas 1 e 2) de que somente a so­
cialização negativa está associada a esse fator,
explicando 11,6% da sua variação, permite hi­
potetizarmos que o fato da criança apresentar
relacionamentos sociais pobres e apresentar
características de maior passividade frente ao
grupo, influencia o modo pelo qual ela se adapta
às exigências ambientais escolares em amplos
aspectos desde as demandas de socialização
até as acadêmicas. Neste sentido, Speakman et
al.21, por exemplo, apontam que entre os fatores
de risco para problemas de aprendizagem estão
os relacionamentos sociais pobres. Entretanto,
a questão é como a socialização negativa está
envolvida no desenvolvimento de problemas de
aprendizagem. Com base na análise da Tabela
3 observamos que a socialização negativa não
influencia o desempenho acadêmico, mas sim
a velocidade de execução, indicando o meca­
nismo explicativo que pode estar associado a
está variável.
Outro achado interessante é de que houve
correlação moderada, estatisticamente signifi­
cativa e positiva entre Inatenção e Socialização
Negativa (Tabela 5). Sabemos que crianças com
TDAH tipo predominante desatento apresen­
tam desempenho mais lentificado conforme
Simões19 e Miranda-Casas et. al.18 e que crianças
com TDAH também tendem a apresentar mais
problemas de socialização e prejuízos nas habi­
lidades sociais22.
O fato da Inatenção ser o fator mais expres­
sivo nas variações no desempenho das crianças,
sendo responsável por 37,2% dessa variação,
seguido do nível de Funcionamento Indepen­
dente/Socialização Positiva que explica 12,5%
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
233
Fonseca MFB et al.
da variação, foram achados que permitem al­
gumas considerações. Primeiro como a atenção
traduz, de maneira geral, a habilidade da criança
em manter o interesse em determinada tarefa
ou ideia, inclusive manipulando suas próprias
distrações23, sendo requisito para a execução
de qualquer tarefa escolar, o seu prejuízo im­
pacta de maneira geral o desempenho escolar
da criança. Isso é especialmente observado em
crianças com TDAH cujo perfil de inatenção
faz com que tenham dificuldades de atenção
seletiva, sustentada, de organização, inibição e
integração no curso da execução de tarefas, por
exemplo, escolares24,25.
Outro dado é que há influência recíproca
entre o desenvolvimento emocional e cognitivo,
sendo possível uma associação entre problemas
comportamentais e desempenho acadêmico12.
Mui­­­tas vezes as necessidades da criança de
maior autonomia e independência não são ade­
quadamente atendidas pelo ambiente escolar e
familiar, fazendo com que a mesma não encontre
a motivação e confiança necessárias para o de­
senvolvimento de um apropriado autoconceito
sobre suas próprias capacidades de aprendiza­
gem e desempenho acadêmico26.
As correlações entre o Q.I estimado do WISC-III
e os fatores do EACI-P corroboram os achados do
estudo de Naglieri et al.27. Nesse estudo que bus­
cou correlacionar os escores no WISC-III com
as escalas Conners, versão pais e professores,
e Continuous Performance Test, aplicado a 117
crianças de 6 a 16 anos, foram demonstradas no
WISC-III correlações significativas com a escala
Conners versão professores, sendo a correlação
mais importante encontrada para o fator Ina­
tenção (r = -0,37), semelhante ao nosso estudo
a correlação para este fator também foi pequena
e significativa (ρ = -0,38). Como o Q.I estimado
do WISC-III apresentou correlações negativas
e significativas com a maior parte dos fatores
do EACI-P, traçamos a hipótese que a reserva
cognitiva traduzida no fator (“G”) é uma medida
de proteção no que se refere ao desenvolvimento
de problemas de comportamento na infância, já
que eles tendem a crescer em sentidos opostos.
Nesse sentido, a literatura tem revelado que
crianças com Q.I acima da média têm menores
taxas de morbidade psiquiátrica, enquanto que
crianças com Q.I abaixo da média são mais vul­
neráveis para desenvolvimento de transtornos
de comportamento, apresentando, assim uma
maior prevalência dos mesmos28.
CONCLUSÃO
Os resultados demonstram que a Escala de
Comportamento Infantil para o Professor (EACI-P)
apresenta dados importantes para compreender
o comportamento e a aprendizagem da criança
no ambiente escolar, auxiliando o professor nas
suas funções pedagógicas. Portanto, enquanto
instrumento estruturado, a escala favorece a com­
preensão do professor em relação às variáveis en­
volvidas no processo de ensino-aprendizagem,
permitindo aos profissionais da educação refletir
sobre suas observações e registros, remetendo­
-as a processos de intervenção a curto, médio e
longo prazo.
O estudo corrobora outros achados da lite­
ra­­­­­tura sobre a influência dos problemas de com­­­­­­­­­­­­­­­­­­
portamento no desempenho acadêmico de crian­­­­
ças em processo de escolarização, demonstrando
as inter-relações entre comportamento, desempe­
nho acadêmico, velocidade de exe­­­cu­­ção e inteli­
gência, apontando-os também como importantes
fatores de risco ou proteção para o desenvolvi­
mento típico da criança e da sua aprendizagem,
dependendo dos mesmos estarem preservados
ou comprometidos.
Concluímos que este estudo indica a neces­
sidade de um cuidado especial quanto à obser­
vação do comportamento da criança no ambiente
da aprendizagem, oportunizando assim inter­
venções mais precoces e com validade ecológica.
Entendemos que as relações professor-aluno-es­
cola são fundamentais para o desenvolvimento
cognitivo e psicossocial da criança, e quando
ade­­­quadamente mediados, podem evitar a ins­­­
tauração de problemas de aprendizagem, com­
portamentais e interpessoais.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
234
Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas
e o comportamento da criança a partir da EACI-P
SUMMARY
Analysis of association between the academic performance, the speed
of execution of tasks and behavior of children from EACI-P
Objective: The aim of this study was to analyze the association between
academic achievement, assessed by Child Behavior Scale for Teacher (EACI-P),
as well as to correlate it to behavioral problems, speed of performance and IQ
score. Methods: This is a cross-sectional study analysing EACIP Inventory
answers through standardized comparison to neuropsychological variables
in 84 children. Results: Hyperactivity and conduct problems prevailed in
7.9% (7 cases) children, 2.2% of cases showed difficulties in Independent
Func­­­tioning / Positive Socialization, 13.5% revealed inattention, 5.6% (5 cases)
showed symptoms of neuroticism / anxiety and 1.1% (1 case) of cases ex­­­
periences a negative socialization. Global performance was associated with
inattention scores and positive socialization, whereas hyperactivity symptoms
were correlated to inattention. Speed of performance was associated with
negative socialization and IQ score was negatively correlated to all behavioral
variables except independent functioning. Conclusion: It is possible through
the application of EACI-P to obtain data to understand behavior and learning
correlations, supporting early intervention. Behavior, speed of performance
and intelligence could be either risk or protective factors for learning if they
are preserved or impaired. Such data suggest that teacher-student interface
is crucial to understand psychosocial development of children and could give
support to positive approaches to face learning, behavior and interpersonal
problems.
KEY WORDS: Behavior. Child. Learning.
REFERÊNCIAS
6. Brito GN, Pinto RC, Lins MF. A behavioral as­
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Artigo recebido: 11/7/2011
Aprovado: 23/9/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36
236
Reflexões sobre Psicopedagogia
, estresse
e distúrbios do sono do professor
ARTIGO
original
Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse
e distúrbios do sono do professor
Luiza Elena Ribeiro do Valle; Rubens Reimão; Sigmar Malvezzi
RESUMO – Introdução: A Psicopedagogia se ocupa dos fatores envolvidos
na aprendizagem. Os sintomas de estresse e os distúrbios do sono também
repercutem na aprendizagem, especialmente quando esses transtornos
ocorrem com o professor, o responsável pelo processo de ensino. Objetivo:
O objetivo desta pesquisa é investigar o tipo de sintomas de estresse de
professores da rede pública de Poços de Caldas. Método: A pesquisa,
do tipo exploratório descritivo, estudou uma população de conveniência
de 165 professores de Poços de Caldas, dos quais 59% apresentavam
estresse e 46,7% eram maus dormidores, evidenciando associação entre
os sintomas de estresse e o sono. Por meio do Questionário de Fatores de
Estresse dos Professores (QFEP-Valle & Malvezzi), foram investigados os
aspectos qualitativos do estresse dos professores. Resultados: Os fatores
predominantes que estressam os professores são: dupla jornada de trabalho
e multiplicidade de tarefas, salário, barulho nas salas de aula e dificuldades
nas relações família-escola. Conclusões: Este estudo revela a necessidade de
pesquisas e atenção ao professor para prevenir consequências prejudiciais
do estresse e dos distúrbios do sono.
UNITERMOS: Estresse psicológico. Sono. Transtornos do sono. Do­­­cen­­­
tes. Saúde do trabalhador.
Luiza Elena Ribeiro do Valle – Psicóloga, Psicopedagoga,
Mestra em Psicologia Educacional (PUC), Doutora em
Psicologia Social (USP), São Paulo, SP, Brasil.
Rubens Reimão – Médico Neurologista, Professor Livre
Docente de Neurologia Divisão de Clínica Neurológica
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Líder do
Grupo de Pesquisa Avançada em Medicina do Sono –
HCFMUSP, São Paulo, SP, Brasil.
Sigmar Malvezzi – Psicólogo, Professor Doutor do De­­
par­­­­tamento de Psicologia Social e do Trabalho (PST/
USP), São Paulo, SP, Brasil.
Correspondência
Luiza Elena Ribeiro do Valle
Rua Goiás, 77 – Poços de Caldas, MG, Brasil –
CEP: 35701-005
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
237
Valle LER et al.
O estresse e os distúrbios do sono são ameaças
graves, porque causam sofrimento e repercutem
em toda a sociedade, quando o profissional é
um educador, responsável por crianças e adoles­
centes.
O estresse pode ser entendido como resultado
de um ajuste entre características específicas situacionais e as reações que estas desencadeiam,
nas quais o sistema nervoso simpático se coloca
em alerta. Nem sempre o estresse é negativo. O
estresse pode impulsionar o organismo à adaptação e, nesse caso, recebe o nome de “eustress”.
O estresse negativo (distresse) ocorre quando o
esforço é exagerado e prejudicial. Entretanto,
uma situação estressora poderá ser ruim para um
determinado indivíduo e não necessariamente
para outro; a intensidade de seu impacto será
maior ou menor de acordo com a avaliação que
o indivíduo fizer do evento estressor.
A presença e a intensidade das respostas variam e dependem da avaliação que o indivíduo
fizer do evento, assim como de suas experiências
prévias adquiridas para manejar tal situação. O
estresse pode ocorrer em diferentes níveis, de
uma forma mais transitória ou grave, e no último
caso, resulta em consequências que irão afetar
a saúde do indivíduo, conforme a fases em que
se encontra:
1. Na fase de alerta ou alarme, ocorre uma
reação principalmente biológica, o orga­
nismo é mobilizado para situações de
emergência numa reação natural de defesa
e preservação da vida, denotando alguns
sintomas, como taquicardia, tensão, suor
nas mãos, nos pés, palidez, insônia, esgotamento, irritação e mudança de humor2;
2. Na fase de resistência, quando o organis­
mo procura se restabelecer em busca de
adaptação, mas se o estresse persiste, leva
o sujeito à terceira fase;
3. A fase de quase exaustão é um agravamento da fase de resistência, que foi
acrescentada por Lipp3 para designar o
enfraquecimento do organismo;
4. A fase de exaustão se manifesta por meio
do adoecimento do órgão mobilizado na
INTRODUÇÃO
A atividade do professor se distingue de todas
as outras, pela sua natureza e pelo seu valor
social. O professor tem uma função complexa,
considerando que cada um dos alunos tem características únicas e necessidades muito diferentes. Conforme os conhecimentos se ampliam
e o mundo se transforma por meio de inovações
tecnológicas e de comunicação globalizada, as
dificuldades se acumulam para o professor que
precisa se adaptar a novas exigências que promovam a aprendizagem de seus alunos.
A Psicopedagogia é um campo do conhecimento que se propõe a integrar conhecimentos científicos para compreender e intervir nos
pro­­­­cessos de aprendizagem humana. Amaral1
analisa a situação do psicopedagogo na media­
ção sujeito-escola-família e afirma que as trans­­
formações muito rápidas do mundo moderno
geraram a não permanência nos valores e indefinição dos objetivos que precisamos ou queremos
alcançar: “Pais e professores sentem-se muitas
vezes desorientados, não sabem ou não conseguem educar; e, de outro lado, filhos e alunos
indagam o que eles podem esperar dos adultos e
o que se espera deles próprios. Assim, os papeis
não se estabelecem. Eles precisam de princípios
norteadores para se sentir seguros, confiantes e
estimulados para enfrentar os desafios”. Então,
o psicopedagogo se defronta com mais esse desafio: não bastam técnicas de ensino e aprendizagem para transformar a educação em sucesso
efetivo dos alunos e realização profissional dos
professores!
Na medida em que o estresse e os distúrbios
do sono interferem no desempenho dos professores e na aprendizagem dos alunos, percebe-se
uma lacuna que não vem recebendo atenção de
profissionais especializados na aprendizagem
e, muito menos, dos responsáveis por políticas
administrativas, que dependem de relatórios e
pesquisas para reger as normas educacionais de
acordo com as demandas existentes. As exigências do trabalho obrigam o professor a esforços
e podem comprometer o seu equilíbrio e saúde,
interferindo em sua atividade de sono, também.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
238
Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor
fase da resistência, ou a morte súbita que,
segundo França e Rodrigues4 representa,
muitas vezes, a falha dos mecanismos de
adaptação. Há uma exaustão psicológica
em forma de depressão e uma exaustão
física, que se manifestam em doenças que
podem levar à morte, conforme afirma
Lipp5.
O estresse provoca tensão física e psicológica,
queda de capacidade intelectual, perturba­­­ções
do sono, levando à fadiga, conforme explica
Goldstein6. Os sinais e os sintomas mais frequentes que ocorrem em um organismo estressado,
em relação ao SNC e psiquismo, são: cansaço
físico e mental, nervosismo, irritabilidade, ansiedade, insônia, dificuldade de concentração,
falha de memória, tristeza, indecisão, baixa
autoestima, sentimento de solidão, sentimento
de raiva, emotividade, choro fácil, pesadelos, depressão, isolamento, perda ou excesso de apetite,
pânico. Alterações de comportamento também
poderão ocorrer, como: alcoolismo, consumo de
drogas ilícitas, uso dos calmantes e ansiolíticos,
comportamento autodestrutivo e robotização do
comportamento7.
O professor enfrenta jornadas de trabalho excessivas para aumentar seu salário, burocracias
e pressões de superiores e colegas, indisciplina
dos alunos e falta de reconhecimento pelo trabalho, o tédio decorrente de tarefas repetitivas,
além de aspectos pessoais e psicológicos que
tam­­­bém são fatores de risco para os professores, tais como a falta de formação científica do
professor, demandas múltiplas geradoras de
contínua e crescente de tensão, que ainda se
acentuam diante de alunos com dificuldades
ou necessidades especiais8. Somam-se, ainda,
os fatores ergonômicos, como o design do mobiliário escolar, iluminação das salas de aula, o
isolamento acústico, o nível de ruído e temperatura do ambiente e limitações humanas, conforme preconizado pela International Ergonomics
Association (IEA), segundo Sobrinho9.
Segundo Reimão et al.10, frequentemente,
distúrbios do sono não são diagnosticados ou tratados, apesar dos claros prejuízos que provocam.
Os distúrbios do sono trazem consequências à
saúde do professor e resultam em importante
custo financeiro e funcional para sociedade,
porque leva ao afastamento do professor de sua
função primordial, em função de aumentar a
vulnerabilidade ao estresse e a doenças.
A ansiedade que pode surgir diante de fatores
estressantes pode gerar níveis graves de insônia
e evoluir para transtornos graves e crônicos, que
podem incluir fragmentação do sono com múltiplos despertares e dificuldade em conciliar o
sono, gerando desequilíbrio no comportamento e
na saúde. Um estudo quantitativo e exploratório,
com uma amostra de 52 educadores, para saber
se avaliam a importância do sono dos alunos,
resultou em preocupação! Apenas 6% indicaram alguma tentativa de interferir com relação
à higiene do sono dos alunos, e sem sucesso,
levando à conclusão de que os professores não
estão preparados para prevenir e encaminhar
problemas do sono, de forma que os distúrbios do
sono na escola não são observados, diagnosticados e tratados, apesar dos avanços científicos11.
Diante dessas constatações, surge o objetivo
do presente trabalho, que é a investigação dos
fatores relacionados aos sintomas de estresse
e aos distúrbios do sono de professores, tendo
como foco a população de professores de crianças e adolescentes do ensino público. O que se
busca é desenvolver conhecimentos compreensivos da Psicopedagogia sobre esses processos
sempre atuais de aprendizagem e desempenho,
sugerindo a hipótese de que, já que os fatores
de estresse e distúrbios do sono interferem no
trabalho do professor, precisa-se conhecer e compreender quais os fatores que mais incomodam
os professores, podendo resultar em prejuízo no
desempenho do professor, consequentemente
em sua saúde e na aprendizagem dos alunos.
Aprendizagem, inserida no contexto social, pre­­­
cisa considerar as interações múltiplas, que
su­­­peram as concepções propostas nas visões
anteriores do aprender formal e informal. O novo
enfoque precisa reconhecer as diferentes formas
do pensar, sentir, viver as diversidades culturais
e o dinamismo desse conjunto na realidade da
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
239
Valle LER et al.
escola, que o professor lidera no contato com os
alunos e familiares.
no aspecto pessoal no desempenho do trabalho
(Figura 1).
Com relação aos fatores estressantes voltados
para o ambiente de trabalho, as queixas mais
fortes (peso 2) concentram-se nas colunas 3 e 8,
demonstrando insatisfação com barulhos na sala
e um interesse em maior participação dos familiares dos alunos no ambiente escolar (Figura 2).
Finalmente, quanto aos fatores causadores
de estresse em relação ao aspecto ocupacional
ou administrativo, a coluna 4 se sobressai, indicando desejo de um aumento na remuneração
(Figura 3).
METODO
Trata-se de pesquisa exploratória descritiva,
qualitativa e quantitativa.
Foi utilizada uma amostra de conveniência12,
constituída por 165 professores da rede pública
de ensino de Poços de Caldas, pré-avaliada pa­­
ra detectar sintomas de estresse e distúrbios do
sono13, que apontou que 59% dos professores
apre­­­sentavam estresse, e 46,7% eram maus
dor­­­midores, evidenciando associação entre os
sintomas de estresse e o sono. Neste trabalho,
utilizou-se o Questionário de Fatores de Estresse
do Professor (QFEP/Valle-Malvezzi)13, que foi
aplicado ao grupo total de professores (que se
distribuem na população avaliada numa proporção próxima da média de professores com e sem
os sintomas de estresse e distúrbios do sono).
As questões do QFEP-Valle/Malvezzi (Anexo
1) foram selecionadas a partir da pesquisa na
busca por queixas mais frequentes dos professores, que eles consideram que contribuem
para desenvolver o estresse. Os fatores potenciais
de estresse se configuram neste instrumento
em individuais, ambientais e organizacionais.
São trinta e seis questões que avaliam como o
professor se sente em relação às exigências de
tarefas inerentes ao trabalho, ambiente e organização. As questões recebem pontuação de zero
(0), um (1) ou dois (2) pontos para que se possa
com­preender o quanto cada um desses fatores
interfere na atividade diária do professor, de
acordo com a própria avaliação.
DISCUSSÃO
Os professores estão expostos a situações
que alteram seu equilíbrio biopsicossocial, que
geram necessidade de adaptação por parte do
organis­mo. O professor se depara com uma
gran­­­­­­de necessidade de adaptação e de desenvolvimento de novas habilidades para absorver o
ritmo e o significado de transformações, positivas
ou negativas, que influenciam todos os aspectos
da vida dos indivíduos e que requerem esforços
físicos, psicológicos e emocionais. Esse esforço
de adaptação gera o fenômeno do estresse, interligado ao processo do sono, e muito presente na
contemporaneidade, sendo, portanto, um sério
campo de reflexões, especialmente, porque o
professor é personagem principal no palco da
aprendizagem.
O estresse interfere no desempenho ocupacional, nas relações sociais e no sono do pro­­fessor,
mas o problema tem sido ignorado na sociedade e
nas instituições educacionais, em função de desconhecimento da gravidade desses transtornos
e da falta de dados científicos e de instrumentos
para investigação, prevenção pri­­­mária, evitando
o problema, ou prevenção secun­­­dária, atenuando
a ação maléfica resultantes do estresse acentuado e dos distúrbios do sono e comorbidades, ou
mesmo, prevenção terciária, tratando os prejuízos
causados e recuperando a saúde.
Os fatores individuais predominantes que
estressam os professores são: dupla jornada de
tra­­­­balho e multiplicidade de tarefas, segundo as
RESULTADOS
Conforme respondem às perguntas, os professores nos oferecem o quadro de quais os
fatores que consideram mais estressantes (peso
2), a partir de uma experiência pessoal, inicialmente. Nos resultados, os professores apontam
o excesso de trabalho (coluna 1 - dupla jornada
de trabalho), falta de tempo para si mesmo (coluna 2) e multiplicidade de tarefas do educador
(coluna 5), entre as preocupações mais intensas
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
240
Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor
Anexo 1 – Questionário do Estresse do Professor (QFEP)
Luiza Elena Ribeiro do Valle
Sigmar Malvezzi
Avalie os fatores potenciais de estresse que mais o(a) abalam e interferem em seu rendimento, atribuindo-lhes valores de 0, 1 ou 2:
I - Atividades do Trabalho:
01. Longas jornadas de trabalho ( )
02. Dupla jornada de trabalho – trabalho e tarefas do lar ( )
03. Falta de tempo para si ( )
04. Falta de oportunidade de atualizações profissionais ( )
05. Multiplicidade de tarefas do educador (ler, planejar, fazer relatórios, corrigir) ( )
06. Falta de formação compatível com as exigências ( )
07. Dificuldades em lidar com os problemas sociofamiliares dos alunos ( )
08. Indisciplina dos alunos ( )
09. Falta de condições de lidar com os problemas socioculturais que se apresentam ( )
10. Falta de valorização pessoal ( )
11. Falta de atendimento às suas necessidades pessoais no trabalho ( )
12. Dificuldades de relacionamento no trabalho ( )
II – Ambiente de Trabalho:
01. Salas superlotadas de alunos ( )
02. Exposição a temperaturas inadequadas ( )
03. Exposição a ruídos inadequados ( )
04. Falta de recursos no ambiente de trabalho (móveis, área de recreação, biblioteca, etc.) ( )
05. Falta de recursos tecnológicos – computadores, TV, internet, etc. ( )
06. Falta de condições para obter resultados satisfatórios dos alunos ( )
07. Insegurança física e psicológica ( )
08. Falta de contato cooperativo com os familiares na escola ( )
09. Imagem da escola mal conceituada junto à comunidade ( )
10. Falta de orientação psicológica no trabalho ( )
11. Falta de equipe interdisciplinar de apoio ( )
12. Falta de lazer e atividades entre a equipe profissional ( )
III – Aspectos Administrativo/Burocrático
01. Burocratização das atividades ( )
02. Falta de diálogo com a administração ( )
03. Controle excessivo, tolhimento ou dificuldades com gestores e supervisores ( )
04. Falta de remuneração satisfatória ( )
05. Insegurança nos contratos de trabalho ( )
06. Dificuldades para chegar ao local de trabalho ( )
07. Exigências curriculares e metas incompatíveis com a realidade da turma ( )
08. Tempo de dedicação exigido excessivo ( )
09. Falta de critérios de avaliação adequados ( )
10. Falta de campanhas educacionais de apoio junto à comunidade ( )
11. Falta de reconhecimento administrativo do profissional ( )
12. Falta de programas de aprimoramento profissional ( )
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
241
Valle LER et al.
do ensino, ampliar a ocorrência de agressão na
escola, entre outros aspectos negativos que se
refletem no clima da sala de aula e nos alunos.
O estresse representa um risco bastante complexo, determinado por diferentes causas e formas de enfrentamento das situações de trabalho.
Diversos fatores, como a globalização, a modernização tecnológica e o redimensionamento do
quadro de trabalhadores, que provocam desestabilidade e insegurança de ação, se encontram
entre os determinantes ou antecedentes mais
contributivos à geração do estresse emocional
nas organizações, interferindo na saúde dos tra­­­
balhadores14. O professor tem metas a cumprir
como agente social, um papel que o sobrecarrega
de expectativas por parte da comunidade, dos
colegas, superiores ou alunos. Do professor se
espera a educação dos alunos, o que significa a
competência na prática de ensino para que os
alunos aprendam o conteúdo programado em
sua grade escolar e, ainda, implica na orientação do comportamento que a sociedade prevê
para um cidadão adaptado. Se a Educação for
“uma capacidade eficaz de instrumentalizar-se
funcionalmente para produzir como em uma
imaginária linha de montagem indivíduos pragmaticamente instruídos, em lugar de pessoas
críticas e amorosamente educadas, então, talvez
a educação, a escola e a sala de aulas bem mereçam os cenários de violência com que se vêem
ameaçadas a conviver cada vez mais”15.
Pensar no educador como um agente de in­­­
formações, simplesmente, não faz justiça ao esforço desse profissional, que diariamente lida com
pessoas diferentes em plena fase de formação e
que dependem de sua iniciativa, na programação,
realização e avaliação das aulas, dentro ou fora da
escola. Com relação ao conteúdo programático,
o professor, na atualidade, encontra referências
e orientações para manter em dia os próprios
conhecimentos, mas isso representa um investimento necessário de tempo e desgaste pessoal
indiscutível.
O magistério é uma categoria de trabalho de
vulnerabilidade em relação ao estresse, com suas
consequências em prejuízo da saúde Mental,
Figura 1 – Fatores estressores pessoais no trabalho.
Figura 2 - Fatores estressores relativos ao ambiente de trabalho.
Figura 3 - Fatores estressores ocupacionais.
respostas dos professores em Poços de Caldas. Nos
fatores voltados para o ambiente escolar, as dificuldades se mostraram mais acentuadas nas relações
família-escola, pela dificuldade em conduzir um
trabalho conjunto nesse aspecto. Entre os fatores
organizacionais, as queixas predominantes referiram-se ao desejo de aumento na remuneração.
Os professores se encontram em situação de
vulnerabilidade para enfrentar as complexas
pressões que sobre eles são exercidas. Professores estressados podem gerar ou intensificar o
estresse do aluno, levá-lo à ansiedade, reduzir a
motivação, prejudicar a qualidade e o resultado
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
242
Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor
cooperação de cada um e o esforço conjunto de
solidariedade. Portanto, o psicopedagogo precisa
orientar o melhor dos esforços, sempre por meio
de ações integradas, para conscientizar a ação
social, inclusive os organismos públicos de ação
social e instituições educacionais sobre a importância de lidar com o estresse e com os distúrbios
do sono. A criação de programas que valorizem
relações sociais de respeito e ética, em todos os
momentos, especialmente fazendo reconhecer
a figura do professor em seu papel inestimável,
poderia valorizar seu papel na sociedade, que
se busca construir pela educação.
Para Malvezzi18, a criação de novos instrumentos que problematizem as questões referentes ao trabalho é essencial e isso depende
de pesquisas sobre as organizações no trabalho.
Assim, compreender a situação dos transtornos
do estresse e do sono do professor, em Poços
de Caldas, para discutir os fatores envolvidos,
além de possibilitar a reflexão sobre fatores que
interferem na saúde e na atuação do professor
em seu trabalho, também poderá colaborar com
a construção do conhecimento na área.
Há muito que ser feito! Novas pesquisas sobre o
tema, mudando ações no sentido do que se busca
desenvolver, poderão mostrar novas realidades e
colorir com cores de afetividade e humanismo, um
mundo que se obscurece na tristeza do estresse e
nas noites sem qualidade de sono. A aprendizagem se faz no movimento diário, nas entrelinhas
dos relacionamentos, mas o psicopedagogo pode
ajudar a escolher como foco para nossa sociedade
o prazer de viver bem.
conforme demonstram os estudos de Meira16 com
professores do Ensino Fundamental. Segundo
Meleiro17, “o professor é uma das profissões mais
estressantes na atualidade”. Compreender os
fatores que mais atingem os professores em seu
trabalho torna-se um recurso a mais para interferir em tais situações e prevenir o problema.
CONCLUSÃO
Há necessidade de uma mudança decisiva
nos padrões educacionais em prática, no sentido
de respeitar o professor em seu papel formativo,
orientando os valores de família e de cidadania.
Entretanto, esse aspecto relevante não sido suficientemente considerado no sistema educacional, que não promove questões básicas no suporte que o professor precisa receber para lidar com
o próprio estresse e sono, além de orientar alunos
e familiares no mesmo sentido. Não bastam as
resoluções que apenas se referem à racionalização administrativa e de gastos e à adequação
da educação às necessidades do mercado de
trabalho, mas é sabido que esses cuidados não
representam uma tarefa fácil. É difícil porque a
sociedade vive uma crise de valores, responsável
por desencadeamento de estresse, mais do que
do oferecimento de recursos de enfrentamento e
de desenvolvimento de um pensar mais abrangente, com vistas para o futuro, não apenas para
a situação imediata, que, frequentemente, dita
normas incoerentes com as necessidades pessoais de saúde. É preciso desenvolver espaço
para o relacionamento interpessoal que prioriza
o respeito, a compreensão das dificuldades, a
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
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Valle LER et al.
SUMMARY
Studies on Psychopedagogy, teacher’s stress and sleep disorders
Introduction: Psychopedagogy cares about involved factors in learning.
Stress’s symptoms and sleep’s disorders also affects learning, especially when
these disorders happens to teachers. Purpose: The purpose of this research
is to investigate the type of teachers stress’s symptoms in public net of Poços
de Caldas. Methods: This exploratory and descriptive research studied a
population of 165 teachers, through the means of QFEP-Valle&Malvezzi,
analyzing a descriptive exploratory, that revealed that 59% of the teachers
were stressed and 46.7% of the teachers sleep badly, pointing out undeniable
association between sleep and stress. Results: The predominant teacher’s
stress factors are: double hours of working and multiplicity of tasks, salary,
noisy in classroom, difficulties with the relations family-school. Conclusion:
The conclusion of this study also disclosed the call for further developments
in the investigation of teachers’ care as a means for the prevention of stress
and sleep disorders.
KEY WORDS: Stress, psychological. Sleep. Sleep disorders. Faculty. Occu­­­
pational Health.
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Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
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Trabalho integra Tese de Doutorado, aprovada pelo
De­­­­partamento de Psicologia Social de do Trabalho do
Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo,
São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 30/7/2011
Aprovado: 21/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45
245
Oliveira ORIGINAL
DG et al.
ARTIGO
Análise da produção escrita de crianças
com dislexia do desenvolvimento submetidas
a intervenção fônica computadorizada
Darlene Godoy de Oliveira; Karen Kaufmann Sacchetto; Karen Ueki; Patrícia Botelho da Silva; Elizeu Coutinho de Macedo
RESUMO – Introdução: Déficits de escrita são comuns em crianças disléxicas,
especialmente nos domínios de codificação ortográfica e fonológica. Procedimentos
de avaliação psicopedagógica devem considerar a semiologia de erros de escrita, para
promover o desenvolvimento eficaz destas habilidades. Programas interventivos com foco no
processamento fonológico contribuem para melhora nas habilidades de linguagem escrita
de disléxicos. Objetivo: Este estudo objetivou verificar mu­­­danças no padrão de escrita de
disléxicos submetidos à intervenção com o soft­wa­­­­re Alfabetização Fônica Computadorizada,
por meio da análise dos tipos de erros or­­­tográficos. Método: Vinte crianças, com idade
média de 11,7 anos, com diag­­­­nóstico de dislexia foram avaliadas em tarefas de leitura e
escrita e divididas em dois grupos pareadas por idade, sexo e escolaridade. O GI (n=10)
foi submetido à intervenção em 16 sessões semanais. O GII não recebeu tratamento.
Todos os sujeitos foram novamente avaliados após a intervenção. Resultados: Análises
da primeira avaliação indicaram que os grupos tinham o mesmo nível de escrita. Na
segunda avaliação, houve aumento significativo da velocidade de escrita no GI. Não houve
diferenças significativas para aumento do número de acertos e para diminuição de erros
de escrita conforme as categorias analisadas, apesar de haver decréscimo na média de
erros por palavra e nas categorias de correspondência biunívoca, omissão de segmento,
correspondência regular contextual, correspondência irre­­­gular independente de regras
e supercorreção. Estes resultados são discutidos con­­­siderando o modelo de intervenção
psicopedagógico, o número de sessões e as habilidades treinadas. Conclusão: A utilização
do software Alfabetização Fônica Computadorizada pode auxiliar no desenvolvimento da
escrita em crianças disléxicas em conjunto ao treinamento de habilidades ortográficas.
UNITERMOS: Dislexia. Escrita manual. Avaliação educacional.
Correspondência
Darlene Godoy de Oliveira
Rua Piauí, 181 – 10º andar – São Paulo, SP, Brasil –
CEP 01241-000
E-mail: [email protected]
Darlene Godoy de Oliveira – Psicóloga, mestre e dou­­­­to­­­­randa
em Distúrbios do Desenvolvimento pela Uni­­­versidade Pres­­
biteriana Mackenzie. Bolsista FAPESP, São Paulo, SP, Brasil.
Karen Kaufmann Sacchetto – Pedagoga, Especialista em
Distúrbios de Aprendizagem pelo CRDA, mestranda em
Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Pres­­
biteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Karen Ueki – Graduanda em Psicologia pela Uni­­­ver­­­sidade
Presbiteriana Mackenzie. Bolsista CNPq, São Paulo, SP, Brasil.
Patrícia Botelho da Silva – Graduanda em Psicologia pe­­­­­la
Uni­­­­­­­­versidade Presbiteriana Mackenzie. Bolsista Ma­­ck­­pes­­
quisa, São Paulo, SP, Brasil.
Elizeu Coutinho de Macedo – Psicólogo, mestre e doutor
em Psicologia Experimental pela USP, Professor e coor­­­de­
nador do programa de pós-graduação em Dis­­­túrbios do
Desenvolvimento da Universidade Pres­­­biteriana Mackenzie.
Pesquisador produtividade CNPq, São Paulo, SP, Brasil.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
246
Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada
autores elencaram três habilidades distintas,
mas inter-relacionadas, no desenvolvimento
típico da escrita: a caligrafia, a composição e a
codificação gráfica. A caligrafia engloba o de­­­
senvolvimento de habilidades motoras finas e
de integração visuo-motora. A composição con­
sidera a elaboração de textos e narrativas, nos
quais são essenciais habilidades de linguagem
oral e das funções executivas, uma vez que é ne­
cessário o planejamento adequado da ex­­­pressão
do raciocínio, o engajamento para execução com
alocação de recursos atencionais, a alternância
em um conjunto de respostas envolvendo codi­
ficação fonológica e ortográfica e, por fim, o au­
tomonitoramento, a fim de manter ou modificar
as estratégias de escrita5.
O componente da codificação gráfica envol­
ve os domínios fonológicos e ortográficos. As
ha­­­­­bilidades de discriminação e manipulação
fo­­­nológica, presentes no domínio fonológico,
são relevantes para a decodificação, mas não
são suficientes para promover fluência e com­
preensão ampla da leitura. São as habilidades
ortográficas, decorrentes de processamento fo­­­­
nológico preservado e do armazenamento de
padrões gráficos de palavras (morfêmicos) em
nível lexical, que tornam possível a leitura de
quais­­­quer representações da língua escrita.
Ainda não é claro se as dificuldades de es­­­crita
podem ser explicadas pela existência de déficits
de processamento visual ou se são exclusiva­
mente decorrentes de problemas no nível fono­
lógico7. Considerando o papel da memória para
aquisição da escrita, verifica-se a progressão
da codificação grafêmica nos níveis de escrita
global da palavra, seguida da codificação indi­
vidual de letras e, posteriormente, de unidades
de letras, denominadas clusters. Os clusters
re­­­ferem-se a morfemas presentes em palavras
diversas, tais como dígrafos e estruturas silábicas
irregulares. A exposição à leitura e o exercício
constante de escrita tornam a criança mais efi­
ciente na codificação e as irregularidades da
lin­­­­­­guagem escrita são automatizadas.
Affonso et al.8 analisaram os tipos de erros
ortográficos cometidos por crianças disléxicas,
INTRODUÇÃO
Dificuldades persistentes e sistemáticas na
aquisição da leitura, presentes tanto no domínio
da decodificação como na compreensão da leitura,
são características da dislexia do desenvolvimen­
to. Por definição, a dislexia do desenvolvimento
é um distúrbio específico de aprendizagem de
ori­­gem neurobiológica, caracterizado por dificul­
dades na correta e/ou fluente leitura de palavras
e por pobres habilidades de soletração e decodi­
ficação1. Essas dificuldades tipicamente resultam
de um déficit no componente fonológico da lin­
guagem que é inesperado em relação às outras
habilidades cognitivas e à instrução adequada
de ensino em sala de aula. Como consequências
se­cundárias costumam estar presentes problemas
na compreensão de textos e, consequentemente,
reduzido desenvolvimento de vocabulário e de
conhecimentos gerais.
Considerando os processamentos cognitivos
necessários para a leitura de palavras e as estra­
tégias utilizadas, a Dislexia do Desenvolvimento
pode ser classificada em dois subtipos2, tendo
como base o modelo de dupla rota de leitura3.
Na dislexia de subtipo fonológica, sublexical
ou disfonética, ocorrem falhas na conversão de
grafemas em fonemas. Logo, a leitura se dá pe­­
la estratégia logográfica por memorização de
palavras frequentes. Já na dislexia de subtipo
lexical, morfêmica ou de superfície, ocorrem
prejuízos no uso da estratégia ortográfica que
impedem a leitura de palavras irregulares e a
aquisição de fluência.
Assim como ocorre na leitura, a aquisição
com­­­petente da escrita depende do desenvolvi­
mento adequado de componentes distintos da
linguagem oral, tais como a capacidade de no­
meação, o vocabulário, a consciência fonológica,
o raciocínio verbal e a fluência narrativa4,5. Sendo
assim, é comum que disléxicos apresentem tam­
bém dificuldades de escrita, que tendem a ser
negligenciados tanto nos estudos de avaliação
e intervenção, como na prática clínica.
A fim de verificar a existência de estágios de
aquisição da escrita, estudos longitudinais com
amostras representativas foram conduzidos6. Os
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
247
Oliveira DG et al.
controles pareados por idade cronológica e
con­­­troles pareados por nível de leitura em uma
tarefa computadorizada de nomeação de figu­
ras por escrita. Os resultados indicaram que
disléxicos e controles por nível de leitura não
diferiram quanto ao número de acertos, mas
ambos acertaram menos que os controles por
idade. Em relação aos tipos de erros, os dislé­
xicos apresentaram maior número de erros nas
correspondências unívocas grafema-fonema,
omissão de segmentos e correspondência fone­
ma-grafema independente de regras, o que in­­­­
dica a existência de falhas do processamento
fonológico e do processamento lexical necessá­
rios para a codificação.
De acordo com Ygual-Fernandez et al.9, para
analisar os erros ortográficos na codificação es­­
crita é essencial compreender a relação que o
indivíduo faz entre linguagem oral e escrita para
o desempenho na conversão fonema/grafema.
Crianças com déficits de escrita costumam apre­
sentar escrita incorreta que foge às regras orto­
gráficas com erros por substituições, omissões,
inversões de grafemas e alteração na segmenta­
ção de palavras. Sendo assim, diferentes siste­
mas de classificação de erros ortográficos foram
compilados2, que propõem critérios distintos de
avaliação qualitativa de erros de escrita, tal como
apresentado na Tabela 1.
Considerando que as crianças com dificulda­
de de leitura e escrita possuem déficits de au­­­
tomatização das habilidades de decodificação
grafema-fonema, consequentemente não dis­
põem de recursos atencionais necessários para
memorizar as exceções ortográficas e aprender
as irregularidades linguísticas9. A partir disso,
procedimentos de intervenção com foco no ensino
da escrita devem ser sequenciais e siste­máticos, a
fim de promover a automatização das habilidades
treinadas. Além disso, devem ser adequados aos
tipos de erros ortográficos presentes, sendo os
erros relacionados ao princípio alfabético consi­
derados de ortografia natural e erros nas conven­
ções ortográficas, como de or­­tografia arbitrária.
Fukuda e Capellini10 estudaram a eficácia
do programa de treinamento fonológico e cor­
respondência grafema-fonema em crianças de
risco para dislexia da 1ª série do ensino fun­
damental. O fornecimento de instrução formal
do princípio alfabético associado ao ensino de
consciência fonológica possibilitou às crianças
submetidas ao treinamento o desenvolvimento
de habilidades cognitivo-linguísticas importan­
tes para a aprendizagem do sistema de escrita
do português brasileiro. Barbosa et al.11 investi­
garam a relação entre habilidades de memória
visual e desempenho ortográfico na escrita de
crianças da 2ª e 3ª séries do ensino fundamental.
Foram aplicadas provas de ditado e leitura de
palavras, bem como a tarefa da Figura Com­
plexa de Rey. Os resultados apontaram que as
crianças que co­­­metem mais erros ortográficos
nos ditados têm pior desempenho na Figura
Com­­plexa de Rey. Logo, conclui-se que boas
ha­­­bilidades de memória visual acompanham
melhor aquisição das regras ortográficas e estas
devem fazer parte de programas interventivos
de leitura e escrita.
Capellini et al.12 verificaram a eficácia de um
programa de remediação fonológica em crianças
disléxicas em um estudo com 4 grupos. O primei­
ro grupo (GI) foi composto de 20 disléxicos agru­
pados em dois subgrupos: experimental (GIe) e
controle (GIc). Os mesmos procedimentos foram
feitos com o segundo grupo (GII), formado por
crianças sem dislexia. Todos os sujeitos foram
avaliados com testes linguísticos e os sujeitos do
GI foram submetidos ao programa. Os resultados
demonstraram que as crianças submetidas à
remediação obtiveram melhor desempenho na
avaliação pós-intervenção, principalmente nas
tarefas de leitura e compreensão de texto. Os au­
tores apontam para a importância de amplificar
os efeitos deste tipo de programa para crianças
com e sem dislexia no ambiente escolar, de modo
a favorecer a leitura dos escolares.
Sendo assim, o objetivo deste estudo foi ve­
rificar mudanças no padrão de escrita de dislé­
xicos submetidos à intervenção com o software
Alfabetização Fônica Computadorizada por
meio da análise dos tipos de erros ortográficos
cometidos.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
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Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada
Tabela 1 – Classificação de erros ortográficos conforme a semiologia proposta por Moojen2.
Tipo de Erro
Descrição
Exemplos
Correspondência Biunívoca
Um fonema é representado por um grafema
que possui apenas um valor sonoro
feto/veto; pato/bato
Erros por Falha
Fonema-Grafema
Falha na escolha do grafema para representar
o fonema. Envolve substituições, omissões,
adições, transposições ou inversões
exposão/explosão; casasa/casa;
sutso/susto
Juntura ou Segmentação
Intervocabular
União ou separação de palavras inteiras
Correspondência Regular
Contextual
Desconhecimento de regras que alteram o valor
da letra dependendo do contexto (r/rr; c/q; g/
gu; uso do ç; nh/til/m/n antes de consoantes;
l/u no fim das palavras)
Correspondência Irregular
Independente de Regras
Não existe uma norma gerativa que permita
decidir o grafema a ser utilizado para
representar o fonema
seguru; sigarro
Supercorreção
Há a tentativa de corrigir na transcrição que
acarreta outro erro
alto/altomóvel;
vassoura/professoura
Falha Semântica
Desconhecimento do significado de uma figura
ou da nomeação de objetos/conceitos
Substituição Aleatória
Trocas não classificadas ou incomuns, por
tentativas de escrita não-alfabéticas, erros de
digitação ou de proximidade de teclas
a fundar/afundar;
emcima/em cima
horor/horror; qausa/causa;
çalada; brimcan; sorril; sau
escrever laranja sob a figura
de uma banana
cclkajj; ppinião/opinião
Infantil Interdisciplinar (NANI-UNIFESP) ou por
consultórios particulares de atendimento fo­­­­
noau­­­­diológico.
Os participantes foram avaliados por meio
de uma bateria computadorizada de leitura, de
escrita e de consciência fonológica, a fim de
satisfazer os critérios de inclusão e exclusão. Os
critérios de exclusão adotados no estudo foram:
1) QI Total no WISC III abaixo da média, com
percentil geral abaixo de 25; 2) suspeita de defi­
ciências visuais e/ou auditivas sem correção;
3) presença de lesões cerebrais, histórico de
doenças clínicas neurológicas ou psiquiátricas;
4) atraso no desenvolvimento de linguagem oral
ou atraso neuropsicomotor; 5) presença de co­
morbidade com o Transtorno Déficit de Atenção
e Hiperatividade.
MÉTODO
Participantes
Vinte crianças com diagnóstico de dislexia do
desenvolvimento, com idade média de 11,7 anos,
foram alocadas em dois grupos, sendo o primeiro
(GI) formado por disléxicos submetidos à Inter­
venção (Grupo Intervenção) e o segundo (GII) por
disléxicos que não se submeteram ao programa
de intervenção (Grupo sem Intervenção).
O GI foi formado por 10 crianças (7 meninos),
com idade média de 11 ± 2,44 anos e 4,6 anos de
escolaridade. Já o GII foi formado por 10 crianças
(7 meninos), com idade média de 10,8 ± 1,75 anos
e 4,9 anos de escolaridade. Os critérios de parea­
mento para a formação dos grupos foram idade,
sexo e série escolar. A divisão dos participantes
nos grupos se deu por critério de conveniência,
sendo os 10 primeiros participantes selecionados
na pesquisa alocados no grupo de intervenção.
Todos os participantes foram diagnosticados
e encaminhados para a participação na pesquisa
pelo Núcleo de Atendimento Neuropsicológico
Instrumentos
A fim de verificar o padrão de escrita dos par­
ticipantes antes e após a intervenção foi utilizado
o TNF1.1-Escrita13, que avalia o desenvolvimen­
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
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Oliveira DG et al.
to da competência de escrita em português do
nome de figuras, ou seja, da competência de
produção de escrita livre para nomear figuras
que representem objetos e animais conhecidos.
Trata-se de um teste de competência de produção
de escrita de palavras isoladas que avalia a ha­
bilidade do examinando de escrever livremente
palavras que correspondem a figuras, sem co­
meter erros ortográficos ou semânticos13. O teste
contém 36 itens, sendo que cada item é composto
de uma figura situada acima de uma caixa de
texto. O examinando produz a resposta digitando
na caixa de texto o nome da figura apresentada.
Em um teste de nomeação, diferentes palavras
podem corresponder às figuras apresentadas,
por exemplo, para a figura de um rato seriam
consideradas corretas as respostas: rato, rata,
camundongo e ratazana. As possibilidades de
nomeação corretas foram estabelecidas durante
o processo de padronização do teste. Assim sen­
do, a correção é feita de maneira automatizada
pelo programa e são consideradas incorretas
quaisquer respostas que não correspondam às
pré-estabelecidas pelo programa e quaisquer
tipos de erros ortográficos, incluindo ausência de
resposta, respostas do tipo “não sei” e respostas
semanticamente incorretas.
Além da correção computadorizada conside­
rando o número de acertos no TNF1.1-Escrita, a
produção dos participantes foi analisada qualita­
tivamente, a fim de identificar os tipos de erros
cometidos nas respostas. Os erros ortográficos
foram categorizados e analisados a partir de pa­­­­
râmetros utilizados por estudiosos compilados por
Moojen2: Correspondência Biunívoca (CB); Erros
por falha fonema-grafema: Omissão de Seg­­­mento
(OS); Adição de Segmento (AS); In­­ver­­são de Seg­
mento (IS); Juntura ou Segmentação Intervoca­
bular (JS); Correspondência Regular Contextual
(CC); Correspondência Irregular Independente
de Regras (CR); Supercorreção (SC); Falha Se­
mântica (FS) e Substituição Aleatória (SA).
O instrumento de intervenção foi o software
Alfabetização Fônica Computadorizada14, cujas
atividades estimulam ludicamente as habilida­
des de manipulação de grafemas e fonemas. O
objetivo destas atividades é promover a aquisi­
ção da leitura alfabética, que se dá por meio da
decodificação grafema-fonema. O software é di­
vidido em dois módulos de atividades: consciên­
cia fonológica e alfabeto. O módulo consciência
fonológica contém atividades de reconhecimento
de palavras, rima, aliteração, sílabas e fonemas,
sendo os estímulos apresentados em desenhos
ou em formas geométricas. Na atividade palavras, o participante deve identificar palavras
dentro de uma frase e inserir palavras em frases
incompletas por meio de combinação semântica.
Nas atividades rima, aliteração, sílabas e fonemas, os itens são apresentados inicialmente por
meio de figuras que devem ser combinadas de
acordo com o princípio fonético do nome e, em
seguida, as unidades sonoras são apresentadas
em formatos geométricos, para a realização de
operações de adição, subtração ou inversão das
unidades sonoras.
Já o módulo alfabeto é subdividido nas seções
vogais e consoantes. Para cada grafema é apre­
sentado o fonema correspondente, que é ouvido
pela criança quando ela faz o contorno da letra
com o mouse. Em seguida, são apresentadas
listas de palavras para leitura e exercícios de
discriminação fonológica para identificação de
sons que completam as palavras.
Procedimentos
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética
da Universidade Presbiteriana Mackenzie, sob
protocolo número 1087/08. Os responsáveis por
todos os participantes assinaram o Termo de
Con­­sentimento Livre e Esclarecido e estes fo­
ram avaliados no Laboratório de Neurociência
Cog­­­nitiva e Social da Universidade Presbiteriana
Mackenzie.
De acordo com os princípios éticos, após a
análise dos resultados do estudo, os participan­
tes do grupo sem intervenção também foram
submetidos aos procedimentos, uma vez que
estes trouxeram benefícios nas habilidades de
leitura e escrita.
Após a primeira avaliação, realizada com
todos os participantes, o GI foi submetido à in­
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
250
Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada
monstram que os disléxicos que participaram da
intervenção passaram a escrever corretamente,
em média, duas palavras a mais após o treino
com o software. Embora esta diferença não apre­
sente significância estatística, este dado possui
relevância no contexto educacional e pedagó­
gico, ainda mais quando analisado em função
da diminuição no tempo para a realização do
teste. De fato, quando se analisa o tempo para a
realização do teste, observa-se que houve dife­
rença significativa entre os dois grupos no tempo
para realização da escrita das palavras, sendo
que os participantes que fizeram a intervenção
tornaram-se mais rápidos, levando em média
5 segundos a menos para escrever cada uma
das palavras. Tais dados parecem indicar que a
intervenção produziu efeitos na capacidade de
codificação.
A análise qualitativa do efeito da intervenção
no padrão de escrita a partir da semiologia de
erros apresentados pelos grupos foi realizada
a partir do cálculo da diferença do número de
palavras grafadas incorretamente antes e após
a intervenção. Desta maneira, resultados positi­
vos indicam que o número de palavras grafadas
incorretamente diminuiu na segunda avaliação.
Por outro lado, resultados negativos indicam que
o número de palavras grafadas incorretamente
aumentou após a intervenção. A fim de verificar
o efeito da intervenção para cada uma das cate­
gorias de erros ortográficos, foram conduzidos
testes t para amostras independentes, comparan­
do-se o desempenho dos dois grupos. A Tabela 4
apresenta os valores médios das diferenças entre
as duas avaliações, bem como o desvio padrão
de cada média. Além disso, são apresentados os
tervenção com sessões semanais e individuais
de aproximadamente 60 minutos de duração. A
ordem de execução das atividades utilizada foi a
prevista pelo manual do software, que intercala
atividades dos módulos consciência fonológica
e alfabeto, com aumento crescente de dificulda­
de das atividades. O número de sessões variou
conforme a realização do protocolo do software,
e cada participante executou duas vezes todas
as atividades propostas, o que totalizou um nú­
mero médio de 16 sessões de intervenção. Após
o término das sessões, os participantes dos dois
grupos foram submetidos novamente à avalia­
ção com os mesmos instrumentos utilizados na
primeira avaliação.
RESULTADOS
Foram conduzidas ANOVAS, a fim de com­
parar os desempenhos dos grupos na avaliação
pré-teste, tanto para o número de acertos, quanto
para o tempo de execução do teste. A Tabela 2
sumaria o desempenho dos participantes dos
grupos no TNF1.1-Escrita. Resultados indicam
que os dois grupos apresentaram desempenho
similar para número de acertos e tempo de exe­­­
cução, uma vez que não foram encontradas di­­
ferenças estatísticas significativas.
A análise quantitativa dos efeitos da interven­
ção fônica na escrita dos disléxicos foi analisada
em função do número de itens corretos, bem
como do tempo para a realização do teste. Desta
forma, foi feito o cálculo da diferença entre as
medidas antes e após a intervenção. A Tabela 3
apresenta as médias das diferenças de pontua­
ção e de tempo de execução entre a segunda e
a primeira avaliação dos grupos. Resultados de­
Tabela 2 – Média de número de acertos e tempo de execução em cada item (em segundos)
no Teste de Nomeação de Figura por Escrita (TNF 1.1 – Escrita), na avaliação pré-teste.
TNF 1.1-Escrita
Acertos
Tempo
Grupo
N
Média (desvio padrão)
GI
10
13,60 (± 7,336)
GII
10
20,30 (± 8,667)
GI
10
25,90 (± 13,852)
GII
10
19,27 (± 12,158)
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
251
F (1,15)
p
3,481
0,078
1,293
0,270
Oliveira DG et al.
Tabela 3 – Média de diferença entre acertos e tempo de execução em cada item (em segundos)
nos itens do pós para o pré-teste do Teste de Nomeação de Figura por Escrita (TNF 1.1 – Escrita).
TNF 1.1-Escrita
Acertos
Tempo
Grupo
N
Média (desvio padrão)
GI
10
2,20 (±3,853)
GII
10
-0,90 (±5,446)
GI
10
-5,47 (±8,281)
GII
10
3,78 (±9,495)
F
(1,15)
p
2,160
0,159
5,406
0,032*
Tabela 4 – Média, desvio padrão e valores de significância para os tipos de erros
no TNF 1.1.- Escrita para na avaliação pré e pós intervenção.
GI - Média
(desvio padrão)
GII - Média
(desvio padrão)
Pré-Pós
Pré-Pós
Correspondência Biunívoca (CB)
2,70 (6,96)
0,10 (2,07)
Omissão de Segmento (OS)
6,60 (12,05)
Adição de Segmento (AS)
0,00 (3,58)
Inversão de Segmento (IS)
Categoria Ortográfica
t
(1,15)
p
1,132
0,273
-1,20 (4,59)
1,912
0,072
0,30 (0,48)
-0,266
0,792
-1,30 (2,62)
-0,30 (0,48)
-1,184
0,252
Juntura ou Segmentação Intervocabular (JS)
-0,10 (0,31)
0,10 (0,31)
-1,414
0,174
Correspondência Regular Contextual (CC)
0,80 (2,30)
0,10 (0,87)
0,900
0,380
Correspondência Irregular
Independente de Regras (CR)
0,10 (2,28)
0,40 (0,84)
-0,390
0,701
Supercorreção (SC)
0,10 (0,56)
0,10 (0,31)
0,000
1,000
Falha Semântica (FS)
-0,10 (0,73)
-0,10 (0,31)
0,000
1,000
Substituição Aleatória (SA)
-1,30 (3,94)
0,20 (1,03)
-1,163
0,260
Palavras Erradas (PE)
1,60 (3,97)
0,30 (1,41)
0,973
0,343
Erros por Palavra (EP)
8,5 (15,05)
0,00 (5,45)
1,679
0,110
valores de significância para cada um dos tipos
de erros analisados.
A análise descritiva dos resultados indica
que houve diminuição do número de erros de
es­­­crita pelos disléxicos que participaram da
in­­­tervenção em 4 categorias analisadas. Na
ca­­te­­­goria de Correspondência Biunívoca (CB),
os disléxicos cometeram, em média, aproxima­
damente 3 erros a menos na segunda avaliação
e este resultado indica que a aprendizagem
dos fonemas referentes aos grafemas está dimi­
nuindo a ocorrência de erros por confusão de
letras foneticamente similares. Por outro lado,
os disléxicos sem intervenção continuaram co­­­
metendo a mesma quantidade de erros nesta
categoria. Na categoria de Omissão de Segmen­
tos (OS), houve diminuição média de 6 erros
na segunda avaliação pelo grupo de disléxicos
que participaram da intervenção. Foi observado
aumento médio de 1 erro nesta categoria pelo
grupo sem intervenção. Logo, o ensino explícito
do princípio alfabético da leitura e das habilida­
des de consciência fonológica promoveu efeitos
na escrita por meio do acréscimo de letras que
possuem representação sonora.
Além disso, foram observadas mudanças nas
médias do número de Palavras Erradas (PE)
e de Erros por Palavra (EP). Os disléxicos que
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
252
Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada
do tempo. Em outro estudo16, foram realizadas
duas sessões diárias de 50 minutos em 5 dias por
semana, durante 8 semanas. Outra possibilidade
de estruturação temporal para intervenção, que
promoveu efeitos significativos para mudança no
padrão de escrita17, é a realização de 4 sessões
semanais de 90 minutos em grupos de 6 sujeitos.
Para além das considerações sobre a estru­
turação temporal das sessões, outro aspecto re­­­
levante a ser discutido é a restrição do treino ao
ensino de habilidades de consciência fonológica
e de decodificação grafo-fonêmica. Ainda que
estes processos façam parte das habilidades
preditoras do sucesso em leitura18,19, para a aqui­­­
sição da escrita eficaz, outras habilidades devem
ser treinadas.
Considerando os componentes envolvidos na
produção da escrita6, enquanto que a fonologia
tem relação direta com a leitura oral, o desen­
volvimento de habilidades de ortografia tem
impacto maior na produção escrita. Os resulta­
dos obtidos por estes autores apontam que a
fonologia apresenta uma relação indireta para
o aprendizado da leitura e que, portanto, torna­
-se necessária a investigação e estimulação da
consciência ortográfica no início da aquisição
das habilidades de escrita. Neste sentido, a in­
tervenção psicopedagógica deve voltar-se para
promoção de habilidades de caligrafia e treina­
mento de habilidades de codificação ortográfica,
além de voltar-se para diferenças individuais
encontradas nas habilidades necessárias para a
aquisição da escrita.
Diante dos resultados encontrados neste es­
tudo, sugere-se a realização de outras pesquisas
com aplicação de procedimentos interventivos
em leitura e escrita que contemplem menores
intervalos entre as sessões, número maior de
sessões e atividades que favoreçam o ensino
de habilidades ortográficas, a fim de verificar
resultados mais robustos e permanentes em
crianças disléxicas.
rea­­­­­­lizaram o treino com o software diminuíram
na segunda avaliação, em média, 1,6 palavras
escritas com erros. A relevância desta diferença
adquire maior significado quando se leva em
consideração a diminuição média de 8 erros por
palavra nestes mesmos sujeitos. Palavras grafadas
incorretamente podem possuir mais de um erro e
erros com diferentes semiologias. Logo, os dislé­
xicos que participaram da intervenção escrevem
palavras com menor número de erros, enquanto
os disléxicos sem intervenção não apresentam di­
ferenças para diminuição da ocorrência de erros.
DISCUSSÃO
Este estudo objetivou verificar mudanças no
padrão de escrita de disléxicos submetidos à
intervenção com o software Alfabetização Fôni­
ca Computadorizada, por meio da análise dos
tipos de erros ortográficos cometidos. Análises
quantitativas verificaram diminuição significa­
tiva no tempo de execução na escrita pelo grupo
de disléxicos que realizaram a intervenção. Tal
resultado é similar ao de trabalho conduzido pe­­­
los autores deste estudo15, no qual se verificou
que a melhora na capacidade de decodificação
promove aumento na velocidade de leitura e
também facilita o processo de codificação grá­
fica. A aquisição e o treino de habilidades de
consciência fonológica por parte do GI parece
ex­­­plicar a redução média de 8 erros do tipo
Omis­­­­­­são de Segmento em palavras, indicando
o desenvolvimento do princípio alfabético e a
apli­­­cação deste no domínio da escrita.
Assim como citado15, o delineamento da in­
tervenção aplicada neste estudo consistiu em
sessões semanais individuais de 60 minutos,
com média de 16 sessões. Este modelo de in­
tervenção psicopedagógica com duração breve
promoveu efeitos menos significativos do que
aqueles observados em estudos com disléxicos
subme­tidos à intervenção que contemplam maior
nú­­­­mero de sessões e com intervalos menores
de tempo entre elas. Estudos com intervenções
mais intensas e aplicadas em contexto escolar
têm demonstrado melhora de desempenho mais
significativa e, frequentemente mantida ao longo
CONCLUSÃO
Conclui-se que a utilização do software Alfa­
betização Fônica Computadorizada promoveu
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
253
Oliveira DG et al.
melhora significativa no aumento da velocidade
de escrita de palavras. Não foram encontrados
efeitos estatisticamente significativos da inter­
venção na análise qualitativa de erros ortográ­
ficos cometidos pelos disléxicos submetidos à
in­­tervenção. Estes resultados indicam a neces­
sidade de implementação de atividades que
favoreçam o desenvolvimento de habilidades
or­­­to­­­gráficas, a fim de maximizar a aprendizagem
da leitura e da escrita destas crianças.
AGRADECIMENTOS
Às agências de fomento à pesquisa FAPESP,
CNPq e MackPesquisa.
SUMMARY
Written production analysis of children with developmental dyslexia
submitted to a computerized phonological intervention
Introduction: Writing deficits are common in dyslexic children es­­pe­­­
cially in orthographic and phonological coding domains. Procedures of
psy­­­­­­chopedagogy assessment should consider the semiology of spelling
errors to promote the effective development these skills. Interventional
programs focused on phonological processing contribute to improvement in
written language skills of dyslexics. Purpose: This study aimed to measure
changes in the pattern of dyslexic writing submitted to the intervention
with the computed phonic literacy software through analysis of types of
or­­­thographic errors. Methods: Twenty dyslexics children (average age
11.7) were assessed by reading and writing tasks and were divided in two
groups paired by age, sex and schooling. The G1 (n=10) was submitted
in 16 weekly sessions to intervention. All the subjects were reevaluated
after the intervention. Results: Analysis of the first evaluation indicated
that both groups had the same level of writing. In the second evaluation,
was significant increase of writing speed in G1. There were no significant
differences to increase the number of correct responses and reduction of
spelling errors by the categories analyzed, although there is a decrease in
average errors per word and in categories of two-way matching, omission of
segment, contextual regular correspondence, independent correspondence
irregular rules and overcorrection. This data are discussed considering the
psychoeducational intervention model, the number of sessions and the skills
trained. Conclusion: The use of Phonics Computer Literacy software can
improves the development of writing in dyslexic children in conjunction
with the spelling skills training.
KEY WORDS: Dyslexia. Handwriting. Educational measurement.
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Trabalho realizado na Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Apoio: CNPq, FAPESP e MackPesquisa.
Artigo recebido: 8/8/2011
Aprovado: 5/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55
255
Souza
AV &original
Capellini SA
ARTIGO
Percepção visual de escolares com
distúrbios de aprendizagem
Aline Viganô de Souza; Simone Aparecida Capellini
RESUMO – Objetivo: Caracterizar os achados de percepção visual de
escolares com distúrbios de aprendizagem. Método: Participaram des­­­te
estudo 24 escolares na faixa etária de 7 a 12 anos de idade, de ambos os
gêneros, com nível socioeconômico médio. Os escolares foram divididos
em dois grupos: Grupo I (GI) – composto por 12 escolares com diagnóstico
interdisciplinar de distúrbios de aprendizagem, sendo 75% do sexo masculino
e 25% do sexo feminino; Grupo II (GII) – composto por 12 escolares com bom
desempenho acadêmico, pareados por sexo e faixa etária com os escolares
do GI. Todos os escolares foram submetidos ao Teste Evolutivo de Percepção
Visual – DTVP-2, composto de oito subtestes que medem habilidades vi­­­­­­­
so-mo­­­­­­­toras interrelacionadas com percepto-visuais diferentes. Os resultados
foram analisados estatisticamente por meio do teste de Mann-Whitney, para
verificar possíveis diferenças de desempenho nas tarefas entre os grupos
estudados. Resultados: Os resultados revelaram diferença estatisticamente
significante entre o GI e o GII, demonstrando que o GI apresentou alterações
que indicam déficit de percepção viso-motora, apesar das habilidades de
relação espacial e figura e fundo estarem íntegras. Conclusão: Os escolares
do GI apresentaram desempenho inferior na habilidade de coordenação
viso-motora, de posição no espaço, de cópia, de closura visual, de velocidade
viso-motora e de constância de forma em relação aos escolares do GII.
UNITERMOS: Aprendizagem. Avaliação. Percepção visual. Transtornos
de aprendizagem.
Aline Viganô de Souza – Terapeuta Ocupacional na
Prefeitura Municipal de Monte Alto (SAEEB – Serviço
de Apoio Especializado à Educação Básica). Aluna do
Curso de Especialização em Intervenção em Neuro­
pe­diatria do Núcleo de Estudo em Neuropediatria e
Motricidade da Universidade de São Carlos (UFSCar),
São Carlos, SP, Brasil.
Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga, Li­­
vre-Do­­­­cente em Linguagem Escrita do Departamento
de Fonoaudiologia e Programa de Pós-Graduação em
Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da
Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP). Coor­­­
denadora do Laboratório de Investigação dos Des­vios
da Aprendizagem - FFC/UNESP, Marília, SP, Brasil.
Correspondência
Simone Aparecida Capellini
Av. Hygino Muzzy Filho, 737 – Marília, SP, Brasil –
CEP: 17525-900
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61
256
Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem
dêmicas no Brasil, contrariamente ao que ocorre
com a percepção auditiva, os aspectos motores
e os aspectos cognitivo-linguísticos nessa população.
Dessa forma, este trabalho é uma das primeiras tentativas de discutir aspectos de percepção
visual e viso-motora em crianças com alterações
de aprendizagem determinadas genética e neu­­­
rologicamente, e, em decorrência disso, o presente estudo teve como objetivo caracterizar os
achados de percepção visual de escolares com
distúrbios de aprendizagem.
INTRODUÇÃO
A percepção visual consiste em uma função
cognitiva pela qual as informações sobre o
nos­­­so ambiente visual são disponibilizadas em
nossa consciência e/ou disponibilizadas para
orientar nossas ações. Essa percepção favorece
a construção da experiência e da consciência do
mundo visual, a partir da atenção, orientando
as ações motoras1,2. Para que a percepção visual
seja adequada, tanto as funções e as estruturas
corticais devem estar intactas3-6.
O desenvolvimento da percepção visual é
rápido durante a infância e se aproxima do nível
de desenvolvimento do adulto por volta de 11
e 12 anos de idade. Entretanto, aos 9 anos de
idade, as habilidades de percepção visual são
refinadas, sendo que, entre os 8 e os 10 anos de
idade, a percepção de figura e a capacidade de
perceber posições no espaço estão plenamente
de­­­­senvolvidas. A capacidade de constância de
forma melhora entre os 6 e os 7 anos e atinge
uma condição estável entre os 8 e os 9 anos, e
a capacidade mais complexa de diferenciar as
formas das relações espaciais está bem desenvolvida a partir dos 10 anos de idade7.
A função percepto-viso-motora é resultado da
combinação de habilidades viso-motoras, planificação motora e cognitiva, habilidades perceptuais visuais (como coordenação óculo-manual),
posição no espaço, relações espaciais, figura-fundo e constância de forma8. Por isso, crianças
com distúrbios de aprendizagem são propensas
a manifestar alterações perceptivas visuais pelo
fato de apresentarem disfunções em áreas cerebrais responsáveis pela percepção viso-espacial
necessária para a realização da escrita9,10.
Independentemente da perspectiva adotada
por pesquisadores, sendo esta social ou biológica, há evidências na literatura que evidenciam o
fato de as crianças com distúrbios de aprendizagem apresentar alterações perceptuais, motoras
e cognitivo-linguísticas que prejudicam a situa­
ção de aprendizagem em contexto de sala de
aula. Entretanto, ainda são escassos os estudos
que investiguam especificamente a percepção
vi­­­sual e a sua relação com as habilidades aca-
MÉTODO
Participaram deste estudo 24 escolares na
faixa etária de 7 a 12 anos de idade, de ambos
os sexos, com nível socioeconômico médio11,
matriculados em escolas de ensino público
fundamental. Os escolares foram divididos em
dois grupos:
• Grupo I (GI) – composto por 12 escolares
com diagnóstico interdisciplinar de distúrbios de aprendizagem que recebem
atendimento semanal no Serviço de Apoio
Especializado à Educação Básica (SAEEB) da prefeitura municipal da cidade de
Monte Alto-SP, sendo 75% do sexo mas­­
culino e 25% do sexo feminino;
• Grupo II (GII) – composto por 12 escolares com bom desempenho acadêmico,
pareados por gênero e faixa etária com os
escolares do GI.
Participaram deste estudo somente escolares
que não apresentaram intercorrências pré, peri
e pós-natais, ou atraso no desenvolvimento
neuropsicomotor e linguagem descritos em
pron­­­tuário escolar e que apresentaram o Termo
de Consentimento assinado pelos pais ou res­­­
ponsáveis, anteriormente ao início das avaliações. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia
e Ciências da Universidade Estadual Paulista
(FFC/UNESP), em Marília, SP, sob o protocolo
de número 2004/2009.
Todos os escolares foram submetidos ao Teste
Evolutivo de Percepção Visual, segunda edição –
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61
257
Souza AV & Capellini SA
DTVP-212, composto de oito subtestes que medem
habilidades viso-motoras interrelacionadas com
percepto-visuais diferentes. Os subtestes do
DTVP-2 são: coordenação viso-motora (CVM),
posição no espaço (PE), cópia (C), figura-fundo
(FF), relações espaciais (RE), closura visual
(CV), velocidade viso-motora (VVM) e constância de forma (CF). Todos os subtestes medem
um tipo de capacidade percepto-visual e podem
ser consideradas como subteste de motricidade
reduzida – posição no espaço (PE), figura-fundo
(FF), closura visual (CV) e constância de forma
(CF) ou de motricidade plena [coordenação
viso-motora (CVM), cópia (C), relações espaciais (RE), velocidade viso-motora (VVM)]. Sua
pontuação é dividida em escore padrão, que
é obtido a partir da pontuação bruta e de sua
conversão mediante utilização de tabelas; e
escore composto, obtido por meio da soma dos
escores padrão e sua conversão em um quociente
classificatório em relação à percepção visual
geral, à percepção de motricidade reduzida e à
integração viso-motora. Todas as funções avaliadas permitem o cálculo de um equivalente de
idade (EI), ou seja, para cada função avaliada o
escore obtido permite o cálculo de uma “idade
de percepção visual”.
Os resultados obtidos foram analisados estatisticamente por meio do teste de Mann-Whitney,
para verificar possíveis diferenças de desempenho nas tarefas entre os grupos estudados. O
nível de significância (valor de p) adotado foi de
5% (0,050) e está marcado com asterisco.
Para a análise dos dados, foi utilizado o
pro­­­grama SPSS (Statistical Package for Social
Sciences), em sua versão 19.0.
Tabela 1 – Comparação do desempenho
dos escolares do GI e do GII nos subtestes
do teste de percepção visual.
Variável
Grupo
Média
Desvio
padrão
I
152,75
10,47
II
162,17
8,76
I
14,00
4,51
II
19,92
3,90
CVM
PE
C
FF
RE
CV
VVM
CF
I
24,50
8,36
II
31,50
5,87
I
10,42
3,09
II
11,92
2,50
I
33,92
13,28
II
40,67
2,54
I
7,42
4,80
II
11,67
5,00
I
14,92
8,33
II
22,25
5,85
I
10,58
3,78
II
14,00
3,28
Valor
de p
0,032*
0,003*
0,026*
0,231
0,168
0,024*
0,034*
0,045*
Legenda: CVM = coordenação viso-motora; PE = posição no
espaço; C = cópia; FF = figura-fundo; RE = relação espacial;
CV = closura visual; VVM = velocidade viso-motora; CF =
constância de forma.
penhos por subteste, demonstrando que o GI
apre­­­sentou desempenho inferior na habilidade
de coordenação viso-motora (CVM), de posição
no espaço (PE), de cópia (C), de closura visual
(CV), de velocidade viso-motora (VVM) e de
constância de forma (CF).
Os achados dessa tabela também revelaram
que os escolares do GI e do GII apresentam
de­­­­sempenhos similares em figura-fundo (FF) e
relação espacial (RE).
RESULTADOS
Na Tabela 1, pode-se observar a média, o des­­
vio-padrão e o valor de p referente à comparação
de desempenho entre os grupos GI e GII, nos
subtestes do teste de percepção visual.
Na Tabela 1, após a aplicação do teste de
Mann-Whitney, pudemos observar diferença
estatisticamente significante entre os grupos
GI e GII quando comparados em seus desem-
DISCUSSÃO
A percepção viso-motora é composta por
funções com componentes visuais (percepção
visual: posição no espaço; figura-fundo, closura
visual e constância de forma) e por funções com
componentes motores integrados (integração
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61
258
Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem
viso-motora: coordenação viso-motora, cópia,
relação espacial e velocidade viso-motora), ne­­­­
cessárias para a aquisição de habilidades escolares (leitura e escrita) e habilidades em atividades
de vida diária12,13.
Com base nos dados obtidos, pôde-se observar que os escolares com distúrbios de aprendizagem apresentaram alterações percepto-viso-motoras, corroborando estudos descritos na
li­­­­te­­­ratura internacional13-16.
De acordo com alguns autores17,18, alterações
de percepção visual, reconhecimento de detalhes, processamento simultâneo, organização
visoespacial, integração das partes em um todo
e de relação espacial fazem parte do déficit da
integração visoespacial. Neste estudo, os escolares do grupo com distúrbios de aprendizagem
apresentaram alterações que indicam déficit de
percepção viso-motora, pois as habilidades de
coordenação viso-motora, percepção de posição
no espaço, constância de forma, cópia e velocidade viso-motora encontram-se abaixo do esperado
para a idade e a escolaridade.
Com base nos achados deste estudo, as ha­­
bilidades de percepção visual alteradas nos
es­­­colares com distúrbios de aprendizagem pro­­­
vavelmente são responsáveis pelo baixo desempenho acadêmico desses escolares em tarefa
de cópia, leitura e escrita, uma vez que essas
atividades requerem o uso de estratégias que
envolvem o reconhecimento visual de formas e
as posições no espaço, a percepção de detalhes
e a velocidade de coordenação viso-motora, que
oferecem significados às formas das letras, que,
quando alteradas, comprometem o desempenho
motor fino para a produção da escrita de letras e
palavras, caracterizando o quadro de disgrafia
em tais escolares13,19.
A partir deste estudo, investigações científicas
com a finalidade de melhor estabelecer a relação
percepto-viso-motora e a produção da escrita
estão sendo realizadas, para melhor elucidar a
relação entre a percepção visual, o aspecto motor
fino e a escrita em escolares com distúrbios de
aprendizagem.
CONCLUSÃO
Os resultados deste estudo nos permitiram
concluir que os escolares com distúrbios de
apren­­­dizagem avaliados apresentaram desempenho inferior aos escolares com bom desempenho acadêmico em relação às habilidades de
coordenação viso-motora, de posição no espaço,
de cópia, de closura visual, de velocidade viso-motora e de constância de forma.
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259
Souza AV & Capellini SA
SUMMARY
Visual perception of students with learning disabilities
Purpose: To characterize the findings of visual perception in students
with learning disorders. Method: The study included 24 students aged 7 to
12 years old, of both genders, with middle socioeconomic level. The students
were divided into two groups: Group I (GI) – composed by 12 students diag­­­
nosed with interdisciplinary learning disorders, 75% male and 25% female,
Group II (GII) – composed by 12 students with good academic performance,
paired according to gender and age with GI. All students were submitted to
the Developmental Test of Visual Perception – DTVP-2, composed of eight
subtests that measure visual-motor skills interrelated with different vi­­­sual
perceptual ones. The results were analyzed statistically using the MannWhit­­­ney test, to verify possible differences in test performance between
groups. Results: The results revealed a statistically significant difference
between GI and GII, demonstrating that GI presented changes that indicate
a deficit of visual-motor perception, even though spatial relations and figure
ground skills are intact. Conclusion: The students of GI presented inferior
performances in the skills of eye-hand coordination, position in space,
copying, visual closure, visual-motor speed and form constancy in relation
to the students of GII.
KEY WORDS: Learning. Evaluation. Visual perception. Learning disorders.
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Trabalho realizado na Prefeitura Municipal de Monte
Alto (SAEEB – Serviço de Apoio Especializado à Edu­­
cação Básica), Monte Alto, SP, Brasil.
Artigo recebido: 5/7/2011
Aprovado: 3/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61
261
AngeliniESPECIAL
RAVM
ARTIGO
Burnout: a doença da alma na educação
e sua prevenção
Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini
RESUMO – Esse artigo tem como intuito propor uma reflexão acerca dos
novos caminhos da educação no século XXI. Consideramos relevante propor
uma discussão sobre os novos paradigmas que redirecionam a vida humana
e as implicações sobre a educação nesse processo. Vamos, portanto, eleger as
implicações filosóficas que a física quântica traz como porta-voz na ativação
dos novos princípios que regem o mundo e a ciência contemporânea, que
inclui a espiritualidade como condição humana, dentro de uma abordagem
transdisciplinar para a compreensão de uma síndrome – burnout, sintoma
de uma educação adoecida que leva professores e alunos a um sofrimento
psicofisicoespiritual.
UNITERMOS: Educação. Esgotamento profissional. Espiritualidade.
Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini – Psi­­co­­­­
pedagoga clínica do Instituto Paulista de De­­­sen­­
volvimento Profissional (IPDP); Profª Mestre na Uni­­­
versidade Paulista (UNIP) – Curso de Pedagogia, São
Paulo, SP, Brasil.
Correspondência
Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini
Av. Moema, 170 – cjto. 51 – São Paulo, SP, Brasil –
CEP: 04077-020
E-mail: [email protected]
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262
Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
INTRODUÇÃO
“É essa capacidade de reflexão que leva
o indivíduo a aprender, a conhecer, a
pen­­­­­­sar, a aprender, a aprender a fazer,
a aprender a conviver e a aprender a
amar, para que possa aprender a ser, e
estar em condições de agir com cons­
ciência, autonomia e responsabilidade.
Responsabilidade consigo mesmo, com
a sociedade e com a natureza, o que im­­­
plica o desenvolvimento de uma nova
ética apoiada numa nova consciência
in­­­dividual, social e planetária, uma nova
compaixão universal, centrada no equilíbrio da comunidade terrestre.”2
“O novo paradigma é abrangente;
trata-se de uma ciência da
espiritualidade, que inclui a
materialidade. Ativismo quântico é a
ideia de transformarmos a nós
mesmos e nossas sociedades segundo
as mensagens transformadoras da
física quântica e do novo paradigma.”
Goswami, 20101
Entramos no Terceiro Milênio, já não é mais
possível conceber a vida de forma tão rasa, sob
uma única perspectiva material. As ciências
contemporâneas têm trazido suas contribuições para o avanço sobre a compreensão do
hu­­­­mano.
Esse projeto nasce dentro de uma concepção
psicopedagógica do atendimento clínico, a partir
da formação de um grupo reflexivo para educadores, professores e psicopedagogos, cuja finalidade foi a de possibilitar a esses profis­sionais um
questionamento sobre suas modalidades como
ensinantes, suas ações, emoções, aflições e desejos ao exercer sua práxis educativa. O objetivo foi
o de que colocassem em palavras suas emoções,
a fim de nomeá-las e identificá-las, para, então,
repensar os processos que os fazem adoecer e
po­­­der combatê-los por meio da reflexão, como
fortalecimento psíquico e espiritual. Ainda, pensamos no grupo reflexivo enquanto prevenção,
um canal para os educadores lidarem com a
insatisfação, a frustração e o estresse cotidiano.
Nosso trabalho se desenvolveu em quatro
en­­­contros e, nesse espaço, pudemos perceber
a angústia que tem comprometido a ação do
professor, fundamentalmente, nesse início do
sé­­­culo XXI, quando os valores delineiam-se de
forma confusa e invertida frente à qualidade das
relações interpessoais, cada vez mais desumanizadoras e displicentes com a vida. Moraes2
nos aponta que a Educação caminha para a Era
das Relações – em que todos reflitam sobre as
dimensões materiais e espirituais da sociedade,
por uma educação que possibilite uma convivência harmônica entre os indivíduos:
Um dos primeiros aspectos levantados para a
reflexão foi a doença que acomete o profissional
da educação, tirando-o, muitas vezes, do eixo
e, consequentemente, do campo de trabalho. A
doença vem como um mecanismo de defesa, ao
não suportar mais uma relação tão complexa no
espaço escolar, uma violência àquele professor
que vai se deixando exaurir e consumindo-se
por completo, resta a doença, hoje, já nomeada:
a síndrome de burnout.
SINDROME DE BURNOUT
Do inglês, to burn out – queimar por completo – síndrome de burnout é conhecida também
por esgotamento profissional. Consideramos a
síndrome como uma das consequências mais
graves do estresse ou de desgaste profissional,
o que é provocado por sentimentos de exaustão,
de frustração, de incapacidade, bem como leva o
profissional a sentir-se culpado por não realizar
o trabalho de acordo com o desejado e carregar o
estresse para casa. Esses são alguns dos aspectos
que vão consumindo física e emocionalmente
o professor, que pode passar a ficar irritadiço e
depressivo. Como nos aponta Codo3:
“Burnout foi o nome escolhido; em português, algo como ‘perder o fogo’, ‘perder
a energia’ ou ‘queimar (para fora) completamente (numa tradução mais direta).
É uma síndrome através da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação
com o trabalho, de forma que as coisas já
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263
Angelini RAVM
da autonomia de pensamento, do respeito à diversidade, da tolerância, da inclusão, do respeito
às possibilidades, às diferentes inteligências, por
meio de um olhar holístico e sistêmico. Autores
como Piaget, Vygotsky, Wallon, Freud, Klein,
Dolto, Winnicott, Morin, Perrenoud, Freire, Ma­­
turana, Golleman, Gardner, Rogers, Mantoan,
Latouche, na psicologia Jung; Luhman, na sociologia; Prigogine, na química; Maturana, na
biologia; Einstein, na física; Goswami, na física
quântica e muitos outros ajudam-nos a ampliar o
olhar sobre as novas relações que devem mediar
a educação. Ainda, temos trabalhado com novas
disciplinas, como Inclusão, Educação Ambiental,
Ecopedagogia, Psicopedagogia, Psicanálise,
Relações Interpessoais – esses estudos demonstram, com certeza, uma mudança de para­digma
para uma nova compreensão das relações ho­­­­mem
e mundo. Logicamente, essas novas contribuições têm alargado nossa concepção de homem
e de mundo, o que nos permite articular outros
conhecimentos para uma compreensão holística
e sistêmica do homem. Pensamos, dessa forma,
em um novo profissional e em uma nova educa­
ção que possa abrir espaços para o diálogo, para
a reflexão.
Temos observado que a necessidade de pensar o mundo como nossa casa e as pessoas como
pertencentes à comunidade humana partiu de
um grande amadurecimento científico, dentre
eles, a Física Quântica, que abriu novos caminhos para que pudéssemos dar um salto em
nossas pesquisas. Tudo isso, ainda, é muito novo
e difícil de ser colocado em prática, em nossas
ações cotidianas e em uma nova concepção de
educação.
No entanto, cremos que é chegado o momento de compartilhar as novas aprendizagens
e colocá-las para novas reflexões, já não é mais
possível ver toda uma sociedade sofrendo por falta
de uma educação inadequada, ultrapassada,
focada no “ter” e que não focaliza o humano enquanto sujeito holístico e sistêmico, em nenhum
momento. Daí tantas doenças acometendo professores, alunos, pais e toda uma sociedade que
se perde, em meio a relações tão conturbadas.
não o importam mais e qualquer esforço
lhe parece ser inútil. (...) Como clientela
de risco são apontados os profissionais
de educação e saúde, policiais e agentes
penitenciários, entre outros.”3
Para que essa patologia e outras, como depressão, estresse e doenças psicossomáticas,
não aumentem significativamente entre esses
profissionais, cremos que algumas intervenções
precisam ser realizadas dentro ou fora do espaço
escolar. Dentre as possibilidades, buscamos no
grupo reflexivo um caminho para atenuar tais
problemas. Por meio da troca entre os professores, elegemos a fala como caminho da reflexão
para questionarem suas apreensões, angústias,
etc. Esse trabalho tem permitido aos educadores conversar e enfrentar seus problemas para
compreender e buscar uma solução, em que a
mediação cabe ao próprio grupo, quando cada
um tem oportunidade de externar suas queixas
e dar vazão àquilo que o incomoda profundamente. Andersen4 tem nos ajudado a pensar no
movimento dialógico do grupo:
“Consideramos as conversas como fonte
importante para a troca de descrições e
explicações adequadamente diferentes,
de definições e de significados. Essas
tro­­­cas podem dar um novo tom às antigas descrições e explicações, e até fazer
surgir outras novas. Proporcionam, assim,
uma base o mais ampla possível de escolha para que a pessoa possa tratar, de
uma forma diferente, situações paralisadas, ou reagir a novos fatos, sejam eles
previstos ou não.”4
A reflexão tem nos proporcionado uma atitude, uma voz para que compreendamos essas
questões, sob diferentes enfoques, como o reco­
nhecimento da mudança de paradigma – o que
tem gerado grandes conflitos na sociedade,
essencialmente, nas diversas relações que estabelecemos.
Trabalhamos, hoje, na formação dos novos
professores, com teorias de ponta que tratam do
homem enquanto construtor de seu conhecimento e, acima de tudo, da importância da autoria,
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264
Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
Dessa forma, vamos apresentar alguns aspectos dessa nova forma de entender o homem,
para que possamos divulgar, de fato, uma nova
maneira de compreender as relações humanas,
dentro das escolas, a partir desse novo século,
dentro de uma abordagem transdisciplinar.
Vamos trabalhar com a concepção de transdisciplinaridade de Nicolescu (1997) – professor
da Universidade de Paris e diretor do Centro
In­­­ternacional de Pesquisas e Estudos Transdis­
ciplinares (CIRET)5. Assim, as ideias de Nicolescu estão fundamentadas na física quântica, e
os seus três pilares são os níveis de realidade, a
lógica do terceiro incluído e a complexidade. O
autor considera a transdisciplinaridade, como:
“(...) o prefixo trans indica, ao que está
entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de cada disciplina.
Sua finalidade é a compreensão do mundo presente, da qual um dos imperativos
é a unidade de conhecimento.”5
Piaget já nos apontava a construção de um
novo conceito para dar conta de uma nova compreensão mais ampla do homem. A transdisciplinaridade propõe a articulação dos mais diversos
saberes, pondo em ênfase uma visão holística de
homem que considera sua dimensão espiritual.
Ainda queremos ressaltar que para a compreen­
são do homem, nesse milênio, não é mais possí­
vel vê-lo como um ser raso, preso ao mito da
ma­­terialidade. Devemos considerar as diversas
disciplinas de estudo para que nosso entendimento seja ampliado, e possamos desenvolver
o autoconhecimento e o comprometimento com
a vida em suas dimensões material e espiritual.
O termo espiritual carrega um estigma, ranço do
apogeu de uma ciência materialista reducionista. Sua utilização em vários campos de estudos
provocou uma depreciação do termo. Queremos,
portanto, justificar seu uso. De acordo com Souza
Follmann6:
“Espiritualidade, aqui, é reconhecida co­­­
mo um elemento inato e essencial de todas
as pessoas, que é refletido nas ex­­­pressões
de diferentes camadas de conectividade
que espiralam de dentro para fora para se
ligar com o Outro social, comunal e físico,
mais ainda para dentro para encontrar o
Eu interior e finalmente, o Outro Transcendente. Estas camadas de conexão
podem transcender cenários e fronteiras
religiosas, sociais, culturais e políticas,
ainda que as expressões possam ser in­­­
fluenciadas por tais fatores. É a conectividade que os indivíduos experimentam
que os leva a descobrir um sentido de eu
e lugar dentro de suas comunidades e do
mundo maior, e, em última instância, os
ajuda a achar significado e objetivo em
suas vidas.”6
Para o autor, a transdisciplinaridade é uma
nova abordagem científica, cultural, social e espiritual. O prefixo trans aponta para o que está
simultaneamente entre as disciplinas, através
das disciplinas e além de qualquer disciplina. O
intuito dessa nova abordagem é nos levar para
a compreensão do mundo presente e à unidade
do conhecimento. Apresenta, então, uma aborda­
gem holística, em que inclui uma inteligência
espiritual – base científica para compreensão da
dimensão espiritual.
O termo transdisciplinaridade, de acordo com
Nicolescu5, foi apresentado pela primeira vez
por Piaget, em Nice (1970) – na Universidade de
Nice, durante o I Seminário Internacional sobre
pluri e interdisciplinaridade:
“Enfim sucedendo a etapa das relações
interdisciplinares, pode-se esperar uma
etapa superior que será transdiscipli­­­nar,
que não se contentará em atingir interações ou reciprocidades entre pesquisas
especializadas, mas situará essas ligações no interior de um sistema total sem
fronteiras estáveis entre as disciplinas.”5
Buscamos nesse conceito uma nova maneira
de compreender a base de todo um aprendizado
mais significativo, que inclui o desenvolvimento espiritual, por meio de uma educação
que priorize os princípios fundamentais das
re­­­lações humanas: respeito, diálogo, ética e
re­­­flexão. Precisamos ativar uma educação que
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265
Angelini RAVM
acolha o humano e mudar a percepção de nossa
consciência e de nossa realidade. A escola e os
professores precisam se reinventar nessa nova
jornada, buscar uma estrutura que construa
uma educação pautada no desenvolvimento da
espiritualidade como condição humana, se quisermos ter uma vida melhor, menos superficial,
banal, sem sentido, que valorize a ética em toda
e qualquer relação.
Em 1994, no Convento de Arrábida, Portugal, foi realizado pela UNESCO o I Congresso
Mundial de Transdisciplinaridade, daí nasceu o
Manifesto da Transdisciplinaridade – um convite
para repensarmos o novo paradigma, a busca por
um saber comum:
Artigo 2 – O reconhecimento da existência
de diferentes níveis de Realidade, regidos
por lógicas diferentes, é inerente à atitude
transdisciplinar. Toda tentativa de reduzir
a Realidade a um único nível, regido por
uma única lógica, não se situa no campo
da transdisciplinaridade.
Dessa forma, faz-se emergencial reconhecer
na ciência contemporânea o caminho para uma
nova lógica que permite a reavaliação sobre
Quem somos nós? E o que a educação pode
fa­­­zer para evitar tantos problemas de relações
interpessoais? Consideramos fundamental para
nossos estudos rever a física quântica e as novas
pesquisas que exploram as relações mente e
cérebro.
com base na matéria que estimula exclusivamente a materialidade.”(Goswami,
2010)1
Nosso propósito é o de divulgar o novo para­
digma frente à Educação seja com quem for,
onde for. Partimos do princípio de que somente
por meio da educação e do conhecimento o homem poderá desenvolver-se como ser humanizador, um processo, ainda, em construção. Nesse
sentido, vemos o ser humano como um ser de
pos­­­sibilidades para aprender a vida em todos
seus aspectos. Para a compreensão dessa proposta, precisamos pensar primeiramente na questão
do paradigma sob o qual vivemos. O paradigma
é uma percepção geral da vida; é um consenso
sobre a maneira de entender, de perceber, de agir
a respeito do mundo; é uma visão de mundo, a
que nos submetemos, de forma consciente ou
não, para organizarmos nossas vidas.
Hoje, estamos vivendo um momento de transição de ideias, de valores, de relações, de paradigmas. Para compreendermos melhor a questão
dos paradigmas, vejamos o antigo modelo que
ainda está instalado em nosso modus vivendi –
o paradigma da Modernidade, e o paradigma
que estamos buscando viver urgentemente – o
paradigma da Pós-Modernidade.
O paradigma da Modernidade ou paradigma
mecanicista é interpretado segundo as ideias de
René Descartes (século XVII). Para ele, o mundo
natural deve ser visto como uma máquina. Descartes desenvolveu o Método Cartesiano, par­­­tindo
de Galileu, acreditava que a chave para a com­
preensão do universo era a estrutura matemá­
tica; daí ter uma visão mecanicista de mundo. A
certeza cartesiana é matemática, ou seja, se em
uma máquina algo vai mal, é preciso descobrir
o defeito da parte danificada e trocá-la, para que
volte a funcionar.
Nesse sentido, o olhar é local, é para as partes e não para o todo. Vamos transpor essa ideia
para a Educação. O ensino é compartimentado,
ou seja, fragmentado, não passa para o aluno a
visão do todo, mas a visão de cada conteúdo que
precisa memorizar: História, Geografia, Ciências, Matemática, Línguas, Artes, tudo é visto
AS IMPLICAÇÕES FILOSÓFICAS DA
FÍSICA QUÂNTICA E A MUDANÇA DE
PARADIGMA
“A ciência descobriu a espiritualidade.
Hoje, há uma teoria científica logicamente consistente sobre Deus e a espiritualidade com base na física quântica e no
primado da consciência (a ideia de que
a consciência, e não a matéria, é a base
de toda a existência). Noutras palavras,
embora a mídia ainda não alardeie isso,
temos agora uma ciência viável da espiritualidade ameaçando uma mudança de
paradigma e passando da atual ciência
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72
266
Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
de forma estanque, sem ligação, não há interdisciplinaridade, isto é, para se compreender as
coisas, é preciso separá-las. Todo esse conteúdo
fica descontextualizado e longe de sua relação
com a vida do homem. Para complicar, toda nossa
educação hoje visa o Vestibular, a competição e
não o conhecimento de mundo e o autoconhecimento, fundamentais a esse processo. Entra em
cena o acúmulo do conhecimento para ser descartado, quando não for mais necessário medi-lo.
A educação tornou-se, portanto, competitiva,
desumana e o conhecimento cumulativo. O conhecimento não se transforma em saber, passa
a ser mero produto para ser descartado, quando
não servir mais para os testes que o nosso sistema
econômico/educacional implantou no mundo. Para
que serve uma educação que apenas mede o
acúmulo de conhecimento? Como fica ação dos
professores? Que seres humanos estão por trás
de uma educação que des-humaniza? Quantas
crianças e jovens, além de professores, estão
doentes, hoje? São doenças psicossomáticas, autoimunes, doenças de relacionamento: bullying,
depressão, estresse que acometem nossos alunos
durante e pós o período escolar, marcas que
ficam na pele, difíceis de tratar. Por que toda a
sociedade age dessa forma? Queremos ter, cada
vez mais, e educamos para o poder e o ter desmedido. Vivemos a inversão de todos os valores.
Já passamos da fase do “mal estar da civilização” de Freud. Estamos voltando à barbárie?
Numa sociedade que perde de vista o humano,
sua sensibilidade resta o desumano. Para onde
caminhamos? A resposta é clara: precisamos decrescer – urgentemente, como aponta Latouche7:
“A palavra de ordem ‘decrescimento’ tem
como principal meta enfatizar fortemente
o abandono do objetivo do crescimento
ilimitado, objetivo cujo motor não é outro senão a busca do lucro por parte dos
detentores do capital, com consequências desastrosas para o meio ambiente e,
por­­­tanto, para a humanidade. Não só a
sociedade fica condenada a não ser mais
o instrumento ou o meio da mecânica produtiva, mas o próprio homem tende a se
transformar no refugo de um sistema que
visa a torná-lo inútil e a prescindir dele.”7
Outro exemplo que podemos citar é referente
à dificuldade de aprendizagem. A criança que
apresenta alguma dificuldade é olhada como
portadora única do problema, compete a ela
resolvê-lo, caso contrário vira um aluno rotulado,
aprisionado, sem capacidade de sair do lugar
que lhe ditaram. Essa visão novamente é local
e individual, perde-se de vista o sujeito como
um todo, reduzindo-o a um aluno com dificuldades, estigmatizado, reduzido ao não-saber e
ao sofrimento.
Já na medicina, a relação médico-paciente
repete a relação de poder e saber do professor-aluno. Basta olharmos para as “n” especialidades médicas que existem. Os especialistas
tornaram-se exímios em olhar para as partes.
Se alguém está com algum problema nos rins,
por exemplo, eles é que devem ser olhados, in­­
dependentemente, do sujeito que os carrega.
É tudo muito local, prático e pragmático, como
se o ser humano fosse uma máquina, um ser
lógico. Essa é a visão de mundo que impera:
fragmentada, compartimentada, a valorização
de cada parte, sem conexão com o todo, privilegiando a competição, a luta, a individualidade.
Sob essa visão de mundo que opera com as leis
da matemática, temos uma visão positivista da
realidade, que permite a objetividade e o rigor
nas ciências, uma visão de mundo mecanicista,
uma visão ilusória sobre a neutralidade científica. Esse movimento tem nos levado a um mundo
de crises individual, social, política, ambiental,
uma crise global que ameaça a todos e ao planeta. De acordo com Latouche7, está mais do que
na hora de mudarmos o foco:
“O altruísmo deveria prevalecer sobre o
egoísmo, a cooperação sobre a competi­
ção desenfreada, o prazer do lazer e o éthos
do jogo sobre a obsessão do trabalho, a
importância da vida social sobre o consumo ilimitado, o local sobre o global, a
autonomia sobre a heteronomia, o gosto
pela obra sobre a eficiência produtivista,
o sensato sobre o racional, o relacional
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72
267
Angelini RAVM
apenas, sem a menor ligação com nossas vidas.
Estamos no planeta, quando deveríamos pensar
que somos o planeta e que, por isso, requer cuidados. Temos de ser pela vida. Seja ela como for, de
quem for, onde for, de forma ética. Somos seres de
relações e de aprendizagem: a vida é construção,
um processo de aprendizagem o tempo todo.
O novo paradigma, o da Pós-modernidade,
nomeado por paradigma sistêmico ou holístico,
rejeita essa velha visão de mundo, partindo,
portanto, de novos pressupostos como interação
e relações; uma visão sistêmica, cuja proposta
é a inter-relação do homem com a natureza e
sua saúde física, mental, emocional e espiritual.
sobre o material, etc. Preocupação com a
verdade, senso de justiça, responsabilidade, respeito da democracia, elogio da
diferença, dever de solidariedade, vida
espiritual: eis os valores que devemos
con­­­quistar a qualquer preço, pois são a
base de nosso florescimento e nossa sal­­­
vaguarda para o futuro.”7
Atualmente, estamos lutando por uma nova
visão de mundo mais adequada às novas descobertas científicas e à vida que tem se desenvolvido. Estamos sob um novo paradigma ainda
trabalhado de forma teórica, temos de divulgá-lo
para que possamos vivenciá-lo no dia-a-dia de
nossas vidas, seja na escola, na profissão que
exercemos, no médico em que nos consultamos,
em todas as relações que possamos estabelecer.
A escola precisa se rever e abrir espaços para a
humanização das relações. Será preciso ensinar
a empatia, a inteligência emocional, a sensibilidade e a ética, urgentemente.
Em todos os campos das ciências contemporâneas, temos observado novas descobertas e uma
adesão ao novo paradigma, pois as descobertas
têm conexão e estão convergindo para o nosso
conhecimento como seres humanos irmanados,
como uma só pessoa, na comunidade humana.
Até mesmo na linguagem, em seu vocabulário, já percebemos as diferenças. Se antes
falávamos em fragmentação, individualidade,
em conhecimento das partes, em especialidades
e especificidades, em objetividade, em rigor
científico, agora, falamos em rede, conexão, in­­
teração, multiplicidade, interdisciplinaridade,
multidisciplinaridade, conhecimento transversal, co-responsabilidade, co-construção, possibilidades, diversidade, sistemas. Um vocabulário
voltado para as relações que estabelecemos com
a vida, de forma coletiva, cooperativa, complementar, ética, co-responsável.
Parece haver uma convergência ao que foi
separado: ciência e religião. Penso que seria
me­­­lhor falarmos em ciência e espiritualidade.
Assim, estivemos agindo e estamos frente à
nossa casa, o nosso planeta – Terra – que sob o
paradigma moderno, é visto como um planeta
CONEXÕES: A DOENÇA NASCE NA ALMA
E VAI PARA O CORPO
Cada parte do universo está em nós, em cada
um de nós, portanto, somos o universo, estamos
todos conectados. E o que nos conecta? A energia, essência da vida.
Vivemos num mundo material e também so­­
mos matéria. A matéria é formada por átomos –
qualquer matéria (animal, vegetal, mineral) – e
um dos componentes essenciais à matéria é o
átomo formado por prótons, nêutrons elétrons.
Seu núcleo é formado por energia condensada. Logo tudo que existe no universo é feito de
energia, desde a caneta com que escrevemos, às
estrelas, os grãos de areia, até nossos ossos... O
mundo material é constituído por um conjunto
de moléculas, ou seja, de átomos – que é energia
condensada.
O que significa, então, energia condensada?
Energia significa força, potência, capacidade de
realizar trabalho. Dessa forma, dentro de cada
átomo (que nos forma) há energia e as partículas
que o compõem vibram o tempo todo, estão em
movimento. Se pudéssemos ver as coisas, as
pessoas, em um nível macroscópico, veríamos
pontos em vibração contínua, o que possibilita
nossa materialidade.
Tudo é vibração – energia – nossos corpos,
também, são feitos a partir da vibração de energia que emanamos constantemente. Somos
pequenos pontos de moléculas em vibração
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268
Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
coesa e contínua – o que nos dá a impressão da
materialidade. Tudo no universo vibra, se movimenta em diferentes velocidades.
Hoje, a ciência contemporânea tem comprovado que a mente e o cérebro são independentes
e que mesmo após a morte do cérebro, a mente
continua a se manifestar. Compreendemos, também, que a mente tem a capacidade de alterar
a matéria. Somos seres que pensam e os nossos
pensamentos circulam por todo nosso corpo e
fora dele. Logo, na teoria quântica que estuda
o comportamento da matéria e da energia em
nível subatômico, o pensamento é energia que
pode transmitir para o cérebro físico vibrações
de nossos impulsos, emoções e sentimentos po­
sitivos ou negativos.
Por meio de estudos, como os de IRMF – Imagens por Ressonância Magnética Funcional e
EEGQ – Eletrencefalografia Quantitativa – que
mede as correntes elétricas na superfície do escalpo – refletem os registros gráficos das ondas
cerebrais, essas ondas podem ser estaticamente
analisadas, traduzidas em números e depois
re­­­produzidas como um mapa colorido. A partir
desses estudos, já se sabe que muitas ondas de
energia como a beta são típicas de forte atividade
consciente e muitas ondas teta são típicas dos
estados de meditação profunda. Ainda se sabe
que o padrão de onda cerebral lenta (ondas teta)
não é exclusivo da tradição cristã, foi encontrado
em iogues hindus e monges budistas, portanto,
parece ser uma característica de misticismo generalizada, ou seja, uma forma de conexão com
o que nos transcende, com uma energia supramental. De acordo com Beauregard & O’Leary8:
“Como vimos, várias linhas de comprovação demonstram que os fenômenos
mentais alteram significativamente a
atividade cerebral. Essas linhas incluem
nossos estudos de IRMF sobre observa­
ção emocional objetiva e o impacto da
te­­­rapia comportamental cognitiva na
fobia de aranha, além dos estudos de
neu­­­roimagens funcionais do efeito placebo. Os resultados dessa última série de
estudos deixam bem claro que a atividade
cerebral pode ser motivada pela crença e
pela expectativa mental do paciente em
relação a um tratamento médico proposto. Para interpretar os resultados desses
estudos, precisamos de uma hipótese
que explique a relação entre a atividade
mental e a atividade cerebral. A hipótese
de tradução psiconeural é uma delas.
Postula que a mente (o mundo psicológico, a perspectiva da primeira pessoa)
e o cérebro (que faz parte do chamado
‘mundo material’, a perspectiva da terceira pessoa) representam dois domínios
diferentes em termos epistemológicos
que podem interagir porque são aspectos
complementares da mesma realidade
trans­­­cendental. A hipótese da tradução
psiconeural reconhece que os processos
mentais (tais como vontades, metas, emoções, desejos e crenças) são neuralmente
demonstrados por exemplos no cérebro,
mas afirma que não são idênticos nem
podem ser reduzidos a processos neu­
roelétricos e neuroquímicos. Na verdade,
os processos mentais – que não são passíveis de localização no cérebro – não
podem ser eliminados.”8
Recentemente, cientistas conseguiram, tam­­­­
bém, uma forma de fotografar o percurso do pensamento em três dimensões, como um hologra­­ma
– tomografia por emissão de pósitron – conhecida
como PET. Na tela se vê que a imagem formada
a cada pensamento, se modifica. Daí compreendermos que, na Teoria Quântica, pensamento é
igual energia que tem vibração, o que cria e materializa nossos pensamentos, o que cria, portanto,
o mundo material.
Portanto, se apresento um pensamento distorcido, posso criar uma molécula distorcida
– aqui pode se dar o início de uma doença. A
doença, então, não nasce no corpo, como muitos
cientistas materialistas acreditam, vem d’alma,
de nossas emoções, pensamentos e se aloja no
corpo, por um desarranjo molecular. Pensamento
é energia em alto grau de velocidade e o pensamento está dentro e fora de nós – ele vibra com
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269
Angelini RAVM
cuidar, além de nossas ações, atitudes, de nossos
pensamentos que geram a materialidade.
Hoje, já sabemos que a frequência energética
mais alta é o Amor; pois ele impacta no ambiente
de forma material – produz transformações no
ambiente em que nos cerca e, até mesmo, em
nosso DNA. Podemos compreender tudo isso
do ponto de vista da ciência contemporânea,
especialmente por meio da física quântica ou
por meio das religiões (ocidentais e orientais)
que o homem construiu ao longo dos séculos.
Entretanto, uma coisa é certa, não é mais possível negar que temos uma dimensão que nos
conecta a algo muito maior de onde emanamos.
Com certeza, uma energia tão positiva que irra­
dia Amor. Logo, essa é a frequência com que
devemos nos conectar para evoluirmos como
seres humanos.
Esse é o momento de articularmos os saberes,
sejam eles científicos ou espirituais, porque tudo
isso faz parte da condição humana, assim como
ter um inconsciente. Dessa forma, Codo3 nos traz
uma ampliação sobre a compreensão do burnout:
“Paradoxalmente, o que significou uma
certa crise de identidade das ciências
físicas e biológicas trouxe um alento vigoroso para as ciências humanas, afinal,
esta foi a nossa dificuldade, sempre soubemos que os fenômenos que nos tiram o
sono são multideterminados, agora temos
modelos melhores de análise, e, o que é
melhor, podemos conversar sem a presença incômoda do riso irônico de nossos
colegas dedicados às ciências exatas. A
nossa ciência continua não sendo exata,
mas agora a deles também deixou de ser,
ambos sabemos que a busca é a multideterminação, ambos deixamos de buscar
a “A Relação”, e passamos a investigar
as múltiplas inter-relações.”3
o universo. Daí conclui-se que a matéria gera
energia, que gera consciência.
Tudo dentro ou fora de nós, já que estamos
todos conectados (somos um), depende do que
valorizamos, cremos e pensamos. Somos seres
de energia, portanto, podemos transformar, alterar a realidade – pois existe uma conexão entre
pensamento e realidade. A cada dia, compreen­
demos mais e mais que nossos pensamentos
criam o universo físico. Toda a ciência, tudo o
que construímos nasce em nosso pensamento
primeiro e daí concretizarmos no mundo físico.
É fundamental que entendamos a importância
e as implicações dessa energia em nossas vidas,
ou seja, matéria = energia = consciência ou
consciência = energia = matéria.
O pensamento atua e modifica todo o processo
vibratório de energia dentro e fora daquele que
pensa. Podemos dizer que o observador altera a
coisa observada, sempre. Dessa forma, nossos
pensamentos, nossos sentimentos, nossas emoções – que são vibrações – criam um transtorno
sobre a matéria em que são projetadas. Sendo
assim, é necessário alinharmos pensamento/
sen­­­timento/emoção, para acessarmos o equilíbrio
de nossos corpos.
Não podemos esquecer que a matéria é mo­­­
vida pela energia e a energia por nossa cons­
ciência. Nossa observação, nossa atenção e nossa
consciência sobre nós mesmos têm a capacidade
de interferir em nosso processo de desenvol­
vimento. Por isso, devemos ter cuidado com o que
pensamos e pensar de forma positiva, é preciso
tornar nossos pensamentos alinhados com o que
é positivo.
A atenção é a focalização da consciência que
é a manifestação no mundo por meio da matéria;
das situações, dos fatos – a consciência processa
realidades – sob o foco da consciência, as coisas
se concretizam. Nesse sentido, tudo o que determinamos por meio de nossos pensamentos,
o universo conspira e realiza; pois a energia
que usamos para isso obedece à informação do
pensamento. Portanto, é preciso crer para ver, já
que somos o que pensamos – temos não o que
queremos, mas o que cremos. Assim, devemos
Esses saberes que nos compõem precisam ser
divulgados e recuperados, para darmos conta de
uma vida melhor, nesse planeta, nesse momento.
Somos todos aprendizes de um novo paradigma
em que a vida é muito maior do que pensamos:
somos mais do que a matéria e navegamos pelos
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270
Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção
tempos trocando aprendizagens. Somos uma
forma de energia que emana da Criação.
Podemos finalizar com Codo3 e deixarmos a
seguinte reflexão “O caminho mais difícil e também o mais prazeroso é o de enfrentar o desafio,
mudar as perguntas, encontrar novas respostas.”3
possível, quer seja na nossa prática profissional,
como em nossa vida pessoal.
Lucila F. – professora
“Fiquei muito feliz ao iniciar o trabalho com o
grupo. Para mim, é um espaço para o desenvolvimento pessoal e profissional. O primeiro estudo
foi muito pertinente ao que estamos vendo e
vivenciando nas escolas enquanto profissionais.
O texto que tratou da síndrome de burnout trouxe
reflexões para identificar em nós e nos professores, de maneira geral, o empobrecimento de estímulos profissionais, o desgaste que é angariado
com o passar do tempo de trabalho. (...) conversamos sobre os caminhos que o ser humano traça
sua história, no que ele acredita ou não, do que
é importante na vida ou não, valores, pensamos
sobre o capitalismo, o consumismo, a correria do
dia-a-dia, a falta de amor nas relações profissionais e para consigo próprio, no desgaste interior
que conduz à doença. Doenças que se iniciam na
alma e depois atingem o corpo físico. (...) Assim,
concluo dizendo que os momentos que passamos
nas discussões foram esclarecedores, principalmente, um ponto de encontro para trocarmos e
dividirmos nossos anseios, dores e sonhos.”
Mara L. R. – psicopedagoga
DEPOIMENTOS
Consideramos relevante trazer as falas de
uma professora e de uma psicopedagoga para a
ilustração desse trabalho:
“Os nossos encontros me trouxeram como
principal aquisição a ideia clara e cristalina de
que a pesquisa, assiduidade em nossas leituras
e, principalmente, a reflexão compartilhada,
nos traz conhecimentos e recursos outros que,
por vezes, no dia-a-dia, nos escapam. Também
esclareceram que, na minha prática profissional,
eu preciso estar sempre atualizada em relação
aos recursos intelectuais que minha práxis exige, como também de troca com os outros, porém
mantendo o meu equilíbrio emocional, portanto
olhando sempre para dentro de mim. Às vezes
em que falávamos de autores e de textos preo­
cupados com nosso desempenho, na maioria
delas ou quase sempre, estavam vinculados à
visão do homem como um todo, suas ações de
cordialidade e desprendimento para com o mundo, destacando o respeito às diversas categorias
de problemas e situações psicossomáticas, num
processo incessante de inclusão. (...) O leque
de possibilidades de leitura e de pesquisas, o
conhecimento de áreas pelas quais nunca havia
caminhado e o empenho das pessoas que participaram dos encontros foram determinantes para
o estímulo de minha vontade de estar junto, de
sair na minha folga disciplinadamente para ir ao
encontro de algo que me preenchia, me desafiava
e me deixava inquieta em relação às coisas que
ia aprendendo, socializando e descobrindo. A
reflexão de situações como inclusão, respeito, autoconhecimento, ciência, religiosidade, responsabilidade, curas através do autoconhecimento
com a ajuda da física quântica, percepção do
outro, identidade, nos fizeram sabedores de que
é necessário o exercício constante da reflexão,
a fim de podermos agir o mais coerentemente
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estamos a todo tempo agindo, tomando deci­
sões por termos um paradigma que nos rege e que
nos faz caminhar. O homem é um ser de relações
e, por isso, não vive sem o outro. Essa é a lei do
humano: viver relações, cujo objetivo maior é
a aprendizagem. Precisamos do outro para nos
compreendermos e para aprendermos a vida.
Essas são questões que nos propõem um exer­­­
cício de reflexão e que nos comprometem com a
vida que temos em nossas mãos. Talvez o único
sentido de estarmos aqui nesse mundo: com­
preender para nos aperfeiçoarmos, constantemente, enquanto seres humanizadores, seja quais
forem as relações estabelecidas e iluminarmos os
caminhos daqueles que por nós passam.
Estamos iniciando um novo século, uma nova
era, um momento em que o homem busca seu
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Angelini RAVM
autoconhecimento, bem como o movimento do
ser com o cosmo, uma busca pela espiritualidade, por uma ética humanizadora. Começamos a
pensar o planeta como nossa casa, casa do humano, da vida humana. Toda e qualquer atitude
inadequada conjunta e/ou isolada frente à vida e
ao planeta pode nos colocar em risco; pois somos
parte intrínseca da natureza e qualquer dano a
ela recairá sobre nossas vidas.
Precisamos transformar a educação como
pon­­­te para esses novos valores, e o professor
é essencial nesse processo. Cabe a ele pôr
em an­­­damento a nova perspectiva, por isso é
fundamental que sua saúde emocional, física e espiritual seja redimensionada por meio
de espaços reflexivos, onde a troca reflexiva
por meio da conversa possa transformar suas
relações de forma equilibrada e apoiada. Ao
final dessa primeira etapa, percebemos que o
professor não pode caminhar sozinho, precisa
do acolhimento emocional, por meio de espaços (dentro ou fora da escola) que propiciem
a conversa, a troca, para enfrentar o dia-a-dia
e usar da criatividade, da esperança, da possibilidade de transformar a escola num espaço
mais humanizado.
SUMMARY
Burnout: soul’s disease in education and its prevention
This article has the intention to propose a reflection on the new paths of
education in the 21st Century. Consider it important to propose a discussion
about the new paradigms that redirect human life and the implications for
education in this process. Let’s therefore elect the philosophical implications
that quantum physics plays in its role in the activation of new principles
ruling the world and contemporary science, including spirituality as a hu­­
man condition for a transdisciplinary approach to the understanding of a
syndrome – burnout, symptom of a diseased education that leads teachers
and students to a psychological physical and spiritual suffering.
KEY WORDS: Education. Burnout, professional. Spirituality.
REFERÊNCIAS
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8. Beauregard M, O’Leary D. O cérebro espiri­tual:
uma explicação neurocientífica para a exis­­tên­­cia
da alma. Rio de Janeiro:BestSeller;2010. p.185.
Trabalho realizado no Instituto Paulista de Desen­­
volvimento Profissional (IPDP), São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 8/6/2011
Aprovado: 3/9/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72
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Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem
matemática sob as lentes da transferência em Freud
ARTIGO ESPECIAL
Uma autópsia nas origens dos problemas
de aprendizagem matemática sob as
lentes da transferência em Freud
Laerte Fonseca
RESUMO – O objetivo primordial deste ensaio teórico é fomentar as discussões
dos conceitos psicanalíticos nos ambientes formais de Apren­­dizagem Matemática
nas salas do Ensino Básico, utilizando-se do mecanismo da transferência como
conceito psicanalítico para compreender as origens dos problemas de Apren­­
di­­­­­zagem Matemática. A análise teórica repousou em Freud (1901, 1912, 1915),
Nasio (1999), D’Ambrosio (1996), Fiorentini e Lorenzato (2009), Huete e Bravo
(2006), Pain (1985) e Kupfer (1989). Os resultados alcançados reclamaram que o
mecanismo da transferência re­­­sulta de situações mal resolvidas entre pais e filhos,
que durante as aulas de Matemática são compreendidos como resistência à sua
aprendizagem, ocasionando os problemas escolares.
UNITERMOS: Transferência de experiência (Psicologia). Transtornos de apren­­
dizagem. Matemática.
Laerte Fonseca – Doutorando em Educação Matemática
pela Universidade Bandeirante de São Paulo (UNIBAN;
2011); Mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela
Universidade Federal de Sergipe (UFS; 2011); Mestre
em Educação pela Universidade Federal de Sergipe
(UFS; 2002); Especialista em Educação Matemática
pe­­­la Faculdade Atlântico (FA; 2009); Especialista em
Psicopedagogia Clínica pela Faculdade Pio Dé­­­ci­­­mo (FPD;
2002); Especialista em Psicopedagogia Ins­­­­­­titucional
pela Faculdade Pio Décimo (FPD; 1999); Especialista
em Ensino de Matemática pela Universidade Federal
de Sergipe (UFS; 1995); Es­­­pe­­cialista em Gerência e
Tecnologia da Qualidade pe­­lo Centro Federal de Edu­­
cação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET/MG; 1994);
Licenciado em Matemática pela Universidade Federal
de Sergipe (UFS; 1992); Graduando em Psicologia pela
Faculdade de Sergipe (FASE/ESTÁCIO; 2010); Estudante
de Psicanálise pelo Núcleo Psicanalítico de Aracaju (NPA;
2010); Pesquisador da FAPITEC/SE-BIBIC/Jr-CNPq;
Pesquisador do PIBIC/IFS; Membro do Grupo de Pesquisa
em Educação e Contemporaneidade/UFS; Professor
do Curso de Licenciatura em Matemática do Instituto
Federal de Sergipe – IFS/BR; Líder do Grupo de Estudos
e Pesquisa em Educação Matemática/IFS; Coordenador
e Editor da Revista Sergipana Caminhos da Educação
Matemática; Pró-Reitor de Ensino do Instituto Federal
de Sergipe – IFS/BR.
Correspondência
Laerte Fonseca
Instituto Federal de Sergipe.
Av. Gentil Tavares da Mota, 1166 – Aracaju, SE, Brasil –
CEP 49055-260
E-mail: [email protected]
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Fonseca L
mo os problemas de Aprendizagem Matemática
podem ser analisados sob as lentes desse mesmo
conceito.
Para tanto, estarei dialogando com autores
da área de Educação Matemática, tais como,
D’Ambrosio5 (1996), Fiorentini e Lorenzato6,
Huete e Bravo7, bem como teóricos dos campos
da Psicopedagogia e da Psicologia Psicanalítica,
como Pain8 e Kupfer9, respectivamente.
Desta forma, o presente trabalho foi dividido
em três partes, com o intuito de proceder a uma
análise sistemática da transferência, dos problemas de Aprendizagem Matemática e da relação
entre esses dois temas.
O texto é concluído, fazendo considerações
em torno da temática discutida, lançando mão
de outras investigações psicanalíticas que poderão contribuir para minimizar o desconforto de
alguns alunos em aprenderem Matemática e,
por fim, posicionando-se em relação à hipótese
anteriormente levantada.
INTRODUÇÃO
O cotidiano das salas de aula de Matemática
do Ensino Básico sempre esteve sujeito a fatores que interferem direta ou indiretamente na
Aprendizagem Matemática dos alunos.
Segundo Fonseca1, na maioria das vezes, os
pro­­­fessores de Matemática não dispõem de um
arsenal teórico-metodológico para minimizar os
fatores que geram os problemas de Aprendizagem
Matemática, dado o tímido investimento – no
campo da Psicologia – feito nos currículos dos
Cur­­­sos de Licenciatura em Matemática.
Neste sentido, um desses fatores está relacio­
nado ao mecanismo da transferência, sendo este,
a meu ver, um dos conceitos primordiais da
Psicanálise.
Nos ambientes de Aprendizagem Matemática, é comum ouvir dos alunos queixas do tipo:
“Não gosto do meu pai porque ele é muito rígido.
Meu professor de Matemática se parece com o
meu pai. Logo, não gosto do meu professor de
Matemática porque ele é muito rígido”. Diante
dessas declarações, questionei-me: como é possível aprender Matemática com alguém que se
alimenta de lembranças negativas a respeito de
seus genitores?
Foi no seio dessa problemática que residiu
minha motivação inicial para desenvolver essa
investigação bibliográfica. Assim, para não perder o norte do trabalho, foquei meus esforços na
seguinte questão: como os problemas de Aprendizagem Matemática poderiam ser analisados
sob a ótica do mecanismo da transferência? Co­­­
mo conjectura preliminar, desconfio que os pro­­
blemas de Aprendizagem Matemática estejam,
em parte, relacionados às transferências que os
alunos fazem dos seus pais com relação a seus
professores.
Com efeito, neste ensaio, objetivo, inicialmen­
te, fomentar a ampliação das discussões de conceitos psicanalíticos nos ambientes formais de
Aprendizagem, em particular, nas salas de aula
de Matemática do Ensino Básico.
Em segundo plano, discutir, a partir de Freud2,3
e Nasio4, o conceito psicanalítico do me­­canismo
da transferência e, em seguida, compreender co­­
O SIGNIFICADO E O SENTIDO DA TRANS­­­
FERÊNCIA EM FREUD
Entre os principais conceitos psicanalíti­­cos,
a transferência destaca-se por melhor com­­
preen­der as relações entre poder e desejo9. Con­­­
siderando esses dois termos como categorias
inatas da personalidade humana, entendo que
se movem ciclicamente, onde o desejo de algo
ou por alguém estimula uma dose de poder que
será desenvolvido e utilizado em prol do alcance
dos objetivos.
Neste contexto, espero que, ao esclarecer o
sentido e significado da palavra transferência
para Freud2, construa-se o alicerce que sustentará a discussão da temática em tela.
Em suas obras completas, Freud2 esclareceu
que a transferência é um fenômeno psicológico
ocasionado não somente durante o tratamento
psicanalítico, podendo acontecer tanto dentro
como fora do consultório. Contudo, é analisada
pelos psicanalistas apenas em seus consultórios.
Como este acontecimento ultrapassa as pa­­­
redes dos consultórios psicanalíticos, desenvolverei, em princípio, inferências apresentadas
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
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Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud
neste trabalho, cujo objetivo é fomentar a ampliação das discussões de conceitos psicanalíticos
nos ambientes formais de aprendizagem, em
particular, nas salas de aula de Matemática do
Ensino Básico.
Desta forma, é favorável anunciar que fazer
uma transposição didática desse conceito freu­­­
diano para o ambiente da sala de aula de Ma­­­
temática não se constituirá uma tarefa fácil,
dado o reduzido número de publicações a esse
respeito, bem como da leitura ainda embrionária
no terreno da transferência.
Durante todo o tempo e de forma inconscien­
te, homens, mulheres e crianças avaliam os com­­­
portamentos de seus pares para poder tomar
de­­­cisões em relação às atitudes exteriores. Como
descendemos da mesma espécie, herdamos geneticamente padrões comportamentais que, sob
a influência do meio, moldam-se de acordo com
as realidades que os envolvem.
Reações a comportamentos manifestados,
frutos de uma relação de poder, geralmente trans­­­
portam o receptor da ação a situações já experienciadas. E, de modo inconsciente, emite-se
outro comportamento que pode provocar uma
fissura entre as relações interpessoais. Esta
des­­­crição pretende definir os limites da transferência que, para Nasio4, caracteriza-se “desde
o apego mais apaixonado até a mais aberta
hos­­­tilidade, o vínculo analista/paciente retira
todas as suas particularidades das fantasias que
alimentam as relações afetivas outrora vividas
pelo analisando” (grifo do autor).
Freud2, antes de conceituá-la, descreve obser­
vações em seu entorno, quando afirma duas
gran­­­­des lacunas de interesse dos psicanalistas:
“Em primeiro lugar, não compreendemos
por que a transferência é tão mais intensa nos indivíduos neuróticos em análise
que em outras pessoas desse tipo que
não estão sendo analisadas. Em segundo
lugar, permanece sendo um enigma a
razão por que, na análise, a transferência
surge como a resistência mais poderosa
ao tratamento, enquanto que, fora dela,
deve ser encarada como veículo de cura
e condição de sucesso.” (ibidem, p. 112,
grifos do autor)
É oportuno frisar que as duas últimas linhas
dessa citação ajudarão a conformação da hipótese central desse trabalho, pois defendo e acredito
que a percepção da intensidade da transferência
no meio escolar pode contribuir para minorar os
problemas originados no seio das relações entre
pais e filhos.
Freud2 explica que há relações entre o mecanismo da transferência e a resistência, primor­dial­
mente “quando o retomamos ao estado de pron­­­
tidão da libido, que conservou imagos infantis”
(ibidem, p. 116). Este excerto endossa ainda mais
os comportamentos de alguns alunos quando
“resistem” às orientações de seus professores.
Pelas vias do inconsciente, os jovens adoles­
centes sinalizam, por meio da transferência,
desejos recalcados em relação aos seus pais,
“pois é claro que se torna particularmente difícil
de admitir qualquer impulso proscrito de desejo,
se ele tem de ser revelado diante desse tipo dá
origem a situações que, no mundo real, mal parecem possíveis”2. E, dessa forma, são veladas por
explicações que, geralmente, corroboram com
o naufrágio dos problemas de Aprendizagem
Matemática.
Outra observação importante de Freud2 que
ajuda na compreensão sistemática dos problemas de Aprendizagem Matemática é a classificação do mecanismo da transferência acerca da
natureza do comportamento manifesto: podem
ser positiva ou negativa.
Para Freud2, estão relacionadas, nesta ordem,
a sentimentos afetuosos e os hostis. O primeiro
tipo ainda é subdividido em “transferência de
sentimentos amistosos ou afetuosos, que são
ad­­­missíveis à consciência, e a transferência de
prolongamento desses sentimentos no inconsciente”.
Freud2 defende, ainda, que ambos os tipos
citados remontam a fontes eróticas, estando associadas a impulsos sexuais reprimidos. Neste sentido, é favorável argumentar que todas as formas
de transferência permeiam campos institucionais
abertos. Sendo assim:
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
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Fonseca L
Algumas vezes, esses sentimentos de amor
e ódio apresentam-se sob características quase
invisíveis para o professor de Matemática. Pri­­­
meiramente, por ausência de uma formação
em fundamentos psicanalíticos e, em segundo
lugar, pela pouca importância que os professores
dessa área atribuem ao campo da Psicologia.
Funcionando como um envolto nebuloso, fica o
professor refém dos comportamentos maquiavélicos (ainda que inconscientes) de seus alunos10.
Assim, Freud2 tratou no volume 12 de sua coleção sobre o processo dinâmico da transferência.
Somente na XXVII conferência, proferida entre
os anos de 1915 e 1917, apresentada no volume
16, discutiu mais profundamente a temática,
buscando definir a referida nomenclatura. Mesmo
assim, ainda o faz de forma indireta, partindo de
exemplos ou estórias criadas por ele mesmo.
Interpretando Freud3, sobre transferência é
possível concluir que se trata de uma triangulação envolvendo o paciente (no caso escolar, o
aluno), o analista (no caso escolar, o professor) e
a mãe/pai, onde sentimentos conflituosos ou não,
vividos na infância do paciente (aluno) com um
dos seus pais são revividos inconscientemente
pelo paciente (aluno) substituindo seus pais pelo
analista (professor).
Um dos episódios de minha trajetória professoral traduz o mecanismo da transferência:
“Certa vez fui tratado com arrogância por
um aluno da 1ª série do Ensino Médio.
Como professor, prezo pela disciplina que,
por sua vez, incomoda àqueles que não
a possuem e acabam assemelhando-se a
alguns modelos de educação doméstica.
O caso alongou-se, indo parar no setor
pedagógico. Tivemos – eu e a instituição –
de convidar os pais do referido aluno para
uma sessão de esclarecimentos. Quando
os pais começaram a descrever o cotidiano familiar, percebi o quanto primava pela
disciplina do filho, quando dizia: ‘lá em
casa tem hora pra tudo, mas José é muito
arredio... não sei a quem puxou! ’”.
“Pode-se levantar ainda a questão de saber por que os fenômenos de resistência
da transferência só aparecem na psicanálise e não em formas indiferentes de
tratamento (em instituições, por exemplo).
A resposta é que eles também se apresentam nestas outras situações, mas têm de
ser identificados como tal. A manifestação
de uma transferência negativa é, na realidade, acontecimento muito comum nas
instituições. Assim que um paciente cai
sob o domínio da transferência negativa,
ele deixa a instituição em estado inalterado ou agravado”2.
Como já foi mencionado, a transferência negativa – foco latente do objeto deste texto – tem
se apresentado no espaço particular de minha
prática docente (ao longo de vinte anos) em
maior dose que a positiva. Nisto residiu a motivação inicial deste trabalho.
Sobre esse tipo, Freud2, apesar de não ser minucioso por acreditar ser uma questão que merece um capítulo à parte, discorre sobre alguns
elementos que contribuirão para o clareamento
das minhas incertezas. Afirma que pode ser encontrada em sintonia da transferência afetuosa e
que, geralmente, são dirigidas ao mesmo tempo
para o mesmo indivíduo.
Segundo Freud2, foi criada uma terminologia
para melhor caracterizar a propriedade de simultaneidade entre os dois tipos de transferência: a
ambivalência – terminologia adotada por Bleuler.
Freud2 explica que:
“Até certo ponto, uma ambivalência desse
tipo parece ser normal; mas um alto grau
dela é, certamente, peculiaridade especial
de pessoas neuróticas. [...]. A ambivalência nas tendências emocionais dos
neuróticos é a melhor explicação para sua
habilidade em colocar as transferências a
serviço da resistência. Onde a capacidade
de transferência tornou-se essencialmente
limitada a uma transferência negativa,
como é o caso dos paranoicos, deixa de
haver qualquer possibilidade de influência ou cura.” (ibidem, p. 118, grifos meu)
Mergulhando nesse exemplo e alicerçan­­­­
do-me na teoria de Freud3, verifiquei que o
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
276
Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud
• o processo de aprendizagem ocorre mediante uma ampla variedade de expe­riên­
cias e materiais de estudo;
• se as condições da aprendizagem são ótimas e a disposição do aluno para percebê-la é positiva, o que se aprende integra-se
de forma adaptável conforme as necessidades. A transferência da aprendizagem
se realizará eficazmente quando o aluno
descobrir relações entre tarefas distintas;
• a formação de conceitos matemáticos irá
precedida de experiências lúdicas, estruturadas e práticas que sirvam de introdução para eles;
• a aprendizagem significativa pressupõe
a assimilação eficaz do novo conteúdo;
• a interação aluno-professor e aluno-aluno
é essencial para que ocorra a construção
de aprendizagens significativas e a aquisição de conteúdos de claro componente
cultural e social. (grifo meu).
De acordo com a minha experiência docente e
com os resultados de pesquisas de D’Ambrosio5,
Fiorentini e Lorenzato6, Fonseca1,11-13 e Maia14,
por exemplo, o fracasso escolar em Matemática decorre da refutação desses princípios de
aprendizagem. Esquivando-se de uma leitura
psicanalítica, é dessa forma que geralmente são
analisados os problemas de aprendizagem pelas
equipes pedagógicas, professores de Matemática interessados na aprendizagem de seus alunos
ou por especialistas (pesquisadores) no Ensino
de Matemática.
Mas, para que se possa compreender o âmbito dos problemas de Aprendizagem Matemática, faz-se necessário, a meu ver, compreender
o significado dos problemas de aprendizagem
a partir do viés psicanalítico. A pesquisadora
argentina Paín8 considera:
“o problema de aprendizagem como um
sintoma, no sentido de que o não aprender não configura um quadro permanente, mas ingressa numa constelação
peculiar de comportamentos, nos quais
se destaca como sinal de descompensação. [e que] Da manipulação casuística
sentido da transferência representa também
uma forma de comunicação. Ainda que incompreendido pelos sujeitos atingidos, esse formato
de linguagem pretende anunciar que: existem
questões não resolvidas ou superadas no desenvolvimento da sexualidade do paciente (aluno);
como não tem a consciência dessas questões,
utiliza-se de seu inconsciente para sinalizá-las;
pede ajuda a pessoas que não falam em seu
idioma manifesto.
É sabido que mães e pais não fazem cursos
para criar seus filhos. Então o fazem baseando-se
nos valores em que acreditam. Dependendo do
nível de educação e bom senso, bem como do
poder aquisitivo, recorrem a outros profissionais
para que a educação de seus filhos seja complementada. Isso auxilia a canalização de questões
edipianas muitas vezes não sublimadas durante
o desenvolvimento psicológico, que, por razão
contrária, transformam-se em problemas, cujas
origens são camufladas e difíceis de acessar fora
de um consultório psicanalítico.
OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM MA­­­
TEMÁTICA
Segundo D’Ambrosio5, ensinar e aprender
Ma­­­temática tem se constituído ainda em uma
tarefa difícil, pois não se têm respeitados os princípios epistemológicos e didáticos que norteiam
o processo dessa atividade.
Em se tratando da Aprendizagem Matemática, Huete e Bravo7 discriminam, sem exauri-los,
44 princípios dessa aprendizagem, resultado
de um misto de teorias. Dentre elas, os mesmos
autores destacam, principalmente: “Paradigma
Condutual, Teoria de Burton, Teoria de Heredia
Ancona, Teoria de Piaget, Teoria de Ausubel”7.
Alguns desses princípios chamaram a minha
atenção quando se objetiva compreender os problemas de Aprendizagem Matemática. Elencá-los-ei, segundo ordenamento de Huete e Bravo7:
• o processo de aprendizagem consiste em ex­­­­
perimentar a ação que há de ser aprendida, mas simultaneamente ocorrem muitas
e variadas atividades e muitos resultados
de aprendizagem;
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
277
Fonseca L
mais ampliada sobre a temática abordada neste
ensaio.
Paín8 explica que o problema da aprendizagem pode surgir como uma reação neurótica à
interdição da satisfação, seja pelo afastamento
da realidade e pela excessiva satisfação na fantasia, seja pela fixação com a parada de crescimento na criança e, por isso, classifica-o como
resultado dos fatores psicógenos.
Estes, por sua vez, estão relacionados com a
dimensão que considera a aprendizagem como
função de “eu” e que pode explicar a diminuição
das funções implícitas no aprender ou a transformação dessas funções, gerando inibições na
aprendizagem ou sintomas de dificuldades*,
respectivamente.
A não-aprendizagem como sintoma supõe
uma repressão de algo relacionado ao significado da operação de aprender, sendo, portanto, um
fenômeno inconsciente. A inibição, por sua vez,
traduz uma retração intelectual do ego, provocando diminuição das funções cognitivas e que
acabam por acarretar problemas para aprender.
Apoiando-se em Freud, Paín8 afirma que:
“tal retração acontece em três diferentes
oportunidades: a primeira, quando há sexualização dos órgãos comprometidos na
ação, por exemplo, a inabilidade manual
associada à masturbação; a segunda,
quando há evitação do êxito, ou compulsão ao fracasso diante do êxito, como
castigo à ambição de ser; e a terceira,
quando o ego (“eu”) está absorvido em
outra tarefa psíquica que compromete
toda a energia disponível, como pode ser
o caso da elaboração de um luto.” (ibidem,
1995, p. 31, tradução minha).
da sintomatologia inerente ao déficit de
aprendizagem, concluímos que nenhum
fator é determinante de seu surgimento, e
que ele surge da fatura contemporânea de
uma série de concomitantes.” (grifo meu)
A despeito desses concomitantes, Paín8 consi­
dera como fundamentais os seguintes fatores:
orgânicos, específicos, psicógenos e ambientais.
Acerca dos fatores orgânicos, Paín8 ratifica
que toda aprendizagem embasa-se nos esquemas de ação e, por isso, a integridade anatômi­
ca assegurada pelo sistema nervoso central é
considerada vital para um desenvolvimento
sadio do processo de aprender. Neste sentido, a
situação geral da saúde dos aprendentes deve
ser analisada. Sintomas como hipoacúsia, miopia, apraxias, afasias e certas dislexias podem
resultar de algum tipo de fragilidade no sistema
nervoso central e serem verificadas tardiamente.
Outro aspecto que a autora destaca é o funcionamento glandular que, em desequilíbrio,
origina hipomnésia, falta de concentração e
sonolência. Paín8 é incisiva quanto às questões
alimentares, “pois o déficit alimentar crônico
pro­­­duz uma distrofia generalizada que abrange
sensivelmente a capacidade de aprender” (ibidem, 1995, p. 29). Por último, salienta que as
con­­­dições de abrigo e conforto para o sono são
elementos importantes que favorecem os fatores
orgânicos da aprendizagem.
No caso dos fatores específicos, Paín8 esclarece, em linhas gerais, que estão relacionados
“fre­­­quentemente a uma indeterminação da lateralidade do sujeito”.
Quanto aos fatores ambientais, a autora em
tela defende que não importa apenas as condições
ambientais, mas, principalmente, ao meio ambiente material do sujeito, bem como as ideo­­­­­lo­­­gias
e valores vigentes no grupo em que o apren­­­dente
se encontra.
Propositadamente, os fatores psicógenos foram
deixados por último, por permitir uma discussão
Defende Paín8 que a inibição origina-se tam­­­
bém como uma especificidade do fenômeno
neurótico, apresentando este duas reações opostas: “uma responde ao impulso de repetição a
situação traumática e a outra à necessidade de
* Na perspectiva de Strick15, “o termo dificuldades de aprendizagem refere-se não a um único distúrbio, mas a uma ampla
gama de problemas que podem afetar qualquer área do desempenho acadêmico”. (grifos da autora)
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278
Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud
acredito que a gênese dos referidos problemas
encontra-se no desejo dos alunos em ‘dizer’ algo
– mas por não saberem como – esbarra na ‘in­­
capacidade’ do professor de decodificar as ações
dos mesmos.
No que se refere aos desejos dos alunos,
acredito que as discussões teóricas anteriores já
respondem, ao menos, preliminarmente. Mas,
quanto ao professor, acredito, pautando-me no
percurso da minha própria formação superior e
no meu itinerário de pesquisa, que os cursos de
Licenciatura em Matemática ainda não despertaram para o viés psicanalítico, ficando o professor
desprovido de ferramentas para minimizar ou,
ao menos, buscar meios adequados às situações
embaraçosas vítimas dos mecanismos da transferência.
Corroborando essa premissa, Kupfer9 defende
que:
“Ocupar o lugar designado ao professor
pe­la transferência: eis uma tarefa que
não deixa de ser incômoda, visto que ali
seu sentido enquanto pessoa é “esvaziado” para dar lugar a um outro que ele
desconhece.”
evitação do lugar indicado pela cicatriz” (ibidem,
1995, p. 31). Estas reações, segundo a autora,
estão relacionadas a três mecanismos de defesa:
a negação, a denegação e a identificação projetiva, que, em linhas gerais, buscam livrassem
de algum sentimento de angústia.
A TRANSFERÊNCIA COMO SINTOMA DOS
PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM MATE­
MÁTICA
Discutidos os conceitos relacionados à transferência e aprendizagem, buscarei compreender
as possíveis relações entre esses, a fim de validar
ou refutar a hipótese central.
Kupfer9 informa que o mecanismo da transferência foi analisado por Freud a partir da interpretação dos sonhos e, mais tarde, percebeu
que a figura do analista funcionava como resto
diurno. Por ser a relação paciente-analista uma
relação humana, Freud acreditou que a transferência também seria encontrada na relação
professor-aluno9.
Desta forma, torna-se o professor um objeto
de transferência em que, segundo Kupfer9, “o que
se transfere são as experiências vividas primiti­
vamente com os pais”. Então, o que se transfere
é o sentido de algo ou alguma ‘coisa’ que está
sendo deslocado de uma situação particular,
muitas vezes reprimido ou desejado.
Kupfer9, parafraseando Miller, afirma que “na
relação professor-aluno, a transferência se produz
quando o desejo de saber do aluno se aferra a um
elemento particular, que é a pessoa do professor”.
Esse desejo, traduzido inconscientemente, por
meio das ações de transferência, busca aferrar-se
a formas, particularmente, os restos diurnos, o
analista e o professor, esvaziando-as e colocando
nelas o sentido que interessa ao sujeito da ação.
Analisando as contribuições de Kupfer9, verifiquei o quão intensa se faz presente a hipótese
central deste ensaio: os problemas de Aprendizagem Matemática estão, em parte, relacionados
às transferências que os alunos fazem dos seus
pais em relação aos seus professores.
Com efeito, apoiando-me no decurso teórico deste trabalho e inferindo a esse respeito,
Em paralelo a esse raciocínio, Kupfer9 faz uma
associação entre desejo e poder, ratificando que,
segundo a História, “a tentação de abusar do poder
é muito grande”. (ibidem, 1989, p. 93)
Abrindo rapidamente uma “fresta” acerca
da aprendizagem na perspectiva freudiana,
entendo que esta decorre do desejo de aprender
que, por sua vez, está relacionado ao desejo de
independência ou afirmação do ego. Assim sendo, Kupfer9 assinala uma preocupação quanto
ao silenciamento do desejo do aluno a partir do
poder exercido pelo professor. Segundo a autora, o abuso de poder ocorre quando o professor
subjulga seu aluno ao “impor-lhe seus próprios
valores e ideias. Em outras palavras, impor seu
próprio desejo, fazendo-o sobrepor-se àquele
que movia seu aluno a colocá-lo em destaque”9.
A meu ver, dessa forma cessa-se o poder
desejante do aluno, tendo ele dificuldade para
aprender conteúdos matemáticos, memorizar
informações, desenvolver habilidades e compe-
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
279
Fonseca L
tências almejadas pelas orientações do cenário
da Educação, conseguindo apenas uma diplomação, mas não se configurando como sujeito
pensante.
Inspirado ainda em Freud16 poder-se-ia ques­­
tionar: caberia ao mestre anular seu próprio
de­­­sejo se é este que o impulsiona para a função
de mestre? Neste momento, valendo-me de um
dito popular – “não quero para o outro o que não
quero para mim” –, pois creio que representa
uma adequada oportunidade para o professor
repensar suas práticas pedagógicas, admitindo,
inicialmente, que possibilitar a aprendizagem de
seus alunos será uma tarefa difícil.
Mas, no caso de buscar alternativas metodo­
lógicas** para provocar nos alunos o desejo por
novas aprendizagens, especialmente as relacionadas aos conteúdos escolares, poderá contribuir
para minimizar os inevitáveis mecanismos da
transferência que, na maioria das vezes, reedi­
tam situações tipicamente relacionadas ao complexo de Édipo, tanto no caso masculino como
no feminino.
Sobretudo, pinço de Kupfer9 duas proposições
decorrentes do discurso psicanalítico:
“Ao professor, guiado por seu desejo, cabe
o esforço imenso de organizar, articular,
tornar lógico seu campo de conhecimento
e transmiti-lo a seus alunos. A cada aluno cabe desarticular, retalhar, ingerir e
digerir aqueles elementos transmitidos
pelo professor, que se engancham em
seu desejo, que fazem sentido para ele,
que pela via de transmissão única aberta
entre ele e o professor – a via da transferência – encontram eco nas profundezes
de sua existência de sujeito do inconsciente”. (ibidem, 1989, p. 99)
conjunto de crenças e valores resultados de seus
desejos – “estará contribuindo para uma relação
de aprendizagem autêntica”.
Verifica-se, desta forma, o quão se torna complicado o jogo no campo educacional entre atores
protagonistas e coadjuvantes, pois somente o
desejo do professor justifica o fato dele estar ali;
e, estando ali precisa renunciar a este desejo.
Eis o fato em que Freud16 (1901) se fundamenta
para afirmar que, apenas como uma fantasia, a
Educação é possível. Caso contrário, configura-se como um ato de violência simbólica.
CONCLUSÃO
Seja ao longo da História, seja na contemporaneidade, as relações interpessoais constituem-se alvos sedutores para os interessados nas
pes­­­­­­­quisas do comportamento humano. Ao que
tudo indica, esse ensaio abordou o mecanismo
da transferência como um dos vieses de um dos
milhares de subconjuntos de pessoas: a tríade
pais-alunos-professores.
O diálogo entre Freud2,3 e Nasio4 acentuou
a conceptualização da transferência como um
me­­­canismo de resistência psicológica que, no
caso particular dos alunos das salas de aula de
Matemática do Ensino Básico, utilizam-na para
“denunciar”, inconscientemente, as fragilidades
que permeiam o relacionamento com os seus
pais, muitas vezes compreendida pela maioria
dos professores de Matemática como rebeldia
ou indisciplina.
D’Ambrosio5, Fiorentini e Lorenzato6, Huete
e Bravo7 e Pain8 ajudaram a alicerçar-me no
ter­­­reno delicado dos problemas de Aprendizagem Matemática, em que princípios e fatores
indispensáveis e diretamente correlacionados
à mesma não são valorizados nem por aqueles
que ensinam, nem pelos pais e nem pelos próprios sujeitos envolvidos. Dessa forma, geram
consequências difíceis de serem removidas no
tempo desejado.
Caso um professor permita essa compreensão
psicanalítica, denominada por Kupfer9 de “canibalização”, que acontece no seio dele mesmo
e de suas próprias aprendizagens – fruto de seu
** Ainda assim, é bom esclarecer que, o educador, segundo Kupfer9, “aprende que pode organizar seu saber, mas não tem
controle sobre os efeitos que produz sobre seus alunos [...] pode-se dizer, por isso, que a Psicanálise pode transmitir ao
educador [...] uma ética, um modo de ver e de entender sua prática educativa”.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
280
Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud
dar ao professor de Matemática ou ao leitor interessado mais alternativas para a compreensão
parcial do seu campo profissional.
Por último, acrescento que a percepção de
um desequilíbrio no comportamento dos alunos
durante as aulas de Matemática que, em par­­­
ticular, pode ser sinônimo dos “Problemas de
Aprendizagem Matemática”, representa um sintoma equivalente à febre orgânica que, quando
medida, traduz-se para o médico em que estado
encontra-se a situação interna do corpo huma­
no. Por isso, o professor deve permitir-se ao
apro­­­fundamento no estudo do comportamento
humano, pois poderia dispor de termômetros que
facilitariam encaminhar as providências mais
indicadas e, com isso, minimizaria problemas de
relacionamento interpessoal com os seus alunos.
Caso usassem lentes de alta resolução, perceberiam que o mecanismo da transferência
funciona como o processo febril e que enquanto
não for resolvido o problema com o pai ou a mãe,
alguns alunos podem desenvolver entraves para
aprender Matemática.
Sobretudo, deixo como provocação os seguintes questionamentos: num mundo em que
a diversidade é fator primordial para o crescimento humano, estariam os problemas de
Aprendizagem Matemática isentos de outros
tipos de interpretação teórica? Qual o problema
em considerá-los?
E, finalmente, as contribuições de Kupfer9, associadas às anteriores, favoreceram a validação
da hipótese inicial: “os problemas de Aprendizagem Matemática estão, em parte, relacionados
às transferências que os alunos fazem dos seus
pais em relação aos seus professores”, pois, segundo a autora, é inevitável que esse mecanismo
aconteça em decorrência da resistência natural
do homem em abandonar seus próprios desejos
em favor de outrem. Assim, friso que, do ponto
de vista da Psicanálise, é nesse meio que reside a origem dos problemas de Aprendizagem
Matemática.
Com efeito, faz-se necessário aos responsáveis pelo processo de ensino-aprendizagem
compreender a importância do viés psicanalítico, pois, além de auxiliar na compreensão dos
casos de seu cotidiano professoral, permitirá a
flexibilização nos estilos de ensino que deverão
seduzir os alunos para que estes tolerem, momentaneamente, a submissão dos seus desejos.
A partir dessa experiência primeira, onde
o mecanismo da transferência é lançado como
pano de fundo para compreender os problemas de Aprendizagem Matemática, é minha
intenção fazer outros movimentos pinçados da
Psicanálise, temáticas como a castração, foraclusão, narcisismo, falo, supereu, identificação
e sublimação, por exemplo, e relacioná-las com
a Aprendizagem Matemática, cujo propósito é
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
281
Fonseca L
SUMMARY
An autopsy on the origins of the problems of learning mathematics
under the lens of transfer in Freud
The primary purpose of this essay is to promote theoretical discussions of psy­
canalitics concepts in formal Mathematics learning environments in elementary
classrooms, using the mechanism of transfer as psychoanalytic concept to understand
the origins of Mathematical learning problems. Theoretical analysis rested on Freud
(1901, 1912, 1915), Nasio (1999), D’Am­­brosio (1996), Fiorentini and Lorenzato
(2009), Huete and Bravo (2006), Pain (1985) and Kupfer (1989). The results achieved
have complained that the mechanism of transfer results from unresolved situations
between parents and children that, during lessons of Mathematics, are understood
as resistance to their learning, causing problems at school.
KEY WORDS: Transfer (Psychology). Learning disorders. Mathematics.
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Artigo recebido: 12/9/2011
Aprovado: 28/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82
282
Andragogia na psicopedagogia
: a atuação com adultos
ARTIGO ESPECIAL
Andragogia na psicopedagogia:
a atuação com adultos
Neide de Aquino Noffs; Carla Maria Rezende Rodrigues
RESUMO – Com esse artigo, temos como objetivo expor a pesquisa
que vem sendo desenvolvida no NAPAp/PUC-SP (Núcleo de Apoio Psi­­
co­pedagógico à Aprendizagem) e apresentada em palestra, ministrada
pela Profa Neide de Aquino Noffs, no IV Simpósio Internacional de Psi­­­
co­­pedagogia, realizado em São Paulo pela Associação Brasileira de Psi­­
copedagogia (ABPp), em 2010. A referida pesquisa nos leva a observar
que a Psicopedagogia, durante décadas, se preocupou em desenvolver
ações com crianças e adolescentes em idade escolar. No entanto, após
a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
(SINAES), no qual foi incluído como indicador de avaliação dos cursos de
Licenciatura e Pedagogia o item “atendimento ao discente”, entendemos
que se faz necessário refletir e revisar as ações pedagógicas desenvolvidas
no Ensino Superior. Este quesito ao ser avaliado será pontuado de 1 a 5 e o
critério de análise inclui níveis de implementação (ou não) do programas de
“atendimento extraclasse e atividade de nivelamento”, além de atendimento
psicopedagógico oferecido pela instituição. Apoiados neste pressuposto,
iniciamos, em 2007, um projeto de intervenção por meio do NAPAp/PUC-SP.
Este núcleo, assumido pelos estudantes de Psicopedagogia na abordagem
institucional, coordenado e supervisionado pela Profa Neide de Aquino Noffs,
está construindo instrumentos e metodologias específicas no atendimento a
adultos que buscam identificar e/ou melhorar seu desempenho escolar, pro­­
fissional e pessoal. Neste texto, abordaremos as contribuições dessa ação na
ampliação do campo de atuação de aprendizagem com adultos: a andragogia.
UNITERMOS: Ensino. Aprendizagem. Educação superior.
Neide de Aquino Noffs – Doutora em Educação pela
Uni­­­versidade de São Paulo; Psicopedagoga Clínica e
Institucional; coordenadora do curso Psicopedagogia
na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP); Diretora e docente da Faculdade de Educação da
PUC-SP; presidente vitalícia da Associação Brasileira de
Psicopedagogia (ABPp), assessora institucional na rede
municipal de ensino e coordenadora geral da comissão
de regulamentação e formação do Psicopedagogo no
Brasil junto à ABPp.
Carla Maria Rezende Rodrigues – Mestrado em Curso
de Pós-Graduação em Letras. Universidade Pres­bite­
riana Mackenzie.
Correspondência
Neide de Aquino Noffs
Rua Diana, 715 – São Paulo, SP, Brasil – CEP 05019-000
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
283
Noffs NA & Rodrigues CMR
dos estudantes ingressantes na Graduação.
Nosso trabalho viabiliza, por meio de estratégias
adequadas, o auxílio nas produções de leitura e
de escrita, bem como a apresentação da diver­
sidade de métodos de organização e estudos
que favoreçam a cada indivíduo e ao grupo, de
acordo com sua modalidade de aprendizagem.
Como estudantes de Pós-graduação da PUC-S­P,
bem como profissionais da Educação, atuando
nas diferentes Instituições de Ensino Superior,
convivemos com a realidade que consiste em ter
nas salas de aula dos cursos de Graduação, em
especial nos de Licenciaturas, alunos que trazem
diferentes modalidades de aprendizagem e, em
grande número, indivíduos que apresentam
dificuldades em seu desempenho escolar e nas
diferentes áreas de conhecimento.
Diante de tal realidade, cada vez representado por maior número de egressos, entendemos
que se faz necessária a reflexão, como também,
a revisão das ações pedagógicas desenvolvidas
no Ensino Superior. Contribui, também, para
essa iniciativa, o fato de ter sido incluído no
instrumento de avaliação para reconhecimento
de Cursos de Pedagogia, no âmbito do Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior
(SINAES), Portaria 808/2010, na Dimensão 1
Organização didático-pedagógica do Curso, o
item 13, que trata do Atendimento ao Discente,
devendo ser pontuado de 1 a 5, dependendo do
nível de im­­­­plementação realizado ou não nos
“pro­­­gramas sistemáticos de atendimento extraclasse, e ativi­­­dade de nivelamento, além de apoio
psicopedagógico oferecido pela instituição”.
Considerando as novas exigências do Ensino,
nosso trabalho visa, portanto, o desenvolvimento
de habilidades necessárias para a atuação do estudante, com procedimentos pedagógicos, psicopedagógicos e técnicas adequadas, detectando
as causas pelas quais o sujeito não aprende ou
encontra-se inadaptado.
Por meio do Atendimento Psicopedagógico,
buscamos proporcionar condições que facilitem
o desenvolvimento do indivíduo, do grupo, da
ins­­­tituição e da comunidade, bem como a prevenção e a solução de dificuldades existentes de
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é apresentar o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Núcleo
de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem
(NAPAp) da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo (PUC-SP), sob a coordenação e
su­­­pervisão da Profa Neide de Aquino Noffs e
assumido pela equipe de pós-graduandas do
Curso de Psicopedagogia da citada Instituição.
O NAPAp, criado em 2007, é uma iniciativa
da Faculdade de Educação da PUC/SP, que
oferece o curso de Pós-graduação (lato sensu)
em Psicopedagogia e atende a dois propósitos, sendo o primeiro, oferecer aos alunos, que
optam pelo estágio institucional do curso de
Psicopedagogia, o ambiente e as situações de
aprendizagem exigidos no futuro exercício de
sua prática e, como segundo propósito, atender
aos alunos dos diferentes cursos de graduação
que procuram apoio para lidar com sua aprendizagem. A partir de 2010, criamos grupos de
apoio específicos para estudantes do curso de
Pedagogia e demais licenciaturas, bem como a
estudantes participantes do Programa Universidade para Todos (PROUNI).
A Psicopedagogia se apresenta como uma
área das Ciências Humanas que se dedica ao
estudo dos processos de aprendizagem. Com
olhar teórico transdisciplinar, o Psicopedagogo
observa as características da aprendizagem
hu­­­­mana, estuda como se aprende, como essa
apren­­dizagem varia evolutivamente e está articulada a vários fatores, como se produzem as alterações na aprendizagem, como reconhecê-las,
tratá-las e preveni-las. No olhar institucional,
entendemos como “o estudo das modalidades
de aprendizagem desencadeadas e/ou possibilitadas pela instituição-escola. Sua intenção é
cuidar da prevenção e enfrentamento de confli­
tos envolvendo a escolarização. Este trabalho
pressupõe uma postura profissional (e de vida)
do indivíduo consigo mesmo e com a coletividade em que convive”1.
Entendemos que, ao oferecer o atendimento
psicopedagógico qualificado, contribuímos para
melhor desempenho nas atividades acadêmicas
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
284
Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos
a aprendizagem de crianças e a aprendizagem
de adultos.
Nossa investigação levou-nos às ideias e aos
modelos que delinearam o percurso da Educação
de adultos. Segundo Knowles et al.2, discernimos
duas correntes de investigação para a Educação
de adultos, a saber: a corrente científica e a corrente artística ou intuitiva reflexiva.
Em 1926, com a publicação de The Meaning
of Adult Education, Eduard C. Lindeman2 esta­
beleceu os fundamentos para uma teoria sobre
a aprendizagem de adultos, denominada corrente artística ou intuitiva. Em sua investigação
interessou-se em entender o modo como os
adultos aprendem, buscando descobrir novos
conhecimentos por meio da intuição e da análise
da experiência. Em seus estudos observamos
que Lindeman estabelece uma dicotomia entre a
educação de adultos e a educação convencional,
e não entre jovens e adultos como inicialmente
podemos supor.
A abordagem para a educação de adultos
ocorrerá por meio de situações, e não de disciplinas. Nosso sistema acadêmico se desenvolveu
em ordem inversa: as disciplinas e os professores são o ponto de partida; os alunos vêm
em segundo lugar. Na educação convencional,
espera-se que um aluno ajuste-se a um currículo
estabelecido; na educação de adultos, o currículo é construído em torno das necessidades e
interesses do aluno2.
A corrente chamada científica foi proposta
em 1928, por E. L. Thorndike, por ocasião da
pu­­­blicação de Adult Learning. É preciso ressaltar
que a corrente científica busca “descobrir novos
conhecimentos por meio de investigação rigorosa” e Thorndike interessou-se pela habilidade de
aprendizagem dos adultos, e não pelos processos
de aprendizagem. Seus estudos foram de grande
importância na medida em que apresentam uma
fundamentação científica para aquilo que, a
princípio, constituía-se apenas como uma crença:
de que os adultos podiam aprender.
Podemos dizer que, na década de 1940, foi
divulgada a maioria dos elementos necessários
para uma conceitualização da aprendizagem de
modo a atingir objetivos educacionais, pedagógicos e psicopedagógicos.
Como objetivo geral, nos interessa ressignificar o papel do estudante no ensino superior,
buscando atender às necessidades dos professores e dos estudantes, a fim de oferecer a esses
condições de trabalho aperfeiçoado, apoiando-os
durante o processo acadêmico, revendo a metodologia de ensino e de estudos utilizada por eles,
aprimorando a organização e a autonomia do
aprendente para a aquisição do conhecimento.
O foco de nosso trabalho está nos sujeitos que
estão em constante processo de aprendizagem,
colaborando com a construção do seu conhecimento, identificando obstáculos no processo de
aprendizagem e o seu desenvolvimento.
Ao abraçarmos tal desafio nos deparamos
com uma questão fundamental: Como tratar da
aprendizagem desses professores/aprendentes
adul­­­­tos? Nossa pesquisa nos levou à percepção
de que nossas intervenções, no ensino superior,
estavam articuladas mais ao processo de aprendizagem das crianças do que aos profissionais
adultos.
Gostaríamos de ressaltar que a educação de
adultos tem sido uma preocupação da Humanidade desde a Antiguidade, onde as escolas funcionavam com um conjunto de pressupostos, sobre
a aprendizagem e as estratégias de ensino, que
recebeu o nome de Pedagogia, que literalmente
significa “a arte e ciência de ensinar crianças”.
Constatando, então, que o ensino com adultos
é algo ainda pouco discutido, iniciamos nosso
estudo com o percurso histórico que nos introduzisse às ideias e aos pressupostos teóricos que
norteiam a aprendizagem com adultos.
O termo Pedagogia tem origem no modelo
or­­­­ganizacional das escolas da Europa do século
VII, já que estas tinham como função primordial
preparar jovens meninos para o sacerdócio, tendo
os professores a missão de doutriná-los na fé e
nos rituais da Igreja.
Somente após a Primeira Guerra Mundial surge um conjunto de ideias, que se expande, pouco
a pouco, tanto nos Estados Unidos quanto na
Europa, sobre as características que distinguem
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
285
Noffs NA & Rodrigues CMR
adultos, porém esses elementos encontravam-se ainda fragmentados, não conjugados para
um modelo integrado de aprendizagem. As
pesquisas foram intensificadas durante a década de 1950, quando algumas disciplinas das
ciências sociais, tais como, a psicologia clínica,
a psicologia do desenvolvimento, a sociologia,
a psicologia social e a filosofia, se interessaram
pela aprendizagem de adultos. Observamos,
também, que Freud, Jung, Erikson, Maslow e
Rogers contribuíram enormemente com a ampliação do conhecimento sobre as diferentes
dimensões do ser humano e, consequentemente,
com os fatores que interferem nos processos de
ensino e aprendizagem.
Surge, assim, o termo andragogia, definido
por Knowles como a “arte e a ciência de ajudar
os adultos a aprender”, estabelecendo, inicialmente, o contraste com a pedagogia, que trata do
ensino de crianças. Posteriormente, reconsiderou
sua formulação, entendendo a andragogia como
um modelo de princípios de aprendizagem e,
portanto, podem ser considerados também, “à
educação de crianças e jovens”3.
No modelo de educação andragógico, os alu­­­­
nos participam das diversas fases do processo
de ensino-aprendizagem, no diagnóstico das ne­­
cessidades educativas, na elaboração de plano,
no estabelecimento de objetivos e nas formas de
avaliações a partir do que foi definido no diag­­
nóstico educativo.
A metodologia é voltada para a participação
ativa dos alunos com uma organização curricular
flexível, visando atender às especificidades de
cada adulto. O docente, envolvido nesse modelo,
necessita conhecer o desenvolvimento e as ne­­­
cessidades de diferentes faixas etárias com as
quais vai lidar.
O professor é considerado um facilitador e,
como tal, sua relação com os alunos é horizontal,
tendo como principal característica o diálogo, o
respeito, a colaboração, a confiança, o conforto, a
informalidade, garantindo, assim, que o aluno se
sinta seguro e confiante, propiciando um clima
propício para a aprendizagem.
A andragogia, enquanto modelo para a educação com adultos, é caracterizada pelo seu foco
no processo de aprendizagem, ao invés da ênfase
no conteúdo. O processo de aprendizagem se
de­­senvolve seguindo uma ordem; sensibilização (motivação), pesquisa (estudo), discussão
(es­­­­­­c larecimento), experimentação (prática),
conclusão (convergência) e compartilhamento
(sedimentação).
O diálogo é fundamental, já que pressupomos
um professor facilitador e um aluno aprendiz,
compartilhando o conhecimento de um com a
experiência do outro.
Nesse processo, torna-se difícil distinguir
quem aprende mais, se o professor ou o aluno,
pois o aprendizado andragógico é caminho de
duas vias e não um caminho de mão única,
busca promover o aprendizado por meio da
ex­­­periência, fazendo com que a vivência estimule e transforme o conteúdo, impulsionando
a assimilação.
Em nosso projeto de trabalho iniciamos com­­­
parando os diferentes modelos de conhecer: o
pedagógico, compreendido aqui, como aprendi­­­
zagem tradicional e o andragógico, como aprendizagem contemporânea (Quadro 1).
Todos nós, os que ensinam e os que aprendem, experienciamos o modelo tradicional de
aprendizagem – o Pedagógico. Este modelo está
presente em nossas escolas de ensino fundamental e médio, em nossos cursos de graduação e
pós-graduação. Podemos inferir que as dificuldades apresentadas, atualmente, na aprendizagem
dos alunos no ensino superior, estão associadas
com a adoção de um modelo pedagógico para o
ensino de jovens adultos.
Partindo desse pressuposto, planejamos a
intervenção psicopedagógica, aplicando o sistema de hipóteses andragógicas, dialogando
com as hipóteses pedagógicas, já estabelecidas
e vivenciadas pelos ingressantes em situação de
aprendizagem.
O projeto de intervenção ocorreu ao longo
do ano letivo de 2010 e, para nortear nossas
ações, realizamos um cronograma contando com
elaboração de instrumentos investigativos, execução dos instrumentos planejados e avaliação
(Quadro 2).
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
286
Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos
Quadro 1 – Modelos de aprendizagem.
Modelo Pedagógico
Aprendizagem Tradicional
Modelo Andragógico
Aprendizagem Contemporânea
Professor é o centro das ações, decide o que ensinar,
como ensinar, e avalia a aprendizagem
A aprendizagem adquire uma característica mais
centrada no aluno, na independência e na autogestão
da aprendizagem
O aluno deve aprender o que a sociedade espera que
saibam (seguindo um currículo padronizado)
Pessoas aprendem o que realmente precisam saber
(aprendizagem para a aplicação prática na vida diária)
O ensino é didático, padronizado e a experiência do
aluno tem pouco valor
A experiência é rica fonte de aprendizagem, por meio
da discussão e da solução de problemas em grupo
Aprendizagem por assunto ou matéria e motivadas
por pressão externa (pais/professores/empregadores)
notas e certificados
Aprendizagem baseada em problemas, exigindo ampla
gama de conhecimentos para se chegar à solução
Quadro 2 – Cronograma.
Atividades Realizadas
Período
Elaboração do Pré-Projeto de Intervenção do NAPAp
Fevereiro/2010
Análise e discussão dos dados obtidos nos Questionários aplicados pela PUC-SP
aos alunos inscritos nos Cursos de Graduação em Pedagogia, durante o
Vestibular Unificado/2010
Março/2010
Contato com a Coordenação dos Cursos de Graduação em Pedagogia da PUC-SP
Abril/2010
Elaboração dos Questionários para reconhecimento do perfil de aluno dos
Cursos de Graduação em Pedagogia da PUC-SP
Abril/2010
Aplicação dos Questionários
Maio/2010
Tabulação dos dados obtidos nos Questionários
Maio/2010
Análise e discussão dos dados obtidos nos Questionários
Maio e Junho/2010
Planejamento dos atendimentos
Junho/2010
Encontro de apresentação aos alunos interessados em participar do projeto
Junho/2010
Atendimento aos alunos
Agosto a Novembro/2010
Interpretação dos resultados obtidos nos atendimentos
Novembro/2010
Confecção de relatório final dos atendimentos
Dezembro/2010
Inicialmente, distribuímos uma carta convite
(Anexo 1), expondo, em linhas gerais, a nossa
intenção de trabalho e, em seguida, distribuí­
mos um questionário a ser preenchido por
aqueles que desejassem participar do projeto
(Anexo 2).
Esse questionário foi realizado com a finalidade de levantamento de dados iniciais, do
perfil da clientela e do conhecimento prévio
das experiências educativas dos interessados.
As perguntas foram elaboradas tomando-se
por base, os seis princípios fundamentais que
orientam o modelo andragógico na prática, demonstrado na Figura 1.
A Figura 1 pode ser interpretada como representante do percurso da aprendizagem, no qual
estão expostos, ao centro, os seis princípios, rodeados por outros fatores que afetam o processo
de aprendizagem, tais como: as diferentes modalidades de aprendizagem, que individualmente
possuímos, as influências sociais, culturais ins­
titucionais, entre outros (Quadro 3).
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
287
Noffs NA & Rodrigues CMR
Anexo 1 – Carta convite.
CONVITE
Núcleo de Apoio Pedagógico à Aprendizagem
Prezado(a) Estudante de Pedagogia
O Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem (NAPAp / PUC-SP), após análise e sua anuência
manifesta em questionário específico, vem convidá-lo(a) a participar deste projeto.
Nossa primeira reunião será no dia____de_______de 2010, segunda-feira, às ____ h, na sala ____.
Este Núcleo está voltado, preferencialmente, aos alunos ingressantes do curso de Graduação em
Pedagogia e demais licenciaturas da PUC-SP. Busca a qualificação destes estudantes, bem como, sua
inserção no mercado de trabalho como profissional da Educação.
Contamos com sua presença!
Saudações pedagógicas e psicopedagógicas,
Equipe NAPAp / PUC-SP
tivas de Jorge Visca, nas primeiras sessões, para
explorarmos a relação de aprendizagem estabelecida em cada um dos elementos do grupo, e
também abrir o canal da escuta psicopedagógica
para as demandas individuais e coletivas.
Após esse momento, organizamos as sessões
a partir de atividades pedagógicas específicas
articuladas a um processo de autoconhecimento
do estudante como pessoa e como acadêmico.
Entre as atividades pedagógicas específicas
eram oferecidos textos de jornais, revistas, artigos de livros científicos proposto pelo curso (do
qual o cliente era oriundo), bem como subsídios
específicos às situações vivenciadas academicamente, tais como: seminários, trabalhos individuais ou coletivos, relação professor-aluno e
aluno-aluno.
Visando à compreensão do processo an­
dragógico e psicopedagógico de aprendiza­­­­­
gem, eram refletidas no momento da supervisão
des­­­te estágio: as atividades a serem desenvolvidas, o processo e atuação dos profissionais,
e tam­­bém, o produto conquistado individual e
coletivamente.
Assim, após o levantamento, a leitura e a
aná­­­lise dos dados obtidos, nossos objetivos específicos foram assim definidos:
• Rever a concepção e a atuação do estudante universitário;
• Auxiliar o aprendiz para que se vincule
à tarefa de modo a produzir uma aprendizagem efetiva;
• Selecionar estratégias facilitadoras da
aprendizagem, que envolvam a escolaridade como um todo;
• Utilizar o cotidiano como um desencadea­
dor das reflexões pertinentes aos seus
processos de ensino e aprendizagem;
• Integrar pessoas, bem como a modalida­de
de articulações possíveis entre os con­­­
teúdos-conhecimentos escolares e as ati­­­
vidades de ensino-aprendizagem;
• Proporcionar a transposição didática, integrando os saberes empíricos, ensinados
e científicos.
Estabelecido os objetivos a partir da análise
dos dados, iniciamos as sessões, atendendo aos
grupos e optamos por utilizar as técnicas proje-
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
288
Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos
Anexo 2 – Questionário de ingresso.
Núcleo de Apoio Pedagógico à Aprendizagem
QUESTIONÁRIO DE INGRESSO/2010
Nome:_______________________________________________________________________ Data Nascimento____/_____/____
e-mail:______________________________________
____________________________________________
____________________________________________
Naturalidade:________________________________
□
□
Sexo:
MasculinoResidencial:________________________
FemininoCelular:___________________________
Comercial:_________________________
Estado Civil:_____________________

Curso:______________________________________________________________________________________________________
□ SimModalidade:____________________
□ Não
□ Regular □ Pública
Ensino Fundamental I, II:___________________________________ __________________________________________________________ □ EJA
□ Privada
Ensino Médio:_____________________________________________ □ Regular □ Pública
__________________________________________________________ □ EJA
□ Privada
Forma de Ingresso:___________________________ Bolsista:
Período de Ingresso:__________________________ • Formação acadêmica:_______________________________________________________________________________________
• Neste período em que cursou Ensino Fundamental e o Ensino Médio, houve alguma reprovação, em qual série?
____________________________________________________________________________________________________________
• Você foi submetido a algum tipo de intervenção ou ajuda de profissionais?
Ex: aulas particulares, atendimento psicológico, salas de atendimento, fonoaudiólogas e etc.
____________________________________________________________________________________________________________
• Quais as estratégias usadas pelo professor que você mais se identificou no Ensino Fundamental e Médio? E quais as
que menos se identificou?
____________________________________________________________________________________________________________
• Como você avalia o seu aprendizado durante o Ensino Fundamental?
____________________________________________________________________________________________________________
• E no Ensino Médio?
____________________________________________________________________________________________________________
• O que a escola representa para você de uma maneira geral?
____________________________________________________________________________________________________________
• Qual o motivo da escolha desse curso?
____________________________________________________________________________________________________________
• Esse é a sua primeira graduação?
□ Sim □ Não
• Se não, qual a sua outra graduação__________________________________________________________________________
• Como é a sua vivência atual em relação à produção acadêmica?
Leitura
Ótima
Boa
Interpretação de textos
Resenhas
Seminários
Pesquisas
Elaboração de projetos
□
□ Ótima
□ Ótima
□ Ótima
□ Ótima
□ Ótima
□
□ Boa
□ Boa
□ Boa
□ Boa
□ Boa
□ Regular
□ Regular
□ Regular
□ Regular
□ Regular
□ Regular
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289
Noffs NA & Rodrigues CMR
Continuação Anexo 2 – Questionário de ingresso.
• Sente alguma dificuldade em acompanhar o curso? De que natureza?
Métodos de estudo
Sim
Não
Situação de escrita
Interpretação de textos
Leitura
Organização pessoal
Apresentação de Seminário
□
□ Sim
□ Sim
□ Sim
□ Sim
□ Sim
□
□ Não
□ Não
□ Não
□ Não
□ Não
• Gostaria de ter algum apoio no Ensino Superior? Qual?
____________________________________________________________________________________________________________
• Teria interesse em participar de sessões de apoio psicopedagógico às segundas-férias na PUC-SP?
Marque com X o horário de sua preferência
□ Grupo A: 12h às 13h
□ Grupo B: 18h às 19h
Sugere outro horário para formação de grupo?_________________________________________________________________
Data:____/_____/_____
__________________________________________________
Assinatura
Quadro 3 – Princípios da Andragogia e
norteadores da ação interventiva no NAPAp.
Os adultos precisam saber por que eles precisam
aprender algo antes de aprendê-lo
A autopercepção dos adultos é altamente dependente
de um movimento rumo à autodireção
As experiências prévias do aprendiz fornecem riqueza
de recurso para a aprendizagem
Os adultos tipicamente se tornam prontos para
aprender quando experienciam a necessidade de
lidar com uma situação de vida ou realizar
uma tarefa
A orientação de aprendizagem de adultos é
centrada na vida; a educação é um processo de
desenvolvimento dos níveis de competências para
que atinjam seu potencial complexo
A motivação para a aprendizagem dos adultos é
mais interna do que externa
Figura 1 – O modelo de Andragogia na prática.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
290
Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos
um paradigma de educação, no qual o centro
do processo seja, integralmente, o sujeito, sua
aprendizagem em suas diferentes dimensões4.
Outro ponto importante foi a identificação
do grupo com os objetivos e propósitos para a
apren­­dizagem indicados no quadro modelo de
andragogia na prática com a Psicopedagogia. O
psicopedagogo em suas ações reconhece, nos
seis princípios fundamentais da aprendizagem
com adultos, um roteiro possível de ser seguido
desde que o profissional o faça refletidamente
e não mecanicamente.
A atuação do psicopedagogo a partir da perspectiva da andragogia se apresenta como mais
uma possibilidade de inovação às referências
convencionais de intervenção na dimensão
institucional do psicopedagogo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estas reflexões são registros de um processo
em execução, configurando-se num estudo ainda
não conclusivo. O que já podemos adiantar é
que, diante dos dados apresentados e das experiências com os indivíduos do grupo, vislumbramos a necessidade de se repensar os modelos de
ensino, principalmente para aqueles que exercerão, futuramente, o papel social de docentes.
Ressalta-nos a necessidade de que, os mediadores dos processos de aprendizagem, entre
eles, o psicopedagogo, se esforce para encontrar
estratégias que contemplem as reais necessidades e demandas dos aprendentes, revendo
os procedimentos e as propostas educacionais
atuais, abrindo diálogo entre as diferentes teo­
rias e áreas do conhecimento, estabelecendo
SUMMARY
Andragogy in psychopedagogy: the role with adults
With this article, we aim to expose the research being developed in
the NAPAp/PUC-SP (Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem)
and presented in a lecture, given by Prof. Neide de Aquino Noffs, at the
IV International Symposium on Psychopedagogy, held in Sao Paulo, in
2010, by Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp). Such research
leads us to note that the Psychopedagogy for decades focused on building
activities with children and adolescents of school age. However, after
the implementation of the Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior (SINAES), which was included as an indicator for evaluating the
degree courses and pedagogy the item “student service” we mean that it
is necessary to reflect and review the actions developed pedagogical in
Higher Education. This item to be evaluated will be scored from 1 to 5 and
the standard of review includes levels of implementation (or not) programs
for “extra class attendance and grading activity” beyond psychopedagogical
service offered by the institution. Supported this assumption, we started
from 2007, an intervention project through the NAPAp/PUC-SP. This
core, taken by students of Psychopedagogy in the institutional approach,
coordinated and supervised by Prof. Neide de Aquino Noffs, is building
tools and methodologies specific to adults seeking assistance to identify
and / or improve their academic performance, professional and personal.
In this paper, we discuss the contributions of this action in the expansion
of the field of adult learning: andragogy.
KEY WORDS: Teaching. Learning. Education, higher.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
291
Noffs NA & Rodrigues CMR
REFERÊNCIAS
3. Knowles MS, Holton III EF, Swanson RA. The
modern practice of adult education: from pe­
dagogy to andragogy. New York:Association
Press;1980.
4. Noffs NA, Espósito VHC. Formação de profissionais da Educação: da proposição à ação.
Rev Psicopedagogia. 2011;28:178-84.
1. Noffs NA. Psicopedagogo na rede de ensino:
a trajetória institucional de seus atores-autores. São Paulo:Elevação;2008.
2. Knowles MS, Holton III EF, Swanson RA.
Aprendizagem de resultados: uma abordagem
prática para aumentar a efetividade da educação corporativa. Rio de Janeiro:Elsevier;2009.
Trabalho realizado no Núcleo de Apoio Psicopedagógico
à Aprendizagem (NAPAp) da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 1/10/2011
Aprovado: 28/10/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92
292
Aplicação das tecnologias
digitaisde
virtuais
no contexto psicopedagógico
ARTIGO
revisão
Aplicação das tecnologias digitais virtuais
no contexto psicopedagógico
Ana Margô Mantovani; Bettina Steren dos Santos
RESUMO – As Tecnologias Digitais Virtuais (TDVs) trazem novas pos­­­
si­­­­­­­bilidades de interação, comunicação e representação, possibilitando um
leque cada vez maior de aplicações no campo psicopedagógico, pois podem
tornar-se instrumentos para a investigação das vinculações inadequadas que
ocorrem no processo de aprendizagem. No entanto, para o psicopedagogo
ser o protagonista desse processo e atender à demanda da geração di­­­
gi­­tal, é necessário vivenciar experiências com tais tecnologias, a fim de
de­­senvolver competências didático-pedagógicas, aliadas a competências
tecnológicas-digitais, que lhe viabilizem interagir e utilizar essas tecnologias
em sua prática psicopedagógica, tanto institucional como clínica. Nesse
contexto, apresentamos uma revisão teórica acerca das possibilidades
psicopedagógicas do uso das TDVs, destacando contribuições advindas
dos estudos e da experiência docente e psicopedagógica das autoras com a
utilização dessas tecnologias. A partir das reflexões realizadas, acreditamos
que a utilização das TDVs na prática psicopedagógica, por atuar no campo
das representações virtuais, aciona os mecanismos da projeção, facilitando
assim a investigação das significações do ato de aprender e a representação
social que o sujeito faz dos conhecimentos escolares, familiares e consigo
mesmo, abrindo novas vias para a ressignificação da aprendizagem.
UNITERMOS: Aprendizagem. Metodologias computacionais. Software.
Ana Margô Mantovani – Mestre em Educação pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Psicopedagoga e Docente do Programa de Pós-Gra­­­
duação – Mestrado em Memória Social e Bens Cul­­
turais e Graduação do Centro Universitário La Salle
(UNILASALLE), Canoas, RS, Brasil.
Bettina Steren dos Santos – Pós-doutorado no College
of Education, The University of Texas at Austin, EUA.
Doutorado em Psicologia Evolutiva e da Educação –
Universidad de Barcelona. Docente do Programa
de Pós-Graduação em Educação e da Faculdade de
Educação/ Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil.
Correspondência
Ana Margô Mantovani
Avenida Victor Barreto, 2288, Sala 315, Prédio 1 –
Canoas, RS, Brasil – CEP: 92010-000
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
293
Mantovani AM & Santos BS
ções, tais como dúvidas, ansiedades, alegrias e
frustrações no uso de tais tecnologias, para após
utilizá-las com nossos aprendentes, sejam alunos
e/ou pacientes.
Nesse sentido, Weiss5 aponta que o compu­­
tador deve ser visto como mais um recurso
na clí­­­nica e, compete a nós buscar o potencial
psi­­­­copedagógico diferenciado que essas tecno­
logias apresentam, principalmente em relação
à possibilidade da expressão da rede de nosso
pensamento, vinculada à convivência em espa­
ços digitais virtuais. Para Weiss5 “o percurso que
cada um utilizará irá depender dos “nós” de conexão que forem escolhidos ao longo da jornada.
Poderemos encontrar aí os “nós” das vinculações
inadequadas no processo de aprendizagem de
cada sujeito”.
Assim, esse artigo apresenta uma revisão teó­­­­
rica sobre as potencialidades do uso das TDVs
no campo psicopedagógico, destacando algumas
contribuições advindas dos estudos e da expe­
riência docente e psicopedagógica das autoras
com as aplicações de tais tecnologias. Para tal,
elucidamos alguns conceitos referentes às tecno­
logias que serão abordadas nesse artigo, desta­
cando nossas concepções acerca dos processos
de ensinar e aprender nesse contexto, apresen­
tando possibilidades didático-pedagógicas e,
em especial, psicopedagógicas do uso dessas
tecnologias.
INTRODUÇÃO
Nossa vivência no contexto da sociedade con­­­
temporânea está imersa em uma nova cultura
digital, quer sejamos “imigrantes” ou “nativos
di­­­gitais” (também denominados de “Homo zappiens”). Prensky1 destaca que os nativos digitais
têm contato com a tecnologia logo após o nasci­
mento, então desde cedo aprendem a conviver
no cenário dos espaços digitais virtuais. Para
Veen e Vraking2, o Homo zappiens caracteriza
a geração que nasceu em plena ebulição de
uma cultura cibernética global, sustentada pela
multimídia e, como consequência, se comporta,
pensa e aprende de uma forma diferenciada. É
uma geração que pertence a redes e faz uso delas
para resolver problemas, por isso não pensa de
uma forma linear, pensa em redes e de forma
mais colaborativa do que as gerações anteriores.
Então, o modo de ser do Homo zappiens é digital
e não analógico.
De acordo com Prensky1, os imigrantes digi­
tais são aqueles que assistiram ao nascimento
da Internet e se adaptaram a ela, como é o caso
da maioria dos docentes e psicopedagogos que
se encontram em atividade profissional. Então,
estamos vivenciando o encontro das gerações
analógica e digital e, para que esse momento
possa contribuir com mudanças significativas
na compreensão dos processos de ensinar e de
aprender, ou nas palavras de Fernandez3, nas re­
lações que se estabelecem entre aprendente, en­
sinante e objeto de conhecimento, é necessário
que a geração analógica conheça os “idiomas”
da geração digital.
Desse modo, para atender aos anseios e inte­
resses da geração digital, é necessário incorporar
em nosso dia a dia e, em nossa prática psicope­
dagógica, a convivência em espaços propiciados
pelas TDVs, para que possamos utilizá-las com
competência didático-pedagógica e competên­
cia tecnológica-digital, a fim de acompanhar e
propor mudanças decorrentes da “Sociedade em
Rede”4. No entanto, para que nos autorizemos
a intervir nessa realidade, precisamos primeiro
conhecer as possibilidades e as limitações dessas
tecnologias, sentir nossas percepções e sensa­
CONCEITUANDO TECNOLOGIAS DIGI­
TAIS VIRTUAIS (TDVS)
A Web 1.0, denominada como a primeira
geração da Internet, se caracterizava pela dis­
ponibilização de informação em páginas escritas
em HTML, com baixa capacidade de interação. A
partir do surgimento da Web 2.0, as tecnologias
associadas à rede Internet disponibilizaram aos
usuários da rede (interagentes) diversos serviços
e ferramentas que permitem o compartilhamento
gratuito de arquivos, vídeos, músicas e o estabe­­
lecimento das redes sociais, apresentando um
grande potencial de interação, característica mar­­­
cante dessa nova geração de tecnologias.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
294
Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
Consideramos importante destacar os con­
ceitos de interação sugeridos por Primo6, uma
vez que o autor diferencia a interação mútua da
interação reativa presente na interação humana
mediada por computador. A interação mútua se
caracteriza como um sistema aberto, sendo que
os sujeitos participam ativamente da construção
do relacionamento e se afetam mutuamente,
re­­­criando o processo a cada troca. A interação
reativa caracteriza um sistema fechado de rela­
ções determinadas por estímulo e resposta. Por
apresentar relações lineares e unilaterais, os
sujeitos têm pouca ou nenhuma possibilidade
de construir o relacionamento.
Assim, as TDVs aqui referidas caracterizam­
-se pela integração e a combinação de diferen­
tes tecnologias por meio da Web 2.0, aliadas às
tecnologias da Web 3D, representadas princi­
palmente pelos metaversos que possibilitam a
construção de Mundos Digitais Virtuais em 3
Dimensões (MDV3D) e potencializam os pro­
cessos de interação.
O termo metaverso foi criado por Neal Ste­
phenson, em 1992, no romance Snow Crash
e é utilizado para designar um mundo virtual
fic­­­cional. Conforme Schlemmer e Backes7, o
metaverso “é uma tecnologia que se constitui
no ciberespaço e se “materializa” por meio da
criação de Mundos Digitais Virtuais em 3D, no
qual diferentes espaços para o viver e conviver
são representados em 3D, propiciando o surgimento dos “mundos paralelos” contemporâneos”.
Os metaversos-MDV3D possibilitam novas
formas de interação proporcionadas pelo alto
grau de imersão do sujeito (e-habitante) no am­­
biente, pois este pode estar telepresente por meio
de um avatar, uma representação gráfica em 3D,
e interagir por meio das diferentes linguagens de
comunicação: textual, oral, gestual (movimentos
evidenciados nas ações do avatar) e gráfica,
além de ser teletransportado virtualmente para
diversos lugares localizados nesses mundos.
Aqui, acontece a interação mútua apontada por
Primo6 e, se considerarmos que a interação é um
dos principais fatores para que a aprendizagem
aconteça, compreender a intricada teia das in­­
te­­­­rações geradas nos Mundos Virtuais seria fun­
damental para potencializar as aprendizagens
decorrentes desses ambientes.
Essas tecnologias possibilitam uma comuni­
cação em rede, emergentes do ciberespaço, pro­­­­­­
mo­­­vendo novas formas de (re)construção dos
co­­­­­­nhecimentos, através de processos mais coo­
pe­­­­rativos e interativos, bem como a construção
de novos espaços de aprendizagem, na medida
em que modifica as representações de tempo e
es­­­paço e a relação do sujeito com seu próprio
corpo e com a construção de sua própria história8.
Essas questões devem estar presentes na teoriza­
ção didático-pedagógica e psicopedagógica que
permeia os processos de ensinar e aprender.
AS TRAMAS E “NÓS” DA APRENDIZAGEM
NO CONTEXTO PSICOPEDAGÓGICO
No campo psicopedagógico, para que a apren­­­­
dizagem aconteça, é necessário ter presente três
instâncias: o aprendente, o ensinante e o objeto
de conhecimento. Quando os vínculos que se es­
tabelecem entre essas instâncias são adequados,
configura-se a aprendizagem e, quando surgem
“nós” entre esses vínculos, colocando em risco
a circulação dos saberes e dos conhecimentos,
mobilizando o pensamento, surgem as diferentes
fraturas na aprendizagem.
Em nossa concepção, a aprendizagem se dá
na trama dialética de interação com o mundo
ob­­­jetivo e sociocultural, entrelaçada na estru­­­
turação da lógica (estrutura epistêmica) e da dra­­­­
mática (estrutura desejante) do sujeito. São duas
estruturas constituídas no nível de representa­
ções e manifestadas por meio da linguagem.
Apesar de estarem intrinsecamente entrelaça­
das, pois ambas definem e são determinantes
na geração de nossas ações e reações, elas não
são idênticas9,10.
Para Fernández9, a capacidade de organiza­
ção lógica e a significação simbólica acontecem
ao mesmo tempo, no entanto, uma estrutura é
de caráter genético, que vai se autoconstruindo,
e a outra estrutura é desejante, que embora não
seja genética, vai entrelaçando um sujeito que
tem uma história. Então, a aprendizagem se dá
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
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Mantovani AM & Santos BS
na concepção de um sujeito que no uso de sua
singularidade estruturada e estruturante, na
me­­­dida em que interage dialeticamente com o
mundo sociocultural (afeta e é afetado) aprende
com as relações estabelecidas com o outro, por
meio dos vínculos socioafetivos, entrelaçados
pela ação e pela linguagem.
Situamos aqui o contexto de construção de
um corpo teórico psicopedagógico que, usando
as diversas áreas do conhecimento, tem o propó­
sito de compreender o sutil entrelaçamento entre
a inteligência e o desejo do sujeito que “suporta”
a aprendizagem. Pain11 aponta o problema de
aprendizagem como um lugar privilegiado e
talvez o único que permite observar as relações
entre ambas às estruturas.
Conforme Fernández9, para interpretar um
problema de aprendizagem é necessário conhe­
cer o lugar que tal problema está enganchado
no simbólico, uma vez que existe uma certa
dependência, uma ligação entre o simbolizado e
o símbolo escolhido. Assim, segundo a autora, o
problema de aprendizagem “sintoma” está liga­
do ao fracasso da simbolização frente à anulação
do desconhecimento, ou seja, a impossibilidade
de simbolizar sobre uma determinada situação,
é que provocaria um sintoma. Nesse sentido, a
autora mostra que entender a diferença e eli­­­
minar a distância entre o real e o imaginário
im­­­plica encontrar na ordem do simbólico um
novo significado. Para a autora, a passagem da
simbolização torna possível mobilizar a circu­
lação patológica do conhecimento na criança e
em seu grupo familiar, abrindo-se assim a via da
ressignificação da aprendizagem.
Desse modo, temos evidências de que o sinto­
ma, ao cristalizar-se na aprendizagem, bloqueia
as possibilidades desse processo. Então, como
psicopedagogos precisamos desvendá-lo, ou me­
lhor, desembrulhá-lo e constatar nesse sintoma
aquilo que está ausente. No trabalho clínico,
com­­­pete ao psicopedagogo, trabalhar para o
de­­­sa­­­parecimento do sintoma e criar condições,
estratégias para que a aprendizagem aconteça,
liberando os entraves que existem na relação do
sujeito com o conhecimento.
Acreditamos que, nos espaços digitais vir­
tuais, a simbolização se insinua a todo instante.
A “na­­­vegação” nesses ambientes possibilita um
grande “mergulho” no simbólico e as crianças de
hoje, os nativos digitais, já são testemunhas do
revestimento simbólico proporcionado pelo com­
putador e suas múltiplas interconexões, porque
as tecnologias fazem parte do seu mundo, da sua
cultura. Então, não seriam os espaços digitais
virtuais instrumentos ou recursos propícios para
investigação e/ou manifestação dos problemas
de aprendizagem?
Por isso, a importância de utilizarmos o com­­­­
putador e suas múltiplas conexões, por meio das
TDVs, como instrumentos de construção sim­­
bó­lica, que podem participar desse processo de
des­­­­velamento do simbólico e, por con­­­­­­­sequência,
dos sintomas de aprendiza­­­gem. Consideramos
importante utilizar essas tecnologias, enquanto
psicopedagogos, para que as crianças, adoles­
centes e até mesmo os adultos, estabeleçam no­
vos vínculos e/ou relações com a aprendizagem.
POSSIBILIDADES DAS TDVS NA APLICA­
ÇÃO DAS TÉCNICAS PROJETIVAS PSICO­
PEDAGÓGICAS
Visca12 destaca que a aprendizagem não é só
escolar, por isso em uma investigação psicope­
dagógica deve-se investigar o tipo de vínculo
que o sujeito estabelece com o professor, a sala
de aula, os conteúdos, os colegas e a escola, mas
também a relação com as pessoas fora do contex­
to escolar. Nessa perspectiva, Weiss5 aponta que
é necessário investigar a relação da criança com
os adultos significativos que lhe oferecem ou não
modelos de aprendizagem, bem como os cenários
onde isto ocorre. Nesse caso, Visca12 sugere a
apli­­­cação das Técnicas Projetivas Psicopedagó­
gicas, que permitem investigar os vínculos que
o sujeito estabelece com a aprendizagem, como
também com as circunstâncias dentro das quais
ocorre tal construção. Assim, o objetivo dessas
técnicas é estudar as redes de vínculos que o
su­­­jeito estabelece em três grandes domínios:
escolar, familiar e consigo mesmo.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
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Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
Desse modo, Visca12 considera as Técnicas
Projetivas Psicopedagógicas instrumentos para
a compreensão dos fatores emocionais que
con­­­dicionam de forma positiva ou negativa a
apren­­dizagem, sendo que o foco é o processo de
aprendizagem, as significações do ato de apren­
der e a representação social que o sujeito faz dos
conhecimentos escolares, familiares e consigo
mesmo. Dentre as técnicas projetivas propostas
por Visca12, em relação aos vínculos escolares,
destacamos: par educativo; “eu com meus cole­
gas”; a planta da sala de aula. Em relação aos
vínculos familiares estão: a planta da minha casa;
os quatro momentos do dia; a família educativa.
E, em relação aos vínculos consigo mesmo: o
desenho em episódios; o dia do meu aniversário;
em minhas férias; fazendo o que mais gosto.
Chamat13 também apresenta e resgata algumas
técnicas projetivas, tais como a pareja educativa,
o par educativo familiar, a técnica do “eu” ideal e
real, desenho livre e da família, da figura humana,
situação agradável e desagradável, entre outras.
A autora alerta que a aplicação dos instrumentos
projetivos requer do psicopedagogo sustentação
teórica para sub­­­sidiar a interpretação e a com­
preensão de que tais instrumentos não podem ser
analisados in­­­dividualmente, mas, sim, inseridos
em um determinado contexto, considerando a
história de vida individual e familiar do sujeito.
Diante das considerações aqui referidas, pode­
mos inferir que o uso das TDVs na clínica psicope­
dagógica, por atuar no campo das repre­sentações
virtuais, agiliza os mecanismos da projeção no
sentido de deslocamento, ou seja, o sujeito projeta
para fora de si o que se recusa a reconhecer em si
mesmo. Então, através da projeção, é possível que
o inconsciente se manifeste liberto dos entraves
que habitualmente o impedem de expressar-se,
deslocando para o plano objetivo os conteúdos
latentes que podem estar significando suas apren­
dizagens em aprender ou não aprender12.
dagógico deverão ser criteriosos, por isso faz-se
necessário considerar alguns requisitos técnicos
e pedagógicos, para garantir a qualidade desses
recursos computacionais. Através dos estudos
rea­­­­lizados, referenciados em autores, tais como
Padovani e Moura14, Giraffa15 e na Rede Interativa
Virtual de Educação16 (RIVED), da experiência
dessas autoras com o uso de diversas TDVs e da
prática no desenvolvimento de software, jogos e
websites educacionais, bem como na construção
de MDV3D, destacamos a seguir os principais
requisitos que devem orientar a seleção de tais
tecnologias.
Em relação aos requisitos pedagógicos, os
recursos computacionais deverão ser didatica­
mente bem estruturados, explorando a interati­
vidade proporcionada pelos recursos multimídia,
aliados aos ambientes hipermídia, para instigar
o sujeito a:
• Desenvolver a capacidade de representação
por meio de palavras (signos verbais) e/ou
imagens mentais (símbolos imagéticos);
• Testar diferentes caminhos;
• Visualizar conceitos de diferentes pontos
de vista;
• Relacionar conceitos, organizar e construir
conhecimentos;
• Comprovar e formular novas hipóteses;
• Tomar decisões e resolver problemas;
• Aguçar a curiosidade, criatividade e ima­
ginação;
• Trabalhar em equipe promovendo os pro­
cessos de colaboração e cooperação;
• Promover situações que favoreçam a in­
dependência e a autonomia;
• Instigar o desenvolvimento de diversas
competências e habilidades;
• Ampliar as possibilidades de interação
por meio de atividades variadas, criativas
e com nível de complexidade.
Como apresentaremos software educativos
categorizados como abertos, flexíveis, que pos­
sibilitam interação mútua, não nos deteremos
na questão do feedback. No entanto, na escolha
de software categorizado como fechado e con­
dutivista, que no geral proporcionam apenas
SELECIONANDO TDVS PARA APLICAÇÃO
NO CONTEXTO PSICOPEDAGÓGICO
A seleção e o processo de escolha das tecno­
logias a serem utilizadas no contexto psicope­
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
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Mantovani AM & Santos BS
interação reativa, é importante que o software
ofereça um feedback construtivo, ou seja, ofereça
uma resposta apropriada que mostre ou distinga
o certo do errado e que leve o sujeito à reflexão,
auxiliando-o em possíveis soluções às questões
apresentadas.
E, em relação aos requisitos técnicos, os re­
cursos computacionais devem:
• Apresentar facilidades de uso, possibili­
tando acesso intuitivo por parte de pro­
fessores e/ou psicopedagogos e alunos
e/ou pacientes não familiarizados com o
manuseio do computador;
• Dispor de interface e navegação adequa­
das para compreensão do conteúdo ou
con­­­ceitos apresentados e à faixa etária a
que se destina;
• Apresentar design agradável, claro, bem
elaborado, com fácil funcionamento e
exe­­­cução na web.
Consideramos importante destacar que esses
recursos computacionais também devem apre­
sentar facilidades que proporcionem acessibilida­
de para as Pessoas com Necessidades Educativas
Especiais (PNEEs), a fim de garantir a inclusão
social e digital dessas pessoas.
Constatamos que a maioria dos softwares dis­­
poníveis no mercado e na web, sejam proprie­tários
ou gratuitos, apresenta inúmeras deficiências nos
requisitos aqui destacados, principalmente em
relação à interação (geralmente mais reativa do
que mútua), feedback, interface e acessibili­dade.
Desse modo, apresentamos, a seguir, ambientes
computacionais categorizados como abertos, di­­­
nâ­­­micos e interativos, cujo enfoque é a aprendi­
zagem, a construção do conhecimento por meio
da participação ativa do sujeito em seu viver e
conviver.
senho ainda sirva com um elemento de apoio
para a leitura. Conforme as autoras, essa dife­
renciação é importante por representar um
avanço cognitivo relevante no que se refere à
produção textual.
Os estudos sobre a psicogênese da língua
escrita, desenvolvidos pelas autoras referidas,
comprovam que a criança reconstrói o código lin­­­
guístico e reflete sobre a escrita. Esses estudos
introduzem uma nova proposta, provocando um
repensar nos antigos métodos fundamentados
em concepções mecanicistas sobre o processo de
alfabetização. A preocupação deixa de ser ‘como
se deve ensinar a escrever’, passando para ‘como
alguém aprende a ler e escrever’, independente
do ensino. Em outras palavras, o processo deslo­
ca-se do ato de ensinar para o ato de aprender,
através da construção de um conhecimento que
é realizado pela própria criança que, ao invés de
ser passiva, recebendo e absorvendo o que lhe é
ensinado, participa ativamente desse processo.
Assim, a criança constrói várias hipóteses que
caracterizam os níveis de alfabetização, até cons­
truir o conhecimento da base alfabética escrita.
Então, compete ao professor ou psicopedagogo
desenvolver atividades que favoreçam a reflexão
da criança sobre a escrita, para que ela possa
desestruturar sua concepção atual e avançar
nos níveis conceituais linguísticos, porque é
pensando que ela aprende.
Nessa perspectiva, sugerimos o uso dos se­­guin­­
tes softwares para as crianças dos anos iniciais.
Histórias Fantásticas: Esse Objeto de Apren­
dizagem (OA) está disponível no website da
Proa­­­tiva (http://www.proativa.vdl.ufc.br). O ob­
jetivo desse OA é motivar a criança a escrever de
uma forma prazerosa e lúdica, autônoma e cria­
tiva, facilitando essa escrita por meio da relação
e da coerência entre a escrita e a imagem-texto.
Por isso, disponibiliza duas formas de produzir
histórias: produções textuais apoiadas a priori
por imagens e produções textuais sem o apoio de
ilustrações, que deverão ser realizadas somente
após a elaboração da história.
Na Atividade 1, primeiro escolhe-se um ce­­
nário para ilustrar (fazenda, praia, circo, floresta,
Software para produção gráfica, textual e
multimídia
Ferreiro e Teberosky17 apontam que, na fase
inicial das representações gráficas infantis, o
desenho e a escrita se confundem, mas a partir
dos seis anos de idade, as crianças já conseguem
diferenciar as letras das imagens, embora o de­­
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
298
Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
sertão, escola) e após pode-se escolher persona­
gens, objetos e animais para compor o cenário e
produzir a história. As histórias podem ser salvas
no formato de imagem, o que possibilita inte­­­­
grá-las a outras tecnologias. Na Atividade 2, pri­
meiro escreve-se a história em forma de um livro
e depois pode-se construir os próprios desenhos
por meio de um editor gráfico disponível no objeto
de aprendizagem. Essa ilustração é adicionada à
história, mas a criança fica livre para escolher se
deseja ilustrar a sua história ou não.
Esse OA pode ser utilizado na clínica psico­
pedagógica para realização de atividades, tais
como composição de cenários, ilustrações e
produções de histórias de acordo com a proble­
mática apresentada pela criança, observando
questões pertinentes aos laços simbólicos, fa­­­mi­
liares, afetivos, escolares, etc., além das questões
pedagógicas relacionadas à leitura e escrita, or­­­
ganização espacial, coordenação motora, dentre
outras. Por isso. sugerimos utilizá-lo para aplica­
ção das técnicas psicopedagógicas do desenho
livre, da família e da figura humana e/ou das
técnicas projetivas psicopedagógicas, família
cinética/educativa, desenho história/episódio e
par/pareja educativa, dentre outras.
Kid Pix: O Kid Pix é um editor gráfico, soft­ware
proprietário da conceituada empresa ame­­­ricana
Broderbund, traduzido no Brasil pela Positivo
Informática. Esse software foi lançado em 1991 e
já passou por várias versões, tais como Kid Pix Deluxe 3, Kid Pix 4. Pode ser utilizado na Educação
Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental.
Esse software permite a criação de atividades
multimídias, explorando recursos de carimbos
se­­­­parados em diversas categorias, imagens, sons,
vídeos (que podem ser gravados em formatos
AVI e EXE) e fundos/backgrounds que podem
ser combinados com textos e composição de
ce­­­nários. Também permite criação à mão livre.
Na versão Kid Pix 4, o software permite a in­
clusão de vídeos e fotos na tela de pintura. Em
relação aos vídeos, as crianças podem escolher
gravações no arquivo do computador, inseri-las
e pintar o quadro ao redor da tela de exibição
das imagens. Tanto os vídeos quanto as apre­
sentações podem ser importados para outros
programas. Outro recurso multimídia importante
é a exploração dos sons, pois apresenta a possibi­
lidade de gravar a própria voz, permitindo assim
personificar os trabalhos ou utilizar o recurso
“leitura” do próprio texto escrito, escolhendo o
tipo de voz. Em relação às fotos, é possível editar
imagens da própria criança, da família, amigos,
etc., e utilizar todas as ferramentas disponíveis
para aplicar efeitos variados. Também é possí­
vel fazer apresentações de slides com todas as
criações feitas com o uso do software na opção
“Slide Show”.
O Kid Pix, por ser um software educativo de
ambiente pedagógico aberto, pode ser consi­
derado um software de autoria, pois permite a
construção de simples garatujas e desenhos até
projetos mais elaborados, envolvendo apresen­
tações, vídeos e animações, com a participação
ativa do usuário, sendo este o autor da sua pró­
pria criação. Por isso mesmo, pode ser utilizado
em diferentes áreas do conhecimento para ex­
ploração gráfica, da leitura e escrita, alfabetiza­
ção, conceitos matemáticos, ciências, educação
ambiental, enfim, depende da criatividade do
usuário, seja aluno, professor ou psicopedagogo.
Por apresentar a possibilidade de salvar e im­
portar arquivos e/ou projetos, o professor ou psi­
copedagogo pode desenvolver previamente as
atividades, conforme o interesse ou necessidades
do aluno e/ou paciente, podendo trabalhar com
associação de letras e carimbos, bingo das letras,
correspondência entre quantidade de letras e
carimbos, relações de quantidade (numerais),
provas operatórias piagetianas como seriação
e classificação, formas geométricas, construção
de cenários, vídeos, animações e apresentações,
poesias ilustradas, paródias, etc.
Na clínica psicopedagógica, sugerimos uti­
lizar esse software para aplicação das técnicas
psicopedagógicas (desenho livre, família e da
figura humana, situação agradável e desagra­
dável) e/ou das técnicas projetivas psicopeda­
gógicas como: família cinética/educativa, “eu e
meus companheiros”, desenho história/episódio
e par/pareja educativa, dentre outras.
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Mantovani AM & Santos BS
Fine Artist e Creative Writter: Ainda na linha
de software educativo aberto, para a produção de
histórias e construção de cenários, podemos citar
o Fine Artist e o Creative Writter, ambos da empre­
sa Microsoft. Assim como o Kid Pix, possuem
uma interface amigável e intuitiva e podem ser
utilizados a partir da Educação Infantil até apro­
ximadamente o 6º ano do Ensino Fundamental,
dependendo do nível de maturidade das crianças.
O Fine Artist é um editor gráfico que possibilita
construir, além de desenhos e cenários, histórias
em quadrinhos, cartazes e apresentações multi­
mídia. Também possibilita editar figuras e adição
de animações, com tutores (personagens Maggie,
McZee) que auxiliam no uso do software.
O Creative Writter é um editor de textos para
crianças, dispõe de diversas ferramentas e ideias
que instigam o usuário a criar seus próprios
pro­­­­­jetos, envolvendo textos, desenhos, sons e
animações. São várias fontes personalizadas,
tamanhos de letras, efeitos especiais, bordas e
fundos, que tornam a criação dos projetos uma
atividade criativa e divertida. Além disso, forne­
ce sugestões, como frases e ilustrações engra­
çadas ou interessantes (Fábrica de Ideias) que
podem servir como fonte de inspiração para ini­
ciar a produção de um texto ou história. Também
possibilita a criação de jornais, cartões e faixas,
levando o usuário à construção de conceitos nas
diversas áreas do conhecimento. Permite impor­
tar imagens, sons e textos de outros aplicativos,
ampliando assim as possibilidades de uso.
Pelas inúmeras possibilidades de criação
apresentadas por ambos os software, podem e
devem ser utilizados na prática psicopedagógica,
através de atividades diversificadas e criativas,
sempre de acordo com as necessidades, interes­
ses e a problemática apresentada pelo sujeito.
virtuais. Podemos citar como exemplos de Mun­
dos Virtuais: Club Penguin, o jogo The Sims e o
metaverso Second Life (SL).
ClubPenguin: Disponível em <http://www.
clubpenguin.com>: É um jogo eletrônico do tipo
MMOSG (Massively Multiplayer On-line Social
Game - Jogo Multijogador Social em Massa), cujo
ambiente é baseado na ideia de co­­­­munidades
on-line e mundos virtuais. Foi desenvolvido pela
Club Penguin™ Entertainment e lançado para o
público geral em 2005 e, devido ao seu sucesso,
foi comprado pela Walt Disney Company, em 2007.
Esse Mundo Virtual apresenta um cenário
co­­­berto por neve, com pistas de esqui, restauran­­
tes, danceterias, lojas, bibliotecas e uma praia.
Usando avatares em forma de pinguins, as crian­­­
ças e adolescentes podem: conversar e jogar
(jogos de esqui, pescaria, hóquei, caça ao tesouro,
con­­­­curso de dança, etc.); fazer novos amigos,
agregando outros pinguins à sua lista; avisar se
alguém não está se comportando. Também são
incentivados a dar bons exemplos, pois ajudando
aos outros podem ganhar moedas que servem
para adquirir alguns objetos no ambiente. Alguns
jogos são gratuitos, mas para participar das ati­
vidades mais interessantes que permitem aos
jogadores comprar roupas, móveis e animais de
estimação virtuais, conhecidos como “puffles”,
usando moe­das virtuais que ganham no próprio
jogo, além de participar de festas e eventos, é
necessário pagar uma assinatura. O site oferece
segurança para os pais, pois as crianças só podem
começar a brincar depois de ter o cadastro auto­
rizado por um adulto.
O ClubPenguin apresenta várias possibili­
dades didático-pedagógicas através das ativi­
dades (tais como escrita, leitura, etc.) e jogos
propostos. Na clínica pscicopedagógica podem
ser observados os vínculos relacionados à apren­
dizagem e aos ensinantes: como a criança e o
pré-adolescente se relacionam com os seus pin­­
guins avatares (consigo mesmo) e com os outros
(pares e pais), se participam da comunidade
vir­­­tual, se gostam de jogar sozinhas ou com ou­
tros jogadores, tipos de jogos preferidos, como
encaram as derrotas nos jogos, como se relacio­
Tecnologias da Web3D: Mundos Virtuais
De acordo com Schlemmer e Backes7, os
Mun­­­­­dos Virtuais podem ser entendidos como
tecnologia híbrida, uma vez que possuem carac­
terísticas típicas dos jogos computadorizados,
Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) e
funcionalidades encontradas nas comunidades
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
300
Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
nam com o dinheiro, o que gostam de comprar,
enfim, é possível observar a problemática de vida
(representações, simbolismos, subjetividades)
que emerge das interações dos sujeitos nesse
Mundo Virtual.
The Sims: É distribuído pela Maxis para di­­­
versas plataformas e é indicado para uso com os
adolescentes. É uma série de jogos eletrônicos de
simulação de vida, onde o jogador cria e controla
a vida de “pessoas” virtuais (chamadas de Sims).
Para jogar, precisa-se escolher os Sims, crianças
ou adultos, a partir de um leque de opções de
características físicas e de personalidade. Então,
a partir daí, pode-se construir uma casa, co­­lo­
cando-se os móveis e utensílios necessários. A
estrutura interna do jogo é um programa de vida
artificial baseado em agentes, ou seja, o jogo
funciona através de inteligência artificial e os
Sims responderão a condições externas por si
mesmos, mesmo que a intervenção do jogador
seja necessária para que eles mantenham-se no
caminho certo. Nessa versão, os Sims terão filhos
e morrerão, respeitando o ciclo da vida.
O The Sims 2 por ser em um ambiente em 3D
poporciona uma experiência de jogo mais “viva”
e realista que a versão anterior, sendo que os
Sims crescem desde recém-nascidos para idosos
e eventualmente morrem, ou seja, nessa versão
é possível controlar os Sims pela vida inteira. Os
Sims têm aspirações específicas, que pode ser
um romance, constituir família, riqueza, obter
conhecimento ou popularidade, o que acaba
afetando seus desejos e medos pessoais. Essas
aspirações geram algumas recompensas dadas
à família quando se alcança certos objetivos,
co­­­mo por exemplo, no caso da aspiração ser a
constituição de uma família, a recompensa será
ter um bebê. Também pode-se personalizar os
Sims e criar vídeos dentro do jogo.
No The Sims 3, as vidas dos Sims escolhidos
para o jogo não giram mais ao redor das suas
casas, sendo possível explorar livremente a vi­
zinhança. Como eles são livres, isto é, indepen­
dentes do controle do jogador, todos os Sims da
vizinhança envelhecem com o passar do tempo,
em contraponto ao que ocorria na versão do The
Sims 2. Nessa versão é introduzido o novo siste­
ma de Modificadores de Humor, onde algumas
atividades rotineiras como escovar os dentes
e fazer uma visita ao parque, geram modifica­
dores de humor positivos, que acompanham
o Sim por um determinado período de tempo.
Por outro lado, acontecimentos ruins como ter
um “acidente” ou tirar notas baixas na escola,
geram modificadores negativos que definem
diretamente como o Sim se sente no meio que o
cerca, refletindo como ele interage com outros
Sims e objetos.
O The Sims não é um jogo educacional, pois
não foi desenvolvido com objetivo didático-peda­
gógico. No entanto, pode ser utilizado nos meios
educacionais e na clínica psicopedagógica, pelas
inúmeras possibilidades que o jogo oferece em
trabalhar com contexto de aprendizagem e com
as significações do ato de aprender, e as relações
com os vínculos que se formam com o conheci­
mento e as figuras “ensinantes”, que vão além da
aprendizagem escolar, uma vez que aprende-se
no viver e conviver cotidiano.
Diante das considerações já tecidas em rela­
ção às possibilidades apresentadas por esse jogo,
podemos perceber o seu potencial para tratar das
questões dos relacionamentos dos sujeitos: con­
sigo mesmo, com a família, com a escola e com
os outros; o relacionamento com o dinheiro, as
vi­­­­­tórias e os fracassos. E, ainda, a capacidade
de tomar decisões, fazer escolhas, resolver pro­
blemas, capacidade de resiliência, o desenvolvi­
mento de habilidades e competências para tal, os
valores e a ética dos sujeitos, enfim, como o sujeito
encara a vida (agir e reagir) em seu dia-a-dia.
Concordamos com Weiss5, quando afirma
que “a riqueza desse software está em poder
converter-se em uma grande tela projetiva e que
esse jogo propicia a “simulação” de várias situa­
ções dramáticas que podem estar na composição
de problemas de aprendizagem. Por isso, “a
coor­­­­­denação entre escolhas com o atendimento
de necessidades dos diferentes personagens, ou
ainda com a adequação dos acontecimentos e das
respostas do programa, forma um mundo rico na
avaliação e intervenção do trabalho na clínica”.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
301
Mantovani AM & Santos BS
Second Life: Desenvolvido em 2003 pela
em­­­presa americana Linden Lab, é considerado o
metaverso mais popular até esse momento. Pode
ser utilizado a partir dos 18 anos e para uso com
adolescentes entre 13 a 17 anos, pode-se utilizar
o Teen Second Life.
Para interagir nos Mundos Virtuais, conforme
já referido, é necessário construir um avatar, ou
seja, a identidade digital virtual que representará
o ser humano e que possibilita a telepresença
nesse metaverso. No Second Life, pode-se repre­
sentar o avatar reproduzindo as características e
semelhanças de nossa aparência física ou fazê-lo
de acordo com nossa imaginação e desejos.
Em uma experiência pedagógica com o uso
do metaverso Second Life, realizada com uma
turma de alunos da graduação em Psicopeda­
gogia, percebemos que, em relação à aparência
do avatar, a maioria dos alunos buscou uma
identificação visual no presencial-físico. Pelos
depoimentos dos alunos em relação à própria
percepção dessa experiência, podemos inferir
que, em um primeiro momento, a busca de uma
identificação visual no presencial físico está
relacionada também com a busca de uma apro­
ximação, familiarização com uma nova tecno­
logia. No entanto, na medida em que os alunos
se apropriam dessa tecnologia e que têm mais
facilidade no manuseio das ferramentas de cus­
tomização da aparência, a tendência é sentir-se
mais livre para “ousar” e buscar até mesmo uma
diferenciação da identidade no presencial-físico.
Também podemos inferir que a representação
da identidade digital-virtual está associada com
a forma pela qual queremos ser reconhecidos no
metaverso, uma vez que carregamos a identi­
dade de ser humano para dentro desse espaço,
expressando de alguma forma nossos desejos,
interesses e necessidades.
Turkle18 estuda o comportamento dos sujeitos
nos mundos mediados pelo computador diante
da possibilidade do nosso “eu” ser “outro”.
Ao estudar as influências das tecnologias do
ciberespaço na configuração das identidades,
a autora argumenta que estamos imersos por
uma cultura da simulação na qual as pessoas se
sentem cada vez mais à vontade em substituir
o real por representações da realidade. Então,
nos Mundos Virtuais pode-se inventar, projetar
novas versões do eu “real”, tornando-o múltiplo
e fragmentado, transformando os conceitos “tra­
dicionais” referentes à identidade dos sujeitos.
Acreditamos que tais possibilidades abrem na
clínica um novo campo para o estudo do com­
portamento humano e para a busca do entendi­
mento do próprio sujeito.
Assim, com o objetivo de proporcionar expe­
riências sensoriais imersivas para uma turma
de alunos da Psicopedagogia, no contexto da
gra­­­duação, após a construção dos avatares e a
exploração do metaverso Second Life, os alunos
interagiram com diversas ilhas educacionais que
apresentam essas possibilidades. Dentre essas
ilhas, destacamos a interação com a Ilha Educa­
ção através do Objeto de Aprendizagem (OA) Acessibilidade. Para interagir com esse Objeto de
Aprendizagem o avatar precisa “comprar” uma
cadeira de rodas e após anexá-la ao seu corpo
para poder se deslocar nas casas que o Objeto
de Aprendizagem apresenta, sendo que uma
casa não é adaptada para cadeirantes e a outra
casa é adaptada. Após fazerem esta simulação,
os alunos foram desafiados a descrever suas
percepções e sensações em “andar” em ambas
as casas. Apresentamos, a seguir, o relato de
um aluno postado em um Fórum de Discussão
do Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle,
utilizado como suporte para o trabalho realizado:
Ilha Educação: OA acessibilidade - casa não
adaptada: “A pessoa que é cadeirante tem muita
dificuldade para acessar alguns lugares. A sensação é de nervosismo e frustração por não poder
subir para o segundo piso, aqui tive vontade
de sair da cadeira. Também não consegui ir ao
banheiro. Realmente, tive a sensação de ser um
cadeirante com suas dificuldades de locomoção”.
Ilha Educação: OA acessibilidade - casa
adap­­­tada: “A sensação é bem melhor, a pessoa
consegue ter acesso aos lugares como subir no
segundo piso, facilidade em entrar na casa, ir
ao banheiro. Em nenhum momento tive vontade
de sair da cadeira porque consegui ir aos luga-
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
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Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico
autores da sua produção. Nessa perspectiva,
diversos estudos apontam que a triangulação
ensinante-aprendente-objeto do conhecimento
é necessária para uma aprendizagem saudável.
Assim, nesse novo contexto de aprendizagem,
permeado pelo uso de tais tecnologias, o aluno
e/ou paciente torna-se o protagonista de sua
própria aprendizagem, desenvolvendo suas po­
tencialidades, buscando soluções para seus pro­
blemas, participando de forma autônoma desse
processo, na medida em que convive e estabele­
ce novos vínculos em diferentes cotidianos, quer
sejam físicos-presenciais ou digitais-virtuais.
Acreditamos que a utilização das TDVs na
prática pscicopedagógica possibilita o trabalho
no campo das representações virtuais, pois ao
acionar os mecanismos da projeção, facilita a
in­­­vestigação das significações do ato de apren­
der e das representações que o sujeito faz dos
conhecimentos escolares, familiares e consigo
mesmo. Por isso, a importância de proporcionar
situações que instiguem o processo de simboli­
zação do sujeito, por meio de imagens, desenhos,
sons, vídeos, animações, simulações e textos,
para compreendê-lo além de suas funções obje­
tivas, pois é através do símbolo, que a realidade
é interpretada e compreendida.
Desse modo, constatamos, por meio de nossa
práxis, que a aprendizagem acontece dentro de
ambientes presenciais-físicos e digitais-virtuais,
através de atividades ricas em interação e de
abor­­­dagens multidimensionais que podem ser
potencializadas pelo uso adequado das TDVs,
motivando ensinantes e aprendentes para a
construção de processos de aprendizagem mais
significativos no contexto da diversidade.
res que queria. [...] Eu me senti imersa na casa
adaptada!”
Esses relatos mostram as sensações e percep­
ções dos alunos em “vivenciar” uma situação na
qual os avatares são cadeirantes e devem agir
como tal. Essa experiência permite se colocar no
lugar do outro e, a partir disso, fazer uma refle­
xão a respeito da inclusão das PNEEs. Então, a
possibilidade de vivenciar diversas situações e
papéis desperta todos os sentidos, envolvendo a
corporeidade, a cognição, o afeto, os sentimentos
e a emoção, tornando essa experiência muito pró­
xima da realidade física e, como consequên­cia,
possibilita uma aprendizagem imersiva, atraente
e diferenciada. Por isso, entendemos que essas
possibilidades devem ser exploradas na clínica
psicopedagógica para diagnosticar e intervir
com o objetivo de promover o desenvolvimento,
o autoconhecimento e a aprendizagem do sujeito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apresentamos uma revisão teórica a respeito
das possibilidades psicopedagógicas apre­
sentadas pelo uso das TDVs, tanto no contexto
edu­­­cativo quanto psicopedagógico, seja insti­
tucional ou clínico, destacando contribuições
advindas dos estudos e da experiência docente
e psicopedagógica das autoras com a utilização
dessas tecnologias.
Consideramos importante destacar que, para
utilizar tais tecnologias, devemos ter claro quais
são nossos objetivos didáticos-pedagógicos e
clínicos, tendo como enfoque a expressão do
pen­­­samento do sujeito em situações de apren­
dizagem diversificadas, uma vez que muitos
apresentam dificuldades para reconhecerem-se
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SUMMARY
The application of virtual digital technologies in the
psychopedagogical context
Virtual Digital Technologies (VDTs) bring new possibilities of inte­­­rac­­­
tion, communication and representation, enabling a wider range of ap­­pli­­­
cations in the psychopedagogical field, as they can become instruments
for the investigation of the inadequate connections that occur in the
lear­­­­­­­ning process. However, for psychopedagogists to be protagonists in
this process and attend to the demand of the digital generation, it is ne­­­­­
cessary to have experience with such technologies, in order to develop
didactic-pedagogical competences, allied with technological-digital
competences, which enable the interaction and use of these technologies
in their psychopedagogical practice, institutional as well as clinical. In
this context, we present a theoretical review on the psychopedagogical
possibilities for using VDTs, highlighting contributions from the studies and
teaching and psychopedagogical experiences of the authors in using these
technologies. Based on these reflections, we believe that the use of VDTs in
the psychopedagogical practice, due to their working in the field of virtual
representations, activate the projection mechanisms, thus facilitating the
investigation of meanings in the act of learning and the social representation
that the subject makes of academic and informal knowledge and of himself,
opening new paths for new meanings of learning.
KEY WORDS: Learning. Computing methodologies. Software.
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Trabalho realizado no Centro Universitário La Salle/
UNILASALLE, Canoas, RS, Brasil.
Artigo recebido: 8/6/2011
Aprovado: 21/8/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305
305
Sebra AGde
& revisão
Dias NM
ARTIGO
Métodos de alfabetização: delimitação
de procedimentos e considerações
para uma prática eficaz
Alessandra Gotuzo Sebra; Natália Martins Dias
RESUMO – O artigo apresenta os métodos de alfabetização mais difundidos
no país, delimitando-os em função de seus três aspectos fundamentais, a saber:
a) ponto de partida e encaminhamento da alfabetização, delimitando os métodos
analíticos e sintéticos; b) unidade mínima de análise na relação entre fala e
escrita, delimitando os métodos global, silábico e fônico; e c) tipo de estimulação
envolvida, distinguindo os métodos multissensorial e tradicional. É apresentado
breve histórico sobre os métodos de alfabetização e, em maiores detalhes, são
descritos os métodos fônico e global. O método fônico tem como objetivo prin­­­
cipal ensinar as correspondências grafofonêmicas e desenvolver habilidades
metafonológicas, fomentado as habilidades de decodificação e codificação. Já
o método global pressupõe que a aprendizagem da linguagem escrita ocorra
pela identificação visual da palavra, focando diretamente as associações entre
as palavras e seus significados. No Brasil, o método global é o mais enfatizado
nas universidades e o mais utilizado nas salas de aula. Além disso, no país, a
concepção construtivista tem exercido grande influência sobre as práticas em
alfabetização. No entanto, pesquisas nacionais e internacionais têm questionado
a efetividade do método global e das concepções construtivistas e revelado o
método fônico como o mais eficaz na alfabetização regular e, ao lado do método
multissensorial, na intervenção com crianças com dificuldades em leitura e
escrita. Recentemente, algumas iniciativas acadêmicas e de setores do governo
têm revelado uma possível aproximação entre as práticas educacionais e tais
evidências científicas. Essa confluência ‘educação-ciência’ poderá beneficiar
grandemente as práticas na educação fundamental do país.
UNITERMOS: Alfabetização. Aprendizagem. Linguagem. Leitura.
Alessandra Gotuzo Sebra – Psicóloga, Doutora e PósDoutorada em Psicologia pela Universidade de São Pau­­­
lo, Professora, pesquisadora e orientadora do Programa
de Pós-graduação em Distúrbios do De­­­­­­­­­senvolvimento
da Universidade Presbiteriana Ma­­­­ckenzie, Bolsista
de Produtividade CNPq - Uni­­­versidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Natália Martins Dias – Psicóloga, Mestre e Doutoranda
do Programa de Pós-graduação em Distúrbios do De­­­­­sen­­­
volvimento da Universidade Presbiteriana Ma­­­cken­­­zie,
Bolsista FAPESP. Professora convidada do curso de
Psi­­­copedagogia da UPM. Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Correspondência
Alessandra Gotuzo Sebra
Av. Higienópolis, 846, apto 22 – São Paulo, SP, Brasil –
CEP 01238-000
E-mail: [email protected]
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306
Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
ser apresentadas inicialmente as letras, os sons
das letras ou as sílabas. Tal apresentação pode
ocorrer conforme uma ordem específica ou sem
uma sequência previamente determinada. Após
a introdução das unidades mínimas, ensina-se
a sua síntese em unidades maiores, formando
sílabas, palavras, frases e, finalmente, textos.
Nos métodos analíticos, ao contrário, as unidades apresentadas inicialmente são unidades de
significado, sejam elas palavras, frases ou textos.
Assim, os métodos analíticos partem de unidades
maiores, sem um foco primário sobre as unidades
menores (do todo para a parte).
A unidade mínima de análise na relação entre fala e escrita refere-se à menor unidade cuja
relação com a fala é explicitamente apresentada.
Ou seja, refere-se a qual segmento da fala é
“oralizado” ou “verbalizado” pelo professor. Por
exemplo, pode-se apresentar uma palavra escrita
e dizer o correspondente falado daquela palavra
(ou seja, ler a palavra). Em um nível mais segmentado, podem-se apresentar sílabas escritas e
dizer o correspondente falado daquelas sílabas
(ou seja, ler a sílaba). Finalmente, podem-se
apresentar as letras e dizer o seu correspondente
falado (ou seja, ler os fonemas correspondentes
às letras). Dessa forma, em relação à unidade
mínima de análise na relação entre fala e escrita, há os métodos global (unidade mínima é a
palavra), silábico (unidade mínima é a sílaba) e
fônico ou fonético (unidade mínima é o fonema).
Em relação ao terceiro critério, o tipo de es­­­
timulação envolvida, distinguem-se o método
multissensorial e o método tradicional. Tais métodos diferenciam-se em relação às modalidades
sensoriais engajadas, ativa e intencionalmente,
no processo de alfabetização. No método tradicional, a linguagem escrita é ensinada principalmente usando a visão (o aluno vê o item escrito)
e a audição (o aluno ouve seu correspondente
oral). No método multissensorial, há um engajamento muito maior e mais explícito de outras
modalidades sensoriais, como a tátil (o aluno
sente uma letra desenhada com um material de
textura específica, por exemplo), a cinestésica (o
aluno movimenta-se sobre uma letra desenhada
INTRODUÇÃO
Esse artigo tem como objetivo apresentar
alguns conceitos sobre os diferentes métodos
de alfabetização. Não caracteriza uma revisão
sistemática e não pretende aprofundar historicamente o tema, mas é uma reflexão motivada
pela observação de desconhecimento, por parte
de profissionais da área, com relação aos distintos métodos de alfabetização, seus princípios e
procedimentos de aplicação, o que tem limitado
a possibilidade de aplicação de diferentes métodos para alunos com diferentes características,
prejudicando, dessa forma, a otimização do po­­­
tencial de cada indivíduo.
MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: DEFININDO CONCEITOS
Atualmente, há uma confusão bastante gran­­de
em relação às diferentes características dos mé­­­
todos de alfabetização. Nesse sentido, devem-se
distinguir três aspectos fundamentais de tais
métodos:
1) Qual é o ponto de partida e o encaminhamento da alfabetização? Aqui se faz a distinção entre métodos analíticos e sintéticos;
2) Qual é a unidade mínima de análise na
relação entre fala e escrita? Aqui se distingue entre método global, método silábico
e método fônico;
3) Qual é o tipo de estimulação envolvida?
Aqui se distinguem o método multissensorial e o tradicional.
Essas três distinções encontram-se representadas na Figura 1 e são descritas mais detalhadamente a seguir.
O ponto de partida e o encaminhamento da
alfabetização referem-se a qual é a unidade inicialmente apresentada durante a alfabetização,
dentre a parte ou o todo (unidade de significado). Há duas possibilidades: método analítico
e método sintético. Nos métodos sintéticos, são
usados procedimentos que partem de unidades menores para chegar a unidades maiores
(da parte para o todo). Ou seja, as unidades
ensinadas são menores que as unidades de
significado da língua em questão. Logo, podem
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Sebra AG & Dias NM
Ponto de
partida
Unidade de
análise
(escrita-fala)
analítico
(todo – parte)
palavra
sintético
(parte – todo)
Modalidades
sensoriais
envolvidas
multissensorial
sílaba
fonema
tradicional
Figura 1 – Três aspectos fundamentais dos métodos de alfabetização: ponto de partida, unidade de análise na relação entre
escrita e fala e modalidades sensoriais envolvidas.
no chão, por exemplo), e a fonoarticulatória (o
aluno, de forma intencional, atenta aos movimentos e posições de lábios e língua necessários
para pronunciar determinado som). Assim, o
mé­­­­todo multissensorial tenta, intencionalmente, apresentar a linguagem escrita, tendo como
input outras modalidades não usadas no método
tradicional, como o tato e a cinestesia.
Tendo sido apresentados esses três critérios
possíveis para classificação dos métodos de
alfabetização, pode-se prever que há diferentes
combinações possíveis dos critérios. Pode haver,
por exemplo, um método analítico que tenha
co­­­mo unidade mínima o fonema e que seja mul­­
tissensorial. Nesse caso, o ensino parte do texto
como unidade inicial de apresentação ao aluno,
ensina explicitamente a relação entre os fonemas
da fala e as letras da escrita, e engaja ativamente
diversas modalidades sensoriais.
Dessa forma, diferentes combinações dos
critérios são possíveis. As combinações mais
comuns, usadas ao longo da história da educação
formal, são descritas a seguir.
contrário, remete a uma discussão antiga e
constitui uma das maiores disputas no campo
da pedagogia e da educação1. Historicamente,
o uso e a transição entre diferentes métodos de
alfabetização têm sido marcados por períodos de
insatisfação e resistência, delimitando conflitos e
disputas, quase sempre ideológicas, entre defensores de antigas e novas concepções2. A Figura
2 apresenta esquematicamente uma linha do
tempo sobre disputas e práticas em alfabetização
no Estado de São Paulo. O esquema foi amplamente baseado e sintetiza a revisão histórica e
teórica de Mortatti2, porém é complementado
por outras referências3-12.
Nos primeiros séculos de ensino de leitura
e escrita, havia um predomínio de instruções
denominadas sintéticas, conforme descrição
anterior. O método mais usado era o método
alfabético, iniciado com o ensino das letras e
seus nomes13.
O método fônico, que propõe o ensino sistemático e explícito das correspondências entre
letras e sons, nasceu provavelmente no século
XVI, com educadores alemães. Esta proposta à
alfabetização ensina, como parte fundamental
da sua prática, as correspondências grafofonêmicas, ou seja, entre as letras e seus sons. Por
sua vez, o método global nasceu provavelmente
MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: BREVE
HISTÓRICO
Identificar qual das várias formas de alfabe­
tização é a mais eficaz não é algo recente; ao
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308
Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
Alfabetização ganha destaque
• Antes de 1889: ensino leitura/escrita – transmissão assistemática em casa ou ‘aulas régias’;
• 1889: Proclamação da República. Inicia-se a universalização da escola.
• A partir de 1889: prática organizada nas escolas.
Até final do império – métodos sintáticos (alfabético e silábico);
1880 – Método João de Deus – ‘Palavração’.
Funda-se nova tradição: ensino da leitura envolve questão do método.
Disputa entre defensores de novos (Método João de Deus) e antigos métodos (sintéticos)
Reforma da instrução pública (base da reforma eram os métodos de ensino).
• Entra em uso o Método Analítico.
• Disseminação para outros estados e utilização obrigatória nas escolas paulistas (reclamações
devido à lentidão de resultados).
Método Analítico – influência da pedagogia norte-americana – “criança apreende o mundo
de forma sincrética”.
• Adaptação do ensino à nova concepção de criança.
• Ensino começa do TODO para as partes constituintes (TODO = palavra/sentença/história)
• Cartilhas – ‘palavração’ e ‘sentenciação’.
• 1910 – termo ‘alfabetização’ começa a ser utilizado.
• Disputa: entre analítico x sintético (silabação) e entre diferentes modos de processuação do
analítico.
• Nova tradição: como ensinar a partir da definição das habilidades visuais, auditivas e motoras
da criança a quem se ensina.
Autonomia didática (Reforma Sampaio Dória).
• Novas urgências políticas e sociais aumentam a resistência dos professores ao uso do Método
Analítico. Há maior busca por novas soluções para os problemas de ensino.
• Começam a ser utilizados os Métodos mistos.
• Disputas entre defensores dos métodos analítico e sintético diminuem; há, porém, relativização sobre importância do método influenciada pela publicação do livro ‘Testes ABC para
verificação da maturidade necessária ao aprendizado da leitura e escrita’, em 1934.
• Cartilhas métodos mistos (Caminho Suave em 1948-1990)
• ‘Período preparatório’ (exercícios de discriminação visomotora, auditivomotora, posição
corpo e membros, coordenação motora grossa e fina, etc).
• Método se subordina ao nível de maturidade da criança.
• Nova tradição: foco sobre maturidade da criança.
Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões atuais em nível
nacional.
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309
Sebra AG & Dias NM
• Prática e tradição anterior é questionada.
• Introduz-se no Brasil a concepção construtivista (1986).
• Nova teoria se apresenta como ‘revolução conceitual’ (não como método!), há abandono
das práticas tradicionais e questiona-se a utilidade das cartilhas.
• Esforços de “convencimento” dos alfabetizadores pelas autoridades educacionais e imposição
do construtivismo.
• Disputas entre defensores métodos tradicionais (mistos), defensores das cartilhas e do nível
de maturidade versus construtivistas.
• Problema do fracasso escolar passa a ser pensado em termos de políticas públicas (não se
pode mais discutir método?)
• Processo de aprendizagem é compreendido de acordo com a psicogênese da língua escrita36.
• Institucionalização em nível nacional do construtivismo - PCN’s publicados pelo MEC em
1997.
• Tradição: desmetodização e ênfase no aprendiz, a criança elabora hipóteses e constrói seu
conhecimento.
• Porém, não há total desmetodização. Os PCN’s brasileiros apresentam o método Global ou
Ideovisual (que se caracteriza como um método analítico).
• “... Ilusório consenso de que a aprendizagem independe do ensino”2 (pág.11).
• Questionamentos e dúvidas decorrentes da ausência de uma “didática construtivista”.
• Dados PISA 2000; 2003, 2006, 20098-11 - Estudantes brasileiros desempenham-se abaixo da
média internacional. Resultados da avaliação de Leitura:
• 2000 – último lugar! 32ª posição de 32 países;
• 2003 – 38ª posição dentre 41 países;
• 2006 – 49ª posição dentre 56 países;
• 2009 – 53ª posição dentre 65 países;
• Reportagem publicada na Folha de São Paulo em 2003 – Fernando Capovilla: “O Brasil é
recordista mundial de incompetência de leitura”.
• Avaliações nacionais - SAEB - declínio de desempenho nas avaliações sucessivas de 1995 a
2005.
Uma luz no fim do Túnel?
Pesquisas na área da Psicologia Cognitiva apontam superioridade do método fônico sobre o
método global.
• As evidências científicas acerca dos métodos de alfabetização começam a ser consideradas
na Pedagogia: Convergência Ciência-Educação?
• Relatório Novos Caminhos da Alfabetização5,7;
• Relatório do MEC6 – A Criança de 6 anos na Educação de 9 anos – traz referência ao treino da
consciência fonológica.
• Em 2011 ocorre em São Paulo o Seminário Internacional de Alfabetização na Perspectiva da
Psicologia Cognitiva.
Continuação da Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões
atuais em nível nacional.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20
310
Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
Estudos têm evidenciado resultados bastante
animadores com o uso do método fônico. Por
exemplo, Gersten et al.14 relataram benefícios de
longo prazo de um programa baseado em instruções fônicas, o modelo de Instrução Direta. Tais
benefícios foram evidentes em termos de menor
repetência ao longo das séries escolares e, até
mesmo, de maior aceitação em faculdades. Estes
resultados de longo prazo são explicados pelo
fato de que o método fônico fornece às crianças
habilidades e conhecimentos autogerativos de
decodificação fonológica, o que é concebido por
Share15 como um mecanismo que possibilita o
autoensino. Assim, após dominar essa habilidade básica de decodificação, o leitor possui
os pré-requisitos necessários para desenvolver
suas habilidades de leitura, necessitando basi­
camente da prática para alcançar fluência e
automatismo.
Alguns princípios derivados da abordagem
de processamento de informação da Psicologia
Cognitiva dão sustentação ao método fônico, e
são descritos a seguir:
• Não se sustenta a noção de que a linguagem escrita apresenta uma continuidade
em relação a outras formas de representação, como o jogo simbólico e as imagens
mentais, conforme proposto por outras
abor­­dagens, como a epistemologia genética de Piaget16;
• Logo, um ensino específico deve ocorrer
para que a criança desenvolva as habilidades necessárias para dominar a leitura e a escrita, incluindo atividades de
consciência fonológica, como síntese e
segmentação de fonemas, e o ensino dos
sons das letras;
• Para o ensino dos sons das letras, pode-se
começar pelas vogais e pelas consoantes
cujos sons podem ser pronunciados isoladamente, como /f/, /j/, /l/, /m/, /n/, /s/, /v/,
/x/, /z/17;
• Deve haver um ensino dirigido das palavras: inicialmente devem ser ensinadas as
palavras com ortografias regulares, posteriormente com ortografias reguladas pela
no século XVII13. Segundo esse método, seria
mais econômico ensinar a palavra como um todo
às crianças, sem focalizar unidades menores.
Assim, era preconizado o ensino direto das asso­
ciações entre as palavras e seus significados12.
Apesar de diversos outros métodos de alfabe­
tização terem surgido, um grande debate tem
ocorrido entre o método fônico, de um lado, e
o método global, de outro lado. Tal debate tem
ocorrido já há algumas décadas internacionalmente1 e, no Brasil, tem se intensificado nos
últimos anos. Esses dois métodos, portanto, serão
descritos mais detalhadamente a seguir.
Método fônico
Esta proposta à alfabetização tem dois obje­
tivos principais: ensinar as correspondências
grafofonêmicas e desenvolver as habilidades
metafonológicas, ou seja, ensinar as correspondências entre as letras e seus sons, e estimular
o desenvolvimento da consciência fonológica,
que se refere à habilidade de manipular e refletir sobre os sons da fala. Enquanto o ensino das
correspondências grafofonêmicas é considerado
fundamental desde o início do método fônico,
que provavelmente data do século XVI, como
anteriormente descrito, o desenvolvimento da
consciência fonológica é mais recente, tem sido
incentivado principalmente a partir do século XX.
Este método baseia-se na constatação experimental de que as crianças com dificuldades na
alfabetização têm dificuldade em discriminar,
segmentar e manipular, de forma consciente, os
sons da fala. Esta dificuldade, porém, pode ser
diminuída significativamente com a introdução
de atividades explícitas e sistemáticas de consciência fonológica, durante ou mesmo antes da
alfabetização. Quando associadas ao ensino das
correspondências entre letras e sons, as instruções de consciência fonológica têm efeito ainda
maior sobre a aquisição de leitura e escrita. Além
de ser um procedimento bastante eficaz para a
alfabetização de crianças disléxicas, o método
fô­­­nico também tem se mostrado o mais adequado
ao ensino regular de crianças sem distúrbios de
leitura e escrita12.
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Sebra AG & Dias NM
soma das informações contidas separadamente
nos elementos menores. Tal pressuposto, proveniente de estudos basicamente de percepção, foi
aplicado à alfabetização, supondo que a forma
global das palavras forneceria dicas importantes
aos leitores iniciantes12. Para os defensores do
método global, o conhecimento das correspondências letra-som seria adquirido naturalmente
pelas crianças, após o reconhecimento total da
palavra estar bem estabelecido.
Para além do nível da palavra, a maioria
dos métodos analíticos toma o contexto como
absolutamente relevante para a leitura de uma
palavra. Assim, angariado nas concepções de
Ben Goodman e Frank Smith, em tais métodos
considera-se que a aprendizagem de leitura e
escrita só pode ocorrer a partir de unidades que
sejam significativas à criança. Em geral, métodos
globais ou ideovisuais partem de unidades como
palavras, textos, parágrafos, sentenças ou palavras-chave (como no método de Paulo Freire).
É a partir destas unidades maiores e, portanto,
significativas que, em um segundo momento,
o aprendiz chegaria a uma com­preensão das
unidades menores que compõem as palavras,
porém sem necessidade de instrução sistemática
e explícita para isso.
Em meados do século XX, em todo o mundo,
o método global difundiu-se amplamente nas
escolas. Desde então, um dos maiores pesquisadores sobre o método tem sido Goodman19,20.
O autor sustenta a visão de que as ideias do
método global são progressistas e sensíveis às
necessidades das crianças e buscam desenvolver
a criatividade destas, permitindo a elas próprias
“descobrirem” os princípios subjacentes à leitura
e à escrita. Além disso, as práticas do método global evitam a submissão das crianças a programas
estruturados e sistemáticos, como os programas
fônicos e seu ensino sistemático e explícito de
correspondências grafema-fonema.
Assim, o método global propõe o ensino das
associações entre palavras inteiras e seus significados (abordagem ideovisual), individualmente
ou em textos introduzidos desde o início12. Dentre
os princípios de sua prática, podem-se elencar:
posição (mesa, em que o “s” intervocálico
soa como /z/) e somente então as palavras
com ortografias irregulares (por exemplo,
flecha ou xale para irregularidade de
ch/x; jeito ou gente para irregularidade
de g/j). Isto porque o ensino de palavras
irregulares logo no início da alfabetização
pode confundir o aprendiz, impedindo-o de
desenvolver consistentemente a noção de
correspondência entre letras e sons13. Somente após essa noção estar estruturada,
as irregularidades devem ser introduzidas;
• Os exercícios de coordenação motora são
importantes. Eles auxiliam o aluno a adquirir as formas ortográficas das letras13.
Isto permitirá, posteriormente, que o alu­­­no
apresente uma caligrafia mais adequada
e, principalmente, ajudará na consolidação mental das formas das letras, o que
permitirá a escrita mais automática e a
identificação mais fácil das letras durante
a leitura.
Assim, abordagens fônicas usualmente propõem o ensino explícito e sistemático, com grau
crescente de dificuldade, das habilidades de
decodificação grafofonêmica e de codificação
fonografêmica, paralelamente ao trabalho para
desenvolvimento da consciência fonológica18.
Método global
O método global ou ideovisual pressupõe que
a aprendizagem da linguagem escrita se dê pela
identificação visual da palavra. Apesar de haver
outros métodos analíticos, como os métodos de
‘palavração’ e ‘sentenciação’, o global ou ideovisual é o mais amplamente conhecido, desenvolvido provavelmente no século XVII13. Como
anteriormente descrito, tal método pressupõe
que é mais econômico ensinar a palavra como
um todo ao aluno, sem focalizar unidades menores, sendo, portanto, ensinadas diretamente
as associações entre as palavras e seus significados. Tais ideias foram reforçadas pela Gestalt,
que pressupõe que o todo é maior que a soma
das partes, ou seja, que a informação contida na
unidade total de significado é maior do que a
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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
grandemente difundido e ele continuou sendo
utilizado por anos em escolas em todo mundo1.
Tal discrepância entre a prática educacional na
alfabetização e as evidências oriundas de estudos científicos foi apontada por diversos autores1,13,31, que destacavam, entre outros fatores, a
falta de pesquisa experimental conduzida pelos
adeptos do método global e uma postura na qual
imperava o dogmatismo, apesar do fracasso a
que eram fadados seus estudantes.
No Brasil, a história tendeu a se repetir e, nos
cursos de formação, tanto na graduação quanto na pós-graduação, o método global ainda é
enfatizado como eficaz e moderno12. Com isso,
anualmente, as escolas ganham novos educadores, pedagogos e psicopedagogos, que continuam a aplicar e difundir uma prática ineficaz,
em total contrassenso às pesquisas conduzidas
na área. E é, sobretudo, nas escolas públicas,
com seu maior contingente de crianças de nível
socioeconômico baixo, que esse fato é mais preo­
cupante, pois estas crianças, muitas vezes, não
possuem alternativas que possam suprir estas
falhas educacionais. Vale lembrar que o Censo
educacional de 2010 declarou que 87,3% dos
estudantes brasileiros no ensino fundamental
estão matriculados na rede pública de ensino32.
Ainda no âmbito nacional, na década de
1980, houve grande difusão das ideias de Emília Ferreiro que, até os dias de hoje, permeiam
e influenciam as práticas de alfabetização em
todo território brasileiro. Ferreiro baseou seus
trabalhos na teoria piagetiana, investigando,
sobre esta perspectiva, o processo de aquisição
da leitura pela criança33-36. De acordo com suas
pesquisas e de modo conciso, a autora descreveu
três períodos evolutivos ou de conceitualização
do escrito pela criança16,34. No primeiro nível
conceitual, começa a haver uma distinção entre
o material gráfico icônico e o não-icônico. No
se­­­gundo, a hipótese central formulada pela
criança é que coisas diferentes devem ser lidas/
escritas de formas diferentes; também surgem
as noções de quantidade e diversidade de letras
por palavra. E, no terceiro nível conceitual, surge a tentativa de dar valor sonoro às letras que
• A leitura é compreendida como atribuição de sentido e interação entre o leitor
e texto; a leitura não deve ser focada na
decifração;
• A leitura é um “jogo de adivinhação psicolinguística”21. As crianças devem ser
estimuladas a adivinhar o que está escrito
a partir de pistas contextuais;
• A aprendizagem da leitura deve ocorrer
a partir de unidades maiores que sejam
significativas para a criança (palavras,
sentenças, textos), com incentivo à associação direta entre palavras e significados.
EVIDÊNCIAS DA SUPERIORIDADE DO
MÉ­­­­TODO FÔNICO
Como anteriormente descrito, no século XX,
o método global difundiu-se entre as escolas em
diversos países. Com seu amplo uso, começaram
a ser conduzidos estudos questionando sua efi­­­
cácia. O primeiro grande ataque ao método global
surgiu com o estudo de Flesch22, intitulado Why
Johnny can’t read? (Por que Johnny não pode
ler?). Segundo o autor, o método global é mais
uma forma de treinamento animal do que método
de alfabetização. Seu posicionamento é corroborado por outros estudos de grande porte, como os
de Chall23 e Bond & Dykstra24, que arguiam que os
programas de alfabetização baseados em instruções fônicas eram superiores aos globais, levando
a melhores desempenhos em reconhecimento de
palavras, escrita e vocabulário12.
Conforme alguns estudos apontam25-27, o tipo
de instrução característica do método global
não enfatiza o ensino explícito e sistemático
dos princípios da língua escrita, tal como faz
o método fônico, de modo que nem todas as
crianças conseguem apreender tais princípios.
Essa dificuldade é ainda maior, fazendo ainda
mais evidente a discrepância entre os métodos,
com clara inferioridade do global, no caso de
crianças que apresentam risco de atraso de
leitura e escrita ou aquelas com desvantagens
socioculturais28-30.
Porém, apesar de evidências da inferioridade
e das desvantagens do método global, seu uso foi
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atividades do método fônico. Os professores são
incentivados a desenvolver habilidades de rima,
segmentação fonêmica e discriminação de sons
e a ensinar as relações entre as letras e os sons.
É interessante observar que tais diretrizes são
recomendadas em países de língua inglesa, cuja
ortografia tem relações grafofonêmicas bastante
irregulares, com correspondências imprevisíveis
entre letras e sons. Logo, se o método fônico é
recomendado para o inglês (que é extremamente
irregular), certamente ele é ainda muito mais
eficaz no português, cujas relações entre letras
e sons são bem mais regulares e que, portanto,
propicia maior sucesso na aplicação de regras
de conversão grafofonêmicas39.
No contexto nacional, autores têm desenvolvido e testado programas fônicos com resultados
bastante positivos. Tais procedimentos podem
ser utilizados no contexto educacional ou clínico12,40,41. Há também um programa computadorizado que permite a aprendizagem de habilidades importantes de uma forma bastante lúdica42.
Vale lembrar que estudos têm evidenciado que
as dificuldades em leitura e escrita se devem,
em grande parte, a problemas de processamento
fonológico, podendo estes ser atenuados e/ou
solucionados com a incorporação de atividades
fônicas e metafonológicas em diferentes níveis
escolares43. Isto tem sido demonstrado em diversos estudos internacionais43-51 e nacionais12,41,53-58.
Outro método também utilizado no trabalho
com crianças com dislexia ou com dificuldades
de leitura e escrita é o chamado multissensorial39.
Este procedimento busca combinar diferentes
modalidades sensoriais no ensino da linguagem
escrita às crianças. Assim, ele facilita a leitura e
a escrita ao estabelecer a conexão entre aspectos visuais (a forma ortográfica da letra ou da
pa­­­lavra), aspectos auditivos (a forma fonológica), aspectos táteis e cinestésicos da grafia (os
movimentos necessários para escrever letras e
palavras) e aspectos cinestésicos da articulação
(os movimentos e posições necessários para
pronunciar sons e palavras).
Maria Montessori foi uma das precursoras do
método multissensorial. Ela defendia a participa-
formam a palavra, ou seja, surge a noção de
fonetização da escrita. Inicialmente, a criança
elabora uma hipótese silábica, na qual a cada
letra faz equivaler uma sílaba; posteriormente,
compreende que a cada letra corresponde um
som ou fonema, pautando sua leitura e sua produção escrita em uma hipótese alfabética.
As ideias de Ferreiro originaram a concepção construtivista que se autoproclama uma
revolução conceitual e não um novo método
de alfabetização. Tal concepção defende uma
alfabetização contextualizada e, portanto, significativa que deve dar-se por meio da transposição
didática das práticas sociais de leitura e escrita
para o contexto da sala de aula. É por meio de
sua imersão às práticas sociais de leitura que a
criança começa a se organizar para apreender o
significado deste objeto. Pouco a pouco ela elabora hipóteses sobre o que a escrita representa.
Neste processo, por meio da ação reflexiva da
criança, a consciência fonológica desenvolver-se-ia naturalmente, não sendo necessárias
práticas sistemáticas para sua estimulação. Na
concepção construtivista, o aluno deve ser levado a pensar sobre a escrita e, assim, construirá e
reelaborará seu próprio conhecimento36,37.
O construtivismo de Ferreiro é uma teoria
epis­­­temológica e não um método de alfabetização. Sua transposição para a sala de aula tem
se mostrado problemática e pouco eficaz, e os
riscos que tal concepção sobre alfabetização
podem trazer podem ser verificados nos dados
das avaliações nacionais e internacionais que
constatam o fracasso do alunado brasileiro na
aprendizagem da leitura5,7-11.
ALFABETIZAÇÃO DE CRIANÇAS COM
DISLEXIA E PROBLEMAS DE LEITURA
E ESCRITA
Além da superioridade do método fônico
na alfabetização em contexto regular, diversas
associações de dislexia em todo o mundo recomendam instruções fônicas para o ensino de
indivíduos com dislexia. De fato, nas diretrizes
da British Dyslexia Association38 para o ensino de
crianças disléxicas, é recomendada a inclusão de
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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
• Visão: ênfase na forma visual de letras e
palavras, podendo usar cores e tamanhos
diferentes;
• Cinestesia – traçado: ênfase no traçado da
letra/palavra, por exemplo usando letras
com setas desenhadas que indicam a direção do movimento correto para a grafia;
• Tátil: ênfase na memória tátil da forma
das letras/palavras, por exemplo usando
texturas diferentes;
• Articulação: ênfase na memória articu­
latória das letras/palavras, de forma cons­­
ciente e intencional.
No Brasil, um procedimento multissensorial
bastante difundido e adotado é o Fonovisuoarticulatório, conhecido mais informalmente como
‘Método das boquinhas’. Utiliza-se das estraté­
gias fônica (fonema/som), visual (grafema/
letra) e articulatória (articulema/Boquinhas) e é
indicado tanto para a alfabetização de crianças
quanto na reabilitação dos distúrbios da leitura
e escrita62-64.
ção ativa da criança durante a aprendizagem e o
movimento era visto como um dos aspectos mais
importantes da alfabetização. A criança devia,
por exemplo, traçar a letra enquanto o professor
dizia o som correspondente59.
Fernald e Keller60, outros proponentes do
mé­­­todo multissensorial, também incentivavam
as crianças a pronunciar em voz alta os nomes
das letras enquanto as escrevessem. Orton61 deu
continuidade ao desenvolvimento de técnicas do
método multissensorial, mantendo a associação
tríplice visual, auditiva e cinestésica e, em 1925,
Orton e Gillingham propuseram uma variação do
método multissensorial, em que inicialmente devem ser ensinadas as correspondências entre as
letras e seus sons, aumentando as unidades progressivamente para palavras e, somente depois,
para frases39. Esse procedimento delimitava:
• Apresentação de cada letra separadamente, com seu nome e seu som;
• Criança traça a letra enquanto diz seu
no­­­me, inicialmente com o modelo visual
e, depois, sem ele;
• Apresentação das sílabas simples com sons
regulares;
• Combinação dessas sílabas para formar
palavras;
• Introdução de palavras com correspondên­
cias irregulares;
• Combinação de palavras em frases.
Cabe destacar que algumas variantes do método multissensorial trabalham apenas com os
sons das letras, e não com seus nomes. A maioria
delas parte das unidades mínimas (no nível da
letra) para unidades mais complexas (nível da
palavra e, depois, da frase). Apesar de requerer
muito tempo de intervenção, o método multissensorial é um dos procedimentos mais eficazes
para crianças mais velhas, que apresentam problemas de leitura e escrita há vários anos e que
possuem histórico de fracasso escolar.
Alguns princípios que orientam a prática do
método multissensorial são:
• Audição: ênfase nos sons das letras e na
forma fonológica das palavras;
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo apresentou e delimitou os métodos sintéticos e analíticos. Após, centrou-se
na discussão entre os métodos fônico e global,
apresentando, por fim, sugestões tanto para a
alfabetização quanto ao trabalho interventivo
com crianças com dislexia ou problemas de leitura e escrita. Para tal atuação, os procedimentos
fônico e multissensorial têm sido reconhecidos
como os mais eficazes.
Pesquisas comparando os métodos de alfabetização têm se concentrado principalmente nos
procedimentos fônico e global. Em geral, estas
investigações têm demonstrado a superioridade do fônico, especialmente com crianças com
desvantagem sociocultural ou cognitiva. Estudos de meta-análise comprovam que introduzir
instruções fônicas (ensinar correspondências
grafofonêmicas) e metafonológicas (desenvolver
a consciência fonológica) auxilia a aquisição
de leitura e escrita. Porém, no Brasil, até hoje
predomina o método global, tanto no contexto
clínico quanto no educacional.
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As razões para a insistência em um modelo
que tem logrado péssimos resultados nas avaliações nacionais e internacionais, tendo sido
descartado como ineficaz por outros países7,
possui uma explicação complexa, que perpassa
conjecturas políticas e ideológicas até problemas próprios da formação de professores nas
universidades do país. Não se sugere aqui uma
linha de raciocínio simplista de que o método
de alfabetização é o único responsável por todos
os problemas educacionais do país. Porém, no
que tange ao domínio específico da aquisição
da linguagem escrita, e com aporte em pes­
quisas e nas avaliações de desempenho nacionais e internacionais, é inevitável a conclusão
de que a confluência ‘Construtivismo-método
global’, endossada nos PCN’s3, apenas está
conduzindo as crianças brasileiras ao posto de
incompetentes.
Se durante a última década a educação caminhou sem a parceria do conhecimento científico,
algumas evidências mais recentes têm sugerido
a possibilidade de um encontro entre as duas
áreas. Exemplos disso são o Relatório Novos
Caminhos da Alfabetização5,7, solicitado a especialistas nacionais e internacionais pela Câmara
dos Deputados e a própria referência ao treino da
consciência fonológica no relatório publicado pelo
MEC, em 20096, intitulado “A criança de 6 anos,
a linguagem escrita e o ensino fundamental de 9
anos”. Além disso, em 2011, ocorreu na cidade de
São Paulo o “Seminário Internacional de Alfabetização na Perspectiva da Psicologia Cognitiva”,
contando com importantes e influentes pesquisadores da área e representantes das Secretarias de
Educação de alguns estados brasileiros.
A psicologia cognitiva tem muito a contribuir com a Educação e a Pedagogia. Que estas
áreas possam dialogar e que a educação possa
se beneficiar das evidências científicas estarão
subordinados os próximos anos da educação
fundamental brasileira.
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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz
SUMMARY
Literacy methods: definition of procedures and considerations
for effective practice
The article presents the most widespread literacy methods in the country,
defining them in terms of its three fundamental features, i.e., a) starting
point and course of literacy, delimiting the analytical and synthetic methods;
b) the minimum analysis unit on the relationship between speech and
writing, outlining the global, syllabic and phonic methods; and c) type of
stimulation involved, distinguishing between traditional and multisensory
methods. Brief history is presented on literacy methods, and the global and
the phonics ones are described whit more details. The phonic method’s
main objective is to teach the graphophonemic correspondences and to
develop phonological skills, fostering decoding and encoding skills. The
global method assumes that the learning of written language occurs by the
word visual identification, focusing directly the associations between words
and their meanings. In Brazil, the global method is the most broadcast in
universities and most used in classrooms. In addition, in the country, the
constructivist conception has exerted great influence on literacy practices.
However, national and international researches have questioned the effec­
tiveness of the global method and constructivist conceptions, and revealed
the phonics as the most effective in literacy and, aside multisensory method,
in the intervention with children with reading and writing problems. Re­­
cently, some academic and government initiatives has revealed a possible
oncoming between educational practices and scientific evidence produced
by cognitive psychology. This ‘education-science’ confluence could greatly
benefit the country’s practices in elementary education.
KEY WORDS: Literacy. Learning. Language. Reading.
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Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20
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Sebra AG & Dias NM
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as Boquinhas – livro do professor. São José
dos Campos:Pulso Editorial;2007.
64. Jardini RSR, Gomes PTS. Alfabetização com
as Boquinhas – caderno do aluno. São José
dos Campos:Pulso Editorial;2008.
Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação
em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 18/5/2011
Aprovado: 30/7/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20
320
Adolescência: RESENHA
as contradições da idade
Adolescência: as contradições da idade
Luiza Elena L. Ribeiro do Valle; Maria José Viana Marinho de Mattos
Resenha do livro: Valle LELR, Mattos MJVM. Adolescência: as contradições da idade.
2ª ed. Rio de Janeiro:Wak Editora;2010.
A impressão de que a nova ordem social (capitalista, democrática, liberal) e suas conquistas
tecnológicas não iriam desprezar nenhum segmento da população e que a juventude seria, naturalmente, atendida nas suas necessidades demonstrou-se equivocada. Agora, o problema em
relação aos “jovens”, tratado quase sempre como
um problema social e econômico, acrescenta-se
de uma dimensão existencial e sociocultural que
não constava dos estudos e pesquisas, das políticas do Estado e das instituições voltadas para
a educação desses jovens. Indiscutivelmente,
mais uma vez, a sociedade e o Estado estão diante
de grande dilema e novos desafios: mudanças
na estrutura familiar; crescimento da violência
urbana; do convite às drogas; dos problemas de
depressão e ansiedade; das exigências da escola,
da escolha profissional e do mercado de trabalho.
É um momento, portanto, de grandes mudanças
e incertezas em relação ao futuro.
A adolescência é uma fase complexa e dinâmica do ponto de vista físico e emocional na vida
do ser humano. É neste período em que ocorrem
várias mudanças no corpo, que repercutem di-
retamente na evolução da personalidade e na
atuação pessoal da sociedade. Há muita preocupação com essa etapa, especialmente com os
seus aspectos comportamentais e adaptativos,
alertados já em 1904, quando Stanley Hall, um
dos primeiros estudiosos sobre o tema, definiu
a adolescência como um período de tempestade
e tensão negativas.
Uma grande dificuldade surge até mesmo
quando tentamos enquadrar a adolescência cro­­­
nologicamente e, portanto, faz-se necessária
essa caracterização. A Organização Mundial
de Saúde (1975), no plano internacional, define
adolescência pelo referencial cronológico como
um período da vida que vai dos 10 a 19 anos,
envolvendo, assim, a puberdade, que é um
fenômeno universal e tem um ritmo que varia
de indivíduo para indivíduo, mas previsível de
acordo com os parâmetros próprios da espécie.
Hoje se fala em adolescência precoce, quando
está anterior ao aparecimento das características
indicadas da puberdade, e também se define
uma adolescência tardia, que se observa pela
manutenção desse período, quando, pelos cri-
Luiza Elena L. Ribeiro do Valle – Doutora em Psicologia
Social e do Trabalho pela Universidade de São Paulo;
Psicóloga; Membro da Sociedade Brasileira de Psi­­­
cologia das Organizações e do Trabalho (SBPOT).
Maria José Viana Marinho de Mattos – Doutora em
Educação na área de Políticas, Administração e
Sistemas Educacionais pela Faculdade de Educação/
Unicamp. Professora na Pontifícia Universidade Ca­­­
tólica (PUC) Minas. Cursando Pós-doutorado no De­­­
partamento de Educação: Currículo na PUC – SP.
Correspondência
Luiza Elena L. Ribeiro do Valle
Rua Goiás, 77 – Centro – Poços de Caldas, MG, Brasil –
CEP 37701-005
E-mail: [email protected]
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3
321
Valle LELR & Mattos MJVM
Assim, os autores refletem e tecem orientações para lidar com as dificuldades que a fase
da adolescência impõe e devem ser valorizadas
como prioridade. Elaboram reflexões sobre o
assunto sempre na perspectiva de que a adoles­
cência é uma fase da vida humana, que traz
dificuldades peculiares e apresenta dificuldades
de relacionamento. Por outro lado, as dificuldades são enriquecedoras e devem ser valorizadas como uma forma de manifestação em uma
sociedade jovem, promissora economicamente,
com a criação e unificação de políticas públicas
voltadas, especificamente, para os adolescentes
e a juventude.
Os transtornos, os conflitos e outras manifestações que acometem os jovens nesta fase
de transição para a vida adulta merecem ser
compreendidas como ações preventivas. A abordagem dos demais capítulos do livro considerou
estes elementos como prioridade. Essas manifestações são complexas, pois são decorrentes
de vários fatores e necessitam de intervenções,
uma vez que geram consequências nas mais
diversas áreas da vida, como no funcionamento
social, familiar, escolar e ocupacional.
Ao considerar que a adolescência é um pe­­­ríodo
da vida de mudanças peculiares nos as­­­pectos fí­
sicos e psicológicos, então, é uma fase que merece atenção especial às demandas desse processo.
É nessa direção que psicólogos, educadores
e pesquisadores, de diferentes áreas, buscam
com­­­preender o universo da adolescência e juventude sempre em uma perspectiva de melhor
atendimento, mesmo em meio às incertezas, aos
avanços científicos e tecnológicos. Esse atendimento agrega saberes referentes à prevenção e
aos riscos da saúde física, psicológica e de formação, em sua amplitude como um ser humano
em formação. O livro recupera e apresenta uma
visão do estado atual das abordagens necessárias
ao processo de atendimento, acompanhamento e
orientações necessários, a uma fase importante
da vida humana.
Houve um tempo em que cada um nascia
condenado a um destino determinado na sociedade, com base no berço, na cor da pele ou nas
térios biológicos, o indivíduo já um adulto. As
definições cronológicas esbarram na realidade
cultural e temporal.
A proposta do livro “Adolescência: as contra­
dições da idade” é tratar das dificuldades enfrentadas por educadores, pais e profissionais que
trabalham diretamente com adolescentes e jovens
em seus momentos de busca, de conflitos, em um
período com tantas indagações. Essa relação lida
com a complexidade de situações desafiadoras.
O livro foi organizado com 14 capítulos, elaborados por psicólogos, professores e pesquisadores. Estudiosos do assunto, os colaboradores
buscam articulação e aprofundamento entre os
capítulos. Os três primeiros capítulos recuperam
conceitos e princípios básicos sobre “adolescência” e “juventude”, buscando referências no
campo da Psicologia, Sociologia e Educação, sem
perder de vista a noção de cultura nas Ciências
Sociais. Essas reflexões trazem para o campo
do debate um tema importante na sociedade
contemporânea, que é a responsabilidade com
a formação e educação de jovens na atualidade.
Nesta direção, os capítulos seguintes, de qua­­
tro a oito, buscam centrar a discussão na fase da
adolescência considerada como um momento
crucial para o desenvolvimento humano, marcada pelas significativas alterações corporais,
bioquímicas, sociais e emocionais. Assim, esta
parte do livro preocupa-se com os estudos e as
reflexões sobre conflitos, embaraços e distúrbios, próprios desta fase da vida humana. No
entanto, são temas desafiadores para atuação
de instituições e profissionais que lidam, incansavelmente, com situações de atendimento e
encaminhamento desses problemas, tais como:
psicólogos, médicos e educadores. Além disso,
questões como a formação de uma nova identidade, a ansiedade, a depressão e o sentimento
de fracasso são temas tratados nesses capítulos.
Assumir novos papéis gera no adolescente uma
grande ansiedade, que configura na adolescência como um período de risco para o surgimento
de sintomas de depressão, isolamento social e
outras consequências, requerendo, assim, apoio
social e psicológico.
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3
322
Adolescência: as contradições da idade
características pessoais globais ou específicas. O
desenvolvimento social nos trouxe a possibilidade da conquista do próprio destino como direito
de todas as pessoas e é regido pela Educação,
que se volta para a Saúde, entendida como bem
estar físico e mental. O desenvolvimento científico investigou os caminhos para que esse direito
se imponha para além dos limites impostos por
dificuldades ou características pessoais, mas
a sociedade tornou-se responsável pela possibilidade de utilizar esses avanços em favor da
qualidade de vida das pessoas. Os adolescentes
constituem um grupo que dá início a uma nova
cultura, que a sociedade atual ajuda a construir,
enfrentando as contradições e planejando esse
futuro, ao lado deles. dolescência é uma idade de
contradições e este livro busca não fugir delas,
nem usar a crítica como afastamento daqueles
que são a promessa de mudanças melhores,
desde que encontrem valorização de seu potencial, direção, respeito e oportunidade na própria
sociedade.
Resenha realizada na Pontifícia Universidade Católica
(PUC) Minas, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Artigo recebido: 8/11/2011
Aprovado: 12/11/2011
Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3
323
ASSOCIADOS TITULARES PARA REVISTA 87 – 2011
ALAGOAS
Maceió
ELIANE CALHEIROS CANSANÇÃO
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(82) 3223-4258 – Farol
BAHIA
Feira de Santana
LOURDES MARIA DA SILVA TEIXEIRA
[email protected]
(75) 3221-3456 – Mangabeira
ELIANE CÁSSIA ROCHA BLANES
LUCIANA BARROS DE ALMEIDA SILVA
ELISABETE SILVEIRA CASTELO BRANCO
MARISTELA NUNES PINHEIRO
[email protected]
(85) 3244-2820 – Dionísio Torres
[email protected]
(85) 3881-1673 – Rodolfo Teófilo
[email protected]
(62) 3293-3067 – Setor Marista
[email protected]
(62) 3259-0247 – Nova Suíça
FRANCISCA FRANCINEIDE CÂNDIDO
[email protected]
(85) 3272-3966 – Fátima
MATO GROSSO
Cuiabá
GALEÁRA MATOS DE FRANÇA SILVA
ÂNGELA CRISTINA MUNHOZ MALUF
Itabuna
[email protected]
(85) 3264-0322 – Aldeota
GENIGLEIDE SANTOS DA HORA
GERALDO LEMOS DA SILVA
MARIA MASARELA MARQUES DOS PASSOS
MARIA JOSÉ WEYNE MELO DE CASTRO
[email protected]
(85) 3261-0064 – Parque Manibura
MINAS GERAIS
Campanha
MARISA PASCARELLI AGRELLO
RAMONA CARVALHO FERNANDEZ NO­­­­
GUEIRA
[email protected]
(73) 3617-0372 – São Caetano
Salvador
ARLENE NASCIMENTO PESSOA
[email protected]
(71) 9983-0470 – Caminho das Árvores
DEBORA SILVA DE CASTRO PEREIRA
[email protected]
(71) 3341-2708 – Candeal
JACY CÉLIA DA FRANCA SOARES
[email protected]
(71) 3347-8777 – Pituba
JOZELIA DE ABREU TESTAGROSSA
[email protected]
(71) 3341-2708 – Caminho das Árvores
KARENINA AZEVEDO
[email protected]
(85) 3246-7000 – Dionísio Torres
[email protected]
(85) 3267-5714 – Varjota
OTILIA DAMARIS QUEIROZ
[email protected]
(85) 3246-7000 – Dionísio Torres
Tianguá
GRAÇA MARIA DE MORAIS AGUIAR E
SILVA
[email protected]
(88) 9963-5854 – Centro
[email protected]
(71) 3345-3535 – Pituba
DISTRITO FEDERAL
Brasília
LEILA DA FRANCA SOARES
MARINA LIMA BEUST
[email protected]
(71) 3347-8777 – Pituba
[email protected]
(61) 3326-9314 – Asa Norte
MÁRCIA GONÇALVES NUNES
MARLI LOURDES DA SILVA CAMPOS
MARIA ANGELICA MOREIRA ROCHA
[email protected]
(71) 3345-1111 – Pituba
ESPÍRITO SANTO
Vitória
MARIA AUXILIADORA DE A. RABELLO
MARIA DA GRAÇA VON KRUGER PIMENTEL
SANDRA MARIA FURTADO ANDRADE
MARISTELA DO VALLE
CEARÁ
Fortaleza
GOIÁS
Goiânia
ANDRÉA AYRES COSTA DE OLIVEIRA
CARLA BARBOSA DE ANDRADE JAYME
DALMA RÉGIA MACEDO PINTO
JANAÍNA CARLA R. DOS SANTOS
[email protected]
(71) 3374-4505 – Federação
[email protected]
(71) 3353-2207 – Pituba
[email protected]
(71) 3351-9973 – Itaigara
[email protected]
(85) 3261-0064 – Aldeota
[email protected]
(85) 3491-2280 – Vila União
[email protected]
(61) 3321-3666 – Plano Piloto
[email protected]
(27) 3225-9978 – Praia do Canto
[email protected]
(27) 3215-5039 – Jardim da Penha
[email protected]
(62) 3225-9805 – Setor Oeste
[email protected]
(62) 3241-7837 – Setor Sul
[email protected]
(65) 9214-4484 – Jardim Cuiabá
[email protected]
(65) 3028-1372 – Campo Velho
[email protected]
(35) 3261-2119 – Centro
Pouso Alegre
CLAUDIA MARQUES CUNHA SILVA
[email protected]
(35) 3422-2050 – Fátima
SÔNIA REGINA BELLARDI TAVARES
[email protected]
(35) 3425-3456 – Santa Filomena
Uberlândia
SANDRA MEIRE DE OLIVEIRA R. ARANTES
[email protected]
(34) 3224-3687 – Lidice
Varginha
HELENA SCHERER GIORDANO
[email protected]
(35) 3212-7296 – Novo Horizonte
JÚLIA EUGÊNIA GONÇALVES
[email protected]
(35) 3222-1214 – Centro
MARIA CLARA R. R. FORESTI
[email protected]
(35) 3212-3496 – Centro
MARIA ISABEL SILVA PINTO REZENDE
[email protected]
(35) 3212-9120 – Jardim Andere
REGINA CLAUDIA A. S. FERRAZ
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(35) 3214-5660 – Jardim Andere
PARÁ
Belém
CARMEM CYLBELLE PEREIRA ALVES VIÉ­­­­
GAS
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(91) 3259-3531 – São Braz
ELIANE SOUZA DE DEUS NETO ALMEIDA
[email protected]
(91) 8850-8628 – Cidade Velha
MARIA DE NAZARÉ DO VALE SOARES
[email protected]
(91) 9981-2076 – São Braz
PARANÁ
Cambé
NEOCLEIDE MILANI
[email protected]
(43) 3223-2654 – Centro
Cornélio Procópio
IVANI APARECIDA C. A. OLIVEIRA
[email protected]
(43) 3524-2377 – Centro
Guarapuava
ADRIANA CRISTINE LUCCHIN
[email protected]
(42) 3622-4022 – Trianon
Londrina
ROSA MARIA JUNQUEIRA SCICCHITANO
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(43) 3342-7308 – Jardim Caiçaras
Maringá
NERLI NONATO RIBEIRO MORI
[email protected]
(44) 3261-4887 – Campus Universitário
São José dos Pinhais
CÉLIA REGINA BENUCCI CHIODI
Curitiba
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(41) 8445-1444 – Ouro Fino
ADRIANE CREDIDIO R.C.DYMINSKI ARRUDA
LORIANE DE FÁTIMA FERREIRA
ANA PAULA LOUREIRO E COSTA
[email protected]
(21) 2436-1803 – Jacarepaguá
CLYTIA SIANO FREIRE DE CASTRO
[email protected]
(21) 2247-3185 – Ipanema
DIRCE MARIA MORRISSY MACHADO
[email protected]
(21) 2236-2012 – Copacabana
HELOISA BEATRIZ ALICE RUBMAN
[email protected]
(21) 2259-9959 – Jardim Botânico
JANE BRAVO GORNE
[email protected]
(21) 8746-4623 – Botafogo
LUCIA HELENA MACHADO SAAVEDRA
[email protected]
(21) 2239-5878 – Gávea
[email protected]
(41) 3672-3454 – Jardim Menino Deus
[email protected]
(41) 3282-9357 – Centro MARIA HELENA C. LISBOA BARTHOLO
ARLETE ZAGONEL SERAFINI
PERNAMBUCO
Recife
MARIA KATIANA VELUK GUTIERREZ
[email protected]
(41) 3363-1500 – Santa Cândida
CINTIA BENTO M. VEIGA
[email protected]
(41) 3332-2156 – Rebouças EVELISE M. LABATUT PORTILHO
[email protected]
(41) 3271-1655 – Prado Velho
FABIANE CASAGRANDE C. O. MELLO
[email protected]
(41) 3022-4041 – Batel
ISABEL CRISTINA HIERRO PAROLIN
[email protected]
(41) 3264-8061 – Alto da XV
LAURA MONTE SERRAT BARBOSA
[email protected]
(41) 3363-1500 – Alto da Glória
DAISY FLORIZA C. AMARAL
[email protected]
(81) 3326-1927 – Boa Viagem
MARIA DAS GRAÇAS SOBRAL GRIZ
[email protected]
(81) 3231-1461 – Graças
PIAUÍ
Teresina
AMÉLIA CUNHA RIO LIMA COSTA
amé[email protected]
(86) 3233-2878 – Fátima
JOYCE MARIA BARBOSA DE PADUA
[email protected]
(86) 3221-1013 – Centro/Sul
MARIA DA SANTIDADE LOPES DIAS
REGINA BONAT PIANOVSKI
[email protected]
(86) 3221-4444 – Centro
ROSE MARY DA FONSECA SANTOS
RIO DE JANEIRO
Ilha do Governador
[email protected]
(41) 3345-8798 – Portão
[email protected]
(41) 3026-2865 – Centro Cívico
SIMONE CALBERG
[email protected]
(41) 3363-1500 – Alto da Glória
[email protected]
(21) 2527-1933 – São Conrado
MARIA LÚCIA DE OLIVEIRA FIGUEIREDO
[email protected]
(21) 9345-4020 – Botafogo
MARLENE DIAS PEREIRA PINTO
[email protected]
(21) 9739-5332 – Leblon
MARTHA IZAURA DO NASCIMENTO TABOADA
[email protected]
(21) 2570-0065 – Barra da Tijuca
VERA BEATRIZ DA COSTA NUNES MENDONÇA
[email protected]
(21) 2295-4838 – Botafogo
RIO GRANDE DO NORTE
Natal
CHRISTINA SALES NOVO
[email protected]
(84) 3206-4449 – Dix Sept Rosado
DULCE CONSUELO RIBEIRO SOARES
EDNALVA DE AZEVEDO SILVA
Niterói
SONIA APARECIDA MONÇÃO GONÇALVES
[email protected]
(21) 3366-2468 – Freguesia
SONIA MARIA GOMES DE SÁ KUSTER
FÁTIMA GALVÃO PALMA
[email protected]
(41) 3264-8061 – Centro
[email protected]
(21) 2710-5577 – Icaraí
Foz do Iguaçu
Rio de Janeiro
ANA ZANIN ROVANI
ANA MARIA ZENÍCOLA
[email protected]
(45) 3523-4655
[email protected]
(21) 2266-0818 – Humaitá
[email protected]
(21) 2556-3767 – Flamengo
[email protected]
(84) 3221-6573 – Lagoa Seca
[email protected]
(84) 3211-4220 – Ribeira
Parnamirim
FRANCY IZANNY DE BRITO BASTOS MAR­­­
TINS
[email protected]
(84) 8839-0539
RIO GRANDE DO SUL
Caxias do Sul
LOVAINE SALETE STREIT JUNGES
[email protected]
(54) 3536-3516 – Rio Branco
Passo Fundo
IARA SALETE CAIERÃO
[email protected]
(54) 3311-5230 – Centro
Porto Alegre
CLARA GENI BERLIM
[email protected]
(51) 3221-1740 – Santana
FABIANI ORTIZ PORTELLA
[email protected]
(51) 3209-5722 – Cidade Baixa
MARILENE DA SILVA CARDOSO
MARIA GUILHERMINA COSTA ACIOLI
EDITH REGINA RUBINSTEIN
MARIA LÚCIA ALMADA FERNANDES
ELISA MARIA DIAS DE TOLEDO PITOMBO
[email protected]
(48) 3331-1952 – Trindade
[email protected]
(11) 5184-1340 – Granja Julieta
Maravilha
ELOISA QUADROS FAGALI
[email protected]
(48) 3223-6402 – Centro
SILVANA MARIA BEDUSCHI DA SILVEIRA
[email protected]
(49) 3664-2186 – Centro
SÃO PAULO
Araraquara
ALINE RECK PADILHA ABRANTES
[email protected]
(11) 3335-7440 – Centro
Campinas
MARIA LAURA CASSOLI MACEDO
[email protected]
(51) 8182-0721 – Higienópolis
[email protected]
(19) 3254-2714 – Jardim N. Sra. Auxiliadora
NEUSA KERN HICKEL
Cotia
[email protected]
(51) 3333-5478 – Centro
SANDRA MARIA CORDEIRO SCHRÖEDER
[email protected]
(51) 3328-3872 – Chácara das Pedras
SONIA MARIA PALLAORO MOOJEN
[email protected]
(51) 3333-8300 – Petrópolis
VERÔNICA ABELLA MARQUES
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(51) 3374-6938 – Higienópolis
MARIA CECILIA CASTRO GASPARIAN
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(11) 4702-2192 – Granja Viana
Ribeirão Preto
ANA LUCIA DE ABREU BRAGA
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(16) 3021-5490 – Jardim Sumaré
São Bernardo do Campo
BEATRIZ PICCOLO GIMENES
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(11) 4368-0013 – Rudge Ramos
[email protected]
(11) 3743-0090 – Vila Sônia
[email protected]
(11) 3864-2869 – Perdizes
HERVAL G. FLORES
[email protected]
(11) 3257-5106 – Higienópolis LEDA MARIA CODEÇO BARONE
[email protected]
(11) 3045-9064 – Vila Olímpia
LUCIA BERNSTEIN
[email protected]
(11) 3209-8071 – Aclimação
MÁRCIA ALVES SIMÕES
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(11) 8192-0921 – Tatuapé
MARIA BERNADETE GIOMETTI PORTÁSIO
[email protected]
(11) 2950-6072 – Santana
MARIA CÉLIA R. MALTA CAMPOS
[email protected]
(11) 3819-9097 – Alto de Pinheiros
MARIA CRISTINA NATEL
[email protected]
(11) 5081-2067 – Vila Mariana
MARIA DE FATIMA MARQUES GOLA
[email protected]
(11) 3052-2381 – Jardim Paulista
Santa Maria
São Paulo
FABIANI ROMANO DE SOUZA BRIDI
ADA MARIA GOMES HAZARABEDIAN
MARIA IRENE DE MATOS MALUF
[email protected]
(11) 2261-2377 – Jardim França
[email protected]
(11) 3258-5715 – Higienópolis
ANA LISETE P. RODRIGUES
MARIA TERESA MESSEDER ANDION
ANDRÉA DE CASTRO RACY
MARISA IRENE S. CASTANHO
BEATRIZ JUDITH LIMA SCOZ
MÔNICA HOEHNE MENDES
CARLA LABAKI
NÁDIA APARECIDA BOSSA
MÁRCIA FIATES
CLEOMAR LANDIM DE OLIVEIRA
NEIDE DE AQUINO NOFFS
MARIA ALICE MOREIRA BAMPI
DILAINA PAULA DOS SANTOS
NIVEA MARIA DE CARVALHO FABRICIO
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(55) 3225-1577 – N. Sra. de Lourdes
SANTA CATARINA
Florianópolis
ALBERTINA C. MATTOS CHRAIM
[email protected]
(48) 3244-5984 – Estreito
JANICE MARIA BETAVE
[email protected]
(48) 8453-7791 – Ingleses
LILIANA STADNIK
[email protected]
(48) 3248-0401 – Balneário
[email protected]
(48) 3224-0441 – Centro
[email protected]
(48) 3333-1745 – Agronômica
[email protected]
(11) 3885-7200 – Jardim Paulista
[email protected]
(11) 5572-1331
[email protected]
(11) 3651-9914 – Alto de Pinheiros
[email protected]
(11) 3815-5774 – Vila Madalena
[email protected]
(11) 9302-5501 – Moema
[email protected]
(11) 9219-5114 – Santana
[email protected]
(11) 3023-5834 – Alto de Pinheiros
[email protected]
(11) 3491-0522 – Ipiranga
[email protected]
(11) 5041-1988 – Indianópolis [email protected]
(11) 2268-4545 – Mooca
[email protected]
(11) 3670-8162 – Perdizes
[email protected]
(11) 3868-3850 – Perdizes
QUÉZIA BOMBONATTO SILVA
TELMA PANTANO
WYLMA FERRAZ LIMA
REGINA A. S. I. FEDERICO
VALÉRIA RIVELLINO LOURENZO
Taubaté
[email protected]
(11) 3815-8710 – Vila Madalena
[email protected]
(11) 5041-1988 – Brooklin
REGINA ZAIDAN PEREIRA MENDES
[email protected]
(11) 3872-2434 – Pacaembu
[email protected]
(11) 3062-6580 – Jardins
[email protected]
(11) 5041-7896 – Brooklin
VÂNIA M. CARVALHO BUENO DE SOUZA
vâ[email protected]
(11) 7204-7894 – Lapa
[email protected]
(11) 3721-6421 – Morumbi
BENEDITA ILZA VIEIRA FORTES
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(12) 3411-6637 – Centro
Vinhedo
SANDRA G. DE SÁ KRAFT MOREIRA DO
NASCIMENTO
VERA MEIDE MIGUEL RODRIGUES
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(11) 3805-9799 – Morumbi
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(11) 3511-3888 – Pacaembú
SANDRA LIA NISTERHOFEN SANTILLI
VIVIANE MASSAD DE AGUIAR
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(11) 3259-0837 – Higienópolis
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(11) 9840-6337 – Pompéia
SERGIPE
Aracaju
SILVIA AMARAL DE MELLO PINTO
YARA PRATES
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(11) 2976-8937 – Vila Ester
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A Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) é
uma entidade de caráter científico-cultural, sem fins
lucrativos, que congrega profissionais militantes na área da
Psicopedagogia.
Em 12 de novembro de 1980, um grupo de profissionais já
envolvidas e atuantes nas questões relativas aos problemas da
aprendizagem fundou a Associação Estadual de
Psicopedagogos do Estado de São Paulo, a AEP.
Devido ao grande interesse em torno dessa Associação, a sua
expansão a nível Nacional surgiu como necessidade imperiosa.
Em 1986, a AEP transformou-se na ABPp e gradativamente
foram sendo criados os seus escritórios de representação por
todo o Brasil, denominados de Núcleos e Seções.
ANOS
30
Durante estes anos, a ABPp vem cuidando de questões
referentes à formação, ao perfil, à difusão e ao
reconhecimento da Psicopedagogia no Brasil, já tendo
alcançado muitas vitórias na luta pela sua regulamentação.
Atualmente, conta com 16 Seções e 2 Núcleos, espalhados
pelo Brasil, para melhor divulgar a Psicopedagogia e
aproximar os profissionais em torno de seus objetivos comuns.
A ABPp promove conferências, cursos, palestras, jornadas,
congressos, bem como a divulgação de trabalhos sobre sua
área de atuação, por meio da revista científica
Psicopedagogia, da Revista do Psicopedagogo, do informativo Diálogo Psicopedagógico e do site www.abpp.com.br.
Oferece, ainda, descontos tanto nos eventos que
organiza quanto em eventos de terceiros, que são parceiros e
interessados nos assuntos desta área.
Preocupada com as questões sociais, a atual diretoria da
ABPp Nacional organizou um novo trabalho de cunho
sociocientífico, que visa não só ao atendimento
da população carente, promovendo a inserção social e a
divulgação da importância da prática psicopedagógica,
como também à implantação de um novo modelo de estudo
e pesquisa nesse campo. Dele poderão participar todos os
associados interessados em prestar um trabalho social.
Podem associar-se à ABPp todas as pessoas interessadas
nessa área de atuação, tendo ou não concluído a sua
especialização em Psicopedagogia.
Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000
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