PSICOPEDAGOGIA REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOPEDAGOGIA • Nº 87 • 2011 • ISSN 0103-8486 EDITORIAL / EDITORIAL ....................................................................................................... 217 ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES • Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados ....................................... 219 • Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P ........................................ 226 • Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor .............. 237 • Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada ........................................................................... 246 • Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem ................................... 256 ARTIGOS ESPECIAIS / SPECIAL ARTICLES • Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção ............................................ 262 • Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud ......................................................................... 273 • Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos................................................. 283 ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES • Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico .....................293 • Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz .................................................................................................... 306 RESENHA / REVIEW • Adolescência: as contradições da idade .......................................................................... 321 30 ANOS VOLUME 28 Associação Brasileira de Psicopedagogia Sede: Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 - São Paulo - SP Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567 - www.abpp.com.br - [email protected] NÚCLEOS E SEÇÕES DA ABPp (Dezembro de 2011) Núcleo Espírito Santo Coordenadora: Maria da Graça Von Kruger Pimentel R. Elesbão Linhares, 420/601 – Praia do Canto Vitória – ES – CEP 29057-220 (27) 3225-9978 [email protected] Núcleo Sul Mineiro Coordenadora: Maria Clara Rainato Foresti R. Deputado Ribeiro Rezende, 494 – Centro Varginha – MG – CEP 37002-100 (35) 3222-1214 [email protected] Núcleo Teresina Coordenadora: Amélia Cunha Rio Lima Costa R. Eletricista Guilherme, 815 – Fátima Teresina – PI – CEP 64049-486 (86) 3233-2878 amé[email protected] Seção Bahia Diretora Geral: Jozélia de Abreu Testagrossa Av. Tancredo Neves, 3343, sala 1103 – Ed. Cempre Torre B – Caminho das Árvores Salvador – BA – CEP 41820-021 (71) 3341-0121 [email protected] Seção Brasília Diretora Geral: Marli Lourdes da Silva Campos SCLN Quadra 102 – Bloco D – sala 110 Brasília – DF – CEP 70722-540 (61) 3964-1004 [email protected] Seção Ceará Diretora Geral: Francisca Francineide Cândido R. Assis Chateaubriand, 362 A – Dionizio Torres Fortaleza – CE – CEP 60135-200 (85) 3261-0064 [email protected] Seção Goiás Diretora Geral: Luciana Barros de Almeida R. 85, 684, sala 207 – Ed. Eldorado Center – Setor Oeste Goiânia – GO – CEP 74120-090 (62) 3954-2178 [email protected] Seção Paraná Norte Diretora Geral: Neocleide Milani R. Dinamarca, 381 – Centro Cambé – PR – CEP 86181-080 [email protected] Seção Paraná Sul Diretora Geral: Rose Mary da Fonseca Santos R. Fernando Amaro, 431 – Alto da XV Curitiba – PR – CEP 80050-020 (41) 3603-8006 [email protected] Seção Pernambuco Diretora Geral: Maria das Graças Sobral Griz R. das Pernambucanas, 277 – Graças Recife – PE – CEP 52011-010 (81) 3222-4375 [email protected] Seção Rio de Janeiro Diretora Geral: Ana Paula Loureiro e Costa Av. Nossa Senhora de Copacabana, 861, sala 302 – Copacabana – Rio de Janeiro – RJ – CEP 22060-000 (21) 2236-2012 [email protected] Seção Rio Grande do Norte Diretora Geral: Francy Izanny de Brito B. Martins R. Coronel Silvino Bezzera, 1178 – Lagoa Seca Natal – RN – CEP 59000-000 (84) 3223-3260 [email protected] Seção Rio Grande do Sul Diretora Geral: Iara Caierão Av. Venâncio Aires, 1119 – sala 9 – Cidade Baixa (51) 3333-3690 Porto Alegre – RS – CEP 90520-000 [email protected] Seção Santa Catarina Diretora Geral: Albertina Celina de Mattos Chraim R. Eurico Gaspar Dutra, 445, sala 101 – Estreito Florianópolis – SC – CEP 88075-100 (48) 3209-8035 [email protected] Seção Minas Gerais Diretora Geral: Regina Maria Caldeira Couto e Silva Av. Brasil, 248, sala 202 – Santa Ifigênia Belo Horizonte – MG – CEP 30140-001 (31) 3221-3616 [email protected] Seção São Paulo Diretora Geral: Maria Cristina Natel R. Marselhesa, 341 – Vila Mariana – São Paulo – SP – CEP 04020-060 (11) 9513-1411 [email protected] Seção Pará Diretora Geral: Maria Nazaré do Vale Soares Trav. 3 de Maio, 1218, sala 307 – São Braz Belém – PA – CEP 66060-600 (91) 3229-0565 [email protected] Seção Sergipe Diretora Geral: Auredite Cardoso Costa Av. Ivo Prado, 312 – Centro Aracaju – SE – CEP 49010-050 (79) 3211-8668 [email protected] Editora Maria Irene Maluf SP Conselho Executivo Maria Irene Maluf Quézia Bombonatto Luciana Barros de Almeida Maria Angélica Moreira Rocha Rosa M. Junqueira Scicchitano SP SP GO BA PR Conselho Editorial Nacional Ana Lisete Rodrigues Anete Busin Fernandes Beatriz Scoz Débora Silva de Castro Pereira Denise da Cruz Gouveia Edith Rubinstein Elcie Salzano Masini Eloísa Quadros Fagali Evelise Maria L. Portilho Gláucia Maria de Menezes Ferreira Heloisa Beatriz Alice Rubman Leda M. Codeço Barone Margarida Azevedo Dupas Maria Auxiliadora de Azevedo Rabello Maria Cecília Castro Gasparian Conselho Editorial Internacional Alicia Fernández Carmen Pastorino César Coll Isabel Solé Maria Cristina Rojas Neva Milicic Vitor da Fonseca - - - - - - - Argentina Uruguai Espanha Espanha Argentina Chile Portugal Consultores ad hoc Ana Maria Maaz Acosta Alvarez Jaime Zorzi Lino de Macedo Lívia Elkis Luiza Helena Ribeiro do Valle Pedro Primo Bombonato Saul Cypel Sylvia Maria Ciasca SP SP SP BA SP SP SP SP PR CE RJ SP SP BA SP Maria Célia Malta Campos Maria Cristina Natel Maria Lúcia de Almeida Melo Maria Silvia Bacila Winkeler Marisa Irene Siqueira Castanho Mônica H. Mendes Nádia Bossa Neide de Aquino Noffs Nívea M.de Carvalho Fabrício Regina Rosa dos Santos Leal Rosa M. Junqueira Scicchitano Sônia Maria Colli de Souza Vânia Carvalho Bueno de Souza SP SP SP PR SP SP SP SP SP MG PR SP SP Associação Brasileira de Psicopedagogia Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567 www.abpp.com.br [email protected] PSICOPEDAGOGIA – Órgão oficial de divulgação da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp é indexada nos seguintes órgãos: 1) LILACS - Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde BIREME 2) Clase - Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales y Humanidades. Universidad Nacional Autónoma de Mexico 3) Edubase - Faculdade de Educação, UNICAMP 4) Bibliografia Brasileira de Educação - BBE CIBEC / INEP / MEC 5) Latindex - Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Científicas de América Latina, El Caribe, España y Portugal 6) Catálogo Coletivo Nacional – Instituto Brasileiro em Ciência e Tecnologia – IBICT 7) INDEX PSI – Periódicos – Conselho Federal de Psicologia 8) DBFCC – Descrição Bibliográfica Fundação Carlos Chagas 9) PEPSIC – Periódicos Eletrônicos em Psicologia Editora Responsável: Maria Irene Maluf Revisão e Assessoria Editorial: Rosângela Monteiro Editoração Eletrônica: Rudolf Serviços Gráficos O conteúdo dos artigos aqui publicados é de inteira responsabilidade de seus autores, não expressando, necessariamente, o pensamento do corpo editorial. É expressamente proibida qualquer modalidade de reprodução desta revista, seja total ou parcial, sob penas da lei. Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia / Associação Brasileira de Psicopedagogia. - Vol. 10, nº 21 (1991). São Paulo: ABPp, 1991Quadrimestral ISSN 0103-8486 Continuação, a partir de 1991, vol. 10, nº 21 de Boletim da Associação Brasileira de Psicopedagogia. 1. Psicopedagogia. I. Associação Brasileira de Psicopedagogia. CDD 370.15 Acesse a revista na íntegra: www.revistapsicopedagogia.com.br Diretoria da Associação Brasileira de Psicopedagogia 2011/2013 Presidente Quézia Bombonatto Tesoureira Maria Cecília Castro Gasparian Secretária Administrativa Maria Teresa Messeder Andion Diretora Científica Marisa Irene Siqueira Castanho Diretora Cultural Débora Silva de Castro Pereira Diretora de Projetos Sociais Márcia Alves Simões Diretora Regional de Relações Públicas Galeára Matos de França Silva Diretora Regional de Comunicação e Divulgação Ana Paula Loureiro e Costa Diretora Regional de Comunicação e Divulgação Maria Helena Bartholo Assessorias Assessora de Cursos e Regulamentação Neide de Aquino Noffs Assessora de Divulgações Científicas Maria Irene Maluf Conselheiras Vitalícias Beatriz Judith Lima Scoz Edith Rubinstein Leda Maria Codeço Barone Maria Cecília Castro Gasparian Maria Célia Malta Campos Sp Sp Sp SP Sp Conselheiras Eleitas 2011/2013 Ana Maria Zenícola Andréa Ayres Costa Carla Labaki A. Luvizotto Cleomar Landim de Oliveira Cristina Vandoros Quilici Débora S. de Castro Pereira Ednalva de Azevedo Silva Eloisa Quadros Fagali Evelise M. Labatut Portilho Fabiani Ortiz Portella Galeára Matos de França Silva Heloisa Beatriz Alice Rubman Lucia Helena M. Saavedra Luciana Barros de Almeida Márcia Alves Simões Vice-Presidente Luciana Barros de Almeida Tesoureira Adjunta Viviane Massad de Aguiar Secretária Administrativa Adjunta Edimara de Lima Diretora Científica Adjunta Telma Pantano Diretora Cultural Adjunta Heloisa Beatriz Alice Rubman Colaboradora Cristina Vandoros Quilici Diretora Regional de Relações Públicas Maria José Weyne Melo de Castro Diretora Regional de Comunicação e Divulgação Fabiani Ortiz Portella Diretora Regional de Comunicação e Divulgação Maria Katiana Veluk Gutierrez RJ CE SP SP SP BA RN SP PR RS CE RJ RJ GO SP Maria Irene Maluf Mônica H. Mendes Neide de Aquino Noffs Nívea Maria de Carvalho Fabrício Sp Sp Sp Sp Maria Angélica Moreira Rocha Maria Cristina Natel Maria Helena Bartholo Maria José Weyne Melo de Castro Maria Katiana Veluk Gutierrez Maria Teresa Messeder Andion Marisa Irene Siqueira Castanho Quézia Bombonatto Rosa Maria Junqueira Scicchitano Silvia Amaral de Mello Pinto Sônia Maria Colli de Souza Sônia Maria G. de Sá Küster Sônia A. Monção Gonçalves Viviane Massad de Aguiar Yara Prates BA SP RJ CE RJ SP SP SP PR SP SP PR RN SP SP Associação Brasileira de Psicopedagogia sumário EDITORIAL / EDITORIAL • Maria Irene Maluf.........................................................................................................................217 ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES • Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados Study on the writing in sheltered children and adolescents Márcia Siqueira de Andrade.........................................................................................................219 • Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P Analysis of association between the academic performance, the speed of execution of tasks and behavior of children from EACI-P Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca; Thiago da Silva Gusmão Cardoso; Mauro Muszkat; Orlando Francisco Amodeo Bueno..................................................................226 • Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor Studies on Psychopedagogy, teacher’s stress and sleep disorders Luiza Elena Ribeiro do Valle; Rubens Reimão; Sigmar Malvezzi...............................................237 • Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada Written production analysis of children with developmental dyslexia submitted to a computerized phonological intervention Darlene Godoy de Oliveira; Karen Kaufmann Sacchetto; Karen Ueki; Patrícia Botelho da Silva; Elizeu Coutinho de Macedo...............................................................246 • Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem Visual perception of students with learning disabilities Aline Viganô de Souza; Simone Aparecida Capellini.................................................................256 ARTIGOS ESPECIAIS / SPECIAL ARTICLES • Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção Burnout: soul’s disease in education and its prevention Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini.....................................................................................262 • Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud An autopsy on the origins of the problems of learning mathematics under the lens of transfer in Freud Laerte Fonseca...............................................................................................................................273 • Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos Andragogy in Psychopedagogy: the role with adults Neide de Aquino Noffs; Carla Maria Rezende Rodrigues..........................................................283 ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES • Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico The application of virtual digital technologies in the psychopedagogical context Ana Margô Mantovani; Bettina Steren dos Santos.....................................................................293 • Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz Literacy methods: definition of procedures and considerations for effective practice Alessandra Gotuzo Sebra; Natália Martins Dias.........................................................................306 RESENHA / REVIEW • Adolescência: as contradições da idade Adolescence: the contradictions of the age Luiza Elena L. Ribeiro do Valle; Maria José Viana Marinho de Mattos....................................321 EDITORIAL E sta edição da revista Psicopedagogia tem como fio condutor a busca da qualidade na formação dos professores, psicopedagogos e o aprimoramento de sua ação profissional, uma relação complexa e dinâmica, da qual depende o sucesso da aprendizagem de todos os nossos alunos. A partir de meados do século XX, como todos sabemos, a escola se organizou frente às novas realidades mundiais, tornando-se simultaneamente uma escola para todos e uma escola para cada um. Para atender a essa demanda, inicialmente trazemos neste número da Psi copedagogia, o artigo “Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados”, de Márcia Siqueira de Andrade, uma pesquisa cujo objetivo é identificar a qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas. Dando seguimento, temos outra pesquisa, “Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P”, apresentado por Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca, Thiago da Silva Gusmão Cardoso, Mauro Muszkat e Orlando Francisco Amodeo Bueno, que comprova ser possível, por meio da aplicação da EACI-P, obter dados para compreender o comportamento e a aprendizagem da criança, fundamentando intervenções precoces, e detectando fatores de risco ou proteção para aprendizagem, caso estejam preservados ou prejudicados. Em “Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do profes sor”, Luiza Elena Ribeiro do Valle, Rubens Reimão e Sigmar Malvezzi nos trou xeram um assunto importante e de atualidade para todos os profissionais da Educação e da Psicopedagogia. Já sabemos que os sintomas de estresse e os distúrbios do sono repercutem na aprendizagem de nossos alunos, mas, neste trabalho, os autores enfatizam os problemas associados à ocorrência de transtornos com o professor, o responsável pelo processo de ensino. “Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada” é também um artigo de grande relevância para os psicopedagogos que trabalham com crianças em fase de alfabetização. Escrito por Darlene Godoy de Oliveira, Karen Kaufmann Sacchetto, Karen Ueki, Patrícia Botelho da Silva e Elizeu Coutinho de Macedo, este estudo objetivou verificar mudanças no padrão de escrita de disléxicos submetidos à intervenção com o software Alfabetização Fônica Computadorizada, por meio da análise dos tipos de erros ortográficos. “Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem”, de Aline Viganô de Souza e Simone Aparecida Capellini, é um artigo baseado em uma pesquisa em que se procurou caracterizar os achados de percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem. É de Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini o Artigo Especial “Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção”, que tem como intuito propor uma reflexão sobre os novos caminhos da educação no século XXI, para a compreensão da síndrome – burnout, sintoma de uma educação adoecida que leva professores e alunos a um sofrimento psicofisicoespiritual. “Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud” é o ensaio teórico apresentado por Laerte Fonseca, cujo Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 217-8 217 EDITORIAL objetivo é fomentar as discussões dos conceitos psicanalíticos nos ambientes formais nas salas do Ensino Básico, utilizando-se do mecanismo da transferência como conceito psicanalítico para compreender as origens dos problemas de aprendizagem matemática. “Andragogia na Psicopedagogia: a atuação com adultos” é o artigo de Neide de Aquino Noffs e Carla Maria Rezende Rodrigues, que relatam a pesquisa que vem sendo desenvolvida no NAPAp/PUC-SP (Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem). A referida pesquisa nos leva a observar que a Psicopedagogia, durante décadas, se preocupou em desenvolver ações com crianças e adolescentes em idade escolar e, neste texto, abordam as contribuições dessa ação na ampliação do campo de atuação de aprendizagem com adultos: a andragogia. Dois artigos de revisão se apresentam nesta edição. “Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico”, de Ana Margô Mantovani e Bettina Steren dos Santos, nos reafirma a necessidade do psicopedagogo atender à demanda da geração digital, a necessidade de vivenciar experiências com tais tecnologias, a fim de desenvolver competências didático-pedagógicas, aliadas a competências tecnológicas-digitais, que lhe viabilizem interagir e utilizar essas ações em sua prática psicopedagógica, tanto institucional como clínica. Em “Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considera ções para uma prática eficaz”, Alessandra Gotuzo Sebra e Natália Martins Dias apontam para uma promissora posição oriunda de algumas iniciativas acadêmicas e de setores do governo, que tem revelado uma possível aproximação entre as diferentes práticas educacionais ligadas à alfabetização e as mais atuais evidências científicas. Uma resenha encerra esta edição de dezembro de 2011. É de autoria de Luiza Elena L. Ribeiro do Valle e Maria José Viana Marinho de Mattos e versa sobre o livro “Adolescência: as contradições da idade”. Agradecemos, em nome desta Associação, aos que participaram das três edições da revista Psicopedagogia, quer nos enviando seus trabalhos, quer trabalhando no Conselho Editorial desta publicação. Somos gratas também por toda gentileza da UNIFIEO, nossa parceira no II Simpósio Nacional de Psicopedagogia da ABPp, muito especialmente à Profª Dra. Márcia Siqueira. E não podíamos deixar de expressar aos nossos associados, amigos e colaboradores o nosso muito obrigada, pelo apoio, confiança e incentivo recebidos. Ao nos despedirmos deste ano, já deixamos a todos o convite para o grande Congresso da ABPp de 2012, sob a responsabilidade do Conselho Nacional, de Quézia Bombonatto (Presidente da ABPp Nacional) e de Luciana Barros de Almeida (Vice-Presidente da ABPp Nacional). Aguardem! A todos, um abraço cordial e os votos de Boas Festas! Até 2012! Maria Irene Maluf Editora Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 217-8 218 Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados ARTIGO ORIGINAL Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados Márcia Siqueira de Andrade RESUMO – Objetivo: Esta pesquisa teve como objetivo identificar a qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas. Mé todo: Participaram do estudo 20 estudantes das 2ª, 3ª e 4ª séries do ensino fundamental de escolas da rede pública, de ambos os sexos, com idades entre 8 e 14 anos, atendidas em instituição privada caracterizada por “abrigo”. Os dados foram coletados por meio do teste Avaliação de Dificuldades na Aprendizagem da Escrita-ADAPE. Resultados: Os resultados revelaram que a maioria dos participantes aglutina-se abaixo da média de acertos. Conclusão: A vivência institucional pode proporcionar prejuízos cognitivos às crianças abrigadas, especialmente em relação à aprendizagem da escrita. UNITERMOS: Aprendizagem. Escrita. Institucionalização. Márcia Siqueira de Andrade – Doutora em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Psicologia Educacional do Centro Universitário FIEO, São Paulo, SP, Brasil. Correspondência Márcia Siqueira de Andrade Centro Universitário FIEO - UNIFIEO Programa de Pós-graduação em Psicologia Educacional Campus Vila Yara – Bloco Prata Av. Franz Voegelli, 300 – Vila Yara – Osasco, SP, Brasil – CEP: 060190-20 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25 219 Andrade MS de problemas sociais, associados à situação de pobreza e ao perfil de distribuição de renda no Brasil. Ao falarmos da criança institucionalizada, observamos que, mesmo recebendo cuidados alimentares, higiênicos e médicos, ela caminha tardiamente, demora a falar e tem dificuldade para estabelecer ligações significativas10. Embora a Lei nº 8069, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA11, preconize a desinstitucionalização no atendimento de crianças e adolescentes em situação de abandono, valorizando o papel da família, as ações locais e as parcerias no desenvolvimento de atividades de atenção, as mudanças no panorama do funcionamento das instituições de abrigo ainda não foram incorporadas por todas as instituições brasileiras. Para Carvalho12, o ambiente institucional não se constitui no melhor ambiente de desenvolvi mento, pois o atendimento padronizado, o alto ín dice de criança por cuidador, a falta de atividades planejadas e a fragilidade das redes de apoio social e afetivo são alguns dos aspectos relacionados aos prejuízos que a vivência institucional pode operar no indivíduo. Para Bowlby13, a criança que vive em instituição, sem a presença de uma pessoa significativa, poderá ter seu desenvolvimento prejudicado, pois foi privada total ou parcialmente de se vincular afetivamente a alguém que lhe ofereça apoio, proteção e cuidados. Para Altoé14, em geral, abrigos de proteção ou “internatos” apresentam um atendimento mais impessoal e despersonalizado, dificultando a construção de laços afetivos e significativos, levando à pobreza nos relacionamentos interpessoais. Também refere que a instituição deixa marcas no indivíduo que passa ali anos de sua infância e adolescência, marcas que influenciam sua trajetória e sua inserção na vida social, podendo dificultar seu desenvolvimento psicológico, da inteligência e criatividade15. Grusec e Lytton16 afirmam que, mesmo em instituições de alta qualidade, a inteligência e a autonomia de crianças deste contexto são marcadamente menores do que aquelas que foram cuidadas em suas casas. Isto sugere que INTRODUÇÃO Estudos sobre as dificuldades de leitura e escrita estão sendo amplamente realizados em uma variedade de idiomas1-4. Na perspectiva de Sternberg e Grigorenko5, as dificuldades de leitura e escrita são decorrentes de uma interação entre fatores biológicos, cognitivos e sociais. Para Bartholomeu et al.6, os problemas emocionais também interferem negativamente na aprendizagem da escrita. Para esses autores, crianças ansiosas e com pobre autoconceito, denotando sentimentos de inadequação e culpa relacionados a impulsos agressivos mal-elaborados, com preocupação pelos impulsos sexuais, dificuldades de comunicação e timidez, apresentam problemas de aprendizagem da escrita. Marturano e Parreira7 compreendem que existe uma relação entre baixo rendimento es colar e problemas emocionais/comportamentais, pois estes tanto podem ser decorrentes das dificuldades escolares, como serem precedidos pelas mesmas, causando-as. Uma criança com baixo rendimento escolar pode apresentar dificuldades quanto a suas habilidades sociais, que associadas a falhas educacionais e condições familiares podem agravar-se. Este estudo teve como objetivo investigar a qualidade da aprendizagem da escrita em crianças institucionalizadas. Esta pesquisa justifica-se tendo em vista que o Levantamento Nacional de Abrigos para Crianças e Adolescentes8 encontrou cerca de 20 mil crianças e adolescentes vivendo em 589 abrigos pesquisados no Brasil, na sua maioria meninos (58,5%) entre 7 e 15 anos de idade (61,3%), negros e pobres, com percentual de analfabetos entre os adolescentes de 15 a 18 anos de 19,2%. Além disso, as estatísticas governamentais, como as demonstradas pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB)9, demonstram um quadro preocupante em termos de desempenho em leitura e escrita no Ensino Fundamental. As instituições de abrigo fazem parte da rede de apoio de muitas famílias brasileiras, há mui tas décadas, principalmente em decorrência Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25 220 Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados a segurança emocional, derivada da existência de relações estáveis na vida da criança, pode contribuir para o funcionamento intelectual adequado. Segundo Yunes17, a institucionalização pode ou não constituir um risco para o desenvolvimento. Esta condição dependerá dos mecanismos através dos quais os processos de risco operarão seus efeitos negativos sobre eles, sendo o risco entendido como as condições ou variáveis que estão associadas a uma alta possibilidade de ocorrência de resultados negativos ou não desejáveis18. Estudos mais antigos apontaram os prejuízos cognitivos que a vivência institucional proporcionava para as crianças abrigadas, tal como déficit intelectual, especialmente no desenvolvimento da linguagem16,19. tes utilizam recursos de escola, centros de lazer, praças e também a rede municipal de saúde. Na ocasião da pesquisa, o abrigo acolhia 125 crianças e adolescentes entre zero e 18 anos, com uma relação de um cuidador para 20 crianças. Instrumentos Foram utilizados neste estudo: a) um questionário de identificação, no qual os participantes informaram os seguintes aspectos: nome, idade, sexo, série e insti tuição de ensino à qual pertenciam; b) Escala de Avaliação de Dificuldades na Aprendizagem da Escrita (ADAPE)20 apli cado para identificar as dificuldades dos participantes em escrita. O referido instrumento tem sido largamente empregado em pesquisas sobre avaliação de dificuldades na aprendizagem da escrita3,21,22. O texto contém 114 palavras, com 60 delas apresentando algum tipo de dificuldade classificada como encontro consonantal (tarde, campo bastante, quando, contaram, festinha, Vanda, aniversário, Amparo, brincadeiras, engraçadas, esparadrapo, jogando, mercúrio, companheiros, Márcio, brincar, crianças, gostam, perto, Jumbo, correndo, gente, Valter, estava, certo, voltar, di vertido, pensando, quente, vontade), dígrafo, (quando, lhe, festinha, chácara, chegou, machucou, joelho, achou, necessário, passar, burrico, companheiros, Cássio, cachorro, vizinho, chegaram, correndo, quente, velhos, tenho), sílaba composta (alegre, sobre, brincadeiras, esparadrapo, crianças, brincar, outros, engraçadas, atrás) e sílaba complexa (José, sobre, engraçadas, necessário, seus, Márcio, Adão, crianças, não, sai, gente, difícil, certo, casa, pensando, verão, visitar, aniversário). Além disso, a escala avalia também o uso correto de parágrafos, uso correto da letra maiúscula e acentuação. Para essa avaliação, as palavras são utilizadas na composição de um texto que conta uma história. O instrumento empregado tem uma única versão de aplicação para crianças de 2ª 3ª e 4ª séries, utilizando diferentes escalas de avaliação para cada uma das séries. MÉTODO Participantes Foram incluídos no estudo 20 participantes, de ambos os sexos, sendo oito meninas e 12 meninos, com idades compreendidas entre oito e 14 anos, atendidas em uma instituição privada que se caracteriza por “abrigo”. A composição da amostra partiu de uma listagem, fornecida pela Instituição de abrigo. Dentre as crianças selecionadas aleatoriamente, algumas estavam institucionalizadas em consequência do abandono, outras foram acolhidas na instituição por serem vítimas de violência doméstica (física e sexual), negligência parental ou decisão judicial. O tempo de institucionalização dos participantes da amostra variou de três meses a 10 anos e frequentavam a 2ª, 3ª e 4ª séries do ensino fun damental de escolas da rede pública estadual, predominando alunos da 2ª série. O abrigo que atendia os participantes por oca sião da pesquisa está localizado em uma cidade da região oeste do Estado. Existe desde 1939, funcionando como uma Sociedade Civil de Caráter Assistencial, tendo como finalidade a proteção e educação da criança, com duração indeterminada e sem fins lucrativos. Encontra-se inserido na comunidade, na qual essas crianças e adolescen- Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25 221 Andrade MS 50 – 79 erros; e dificuldade de aprendizagem média (categoria 3 – DA média), 80 ou mais erros. A escala para a terceira e quarta série é a seguinte: sem indícios de dificuldade de aprendizagem até 10 erros (categoria 1A); dificuldade de aprendizagem leve (categoria 1B – DA leve), de 11 – 19 erros; dificuldade de aprendizagem média (categoria 3 – DA média), 20 – 49 erros e dificuldade de aprendizagem acentuada (categoria 4 – DA acentuada), 50 ou mais erros. Procedimentos Este estudo caracterizou-se por ser de risco mínimo aos participantes e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição promotora (Protocolo: 097/2009), tendo seguido os preceitos éticos que regem a realização de pesquisas com seres humanos23,24. Foi obtido o Termo de Concordância da Instituição, bem como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado pelos diretores do abrigo que mantêm a guarda formal das crianças e adolescentes que ali vivem. Além disso, foi assegurada aos participantes a voluntariedade de sua participação e obteve-se um assentimento verbal das crianças e adolescentes. O instrumento foi aplicado coletivamente no abrigo, em horário combinado com antecedência, por uma equipe de pesquisa composta pelo pesquisador responsável e por acadêmicos previamente treinados. O meio utilizado foi o ditado, como uma forma objetiva de avaliar a dificuldade de aprendizagem em linguagem escrita. No momento da aplicação, foi explicado que seria efetuado um ditado de um texto, as palavras lidas uma a uma e não repetidas, além de os participantes da pesquisa serem orientados para escrever todas as palavras. Foi entregue uma folha em branco para cada um para que escrevesse as palavras ditadas. RESULTADOS A pontuação alcançada por cada participante é apresentada na Tabela 1. No que concerne aos erros por palavras no ditado, evidenciou-se que grande parte dos participantes obteve 114 pontos de erros no ditado, pontuação máxima (55%), tendo também uma grande concentração de sujeitos com pontuação entre 75 e 95 (30%). Dessa forma, a maioria dos sujeitos aglutina-se abaixo da média, apresentando dificuldade de aprendizagem da escrita acentuada. Por sua vez, a minoria dos casos (15%) concentra-se nas pontuações de até 10 erros. Estes casos referem-se a crianças do sexo feminino com poucos meses de vida institucional. Constatou-se que os meninos obtiveram uma pontua ção média de erros maior no ADAPE: (M=108; DP= 2,5) média - aritmética dos meninos, contra (M=60,6; DP= 0,6) média - aritmética das meninas, o que corrobora os resultados obtidos por outros pesquisadores25-27, que indicam que os meninos apresentam mais dificuldades de aprendizagem na escrita, quando comparados às meninas. Análise de dados Para a correção dos ditados, cada palavra foi considerada uma unidade e qualquer erro ortográfico ou ausência de palavra foi considerada erro, assim como acentos e letras maiúsculas e minúsculas indevidas, sendo a soma dos erros a pontuação de cada criança. Foi atribuído um ponto para cada erro e zero para acerto, sendo a pontuação máxima possível 114. Os participantes foram categorizados segundo o critério ADAPE. A escala do instrumento para segunda série é a seguinte: sem indícios de dificuldade de aprendizagem (DA) pertencentes à categoria zero até 20 erros; dificuldade de aprendizagem leve (categoria 2 – DA leve), de DISCUSSÃO Os resultados evidenciaram que crianças e adolescentes abrigados apresentam problemas na aprendizagem da escrita, podendo ser considerados, na sua maioria (80%), como analfabetos, ou seja, considerando o conceito de alfabetizado utilizado pelo IBGE28 nas suas estatísticas, não conseguem ler ou escrever um bilhete simples no idioma que conhecem. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25 222 Estudo sobre a escrita em crianças e adolescentes abrigados Tabela 1 – Pontuação alcançada pelos participantes. Idade Tempo na instituição Escolaridade (série) Nº de erros Feminino 11 8 meses 3ª 6 Feminino 14 10 anos 4ª 114 Feminino 9 3 meses 2ª 7 Feminino 9 5 meses 2ª 5 Feminino 8 6 anos 2ª 78 Feminino 11 8 anos 3ª 86 Sexo Feminino 12 10 anos 4ª 114 Feminino 9 5 anos 2ª 75 Masculino 9 7 anos 2ª 95 Masculino 9 8 anos 3ª 114 Masculino 10 9 anos 3ª 114 Masculino 9 5 anos 2ª 80 Masculino 10 8 anos 3ª 114 Masculino 8 5 anos 2ª 114 Masculino 14 10 anos 4ª 114 Masculino 8 6 anos 2ª 95 Masculino 9 9 anos 2ª 114 Masculino 10 9 anos 3ª 114 Masculino 9 7 anos 2ª 114 Masculino 10 8 anos 3ª 114 Vários estudos confirmam que crianças que são institucionalizadas com pouca idade e per manecem nessa situação por vários anos, apresentam problemas de desenvolvimento cognitivo10,13,15,29. O tempo de institucionalização, no caso dos participantes desta pesquisa, parece configurar-se um fator importante, visto que aquelas crianças com mais tempo no abrigo e que lá chegaram com poucos anos de vida apresentaram maiores dificuldades na aprendizagem da escrita, enquanto as crianças e adolescentes com poucos meses de institucionalização apresentaram um desempenho satisfatório. Os problemas de aprendizagem dessas crianças e adolescentes parecem ser decorrentes, dentre outras variáveis, da insegurança emocional e material fruto da ausência de familiares e de um ambiente estimulador, já que o alto índice de criança/adolescente por cuidador no abrigo em pauta não favorece a construção de laços afetivos e significativos de forma a contribuir para o funcionamento intelectual adequado. Para Santos e Graminha30, a exposição das crianças a um número maior de adversidades afeta seu desenvolvimento na escola. Mesmo considerando que as crianças e adolescentes par ticipantes deste estudo foram abrigadas por viverem num contexto de abuso sexual, maus tratos e abandono, apresentando uma história de vida repleta de sofrimento e privações, espera-se que a institucionalização traga um contexto possível de desenvolvimento e superação dos prejuízos afetivos e intelectuais, proporcionando a recuperação e crescimento psicológico. Porém, para que isso seja possível as instituições de abrigo devem estar configuradas em unidades pequenas, com Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 219-25 223 Andrade MS poucos integrantes, mantendo um atendimento personalizado, estimulando a participação em atividades comunitárias e preservando o grupo de irmãos, entre outros pontos31. Os resultados obtidos na presente pesquisa confirmaram dados encontrados na literatura da área, contribuindo assim para a generalização do conhecimento a respeito da aprendizagem da escrita de crianças e adolescentes abrigados. Nesse sentido, diante dos resultados encontrados, entendemos ser importante desenvolver estudos nesta área, a fim de garantir formas de atuação que favoreçam a efetivação dos direitos previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. SUMMARY Study on the writing in sheltered children and adolescents Purpose: The present study had as propose to identify the quality of the learning of the writing among institutionalized infants. Methods: Twenty infants, living in a shelter, of both sexes, aged between 8 and 14 years old, took part in this study. The data were collected through the test ADAPE Assessment of Learning Difficulties in Writing. Results: Results revealed that most participants agglutinate is below the average of hits. Conclusion: The institutional experience provides cognitive damage to sheltered children, particularly in language development. KEY WORDS: Learning. Handwriting. Institutionalization. REFERÊNCIAS 7. Marturano EM, Parreira VLC. 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ARTIGO ORIGINAL Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca; Thiago da Silva Gusmão Cardoso; Mauro Muszkat; Orlando Francisco Amodeo Bueno RESUMO – Objetivo: Esse trabalho busca analisar a associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas, e os problemas de comportamento in fantil, avaliados pela EACI-P, bem como as inter-relações entre esses problemas de com portamento, desempenho e a inteligência estimada das crianças. Método: Trata-se de um estudo transversal com a avaliação do comportamento por meio de escala padronizada, comparação entre as idades e análise de associação entre as variáveis do instrumento (EACI-P) segundo classificação do professor. Resultados: Os resultados da avaliação dos professores quanto à presença ou não de problemas de comportamento nas 84 crianças avaliadas revelam que 7,9% (7) crianças apresentam Hiperatividade/Problema de Conduta, 2,2% (2) crianças apresentam um nível abaixo do esperado para sua idade e nível de es colarização no que se refere ao Funcionamento Independente/Socialização Positiva, 13,5% (12) apresentam Inatenção, 5,6% (5) têm sintomas de Neurotismo/Ansiedade e 1,1% (1) vivencia um processo de Socialização Negativa. O desempenho foi associado aos escores de desatenção e hiperatividade. A velocidade de execução foi associada à socialização negativa e o escore de QI foi negativamente correlacionado com todas as variáveis com portamentais, exceto funcionamento independente. Conclusão: É possível por meio da aplicação da EACI-P obter dados para compreender o comportamento e a aprendizagem da criança, fundamentando intervenções precoces. Comportamento, desempenho acadêmico, velocidade de execução e inteligência foram fatores de risco ou proteção para aprendizagem, caso estejam preservados ou prejudicados. A relação professor-aluno-escola é fundamental para o desenvolvimento psicossocial da criança, a partir da mediação dessa tríade podemse evitar problemas de aprendizagem, comportamentos e relacionamentos interpessoais. UNITERMOS: Comportamento. Criança. Aprendizagem. Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca – Pedagoga, Psicopedagoga, Mestre em Ciências da Saúde da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/SP). Thiago da Silva Gusmão Cardoso – Psicólogo, Mestrando em Educação e Saúde na Infância e Adolescência UNIFESP/Guarulhos. Mauro Muszkat – Neuropediatra da UNIFESP/SP, Coor denador do Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil/CPN. Orlando Francisco Amodeo Bueno – Chefe da Disci plina de Psicobiologia/ UNIFESP/SP. Correspondência Maria Fernanda B. Coelho da Fonseca Rua Ernesto de Oliveira, 400 apto 41B – Vila Mariana – São Paulo, SP, Brasil – CEP 04116 170 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 226 Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P mais específica, já que nos critérios diagnósticos de muitos transtornos psiquiátricos está pre sente a necessidade de que o comportamento seja observado ou se manifeste em mais de um contexto, clínico, familiar e escolar, por exemplo. Embora, o EACI-P apresente características psi cométricas muito favoráveis no que se refere à medida da percepção do professor quanto ao comportamento da criança na sala de aula, não deve ser utilizada como instrumento único de diagnóstico. O comportamento apresentado pela criança no ambiente escolar deve ser bastante obser vado durante as atividades, pois pode ser por esse caminho que possibilita uma investigação mais precisa de uma provável dificuldade ou transtorno de aprendizagem. Comportamentos desatentos, impulsivos, agressivos, hiperativos, depressivos entre outros determinam muitas vezes uma condição, que por meio de interven ções pode ser superado. Além disso, a visão do professor sobre o comportamento do aluno constrói ou destrói uma condição, portanto, é fundamental que o profissional da educação mantenha a sensibilidade única sobre cada criança, independente de seu status social, situa ção familiar e condições de desenvolvimento, pois o importante é que consiga em seus olhares e ações motivar seus alunos para o aprendizado. Pesquisa realizada por Santos e Graminha12, em uma escola Pública Estadual no interior de São Paulo, aponta que o problema de com portamento representa uma forte condição de risco para problemas de aprendizagem e que o trabalho com crianças com dificuldades de aprendizagem deve considerar aspectos ligados ao comportamento. Manifestam ainda em seus estudos que, na escala preenchida por pais e professores, professores discriminam melhor, e aponta para a forte associação entre dificuldades de aprendizagem e comportamento. Concluíram que os professores avaliam melhor problemas de comportamento do que baixo rendimento acadê mico dos alunos, tendo uma alta sensibilidade para detectar crianças com problemas emocio nais/comportamentais. Ainda no mesmo estudo INTRODUÇÃO A Escala de Avaliação do Comportamento Infantil para o Professor (EACI-P) é um ins trumento individual de preenchimento pelo professor, que fornece uma estimativa do fun cionamento da criança na escola em relação a cinco dimensões diferentes de comportamentos, sendo aplicadas para crianças de 4 a 14 anos. A construção da escala partiu de um amplo grupo de itens obtidos da Conners Teacher Rating Scale – CTRS-391, ADDH – Comprehensive Teacher Rating Scale – ACTeRS2 e dos critérios diagnósticos do DSM-III3 e DSM-III-R4 da American Psychiatric Association para os transtornos infantis da atenção com ou sem hiperatividade. No Brasil, o instrumento foi adaptado e nor matizado por Brito5 numa amostra de 1.608 crian ças, de ambos os sexos, da região metropolitana do Rio de Janeiro, demonstrando sensibilidade na identificação de problemas de comportamen to compatíveis com condições psiquiátricas des critas no DSM-III-R4. Novos estudos foram con duzidos na década de 90 por Brito et al.6, desta vez numa amostra composta por 2.082 crianças, com média de idade de 11,2 anos, sendo 62,4% do sexo feminino, frequentando escolas do Rio de Janeiro e revelou a alta confiabilidade do ins trumento, correlação teste re-teste de 0,7. Desde então, o instrumento vem sendo aplicado em várias pesquisas no país, servindo como uma im portante escala de avaliação no diagnóstico dife rencial de transtornos psiquiátricos que cursam o desenvolvimento infantil, como o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e Transtornos do Comportamento Disruptivo7-11. A Escala foi desenvolvida para fins de pes quisa e triagem em serviços clínicos e psicope dagógicos, como instrumento de auxílio a profis sionais e pesquisadores na compreensão de algumas dimensões importantes do comporta mento da criança. A ideia subjacente à utilização da escala é de que a informação obtida por meio da visão do professor é fundamental para todo o processo de avaliação, diagnostico e monito ramento do tratamento. A escala pode também ser utilizada para uma investigação nosológica Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 227 Fonseca MFB et al. concluem que o baixo rendimento acadêmico foi mais frequente entre meninos, e as meninas com alto rendimento. Sugerem, ainda, que as crian ças que apresentam baixo rendimento acadêmi co estão em desvantagem de desenvolvimento em relação às crianças com alto rendimento, uma vez que no baixo rendimento acadêmico foram maiores: a incidência de crianças com desem penho escolar inferior ao esperado, o número de crianças com inteligência abaixo da média ou intelectualmente deficientes e o número de crianças com resultados visomotores abaixo do esperado para a idade. Barra et al.13, analisando a opinião dos pro fessores sobre o rendimento acadêmico, o com portamento de escolares e a necessidade de ser viços especializados por não estarem respondendo às demandas da escola, concluíram que os profes sores avaliam melhor problemas de comportamen to do que baixo rendimento acadêmico dos alunos, tendo alta sensibilidade para detectar crianças com problemas emocionais/comportamentais. Machado et al.14, em pesquisa focalizando a sala de aula e a avaliação feita pelos profes sores, concluíram que o grupo de crianças com dificuldades de aprendizagem apresentava mais problemas de comportamento, principalmente ligados à externalização, reforçando a ideia de que as crianças que apresentam dificuldades para aprender também são avaliadas como tendo mais problemas comportamentais. Ainda D´Abreu e Marturano15, em um levan tamento na literatura de estudos prospectivos e longitudinais investigando a associação entre problemas de comportamento externalizantes e baixo rendimento escolar no Ensino Fundamen tal, sugerem a influência de variáveis anteceden tes como condições adversas na família e baixo nível socioeconômico, e indicam que a associa ção traz prognóstico ruim para as crianças, como comorbidades com transtornos psiquiátricos, posteriores problemas acadêmicos e de compor tamento anti-social, evidenciando a situação de risco psicossocial em que se encontram. Para Ferreira16, em seu artigo de revisão sobre autoconceito e desempenho escolar, concluiu que todos os onze artigos revisados encontraram uma correlação positiva entre autoconceito e de sempenho escolar, ou seja, crianças com desem penho acadêmico satisfatório tendem a ter um bom autoconceito e aquelas com desempenho escolar ruim tendem a apresentar autoconceito diminuído. Peixoto17 no seu estudo demonstra que as va riáveis cognitivas (Q.I e fator “g” de inteligência) influenciam os problemas de aprendizagem e de comportamento. Os problemas de aprendizagem e de comportamento de acordo com a percepção dos professores foram subdivididos em doze categorias distribuídas conforme os aspectos avaliados: 1) aspectos mais ligados à cognição (raciocínio, atenção e memória); 2) aspectos mais ligados a aprendizagem (cálculo, leitura -escrita e motivação); 3) aspectos mais ligados ao comportamento perturbador em sala de aula (hiperatividade, indisciplina e oposição); e 4) aspectos mais ligados ao comportamento não perturbador (autoconfiança, inibição e apatia). Os resultados de Peixoto17 revelam que a dife rença nas médias das variáveis cognitivas entre os grupos de alunos referidos pelos professores como sem problemas ou com problemas nos doze indicadores de aprendizagem-comportamento são sempre favoráveis aos alunos do grupo sem problemas, com exceção das categorias indisci plina e autoconfiança. Em síntese, no estudo de Peixoto17, a percep ção dos professores é consistente com os resulta dos obtidos nas variáveis cognitivas, pois os alu nos referidos pelos professores sem problemas tendem a obter melhores resultados nas variáveis cognitivas. Outro achado interessante é que a diferença nas médias é maior nas categorias relativas à cognição-aprendizagem, sendo mais elevada no conjunto dos indicadores relativos à cognição (raciocínio, atenção e memória) do que na aprendizagem propriamente dita (leitura -escrita, cálculo e motivação). No estudo realizado por Miranda-Casas et al.18, crianças com TDAH e com dificuldades de aprendizagem da matemática solucionaram menos problemas da vida real e realizaram Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 228 Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P operações aritméticas mais lentamente em com paração ao grupo controle. Para Simões19, crian ças com TDAH, principalmente com déficits de prejuízo atencional, tendem a apresentar escores mais baixos nos códigos e procurar símbolos no WISC-III, por conta de uma velocidade de processamento mais baixa, apresentando um desempenho mais lentificado e não necessaria mente incapacidade de realização da tarefa. Des taca-se, desta forma, a necessidade de medidas de velocidade de execução de tarefas ou confor me o seu nome mais conhecido, velocidade de processamento para identificação do TDAH e de outras dificuldades de aprendizagem, como da matemática, leitura e escrita. Para Cunha20, a velocidade de processamento reflete a velocidade psicomotora e mental, sendo importantes medidas de desempenho em testes a serem consideradas no psicodiagnóstico. Esse trabalho busca analisar a associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas, e os problemas de com portamento infantil, avaliados pela EACI-P, bem como as inter-relações entre esses problemas de comportamento, desempenho e a inteligência estimada das crianças. instrumento, porém o preenchimento ocorreu de maneira individualizada, sem a participação da psicóloga, orientadora ou pedagoga da escola. Foram critérios para seleção dos professores: que os mesmos fossem o regente da sala e conhe cessem a criança por pelos menos dois meses. Participantes Participaram do estudo 84 crianças, com idades entre 6 e 12 anos, média de 8,95 anos (dp=2,0) de uma Escola Pública Municipal na zona Sul de São Paulo, sendo 43,8% das crianças do sexo masculino. Instrumentos Foi utilizada como principal instrumento a escala de Avaliação do Comportamento Infantil para o Professor – EACI-P: escala preenchida pelo professor composta de 62 itens que avaliam o comportamento da criança em cinco dimen sões – Hiperatividade/Problema de Conduta, Funcionamento/Independência/Socialização Positiva, Inatenção, Neurotismo/Ansiedade e Socialização Negativa. A escala apresenta uma seção para avaliação do desempenho acadêmico (bem abaixo, abai xo, médio, acima e bem acima) e velocidade de execução das atividades (lento, médio e rápido), sempre considerando a criança em relação à turma, questões referentes à repetência, nível de compatibilidade da criança com a série, leitura, ditado e aritmética. O EACI-P permite também a coleta de informações descritivas sobre com portamentos relevantes, atendimentos terapêu ticos realizados, indicação de necessidades de encaminhamento e/ou atendimentos, interesses de estudos e dados sobre problemas de aprendi zagem na família da criança. São sintomas avaliados pelo instrumento conforme os seus cinco fatores/dimensões: a) FATOR I - Hiperatividade/Problema con duta: Constantemente se mexe (mesmo sentado); emite sons ou ruídos constan temente; pedido tem que ser imediata mente atendido (facilmente frustrável); irrequieto, hiperativo, excitável, impul MÉTODO Trata-se de um estudo transversal com a ava liação do comportamento por meio de escala pa dronizada, comparação entre as idades e análise de associação entre as variáveis do instrumento (EACI-P) e o desempenho escolar e velocidade de execução da criança, segundo classificação do professor. Procedimentos A avaliação consistiu de duas etapas. Na primeira etapa, foi avaliado o coeficiente de in teligência (Q.I) estimado das crianças, obtido através da escala Weschler (Wisc-III), conside rando apenas o subteste de vocabulário e cubos, o que determina um Q.I estimado. Na segunda etapa, foi avaliado o comportamento das crianças por meio da escala EACI-P. Os professores foram orientados sobre o preenchimento adequado do Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 229 Fonseca MFB et al. triste; chora com frequência e facilidade; isola-se das outras crianças; submissa, tí mida e medrosa. e) FATOR V - Socialização Negativa: Parece não ser aceita pelo grupo; não tem espírito esportivo; parece não ter liderança; não se relaciona bem com o sexo oposto; não se re laciona bem com a criança do mesmo sexo. sivo, mal humorado; perturba colegas; provoca confusões; humor muda drasti camente com rapidez; matreiro, se faz de esperto, destrutivo, mente, tem explosões de raiva, comportamento imprevisível; desafiador, atrevido, excessiva exigência de atenção; provoca outras crianças ou interfere com as suas atividades; teimoso, sempre mudando de atividade, grita em sala; dificuldade em esperar a sua vez, sempre correndo ou pulando, frequente mente responde antes que se complete a pergunta; tem dificuldade em brincar quieto, fala excessivamente, frequente mente interrompe ou se intromete nas atividades dos outros; frequentemente perde objetos de uso na escola e em casa (ex brinquedos, livros); participa das ta refas que envolvem perigo sem considerar as possíveis consequências, tenta envol ver o outro em confusão, começa briga sem nenhum motivo, ridiculariza outro de modo malicioso. b) FATOR II - Funcionamento Independen te/Socialização Positiva: trabalha de for ma independente, persistem em tarefas por um bom tempo, completa deveres com pouca assistência; segue instruções simples corretamente; funciona bem em sala de aula, executa corretamente uma sequência de instruções, comporta-se bem com os colegas; comunicação verbal clara e concatenada, comunicação verbal não correta, compreende normas e regras so ciais; sabe fazer novos amigos, enfrenta situações confiantes. c) FATOR III - Inatenção: desatento, não termina o que começa, dificuldades em se concentrar nos deveres escolares; difi culdades em fixar em uma brincadeira ou jogo; dificuldades em organizar suas atividades e deveres; muitas vezes parece não prestar atenção ao que está sendo dito a ele. d) FATOR IV - Neurotismo/Ansiedade: extre mamente sensível; extremamente sério ou Análise dos dados Foi utilizado para análise dos dados o pro grama estatístico SPSS versão 15.0 (Statistical Package for the Social Sciences). Para análise dos dados categoriais, foram aplicados os testes do Qui-quadrado e correlação V de Cramer. Na análise dos dados numéricos, foi utilizada a ANOVA (Análise de Variância) por idade, para determinar se havia diferenças nos fatores do EACI-P que fossem sensíveis à idade da criança e correlação de Sperman entre o QI estimado do WISC-III e os fatores do EACI-P. As variáveis do instrumento referentes ao ponto de corte que eram variáveis escalares foram convertidas no programa em variáveis categoriais, através da dicotomização do valor do ponto de corte nas categoriais 0-1 (0 = abaixo do ponto de corte e 1= acima do ponto de corte), permitindo a com paração com outras varáveis do instrumento. As variáveis que foram analisadas por meio do teste de associação para variáveis categoriais foram velocidade (lento, médio e rápido) e desempenho (bem abaixo, abaixo, médio, acima e bem acima). RESULTADOS Os resultados da avaliação dos professores quanto à presença ou não de problemas de comportamento, nas 84 crianças avaliadas, revelam que 7,9% (7) apresentam Hiperativi dade/Problema de Conduta, 2,2% (2), um nível abaixo do esperado para sua idade e nível de escolarização no que se refere ao Funcionamento Independente/Socialização Positiva, 13,5% (12), Inatenção, 5,6% (5) têm sintomas de Neurotis mo/Ansiedade e 1,1% (1) vivencia um processo de Socialização Negativa. A análise de como esses problemas de comportamento influencia Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 230 Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P a velocidade de execução da criança e seu de sempenho escolar podem ser visualizados nas Tabelas 1 a 4. Os resultados das Tabelas 1 e 2 revelam que somente a socialização negativa está associada significativamente à velocidade de execução das crianças (χ² = 8,98; significante para p < 0,01; V de Cramer = 0,34), explicando 11,6% dessa variação. Os resultados das Tabelas 3 e 4 demonstram que o desempenho da criança é significativa mente associado aos fatores do EACI-P de Ina tenção (χ² = 30,60; significante para p < 0,01; V de Cramer = 0,61) e Funcionamento Independente/ Socialização Positiva (χ² = 9,52; significante para p<0,05; V de Cramer = 0,35). A Inatenção é o fator que mais explica as variações no de sempenho das crianças, sendo responsável por 37,2% dessa variação, seguido do nível de Fun cionamento Independente/Socialização Positiva que explicam 12,5% da variação. Os resultados da Tabela 5 demonstram que crianças de 6 a 12 anos, quando comparadas entre si nos fatores do EACI-P, somente apresen tam diferenças estatisticamente significativas no fator Funcionamento Independente/Socialização Positiva (p<0,05), sendo melhor o desempenho das crianças mais velhas. Quando correlacionados os fatores do EACI-P entre si e com o Q.I estimado do WISC-III, obser va-se que o Q.I apresenta correlações negativas e significativas com a maior parte dos fatores do EACI-P, exceção do fator Funcionamento/Inde pendência. Todavia, todas as correlações entre o Q.I e os fatores são pequenas, mas já demons tram que conforme o Q.I aumenta num sentido, os fatores crescem no sentido oposto. A correla ção mais alta é entre os fatores Hiperatividade e Inatenção, sendo está correlação significativa e positiva (ρ = 0,79 e p<0,01). Existem também correlações moderadas, estatisticamente signifi Tabela 1 – Relação entre Velocidade e os fatores Hiperatividade, Inatenção e Socialização Negativa do EACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer. Hiperatividade (n = 7)¹ Velocidade Presença nº (%) Ausência nº (%) Inatenção (n = 12)² Presença nº (%) Socialização Negativa (n = 1)*³ Ausência nº (%) Presença nº (%) Ausência nº (%) Lento 1 (12,5%) 7 (87,5%) 1 (12,5%) 7 (87,5%) ___ 8 (100%) Médio 6 (9,2%) 59 (90,8%) 11 (9,6%) 54( 55,4%) ___ 63 (100%) Rápido ___ 8 (100%) ___ 8 (100%) 1 (12,5%) 7 (87,5%) 7 (8,6%) 74 (91,4%) 12 (14,8%) 69 (85,2%) 1 (1,3%) 78 (98,7%) Total ¹ χ² = 0,93; p = 0,62; V de Cramer = 0,10; ² χ² = 1,65; p = 0,43; V de Cramer = 0,14; *³ χ² = 8,98; significante para p < 0,01; V de Cramer = 0,34 (11,6%). Tabela 2 – Relação entre Velocidade e os fatores Funcionamento/Independência e Neurose/Ansiedade do IACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer. Velocidade Funcionamento/Independente (n = 2)¹ Neuroticismo/Ansiedade (n = 5)² Presença nº (%) Ausência nº (%) Presença nº (%) Ausência nº (%) Lento ___ 8 (100%) ___ 8 (87,5%) Médio 2 (3,1%) 63 (96,9%) 4 (6,2%) 61 (93,8%) ___ 8 (100%) 1 (12,5%) 7 (87,5%) 2 (2,5%) 79 (97,5%) 5 (6,2%) 76 (93,8%) Rápido Total ¹ χ² = 0,50; p = 0,62; V de Cramer = 0,07; ² χ² = 1,65; p = 0,43; V de Cramer = 0,14. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 231 Fonseca MFB et al. cativas e positivas entre Inatenção e Socialização Negativa (ρ = 0,58 e p<0,01) e entre Neurose/ Ansiedade e Socialização Negativa (ρ = 0,66 e p<0,05) – Tabela 6. DISCUSSÃO Os resultados referentes à frequência de problemas de comportamento na amostra de crianças estudadas são diferentes das frequên Tabela 3 – Relação entre Desempenho e os fatores Hiperatividade, Inatenção e Socialização Negativa do EACIP, através do teste qui-quadrado e V de Cramer. Desempenho Hiperatividade/conduta (n = 7)¹ Inatenção (n = 12)*² Socialização Negativa (n = 1)³ Presença nº (%) Ausência nº (%) Presença nº (%) Ausência nº (%) Presença nº (%) Ausência nº (%) ___ 7 (100%) 1 (14,3%) 6 (85,7%) ___ 7 (100%) Acima 1 (3,8%) 25 (96,2%) 1 (3,8%) 25 (96,2%) ___ 25 (100%) Médio 2 (6,2%) 30 (93,8%) 2 (6,2%) 30 (93,8%) 1 (3,1%) 31 (96,9%) Abaixo 3 (25%) 9 (75%) 4 (3,3%) 8 (66,7%) ___ 11 (100%) Bem Acima Bem Abaixo 1 (25%) 3 (75%) 4 (100%) ___ ___ 4 (100%) Total 7 (8,6%) 74 (91,4%) 12 (14,8%) 69 (85,2%) 1 (1,3%) 78 (98,7%) ¹ χ² = 7,07; p = 0,13; V de Cramer = 0,29; *² χ² = 30,60; significante para p < 0,01; V de Cramer = 0,61 (37,2%); ³ χ² = 1,48; p= 0,82; V de Cramer = 0,13. Tabela 4 – Relação entre Desempenho e os fatores Funcionamento/Independência e Neurose/Ansiedade do EACIP, através do teste χ² (qui-quadrado) e V de Cramer. Desempenho Funcionamento/Independente (n = 2)*¹ Presença nº (%) Ausência nº (%) Neuroticismo/Ansiedade (n = 5)² Presença nº (%) Ausência nº (%) Bem Acima ___ 7 (100%) ___ 7 (100%) Acima ___ 26 (100%) ___ 26 (100%) Médio 1 (3,1%) 31 (96,9%) 4 (12,5%) 28 (87,5%) Abaixo ___ 12 (100%) ___ 12 (100%) Bem Abaixo 1 (25%) 3 (75%) 1 (25%) 3 (75%) Total 2 (2,5%) 79 (97,5%) 5 (6,2%) 76 (93,8%) *¹ χ² = 9,52; significante para p<0,05; V de Cramer = 0,35 (12,5%); ² χ² = 7,62; p = 0,10; V de Cramer = 0,30. Tabela 5 – Análise do desempenho de crianças de 6 a 12 anos nos fatores do EACIP, utilizando a ANOVA. Fatores N Min. Max. Média Dp P Hiperatividade 81 ___ 81 17,56 22,04 0,86 Inatenção 81 ___ 18 5,16 6,1 0,58 Funcionamento/Independência 81 ___ 36 17,53 12,75 0,03* Neuroticismo/Ansiedade 80 ___ 21 3,93 4,33 0,11 Socialização Negativa 79 ___ 10 1,9 2,82 0,52 * significante para p < 0,05. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 232 Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P Tabela 6 – Correlação de Spearman entre os fatores do EACIP e o QI estimado do WISC. Variáveis WISC HIPER INATE FUNIND NEUSE SONE WISC 1,00 - 0,30** -0,38** -0,01 -0,22* -0,28* HIPER -0,30** 1,00 0,79** 0,16 0,41** 0,46** INATE -0,38** 0,79** 1,00 0,11 0,50** 0,58** -0,01 0,16 0,11 1,00 0,26* 0,04 FUNIND NEUSE -0,22* 0,41** 0,50** 0,26* 1,00 0,66* SONE -0,28* 0,46** 0,58** 0,04 0,66* 1,00 Legenda: WISC – QI estimado do WISC; HIPER - Hiperatividade; INATE – Inatenção; FUNIND – Funcionamento/Independência; NEUSE – Neurose/Ansiedade; SONE – Socialização Negativa. * significativa para p<0,05; **significativa para p<0,01. cias encontradas em outros estudos8,10. No es tudo de Brito et al.8, que avaliou 402 crianças do Rio de Janeiro, por exemplo, verificou-se que 11,9% das crianças apresentaram Inatenção e 4,2% Hiperatividade/Problemas de conduta, enquanto que, no nosso estudo com crianças da cidade de São Paulo, as frequências para esses domínios foram de 13,5% e 7,9%, respectiva mente. As médias também das crianças por nós avaliadas nos instrumentos foram diferentes, enquanto que no estudo de Brito et al.8 as médias foram: Hiperatividade/Problemas de conduta (M=17,5), Inatenção (M=5,1), Funcionamento Independente/Socialização Positiva (M=17,5), Neurotismo/Ansiedade (M=5,0) e Socialização Negativa (M=2,6); no presente estudo, elas foram: Hiperatividade/Problemas de conduta (M=12,7), Inatenção (M=3,3), Funcionamento Independente/Socialização Positiva (M=24,6), Neurotismo/Ansiedade (M=3,9) e Socialização Negativa (M=1,9) (Tabela 5). Esses achados re velam que existem diferenças para a frequência de problemas de comportamento entre crianças do Rio de Janeiro e São Paulo, se significativas ou não, depende da realização de outros estudos, inclusive as diferenças encontradas relativas às médias para as subescalas do EACI-P apontam para a necessidade de normas específicas para a população de crianças do Estado de São Paulo. Os resultados referentes à velocidade de execução (Tabelas 1 e 2) de que somente a so cialização negativa está associada a esse fator, explicando 11,6% da sua variação, permite hi potetizarmos que o fato da criança apresentar relacionamentos sociais pobres e apresentar características de maior passividade frente ao grupo, influencia o modo pelo qual ela se adapta às exigências ambientais escolares em amplos aspectos desde as demandas de socialização até as acadêmicas. Neste sentido, Speakman et al.21, por exemplo, apontam que entre os fatores de risco para problemas de aprendizagem estão os relacionamentos sociais pobres. Entretanto, a questão é como a socialização negativa está envolvida no desenvolvimento de problemas de aprendizagem. Com base na análise da Tabela 3 observamos que a socialização negativa não influencia o desempenho acadêmico, mas sim a velocidade de execução, indicando o meca nismo explicativo que pode estar associado a está variável. Outro achado interessante é de que houve correlação moderada, estatisticamente signifi cativa e positiva entre Inatenção e Socialização Negativa (Tabela 5). Sabemos que crianças com TDAH tipo predominante desatento apresen tam desempenho mais lentificado conforme Simões19 e Miranda-Casas et. al.18 e que crianças com TDAH também tendem a apresentar mais problemas de socialização e prejuízos nas habi lidades sociais22. O fato da Inatenção ser o fator mais expres sivo nas variações no desempenho das crianças, sendo responsável por 37,2% dessa variação, seguido do nível de Funcionamento Indepen dente/Socialização Positiva que explica 12,5% Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 233 Fonseca MFB et al. da variação, foram achados que permitem al gumas considerações. Primeiro como a atenção traduz, de maneira geral, a habilidade da criança em manter o interesse em determinada tarefa ou ideia, inclusive manipulando suas próprias distrações23, sendo requisito para a execução de qualquer tarefa escolar, o seu prejuízo im pacta de maneira geral o desempenho escolar da criança. Isso é especialmente observado em crianças com TDAH cujo perfil de inatenção faz com que tenham dificuldades de atenção seletiva, sustentada, de organização, inibição e integração no curso da execução de tarefas, por exemplo, escolares24,25. Outro dado é que há influência recíproca entre o desenvolvimento emocional e cognitivo, sendo possível uma associação entre problemas comportamentais e desempenho acadêmico12. Muitas vezes as necessidades da criança de maior autonomia e independência não são ade quadamente atendidas pelo ambiente escolar e familiar, fazendo com que a mesma não encontre a motivação e confiança necessárias para o de senvolvimento de um apropriado autoconceito sobre suas próprias capacidades de aprendiza gem e desempenho acadêmico26. As correlações entre o Q.I estimado do WISC-III e os fatores do EACI-P corroboram os achados do estudo de Naglieri et al.27. Nesse estudo que bus cou correlacionar os escores no WISC-III com as escalas Conners, versão pais e professores, e Continuous Performance Test, aplicado a 117 crianças de 6 a 16 anos, foram demonstradas no WISC-III correlações significativas com a escala Conners versão professores, sendo a correlação mais importante encontrada para o fator Ina tenção (r = -0,37), semelhante ao nosso estudo a correlação para este fator também foi pequena e significativa (ρ = -0,38). Como o Q.I estimado do WISC-III apresentou correlações negativas e significativas com a maior parte dos fatores do EACI-P, traçamos a hipótese que a reserva cognitiva traduzida no fator (“G”) é uma medida de proteção no que se refere ao desenvolvimento de problemas de comportamento na infância, já que eles tendem a crescer em sentidos opostos. Nesse sentido, a literatura tem revelado que crianças com Q.I acima da média têm menores taxas de morbidade psiquiátrica, enquanto que crianças com Q.I abaixo da média são mais vul neráveis para desenvolvimento de transtornos de comportamento, apresentando, assim uma maior prevalência dos mesmos28. CONCLUSÃO Os resultados demonstram que a Escala de Comportamento Infantil para o Professor (EACI-P) apresenta dados importantes para compreender o comportamento e a aprendizagem da criança no ambiente escolar, auxiliando o professor nas suas funções pedagógicas. Portanto, enquanto instrumento estruturado, a escala favorece a com preensão do professor em relação às variáveis en volvidas no processo de ensino-aprendizagem, permitindo aos profissionais da educação refletir sobre suas observações e registros, remetendo -as a processos de intervenção a curto, médio e longo prazo. O estudo corrobora outros achados da lite ratura sobre a influência dos problemas de com portamento no desempenho acadêmico de crian ças em processo de escolarização, demonstrando as inter-relações entre comportamento, desempe nho acadêmico, velocidade de execução e inteli gência, apontando-os também como importantes fatores de risco ou proteção para o desenvolvi mento típico da criança e da sua aprendizagem, dependendo dos mesmos estarem preservados ou comprometidos. Concluímos que este estudo indica a neces sidade de um cuidado especial quanto à obser vação do comportamento da criança no ambiente da aprendizagem, oportunizando assim inter venções mais precoces e com validade ecológica. Entendemos que as relações professor-aluno-es cola são fundamentais para o desenvolvimento cognitivo e psicossocial da criança, e quando adequadamente mediados, podem evitar a ins tauração de problemas de aprendizagem, com portamentais e interpessoais. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 234 Análise da associação entre o desempenho acadêmico, a velocidade de execução das tarefas e o comportamento da criança a partir da EACI-P SUMMARY Analysis of association between the academic performance, the speed of execution of tasks and behavior of children from EACI-P Objective: The aim of this study was to analyze the association between academic achievement, assessed by Child Behavior Scale for Teacher (EACI-P), as well as to correlate it to behavioral problems, speed of performance and IQ score. Methods: This is a cross-sectional study analysing EACIP Inventory answers through standardized comparison to neuropsychological variables in 84 children. Results: Hyperactivity and conduct problems prevailed in 7.9% (7 cases) children, 2.2% of cases showed difficulties in Independent Functioning / Positive Socialization, 13.5% revealed inattention, 5.6% (5 cases) showed symptoms of neuroticism / anxiety and 1.1% (1 case) of cases ex periences a negative socialization. Global performance was associated with inattention scores and positive socialization, whereas hyperactivity symptoms were correlated to inattention. Speed of performance was associated with negative socialization and IQ score was negatively correlated to all behavioral variables except independent functioning. Conclusion: It is possible through the application of EACI-P to obtain data to understand behavior and learning correlations, supporting early intervention. Behavior, speed of performance and intelligence could be either risk or protective factors for learning if they are preserved or impaired. Such data suggest that teacher-student interface is crucial to understand psychosocial development of children and could give support to positive approaches to face learning, behavior and interpersonal problems. KEY WORDS: Behavior. Child. Learning. REFERÊNCIAS 6. Brito GN, Pinto RC, Lins MF. A behavioral as sessment scale for attention deficit disorder in Brazilian children based on DSM-III-R criteria. J Abnorm Child Psychol. 1995;23(4):509-20. 7. Andrade ER, Scheuer C. Análise da eficácia do metilfenidato usando a versão abreviada do questionário de Conners em transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Arq Neu ropsiquiatr. 2004;62(1):81-5. 8. Brito GN, Pereira CCS, Santos-Morales TR. Behavioral and neuropsychological correlates of hyperactivity and inattention in Brazilian school children. Develop Med Child Neurol. 1999;41:732-9. 9. Silva RR, Alpert M, Pouget E, Silva V, Trosper S, Reyes K, et al. A rating scale for disruptive behavior disorders, based on the DSM-IV item pool. 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Trabalho realizado na Universidade Federal de São Pau lo - SP - Disciplina de Psicobiologia - CPN - NANI - São Paulo , SP, Brasil. el aprendizaje de matemáticas en niños con trastorno por déficit de atención e hiperacti vidad. Rev Neurol Clín. 2006;42(2):163-70. Simões MR. Utilizações da WISC-III na ava liação neuropsicológica de crianças e adoles centes. In: Simões MR, ed. Aferição de testes neuropsicológicos para a população portu guesa. Coimbra:Universidade de Coimbra; 2002. Cunha J. Psicodiagnóstico V. Porto Alegre: Artmed;2002. Speakman NJ, Herman KL, Vogel SA. Risk and resilience in individuals with learning disa bilities: a challenge to the field. Learning Di sabilities: Research & Practice 1993;8(1):59-65. Pardos, Fernadez-Jaen A, Fernandez-Mayo ralas D. Habilidades sociales en el trastorno por déficit de atención/hiperactividad. Rev Neurol. 2009;48(2):107-11. Muszkat M, Mello CB. Neuropsicologia do desenvolvimento e suas interfaces. São Paulo: All Print;2008. Barkley RA. 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Psicopedagogia 2011; 28(87): 226-36 236 Reflexões sobre Psicopedagogia , estresse e distúrbios do sono do professor ARTIGO original Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor Luiza Elena Ribeiro do Valle; Rubens Reimão; Sigmar Malvezzi RESUMO – Introdução: A Psicopedagogia se ocupa dos fatores envolvidos na aprendizagem. Os sintomas de estresse e os distúrbios do sono também repercutem na aprendizagem, especialmente quando esses transtornos ocorrem com o professor, o responsável pelo processo de ensino. Objetivo: O objetivo desta pesquisa é investigar o tipo de sintomas de estresse de professores da rede pública de Poços de Caldas. Método: A pesquisa, do tipo exploratório descritivo, estudou uma população de conveniência de 165 professores de Poços de Caldas, dos quais 59% apresentavam estresse e 46,7% eram maus dormidores, evidenciando associação entre os sintomas de estresse e o sono. Por meio do Questionário de Fatores de Estresse dos Professores (QFEP-Valle & Malvezzi), foram investigados os aspectos qualitativos do estresse dos professores. Resultados: Os fatores predominantes que estressam os professores são: dupla jornada de trabalho e multiplicidade de tarefas, salário, barulho nas salas de aula e dificuldades nas relações família-escola. Conclusões: Este estudo revela a necessidade de pesquisas e atenção ao professor para prevenir consequências prejudiciais do estresse e dos distúrbios do sono. UNITERMOS: Estresse psicológico. Sono. Transtornos do sono. Docen tes. Saúde do trabalhador. Luiza Elena Ribeiro do Valle – Psicóloga, Psicopedagoga, Mestra em Psicologia Educacional (PUC), Doutora em Psicologia Social (USP), São Paulo, SP, Brasil. Rubens Reimão – Médico Neurologista, Professor Livre Docente de Neurologia Divisão de Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Líder do Grupo de Pesquisa Avançada em Medicina do Sono – HCFMUSP, São Paulo, SP, Brasil. Sigmar Malvezzi – Psicólogo, Professor Doutor do De partamento de Psicologia Social e do Trabalho (PST/ USP), São Paulo, SP, Brasil. Correspondência Luiza Elena Ribeiro do Valle Rua Goiás, 77 – Poços de Caldas, MG, Brasil – CEP: 35701-005 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 237 Valle LER et al. O estresse e os distúrbios do sono são ameaças graves, porque causam sofrimento e repercutem em toda a sociedade, quando o profissional é um educador, responsável por crianças e adoles centes. O estresse pode ser entendido como resultado de um ajuste entre características específicas situacionais e as reações que estas desencadeiam, nas quais o sistema nervoso simpático se coloca em alerta. Nem sempre o estresse é negativo. O estresse pode impulsionar o organismo à adaptação e, nesse caso, recebe o nome de “eustress”. O estresse negativo (distresse) ocorre quando o esforço é exagerado e prejudicial. Entretanto, uma situação estressora poderá ser ruim para um determinado indivíduo e não necessariamente para outro; a intensidade de seu impacto será maior ou menor de acordo com a avaliação que o indivíduo fizer do evento estressor. A presença e a intensidade das respostas variam e dependem da avaliação que o indivíduo fizer do evento, assim como de suas experiências prévias adquiridas para manejar tal situação. O estresse pode ocorrer em diferentes níveis, de uma forma mais transitória ou grave, e no último caso, resulta em consequências que irão afetar a saúde do indivíduo, conforme a fases em que se encontra: 1. Na fase de alerta ou alarme, ocorre uma reação principalmente biológica, o orga nismo é mobilizado para situações de emergência numa reação natural de defesa e preservação da vida, denotando alguns sintomas, como taquicardia, tensão, suor nas mãos, nos pés, palidez, insônia, esgotamento, irritação e mudança de humor2; 2. Na fase de resistência, quando o organis mo procura se restabelecer em busca de adaptação, mas se o estresse persiste, leva o sujeito à terceira fase; 3. A fase de quase exaustão é um agravamento da fase de resistência, que foi acrescentada por Lipp3 para designar o enfraquecimento do organismo; 4. A fase de exaustão se manifesta por meio do adoecimento do órgão mobilizado na INTRODUÇÃO A atividade do professor se distingue de todas as outras, pela sua natureza e pelo seu valor social. O professor tem uma função complexa, considerando que cada um dos alunos tem características únicas e necessidades muito diferentes. Conforme os conhecimentos se ampliam e o mundo se transforma por meio de inovações tecnológicas e de comunicação globalizada, as dificuldades se acumulam para o professor que precisa se adaptar a novas exigências que promovam a aprendizagem de seus alunos. A Psicopedagogia é um campo do conhecimento que se propõe a integrar conhecimentos científicos para compreender e intervir nos processos de aprendizagem humana. Amaral1 analisa a situação do psicopedagogo na media ção sujeito-escola-família e afirma que as trans formações muito rápidas do mundo moderno geraram a não permanência nos valores e indefinição dos objetivos que precisamos ou queremos alcançar: “Pais e professores sentem-se muitas vezes desorientados, não sabem ou não conseguem educar; e, de outro lado, filhos e alunos indagam o que eles podem esperar dos adultos e o que se espera deles próprios. Assim, os papeis não se estabelecem. Eles precisam de princípios norteadores para se sentir seguros, confiantes e estimulados para enfrentar os desafios”. Então, o psicopedagogo se defronta com mais esse desafio: não bastam técnicas de ensino e aprendizagem para transformar a educação em sucesso efetivo dos alunos e realização profissional dos professores! Na medida em que o estresse e os distúrbios do sono interferem no desempenho dos professores e na aprendizagem dos alunos, percebe-se uma lacuna que não vem recebendo atenção de profissionais especializados na aprendizagem e, muito menos, dos responsáveis por políticas administrativas, que dependem de relatórios e pesquisas para reger as normas educacionais de acordo com as demandas existentes. As exigências do trabalho obrigam o professor a esforços e podem comprometer o seu equilíbrio e saúde, interferindo em sua atividade de sono, também. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 238 Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor fase da resistência, ou a morte súbita que, segundo França e Rodrigues4 representa, muitas vezes, a falha dos mecanismos de adaptação. Há uma exaustão psicológica em forma de depressão e uma exaustão física, que se manifestam em doenças que podem levar à morte, conforme afirma Lipp5. O estresse provoca tensão física e psicológica, queda de capacidade intelectual, perturbações do sono, levando à fadiga, conforme explica Goldstein6. Os sinais e os sintomas mais frequentes que ocorrem em um organismo estressado, em relação ao SNC e psiquismo, são: cansaço físico e mental, nervosismo, irritabilidade, ansiedade, insônia, dificuldade de concentração, falha de memória, tristeza, indecisão, baixa autoestima, sentimento de solidão, sentimento de raiva, emotividade, choro fácil, pesadelos, depressão, isolamento, perda ou excesso de apetite, pânico. Alterações de comportamento também poderão ocorrer, como: alcoolismo, consumo de drogas ilícitas, uso dos calmantes e ansiolíticos, comportamento autodestrutivo e robotização do comportamento7. O professor enfrenta jornadas de trabalho excessivas para aumentar seu salário, burocracias e pressões de superiores e colegas, indisciplina dos alunos e falta de reconhecimento pelo trabalho, o tédio decorrente de tarefas repetitivas, além de aspectos pessoais e psicológicos que também são fatores de risco para os professores, tais como a falta de formação científica do professor, demandas múltiplas geradoras de contínua e crescente de tensão, que ainda se acentuam diante de alunos com dificuldades ou necessidades especiais8. Somam-se, ainda, os fatores ergonômicos, como o design do mobiliário escolar, iluminação das salas de aula, o isolamento acústico, o nível de ruído e temperatura do ambiente e limitações humanas, conforme preconizado pela International Ergonomics Association (IEA), segundo Sobrinho9. Segundo Reimão et al.10, frequentemente, distúrbios do sono não são diagnosticados ou tratados, apesar dos claros prejuízos que provocam. Os distúrbios do sono trazem consequências à saúde do professor e resultam em importante custo financeiro e funcional para sociedade, porque leva ao afastamento do professor de sua função primordial, em função de aumentar a vulnerabilidade ao estresse e a doenças. A ansiedade que pode surgir diante de fatores estressantes pode gerar níveis graves de insônia e evoluir para transtornos graves e crônicos, que podem incluir fragmentação do sono com múltiplos despertares e dificuldade em conciliar o sono, gerando desequilíbrio no comportamento e na saúde. Um estudo quantitativo e exploratório, com uma amostra de 52 educadores, para saber se avaliam a importância do sono dos alunos, resultou em preocupação! Apenas 6% indicaram alguma tentativa de interferir com relação à higiene do sono dos alunos, e sem sucesso, levando à conclusão de que os professores não estão preparados para prevenir e encaminhar problemas do sono, de forma que os distúrbios do sono na escola não são observados, diagnosticados e tratados, apesar dos avanços científicos11. Diante dessas constatações, surge o objetivo do presente trabalho, que é a investigação dos fatores relacionados aos sintomas de estresse e aos distúrbios do sono de professores, tendo como foco a população de professores de crianças e adolescentes do ensino público. O que se busca é desenvolver conhecimentos compreensivos da Psicopedagogia sobre esses processos sempre atuais de aprendizagem e desempenho, sugerindo a hipótese de que, já que os fatores de estresse e distúrbios do sono interferem no trabalho do professor, precisa-se conhecer e compreender quais os fatores que mais incomodam os professores, podendo resultar em prejuízo no desempenho do professor, consequentemente em sua saúde e na aprendizagem dos alunos. Aprendizagem, inserida no contexto social, pre cisa considerar as interações múltiplas, que superam as concepções propostas nas visões anteriores do aprender formal e informal. O novo enfoque precisa reconhecer as diferentes formas do pensar, sentir, viver as diversidades culturais e o dinamismo desse conjunto na realidade da Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 239 Valle LER et al. escola, que o professor lidera no contato com os alunos e familiares. no aspecto pessoal no desempenho do trabalho (Figura 1). Com relação aos fatores estressantes voltados para o ambiente de trabalho, as queixas mais fortes (peso 2) concentram-se nas colunas 3 e 8, demonstrando insatisfação com barulhos na sala e um interesse em maior participação dos familiares dos alunos no ambiente escolar (Figura 2). Finalmente, quanto aos fatores causadores de estresse em relação ao aspecto ocupacional ou administrativo, a coluna 4 se sobressai, indicando desejo de um aumento na remuneração (Figura 3). METODO Trata-se de pesquisa exploratória descritiva, qualitativa e quantitativa. Foi utilizada uma amostra de conveniência12, constituída por 165 professores da rede pública de ensino de Poços de Caldas, pré-avaliada pa ra detectar sintomas de estresse e distúrbios do sono13, que apontou que 59% dos professores apresentavam estresse, e 46,7% eram maus dormidores, evidenciando associação entre os sintomas de estresse e o sono. Neste trabalho, utilizou-se o Questionário de Fatores de Estresse do Professor (QFEP/Valle-Malvezzi)13, que foi aplicado ao grupo total de professores (que se distribuem na população avaliada numa proporção próxima da média de professores com e sem os sintomas de estresse e distúrbios do sono). As questões do QFEP-Valle/Malvezzi (Anexo 1) foram selecionadas a partir da pesquisa na busca por queixas mais frequentes dos professores, que eles consideram que contribuem para desenvolver o estresse. Os fatores potenciais de estresse se configuram neste instrumento em individuais, ambientais e organizacionais. São trinta e seis questões que avaliam como o professor se sente em relação às exigências de tarefas inerentes ao trabalho, ambiente e organização. As questões recebem pontuação de zero (0), um (1) ou dois (2) pontos para que se possa compreender o quanto cada um desses fatores interfere na atividade diária do professor, de acordo com a própria avaliação. DISCUSSÃO Os professores estão expostos a situações que alteram seu equilíbrio biopsicossocial, que geram necessidade de adaptação por parte do organismo. O professor se depara com uma grande necessidade de adaptação e de desenvolvimento de novas habilidades para absorver o ritmo e o significado de transformações, positivas ou negativas, que influenciam todos os aspectos da vida dos indivíduos e que requerem esforços físicos, psicológicos e emocionais. Esse esforço de adaptação gera o fenômeno do estresse, interligado ao processo do sono, e muito presente na contemporaneidade, sendo, portanto, um sério campo de reflexões, especialmente, porque o professor é personagem principal no palco da aprendizagem. O estresse interfere no desempenho ocupacional, nas relações sociais e no sono do professor, mas o problema tem sido ignorado na sociedade e nas instituições educacionais, em função de desconhecimento da gravidade desses transtornos e da falta de dados científicos e de instrumentos para investigação, prevenção primária, evitando o problema, ou prevenção secundária, atenuando a ação maléfica resultantes do estresse acentuado e dos distúrbios do sono e comorbidades, ou mesmo, prevenção terciária, tratando os prejuízos causados e recuperando a saúde. Os fatores individuais predominantes que estressam os professores são: dupla jornada de trabalho e multiplicidade de tarefas, segundo as RESULTADOS Conforme respondem às perguntas, os professores nos oferecem o quadro de quais os fatores que consideram mais estressantes (peso 2), a partir de uma experiência pessoal, inicialmente. Nos resultados, os professores apontam o excesso de trabalho (coluna 1 - dupla jornada de trabalho), falta de tempo para si mesmo (coluna 2) e multiplicidade de tarefas do educador (coluna 5), entre as preocupações mais intensas Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 240 Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor Anexo 1 – Questionário do Estresse do Professor (QFEP) Luiza Elena Ribeiro do Valle Sigmar Malvezzi Avalie os fatores potenciais de estresse que mais o(a) abalam e interferem em seu rendimento, atribuindo-lhes valores de 0, 1 ou 2: I - Atividades do Trabalho: 01. Longas jornadas de trabalho ( ) 02. Dupla jornada de trabalho – trabalho e tarefas do lar ( ) 03. Falta de tempo para si ( ) 04. Falta de oportunidade de atualizações profissionais ( ) 05. Multiplicidade de tarefas do educador (ler, planejar, fazer relatórios, corrigir) ( ) 06. Falta de formação compatível com as exigências ( ) 07. Dificuldades em lidar com os problemas sociofamiliares dos alunos ( ) 08. Indisciplina dos alunos ( ) 09. Falta de condições de lidar com os problemas socioculturais que se apresentam ( ) 10. Falta de valorização pessoal ( ) 11. Falta de atendimento às suas necessidades pessoais no trabalho ( ) 12. Dificuldades de relacionamento no trabalho ( ) II – Ambiente de Trabalho: 01. Salas superlotadas de alunos ( ) 02. Exposição a temperaturas inadequadas ( ) 03. Exposição a ruídos inadequados ( ) 04. Falta de recursos no ambiente de trabalho (móveis, área de recreação, biblioteca, etc.) ( ) 05. Falta de recursos tecnológicos – computadores, TV, internet, etc. ( ) 06. Falta de condições para obter resultados satisfatórios dos alunos ( ) 07. Insegurança física e psicológica ( ) 08. Falta de contato cooperativo com os familiares na escola ( ) 09. Imagem da escola mal conceituada junto à comunidade ( ) 10. Falta de orientação psicológica no trabalho ( ) 11. Falta de equipe interdisciplinar de apoio ( ) 12. Falta de lazer e atividades entre a equipe profissional ( ) III – Aspectos Administrativo/Burocrático 01. Burocratização das atividades ( ) 02. Falta de diálogo com a administração ( ) 03. Controle excessivo, tolhimento ou dificuldades com gestores e supervisores ( ) 04. Falta de remuneração satisfatória ( ) 05. Insegurança nos contratos de trabalho ( ) 06. Dificuldades para chegar ao local de trabalho ( ) 07. Exigências curriculares e metas incompatíveis com a realidade da turma ( ) 08. Tempo de dedicação exigido excessivo ( ) 09. Falta de critérios de avaliação adequados ( ) 10. Falta de campanhas educacionais de apoio junto à comunidade ( ) 11. Falta de reconhecimento administrativo do profissional ( ) 12. Falta de programas de aprimoramento profissional ( ) Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 241 Valle LER et al. do ensino, ampliar a ocorrência de agressão na escola, entre outros aspectos negativos que se refletem no clima da sala de aula e nos alunos. O estresse representa um risco bastante complexo, determinado por diferentes causas e formas de enfrentamento das situações de trabalho. Diversos fatores, como a globalização, a modernização tecnológica e o redimensionamento do quadro de trabalhadores, que provocam desestabilidade e insegurança de ação, se encontram entre os determinantes ou antecedentes mais contributivos à geração do estresse emocional nas organizações, interferindo na saúde dos tra balhadores14. O professor tem metas a cumprir como agente social, um papel que o sobrecarrega de expectativas por parte da comunidade, dos colegas, superiores ou alunos. Do professor se espera a educação dos alunos, o que significa a competência na prática de ensino para que os alunos aprendam o conteúdo programado em sua grade escolar e, ainda, implica na orientação do comportamento que a sociedade prevê para um cidadão adaptado. Se a Educação for “uma capacidade eficaz de instrumentalizar-se funcionalmente para produzir como em uma imaginária linha de montagem indivíduos pragmaticamente instruídos, em lugar de pessoas críticas e amorosamente educadas, então, talvez a educação, a escola e a sala de aulas bem mereçam os cenários de violência com que se vêem ameaçadas a conviver cada vez mais”15. Pensar no educador como um agente de in formações, simplesmente, não faz justiça ao esforço desse profissional, que diariamente lida com pessoas diferentes em plena fase de formação e que dependem de sua iniciativa, na programação, realização e avaliação das aulas, dentro ou fora da escola. Com relação ao conteúdo programático, o professor, na atualidade, encontra referências e orientações para manter em dia os próprios conhecimentos, mas isso representa um investimento necessário de tempo e desgaste pessoal indiscutível. O magistério é uma categoria de trabalho de vulnerabilidade em relação ao estresse, com suas consequências em prejuízo da saúde Mental, Figura 1 – Fatores estressores pessoais no trabalho. Figura 2 - Fatores estressores relativos ao ambiente de trabalho. Figura 3 - Fatores estressores ocupacionais. respostas dos professores em Poços de Caldas. Nos fatores voltados para o ambiente escolar, as dificuldades se mostraram mais acentuadas nas relações família-escola, pela dificuldade em conduzir um trabalho conjunto nesse aspecto. Entre os fatores organizacionais, as queixas predominantes referiram-se ao desejo de aumento na remuneração. Os professores se encontram em situação de vulnerabilidade para enfrentar as complexas pressões que sobre eles são exercidas. Professores estressados podem gerar ou intensificar o estresse do aluno, levá-lo à ansiedade, reduzir a motivação, prejudicar a qualidade e o resultado Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 242 Reflexões sobre Psicopedagogia, estresse e distúrbios do sono do professor cooperação de cada um e o esforço conjunto de solidariedade. Portanto, o psicopedagogo precisa orientar o melhor dos esforços, sempre por meio de ações integradas, para conscientizar a ação social, inclusive os organismos públicos de ação social e instituições educacionais sobre a importância de lidar com o estresse e com os distúrbios do sono. A criação de programas que valorizem relações sociais de respeito e ética, em todos os momentos, especialmente fazendo reconhecer a figura do professor em seu papel inestimável, poderia valorizar seu papel na sociedade, que se busca construir pela educação. Para Malvezzi18, a criação de novos instrumentos que problematizem as questões referentes ao trabalho é essencial e isso depende de pesquisas sobre as organizações no trabalho. Assim, compreender a situação dos transtornos do estresse e do sono do professor, em Poços de Caldas, para discutir os fatores envolvidos, além de possibilitar a reflexão sobre fatores que interferem na saúde e na atuação do professor em seu trabalho, também poderá colaborar com a construção do conhecimento na área. Há muito que ser feito! Novas pesquisas sobre o tema, mudando ações no sentido do que se busca desenvolver, poderão mostrar novas realidades e colorir com cores de afetividade e humanismo, um mundo que se obscurece na tristeza do estresse e nas noites sem qualidade de sono. A aprendizagem se faz no movimento diário, nas entrelinhas dos relacionamentos, mas o psicopedagogo pode ajudar a escolher como foco para nossa sociedade o prazer de viver bem. conforme demonstram os estudos de Meira16 com professores do Ensino Fundamental. Segundo Meleiro17, “o professor é uma das profissões mais estressantes na atualidade”. Compreender os fatores que mais atingem os professores em seu trabalho torna-se um recurso a mais para interferir em tais situações e prevenir o problema. CONCLUSÃO Há necessidade de uma mudança decisiva nos padrões educacionais em prática, no sentido de respeitar o professor em seu papel formativo, orientando os valores de família e de cidadania. Entretanto, esse aspecto relevante não sido suficientemente considerado no sistema educacional, que não promove questões básicas no suporte que o professor precisa receber para lidar com o próprio estresse e sono, além de orientar alunos e familiares no mesmo sentido. Não bastam as resoluções que apenas se referem à racionalização administrativa e de gastos e à adequação da educação às necessidades do mercado de trabalho, mas é sabido que esses cuidados não representam uma tarefa fácil. É difícil porque a sociedade vive uma crise de valores, responsável por desencadeamento de estresse, mais do que do oferecimento de recursos de enfrentamento e de desenvolvimento de um pensar mais abrangente, com vistas para o futuro, não apenas para a situação imediata, que, frequentemente, dita normas incoerentes com as necessidades pessoais de saúde. É preciso desenvolver espaço para o relacionamento interpessoal que prioriza o respeito, a compreensão das dificuldades, a Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 243 Valle LER et al. SUMMARY Studies on Psychopedagogy, teacher’s stress and sleep disorders Introduction: Psychopedagogy cares about involved factors in learning. Stress’s symptoms and sleep’s disorders also affects learning, especially when these disorders happens to teachers. Purpose: The purpose of this research is to investigate the type of teachers stress’s symptoms in public net of Poços de Caldas. Methods: This exploratory and descriptive research studied a population of 165 teachers, through the means of QFEP-Valle&Malvezzi, analyzing a descriptive exploratory, that revealed that 59% of the teachers were stressed and 46.7% of the teachers sleep badly, pointing out undeniable association between sleep and stress. Results: The predominant teacher’s stress factors are: double hours of working and multiplicity of tasks, salary, noisy in classroom, difficulties with the relations family-school. Conclusion: The conclusion of this study also disclosed the call for further developments in the investigation of teachers’ care as a means for the prevention of stress and sleep disorders. KEY WORDS: Stress, psychological. Sleep. Sleep disorders. Faculty. Occu pational Health. REFERÊNCIAS 9. Sobrinho FPN. O stress do professor do ensino fundamental. In: Lipp M, ed. O stress do professor. 6ª ed. Campinas:Papirus;2008. 10. Reimão R, Valle L, Valle E, Rossini S. Sono e saúde: interfaces com Neurologia e Psicologia. Ribeirão Preto:Novo Conceito;2010. 11. Valle LELR. Curso de dificuldades de aprendizagem. GPEC on line. 2009/2010. 12. Costa Neto PLO. Planejamento em estatística. 17ª ed. São Paulo:ABDR;1999. 13. Valle LELR, Malvezzi S. Estresse e distúrbios do sono no desempenho de professores: saúde mental no trabalho [Tese de Doutorado]. São Paulo:Departamento de Psicologia Social, Universidade de São Paulo;2011. 14. Zanelli IJC, Calzaretta AV, García AJ, Lipp MEN, Chambel MJ. 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Trabalho integra Tese de Doutorado, aprovada pelo Departamento de Psicologia Social de do Trabalho do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. Artigo recebido: 30/7/2011 Aprovado: 21/10/2011 Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 237-45 245 Oliveira ORIGINAL DG et al. ARTIGO Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada Darlene Godoy de Oliveira; Karen Kaufmann Sacchetto; Karen Ueki; Patrícia Botelho da Silva; Elizeu Coutinho de Macedo RESUMO – Introdução: Déficits de escrita são comuns em crianças disléxicas, especialmente nos domínios de codificação ortográfica e fonológica. Procedimentos de avaliação psicopedagógica devem considerar a semiologia de erros de escrita, para promover o desenvolvimento eficaz destas habilidades. Programas interventivos com foco no processamento fonológico contribuem para melhora nas habilidades de linguagem escrita de disléxicos. Objetivo: Este estudo objetivou verificar mudanças no padrão de escrita de disléxicos submetidos à intervenção com o software Alfabetização Fônica Computadorizada, por meio da análise dos tipos de erros ortográficos. Método: Vinte crianças, com idade média de 11,7 anos, com diagnóstico de dislexia foram avaliadas em tarefas de leitura e escrita e divididas em dois grupos pareadas por idade, sexo e escolaridade. O GI (n=10) foi submetido à intervenção em 16 sessões semanais. O GII não recebeu tratamento. Todos os sujeitos foram novamente avaliados após a intervenção. Resultados: Análises da primeira avaliação indicaram que os grupos tinham o mesmo nível de escrita. Na segunda avaliação, houve aumento significativo da velocidade de escrita no GI. Não houve diferenças significativas para aumento do número de acertos e para diminuição de erros de escrita conforme as categorias analisadas, apesar de haver decréscimo na média de erros por palavra e nas categorias de correspondência biunívoca, omissão de segmento, correspondência regular contextual, correspondência irregular independente de regras e supercorreção. Estes resultados são discutidos considerando o modelo de intervenção psicopedagógico, o número de sessões e as habilidades treinadas. Conclusão: A utilização do software Alfabetização Fônica Computadorizada pode auxiliar no desenvolvimento da escrita em crianças disléxicas em conjunto ao treinamento de habilidades ortográficas. UNITERMOS: Dislexia. Escrita manual. Avaliação educacional. Correspondência Darlene Godoy de Oliveira Rua Piauí, 181 – 10º andar – São Paulo, SP, Brasil – CEP 01241-000 E-mail: [email protected] Darlene Godoy de Oliveira – Psicóloga, mestre e doutoranda em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Pres biteriana Mackenzie. Bolsista FAPESP, São Paulo, SP, Brasil. Karen Kaufmann Sacchetto – Pedagoga, Especialista em Distúrbios de Aprendizagem pelo CRDA, mestranda em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Pres biteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil. Karen Ueki – Graduanda em Psicologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bolsista CNPq, São Paulo, SP, Brasil. Patrícia Botelho da Silva – Graduanda em Psicologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bolsista Mackpes quisa, São Paulo, SP, Brasil. Elizeu Coutinho de Macedo – Psicólogo, mestre e doutor em Psicologia Experimental pela USP, Professor e coorde nador do programa de pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pesquisador produtividade CNPq, São Paulo, SP, Brasil. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 246 Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada autores elencaram três habilidades distintas, mas inter-relacionadas, no desenvolvimento típico da escrita: a caligrafia, a composição e a codificação gráfica. A caligrafia engloba o de senvolvimento de habilidades motoras finas e de integração visuo-motora. A composição con sidera a elaboração de textos e narrativas, nos quais são essenciais habilidades de linguagem oral e das funções executivas, uma vez que é ne cessário o planejamento adequado da expressão do raciocínio, o engajamento para execução com alocação de recursos atencionais, a alternância em um conjunto de respostas envolvendo codi ficação fonológica e ortográfica e, por fim, o au tomonitoramento, a fim de manter ou modificar as estratégias de escrita5. O componente da codificação gráfica envol ve os domínios fonológicos e ortográficos. As habilidades de discriminação e manipulação fonológica, presentes no domínio fonológico, são relevantes para a decodificação, mas não são suficientes para promover fluência e com preensão ampla da leitura. São as habilidades ortográficas, decorrentes de processamento fo nológico preservado e do armazenamento de padrões gráficos de palavras (morfêmicos) em nível lexical, que tornam possível a leitura de quaisquer representações da língua escrita. Ainda não é claro se as dificuldades de escrita podem ser explicadas pela existência de déficits de processamento visual ou se são exclusiva mente decorrentes de problemas no nível fono lógico7. Considerando o papel da memória para aquisição da escrita, verifica-se a progressão da codificação grafêmica nos níveis de escrita global da palavra, seguida da codificação indi vidual de letras e, posteriormente, de unidades de letras, denominadas clusters. Os clusters referem-se a morfemas presentes em palavras diversas, tais como dígrafos e estruturas silábicas irregulares. A exposição à leitura e o exercício constante de escrita tornam a criança mais efi ciente na codificação e as irregularidades da linguagem escrita são automatizadas. Affonso et al.8 analisaram os tipos de erros ortográficos cometidos por crianças disléxicas, INTRODUÇÃO Dificuldades persistentes e sistemáticas na aquisição da leitura, presentes tanto no domínio da decodificação como na compreensão da leitura, são características da dislexia do desenvolvimen to. Por definição, a dislexia do desenvolvimento é um distúrbio específico de aprendizagem de origem neurobiológica, caracterizado por dificul dades na correta e/ou fluente leitura de palavras e por pobres habilidades de soletração e decodi ficação1. Essas dificuldades tipicamente resultam de um déficit no componente fonológico da lin guagem que é inesperado em relação às outras habilidades cognitivas e à instrução adequada de ensino em sala de aula. Como consequências secundárias costumam estar presentes problemas na compreensão de textos e, consequentemente, reduzido desenvolvimento de vocabulário e de conhecimentos gerais. Considerando os processamentos cognitivos necessários para a leitura de palavras e as estra tégias utilizadas, a Dislexia do Desenvolvimento pode ser classificada em dois subtipos2, tendo como base o modelo de dupla rota de leitura3. Na dislexia de subtipo fonológica, sublexical ou disfonética, ocorrem falhas na conversão de grafemas em fonemas. Logo, a leitura se dá pe la estratégia logográfica por memorização de palavras frequentes. Já na dislexia de subtipo lexical, morfêmica ou de superfície, ocorrem prejuízos no uso da estratégia ortográfica que impedem a leitura de palavras irregulares e a aquisição de fluência. Assim como ocorre na leitura, a aquisição competente da escrita depende do desenvolvi mento adequado de componentes distintos da linguagem oral, tais como a capacidade de no meação, o vocabulário, a consciência fonológica, o raciocínio verbal e a fluência narrativa4,5. Sendo assim, é comum que disléxicos apresentem tam bém dificuldades de escrita, que tendem a ser negligenciados tanto nos estudos de avaliação e intervenção, como na prática clínica. A fim de verificar a existência de estágios de aquisição da escrita, estudos longitudinais com amostras representativas foram conduzidos6. Os Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 247 Oliveira DG et al. controles pareados por idade cronológica e controles pareados por nível de leitura em uma tarefa computadorizada de nomeação de figu ras por escrita. Os resultados indicaram que disléxicos e controles por nível de leitura não diferiram quanto ao número de acertos, mas ambos acertaram menos que os controles por idade. Em relação aos tipos de erros, os dislé xicos apresentaram maior número de erros nas correspondências unívocas grafema-fonema, omissão de segmentos e correspondência fone ma-grafema independente de regras, o que in dica a existência de falhas do processamento fonológico e do processamento lexical necessá rios para a codificação. De acordo com Ygual-Fernandez et al.9, para analisar os erros ortográficos na codificação es crita é essencial compreender a relação que o indivíduo faz entre linguagem oral e escrita para o desempenho na conversão fonema/grafema. Crianças com déficits de escrita costumam apre sentar escrita incorreta que foge às regras orto gráficas com erros por substituições, omissões, inversões de grafemas e alteração na segmenta ção de palavras. Sendo assim, diferentes siste mas de classificação de erros ortográficos foram compilados2, que propõem critérios distintos de avaliação qualitativa de erros de escrita, tal como apresentado na Tabela 1. Considerando que as crianças com dificulda de de leitura e escrita possuem déficits de au tomatização das habilidades de decodificação grafema-fonema, consequentemente não dis põem de recursos atencionais necessários para memorizar as exceções ortográficas e aprender as irregularidades linguísticas9. A partir disso, procedimentos de intervenção com foco no ensino da escrita devem ser sequenciais e sistemáticos, a fim de promover a automatização das habilidades treinadas. Além disso, devem ser adequados aos tipos de erros ortográficos presentes, sendo os erros relacionados ao princípio alfabético consi derados de ortografia natural e erros nas conven ções ortográficas, como de ortografia arbitrária. Fukuda e Capellini10 estudaram a eficácia do programa de treinamento fonológico e cor respondência grafema-fonema em crianças de risco para dislexia da 1ª série do ensino fun damental. O fornecimento de instrução formal do princípio alfabético associado ao ensino de consciência fonológica possibilitou às crianças submetidas ao treinamento o desenvolvimento de habilidades cognitivo-linguísticas importan tes para a aprendizagem do sistema de escrita do português brasileiro. Barbosa et al.11 investi garam a relação entre habilidades de memória visual e desempenho ortográfico na escrita de crianças da 2ª e 3ª séries do ensino fundamental. Foram aplicadas provas de ditado e leitura de palavras, bem como a tarefa da Figura Com plexa de Rey. Os resultados apontaram que as crianças que cometem mais erros ortográficos nos ditados têm pior desempenho na Figura Complexa de Rey. Logo, conclui-se que boas habilidades de memória visual acompanham melhor aquisição das regras ortográficas e estas devem fazer parte de programas interventivos de leitura e escrita. Capellini et al.12 verificaram a eficácia de um programa de remediação fonológica em crianças disléxicas em um estudo com 4 grupos. O primei ro grupo (GI) foi composto de 20 disléxicos agru pados em dois subgrupos: experimental (GIe) e controle (GIc). Os mesmos procedimentos foram feitos com o segundo grupo (GII), formado por crianças sem dislexia. Todos os sujeitos foram avaliados com testes linguísticos e os sujeitos do GI foram submetidos ao programa. Os resultados demonstraram que as crianças submetidas à remediação obtiveram melhor desempenho na avaliação pós-intervenção, principalmente nas tarefas de leitura e compreensão de texto. Os au tores apontam para a importância de amplificar os efeitos deste tipo de programa para crianças com e sem dislexia no ambiente escolar, de modo a favorecer a leitura dos escolares. Sendo assim, o objetivo deste estudo foi ve rificar mudanças no padrão de escrita de dislé xicos submetidos à intervenção com o software Alfabetização Fônica Computadorizada por meio da análise dos tipos de erros ortográficos cometidos. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 248 Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada Tabela 1 – Classificação de erros ortográficos conforme a semiologia proposta por Moojen2. Tipo de Erro Descrição Exemplos Correspondência Biunívoca Um fonema é representado por um grafema que possui apenas um valor sonoro feto/veto; pato/bato Erros por Falha Fonema-Grafema Falha na escolha do grafema para representar o fonema. Envolve substituições, omissões, adições, transposições ou inversões exposão/explosão; casasa/casa; sutso/susto Juntura ou Segmentação Intervocabular União ou separação de palavras inteiras Correspondência Regular Contextual Desconhecimento de regras que alteram o valor da letra dependendo do contexto (r/rr; c/q; g/ gu; uso do ç; nh/til/m/n antes de consoantes; l/u no fim das palavras) Correspondência Irregular Independente de Regras Não existe uma norma gerativa que permita decidir o grafema a ser utilizado para representar o fonema seguru; sigarro Supercorreção Há a tentativa de corrigir na transcrição que acarreta outro erro alto/altomóvel; vassoura/professoura Falha Semântica Desconhecimento do significado de uma figura ou da nomeação de objetos/conceitos Substituição Aleatória Trocas não classificadas ou incomuns, por tentativas de escrita não-alfabéticas, erros de digitação ou de proximidade de teclas a fundar/afundar; emcima/em cima horor/horror; qausa/causa; çalada; brimcan; sorril; sau escrever laranja sob a figura de uma banana cclkajj; ppinião/opinião Infantil Interdisciplinar (NANI-UNIFESP) ou por consultórios particulares de atendimento fo noaudiológico. Os participantes foram avaliados por meio de uma bateria computadorizada de leitura, de escrita e de consciência fonológica, a fim de satisfazer os critérios de inclusão e exclusão. Os critérios de exclusão adotados no estudo foram: 1) QI Total no WISC III abaixo da média, com percentil geral abaixo de 25; 2) suspeita de defi ciências visuais e/ou auditivas sem correção; 3) presença de lesões cerebrais, histórico de doenças clínicas neurológicas ou psiquiátricas; 4) atraso no desenvolvimento de linguagem oral ou atraso neuropsicomotor; 5) presença de co morbidade com o Transtorno Déficit de Atenção e Hiperatividade. MÉTODO Participantes Vinte crianças com diagnóstico de dislexia do desenvolvimento, com idade média de 11,7 anos, foram alocadas em dois grupos, sendo o primeiro (GI) formado por disléxicos submetidos à Inter venção (Grupo Intervenção) e o segundo (GII) por disléxicos que não se submeteram ao programa de intervenção (Grupo sem Intervenção). O GI foi formado por 10 crianças (7 meninos), com idade média de 11 ± 2,44 anos e 4,6 anos de escolaridade. Já o GII foi formado por 10 crianças (7 meninos), com idade média de 10,8 ± 1,75 anos e 4,9 anos de escolaridade. Os critérios de parea mento para a formação dos grupos foram idade, sexo e série escolar. A divisão dos participantes nos grupos se deu por critério de conveniência, sendo os 10 primeiros participantes selecionados na pesquisa alocados no grupo de intervenção. Todos os participantes foram diagnosticados e encaminhados para a participação na pesquisa pelo Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Instrumentos A fim de verificar o padrão de escrita dos par ticipantes antes e após a intervenção foi utilizado o TNF1.1-Escrita13, que avalia o desenvolvimen Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 249 Oliveira DG et al. to da competência de escrita em português do nome de figuras, ou seja, da competência de produção de escrita livre para nomear figuras que representem objetos e animais conhecidos. Trata-se de um teste de competência de produção de escrita de palavras isoladas que avalia a ha bilidade do examinando de escrever livremente palavras que correspondem a figuras, sem co meter erros ortográficos ou semânticos13. O teste contém 36 itens, sendo que cada item é composto de uma figura situada acima de uma caixa de texto. O examinando produz a resposta digitando na caixa de texto o nome da figura apresentada. Em um teste de nomeação, diferentes palavras podem corresponder às figuras apresentadas, por exemplo, para a figura de um rato seriam consideradas corretas as respostas: rato, rata, camundongo e ratazana. As possibilidades de nomeação corretas foram estabelecidas durante o processo de padronização do teste. Assim sen do, a correção é feita de maneira automatizada pelo programa e são consideradas incorretas quaisquer respostas que não correspondam às pré-estabelecidas pelo programa e quaisquer tipos de erros ortográficos, incluindo ausência de resposta, respostas do tipo “não sei” e respostas semanticamente incorretas. Além da correção computadorizada conside rando o número de acertos no TNF1.1-Escrita, a produção dos participantes foi analisada qualita tivamente, a fim de identificar os tipos de erros cometidos nas respostas. Os erros ortográficos foram categorizados e analisados a partir de pa râmetros utilizados por estudiosos compilados por Moojen2: Correspondência Biunívoca (CB); Erros por falha fonema-grafema: Omissão de Segmento (OS); Adição de Segmento (AS); Inversão de Seg mento (IS); Juntura ou Segmentação Intervoca bular (JS); Correspondência Regular Contextual (CC); Correspondência Irregular Independente de Regras (CR); Supercorreção (SC); Falha Se mântica (FS) e Substituição Aleatória (SA). O instrumento de intervenção foi o software Alfabetização Fônica Computadorizada14, cujas atividades estimulam ludicamente as habilida des de manipulação de grafemas e fonemas. O objetivo destas atividades é promover a aquisi ção da leitura alfabética, que se dá por meio da decodificação grafema-fonema. O software é di vidido em dois módulos de atividades: consciên cia fonológica e alfabeto. O módulo consciência fonológica contém atividades de reconhecimento de palavras, rima, aliteração, sílabas e fonemas, sendo os estímulos apresentados em desenhos ou em formas geométricas. Na atividade palavras, o participante deve identificar palavras dentro de uma frase e inserir palavras em frases incompletas por meio de combinação semântica. Nas atividades rima, aliteração, sílabas e fonemas, os itens são apresentados inicialmente por meio de figuras que devem ser combinadas de acordo com o princípio fonético do nome e, em seguida, as unidades sonoras são apresentadas em formatos geométricos, para a realização de operações de adição, subtração ou inversão das unidades sonoras. Já o módulo alfabeto é subdividido nas seções vogais e consoantes. Para cada grafema é apre sentado o fonema correspondente, que é ouvido pela criança quando ela faz o contorno da letra com o mouse. Em seguida, são apresentadas listas de palavras para leitura e exercícios de discriminação fonológica para identificação de sons que completam as palavras. Procedimentos A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Presbiteriana Mackenzie, sob protocolo número 1087/08. Os responsáveis por todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e estes fo ram avaliados no Laboratório de Neurociência Cognitiva e Social da Universidade Presbiteriana Mackenzie. De acordo com os princípios éticos, após a análise dos resultados do estudo, os participan tes do grupo sem intervenção também foram submetidos aos procedimentos, uma vez que estes trouxeram benefícios nas habilidades de leitura e escrita. Após a primeira avaliação, realizada com todos os participantes, o GI foi submetido à in Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 250 Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada monstram que os disléxicos que participaram da intervenção passaram a escrever corretamente, em média, duas palavras a mais após o treino com o software. Embora esta diferença não apre sente significância estatística, este dado possui relevância no contexto educacional e pedagó gico, ainda mais quando analisado em função da diminuição no tempo para a realização do teste. De fato, quando se analisa o tempo para a realização do teste, observa-se que houve dife rença significativa entre os dois grupos no tempo para realização da escrita das palavras, sendo que os participantes que fizeram a intervenção tornaram-se mais rápidos, levando em média 5 segundos a menos para escrever cada uma das palavras. Tais dados parecem indicar que a intervenção produziu efeitos na capacidade de codificação. A análise qualitativa do efeito da intervenção no padrão de escrita a partir da semiologia de erros apresentados pelos grupos foi realizada a partir do cálculo da diferença do número de palavras grafadas incorretamente antes e após a intervenção. Desta maneira, resultados positi vos indicam que o número de palavras grafadas incorretamente diminuiu na segunda avaliação. Por outro lado, resultados negativos indicam que o número de palavras grafadas incorretamente aumentou após a intervenção. A fim de verificar o efeito da intervenção para cada uma das cate gorias de erros ortográficos, foram conduzidos testes t para amostras independentes, comparan do-se o desempenho dos dois grupos. A Tabela 4 apresenta os valores médios das diferenças entre as duas avaliações, bem como o desvio padrão de cada média. Além disso, são apresentados os tervenção com sessões semanais e individuais de aproximadamente 60 minutos de duração. A ordem de execução das atividades utilizada foi a prevista pelo manual do software, que intercala atividades dos módulos consciência fonológica e alfabeto, com aumento crescente de dificulda de das atividades. O número de sessões variou conforme a realização do protocolo do software, e cada participante executou duas vezes todas as atividades propostas, o que totalizou um nú mero médio de 16 sessões de intervenção. Após o término das sessões, os participantes dos dois grupos foram submetidos novamente à avalia ção com os mesmos instrumentos utilizados na primeira avaliação. RESULTADOS Foram conduzidas ANOVAS, a fim de com parar os desempenhos dos grupos na avaliação pré-teste, tanto para o número de acertos, quanto para o tempo de execução do teste. A Tabela 2 sumaria o desempenho dos participantes dos grupos no TNF1.1-Escrita. Resultados indicam que os dois grupos apresentaram desempenho similar para número de acertos e tempo de exe cução, uma vez que não foram encontradas di ferenças estatísticas significativas. A análise quantitativa dos efeitos da interven ção fônica na escrita dos disléxicos foi analisada em função do número de itens corretos, bem como do tempo para a realização do teste. Desta forma, foi feito o cálculo da diferença entre as medidas antes e após a intervenção. A Tabela 3 apresenta as médias das diferenças de pontua ção e de tempo de execução entre a segunda e a primeira avaliação dos grupos. Resultados de Tabela 2 – Média de número de acertos e tempo de execução em cada item (em segundos) no Teste de Nomeação de Figura por Escrita (TNF 1.1 – Escrita), na avaliação pré-teste. TNF 1.1-Escrita Acertos Tempo Grupo N Média (desvio padrão) GI 10 13,60 (± 7,336) GII 10 20,30 (± 8,667) GI 10 25,90 (± 13,852) GII 10 19,27 (± 12,158) Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 251 F (1,15) p 3,481 0,078 1,293 0,270 Oliveira DG et al. Tabela 3 – Média de diferença entre acertos e tempo de execução em cada item (em segundos) nos itens do pós para o pré-teste do Teste de Nomeação de Figura por Escrita (TNF 1.1 – Escrita). TNF 1.1-Escrita Acertos Tempo Grupo N Média (desvio padrão) GI 10 2,20 (±3,853) GII 10 -0,90 (±5,446) GI 10 -5,47 (±8,281) GII 10 3,78 (±9,495) F (1,15) p 2,160 0,159 5,406 0,032* Tabela 4 – Média, desvio padrão e valores de significância para os tipos de erros no TNF 1.1.- Escrita para na avaliação pré e pós intervenção. GI - Média (desvio padrão) GII - Média (desvio padrão) Pré-Pós Pré-Pós Correspondência Biunívoca (CB) 2,70 (6,96) 0,10 (2,07) Omissão de Segmento (OS) 6,60 (12,05) Adição de Segmento (AS) 0,00 (3,58) Inversão de Segmento (IS) Categoria Ortográfica t (1,15) p 1,132 0,273 -1,20 (4,59) 1,912 0,072 0,30 (0,48) -0,266 0,792 -1,30 (2,62) -0,30 (0,48) -1,184 0,252 Juntura ou Segmentação Intervocabular (JS) -0,10 (0,31) 0,10 (0,31) -1,414 0,174 Correspondência Regular Contextual (CC) 0,80 (2,30) 0,10 (0,87) 0,900 0,380 Correspondência Irregular Independente de Regras (CR) 0,10 (2,28) 0,40 (0,84) -0,390 0,701 Supercorreção (SC) 0,10 (0,56) 0,10 (0,31) 0,000 1,000 Falha Semântica (FS) -0,10 (0,73) -0,10 (0,31) 0,000 1,000 Substituição Aleatória (SA) -1,30 (3,94) 0,20 (1,03) -1,163 0,260 Palavras Erradas (PE) 1,60 (3,97) 0,30 (1,41) 0,973 0,343 Erros por Palavra (EP) 8,5 (15,05) 0,00 (5,45) 1,679 0,110 valores de significância para cada um dos tipos de erros analisados. A análise descritiva dos resultados indica que houve diminuição do número de erros de escrita pelos disléxicos que participaram da intervenção em 4 categorias analisadas. Na categoria de Correspondência Biunívoca (CB), os disléxicos cometeram, em média, aproxima damente 3 erros a menos na segunda avaliação e este resultado indica que a aprendizagem dos fonemas referentes aos grafemas está dimi nuindo a ocorrência de erros por confusão de letras foneticamente similares. Por outro lado, os disléxicos sem intervenção continuaram co metendo a mesma quantidade de erros nesta categoria. Na categoria de Omissão de Segmen tos (OS), houve diminuição média de 6 erros na segunda avaliação pelo grupo de disléxicos que participaram da intervenção. Foi observado aumento médio de 1 erro nesta categoria pelo grupo sem intervenção. Logo, o ensino explícito do princípio alfabético da leitura e das habilida des de consciência fonológica promoveu efeitos na escrita por meio do acréscimo de letras que possuem representação sonora. Além disso, foram observadas mudanças nas médias do número de Palavras Erradas (PE) e de Erros por Palavra (EP). Os disléxicos que Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 252 Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada do tempo. Em outro estudo16, foram realizadas duas sessões diárias de 50 minutos em 5 dias por semana, durante 8 semanas. Outra possibilidade de estruturação temporal para intervenção, que promoveu efeitos significativos para mudança no padrão de escrita17, é a realização de 4 sessões semanais de 90 minutos em grupos de 6 sujeitos. Para além das considerações sobre a estru turação temporal das sessões, outro aspecto re levante a ser discutido é a restrição do treino ao ensino de habilidades de consciência fonológica e de decodificação grafo-fonêmica. Ainda que estes processos façam parte das habilidades preditoras do sucesso em leitura18,19, para a aqui sição da escrita eficaz, outras habilidades devem ser treinadas. Considerando os componentes envolvidos na produção da escrita6, enquanto que a fonologia tem relação direta com a leitura oral, o desen volvimento de habilidades de ortografia tem impacto maior na produção escrita. Os resulta dos obtidos por estes autores apontam que a fonologia apresenta uma relação indireta para o aprendizado da leitura e que, portanto, torna -se necessária a investigação e estimulação da consciência ortográfica no início da aquisição das habilidades de escrita. Neste sentido, a in tervenção psicopedagógica deve voltar-se para promoção de habilidades de caligrafia e treina mento de habilidades de codificação ortográfica, além de voltar-se para diferenças individuais encontradas nas habilidades necessárias para a aquisição da escrita. Diante dos resultados encontrados neste es tudo, sugere-se a realização de outras pesquisas com aplicação de procedimentos interventivos em leitura e escrita que contemplem menores intervalos entre as sessões, número maior de sessões e atividades que favoreçam o ensino de habilidades ortográficas, a fim de verificar resultados mais robustos e permanentes em crianças disléxicas. realizaram o treino com o software diminuíram na segunda avaliação, em média, 1,6 palavras escritas com erros. A relevância desta diferença adquire maior significado quando se leva em consideração a diminuição média de 8 erros por palavra nestes mesmos sujeitos. Palavras grafadas incorretamente podem possuir mais de um erro e erros com diferentes semiologias. Logo, os dislé xicos que participaram da intervenção escrevem palavras com menor número de erros, enquanto os disléxicos sem intervenção não apresentam di ferenças para diminuição da ocorrência de erros. DISCUSSÃO Este estudo objetivou verificar mudanças no padrão de escrita de disléxicos submetidos à intervenção com o software Alfabetização Fôni ca Computadorizada, por meio da análise dos tipos de erros ortográficos cometidos. Análises quantitativas verificaram diminuição significa tiva no tempo de execução na escrita pelo grupo de disléxicos que realizaram a intervenção. Tal resultado é similar ao de trabalho conduzido pe los autores deste estudo15, no qual se verificou que a melhora na capacidade de decodificação promove aumento na velocidade de leitura e também facilita o processo de codificação grá fica. A aquisição e o treino de habilidades de consciência fonológica por parte do GI parece explicar a redução média de 8 erros do tipo Omissão de Segmento em palavras, indicando o desenvolvimento do princípio alfabético e a aplicação deste no domínio da escrita. Assim como citado15, o delineamento da in tervenção aplicada neste estudo consistiu em sessões semanais individuais de 60 minutos, com média de 16 sessões. Este modelo de in tervenção psicopedagógica com duração breve promoveu efeitos menos significativos do que aqueles observados em estudos com disléxicos submetidos à intervenção que contemplam maior número de sessões e com intervalos menores de tempo entre elas. Estudos com intervenções mais intensas e aplicadas em contexto escolar têm demonstrado melhora de desempenho mais significativa e, frequentemente mantida ao longo CONCLUSÃO Conclui-se que a utilização do software Alfa betização Fônica Computadorizada promoveu Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 253 Oliveira DG et al. melhora significativa no aumento da velocidade de escrita de palavras. Não foram encontrados efeitos estatisticamente significativos da inter venção na análise qualitativa de erros ortográ ficos cometidos pelos disléxicos submetidos à intervenção. Estes resultados indicam a neces sidade de implementação de atividades que favoreçam o desenvolvimento de habilidades ortográficas, a fim de maximizar a aprendizagem da leitura e da escrita destas crianças. AGRADECIMENTOS Às agências de fomento à pesquisa FAPESP, CNPq e MackPesquisa. SUMMARY Written production analysis of children with developmental dyslexia submitted to a computerized phonological intervention Introduction: Writing deficits are common in dyslexic children espe cially in orthographic and phonological coding domains. Procedures of psychopedagogy assessment should consider the semiology of spelling errors to promote the effective development these skills. Interventional programs focused on phonological processing contribute to improvement in written language skills of dyslexics. Purpose: This study aimed to measure changes in the pattern of dyslexic writing submitted to the intervention with the computed phonic literacy software through analysis of types of orthographic errors. Methods: Twenty dyslexics children (average age 11.7) were assessed by reading and writing tasks and were divided in two groups paired by age, sex and schooling. The G1 (n=10) was submitted in 16 weekly sessions to intervention. All the subjects were reevaluated after the intervention. Results: Analysis of the first evaluation indicated that both groups had the same level of writing. In the second evaluation, was significant increase of writing speed in G1. There were no significant differences to increase the number of correct responses and reduction of spelling errors by the categories analyzed, although there is a decrease in average errors per word and in categories of two-way matching, omission of segment, contextual regular correspondence, independent correspondence irregular rules and overcorrection. This data are discussed considering the psychoeducational intervention model, the number of sessions and the skills trained. Conclusion: The use of Phonics Computer Literacy software can improves the development of writing in dyslexic children in conjunction with the spelling skills training. KEY WORDS: Dyslexia. Handwriting. Educational measurement. REFERÊNCIAS 2. Moojen SM. A escrita ortográfica na escola e na clínica: teoria, avaliação e tratamento. São Paulo:Casa do Psicólogo;2009. 3. Coltheart M, Rastle K, Perry C, Langdon R, 1. Lyon GR. Defining dyslexia, comorbidity, tea chers. knowledge of language and reading. Ann Dyslexia. 2003;53:1-14. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 246-55 254 Análise da produção escrita de crianças com dislexia do desenvolvimento submetidas a intervenção fônica computadorizada Ziegler J. DRC: a dual route cascaded model of visual word recognition and reading aloud. Psychol. 2001;108(1):204-56. 4. Berninger VW, Nielsen KH, Abbott RD, Wijs man E, Raskind W. Writing problems in de velopmental dyslexia: Under-recognized and under-treated. J School Psychol. 2008;46:1-21. 5. Fletcher JM, Lyons GR, Fuchs LS, Barnes MA. Transtornos de aprendizagem: da identifica ção à intervenção. Porto Alegre:ArtMed;2009. 6. Abbott RD, Berninger VW. Structural equa tion modeling of relationships among deve lopmental skills and writing skills in prima ry- and intermediate-grade writers. J Educ Psychol. 1993;85(3):478-508. 7. Romani C, Olson A, Di Betta AM. Spelling disor ders. In: Snowling MJ, Hulme C, eds. The science of reading: a handbook. Oxford: Blackwell;2005. 8. 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Os escolares foram divididos em dois grupos: Grupo I (GI) – composto por 12 escolares com diagnóstico interdisciplinar de distúrbios de aprendizagem, sendo 75% do sexo masculino e 25% do sexo feminino; Grupo II (GII) – composto por 12 escolares com bom desempenho acadêmico, pareados por sexo e faixa etária com os escolares do GI. Todos os escolares foram submetidos ao Teste Evolutivo de Percepção Visual – DTVP-2, composto de oito subtestes que medem habilidades vi so-motoras interrelacionadas com percepto-visuais diferentes. Os resultados foram analisados estatisticamente por meio do teste de Mann-Whitney, para verificar possíveis diferenças de desempenho nas tarefas entre os grupos estudados. Resultados: Os resultados revelaram diferença estatisticamente significante entre o GI e o GII, demonstrando que o GI apresentou alterações que indicam déficit de percepção viso-motora, apesar das habilidades de relação espacial e figura e fundo estarem íntegras. Conclusão: Os escolares do GI apresentaram desempenho inferior na habilidade de coordenação viso-motora, de posição no espaço, de cópia, de closura visual, de velocidade viso-motora e de constância de forma em relação aos escolares do GII. UNITERMOS: Aprendizagem. Avaliação. Percepção visual. Transtornos de aprendizagem. Aline Viganô de Souza – Terapeuta Ocupacional na Prefeitura Municipal de Monte Alto (SAEEB – Serviço de Apoio Especializado à Educação Básica). Aluna do Curso de Especialização em Intervenção em Neuro pediatria do Núcleo de Estudo em Neuropediatria e Motricidade da Universidade de São Carlos (UFSCar), São Carlos, SP, Brasil. Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga, Li vre-Docente em Linguagem Escrita do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP). Coor denadora do Laboratório de Investigação dos Desvios da Aprendizagem - FFC/UNESP, Marília, SP, Brasil. Correspondência Simone Aparecida Capellini Av. Hygino Muzzy Filho, 737 – Marília, SP, Brasil – CEP: 17525-900 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61 256 Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem dêmicas no Brasil, contrariamente ao que ocorre com a percepção auditiva, os aspectos motores e os aspectos cognitivo-linguísticos nessa população. Dessa forma, este trabalho é uma das primeiras tentativas de discutir aspectos de percepção visual e viso-motora em crianças com alterações de aprendizagem determinadas genética e neu rologicamente, e, em decorrência disso, o presente estudo teve como objetivo caracterizar os achados de percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem. INTRODUÇÃO A percepção visual consiste em uma função cognitiva pela qual as informações sobre o nosso ambiente visual são disponibilizadas em nossa consciência e/ou disponibilizadas para orientar nossas ações. Essa percepção favorece a construção da experiência e da consciência do mundo visual, a partir da atenção, orientando as ações motoras1,2. Para que a percepção visual seja adequada, tanto as funções e as estruturas corticais devem estar intactas3-6. O desenvolvimento da percepção visual é rápido durante a infância e se aproxima do nível de desenvolvimento do adulto por volta de 11 e 12 anos de idade. Entretanto, aos 9 anos de idade, as habilidades de percepção visual são refinadas, sendo que, entre os 8 e os 10 anos de idade, a percepção de figura e a capacidade de perceber posições no espaço estão plenamente desenvolvidas. A capacidade de constância de forma melhora entre os 6 e os 7 anos e atinge uma condição estável entre os 8 e os 9 anos, e a capacidade mais complexa de diferenciar as formas das relações espaciais está bem desenvolvida a partir dos 10 anos de idade7. A função percepto-viso-motora é resultado da combinação de habilidades viso-motoras, planificação motora e cognitiva, habilidades perceptuais visuais (como coordenação óculo-manual), posição no espaço, relações espaciais, figura-fundo e constância de forma8. Por isso, crianças com distúrbios de aprendizagem são propensas a manifestar alterações perceptivas visuais pelo fato de apresentarem disfunções em áreas cerebrais responsáveis pela percepção viso-espacial necessária para a realização da escrita9,10. Independentemente da perspectiva adotada por pesquisadores, sendo esta social ou biológica, há evidências na literatura que evidenciam o fato de as crianças com distúrbios de aprendizagem apresentar alterações perceptuais, motoras e cognitivo-linguísticas que prejudicam a situa ção de aprendizagem em contexto de sala de aula. Entretanto, ainda são escassos os estudos que investiguam especificamente a percepção visual e a sua relação com as habilidades aca- MÉTODO Participaram deste estudo 24 escolares na faixa etária de 7 a 12 anos de idade, de ambos os sexos, com nível socioeconômico médio11, matriculados em escolas de ensino público fundamental. Os escolares foram divididos em dois grupos: • Grupo I (GI) – composto por 12 escolares com diagnóstico interdisciplinar de distúrbios de aprendizagem que recebem atendimento semanal no Serviço de Apoio Especializado à Educação Básica (SAEEB) da prefeitura municipal da cidade de Monte Alto-SP, sendo 75% do sexo mas culino e 25% do sexo feminino; • Grupo II (GII) – composto por 12 escolares com bom desempenho acadêmico, pareados por gênero e faixa etária com os escolares do GI. Participaram deste estudo somente escolares que não apresentaram intercorrências pré, peri e pós-natais, ou atraso no desenvolvimento neuropsicomotor e linguagem descritos em prontuário escolar e que apresentaram o Termo de Consentimento assinado pelos pais ou res ponsáveis, anteriormente ao início das avaliações. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP), em Marília, SP, sob o protocolo de número 2004/2009. Todos os escolares foram submetidos ao Teste Evolutivo de Percepção Visual, segunda edição – Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61 257 Souza AV & Capellini SA DTVP-212, composto de oito subtestes que medem habilidades viso-motoras interrelacionadas com percepto-visuais diferentes. Os subtestes do DTVP-2 são: coordenação viso-motora (CVM), posição no espaço (PE), cópia (C), figura-fundo (FF), relações espaciais (RE), closura visual (CV), velocidade viso-motora (VVM) e constância de forma (CF). Todos os subtestes medem um tipo de capacidade percepto-visual e podem ser consideradas como subteste de motricidade reduzida – posição no espaço (PE), figura-fundo (FF), closura visual (CV) e constância de forma (CF) ou de motricidade plena [coordenação viso-motora (CVM), cópia (C), relações espaciais (RE), velocidade viso-motora (VVM)]. Sua pontuação é dividida em escore padrão, que é obtido a partir da pontuação bruta e de sua conversão mediante utilização de tabelas; e escore composto, obtido por meio da soma dos escores padrão e sua conversão em um quociente classificatório em relação à percepção visual geral, à percepção de motricidade reduzida e à integração viso-motora. Todas as funções avaliadas permitem o cálculo de um equivalente de idade (EI), ou seja, para cada função avaliada o escore obtido permite o cálculo de uma “idade de percepção visual”. Os resultados obtidos foram analisados estatisticamente por meio do teste de Mann-Whitney, para verificar possíveis diferenças de desempenho nas tarefas entre os grupos estudados. O nível de significância (valor de p) adotado foi de 5% (0,050) e está marcado com asterisco. Para a análise dos dados, foi utilizado o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 19.0. Tabela 1 – Comparação do desempenho dos escolares do GI e do GII nos subtestes do teste de percepção visual. Variável Grupo Média Desvio padrão I 152,75 10,47 II 162,17 8,76 I 14,00 4,51 II 19,92 3,90 CVM PE C FF RE CV VVM CF I 24,50 8,36 II 31,50 5,87 I 10,42 3,09 II 11,92 2,50 I 33,92 13,28 II 40,67 2,54 I 7,42 4,80 II 11,67 5,00 I 14,92 8,33 II 22,25 5,85 I 10,58 3,78 II 14,00 3,28 Valor de p 0,032* 0,003* 0,026* 0,231 0,168 0,024* 0,034* 0,045* Legenda: CVM = coordenação viso-motora; PE = posição no espaço; C = cópia; FF = figura-fundo; RE = relação espacial; CV = closura visual; VVM = velocidade viso-motora; CF = constância de forma. penhos por subteste, demonstrando que o GI apresentou desempenho inferior na habilidade de coordenação viso-motora (CVM), de posição no espaço (PE), de cópia (C), de closura visual (CV), de velocidade viso-motora (VVM) e de constância de forma (CF). Os achados dessa tabela também revelaram que os escolares do GI e do GII apresentam desempenhos similares em figura-fundo (FF) e relação espacial (RE). RESULTADOS Na Tabela 1, pode-se observar a média, o des vio-padrão e o valor de p referente à comparação de desempenho entre os grupos GI e GII, nos subtestes do teste de percepção visual. Na Tabela 1, após a aplicação do teste de Mann-Whitney, pudemos observar diferença estatisticamente significante entre os grupos GI e GII quando comparados em seus desem- DISCUSSÃO A percepção viso-motora é composta por funções com componentes visuais (percepção visual: posição no espaço; figura-fundo, closura visual e constância de forma) e por funções com componentes motores integrados (integração Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61 258 Percepção visual de escolares com distúrbios de aprendizagem viso-motora: coordenação viso-motora, cópia, relação espacial e velocidade viso-motora), ne cessárias para a aquisição de habilidades escolares (leitura e escrita) e habilidades em atividades de vida diária12,13. Com base nos dados obtidos, pôde-se observar que os escolares com distúrbios de aprendizagem apresentaram alterações percepto-viso-motoras, corroborando estudos descritos na literatura internacional13-16. De acordo com alguns autores17,18, alterações de percepção visual, reconhecimento de detalhes, processamento simultâneo, organização visoespacial, integração das partes em um todo e de relação espacial fazem parte do déficit da integração visoespacial. Neste estudo, os escolares do grupo com distúrbios de aprendizagem apresentaram alterações que indicam déficit de percepção viso-motora, pois as habilidades de coordenação viso-motora, percepção de posição no espaço, constância de forma, cópia e velocidade viso-motora encontram-se abaixo do esperado para a idade e a escolaridade. Com base nos achados deste estudo, as ha bilidades de percepção visual alteradas nos escolares com distúrbios de aprendizagem pro vavelmente são responsáveis pelo baixo desempenho acadêmico desses escolares em tarefa de cópia, leitura e escrita, uma vez que essas atividades requerem o uso de estratégias que envolvem o reconhecimento visual de formas e as posições no espaço, a percepção de detalhes e a velocidade de coordenação viso-motora, que oferecem significados às formas das letras, que, quando alteradas, comprometem o desempenho motor fino para a produção da escrita de letras e palavras, caracterizando o quadro de disgrafia em tais escolares13,19. A partir deste estudo, investigações científicas com a finalidade de melhor estabelecer a relação percepto-viso-motora e a produção da escrita estão sendo realizadas, para melhor elucidar a relação entre a percepção visual, o aspecto motor fino e a escrita em escolares com distúrbios de aprendizagem. CONCLUSÃO Os resultados deste estudo nos permitiram concluir que os escolares com distúrbios de aprendizagem avaliados apresentaram desempenho inferior aos escolares com bom desempenho acadêmico em relação às habilidades de coordenação viso-motora, de posição no espaço, de cópia, de closura visual, de velocidade viso-motora e de constância de forma. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61 259 Souza AV & Capellini SA SUMMARY Visual perception of students with learning disabilities Purpose: To characterize the findings of visual perception in students with learning disorders. Method: The study included 24 students aged 7 to 12 years old, of both genders, with middle socioeconomic level. The students were divided into two groups: Group I (GI) – composed by 12 students diag nosed with interdisciplinary learning disorders, 75% male and 25% female, Group II (GII) – composed by 12 students with good academic performance, paired according to gender and age with GI. All students were submitted to the Developmental Test of Visual Perception – DTVP-2, composed of eight subtests that measure visual-motor skills interrelated with different visual perceptual ones. The results were analyzed statistically using the MannWhitney test, to verify possible differences in test performance between groups. Results: The results revealed a statistically significant difference between GI and GII, demonstrating that GI presented changes that indicate a deficit of visual-motor perception, even though spatial relations and figure ground skills are intact. Conclusion: The students of GI presented inferior performances in the skills of eye-hand coordination, position in space, copying, visual closure, visual-motor speed and form constancy in relation to the students of GII. KEY WORDS: Learning. Evaluation. Visual perception. Learning disorders. REFERÊNCIAS 7. Tsai CL, Wilson PH, Wu SK. Role of visualperceptual skills (non-motor) in children with developmental coordination disorder. Hum Mov Sci. 2008;27(4):649-64. 8. Brown T, Rodger S. Validity of the developmental test of visual-motor integration sup plemental developmental test of visual perception. Percept Mot Skills. 2008;106(3): 659-78. 9. Wuang YP, Su CY. Rasch analysis of the Developmental Test of Visual-Motor Integration in children with intellectual disabilities. Res Dev Disabil. 2009;30(5):1044-53. 10. Fusco N, Okuda PMM, Capellini SA. Avaliação e intervenção com a habilidade visomotora em escolares com dislexia e distúrbio de aprendizagem. In: Capellini SA, Silva C, Pinheiro FH, eds. Tópicos em transtornos de aprendizagem. São Paulo:Pulso;2011. p.79-89. 11. Fundação de Economia e Estatística (FEE). Porto Alegre: 2003. Disponível em: http:// www.fee.tche.br/sitefee/pt/content/estatisticas/pg_idese.php Acesso em: Dez/2008. 1. Milner AD, Goodale MA. Two visual systems reviewed. 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Teste evolutivo de percepção visual. 2ª ed. Trad. Ferreira MC. Rio de Janeiro:Entreletras;2001. 13.Ratzon NZ, Lahav O, Cohen-Hamsi S, Metzger Y, Efraim D, Bart O. Comparing different short-term service delivery methods of visual-motor treatment for first grade students in mainstream schools. Res Dev Disabil. 2009;30(6):1168-76. 14. Crawford SG, Dewey D. Co-occurring disor ders: a possible key to visual perceptual deficits in children with developmental coordination disorder? Hum Mov Sci. 2008;27(1):154-69. 15. Toniolo CS, Santos LCA, Lourenceti MD, Padula NAMR, Capellini SA. Caracterização do desempenho motor em escolares com trans- torno do déficit de atenção com hiperatividade. Rev Psicopedagogia. 2009;79(26):33-40. 16. Capellini SA, Ferreira TL, Salgado CA, Cias ca SM. Desempenho de escolares bons leitores, com dislexia e com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade em nomeação automática rápida. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(2):114-9. 17. Magallón S, Narbona J. Detección y estudios específicos en el trastorno de aprendizaje procesal. Rev Neurol. 2009;48(2):71-6. 18. Klein S, Guiltner V, Sollereder P, Cui Y. Relationships between fine-motor, visual-motor, and visual perception scores and handwriting legibility and speed. Phys Occup Ther Pe diatr. 2011;31(1):103-14. Trabalho realizado na Prefeitura Municipal de Monte Alto (SAEEB – Serviço de Apoio Especializado à Edu cação Básica), Monte Alto, SP, Brasil. Artigo recebido: 5/7/2011 Aprovado: 3/10/2011 Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 256-61 261 AngeliniESPECIAL RAVM ARTIGO Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini RESUMO – Esse artigo tem como intuito propor uma reflexão acerca dos novos caminhos da educação no século XXI. Consideramos relevante propor uma discussão sobre os novos paradigmas que redirecionam a vida humana e as implicações sobre a educação nesse processo. Vamos, portanto, eleger as implicações filosóficas que a física quântica traz como porta-voz na ativação dos novos princípios que regem o mundo e a ciência contemporânea, que inclui a espiritualidade como condição humana, dentro de uma abordagem transdisciplinar para a compreensão de uma síndrome – burnout, sintoma de uma educação adoecida que leva professores e alunos a um sofrimento psicofisicoespiritual. UNITERMOS: Educação. Esgotamento profissional. Espiritualidade. Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini – Psico pedagoga clínica do Instituto Paulista de Desen volvimento Profissional (IPDP); Profª Mestre na Uni versidade Paulista (UNIP) – Curso de Pedagogia, São Paulo, SP, Brasil. Correspondência Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini Av. Moema, 170 – cjto. 51 – São Paulo, SP, Brasil – CEP: 04077-020 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 262 Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção INTRODUÇÃO “É essa capacidade de reflexão que leva o indivíduo a aprender, a conhecer, a pensar, a aprender, a aprender a fazer, a aprender a conviver e a aprender a amar, para que possa aprender a ser, e estar em condições de agir com cons ciência, autonomia e responsabilidade. Responsabilidade consigo mesmo, com a sociedade e com a natureza, o que im plica o desenvolvimento de uma nova ética apoiada numa nova consciência individual, social e planetária, uma nova compaixão universal, centrada no equilíbrio da comunidade terrestre.”2 “O novo paradigma é abrangente; trata-se de uma ciência da espiritualidade, que inclui a materialidade. Ativismo quântico é a ideia de transformarmos a nós mesmos e nossas sociedades segundo as mensagens transformadoras da física quântica e do novo paradigma.” Goswami, 20101 Entramos no Terceiro Milênio, já não é mais possível conceber a vida de forma tão rasa, sob uma única perspectiva material. As ciências contemporâneas têm trazido suas contribuições para o avanço sobre a compreensão do humano. Esse projeto nasce dentro de uma concepção psicopedagógica do atendimento clínico, a partir da formação de um grupo reflexivo para educadores, professores e psicopedagogos, cuja finalidade foi a de possibilitar a esses profissionais um questionamento sobre suas modalidades como ensinantes, suas ações, emoções, aflições e desejos ao exercer sua práxis educativa. O objetivo foi o de que colocassem em palavras suas emoções, a fim de nomeá-las e identificá-las, para, então, repensar os processos que os fazem adoecer e poder combatê-los por meio da reflexão, como fortalecimento psíquico e espiritual. Ainda, pensamos no grupo reflexivo enquanto prevenção, um canal para os educadores lidarem com a insatisfação, a frustração e o estresse cotidiano. Nosso trabalho se desenvolveu em quatro encontros e, nesse espaço, pudemos perceber a angústia que tem comprometido a ação do professor, fundamentalmente, nesse início do século XXI, quando os valores delineiam-se de forma confusa e invertida frente à qualidade das relações interpessoais, cada vez mais desumanizadoras e displicentes com a vida. Moraes2 nos aponta que a Educação caminha para a Era das Relações – em que todos reflitam sobre as dimensões materiais e espirituais da sociedade, por uma educação que possibilite uma convivência harmônica entre os indivíduos: Um dos primeiros aspectos levantados para a reflexão foi a doença que acomete o profissional da educação, tirando-o, muitas vezes, do eixo e, consequentemente, do campo de trabalho. A doença vem como um mecanismo de defesa, ao não suportar mais uma relação tão complexa no espaço escolar, uma violência àquele professor que vai se deixando exaurir e consumindo-se por completo, resta a doença, hoje, já nomeada: a síndrome de burnout. SINDROME DE BURNOUT Do inglês, to burn out – queimar por completo – síndrome de burnout é conhecida também por esgotamento profissional. Consideramos a síndrome como uma das consequências mais graves do estresse ou de desgaste profissional, o que é provocado por sentimentos de exaustão, de frustração, de incapacidade, bem como leva o profissional a sentir-se culpado por não realizar o trabalho de acordo com o desejado e carregar o estresse para casa. Esses são alguns dos aspectos que vão consumindo física e emocionalmente o professor, que pode passar a ficar irritadiço e depressivo. Como nos aponta Codo3: “Burnout foi o nome escolhido; em português, algo como ‘perder o fogo’, ‘perder a energia’ ou ‘queimar (para fora) completamente (numa tradução mais direta). É uma síndrome através da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação com o trabalho, de forma que as coisas já Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 263 Angelini RAVM da autonomia de pensamento, do respeito à diversidade, da tolerância, da inclusão, do respeito às possibilidades, às diferentes inteligências, por meio de um olhar holístico e sistêmico. Autores como Piaget, Vygotsky, Wallon, Freud, Klein, Dolto, Winnicott, Morin, Perrenoud, Freire, Ma turana, Golleman, Gardner, Rogers, Mantoan, Latouche, na psicologia Jung; Luhman, na sociologia; Prigogine, na química; Maturana, na biologia; Einstein, na física; Goswami, na física quântica e muitos outros ajudam-nos a ampliar o olhar sobre as novas relações que devem mediar a educação. Ainda, temos trabalhado com novas disciplinas, como Inclusão, Educação Ambiental, Ecopedagogia, Psicopedagogia, Psicanálise, Relações Interpessoais – esses estudos demonstram, com certeza, uma mudança de paradigma para uma nova compreensão das relações homem e mundo. Logicamente, essas novas contribuições têm alargado nossa concepção de homem e de mundo, o que nos permite articular outros conhecimentos para uma compreensão holística e sistêmica do homem. Pensamos, dessa forma, em um novo profissional e em uma nova educa ção que possa abrir espaços para o diálogo, para a reflexão. Temos observado que a necessidade de pensar o mundo como nossa casa e as pessoas como pertencentes à comunidade humana partiu de um grande amadurecimento científico, dentre eles, a Física Quântica, que abriu novos caminhos para que pudéssemos dar um salto em nossas pesquisas. Tudo isso, ainda, é muito novo e difícil de ser colocado em prática, em nossas ações cotidianas e em uma nova concepção de educação. No entanto, cremos que é chegado o momento de compartilhar as novas aprendizagens e colocá-las para novas reflexões, já não é mais possível ver toda uma sociedade sofrendo por falta de uma educação inadequada, ultrapassada, focada no “ter” e que não focaliza o humano enquanto sujeito holístico e sistêmico, em nenhum momento. Daí tantas doenças acometendo professores, alunos, pais e toda uma sociedade que se perde, em meio a relações tão conturbadas. não o importam mais e qualquer esforço lhe parece ser inútil. (...) Como clientela de risco são apontados os profissionais de educação e saúde, policiais e agentes penitenciários, entre outros.”3 Para que essa patologia e outras, como depressão, estresse e doenças psicossomáticas, não aumentem significativamente entre esses profissionais, cremos que algumas intervenções precisam ser realizadas dentro ou fora do espaço escolar. Dentre as possibilidades, buscamos no grupo reflexivo um caminho para atenuar tais problemas. Por meio da troca entre os professores, elegemos a fala como caminho da reflexão para questionarem suas apreensões, angústias, etc. Esse trabalho tem permitido aos educadores conversar e enfrentar seus problemas para compreender e buscar uma solução, em que a mediação cabe ao próprio grupo, quando cada um tem oportunidade de externar suas queixas e dar vazão àquilo que o incomoda profundamente. Andersen4 tem nos ajudado a pensar no movimento dialógico do grupo: “Consideramos as conversas como fonte importante para a troca de descrições e explicações adequadamente diferentes, de definições e de significados. Essas trocas podem dar um novo tom às antigas descrições e explicações, e até fazer surgir outras novas. Proporcionam, assim, uma base o mais ampla possível de escolha para que a pessoa possa tratar, de uma forma diferente, situações paralisadas, ou reagir a novos fatos, sejam eles previstos ou não.”4 A reflexão tem nos proporcionado uma atitude, uma voz para que compreendamos essas questões, sob diferentes enfoques, como o reco nhecimento da mudança de paradigma – o que tem gerado grandes conflitos na sociedade, essencialmente, nas diversas relações que estabelecemos. Trabalhamos, hoje, na formação dos novos professores, com teorias de ponta que tratam do homem enquanto construtor de seu conhecimento e, acima de tudo, da importância da autoria, Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 264 Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção Dessa forma, vamos apresentar alguns aspectos dessa nova forma de entender o homem, para que possamos divulgar, de fato, uma nova maneira de compreender as relações humanas, dentro das escolas, a partir desse novo século, dentro de uma abordagem transdisciplinar. Vamos trabalhar com a concepção de transdisciplinaridade de Nicolescu (1997) – professor da Universidade de Paris e diretor do Centro Internacional de Pesquisas e Estudos Transdis ciplinares (CIRET)5. Assim, as ideias de Nicolescu estão fundamentadas na física quântica, e os seus três pilares são os níveis de realidade, a lógica do terceiro incluído e a complexidade. O autor considera a transdisciplinaridade, como: “(...) o prefixo trans indica, ao que está entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de cada disciplina. Sua finalidade é a compreensão do mundo presente, da qual um dos imperativos é a unidade de conhecimento.”5 Piaget já nos apontava a construção de um novo conceito para dar conta de uma nova compreensão mais ampla do homem. A transdisciplinaridade propõe a articulação dos mais diversos saberes, pondo em ênfase uma visão holística de homem que considera sua dimensão espiritual. Ainda queremos ressaltar que para a compreen são do homem, nesse milênio, não é mais possí vel vê-lo como um ser raso, preso ao mito da materialidade. Devemos considerar as diversas disciplinas de estudo para que nosso entendimento seja ampliado, e possamos desenvolver o autoconhecimento e o comprometimento com a vida em suas dimensões material e espiritual. O termo espiritual carrega um estigma, ranço do apogeu de uma ciência materialista reducionista. Sua utilização em vários campos de estudos provocou uma depreciação do termo. Queremos, portanto, justificar seu uso. De acordo com Souza Follmann6: “Espiritualidade, aqui, é reconhecida co mo um elemento inato e essencial de todas as pessoas, que é refletido nas expressões de diferentes camadas de conectividade que espiralam de dentro para fora para se ligar com o Outro social, comunal e físico, mais ainda para dentro para encontrar o Eu interior e finalmente, o Outro Transcendente. Estas camadas de conexão podem transcender cenários e fronteiras religiosas, sociais, culturais e políticas, ainda que as expressões possam ser in fluenciadas por tais fatores. É a conectividade que os indivíduos experimentam que os leva a descobrir um sentido de eu e lugar dentro de suas comunidades e do mundo maior, e, em última instância, os ajuda a achar significado e objetivo em suas vidas.”6 Para o autor, a transdisciplinaridade é uma nova abordagem científica, cultural, social e espiritual. O prefixo trans aponta para o que está simultaneamente entre as disciplinas, através das disciplinas e além de qualquer disciplina. O intuito dessa nova abordagem é nos levar para a compreensão do mundo presente e à unidade do conhecimento. Apresenta, então, uma aborda gem holística, em que inclui uma inteligência espiritual – base científica para compreensão da dimensão espiritual. O termo transdisciplinaridade, de acordo com Nicolescu5, foi apresentado pela primeira vez por Piaget, em Nice (1970) – na Universidade de Nice, durante o I Seminário Internacional sobre pluri e interdisciplinaridade: “Enfim sucedendo a etapa das relações interdisciplinares, pode-se esperar uma etapa superior que será transdisciplinar, que não se contentará em atingir interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas, mas situará essas ligações no interior de um sistema total sem fronteiras estáveis entre as disciplinas.”5 Buscamos nesse conceito uma nova maneira de compreender a base de todo um aprendizado mais significativo, que inclui o desenvolvimento espiritual, por meio de uma educação que priorize os princípios fundamentais das relações humanas: respeito, diálogo, ética e reflexão. Precisamos ativar uma educação que Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 265 Angelini RAVM acolha o humano e mudar a percepção de nossa consciência e de nossa realidade. A escola e os professores precisam se reinventar nessa nova jornada, buscar uma estrutura que construa uma educação pautada no desenvolvimento da espiritualidade como condição humana, se quisermos ter uma vida melhor, menos superficial, banal, sem sentido, que valorize a ética em toda e qualquer relação. Em 1994, no Convento de Arrábida, Portugal, foi realizado pela UNESCO o I Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, daí nasceu o Manifesto da Transdisciplinaridade – um convite para repensarmos o novo paradigma, a busca por um saber comum: Artigo 2 – O reconhecimento da existência de diferentes níveis de Realidade, regidos por lógicas diferentes, é inerente à atitude transdisciplinar. Toda tentativa de reduzir a Realidade a um único nível, regido por uma única lógica, não se situa no campo da transdisciplinaridade. Dessa forma, faz-se emergencial reconhecer na ciência contemporânea o caminho para uma nova lógica que permite a reavaliação sobre Quem somos nós? E o que a educação pode fazer para evitar tantos problemas de relações interpessoais? Consideramos fundamental para nossos estudos rever a física quântica e as novas pesquisas que exploram as relações mente e cérebro. com base na matéria que estimula exclusivamente a materialidade.”(Goswami, 2010)1 Nosso propósito é o de divulgar o novo para digma frente à Educação seja com quem for, onde for. Partimos do princípio de que somente por meio da educação e do conhecimento o homem poderá desenvolver-se como ser humanizador, um processo, ainda, em construção. Nesse sentido, vemos o ser humano como um ser de possibilidades para aprender a vida em todos seus aspectos. Para a compreensão dessa proposta, precisamos pensar primeiramente na questão do paradigma sob o qual vivemos. O paradigma é uma percepção geral da vida; é um consenso sobre a maneira de entender, de perceber, de agir a respeito do mundo; é uma visão de mundo, a que nos submetemos, de forma consciente ou não, para organizarmos nossas vidas. Hoje, estamos vivendo um momento de transição de ideias, de valores, de relações, de paradigmas. Para compreendermos melhor a questão dos paradigmas, vejamos o antigo modelo que ainda está instalado em nosso modus vivendi – o paradigma da Modernidade, e o paradigma que estamos buscando viver urgentemente – o paradigma da Pós-Modernidade. O paradigma da Modernidade ou paradigma mecanicista é interpretado segundo as ideias de René Descartes (século XVII). Para ele, o mundo natural deve ser visto como uma máquina. Descartes desenvolveu o Método Cartesiano, partindo de Galileu, acreditava que a chave para a com preensão do universo era a estrutura matemá tica; daí ter uma visão mecanicista de mundo. A certeza cartesiana é matemática, ou seja, se em uma máquina algo vai mal, é preciso descobrir o defeito da parte danificada e trocá-la, para que volte a funcionar. Nesse sentido, o olhar é local, é para as partes e não para o todo. Vamos transpor essa ideia para a Educação. O ensino é compartimentado, ou seja, fragmentado, não passa para o aluno a visão do todo, mas a visão de cada conteúdo que precisa memorizar: História, Geografia, Ciências, Matemática, Línguas, Artes, tudo é visto AS IMPLICAÇÕES FILOSÓFICAS DA FÍSICA QUÂNTICA E A MUDANÇA DE PARADIGMA “A ciência descobriu a espiritualidade. Hoje, há uma teoria científica logicamente consistente sobre Deus e a espiritualidade com base na física quântica e no primado da consciência (a ideia de que a consciência, e não a matéria, é a base de toda a existência). Noutras palavras, embora a mídia ainda não alardeie isso, temos agora uma ciência viável da espiritualidade ameaçando uma mudança de paradigma e passando da atual ciência Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 266 Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção de forma estanque, sem ligação, não há interdisciplinaridade, isto é, para se compreender as coisas, é preciso separá-las. Todo esse conteúdo fica descontextualizado e longe de sua relação com a vida do homem. Para complicar, toda nossa educação hoje visa o Vestibular, a competição e não o conhecimento de mundo e o autoconhecimento, fundamentais a esse processo. Entra em cena o acúmulo do conhecimento para ser descartado, quando não for mais necessário medi-lo. A educação tornou-se, portanto, competitiva, desumana e o conhecimento cumulativo. O conhecimento não se transforma em saber, passa a ser mero produto para ser descartado, quando não servir mais para os testes que o nosso sistema econômico/educacional implantou no mundo. Para que serve uma educação que apenas mede o acúmulo de conhecimento? Como fica ação dos professores? Que seres humanos estão por trás de uma educação que des-humaniza? Quantas crianças e jovens, além de professores, estão doentes, hoje? São doenças psicossomáticas, autoimunes, doenças de relacionamento: bullying, depressão, estresse que acometem nossos alunos durante e pós o período escolar, marcas que ficam na pele, difíceis de tratar. Por que toda a sociedade age dessa forma? Queremos ter, cada vez mais, e educamos para o poder e o ter desmedido. Vivemos a inversão de todos os valores. Já passamos da fase do “mal estar da civilização” de Freud. Estamos voltando à barbárie? Numa sociedade que perde de vista o humano, sua sensibilidade resta o desumano. Para onde caminhamos? A resposta é clara: precisamos decrescer – urgentemente, como aponta Latouche7: “A palavra de ordem ‘decrescimento’ tem como principal meta enfatizar fortemente o abandono do objetivo do crescimento ilimitado, objetivo cujo motor não é outro senão a busca do lucro por parte dos detentores do capital, com consequências desastrosas para o meio ambiente e, portanto, para a humanidade. Não só a sociedade fica condenada a não ser mais o instrumento ou o meio da mecânica produtiva, mas o próprio homem tende a se transformar no refugo de um sistema que visa a torná-lo inútil e a prescindir dele.”7 Outro exemplo que podemos citar é referente à dificuldade de aprendizagem. A criança que apresenta alguma dificuldade é olhada como portadora única do problema, compete a ela resolvê-lo, caso contrário vira um aluno rotulado, aprisionado, sem capacidade de sair do lugar que lhe ditaram. Essa visão novamente é local e individual, perde-se de vista o sujeito como um todo, reduzindo-o a um aluno com dificuldades, estigmatizado, reduzido ao não-saber e ao sofrimento. Já na medicina, a relação médico-paciente repete a relação de poder e saber do professor-aluno. Basta olharmos para as “n” especialidades médicas que existem. Os especialistas tornaram-se exímios em olhar para as partes. Se alguém está com algum problema nos rins, por exemplo, eles é que devem ser olhados, in dependentemente, do sujeito que os carrega. É tudo muito local, prático e pragmático, como se o ser humano fosse uma máquina, um ser lógico. Essa é a visão de mundo que impera: fragmentada, compartimentada, a valorização de cada parte, sem conexão com o todo, privilegiando a competição, a luta, a individualidade. Sob essa visão de mundo que opera com as leis da matemática, temos uma visão positivista da realidade, que permite a objetividade e o rigor nas ciências, uma visão de mundo mecanicista, uma visão ilusória sobre a neutralidade científica. Esse movimento tem nos levado a um mundo de crises individual, social, política, ambiental, uma crise global que ameaça a todos e ao planeta. De acordo com Latouche7, está mais do que na hora de mudarmos o foco: “O altruísmo deveria prevalecer sobre o egoísmo, a cooperação sobre a competi ção desenfreada, o prazer do lazer e o éthos do jogo sobre a obsessão do trabalho, a importância da vida social sobre o consumo ilimitado, o local sobre o global, a autonomia sobre a heteronomia, o gosto pela obra sobre a eficiência produtivista, o sensato sobre o racional, o relacional Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 267 Angelini RAVM apenas, sem a menor ligação com nossas vidas. Estamos no planeta, quando deveríamos pensar que somos o planeta e que, por isso, requer cuidados. Temos de ser pela vida. Seja ela como for, de quem for, onde for, de forma ética. Somos seres de relações e de aprendizagem: a vida é construção, um processo de aprendizagem o tempo todo. O novo paradigma, o da Pós-modernidade, nomeado por paradigma sistêmico ou holístico, rejeita essa velha visão de mundo, partindo, portanto, de novos pressupostos como interação e relações; uma visão sistêmica, cuja proposta é a inter-relação do homem com a natureza e sua saúde física, mental, emocional e espiritual. sobre o material, etc. Preocupação com a verdade, senso de justiça, responsabilidade, respeito da democracia, elogio da diferença, dever de solidariedade, vida espiritual: eis os valores que devemos conquistar a qualquer preço, pois são a base de nosso florescimento e nossa sal vaguarda para o futuro.”7 Atualmente, estamos lutando por uma nova visão de mundo mais adequada às novas descobertas científicas e à vida que tem se desenvolvido. Estamos sob um novo paradigma ainda trabalhado de forma teórica, temos de divulgá-lo para que possamos vivenciá-lo no dia-a-dia de nossas vidas, seja na escola, na profissão que exercemos, no médico em que nos consultamos, em todas as relações que possamos estabelecer. A escola precisa se rever e abrir espaços para a humanização das relações. Será preciso ensinar a empatia, a inteligência emocional, a sensibilidade e a ética, urgentemente. Em todos os campos das ciências contemporâneas, temos observado novas descobertas e uma adesão ao novo paradigma, pois as descobertas têm conexão e estão convergindo para o nosso conhecimento como seres humanos irmanados, como uma só pessoa, na comunidade humana. Até mesmo na linguagem, em seu vocabulário, já percebemos as diferenças. Se antes falávamos em fragmentação, individualidade, em conhecimento das partes, em especialidades e especificidades, em objetividade, em rigor científico, agora, falamos em rede, conexão, in teração, multiplicidade, interdisciplinaridade, multidisciplinaridade, conhecimento transversal, co-responsabilidade, co-construção, possibilidades, diversidade, sistemas. Um vocabulário voltado para as relações que estabelecemos com a vida, de forma coletiva, cooperativa, complementar, ética, co-responsável. Parece haver uma convergência ao que foi separado: ciência e religião. Penso que seria melhor falarmos em ciência e espiritualidade. Assim, estivemos agindo e estamos frente à nossa casa, o nosso planeta – Terra – que sob o paradigma moderno, é visto como um planeta CONEXÕES: A DOENÇA NASCE NA ALMA E VAI PARA O CORPO Cada parte do universo está em nós, em cada um de nós, portanto, somos o universo, estamos todos conectados. E o que nos conecta? A energia, essência da vida. Vivemos num mundo material e também so mos matéria. A matéria é formada por átomos – qualquer matéria (animal, vegetal, mineral) – e um dos componentes essenciais à matéria é o átomo formado por prótons, nêutrons elétrons. Seu núcleo é formado por energia condensada. Logo tudo que existe no universo é feito de energia, desde a caneta com que escrevemos, às estrelas, os grãos de areia, até nossos ossos... O mundo material é constituído por um conjunto de moléculas, ou seja, de átomos – que é energia condensada. O que significa, então, energia condensada? Energia significa força, potência, capacidade de realizar trabalho. Dessa forma, dentro de cada átomo (que nos forma) há energia e as partículas que o compõem vibram o tempo todo, estão em movimento. Se pudéssemos ver as coisas, as pessoas, em um nível macroscópico, veríamos pontos em vibração contínua, o que possibilita nossa materialidade. Tudo é vibração – energia – nossos corpos, também, são feitos a partir da vibração de energia que emanamos constantemente. Somos pequenos pontos de moléculas em vibração Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 268 Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção coesa e contínua – o que nos dá a impressão da materialidade. Tudo no universo vibra, se movimenta em diferentes velocidades. Hoje, a ciência contemporânea tem comprovado que a mente e o cérebro são independentes e que mesmo após a morte do cérebro, a mente continua a se manifestar. Compreendemos, também, que a mente tem a capacidade de alterar a matéria. Somos seres que pensam e os nossos pensamentos circulam por todo nosso corpo e fora dele. Logo, na teoria quântica que estuda o comportamento da matéria e da energia em nível subatômico, o pensamento é energia que pode transmitir para o cérebro físico vibrações de nossos impulsos, emoções e sentimentos po sitivos ou negativos. Por meio de estudos, como os de IRMF – Imagens por Ressonância Magnética Funcional e EEGQ – Eletrencefalografia Quantitativa – que mede as correntes elétricas na superfície do escalpo – refletem os registros gráficos das ondas cerebrais, essas ondas podem ser estaticamente analisadas, traduzidas em números e depois reproduzidas como um mapa colorido. A partir desses estudos, já se sabe que muitas ondas de energia como a beta são típicas de forte atividade consciente e muitas ondas teta são típicas dos estados de meditação profunda. Ainda se sabe que o padrão de onda cerebral lenta (ondas teta) não é exclusivo da tradição cristã, foi encontrado em iogues hindus e monges budistas, portanto, parece ser uma característica de misticismo generalizada, ou seja, uma forma de conexão com o que nos transcende, com uma energia supramental. De acordo com Beauregard & O’Leary8: “Como vimos, várias linhas de comprovação demonstram que os fenômenos mentais alteram significativamente a atividade cerebral. Essas linhas incluem nossos estudos de IRMF sobre observa ção emocional objetiva e o impacto da terapia comportamental cognitiva na fobia de aranha, além dos estudos de neuroimagens funcionais do efeito placebo. Os resultados dessa última série de estudos deixam bem claro que a atividade cerebral pode ser motivada pela crença e pela expectativa mental do paciente em relação a um tratamento médico proposto. Para interpretar os resultados desses estudos, precisamos de uma hipótese que explique a relação entre a atividade mental e a atividade cerebral. A hipótese de tradução psiconeural é uma delas. Postula que a mente (o mundo psicológico, a perspectiva da primeira pessoa) e o cérebro (que faz parte do chamado ‘mundo material’, a perspectiva da terceira pessoa) representam dois domínios diferentes em termos epistemológicos que podem interagir porque são aspectos complementares da mesma realidade transcendental. A hipótese da tradução psiconeural reconhece que os processos mentais (tais como vontades, metas, emoções, desejos e crenças) são neuralmente demonstrados por exemplos no cérebro, mas afirma que não são idênticos nem podem ser reduzidos a processos neu roelétricos e neuroquímicos. Na verdade, os processos mentais – que não são passíveis de localização no cérebro – não podem ser eliminados.”8 Recentemente, cientistas conseguiram, tam bém, uma forma de fotografar o percurso do pensamento em três dimensões, como um holograma – tomografia por emissão de pósitron – conhecida como PET. Na tela se vê que a imagem formada a cada pensamento, se modifica. Daí compreendermos que, na Teoria Quântica, pensamento é igual energia que tem vibração, o que cria e materializa nossos pensamentos, o que cria, portanto, o mundo material. Portanto, se apresento um pensamento distorcido, posso criar uma molécula distorcida – aqui pode se dar o início de uma doença. A doença, então, não nasce no corpo, como muitos cientistas materialistas acreditam, vem d’alma, de nossas emoções, pensamentos e se aloja no corpo, por um desarranjo molecular. Pensamento é energia em alto grau de velocidade e o pensamento está dentro e fora de nós – ele vibra com Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 269 Angelini RAVM cuidar, além de nossas ações, atitudes, de nossos pensamentos que geram a materialidade. Hoje, já sabemos que a frequência energética mais alta é o Amor; pois ele impacta no ambiente de forma material – produz transformações no ambiente em que nos cerca e, até mesmo, em nosso DNA. Podemos compreender tudo isso do ponto de vista da ciência contemporânea, especialmente por meio da física quântica ou por meio das religiões (ocidentais e orientais) que o homem construiu ao longo dos séculos. Entretanto, uma coisa é certa, não é mais possível negar que temos uma dimensão que nos conecta a algo muito maior de onde emanamos. Com certeza, uma energia tão positiva que irra dia Amor. Logo, essa é a frequência com que devemos nos conectar para evoluirmos como seres humanos. Esse é o momento de articularmos os saberes, sejam eles científicos ou espirituais, porque tudo isso faz parte da condição humana, assim como ter um inconsciente. Dessa forma, Codo3 nos traz uma ampliação sobre a compreensão do burnout: “Paradoxalmente, o que significou uma certa crise de identidade das ciências físicas e biológicas trouxe um alento vigoroso para as ciências humanas, afinal, esta foi a nossa dificuldade, sempre soubemos que os fenômenos que nos tiram o sono são multideterminados, agora temos modelos melhores de análise, e, o que é melhor, podemos conversar sem a presença incômoda do riso irônico de nossos colegas dedicados às ciências exatas. A nossa ciência continua não sendo exata, mas agora a deles também deixou de ser, ambos sabemos que a busca é a multideterminação, ambos deixamos de buscar a “A Relação”, e passamos a investigar as múltiplas inter-relações.”3 o universo. Daí conclui-se que a matéria gera energia, que gera consciência. Tudo dentro ou fora de nós, já que estamos todos conectados (somos um), depende do que valorizamos, cremos e pensamos. Somos seres de energia, portanto, podemos transformar, alterar a realidade – pois existe uma conexão entre pensamento e realidade. A cada dia, compreen demos mais e mais que nossos pensamentos criam o universo físico. Toda a ciência, tudo o que construímos nasce em nosso pensamento primeiro e daí concretizarmos no mundo físico. É fundamental que entendamos a importância e as implicações dessa energia em nossas vidas, ou seja, matéria = energia = consciência ou consciência = energia = matéria. O pensamento atua e modifica todo o processo vibratório de energia dentro e fora daquele que pensa. Podemos dizer que o observador altera a coisa observada, sempre. Dessa forma, nossos pensamentos, nossos sentimentos, nossas emoções – que são vibrações – criam um transtorno sobre a matéria em que são projetadas. Sendo assim, é necessário alinharmos pensamento/ sentimento/emoção, para acessarmos o equilíbrio de nossos corpos. Não podemos esquecer que a matéria é mo vida pela energia e a energia por nossa cons ciência. Nossa observação, nossa atenção e nossa consciência sobre nós mesmos têm a capacidade de interferir em nosso processo de desenvol vimento. Por isso, devemos ter cuidado com o que pensamos e pensar de forma positiva, é preciso tornar nossos pensamentos alinhados com o que é positivo. A atenção é a focalização da consciência que é a manifestação no mundo por meio da matéria; das situações, dos fatos – a consciência processa realidades – sob o foco da consciência, as coisas se concretizam. Nesse sentido, tudo o que determinamos por meio de nossos pensamentos, o universo conspira e realiza; pois a energia que usamos para isso obedece à informação do pensamento. Portanto, é preciso crer para ver, já que somos o que pensamos – temos não o que queremos, mas o que cremos. Assim, devemos Esses saberes que nos compõem precisam ser divulgados e recuperados, para darmos conta de uma vida melhor, nesse planeta, nesse momento. Somos todos aprendizes de um novo paradigma em que a vida é muito maior do que pensamos: somos mais do que a matéria e navegamos pelos Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 270 Burnout: a doença da alma na educação e sua prevenção tempos trocando aprendizagens. Somos uma forma de energia que emana da Criação. Podemos finalizar com Codo3 e deixarmos a seguinte reflexão “O caminho mais difícil e também o mais prazeroso é o de enfrentar o desafio, mudar as perguntas, encontrar novas respostas.”3 possível, quer seja na nossa prática profissional, como em nossa vida pessoal. Lucila F. – professora “Fiquei muito feliz ao iniciar o trabalho com o grupo. Para mim, é um espaço para o desenvolvimento pessoal e profissional. O primeiro estudo foi muito pertinente ao que estamos vendo e vivenciando nas escolas enquanto profissionais. O texto que tratou da síndrome de burnout trouxe reflexões para identificar em nós e nos professores, de maneira geral, o empobrecimento de estímulos profissionais, o desgaste que é angariado com o passar do tempo de trabalho. (...) conversamos sobre os caminhos que o ser humano traça sua história, no que ele acredita ou não, do que é importante na vida ou não, valores, pensamos sobre o capitalismo, o consumismo, a correria do dia-a-dia, a falta de amor nas relações profissionais e para consigo próprio, no desgaste interior que conduz à doença. Doenças que se iniciam na alma e depois atingem o corpo físico. (...) Assim, concluo dizendo que os momentos que passamos nas discussões foram esclarecedores, principalmente, um ponto de encontro para trocarmos e dividirmos nossos anseios, dores e sonhos.” Mara L. R. – psicopedagoga DEPOIMENTOS Consideramos relevante trazer as falas de uma professora e de uma psicopedagoga para a ilustração desse trabalho: “Os nossos encontros me trouxeram como principal aquisição a ideia clara e cristalina de que a pesquisa, assiduidade em nossas leituras e, principalmente, a reflexão compartilhada, nos traz conhecimentos e recursos outros que, por vezes, no dia-a-dia, nos escapam. Também esclareceram que, na minha prática profissional, eu preciso estar sempre atualizada em relação aos recursos intelectuais que minha práxis exige, como também de troca com os outros, porém mantendo o meu equilíbrio emocional, portanto olhando sempre para dentro de mim. Às vezes em que falávamos de autores e de textos preo cupados com nosso desempenho, na maioria delas ou quase sempre, estavam vinculados à visão do homem como um todo, suas ações de cordialidade e desprendimento para com o mundo, destacando o respeito às diversas categorias de problemas e situações psicossomáticas, num processo incessante de inclusão. (...) O leque de possibilidades de leitura e de pesquisas, o conhecimento de áreas pelas quais nunca havia caminhado e o empenho das pessoas que participaram dos encontros foram determinantes para o estímulo de minha vontade de estar junto, de sair na minha folga disciplinadamente para ir ao encontro de algo que me preenchia, me desafiava e me deixava inquieta em relação às coisas que ia aprendendo, socializando e descobrindo. A reflexão de situações como inclusão, respeito, autoconhecimento, ciência, religiosidade, responsabilidade, curas através do autoconhecimento com a ajuda da física quântica, percepção do outro, identidade, nos fizeram sabedores de que é necessário o exercício constante da reflexão, a fim de podermos agir o mais coerentemente CONSIDERAÇÕES FINAIS Estamos a todo tempo agindo, tomando deci sões por termos um paradigma que nos rege e que nos faz caminhar. O homem é um ser de relações e, por isso, não vive sem o outro. Essa é a lei do humano: viver relações, cujo objetivo maior é a aprendizagem. Precisamos do outro para nos compreendermos e para aprendermos a vida. Essas são questões que nos propõem um exer cício de reflexão e que nos comprometem com a vida que temos em nossas mãos. Talvez o único sentido de estarmos aqui nesse mundo: com preender para nos aperfeiçoarmos, constantemente, enquanto seres humanizadores, seja quais forem as relações estabelecidas e iluminarmos os caminhos daqueles que por nós passam. Estamos iniciando um novo século, uma nova era, um momento em que o homem busca seu Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 271 Angelini RAVM autoconhecimento, bem como o movimento do ser com o cosmo, uma busca pela espiritualidade, por uma ética humanizadora. Começamos a pensar o planeta como nossa casa, casa do humano, da vida humana. Toda e qualquer atitude inadequada conjunta e/ou isolada frente à vida e ao planeta pode nos colocar em risco; pois somos parte intrínseca da natureza e qualquer dano a ela recairá sobre nossas vidas. Precisamos transformar a educação como ponte para esses novos valores, e o professor é essencial nesse processo. Cabe a ele pôr em andamento a nova perspectiva, por isso é fundamental que sua saúde emocional, física e espiritual seja redimensionada por meio de espaços reflexivos, onde a troca reflexiva por meio da conversa possa transformar suas relações de forma equilibrada e apoiada. Ao final dessa primeira etapa, percebemos que o professor não pode caminhar sozinho, precisa do acolhimento emocional, por meio de espaços (dentro ou fora da escola) que propiciem a conversa, a troca, para enfrentar o dia-a-dia e usar da criatividade, da esperança, da possibilidade de transformar a escola num espaço mais humanizado. SUMMARY Burnout: soul’s disease in education and its prevention This article has the intention to propose a reflection on the new paths of education in the 21st Century. Consider it important to propose a discussion about the new paradigms that redirect human life and the implications for education in this process. Let’s therefore elect the philosophical implications that quantum physics plays in its role in the activation of new principles ruling the world and contemporary science, including spirituality as a hu man condition for a transdisciplinary approach to the understanding of a syndrome – burnout, symptom of a diseased education that leads teachers and students to a psychological physical and spiritual suffering. KEY WORDS: Education. Burnout, professional. Spirituality. REFERÊNCIAS 1. Goswami A. O ativista quântico: princípios da física quântica para mudar o mundo e a nós mesmos. São Paulo:Aleph;2010. p.9;13. 2. Moraes MC. O paradigma educacional emergente. São Paulo:Papirus;1997. p.227-8. 3. Codo W. Educação: carinho e trabalho. Petró polis:Vozes;1999. p.238;247. 4. Andersen T. Processos reflexivos. Rio de Janeiro: NOOS – Instituto de Pesquisas Sistê micas e Desenvolvimento de Redes Sociais; 1991. p.56. 5. Souza IML, Follmann JI. Transdisciplinaridade e universidade: uma proposta em construção. São Leopoldo:Editora Unisinos;2003. p.15. 6. Souza M. Engajando a mente, o coração e a alma do aluno de educação religiosa: educar para o significado e conexão. In: Incontri D, org. Educação e espiritualidade: interfaces e pers pectivas. São Paulo:Comenius;2010. p.107-8. 7. Latouche S. Pequeno tratado do decrescimento sereno. São Paulo:WMF Martins Fontes;2009. p.4;43. 8. Beauregard M, O’Leary D. O cérebro espiritual: uma explicação neurocientífica para a existência da alma. Rio de Janeiro:BestSeller;2010. p.185. Trabalho realizado no Instituto Paulista de Desen volvimento Profissional (IPDP), São Paulo, SP, Brasil. Artigo recebido: 8/6/2011 Aprovado: 3/9/2011 Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 262-72 272 Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud ARTIGO ESPECIAL Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud Laerte Fonseca RESUMO – O objetivo primordial deste ensaio teórico é fomentar as discussões dos conceitos psicanalíticos nos ambientes formais de Aprendizagem Matemática nas salas do Ensino Básico, utilizando-se do mecanismo da transferência como conceito psicanalítico para compreender as origens dos problemas de Apren dizagem Matemática. A análise teórica repousou em Freud (1901, 1912, 1915), Nasio (1999), D’Ambrosio (1996), Fiorentini e Lorenzato (2009), Huete e Bravo (2006), Pain (1985) e Kupfer (1989). Os resultados alcançados reclamaram que o mecanismo da transferência resulta de situações mal resolvidas entre pais e filhos, que durante as aulas de Matemática são compreendidos como resistência à sua aprendizagem, ocasionando os problemas escolares. UNITERMOS: Transferência de experiência (Psicologia). Transtornos de apren dizagem. Matemática. Laerte Fonseca – Doutorando em Educação Matemática pela Universidade Bandeirante de São Paulo (UNIBAN; 2011); Mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Federal de Sergipe (UFS; 2011); Mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe (UFS; 2002); Especialista em Educação Matemática pela Faculdade Atlântico (FA; 2009); Especialista em Psicopedagogia Clínica pela Faculdade Pio Décimo (FPD; 2002); Especialista em Psicopedagogia Institucional pela Faculdade Pio Décimo (FPD; 1999); Especialista em Ensino de Matemática pela Universidade Federal de Sergipe (UFS; 1995); Especialista em Gerência e Tecnologia da Qualidade pelo Centro Federal de Edu cação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET/MG; 1994); Licenciado em Matemática pela Universidade Federal de Sergipe (UFS; 1992); Graduando em Psicologia pela Faculdade de Sergipe (FASE/ESTÁCIO; 2010); Estudante de Psicanálise pelo Núcleo Psicanalítico de Aracaju (NPA; 2010); Pesquisador da FAPITEC/SE-BIBIC/Jr-CNPq; Pesquisador do PIBIC/IFS; Membro do Grupo de Pesquisa em Educação e Contemporaneidade/UFS; Professor do Curso de Licenciatura em Matemática do Instituto Federal de Sergipe – IFS/BR; Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Matemática/IFS; Coordenador e Editor da Revista Sergipana Caminhos da Educação Matemática; Pró-Reitor de Ensino do Instituto Federal de Sergipe – IFS/BR. Correspondência Laerte Fonseca Instituto Federal de Sergipe. Av. Gentil Tavares da Mota, 1166 – Aracaju, SE, Brasil – CEP 49055-260 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 273 Fonseca L mo os problemas de Aprendizagem Matemática podem ser analisados sob as lentes desse mesmo conceito. Para tanto, estarei dialogando com autores da área de Educação Matemática, tais como, D’Ambrosio5 (1996), Fiorentini e Lorenzato6, Huete e Bravo7, bem como teóricos dos campos da Psicopedagogia e da Psicologia Psicanalítica, como Pain8 e Kupfer9, respectivamente. Desta forma, o presente trabalho foi dividido em três partes, com o intuito de proceder a uma análise sistemática da transferência, dos problemas de Aprendizagem Matemática e da relação entre esses dois temas. O texto é concluído, fazendo considerações em torno da temática discutida, lançando mão de outras investigações psicanalíticas que poderão contribuir para minimizar o desconforto de alguns alunos em aprenderem Matemática e, por fim, posicionando-se em relação à hipótese anteriormente levantada. INTRODUÇÃO O cotidiano das salas de aula de Matemática do Ensino Básico sempre esteve sujeito a fatores que interferem direta ou indiretamente na Aprendizagem Matemática dos alunos. Segundo Fonseca1, na maioria das vezes, os professores de Matemática não dispõem de um arsenal teórico-metodológico para minimizar os fatores que geram os problemas de Aprendizagem Matemática, dado o tímido investimento – no campo da Psicologia – feito nos currículos dos Cursos de Licenciatura em Matemática. Neste sentido, um desses fatores está relacio nado ao mecanismo da transferência, sendo este, a meu ver, um dos conceitos primordiais da Psicanálise. Nos ambientes de Aprendizagem Matemática, é comum ouvir dos alunos queixas do tipo: “Não gosto do meu pai porque ele é muito rígido. Meu professor de Matemática se parece com o meu pai. Logo, não gosto do meu professor de Matemática porque ele é muito rígido”. Diante dessas declarações, questionei-me: como é possível aprender Matemática com alguém que se alimenta de lembranças negativas a respeito de seus genitores? Foi no seio dessa problemática que residiu minha motivação inicial para desenvolver essa investigação bibliográfica. Assim, para não perder o norte do trabalho, foquei meus esforços na seguinte questão: como os problemas de Aprendizagem Matemática poderiam ser analisados sob a ótica do mecanismo da transferência? Co mo conjectura preliminar, desconfio que os pro blemas de Aprendizagem Matemática estejam, em parte, relacionados às transferências que os alunos fazem dos seus pais com relação a seus professores. Com efeito, neste ensaio, objetivo, inicialmen te, fomentar a ampliação das discussões de conceitos psicanalíticos nos ambientes formais de Aprendizagem, em particular, nas salas de aula de Matemática do Ensino Básico. Em segundo plano, discutir, a partir de Freud2,3 e Nasio4, o conceito psicanalítico do mecanismo da transferência e, em seguida, compreender co O SIGNIFICADO E O SENTIDO DA TRANS FERÊNCIA EM FREUD Entre os principais conceitos psicanalíticos, a transferência destaca-se por melhor com preender as relações entre poder e desejo9. Con siderando esses dois termos como categorias inatas da personalidade humana, entendo que se movem ciclicamente, onde o desejo de algo ou por alguém estimula uma dose de poder que será desenvolvido e utilizado em prol do alcance dos objetivos. Neste contexto, espero que, ao esclarecer o sentido e significado da palavra transferência para Freud2, construa-se o alicerce que sustentará a discussão da temática em tela. Em suas obras completas, Freud2 esclareceu que a transferência é um fenômeno psicológico ocasionado não somente durante o tratamento psicanalítico, podendo acontecer tanto dentro como fora do consultório. Contudo, é analisada pelos psicanalistas apenas em seus consultórios. Como este acontecimento ultrapassa as pa redes dos consultórios psicanalíticos, desenvolverei, em princípio, inferências apresentadas Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 274 Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud neste trabalho, cujo objetivo é fomentar a ampliação das discussões de conceitos psicanalíticos nos ambientes formais de aprendizagem, em particular, nas salas de aula de Matemática do Ensino Básico. Desta forma, é favorável anunciar que fazer uma transposição didática desse conceito freu diano para o ambiente da sala de aula de Ma temática não se constituirá uma tarefa fácil, dado o reduzido número de publicações a esse respeito, bem como da leitura ainda embrionária no terreno da transferência. Durante todo o tempo e de forma inconscien te, homens, mulheres e crianças avaliam os com portamentos de seus pares para poder tomar decisões em relação às atitudes exteriores. Como descendemos da mesma espécie, herdamos geneticamente padrões comportamentais que, sob a influência do meio, moldam-se de acordo com as realidades que os envolvem. Reações a comportamentos manifestados, frutos de uma relação de poder, geralmente trans portam o receptor da ação a situações já experienciadas. E, de modo inconsciente, emite-se outro comportamento que pode provocar uma fissura entre as relações interpessoais. Esta descrição pretende definir os limites da transferência que, para Nasio4, caracteriza-se “desde o apego mais apaixonado até a mais aberta hostilidade, o vínculo analista/paciente retira todas as suas particularidades das fantasias que alimentam as relações afetivas outrora vividas pelo analisando” (grifo do autor). Freud2, antes de conceituá-la, descreve obser vações em seu entorno, quando afirma duas grandes lacunas de interesse dos psicanalistas: “Em primeiro lugar, não compreendemos por que a transferência é tão mais intensa nos indivíduos neuróticos em análise que em outras pessoas desse tipo que não estão sendo analisadas. Em segundo lugar, permanece sendo um enigma a razão por que, na análise, a transferência surge como a resistência mais poderosa ao tratamento, enquanto que, fora dela, deve ser encarada como veículo de cura e condição de sucesso.” (ibidem, p. 112, grifos do autor) É oportuno frisar que as duas últimas linhas dessa citação ajudarão a conformação da hipótese central desse trabalho, pois defendo e acredito que a percepção da intensidade da transferência no meio escolar pode contribuir para minorar os problemas originados no seio das relações entre pais e filhos. Freud2 explica que há relações entre o mecanismo da transferência e a resistência, primordial mente “quando o retomamos ao estado de pron tidão da libido, que conservou imagos infantis” (ibidem, p. 116). Este excerto endossa ainda mais os comportamentos de alguns alunos quando “resistem” às orientações de seus professores. Pelas vias do inconsciente, os jovens adoles centes sinalizam, por meio da transferência, desejos recalcados em relação aos seus pais, “pois é claro que se torna particularmente difícil de admitir qualquer impulso proscrito de desejo, se ele tem de ser revelado diante desse tipo dá origem a situações que, no mundo real, mal parecem possíveis”2. E, dessa forma, são veladas por explicações que, geralmente, corroboram com o naufrágio dos problemas de Aprendizagem Matemática. Outra observação importante de Freud2 que ajuda na compreensão sistemática dos problemas de Aprendizagem Matemática é a classificação do mecanismo da transferência acerca da natureza do comportamento manifesto: podem ser positiva ou negativa. Para Freud2, estão relacionadas, nesta ordem, a sentimentos afetuosos e os hostis. O primeiro tipo ainda é subdividido em “transferência de sentimentos amistosos ou afetuosos, que são admissíveis à consciência, e a transferência de prolongamento desses sentimentos no inconsciente”. Freud2 defende, ainda, que ambos os tipos citados remontam a fontes eróticas, estando associadas a impulsos sexuais reprimidos. Neste sentido, é favorável argumentar que todas as formas de transferência permeiam campos institucionais abertos. Sendo assim: Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 275 Fonseca L Algumas vezes, esses sentimentos de amor e ódio apresentam-se sob características quase invisíveis para o professor de Matemática. Pri meiramente, por ausência de uma formação em fundamentos psicanalíticos e, em segundo lugar, pela pouca importância que os professores dessa área atribuem ao campo da Psicologia. Funcionando como um envolto nebuloso, fica o professor refém dos comportamentos maquiavélicos (ainda que inconscientes) de seus alunos10. Assim, Freud2 tratou no volume 12 de sua coleção sobre o processo dinâmico da transferência. Somente na XXVII conferência, proferida entre os anos de 1915 e 1917, apresentada no volume 16, discutiu mais profundamente a temática, buscando definir a referida nomenclatura. Mesmo assim, ainda o faz de forma indireta, partindo de exemplos ou estórias criadas por ele mesmo. Interpretando Freud3, sobre transferência é possível concluir que se trata de uma triangulação envolvendo o paciente (no caso escolar, o aluno), o analista (no caso escolar, o professor) e a mãe/pai, onde sentimentos conflituosos ou não, vividos na infância do paciente (aluno) com um dos seus pais são revividos inconscientemente pelo paciente (aluno) substituindo seus pais pelo analista (professor). Um dos episódios de minha trajetória professoral traduz o mecanismo da transferência: “Certa vez fui tratado com arrogância por um aluno da 1ª série do Ensino Médio. Como professor, prezo pela disciplina que, por sua vez, incomoda àqueles que não a possuem e acabam assemelhando-se a alguns modelos de educação doméstica. O caso alongou-se, indo parar no setor pedagógico. Tivemos – eu e a instituição – de convidar os pais do referido aluno para uma sessão de esclarecimentos. Quando os pais começaram a descrever o cotidiano familiar, percebi o quanto primava pela disciplina do filho, quando dizia: ‘lá em casa tem hora pra tudo, mas José é muito arredio... não sei a quem puxou! ’”. “Pode-se levantar ainda a questão de saber por que os fenômenos de resistência da transferência só aparecem na psicanálise e não em formas indiferentes de tratamento (em instituições, por exemplo). A resposta é que eles também se apresentam nestas outras situações, mas têm de ser identificados como tal. A manifestação de uma transferência negativa é, na realidade, acontecimento muito comum nas instituições. Assim que um paciente cai sob o domínio da transferência negativa, ele deixa a instituição em estado inalterado ou agravado”2. Como já foi mencionado, a transferência negativa – foco latente do objeto deste texto – tem se apresentado no espaço particular de minha prática docente (ao longo de vinte anos) em maior dose que a positiva. Nisto residiu a motivação inicial deste trabalho. Sobre esse tipo, Freud2, apesar de não ser minucioso por acreditar ser uma questão que merece um capítulo à parte, discorre sobre alguns elementos que contribuirão para o clareamento das minhas incertezas. Afirma que pode ser encontrada em sintonia da transferência afetuosa e que, geralmente, são dirigidas ao mesmo tempo para o mesmo indivíduo. Segundo Freud2, foi criada uma terminologia para melhor caracterizar a propriedade de simultaneidade entre os dois tipos de transferência: a ambivalência – terminologia adotada por Bleuler. Freud2 explica que: “Até certo ponto, uma ambivalência desse tipo parece ser normal; mas um alto grau dela é, certamente, peculiaridade especial de pessoas neuróticas. [...]. A ambivalência nas tendências emocionais dos neuróticos é a melhor explicação para sua habilidade em colocar as transferências a serviço da resistência. Onde a capacidade de transferência tornou-se essencialmente limitada a uma transferência negativa, como é o caso dos paranoicos, deixa de haver qualquer possibilidade de influência ou cura.” (ibidem, p. 118, grifos meu) Mergulhando nesse exemplo e alicerçan do-me na teoria de Freud3, verifiquei que o Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 276 Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud • o processo de aprendizagem ocorre mediante uma ampla variedade de experiên cias e materiais de estudo; • se as condições da aprendizagem são ótimas e a disposição do aluno para percebê-la é positiva, o que se aprende integra-se de forma adaptável conforme as necessidades. A transferência da aprendizagem se realizará eficazmente quando o aluno descobrir relações entre tarefas distintas; • a formação de conceitos matemáticos irá precedida de experiências lúdicas, estruturadas e práticas que sirvam de introdução para eles; • a aprendizagem significativa pressupõe a assimilação eficaz do novo conteúdo; • a interação aluno-professor e aluno-aluno é essencial para que ocorra a construção de aprendizagens significativas e a aquisição de conteúdos de claro componente cultural e social. (grifo meu). De acordo com a minha experiência docente e com os resultados de pesquisas de D’Ambrosio5, Fiorentini e Lorenzato6, Fonseca1,11-13 e Maia14, por exemplo, o fracasso escolar em Matemática decorre da refutação desses princípios de aprendizagem. Esquivando-se de uma leitura psicanalítica, é dessa forma que geralmente são analisados os problemas de aprendizagem pelas equipes pedagógicas, professores de Matemática interessados na aprendizagem de seus alunos ou por especialistas (pesquisadores) no Ensino de Matemática. Mas, para que se possa compreender o âmbito dos problemas de Aprendizagem Matemática, faz-se necessário, a meu ver, compreender o significado dos problemas de aprendizagem a partir do viés psicanalítico. A pesquisadora argentina Paín8 considera: “o problema de aprendizagem como um sintoma, no sentido de que o não aprender não configura um quadro permanente, mas ingressa numa constelação peculiar de comportamentos, nos quais se destaca como sinal de descompensação. [e que] Da manipulação casuística sentido da transferência representa também uma forma de comunicação. Ainda que incompreendido pelos sujeitos atingidos, esse formato de linguagem pretende anunciar que: existem questões não resolvidas ou superadas no desenvolvimento da sexualidade do paciente (aluno); como não tem a consciência dessas questões, utiliza-se de seu inconsciente para sinalizá-las; pede ajuda a pessoas que não falam em seu idioma manifesto. É sabido que mães e pais não fazem cursos para criar seus filhos. Então o fazem baseando-se nos valores em que acreditam. Dependendo do nível de educação e bom senso, bem como do poder aquisitivo, recorrem a outros profissionais para que a educação de seus filhos seja complementada. Isso auxilia a canalização de questões edipianas muitas vezes não sublimadas durante o desenvolvimento psicológico, que, por razão contrária, transformam-se em problemas, cujas origens são camufladas e difíceis de acessar fora de um consultório psicanalítico. OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM MA TEMÁTICA Segundo D’Ambrosio5, ensinar e aprender Matemática tem se constituído ainda em uma tarefa difícil, pois não se têm respeitados os princípios epistemológicos e didáticos que norteiam o processo dessa atividade. Em se tratando da Aprendizagem Matemática, Huete e Bravo7 discriminam, sem exauri-los, 44 princípios dessa aprendizagem, resultado de um misto de teorias. Dentre elas, os mesmos autores destacam, principalmente: “Paradigma Condutual, Teoria de Burton, Teoria de Heredia Ancona, Teoria de Piaget, Teoria de Ausubel”7. Alguns desses princípios chamaram a minha atenção quando se objetiva compreender os problemas de Aprendizagem Matemática. Elencá-los-ei, segundo ordenamento de Huete e Bravo7: • o processo de aprendizagem consiste em ex perimentar a ação que há de ser aprendida, mas simultaneamente ocorrem muitas e variadas atividades e muitos resultados de aprendizagem; Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 277 Fonseca L mais ampliada sobre a temática abordada neste ensaio. Paín8 explica que o problema da aprendizagem pode surgir como uma reação neurótica à interdição da satisfação, seja pelo afastamento da realidade e pela excessiva satisfação na fantasia, seja pela fixação com a parada de crescimento na criança e, por isso, classifica-o como resultado dos fatores psicógenos. Estes, por sua vez, estão relacionados com a dimensão que considera a aprendizagem como função de “eu” e que pode explicar a diminuição das funções implícitas no aprender ou a transformação dessas funções, gerando inibições na aprendizagem ou sintomas de dificuldades*, respectivamente. A não-aprendizagem como sintoma supõe uma repressão de algo relacionado ao significado da operação de aprender, sendo, portanto, um fenômeno inconsciente. A inibição, por sua vez, traduz uma retração intelectual do ego, provocando diminuição das funções cognitivas e que acabam por acarretar problemas para aprender. Apoiando-se em Freud, Paín8 afirma que: “tal retração acontece em três diferentes oportunidades: a primeira, quando há sexualização dos órgãos comprometidos na ação, por exemplo, a inabilidade manual associada à masturbação; a segunda, quando há evitação do êxito, ou compulsão ao fracasso diante do êxito, como castigo à ambição de ser; e a terceira, quando o ego (“eu”) está absorvido em outra tarefa psíquica que compromete toda a energia disponível, como pode ser o caso da elaboração de um luto.” (ibidem, 1995, p. 31, tradução minha). da sintomatologia inerente ao déficit de aprendizagem, concluímos que nenhum fator é determinante de seu surgimento, e que ele surge da fatura contemporânea de uma série de concomitantes.” (grifo meu) A despeito desses concomitantes, Paín8 consi dera como fundamentais os seguintes fatores: orgânicos, específicos, psicógenos e ambientais. Acerca dos fatores orgânicos, Paín8 ratifica que toda aprendizagem embasa-se nos esquemas de ação e, por isso, a integridade anatômi ca assegurada pelo sistema nervoso central é considerada vital para um desenvolvimento sadio do processo de aprender. Neste sentido, a situação geral da saúde dos aprendentes deve ser analisada. Sintomas como hipoacúsia, miopia, apraxias, afasias e certas dislexias podem resultar de algum tipo de fragilidade no sistema nervoso central e serem verificadas tardiamente. Outro aspecto que a autora destaca é o funcionamento glandular que, em desequilíbrio, origina hipomnésia, falta de concentração e sonolência. Paín8 é incisiva quanto às questões alimentares, “pois o déficit alimentar crônico produz uma distrofia generalizada que abrange sensivelmente a capacidade de aprender” (ibidem, 1995, p. 29). Por último, salienta que as condições de abrigo e conforto para o sono são elementos importantes que favorecem os fatores orgânicos da aprendizagem. No caso dos fatores específicos, Paín8 esclarece, em linhas gerais, que estão relacionados “frequentemente a uma indeterminação da lateralidade do sujeito”. Quanto aos fatores ambientais, a autora em tela defende que não importa apenas as condições ambientais, mas, principalmente, ao meio ambiente material do sujeito, bem como as ideologias e valores vigentes no grupo em que o aprendente se encontra. Propositadamente, os fatores psicógenos foram deixados por último, por permitir uma discussão Defende Paín8 que a inibição origina-se tam bém como uma especificidade do fenômeno neurótico, apresentando este duas reações opostas: “uma responde ao impulso de repetição a situação traumática e a outra à necessidade de * Na perspectiva de Strick15, “o termo dificuldades de aprendizagem refere-se não a um único distúrbio, mas a uma ampla gama de problemas que podem afetar qualquer área do desempenho acadêmico”. (grifos da autora) Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 278 Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud acredito que a gênese dos referidos problemas encontra-se no desejo dos alunos em ‘dizer’ algo – mas por não saberem como – esbarra na ‘in capacidade’ do professor de decodificar as ações dos mesmos. No que se refere aos desejos dos alunos, acredito que as discussões teóricas anteriores já respondem, ao menos, preliminarmente. Mas, quanto ao professor, acredito, pautando-me no percurso da minha própria formação superior e no meu itinerário de pesquisa, que os cursos de Licenciatura em Matemática ainda não despertaram para o viés psicanalítico, ficando o professor desprovido de ferramentas para minimizar ou, ao menos, buscar meios adequados às situações embaraçosas vítimas dos mecanismos da transferência. Corroborando essa premissa, Kupfer9 defende que: “Ocupar o lugar designado ao professor pela transferência: eis uma tarefa que não deixa de ser incômoda, visto que ali seu sentido enquanto pessoa é “esvaziado” para dar lugar a um outro que ele desconhece.” evitação do lugar indicado pela cicatriz” (ibidem, 1995, p. 31). Estas reações, segundo a autora, estão relacionadas a três mecanismos de defesa: a negação, a denegação e a identificação projetiva, que, em linhas gerais, buscam livrassem de algum sentimento de angústia. A TRANSFERÊNCIA COMO SINTOMA DOS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM MATE MÁTICA Discutidos os conceitos relacionados à transferência e aprendizagem, buscarei compreender as possíveis relações entre esses, a fim de validar ou refutar a hipótese central. Kupfer9 informa que o mecanismo da transferência foi analisado por Freud a partir da interpretação dos sonhos e, mais tarde, percebeu que a figura do analista funcionava como resto diurno. Por ser a relação paciente-analista uma relação humana, Freud acreditou que a transferência também seria encontrada na relação professor-aluno9. Desta forma, torna-se o professor um objeto de transferência em que, segundo Kupfer9, “o que se transfere são as experiências vividas primiti vamente com os pais”. Então, o que se transfere é o sentido de algo ou alguma ‘coisa’ que está sendo deslocado de uma situação particular, muitas vezes reprimido ou desejado. Kupfer9, parafraseando Miller, afirma que “na relação professor-aluno, a transferência se produz quando o desejo de saber do aluno se aferra a um elemento particular, que é a pessoa do professor”. Esse desejo, traduzido inconscientemente, por meio das ações de transferência, busca aferrar-se a formas, particularmente, os restos diurnos, o analista e o professor, esvaziando-as e colocando nelas o sentido que interessa ao sujeito da ação. Analisando as contribuições de Kupfer9, verifiquei o quão intensa se faz presente a hipótese central deste ensaio: os problemas de Aprendizagem Matemática estão, em parte, relacionados às transferências que os alunos fazem dos seus pais em relação aos seus professores. Com efeito, apoiando-me no decurso teórico deste trabalho e inferindo a esse respeito, Em paralelo a esse raciocínio, Kupfer9 faz uma associação entre desejo e poder, ratificando que, segundo a História, “a tentação de abusar do poder é muito grande”. (ibidem, 1989, p. 93) Abrindo rapidamente uma “fresta” acerca da aprendizagem na perspectiva freudiana, entendo que esta decorre do desejo de aprender que, por sua vez, está relacionado ao desejo de independência ou afirmação do ego. Assim sendo, Kupfer9 assinala uma preocupação quanto ao silenciamento do desejo do aluno a partir do poder exercido pelo professor. Segundo a autora, o abuso de poder ocorre quando o professor subjulga seu aluno ao “impor-lhe seus próprios valores e ideias. Em outras palavras, impor seu próprio desejo, fazendo-o sobrepor-se àquele que movia seu aluno a colocá-lo em destaque”9. A meu ver, dessa forma cessa-se o poder desejante do aluno, tendo ele dificuldade para aprender conteúdos matemáticos, memorizar informações, desenvolver habilidades e compe- Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 279 Fonseca L tências almejadas pelas orientações do cenário da Educação, conseguindo apenas uma diplomação, mas não se configurando como sujeito pensante. Inspirado ainda em Freud16 poder-se-ia ques tionar: caberia ao mestre anular seu próprio desejo se é este que o impulsiona para a função de mestre? Neste momento, valendo-me de um dito popular – “não quero para o outro o que não quero para mim” –, pois creio que representa uma adequada oportunidade para o professor repensar suas práticas pedagógicas, admitindo, inicialmente, que possibilitar a aprendizagem de seus alunos será uma tarefa difícil. Mas, no caso de buscar alternativas metodo lógicas** para provocar nos alunos o desejo por novas aprendizagens, especialmente as relacionadas aos conteúdos escolares, poderá contribuir para minimizar os inevitáveis mecanismos da transferência que, na maioria das vezes, reedi tam situações tipicamente relacionadas ao complexo de Édipo, tanto no caso masculino como no feminino. Sobretudo, pinço de Kupfer9 duas proposições decorrentes do discurso psicanalítico: “Ao professor, guiado por seu desejo, cabe o esforço imenso de organizar, articular, tornar lógico seu campo de conhecimento e transmiti-lo a seus alunos. A cada aluno cabe desarticular, retalhar, ingerir e digerir aqueles elementos transmitidos pelo professor, que se engancham em seu desejo, que fazem sentido para ele, que pela via de transmissão única aberta entre ele e o professor – a via da transferência – encontram eco nas profundezes de sua existência de sujeito do inconsciente”. (ibidem, 1989, p. 99) conjunto de crenças e valores resultados de seus desejos – “estará contribuindo para uma relação de aprendizagem autêntica”. Verifica-se, desta forma, o quão se torna complicado o jogo no campo educacional entre atores protagonistas e coadjuvantes, pois somente o desejo do professor justifica o fato dele estar ali; e, estando ali precisa renunciar a este desejo. Eis o fato em que Freud16 (1901) se fundamenta para afirmar que, apenas como uma fantasia, a Educação é possível. Caso contrário, configura-se como um ato de violência simbólica. CONCLUSÃO Seja ao longo da História, seja na contemporaneidade, as relações interpessoais constituem-se alvos sedutores para os interessados nas pesquisas do comportamento humano. Ao que tudo indica, esse ensaio abordou o mecanismo da transferência como um dos vieses de um dos milhares de subconjuntos de pessoas: a tríade pais-alunos-professores. O diálogo entre Freud2,3 e Nasio4 acentuou a conceptualização da transferência como um mecanismo de resistência psicológica que, no caso particular dos alunos das salas de aula de Matemática do Ensino Básico, utilizam-na para “denunciar”, inconscientemente, as fragilidades que permeiam o relacionamento com os seus pais, muitas vezes compreendida pela maioria dos professores de Matemática como rebeldia ou indisciplina. D’Ambrosio5, Fiorentini e Lorenzato6, Huete e Bravo7 e Pain8 ajudaram a alicerçar-me no terreno delicado dos problemas de Aprendizagem Matemática, em que princípios e fatores indispensáveis e diretamente correlacionados à mesma não são valorizados nem por aqueles que ensinam, nem pelos pais e nem pelos próprios sujeitos envolvidos. Dessa forma, geram consequências difíceis de serem removidas no tempo desejado. Caso um professor permita essa compreensão psicanalítica, denominada por Kupfer9 de “canibalização”, que acontece no seio dele mesmo e de suas próprias aprendizagens – fruto de seu ** Ainda assim, é bom esclarecer que, o educador, segundo Kupfer9, “aprende que pode organizar seu saber, mas não tem controle sobre os efeitos que produz sobre seus alunos [...] pode-se dizer, por isso, que a Psicanálise pode transmitir ao educador [...] uma ética, um modo de ver e de entender sua prática educativa”. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 280 Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as lentes da transferência em Freud dar ao professor de Matemática ou ao leitor interessado mais alternativas para a compreensão parcial do seu campo profissional. Por último, acrescento que a percepção de um desequilíbrio no comportamento dos alunos durante as aulas de Matemática que, em par ticular, pode ser sinônimo dos “Problemas de Aprendizagem Matemática”, representa um sintoma equivalente à febre orgânica que, quando medida, traduz-se para o médico em que estado encontra-se a situação interna do corpo huma no. Por isso, o professor deve permitir-se ao aprofundamento no estudo do comportamento humano, pois poderia dispor de termômetros que facilitariam encaminhar as providências mais indicadas e, com isso, minimizaria problemas de relacionamento interpessoal com os seus alunos. Caso usassem lentes de alta resolução, perceberiam que o mecanismo da transferência funciona como o processo febril e que enquanto não for resolvido o problema com o pai ou a mãe, alguns alunos podem desenvolver entraves para aprender Matemática. Sobretudo, deixo como provocação os seguintes questionamentos: num mundo em que a diversidade é fator primordial para o crescimento humano, estariam os problemas de Aprendizagem Matemática isentos de outros tipos de interpretação teórica? Qual o problema em considerá-los? E, finalmente, as contribuições de Kupfer9, associadas às anteriores, favoreceram a validação da hipótese inicial: “os problemas de Aprendizagem Matemática estão, em parte, relacionados às transferências que os alunos fazem dos seus pais em relação aos seus professores”, pois, segundo a autora, é inevitável que esse mecanismo aconteça em decorrência da resistência natural do homem em abandonar seus próprios desejos em favor de outrem. Assim, friso que, do ponto de vista da Psicanálise, é nesse meio que reside a origem dos problemas de Aprendizagem Matemática. Com efeito, faz-se necessário aos responsáveis pelo processo de ensino-aprendizagem compreender a importância do viés psicanalítico, pois, além de auxiliar na compreensão dos casos de seu cotidiano professoral, permitirá a flexibilização nos estilos de ensino que deverão seduzir os alunos para que estes tolerem, momentaneamente, a submissão dos seus desejos. A partir dessa experiência primeira, onde o mecanismo da transferência é lançado como pano de fundo para compreender os problemas de Aprendizagem Matemática, é minha intenção fazer outros movimentos pinçados da Psicanálise, temáticas como a castração, foraclusão, narcisismo, falo, supereu, identificação e sublimação, por exemplo, e relacioná-las com a Aprendizagem Matemática, cujo propósito é Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 273-82 281 Fonseca L SUMMARY An autopsy on the origins of the problems of learning mathematics under the lens of transfer in Freud The primary purpose of this essay is to promote theoretical discussions of psy canalitics concepts in formal Mathematics learning environments in elementary classrooms, using the mechanism of transfer as psychoanalytic concept to understand the origins of Mathematical learning problems. Theoretical analysis rested on Freud (1901, 1912, 1915), Nasio (1999), D’Ambrosio (1996), Fiorentini and Lorenzato (2009), Huete and Bravo (2006), Pain (1985) and Kupfer (1989). The results achieved have complained that the mechanism of transfer results from unresolved situations between parents and children that, during lessons of Mathematics, are understood as resistance to their learning, causing problems at school. KEY WORDS: Transfer (Psychology). Learning disorders. Mathematics. REFERÊNCIAS 1. Fonseca LS. A aprendizagem das funções trigonométricas na perspectiva da teoria das situações didáticas [Dissertação de Mestrado] Aracaju: Universidade Federal de Sergipe;2011. 2. Freud S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: edição brasileira. Tradução sob a direção de Salomão J. vol. XII. Rio de Janeiro:Imago;1996, 3. Freud S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: edição brasileira. Tradução sob a direção de Salomão J. vol. XVI. Rio de Janeiro:Imago;1996. 4. Nasio J-D. O prazer de ler Freud. Tradução de Magalhães L. Rio de Janeiro:Jorge Zahar;1999. 5. D’Ambrosio U. Educação matemática: da teo ria à prática. Coleção Perspectivas em Educação Matemática. Campinas:Papirus;1996. 6. Fiorentini D, Lorenzato S. Investigação em educação matemática: percursos teóricos e metodológicos. Coleção Formação de Professores. Campinas:Autores Associados;2006. 7. Huete JCS, Bravo JAF. O ensino da matemática: fundamentos teóricos e bases psicopedagógicas. Tradução de Rosa E. 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A referida pesquisa nos leva a observar que a Psicopedagogia, durante décadas, se preocupou em desenvolver ações com crianças e adolescentes em idade escolar. No entanto, após a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), no qual foi incluído como indicador de avaliação dos cursos de Licenciatura e Pedagogia o item “atendimento ao discente”, entendemos que se faz necessário refletir e revisar as ações pedagógicas desenvolvidas no Ensino Superior. Este quesito ao ser avaliado será pontuado de 1 a 5 e o critério de análise inclui níveis de implementação (ou não) do programas de “atendimento extraclasse e atividade de nivelamento”, além de atendimento psicopedagógico oferecido pela instituição. Apoiados neste pressuposto, iniciamos, em 2007, um projeto de intervenção por meio do NAPAp/PUC-SP. Este núcleo, assumido pelos estudantes de Psicopedagogia na abordagem institucional, coordenado e supervisionado pela Profa Neide de Aquino Noffs, está construindo instrumentos e metodologias específicas no atendimento a adultos que buscam identificar e/ou melhorar seu desempenho escolar, pro fissional e pessoal. Neste texto, abordaremos as contribuições dessa ação na ampliação do campo de atuação de aprendizagem com adultos: a andragogia. UNITERMOS: Ensino. Aprendizagem. Educação superior. Neide de Aquino Noffs – Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo; Psicopedagoga Clínica e Institucional; coordenadora do curso Psicopedagogia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP); Diretora e docente da Faculdade de Educação da PUC-SP; presidente vitalícia da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), assessora institucional na rede municipal de ensino e coordenadora geral da comissão de regulamentação e formação do Psicopedagogo no Brasil junto à ABPp. Carla Maria Rezende Rodrigues – Mestrado em Curso de Pós-Graduação em Letras. Universidade Presbite riana Mackenzie. Correspondência Neide de Aquino Noffs Rua Diana, 715 – São Paulo, SP, Brasil – CEP 05019-000 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 283 Noffs NA & Rodrigues CMR dos estudantes ingressantes na Graduação. Nosso trabalho viabiliza, por meio de estratégias adequadas, o auxílio nas produções de leitura e de escrita, bem como a apresentação da diver sidade de métodos de organização e estudos que favoreçam a cada indivíduo e ao grupo, de acordo com sua modalidade de aprendizagem. Como estudantes de Pós-graduação da PUC-SP, bem como profissionais da Educação, atuando nas diferentes Instituições de Ensino Superior, convivemos com a realidade que consiste em ter nas salas de aula dos cursos de Graduação, em especial nos de Licenciaturas, alunos que trazem diferentes modalidades de aprendizagem e, em grande número, indivíduos que apresentam dificuldades em seu desempenho escolar e nas diferentes áreas de conhecimento. Diante de tal realidade, cada vez representado por maior número de egressos, entendemos que se faz necessária a reflexão, como também, a revisão das ações pedagógicas desenvolvidas no Ensino Superior. Contribui, também, para essa iniciativa, o fato de ter sido incluído no instrumento de avaliação para reconhecimento de Cursos de Pedagogia, no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), Portaria 808/2010, na Dimensão 1 Organização didático-pedagógica do Curso, o item 13, que trata do Atendimento ao Discente, devendo ser pontuado de 1 a 5, dependendo do nível de implementação realizado ou não nos “programas sistemáticos de atendimento extraclasse, e atividade de nivelamento, além de apoio psicopedagógico oferecido pela instituição”. Considerando as novas exigências do Ensino, nosso trabalho visa, portanto, o desenvolvimento de habilidades necessárias para a atuação do estudante, com procedimentos pedagógicos, psicopedagógicos e técnicas adequadas, detectando as causas pelas quais o sujeito não aprende ou encontra-se inadaptado. Por meio do Atendimento Psicopedagógico, buscamos proporcionar condições que facilitem o desenvolvimento do indivíduo, do grupo, da instituição e da comunidade, bem como a prevenção e a solução de dificuldades existentes de INTRODUÇÃO O objetivo deste artigo é apresentar o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem (NAPAp) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), sob a coordenação e supervisão da Profa Neide de Aquino Noffs e assumido pela equipe de pós-graduandas do Curso de Psicopedagogia da citada Instituição. O NAPAp, criado em 2007, é uma iniciativa da Faculdade de Educação da PUC/SP, que oferece o curso de Pós-graduação (lato sensu) em Psicopedagogia e atende a dois propósitos, sendo o primeiro, oferecer aos alunos, que optam pelo estágio institucional do curso de Psicopedagogia, o ambiente e as situações de aprendizagem exigidos no futuro exercício de sua prática e, como segundo propósito, atender aos alunos dos diferentes cursos de graduação que procuram apoio para lidar com sua aprendizagem. A partir de 2010, criamos grupos de apoio específicos para estudantes do curso de Pedagogia e demais licenciaturas, bem como a estudantes participantes do Programa Universidade para Todos (PROUNI). A Psicopedagogia se apresenta como uma área das Ciências Humanas que se dedica ao estudo dos processos de aprendizagem. Com olhar teórico transdisciplinar, o Psicopedagogo observa as características da aprendizagem humana, estuda como se aprende, como essa aprendizagem varia evolutivamente e está articulada a vários fatores, como se produzem as alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las. No olhar institucional, entendemos como “o estudo das modalidades de aprendizagem desencadeadas e/ou possibilitadas pela instituição-escola. Sua intenção é cuidar da prevenção e enfrentamento de confli tos envolvendo a escolarização. Este trabalho pressupõe uma postura profissional (e de vida) do indivíduo consigo mesmo e com a coletividade em que convive”1. Entendemos que, ao oferecer o atendimento psicopedagógico qualificado, contribuímos para melhor desempenho nas atividades acadêmicas Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 284 Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos a aprendizagem de crianças e a aprendizagem de adultos. Nossa investigação levou-nos às ideias e aos modelos que delinearam o percurso da Educação de adultos. Segundo Knowles et al.2, discernimos duas correntes de investigação para a Educação de adultos, a saber: a corrente científica e a corrente artística ou intuitiva reflexiva. Em 1926, com a publicação de The Meaning of Adult Education, Eduard C. Lindeman2 esta beleceu os fundamentos para uma teoria sobre a aprendizagem de adultos, denominada corrente artística ou intuitiva. Em sua investigação interessou-se em entender o modo como os adultos aprendem, buscando descobrir novos conhecimentos por meio da intuição e da análise da experiência. Em seus estudos observamos que Lindeman estabelece uma dicotomia entre a educação de adultos e a educação convencional, e não entre jovens e adultos como inicialmente podemos supor. A abordagem para a educação de adultos ocorrerá por meio de situações, e não de disciplinas. Nosso sistema acadêmico se desenvolveu em ordem inversa: as disciplinas e os professores são o ponto de partida; os alunos vêm em segundo lugar. Na educação convencional, espera-se que um aluno ajuste-se a um currículo estabelecido; na educação de adultos, o currículo é construído em torno das necessidades e interesses do aluno2. A corrente chamada científica foi proposta em 1928, por E. L. Thorndike, por ocasião da publicação de Adult Learning. É preciso ressaltar que a corrente científica busca “descobrir novos conhecimentos por meio de investigação rigorosa” e Thorndike interessou-se pela habilidade de aprendizagem dos adultos, e não pelos processos de aprendizagem. Seus estudos foram de grande importância na medida em que apresentam uma fundamentação científica para aquilo que, a princípio, constituía-se apenas como uma crença: de que os adultos podiam aprender. Podemos dizer que, na década de 1940, foi divulgada a maioria dos elementos necessários para uma conceitualização da aprendizagem de modo a atingir objetivos educacionais, pedagógicos e psicopedagógicos. Como objetivo geral, nos interessa ressignificar o papel do estudante no ensino superior, buscando atender às necessidades dos professores e dos estudantes, a fim de oferecer a esses condições de trabalho aperfeiçoado, apoiando-os durante o processo acadêmico, revendo a metodologia de ensino e de estudos utilizada por eles, aprimorando a organização e a autonomia do aprendente para a aquisição do conhecimento. O foco de nosso trabalho está nos sujeitos que estão em constante processo de aprendizagem, colaborando com a construção do seu conhecimento, identificando obstáculos no processo de aprendizagem e o seu desenvolvimento. Ao abraçarmos tal desafio nos deparamos com uma questão fundamental: Como tratar da aprendizagem desses professores/aprendentes adultos? Nossa pesquisa nos levou à percepção de que nossas intervenções, no ensino superior, estavam articuladas mais ao processo de aprendizagem das crianças do que aos profissionais adultos. Gostaríamos de ressaltar que a educação de adultos tem sido uma preocupação da Humanidade desde a Antiguidade, onde as escolas funcionavam com um conjunto de pressupostos, sobre a aprendizagem e as estratégias de ensino, que recebeu o nome de Pedagogia, que literalmente significa “a arte e ciência de ensinar crianças”. Constatando, então, que o ensino com adultos é algo ainda pouco discutido, iniciamos nosso estudo com o percurso histórico que nos introduzisse às ideias e aos pressupostos teóricos que norteiam a aprendizagem com adultos. O termo Pedagogia tem origem no modelo organizacional das escolas da Europa do século VII, já que estas tinham como função primordial preparar jovens meninos para o sacerdócio, tendo os professores a missão de doutriná-los na fé e nos rituais da Igreja. Somente após a Primeira Guerra Mundial surge um conjunto de ideias, que se expande, pouco a pouco, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, sobre as características que distinguem Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 285 Noffs NA & Rodrigues CMR adultos, porém esses elementos encontravam-se ainda fragmentados, não conjugados para um modelo integrado de aprendizagem. As pesquisas foram intensificadas durante a década de 1950, quando algumas disciplinas das ciências sociais, tais como, a psicologia clínica, a psicologia do desenvolvimento, a sociologia, a psicologia social e a filosofia, se interessaram pela aprendizagem de adultos. Observamos, também, que Freud, Jung, Erikson, Maslow e Rogers contribuíram enormemente com a ampliação do conhecimento sobre as diferentes dimensões do ser humano e, consequentemente, com os fatores que interferem nos processos de ensino e aprendizagem. Surge, assim, o termo andragogia, definido por Knowles como a “arte e a ciência de ajudar os adultos a aprender”, estabelecendo, inicialmente, o contraste com a pedagogia, que trata do ensino de crianças. Posteriormente, reconsiderou sua formulação, entendendo a andragogia como um modelo de princípios de aprendizagem e, portanto, podem ser considerados também, “à educação de crianças e jovens”3. No modelo de educação andragógico, os alu nos participam das diversas fases do processo de ensino-aprendizagem, no diagnóstico das ne cessidades educativas, na elaboração de plano, no estabelecimento de objetivos e nas formas de avaliações a partir do que foi definido no diag nóstico educativo. A metodologia é voltada para a participação ativa dos alunos com uma organização curricular flexível, visando atender às especificidades de cada adulto. O docente, envolvido nesse modelo, necessita conhecer o desenvolvimento e as ne cessidades de diferentes faixas etárias com as quais vai lidar. O professor é considerado um facilitador e, como tal, sua relação com os alunos é horizontal, tendo como principal característica o diálogo, o respeito, a colaboração, a confiança, o conforto, a informalidade, garantindo, assim, que o aluno se sinta seguro e confiante, propiciando um clima propício para a aprendizagem. A andragogia, enquanto modelo para a educação com adultos, é caracterizada pelo seu foco no processo de aprendizagem, ao invés da ênfase no conteúdo. O processo de aprendizagem se desenvolve seguindo uma ordem; sensibilização (motivação), pesquisa (estudo), discussão (esc larecimento), experimentação (prática), conclusão (convergência) e compartilhamento (sedimentação). O diálogo é fundamental, já que pressupomos um professor facilitador e um aluno aprendiz, compartilhando o conhecimento de um com a experiência do outro. Nesse processo, torna-se difícil distinguir quem aprende mais, se o professor ou o aluno, pois o aprendizado andragógico é caminho de duas vias e não um caminho de mão única, busca promover o aprendizado por meio da experiência, fazendo com que a vivência estimule e transforme o conteúdo, impulsionando a assimilação. Em nosso projeto de trabalho iniciamos com parando os diferentes modelos de conhecer: o pedagógico, compreendido aqui, como aprendi zagem tradicional e o andragógico, como aprendizagem contemporânea (Quadro 1). Todos nós, os que ensinam e os que aprendem, experienciamos o modelo tradicional de aprendizagem – o Pedagógico. Este modelo está presente em nossas escolas de ensino fundamental e médio, em nossos cursos de graduação e pós-graduação. Podemos inferir que as dificuldades apresentadas, atualmente, na aprendizagem dos alunos no ensino superior, estão associadas com a adoção de um modelo pedagógico para o ensino de jovens adultos. Partindo desse pressuposto, planejamos a intervenção psicopedagógica, aplicando o sistema de hipóteses andragógicas, dialogando com as hipóteses pedagógicas, já estabelecidas e vivenciadas pelos ingressantes em situação de aprendizagem. O projeto de intervenção ocorreu ao longo do ano letivo de 2010 e, para nortear nossas ações, realizamos um cronograma contando com elaboração de instrumentos investigativos, execução dos instrumentos planejados e avaliação (Quadro 2). Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 286 Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos Quadro 1 – Modelos de aprendizagem. Modelo Pedagógico Aprendizagem Tradicional Modelo Andragógico Aprendizagem Contemporânea Professor é o centro das ações, decide o que ensinar, como ensinar, e avalia a aprendizagem A aprendizagem adquire uma característica mais centrada no aluno, na independência e na autogestão da aprendizagem O aluno deve aprender o que a sociedade espera que saibam (seguindo um currículo padronizado) Pessoas aprendem o que realmente precisam saber (aprendizagem para a aplicação prática na vida diária) O ensino é didático, padronizado e a experiência do aluno tem pouco valor A experiência é rica fonte de aprendizagem, por meio da discussão e da solução de problemas em grupo Aprendizagem por assunto ou matéria e motivadas por pressão externa (pais/professores/empregadores) notas e certificados Aprendizagem baseada em problemas, exigindo ampla gama de conhecimentos para se chegar à solução Quadro 2 – Cronograma. Atividades Realizadas Período Elaboração do Pré-Projeto de Intervenção do NAPAp Fevereiro/2010 Análise e discussão dos dados obtidos nos Questionários aplicados pela PUC-SP aos alunos inscritos nos Cursos de Graduação em Pedagogia, durante o Vestibular Unificado/2010 Março/2010 Contato com a Coordenação dos Cursos de Graduação em Pedagogia da PUC-SP Abril/2010 Elaboração dos Questionários para reconhecimento do perfil de aluno dos Cursos de Graduação em Pedagogia da PUC-SP Abril/2010 Aplicação dos Questionários Maio/2010 Tabulação dos dados obtidos nos Questionários Maio/2010 Análise e discussão dos dados obtidos nos Questionários Maio e Junho/2010 Planejamento dos atendimentos Junho/2010 Encontro de apresentação aos alunos interessados em participar do projeto Junho/2010 Atendimento aos alunos Agosto a Novembro/2010 Interpretação dos resultados obtidos nos atendimentos Novembro/2010 Confecção de relatório final dos atendimentos Dezembro/2010 Inicialmente, distribuímos uma carta convite (Anexo 1), expondo, em linhas gerais, a nossa intenção de trabalho e, em seguida, distribuí mos um questionário a ser preenchido por aqueles que desejassem participar do projeto (Anexo 2). Esse questionário foi realizado com a finalidade de levantamento de dados iniciais, do perfil da clientela e do conhecimento prévio das experiências educativas dos interessados. As perguntas foram elaboradas tomando-se por base, os seis princípios fundamentais que orientam o modelo andragógico na prática, demonstrado na Figura 1. A Figura 1 pode ser interpretada como representante do percurso da aprendizagem, no qual estão expostos, ao centro, os seis princípios, rodeados por outros fatores que afetam o processo de aprendizagem, tais como: as diferentes modalidades de aprendizagem, que individualmente possuímos, as influências sociais, culturais ins titucionais, entre outros (Quadro 3). Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 287 Noffs NA & Rodrigues CMR Anexo 1 – Carta convite. CONVITE Núcleo de Apoio Pedagógico à Aprendizagem Prezado(a) Estudante de Pedagogia O Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem (NAPAp / PUC-SP), após análise e sua anuência manifesta em questionário específico, vem convidá-lo(a) a participar deste projeto. Nossa primeira reunião será no dia____de_______de 2010, segunda-feira, às ____ h, na sala ____. Este Núcleo está voltado, preferencialmente, aos alunos ingressantes do curso de Graduação em Pedagogia e demais licenciaturas da PUC-SP. Busca a qualificação destes estudantes, bem como, sua inserção no mercado de trabalho como profissional da Educação. Contamos com sua presença! Saudações pedagógicas e psicopedagógicas, Equipe NAPAp / PUC-SP tivas de Jorge Visca, nas primeiras sessões, para explorarmos a relação de aprendizagem estabelecida em cada um dos elementos do grupo, e também abrir o canal da escuta psicopedagógica para as demandas individuais e coletivas. Após esse momento, organizamos as sessões a partir de atividades pedagógicas específicas articuladas a um processo de autoconhecimento do estudante como pessoa e como acadêmico. Entre as atividades pedagógicas específicas eram oferecidos textos de jornais, revistas, artigos de livros científicos proposto pelo curso (do qual o cliente era oriundo), bem como subsídios específicos às situações vivenciadas academicamente, tais como: seminários, trabalhos individuais ou coletivos, relação professor-aluno e aluno-aluno. Visando à compreensão do processo an dragógico e psicopedagógico de aprendiza gem, eram refletidas no momento da supervisão deste estágio: as atividades a serem desenvolvidas, o processo e atuação dos profissionais, e também, o produto conquistado individual e coletivamente. Assim, após o levantamento, a leitura e a análise dos dados obtidos, nossos objetivos específicos foram assim definidos: • Rever a concepção e a atuação do estudante universitário; • Auxiliar o aprendiz para que se vincule à tarefa de modo a produzir uma aprendizagem efetiva; • Selecionar estratégias facilitadoras da aprendizagem, que envolvam a escolaridade como um todo; • Utilizar o cotidiano como um desencadea dor das reflexões pertinentes aos seus processos de ensino e aprendizagem; • Integrar pessoas, bem como a modalidade de articulações possíveis entre os con teúdos-conhecimentos escolares e as ati vidades de ensino-aprendizagem; • Proporcionar a transposição didática, integrando os saberes empíricos, ensinados e científicos. Estabelecido os objetivos a partir da análise dos dados, iniciamos as sessões, atendendo aos grupos e optamos por utilizar as técnicas proje- Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 288 Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos Anexo 2 – Questionário de ingresso. Núcleo de Apoio Pedagógico à Aprendizagem QUESTIONÁRIO DE INGRESSO/2010 Nome:_______________________________________________________________________ Data Nascimento____/_____/____ e-mail:______________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ Naturalidade:________________________________ □ □ Sexo: MasculinoResidencial:________________________ FemininoCelular:___________________________ Comercial:_________________________ Estado Civil:_____________________ Curso:______________________________________________________________________________________________________ □ SimModalidade:____________________ □ Não □ Regular □ Pública Ensino Fundamental I, II:___________________________________ __________________________________________________________ □ EJA □ Privada Ensino Médio:_____________________________________________ □ Regular □ Pública __________________________________________________________ □ EJA □ Privada Forma de Ingresso:___________________________ Bolsista: Período de Ingresso:__________________________ • Formação acadêmica:_______________________________________________________________________________________ • Neste período em que cursou Ensino Fundamental e o Ensino Médio, houve alguma reprovação, em qual série? ____________________________________________________________________________________________________________ • Você foi submetido a algum tipo de intervenção ou ajuda de profissionais? Ex: aulas particulares, atendimento psicológico, salas de atendimento, fonoaudiólogas e etc. ____________________________________________________________________________________________________________ • Quais as estratégias usadas pelo professor que você mais se identificou no Ensino Fundamental e Médio? E quais as que menos se identificou? ____________________________________________________________________________________________________________ • Como você avalia o seu aprendizado durante o Ensino Fundamental? ____________________________________________________________________________________________________________ • E no Ensino Médio? ____________________________________________________________________________________________________________ • O que a escola representa para você de uma maneira geral? ____________________________________________________________________________________________________________ • Qual o motivo da escolha desse curso? ____________________________________________________________________________________________________________ • Esse é a sua primeira graduação? □ Sim □ Não • Se não, qual a sua outra graduação__________________________________________________________________________ • Como é a sua vivência atual em relação à produção acadêmica? Leitura Ótima Boa Interpretação de textos Resenhas Seminários Pesquisas Elaboração de projetos □ □ Ótima □ Ótima □ Ótima □ Ótima □ Ótima □ □ Boa □ Boa □ Boa □ Boa □ Boa □ Regular □ Regular □ Regular □ Regular □ Regular □ Regular Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 289 Noffs NA & Rodrigues CMR Continuação Anexo 2 – Questionário de ingresso. • Sente alguma dificuldade em acompanhar o curso? De que natureza? Métodos de estudo Sim Não Situação de escrita Interpretação de textos Leitura Organização pessoal Apresentação de Seminário □ □ Sim □ Sim □ Sim □ Sim □ Sim □ □ Não □ Não □ Não □ Não □ Não • Gostaria de ter algum apoio no Ensino Superior? Qual? ____________________________________________________________________________________________________________ • Teria interesse em participar de sessões de apoio psicopedagógico às segundas-férias na PUC-SP? Marque com X o horário de sua preferência □ Grupo A: 12h às 13h □ Grupo B: 18h às 19h Sugere outro horário para formação de grupo?_________________________________________________________________ Data:____/_____/_____ __________________________________________________ Assinatura Quadro 3 – Princípios da Andragogia e norteadores da ação interventiva no NAPAp. Os adultos precisam saber por que eles precisam aprender algo antes de aprendê-lo A autopercepção dos adultos é altamente dependente de um movimento rumo à autodireção As experiências prévias do aprendiz fornecem riqueza de recurso para a aprendizagem Os adultos tipicamente se tornam prontos para aprender quando experienciam a necessidade de lidar com uma situação de vida ou realizar uma tarefa A orientação de aprendizagem de adultos é centrada na vida; a educação é um processo de desenvolvimento dos níveis de competências para que atinjam seu potencial complexo A motivação para a aprendizagem dos adultos é mais interna do que externa Figura 1 – O modelo de Andragogia na prática. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 290 Andragogia na psicopedagogia: a atuação com adultos um paradigma de educação, no qual o centro do processo seja, integralmente, o sujeito, sua aprendizagem em suas diferentes dimensões4. Outro ponto importante foi a identificação do grupo com os objetivos e propósitos para a aprendizagem indicados no quadro modelo de andragogia na prática com a Psicopedagogia. O psicopedagogo em suas ações reconhece, nos seis princípios fundamentais da aprendizagem com adultos, um roteiro possível de ser seguido desde que o profissional o faça refletidamente e não mecanicamente. A atuação do psicopedagogo a partir da perspectiva da andragogia se apresenta como mais uma possibilidade de inovação às referências convencionais de intervenção na dimensão institucional do psicopedagogo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Estas reflexões são registros de um processo em execução, configurando-se num estudo ainda não conclusivo. O que já podemos adiantar é que, diante dos dados apresentados e das experiências com os indivíduos do grupo, vislumbramos a necessidade de se repensar os modelos de ensino, principalmente para aqueles que exercerão, futuramente, o papel social de docentes. Ressalta-nos a necessidade de que, os mediadores dos processos de aprendizagem, entre eles, o psicopedagogo, se esforce para encontrar estratégias que contemplem as reais necessidades e demandas dos aprendentes, revendo os procedimentos e as propostas educacionais atuais, abrindo diálogo entre as diferentes teo rias e áreas do conhecimento, estabelecendo SUMMARY Andragogy in psychopedagogy: the role with adults With this article, we aim to expose the research being developed in the NAPAp/PUC-SP (Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem) and presented in a lecture, given by Prof. Neide de Aquino Noffs, at the IV International Symposium on Psychopedagogy, held in Sao Paulo, in 2010, by Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp). Such research leads us to note that the Psychopedagogy for decades focused on building activities with children and adolescents of school age. However, after the implementation of the Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), which was included as an indicator for evaluating the degree courses and pedagogy the item “student service” we mean that it is necessary to reflect and review the actions developed pedagogical in Higher Education. This item to be evaluated will be scored from 1 to 5 and the standard of review includes levels of implementation (or not) programs for “extra class attendance and grading activity” beyond psychopedagogical service offered by the institution. Supported this assumption, we started from 2007, an intervention project through the NAPAp/PUC-SP. This core, taken by students of Psychopedagogy in the institutional approach, coordinated and supervised by Prof. Neide de Aquino Noffs, is building tools and methodologies specific to adults seeking assistance to identify and / or improve their academic performance, professional and personal. In this paper, we discuss the contributions of this action in the expansion of the field of adult learning: andragogy. KEY WORDS: Teaching. Learning. Education, higher. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 291 Noffs NA & Rodrigues CMR REFERÊNCIAS 3. Knowles MS, Holton III EF, Swanson RA. The modern practice of adult education: from pe dagogy to andragogy. New York:Association Press;1980. 4. Noffs NA, Espósito VHC. Formação de profissionais da Educação: da proposição à ação. Rev Psicopedagogia. 2011;28:178-84. 1. Noffs NA. Psicopedagogo na rede de ensino: a trajetória institucional de seus atores-autores. São Paulo:Elevação;2008. 2. Knowles MS, Holton III EF, Swanson RA. Aprendizagem de resultados: uma abordagem prática para aumentar a efetividade da educação corporativa. Rio de Janeiro:Elsevier;2009. Trabalho realizado no Núcleo de Apoio Psicopedagógico à Aprendizagem (NAPAp) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, SP, Brasil. Artigo recebido: 1/10/2011 Aprovado: 28/10/2011 Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 283-92 292 Aplicação das tecnologias digitaisde virtuais no contexto psicopedagógico ARTIGO revisão Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico Ana Margô Mantovani; Bettina Steren dos Santos RESUMO – As Tecnologias Digitais Virtuais (TDVs) trazem novas pos sibilidades de interação, comunicação e representação, possibilitando um leque cada vez maior de aplicações no campo psicopedagógico, pois podem tornar-se instrumentos para a investigação das vinculações inadequadas que ocorrem no processo de aprendizagem. No entanto, para o psicopedagogo ser o protagonista desse processo e atender à demanda da geração di gital, é necessário vivenciar experiências com tais tecnologias, a fim de desenvolver competências didático-pedagógicas, aliadas a competências tecnológicas-digitais, que lhe viabilizem interagir e utilizar essas tecnologias em sua prática psicopedagógica, tanto institucional como clínica. Nesse contexto, apresentamos uma revisão teórica acerca das possibilidades psicopedagógicas do uso das TDVs, destacando contribuições advindas dos estudos e da experiência docente e psicopedagógica das autoras com a utilização dessas tecnologias. A partir das reflexões realizadas, acreditamos que a utilização das TDVs na prática psicopedagógica, por atuar no campo das representações virtuais, aciona os mecanismos da projeção, facilitando assim a investigação das significações do ato de aprender e a representação social que o sujeito faz dos conhecimentos escolares, familiares e consigo mesmo, abrindo novas vias para a ressignificação da aprendizagem. UNITERMOS: Aprendizagem. Metodologias computacionais. Software. Ana Margô Mantovani – Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Psicopedagoga e Docente do Programa de Pós-Gra duação – Mestrado em Memória Social e Bens Cul turais e Graduação do Centro Universitário La Salle (UNILASALLE), Canoas, RS, Brasil. Bettina Steren dos Santos – Pós-doutorado no College of Education, The University of Texas at Austin, EUA. Doutorado em Psicologia Evolutiva e da Educação – Universidad de Barcelona. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação e da Faculdade de Educação/ Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil. Correspondência Ana Margô Mantovani Avenida Victor Barreto, 2288, Sala 315, Prédio 1 – Canoas, RS, Brasil – CEP: 92010-000 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 293 Mantovani AM & Santos BS ções, tais como dúvidas, ansiedades, alegrias e frustrações no uso de tais tecnologias, para após utilizá-las com nossos aprendentes, sejam alunos e/ou pacientes. Nesse sentido, Weiss5 aponta que o compu tador deve ser visto como mais um recurso na clínica e, compete a nós buscar o potencial psicopedagógico diferenciado que essas tecno logias apresentam, principalmente em relação à possibilidade da expressão da rede de nosso pensamento, vinculada à convivência em espa ços digitais virtuais. Para Weiss5 “o percurso que cada um utilizará irá depender dos “nós” de conexão que forem escolhidos ao longo da jornada. Poderemos encontrar aí os “nós” das vinculações inadequadas no processo de aprendizagem de cada sujeito”. Assim, esse artigo apresenta uma revisão teó rica sobre as potencialidades do uso das TDVs no campo psicopedagógico, destacando algumas contribuições advindas dos estudos e da expe riência docente e psicopedagógica das autoras com as aplicações de tais tecnologias. Para tal, elucidamos alguns conceitos referentes às tecno logias que serão abordadas nesse artigo, desta cando nossas concepções acerca dos processos de ensinar e aprender nesse contexto, apresen tando possibilidades didático-pedagógicas e, em especial, psicopedagógicas do uso dessas tecnologias. INTRODUÇÃO Nossa vivência no contexto da sociedade con temporânea está imersa em uma nova cultura digital, quer sejamos “imigrantes” ou “nativos digitais” (também denominados de “Homo zappiens”). Prensky1 destaca que os nativos digitais têm contato com a tecnologia logo após o nasci mento, então desde cedo aprendem a conviver no cenário dos espaços digitais virtuais. Para Veen e Vraking2, o Homo zappiens caracteriza a geração que nasceu em plena ebulição de uma cultura cibernética global, sustentada pela multimídia e, como consequência, se comporta, pensa e aprende de uma forma diferenciada. É uma geração que pertence a redes e faz uso delas para resolver problemas, por isso não pensa de uma forma linear, pensa em redes e de forma mais colaborativa do que as gerações anteriores. Então, o modo de ser do Homo zappiens é digital e não analógico. De acordo com Prensky1, os imigrantes digi tais são aqueles que assistiram ao nascimento da Internet e se adaptaram a ela, como é o caso da maioria dos docentes e psicopedagogos que se encontram em atividade profissional. Então, estamos vivenciando o encontro das gerações analógica e digital e, para que esse momento possa contribuir com mudanças significativas na compreensão dos processos de ensinar e de aprender, ou nas palavras de Fernandez3, nas re lações que se estabelecem entre aprendente, en sinante e objeto de conhecimento, é necessário que a geração analógica conheça os “idiomas” da geração digital. Desse modo, para atender aos anseios e inte resses da geração digital, é necessário incorporar em nosso dia a dia e, em nossa prática psicope dagógica, a convivência em espaços propiciados pelas TDVs, para que possamos utilizá-las com competência didático-pedagógica e competên cia tecnológica-digital, a fim de acompanhar e propor mudanças decorrentes da “Sociedade em Rede”4. No entanto, para que nos autorizemos a intervir nessa realidade, precisamos primeiro conhecer as possibilidades e as limitações dessas tecnologias, sentir nossas percepções e sensa CONCEITUANDO TECNOLOGIAS DIGI TAIS VIRTUAIS (TDVS) A Web 1.0, denominada como a primeira geração da Internet, se caracterizava pela dis ponibilização de informação em páginas escritas em HTML, com baixa capacidade de interação. A partir do surgimento da Web 2.0, as tecnologias associadas à rede Internet disponibilizaram aos usuários da rede (interagentes) diversos serviços e ferramentas que permitem o compartilhamento gratuito de arquivos, vídeos, músicas e o estabe lecimento das redes sociais, apresentando um grande potencial de interação, característica mar cante dessa nova geração de tecnologias. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 294 Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico Consideramos importante destacar os con ceitos de interação sugeridos por Primo6, uma vez que o autor diferencia a interação mútua da interação reativa presente na interação humana mediada por computador. A interação mútua se caracteriza como um sistema aberto, sendo que os sujeitos participam ativamente da construção do relacionamento e se afetam mutuamente, recriando o processo a cada troca. A interação reativa caracteriza um sistema fechado de rela ções determinadas por estímulo e resposta. Por apresentar relações lineares e unilaterais, os sujeitos têm pouca ou nenhuma possibilidade de construir o relacionamento. Assim, as TDVs aqui referidas caracterizam -se pela integração e a combinação de diferen tes tecnologias por meio da Web 2.0, aliadas às tecnologias da Web 3D, representadas princi palmente pelos metaversos que possibilitam a construção de Mundos Digitais Virtuais em 3 Dimensões (MDV3D) e potencializam os pro cessos de interação. O termo metaverso foi criado por Neal Ste phenson, em 1992, no romance Snow Crash e é utilizado para designar um mundo virtual ficcional. Conforme Schlemmer e Backes7, o metaverso “é uma tecnologia que se constitui no ciberespaço e se “materializa” por meio da criação de Mundos Digitais Virtuais em 3D, no qual diferentes espaços para o viver e conviver são representados em 3D, propiciando o surgimento dos “mundos paralelos” contemporâneos”. Os metaversos-MDV3D possibilitam novas formas de interação proporcionadas pelo alto grau de imersão do sujeito (e-habitante) no am biente, pois este pode estar telepresente por meio de um avatar, uma representação gráfica em 3D, e interagir por meio das diferentes linguagens de comunicação: textual, oral, gestual (movimentos evidenciados nas ações do avatar) e gráfica, além de ser teletransportado virtualmente para diversos lugares localizados nesses mundos. Aqui, acontece a interação mútua apontada por Primo6 e, se considerarmos que a interação é um dos principais fatores para que a aprendizagem aconteça, compreender a intricada teia das in terações geradas nos Mundos Virtuais seria fun damental para potencializar as aprendizagens decorrentes desses ambientes. Essas tecnologias possibilitam uma comuni cação em rede, emergentes do ciberespaço, pro movendo novas formas de (re)construção dos conhecimentos, através de processos mais coo perativos e interativos, bem como a construção de novos espaços de aprendizagem, na medida em que modifica as representações de tempo e espaço e a relação do sujeito com seu próprio corpo e com a construção de sua própria história8. Essas questões devem estar presentes na teoriza ção didático-pedagógica e psicopedagógica que permeia os processos de ensinar e aprender. AS TRAMAS E “NÓS” DA APRENDIZAGEM NO CONTEXTO PSICOPEDAGÓGICO No campo psicopedagógico, para que a apren dizagem aconteça, é necessário ter presente três instâncias: o aprendente, o ensinante e o objeto de conhecimento. Quando os vínculos que se es tabelecem entre essas instâncias são adequados, configura-se a aprendizagem e, quando surgem “nós” entre esses vínculos, colocando em risco a circulação dos saberes e dos conhecimentos, mobilizando o pensamento, surgem as diferentes fraturas na aprendizagem. Em nossa concepção, a aprendizagem se dá na trama dialética de interação com o mundo objetivo e sociocultural, entrelaçada na estru turação da lógica (estrutura epistêmica) e da dra mática (estrutura desejante) do sujeito. São duas estruturas constituídas no nível de representa ções e manifestadas por meio da linguagem. Apesar de estarem intrinsecamente entrelaça das, pois ambas definem e são determinantes na geração de nossas ações e reações, elas não são idênticas9,10. Para Fernández9, a capacidade de organiza ção lógica e a significação simbólica acontecem ao mesmo tempo, no entanto, uma estrutura é de caráter genético, que vai se autoconstruindo, e a outra estrutura é desejante, que embora não seja genética, vai entrelaçando um sujeito que tem uma história. Então, a aprendizagem se dá Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 295 Mantovani AM & Santos BS na concepção de um sujeito que no uso de sua singularidade estruturada e estruturante, na medida em que interage dialeticamente com o mundo sociocultural (afeta e é afetado) aprende com as relações estabelecidas com o outro, por meio dos vínculos socioafetivos, entrelaçados pela ação e pela linguagem. Situamos aqui o contexto de construção de um corpo teórico psicopedagógico que, usando as diversas áreas do conhecimento, tem o propó sito de compreender o sutil entrelaçamento entre a inteligência e o desejo do sujeito que “suporta” a aprendizagem. Pain11 aponta o problema de aprendizagem como um lugar privilegiado e talvez o único que permite observar as relações entre ambas às estruturas. Conforme Fernández9, para interpretar um problema de aprendizagem é necessário conhe cer o lugar que tal problema está enganchado no simbólico, uma vez que existe uma certa dependência, uma ligação entre o simbolizado e o símbolo escolhido. Assim, segundo a autora, o problema de aprendizagem “sintoma” está liga do ao fracasso da simbolização frente à anulação do desconhecimento, ou seja, a impossibilidade de simbolizar sobre uma determinada situação, é que provocaria um sintoma. Nesse sentido, a autora mostra que entender a diferença e eli minar a distância entre o real e o imaginário implica encontrar na ordem do simbólico um novo significado. Para a autora, a passagem da simbolização torna possível mobilizar a circu lação patológica do conhecimento na criança e em seu grupo familiar, abrindo-se assim a via da ressignificação da aprendizagem. Desse modo, temos evidências de que o sinto ma, ao cristalizar-se na aprendizagem, bloqueia as possibilidades desse processo. Então, como psicopedagogos precisamos desvendá-lo, ou me lhor, desembrulhá-lo e constatar nesse sintoma aquilo que está ausente. No trabalho clínico, compete ao psicopedagogo, trabalhar para o desaparecimento do sintoma e criar condições, estratégias para que a aprendizagem aconteça, liberando os entraves que existem na relação do sujeito com o conhecimento. Acreditamos que, nos espaços digitais vir tuais, a simbolização se insinua a todo instante. A “navegação” nesses ambientes possibilita um grande “mergulho” no simbólico e as crianças de hoje, os nativos digitais, já são testemunhas do revestimento simbólico proporcionado pelo com putador e suas múltiplas interconexões, porque as tecnologias fazem parte do seu mundo, da sua cultura. Então, não seriam os espaços digitais virtuais instrumentos ou recursos propícios para investigação e/ou manifestação dos problemas de aprendizagem? Por isso, a importância de utilizarmos o com putador e suas múltiplas conexões, por meio das TDVs, como instrumentos de construção sim bólica, que podem participar desse processo de desvelamento do simbólico e, por consequência, dos sintomas de aprendizagem. Consideramos importante utilizar essas tecnologias, enquanto psicopedagogos, para que as crianças, adoles centes e até mesmo os adultos, estabeleçam no vos vínculos e/ou relações com a aprendizagem. POSSIBILIDADES DAS TDVS NA APLICA ÇÃO DAS TÉCNICAS PROJETIVAS PSICO PEDAGÓGICAS Visca12 destaca que a aprendizagem não é só escolar, por isso em uma investigação psicope dagógica deve-se investigar o tipo de vínculo que o sujeito estabelece com o professor, a sala de aula, os conteúdos, os colegas e a escola, mas também a relação com as pessoas fora do contex to escolar. Nessa perspectiva, Weiss5 aponta que é necessário investigar a relação da criança com os adultos significativos que lhe oferecem ou não modelos de aprendizagem, bem como os cenários onde isto ocorre. Nesse caso, Visca12 sugere a aplicação das Técnicas Projetivas Psicopedagó gicas, que permitem investigar os vínculos que o sujeito estabelece com a aprendizagem, como também com as circunstâncias dentro das quais ocorre tal construção. Assim, o objetivo dessas técnicas é estudar as redes de vínculos que o sujeito estabelece em três grandes domínios: escolar, familiar e consigo mesmo. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 296 Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico Desse modo, Visca12 considera as Técnicas Projetivas Psicopedagógicas instrumentos para a compreensão dos fatores emocionais que condicionam de forma positiva ou negativa a aprendizagem, sendo que o foco é o processo de aprendizagem, as significações do ato de apren der e a representação social que o sujeito faz dos conhecimentos escolares, familiares e consigo mesmo. Dentre as técnicas projetivas propostas por Visca12, em relação aos vínculos escolares, destacamos: par educativo; “eu com meus cole gas”; a planta da sala de aula. Em relação aos vínculos familiares estão: a planta da minha casa; os quatro momentos do dia; a família educativa. E, em relação aos vínculos consigo mesmo: o desenho em episódios; o dia do meu aniversário; em minhas férias; fazendo o que mais gosto. Chamat13 também apresenta e resgata algumas técnicas projetivas, tais como a pareja educativa, o par educativo familiar, a técnica do “eu” ideal e real, desenho livre e da família, da figura humana, situação agradável e desagradável, entre outras. A autora alerta que a aplicação dos instrumentos projetivos requer do psicopedagogo sustentação teórica para subsidiar a interpretação e a com preensão de que tais instrumentos não podem ser analisados individualmente, mas, sim, inseridos em um determinado contexto, considerando a história de vida individual e familiar do sujeito. Diante das considerações aqui referidas, pode mos inferir que o uso das TDVs na clínica psicope dagógica, por atuar no campo das representações virtuais, agiliza os mecanismos da projeção no sentido de deslocamento, ou seja, o sujeito projeta para fora de si o que se recusa a reconhecer em si mesmo. Então, através da projeção, é possível que o inconsciente se manifeste liberto dos entraves que habitualmente o impedem de expressar-se, deslocando para o plano objetivo os conteúdos latentes que podem estar significando suas apren dizagens em aprender ou não aprender12. dagógico deverão ser criteriosos, por isso faz-se necessário considerar alguns requisitos técnicos e pedagógicos, para garantir a qualidade desses recursos computacionais. Através dos estudos realizados, referenciados em autores, tais como Padovani e Moura14, Giraffa15 e na Rede Interativa Virtual de Educação16 (RIVED), da experiência dessas autoras com o uso de diversas TDVs e da prática no desenvolvimento de software, jogos e websites educacionais, bem como na construção de MDV3D, destacamos a seguir os principais requisitos que devem orientar a seleção de tais tecnologias. Em relação aos requisitos pedagógicos, os recursos computacionais deverão ser didatica mente bem estruturados, explorando a interati vidade proporcionada pelos recursos multimídia, aliados aos ambientes hipermídia, para instigar o sujeito a: • Desenvolver a capacidade de representação por meio de palavras (signos verbais) e/ou imagens mentais (símbolos imagéticos); • Testar diferentes caminhos; • Visualizar conceitos de diferentes pontos de vista; • Relacionar conceitos, organizar e construir conhecimentos; • Comprovar e formular novas hipóteses; • Tomar decisões e resolver problemas; • Aguçar a curiosidade, criatividade e ima ginação; • Trabalhar em equipe promovendo os pro cessos de colaboração e cooperação; • Promover situações que favoreçam a in dependência e a autonomia; • Instigar o desenvolvimento de diversas competências e habilidades; • Ampliar as possibilidades de interação por meio de atividades variadas, criativas e com nível de complexidade. Como apresentaremos software educativos categorizados como abertos, flexíveis, que pos sibilitam interação mútua, não nos deteremos na questão do feedback. No entanto, na escolha de software categorizado como fechado e con dutivista, que no geral proporcionam apenas SELECIONANDO TDVS PARA APLICAÇÃO NO CONTEXTO PSICOPEDAGÓGICO A seleção e o processo de escolha das tecno logias a serem utilizadas no contexto psicope Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 297 Mantovani AM & Santos BS interação reativa, é importante que o software ofereça um feedback construtivo, ou seja, ofereça uma resposta apropriada que mostre ou distinga o certo do errado e que leve o sujeito à reflexão, auxiliando-o em possíveis soluções às questões apresentadas. E, em relação aos requisitos técnicos, os re cursos computacionais devem: • Apresentar facilidades de uso, possibili tando acesso intuitivo por parte de pro fessores e/ou psicopedagogos e alunos e/ou pacientes não familiarizados com o manuseio do computador; • Dispor de interface e navegação adequa das para compreensão do conteúdo ou conceitos apresentados e à faixa etária a que se destina; • Apresentar design agradável, claro, bem elaborado, com fácil funcionamento e execução na web. Consideramos importante destacar que esses recursos computacionais também devem apre sentar facilidades que proporcionem acessibilida de para as Pessoas com Necessidades Educativas Especiais (PNEEs), a fim de garantir a inclusão social e digital dessas pessoas. Constatamos que a maioria dos softwares dis poníveis no mercado e na web, sejam proprietários ou gratuitos, apresenta inúmeras deficiências nos requisitos aqui destacados, principalmente em relação à interação (geralmente mais reativa do que mútua), feedback, interface e acessibilidade. Desse modo, apresentamos, a seguir, ambientes computacionais categorizados como abertos, di nâmicos e interativos, cujo enfoque é a aprendi zagem, a construção do conhecimento por meio da participação ativa do sujeito em seu viver e conviver. senho ainda sirva com um elemento de apoio para a leitura. Conforme as autoras, essa dife renciação é importante por representar um avanço cognitivo relevante no que se refere à produção textual. Os estudos sobre a psicogênese da língua escrita, desenvolvidos pelas autoras referidas, comprovam que a criança reconstrói o código lin guístico e reflete sobre a escrita. Esses estudos introduzem uma nova proposta, provocando um repensar nos antigos métodos fundamentados em concepções mecanicistas sobre o processo de alfabetização. A preocupação deixa de ser ‘como se deve ensinar a escrever’, passando para ‘como alguém aprende a ler e escrever’, independente do ensino. Em outras palavras, o processo deslo ca-se do ato de ensinar para o ato de aprender, através da construção de um conhecimento que é realizado pela própria criança que, ao invés de ser passiva, recebendo e absorvendo o que lhe é ensinado, participa ativamente desse processo. Assim, a criança constrói várias hipóteses que caracterizam os níveis de alfabetização, até cons truir o conhecimento da base alfabética escrita. Então, compete ao professor ou psicopedagogo desenvolver atividades que favoreçam a reflexão da criança sobre a escrita, para que ela possa desestruturar sua concepção atual e avançar nos níveis conceituais linguísticos, porque é pensando que ela aprende. Nessa perspectiva, sugerimos o uso dos seguin tes softwares para as crianças dos anos iniciais. Histórias Fantásticas: Esse Objeto de Apren dizagem (OA) está disponível no website da Proativa (http://www.proativa.vdl.ufc.br). O ob jetivo desse OA é motivar a criança a escrever de uma forma prazerosa e lúdica, autônoma e cria tiva, facilitando essa escrita por meio da relação e da coerência entre a escrita e a imagem-texto. Por isso, disponibiliza duas formas de produzir histórias: produções textuais apoiadas a priori por imagens e produções textuais sem o apoio de ilustrações, que deverão ser realizadas somente após a elaboração da história. Na Atividade 1, primeiro escolhe-se um ce nário para ilustrar (fazenda, praia, circo, floresta, Software para produção gráfica, textual e multimídia Ferreiro e Teberosky17 apontam que, na fase inicial das representações gráficas infantis, o desenho e a escrita se confundem, mas a partir dos seis anos de idade, as crianças já conseguem diferenciar as letras das imagens, embora o de Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 298 Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico sertão, escola) e após pode-se escolher persona gens, objetos e animais para compor o cenário e produzir a história. As histórias podem ser salvas no formato de imagem, o que possibilita inte grá-las a outras tecnologias. Na Atividade 2, pri meiro escreve-se a história em forma de um livro e depois pode-se construir os próprios desenhos por meio de um editor gráfico disponível no objeto de aprendizagem. Essa ilustração é adicionada à história, mas a criança fica livre para escolher se deseja ilustrar a sua história ou não. Esse OA pode ser utilizado na clínica psico pedagógica para realização de atividades, tais como composição de cenários, ilustrações e produções de histórias de acordo com a proble mática apresentada pela criança, observando questões pertinentes aos laços simbólicos, fami liares, afetivos, escolares, etc., além das questões pedagógicas relacionadas à leitura e escrita, or ganização espacial, coordenação motora, dentre outras. Por isso. sugerimos utilizá-lo para aplica ção das técnicas psicopedagógicas do desenho livre, da família e da figura humana e/ou das técnicas projetivas psicopedagógicas, família cinética/educativa, desenho história/episódio e par/pareja educativa, dentre outras. Kid Pix: O Kid Pix é um editor gráfico, software proprietário da conceituada empresa americana Broderbund, traduzido no Brasil pela Positivo Informática. Esse software foi lançado em 1991 e já passou por várias versões, tais como Kid Pix Deluxe 3, Kid Pix 4. Pode ser utilizado na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Esse software permite a criação de atividades multimídias, explorando recursos de carimbos separados em diversas categorias, imagens, sons, vídeos (que podem ser gravados em formatos AVI e EXE) e fundos/backgrounds que podem ser combinados com textos e composição de cenários. Também permite criação à mão livre. Na versão Kid Pix 4, o software permite a in clusão de vídeos e fotos na tela de pintura. Em relação aos vídeos, as crianças podem escolher gravações no arquivo do computador, inseri-las e pintar o quadro ao redor da tela de exibição das imagens. Tanto os vídeos quanto as apre sentações podem ser importados para outros programas. Outro recurso multimídia importante é a exploração dos sons, pois apresenta a possibi lidade de gravar a própria voz, permitindo assim personificar os trabalhos ou utilizar o recurso “leitura” do próprio texto escrito, escolhendo o tipo de voz. Em relação às fotos, é possível editar imagens da própria criança, da família, amigos, etc., e utilizar todas as ferramentas disponíveis para aplicar efeitos variados. Também é possí vel fazer apresentações de slides com todas as criações feitas com o uso do software na opção “Slide Show”. O Kid Pix, por ser um software educativo de ambiente pedagógico aberto, pode ser consi derado um software de autoria, pois permite a construção de simples garatujas e desenhos até projetos mais elaborados, envolvendo apresen tações, vídeos e animações, com a participação ativa do usuário, sendo este o autor da sua pró pria criação. Por isso mesmo, pode ser utilizado em diferentes áreas do conhecimento para ex ploração gráfica, da leitura e escrita, alfabetiza ção, conceitos matemáticos, ciências, educação ambiental, enfim, depende da criatividade do usuário, seja aluno, professor ou psicopedagogo. Por apresentar a possibilidade de salvar e im portar arquivos e/ou projetos, o professor ou psi copedagogo pode desenvolver previamente as atividades, conforme o interesse ou necessidades do aluno e/ou paciente, podendo trabalhar com associação de letras e carimbos, bingo das letras, correspondência entre quantidade de letras e carimbos, relações de quantidade (numerais), provas operatórias piagetianas como seriação e classificação, formas geométricas, construção de cenários, vídeos, animações e apresentações, poesias ilustradas, paródias, etc. Na clínica psicopedagógica, sugerimos uti lizar esse software para aplicação das técnicas psicopedagógicas (desenho livre, família e da figura humana, situação agradável e desagra dável) e/ou das técnicas projetivas psicopeda gógicas como: família cinética/educativa, “eu e meus companheiros”, desenho história/episódio e par/pareja educativa, dentre outras. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 299 Mantovani AM & Santos BS Fine Artist e Creative Writter: Ainda na linha de software educativo aberto, para a produção de histórias e construção de cenários, podemos citar o Fine Artist e o Creative Writter, ambos da empre sa Microsoft. Assim como o Kid Pix, possuem uma interface amigável e intuitiva e podem ser utilizados a partir da Educação Infantil até apro ximadamente o 6º ano do Ensino Fundamental, dependendo do nível de maturidade das crianças. O Fine Artist é um editor gráfico que possibilita construir, além de desenhos e cenários, histórias em quadrinhos, cartazes e apresentações multi mídia. Também possibilita editar figuras e adição de animações, com tutores (personagens Maggie, McZee) que auxiliam no uso do software. O Creative Writter é um editor de textos para crianças, dispõe de diversas ferramentas e ideias que instigam o usuário a criar seus próprios projetos, envolvendo textos, desenhos, sons e animações. São várias fontes personalizadas, tamanhos de letras, efeitos especiais, bordas e fundos, que tornam a criação dos projetos uma atividade criativa e divertida. Além disso, forne ce sugestões, como frases e ilustrações engra çadas ou interessantes (Fábrica de Ideias) que podem servir como fonte de inspiração para ini ciar a produção de um texto ou história. Também possibilita a criação de jornais, cartões e faixas, levando o usuário à construção de conceitos nas diversas áreas do conhecimento. Permite impor tar imagens, sons e textos de outros aplicativos, ampliando assim as possibilidades de uso. Pelas inúmeras possibilidades de criação apresentadas por ambos os software, podem e devem ser utilizados na prática psicopedagógica, através de atividades diversificadas e criativas, sempre de acordo com as necessidades, interes ses e a problemática apresentada pelo sujeito. virtuais. Podemos citar como exemplos de Mun dos Virtuais: Club Penguin, o jogo The Sims e o metaverso Second Life (SL). ClubPenguin: Disponível em <http://www. clubpenguin.com>: É um jogo eletrônico do tipo MMOSG (Massively Multiplayer On-line Social Game - Jogo Multijogador Social em Massa), cujo ambiente é baseado na ideia de comunidades on-line e mundos virtuais. Foi desenvolvido pela Club Penguin™ Entertainment e lançado para o público geral em 2005 e, devido ao seu sucesso, foi comprado pela Walt Disney Company, em 2007. Esse Mundo Virtual apresenta um cenário coberto por neve, com pistas de esqui, restauran tes, danceterias, lojas, bibliotecas e uma praia. Usando avatares em forma de pinguins, as crian ças e adolescentes podem: conversar e jogar (jogos de esqui, pescaria, hóquei, caça ao tesouro, concurso de dança, etc.); fazer novos amigos, agregando outros pinguins à sua lista; avisar se alguém não está se comportando. Também são incentivados a dar bons exemplos, pois ajudando aos outros podem ganhar moedas que servem para adquirir alguns objetos no ambiente. Alguns jogos são gratuitos, mas para participar das ati vidades mais interessantes que permitem aos jogadores comprar roupas, móveis e animais de estimação virtuais, conhecidos como “puffles”, usando moedas virtuais que ganham no próprio jogo, além de participar de festas e eventos, é necessário pagar uma assinatura. O site oferece segurança para os pais, pois as crianças só podem começar a brincar depois de ter o cadastro auto rizado por um adulto. O ClubPenguin apresenta várias possibili dades didático-pedagógicas através das ativi dades (tais como escrita, leitura, etc.) e jogos propostos. Na clínica pscicopedagógica podem ser observados os vínculos relacionados à apren dizagem e aos ensinantes: como a criança e o pré-adolescente se relacionam com os seus pin guins avatares (consigo mesmo) e com os outros (pares e pais), se participam da comunidade virtual, se gostam de jogar sozinhas ou com ou tros jogadores, tipos de jogos preferidos, como encaram as derrotas nos jogos, como se relacio Tecnologias da Web3D: Mundos Virtuais De acordo com Schlemmer e Backes7, os Mundos Virtuais podem ser entendidos como tecnologia híbrida, uma vez que possuem carac terísticas típicas dos jogos computadorizados, Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) e funcionalidades encontradas nas comunidades Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 300 Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico nam com o dinheiro, o que gostam de comprar, enfim, é possível observar a problemática de vida (representações, simbolismos, subjetividades) que emerge das interações dos sujeitos nesse Mundo Virtual. The Sims: É distribuído pela Maxis para di versas plataformas e é indicado para uso com os adolescentes. É uma série de jogos eletrônicos de simulação de vida, onde o jogador cria e controla a vida de “pessoas” virtuais (chamadas de Sims). Para jogar, precisa-se escolher os Sims, crianças ou adultos, a partir de um leque de opções de características físicas e de personalidade. Então, a partir daí, pode-se construir uma casa, colo cando-se os móveis e utensílios necessários. A estrutura interna do jogo é um programa de vida artificial baseado em agentes, ou seja, o jogo funciona através de inteligência artificial e os Sims responderão a condições externas por si mesmos, mesmo que a intervenção do jogador seja necessária para que eles mantenham-se no caminho certo. Nessa versão, os Sims terão filhos e morrerão, respeitando o ciclo da vida. O The Sims 2 por ser em um ambiente em 3D poporciona uma experiência de jogo mais “viva” e realista que a versão anterior, sendo que os Sims crescem desde recém-nascidos para idosos e eventualmente morrem, ou seja, nessa versão é possível controlar os Sims pela vida inteira. Os Sims têm aspirações específicas, que pode ser um romance, constituir família, riqueza, obter conhecimento ou popularidade, o que acaba afetando seus desejos e medos pessoais. Essas aspirações geram algumas recompensas dadas à família quando se alcança certos objetivos, como por exemplo, no caso da aspiração ser a constituição de uma família, a recompensa será ter um bebê. Também pode-se personalizar os Sims e criar vídeos dentro do jogo. No The Sims 3, as vidas dos Sims escolhidos para o jogo não giram mais ao redor das suas casas, sendo possível explorar livremente a vi zinhança. Como eles são livres, isto é, indepen dentes do controle do jogador, todos os Sims da vizinhança envelhecem com o passar do tempo, em contraponto ao que ocorria na versão do The Sims 2. Nessa versão é introduzido o novo siste ma de Modificadores de Humor, onde algumas atividades rotineiras como escovar os dentes e fazer uma visita ao parque, geram modifica dores de humor positivos, que acompanham o Sim por um determinado período de tempo. Por outro lado, acontecimentos ruins como ter um “acidente” ou tirar notas baixas na escola, geram modificadores negativos que definem diretamente como o Sim se sente no meio que o cerca, refletindo como ele interage com outros Sims e objetos. O The Sims não é um jogo educacional, pois não foi desenvolvido com objetivo didático-peda gógico. No entanto, pode ser utilizado nos meios educacionais e na clínica psicopedagógica, pelas inúmeras possibilidades que o jogo oferece em trabalhar com contexto de aprendizagem e com as significações do ato de aprender, e as relações com os vínculos que se formam com o conheci mento e as figuras “ensinantes”, que vão além da aprendizagem escolar, uma vez que aprende-se no viver e conviver cotidiano. Diante das considerações já tecidas em rela ção às possibilidades apresentadas por esse jogo, podemos perceber o seu potencial para tratar das questões dos relacionamentos dos sujeitos: con sigo mesmo, com a família, com a escola e com os outros; o relacionamento com o dinheiro, as vitórias e os fracassos. E, ainda, a capacidade de tomar decisões, fazer escolhas, resolver pro blemas, capacidade de resiliência, o desenvolvi mento de habilidades e competências para tal, os valores e a ética dos sujeitos, enfim, como o sujeito encara a vida (agir e reagir) em seu dia-a-dia. Concordamos com Weiss5, quando afirma que “a riqueza desse software está em poder converter-se em uma grande tela projetiva e que esse jogo propicia a “simulação” de várias situa ções dramáticas que podem estar na composição de problemas de aprendizagem. Por isso, “a coordenação entre escolhas com o atendimento de necessidades dos diferentes personagens, ou ainda com a adequação dos acontecimentos e das respostas do programa, forma um mundo rico na avaliação e intervenção do trabalho na clínica”. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 301 Mantovani AM & Santos BS Second Life: Desenvolvido em 2003 pela empresa americana Linden Lab, é considerado o metaverso mais popular até esse momento. Pode ser utilizado a partir dos 18 anos e para uso com adolescentes entre 13 a 17 anos, pode-se utilizar o Teen Second Life. Para interagir nos Mundos Virtuais, conforme já referido, é necessário construir um avatar, ou seja, a identidade digital virtual que representará o ser humano e que possibilita a telepresença nesse metaverso. No Second Life, pode-se repre sentar o avatar reproduzindo as características e semelhanças de nossa aparência física ou fazê-lo de acordo com nossa imaginação e desejos. Em uma experiência pedagógica com o uso do metaverso Second Life, realizada com uma turma de alunos da graduação em Psicopeda gogia, percebemos que, em relação à aparência do avatar, a maioria dos alunos buscou uma identificação visual no presencial-físico. Pelos depoimentos dos alunos em relação à própria percepção dessa experiência, podemos inferir que, em um primeiro momento, a busca de uma identificação visual no presencial físico está relacionada também com a busca de uma apro ximação, familiarização com uma nova tecno logia. No entanto, na medida em que os alunos se apropriam dessa tecnologia e que têm mais facilidade no manuseio das ferramentas de cus tomização da aparência, a tendência é sentir-se mais livre para “ousar” e buscar até mesmo uma diferenciação da identidade no presencial-físico. Também podemos inferir que a representação da identidade digital-virtual está associada com a forma pela qual queremos ser reconhecidos no metaverso, uma vez que carregamos a identi dade de ser humano para dentro desse espaço, expressando de alguma forma nossos desejos, interesses e necessidades. Turkle18 estuda o comportamento dos sujeitos nos mundos mediados pelo computador diante da possibilidade do nosso “eu” ser “outro”. Ao estudar as influências das tecnologias do ciberespaço na configuração das identidades, a autora argumenta que estamos imersos por uma cultura da simulação na qual as pessoas se sentem cada vez mais à vontade em substituir o real por representações da realidade. Então, nos Mundos Virtuais pode-se inventar, projetar novas versões do eu “real”, tornando-o múltiplo e fragmentado, transformando os conceitos “tra dicionais” referentes à identidade dos sujeitos. Acreditamos que tais possibilidades abrem na clínica um novo campo para o estudo do com portamento humano e para a busca do entendi mento do próprio sujeito. Assim, com o objetivo de proporcionar expe riências sensoriais imersivas para uma turma de alunos da Psicopedagogia, no contexto da graduação, após a construção dos avatares e a exploração do metaverso Second Life, os alunos interagiram com diversas ilhas educacionais que apresentam essas possibilidades. Dentre essas ilhas, destacamos a interação com a Ilha Educa ção através do Objeto de Aprendizagem (OA) Acessibilidade. Para interagir com esse Objeto de Aprendizagem o avatar precisa “comprar” uma cadeira de rodas e após anexá-la ao seu corpo para poder se deslocar nas casas que o Objeto de Aprendizagem apresenta, sendo que uma casa não é adaptada para cadeirantes e a outra casa é adaptada. Após fazerem esta simulação, os alunos foram desafiados a descrever suas percepções e sensações em “andar” em ambas as casas. Apresentamos, a seguir, o relato de um aluno postado em um Fórum de Discussão do Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle, utilizado como suporte para o trabalho realizado: Ilha Educação: OA acessibilidade - casa não adaptada: “A pessoa que é cadeirante tem muita dificuldade para acessar alguns lugares. A sensação é de nervosismo e frustração por não poder subir para o segundo piso, aqui tive vontade de sair da cadeira. Também não consegui ir ao banheiro. Realmente, tive a sensação de ser um cadeirante com suas dificuldades de locomoção”. Ilha Educação: OA acessibilidade - casa adaptada: “A sensação é bem melhor, a pessoa consegue ter acesso aos lugares como subir no segundo piso, facilidade em entrar na casa, ir ao banheiro. Em nenhum momento tive vontade de sair da cadeira porque consegui ir aos luga- Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 302 Aplicação das tecnologias digitais virtuais no contexto psicopedagógico autores da sua produção. Nessa perspectiva, diversos estudos apontam que a triangulação ensinante-aprendente-objeto do conhecimento é necessária para uma aprendizagem saudável. Assim, nesse novo contexto de aprendizagem, permeado pelo uso de tais tecnologias, o aluno e/ou paciente torna-se o protagonista de sua própria aprendizagem, desenvolvendo suas po tencialidades, buscando soluções para seus pro blemas, participando de forma autônoma desse processo, na medida em que convive e estabele ce novos vínculos em diferentes cotidianos, quer sejam físicos-presenciais ou digitais-virtuais. Acreditamos que a utilização das TDVs na prática pscicopedagógica possibilita o trabalho no campo das representações virtuais, pois ao acionar os mecanismos da projeção, facilita a investigação das significações do ato de apren der e das representações que o sujeito faz dos conhecimentos escolares, familiares e consigo mesmo. Por isso, a importância de proporcionar situações que instiguem o processo de simboli zação do sujeito, por meio de imagens, desenhos, sons, vídeos, animações, simulações e textos, para compreendê-lo além de suas funções obje tivas, pois é através do símbolo, que a realidade é interpretada e compreendida. Desse modo, constatamos, por meio de nossa práxis, que a aprendizagem acontece dentro de ambientes presenciais-físicos e digitais-virtuais, através de atividades ricas em interação e de abordagens multidimensionais que podem ser potencializadas pelo uso adequado das TDVs, motivando ensinantes e aprendentes para a construção de processos de aprendizagem mais significativos no contexto da diversidade. res que queria. [...] Eu me senti imersa na casa adaptada!” Esses relatos mostram as sensações e percep ções dos alunos em “vivenciar” uma situação na qual os avatares são cadeirantes e devem agir como tal. Essa experiência permite se colocar no lugar do outro e, a partir disso, fazer uma refle xão a respeito da inclusão das PNEEs. Então, a possibilidade de vivenciar diversas situações e papéis desperta todos os sentidos, envolvendo a corporeidade, a cognição, o afeto, os sentimentos e a emoção, tornando essa experiência muito pró xima da realidade física e, como consequência, possibilita uma aprendizagem imersiva, atraente e diferenciada. Por isso, entendemos que essas possibilidades devem ser exploradas na clínica psicopedagógica para diagnosticar e intervir com o objetivo de promover o desenvolvimento, o autoconhecimento e a aprendizagem do sujeito. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apresentamos uma revisão teórica a respeito das possibilidades psicopedagógicas apre sentadas pelo uso das TDVs, tanto no contexto educativo quanto psicopedagógico, seja insti tucional ou clínico, destacando contribuições advindas dos estudos e da experiência docente e psicopedagógica das autoras com a utilização dessas tecnologias. Consideramos importante destacar que, para utilizar tais tecnologias, devemos ter claro quais são nossos objetivos didáticos-pedagógicos e clínicos, tendo como enfoque a expressão do pensamento do sujeito em situações de apren dizagem diversificadas, uma vez que muitos apresentam dificuldades para reconhecerem-se Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 303 Mantovani AM & Santos BS SUMMARY The application of virtual digital technologies in the psychopedagogical context Virtual Digital Technologies (VDTs) bring new possibilities of interac tion, communication and representation, enabling a wider range of appli cations in the psychopedagogical field, as they can become instruments for the investigation of the inadequate connections that occur in the learning process. However, for psychopedagogists to be protagonists in this process and attend to the demand of the digital generation, it is ne cessary to have experience with such technologies, in order to develop didactic-pedagogical competences, allied with technological-digital competences, which enable the interaction and use of these technologies in their psychopedagogical practice, institutional as well as clinical. In this context, we present a theoretical review on the psychopedagogical possibilities for using VDTs, highlighting contributions from the studies and teaching and psychopedagogical experiences of the authors in using these technologies. Based on these reflections, we believe that the use of VDTs in the psychopedagogical practice, due to their working in the field of virtual representations, activate the projection mechanisms, thus facilitating the investigation of meanings in the act of learning and the social representation that the subject makes of academic and informal knowledge and of himself, opening new paths for new meanings of learning. KEY WORDS: Learning. Computing methodologies. Software. REFERÊNCIAS 1. Prensky M. Digital natives, digital immigrants. Part II: Do They Really Think Differently? In: “On The Horizon”. Vol. 9. Nº 5. Lincoln:NCB University Press;2001. 2. Veen W, Vrakking B. Homo zappiens: educan do na era digital. Porto Alegre:Artmed;2009. 3. Fernández A. 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Psicopedagogia 2011; 28(87): 293-305 305 Sebra AGde & revisão Dias NM ARTIGO Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz Alessandra Gotuzo Sebra; Natália Martins Dias RESUMO – O artigo apresenta os métodos de alfabetização mais difundidos no país, delimitando-os em função de seus três aspectos fundamentais, a saber: a) ponto de partida e encaminhamento da alfabetização, delimitando os métodos analíticos e sintéticos; b) unidade mínima de análise na relação entre fala e escrita, delimitando os métodos global, silábico e fônico; e c) tipo de estimulação envolvida, distinguindo os métodos multissensorial e tradicional. É apresentado breve histórico sobre os métodos de alfabetização e, em maiores detalhes, são descritos os métodos fônico e global. O método fônico tem como objetivo prin cipal ensinar as correspondências grafofonêmicas e desenvolver habilidades metafonológicas, fomentado as habilidades de decodificação e codificação. Já o método global pressupõe que a aprendizagem da linguagem escrita ocorra pela identificação visual da palavra, focando diretamente as associações entre as palavras e seus significados. No Brasil, o método global é o mais enfatizado nas universidades e o mais utilizado nas salas de aula. Além disso, no país, a concepção construtivista tem exercido grande influência sobre as práticas em alfabetização. No entanto, pesquisas nacionais e internacionais têm questionado a efetividade do método global e das concepções construtivistas e revelado o método fônico como o mais eficaz na alfabetização regular e, ao lado do método multissensorial, na intervenção com crianças com dificuldades em leitura e escrita. Recentemente, algumas iniciativas acadêmicas e de setores do governo têm revelado uma possível aproximação entre as práticas educacionais e tais evidências científicas. Essa confluência ‘educação-ciência’ poderá beneficiar grandemente as práticas na educação fundamental do país. UNITERMOS: Alfabetização. Aprendizagem. Linguagem. Leitura. Alessandra Gotuzo Sebra – Psicóloga, Doutora e PósDoutorada em Psicologia pela Universidade de São Pau lo, Professora, pesquisadora e orientadora do Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Bolsista de Produtividade CNPq - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil. Natália Martins Dias – Psicóloga, Mestre e Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desen volvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Bolsista FAPESP. Professora convidada do curso de Psicopedagogia da UPM. Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil. Correspondência Alessandra Gotuzo Sebra Av. Higienópolis, 846, apto 22 – São Paulo, SP, Brasil – CEP 01238-000 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 306 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz ser apresentadas inicialmente as letras, os sons das letras ou as sílabas. Tal apresentação pode ocorrer conforme uma ordem específica ou sem uma sequência previamente determinada. Após a introdução das unidades mínimas, ensina-se a sua síntese em unidades maiores, formando sílabas, palavras, frases e, finalmente, textos. Nos métodos analíticos, ao contrário, as unidades apresentadas inicialmente são unidades de significado, sejam elas palavras, frases ou textos. Assim, os métodos analíticos partem de unidades maiores, sem um foco primário sobre as unidades menores (do todo para a parte). A unidade mínima de análise na relação entre fala e escrita refere-se à menor unidade cuja relação com a fala é explicitamente apresentada. Ou seja, refere-se a qual segmento da fala é “oralizado” ou “verbalizado” pelo professor. Por exemplo, pode-se apresentar uma palavra escrita e dizer o correspondente falado daquela palavra (ou seja, ler a palavra). Em um nível mais segmentado, podem-se apresentar sílabas escritas e dizer o correspondente falado daquelas sílabas (ou seja, ler a sílaba). Finalmente, podem-se apresentar as letras e dizer o seu correspondente falado (ou seja, ler os fonemas correspondentes às letras). Dessa forma, em relação à unidade mínima de análise na relação entre fala e escrita, há os métodos global (unidade mínima é a palavra), silábico (unidade mínima é a sílaba) e fônico ou fonético (unidade mínima é o fonema). Em relação ao terceiro critério, o tipo de es timulação envolvida, distinguem-se o método multissensorial e o método tradicional. Tais métodos diferenciam-se em relação às modalidades sensoriais engajadas, ativa e intencionalmente, no processo de alfabetização. No método tradicional, a linguagem escrita é ensinada principalmente usando a visão (o aluno vê o item escrito) e a audição (o aluno ouve seu correspondente oral). No método multissensorial, há um engajamento muito maior e mais explícito de outras modalidades sensoriais, como a tátil (o aluno sente uma letra desenhada com um material de textura específica, por exemplo), a cinestésica (o aluno movimenta-se sobre uma letra desenhada INTRODUÇÃO Esse artigo tem como objetivo apresentar alguns conceitos sobre os diferentes métodos de alfabetização. Não caracteriza uma revisão sistemática e não pretende aprofundar historicamente o tema, mas é uma reflexão motivada pela observação de desconhecimento, por parte de profissionais da área, com relação aos distintos métodos de alfabetização, seus princípios e procedimentos de aplicação, o que tem limitado a possibilidade de aplicação de diferentes métodos para alunos com diferentes características, prejudicando, dessa forma, a otimização do po tencial de cada indivíduo. MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: DEFININDO CONCEITOS Atualmente, há uma confusão bastante grande em relação às diferentes características dos mé todos de alfabetização. Nesse sentido, devem-se distinguir três aspectos fundamentais de tais métodos: 1) Qual é o ponto de partida e o encaminhamento da alfabetização? Aqui se faz a distinção entre métodos analíticos e sintéticos; 2) Qual é a unidade mínima de análise na relação entre fala e escrita? Aqui se distingue entre método global, método silábico e método fônico; 3) Qual é o tipo de estimulação envolvida? Aqui se distinguem o método multissensorial e o tradicional. Essas três distinções encontram-se representadas na Figura 1 e são descritas mais detalhadamente a seguir. O ponto de partida e o encaminhamento da alfabetização referem-se a qual é a unidade inicialmente apresentada durante a alfabetização, dentre a parte ou o todo (unidade de significado). Há duas possibilidades: método analítico e método sintético. Nos métodos sintéticos, são usados procedimentos que partem de unidades menores para chegar a unidades maiores (da parte para o todo). Ou seja, as unidades ensinadas são menores que as unidades de significado da língua em questão. Logo, podem Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 307 Sebra AG & Dias NM Ponto de partida Unidade de análise (escrita-fala) analítico (todo – parte) palavra sintético (parte – todo) Modalidades sensoriais envolvidas multissensorial sílaba fonema tradicional Figura 1 – Três aspectos fundamentais dos métodos de alfabetização: ponto de partida, unidade de análise na relação entre escrita e fala e modalidades sensoriais envolvidas. no chão, por exemplo), e a fonoarticulatória (o aluno, de forma intencional, atenta aos movimentos e posições de lábios e língua necessários para pronunciar determinado som). Assim, o método multissensorial tenta, intencionalmente, apresentar a linguagem escrita, tendo como input outras modalidades não usadas no método tradicional, como o tato e a cinestesia. Tendo sido apresentados esses três critérios possíveis para classificação dos métodos de alfabetização, pode-se prever que há diferentes combinações possíveis dos critérios. Pode haver, por exemplo, um método analítico que tenha como unidade mínima o fonema e que seja mul tissensorial. Nesse caso, o ensino parte do texto como unidade inicial de apresentação ao aluno, ensina explicitamente a relação entre os fonemas da fala e as letras da escrita, e engaja ativamente diversas modalidades sensoriais. Dessa forma, diferentes combinações dos critérios são possíveis. As combinações mais comuns, usadas ao longo da história da educação formal, são descritas a seguir. contrário, remete a uma discussão antiga e constitui uma das maiores disputas no campo da pedagogia e da educação1. Historicamente, o uso e a transição entre diferentes métodos de alfabetização têm sido marcados por períodos de insatisfação e resistência, delimitando conflitos e disputas, quase sempre ideológicas, entre defensores de antigas e novas concepções2. A Figura 2 apresenta esquematicamente uma linha do tempo sobre disputas e práticas em alfabetização no Estado de São Paulo. O esquema foi amplamente baseado e sintetiza a revisão histórica e teórica de Mortatti2, porém é complementado por outras referências3-12. Nos primeiros séculos de ensino de leitura e escrita, havia um predomínio de instruções denominadas sintéticas, conforme descrição anterior. O método mais usado era o método alfabético, iniciado com o ensino das letras e seus nomes13. O método fônico, que propõe o ensino sistemático e explícito das correspondências entre letras e sons, nasceu provavelmente no século XVI, com educadores alemães. Esta proposta à alfabetização ensina, como parte fundamental da sua prática, as correspondências grafofonêmicas, ou seja, entre as letras e seus sons. Por sua vez, o método global nasceu provavelmente MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: BREVE HISTÓRICO Identificar qual das várias formas de alfabe tização é a mais eficaz não é algo recente; ao Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 308 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz Alfabetização ganha destaque • Antes de 1889: ensino leitura/escrita – transmissão assistemática em casa ou ‘aulas régias’; • 1889: Proclamação da República. Inicia-se a universalização da escola. • A partir de 1889: prática organizada nas escolas. Até final do império – métodos sintáticos (alfabético e silábico); 1880 – Método João de Deus – ‘Palavração’. Funda-se nova tradição: ensino da leitura envolve questão do método. Disputa entre defensores de novos (Método João de Deus) e antigos métodos (sintéticos) Reforma da instrução pública (base da reforma eram os métodos de ensino). • Entra em uso o Método Analítico. • Disseminação para outros estados e utilização obrigatória nas escolas paulistas (reclamações devido à lentidão de resultados). Método Analítico – influência da pedagogia norte-americana – “criança apreende o mundo de forma sincrética”. • Adaptação do ensino à nova concepção de criança. • Ensino começa do TODO para as partes constituintes (TODO = palavra/sentença/história) • Cartilhas – ‘palavração’ e ‘sentenciação’. • 1910 – termo ‘alfabetização’ começa a ser utilizado. • Disputa: entre analítico x sintético (silabação) e entre diferentes modos de processuação do analítico. • Nova tradição: como ensinar a partir da definição das habilidades visuais, auditivas e motoras da criança a quem se ensina. Autonomia didática (Reforma Sampaio Dória). • Novas urgências políticas e sociais aumentam a resistência dos professores ao uso do Método Analítico. Há maior busca por novas soluções para os problemas de ensino. • Começam a ser utilizados os Métodos mistos. • Disputas entre defensores dos métodos analítico e sintético diminuem; há, porém, relativização sobre importância do método influenciada pela publicação do livro ‘Testes ABC para verificação da maturidade necessária ao aprendizado da leitura e escrita’, em 1934. • Cartilhas métodos mistos (Caminho Suave em 1948-1990) • ‘Período preparatório’ (exercícios de discriminação visomotora, auditivomotora, posição corpo e membros, coordenação motora grossa e fina, etc). • Método se subordina ao nível de maturidade da criança. • Nova tradição: foco sobre maturidade da criança. Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões atuais em nível nacional. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 309 Sebra AG & Dias NM • Prática e tradição anterior é questionada. • Introduz-se no Brasil a concepção construtivista (1986). • Nova teoria se apresenta como ‘revolução conceitual’ (não como método!), há abandono das práticas tradicionais e questiona-se a utilidade das cartilhas. • Esforços de “convencimento” dos alfabetizadores pelas autoridades educacionais e imposição do construtivismo. • Disputas entre defensores métodos tradicionais (mistos), defensores das cartilhas e do nível de maturidade versus construtivistas. • Problema do fracasso escolar passa a ser pensado em termos de políticas públicas (não se pode mais discutir método?) • Processo de aprendizagem é compreendido de acordo com a psicogênese da língua escrita36. • Institucionalização em nível nacional do construtivismo - PCN’s publicados pelo MEC em 1997. • Tradição: desmetodização e ênfase no aprendiz, a criança elabora hipóteses e constrói seu conhecimento. • Porém, não há total desmetodização. Os PCN’s brasileiros apresentam o método Global ou Ideovisual (que se caracteriza como um método analítico). • “... Ilusório consenso de que a aprendizagem independe do ensino”2 (pág.11). • Questionamentos e dúvidas decorrentes da ausência de uma “didática construtivista”. • Dados PISA 2000; 2003, 2006, 20098-11 - Estudantes brasileiros desempenham-se abaixo da média internacional. Resultados da avaliação de Leitura: • 2000 – último lugar! 32ª posição de 32 países; • 2003 – 38ª posição dentre 41 países; • 2006 – 49ª posição dentre 56 países; • 2009 – 53ª posição dentre 65 países; • Reportagem publicada na Folha de São Paulo em 2003 – Fernando Capovilla: “O Brasil é recordista mundial de incompetência de leitura”. • Avaliações nacionais - SAEB - declínio de desempenho nas avaliações sucessivas de 1995 a 2005. Uma luz no fim do Túnel? Pesquisas na área da Psicologia Cognitiva apontam superioridade do método fônico sobre o método global. • As evidências científicas acerca dos métodos de alfabetização começam a ser consideradas na Pedagogia: Convergência Ciência-Educação? • Relatório Novos Caminhos da Alfabetização5,7; • Relatório do MEC6 – A Criança de 6 anos na Educação de 9 anos – traz referência ao treino da consciência fonológica. • Em 2011 ocorre em São Paulo o Seminário Internacional de Alfabetização na Perspectiva da Psicologia Cognitiva. Continuação da Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões atuais em nível nacional. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 310 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz Estudos têm evidenciado resultados bastante animadores com o uso do método fônico. Por exemplo, Gersten et al.14 relataram benefícios de longo prazo de um programa baseado em instruções fônicas, o modelo de Instrução Direta. Tais benefícios foram evidentes em termos de menor repetência ao longo das séries escolares e, até mesmo, de maior aceitação em faculdades. Estes resultados de longo prazo são explicados pelo fato de que o método fônico fornece às crianças habilidades e conhecimentos autogerativos de decodificação fonológica, o que é concebido por Share15 como um mecanismo que possibilita o autoensino. Assim, após dominar essa habilidade básica de decodificação, o leitor possui os pré-requisitos necessários para desenvolver suas habilidades de leitura, necessitando basi camente da prática para alcançar fluência e automatismo. Alguns princípios derivados da abordagem de processamento de informação da Psicologia Cognitiva dão sustentação ao método fônico, e são descritos a seguir: • Não se sustenta a noção de que a linguagem escrita apresenta uma continuidade em relação a outras formas de representação, como o jogo simbólico e as imagens mentais, conforme proposto por outras abordagens, como a epistemologia genética de Piaget16; • Logo, um ensino específico deve ocorrer para que a criança desenvolva as habilidades necessárias para dominar a leitura e a escrita, incluindo atividades de consciência fonológica, como síntese e segmentação de fonemas, e o ensino dos sons das letras; • Para o ensino dos sons das letras, pode-se começar pelas vogais e pelas consoantes cujos sons podem ser pronunciados isoladamente, como /f/, /j/, /l/, /m/, /n/, /s/, /v/, /x/, /z/17; • Deve haver um ensino dirigido das palavras: inicialmente devem ser ensinadas as palavras com ortografias regulares, posteriormente com ortografias reguladas pela no século XVII13. Segundo esse método, seria mais econômico ensinar a palavra como um todo às crianças, sem focalizar unidades menores. Assim, era preconizado o ensino direto das asso ciações entre as palavras e seus significados12. Apesar de diversos outros métodos de alfabe tização terem surgido, um grande debate tem ocorrido entre o método fônico, de um lado, e o método global, de outro lado. Tal debate tem ocorrido já há algumas décadas internacionalmente1 e, no Brasil, tem se intensificado nos últimos anos. Esses dois métodos, portanto, serão descritos mais detalhadamente a seguir. Método fônico Esta proposta à alfabetização tem dois obje tivos principais: ensinar as correspondências grafofonêmicas e desenvolver as habilidades metafonológicas, ou seja, ensinar as correspondências entre as letras e seus sons, e estimular o desenvolvimento da consciência fonológica, que se refere à habilidade de manipular e refletir sobre os sons da fala. Enquanto o ensino das correspondências grafofonêmicas é considerado fundamental desde o início do método fônico, que provavelmente data do século XVI, como anteriormente descrito, o desenvolvimento da consciência fonológica é mais recente, tem sido incentivado principalmente a partir do século XX. Este método baseia-se na constatação experimental de que as crianças com dificuldades na alfabetização têm dificuldade em discriminar, segmentar e manipular, de forma consciente, os sons da fala. Esta dificuldade, porém, pode ser diminuída significativamente com a introdução de atividades explícitas e sistemáticas de consciência fonológica, durante ou mesmo antes da alfabetização. Quando associadas ao ensino das correspondências entre letras e sons, as instruções de consciência fonológica têm efeito ainda maior sobre a aquisição de leitura e escrita. Além de ser um procedimento bastante eficaz para a alfabetização de crianças disléxicas, o método fônico também tem se mostrado o mais adequado ao ensino regular de crianças sem distúrbios de leitura e escrita12. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 311 Sebra AG & Dias NM soma das informações contidas separadamente nos elementos menores. Tal pressuposto, proveniente de estudos basicamente de percepção, foi aplicado à alfabetização, supondo que a forma global das palavras forneceria dicas importantes aos leitores iniciantes12. Para os defensores do método global, o conhecimento das correspondências letra-som seria adquirido naturalmente pelas crianças, após o reconhecimento total da palavra estar bem estabelecido. Para além do nível da palavra, a maioria dos métodos analíticos toma o contexto como absolutamente relevante para a leitura de uma palavra. Assim, angariado nas concepções de Ben Goodman e Frank Smith, em tais métodos considera-se que a aprendizagem de leitura e escrita só pode ocorrer a partir de unidades que sejam significativas à criança. Em geral, métodos globais ou ideovisuais partem de unidades como palavras, textos, parágrafos, sentenças ou palavras-chave (como no método de Paulo Freire). É a partir destas unidades maiores e, portanto, significativas que, em um segundo momento, o aprendiz chegaria a uma compreensão das unidades menores que compõem as palavras, porém sem necessidade de instrução sistemática e explícita para isso. Em meados do século XX, em todo o mundo, o método global difundiu-se amplamente nas escolas. Desde então, um dos maiores pesquisadores sobre o método tem sido Goodman19,20. O autor sustenta a visão de que as ideias do método global são progressistas e sensíveis às necessidades das crianças e buscam desenvolver a criatividade destas, permitindo a elas próprias “descobrirem” os princípios subjacentes à leitura e à escrita. Além disso, as práticas do método global evitam a submissão das crianças a programas estruturados e sistemáticos, como os programas fônicos e seu ensino sistemático e explícito de correspondências grafema-fonema. Assim, o método global propõe o ensino das associações entre palavras inteiras e seus significados (abordagem ideovisual), individualmente ou em textos introduzidos desde o início12. Dentre os princípios de sua prática, podem-se elencar: posição (mesa, em que o “s” intervocálico soa como /z/) e somente então as palavras com ortografias irregulares (por exemplo, flecha ou xale para irregularidade de ch/x; jeito ou gente para irregularidade de g/j). Isto porque o ensino de palavras irregulares logo no início da alfabetização pode confundir o aprendiz, impedindo-o de desenvolver consistentemente a noção de correspondência entre letras e sons13. Somente após essa noção estar estruturada, as irregularidades devem ser introduzidas; • Os exercícios de coordenação motora são importantes. Eles auxiliam o aluno a adquirir as formas ortográficas das letras13. Isto permitirá, posteriormente, que o aluno apresente uma caligrafia mais adequada e, principalmente, ajudará na consolidação mental das formas das letras, o que permitirá a escrita mais automática e a identificação mais fácil das letras durante a leitura. Assim, abordagens fônicas usualmente propõem o ensino explícito e sistemático, com grau crescente de dificuldade, das habilidades de decodificação grafofonêmica e de codificação fonografêmica, paralelamente ao trabalho para desenvolvimento da consciência fonológica18. Método global O método global ou ideovisual pressupõe que a aprendizagem da linguagem escrita se dê pela identificação visual da palavra. Apesar de haver outros métodos analíticos, como os métodos de ‘palavração’ e ‘sentenciação’, o global ou ideovisual é o mais amplamente conhecido, desenvolvido provavelmente no século XVII13. Como anteriormente descrito, tal método pressupõe que é mais econômico ensinar a palavra como um todo ao aluno, sem focalizar unidades menores, sendo, portanto, ensinadas diretamente as associações entre as palavras e seus significados. Tais ideias foram reforçadas pela Gestalt, que pressupõe que o todo é maior que a soma das partes, ou seja, que a informação contida na unidade total de significado é maior do que a Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 312 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz grandemente difundido e ele continuou sendo utilizado por anos em escolas em todo mundo1. Tal discrepância entre a prática educacional na alfabetização e as evidências oriundas de estudos científicos foi apontada por diversos autores1,13,31, que destacavam, entre outros fatores, a falta de pesquisa experimental conduzida pelos adeptos do método global e uma postura na qual imperava o dogmatismo, apesar do fracasso a que eram fadados seus estudantes. No Brasil, a história tendeu a se repetir e, nos cursos de formação, tanto na graduação quanto na pós-graduação, o método global ainda é enfatizado como eficaz e moderno12. Com isso, anualmente, as escolas ganham novos educadores, pedagogos e psicopedagogos, que continuam a aplicar e difundir uma prática ineficaz, em total contrassenso às pesquisas conduzidas na área. E é, sobretudo, nas escolas públicas, com seu maior contingente de crianças de nível socioeconômico baixo, que esse fato é mais preo cupante, pois estas crianças, muitas vezes, não possuem alternativas que possam suprir estas falhas educacionais. Vale lembrar que o Censo educacional de 2010 declarou que 87,3% dos estudantes brasileiros no ensino fundamental estão matriculados na rede pública de ensino32. Ainda no âmbito nacional, na década de 1980, houve grande difusão das ideias de Emília Ferreiro que, até os dias de hoje, permeiam e influenciam as práticas de alfabetização em todo território brasileiro. Ferreiro baseou seus trabalhos na teoria piagetiana, investigando, sobre esta perspectiva, o processo de aquisição da leitura pela criança33-36. De acordo com suas pesquisas e de modo conciso, a autora descreveu três períodos evolutivos ou de conceitualização do escrito pela criança16,34. No primeiro nível conceitual, começa a haver uma distinção entre o material gráfico icônico e o não-icônico. No segundo, a hipótese central formulada pela criança é que coisas diferentes devem ser lidas/ escritas de formas diferentes; também surgem as noções de quantidade e diversidade de letras por palavra. E, no terceiro nível conceitual, surge a tentativa de dar valor sonoro às letras que • A leitura é compreendida como atribuição de sentido e interação entre o leitor e texto; a leitura não deve ser focada na decifração; • A leitura é um “jogo de adivinhação psicolinguística”21. As crianças devem ser estimuladas a adivinhar o que está escrito a partir de pistas contextuais; • A aprendizagem da leitura deve ocorrer a partir de unidades maiores que sejam significativas para a criança (palavras, sentenças, textos), com incentivo à associação direta entre palavras e significados. EVIDÊNCIAS DA SUPERIORIDADE DO MÉTODO FÔNICO Como anteriormente descrito, no século XX, o método global difundiu-se entre as escolas em diversos países. Com seu amplo uso, começaram a ser conduzidos estudos questionando sua efi cácia. O primeiro grande ataque ao método global surgiu com o estudo de Flesch22, intitulado Why Johnny can’t read? (Por que Johnny não pode ler?). Segundo o autor, o método global é mais uma forma de treinamento animal do que método de alfabetização. Seu posicionamento é corroborado por outros estudos de grande porte, como os de Chall23 e Bond & Dykstra24, que arguiam que os programas de alfabetização baseados em instruções fônicas eram superiores aos globais, levando a melhores desempenhos em reconhecimento de palavras, escrita e vocabulário12. Conforme alguns estudos apontam25-27, o tipo de instrução característica do método global não enfatiza o ensino explícito e sistemático dos princípios da língua escrita, tal como faz o método fônico, de modo que nem todas as crianças conseguem apreender tais princípios. Essa dificuldade é ainda maior, fazendo ainda mais evidente a discrepância entre os métodos, com clara inferioridade do global, no caso de crianças que apresentam risco de atraso de leitura e escrita ou aquelas com desvantagens socioculturais28-30. Porém, apesar de evidências da inferioridade e das desvantagens do método global, seu uso foi Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 313 Sebra AG & Dias NM atividades do método fônico. Os professores são incentivados a desenvolver habilidades de rima, segmentação fonêmica e discriminação de sons e a ensinar as relações entre as letras e os sons. É interessante observar que tais diretrizes são recomendadas em países de língua inglesa, cuja ortografia tem relações grafofonêmicas bastante irregulares, com correspondências imprevisíveis entre letras e sons. Logo, se o método fônico é recomendado para o inglês (que é extremamente irregular), certamente ele é ainda muito mais eficaz no português, cujas relações entre letras e sons são bem mais regulares e que, portanto, propicia maior sucesso na aplicação de regras de conversão grafofonêmicas39. No contexto nacional, autores têm desenvolvido e testado programas fônicos com resultados bastante positivos. Tais procedimentos podem ser utilizados no contexto educacional ou clínico12,40,41. Há também um programa computadorizado que permite a aprendizagem de habilidades importantes de uma forma bastante lúdica42. Vale lembrar que estudos têm evidenciado que as dificuldades em leitura e escrita se devem, em grande parte, a problemas de processamento fonológico, podendo estes ser atenuados e/ou solucionados com a incorporação de atividades fônicas e metafonológicas em diferentes níveis escolares43. Isto tem sido demonstrado em diversos estudos internacionais43-51 e nacionais12,41,53-58. Outro método também utilizado no trabalho com crianças com dislexia ou com dificuldades de leitura e escrita é o chamado multissensorial39. Este procedimento busca combinar diferentes modalidades sensoriais no ensino da linguagem escrita às crianças. Assim, ele facilita a leitura e a escrita ao estabelecer a conexão entre aspectos visuais (a forma ortográfica da letra ou da palavra), aspectos auditivos (a forma fonológica), aspectos táteis e cinestésicos da grafia (os movimentos necessários para escrever letras e palavras) e aspectos cinestésicos da articulação (os movimentos e posições necessários para pronunciar sons e palavras). Maria Montessori foi uma das precursoras do método multissensorial. Ela defendia a participa- formam a palavra, ou seja, surge a noção de fonetização da escrita. Inicialmente, a criança elabora uma hipótese silábica, na qual a cada letra faz equivaler uma sílaba; posteriormente, compreende que a cada letra corresponde um som ou fonema, pautando sua leitura e sua produção escrita em uma hipótese alfabética. As ideias de Ferreiro originaram a concepção construtivista que se autoproclama uma revolução conceitual e não um novo método de alfabetização. Tal concepção defende uma alfabetização contextualizada e, portanto, significativa que deve dar-se por meio da transposição didática das práticas sociais de leitura e escrita para o contexto da sala de aula. É por meio de sua imersão às práticas sociais de leitura que a criança começa a se organizar para apreender o significado deste objeto. Pouco a pouco ela elabora hipóteses sobre o que a escrita representa. Neste processo, por meio da ação reflexiva da criança, a consciência fonológica desenvolver-se-ia naturalmente, não sendo necessárias práticas sistemáticas para sua estimulação. Na concepção construtivista, o aluno deve ser levado a pensar sobre a escrita e, assim, construirá e reelaborará seu próprio conhecimento36,37. O construtivismo de Ferreiro é uma teoria epistemológica e não um método de alfabetização. Sua transposição para a sala de aula tem se mostrado problemática e pouco eficaz, e os riscos que tal concepção sobre alfabetização podem trazer podem ser verificados nos dados das avaliações nacionais e internacionais que constatam o fracasso do alunado brasileiro na aprendizagem da leitura5,7-11. ALFABETIZAÇÃO DE CRIANÇAS COM DISLEXIA E PROBLEMAS DE LEITURA E ESCRITA Além da superioridade do método fônico na alfabetização em contexto regular, diversas associações de dislexia em todo o mundo recomendam instruções fônicas para o ensino de indivíduos com dislexia. De fato, nas diretrizes da British Dyslexia Association38 para o ensino de crianças disléxicas, é recomendada a inclusão de Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 314 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz • Visão: ênfase na forma visual de letras e palavras, podendo usar cores e tamanhos diferentes; • Cinestesia – traçado: ênfase no traçado da letra/palavra, por exemplo usando letras com setas desenhadas que indicam a direção do movimento correto para a grafia; • Tátil: ênfase na memória tátil da forma das letras/palavras, por exemplo usando texturas diferentes; • Articulação: ênfase na memória articu latória das letras/palavras, de forma cons ciente e intencional. No Brasil, um procedimento multissensorial bastante difundido e adotado é o Fonovisuoarticulatório, conhecido mais informalmente como ‘Método das boquinhas’. Utiliza-se das estraté gias fônica (fonema/som), visual (grafema/ letra) e articulatória (articulema/Boquinhas) e é indicado tanto para a alfabetização de crianças quanto na reabilitação dos distúrbios da leitura e escrita62-64. ção ativa da criança durante a aprendizagem e o movimento era visto como um dos aspectos mais importantes da alfabetização. A criança devia, por exemplo, traçar a letra enquanto o professor dizia o som correspondente59. Fernald e Keller60, outros proponentes do método multissensorial, também incentivavam as crianças a pronunciar em voz alta os nomes das letras enquanto as escrevessem. Orton61 deu continuidade ao desenvolvimento de técnicas do método multissensorial, mantendo a associação tríplice visual, auditiva e cinestésica e, em 1925, Orton e Gillingham propuseram uma variação do método multissensorial, em que inicialmente devem ser ensinadas as correspondências entre as letras e seus sons, aumentando as unidades progressivamente para palavras e, somente depois, para frases39. Esse procedimento delimitava: • Apresentação de cada letra separadamente, com seu nome e seu som; • Criança traça a letra enquanto diz seu nome, inicialmente com o modelo visual e, depois, sem ele; • Apresentação das sílabas simples com sons regulares; • Combinação dessas sílabas para formar palavras; • Introdução de palavras com correspondên cias irregulares; • Combinação de palavras em frases. Cabe destacar que algumas variantes do método multissensorial trabalham apenas com os sons das letras, e não com seus nomes. A maioria delas parte das unidades mínimas (no nível da letra) para unidades mais complexas (nível da palavra e, depois, da frase). Apesar de requerer muito tempo de intervenção, o método multissensorial é um dos procedimentos mais eficazes para crianças mais velhas, que apresentam problemas de leitura e escrita há vários anos e que possuem histórico de fracasso escolar. Alguns princípios que orientam a prática do método multissensorial são: • Audição: ênfase nos sons das letras e na forma fonológica das palavras; CONSIDERAÇÕES FINAIS O artigo apresentou e delimitou os métodos sintéticos e analíticos. Após, centrou-se na discussão entre os métodos fônico e global, apresentando, por fim, sugestões tanto para a alfabetização quanto ao trabalho interventivo com crianças com dislexia ou problemas de leitura e escrita. Para tal atuação, os procedimentos fônico e multissensorial têm sido reconhecidos como os mais eficazes. Pesquisas comparando os métodos de alfabetização têm se concentrado principalmente nos procedimentos fônico e global. Em geral, estas investigações têm demonstrado a superioridade do fônico, especialmente com crianças com desvantagem sociocultural ou cognitiva. Estudos de meta-análise comprovam que introduzir instruções fônicas (ensinar correspondências grafofonêmicas) e metafonológicas (desenvolver a consciência fonológica) auxilia a aquisição de leitura e escrita. Porém, no Brasil, até hoje predomina o método global, tanto no contexto clínico quanto no educacional. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 315 Sebra AG & Dias NM As razões para a insistência em um modelo que tem logrado péssimos resultados nas avaliações nacionais e internacionais, tendo sido descartado como ineficaz por outros países7, possui uma explicação complexa, que perpassa conjecturas políticas e ideológicas até problemas próprios da formação de professores nas universidades do país. Não se sugere aqui uma linha de raciocínio simplista de que o método de alfabetização é o único responsável por todos os problemas educacionais do país. Porém, no que tange ao domínio específico da aquisição da linguagem escrita, e com aporte em pes quisas e nas avaliações de desempenho nacionais e internacionais, é inevitável a conclusão de que a confluência ‘Construtivismo-método global’, endossada nos PCN’s3, apenas está conduzindo as crianças brasileiras ao posto de incompetentes. Se durante a última década a educação caminhou sem a parceria do conhecimento científico, algumas evidências mais recentes têm sugerido a possibilidade de um encontro entre as duas áreas. Exemplos disso são o Relatório Novos Caminhos da Alfabetização5,7, solicitado a especialistas nacionais e internacionais pela Câmara dos Deputados e a própria referência ao treino da consciência fonológica no relatório publicado pelo MEC, em 20096, intitulado “A criança de 6 anos, a linguagem escrita e o ensino fundamental de 9 anos”. Além disso, em 2011, ocorreu na cidade de São Paulo o “Seminário Internacional de Alfabetização na Perspectiva da Psicologia Cognitiva”, contando com importantes e influentes pesquisadores da área e representantes das Secretarias de Educação de alguns estados brasileiros. A psicologia cognitiva tem muito a contribuir com a Educação e a Pedagogia. Que estas áreas possam dialogar e que a educação possa se beneficiar das evidências científicas estarão subordinados os próximos anos da educação fundamental brasileira. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20 316 Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz SUMMARY Literacy methods: definition of procedures and considerations for effective practice The article presents the most widespread literacy methods in the country, defining them in terms of its three fundamental features, i.e., a) starting point and course of literacy, delimiting the analytical and synthetic methods; b) the minimum analysis unit on the relationship between speech and writing, outlining the global, syllabic and phonic methods; and c) type of stimulation involved, distinguishing between traditional and multisensory methods. Brief history is presented on literacy methods, and the global and the phonics ones are described whit more details. The phonic method’s main objective is to teach the graphophonemic correspondences and to develop phonological skills, fostering decoding and encoding skills. The global method assumes that the learning of written language occurs by the word visual identification, focusing directly the associations between words and their meanings. In Brazil, the global method is the most broadcast in universities and most used in classrooms. In addition, in the country, the constructivist conception has exerted great influence on literacy practices. However, national and international researches have questioned the effec tiveness of the global method and constructivist conceptions, and revealed the phonics as the most effective in literacy and, aside multisensory method, in the intervention with children with reading and writing problems. Re cently, some academic and government initiatives has revealed a possible oncoming between educational practices and scientific evidence produced by cognitive psychology. This ‘education-science’ confluence could greatly benefit the country’s practices in elementary education. KEY WORDS: Literacy. Learning. Language. Reading. REFERÊNCIAS 5. Brasil. Relatório final do grupo de trabalho alfabetização infantil: os novos caminhos. 2ª ed. Câmara dos Deputados, Comissão de Educação e Cultura, 2007. Disponível em: http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/1924/ 6. Brasil. A criança de 6 anos, a linguagem escrita e o ensino fundamental de 9 anos. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, Diretoria de Concepções e Orientações Curriculares para a Educação Básica e Coordenação Geral de ensino Fundamental. Brasília:MEC;2009. 7. Capovilla FC. Os novos caminhos da alfabetização infantil. São Paulo:Memnon;2005. 8. Organization for Economic Cooperation and 1. Hempenstall K. The whole language: phonics controversy: an historical perspective. Educ Psychol. 1997;17:399-418. 2. Mortatti MRL. História dos métodos de alfabetização no Brasil. Portal MEC, 2006. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/ pdf/ensfund/alf_mortattihisttextalfbbr.pdf. 3. Brasil. 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Rio de Janeiro:Wak Editora;2010. A impressão de que a nova ordem social (capitalista, democrática, liberal) e suas conquistas tecnológicas não iriam desprezar nenhum segmento da população e que a juventude seria, naturalmente, atendida nas suas necessidades demonstrou-se equivocada. Agora, o problema em relação aos “jovens”, tratado quase sempre como um problema social e econômico, acrescenta-se de uma dimensão existencial e sociocultural que não constava dos estudos e pesquisas, das políticas do Estado e das instituições voltadas para a educação desses jovens. Indiscutivelmente, mais uma vez, a sociedade e o Estado estão diante de grande dilema e novos desafios: mudanças na estrutura familiar; crescimento da violência urbana; do convite às drogas; dos problemas de depressão e ansiedade; das exigências da escola, da escolha profissional e do mercado de trabalho. É um momento, portanto, de grandes mudanças e incertezas em relação ao futuro. A adolescência é uma fase complexa e dinâmica do ponto de vista físico e emocional na vida do ser humano. É neste período em que ocorrem várias mudanças no corpo, que repercutem di- retamente na evolução da personalidade e na atuação pessoal da sociedade. Há muita preocupação com essa etapa, especialmente com os seus aspectos comportamentais e adaptativos, alertados já em 1904, quando Stanley Hall, um dos primeiros estudiosos sobre o tema, definiu a adolescência como um período de tempestade e tensão negativas. Uma grande dificuldade surge até mesmo quando tentamos enquadrar a adolescência cro nologicamente e, portanto, faz-se necessária essa caracterização. A Organização Mundial de Saúde (1975), no plano internacional, define adolescência pelo referencial cronológico como um período da vida que vai dos 10 a 19 anos, envolvendo, assim, a puberdade, que é um fenômeno universal e tem um ritmo que varia de indivíduo para indivíduo, mas previsível de acordo com os parâmetros próprios da espécie. Hoje se fala em adolescência precoce, quando está anterior ao aparecimento das características indicadas da puberdade, e também se define uma adolescência tardia, que se observa pela manutenção desse período, quando, pelos cri- Luiza Elena L. Ribeiro do Valle – Doutora em Psicologia Social e do Trabalho pela Universidade de São Paulo; Psicóloga; Membro da Sociedade Brasileira de Psi cologia das Organizações e do Trabalho (SBPOT). Maria José Viana Marinho de Mattos – Doutora em Educação na área de Políticas, Administração e Sistemas Educacionais pela Faculdade de Educação/ Unicamp. Professora na Pontifícia Universidade Ca tólica (PUC) Minas. Cursando Pós-doutorado no De partamento de Educação: Currículo na PUC – SP. Correspondência Luiza Elena L. Ribeiro do Valle Rua Goiás, 77 – Centro – Poços de Caldas, MG, Brasil – CEP 37701-005 E-mail: [email protected] Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3 321 Valle LELR & Mattos MJVM Assim, os autores refletem e tecem orientações para lidar com as dificuldades que a fase da adolescência impõe e devem ser valorizadas como prioridade. Elaboram reflexões sobre o assunto sempre na perspectiva de que a adoles cência é uma fase da vida humana, que traz dificuldades peculiares e apresenta dificuldades de relacionamento. Por outro lado, as dificuldades são enriquecedoras e devem ser valorizadas como uma forma de manifestação em uma sociedade jovem, promissora economicamente, com a criação e unificação de políticas públicas voltadas, especificamente, para os adolescentes e a juventude. Os transtornos, os conflitos e outras manifestações que acometem os jovens nesta fase de transição para a vida adulta merecem ser compreendidas como ações preventivas. A abordagem dos demais capítulos do livro considerou estes elementos como prioridade. Essas manifestações são complexas, pois são decorrentes de vários fatores e necessitam de intervenções, uma vez que geram consequências nas mais diversas áreas da vida, como no funcionamento social, familiar, escolar e ocupacional. Ao considerar que a adolescência é um período da vida de mudanças peculiares nos aspectos fí sicos e psicológicos, então, é uma fase que merece atenção especial às demandas desse processo. É nessa direção que psicólogos, educadores e pesquisadores, de diferentes áreas, buscam compreender o universo da adolescência e juventude sempre em uma perspectiva de melhor atendimento, mesmo em meio às incertezas, aos avanços científicos e tecnológicos. Esse atendimento agrega saberes referentes à prevenção e aos riscos da saúde física, psicológica e de formação, em sua amplitude como um ser humano em formação. O livro recupera e apresenta uma visão do estado atual das abordagens necessárias ao processo de atendimento, acompanhamento e orientações necessários, a uma fase importante da vida humana. Houve um tempo em que cada um nascia condenado a um destino determinado na sociedade, com base no berço, na cor da pele ou nas térios biológicos, o indivíduo já um adulto. As definições cronológicas esbarram na realidade cultural e temporal. A proposta do livro “Adolescência: as contra dições da idade” é tratar das dificuldades enfrentadas por educadores, pais e profissionais que trabalham diretamente com adolescentes e jovens em seus momentos de busca, de conflitos, em um período com tantas indagações. Essa relação lida com a complexidade de situações desafiadoras. O livro foi organizado com 14 capítulos, elaborados por psicólogos, professores e pesquisadores. Estudiosos do assunto, os colaboradores buscam articulação e aprofundamento entre os capítulos. Os três primeiros capítulos recuperam conceitos e princípios básicos sobre “adolescência” e “juventude”, buscando referências no campo da Psicologia, Sociologia e Educação, sem perder de vista a noção de cultura nas Ciências Sociais. Essas reflexões trazem para o campo do debate um tema importante na sociedade contemporânea, que é a responsabilidade com a formação e educação de jovens na atualidade. Nesta direção, os capítulos seguintes, de qua tro a oito, buscam centrar a discussão na fase da adolescência considerada como um momento crucial para o desenvolvimento humano, marcada pelas significativas alterações corporais, bioquímicas, sociais e emocionais. Assim, esta parte do livro preocupa-se com os estudos e as reflexões sobre conflitos, embaraços e distúrbios, próprios desta fase da vida humana. No entanto, são temas desafiadores para atuação de instituições e profissionais que lidam, incansavelmente, com situações de atendimento e encaminhamento desses problemas, tais como: psicólogos, médicos e educadores. Além disso, questões como a formação de uma nova identidade, a ansiedade, a depressão e o sentimento de fracasso são temas tratados nesses capítulos. Assumir novos papéis gera no adolescente uma grande ansiedade, que configura na adolescência como um período de risco para o surgimento de sintomas de depressão, isolamento social e outras consequências, requerendo, assim, apoio social e psicológico. Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3 322 Adolescência: as contradições da idade características pessoais globais ou específicas. O desenvolvimento social nos trouxe a possibilidade da conquista do próprio destino como direito de todas as pessoas e é regido pela Educação, que se volta para a Saúde, entendida como bem estar físico e mental. O desenvolvimento científico investigou os caminhos para que esse direito se imponha para além dos limites impostos por dificuldades ou características pessoais, mas a sociedade tornou-se responsável pela possibilidade de utilizar esses avanços em favor da qualidade de vida das pessoas. Os adolescentes constituem um grupo que dá início a uma nova cultura, que a sociedade atual ajuda a construir, enfrentando as contradições e planejando esse futuro, ao lado deles. dolescência é uma idade de contradições e este livro busca não fugir delas, nem usar a crítica como afastamento daqueles que são a promessa de mudanças melhores, desde que encontrem valorização de seu potencial, direção, respeito e oportunidade na própria sociedade. Resenha realizada na Pontifícia Universidade Católica (PUC) Minas, Belo Horizonte, MG, Brasil. Artigo recebido: 8/11/2011 Aprovado: 12/11/2011 Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 321-3 323 ASSOCIADOS TITULARES PARA REVISTA 87 – 2011 ALAGOAS Maceió ELIANE CALHEIROS CANSANÇÃO [email protected] (82) 3223-4258 – Farol BAHIA Feira de Santana LOURDES MARIA DA SILVA TEIXEIRA [email protected] (75) 3221-3456 – Mangabeira ELIANE CÁSSIA ROCHA BLANES LUCIANA BARROS DE ALMEIDA SILVA ELISABETE SILVEIRA CASTELO BRANCO MARISTELA NUNES PINHEIRO [email protected] (85) 3244-2820 – Dionísio Torres [email protected] (85) 3881-1673 – Rodolfo Teófilo [email protected] (62) 3293-3067 – Setor Marista [email protected] (62) 3259-0247 – Nova Suíça FRANCISCA FRANCINEIDE CÂNDIDO [email protected] (85) 3272-3966 – Fátima MATO GROSSO Cuiabá GALEÁRA MATOS DE FRANÇA SILVA ÂNGELA CRISTINA MUNHOZ MALUF Itabuna [email protected] (85) 3264-0322 – Aldeota GENIGLEIDE SANTOS DA HORA GERALDO LEMOS DA SILVA MARIA MASARELA MARQUES DOS PASSOS MARIA JOSÉ WEYNE MELO DE CASTRO [email protected] (85) 3261-0064 – Parque Manibura MINAS GERAIS Campanha MARISA PASCARELLI AGRELLO RAMONA CARVALHO FERNANDEZ NO GUEIRA [email protected] (73) 3617-0372 – São Caetano Salvador ARLENE NASCIMENTO PESSOA [email protected] (71) 9983-0470 – Caminho das Árvores DEBORA SILVA DE CASTRO PEREIRA [email protected] (71) 3341-2708 – Candeal JACY CÉLIA DA FRANCA SOARES [email protected] (71) 3347-8777 – Pituba JOZELIA DE ABREU TESTAGROSSA [email protected] (71) 3341-2708 – Caminho das Árvores KARENINA AZEVEDO [email protected] (85) 3246-7000 – Dionísio Torres [email protected] (85) 3267-5714 – Varjota OTILIA DAMARIS QUEIROZ [email protected] (85) 3246-7000 – Dionísio Torres Tianguá GRAÇA MARIA DE MORAIS AGUIAR E SILVA [email protected] (88) 9963-5854 – Centro [email protected] (71) 3345-3535 – Pituba DISTRITO FEDERAL Brasília LEILA DA FRANCA SOARES MARINA LIMA BEUST [email protected] (71) 3347-8777 – Pituba [email protected] (61) 3326-9314 – Asa Norte MÁRCIA GONÇALVES NUNES MARLI LOURDES DA SILVA CAMPOS MARIA ANGELICA MOREIRA ROCHA [email protected] (71) 3345-1111 – Pituba ESPÍRITO SANTO Vitória MARIA AUXILIADORA DE A. RABELLO MARIA DA GRAÇA VON KRUGER PIMENTEL SANDRA MARIA FURTADO ANDRADE MARISTELA DO VALLE CEARÁ Fortaleza GOIÁS Goiânia ANDRÉA AYRES COSTA DE OLIVEIRA CARLA BARBOSA DE ANDRADE JAYME DALMA RÉGIA MACEDO PINTO JANAÍNA CARLA R. DOS SANTOS [email protected] (71) 3374-4505 – Federação [email protected] (71) 3353-2207 – Pituba [email protected] (71) 3351-9973 – Itaigara [email protected] (85) 3261-0064 – Aldeota [email protected] (85) 3491-2280 – Vila União [email protected] (61) 3321-3666 – Plano Piloto [email protected] (27) 3225-9978 – Praia do Canto [email protected] (27) 3215-5039 – Jardim da Penha [email protected] (62) 3225-9805 – Setor Oeste [email protected] (62) 3241-7837 – Setor Sul [email protected] (65) 9214-4484 – Jardim Cuiabá [email protected] (65) 3028-1372 – Campo Velho [email protected] (35) 3261-2119 – Centro Pouso Alegre CLAUDIA MARQUES CUNHA SILVA [email protected] (35) 3422-2050 – Fátima SÔNIA REGINA BELLARDI TAVARES [email protected] (35) 3425-3456 – Santa Filomena Uberlândia SANDRA MEIRE DE OLIVEIRA R. ARANTES [email protected] (34) 3224-3687 – Lidice Varginha HELENA SCHERER GIORDANO [email protected] (35) 3212-7296 – Novo Horizonte JÚLIA EUGÊNIA GONÇALVES [email protected] (35) 3222-1214 – Centro MARIA CLARA R. R. FORESTI [email protected] (35) 3212-3496 – Centro MARIA ISABEL SILVA PINTO REZENDE [email protected] (35) 3212-9120 – Jardim Andere REGINA CLAUDIA A. S. FERRAZ [email protected] (35) 3214-5660 – Jardim Andere PARÁ Belém CARMEM CYLBELLE PEREIRA ALVES VIÉ GAS [email protected] (91) 3259-3531 – São Braz ELIANE SOUZA DE DEUS NETO ALMEIDA [email protected] (91) 8850-8628 – Cidade Velha MARIA DE NAZARÉ DO VALE SOARES [email protected] (91) 9981-2076 – São Braz PARANÁ Cambé NEOCLEIDE MILANI [email protected] (43) 3223-2654 – Centro Cornélio Procópio IVANI APARECIDA C. A. OLIVEIRA [email protected] (43) 3524-2377 – Centro Guarapuava ADRIANA CRISTINE LUCCHIN [email protected] (42) 3622-4022 – Trianon Londrina ROSA MARIA JUNQUEIRA SCICCHITANO [email protected] (43) 3342-7308 – Jardim Caiçaras Maringá NERLI NONATO RIBEIRO MORI [email protected] (44) 3261-4887 – Campus Universitário São José dos Pinhais CÉLIA REGINA BENUCCI CHIODI Curitiba [email protected] (41) 8445-1444 – Ouro Fino ADRIANE CREDIDIO R.C.DYMINSKI ARRUDA LORIANE DE FÁTIMA FERREIRA ANA PAULA LOUREIRO E COSTA [email protected] (21) 2436-1803 – Jacarepaguá CLYTIA SIANO FREIRE DE CASTRO [email protected] (21) 2247-3185 – Ipanema DIRCE MARIA MORRISSY MACHADO [email protected] (21) 2236-2012 – Copacabana HELOISA BEATRIZ ALICE RUBMAN [email protected] (21) 2259-9959 – Jardim Botânico JANE BRAVO GORNE [email protected] (21) 8746-4623 – Botafogo LUCIA HELENA MACHADO SAAVEDRA [email protected] (21) 2239-5878 – Gávea [email protected] (41) 3672-3454 – Jardim Menino Deus [email protected] (41) 3282-9357 – Centro MARIA HELENA C. LISBOA BARTHOLO ARLETE ZAGONEL SERAFINI PERNAMBUCO Recife MARIA KATIANA VELUK GUTIERREZ [email protected] (41) 3363-1500 – Santa Cândida CINTIA BENTO M. VEIGA [email protected] (41) 3332-2156 – Rebouças EVELISE M. LABATUT PORTILHO [email protected] (41) 3271-1655 – Prado Velho FABIANE CASAGRANDE C. O. MELLO [email protected] (41) 3022-4041 – Batel ISABEL CRISTINA HIERRO PAROLIN [email protected] (41) 3264-8061 – Alto da XV LAURA MONTE SERRAT BARBOSA [email protected] (41) 3363-1500 – Alto da Glória DAISY FLORIZA C. AMARAL [email protected] (81) 3326-1927 – Boa Viagem MARIA DAS GRAÇAS SOBRAL GRIZ [email protected] (81) 3231-1461 – Graças PIAUÍ Teresina AMÉLIA CUNHA RIO LIMA COSTA amé[email protected] (86) 3233-2878 – Fátima JOYCE MARIA BARBOSA DE PADUA [email protected] (86) 3221-1013 – Centro/Sul MARIA DA SANTIDADE LOPES DIAS REGINA BONAT PIANOVSKI [email protected] (86) 3221-4444 – Centro ROSE MARY DA FONSECA SANTOS RIO DE JANEIRO Ilha do Governador [email protected] (41) 3345-8798 – Portão [email protected] (41) 3026-2865 – Centro Cívico SIMONE CALBERG [email protected] (41) 3363-1500 – Alto da Glória [email protected] (21) 2527-1933 – São Conrado MARIA LÚCIA DE OLIVEIRA FIGUEIREDO [email protected] (21) 9345-4020 – Botafogo MARLENE DIAS PEREIRA PINTO [email protected] (21) 9739-5332 – Leblon MARTHA IZAURA DO NASCIMENTO TABOADA [email protected] (21) 2570-0065 – Barra da Tijuca VERA BEATRIZ DA COSTA NUNES MENDONÇA [email protected] (21) 2295-4838 – Botafogo RIO GRANDE DO NORTE Natal CHRISTINA SALES NOVO [email protected] (84) 3206-4449 – Dix Sept Rosado DULCE CONSUELO RIBEIRO SOARES EDNALVA DE AZEVEDO SILVA Niterói SONIA APARECIDA MONÇÃO GONÇALVES [email protected] (21) 3366-2468 – Freguesia SONIA MARIA GOMES DE SÁ KUSTER FÁTIMA GALVÃO PALMA [email protected] (41) 3264-8061 – Centro [email protected] (21) 2710-5577 – Icaraí Foz do Iguaçu Rio de Janeiro ANA ZANIN ROVANI ANA MARIA ZENÍCOLA [email protected] (45) 3523-4655 [email protected] (21) 2266-0818 – Humaitá [email protected] (21) 2556-3767 – Flamengo [email protected] (84) 3221-6573 – Lagoa Seca [email protected] (84) 3211-4220 – Ribeira Parnamirim FRANCY IZANNY DE BRITO BASTOS MAR TINS [email protected] (84) 8839-0539 RIO GRANDE DO SUL Caxias do Sul LOVAINE SALETE STREIT JUNGES [email protected] (54) 3536-3516 – Rio Branco Passo Fundo IARA SALETE CAIERÃO [email protected] (54) 3311-5230 – Centro Porto Alegre CLARA GENI BERLIM [email protected] (51) 3221-1740 – Santana FABIANI ORTIZ PORTELLA [email protected] (51) 3209-5722 – Cidade Baixa MARILENE DA SILVA CARDOSO MARIA GUILHERMINA COSTA ACIOLI EDITH REGINA RUBINSTEIN MARIA LÚCIA ALMADA FERNANDES ELISA MARIA DIAS DE TOLEDO PITOMBO [email protected] (48) 3331-1952 – Trindade [email protected] (11) 5184-1340 – Granja Julieta Maravilha ELOISA QUADROS FAGALI [email protected] (48) 3223-6402 – Centro SILVANA MARIA BEDUSCHI DA SILVEIRA [email protected] (49) 3664-2186 – Centro SÃO PAULO Araraquara ALINE RECK PADILHA ABRANTES [email protected] (11) 3335-7440 – Centro Campinas MARIA LAURA CASSOLI MACEDO [email protected] (51) 8182-0721 – Higienópolis [email protected] (19) 3254-2714 – Jardim N. Sra. Auxiliadora NEUSA KERN HICKEL Cotia [email protected] (51) 3333-5478 – Centro SANDRA MARIA CORDEIRO SCHRÖEDER [email protected] (51) 3328-3872 – Chácara das Pedras SONIA MARIA PALLAORO MOOJEN [email protected] (51) 3333-8300 – Petrópolis VERÔNICA ABELLA MARQUES [email protected] (51) 3374-6938 – Higienópolis MARIA CECILIA CASTRO GASPARIAN [email protected] (11) 4702-2192 – Granja Viana Ribeirão Preto ANA LUCIA DE ABREU BRAGA [email protected] (16) 3021-5490 – Jardim Sumaré São Bernardo do Campo BEATRIZ PICCOLO GIMENES [email protected] (11) 4368-0013 – Rudge Ramos [email protected] (11) 3743-0090 – Vila Sônia [email protected] (11) 3864-2869 – Perdizes HERVAL G. FLORES [email protected] (11) 3257-5106 – Higienópolis LEDA MARIA CODEÇO BARONE [email protected] (11) 3045-9064 – Vila Olímpia LUCIA BERNSTEIN [email protected] (11) 3209-8071 – Aclimação MÁRCIA ALVES SIMÕES [email protected] (11) 8192-0921 – Tatuapé MARIA BERNADETE GIOMETTI PORTÁSIO [email protected] (11) 2950-6072 – Santana MARIA CÉLIA R. MALTA CAMPOS [email protected] (11) 3819-9097 – Alto de Pinheiros MARIA CRISTINA NATEL [email protected] (11) 5081-2067 – Vila Mariana MARIA DE FATIMA MARQUES GOLA [email protected] (11) 3052-2381 – Jardim Paulista Santa Maria São Paulo FABIANI ROMANO DE SOUZA BRIDI ADA MARIA GOMES HAZARABEDIAN MARIA IRENE DE MATOS MALUF [email protected] (11) 2261-2377 – Jardim França [email protected] (11) 3258-5715 – Higienópolis ANA LISETE P. RODRIGUES MARIA TERESA MESSEDER ANDION ANDRÉA DE CASTRO RACY MARISA IRENE S. CASTANHO BEATRIZ JUDITH LIMA SCOZ MÔNICA HOEHNE MENDES CARLA LABAKI NÁDIA APARECIDA BOSSA MÁRCIA FIATES CLEOMAR LANDIM DE OLIVEIRA NEIDE DE AQUINO NOFFS MARIA ALICE MOREIRA BAMPI DILAINA PAULA DOS SANTOS NIVEA MARIA DE CARVALHO FABRICIO [email protected] (55) 3225-1577 – N. Sra. de Lourdes SANTA CATARINA Florianópolis ALBERTINA C. MATTOS CHRAIM [email protected] (48) 3244-5984 – Estreito JANICE MARIA BETAVE [email protected] (48) 8453-7791 – Ingleses LILIANA STADNIK [email protected] (48) 3248-0401 – Balneário [email protected] (48) 3224-0441 – Centro [email protected] (48) 3333-1745 – Agronômica [email protected] (11) 3885-7200 – Jardim Paulista [email protected] (11) 5572-1331 [email protected] (11) 3651-9914 – Alto de Pinheiros [email protected] (11) 3815-5774 – Vila Madalena [email protected] (11) 9302-5501 – Moema [email protected] (11) 9219-5114 – Santana [email protected] (11) 3023-5834 – Alto de Pinheiros [email protected] (11) 3491-0522 – Ipiranga [email protected] (11) 5041-1988 – Indianópolis [email protected] (11) 2268-4545 – Mooca [email protected] (11) 3670-8162 – Perdizes [email protected] (11) 3868-3850 – Perdizes QUÉZIA BOMBONATTO SILVA TELMA PANTANO WYLMA FERRAZ LIMA REGINA A. S. I. FEDERICO VALÉRIA RIVELLINO LOURENZO Taubaté [email protected] (11) 3815-8710 – Vila Madalena [email protected] (11) 5041-1988 – Brooklin REGINA ZAIDAN PEREIRA MENDES [email protected] (11) 3872-2434 – Pacaembu [email protected] (11) 3062-6580 – Jardins [email protected] (11) 5041-7896 – Brooklin VÂNIA M. CARVALHO BUENO DE SOUZA vâ[email protected] (11) 7204-7894 – Lapa [email protected] (11) 3721-6421 – Morumbi BENEDITA ILZA VIEIRA FORTES [email protected] (12) 3411-6637 – Centro Vinhedo SANDRA G. DE SÁ KRAFT MOREIRA DO NASCIMENTO VERA MEIDE MIGUEL RODRIGUES [email protected] (11) 3805-9799 – Morumbi [email protected] (11) 3511-3888 – Pacaembú SANDRA LIA NISTERHOFEN SANTILLI VIVIANE MASSAD DE AGUIAR [email protected] (11) 3259-0837 – Higienópolis [email protected] (11) 9840-6337 – Pompéia SERGIPE Aracaju SILVIA AMARAL DE MELLO PINTO YARA PRATES AUREDITE CARDOSO COSTA [email protected] (11) 3097-8328 – Pinheiros [email protected] (11) 2976-8937 – Vila Ester CRISTINA VANDOROS QUILICI [email protected] (19) 9259-6652 – Portal Itália [email protected] (79) 3211-8668 – São José Cadastre-se no site da ABPp www.abpp.com.br e receba em seu e-mail as newsletters com notícias, programação de eventos da ABPp e de seus parceiros A Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) é uma entidade de caráter científico-cultural, sem fins lucrativos, que congrega profissionais militantes na área da Psicopedagogia. Em 12 de novembro de 1980, um grupo de profissionais já envolvidas e atuantes nas questões relativas aos problemas da aprendizagem fundou a Associação Estadual de Psicopedagogos do Estado de São Paulo, a AEP. Devido ao grande interesse em torno dessa Associação, a sua expansão a nível Nacional surgiu como necessidade imperiosa. Em 1986, a AEP transformou-se na ABPp e gradativamente foram sendo criados os seus escritórios de representação por todo o Brasil, denominados de Núcleos e Seções. ANOS 30 Durante estes anos, a ABPp vem cuidando de questões referentes à formação, ao perfil, à difusão e ao reconhecimento da Psicopedagogia no Brasil, já tendo alcançado muitas vitórias na luta pela sua regulamentação. Atualmente, conta com 16 Seções e 2 Núcleos, espalhados pelo Brasil, para melhor divulgar a Psicopedagogia e aproximar os profissionais em torno de seus objetivos comuns. A ABPp promove conferências, cursos, palestras, jornadas, congressos, bem como a divulgação de trabalhos sobre sua área de atuação, por meio da revista científica Psicopedagogia, da Revista do Psicopedagogo, do informativo Diálogo Psicopedagógico e do site www.abpp.com.br. Oferece, ainda, descontos tanto nos eventos que organiza quanto em eventos de terceiros, que são parceiros e interessados nos assuntos desta área. Preocupada com as questões sociais, a atual diretoria da ABPp Nacional organizou um novo trabalho de cunho sociocientífico, que visa não só ao atendimento da população carente, promovendo a inserção social e a divulgação da importância da prática psicopedagógica, como também à implantação de um novo modelo de estudo e pesquisa nesse campo. Dele poderão participar todos os associados interessados em prestar um trabalho social. Podem associar-se à ABPp todas as pessoas interessadas nessa área de atuação, tendo ou não concluído a sua especialização em Psicopedagogia. Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567 www.abpp.com.br - [email protected]