SANTA ROSA DE LIMA:
Trabalho, risco social, desigualdades e pobreza
1
Camilo Antônio Silva Lopes
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Fernanda Raquel Álvares e Silva
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Talita de Morais Ferreira
4
Maíra de Morais Ferreira
Resumo: Apresenta-se aqui um estudo sobre uma comunidade rural
nortemineira que tem sua vivência social centrada no trabalho e que
apresenta nas suas interfaces a conjugação de lógicas diferenciadas
de produção. Discute-se, também, a importância dos programas de
transferência de renda do Governo Federal que auxilia e garante a
manutenção mínima das condições de vida de vários moradores.
Além disso, é abordado os impactos que a modernidade tem causado
nas pequenas comunidades rurais.
Palavras-chave: Trabalho, exclusão social, modernidade.
Abstract: He comes a study here on a community rural nortemineira
that has his social existence centered in the work and that it presents
in their interfaces the conjugation of differentiated logics of production.
It is discussed, also, the importance of the programs of transfer of
income of the Federal Government that it aids and it guarantees the
minimum maintenance of the conditions of several residents' life.
Besides, it is approached the impacts that the modernity has been
causing in the small rural communities.
Key words: Work, social exclusion, modernity.
1
Bacharel. Universidade Estadual de Montes Claros. E-mail: [email protected].
Licenciada. Universidade Estadual de Montes Claros. E-mail: [email protected].
3
Bacharel. Universidade Estadual de Montes Claros. E-mail: [email protected].
4
Bacharel. Universidade Estadual de Montes Claros. E-mail: [email protected]
2
1
Santa Rosa de Lima: trabalho, desigualdades, combate a pobreza.
A comunidade rural de Santa Rosa de Lima está localizada no vale do Rio Verde Grande e
dista cinqüenta quilômetros de Montes Claros, sua sede municipal, apresentando nas suas
interfaces a conjugação de lógicas diferentes de reprodução social e material. Formada no
seu interior por uma coletividade em sua maioria descendente de quilombolas que
inicialmente ocuparam a região Lopes (2006), a comunidade reproduz no seu cotidiano
estratégias de sobrevivência que outras populações da região também desenvolvem.
Com uma população de aproximadamente 1100 habitantes – incluindo os moradores das
fazendas próximas – esta população encontra na prestação de serviços e no setor público a
maior fonte de renda. A maioria dos homens do lugar que não possui terras trabalha como
diarista nas fazendas da região enquanto as mulheres permanecem em casa para a
realização dos serviços domésticos.
O trabalho realizado pelos homens nas fazendas se dá de diversas maneiras: capina,
aração de terras com trator, limpeza de pastos, cultivo de lavouras e cercamentos. O
pagamento por cada dia de trabalho varia entre quinze e vinte reais não permitindo que os
trabalhadores usufruam de uma gama de serviços que necessariamente implica dinheiro.
Amartya Sen (2000, p. 109) informa que “uma renda inadequada é, com efeito, uma forte
condição predisponente de uma vida pobre”.
A economia da comunidade movimenta-se através de um círculo que envolve tanto ações
de grandes fazendeiros quanto de pequenos produtores que se articulam para venderem
seus produtos. Há que se compreender que a relação entre fazendeiros e trabalhadores dáse também na forma de assistencialismo. Alguns adotam, via compadrio, trabalhadores e
propiciam a eles oportunidades que muitos não têm como o custeamento dos estudos dos
filhos e também assistência médica5.
Como a região Norte de Minas Gerais na sua totalidade é considerada uma região não
pobre, mas economicamente desfavorecida, a comunidade de Santa Rosa de Lima se vê
enquadrada nesta situação. Para se ter uma idéia, uma parcela significante da renda da
comunidade – exceto dos grandes fazendeiros – é oriunda de aposentadorias ou das
5
Estas relações de compadrio se dão entre agregados das fazendas ou pequenos produtores que moram próximos
às fazendas e prestam serviços continuamente ao fazendeiro que o aceitou como compadre.
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prestações sociais do Governo Federal através do Programa Bolsa Família 6 . Importante
salientar que os programas sociais de transferência de renda do Governo Federal possuem
caráter seletista com finalidade paliativa imediatista, exigindo que os contemplados
preencham alguns requisitos para serem beneficiados.
Por outro lado, há também na comunidade os pequenos produtores rurais que se
reproduzem socialmente e materialmente através da terra que possuem. Nas pequenas
áreas cultivam alimentos e pastagens para a criação de pequena quantidade de gado
leiteiro onde do leite retirado fabricam queijos que são vendidos na comunidade e também
em Montes Claros. Esta forma de produção é crucial para o desenvolvimento dessas
famílias produtoras, pois movimenta tanto mão-de-obra quanto recursos financeiros na
economia local.
Partindo da premissa do desenvolvimento local como motor propulsor para um
desenvolvimento regional como informado por Furtado (2006), o imbricamento de lógicas
diferenciadas de produção permite a reprodução das desigualdades locais. Por um lado, os
grandes fazendeiros criadores de gado se apropriando da renda gerada pela terra
apropriada em demasia e por outro lado a exploração da mão-de-obra de trabalhadores
rurais que se vêem necessitados a garantirem a reprodução familiar se submetendo a
baixos pagamentos pelos serviços realizados.
Importante salientar que os efeitos da pobreza nesta comunidade só não são mais evidentes
devido às formas de organização social existentes. As relações de solidariedade e amizades
se traduzem em ações que permitem aos menos providos de recursos se beneficiarem da
ajuda de outros moradores que não se encontram na situação de pobreza.
A pobreza local pode ser medida pela quantidade de moradias que não atendem aos
padrões mínimos de conforto e também sanitários bem como traduzida na falta de
alimentos. O risco social implicado a essas famílias se traduz na forma como as instituições
providas de responsabilidades como o Estado atuam na comunidade. Os serviços de saúde
e educação apresentam falhas na sua execução culminando com o aumento dos problemas
que poderiam ser diminuídos se levados mais a sério. O grande índice de crianças que
apresentam sintomas de verminoses originados da não captura do esgoto doméstico e
6
Estas informações foram obtidas pelo autor durante pesquisa de conclusão de curso de graduação em Ciências
Sociais pela Unimontes 2006.
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recolhimento do lixo bem como o baixo aproveitamento escolar de boa parte das crianças
matriculadas até a quarta série do ensino fundamental retratam o quadro social em que
estão inseridas muitas famílias7.
Outras patologias sociais recorrentes na comunidade são o alcoolismo e o uso de drogas
entorpecentes entre jovens que propiciaram um aumento da criminalidade dentro da
comunidade como roubos e arrombamentos. São freqüentes na comunidade os
atendimentos médicos de urgência a jovens que estão envolvidos com as bebidas alcoólicas
e em alguns casos culminaram com a emergência do coma alcoólico e posteriormente
evoluindo para óbito.
As conseqüências da modernidade, principalmente em pequenas comunidades que
historicamente se estruturaram com base na confiança e na solidariedade, nos remetem à
noção de sociedade de risco descrita por Hespanha (2007). Para este autor, sociedades de
risco distinguem-se pela presença de conseqüências não esperadas, nem desejadas, do
processo de modernização e pela generalização da insegurança. Para este autor, o
agravamento do risco social na contemporaneidade relaciona-se com a emergência de
novos fatores de incerteza e imprevisibilidade que reduzem inelutavelmente a capacidade
de resposta no quadro dos sistemas institucionalizados.
Neste sentido, José de Souza Martins (2008, p. 19-20) ao analisar os impactos da
modernidade na vida do homem simples informa que:
A modernidade anuncia o possível, embora não o realize. A modernidade é uma
espécie de mistificação desmistificadora das imensas possibilidades de
transformação humana e social que o capitalismo foi capaz de criar, mas, não é
capaz de realizar. [...] A modernidade é, num certo sentido, o reino do cinismo: é
constitutiva dela a denúncia das desigualdades e dos desencontros que a
caracteriza. Nela, o capitalismo se antecipa à crítica radical de suas vítimas mais
sofridas. Por isso, a modernidade não pode deixar de conter (e manipular)
reconhecíveis evidências dos problemas e das contradições de que ela é expressão.
Assim, a dualidade entre o moderno e a tradição na comunidade faz reproduzir o ciclo
vicioso da pobreza relacionado às mudanças em curso: a modernidade das fazendas
voltadas para a lógica capitalista e a tradição das pequenas propriedades que não
7
Estas informações foram coletadas junto à Fundação Nacional de Saúde e também na Escola Estadual de Santa
Rosa de Lima, única escola da comunidade e que recebe alunos de outras localidades que juntas formam a
comunidade local.
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conseguem acompanhar a lógica de mercado não abarcando a mão-de-obra disponível na
sociedade local.
A modernidade se instaura quando o conflito se torna cotidiano e se dissemina,
sobretudo sob a forma de conflito cultural, de disputa entre valores sociais, de
permanente proposição da necessidade de optar entre isto e aquilo, entre o novo e
fugaz, de um lado, e o costumeiro e tradicional, de outro. Porém, uma opção
esgotada na própria tentativa de optar, pois é opção impossível: o mundo, inclusive
o mundo da vida cotidiana já não é nem uma coisa nem outra, embora pareça ser os
dois, ou, melhor, os vários e diversos (MARTINS, 2008, p. 20).
A Perversidade da lógica capitalista de produção gera um universo de miseráveis refletida
na população jovem que se vê desprovida de capacidade para quebrar o círculo vicioso da
dependência econômica dos pais. Sem saída ou condição de mudança, vivem às margens
da realidade e são cada vez mais propensos a se tornarem marginalizados pelo sistema
devido à falta de desenvolvimento econômico local, considerado privilégio das elites locais.
Compreendendo conceitualmente a noção de desenvolvimento
Para compreender a comunidade Santa Rosa de Lima no bojo do seu desenvolvimento fazse necessário localizarmos os meios conceituais aplicados às ciências que permitem esta
compreensão. Sabemos que os conceitos são frequentemente revisitados e refinados, por
isso procuro em vários autores fundamentos teóricos que sustentam o meu argumento.
Autores como Smith, Ricardo e Malthus já demonstravam preocupação com os rumos que
as relações econômicas e sociais poderiam tomar. As relações conflituosas geradas pela
questão econômica já era presente no pensamento econômico e político há muito tempo.
Smith e Marx partilhavam da teoria do valor onde o trabalho era o gerador de riquezas. Mais
adiante Marx direciona sua preocupação com o que ele denominou de antagonismo de
classe dividindo a sociedade entre burgueses e proletários.
Para Marx, era a posição do sujeito em relação aos meios de produção que determinava
sua classe. Se portador de meios de produção o sujeito seria um burguês, caso contrário
seria um proletário e o mesmo seria obrigado a vender a sua força de trabalho para garantir
a sua reprodução social.
A temática do desenvolvimento econômico tem suscitado debates calorosos tanto na
academia quanto na sociedade em geral. A forma mais comum de pensar o
desenvolvimento econômico estava necessariamente atribuída ao crescimento econômico.
5
Porém, com o refinamento conceitual, o desenvolvimento econômico passou a ser visto por
outro ângulo pelos estudiosos.
Ao realizar estudos sobre a questão do crescimento e do desenvolvimento econômico
Souza (1997), afirma que a questão do desenvolvimento econômico teve suas origens nas
principais crises econômicas que marcou a humanidade. Para este autor, foi a partir dessas
crises que se começou a pensar o desenvolvimento econômico não apenas como
crescimento econômico como pensavam os economistas neoclássicos, mas um crescimento
vinculado a novas oportunidades sociais para as pessoas onde a segurança econômica
pudesse ser aliada da segurança social e também familiar.
Hodiernamente, é unânime no mundo acadêmico a aceitação que crescimento econômico é
necessário, mas não o suficiente para se ter o desenvolvimento econômico. Alguns
compreendem que, necessariamente, o crescimento econômico deveria se traduzir em bem
estar.
Amartya Sen (2000) informa que o desenvolvimento consiste na ampliação das liberdades
humanas e que as mesmas são condicionantes de potenciais que permitirão às pessoas
saírem da pobreza que estão inseridas.
É importante compreender que para se obter um desenvolvimento econômico é necessário
que ocorram mudanças estruturais na sociedade. A mudança na estrutura de uma
sociedade constitui-se em um processo complexo, pois envolve aspectos não só
econômicos, mas, também, culturais. Sabemos que em qualquer circunstância da vida
cotidiana a cultura é imperativa e em muitos casos ela é determinante para o alcance do
desenvolvimento econômico e social.
Compreendendo o desenvolvimento regional
Para apreendermos os processos de desenvolvimento ocorridos no Brasil, faz-se necessário
compreendermos algumas matrizes teórico-históricas que ajudam a desanuviar o nosso
olhar sobre o tema. Um dos pilares que ajudam nessa compreensão é a idéia do homem
cordial de Sérgio Buarque de Holanda (2004). Para este autor, a idéia do homem cordial numa perspectiva sociológica - informa que o brasileiro utiliza formas cordiais para se
incorporar em outros grupos com interesses puramente individuais e estes grupos poderão
lhe proporcionar ocupar um melhor espaço na arena social. Estas ações foram constitutivas
6
de um individualismo que se sobressaiu sobre os interesses de ajuda ou solidariedade que
supostamente seriam constitutivos das faculdades mentais humanas. Alguns autores como
Celso Furtado (2003) vêem essa cordialidade como um dos pilares do fracasso institucional
no Brasil.
Em diversas épocas no Brasil, as instituições foram marcadas pela sua vulnerabilidade. Ao
analisar a importância das instituições no processo de desenvolvimento no Brasil
Abramovay (2001), informa que as instituições constituem as regras no jogo do
desenvolvimento e também funcionam como mecanismos de controles sociais.
No Brasil, várias instituições - principalmente as institucionalizadas - não funcionam em
plena transparência e em sua maioria agem em favor de pequenos grupos detentores de
meios não convencionais para se beneficiarem. As instituições que regulam e modelam o
desenvolvimento devem primeiramente ter em conta os diversos processos de ocupação e
povoamento das regiões do Brasil.
O Norte de Minas teve na ação de bandeirantes o marco fundador da região no século XVII
(COSTA, 2005). O encontro de diferentes civilizações resultou numa sociedade de
diferentes sujeitos atuantes. Em primeiro lugar a grande fazenda direcionada para a criação
de gado que utilizava mão-de-obra escrava e que proporcionou a poucos grupos a
apropriação das terras que antes pertenciam ao Rei de Portugal. Por outro lado, o resultado
desse processo foi o esfacelamento da grande fazenda em meados do século XIX e XX e a
introdução da industrialização na região.
O Norte de Minas passou por um processo de desenvolvimento diferente das demais
regiões do estado. Os investimentos destinados à região foram inferiores às demais regiões
o que levou a mesma a ser caracterizada como uma região subdesenvolvida.
Oliveira et al (2000, p. 34) esclarece que o desfavorecimento econômico da região Norte de
Minas Gerais em relação às demais se vincula a dois fatores importantes: a falta de energia
elétrica e a deficiência dos meios de transporte. Por outro lado este mesmo autor informa,
também, que o próprio atraso industrial da região explica melhor a ausência da energia.
A deficiência nos transportes foi fator fundamental para a “estagnação” da região. Oliveira et
al (2000) informa, ainda, que com o processo de integração da região com as demais, os
produtos das regiões mais desenvolvidas sobressaíram sobre os produtos regionais. Um
7
exemplo dado pelo autor foi a confecção de tecidos. Antes da integração os tecidos eram
processados integralmente na região e logo após a integração com outras regiões, nas
indústrias da região eram confeccionados apenas os fios e o processamento final era feito
em outro lugar, caracterizando assim uma indústria subdesenvolvida.
Neste sentido,
o subdesenvolvimento consiste, antes de tudo, num ambiente social em que a
cooperação humana inibe a inovação, apóia-se em vínculos hierárquicos localizados
e bloqueia a ampliação do círculo de relações sociais em que se movem as
pessoas. É exatamente por isso que o segredo do desenvolvimento não reside em
dons naturais, na acumulação de riqueza, nem mesmo nas capacidades humanas,
mas nas instituições, nas formas de coordenar a ação dos indivíduos e dos grupos
sociais (ABRAMOVAY, 2001, p.168).
No Brasil, a diferença regional levou Celso Furtado (2006) a compreender através de estudo
comparativo entre as regiões Nordeste e Sul do Brasil que o fracasso da economia do
Nordeste em relação à economia do Sul se deve à discrepância e dissociação de
investimentos tanto do Estado quanto do setor privado serem direcionados para a região
Sul. Isso, segundo este autor, levou a economia do Nordeste a uma baixa produtividade
apresentando somente o crescimento de uma mão-de-obra desqualificada levando milhares
de nordestinos a migrarem para a parte Sul em busca de melhores condições de vida.
Estratégias de desenvolvimento econômico: entre a ação e a passividade.
As estratégias para se obter o desenvolvimento econômico em uma pequena comunidade
não se diferem dos padrões universais discutidos anteriormente já que as mesmas se
constituem em sociedades vulneráveis aos impactos da globalização econômica. Aliado ao
crescimento econômico, o desenvolvimento econômico local propicia aos membros
envolvidos no processo não somente acesso a bens puramente econômicos, mas também
acesso a oportunidades sociais que o modelo capitalista de produção ceifou.
Ao realizar estudo sobre o desenvolvimento social, Amartya Sen (2000, p. 10) informa que:
O desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as
escolhas e oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua condição de
agente. A eliminação de privações de liberdades substanciais é constitutiva do
desenvolvimento.
Nesta perspectiva, torna-se evidente a importância que as instituições têm na vida cotidiana
das pessoas. Partindo do princípio que as instituições são mecanismos de controles sociais
8
reguladores da vida humana, estas deveriam atuar com seu foco voltado para as questões
que atormentam a vivência social das pessoas. Assim, as instituições podem oferecer
alternativas que possibilitem às pessoas criarem estratégias de superação dos
desequilíbrios sociais, principalmente em comunidades não visualizadas pelas retinas
míopes do Estado.
Deste modo, alternativas como o associativismo e cooperativismo, hodiernamente, estão
ganhando consistência entre as comunidades e estão permitindo a criação de uma unidade
de mobilização entre as comunidades rurais do Norte de Minas, principalmente aquelas
comunidades que se encontram encurraladas pela ação de empresas reflorestadoras que
expulsaram as populações de suas áreas historicamente ocupadas e que eram recheadas
de símbolos e significados criados pelos seus ancestrais.
A solidariedade existente entre os membros que compõe o grupamento humano de Santa
Rosa de Lima constitui-se em estratégia que poderá gerar uma positividade entre seus
membros. Estratégias como estas estão cada vez mais sendo esfaceladas pela lógica do
sistema capitalista aliado às políticas públicas neoliberais e também pelo individualismo que
marca a América Latina. O sentimento de pertencimento a um lugar e também os laços de
solidariedade que seguram as pessoas no lugar onde constituíram seu habitat aos poucos
estão sendo substituídos pelo consumismo desenfreado que gera a exclusão de muitas
pessoas no mundo. Assim, a solidariedade se traduz no que Amartya Sen chama de
valorização das liberdades. É evidente que não é um processo simples as estratégias
geradas no seio da comunidade, uma vez que para que ocorra a organização cooperativista
ou associativista internamente, instituições como família, entidades religiosas e sindicatos
devem atuar coletivamente em defesa dos interesses dos grupos que compõem a
comunidade.
Considerações
É importante considerarmos que as ações estatais resultantes das ações reivindicatórias
dos grupos organizados coletivamente são fundamentais na consolidação das mudanças
que diminuirão a pobreza local da Comunidade rural de Santa Rosa de Lima. Pobreza esta
que se reproduz no seio da comunidade devido à falta de oportunidades impostas pela
estratégia capitalista de gerenciamento dos recursos econômicos.
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Deste modo, as estratégias utilizadas para criar mecanismos que propiciarão alternativas
para melhoria na qualidade de vida da comunidade e combate à pobreza podem ser
encontradas nas relações sociais dadas no seio desta comunidade, exceto entre os grandes
fazendeiros mencionados anteriormente. A troca de serviços e a ajuda alimentar destinada
aos menos favorecidos permitem a criação de um vínculo de solidariedade e reciprocidade
onde os laços sociais são fortalecidos.
À guisa da conclusão, ao levantar apontamentos para o não desenvolvimento local da
comunidade rural de Santa Rosa de Lima, evidencia-se que a estratégia da solidariedade
desenvolvida entre os moradores desta localidade constitui-se apenas em ação paliativa
para amenizar a pobreza entre famílias necessitadas, mas não se constitui em estratégia
definitiva que possa resolver o problema da desigualdade social que a cada dia se acentua
na comunidade. Por outro lado, podemos concluir, também, que a modernidade na
comunidade propiciou um crescimento econômico a um pequeno grupo – os grandes
fazendeiros – em detrimento aos outros e isto propiciou um desnivelamento social e
econômico entre as diversas camadas sociais que compõe esta comunidade rural.
Assim, para se obter um desenvolvimento baseado em parâmetros globais que permite à
população se apropriar dos benefícios na sua totalidade, é necessário que as instituições
atuantes exerçam de forma concreta ações eficientes e eficazes. Tomando como princípio
norteador que as instituições são as regras do jogo do desenvolvimento, instituições como o
Estado e o Mercado poderiam atuar juntos criando mecanismos que propiciassem a esta
comunidade se articular de forma eficaz no sentido de diminuir as desigualdades
imperativas que empurram para o abismo social famílias que não se encontram capacitadas
e dotadas de estrutura que lhes permitam expurgar o fantasma da pobreza que ronda a
comunidade em todas as suas dimensões. Neste sentido o mercado deveria ser visto como
uma estrutura social na perspectiva de Abramovay (2001) no qual o mesmo atuaria como
agente incluidor e não excluidor criador de desigualdades.
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