JORNAL DA associação médica Junho/Julho 2012 • Página 11 ECIAL Falar a verdade inclui dar más notícias Alexandre Guzanshe zes, diante de um diagnóstico que ameaça sua vida. Primeiramente, devemos sondar o quanto o paciente sabe, o que ele deseja saber e o que ele suporta ou não suporta saber prontamente. Em certos casos, será no segundo, terceiro ou quarto encontro que a verdade dos fatos tomará corpo”, esclarece Soares. Eles não estão preparados Os entrevistados são unânimes ao afirmar que os médicos, em sua maioria, não estão preparados para dar más notícias. O tema, de acordo com eles, não costuma ser levado em sala de aula e tão pouco os cursos de medicina contam com matérias específicas que possam orientá-los quanto a melhor maneira de preparar o doente para a verdade. O presidente da Sotamig, Marco Túlio Gualberto Cintra, diz que as escolas de medicina deveriam incluir em sua grade curricular a disciplina de cuidados paliativos. “Não temos controle do número de equipes de cuidados paliativos no Brasil, mas sei que elas ainda não cobrem todos os hospitais. Precisamos ter médicos treinados para integrar essas equipes que têm também psicólogos e enfer- O presidente da Sotamig, Marco Túlio Gualberto Cintra, acredita que a verdade nua e crua é tão ruim quanto a mentira meiros. Um trabalho multidisciplinar facilitaria todo o processo junto ao paciente e familiares.” Luiz Otávio Savassi Rocha chama a atenção ainda para a proliferação irresponsável de escolas médicas no Brasil, que irá, segundo ele, contribuir negativamente para a preparação dos futuros médicos. “Eles estarão cada vez mais despreparados para o exercício da medicina. E isso exige de quem a pratica saúde física e mental, honestidade, dedicação integral, permanente atualização, disposição para a reflexão, espírito crítico aguçado, paciência, capacidade de conviver com a incerteza, conhecimento da alma humana de lidar com perdas e fracassos, perspicácia, aceitação das diferenças individuais e disposição para assumir atitude empática”, enumera alguns pontos. Para a oncologista Priscila Bernardina Miranda Soares, a falta de instruções nas faculdades de medicina traduz o desconforto dos professores em ensinar o que não sabem na prática. Para ela, os médicos fogem de seus pacientes quando a saúde deles vai se deteriorando. “Fugimos por não saber, no fundo, como lidar com situações nas quais precisamos refletir, inclusive, sobre nossas próprias mazelas da alma.” ica Exemplo de uma m, éd prognóstio sommas também, a despeito do s sempre mos co“Devemos ser verdadeiro tempo, portanto não pode do res ho sen os os som o brio, sermos otimistas. Nã osticar. Cada ser humala doença e apenas progn pe te en do o car tro de o mento com a permeter o err de, depara-se em algum mo da gili fra sua na e ia tór a é como a erva no tem uma his duz esta brevidade: ‘A vid tra 89 mo sal O . ito fin é ve ser mecepção de que se fica seca’. E a vida não de de tar à e dia io me ao ce sdo campo: nasce, flores de com que realizamos no eu, mas sim, pela intensida viv se e qu m alico qu po na s tem o rda dida pel l para que as pe o do médico é fundamenta na medicina cusos propósitos. O otimism izadas. Todos temos casos nim mi am sej nte cie pa seu o de, o padade de vida do as. Isto se deve talvez, ao fat ad im est s da es ior ma ito sua jas sobrevidas são mu alimenta sua auto-estima, hos, projetos de vida. Isto son , tas ame r rm na pe mi ao ter e de dico qu ciente cuidado de um colega mé ter de e -m bro Lem er. viv vontade de de terapia intensiva, após necer semanas na unidade gravíssima secundária a um uma complicação fúngica se-me: ‘sei que a linha que transplante de medula, dis rte é tênue, mas eu quero me separa da vida e da mo com meu filho no final do montar a árvore de Natal tendo este objetivo como ano, portanto eu vou lutar rioso. São os milagres que meu alimento’. E ele foi vito a medicina não explica!” l Arquivo pessoa “A verdade nua e crua é tão ruim quanto a mentira”, opina o presidente da Sociedade de Tanatologia de Minas Gerais (Sotamig), o geriatra Marco Túlio Gualberto Cintra. Segundo ele, alguns médicos confundem com omissão, o tempo e o preparo necessários para contar ao paciente um diagnóstico ruim. “A postura do médico e da equipe é fundamental para noticiar em momentos difíceis. Devemos antecipar para a família que a doença progride e de que forma. E não esperar, por exemplo, o paciente perder a mobilidade para avisar a todos que acompanham o processo. Na geriatria há uma peculiaridade. Existem muitas doenças que são neurodegenerativas. Neste caso, falo também com a família, pois não posso mentir dizendo que um remédio vai curá-lo, quando essa possibilidade não existe.” O intensivista pediátrico, José Sabino de Oliveira, alerta que as más notícias só podem ser dadas ao próprio paciente, a um parente próximo ou representante legal. “Não posso passar informações a outros interessados, isto deve ser feito pela família. Convocar um ou dois familiares, no máximo. Afinal, todo núcleo familiar pode ter uma pessoa menos equilibrada, emocionalmente mais frágil, assim não é legal formar uma comitiva dentro do hospital.” Oliveira lembra ainda da importância de um ambiente propício para dar notícias ruins. “Elas não podem ser dadas em balcão. A conversa deve ser realizada em um local tranquilo, onde as pessoas possam se sentar e é necessário tempo hábil para tal. Normalmente, as unidades de terapia intensiva têm uma sala para que o médico possa se reunir com a família do paciente”, explica ele. A oncologista e membro da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, Priscila Bernardina Miranda Soares, reforça a necessidade de uma preparação para que o profissional de medicina comunique notícias difíceis e explica que para eles a tarefa não é tão simples: “Isso se torna torturante para nós quando não temos ainda nenhum vínculo com aquela pessoa que nos procura, cuja expectativa é restaurar sua saúde. Estamos, muitas ve- randa Soares, Dra. Priscila Bernardina Mi oncologista