Brasília, segunda-feira, 26 de agosto de 2013 7 PELAS CIDADES E quando o descaso do GDF causa morte? RAFAELA FELICCIANO No Hospital Regional do Paranoá, Amélia Cantuário, 83 anos, acabou morrendo. O filho dela, o funcionário público Pedro Cantuário, 55 anos, procurou a reportagem para dar a triste notícia. Foram 23 dias de espera para resolver um caso que parecia simples, uma cirurgia de fêmur. A família veio de Arinos, interior de Minas Gerais, para realizar o procedimento. “Jamais pensei que minha fosse morrer deste problema”, lamenta a filha, Ana Amélia Cantuário, 37 anos, que acompanhava a mãe. A cirurgia chegou a ser feita, mas, segundo a filha, era tarde demais. “Ela já estava fraca de tantos dias de jejum para fazer a cirurgia sem nada acontecer. Quando retornou da cirurgia, já veio desacordada, desde então ficou entubada”, conta. Para se ter ideia do descaso, a aposentada chegou no DF em 30 de julho, por volta das 23h30, e só conseguiu ser internada às 4h da madrugada. “Primeiro, a ambulância a levou para Planaltina, mas falaram que não fazia a cirurgia, assim seguimos para Sobradinho, e lá disseram que não havia vagas. Por último, viemos para o Paranoá”, relembra. O mau atendimento não parou por aí. Por quatro vezes a idosa teve de ser submetida a jejum de 12 horas. “Eles diziam que iam fazer a cirurgia, mas na hora davam uma desculpa ou sequer apresentavam justificativa. Minha mãe morreu por descaso”, afirma Ana Amélia. A Secretaria de Saúde respondeu à reportagem informou que a família não autorizou a necrópsia para saber a causa da morte da idosa. Sebastião Mattos, de 57 anos, esperava por mais de quatro horas para ser atendido no Hospital do Guará, quando desabafou: “Sinto-me impotente, ignorado pelo governo”. E completa: “Ele prometeu e não vai cumprir, simples assim. É essa a importância que o governador deu para a saúde”, lamenta. Ele esperava um atendimento devido a fortes dores no ombro. Procurado, o Governo Agnelo Queiroz argumentou que inaugurou 4 UPAs, 7 Clínicas da Família, reformou mais de 30 centros de saúde e fez investimentos em todos os hospitais. Até o final do ano, duas UPAs serão entregues e estarão iniciadas as obras para construir quatro. Serão inauguradas as Clínicas da Família de Sobradinho e Recanto das Emas. Estão previstos os hospitais do Trauma (anexo ao Hospital de Base) e do Gama. Os números de leitos de UTI mais que dobraram. Também investiu-se na saúde da família: aumentando a cobertura de 12% para 40% em média. Promotor acusa Agnelo Outro ponto polêmico do governo Agnelo é o compromisso de “nomear gestores das unidades de saúde comprometidos com a saúde pública”, mencionado no segundo item da lista. Para o promotor Jairo Bisol isso não aconteceu. “Sistemas complexos e sensíveis, como o sistema de saúde, não deveriam estar expostos à lógica perversa das práticas políticas desse país. É isso o que acontece no DF”, aponta. Porém, ressalta: “o gestor de saúde não tem grande autonomia em relação ao governador. En- tão, acho que o grande responsável pela situação da saúde da região é o governador, e não o gestor”. À espera de atendimento no Hospital do Guará, a paulista Elisângela Borges, recém-chegada ao DF, esperava há três horas por uma consulta no clínico geral. “Estou com muita falta de ar. Está impossível trabalhar assim”, diz. Sobre a demora e o que diz o Programa de Governo, ela lamenta: “Os serviços estão péssimos. É vergonhoso e revoltante que tenha prometido tudo isso”. LUARA BAGGI DESCASO Amélia não teve tempo. Quando a cirurgia saiu, ela morreu. Qualquer pessoa pode ser a próxima Minha mãe morreu por descaso”, afirma Ana Amélia, filha da paciente Revolta é o que não falta ELIO RIZZO DESESPERO Bernardino tenta apoio para equipamento da filha, mas não consegue Quase todos os dias da semana, a Defensoria Pública de Saúde do Distrito Federal lota bastante de gente muito revoltada. As filas chegam a invadir o lado de fora da sala. Do lado de dentro, várias histórias colocam abaixo o Programa de Governo de Agnelo Queiroz. Uma delas é o triste relato de Bernardino Godino, 60 anos. Sua filha, hoje com dois anos, nasceu prematura e, por conta disso, teve hidrocefalia. Após a cirurgia, a criança ficou com sequelas: não enxerga e a traqueia dela alargou. Hoje, a menina precisa de um aparelho chamado cânula traqueal para viver. Porém, a família não consegue mais pagar pelo tubo que custa, em média, R$ 220. Desesperado, ele buscou a defensoria para que o governo pague pelo aparelho. “A gente não tem mais dinheiro. Preciso muito que o governo me forneça. Ela é tão pequena, precisa tanto dessa ajuda”, afirma o pai, Bernardino Godino. A camareira Andrea Martins, de 38 anos de idade, também precisou procurar o órgão público para reclamar. “Desde o ano passado, preciso de uma consulta no médico para avaliar meus exames e fazer uma cirurgia no quadril e nunca consigo”, conta a mulher. “A dor é insuportável e eu preciso trabalhar. Não estou aguentando mais”, ressalta a camareira. Sobre a saúde pública do Distrito Federal, ela diz: “Agnelo Queiroz não cumpriu nada. Sinto-me tão pequena passando por isso. Não queria e nem devia estar aqui, apelando para isso”, reclama Andrea. H!