Equipa Editorial Newsletter nº 50 – Junho de 2015 Equipa Editorial: Senhor Professor, quais os principais desafios que encontrou nestes dez anos enquanto Diretor da FMUL? Prof. J. Fernandes e Fernandes: Quando acabei por ceder ao convite para me candidatar à direção da Faculdade, fi-lo por fidelidade a uma ideia e a um modelo de Escola Médica que considerava fundamental desenvolver. Um modelo tão próximo quanto possível de instituições de referência que conhecia, quer do tempo em que trabalhei em Londres quer no que pude ir apreciando no decurso da minha carreira. Nunca tive dúvidas que era indispensável evoluir para uma organização integrada da nossa missão académica – ensino, investigação e prática médica – e que a adaptação para a nossa realidade do modelo holandês de Centro Académico de Medicina que começava a ser discutido e implementado em alguns países europeus e nos EUA, seria uma solução possível. Essa era a visão que tinha para a nossa escola médica e esse o primeiro desafio. A sessão pública na FML com a presença dos Ministros Ana Jorge e Mariano Gago em que assinámos finalmente o protocolo de cooperação entre a Faculdade, o IMM e o Hospital de Santa Maria e a publicação da Portaria no DR em outubro de 2009 oficializando a sua constituição, foram marco numa estratégia de ação que me parece indispensável continuar internamente e com mobilização dos decisores políticos. A ideia consubstancia um modelo inovador de organização dos Hospitais académicos, com impacto no financiamento, na organização das carreiras profissionais e na sua inserção na Rede Hospitalar pública. Recordo, com saudade, a conversa decisiva que tive em casa do Prof. Jaime Celestino da Costa, cujo conselho procurei sobre estes meus planos e como conseguir a sua concretização. As suas palavras ainda hoje perduram na minha memória: só valerá a pena candidatar-se se conseguir implementar esse projeto; esse tem que ser o seu desafio principal. Para o concretizar este projeto era necessário um combate com três ideias-chave: modernização, abertura e expansão. A explicação é talvez um pouco longa, mas acho que é conveniente recordar alguns factos. A - Modernização da Faculdade, no ensino, na investigação científica e uma nova articulação funcional com o seu Hospital académico. Foi prioridade. De facto, confrontava-me com uma organização do ensino antiquada, com grande sobrecarga horária e de avaliações, com demasiadas repetições e barreiras entre si, uma exposição muito tardia dos alunos à vida clínica, a qual efetivamente só tinha significado a partir do 4ºano. Tinha havido reformas anteriores muito válidas, como a reorganização por Blocos do ensino clínico estimulada pelo Prof. Pinto Correia e a introdução de inovações pedagógicas – a Introdução à Medicina, no 1º ano graças ao impulso do Prof. Gomes Pedro e do antigo DEM (Departamento de Educação Médica) que fora entretanto extinto e integrado no Instituto de Formação Avançada (IFA) em 2003. Era preciso retomar o impulso reformista, particularmente nos anos iniciais e na sua articulação com o 4º e 5º anos e assegurar a continuidade e reforço do 6º ano profissionalizante, que estava a ser uma experiência bem-sucedida. E concentrámo-nos nestes anos porque a reorganização necessária dos anos clínicos, precisa duma reestruturação hospitalar que não dependia da Faculdade. Houve um desígnio: aproximar o nosso modelo de ensino do que se pratica nas grandes escolas médicas que nos servem de referência. Para a sua concretização, pedimos uma avaliação por uma Comissão Internacional de Peritos, foi produzido um Relatório e depois iniciámos a sua implementação. Este processo que demorou só um ano, exigiu mobilização de docentes e discentes para a nova reforma a qual foi possível começar logo em outubro de 2007. Foi muito difícil, existiram obstáculos mas creio que valeu a pena; demonstrou que as instituições também são capazes de promover reformas e de evoluir e marcámos uma posição de vanguarda no contexto nacional com uma reforma moderna, um ensino integrado, exposição clínica precoce e abertura à investigação pelos alunos. Sobre a Investigação, cujo reforço era outro desafio, tinha havido uma evolução muito importante. Sob o impulso de David-Ferreira e com o contributo de outros docentes, aproveitando a legislação introduzida pelo Ministro Mariano Gago, foi criado o Instituto de Medicina Molecular (IMM), produto da associação dos Institutos e Centros de Investigação da Faculdade já existentes que foram classificados como Excelente, em avaliação externa. Ao IMM foi constituído como uma associação privada de natureza científica e técnica sem fins lucrativos, com maior flexibilidade e autonomia administrativa que as instituições públicas, como a Faculdade, não dispõem. Foi-lhe atribuído o estatuto de Laboratório Associado e constituiu um upgrade notável da capacidade de investigação biomédica no nosso campus universitário. É uma história de sucesso. A mudança para o novo Edifício Egas Moniz entretanto concluído, foi uma circunstância muito favorável; ocorreu ainda no mandato do meu antecessor. O apoio financeiro, logístico e institucional da Direção da FM ao IMM foi uma opção estratégica que mantive durante todos os meus mandatos, como é do conhecimento geral e da nossa comunidade académica. Este apoio traduziu-se, além do domínio financeiro, no reconhecimento académico dos seus líderes de investigação como Professores da Faculdade, quer na criação de relações de cooperação e confiança com os seus responsáveis, o que permitiu ultrapassar dificuldades naturais e acomodar, com tranquilidade e poucos sobressaltos, a desejável expansão do IMM e, compatibilizá-la com o crescimento da investigação nos outros institutos e centros da faculdade. Restava o terceiro polo – o Hospital. Normalizar o relacionamento da Faculdade com o Hospital de Santa Maria, o nosso hospital académico e essencial para a nossa missão. 2 Quando assumi funções o relacionamento oficial entre as duas instituições estava no grau 0; era fundamental recuperar confiança mútua, ultrapassar os conflitos que existiam e promover uma maior sinergia entre hospital e faculdade, sem o que toda a estratégia para a constituição do Centro Académico nunca teria sucesso. E esse era o desafio determinante para aceitar candidatar-me à direção da escola médica. Por isso, e poucos sabem este facto, ainda antes da primeira eleição pedi apoio aos Ministros da Saúde e Ensino Superior, respetivamente Profs. Correia de Campos e Mariano Gago para esta orientação que considerava absolutamente essencial face à dimensão do desafio. A colaboração da direção do HSM da época permitiu ultrapassar rapidamente as situações de conflito e iniciar um percurso de cooperação efetiva, de confiança e de partilha de uma visão comum para o futuro que teve continuidade durante estes 10 anos e que é porventura um dos aspetos mais gratificantes deste período. Agora, a direção do Centro Académico é assumida pelo Presidente do Conselho de Administração do HSM-CHLN e sei do seu profundo empenhamento na continuidade do projeto e na concretização de medidas legais indispensáveis. B – Abertura da Faculdade à Cidade foi outra ação prioritária e facilitada pela experiência que tinha desenvolvido com a disciplina de Introdução à Clínica. Apostámos na criação de Rede de Instituições Afiliadas, hospitais e centros de saúde, indispensável à melhoria do ensino prático e clínico dos nossos alunos e que denominei de Parceria para o Ensino Clínico. Nesse tempo, tinha a convicção que prevalecia uma mentalidade de cidadela fortificada, numa Faculdade que não obstante experiências inovadoras, estava demasiado centrada sobre a sua realidade. Era preciso romper os muros e avançar para a Cidade numa lógica que sempre entendi como essencial à missão universitária: o dever de reconhecer e incorporar mérito e qualidade onde existam e aproveitá-los para a formação dos médicos. E esta política tinha uma vantagem adicional para nós: maiores oportunidades de diálogo, de cooperação e relações de confiança entre os nossos docentes e os colegas nas outras instituições com impacto relevante na promoção de iniciativas pedagógicas e científicas comuns e expansão da influência da Faculdade. Foi um desafio muito interessante, introduzimos algumas inovações como a do Professor Convidado de Clínica, equivalente ao Clinical Professor nos EUA, aprovado em Conselho Científico, que permitiu reconhecer mérito académico aos líderes clínicos das unidades hospitalares que contratualizávamos para o ensino do programa curricular obrigatório sem interferência na progressão normal da carreira académica, e que se estendeu também aos líderes clínicos não doutorados no HSM, e a remuneração da atividade de ensino indexada à sua duração, o que permitiu oferecer uma compensação financeira comportável no orçamento da Faculdade e, desse modo, consolidar a cooperação. A colaboração das lideranças clínicas e institucionais, nos hospitais e centros de saúde foi determinante para o sucesso da iniciativa. Estou certo que é um programa com continuidade futura, creio que essencial para assegurar diversidade de experiências clínicas aos nossos estudantes e, simultaneamente, para expandir a intervenção e inserção externa da Faculdade. C – A Expansão da Faculdade era o requisito indispensável, que obrigava a racionalização administrativa, equilíbrio financeiro – vivemos sempre com grandes dificuldades e negociar o 3 orçamento da Faculdade na Reitoria foi, durante anos, um exercício difícil. Estabeleceram-se colaborações efetivas e parcerias com outras instituições de ensino e investigação que potenciaram o crescimento da Escola Médica. Assumimos claramente como desígnio estratégico a cooperação com o Instituto Superior Técnico, que já tinha sido iniciada com um programa emblemático e de sucesso que era o Curso de Engenharia Biomédica, e noutras áreas, alargando a cooperação entre as ciências biomédicas e as engenharias, a qual constituirá um dos grandes pilares para a nova revolução científica das primeiras décadas do século XXI. Procurámos ainda estimular a Formação Avançada, quer em programas de Mestrado e Cursos de Pós-graduação e Educação Médica Continuada, estimular programas de e-learning através do Instituto de Formação Avançada (IFA), bem como a divulgação on-line em plataforma própria de conteúdos pedagógicos e o desenvolvimento do Programa Doutoral do Centro Académico de Medicina, que estimulei e apoiei ativamente, cujo objetivo é promover a qualificação científica dos projetos de doutoramento, o interesse dos clínicos pela investigação, e que, graças à atuação inteligente da sua Comissão Científica, é um sucesso e elemento diferenciador da nossa Escola Médica. E, finalmente, era fundamental assegurar a construção do segundo edifício no nosso campus académico, contrapartida do contrato programa assinado em 2001 com o Governo e da cedência do edifício do Instituto Câmara Pestana à Universidade Nova de Lisboa. Foram inúmeras as dificuldades, porque era preciso alterar parte do seu plano, pois tinha sido concebido para substituir o instituto bacteriológico e essa já não era uma necessidade. Foi uma odisseia, mas felizmente a sua construção pode ser retomada, depois de forte oposição que chegou ao Ministério, e de ter sido ultrapassado o interregno causado pelo colapso da primeira firma construtora. Finalmente, com o apoio indefetível da Reitoria, a obra poderá estar concluída no fim de 2015. Ao edifício foi dado o nome de Reynaldo dos Santos, outro pioneiro da Angiografia, e que me pareceu bem, ao lado do edifício Egas Moniz, como tributo ao período brilhante de inovação da Medicina Portuguesa que foi a introdução da Angiografia arterial e venosa nos anos 20 e 30 do século passado. Será hub, assim espero, para essa cooperação especial com o IST, como tenho referido nos Programas de Ação sucessivamente aprovados por unanimidade pelo Conselho de Escola. E.E: E pode referir-nos quais as maiores dificuldades sentidas? Prof. J.F.F: Como é óbvio houve as naturais resistências às mudanças verificadas, mas que foi possível ultrapassar com diálogo exigente e sentido de responsabilidade mútua. Tive uma ajuda extraordinária dos dois Subdiretores que me acompanharam nestes dez anos: o Prof. Alexandre Ribeiro desde o início até à sua jubilação e depois o Prof. Miguel Castanho. A inteligência viva e arguta de ambos, o seu sentido de responsabilidade institucional e empenhamento na concretização das iniciativas, foram um apoio inestimável e permanente que agradeço penhorado, assim como a colaboração e entendimento com todos os Presidentes dos órgãos dirigentes da Faculdade, sem exceção, da Assembleia de Representantes agora Conselho de Escola, aos Concelhos Científico e Pedagógico, ao Diretor Executivo e à estrutura 4 administrativa e à Associação de Estudantes com quem foi possível estabelecer saudável cumplicidade e ir ao encontro de reivindicações justas dos alunos, como a melhoria das salas de estudo, que representou um esforço financeiro conjunto apreciável. Diferenças de opinião são naturais e até desejáveis, porque permitem debater e consolidar ideias, incorporar novas perspetivas e isso é muito importante na vida duma instituição como a Faculdade de Medicina. É preciso que decorram com elevação, senso e medida, sem necessidade de recorrer a uma estratégia de menorização da Faculdade, que só desprestigia quem a usar. Mas há uma dificuldade inultrapassável, permanente e que se agravou substancialmente com a crise financeira que se abateu sobre todos a partir de 2010 – a redução progressiva do investimento público na Educação Superior, por Escola e por aluno. Adequar os orçamentos públicos às necessidades é um exercício particularmente complexo e que coloca limitações reais à capacidade de promover efetivamente uma política de recursos humanos, de atracão dos melhores e mais qualificados, tão necessária à competitividade e desenvolvimento da nossa Escola Médica. Queria referir um dado importante. A fusão das Universidades Clássica e Técnica, e a constituição da ULisboa, um processo no qual a Faculdade esteve e está profundamente empenhada, trouxe novas oportunidades de desenvolvimento que de longe ultrapassam algumas dificuldades potenciais. Apoio completamente a decisão do Reitor de promover a consolidação de contas da Faculdade com o IMM e a AIDFM, cujo significado é muito importante: permitiu uma nova perceção pública da dimensão financeira efetiva da nossa estrutura académica, globalmente apreciada, foi um exercício que nos aproximou da visão integrada que o Centro Académico de Medicina potencia e requer, e coloca a Faculdade numa posição muito mais realista no contexto da Universidade. Temos procurado ultrapassar as dificuldades pelo incremento das receitas próprias, nomeadamente pelos projetos de investigação que os nossos investigadores, no IMM, na Faculdade e no Hospital têm conseguido obter e que constitui expressão de vitalidade e força científica que honra, também, a Faculdade. E este tem que ser o caminho do Futuro. Tornarmo-nos competitivos na disputa de financiamentos externos, de projetos científicos, de prestação de serviços e é nesse contexto que o Centro Académico de Medicina, com os seus diferentes polos de ação, constituirá a nossa grande vantagem competitiva, nacional e internacional. A sua consolidação é o eixo da roda, que manterá a unidade na diversidade da nossa atuação, na fidelidade aos grandes objetivos da nossa missão académica: ensinar, promover conhecimento pela investigação, oferecer prestação de serviços médicos de elevada diferenciação e qualidade que nos permita consolidar uma posição de liderança que efetivamente já ocupamos, quando analisada a nossa atividade nesta perspetiva integrada. Se o fizermos, e estou certo que o faremos bem, ultrapassaremos todas as dificuldades! 5 E.E: Um dos objetivos que esteve praticamente sempre presente nos seus programas e planos de atividades foi a modernização administrativa da FMUL. Considera-o um objetivo cumprido? Prof. J.F.F: Nunca nada está definitivamente cumprido, há sempre melhorias a fazer, mas creio que demos passos seguros e consolidados na direção certa e para cumprir o nosso objetivo: prestar um melhor serviço à nossa comunidade académica. Eu queria aproveitar para publicamente reiterar o meu apoio e admiração pelo trabalho desenvolvido pelos funcionários não docentes e que foram o esteio da modernização administrativa dos serviços da Faculdade. Vivemos períodos muito difíceis, de grande sacrifício pessoal e escassas compensações, que não, o sentido do dever cumprido. O setor administrativo da Faculdade foi extraordinário na sua dedicação à Casa e no seu espírito de serviço, fazendo muito com pouco. Adotou novas formas de organização do trabalho, reforçou a colaboração entre diferentes setores privilegiando atuação em rede e assim procurando ultrapassar os constrangimentos à renovação do pessoal administrativo. Nem sempre foi possível satisfazer reivindicações legítimas, por limitações legais que nos ultrapassam, mas neste fim de mandato, ainda foi possível alterar e melhorar a situação de alguns colaboradores por mobilidade intercarreiras e apostar no desenvolvimento de programas de formação, e tudo isso se refletirá na melhoria e qualificação dos serviços prestados. E.E: Num plano global, a internacionalização, é um fenómeno cada vez mais presente na nossa sociedade. Em que a medida a FMUL se enquadra ou poderá enquadrar nesse fenómeno? Prof. J.F.F: Vejamos o que entendemos por internacionalização. Se é reconhecimento científico internacional, participação em parcerias na investigação fundamental e clínica, eu acho que nós, Faculdade e Centro Académico de Medicina, estamos na liderança no País. Tive a oportunidade de o referir em artigo recente publicado na imprensa, quando se procurou menorizar o Hospital e indiretamente a Faculdade. As nossas lideranças clínicas obtiveram nas últimas décadas um reconhecimento internacional ímpar, quer na participação ativa e por convite nos principais fóruns científicos, nas distinções recebidas, no 6 exercício de cargos de liderança científica internacional. Nem sempre vem no jornal, não usámos nenhuma agência de comunicação e talvez tenhamos privilegiado em excesso algum recato próprio do nosso ethos clínico, que nos obriga, sempre, a relativizar os sucessos. Esta realidade é frequentemente omitida, porventura por esquecimento ou ignorância, mesmo no nosso ambiente quotidiano, mas não devemos nem podemos menorizar essa dimensão da nossa atividade. Se pensamos em criação de inovação e em competição com os principais centros europeus de investigação e prestação de serviços médicos, há um caminho a percorrer, mas que não depende só de nós. Requer uma política inteligente de investimento em tecnologia e recursos humanos, uma visão informada, independente, que tenha em conta a real capacidade das instituições. Sem isso, sem esses tools, que são esses novos produtos da tecnologia aplicada à interrogação e intervenção na Natureza, não seremos competitivos com as outras instituições internacionais na criação de conhecimento e na prestação de serviços de elevada diferenciação e complexidade, que são sempre marca de qualidade. Vivemos um período de esperança. Há uma nova possibilidade de financiamento externo com os programas europeus de apoio ao desenvolvimento, como Horizonte 2020, programas interinstitucionais com dimensão internacional, para os quais temos desenvolvido iniciativa, trabalho e ação, em estreita cooperação com a ULisboa. Veremos o que se conseguirá! Se, se refere à projeção da Faculdade como centro de ensino médico com impacto internacional, acho que temos um bom desempenho. Integramos o Programa Erasmus com apreciável sucesso, quer para os que nos visitam, quer para os nossos alunos que procuram novos horizontes. Temos promovido exigência na escolha das instituições com as quais colaboramos neste intercâmbio de estudantes, na sua avaliação e felicito o Núcleo Internacional pelo trabalho desenvolvido. Não conseguimos implementar com o Brasil e depois com os países lusófonos, o Programa Egas Moniz, um Erasmus-like program para o espaço cultural da Lusofonia. Mas as bases estão lançadas, com protocolos de cooperação assinados com as principais instituições brasileiras; é preciso oportunidade e ambiente político favorável. A oferta de serviços de ensino a estudantes internacionais, que me parece ser o cerne da sua pergunta, debate-se com uma dificuldade peculiar: a proibição imposta pelos sucessivos Governos de as escolas médicas poder abrir vagas para estudantes internacionais, sob a falsa premissa que iriam prejudicar os estudantes portugueses. É uma falácia que procurámos demonstrar, não nos ouviram. Mas é inevitável que a razão penetre no espírito dos governantes e os faça perceber que essa é uma vocação irrecusável da Faculdade de Medicina, que o poderemos fazer com qualidade e sem prejuízo dos nacionais, e que essa atuação poderá trazer indiscutíveis vantagens à instituição, quer para o seu prestígio externo, quer para a melhoria das suas receitas. Temos negociações em curso com Angola, que decorrem não obstante as reconhecidas dificuldades atuais nesse País, e também com a Arábia Saudita, que nos procurou para esse objetivo, entre outros, mas estamos dependentes de uma mudança da legislação. 7 Não podemos perder esta oportunidade! E.E: Tendo estes últimos anos do seu mandato sido coincidentes com o processo de fusão da Universidade de Lisboa com a Universidade Técnica, quer fazer-nos um balanço desta fusão, considerando o ponto de vista de Diretor de uma grande Faculdade? Prof. J.F.F: O balanço é extremamente positivo. A Faculdade participou ativamente neste processo, desde a primeira Convenção organizada pelo Prof. Sampaio da Nóvoa em 2007, até às negociações que se sucederam. Eu acho que foi o maior desenvolvimento na Universidade portuguesa nas últimas décadas e a expressão do vigor, capacidade e determinação da Universidade. Adquirimos uma dimensão única, nacional e internacionalmente, e a Faculdade de Medicina assume-se claramente como um pilar desse desenvolvimento e núcleo de progresso nas Ciências da Vida e da Saúde. Múltiplas parcerias científicas têm vindo a desenvolver-se; realço a mais recente através da Profª Ana Sebastião e do Núcleo de Neurociências da Faculdade que assumiu a liderança do Colégio Mente e Cérebro criado pela ULisboa, no âmbito dum projeto inovador de criação de novas dinâmicas científicas interdisciplinares na Universidade. A conclusão do edifício Reynaldo dos Santos permitirá congregar no nosso campus académico projetos e iniciativas de grande alcance científico, pedagógico e, também, com desenvolvimento empresarial na área da Biotecnologia. Este é bem um projeto emblemático da cooperação interinstitucional no âmbito da ULisboa e há que saber resistir a visões redutoras, que inevitavelmente procurarão limitar o seu desenvolvimento, circunscrevendo-o a interesses exclusivos e autocentrados. Esta é uma oportunidade para um grande projeto de desenvolvimento do Centro Académico de Medicina e da Universidade que não devemos perder. E.E: A nível académico, científico, pedagógico e até administrativo, o que espera da Faculdade para os próximos anos? Prof. J.F.F: A continuação dum caminho de diferenciação e afirmação científica no contexto internacional, pugnarmos cada vez mais por uma research – based education, que permita desenvolver novas oportunidades para a investigação científica e para um ensino de grande qualidade, a consolidação do Centro Académico de Medicina e o reconhecimento que este modelo que propusemos constituirá, porventura, a resposta adequada às necessidades da Medicina Académica, pilar para o ensino e formação de profissionais de topo, para o desenvolvimento de oportunidades de investigação e inovação. Estes são os requisitos para que consigamos posição cimeira entre as instituições académicas europeias. E também aqui um setor administrativo motivado e empenhado é essencial para a concretização destes objetivos. 8 E.E: Por fim Senhor Professor, qual gostaria que fosse considerado o seu maior legado depois destes dez anos enquanto Diretor da maior escola médica do país? Prof. J.F.F: Talvez a consolidação do Centro Académico de Medicina de Lisboa e a efetiva transformação deste campus académico de Santa Maria num grande polo de desenvolvimento científico e tecnológico na área das Ciências da Vida e da Saúde, na formação dos Profissionais de Saúde, médicos e outros, ao serviço de uma Medicina Clínica de grande diferenciação e qualidade, centrada no Doente, nos valores perenes de uma Medicina humana, empenhada e ao serviço da Comunidade. Procurei dar continuidade, com adaptações próprias do tempo e das circunstâncias, a uma estratégia cujas raízes mergulham na nossa herança cultural e científica, na nossa história como Instituição relevante na vida nacional e com impacto internacional. Será que algumas das decisões tomadas corresponderam a essa responsabilidade, inerente à função que desempenhei? Só o Tempo o poderá dizer. Espero ter cumprido o meu dever, tenho a consciência tranquila de ter servido a Instituição procurando sempre fazer o melhor que pude e soube. Foi suficiente? Espero, apenas, que tenha sido útil. 9