Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 Always and Forever: As Histórias de Amor entre Homens e Vampiros1 Bárbara Saliba Daher Ferreira da Silva2 Carolina de Melo Ferreira Umbelino do Nascimento3 Murillo Lopes Buareto da Silva4 Universidade Federal de Goiás - UFG Resumo Este artigo é parte de uma pesquisa experimental e se propõe a estudar a fragilidade do amor moderno em comparação com o amor imortal e eterno das histórias de vampiros. Para esses seres imortais o amor não é uma simples convenção, mas a razão de toda uma existência. A paixão por determinada pessoa (vampiro ou não) acompanha a eternidade do ser imortal. O ser humano é instável e propenso a mudanças de comportamento e humor. O individualismo é outro quesito que tem sido presente nos relacionamentos conjugais. Os casamentos se dissolvem devido ao fim do que os casais um dia chamaram de “amor para a vida toda”. Os vampiros apaixonados são capazes de tudo por amor. Esse amor é tão importante para eles que se torna algo a ser cultivado e cuidado para sempre. É um amor imortal e imutável. Palavras-chave: Amor; vampiros; humanos; fragilidade; mundo moderno. O amor pode se realizar? O amor é antes de tudo uma convenção. A palavra que designamos para nomear algo que, hoje, chamamos sentimento. Para alguns, cheio de significado e representação, para outros uma simples invenção da sociedade. Nunca saberemos como os seres humanos lidavam com isso antes da invenção da “escrita”. Mas a partir do momento histórico em que surgiram os primeiros registros, lá estava a participação dele. 1 Trabalho apresentado no Intercom Júnior – Jornalismo do XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-oeste realizado de 27 a 29 de maio de 2010. 2 Bacharelanda de Jornalismo da Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia - Facomb, da Universidade Federal de Goiás - UFG. 3 Bacharelanda de Jornalismo da Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia - Facomb, da Universidade Federal de Goiás - UFG. 4 Bacharelando de Jornalismo da Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia - Facomb, da Universidade Federal de Goiás - UFG. 1 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 Era diferente do que conhecemos atualmente, pois, assim como o ser humano, o amor evoluiu através dos séculos. E durante essa evolução foi estudado e experimentado por muitos. Às vezes, até negado, mas na maioria exaltado. Alguns dos estudiosos do amor das sociedades moderna e pós-moderna, como Michel Foucault e Zygmunt Bauman, nos forneceram o material essencial para a realização desse trabalho. Suas conclusões a cerca dos rumos que essa convenção tem tomado são nossos pontos de partida para a reflexão. Mas ao comparar o sentimento que conhecemos hoje com o sentimento apresentado nas histórias de vampiros, principalmente, nas de Stephenie Meyer, Anne Rice e Bram Stoker – que escreveram as tramas mais famosas do cinema e da literatura – ficamos curiosos. Para esses seres imortais em particular, o amor não é uma simples convenção, mas a razão de toda uma existência. É possível perceber, inclusive, que a cultura de massa tenta apregoar nos seus mais diversos produtos um amor ideal que a vida prática observada revela que é praticamente inexistente. Como já diria o autor Edgar Morin, “O aventureiro, o cowboy, o xerife sempre encontram na floresta virgem, na savana, no deserto, nas grandes planícies do Oeste o amor de uma heroína pintada e bela” (MORIN, 2009, p. 131). “O amor decantado, fotografado, filmado, entrevistado, falsificado, desvendado, saciado parece natural, evidente. É porque ele é o tema central da felicidade moderna. (...) a propriedade da cultura de massa é universalizar, em todos os setores, a obsessão do amor” (MORIN, 2009, p. 131) Tais constatações do referido autor demonstram que o amor visto nos filmes e novelas, principalmente, é idealizado, mas não praticado no mundo terreno. O objetivo deste estudo, então, é analisar o paradoxo, traçar um paralelo entre o sentimento invulnerável - que resiste através dos séculos - contado nas histórias de vampiros e o frágil, mutável e rápido amor da líquida sociedade moderna. Queremos discutir por que o ser humano, que tem seus dias contados, não consegue vivê-los de maneira intensa. E por que os imortais, que possuem a eternidade, tiram o melhor de cada momento. 2 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 Lendas, mitos e mistérios As lendas de vampiros são muito antigas e estão presentes no imaginário de diversos povos. É difícil afirmar quando surgiram as primeiras histórias, pois aparecem referências desde a Grécia antiga. O sangue tem um forte valor simbólico em diversas culturas: significa vida, paixão, poder, força, e também carrega consigo uma série de tabus e interditos, o que dá margem para especulações e gera um bom material para mitos. Existem lendas de vampiros desde 125 a.C., quando ocorreu uma das principais histórias conhecidas, uma lenda grega. Porém a palavra Upir (palavra de que derivou a expressão "vampiro"), tem registros de 1047, num documento para um príncipe Russo, chamado Upir Lichy ou "Vampiro maldoso". Na verdade, pode-se afirmar que esse foi o primeiro registro por escrito, pois as origens do mito se perdem séculos e séculos atrás quando a tradição oral prevalecia. Lendas sobre vampiros se originaram no oriente e viajaram para o ocidente através da Rota da Seda para o Mediterrâneo. De lá, a partir do século VIII, elas se espalharam por terras eslavas e pelas montanhas dos Carpathos. Quase na mesma época em que essas histórias começaram a se difundir, iniciou-se o processo de “cristianização” da região, e as lendas de vampiros sobreviveram como mitos, muitas vezes associados ao cristianismo. Após a cristianização a lenda dos vampiros foi carregada por ciganos, que migraram à Transilvânia, logo depois do nascimento de Vlad Drácula, em 1431. Assim presente no folclore de muitas culturas, o vampiro ganhou vida eterna através da literatura a partir do início do século XIX. Na literatura há clássicos que trazem vampiros mundialmente conhecidos, como o Conde Drácula, do livro de Bram Stoker, provavelmente o mais famoso de todos; Lestat de Lioncourt e Louis de Pointe du Lac, criações de Anne Rice, imortalizados no cinema por Tom Cruise e Brad Pitt, respectivamente; e, mais recentemente, Edward Cullen, da série de ficção adolescente “Crepúsculo”, da autora Stephenie Meyer. Existem várias divergências entre os mitos, lendas e histórias contadas nos livros e no cinema. Segundo Meyer e Rice, alho, água benta, crucifixo e estacas são falsas convenções da Santa Inquisição. Em suas histórias, não existem muitas maneiras de se matar um vampiro. Já para Stoker, todos esses elementos são nocivos aos seres noturnos. Mas as duas autoras também divergem quando os aspectos analisados são a criação de um vampiro e a exposição ao sol. Em Meyer, os imortais brilham, em Rice, como na maioria dos textos, eles queimam quando expostos aos raios do Sol. 3 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 Outra recorrência quando se trata de vampiros é o poder de sedução que podem exercer. Caracterizados como seres extremamente belos, com força e velocidade sobre-humanos, de pele pálida e forma física perfeita, os vampiros são comumente associados à luxúria. Entretanto, todos os autores descrevem de maneira similar o amor entre vampiros. Quase todas as histórias e contos dizem de um amor único e, principalmente, eterno e imortal, no sentido literal dos adjetivos. Para esses seres imortais o amor não é uma simples convenção, mas a razão de toda uma existência. Segundo Zygmunt Bauman, o homem moderno está preso por ligações extremamente superficiais e facilmente rompíveis. Ele vive uma batalha interna entre a vontade de estreitar esses laços e a necessidade de mantê-los frouxos para que possam ser rompidos a qualquer momento. O ser humano de hoje tem medo de amar e de se relacionar, mas tem mais medo ainda das conseqüências que o amor e os relacionamentos podem trazer em longo prazo. Por isso, acabam sujeitando-se a noites de desejo com pessoas que mal conhecem, passando pela vida de vários indivíduos ao mesmo tempo, sem realmente se interessar por eles. Os vampiros amam incondicionalmente e constroem uma ligação eterna com o objeto de seu amor. Drácula passa a eternidade procurando pelas reencarnações de sua amada. Louis, depois da morte de sua companheira, diz ser “um espírito preso em um corpo imortal. Vazio e imutável!”. Edward tenta se matar quando, depois de um equívoco, acredita que sua cara metade está morta. O ser humano é instável e propenso a mudanças de comportamento e humor. Possui as mais variadas dúvidas, inclusive, e na maior parte do tempo, sobre o amor e o retorno da dedicação que oferece ao outro. Isso traz o medo e a insegurança, o que caracteriza a dúvida sobre seus sentimentos e emoções. Os vampiros, por outro lado, representam tudo aquilo que os seres humanos gostariam de ser e de viver, mas não podem, não conseguem. Eles são a exteriorização de alguns dos sentimentos mais humanos. Quantos anos você tem? Uma característica dos tempos modernos é, sem dúvida, a superficialidade dos relacionamentos amorosos. As pessoas deixaram de ver o convívio com o outro como algo necessário para a sobrevivência. Até algumas décadas atrás, o indivíduo que queria ter 4 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 uma vida social considerada normal tinha, entre seus ideais, o casamento. As pessoas namoravam, casavam-se e constituíam uma família. Hoje, a própria estrutura familiar não é mais a mesma. A formação “Pai, Mãe e Filhos” não é mais a única existente. Há homens que moram sozinhos, mulheres que passam o dia todo fora de casa, homens que, após colocarem fim no casamento, voltam para a casa dos pais, entre outras formações. Já não é mais uma exigência social ter um parceiro para ser aceito na comunidade. Esse é um dos motivos que auxiliaram na constituição de uma mentalidade que não vê no relacionamento amoroso o único caminho para a felicidade. Pode-se ser feliz e bem aceito sem ter uma esposa ou marido. Com isso, os relacionamentos perderam a grande importância que outrora tinham. Como afirma o jornalista José Ebenézer, “o casamento passou a ser não mais aquele compromisso ‘até que a morte separe’, mas ‘até que surja uma nova opção’". O individualismo é outro quesito que tem sido presente nos relacionamentos conjugais. A sociedade que cultua este individualismo é uma sociedade extremamente voltada para o prazer. Muitas pessoas querem obter apenas satisfação em seus relacionamentos, sem pensar no outro, sem crer que o outro também precisa ser satisfeito. Nesse aspecto, Zygmunt Bauman compara: (...) o ser amado transformou-se numa tela – em branco de preferência. Suas cores naturais empalideceram, de modo a não se chocar com a figura do pintor. O pintor não precisa indagar da tela como esta se sente, lá embaixo, sob toda aquela tinta. (Bauman, Zygmunt, 2004, p. 34.) Outra marca típica destes tempos em que se experimenta relacionamentos descartáveis é a presença quantitativa de casamentos que são celebrados por interesses outros que não o amor. Este sentimento antigo chamado de "amor" tem sido descartado por muitos que se aventuram no casamento. Para estes, casamento é realmente uma aventura e não um compromisso. Se der certo, tudo bem; se não der, parte-se para outra. Entra-se e sai-se de casamentos como se troca de roupa diante do espelho da vida, na busca daquela que componha melhor o figurino da ocasião. Exemplo disso é o alto número de divórcios que têm ocorrido ultimamente em todo o mundo. Cerca de 1,4 milhão de casais se divorciaram no ano passado na China, um aumento de 18,2% em relação a 2006. De acordo com o IBGE, cerca de 1 milhão de 5 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 pessoas se casam todos os anos no Brasil – e pouco mais de 250 mil se separam no mesmo período. Conclui-se que, de cada quatro casamentos, um termina em separação. De acordo com muitos psicólogos, um casamento que se estabelece em bases tão frágeis realmente não tem como dar certo. Diante do primeiro obstáculo da vida, tal relacionamento sucumbe porque não tem raízes sólidas e seguras. Vêm, então, o desinteresse, a desarmonia, a desavença, o ciúme, a inveja, a desconfiança e outros tantos sentimentos menos nobres. Nessa altura, fica difícil de sustentar um casamento com bases tão superficiais. A relação conjugal acaba perdendo a “eternidade” estabelecida no momento das bênçãos matrimoniais. “Desenvolvimentos recentes põem em jogo, senão a própria concepção nuclear, pelo menos o tema do único amor. As perturbações da vida amorosa dos olimpianos tendem, paradoxalmente, a desmitologizar o amor de cinema. As inconstâncias, rupturas ou divórcios dos Martine Carol, Rita Hayworth, Elizabeth Taylor, Brigitte Bardot, Margaret, Soraya, Vatim, etc, racham e desintegram o happy end amoroso do cinema” (MORIN, p, 137, 2009) Estamos tratando do casamento, pois esta instituição é um exemplo mais prático e “palpável” da situação em voga, uma vez que o seu tempo pode ser contado, pode ser medido. Mas trata-se apenas de uma representação da validade de algo ainda maior: o amor. Esse sentimento não apresenta mais, para a grande maioria das pessoas, o caráter irrevogável que tinha. Se o casamento não é mais eterno, o amor – lembrando que se trata de uma generalização, mas sabemos das várias exceções – também não. Como afirma Zygmunt Bauman, as relações são consideradas “relações de bolso”, uma vez que podem ser guardadas para se lançar mão delas quando for preciso. Apesar destas constatações reais, percebemos que, como já citado no início deste artigo, a cultura de massa – e a indústria cultural – ainda “vende” a cultura do amor idealizado. Trata-se de uma insistência em passar, através dos produtos, a “falsa realidade” citada por Edgar Morin. “A falsa racionalidade, ou seja, a racionalização abstrata e unidimensional, triunfa sobre a Terra” (MORIN, p. 208, 2000) É nesse momento que surge a correlação com o amor nas histórias dos vampiros. Entre estes seres sobrenaturais, o sentimento amoroso é exaltado e eterno. Diferentemente do mundo humano, não passou por uma transformação e nem perdeu seu caráter vitalício. Os vampiros retratados em filmes e livros vivem uma história amorosa 6 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 para sempre. A paixão por determinada pessoa (vampiro ou não) acompanha a eternidade do ser imortal. Outro aspecto que merece uma boa comparação entre relacionamentos amorosos humanos e vampirescos é a fidelidade. Em uma pesquisa publicada na revista Veja, a autora Daniela Pinheiro divulgou recentemente uma pesquisa realizada pela sua equipe sobre o comportamento de homens e mulheres casados. O levantamento constatou que 60% dos homens já foram infiéis. Os principais motivos apontados pelos entrevistados são atração, problemas no casamento e “circunstâncias”. De acordo com o mesmo estudo, 47% das mulheres também já foram infiéis. Os principais motivos por elas citados são insatisfação, vontade de experimentar outro parceiro, falta de amor e atração. Na mesma pesquisa, 59% dos homens disseram que sentiam vontade de serem infiéis pela insatisfação no relacionamento, pela atração e instinto sexual. 55% das mulheres entrevistadas disseram que sentiam a mesma vontade pela atração, insatisfação no casamento e raiva. Com tais resultados, podemos concluir que homens traem por razões ligadas à sexualidade e as mulheres por motivos ligados ao casamento e por vingança. As traições costumam ocorrer nos quatro primeiros anos de união. A maioria dos homens e mulheres tem vontade de ter um caso. Eles não o fazem por falta de oportunidade. Elas, por não querer que o marido lhes faça o mesmo. Uma reportagem publicada recentemente pela revista Época revelou que uma série de pesquisas sugerem que o sonho da maioria das pessoas continua sendo um casamento único, que dure a vida inteira. “As pessoas não se separam por ter superado essa aspiração romântica. Ao contrário, elas se afastam amarguradas por não conseguir atingir esse ideal” (Época, nº 622, 2010) Seja como for, independentemente dos motivos, os dados revelam uma alta tendência à traição. Não se tem mais o compromisso representado pela aliança. As pessoas traem. Já entre os vampiros a infidelidade amorosa é inaceitável. Todos os sentimentos vividos por esses seres são muito mais intensos, agem com muito mais força no comportamento dos mesmos, e o amor é o exemplo mais característico. Quando um vampiro ama alguém ele realmente nutre por essa pessoa um amor eterno e, acima de tudo, fiel. Não há casos de traição nas histórias de vampiro. Ao analisar este aspecto, pensamos que talvez a falta de devoção ao outro e a infidelidade entre os humanos se deva à vida curta - se comparada à longevidade de um 7 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 vampiro. As pessoas têm uma expectativa bem menor, querem sempre experimentar, aproveitar a vida e o tempo. Entre os vampiros, seres vitalícios, essa “pressa” não existe. Eles não querem ter muitos, mas apenas um. Fora da percepção do homem, está o fato de que buscar o aproveitamento de seu tempo, pequenos e grandes momentos e oportunidades passam despercebidos. Capazes de experimentar sentimentos e emoções de forma única – diferente de qualquer outro ser, imaginário ou real – nós estamos tão preocupados com a rapidez e a fluidez agregada à nossa vida na líquida sociedade moderna que nos esquecemos de olhar atentamente, de sentir, de realmente aproveitar. Podemos achar que estamos ganhando tempo e multiplicando experiências, mas estamos desperdiçando momentos de felicidade e completude. Mas, se aprendermos com os vampiros, percebemos que, na verdade, estamos perdendo um tempo muito valioso. Quando se pode viver para sempre, pelo que você vive? Em se tratando do amor conjugal nos lembramos do que Foucault diz sobre o desgaste do casamento. Segundo o filósofo, o amor entre marido e mulher se desgasta com o nascimento dos filhos, e, a partir de então, a relação começa a decair num processo autodestrutivo. No mundo moderno não são apenas os filhos os responsáveis pela eliminação da paixão entre os cônjuges. A fragilidade das relações e a velocidade em que elas são obrigadas a acontecer acaba abalando as estruturas de qualquer casamento, eliminando sentimentos como o amor e a paixão. Surgem aí o ciúme excessivo, a insegurança, e os pensamentos de infidelidade. Entre os vampiros filhos não são um problema. Para gerar filhos é preciso haver mudanças no corpo da mulher e, como as vampiras estão mortas, seus organismos não podem se adaptar aos bebês. Dessa forma, as mulheres vampiras não podem engravidar. Na maioria das histórias, parte-se do mesmo pressuposto para os homens. Os vampiros estão mortos e, portanto, não podem mais produzir espermatozóides, se tornando incapazes de procriarem. No entanto, algumas lendas dizem que, como o corpo masculino não precisa mudar, e o vampiro homem já era fértil antes de ser transformado, os vampiros podem, sim, engravidar mulheres humanas. O fato é que os filhos não são fator separador dos casais nas histórias de vampiros. Sem esse elemento, a relação não teria porque decair, de acordo com os parâmetros de Foucault. A beleza do amor eterno está no fato deste não ter nenhum 8 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 obstáculo em seu caminho. Os vampiros se entregam de uma forma única ao ser amado, se sacrificam por ele, pois sabem que aquele amor é único. Na maioria das vezes, a entrega é recíproca. Se um humano chega a escolher viver um amor com um vampiro, ele já está bem consciente de que aquilo é único e especial. Depois de transformados, os vampiros nunca mudam. Independente de suas idades, eles não crescem, não envelhecem, não engordam. Isso pode causar transtorno para muitos deles, pois algo que acomete a todos eles é o amor. A personagem Claudia, de “Entrevista com um vampiro”, foi transformada enquanto criança, tendo sempre o aspecto angelical de uma boneca. Mas ela se apaixonou insanamente pelo seu Criador, o vampiro Louis, o que a fez querer crescer e se tornar uma mulher atraente. Numa tentativa de mudar, ela corta seus cachos para tentar parecer mais velha, mas eles crescem de volta imediatamente. O amor é um sentimento que se apodera de todos os vampiros, mas cada um reage de um jeito. Se ainda não tiverem encontrado seu companheiro até serem transformados, depois disso desenvolverão sentimentos, na maioria das vezes, por humanos, buscando uma conexão com o que costumavam ser. Esse amor é tão importante para eles que se torna algo a ser cultivado e cuidado para sempre. É um amor imortal e imutável. Os vampiros apaixonados são capazes de tudo por amor. Os seres humanos são bastante diferentes. Completamente mutáveis, são controlados por uma série de hormônios e fatores externos que fazem com que o amor de agora, anunciado como o amor da vida toda, se torne outro em apenas alguns anos. Casamentos acabam porque o amor acaba. Uma vida inteira, construída juntos, pode chegar ao fim se um dos membros do relacionamento arranjar um novo amor. A partir dessa fragilidade do amor moderno, que se contrapõe a esse amor imbatível e imortal dos vampiros, é possível questionar se o amor eterno é realmente possível, ou será que ele é tão surreal que só existe entre seres imaginários? O amor pode se realizar. Ele só está esperando por você Se é possível tirar uma lição do que propomos neste artigo, é que o amor no mundo moderno está frágil e efêmero devido apenas às ações humanas. Tentamos mostrar ao longo de nossas comparações como o ser humano deseja o verdadeiro sentimento do amor mas não consegue obtê-lo. É por isso que exteriorizamos nossos desejos em nossas 9 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia – GO 27 a 29 de maio de 2010 criações, sendo que os vampiros, suas histórias, sua sensualidade e seu amor imortal são criações humanas. A falta de tempo e de credibilidade nesse sentimento faz com que nossas relações pareçam ínfimas perto das que lemos e vemos nas histórias de vampiros, e em tantas outras histórias de amor perfeito. A perfeição não pode e nunca será alcançada. Errar é parte fundamental do humano. Mas a busca por algo quase perfeito também é algo inerente à nossa condição. E, para encontrar esse algo, basta querermos. O amor verdadeiro e (quase) eterno existe sim. Ele só está esperando que alguém queira encontrálo. Referências bibliográficas BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. BORDON, Gioconda. Fragilidade dos laços humanos, A. In: < http://www.digestivocultural.com/ensaios/ensaio.asp?codigo=123.> Acesso em 2 de dezembro de 2008. DEL PRIORE, Mary. A história do amor no Brasil. 2º ed. São Paulo: Contexto, 2006. ENTREVISTA com o vampiro. Direção: Neil Jordan. Atores: Brad Pitt, Tom Cruise e Antonio Bandeiras. Produção: David Geffen e Stephen Wooley. Roteiro: Anne Rice. Geffen Pictures Estúdio, 1994. 1 DVD (122 min). Baseado na obra de Anne Rice. MARTINS, Ivan; MELLO, Kátia. Como salvar seu casamento. Revista Época. São Paulo. nº 622. 19 de abril de 2010. pp. 116-124. MEYER, Stephenie. Crepúsculo. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2007. MEYER, Stephenie. Lua Nova. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2008. MEYER, Stephenie. Eclipse. USA: Hachette, 2008. MEYER, Stephenie. Breaking Dawn. USA: Hachette, 2008. MORIN, Edgar. Cultura de massas do século XX: neurose. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009. MORIN, Edgar; LE MOIGNE, Jean-Louis. A inteligência da complexidade. São Paulo: Peirópolis, 2000. PINHEIRO, Daniela. Por que elas traem?. Revista Veja. São Paulo. nº 1875. 13 de outubro de 2004. pp. 84-90. STOKER, Bram. Drácula: o vampiro da noite. São Paulo: Martin Claret, 2002. 1